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INTERFACES DA EDUCAÇÃO Organizador Diego Kenji de Almeida Marihama P E R S P E C T I V A S E D I M E N S Õ E S T E Ó R I C O - P R Á T I C A S V O L U M E I I INTERFACES DA EDUCAÇÃO Organizador Diego Kenji de Almeida Marihama P E R S P E C T I V A S E D I M E N S Õ E S T E Ó R I C O - P R Á T I C A S V O L U M E I I S ã o P a u l o 2 0 2 1 EDITOR-CHEFE: PROF. DR. VALDIR LAMIM-GUEDES CONSELHO EDITORIAL PROF. DR. ALEXANDRE MARCELO BUENO (UNIVERSIDADE PRESBITERIANA MACKENZIE) | PROFA. DRA. ANNIE GISELE FERNANDES (USP) | PROF. DR. ANTÓNIO MANUEL FERREIRA (UNIVERSIDADE DE AVEIRO, PORTUGAL) | PROF. DR. CARLOS JUNIOR GONTIJO ROSA (USP) | PROFA. DRA. DEBORAH SANTOS PRADO (CENTRO UNIVERSITÁRIO SENAC) | PROF. DR. FÁBIO AUGUSTO RODRIGUES E SILVA (UFOP) | PROF. DR. FELIPE W. AMORIM (UNESP) | PROFA. DRA. FLAVIA MARIA CORRADIN (USP) | PROF. DR. FRANCISCO SECAF ALVES SILVEIRA (UNIVERSIDADE ANHEMBI MORUMBI) | PROF. DR. HORÁCIO COSTA (USP) | PROF. DR. JAVIER COLLADO RUANO (UNIVERSIDAD NACIONAL DE EDUCACIÓN, EQUADOR) | PROF. DR. JOSÉ AUGUSTO CARDOSO BERNARDES (UNIVERSIDADE DE COIMBRA, PORTUGAL) | PROF. DR. MARCOS PAULO GOMES MOL (FUNDAÇÃO EZEQUIEL DIAS) | PROF. DR. PEDRO ROBERTO JACOBI (USP) | PROF. DR. RENATO ARNALDO TAGNIN (FACULDADES OSWALDO CRUZ) | PROFA. DRA. SUZANA URSI (USP) | PROFA. DRA. YASMINE ANTONINI (UFOP) M335 Marihama, Diego Kenji de Almeida (Org.) Interfaces da Educação: perspectivas de dimensões teórico-práticas - Volume II [livro eletrônico] / Diego Kenji de Almeida Marihama (Org.). Vários autores. – São Paulo: Na Raiz, 2021. 171f.: il.; 14,8x21cm; pdf ISBN 978-65-88711-18-7 DOI http://doi.org/10.5281/zenodo.5663042 1. Educação. 2. Pesquisa interdisciplinar. I. Título. EDITORA NA RAIZ CDD 370 Contatos A Editora Na Raiz é uma empresa com DNA USP http://doi.org/10.5281/zenodo.5663042 https://editoranaraiz.wordpress.com/ mailto:lamimguedes@gmail.com SU M ÁR IO 27 58 4. EDUCAÇÃO EM TEMPOS DE PANDEMIA: (RE)LEMBRANDO... REFLETINDO... PROPONDO… Rosana Meire de Lima, Rosimeyre Maria dos Santos Passaro 2. PERCEPÇÃO DOS PROFESSORES SOBRE FORMAÇÃO CONTINUADA QUANDO O ASSUNTO É EDUCAÇÃO HÍBRIDA E METODOLOGIAS ATIVAS Claudiana Ribeiro dos Santos Andrade, Diego Kenj i de Almeida Marihama 9 14 1. NARRATIVAS DE UM DOCENTEJosé Moran APRESENTAÇÃO Maria Lucia Zanesco 49 3. TECNOLOGIAS SOCIAIS E OS DESAFIOS DA EDUCAÇÃO: TECENDO REDES EM TEMPO DE COVID-19 Carol ina Pereira de Moraes Manoel , Claudiana Ribeiro dos Santos Andrade 67 6 PREFÁCIO Diego Kenj i de Almeida Marihama 5. O USO DO GOOGLE CLASSROOM COM PATROCÍNIO DE DADOS COMO ALTERNATIVA À DIMINUIÇÃO DAS DESIGUALDADES DE APRENDIZAGEM DURANTE A PANDEMIA Let íc ia de Souza Nascimento, Patr íc ia Aparecida Gonçalves de Faria SU M ÁR IO 125 149 11. É POSSÍVEL COMBATER FORÇAS E VARIAR UTILIZANDO DIFERENTES LINGUAGENS, NA COMPOSIÇÃO DE PENSAMENTOS DE GEOGRAFIAS POSSÍVEIS E ESPACIALIDADES, COM AUTISTAS NO ENSINO BÁSICO? Marlene Neves Furlan Lozano 9. FORMAÇÃO DE PROFESSORES PARA ATUAR COMO GUIA/INTÉRPRETE NO ENSINO REGULAR Tamyres de Fát ima dos Santos 99 8. REFLEXÕES SOBRE A IMPORTÂNCIA DOS LETRAMENTOS INFORMACIONAL E DIGITAL Larissa Maiara Barbosa Gomes, Iara Carnevale de Almeida, Viv iane Sartori 134 10. INCLUSÃO DE PORTADOR DE SÍNDROME DE ASPERGER EM ESCOLAS: REGULAR VERSUS ESPECIAL Maria da Paixão Dias Santos 163 SOBRE OS AUTORES E ORGANIZADOR 84 7. ESTUDO E APRENDIZAGEM COM A INTERNETCarlos Lema Garcia 76 6. A INTERAÇÃO PROFESSOR E ALUNO EM TEMPOS DE PANDEMIA Claudete dos Santos, Gi lvânia de Jesus Si lva PREFÁCIO D I E G O K E N J I D E A L M E I D A M A R I H A M A 7 Este livro tem como proposta reunir investigações e ensaios dos membros do Grupo de Estudos e Pesquisas Formação de Professores e convidados, o qual agradeço as contribuições do Prof. Dr. José Moran e a Dom Carlos Lema Garcia (Arquidiocese de São Paulo), que enriqueceram o trabalho do grupo com suas experiências, sob o panorama da educação e suas dimensões teórico-práticas, que permeiam a docência e a discência. É importante salientar que é uma obra colaborativa e representa um grupo que se reuniu em plena pandemia para compartilhar ideias, discutir e investigar práticas que atendam às necessidades emergenciais desta crise sanitária e do contexto social em que vive o Brasil e o mundo, a partir do uso das Tecnologias Digitais da Informação e Comunicação (TDIC’s), metodologias ativas, inclusão social, inclusão tecnológica, ensino híbrido, avaliação, formação de professores, entre outras temáticas que fizeram parte das atividades do coletivo de professores. A pandemia provocou mudanças e transformações no comportamento das pessoas, gerando na comunidade docente a necessidade de descrever suas experiências, obtidas através de suas práticas, construídas no calor da superação. Este fato os fez decidir por registrar suas experiências. Reunimos aqui então estas produções científicas as quais apontam caminhos para trazer de volta a esperança. Assim, ao apresentar as interfaces da educação como tema central, essa obra aborda diferentes olhares sobre a relação professor e aluno, entre outras conexões que impactam na educação. Logo, os capítulos voltam-se às práticas cotidianas e as inquietações dos professores diante dos desafios sociais e educacionais, enfatizando às necessidades dos alunos e professores, no acesso às aulas remotas, bem como o direito a uma educação de qualidade, inclusiva, mediada, sob o entendimento de que formamos cidadãos para as futuras gerações. Acreditamos que este trabalho permitirá a obtenção de uma melhor compreensão dos fatos da vida, da História, da construção do Conhecimento e da Cultura. Urge uma reflexão histórica do comportamento humano, que leve em conta fenômenos sociais e emocionais associados a tudo o que possa influenciar e ser considerado dentro do contexto da sociedade em que vivemos. E foi isso que reunimos neste livro. 8 O que marca o nosso tempo é essa aceleração do progresso tecnológico sem a correspondente aceleração no pensamento teórico. Não temos uma teoria da educação, como não temos uma teoria social, mas estamos equipados com uma assustadora tecnologia. A abordagem do systems analysis está em seu começo, mas constitui um dos mais terríveis desafios ao nosso despreparo para utilizá-la. Anísio Teixeira Folha de São Paulo - 26.10.68 9 Apresentação Maria Lúcia Zanesco 10 A formação do profissional da educação é um processo contínuo, cuja finalidade é a manutenção e desenvolvimento de conhecimentos num mundo em constante mudança, abrangendo um amplo sentido de humanização, que, segundo Paulo Freire, efetuará sua inserção no mundo, como agentes de transformação. A pandemia da Covid-19 trouxe uma série de demandas novas, e levou os educadores a mudar suas práticas e ampliarem as próprias perspectivas sobre educação e a atuação docente. As novas metodologias disruptivas e as TDIC se tornaram uma exigência para manter docentes e discentes unidos. Foi um começo muito difícil e lá se vão quase dois anos de pandemia, mas que proporcionaram muito crescimento para a maioria dos docentes. Dessa forma, este livro apresentou uma ampla gama de experiências humanas no ubíquo ambiente educacional, evidenciando que a formação de professores se faz na prática, com todas as suas complexas necessidades, na busca e seleção de ferramentas teóricas e tecnológicas adequadas e na troca de saberes com outros docentes. Assim, os saberes docentes foram enriquecidos e ressignificados. Os capítulos, assim, discutiram ideias gerais sobre os conceitos metodológicos e o uso das tecnologias, com base nas experiências adquiridas durante o desenvolvimento das práticas cotidianas no ensino remoto, no qual docentes, discentes e comunidades envolvidas, foram aprendendo a construir o caminho. Da mesma forma, os capítulos tambémabordaram temas que apontam para as experiências e ensaios dos educadores e especialistas em educação, que buscaram externar estratégias criadas na relação com a sala de aula, mesmo virtualmente. Segue abaixo, um breve resumo dos capítulos incluídos neste livro, o qual o primeiro, aquele que abre nossos trabalhos, é uma contribuição do Professor José Moran, a quem deixamos aqui o nosso muito obrigado. No capítulo Narrativas de um docente, Moran narra sua jornada na carreira docente, referindo–se a suas dúvidas iniciais e como descobriu os caminhos do diálogo através da pesquisa, por meio das propostas de autores como o psicólogo Carl Rogers, que o conduziu a novas formas de pensar e melhorar as que já praticava. A seguir, temos o capítulo Percepção dos professores e a formação de professores quando o assunto é educação híbrida e metodologias ativas, que traz 11 uma reflexão sobre a formação de professores, buscando mostrar a realidade do caminho percorrido pelos professores em suas aulas virtuais pela necessidade de isolamento exigido pela Pandemia, na busca por formação tecnológica que dê suporte à educação híbrida. Com relação ao uso da tecnologia e as novas demandas docentes, Tecnologias Sociais e os Desafios da Educação: Tecendo Redes em Tempo de Covid- 19 é um relato, abrangendo este momento Histórico da Pandemia e suas consequências na Educação e faz referência ao trabalho dos profissionais de Educação que precisaram conciliar sua rotina, anterior à Pandemia, às novas formas de contato virtual através de metodologias e tecnologias que exigiam formação urgente. Refletindo sobre os caminhos da formação docente, o capítulo Educação em tempos de Pandemia: (re)lembrando... refletindo... propondo nos mostra o impacto da Pandemia na Educação Básica, destacando ser este um momento de muito aprendizado. O capítulo analisa questões como: o que a pandemia ensina para nós em termos de educação? E desta forma, traça o percurso dos docentes e discentes em busca do Conhecimento. Sobre a desigualdade social e a dificuldade enfrentada pelos discentes que vivem em bairros carentes, O uso do google classroom com patrocínio de dados como alternativa à diminuição das desigualdades de aprendizagem durante a pandemia traz a reflexão das autoras sobre o agravamento da desigualdade social, pois muitos alunos não possuem acesso a recursos tecnológicos, numa análise das escolas de ensino básico da rede pública do estado de São Paulo, o que dificultou muito o prosseguimento das atividades com os alunos mais vulneráveis socialmente. Sobre as novas formas de interação social em ambiente educacional, o capítulo A interação professor e aluno em tempos de pandemia aponta que a Educação, neste momento de Pandemia vem enfrentando grandes desafios e salienta o ensino remoto emergencial como fator necessário neste momento de isolamento social, destacando fatores como a importância da tecnologia digital no cotidiano em todos os níveis de ensino. O capítulo Estudo e aprendizagem com a internet dá ênfase ao trabalho difícil, de docentes e discentes, durante estes meses de pandemia. Ele Mostra a necessidade urgente da comunidade se capacitar para o uso de plataformas digitais para dar continuidade, principalmente, às suas tarefas acadêmicas. Enfatiza também o processo de aprendizado, passando pelo conhecer-se e 12 pela leitura. Em Reflexões sobre a importância dos letramentos informacional e digital, as autoras enfatizam o papel da informação desde a antiguidade até a sociedade atual, considerando a importância do letramento para permitir a leitura e a escrita. Considera a necessidade de todo indivíduo ser capaz de interpretar o que lê no sentido de perceber a realidade que o envolve. Os últimos três capítulos estão relacionados a questões próprias da inclusão de grupos específicos na comunidade escolar. O capítulo Formação de professores para atuar como guia/intérprete no ensino regular faz uma análise de estudantes com Necessidades Educacionais Especiais (NEE). Estes estudantes vêm sofrendo exclusão dentro da comunidade escolar e necessitam ter seus direitos de inclusão social defendidos. Esta análise vê a medicina e a pedagogia, como responsáveis por novas possibilidades para estas pessoas. Inclusão de portador de síndrome de Asperger em escolas: regular versus especial descreve as características da Síndrome de Asperger e os problemas encontrados pelos portadores dessa síndrome em escolas regulares quanto nas consideradas especiais. Avalia suas peculiaridades com respeito, dignidade em suas relações com o mundo. Em É possível combater forças e variar utilizando diferentes linguagens, na composição de pensamentos de geografias possíveis e espacialidades, com autistas no ensino básico?, a autora narra suas experiências com pessoas autistas, mostrando que estudos, leituras, debates e reflexões permitiram que fizesse conexões e expandisse seu foco na pesquisa atual e de muitos anos sobre inclusão e aprendizagem de portadores de TEA (Transtorno do Espectro Autista). Todos nós professores nos reinventamos durante os quase dois anos de pandemia e, bem ou mal, nos adaptamos para superar os desafios que foram postos. Diante da profundidade das mudanças geradas pela pandemia no contexto educacional e de tantas outras provocadas por mudanças nas legislações educacionais, sabemos que os docentes e discentes seguirão nesse processo de construção de caminhos, no qual ambos ensinam e aprendem, enquanto transformam as próprias vidas e o contexto em que estão inseridos. O que esperar dos novos tempos pós pandemia? A certeza que 13 levamos é a de que muitas transformações virão e conviverão lado a lado com as muitas permanências que ainda marcam o cotidiano escolar. A transformação não é um simples desafio, mas talvez por isso seja tão interessante e motivador. Excelente leitura a todos! 14 1. Narrativas de um docente José Moran 15 Minhas transformações como docente Fui um bom aluno, em escolas convencionais: Estudei bastante, fazia o que os professores pediam; era obediente. Fui também um professor convencional durante mais de 15 anos. Fui encontrando meu estilo de docência, seguindo os exemplos que tive, que viraram fórmulas, repetições, rotinas. As fórmulas facilitaram a vida, mas trouxeram monotonia, cansaço e desgaste. Com o tempo a insatisfação foi mais visível em algumas turmas. As aulas não empolgavam e minha frustração chegou a um nível insuportável. Ensinar virou um suplício. Há quarenta anos, crianças do nono ano de um Colégio, onde lecionava Análise de Mídias, me desafiaram: “Por que não partimos logo para a prática? Queremos fazer um jornal, fazer teatro, um audiovisual”. Cedi a contragosto. Vi logo a empolgação deles, como se organizaram em grupos com propostas concretas. Umas aulas eram dedicadas a planejar, desenvolver e apresentar os projetos práticos e outras a leitura, análise de outras experiências. Percebi que a motivação aumentou e que os resultados foram melhores. Meus mestres sempre ensinavam primeiro a teoria e depois a prática. Foram as crianças que me mostraram que eles funcionavam melhor ao contrário. Mostraram que a prática os motivava, e que fazia mais sentido trazer depois leituras e realizar análises mais amplas, a partir da experimentação. Aprendi que negociar os projetos era muito melhor que trazê-los prontos (tanto na educação básica como superior). Apresentava minhas propostas e eles davam sugestões, faziam novas propostas e, depois de chegarmos a acordos, os estudantes se sentiam mais envolvidos nas aulas. Fui evoluindo de um planejamento fechado, previsível para um planejamento mais aberto e compartilhado. Enquanto desenhavam seus projetos, começávamos pelos materiais mais simples – mais ligados ao cotidiano - e depois, os mais complexos outeóricos. Isso fez muito mais sentido para eles. Aprendi também a perceber a importância do meu papel de orientador e mentor. Primeiro na orientação dos projetos, depois em ajudar os alunos a irem além dos resultados. Nas apresentações fazia perguntas, como “O que vocês aprenderam”?, “O que fariam diferente, se começassem agora o projeto?” e isso tornava mais visível todo o processo e os estimulava 16 a pensar de pontos de vista diferentes. Nem sempre os estudantes apreciavam as perguntas depois das apresentações dos projetos, porque as interpretavam, às vezes, como críticas. Mas aí percebi que eu meu papel não era só aplaudir o resultado dos projetos, mas ajudá-los a ampliar a visão de outros caminhos possíveis e a tornar a aprendizagem mais visível, algo que hoje se enfatiza tanto. O psicólogo Carl Rogers foi sempre uma grande inspiração para mim. Ele defendia que só educamos em clima de confiança e autonomia. Demorei para conseguir realizar isso como docente. Alguns fracassos e insatisfações com turmas mais difíceis no ensino superior me levaram a tentar mudar a aproximação dos alunos, a perguntar mais, a dialogar, a estimular a participação: tudo que nos parece evidente, depois que conseguimos realizá- lo. Mas demorei para sentir-me seguro em confiar mais nos alunos. Esse foi, para mim, a maior aprendizagem que tive: sair da zona de conforto do previsível para a experimentação, do monólogo para o diálogo, do planejamento fechado para o aberto. Rogers também me ensinou a importância da aprendizagem com propósito, ao longo da vida. Quando ele estava com mais de oitenta anos e próximo da sua morte, escreveu: “estou envelhecendo, aprendendo, revendo meus conceitos”. Ali percebi a importância de fazer da vida meu projeto de aprendizagem mais importante, que continua atual na etapa de envelhecimento em que me encontro. Daí veio o interesse pelos estudos sobre o Projeto de Vida, hoje tão em voga. A essa base humanista, acrescentei as possibilidades tecnológicas possíveis. Primeiro o uso de vídeos, mais tarde a Internet. Descobri a internet em 1988 na USP. Um ano antes tinha defendido meu doutorado, feito em máquina de escrever. A Internet – mesmo no modo texto, sem imagens nem sons – causou-me um impacto extraordinário. De um lado participei de grupos de estudo e pesquisa sobre essas novas tecnologias que estavam surgindo (e que me levaram a participar do Projeto Escola do Futuro) e, de outro, tentei ver na minha prática docente como utilizar essas tecnologias para promover uma aprendizagem mais motivadora e inovadora. As tecnologias ampliaram os espaços da sala de aula e me fizeram ver que o mundo é um espaço rico para aprender e ensinar. Comecei os novos temas com pesquisa em tempo real no laboratório com os alunos. Filtrávamos as melhores referências e as estudávamos ao longo de uma 17 semana (aula invertida). Ficavam disponíveis numa página (que hoje é meu blog da USP) e voltávamos para a sala de aula presencial para compartilhar nossas aprendizagens, questões, dúvidas. A síntese da aula também ficava disponível na página web. A combinação de laboratório, ambiente virtual e presencial me levou a dar mais um passo que foi o híbrido, o blended. Liberei os alunos de pós-graduação de algumas aulas presenciais e alternávamos pesquisa online, estudo prévio com os encontros presenciais de aprofundamento. Vi que o híbrido fazia sentido. Gerenciei alguns projetos híbridos (vinte por cento online) e cursos a distância. Experimentei também na fase mais madura da docência, oferecer mais de uma alternativa de seguir “as aulas” na graduação. Queria que os alunos pudessem realizar escolhas e vir às aulas presenciais não pela presença, mas porque valia a pena. Os alunos podiam escolher fazer atividades personalizadas sem assistir aulas (apresentação de um plano feito a quatro mãos) ou participar regularmente das aulas no formato híbrido. A maioria continuou as aulas presencialmente, e isso me obrigou a ser interessante, a elaborar propostas que fizessem sentido para eles, porque a presença não era obrigatória (eles tinham outras opções). Fui aprendendo, aos poucos, a ser um docente mais ativo, apesar de ter tido uma formação passiva, na qual ser bom aluno era obedecer. Comecei pela escuta, acolhimento, diálogo, fazendo negociações até chegar a consensos. Depois desenvolvi algumas técnicas de participação, com o apoio das tecnologias disponíveis. Aprendi, aos poucos, a sair do planejamento fechado para um planejamento mais aberto e participativo; a sair do espaço físico da sala de aula e a integrá-la com outros espaços, principalmente os digitais. Foi um processo demorado, complexo e contraditório, mas muito realizador, porque me tornou uma pessoa mais aberta, atenta à inovação e à experimentação. Percebi há bastantes anos, que fazia sentido ensinar e aprender de forma menos fechada, mais participativa, flexível, personalizada e colaborativa. Aprendi as metodologias vendo que funcionavam com os estudantes. Em paralelo aprendi também com muitos educadores – Dewey, Freinet, Rogers, Vigotsky, Ausubel, Montessori, Papert e tantos outros – que me serviram como alicerces e guias neste processo tão desafiador como é a arte de aprender a ensinar crianças e jovens tão diferentes num mundo em profunda transformação. 18 Agora busco ajudar docentes e gestores a mudar seu mindset e aprofundar de forma sistêmica as formas de ensinar ativamente, desenhando novos ecossistemas educacionais mais compartilhados, caminhando para modelos de comunidades de aprendizagem. O poder transformador dos docentes inspiradores Há pessoas que nos inspiram. Esta é uma situação vivida, que me marcou muitos anos atrás. Em uma reunião de professores de um colégio importante do Paraná, estávamos discutindo, numa roda de conversa, os desafios de ensinar jovens no Ensino Médio. A maior parte dos professores fez sérias críticas aos seus alunos: chegavam mal preparados, eram mimados pelos pais (sem limites), desinteressados, sempre distraídos nos jogos e nas conversas. A professora de Português, da mesma escola, contou que ela adorava esses mesmos alunos e que era extremamente gratificante trabalhar com eles. Perguntei o que ela fazia para conseguir trabalhar com os estudantes de uma forma tão fácil e gratificante, quando, para muitos dos seus colegas, ensinar era tão complicado. Ela falou de várias estratégias que utilizava, de uma forma simples e eficiente. 1. A primeira “estratégia” é interessar-se, gostar e conhecer os estudantes. Ela pensava neles com afeto antes de começar o curso, criava expectativas positivas sobre eles e sobre o que aconteceria no semestre, enquanto planejava as aulas. Estudava o histórico de cada aluno e dedicava as primeiras aulas a aprofundar o conhecimento de cada um: quais eram seus sonhos, o que sabiam fazer melhor, como ocupavam o tempo livre. Acolhia os alunos na entrada, cumprimentando-os um a um. Isso criava uma relação de cumplicidade, de confiança e de aceitação dos alunos pela professora. Ela tinha se interessado por eles, conversavam sobre a vida deles. Esse mapeamento ajudava a adaptar o planejamento à realidade dos alunos, às necessidades concretas deles, à diversidade de tempos de aprendizagem. 2. A segunda estratégia é surpreendê-los, diversificando as técnicas e a forma de trabalhar com os alunos. Evitava a rotina. A professora tinha um bom repertório de metodologias ativas, de técnicas para trabalhar com eles. A diversidade é fundamental para manter a curiosidade, o interesse e atender a alunos diferentes. 3. A terceira estratégia é saber negociar. A professora compartilhava o planejamento, o que ela tinha pensado para eles, principalmente os grandes 19 projetos, que eram explicados, e postos em discussão para que os estudantes dessem suas sugestões e contribuições.Essa negociação era importante para que os estudantes se sentissem coautores das atividades, dos projetos, da avaliação. Os alunos se envolviam mais, a partir de então, nas aulas, nas pesquisas, nas produções. 4. A quarta estratégia é a de valorizar as produções dos estudantes. Os projetos eram apresentados pelos alunos, de forma criativa, muitas vezes, trazendo outros colegas para assistir e também as famílias. Os alunos se sentiam valorizados, tinham que mostrar diversas competências (pesquisa, colaboração, comunicação em público...). O que mais me chamou a atenção é que são estratégias simples, que fazem todo o sentido e que conseguem criar um clima de confiança, de participação e de intensa colaboração. Para mim foi uma revelação do poder transformador que um bom profissional consegue com estratégias adequadas, adaptadas à sua personalidade, no meio de alunos que trazem dificuldades de anos anteriores, que têm alguns problemas de educação familiar. Nada disso impede de propor estratégias que conseguem modificar um quadro, que outros docentes consideravam difícil de transpor. Também me impressionou que são estratégias viáveis e que podem ser aplicadas sempre, porque não dependem de grandes projetos institucionais. É ótimo estar em um time alinhado, em que todos colaboram, trabalham juntos, planejam e avaliam juntos. Mas o que este exemplo mostra é que todos podemos fazer um trabalho muito inspirador se somos bons profissionais, dominamos algumas estratégias e temos competências humanas bem desenvolvidas como as de saber acolher, negociar, compartilhar. Tenho encontrado nas minhas diferentes atividades com docentes da educação básica e superior muitos exemplos de educadores que fazem um trabalho magnífico, aprendendo a cada semestre, desenvolvendo projetos diferentes, utilizando diversas estratégias (com mais ou menos tecnologias), envolvimento da comunidade. Ao mesmo tempo, vejo nos mesmos lugares, colegas se desgastam, lutando para se impor, para conseguir a atenção dos alunos, e terminam as aulas esgotados, desanimados porque não conseguem essa mesma adesão, a não ser pela força, pelas cobranças, pelas ameaças ou pelas notas. Os professores inspiradores enfrentam as dificuldades como oportunidades e procuram caminhos para entender os alunos, comunicar-se 20 com eles, chegar a acordos possíveis e valorizar o que eles produzem. São caminhos simples, que mostram uma grande maturidade emocional e competência intelectual e emocional para tornar-se docentes queridos, inspiradores, realizados. Sabemos que as soluções na educação precisam ser mais estruturais e com políticas de valorização, formação e envolvimento de todos. Não podemos depender só das soluções individuais. Mas esses docentes - que ganham o mesmo que seus colegas e que têm os mesmos motivos para reclamar das condições profissionais - decidiram fazer o melhor possível nas condições em que se encontram para conseguir comunicar-se com os estudantes, fazer parcerias com alguns colegas mais interessados, envolver as famílias, experimentar os caminhos mais viáveis e assim conseguir bons resultados. São queridos pelos alunos e sentem que sua dedicação é recompensada pelo envolvimento deles, pelas contribuições que os aprendizes trazem e pela alegria de perceber que o trabalho está sendo inspirador para muitos. São professores inspiradores para todos os demais. Mostram que todos podemos transformar-nos como docentes e como pessoas, mudando nossa atitude, experimentando alguns caminhos viáveis que passam pelo acolhimento, pelo afeto, pelas metodologias ativas e pela arte da negociação e pelo compartilhamento. Ampliando as práticas de Mentoria na Educação Os novos modelos educacionais que fazem sentido hoje – mais ativos, criativos, personalizados, colaborativos, que desenvolvem competências amplas - implicam em compreender melhor o papel dos docentes neste processo. Um dos papéis principais até agora era ajudar os alunos a entender alguns fenômenos através de materiais selecionados. Hoje eles estão disponíveis ou podem ser disponibilizados para que os estudantes aprendam no seu próprio ritmo. Plataformas digitais com inteligência artificial conseguem avaliar quais conteúdos são mais relevantes, que itinerários o estudante pode seguir, e solucionar as questões mais previsíveis, que podem chegar a 80%. Está claro que as tecnologias realizarão cada vez com mais precisão uma parte das atividades dos docentes. O que é essencial hoje no trabalho docente? O que ele precisa focar melhor? O que a tecnologia não consegue dar conta? 21 O papel docente mais relevante é ajudar os estudantes a aprender de forma profunda, ampla, experiencial, reflexiva. O docente será cada vez mais um orientador, um tutor e um mentor. Um orientador dos caminhos mais interessantes para aprender, das estratégias que fazem mais sentido para cada estudante e para os diversos grupos. Ele será um tutor que ajudará nas dúvidas mais significativas (as básicas a tecnologia o fará), a problematizar, a trazer outros pontos de vista. O papel mais novo e relevante que se desenha a partir de agora para o docente é o de mentor. Os estudantes podem caminhar sozinhos por roteiros básicos de aprendizagem, podem aprender entre si, mas para um desenvolvimento de competências cognitivas, pessoais e sociais precisam de um acompanhamento mais amplo, entender para que aprendem, o que fazer para ter uma vida com propósito. O foco em mentoria-tutoria é um tema que precisa ser mais discutido, experimentado, institucionalizado e que abre novas perspectivas de atuação profissional para os docentes, dentro e fora das instituições de Ensino. O que é mentoria? É a prática de ajudar ou de aconselhar uma pessoa menos experiente, durante um período de tempo. Sua finalidade é apoiar e incentivar as pessoas a melhorar seu próprio aprendizado para maximizar seu potencial, desenvolver suas habilidades e melhorar seus desempenhos para se tornarem quem desejam se tornar. É uma prática bem enraizada no mundo profissional e que agora ganha atenção nesta fase de transformações profundas pelas que a educação está passando. Num sentido amplo, os docentes serão cada vez mais mentores para que os estudantes consigam desenvolver as competências necessárias em cada área de conhecimento, em cada etapa do processo de aprendizagem, para sua vida profissional e pessoal. Num sentido mais estrito, alguns docentes mais experientes começam a desempenhar novos papéis tanto em instituições educativas inovadoras como em formas de ensinar e de aprender mais abertas, informais, híbridas na educação continuada. A tutoria é uma orientação mais prática, dirigida a áreas de conhecimento específicas (como acontece nos cursos online) e que pode combinar-se com processos de orientação mais amplos, que envolvem carreira, competências e vida, que são os de mentoria. 22 Algumas formas de Mentoria na Educação Mentoria acadêmica e mentoria no desenvolvimento de competências pessoais e sociais: o foco é a formação integral do estudante, que passe não somente por questões acadêmicas e de conhecimento teórico e técnico, mas, competências pessoais e profissionais, a partir dos quatro pilares da Unesco - aprender a ser, a fazer, a conhecer e a conviver. Gerenciar a vida pessoal e profissional: é uma das competências que os estudantes precisam desenvolver, de acordo com as diretrizes atuais da Educação Básica. Devem conseguir refletir – em ambientes de confiança e liberdade - sobre seus desejos e objetivos, aprendendo a se organizar, estabelecer metas, planejar e perseguir com determinação, esforço, autoconfiança e persistência seus projetos presentes e futuros, assim como também a compreensão do mundo do trabalho e das profissões, seus impactos na sociedade, hoje no futuro. A mentoria acadêmica do docente:está centrada na aprendizagem criativa e ativa; de conteúdos trabalhados de forma invertida; na orientação de projetos significativos, e, quando possível, reais; na personalização da aprendizagem (itinerários diferentes, autonomia crescente), no desenho e acompanhamento das atividades colaborativas. A mentoria acadêmica tem o foco ampliado hoje na ênfase na aprendizagem com propósito (orientação de valores e competências pessoais e sociais). Esse trabalho é feito por todos os docentes, de forma ampla, pelos tutores quando orientam áreas mais específicas de conhecimento e por alguns profissionais mais experientes e que abordam a gestão da aprendizagem por competências pessoais e sociais de uma forma mais direta, individualmente ou em pequenos grupos. A mentoria nesse conceito mais amplo pode ser feita de forma mais formal, planejada, institucional e/ou informal, incentivando que mais profissionais de dentro e fora da instituição atuem como orientadores, de várias formas de docentes mais novos, de docentes orientando estudantes, ou de estudantes mais experientes realizando atividades de tutoria de colegas mais jovens. Hoje nas redes sociais há muitas comunidades de prática, onde quem tem um conhecimento mais consolidado o coloca a disposição do grupo e essas experiências são compartilhadas com todos ou com os que se interessam mais. Há também as comunidades de 23 aprendizagem em que todos os envolvidos contribuem para o desenvolvimento de projetos interessantes de aprendizagem e onde todos constroem em parceria esse projeto, aproveitando as diversas competências dos participantes. A mentoria pode ser mais por turma e a mentoria mais personalizada (alunos escolhem seu mentor, que o ajuda a fazer a integração entre aprendizagem e vida). A mentoria/tutoria por turma é mais econômica para a instituição; a mentoria é mais cara, mas, será o caminho no médio prazo. Há tutorias também entre pares, onde alguns estudantes mais experientes são tutores de alunos mais iniciantes, sob supervisão de algum professor- mentor designado pela instituição de ensino. Assim como em todos os campos de serviços, há uma hibridização nos modelos de mentoria. Existem os totalmente presenciais, os híbridos (parcialmente presenciais e online) e os totalmente online. Com o expressivo avanço dos cursos online tem avançado a qualidade e importância das atividades dos tutores. Cuidam das questões acadêmicas e socioemocionais de forma cada vez mais ampla, que vão desde envolvendo o acolhimento, a manutenção de vínculos, a orientação de grupos, de projetos. Mentoria na formação docente e mentoria de professores que iniciam sua vida profissional - a mentoria é uma relação colaborativa temporária entre dois docentes, um dos quais, o mentor, é um professor mais experiente que acompanha a prática docente do professor iniciante, fornecendo-lhe feedback e compartilhando estratégias formativas. O projeto europeu Mentor foi concebido para encorajar e apoiar a implementação de mentoria entre professores, preparando professores, com experiência na respetiva profissão, para que se tornem mentores de professores em início de carreira e, por conseguinte, contribuam para o desenvolvimento profissional dos professores. É um programa desenvolvido em alguns países da Comunidade Europeia e se orienta para a mentoria de professores do ensino Fundamental. Outro programa interessante é o de Mentoria de professores iniciantes na educação pública infantil feito a distância por docentes da Faculdade de Educação da Universidade Federal de São Carlos. Mentoria entre alunos - programas de mentoria por pares consistem na orientação e suporte proporcionados por estudantes mais experientes aos novos colegas ou a alunos que apresentam dificuldades. Esse suporte visa o seu desenvolvimento profissional (e.g., desenvolvimento de competências 24 académicas) e psicossocial (e.g., suporte emocional e psicológico). Os estudantes que orientam são alunos-tutores, que, por sua vez, são supervisionados por professores-mentores da Instituição. Exemplos: Programas da Universidade do Minho em Portugal, das Universidades de Granada, Sevilha, Madri, Burgos, Múrcia e Cádiz na Espanha. Outros exemplos de programas pioneiros de mentoria entre alunos. Programa de Mentores de Pares da Universidade de New Brunswick; Programa de Parceria de Assistência de Mentoring da Universidade John Hopkins (Baltimore, Maryland), Programa de Mentores de Estudantes da Faculdade da Universidade Politécnica da Califórnia (Califórnia). A Drake University (Des Moines, Iowa) designa mentores para grupos de novos alunos (grupos entre cinco e dez). O programa trabalha com os alunos que no verão fazem a pré-inscrição para ingressar na universidade. Aproveitam o início do curso para realizar um seminário para recebê-los e apresentá-los à nova instituição. Mentoria na Escola e mentoria fora da Escola - há instituições que integram mentores acadêmicos com mentores profissionais, em currículos realizados em instituições educacionais e empresas ou outras organizações sociais. Destaco o projeto pioneiro da Engenharia Química da USP, que existe desde o começo da década de 90. A partir do terceiro ano do curso, é oferecido no formato Cooperativo em módulos quadrimestrais: Cinco módulos acadêmicos alternam‐se com quatro módulos de estágio. Nos módulos acadêmicos, a ênfase é na permanência do aluno dentro da universidade. Já nos módulos de estágio, são reservados quadrimestres na grade curricular para o exercício, por parte dos alunos, de atividades remuneradas em empresas e instituições, no Brasil e no exterior, que mantêm convênios com a Escola Politécnica. Desse modo, o aluno pode se dedicar exclusivamente às atividades acadêmicas e ao estágio. Cada programa de estágio é aprovado pela Escola para verificação da sua adequação ao projeto pedagógico. Durante o módulo de estágio, o estudante é supervisionado e avaliado pela empresa/instituição, e, também, pela Escola, por meio de relatórios e acompanhamento por um professor/mentor. A educação cooperativa estimula e valoriza o contato do aluno com a prática profissional, possibilitando uma formação teórica e aplicada em engenharia química. 25 Mentoria para acelerar a inovação educativa - todas as escolas e universidades estão se transformando de forma mais rápida ou com mais lentidão, mas todas estão buscando modelos que façam sentido para o mundo de hoje e de amanhã. Isto está abrindo um horizonte riquíssimo de possibilidades profissionais de mentoria para ajudar a desenhar esses modelos de transformação, para acelerar os processos de mudança, para orientar esses processos, para alinhar os diferentes grupos com visões diferentes, para acompanhar de perto gestores, docentes e organizações parceiras, para que a visão se transforme mais rapidamente em ação. A mentoria na educação é uma tendência que faz sentido, vai ser cada vez mais significativa, diversificada e de importância crescente na educação formal e informal e em novos nichos ainda pouco explorados. Mentoria não é um tema novo, mas a ênfase e possibilidades de atuação hoje começam a ampliar-se de forma significativa. Mentoria faz sentido como o papel mais relevante na docência tanto na forma mais ampla como mais específica. É um tema que precisa ser mais discutido na comunidade acadêmica, divulgando as melhores práticas, as novas oportunidades que o processo de transformação de escolas e universidades está trazendo para a Educação formal e informal, presencial e online em todas as etapas e níveis. É um grande campo profissional que se desenha, amplia e consolida. Sugestões de leituras ALEXANDRE, R. Mentoria para professores(as) iniciantes na Educação Infantil: Uma experiência na formação online – UFSCar Disponível em https://educere.bruc.com.br/arquivo/pdf2017/27204_14191.pdfCASADO-MUÑOZ, R.; LEZCANO-BARBERO, F.; COLOMER-FELIU, J. Diez pasos clave en el desarrollo de un programa de mentoría universitaria para estudiantes de nuevo ingreso. Revista Electrónica Educare, v. 19, n. 2, p. 155-180, 2015. CRISP, G.; CRUZ, I. Mentoring college students: a critical review of the literature between 1990 and 2007. Research in Higher Education, v. 50, n. 6, p. 525-545, 2009. MACIAS, A. et alii. Innovación en la Orientación Universitaria. La mentoría https://educere.bruc.com.br/arquivo/pdf2017/27204_14191.pdf 26 como respuesta. Contextos Educativos, v. 6-7, p. 87-11, 2003-2004. Disponível em: https://dialnet.unirioja.es/descarga/articulo/1049470.pdf SILVA, A. Coaching Acadêmico: Desenvolvimento de competências para a conquista de resultados. In: SILVA, A. (Org.). Coaching e suas aplicações. Jundiai: Paco Editorial, 2018. p.103- 118. SILVA, E.; FREIRE, T. Programas de mentoria e promoção do desenvolvimento positivo de adolescentes - Universidade do Minho. Revista Portuguesa de Educação, v. 27, n. 1, pp. 157- 176, 2014. Disponível em: https://revistas.rcaap.pt/rpe/article/view/4302 SMITH-RUIG, T. Exploring the links between mentoring and work- integrated learning. Higher Education Research & Development, v. 33, n. 4, p. 769-782, 2014. https://dialnet.unirioja.es/descarga/articulo/1049470.pdf https://revistas.rcaap.pt/rpe/article/view/4302 27 2. Percepção dos professores sobre formação continuada quando o assunto é educação híbrida e metodologias ativas Claudiana Ribeiro dos Santos Andrade* Diego Kenji de Almeida Marihama** 28 Introdução Refletir a formação de professores, sob a perspectiva das demandas e dos desafios dos professores em aulas remotas, em tempos de isolamento social, apresentou-se como uma realidade educacional emergente, no sentido de ressignificar a formação continuada e o desenvolvimento de competências tecnológicas, motivadas por um processo de aprendizagem ativa, interativa, dinâmica, flexível e híbrida. Cabe ressaltar que, a partir das experiências com a Covid-19 e o distanciamento social, no contexto dos novos processos sociais e educacionais, às práticas pedagógicas tradicionais e as sequências didáticas que até então, eram “bem acomodadas” no ensino presencial; tornou-se um entrave quando houve a transposição para as aulas remotas, pois não cabiam dentro dos espaços digitais. No processo, a formação continuada é o ponto de partida para desenvolver novas práticas e metodologias que contribuam para a transformação dos docentes e criem neles um projeto de vida que atenda às suas necessidades pessoais e profissionais, criando um elo de ligação com a nova geração e suas aspirações. Dessa forma, encontram-se três importantes atores, dentro do processo de ensino e aprendizagem, que são condições necessárias para um processo de inovação e transformação da educação: a gestão escolar e a equipe pedagógica como promotoras e motivadoras da formação continuada; os professores e educadores como articuladores e mediadores do processo formativo e os alunos como protagonistas do próprio conhecimento. Assim, é necessária uma releitura da educação e dos processos formativos, visto que o novo formato de educação e de mundo, torna-se cada vez mais fluido na mobilidade e conectividade, através de uma educação híbrida, mesclada e misturada em diversos espaços, tempos e públicos. Fazendo parte das transformações sociais e educacionais. Nesta perspectiva, a gestão escolar e a equipe pedagógica, é o núcleo de promoção ao desenvolvimento de competências, no âmbito da formação de professores e no processo de mentoria, oportunizando novas alternativas de ensinar e aprender por meio das metodologias ativas, modelos híbridos, do conhecimento e domínio das ferramentas 29 tecnológicas. O que destaca Moran (2021), quando apresentou os avanços e desafios na educação híbrida: O ensino híbrido é uma modalidade pedagógica que mistura possibilidades de combinar atividades em sala de aula com atividades em espaços digitais para oferecer as melhores experiências de aprendizagem a cada estudante. No Ensino Híbrido o foco está mais na ação dos docentes. O conceito de Educação híbrida é mais abrangente, porque olha para as combinações possíveis de todos os envolvidos no processo de ensino e de aprendizagem (visão ecossistêmica do híbrido). Hoje podemos redesenhar as melhores combinações possíveis na integração de espaços, tempos, metodologias, tutoria para oferecer as melhores experiências de aprendizagem a cada estudante de acordo com suas necessidades e possibilidades. (s/n) Ibidem (2021) considerou que na educação acontecem vários tipos de mistura: (...) blended ou educação híbrida: de saberes e valores, quando integramos várias áreas de conhecimento (no modelo disciplinar ou não); mistura de metodologias, com desafios, atividades, projetos, games, grupais e individuais, colaborativos e personalizados. Também falamos de tecnologias híbridas, cada vez mais “inteligentes”, que integram as atividades da sala de aula com as digitais, as presenciais com as virtuais. Híbrido também pode sinalizar um currículo mais flexível, que planeje o que é básico e fundamental para todos e que permita, ao mesmo tempo, caminhos personalizados para atender às necessidades de cada aluno. O híbrido também abrange a articulação de processos mais formais de ensino e aprendizagem com os informais, de educação aberta e em rede. Híbrido implica em misturar e integrar áreas diferentes, profissionais diferentes e alunos diferentes, em espaços e tempos diferentes. (s/n) Neste sentido, Perrenoud (2000), considerou que, a prática docente tem que refletir sobre o mundo, os professores necessitam ser reconhecidos e capacitados para a nova realidade social, tecnológica e educacional. Considerando, o perfil de alunos, dos professores e das interfaces produzidas entre as relações interpessoais, recursos tecnológicos e o conhecimento. Falar em educação, ensino e aprendizagem, é combinar os diferentes espaços, misturar e mesclar recursos, metodologias e percepções, em um ecossistema mais aberto e criativo, de práticas flexíveis e ativas, propiciando momentos de provocações e ideias que 30 podem ser trabalhadas colaborativamente e individualmente, a partir de diferentes dimensões. O que vai de encontro com as considerações de Moran (2018), quando destaca: Algumas dimensões estão ficando claras na educação formal: 1) o modelo blended, semipresencial, misturado, em que nos reunimos de várias formas – física e digital – em grupos e momentos diferentes, de acordo com a necessidade, com muita flexibilidade, sem os horários rígidos e planejamento engessado; 2) Metodologias ativas: aprendemos melhor através de práticas, atividades, jogos, projetos relevantes do que da forma convencional, combinando colaboração (aprender juntos) e personalização (incentivar e gerenciar os percursos individuais) e 3) O modelo online com uma mistura de colaboração e personalização, em tempo real e através de multiplataformas digitais móveis. Cada aluno desenvolve um percurso mais individual e participa em determinados momentos de atividades de grupo. Uma parte da orientação será via sistema (plataformas adaptativas com roteiros semiestruturados, que respondem as questões mais previsíveis) e a principal será feita por professores e tutores especialistas, que orientarão os alunos nas questões mais difíceis e profundas. (s/n) Ibidem (2018), ressaltou as combinações da aprendizagem ativa e híbrida com diferentes recursos, enfatizando o papel direto, participativo e reflexivo dos alunos em todos os momentos do processo de ensino e aprendizagem. Que são instigados pelos professores: a experimentar novos métodos, (re)desenhar caminhos, (re)construir e modificar a realidade; utilizando-se do compartilhamentode materiais, técnicas e recursos tecnológicos que compõem o processo ativo. Destacando: A ênfase na palavra ativa precisa sempre estar associada à aprendizagem reflexiva, para tornar visíveis os processos, os conhecimentos e as competências do que estamos aprendendo com cada atividade. Aí que o bom professor, orientador, mentor é decisivo e a tecnologia digital, também, porque visibiliza todo o processo de aprendizagem de cada estudante para todos. (s/n) Segundo Moran (2019), a mentoria é uma prática cada vez mais pertencente à função do professor, quando o considera mediador e orientador dos caminhos “(...) mais interessantes para aprender, das estratégias que fazem mais sentido para cada estudante e para os diversos grupos”. (s/n) 31 O mesmo autor (2019), destacou como uma das atribuições do professor, ser um tutor: “(...) que ajudará nas dúvidas mais significativas (as básicas a tecnologia o fará), a problematizar, a trazer outros pontos de vista. O papel mais novo e relevante que se desenha a partir de agora para o docente é o de mentor”. (s/n) Assim, percebeu-se a necessidade da mentoria na formação de professores, como um processo de acompanhamento e trocas de experiências entre o mentor e o aprendiz, na teoria e prática, no desenvolvimento de competências docentes, sob o olhar do professor mentor. O que foi apresentado por Moran (2019), sobre as formas de mentoria na educação Mentoria acadêmica e mentoria no desenvolvimento de competências pessoais e sociais. O foco é a formação integral do estudante, que passe não somente por questões acadêmicas e de conhecimento teórico e técnico, mas, competências pessoais e profissionais, a partir dos quatro pilares da Unesco - aprender a ser, a fazer, a conhecer e a conviver. (s/n) Essa forma de mentoria tem por objetivo gerenciar a vida pessoal e profissional, tendo como princípio um ambiente de confiança e liberdade, que ensine a se “(...) organizar, estabelecer metas, planejar e perseguir com determinação, esforço, autoconfiança e persistência seus projetos presentes e futuros, assim como também a compreensão do mundo do trabalho e das profissões, seus impactos na sociedade, hoje no futuro”. (s/n) *Mentoria na formação docente e mentoria de professores que iniciam sua vida profissional, segundo Moran (2019), é uma mentoria realizada de forma: “(...) colaborativa temporária entre dois docentes, um dos quais, o mentor, é um professor mais experiente que acompanha a prática docente do professor iniciante, fornecendo-lhe feedback e compartilhando estratégias formativas”. *Mentoria para acelerar a inovação educativa, Todas as escolas e universidades estão se transformando de forma mais rápida ou com mais lentidão, mas todas estão buscando modelos que façam sentido para o mundo de hoje e de amanhã. Isto está abrindo um horizonte riquíssimo de possibilidades profissionais de mentoria para ajudar a desenhar esses modelos de transformação, para acelerar os processos de mudança, para orientar esses processos, para alinhar os 32 diferentes grupos com visões diferentes, para acompanhar de perto gestores, docentes e organizações parceiras, para que a visão se transforma mais rapidamente em ação. A mentoria na educação é uma tendência que faz sentido, vai ser cada vez mais significativa, diversificada e de importância crescente na educação formal e informal e em novos nichos ainda pouco explorados (MORAN, 2019, s/n). Diante do apresentado, é possível repensar o engajamento discente como um fator determinante no processo de ensino e aprendizagem, considerando o desafio da adesão voluntária dos alunos pelos estudos. Ressaltando as práticas ativas e significativas, como possibilidade de interação e aproximação dos alunos. Assim, esta pesquisa procurou por meio de um questionário criado no Google Forms, analisar as percepções dos professores e evidenciou-se que 68% (sessenta e oito por cento) dos respondentes, veem as metodologias ativas como indispensáveis em suas práticas e 92% (noventa e dois por cento) convivem com professores que trabalham com as metodologias ativas. O que será apresentado com mais informações nos próximos tópicos. Inegavelmente, os dados revelam que as metodologias ativas já fazem parte do cotidiano dos professores, consequentemente do cenário educacional, destacando as discussões que ganham subsídios com a Base Nacional Comum Curricular (BNCC), que elucida a construção de um pensamento crítico e o projeto de vida dos alunos ao longo da educação básica, como um dos aspectos centrais do processo formativo. No contexto, as metodologias ativas contribuem de forma direta para o desenvolvimento da criticidade, que segundo Berbel (2011): As metodologias ativas têm o potencial de despertar a curiosidade, à medida que os alunos se inserem na teorização e trazem elementos novos, ainda não considerados nas aulas ou na própria perspectiva do professor. Quando acatadas e analisadas as contribuições dos alunos, valorizando- as, são estimulados os sentimentos de engajamento, percepção de competência e de pertencimento, além da persistência nos estudos, entre outras. Com a intenção de fazer a aproximação entre estes estudos voltados para a promoção da autonomia do aluno e o potencial da área pedagógica na mesma direção [...]. (p. 28) Assim, é relevante elucidar a potencialidade das metodologias ativas no processo de ensino e aprendizagem; visto que propiciam uma 33 formação pautada na autonomia e no protagonismo dos alunos. Salientando, o contexto pandêmico que colocou em pauta as necessidades de uma educação menos engessada, ao tempo que também escancarou a tecnologia como indissociável da escola. Partindo dessa premissa, os modelos híbridos que apresentam metodologias flexíveis pautadas na mediação do professor e o desenvolvimento do aluno, se consolidam como elemento fundamental para atender às demandas da sala de aula e dos ambientes virtuais de aprendizagem. Na obra “Ensino híbrido: personalização e tecnologia da educação”, organizada por Bacich, Tanzi Neto e Trevisani (2015), apresenta discussões fundamentais, com relação a formação de professores para utilização do ensino híbrido, visto que é, a partir da qualidade da formação e a transformação dos docentes, que a realidade pode ser inovada. Dessa forma, as novas interfaces tecnológicas apresentadas pelos modelos híbridos, ainda causam estranhamentos e recusa por parte de alguns professores, sobretudo, aos que têm resistência em deixar de trabalhar com metodologias tradicionais. Nesse sentido, ainda de acordo com a referida obra, as instituições deveriam intervir no sentido de deixar claro para os professores, como as tecnologias podem ser aliadas, podendo auxiliar na melhora do desempenho, otimizando o planejamento e a condução das aulas, além de aproximar professores e alunos. Diante do apresentado, é possível repensar a formação de professores e da equipe pedagógica, como um processo de mudanças de atitudes e transformação da realidade, considerando as metodologias ativas e modelos híbridos, desvinculando a ideia tradicional de transmissão e recepção, com espaços de trocas de ideias, pesquisas e inspirações; mesclando espaços, atividades, tempos, ressignificando a presencialidade e as formas de interação (síncronas e assíncronas), o que foi retratado nessa introdução e que será apresentado nos resultados dessa pesquisa. 34 Metodologia No presente estudo considerou-se apropriado a utilização do método qualitativo, a partir de Rangel, Nascimento Rodrigues e Mocarzel (2018), enfatiza que: (...) as análises qualitativas e as quantitativas, associadas e intercomplementares nas interpretações e argumentos que se formulam sobre os achados da investigação, o que significa que as quantidades, ou frequências, ou correlações de causa-efeito,ou resultados de experimentos podem dar suporte às análises interpretativas e à construção de argumentos ( p.10). Nesta perspectiva, as análises qualitativas se constituem, segundo Ludke e André (1986), a partir de cinco características básicas: 1) o ambiente natural como procedência de dados e o pesquisador como imprescindível instrumento; 2) dados coletados são predominantemente descritivos, 3) a preocupação com o processo é muito maior do que com o produto; 4) os significados que os respondentes dão às coisas e a vida é a essência da pesquisa; 5) a análise dos dados tende a seguir um produto indutivo. Dessa forma, essa investigação contou com um questionário construído na plataforma Google Forms, enviados aos professores de diferentes segmentos, de instituições públicas e privadas, da cidade de Senhor do Bonfim - Bahia, contando com 25 respondentes, que apresentaram suas percepções sobre educação híbrida e metodologias ativas na formação de professores. A escolha dos professores foi aleatória e os critérios foram de acessibilidade e disponibilidade para responder ao questionário online, uma vez que a investigação seguiu os protocolos de segurança e as recomendações do isolamento social, sendo cumpridas as determinações legais. No contexto, todos os contatos e o preenchimento dos questionários foram realizados de forma remota, por meio Whatsapp e do Google Forms, redes sociais e contatos telefônicos com coordenadores e gestores educacionais que nos facilitaram o acesso ao corpo docente, onde foram apresentados os objetivos da pesquisa e esclarecimentos sobre: a não divulgados dos nomes dos participantes e respectivamente as instituições de ensino, todo o material coletado será utilizado apenas 35 com o propósito da pesquisa e nenhum dos professores terão quaisquer tipo de gastos financeiros com a pesquisa. Assim, foram retratadas as seguintes perguntas: 1) Gênero; 2) Grau de escolaridade; 3) As instituições em que trabalham (público/ privado); 4) Modalidade (presencial, semipresencial e EaD); 5) Segmento e/ou nível (Educação Infantil, Ensino Fundamental I, Ensino Fundamental II, Ensino Médio, Cursos Técnicos, Ensino Superior) 6) Como você avalia a educação no Brasil? 7) Você utiliza alguma ferramenta tecnológica em suas práticas? Qual? Como? 8) No seu convívio profissional existem professores que trabalham com as metodologias ativas? 9) Existem momentos na formação de professores que trabalham experiências com metodologias ativas e modelos híbridos? Nessa perspectiva, os dados foram analisados à luz de Bardin (2009), sob a análise de conteúdo e foi conduzida em três fases: “1. A pré- análise; 2. A exploração do material; e, por fim, 3. O tratamento dos resultados: a inferência e a interpretação” (BARDIN, 2009, p.121). Com a adoção dessas três fases da Análise de Conteúdo, esta pesquisa foi conduzida selecionando descrições sistemáticas, qualitativas, buscando reinterpretar os dados, mensagens e informações obtidas sobre a temática. Quanto aos gráficos, foram produzidos pelo próprio Google Forms e serão apresentados a seguir. 36 Resultados Ao analisar os dados, verificou-se que a maioria dos Professores Respondentes (PRE) são do sexo feminino, conforme figura a seguir: Figura 2.1: Gênero dos respondentes Fonte: (do próprio autor) Diante dos dados, é relevante considerar que a história da educação tem fortes relações com o sexo feminino desde a inserção das mulheres no mercado de trabalho e a expansão das escolas. Conforme foi ressaltado por Telles (2014, p.12), quando destacou que: As mulheres não somente reivindicaram como também forçaram sua inserção nesse campo profissional e conseguiram ocupá-lo em poucas décadas. Contudo, essa ocupação é resultado de uma série de fatores externos, como a necessidade de mão de obra, a queda do poder aquisitivo da classe média e a expansão do número de escolas, dentre outras questões. Outro fator analisado nesta pesquisa, foi o grau de escolaridade dos respondentes, onde a maioria tem especialização e percebeu-se a existência de um equilíbrio entre a formação dos professores, ressaltando: os segmentos e níveis de ensino (ver figura a seguir). 37 Figura 2.2: Grau de escolaridade dos respondentes. Fonte: (do próprio autor) Quanto ao grau de escolaridade dos professores, verificou-se um certo equilíbrio entre as instituições públicas e privadas, considerando a margem de 0,8% para as escolas privadas. Conforme figura a seguir: Figura 2.3: Rede de ensino em que trabalham os respondentes. Fonte: (do próprio autor) Respectivamente, analisou-se a modalidade em que trabalham os professores e verificou-se que 80% estão no ensino presencial e 12% concomitantemente trabalhando na EaD. Conforme figura a seguir: 38 Figura 2.4: Modalidade em que atuam. Fonte: (do próprio autor) Outro dado levantado nesta pesquisa, foi conhecer os segmentos em que os professores trabalhavam e verificou-se que a maioria dos respondentes são do Ensino Fundamental II. Conforme figura a seguir: Figura 2.5: Segmento em que atuam. Fonte: (do próprio autor) Diante dos dados sociodemográficos, percebeu-se que os professores em sua maioria: é do sexo feminino, tem especialização, estão num equilibrio entre o ensino público e privado, são ensino presencial e do Fundamental II. Conforme apresentado nos dados anteriores. 39 Percepção dos Professores Ao analisar percepções dos PRE, sobre como avaliam a educação no Brasil, verificou-se nos discursos as deficiências do sistema educacional brasileiro. O que foi apresentado pelo PRE20, que: “A rede pública está longe de inovar. É necessário investir em políticas públicas voltadas à capacitação dos professores desde a graduação como investir em infraestrutura. O Brasil precisa entender a necessidade de se investir verdadeiramente na educação”. E reforçado pelo PRE18, que a educação tem necessidades urgentes: “(...) para atualizações e novas políticas públicas que interajam com as realidades educacionais na diversidade em nosso país. A pandemia mexeu com realidades práticas e que agora estão em constante avaliação e observação de todos”. Respectivamente, os entrevistados apresentaram outras percepções que fizeram parte do escopo desta investigação: Quadro 2.1 Percepção dos respondentes. PRE1 - Um projeto nacional deficiente, sem preocupação com planejamentos para longo prazo e voltado para indicadores estatísticos que não necessariamente mensuram a aprendizagem. PRE4 - Com 1 quilômetro de tamanho e 1 centímetro de profundidade PRE8 - Em evolução, transformação, porém, sem ainda ter uma base sólida. PRE10 - Precária. Desvalorizada PRE12 - Ainda em processo de mudanças significativas. PRE14 - Poucos avanços na qualidade do ensino. PRE20 - A educação no Brasil necessita de mais investimento para as pesquisas e projetos, ela vem evoluindo mais o processo é lento. PRE22 - Boa, porém necessita de um bom investimento dos governantes para que possamos desenvolver melhor o aprendizado dos nossos alunos e também priorizando, reconhecendo e remunerando nós Professores. PRE23 - Necessitando ser levado a sério Fonte: (do próprio autor) 40 Outro fator analisado nesta pesquisa, são as ferramentas tecnológicas mais utilizadas pelos professores. E verificou-se que são utilizadas diferentes ferramentas tecnológicas, assim apresentadas pelo PRE13 os seguintes recursos: “Uso murais virtuais (Padlet), jogos interativos criados como quiz (worwall), abordar assuntos/verificar (Mentimeter), vídeos no Porto online, apresentação no Jamboard, kahoot”. O PRE19, afirmou que utiliza a plataforma do Google entre outros recursos: (...) docs, forms, apresentações, drive e meet; Canva; Pixabay; Giphy; Aplicativos: Pinterest, KinerMaster, Mobizen e CapCut. Recursos paraedição de atividades para alunos e familiares, assistência em atividades de apoio a outros setores da educação, planejamento das aulas entre outras atividades. Observação: aprendendo a usar outras ferramentas como as orientações de cursos online. (mentimeter, programa ediLIM e outros). Outra informação levantada na coleta de dados, foram as ferramentas tecnológicas utilizadas pelos professores nas aulas presenciais e/ou online, assim apresentadas no quadro a seguir: Quadro 2.2: Ferramentas utilizadas pelos respondentes. PRE1 - Kahoot, Padlet, Google Forms, Loom, mentimeter, wordwall, scrumblr, quizlet, canva, socrative, edpuzzle. PRE5 - Fiz uso de robótica e de programação de jogos digitais. Em ambos casos estabeleci diálogo com a linguagem regional popular. Em robótica, usei músicas populares para guiar um robô e, na programação, usei o Scratch para os alunos desenvolver jogos digitais com músicas regionais. PRE7 - Sim, pouco. Aparelho de DVD PRE9 - Sim. Padlet, jamboard, Mentimenter, Canva, vídeos, filmes, Brain Breakes e outros. Pré-aula, Aula e Pós-Aula PRE12 - Sim. Utilizo basicamente todas as ferramentas do G-Suit ou atual Google Work Space entre outras ferramentas engajadoras como Nearpod, Khan Academy, Padlet, etc. 41 PRE15 - Sim, atualmente uso alguns aplicativos, recursos do Google classroom, faço uso do Zoom, mas ainda estou me adaptando a essas ferramentas PRE18 - Sim. Vídeo, datashow,aulas na plataforma digital,wathapp. PRE20 - Sim. Aplicativos Zoom, Google meet, etc. Bem como ferramentas de gamificação. PRE24 - Utilizo várias ferramentas bem como algumas metodologias Ativas, como Sala de Aula invertida e Aprendizagem baseada em Projetos. Fonte: (do próprio autor) Os dados indicam que a maior parte dos respondentes utilizam ferramentas tecnológicas em suas práticas e percebem a importância da tecnologia na interação com os alunos, ressaltando: as aulas invertidas, o processo de ensino e aprendizagem baseado em projetos, como modelos fundamentais. Conforme apresentado na figura a seguir, onde 68% dos respondentes perceberam as metodologias ativas e modelos híbridos, indispensáveis em suas práticas de sala de aulas: Figura 2.6: Práticas pedagógicas (metodologias ativas e ensino híbrido). Fonte (próprio autor) 42 De acordo com os dados, procurou-se saber as percepções dos professores que definem as metodologias ativas como medianas ou dispensáveis em suas práticas de sala de aulas: Quadro 2.3 Metodologias ativas. PRE14 - Infelizmente o tempo da sala de aula é muito pequeno. Realizar um trabalho com metodologias requer um espaço maior de aula e recursos que minha escola não dispõe. Hoje, temos dificuldades de sair da sala e ir para o pátio (fomos até proibidos). PRE19 – Não tenho muita familiaridade com o método, mas procuro organizar minha aula em duas partes: 1) exposição de conteúdos pelo professor (25 minutos); 2) discussão com os alunos sobre a temática (15 minutos). PRE07 – Vejo as metodologias ativas como no mundo das Ideias na escola pública, onde temos falta de tudo, como: papel, espaço na sala de aula para se trabalhar em grupo e sair das aulas tradicionais. Pois, o número elevado de alunos gera indisciplina e falta de um trabalho mais personalizado pelo professor PRE 21 – Tenho pouco conhecimento de metodologias ativas. No tempo de faculdade não tive contato com o método. No entanto, vejo que atualmente, muito se tem falado de práticas ativas. Principalmente, nesse tempo de pandemia em que as escolas estão entre o presencial e online. PRE16 – Muito se fala em metodologias ativas em minha escola, mas na realidade quando saímos do tradicional, é visto pela supervisão e pelos alunos como uma sala de aula indisciplinada, sem resultados e enrolação. Fonte (próprio autor) No contexto, percebeu-se por meio dos discursos, que os professores necessitam de um conhecimento mais aprofundado sobre as metodologias ativas e modelos híbridos, bem como trazer para a formação de professores: vivências de aprendizagens ativas e híbridas, na perspectiva da relação professor e aluno, na coletividade e no 43 desenvolvimento de competências tecnológicas. O que vai ao encontro de Souza e Borges (2012, p.05), que desenha as competências docentes em ambientes virtuais e presenciais, sob quatro aspectos: Competência Pedagógica: que envolve o aspecto pedagógico, os métodos de ensino-aprendizagem, que contribuem para o aprendizado do grupo e individual. Competências Sócio-Afetivas: que envolvem os aspectos interpessoais, a comunicação individual, a criatividade e a socialização contribuindo para um ambiente agradável. Competência Tecnológica: que envolve os aspectos técnicos do ambiente, o domínio das tecnologias de informação a orientação técnica visando um melhor aproveitamento do AVAs. Competência Auto-avaliativa: que envolve a compreensão do tutor sob sua própria atuação buscando a análise e a melhoria de seu trabalho. Durante a pesquisa, foi possível analisar se há no convívio profissional: professores que trabalham com metodologias ativas. E verificou- se que 92% afirmaram que existem alguns professores. Conforme figura a seguir: Figura 2.7: Práticas com metodologias ativas. Fonte (próprio autor) A despeito das experiências com metodologias ativas e modelos híbridos, em formação de professores, verificou-se por meio das percepções dos respondentes, que existem algumas discussões, mas necessitam de um apoio da escola para as práticas de sala de aula (ver figura a seguir). 44 Quadro 2.4: Experiências com metodologias ativas e modelos híbridos na formação de professores. PRE1 - O sistema educacional deveria entregar para a sociedade seres humanos capazes de buscar informação, transformá-la em conhecimento, criticar a realidade, propor soluções aos problemas que encontra, enquanto age de forma a respeitar e preservar o pacto civilizatório existente. Nem as universidades conseguem entregar tudo isso. A vivência de um sistema educacional consistente, que permita a ação sobre o objeto e a ativa colaboração entre os indivíduos garantiria isso. Como sempre defendeu Reuven Feuerstein, todo mundo aprende, desde que saiba como fazer isso. No entanto, ao visualizar as reuniões semanais, encontramos pautas burocráticas de prazos, discussões e mensagens irrelevantes e sem nenhum contexto e poucas trocas de experiências. PRE6 - Procuro fazer um trabalho que dê significado aos alunos, a partir do trabalho em grupo, das discussões em sala de aula e fugindo do método caduco enraizado na escola. As reuniões pedagógicas (módulos), no discurso, são muito bonitas e favoráveis às metodologias ativas e modelos híbridos. No entanto, na prática, pouco se tem apoio para trabalhar com outras práticas. PRE24 - Contribuem quando acompanhada de recursos, motivação para o educador e apoio institucional. Em alguns lugares, por exemplo, se o professor desfizer as filas da sala de aula, recebe reclamação dos gestores. O que é ativo aí é a opressão. PRE19 - A transformação não depende unicamente das metodologias ativas. Está na formação e engajamento dos professores e envolvimento dos alunos. No entanto, o seu uso, faz diferença. É o que tentamos colocar na cabeça da supervisão e dos professores. PRE22 - Sim. As metodologias ativas, movimentam as práticas tradicionais, deixando os alunos como protagonistas da trajetória estudantil e o professor como o mediador dessa construção em conjunto. Uma transformação que influencia todos ao redor, seguindo sempre a realidade de cada comunidade escolar. 45 PRE15 - É preciso que a Educação esteja cada vez mais voltada à construção da autonomia do sujeito, e esse é um dos papéis centrais das metodologias ativas, atreladas ao caráter investigativo e científico da educação. PRE8 - A formação de professoresdeve contribuir com a manutenção das práticas inovadoras. No entanto, necessita de um processo de formação contínuo e subsídios para que as teorias sejam concretamente desenvolvidas na sala de aula. Vejo um abismo entre teoria e prática, conteúdo e tempo, planejamento e aulas dadas. Fonte (próprio autor) Assim, ao analisar os discursos, percebeu-se o papel fundamental da formação de professores e da mentoria, como um trabalho dirigido para mobilizar e transcender a teoria. O que vai ao encontro de Moran (2019, s/n), quando conceitua a mentoria: É a prática de ajudar ou de aconselhar uma pessoa menos experiente, durante um período de tempo. Sua finalidade é apoiar e incentivar as pessoas a melhorar seu próprio aprendizado para maximizar seu potencial, desenvolver suas habilidades e melhorar seus desempenhos para se tornarem quem desejam se tornar Ibidem, destacou que a mentoria é uma prática próspera no mundo profissional e que vem sendo trabalhada nas instituições de ensino, por meio do projeto de vida e na formação de professores como processo de desenvolvimento de competências. O que é entendido por Moran (2019, s/n), que os professores serão: (...) cada vez mais mentores para que os estudantes consigam desenvolver as competências necessárias em cada área de conhecimento, em cada etapa do processo de aprendizagem, para sua vida profissional e pessoal. Num sentido mais estrito, alguns docentes mais experientes começam a desempenhar novos papéis tanto em instituições educativas inovadoras como em formas de ensinar e de aprender mais abertas, informais, híbridas na educação continuada. 46 Considerações finais A partir dos dados coletados, dos referenciais teóricos e das percepções dos respondentes, observou-se a necessidade da ressignificação nos espaços de formação continuada, considerando, em primeiro lugar, a capacitação e conscientização da equipe pedagógica, como promotores do desenvolvimento de competências e inspiradores do corpo docente para sua transformação (pessoal e coletiva), destacando: aprendizagem ativa, trocas de experiências entre os professores, autonomia, estudos e discussões dos resultados. O que é salientado por Santos e Campos e Marihama (2020), quando destacaram a importância das discussões em reuniões pedagógicas, como: (…) riqueza trazida pelos diálogos e trocas de experiências, onde o professor pode contextualizar para sua disciplina a experiência do outro colega (...) ajudam na comunicação e principalmente no espírito de coletividade entre os professores. Assegura ser momentos de acompanhamento e socialização das informações. (p.112-113) Nesta perspectiva, é importante destacar os desafios dos professores na gestão do tempo e a falta de recursos, formação continuada e a motivação do grupo, estudos e pesquisas sobre metodologias ativas e modelos híbridos (exemplos: aula invertida, rotação de estação, rotação de laboratório, rotação individual, aprendizagem baseada em projetos, aprendizagem combinada autodirigida, aprendizagem combinada de dentro para fora, aprendizagem combinada de fora para dentro, aprendizagem Combinada Suplementar, aprendizagem combinada baseada em domínio, etc). Outro fator relevante na formação de professores, é o desenvolvimento de competências e o uso de ferramentas tecnológicas na sala de aula, como: Kahoot, Padlet, Google Forms, Loom, mentimeter, wordwall, scrumblr, quizlet, canva, socrative, edpuzzle, entre outros recursos utilizados em sala de aula ou em ambientes virtuais. Por conseguinte, é importante considerar as percepções dos professores para desenvolver uma formação continuada, que atendam às suas necessidades e dos alunos, reforçando a aprendizagem ativa, mediação do professor, tecnologias digitais, as metodologias ativas e modelos híbridos, bem como o diálogo, estudos e pesquisas produzidas pelo coletivo dos professores. 47 Referências AUSUBEL, D.P., NOVAK, J.D. and HANESIAN, H. Educatiollal psychology: a cognitive view. (2' ed). Nova York, Holt, Rinehart and Winston, 1978. 733 p. BACICH, L.; TANZI NETO, A.; TREVISANI, F. M. (Org.). Ensino híbrido: personalização e tecnologia na educação. Porto Alegre: Penso, 2015. BERBEL, N. A. N. Semina: Ciências Sociais e Humanas, Londrina, v. 32, n. 1, p. 25-40, jan./jun. 2011 CUNHA, M. I. O bom professor e sua prática. 2 ed. São Paulo: Papirus, 1 992. 1 82p. MARIHAMA, D.K.A. Formação de professores em tempos de COVID- 19. In: LAMIM-GUEDES, V. (Org.) A educação na Covid-19: A voz docente. 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O objetivo deste capítulo é mostrar o docente utilizando de suas forças físicas e mentais, na busca por soluções “caminhando e fazendo o caminho”, indo à frente e conduzindo o conhecimento nestes tempos de pandemia Caminhante, são teus passos o caminho e nada mais. Caminhante, não há caminho faz-se o caminho ao andar. Ao andar se faz o caminho e ao voltar a vista atrás vê-se a senda que nunca se voltará a pisar. Caminhante, não há caminho, mas sulcos de espuma ao mar. (MACHADO, 2013, n.p). Em meio a este terremoto de acontecimentos, como vamosencontrar a Educação no Brasil? O que fazer para manter o controle dos conteúdos ensinados diante do inesperado? O que não estamos vendo? Os profissionais de Educação, professores, coordenadores e a direção das escolas já trabalham, faz algum tempo, com tecnologias de informação e comunicação. Entretanto, precisaram conciliar sua rotina, anterior à Pandemia, às novas tecnologias que favorecem o contato individual e coletivo com seus alunos, metodologias e mudanças de sua realidade, ao “exclusivamente virtual”. Este cenário exigiu capacitação em novos aplicativos e métodos no desenvolvimento das relações com seus alunos, com as famílias e a comunidade na qual a escola está inserida. Paralelamente a isto, os docentes foram surpreendidos com uma carga semanal extra, produzindo vídeos, os quais exigiam muitas vezes diversas edições, para corrigir ruídos e pontos a serem alterados para melhor compreensão dos conteúdos. Mas quais são os instrumentos com os quais os professores contam? Suas ferramentas são as Redes Sociais e aplicativos, como Zoom, Meet, Teams e outros, disponíveis através da Internet, os quais favoreceram o contato visual e deram apoio aos diálogos necessários, conectando a todos nas escolas, além das famílias e 51 da comunidade local. Neste percurso fomos tecendo redes que se entrelaçam fortalecendo nossos contatos e permitindo o contato, o diálogo, as avaliações, além de reuniões com as famílias. Todo professor constrói para cada turma, uma rede, e posta em um espaço, por exemplo o Classroom do Google, as tarefas, explicações e vídeos, que serão acessados pelos alunos que executam os trabalhos propostos e colocam suas respostas de volta no espaço da rede referente a sua turma. Estes trabalhos serão corrigidos, analisados e comentados pelo professor e tudo isso pode ser acompanhado pelos pais. Eis que se formam pequenas redes, interligadas pelo nó dessas redes que é o professor. Imaginemos um professor com quatro turmas. Mesmo que sejam turmas do mesmo nível escolar, existem as diferenças de acompanhamento e maturidade relativa às idades dos alunos, o professor deverá desenvolver trabalhos diferentes conforme a construção do conhecimento foi sendo feita em cada turma. Ou seja, Tecendo Redes. Os professores também produziram apostilas e encontros ao vivo, em Lives, com seus alunos, através de aplicativos novos em suas rotinas e ao mesmo tempo oferecendo semanalmente, dados de retorno e acompanhamento, às famílias, que por sua vez, precisam adaptar suas realidades trabalhistas às novas rotinas escolares de seus filhos. Algumas famílias, desavisadas do exaustivo trabalho executado pelos professores, não compreendiam e criticavam as aulas de 40 minutos em vídeo, comparando com as aulas do presencial que eram de 50 minutos. Estas informações, compreendemos agora, deveriam ter sido passadas para os pais logo no início da Pandemia, mas quem sabia? Por outro lado, o envolvimento dos responsáveis na orientação dos trabalhos de seus filhos, a serem executado em casa, serviu para que o estresse de todos aumentasse, pela falta de experiência destes no amparo aos conteúdos ministrados virtualmente, a seus próprios filhos, muitas das vezes por conta de não haver em casa capacitação suficiente para essa tarefa. Este é o cenário vivido por todos nós durante este colapso sanitário e político, que não tem data para terminar. 52 Aprendendo com a Crise Estamos vivendo um momento da Educação no qual as famílias, a comunidade onde a escola se encontra, os professores e os alunos, se unem na busca por manter o conhecimento avançando, numa luta intensa contra a Covid-19. Fomos pegos de surpresa. Ninguém imaginava em março de 2020, que um ano depois não teríamos sequer uma ideia de quando essa pandemia teria fim. Não houve planejamento para controle do contágio e no Brasil, um governo criminoso negou e ainda nega medidas de comprovação científica, para proteção do povo, como vacinas e equipamentos de proteção individual, além de oxigênio para suprir hospitais. Estamos despreparados e, ainda hoje, longe do básico necessário para estabilizar o contágio que continua crescendo. Segundo Perobelli (2020): De acordo com pesquisa do Instituto Crescer, 46% dos educadores não sabem avaliar se os alunos estão realmente aprendendo com as aulas online. Além disso, 57% sentem-se frustrados ao perceber que, por mais que se empenhem, poucos estudantes aproveitam os conteúdos por falta de infraestrutura. (PEROBELI, 2020, n.p) Entretanto, foi a rede pública que mais sofreu para adaptar-se às novas rotinas de todos. Segundo Araújo (2020), aproximadamente 6 milhões de alunos brasileiros não têm acesso à internet. Tabela abaixo: 53 Tabela 3.1: População sem acesso à internet em banda larga ou 3G/4G em seu domicílio. Fonte: (ARAÚJO, 2020, n.p) Neste mesmo artigo, Araújo (2020) traz dados colhidos pelo Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (IPEA), que mostram, dentro deste universo de estudantes, serem 5,8 milhões de alunos de instituições públicas, em sua maioria pessoas negras ou indígenas. Segundo o novo relatório da Unesco (2020), mais de 137 milhões de crianças e adolescentes da América Latina e do Caribe, estão fora da escola e só no Brasil segundo a PNAD: “(...) 4 milhões de estudantes do ensino fundamental (14,4%) estavam sem acesso a nenhuma atividade escolar em agosto de 2020” (UNESCO,2020, n.p). Os professores, no Brasil, buscam superar os desafios impostos pela pandemia, apesar de, segundo nos relata o site DW (2021), “Nenhum país do mundo lidou de forma tão ruim com a pandemia do novo coronavírus como o Brasil, segundo um estudo publicado nesta quinta- feira (28/01) por um instituto australiano” (DW, 2021, n.p.). A economia dos países foi muito afetada pela pandemia. A Educação e a Saúde vão necessitar muitos investimentos de todos no planeta, para estruturar sua volta ao “Normal”. Parece estarmos preparados para que não ocorram tantas perdas na aprendizagem de nossas crianças e jovens, como tem acontecido. No entanto, precisamos nos preparar para vencer as sequelas mentais do estresse que estão sendo vividos pelos profissionais de Educação, famílias e alunos. https://www.dw.com/pt-br/m%C3%A1-condu%C3%A7%C3%A3o-da-pandemia-est%C3%A1-passando-de-todos-os-limites/a-56359342 54 Docentes Frente à Realidade Todo este ambiente técnico-científico foi ligado e construído sob estresse, pressão e pelo dia a dia imprevisível, que até agora só é conhecido e compreendido em toda sua amplitude, pelo universo dos docentes, os quais foram compartilhando suas descobertas ao longo da realidade Covid-19, Diante das mudanças promovidas pelas tecnologias ao longo da história da humanidade, e especialmente dos impactos que o desenvolvimento das tecnologias de informação e comunicação (TIC) causaram na reconfiguração do processo de ensino e de aprendizagem da EaD, os papéis dos atores envolvidos nesse contexto foram revistos e, em certos casos, transformados, como, por exemplo, o papel discente (SOUZA; FRANCO; COSTA, 2016, p 103) Embora seja necessário levar em conta também as desigualdades sociais características das sociedades de classes, além da saúde com problemas administrativos sérios, constatamos que milhares de crianças ficaram sem acesso à Educação no Brasil desde março de 2020, criando uma grande dificuldade para famílias, independentemente de sua classe social. Os impactos desta crise sanitária na educação ainda não foram possíveis de se medir em toda sua amplitude, até porque devemos também considerar a formação desta grande rede conectada por múltiplas pequenas redes, se construiu, a partir de todo este trabalho unindo famílias, escola, comunidade, ou seja, ressignificando vidas, dando à vida um novo significado. Com este olhar devemos estruturar o futuroda Educação para ajudar a vencer esses preconceitos nas crianças e jovens, motivando a todos à solidariedade, para uma formação cooperativa, em todos os níveis, desde a Pré-Escola, Ensino Básico, Ensino Superior e pós- Graduação, enfrentando desafios e ofertando uma Educação orientada para a emancipação, preparando os indivíduos para o mundo. Mesmo os melhores sistemas falham em uma sociedade desigual. Este é certamente um projeto de longo prazo, o qual não pode ser tratado da noite para o dia. Independentemente de vivermos em países com economias fortes ou fracas, se houver desigualdades sistêmicas, elas se manifestarão durante as crises – matando aqueles que já são prejudicados 55 e vulneráveis (UNESCO, 2020-3). As tecnologias aliadas às metodologias, aprimoradas ou construídas, durante o repentino adoecimento planetário, são vividas e praticadas hoje, pavimentando a nova realidade da EaD, a qual está estreitamente associada a novos aplicativos virtuais os quais, para além de uma análise e ajuste dos fatos, surgiram e foram sendo combinados ao novo exercício docente. Segundo a Unesco (2020), é possível haver necessidade de ajustes que poderão estender-se por um longo tempo, talvez uma década, caso providências não sejam tomadas, tais como políticas públicas que tragam para as escolas financiamento para formação docente, melhores salários, maior tempo para tutoria fora do horário usual das aulas, devidamente remunerado e apoio material adicional além da nutrição, com o reforço da merenda escolar, reconhecendo que Educação e Saúde, andam de mãos dadas. Precisamos estar aparelhados para enfrentar o novo mundo pós- Covid, principalmente agora que as TDICs, novas metodologias pedagógicas mostraram sua fortaleza, ajudando aos docentes e discentes a enfrentar estes tempos turbulentos. Podemos afirmar que a Educação avançou e se transformou, em técnicas e métodos em apenas um ano, quase o mesmo percentual que progredimos nos últimos dez anos. Considerações finais É importante estudar todos os acontecimentos e informações que obtivemos na prática do Isolamento. Tudo o que vivenciamos durante esta Pandemia e aprendemos no exercício da resiliência, compaixão, solidariedade e força psicológica experimentada. Para dar sequência e continuidade a este trabalho hercúleo e fazer valer cada gota de suor e lágrima derramados, vamos, no retorno à normalidade possível, ensinar e discutir em Seminários e Congressos, todo conhecimento acumulado, enquanto estivemos afastados, dividindo com a coletividade escolar, a família e a comunidade, tudo o que aprendemos no compartilhamento de experiências diárias. Precisamos discutir assuntos tais como: o desaparecimento ou não 56 da doença, nossos medos deste novo vírus contagioso, mortal e rápido, nossas preocupações com o futuro. Urge ter muito claro, tudo o que sabemos e o que ainda não sabemos. Vamos continuar aprendendo sobre esse vírus e seus mutantes por muito tempo. Este será nosso compromisso. Será necessário estimar-se o aprendizado remoto que vem ganhando espaço na prática tanto dos alunos, como dos docentes nesse período, pois se fortaleceu como consequência da realidade pandêmica, o ensino híbrido o qual se apresenta como forte opção para o futuro da Educação na Pós-Covid 19. Este futuro será alicerçado e complementado nas redes tecidas Podemos concluir que existe uma grande probabilidade de que deverão ser praticadas restrições mais radicais para o controle mais efetivo da Covid-19 por muito mais tempo. Tememos as sequelas que podem ser deixadas nas pessoas que adquiriram o vírus. Aguardamos que, ainda neste ano de 2021, os experimentos científicos e a formação dos professores tenham investimentos com foco na qualidade da Educação dentro dos novos modelos que se estão configurando, e nos desafia, considerando que não possuímos respaldo no governo brasileiro nem para Educação nem para a Saúde. Referências ARAÚJO A. L. 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Educação em tempos de pandemia: (re)lembrando... refletindo... propondo… Rosana Meire de Lima* Rosimeyre Maria dos Santos Passaro 59 “Nenhuma sociedade se afirma sem o aparecimento de sua cultura, da ciência, da pesquisa, da tecnologia, do ensino. E tudo isso começa com a pré-escola que, por sua vez, precisa da universidade”. Paulo Freire Para começo de conversa! Não é tarefa fácil e simples dissertar sobre educação nesse momento de pandemia. Nem é objetivo nosso, professoras de educação básica, criticar todo sistema educacional ou tornar a escola o espaço de fracasso ou total sucesso. Em momentos de muito aprendizado, sempre ouvi de um amigo e professor de filosofia que “uma boa conversa” ou “um bom texto” deve partir de “uma boa pergunta”. Pois bem, para prosseguir a narrativa, fruto de nossa análise, trazemos a seguinte questão: o que a pandemia ensina para nós em termos de educação? A pergunta nos faz retroceder a praticamente um ano atrás (2020). A pandemia tornando-se o centro das discussões e relembrar alguns momentos de aflição, seja pelo tempo de distanciamento social, luto, jornada de trabalho triplicada, analfabetismo digital, aulas remotas, acompanhamento dos alunos e dos pais nas plataformas de ensino, as novas formas de ensinar e aprender nos mostram quanto nossa jornada foi e continua a ser desafiadora. Nosso diálogo sobre educação é frequente. A sala de aula está em nós e junto com os alunos, temos também os filhos, que demandam atividades rotineiras. Isso no olhar da professora/mãe ou da professora/família/mãe. Com a chegada da pandemia a escola foi para dentro de casa e consequentemente a rotina modificou-se. O trabalho dos professores intensificou-se. Acreditávamos que seria passageiro, mas esse tempo de isolamento já soma um ano e mais alguns meses, acrescidos de angústias, medos, inseguranças, ou seja, a real condição da morte. Ao viver esse tempo pandêmico pode-se dizer que continuamos as experiências de viver “tempos interessantes”, ou seja, tempos de conflitos em decorrência de questões políticas, econômicas, sociais e culturais onde 60 a falta de esclarecimento da realidade leva a agitações como o cenário de 2013. Vale ressaltar que anteriormente à pandemia, já estávamos mergulhados numa crise, não só econômica, mas também de trabalho, de educação e de cultura. Uma crise social somando uma guerra de narrativas inventadas a partir das eleições americanas de 2014, o que é apresentado por Da Silva Gomes e Dourado (2019), quando enfatiza um fenômeno de comunicação política entre jornalismo, política e democracia. Nesse panorama, a escola tenta caminhar já bem perdida nas políticas do governo pós-impeachment. Todos os projetos de educação foram sendo desfeitos ou reduzidos a pedagogia do apenas “saber ler e escrever”. Esse desmantelamento ganha espaço com instruções do Estado para manter vivo o capitalismo. A sensação de incerteza “do” e “no” real se agravou a partir da onda fascista em solo brasileiro. Tantos problemas dramaticamente unidos nos fazem pensar que o mundo não só está em crise; encontra-se em crise em violento estado no qual se enfrentam as forças de morte e as forças de vida, que pode se chamar de agonia (MORIN, 2000, p. 85). Nesse contexto, para onde caminha a educação? Onde situa a escola? E, nós profissionais de educação, que leituras fizemos para apoiar ou resistir aos movimentos que surgiram anteriormente à pandemia? Se não sabíamos onde nos encontrávamos e onde queríamos chegar, a pandemia chegou primeiro e nos revirou. Intensificou tudo o que já era rotina de trabalho. Após um ano, cá estamos a refletir ou (re)inventar o nosso cotidiano, para viver ou sobreviver e poder projetar a nossa história. Ao escrever sobre o século XXI, Morin (2000) traduz bem essa “era de incerteza” quando afirma que “a realidade não é facilmente legível. As ideias e teorias não refletem, mas traduzem a realidade, que podem traduzir de maneira errônea. Nossa realidade não é outra senão nossa ideia de realidade” (p.85). Mesmo diante deste cenário, estudar e ler tornaram-se essenciais. No centenário do mestre Paulo Freire (2001) não podemos deixar de citá- lo em suas colocações sobre o papel de ensinar e aprender. Assim, “o ato de estudar implica sempre o ato de ler” (p. 260). Os encontros para “pensar” a educação, aproveitaram dos recursos tecnológicos, vídeo 61 conferências, vídeo chamadas, diversas leituras, participação em cursos e outros, nos aproximando do campo das ideias. Os assuntos abordados foram os mais variados. Permitiu-nos a reflexão sobre a “práxis” (e entenda-se práxis, como prática e teórica em conexão). O compromisso com nosso grupo de estudo e pesquisa permaneceu no decorrer de 2020 e as discussões nos levaram a desconstruir e reconstruir ideias a cada noite de encontro. As inquietações chegavam a nos tirar o sono, mas ao raiar do novo dia servia para impulsionar e continuar nossa jornada como educadores. Esse movimento nos remete ao saudoso professor e filósofo Lara (2003, p. 18) quando afirmou que “[...] reconhece-se que ele ainda não é algo, carece de, falta-lhe alguma coisa. Por isso, a necessidade de falar, dialogar e estudar continua como pauta importante em tempos pandêmicos”. A escola foi para dentro de casa! O ano de 2020 parecia calmo quando fomos surpreendidos com notícias vinda do Continente Asiático sobre a circulação do vírus SARS- CoV-2. O mundo rapidamente teve que se fechar para conter a ameaça de algo desconhecido,mas perigoso. A discussão ainda em pauta sobre a escola em casa – homeschooling – (talvez vivos, os poetas, Ariano Suassuna e Manoel de Barros traduziriam a palavra extraída do inglês como, “mistureba” ou “inutilezas”) foi empurrada para dentro dos espaços familiares, sem mesmo pedir licença. O discurso tornou-se realidade. Os pais poderiam acompanhar de perto o aprendizado dos filhos. Algo que havia sido divulgado e apoiado através de uma medida provisória que fazia parte das metas dos cem dias do governo eleito em 2018. Todos devem se lembrar das crianças cantando o hino nacional, da ministra dos direitos humanos afirmando que “o pai que senta com o aluno duas ou três horas por dia pode estar aplicando mais conteúdo do que a escola” e tantas medidas mais que não cabe mencionarmos neste registro. Para nós, professoras e professores começava a reinvenção das práticas de ensinar através das plataformas. Não afirmamos como algo novo, mas diferentes do que estávamos fazendo, usávamos vídeos, aplicativos, e outras ferramentas. A necessidade nos fez aprender em tempo recorde, programas e aplicativos para atender aos alunos. Foi 62 necessário adaptar horário, rever calendário, comprar equipamentos (fazer gastos e/ou investimentos), agendar aulas, gravar vídeos, enfim aprender a aprender. Ao dialogar para registrar essa memória, discutimos quão importante foi aprender a lidar com as novas tecnologias ou até perder o medo de apertar teclas, algo bem tranquilo para nossos alunos. Desconstruimos algumas práticas que precisavam ser (re)significadas, como por exemplo, aprender a ouvir e respeitar a fala do outro. Como foi interessante assistir os colegas se pronunciando nas lives, expondo suas dificuldades e nos dando caminhos de aprendizagem. Como foi bom as trocas com os alunos, ouvir orientações como, “entra nesse ícone”, “aperta esse botão”, “vocês me ouvem bem?” ou “vou enviar o link para a colega”. Muita novidade! A comunidade de “gente miúda” e professores aprendentes foi dando certo. Toda essa condição nova, tornou-se algo cooperativo. Constatamos que aprendemos com outros professores ou estudiosos do nosso lugar e do mundo inteiro. Nossa formação contínua não cessou. Com o passar dos meses, além das atividades que deram certo, veio o cansaço e o medo. As reuniões de escolas tornaram-se frequentes, a burocracia aumentou e a preocupação com a aprendizagem também. A escola fechou, mas a educação não parou. A casa “virou” escola – sala, cozinha ou quarto - escancarando a privacidade. Foi a invasão do espaço familiar como exigência do isolamento social. Vale mencionar que muitos colegas também não estavam preparados para tal mudança, abandonando seus cargos ou solicitando aposentadoria. Desafio maior foi exercitar a paciência e a cooperação. Ao criar uma rede de ajuda, enfrentamos o denominado “ensino remoto” ou “home office”. Neste contexto, a preocupação com o social não foi esquecida. Campanhas para arrecadação de alimentos e acolhida às pessoas vulneráveis aconteceram. É o que conhecemos como “inédito viável”, ou seja, as práticas de solidariedade e de auto-organização que apontam para a construção de uma sociedade do “comum”. Ao examinarmos a ótica das alunas e alunos em suas fases de vida – infância e adolescência – percebemos o quanto foram tolhidos de convívio e novas aprendizagens socioafetivas. Alguns já possuíam seus espaços de estudo, tantos outros tiveram que se adaptar. Os horários 63 intensos em frente às telas, acompanhamento pedagógico precarizado, equipamentos insuficientes e espaços inadequados. Desafios que ainda precisam ser superados. Essa pandemia, além de nos colocar frente à morte, evidenciou a exclusão e consequentemente ampliou o abismo entre a educação pública e privada. Para uma parcela de alunos a educação foi mantida através de uma rede de internet, um equipamento satisfatório e auxílio dos familiares, mas, para outros tantos, faltou às condições mais básicas, como por exemplo, o alimento, o caderno, o lápis, a internet, o computador, o celular, enfim, a exclusão total de suas garantias ou direitos a educação de qualidade. Nesse sentido, o sociólogo Boaventura de Souza Santos nos faz refletir a partir da categoria econômica e: O cenário de caos de uma pandemia expõe as fragilidades do capitalismo, que não tem um modelo de justiça social na agenda. A pandemia ensina que sim, é preciso mudar, pois o futuro estará sempre ameaçado enquanto os modos de produzir e existir seguirem sendo predatórios e injustos, [...] “só com uma nova articulação entre os processos políticos e os processos civilizatórios será possível começar a pensar uma sociedade em que a humanidade assuma uma posição mais humilde no planeta que habita”. (SANTOS, 2020, p. 66) Foi possível, nestas condições mantermos o compromisso de acolher nossos alunos mesmo pela tela. Tivemos o bom senso de escutar e falar com todas e todos, inclusive com alguns familiares. Apesar desse acolhimento que o momento exige, a sala de aula ainda é para nossa categoria o espaço de aprendizagens e vínculo de pertencimento e afeto. Com o agravamento da pandemia, perseverar tornou-se nosso referencial, considerando a ausência de lideranças no Ministério da Educação e outros órgãos afins. Seguimos ouvindo as reclamações dos familiares que tantas vezes discursaram sobre a escola em casa. Os relatos seguiram desde “não aguento mais ensinar” até “nunca mais reclamo de professores ou da escola”, ou lamentações mediante a falta de equipamentos, o acompanhamento pedagógico, o retorno ao trabalho e até sobre alimentação. A partir das falas sobre a “escola fechada”, percebemos que o movimento da comunidade escolar a favor da categoria, foi o que sempre 64 desejamos para validar nosso trabalho e mostrar que a formação é primordial para o que queremos como “educação de qualidade”. Para não concluir... Respondendo mais diretamente a pergunta inicial, discutimos sobre o sentido da vida e da educação dias antes de iniciar esse registro. Percebemos outros elementos que foram surgindo e outras narrativas mais atuais como o retorno às aulas presenciais. Paramos para pensar os milhares de mortos, o risco que corremos, a falta de preparo das escolas, enfim, muitas falhas a reparar. Para dar sustentação e equilíbrio nesse momento, recorremos ao Professor Jung Mo Sung (2007, p. 39) em seu texto - o sentido da vida e da educação -, quando diz que “o sentido é o que se sente, o que se segue ou se persegue e o que se compreende”. Ele acrescenta: “se a vida tem uma direção que devemos seguir e se ela tem uma significação. O sentido está no outro e no amor. A interação é o fundamento do sentido da vida e do desenvolvimento do ser humano”. [...] O sentido da vida está na constituição do humano e da humanidade”. Então, em tempos de pandemia e com um cenário de morte constante, é preciso repensar a escola como lugar de possibilidades e de discussão desse “sentido” do eu, do outro e do nós. Nessa insistência de aulas presenciais, em nossa análise, voltar para o espaço-escola é não salvar vidas. O desafio que encontramos é ajudar os colegas de profissão a pensar sobre isto e levá-los a “pensar bem” sobre quais grupos ou categorias desejam o retorno seguro e quais os que têm as reais condições. Ainda dialogando com o professor Jung, “toda ação humana é compreendida como humana porque ela se dá em um horizonte de sentido e, por isso carregado de sentido”. Precisamos pensar com o educando o sentido do ato de ensinar e aprender nessas adversidades, criando situações em que aprender seja também através da realidade vivida. Nesse sentido, John Dewey completa nosso pensamento quando afirma que a educação não é para a vida e sim a própria vida. Não finalizaremos esse texto “jogando flores” para o ensino remoto,aceitando definitivamente a educação à distância, afirmando que o mundo mudou e nos tornamos tutores, ou que todas as tecnologias deverão ser aceitas imediatamente para tornar a educação a qualidade 65 que muito se fala. Precisamos reconhecer que usar as plataformas para aprendizagens em tempo real e para a formação contínua foi um avanço significativo. O avanço tecnológico e de comunicação contribuiu não só com a educação ou outros setores da sociedade, mas não podemos esquecermos das desigualdades ampliadas pela falta de acesso. A pandemia evidenciou, comportamentos, imperfeições e negligências, mas também possibilidades de (re)pensar a escola como espaço de humanização. Precisamos do outro para nossa (in)completude! Propomos “pensar bem” a escola, o aluno, o professor, cada sujeito envolvido nessa nova realidade. Saber pensar as relações, a comunicação, a Ciência e outros temas que perpassam a nossa existência. Propomos descolonizar nosso pensamento individualista e preconceituoso para tantas causas que estão dentro das escolas. Ouvir e conversar, pautado na “pedagogia do cuidado”. Propomos fazer a opção sobre a coerência entre o discurso e a prática. Pensar a radicalidade (raiz) enquanto foco metodológico, assim podemos ter segurança e criar caminhos possíveis. Propomos sentir medo, mas não o sentimento que imobiliza, mas como reconhecimento que o medo é manifestação de que estamos vivos e incompletos. Para tantas proposições é preciso primeiramente estarmos vivos e dar sentido à caminhada na educação (re)encantando a vida. Acreditamos que resistir é preciso! Referências Bibliográficas CÁSSIO, Fernando (Org.). Educação contra a Barbárie: por escolas democráticas e pela liberdade de ensinar. São Paulo: Boitempo, 2019. DA SILVA GOMES, Wilson; DOURADO, Tatiana. Fake news, um fenômeno de comunicação política entre jornalismo, política e democracia. Estudos em Jornalismo e Mídia, v. 16, n. 2, p. 33-45, 2019. DEMO, Pedro. A educação do futuro e o futuro da educação. Campinas, SP: Autores Associados, 2005. – (Coleção educação contemporânea). FREIRE, Paulo. Ensinar, aprender: leitura do mundo, leitura da palavra. 66 Estudos Avançados, v. 15, n. 42, p. 259-268, 2001. FREIRE, Paulo. Pedagogia da esperança: um reencontro com a pedagogia do oprimido / prefácio de Leonardo Boff; notas de Ana Maria Araújo Freire – 17. Ed. – São Paulo: Paz e Terra, 2011. FREIRE, Freire. Professora sim, tia não: cartas a quem ousa ensinar. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 2012. JUNG, Sung Mo. Educar para reencantar a vida. 2. Ed. – Petrópolis, RJ: Vozes, 2007. LARA,Tiago Adão. A escola que não tive, o professor que não fui.: temas de filosofia e educação. - 3. ed. - São Paulo: Cortez, 2003. MORIN, Edgar. Os sete saberes necessários à educação do futuro. Tradução de Catarina Eleonora F. da Silva e Jeanne Sawaya. 6. ed. – São Paulo: Cortez; Brasília, DF: UNESCO, 2002. SANTOS, Boaventura de Souza. A cruel pedagogia do vírus. São Paulo: Boitempo, 2020. 67 5. O uso do google classroom com patrocínio de dados como alternativa à diminuição das desigualdades de aprendizagem durante a pandemia Letícia de Souza Nascimento* Patrícia Aparecida Gonçalves de Faria** 68 Introdução No dia 11 de março de 2020, a Organização Mundial de Saúde, devido a Covid-19 elevou a condição de calamidade pública para pandemia mundial. Até esse momento, muitos países tentavam adotar medidas protetivas a fim de evitar a propagação do vírus, como o fechamento momentâneo das escolas. Diante de tal perspectiva catastrófica foi necessário adotar medidas extraordinárias no campo da educação. Logo, deve-se reconhecer que estas circunstâncias excepcionais colocaram em prova os nossos sistemas educativos que, ainda, enfrentam o desafio de continuar a formação de milhões de estudantes isolados em suas casas. Cabe destacar que, muitas escolas, em suas aulas presenciais, já adotavam as TDIC como apoio na formação dos alunos, no entanto, uma gama de estudantes, ainda não possuem acesso a recursos tecnológicos ou à internet. Desta maneira, o cenário pandêmico evidenciou e agravou a desigualdade social, principalmente nas escolas de ensino básico da rede pública do estado de São Paulo, explicitando uma dicotomia entre os alunos que têm condições de prosseguir com os estudos e os mais vulneráveis socialmente, estes com evidentes déficits de aprendizagem. Estudos da World Bank Group Education (2020), publicados no mês de março de 2020, mostram o impacto da pandemia na aprendizagem, pois segundo o grupo, “o fechamento da escola pode significar interrupção do processo de aprendizagem principalmente para crianças com alta vulnerabilidade”. Neste viés, muitos alunos perderam o interesse em prosseguir com os estudos, pois tiveram que conviver com as mais variadas dificuldades evidenciadas e agravadas pela crise. Nesse sentido, analisar as problemáticas acerca dessa situação precária se faz necessário a partir de informações de uma literatura mais recente que objetiva responder questionamentos, como: quais podem ser os efeitos acadêmicos da interrupção das aulas presenciais e a, consequente, substituição por aulas on-line e à distância; de que forma tal interrupção afetará a aprendizagem e o abandono escolar; quais medidas foram adotadas para reduzir os impactos negativos e, por fim, quais medidas serão necessárias para amenizar a defasagem dos alunos. É importante destacar que levaremos em consideração, neste artigo, a educação básica pública do estado de São Paulo. 69 A transposição do ensino presencial para o remoto/híbrido na educação básica pública do estado de São Paulo Diante da situação emergencial imposta pela pandemia em meados de março de 2020, inicialmente, escolas e professores se organizaram na tentativa de oferecer um ensino remoto que suprisse as necessidades dos educandos, trazendo para o virtual as mesmas metodologias já em crise há anos, sem considerar as especificidades de ensino e aprendizagem do espaço virtual, o que gerou ainda mais desinteresse por parte dos alunos. Para Barros (2009), o virtual é um espaço que tem comunicação e tempo completamente diferente do presencial, possuindo movimento e lógica próprios. No início do ano letivo de 2021, tendo em vista fracassos do ano anterior, houve uma tentativa de implementação do Ensino Híbrido nas escolas públicas do Estado de São Paulo quando estas foram abertas para uma parcela dos alunos, segundo o Plano São Paulo (2020)1, no intuito de melhorar o panorama da educação durante a crise. Contudo, esbarramos nas dificuldades de entendimento da definição de ensino híbrido pelos gestores educacionais, problemas de formação do professor para esta prática, além das dificuldades que o aluno possui para o acesso à ferramentas de apoio à sua aprendizagem, dentre elas, a tecnológica, e sobre isto Moran (2015, p. 29) nos alerta “são muitas as questões que impactam o ensino híbrido, o qual não se reduz a metodologias ativas, ao mix de presencial e on-line, de sala de aula e outros espaços (...)”. Ocorre que, tal contexto educacional enxertado de falhas metodológicas e estratégias frustradas, que se arrasta desde o ano anterior, contribuiu para o agravamento do fracasso escolar2 e escancara as desigualdades sociais presentes dentro da escola entre os alunos. De acordo com o estudo realizado pela Cenpec Educação, em parceria com 1 Plano de retorno às aulas presenciais nas escolas do estado de São Paulo durante o período de pandemia da Covid-19. Para maiores informações, acesse: <https://www.educacao.sp.gov.br/wp-content/uploads/2020/12/FAQ-Volta- a%CC%80s-aulas-2021.pdf>. 2 Fracasso escolar entendido como evasão e baixo desempenho decorrente de baixa aprendizagem. https://www.educacao.sp.gov.br/wp-content/uploads/2020/12/FAQ-Volta-a%CC%80s-aulas-2021.pdfhttps://www.educacao.sp.gov.br/wp-content/uploads/2020/12/FAQ-Volta-a%CC%80s-aulas-2021.pdf 70 a Unicef e o Instituto Claro, intitulado “Enfrentamento da cultura do fracasso escolar” (2020), os mais afetados pelos impactos da educação foram os estudantes que já eram os mais vulneráveis, e com a pandemia da Covid-19 essa realidade foi acentuada e a disparidade socioeconômica do país ficou ainda mais evidente, passando de 2% para 3,8% o índice de fracasso escolar no Brasil. Este cenário também se faz presente no estado de São Paulo, principalmente entre as classes mais desfavorecidas. O uso de plataformas google com patrocínio de dados na educação paulista: benefícios e desafios Para suavizar os prejuízos no âmbito educacional trazidos pela pandemia, a World Bank Group Education (2020) orientou, ainda no início da pandemia, a criação ou o uso de aplicativos já existentes no meio tecnológico, inclusive para celulares, com o intuito de incentivar o compartilhamento de informações e materiais pedagógicos que melhor se adaptem ao contexto educacional e social da região. Ancorado nessa ideia, sabe-se que: Para haver uma ação focalizada, é importante selecionar um número específico de aplicativos e plataformas que melhor se adequem ao contexto educacional e social de cada região. Da mesma forma, é importante a criação de parcerias com provedores de internet locais para reduzir custos de disseminação dos materiais pedagógicos” (WORLD BANK GROUP EDUCATION, 2020, p.3). Diante a este contexto, a Secretaria de Educação do Estado de São Paulo (Seduc-SP), numa tentativa de atender remotamente os alunos e driblar a desigualdade de aprendizagem entre os alunos de forma disruptiva, criou uma plataforma de ensino on-line no formato do aplicativo Centro de Mídias do Estado de São Paulo (CMSP)3. Nele, os alunos poderiam assistir aulas de todos os componentes curriculares, para todos os anos e séries do ensino básico (1º ano do Ensino Fundamental a 3ª série do Ensino Médio) e interagir sincronicamente por meio de chat. Para que todos os alunos e professores pudessem ter acesso ao aplicativo, os dados móveis de internet utilizados eram patrocinados pela Seduc-SP por meio de contratos com as maiores empresas de 3 Para mais informações, acesse: <https://centrodemidiasp.educacao.sp.gov.br. https://centrodemidiasp.educacao.sp.gov.br/ 71 telefonia móvel do país. Para isso, o usuário precisa utilizar internet própria para baixar o aplicativo Centro de Mídias SP na loja de aplicativos do seu celular e aceitar a configuração VPN solicitado ao se logar pela primeira vez. Dentro deste aplicativo encontramos uma plataforma muito importante para alunos e professores, que também conta com dados patrocinados, o Google Classroom. Trata-se de uma parceria da CITEM (Coordenadoria de Informação, Evidência, Tecnologia e Matrícula) junto ao Google. Além disso, os professores e alunos também terão acesso ao Google Forms, Google Docs, Google Sheets e Google Drive por meio do Google Classroom. Para acessar a plataforma, os alunos e professores precisam inserir o e-mail institucional Google disponibilizado na Secretaria Escolar Digital (Sed)4 Para a enturmação, o professor deveria solicitar dentro da Sed quais turmas gostaria que fossem geradas, e o sistema automaticamente habilita as classes contendo todos os alunos matriculados, evitando o enturmamento manual. Nossa hipótese é a de que o acesso ao Google Classroom com dados patrocinados pela Seduc-SP é uma excelente ferramenta para combater as desigualdades de aprendizagem acarretadas pela pandemia, além de proporcionar práticas de aprendizagem dinâmicas ideais para o ensino híbrido. Algumas dificuldades encontradas Apesar do empenho da Seduc-SP e de grandes avanços de março de 2020 até os dias atuais, a utilização eficiente do Google Classroom e demais plataformas Google por alunos e professores ainda não está da maneira desejada, apesar da parceria estar em funcionamento desde maio de 2020. Elencamos aqui os problemas mais comuns encontrados: a. Demora na enturmação automática pela Sed ou enturmação parcial dos alunos para o Google Classroom; b. Dificuldades do professor na elaboração das atividades que 4 O site <https://sed.sp.gov.br> deve ser acessado com RG e senha para os servidores e RA e senha para os alunos. https://sed.sp.gov.br/ 72 considerem o espaço virtual de aprendizagem. c. Dificuldades de acesso do aluno ou do professor com login e senha, pela não familiaridade com a tecnologia; d. Dificuldade na organização da escola para viabilizar atividades pelo Google Classroom; e. O aluno não possuir tecnologia compatível para o acesso às plataformas Google; f. Desinteresse do aluno para realizar as atividades propostas; Como contornar a situação? É fato que a escola precisa se adequar às mudanças impostas pela situação emergencial, superando os inúmeros problemas estruturais e de formação dos profissionais envolvidos. A criação do Professor de Apoio à Tecnologia e Inovação (Proatec)5 contribui para corrigir alguns dos problemas citados (c; d), que são de natureza de apoio e suporte tecnológico tanto para o professor, quanto para o aluno. Esta é uma vitória para a escola pública paulista, contudo, ressaltamos que não basta aparelhar tecnicamente a escola e/ou o sistema. Maria Cândida de Moraes nos mostra que: Percebemos que a problemática maior estava na forma de apropriação da tecnologia pela escola, nos modelos pedagógicos utilizados e que apesar de incorporarem características que os livros não possuem, continuavam perpetuando o velho ensino, “otimizando o péssimo”, a partir de uma nova versão tecnológica visualmente mais bonita e agradável, mas política e pedagogicamente vazia. Desde o início de nossos trabalhos, observávamos que a maioria das propostas de uso das tecnologias na educação se apoiava numa visão tradicionalista, na separatividade entre sujeito e objeto do conhecimento e, conseqüentemente, na fragmentação das práticas pedagógicas (MORAES, 2003. p. 2). Neste viés, a Seduc-SP investiu em formações aos professores e alunos de maneira remota e presencial com o objetivo de proficiência na utilização do Google Classroom e outros recursos no processo de ensino e aprendizagem durante o período de aulas remotas e/ou híbridas. 5 Para saber mais, acesse <https://deleste1.educacao.sp.gov.br/proatec/>. https://deleste1.educacao.sp.gov.br/proatec/ 73 Contudo, entendemos que muito ainda há de ser feito tendo em vista o engajamento dos alunos neste período. Ainda há a necessidade de sistematizar informações no que tange ao ensino híbrido de qualidade, o que ajudaria a resolver o problema ‘c’. Para o problema ‘a’ no que diz respeito à lentidão da habilitação de turmas pela Sed, o Proatec tem auxiliado os professores na enturmação manual dos alunos para o Google Classroom. Para o problema ‘e’ no que se refere aos recursos tecnológicos do aluno, nos deparamos com as mazelas da desigualdade social escancarada pela pandemia, e para nós a maior barreira neste momento. Segundo a World Bank Group Education: A expansão do ensino a distância exige um planejamento robusto para evitar uma exacerbação das desigualdades de aprendizagem dentro e entre as redes de educação. Uma transição repentina para ensino a distância em escala sem considerar a capacidade das escolas em ofertar aulas de qualidade e a dos alunos em ter a estrutura e o apoio necessários para absorver este material tende a reforçar as já elevadas desigualdades de aprendizado no Brasil (2020, p.2) Algumas soluções são propostas pela Seduc-SP, como o oferecimento de atividades impressas para que a dificuldade de acesso às atividades propostas seja teoricamente contornada, no entanto, muitas vezes, essa metodologia priva os discentes da oportunidade de um aprendizadodinâmico, que aguça a sua curiosidade por meio de diferentes recursos. Abrir as escolas para que o aluno considerado “desconectado” utilize as tecnologias disponíveis acaba sendo uma alternativa mais viável quando o objetivo é a interatividade na hora de aprender. Todavia, o perigo da contaminação acaba, coerentemente, afastando muitos da prática presencial, que neste momento, é vista como alternativa. No que diz respeito ao problema ‘f’, uma proposta de ensino bem pensada, planejada e articulada com a realidade dos alunos é capaz de despertar o interesse em aprender. É neste momento que destacamos a importância da abertura dos horizontes da escola pública, tendo em vista que o papel do professor mudou e hoje “ele é principalmente o designer de roteiros personalizados e grupais de aprendizagem e orientador/mentor de projetos profissionais e de vida dos alunos” 74 (MORAN, 2018, p.21). Considerações finais É inquestionável que a pandemia da Covid-19 impactou negativamente a aprendizagem dos alunos e as perdas são enormes. Desta maneira, precisamos buscar maneiras de suavizar esses impactos e driblar as desigualdades sociais evidenciadas ainda mais neste momento. A plataforma Google Classroom com dados patrocinados se mostra uma ferramenta muito importante para atingirmos esse objetivo. Contudo, chamamos a atenção para vários desafios que se colocam entre o aluno e a aprendizagem. É urgente que os gestores de políticas públicas continuem buscando soluções que contemplem a formação dos profissionais para atuar com as novas exigências da atualidade, assim como a viabilização de meios para que os alunos possam dar continuidade aos estudos, garantindo assim o sucesso do processo de ensino e aprendizagem neste período tão difícil. Referências BARROS, D.M.V. Estilos de uso do espaço virtual: como se aprende e se ensina no virtual?. Inter-Ação: Rev. Fac. Educ. UFG, v. 34, n. 1, p. 51- 74, jan./jun. 2009. EDUCAÇÃO de SP disponibiliza ferramentas online gratuitamente para toda a rede. São Paulo.sp.gov.br, 2020. Disponível em: <https://www.saopaulo.sp.gov.br/ultimas-noticias/educacao-de-sp- disponibiliza-ferramentas-online-gratuitamente-para-toda-a-rede/>. Acesso em 18 de mar. 2021. Enfrentamento da cultura do fracasso escolar. Disponível em: https://trajetoriaescolar.org.br/wp- content/uploads/2021/01/web_unicef-cultura-fracasso-escolar- vf.pdf. Acesso em 19 mar. 2021. MORAES, M.C. O paradigma educacional emergente. Campinas/SP: Papirus, 2003. MORAN, J. Educação Híbrida. Ensino Híbrido: personalização e tecnologia https://www.saopaulo.sp.gov.br/ultimas-noticias/educacao-de-sp-disponibiliza-ferramentas-online-gratuitamente-para-toda-a-rede/ https://www.saopaulo.sp.gov.br/ultimas-noticias/educacao-de-sp-disponibiliza-ferramentas-online-gratuitamente-para-toda-a-rede/ https://trajetoriaescolar.org.br/wp-content/uploads/2021/01/web_unicef-cultura-fracasso-escolar-vf.pdf https://trajetoriaescolar.org.br/wp-content/uploads/2021/01/web_unicef-cultura-fracasso-escolar-vf.pdf https://trajetoriaescolar.org.br/wp-content/uploads/2021/01/web_unicef-cultura-fracasso-escolar-vf.pdf https://trajetoriaescolar.org.br/wp-content/uploads/2021/01/web_unicef-cultura-fracasso-escolar-vf.pdf https://trajetoriaescolar.org.br/wp-content/uploads/2021/01/web_unicef-cultura-fracasso-escolar-vf.pdf 75 na educação. Porto Alegre: Penso, 2015. MORAN, J. Metodologias ativas para uma aprendizagem mais profunda. In BACICH, L.; MORAN, J. Metodologias ativas para uma educação inovadora: uma abordagem teórico-prática. Porto Alegre: Penso, 2018. RETOMADA consciente - Governo do Estado de São Paulo, 2020. Disponível em: <https://www.saopaulo.sp.gov.br/planosp/>. Acesso em 19 mar. 2021. SEDUC habilita Classroom para uso no CMSP – SEDUC/SP. PEBSP, 2020. Disponível em: <https://www.pebsp.com/seduc-habilita-classroom- para-uso-no-cmsp-seduc-sp/>. Acesso em 18 mar. 2021. https://www.saopaulo.sp.gov.br/planosp/ https://www.pebsp.com/seduc-habilita-classroom-para-uso-no-cmsp-seduc-sp/ https://www.pebsp.com/seduc-habilita-classroom-para-uso-no-cmsp-seduc-sp/ 76 6. A interação professor e aluno em tempos de pandemia Claudete dos Santos* Gilvânia de Jesus Silva** 77 Introdução A educação vem enfrentando desafios ao longo da pandemia, salientando o processo de ensino e aprendizagem, a forma de ministrar conteúdos e a própria interação professor e aluno, ao considerar o ensino remoto emergencial como fator necessário neste momento de isolamento social. Destaca-se, assim, os fatores que estiveram ocultos na metodologia de ensinar e aprender de forma a transmitir novos conhecimentos, incluindo a tecnologia digital no cotidiano, trazendo para a prática escolar dos docentes e discentes metodologias ativas como característica a inserção do ensino remoto em todos os níveis de ensino. Neste contexto, cabe aqui ressaltar a necessidade da formação continuada com o objetivo de aprimorar as práticas cotidianas, desenvolvimento de competências e as relações com outros professores, a partir do contexto escolar, dos diferentes perfis dos alunos e de suas necessidades da sala de aula. Dessa forma, torna-se urgente a implementação de políticas públicas, do trabalho das instituições para oferecerem uma formação condizente a realidade dos professores e alunos destacando as ferramentas tecnológicas, metodologias e outros materiais de apoio aos professores. Assim, definiu-se nesta pesquisa, como objetivo geral, analisar a interação professor e aluno durante o ensino remoto emergencial e a influência no desenvolvimento intelectual, cognitivo e emocional de todos os envolvidos. Desta forma, utilizou-se o método qualitativo, em uma abordagem exploratória, dialogando com a prática educacional analisada pelos pesquisadores no decorrer das aulas remotas. Relação professor - aluno - professor Devido a Covid-19, inúmeras mudanças alteraram de forma relevante o formato tradicional de ensinar, considerando a influência emocional dos alunos e professores no decorrer das aulas no processo de interação, união, compreensão e diálogo no ensino remoto. Contudo, as relações entre os envolvidos neste processo de ensinar e aprendizagem, modificou a forma de ministrar aulas e levando o profissional da 78 educação a inserir-se nas metodologias e atividades humanizadoras. Nesse sentido, Moran ressalta: "[1] Fomos empurrados abruptamente para o digital e percebemos que podemos replicar a maior parte das atividades da nossa vida em diferentes plataformas e aplicativos: Comunicar-nos, comprar, ensinar, aprender, comunicar-nos, trabalhar remotamente, fazer consultas médicas, tomar decisões colegiadas em diversas instâncias” (MORAN. 2020, n.p) Cada prática iniciada no ensino remoto trouxe observações sobre a forma de novas adaptações metodológicas, como as mudanças na forma de utilizar os recursos diversificados pelas instituições escolares. Contudo, os responsáveis tornaram-se parte integral e preponderante na formação e parceria dos filhos, alunos de diversos segmentos da educação, membros integrantes e participativos da sociedade. Essas transformações influenciaram a interação professor-aluno, onde o educador na urgência de reinventar, na busca de alternativas no ensinar e ao mesmo tempo, alternando conhecimentos e estudos para aprimorar as metodologias de aprendizagem em cursos, palestras e encontros para trocas de ideias, em ambientes de estudo online. Uma formação continuada, com conteúdos complementares e recém- adquiridos. Transformações aceleradas O que se nota também é uma aceleração transformadora no ensino, para administrar as aulas, na elaboração dos conteúdos, interação com os alunos e mediadores, modificando a rotina de vida da comunidade escolar, devido ao isolamento domiciliar, e no processo de ensino contribuindo para com o emocional.O que para Torres (2019) é imprescindível, “(...) trabalhar em conjunto com a família para realizar o trabalho educacional” (p.4). Recorrente a este processo, a afetiva com o aluno destaca-se, deixando evidente aprofundar e elaborar propostas de atividades no ensino remoto, no desenvolvimento significativo e na aprendizagem, (...) “torna- se interessante que a escola se adeque às demandas que ocorrem no seu tempo atual” (p. 4). Um fator preponderante e vinculado a inovações escolares e necessárias que apareceram em 2020, quando iniciou no Brasil, com a Covid-19 e o isolamento, para garantir a integridade da 79 saúde de todos os brasileiros. Para Garcia (2012), o vínculo afetivo é um dos pilares essenciais que exercem uma intervenção significativa. Estabelecer um bom vínculo diz respeito a desenvolver a confiança e o respeito mútuo entre professor e aluno, sem que isso prejudique os diferentes papéis de cada um e a autoridade do professor como aquele que media e organiza os contornos da cena pedagógica. “Ser amigo não significa colocar-se no mesmo patamar do aluno, mas sim ocupar o seu próprio lugar na relação de ensino-aprendizagem de modo amoroso, cultivando o respeito mútuo. (GARCIA et al., 2012, p 40) Diante das novas abordagens metodológicas na ação pedagógica, que aliás, exige atenção, nos cuidados de interatividade professor-aluno, um novo paradigma para a prática educativa, ou seja, dando significado para efetivação docente - discente na construção do conhecimento humanizado. Contudo, é fundamental a parceria, o diálogo com a família, primeira base da formação social e educacional da criança no cotidiano familiar. Para, Moran: (…) para que essa transformação possa avançar com mais intensidade e relevância na direção de uma escola por competências, projetos e valores; com docentes bem preparados e valorizados; ambientes presenciais e digitais diversificados, flexíveis e estimulantes; novas formas de avaliação e de integração com as famílias e a sociedade: uma escola como comunidade viva de aprendizagem (MORAN. 2020, n.p) Portanto essa complexa relação amplia as aprendizagens com os conteúdos ministrados, exigindo dos professores, conhecimentos, competências, elaboração e planejamento, na inserção de temática diferenciadas, onde o docente possa responder a estes desafios, em sua formação continuada inovando habilidades, proporcionando oportunidades de ampliação e reconstrução prática. Assim sendo, avançar conceitualmente no entendimento para a formação do professor no processo contínuo de mediar, estimulando o aluno a desenvolver, discutir, debater a aprendizagem na construção do conhecimento. Neste contexto, a ruptura de uma rotina no qual os estudantes e responsáveis se adaptaram dentro de cada realidade familiar, contendo na representação do espaço escolar o valor primordial na aprendizagem, tendo necessidade de repensar novas estratégias para dar seguimento nas 80 atividades contínuas no ensino remoto. Contudo, percebe-se a fragilidade do professor diante de uma realidade tão invisível, como o desgaste emocional, sobrecarga de atividades pedagógicas ao ministrar as aulas remotas, e os recursos utilizados para estimular os alunos na participação ativa e dialógica durante o percurso de estudo. Acrescenta-se outra característica marcante, neste contexto, o professor-aluno, no desenvolvimento de estímulos, interação e participação durante as aulas, sendo primordial que o docente elabore em metodologias, projetos humanizados, motivadores, permanecendo em constante interesse, durante as atividades programadas ou impressas. Contudo, a participação dos pais na vida escolar das crianças e adolescentes torna-se de extrema importância no desenvolvimento dos mesmos. Os profissionais da área observam que grande parte dos alunos inclui a presença da família, interagindo e acompanhando as atividades parcialmente ativas no diálogo com a instituição de ensino, neste contexto, esta parceria efetiva seguirá, de fato, em resultados significativos. Sendo assim, Oliveira afirma: “tanto a família quanto a escola devem viabilizar relações pautadas na afetividade e no adequado desempenho de papéis. As crianças ao viverem ora como aluno, ora como filho, aprendem as normas sociais e éticas e compreendem o seu lugar no mundo” (OLIVEIRA, 1993, p.04). Afetividade escola - família Nesse sentido, salienta-se uma integração entre a escola e família no processo pedagógico, mantendo-se o equilíbrio na educação, mostrando assim, a importância das contribuições da família na construção da aprendizagem que perpassam os espaços escolares, presenciais e virtuais. Neste contexto a família, equipe pedagógica e os educadores tornam-se intransferíveis para sanar a motivação e uma possível evasão escolar, assumindo papéis de mentores e inspiradores no processo educativo, desde as questões práticas do cotidiano escolar, como no conhecimento de valores sociais para os conteúdos a serem ensinados. É recomendado estabelecer diálogos e criar ligações de aproximação que permitam um trabalho em conjunto. 81 Constata-se que a tecnologia serve de ponte para os estudos e ligação comunicacional eficiente com os pais, acompanhando e direcionando o projeto de vida de seus filhos, facilitando a interlocução dos processos de ensino e aprendizagem. Segundo Moran (2013, p.18), “(...) para mudar a educação escolar se dá quando se amplia o relacionamento entre gestor-professor-aluno- escola-família e sociedade, num clima amoroso e criativo de solidariedade, intercâmbio e apoio.” Ressaltando que, a aproximação da escola com os responsáveis é benéfica a toda comunidade escolar, sendo assim os alunos passam a serem os protagonistas de sua aprendizagem. Dessa forma, fica evidente que o convívio familiar influencia na relação social e escolar dos estudantes. O que é enfatizado por Moran (2013): A afetividade se manifesta no clima de acolhimento, empatia, inclinação, desejo, gosto, paixão e ternura, de compreensão para consigo mesmo, para com os outros e para com o objeto do conhecimento. Ela dinamiza as interações, as trocas, a busca, os resultados. Facilita a comunicação, toca os participantes, promove a união (p.18). Considerações finais O contexto apresentado é um novo pensar educacional, que demanda um desenvolvimento de novas habilidades, competências consideradas essenciais para a aprendizagem. Em um novo paradigma, onde o ensino segue no objetivo de promover a autonomia, capacidade crítica e social dos alunos, ou seja, professores e alunos aprendem juntos. Compreende-se que este novo ambiente, ainda, demanda de um grande esforço dos envolvidos no processo de ensino e aprendizagem. Por essa razão, é necessário adequar os recursos tecnológicos à educação, bem como, preparar para ambos trilhar caminhos inovadores. Os professores precisam lidar com novas abordagens no presencial e híbrido, tendo como desafio ressignificar seu espaço de atuação, portanto, faz-se necessário a busca de estratégias inovadoras para contribuir no planejamento, e enfrentamento de dificuldades com relação às ferramentas tecnológicas inexistentes à prática dos docentes, neste sentido, cabe às instituições de ensino dar apoio aos mesmos, integralizando o ensino-aprendizagem. 82 Dentro de uma outra vertente, está a necessidade da formação dos professores em desenvolver competências socioemocionais, socioafetivas e pedagógicas, isto quer dizer, que as instituições necessitam, aprimorar os conhecimentos, aprofundando nos estudos em novas estratégias, rotinas inovadoras, utilizando as metodologias ativas, estimulando o pensamento crítico do protagonista central da educação, o aluno. De fato, o papel fundamental deste professor configura-se, a viabilização do trabalho pedagógico, mesclando recursos digitais com materiaisconcretos, mantendo o vínculo familiar na escola. Isso demanda holisticamente uma proposta educacional diferenciada que desenvolva efetivamente a formação de alunos e professores na construção do conhecimento para uma vida digna e de qualidade para todos. Por fim, uma organização curricular, que atenda às novas exigências educacionais para o século XXI. A Pandemia surgiu inesperadamente e pegou a todos de surpresa. Dessa forma os profissionais da educação tomaram um susto, quando percebeu que quase tudo que estudou e aprendeu, entrou em contradição e ou em conflito com a tecnologia digital e os aplicativos os quais surgiram como uma nova forma de ensino. Muitos foram obrigados a conhecê-los e aprender a utilizá-los, para então poder continuar trabalhando e ajudando seus alunos no ensino aprendizagem. Referências CENTRO DE REFERÊNCIA EM EDUCAÇÃO INTEGRAL. Conceito: O que é Educação Integral? Disponível em: <https://educacaointegral.org.br/conceito/>. Acesso em:14 mar. 2021. GARCIA, Sandra et al. O prazer de ensinar e de aprender: contribuições de uma metodologia no aprimoramento das práticas pedagógicas. São Paulo: Mind Lab Brasil & INADE, 2012. Disponível em: < http://www.recriar-se.com.br/site/teoricos-producao-cientifica/ >Acesso em: 14 mar. 2021. MAIA, Marta Campos; MEIRELLES, Fernando S. Tecnologia de Informação e Comunicação aplicada à Educação. Red Americana de Investigación e Información y Comunicación. México, 2009. Disponível em: https://educacaointegral.org.br/conceito/ http://www.recriar-se.com.br/site/teoricos-producao-cientifica/ http://www.recriar-se.com.br/site/teoricos-producao-cientifica/ http://www.recriar-se.com.br/site/teoricos-producao-cientifica/ 83 <https://www.researchgate.net/publication/306314384_Tecnologia_ de_Informacao_e_Comunicacao_aplicada_a_Educacao>Acesso em: 14 mar. 2021. MORAN, José. Como acelerar as mudanças na Educação. Blog. Educação Transformadora. Disponível em: < http://www2.eca.usp.br/moran/wp- content/uploads/2020/09/acelerar.pdf >Acesso em: 11 mar. 2021. MORAN, José; MASETTO, Marcos T; BEHRENS, Marilda Aparecida. Novas tecnologias e mediação pedagógica. 21ª ed. rev., Campinas, SP: Papirus, 2013. MORAN, José. Transformações na Educação impulsionadas pela crise. Disponível em: <http://www2.eca.usp.br/moran/wp- content/uploads/2020/05/Transforma%C3%A7%C3%B5es.pdf> Acessado: 06 mar. 2021. OLIVEIRA, Persio Santos. Introdução à sociologia da educação. São Paulo: Ática, 1993. TORRES, Douglas Batista Rodrigues Gonçalves; SHITSUKA, Ricardo; SHITSUKA, Dorlivete Moreira. Estudo de caso de limites no emprego de computação na educação básica. Education Science, v. 8, n. 1, 2019. Disponível em:<https://www.rsdjournal.org/index.php/rsd/article/view/569> Acessado: 06 mar. 2021. SOUSA, Ana Paula de. A importância da parceria entre família e escola no desenvolvimento educacional. Revista Ibero Americana de Educación / Educação, v. 44, n. 7, jan. 2008. Disponível em: <https://rieoei.org/RIE/article/view/2172 > Acesso em: 14 mar. 2021. https://www.researchgate.net/publication/306314384_Tecnologia_de_Informacao_e_Comunicacao_aplicada_a_Educacao https://www.researchgate.net/publication/306314384_Tecnologia_de_Informacao_e_Comunicacao_aplicada_a_Educacao http://www2.eca.usp.br/moran/wp-content/uploads/2020/09/acelerar.pdf http://www2.eca.usp.br/moran/wp-content/uploads/2020/09/acelerar.pdf http://www2.eca.usp.br/moran/wp-content/uploads/2020/09/acelerar.pdf http://www2.eca.usp.br/moran/wp-content/uploads/2020/09/acelerar.pdf http://www2.eca.usp.br/moran/wp-content/uploads/2020/05/Transforma%C3%A7%C3%B5es.pdf http://www2.eca.usp.br/moran/wp-content/uploads/2020/05/Transforma%C3%A7%C3%B5es.pdf https://www.rsdjournal.org/index.php/rsd/article/view/569 https://rieoei.org/RIE/article/view/2172 84 7. Estudo e aprendizagem com a internet Carlos Lema Garcia* Este capítulo é parte do livro Internet e Evangelho, as tecnologias digitais e a vida cristã, de autoria de Dom Carlos Lema Garcia, Editora Cléofas, 2021, págs. 25-39 e 43-47. 85 Nesses meses de pandemia, professores e alunos passaram a utilizar as plataformas digitais para continuarem as suas tarefas acadêmicas. Essa nova exigência nos faz refletir sobre a maneira de estudar e assimilar os conteúdos das diversas disciplinas. É inegável que grande parte dos estudantes – agora com maior razão – passa horas diante do computador: namoram, baixam vídeos e músicas, preparam trabalhos escolares. A avalanche de informações e a quantidade de acessos disponíveis também têm nítida influência no aprendizado de crianças, adolescentes e jovens, cujas consequências ainda não temos condição de avaliar com segurança. Cursos e aulas on-line tornaram-se praticamente universais e isso provoca um forte impacto no sistema educativo: aos poucos, as ferramentas digitais vão substituindo os cadernos, as canetas, a lousa, os livros impressos e a presença dos professores. No entanto, sabemos que o ritmo da aprendizagem na escola é intencionalmente lento: alguns anos na Educação Infantil; em torno de 12 anos na Educação Básica; e um bom tempo de dedicação na Educação Superior, se contarmos não somente a graduação, mas a especialização. Hoje em dia, os especialistas em educação divergem ao tratar sobre os limites dos métodos de ensino a distância, bem como sua dosagem correta para cada faixa etária. Através da internet, o mundo da cultura e da educação dispõe de uma enorme profusão de materiais e instrumentos cada vez mais sofisticados em relação às gerações anteriores de estudantes e leitores. Pensemos nos estudantes universitários, que, ao elaborarem um trabalho de pesquisa sobre qualquer tema, encontram na internet um número muito mais elevado de textos do que a quantidade catalogada na biblioteca da faculdade. Isso explica sua dificuldade em pesquisar os conteúdos com critério, conseguir assimilá-los e sintetizá- los. No processo de aprendizagem, o estudante normalmente necessita silêncio e concentração para realizar a assimilação dos conteúdos abordados nas diversas disciplinas. Inclusive, algumas bibliotecas de universidades europeias oferecem aos usuários um pequeno tampão de ouvido a fim de garantir o silêncio completo durante suas pesquisas e estudos. 86 Uma boa biblioteca ou uma silenciosa, sala de estudo permitem um rendimento na tarefa intelectual muito superior ao realizado em lugares barulhentos ou agitados. Se a cabeça está dominada por imagens desconexas ou um turbilhão de sons e ritmos fortes, como vão sedimentar-se os novos conhecimentos? Para tirar maior proveito do estudo, o bom aluno sente necessidade de proteger seu “ecossistema mental” da agressão de imagens, sons estridentes e ensurdecedores. O processo de aprendizagem está ligado à atividade da “ruminação interior”, que permite assimilar a fundo. Requer, sobretudo, a capacidade de estar em silêncio e solidão, condições para assimilar os conceitos, pesar as palavras, avaliar as expressões com cuidado, raciocinar sem pressa. Estar permanentemente ligado à internet durante os tempos de estudo pode produzir no estudante uma instabilidade semelhante aos efeitos observados em um caleidoscópio de fragmentos multiformes e coloridos, que produzem dispersões e elucubrações erráticas. Essa constante mudança de enfoques e impressões induz ao risco da superficialidade, por impedir estudar ou ler textos completos, captar as ideias mestras, adquirir visão de conjunto e consolidar a assimilação dos conteúdos. A variedade de informações e a facilidade de encontrá-las provocam uma dificuldade crescente de memorização e do exercício de atividades básicas, como leitura e interpretação de textos. Além do mais, não é evidente que uma maior riqueza de dados e informações promova bons hábitos intelectuais, necessários para o incremento da pesquisacientífica e para o aprofundamento acadêmico. Ilusão de encontrar tudo na internet Um lugar-comum ainda frequente: basta uma simples consulta ao Google para encontrar todo o material disponível sobre determinado tema. Na realidade, cada clique no mouse é, sobretudo, um ato de confiança no motor de pesquisa e no conteúdo apresentado, mas, especialmente, na crença de que obteremos “tudo”. No entanto, sabemos que isso não é possível: um link não fornece tudo o que existe, seja porque ainda não foi digitalizado, seja porque, querendo ou não, somos constrangidos a selecionar a enorme quantidade de material que a cada segundo é lançado na internet e omitir sites e informações que poderiam 87 ser preciosos. Um dos problemas da navegação on-line é que os processadores realizam essa seleção no lugar do usuário, apresentando aquilo que poderia ser do seu interesse, a partir das suas navegações anteriores (que, obviamente, permanecem na memória). E assim, com o passar do tempo, as possibilidades disponíveis diminuem em vez de aumentar. O acesso a informações em demasia tende a criar uma atitude de impotência para a assimilação, além de impedir o saudável espírito crítico, arriscando, em última análise, a padecer de uma espécie de bulimia intelectual. Perda do sadio senso crítico Uma pesquisa sobre o futuro da internet, realizada em 2012 pelo Pew Research Center, em parceria com a Elon University (2012), apontou duas grandes posturas. Por um lado, há a posição dos perplexos, que certamente consideram a revolução digital um estímulo à inovação, mas que pode favorecer a preguiça mental e novas formas de analfabetismo, ligada à falta de critérios adequados para escolher e compreender os valores daquilo que se baixa, prejudicando a capacidade de valoração crítica. Por outro lado, existem os otimistas, que veem os efeitos positivos da revolução digital, a promoção dos direitos humanos e da capacidade de mobilizar formas de protesto e de sensibilização mais eficazes. Ambos pareceres coincidem em alertar para o risco de uma maior intromissão e controle dos governos e da sociedade, que poderiam bloquear as fontes de informação reservada (GIOVANNI CUCCI, 2016). Lentidão na aprendizagem Na música, na poesia, na vida, o repouso, a pausa e a lentidão são necessários para a compreensão. Isso é tão verdadeiro que em nosso cérebro há neurônios para diminuir a velocidade, cuja função é adiar em milésimos de segundos a transmissão neuronial das outras células nervosas. São instantes preciosos, porque introduzem sequência e ordem no aprendizado da realidade, permitindo projetar e sincronizar, como uma orquestra sinfônica (GIOVANNI CUCCI, 2016). Aprender, conhecer-se e ler procedem passo a passo, lenta e cadenciadamente: requerem tempo, gradualidade e paixão. A leitura 88 lenta, feita sem pressa, deixando tempo e espaço para as anotações pessoais, animada pelo desejo de perceber sempre mais coisas, é uma atividade que transforma profundamente o leitor, plasmando o seu pensamento, o seu ser e a sua maneira de ver a vida. A leitura lenta muda a nossa mente do mesmo modo que o treinamento físico modifica o nosso corpo. Para isso, é preciso ler uma página de cada vez, resistindo ao frenesi de “matar o livro” para chegar o mais rápido possível ao final. A capacidade de entrar no texto, torná-lo próprio e assimilá-lo, analogamente como acontece com a alimentação, é também uma condição indispensável para conhecer-se a si próprio, em particular para saber o que se está procurando, o que há no próprio coração. Uma mentalidade que privilegia o imediato e a velocidade, desprezando a reflexão, a meditação e o exame paciente da própria jornada, corre o risco de debilitar o gosto, a riqueza dos sentimentos mais profundos, mas, sobretudo, a capacidade de nos expressarmos, de transformar os pensamentos em palavras e torná-los nossos. A leitura superficial e apressada priva-nos do exercício da nossa faculdade mais bela, a inteligência, a capacidade de entender, de intus- legere, como diria Santo Tomás de Aquino, enfrentando por isso a fadiga e a dificuldade que, em vez de desanimá-la, a estimulam. A leitura pausada é uma ajuda formidável para o conhecimento próprio, precisamente porque favorece o recolhimento e o silêncio, a presença de si, de modo que o texto lido retorna ao leitor, fazendo parte dele. Nós tendemos espontaneamente a estar presentes nas coisas, mas não em nós mesmos. A solidão, portanto, é indispensável para o ato de ler, que nos isola de quem está à nossa volta para colocar a mente e o coração no texto: é uma espécie de ingresso na dimensão do sagrado, do “separado”, bem percebida por leitores e escritores de todos os tempos. A lentidão é a nossa força, é a condição para avaliar e assimilar com atenção aquilo com que nos relacionamos. A própria capacidade crítica e a atenção se debilitam diante do abismo de informações e sites continuamente lançados na web. A esse propósito se fala de um verdadeiro e próprio “desabamento da atenção”, consequência da tentativa de visualizar esse imenso material. Para poder adaptar-se a tanta abundância, se acentuam algumas habilidades “velozes” (como o multitasking), marcadas por interrupções e distrações que tornam 89 praticamente impossível trabalhar com continuidade na mesma tarefa, de modo tal que outras faculdades, mais ligadas à lentidão e à profundidade, acabam sendo prejudicadas, com consequências notáveis no âmbito cognitivo. Com toda razão escrevia o Cardeal Newman, em 1864: “Em virtude da própria natureza da espécie humana, o tempo é necessário para alcançar o entendimento pleno e perfeito das grandes ideias” (NEWMAN, 1909, s/p). Platão e a descoberta da escrita Platão revisita um mito egípcio para prevenir as pessoas da ilusão de ter todo o saber à sua disposição somente pelo fato de confiá-lo à escrita. Em Febro, Platão apresenta a opinião de Sócrates acerca da invenção da escrita, considerando ser, mais do que uma ajuda, um perigo, porque, com o passar do tempo, debilitaria a memória e as faculdades mais elevadas do homem. Trata-se de uma análise surpreendentemente atual, se a aplicarmos ao acesso às informações do mundo digital. Este é um ramo do conhecimento, ó rei, que tornará os egípcios mais sábios e de melhor memória. Na verdade, foi descoberto o remédio da memória e da sabedoria, referindo-se às inovações provenientes da escrita. Ao que o rei responde: Ó engenhosíssimo Theuth, um homem é capaz de criar os fundamentos de uma arte, mas outro deve julgar que parte de dano e de utilidade possui para quantos dela vão fazer uso. Ora tu, neste momento, como pai da escrita que és, apontas-lhe, por lhe quereres bem, efeitos contrários àqueles de que ela é capaz. Essa descoberta, na verdade, provocará nas almas o esquecimento de quanto se aprende, devido à falta de exercício da memória, porque, confiados na escrita, recordar-se-ão de fora, graças a sinais estranhos, e não de dentro, espontaneamente, pelos seus próprios sinais. Por conseguinte, não descobriste um remédio para a memória, mas para a recordação. Aos estudiosos oferece a aparência da sabedoria, e não a verdade, já que, recebendo, graças a ti, grande quantidade de conhecimentos, sem necessidade de instrução, considerar-se-ão muito sabedores, quando são, na sua maior parte ignorantes; são ainda de trato difícil, por terem a aparência de sábios e não o serem verdadeiramente. 90 Platão vislumbra uma consequência negativa do uso da escrita que tornaria obsoleto o tradicional sistema da maiêutica, ou seja, o diálogo entre mestres e discípulos, na medida em que o texto escrito poderia, por si só, substituir o trabalho do professor. Sabemos que o intercâmbio e a troca de impressões favorecem a busca da sabedoria e o progresso na conquista das ciências. Como aparecimento do texto escrito, é verdade, declinou-se a necessidade de memorizar as expressões e, de certa maneira, o trabalho interior de elaborar o raciocínio. Ainda que esse receio possa não ser confirmado, é certo que, com o texto escrito, a capacidade de memorizar diminuiu. Hoje em dia, com os recursos à internet, há o temor de que ocorra algo semelhante e se debilitem gravemente as nossas capacidades cognoscitivas. Sócrates temia que, com a transcrição das ideias, a mente se empobrecesse. Hoje foram mudados os instrumentos, mas o problema continua: a memória parece não ter mais tempo (nem vontade) de pacientemente – com fadiga – assimilar e interiorizar com profundidade aquilo com que se relaciona, de permanecer nas palavras, na página do texto, sem ceder à tentação de passar para outra. Como sensato filósofo, Platão não pretende rejeitar o texto escrito (como hoje não queremos excluir a internet), mas o seu uso acrítico, ingênuo, privado do reconhecimento dos seus limites e dos possíveis danos e dos seus remédios necessários (a oralidade e o exercício da memória). Ainda que o cérebro seja um músculo – mesmo muito especial –, ele se manterá vivo e saudável se for treinado, exercitado com esforços e atividades difíceis, esforçadas. A superficialidade e a imediatez deixam- no preguiçoso, atrofiado, ao ponto de torná-lo incapacitado de seguir raciocínios e temas complexos. O uso de um instrumento pode tornar- nos dependente dele: não se memoriza mais um texto porque é fácil acessá-lo na tela do computador; utilizando um navegador pelo GPS, temos definido um percurso e não há mais a necessidade de reparar nos nomes das ruas pelas quais trafegamos. Assim, os dados escorrem como a água sobre a rocha, sem deixar rasto. É outro aspecto da insídia escondida dos novos recursos digitais: oferecem muitas coisas e velozmente, mas podem favorecer a preguiça intelectual. Por isso, torna- 91 se sempre mais difícil aceder a textos longos e complicados, que requerem tempo e atenção, como no caso das principais obras da literatura universal. A perda da memória é o perigo mais grave presente em todo fato novo, porque pode levar ao esquecimento do passado. A memória histórica está ligada ao exercício da crítica, à capacidade de avaliar e de contrapor propostas novas com as antigas. O esquecimento causa repetição de erros anteriores, em nome da novidade, mas sobretudo expõe ao risco de cair num pensamento massificado, politicamente correto, incapaz de explicitar aspectos incômodos das problemáticas em questão, transformando-se em presa fácil dos mecanismos de persuasão. Outro contraste evidente é que o mundo digital não se esquece de nada, enquanto quem o utiliza em demasia, ao contrário, se sente cada vez mais esquecido. Perder a memória, esquecer o contato com os antepassados, não se interessar em conhecer as próprias origens e tradições, tudo isso pode gerar uma crise pessoal e cultural. A raiz é o princípio e o sustento da vida vegetal. Ela sustenta a vida da planta em solo fértil e a nutre com a seiva absorvida. Mergulha nas águas para que a vida seja verde em todas as estações, permite a folhagem e o surgimento das flores e dos frutos. A raiz também é o ponto de referência seguro para as pessoas, para a família humana e para a sociedade inteira. Uma sociedade que rompe com o passado, na mesma medida, se torna incapacitada de construir o seu futuro. Uma sociedade sem memória é como uma pessoa sofrendo de Alzheimer acentuado (SARAH, 2019). Textos pessoalmente manuscritos O trabalho de percorrer os textos científicos, literários e históricos, ressaltando as ideias principais em esquemas e distinções, durante muitos anos tem sido uma técnica largamente utilizada para estudar disciplinas dissertativas, como História, Geografia, Biologia, Língua Portuguesa e Literatura. A ação de escrever esses resumos no papel, fazendo uso de lápis (ou caneta), permite uma aprofundada assimilação dos conceitos e até uma memorização dos diversos itens destacados pelo próprio estudante. A transcrição personalizada dos textos permite um envolvimento total com o aprendizado, uma dinâmica recíproca entre o 92 leitor e o livro. Com o advento do computador, a facilidade de copiar longos textos de maneira instantânea e automática – que, em si, representa um avanço – traz consigo o risco de minimizar a compreensão e a personalização dos conceitos. Em todo caso, ainda hoje os exames vestibulares para o ingresso nas universidades, em geral, não dispensam a redação, por ser uma atividade reveladora da coerência das ideias e manifestação da lógica do raciocínio. Trata-se de um exercício cada vez mais necessário, à medida que as jovens gerações de estudantes se habituam a digitar seus textos nos teclados dos celulares ou computadores. Escrever à mão é uma capacidade que não se deveria perder, uma vez que nos auxilia a formular o pensamento de maneira progressiva e pausada. Thomas Morus, lorde chanceler do Rei Henrique VIII (1478-1535), quando devia passar uma temporada fora de casa, fazia seus filhos lhe escreverem todos os dias uma carta, em latim. Seus conselhos continuam plenamente atuais para se elaborar uma boa redação: Escrevam sempre com reflexão e esmero, sem reparar se o tema é sério ou não. Não acontece nada se escreverem primeiro em inglês: depois podem transcrever com bastante facilidade ao latim... Quero adverti-los para examinarem tudo com exatidão antes de passar a limpo. Se consideram que a ordem das ideias estiver bem, prestem atenção às frases e examinem a sua construção, uma por uma. Assim não escapará nenhum erro. Quando tiverem corrigido todo o texto, copiem outra vez a carta e voltem a lê-la, pois facilmente acontece de tornarem a aparecer erros já corrigidos (BERGLAR, 2013, p. 149-150). Ler na tela ou no texto impresso Quem lê um texto digital tende a se distrair com mais facilidade (especialmente na adolescência, que de per si predispõe à divagação), passando as páginas rapidamente em vez de se deter a ler com atenção, teclando nas diversas janelas e sites (principalmente quando se tem acesso à internet). O resultado é que se torna muito difícil recordar aquilo que se visualiza, de maneira não muito diferente do que acontece na navegação prolongada na internet. É uma experiência comprovadamente clara de que a qualidade do aprendizado, a capacidade de compreensão e a facilidade para reter o conteúdo de um texto impresso costuma ser 93 maior que o digital. O ambiente digital convida a enfrentar uma ampla quantidade de temas, mas em um nível muito superficial, pois os links distraem a leitura e o pensar de modo mais aprofundado, como dizia alguém: Vejo que a minha paciência para a leitura de documentos longos está diminuindo… Quero saltar diretamente para o fim. Ao contrário do que estamos habituados, para as novas gerações digitais o texto “ilustra a imagem”. Se anteriormente as imagens tinham o papel de ilustrar o texto, para os mais jovens hoje funciona exatamente ao contrário: só recorrem ao texto quando a imagem não se faz compreensível por si só. A linguagem do cinema já provoca essa tendência, mas, com o surgimento das novas tecnologias, ela se potencializou muitíssimo. É verdade que, às vezes, uma imagem diz mais do que mil palavras. No entanto, a prevalência das imagens em relação aos textos recomenda algumas precauções didáticas: em primeiro lugar, torna-se necessário um grande cuidado com a seleção de imagens para apresentar aos jovens, para que os impactem positivamente e para que não lhes sejam ambíguas. É preciso, também, ajudá-los a assumir uma postura mais crítica diante das imagens, pois, ao contrário, elas podem adquirir um poder de manipulação superior, o que faz relação ao texto de Simone Ribeiro Cabral Fuzaro, publicado no jornal “O SãoPaulo”, em maio de 2020. Um universitário graduando na Universidade de São Paulo contou-me um desabafo do seu professor, que insistia – sem sucesso – para que os alunos lessem a bibliografia recomendada para a matéria. Até que um dia não resistiu: “Por favor, meus queridos alunos: menos Facebook e mais face on the book!”. É verdade que a internet nos permite encontrar uma enorme quantidade de informações, mas necessitamos convertê-las em conhecimento. Dispor de informação demasiada pode causar a sensação de perplexidade de quem perde o rumo numa densa floresta. Daí a necessidade de critérios seguros para reconhecer o que vale a pena visualizar, identificar os blogs confiáveis e os autores competentes na matéria. Caso contrário, essa enorme riqueza pode se transformar num obstáculo frustrante e ocasionar uma enorme perda de tempo e energia. E conhecimento não é informação. Reparemos nas nuances: a 94 informação é algo externo, enquanto conhecimento é algo interiorizado. A informação é informe, mas o conhecimento é estruturado. A informação é rapidamente acumulável e o conhecimento só pode crescer lentamente. A informação pode ser automatizada, porém o conhecimento só é humano. A informação é inerte, enquanto o conhecimento conduz à ação. Assim, a leitura é a chave do conhecimento. A colossal acumulação de dados que a sociedade digital oferece não servirá de nada sem pessoas que os percorram, integrem e assimilem. E isto requer habilidades captadas pela leitura. Os livros continuam sendo a melhor escola. Poderia pensar-se que a proliferação de equipamentos com acesso à internet bastaria para incentivar a prática da leitura. No entanto, não é assim. A leitura através da internet dirige-se principalmente à pesquisa de dados e à assimilação de informações breves. Ninguém lê um romance extenso, um longo ensaio, na tela do micro ou do tablet (entre outras coisas, porque é muitíssimo mais incômodo). E a leitura detida e extensa, por si mesma, forma hábitos de estudo e permite extrair eficientemente as informações. Para educar na leitura continuam sendo necessários os livros. Lembremos do sucesso alcançado pelas aventuras de Harry Potter: pré-adolescentes, adolescentes e jovens foram capazes de ler, um após outro, os volumosos livros, sem a menor sensação de cansaço ou preguiça. Ainda que seja mais fácil e mais acessível fazer as conexões de rede, continua sendo necessário que haja livros nas escolas, nas casas, nas bibliotecas. Caso contrário, nossos cidadãos terão acesso à internet, mas só para comprar, para baixar músicas, para conversar ou reservar uma passagem, e carecerão da habilidade de navegar com eficiência e aproveitamento nos oceanos da informação (MILLÁN, 2001). Videogames educativos Para não cair na tentação do dualismo entre a internet e o estudo, vale a pena destacar a possibilidade de utilizar os recursos da internet para uma finalidade acadêmica. Nos Estados Unidos, há anos, são utilizados em algumas disciplinas certos videogames chamados epistemic games – “jogos 95 científicos” –, em que os estudantes se empenham em exercitar atividades de uma determinada profissão, como elaborar o plano diretor de uma cidade. Para atingir esse objetivo, os estudantes devem solucionar problemas simulados pelo computador e necessitam conhecer fórmulas matemáticas que reproduzem a vida pulsante de uma cidade, a sua infraestrutura (distribuição de energia elétrica, água, saneamento, trânsito, transporte público etc.). É um exemplo de como o jogo pode motivar o estudo, favorecer as relações e as virtudes civis, ajudar os outros e criar o sentido de responsabilidade coletiva. A integração entre essas duas atividades, estudo e jogo, é um verdadeiro desafio para a escola: elaborar uma modalidade de aprendizagem capaz de unir fadiga e satisfação, frustração e constância, sem se render às dificuldades. No entanto, nem todos os estudantes são apaixonados por videogames e nem utilizam os mesmos videogames, porque não atuam igualmente diante da internet, que pode ser um mundo maravilhoso, porém não para todos. As diferenças permanecem (GIOVANNI CUCCI, 2016). Também é certo que o ambiente do videogame não pode ser transportado em bloco para a sala de aula. Aprendizado e jogo permanecem como são: dois mundos diferentes. Evidentemente, hoje em dia, os recursos da internet têm sido amplamente utilizados na sala de aula, com bastante proveito. Nesse âmbito, todo cuidado é pouco, porque se deve ter em conta as cifras elevadas de dependência de videogame entre adolescentes, jovens e adultos: problemas de dependência patológica, depressão, baixa autoestima, isolamento social, fortes crises nas relações afetivas, falta de interesse, ausência de atividade física, entre outros. O jogo compulsivo, longe de representar um fator de recreação, esgota as melhores energias, diminuindo lentamente a capacidade cognoscitiva e a vivacidade intelectual (GIOVANNI CUCCI, 2016). Condições para estudar com proveito Antes de tudo, o estudo exige concentração: como o músico, o atleta e o pesquisador entusiasmado com seu trabalho, colocam todas as energias naquilo que fazem em cada momento. Grande parte do sucesso do estudo depende da concentração. Precisamos nos esforçar para colocar todos os sentidos naquilo que fazemos: uma aula, um texto, uma 96 leitura, uma apresentação. A fim de garantir a concentração, seria interessante reservar um horário exclusivo para o estudo: de duas a quatro horas, por exemplo (dependendo da situação de cada um, do volume de conteúdo, da complexidade da disciplina etc.). Durante esse tempo, normalmente a internet deveria ser usada se realmente houver relação com o tema estudado. Depois, o bom estudante enfrenta a sua tarefa como um desafio, como uma aventura, com iniciativa e disposição de se superar, inovar. E ele vibra com as conquistas e descobertas que faz, relaciona os conhecimentos de diversas áreas: literatura, acontecimentos históricos, características culturais de determinada época. A seguir, projeta, elabora e executa o seu plano; não se intimida nem se assusta quando deve enfrentar dificuldades, situações e ambientes novos, trabalhos mais exigentes. Que maior desafio e superação do que vencer a curiosidade de entrar e se dispersar nas redes sociais durante as aulas ou o horário de estudo? Uma hora de estudo equivale a uma hora de oração Para São Josemaria, cresce no caminho da santidade quem estuda ou trabalha bem e oferece o seu estudo para Deus: “Para um apóstolo moderno, uma hora de estudo é uma hora de oração” (ESCRIVÁ, 1999, p.117). Entendamos bem o que nos quer dizer: não é pretender rezar um terço, por exemplo, durante o estudo. Não daria certo. O que o santo sacerdote nos propõe é oferecer cada hora de estudo para Deus e colocar a cabeça, com toda atenção que pudermos, para fazer bem aquela tarefa. E quais são as condições para santificar o estudo? a) responsabilidade; b) constância; c) intensidade. Responsabilidade, constância e intensidade no estudo Em primeiro lugar, responsável é quem responde pelo seu estudo. Quem ganhou a boa autonomia e sabe o que deve fazer a cada dia. Responsável é aquele que resolve os problemas e dá conta das tarefas; pede ajuda quando necessário, mas assume as próprias responsabilidades. Se um estudante repete os mesmos erros todos os anos, pode-se pensar que ainda não se tornou responsável nos estudos. Do mesmo modo, seria irresponsável a pessoa que começa a estudar e, 97 aos quinze minutos do primeiro tempo, já está vagando pela internet. A seguir, constância: segredo do sucesso em qualquer atividade humana. O grande músico Liszt dizia que se passasse um só dia sem tocar o piano ele o notava; se permanecesse dois dias sem se exercitar, sua esposa percebia; se passasse três dias… o públicoreparava. Não há resultado positivo sem dedicação constante. Aquele que – mesmo com menos condições de talento e inteligência – sabe vencer a preguiça e trabalha com constância acaba triunfando, como relata a conhecida fábula da corrida entre a lebre e a tartaruga. Os bons hábitos facilitam o rendimento. Além disso, se, na hora de trabalhar, o estudante souber que esse dever também é a vontade de Deus agora, nesta fase da vida, se sentirá animado a abraçar o estudo, mesmo que não tenha grande entusiasmo no momento ou sinta desejo de se dispersar. Finalmente, intensidade e profundidade. Todo bom estudante já experimentou que o estudo feito a sério torna-o mais maduro. Sente que cresce com aquilo que vai assimilando. Aumenta o seu domínio da matéria e, por isso, sente segurança. Aprecia aquilo que lê. Portanto, o trabalho bem-feito também se transforma em entusiasmo. Vai adquirindo experiência. Acumula conhecimentos. Estuda para saber. Assim se torna uma pessoa de prestígio entre seus colegas; a sua postura e a sua palavra são respeitadas porque tem opiniões consistentes sobre temas de fundo. Tal como na pesca milagrosa do Evangelho, os bons resultados trazem a alegria do estudo realizado com esforço. O estudo bem-feito é como um patrimônio construído, que nos enriquece como pessoa. Experimentamos essa alegria, essa vitória, depois de enfrentar um tema difícil, de colocar a cabeça, ler e reler. Conferir e confirmar os dados de uma equação matemática. Decifrar a lógica de um processo químico. Reconstruir o itinerário de um fato histórico. Tudo isso cansa e nos deixa esgotados, como os pescadores. No entanto, vibramos interiormente com uma sensação de conquista, de domínio, de vitória, pela descoberta de um novo conhecimento. Conhecemos pessoas assim: entusiasmadas com seus estudos, colocam todas as energias no trabalho de aprendizagem. Souberam vencer a preguiça e a dispersão em outras atividades. Aprenderam a vencer utilizando os recursos da internet a seu favor. 98 Referências BERGLAR, Peter. La hora de Tomás Moro: Solo frente al poder. Palabra, 2013. ELON UNIVERSITY. Pesquisa sobre o futuro da Internet. 2012. Disponível em: <https://www.elon.edu/u/imagining/surveys/v- 2012/> acessado em 02 de novembro de 2021. ESCRIVÁ, Josemaría. Caminho. São Paulo: Editora Quadrante, 1999. MILLAN, José Antonio. Um aliado na era digital. Disponível: https://elpais.com/autor/jose-antonio-millan/1/ acessado em 02 de novembro de 2021. NEWMAN, John Henry. Ensaio sobre o desenvolvimento da doutrina cristã. Londres: Longmans, Green, and Co., 1909. SARAH, Robert. A noite se aproxima e o dia já declinou. São Paulo: Fons Sapientiae, 2019. https://www.elon.edu/u/imagining/surveys/v-2012/ https://www.elon.edu/u/imagining/surveys/v-2012/ https://elpais.com/autor/jose-antonio-millan/1/ 99 8. Reflexões sobre a importância dos letramentos informacional e digital Larissa Maiara Barbosa Gomes* Iara Carnevale de Almeida** Viviane Sartori*** 100 Introdução A participação de qualquer indivíduo, na nova sociedade informacional, o instiga ao aprendizado permanente para acompanhar os desafios atuais impostos. Exige-se um cidadão ativo, pensante, dotado de opinião e criticidade, pois a forma de proceder em relação à construção do conhecimento mudou. O próprio saber tornou- se maleável e instável, necessitando de atualização constante. Por isso torna-se necessário saber selecionar, avaliar e processar a imensa gama de informações dessa nova sociedade de maneira crítica e reflexiva, com vistas a garantir que esse grande volume de informações aliada à falta de tempo, não dificulte a aprendizagem do indivíduo levando-o à superficialidade do saber (CRUZ, 2008). Importante ressaltar que Castells (1999) faz uma distinção entre os termos “sociedade da informação” e a “sociedade informacional”. Sociedade da informação enfatiza o papel da informação na sociedade, onde "informação" é considerada, no seu sentido mais amplo, a comunicação de conhecimentos pois é crucial para todas as sociedades. Já sociedade informacional indica o atributo de uma forma específica de organização social em que a geração, o processamento e a transmissão da informação são as fontes fundamentais de produtividade e poder, devido às novas condições tecnológicas surgidas neste período histórico. Neste contexto, salienta-se a importância dos projetos de iniciação científica para a realização de uma aprendizagem significativa, preparando os alunos que passam por essa experiência para edificação das bases para a continuidade de sua vida científica, cultural, acadêmica, enfim de modo geral. “Porém, não se trata de transformar o professor e o aluno em pesquisadores especializados, como membros de instituto de pesquisa, mas de praticar a docência e a aprendizagem mediante a postura investigativa” (SEVERINO, 2009 p.120). Para que tal ocorra, é considerado fundamental que todo indivíduo seja capaz de ler, escrever e interpretar no sentido de compreender o que lhe é apresentado, interferindo diretamente em sua alfabetização. Esta alfabetização é definida por Soares (2009, p. 31) como o estado ou condição de tornar um indivíduo “capaz de ler e escrever”, ou seja, o foco está no conhecimento e nas capacidades de leitura e escrita do aprendiz. O conceito de alfabetização também pode ser entendido a partir da 101 compreensão de Rojo (2009, p.30), que define como a “ação de alfabetizar, de ensinar a ler e a escrever, que leva o aprendiz a conhecer o alfabeto, a mecânica da escrita/leitura, a se tornar alfabetizado”. Percebe-se a alfabetização como uma ação que desenvolve em um aluno o “saber fazer” a leitura e a escrita dentro do código vigente em sua sociedade. Não muito longe do importante papel da alfabetização na vida de um indivíduo, tem-se o letramento, um instrumento de igual modo necessário para a formação de um cidadão dotado de competências para aprender e gerar conhecimentos (AZEVEDO, GASQUE, 2017; SOARES, BATISTA, 2005). O letramento, em geral, refere-se ao estado ou à condição de quem não apenas sabe ler e escrever, mas cultiva e exerce práticas sociais que usam a escrita (SOARES, 2009). Surge de forma complementar à alfabetização e não sinônima, originado a partir da palavra inglesa, literacy, entendido por Hirsch (1987, p. 2) como “o conjunto de informações que todos os leitores competentes possuem. É a informação [...] armazenada em suas mentes, que permite que eles leiam um jornal com um nível adequado de compreensão, entendendo o assunto”. No discurso de Soares (2004), fica claro que o autor entende ser impossível dissociar o letramento da alfabetização, pois: Não são processos independentes, mas interdependentes, e indissociáveis: a alfabetização se desenvolve no contexto de e por meio de práticas sociais de leitura e de escrita, isto é, através de atividades de letramento, e este, por sua vez, só pode desenvolver-se no contexto da e por meio da aprendizagem [...] em dependência da alfabetização.” (SOARES, 2004, p. 25) É possível compreender que o termo letramento surge para descrever um fenômeno que altera o contexto da sociedade em relação à percepção social e intelectual de um indivíduo frente às experiências da vida cotidiana. Desta forma, tem-se o letramento como um fenômeno que não se limita à alfabetização. Por mais que seja uma condição inerente àquele que sabe ler e escrever ou seja, foi alfabetizado, mas que também se utiliza de forma competente e frequente de habilidades adquiridas pela leitura e escrita, este supera as barreiras da educação formal. Não se trata de um viés de hierarquia ou sobreposição, mas sim, de uma nova forma de enxergar o processo histórico de ensino e aprendizagem (SOARES, 2009). 102 Azevedo e Gasque (2017) compreendem o letramento como uma forma de emancipar aspessoas, dar a elas autonomia como cidadãos e seres pensantes. Além disso, reconhecem que existem múltiplos letramentos, sendo eles: digital, informacional, visual, etc., não dispostos dentro de uma hierarquia pela teoria. As autoras afirmam que o letramento “transcende o mero conhecimento, exigindo a aplicação deste [o conhecimento] em situações do cotidiano, em direção à criação de redes e comunidades de aprendizagem” (AZEVEDO, GASQUE, 2017, p. 168) e confirmam a existência de uma chamada para a utilização do letramento focado no contexto do qual este torna-se necessário, seja em determinado segmento da sociedade ou em uma sala de aula diante dos novos desafios impostos aos estudantes. Nota-se que a impossibilidade de sair de casa para estudar por questões como, por exemplo, uma dificuldade de transporte ou por proporções maiores como a crise sanitária mundial provocada pelo vírus SARS-CoV2, conduzem o letramento para uma posição de emergência frente às demandas que precisam ser supridas no atual contexto da sociedade, especialmente a do ambiente escolar que deve estar preparado para preparar, e isto envolve, o letramento do aluno e principalmente do professor - profissional responsável por letrar os alunos. Estes (alunos e professores) devem ser prevenidos e capacitados para esse fenômeno que mais uma vez surge na sociedade brasileira, desta vez, não com uma roupagem de novidade, mas com aspectos de (re)construção necessários frente aos novos desafios e novas capacidades que cada vez mais são requeridas destes indivíduos. De posse do que pode ser entendido por letramento, aprofunda-se neste universo dos múltiplos letramentos, iniciando-se com a compreensão do letramento informacional voltado para o contexto educacional e os processos de ensino-aprendizagem para que seja possível compreender essa temática que permite abarcar as diversas forma de trabalhar (localizar, usar, gerar, etc) com a informação, com vistas a apoiar a tomada de decisões e a resolução de problemas (GASQUE; FIALHO, 2017). Na sequência deste capítulo, apresenta-se o desenvolvimento da competência informacional que, segundo Vitorino e Piantola (2009) tem sido relacionada com as habilidades necessárias para que um indivíduo 103 possa lidar com as tecnologias de informação. Introduz-se assim, aspectos importantes para a seção seguinte que trata sobre o letramento digital, como uma resposta às atuais demandas sociais que exigem dos indivíduos habilidades com a informação em meios suportados por Tecnologias Digitais de Informação e Comunicação (TDICs). Letramento Informacional Existem diferentes questões terminológicas que envolvem o termo information literacy, que por ter sua origem na língua inglesa, é apresentado com diferentes traduções. Alguns autores utilizam o termo original, outros “alfabetização informacional”, “competência informacional” ou “letramento informacional”. Neste documento, optou- se pelo uso do termo “letramento informacional” que, conforme Gasque (2010), é o conceito mais próximo da derivação do inglês “literacy”, bastante utilizado no campo da educação e da pedagogia. O letramento informacional decorre do que Castells (1999) descreve como uma perspectiva acerca da sociedade globalizada, considerada por ele como centrada no uso e aplicação da informação. O autor entende que a economia é informacional, porque a produtividade e a competitividade de unidades ou agentes nessa economia (sejam empresas, regiões ou nações) dependem basicamente de gerar, processar e aplicar de forma eficiente a informação com base nos conhecimentos. Considerada global, porque as principais atividades produtivas, o consumo e a circulação, assim como seus componentes (capital, trabalho, matéria prima, administração, informação, tecnologia e mercado), estão organizados em escala global, diretamente ou mediante uma rede de conexões entre agentes econômicos. E como rede, porque dentro das novas condições históricas a produtividade é gerada, e a concorrência é feita em uma rede global de interação entre redes empresariais. Essa nova economia surgiu no último quartel do século XX, em razão da revolução da tecnologia da informação que forneceu a base material indispensável para sua criação (CASTELLS, 1999). Esse contexto também é salientado por Vitorino e Piantola (2009) quando afirmam que os novos paradigmas de velocidade e transformação que configuram a sociedade remetem a novas demandas, novas relações entre o indivíduo, a informação e o saber, caracterizado 104 pelo aprendizado permanente ao longo da vida. Consequentemente, despontam novas tendências educacionais de aprendizado constante e urgente, voltadas ao desenvolvimento de habilidades e competências para o uso dos recursos informacionais de forma eficiente, eficaz e crítica. Desta forma, entende-se que o desenvolvimento da sociedade da informação e a multiplicação das possibilidades de acesso a dados e fatos, devem ser “supridos” pela educação, pois esta deve preparar os indivíduos a fim de permitir que todos possam coletar, selecionar, ordenar, gerenciar e utilizar esse volume de informações e servir-se dele (DELORS, 2010). Campello (2009) corrobora com essa reflexão ao afirmar que o conceito de letramento informacional foi associado à aprendizagem independente, considerando os propósitos do aprender a aprender, aprendizagem ao longo da vida, aprendizagem por questionamento, aprendizagem para a solução de problemas, pensamento crítico. Este mesmo autor afirma que o letramento informacional está diretamente associado às ações pedagógicas do processo de ensino-aprendizagem do século XXI, na denominada Sociedade da Informação ou Sociedade do Conhecimento e da Aprendizagem. Destaca ainda que, a aplicação do conceito está relacionada a identificar e compreender as características da pessoa competente no uso da informação. Para a compreensão sobre o letramento informacional, é fundamental entender o que vem a ser dado, informação e conhecimento, pois integram a definição dessa expressão, em especial a informação, por ser o elemento central do letramento informacional. 105 Quadro 8.1 Conceitos de dado, informação e conhecimento Dado Conjunto de elementos (as partes) de determinado fato observado, distribuídos a partir de sua relevância e natureza, sem qualquer significação Informação Organização de um dado, realizada por meio da mediação humana, integrada por métodos lógicos e de análise de dados Conhecimento Resultado dos processos cognitivos que ocorrem na mente humana, ou seja, o produto das informações com as experiências, valores e aprendizados daquele que está gerando sua origem Fonte: elaborado pelos autores a partir de Sordi (2015) Conforme a American Library Association – ALA (1989), o letramento informacional está relacionado com o uso de uma informação, isto é, uma pessoa deve saber identificar quando precisa de determinada informação, onde pode encontrar essa informação e como pode usar de forma adequada a informação selecionada. Nota-se que esse conceito está relacionado com o desenvolvimento de capacidades em um indivíduo, capacidades estas que devem ser desenvolvidas dentro dos programas e currículos das escolas, pois as pessoas letradas em informação: [...] são aquelas que aprenderam como aprender. Elas sabem aprender porque sabem como o conhecimento é organizado, como encontrar a informação e como usá-la de modo que outras pessoas possam aprender a partir delas. São pessoas preparadas para aprendizagem ao longo da vida porque elas sempre encontram as informações necessárias para qualquer tarefa ou decisão (ALA, 1989, p.1, tradução nossa). De acordo com o que a ALA (1989) considera, o letramento informacional é a base para o aprendizado, sendo comum a todas as disciplinas, ambientes de aprendizagem ea todos os níveis de ensino. Deste modo, permite ao estudante maior autonomia e a realização de pesquisas mais abrangentes, assumindo maior controle sobre a aprendizagem. Neste contexto, Pozo e Angón (2000, p. 53) relacionam cinco procedimentos que correspondem a cinco etapas do processamento da informação no processo de aprendizagem, nas quais o aluno deve ter, 106 para o exercício de sua autonomia, as seguintes competências: 1. Aquisição da informação: deve ser capaz de saber onde buscar, selecionar e incorporar a nova informação. 2. Interpretação da informação: deve ser capaz de transformá-la em outros códigos ou linguagens. 3. Análise da informação: capacidades para extração de dados mediante interferências, análises e investigações. 4. Compreensão da informação: deve saber relacionar a nova informação com conhecimentos prévios, para extrair a máxima significação. 5. Comunicação da informação: os conhecimentos gerados devem ser comunicados e para isso acontecer ele deve dominar outros procedimentos para a transmissão da informação. Dudziak (2003) define o letramento informacional como um processo interno que ocorre em um indivíduo, que desenvolve continuamente fundamentos relacionados aos conceitos, atitudes e habilidades importantes para que possa entender e se relacionar com o universo dinâmico das informações, proporcionando assim, um aprendizado ao longo de toda sua vida. As bases fundamentais deste conceito são o processo investigativo, o aprendizado ativo, o aprendizado independente, o pensamento crítico, o aprender a aprender e o aprendizado ao longo da vida. O letramento informacional emerge como um grande aliado no processo de ensino e aprendizagem nas abordagens que envolvem o uso e domínio da informação, tais como: identificação das necessidades de determinada informação; conhecimento das fontes; elaboração das estratégias de busca; localização da informação; avaliação da informação; interpretação da informação; síntese e comunicação; e apresentação da informação. Assim, compreende-se que pode ser considerado letrado em informação, aquele indivíduo que passou pelos processos de aprendizagem necessários para desenvolver tais capacidades e principalmente a competência em informação (BELLUZZO, 2018; GASQUE, 2020). Conforme os estudos sobre o letramento informacional são aprimorados, observa-se a evolução das definições apresentadas pelos autores que se dedicaram a compreender mais sobre o fenômeno e, 107 consequentemente, apresentar uma definição sobre este. O Quadro 8.2 apresenta uma breve síntese sobre letramento informacional. Quadro 8.2: Síntese sobre letramento informacional. AUTOR (Ano) DEFINIÇÃO ALA (1989) Refere-se ao uso de uma informação. Uma pessoa deve saber identificar quando precisa de uma informação, onde pode encontrá-la e como pode usar de forma adequada a informação selecionada. Castells (1999) Caracteriza aspectos da sociedade globalizada, centrada no uso e aplicação da informação. ALA (2000) É a base para o aprendizado, comum a todas as disciplinas, ambientes de aprendizagem e níveis de ensino. Dudziak (2003) Processo interno que ocorre em um indivíduo ao longo de toda sua vida, que desenvolve conceitos, atitudes e habilidades fundamentais para que entenda o universo dinâmico das informações. Campello (2009) Caracteriza a pessoa competente no uso da informação. Gasque e Tescarolo (2010) Conjunto de competências que integra ações de localizar, selecionar, acessar, organizar, usar informação e gerar conhecimento, objeto da aprendizagem, visando à tomada de decisão e resolução de problemas. Gasque e Fialho (2017) Uma nova forma de aprendizado que desenvolve capacidades para acessar, recuperar, apreender e gerenciar a informação. Fonte: Elaborado pelos autores (2021). 108 Compreende-se o letramento informacional como uma expressão que denomina um campo de estudo centrado na informação desde a sua origem, integrado por diversas compreensões sobre a sua definição conforme apresentado no Quadro 8.2, notadas como integrantes de bases de pensamento relacionadas à cognição humana e à aprendizagem. A base da cognição está vinculada às definições que referenciam os processos de desenvolvimento de capacidades e habilidades realizados por um indivíduo para a aquisição de conhecimentos, como pode ser observado nas definições apresentadas pelos autores ALA (1989), Castells (1999), Dudziak (2003), Campello (2009), Gasque e Tescarolo (2010). A base de aprendizagem pode ser percebida nas definições que associam o letramento informacional a aspectos de interação do indivíduo que geram aprendizado, conforme apresentado por ALA (2000). Já as definições integradas pelas duas bases destacadas - cognição e aprendizagem, podem ser vistas nas definições dos autores Gasque e Fialho (2017). Desenvolvimento da competência informacional Para Carvalho (2016), o letramento informacional é uma condição para o desenvolvimento da competência em informação, a qual deve ser desenvolvida durante todo o período escolar para que o indivíduo tenha condições de tomar decisões, definir conteúdos de interesse, buscar subsídios para suprir as próprias necessidades informacionais e atuar de forma colaborativa em sociedade. Assim, a competência em informação seria um resultado prático do letramento informacional. Isso reforça a compreensão de letramento informacional totalmente relacionada com a aquisição da competência em informação, definida por Perrenoud (1999, p.7), como “a capacidade de agir eficazmente em um tipo de situação, capacidade que se apoia em conhecimentos, mas sem limitar-se a eles”. ACRL (2000) compreende que a competência em informação estende a aprendizagem para além das configurações formais da sala de aula, fornece instrumentos para investigações autodirigidas dado suporte informacional à medida que os indivíduos progridem em suas carreiras profissionais, assumem crescentes responsabilidades em todas as áreas da vida, visto que o letramento informacional aumenta a 109 competência dos alunos em avaliar, gerenciar e usar as informações. Belluzzo (2018, p.39) apresenta três diferentes concepções para a competência em informação: (1) Digital: concepção com ênfase nas tecnologias da informação e comunicação; (2) Informação propriamente dita: ênfase nos processos cognitivos; (3) Social: com ênfase na inclusão social, consistindo em uma visão integrada de aprendizagem ao longo da vida e do exercício da cidadania. Dudziak (2011) propôs um ciclo de competência informacional composto de sete etapas. Trata inicialmente sobre a conscientização da necessidade da informação, na sequência a atitude de busca, mobilização de conhecimentos e habilidades para a construção da estratégia de pesquisa, seleção da informação por meio da reflexão e análise crítica, organização e utilização da informação, para conduzir ao aprendizado e produção do conhecimento individual e coletivo, podendo inclusive ser armazenado para futuro reuso. Apresentado na Figura 8.1. Figura 8.1: Ciclo da competência informacional Fonte: Adaptado de Dudziak (2011, p. 176). Nota-se que como um ciclo, não possui uma fase de saída ou finalização da constante avaliação da necessidade de uso da informação. Algo totalmente importante no atual cenário da sociedade, pois, conta diariamente com uma enorme gama de informações que precisam ser avaliadas antes de serem utilizadas ou armazenadas. Este ciclo pode ser considerado um poderoso recurso para ser adotado nos processos de ensino e aprendizagem nos ambientes escolares. Salienta-se o que é percebido por Gasque (2010, p.84) quando este 110 destaca que “embora esses conceitos (i.e. o letramento informacional e a competência em informação) estejam relacionados entre si, não devem serempregados como sinônimos, na medida em que representam ações, eventos e ideias distintos”. Desta forma, é fundamental que esteja consolidada a compreensão de cada termo a fim de entender esse fenômeno do letramento dentro do contexto do ensino e aprendizagem no ambiente escolar. Modelos de letramento informacional Os modelos de letramento informacional são considerados instrumentos de apoio para o desenvolvimento do letramento informacional, bem como das competências necessárias para um indivíduo ser considerado como letrado (GASQUE, 2020). Gasque (2020) entende que para um estudante adquirir as competências necessárias para ser considerado letrado em informação, deve ser exposto a conteúdos de aprendizagem que desenvolva nele conceitos, procedimentos e atitudes, vinculados aos modelos de letramento informacional. A autora aponta que os modelos de letramento informacional podem ser considerados flexíveis, rígidos e alguns com até mais conteúdos de aprendizagem do que outros. A ALA (1989) publicou um relatório enfatizando a importância do letramento informacional e que este poderia ser alcançado por meio de um novo modelo de aprendizagem, denominado aprendizagem baseada em recursos (resource-based learning). Não se trata de um novo currículo de estudos, mas sim de uma reestruturação do processo de aprendizagem, baseado nos recursos de informação disponíveis para resolver os problemas ao longo da vida. Esse processo de aprendizagem envolve ativamente os alunos nas seguintes etapas e essa reestruturação do processo de aprendizagem não apenas aprimora as habilidades de pensamento crítico dos alunos, mas também os capacita para a aprendizagem ao longo da vida e para o desempenho efetivo das responsabilidades profissionais e cívicas. Como pode ser observado na Figura 2. 111 Figura 8.2: Processo de aprendizagem baseada em recursos Fonte: Adaptado de ALA (1989). A busca e o uso da informação em ambiente escolar são estudados pela autora norte-americana Kuhlthau (1996) que desenvolveu o modelo chamado de Information Search Process – ISP, modelo baseado na teoria construtivista de aprendizagem, (especialmente em John Dewey e Jerome Bruner) e na dimensão afetiva (George Kelly). A abordagem, baseada em três aspectos do processo de aprendizagem pela busca e uso de informação, são: os pensamentos que ocorrem durante o processo (dimensão cognitiva), os sentimentos que tipicamente acompanham a evolução do pensamento (dimensão afetiva) e as ações de buscar e usar fontes de informação (dimensão física), compondo-se de seis estágios: início do trabalho, seleção do assunto, exploração do foco, definição do foco, coleta de informações, apresentação dos resultados, mais a avaliação do processo (CAMPELLO, 2009). Kuhlthau (1996) utilizando o modelo ISP, investigou os sentimentos, os pensamentos e ações dos alunos durante suas experiências em projetos de pesquisa, descobriu que as emoções influenciam os comportamentos na busca de informações dos alunos e estes progridem em seis estágios: 1. Iniciação - Iniciando um trabalho de pesquisa, sentimentos de incerteza; 2. Seleção - Selecionando um tópico, otimismo; 3. Exploração - Explorando informações, desenvolver conhecimentos básicos sobre o tema, ideias de interesse, sentimentos de inconsistências, confusão, incompatibilidades; 4. Formulação - Definição do foco, da área de concentração, confiança aumenta; 112 5. Coleta - Coletando informações sobre o tema, construção de um entendimento, sentimento de confiança; 6. Apresentação - Apresentação dos resultados, os alunos que constroem suas ideias ao coletar informações estão mais preparados para escrever e apresentar, sentimento de satisfação ou desapontamento. O letramento informacional deve ser implantado no processo de aprendizagem de modo sistematizado e formal no currículo ao longo da educação básica e, mais adiante, no ensino superior, seguindo o indivíduo em seus permanentes processos de aquisição do conhecimento, pois considera-se possível ensinar conceitos necessários ao letramento informacional por toda a vida. Desde tenra idade, os aprendizes podem ter noções sobre autor, títulos, ilustradores e ilustrações, ordem alfabética, coleta de dados, leitura com imagens, assim como podem diferenciar livros de ficção e não ficção, e aprender a usar a biblioteca escolar. Esse período, predominantemente caracterizado pelos primeiros contatos com os suportes de informação e pela compreensão de conceitos relacionados às práticas de busca e uso da informação, pode ser denominado como alfabetização informacional (GASQUE, 2010; 2012). Le Coadic (2004) aprofunda as reflexões sobre o tema quando sugere a criação e introdução de uma disciplina desde o ensino básico, para o desenvolvimento de conhecimentos e habilidades necessárias para o domínio e manejo da informação, isto porque, para dominar a informação é preciso “aprender a se informar, aprender a informar, ou seja, aprender a pesquisar, a usar a informação e a construí-la e comunicá- la” (LE COADIC, 2004, p. 114), sem deixar de considerar a relevância social que abarca o tema. Estas ações que envolvem o ensino básico e fundamental necessitam de uma análise crítica sobre as competências informacionais destes educadores, e isso revela, muitas vezes, deficiências em sua própria formação. Então, torna-se fundamental que os profissionais envolvidos no processo, sejam eles professores ou bibliotecários, tenham a capacitação adequada para atuarem como multiplicadores na promoção do letramento informacional no ambiente escolar e, para que isso aconteça, é necessário superar desafios como a mudança da cultura 113 pedagógica, a formação inadequada de professores, a organização curricular e a ausência de infraestrutura adequada de informação (LE COADIC, 2004; GASQUE, 2010; CARVALHO, GASQUE, 2018). Desta forma, a introdução no ensino da disciplina “informação”, com um quadro de professores especializados, seria a garantia de ingresso dos alunos na sociedade da informação. Permitiria lutar contra esse considerável analfabetismo informacional e contra um crescente iletrismo informacional, e, portanto, suprir a distância que hoje separa os inforicos dos infopobres (LE COADIC, 2004, p. 113) É necessário pensar no letramento informacional como um programa transversal aos conteúdos de sala de aula. Reforça-se o letramento informacional como uma responsabilidade compartilhada pelos diversos profissionais e educadores da escola - professores, coordenadores, assessores, orientadores e bibliotecários - em um esforço de mediação formativa a ser sistematizado no Projeto Político Pedagógico e operacionalizado na matriz curricular das escolas desde a educação básica até as universidades, realizando a integração dos conteúdos de busca e de uso da informação com os conteúdos disciplinares (GASQUE, 2010). O ensino ao longo dos anos, assume proporções que vão além da sala de aula, pois afetam diretamente a sociedade. Ao garantir que os indivíduos tenham as habilidades intelectuais de raciocínio e pensamento crítico, e ajudando-os a construir uma estrutura para aprender a aprender, faculdades e universidades fornecem a base para crescimento contínuo ao longo de suas carreiras, bem como em seus papéis cidadãos e membros de comunidades. O letramento informacional é um componente-chave e colaborador da aprendizagem ao longo da vida (ACRL, 2000, p.4). Com isso, entende-se que esse ensino ao longo dos anos, trará grandes contribuições para uma importante fase da vida acadêmica, o ensino superior. No qual o estudante passa a desenvolver habilidades e competências para atuar com pesquisas de base científica. Significa dizer que estarão mais aptos para o exercício dessa importante atividade que devolve para a sociedade produtos como resultadosdo conhecimento, com aplicações práticas na vida cotidiana. 114 Letramento digital É fundamental que um indivíduo seja letrado em informação, pois este proporciona “o desenvolvimento de competências para buscar e usar criticamente a informação disponível em vários suportes e canais - impressos e eletrônicos” (AZEVEDO, GASQUE, 2017, p. 168). Além disso, o letramento informacional fornece o equilíbrio necessário entre os recursos tradicionais e os digitais. Ao considerar a multiplicidade de canais e mídias existentes, entende-se que diferentes canais vão exigir diferentes tipos de letramentos, ou seja, múltiplos letramentos (AZEVEDO, GASQUE, 2017). De acordo com Motta-Roth e Hendges (2010, p. 45), multiletramento (ou múltiplos letramentos) é a “[...] a habilidade de interagir com a pluralidade [...]”. Compreendem ser a interação dos leitores e produtores de textos, levando em consideração os diferentes canais, bem como a diversidade linguística e cultural. Denominada como pedagogia de multiletramentos por Rojo (2012), é entendida como a multiplicidade de significados (semiótica) encontrada nos textos em circulação social, já que a multimodalidade de textos impressos, mídias audiovisuais ou digitais também exigem múltiplos letramentos. Dentro deste aspecto de múltiplos letramentos apresentado, nota- se ser fundamental para o indivíduo usar adequadamente as informações que têm acesso, isto é, ser letrado em informação, pois refletirá no modo como utiliza um dos principais meios onde atualmente encontram-se as informações, o digital. O meio digital tem, cada vez mais, disponibilizado uma gama de informações que necessitam de avaliação e análise para serem utilizadas (CALDIN, BLATTMANN, 2020). Desde o século XX, a humanidade tem um novo cenário que se caracteriza como a sociedade da informação. Integrada por uma grande quantidade de informações disponibilizadas em vários suportes e contextos, exigindo de todos competências que vão além do saber acessar e usar uma informação disponível em diferentes canais, chegando a necessidade de um julgamento da informação para que seja considerada relevante, útil e confiável. Nessa atual sociedade, o centro das transformações gira em torno das revoluções nas tecnologias da informação, processamento e comunicação, denominadas Tecnologias 115 Digitais da Informação e Comunicação (TDIC) (CASTELLS, 1999; CALDIN, BLATTMANN, 2020). Com a constante das TDIC, observa-se uma chamada para o desenvolvimento de habilidades e competências para utilização desses meios. Barreto (1998, p. 126) evidencia essa significativa transformação ao afirmar que: [...] esta passagem da cultura tribal para a cultura escrita/tipográfica foi uma formação tão profunda para o indivíduo e para a sociedade, como está sendo a passagem da cultura escrita para a cultura eletrônica que ora presenciamos. Pressupõe-se desta forma que, da mesma maneira que a cultura escrita/tipográfica exigiu que os indivíduos passassem pela ação da alfabetização, a cultura eletrônica também exige uma ação de alfabetização, só que desta vez, digital. Assim, torna-se importante diferenciar a alfabetização digital do letramento digital. Buzato (2009) entende a primeira como a capacidade de leitura e escrita de arquivos e documentos dispostos em meio digital, enquanto que a segunda é algo mais amplo, está relacionada com as práticas sociais, culturais, bem como o desenvolvimento de habilidades de interpretação e compreensão do indivíduo nos meios digitais. Para o autor, o acesso às TDIC não é apenas uma referência ao uso de dispositivos digitais, mas uma ampliação do discurso sobre a inclusão digital denominada de forma restrita e leiga como “alfabetização digital” com a noção mais significativa de letramento. O termo letramento digital tem sua origem do inglês Digital Literacy, proposto por Gilster (1997) para descrever o conjunto de habilidades, conhecimentos e competências indispensáveis para um uso funcional e construtivo das TDICs. Carvalho (2009) compreende o letramento digital como o uso significativo de recursos digitais em situações diárias de interação social a partir de conhecimentos sobre tecnologia. De maneira a complementar, Ribeiro (2009, p. 30) acrescenta que o letramento digital é a “porção do letramento que se constitui das habilidades necessárias e desejáveis [a serem] desenvolvidas em indivíduos ou grupos em direção à ação e à comunicação eficiente em ambientes digitais”. Nota-se o letramento digital como uma prática que usa o ambiente das TDICs como 116 oportunidades para desenvolver interação, comunicação e sobretudo o compartilhamento de informações entre os indivíduos que estão nele. Gasque (2012) destaca que o desenvolvimento de competências do letramento digital deve considerar o refletir sobre como os processos de busca e uso da informação estão associados às práticas de leitura e escrita. Assim, na resolução de problemas, os indivíduos têm condições de compreender o motivo pelo qual aprenderam determinado assunto/conteúdo e em que situação devem e/ou podem aplicá-lo. Dudeney, Hockly e Pegrum (2016, p. 17), consideram o letramento digital como sendo as "[...] habilidades individuais e sociais necessárias para interpretar, administrar, compartilhar e criar sentido eficazmente no âmbito crescente dos canais de comunicação digital", interferindo não apenas nos processos de ensino e aprendizagem em sala de aula, mas também na forma como o aluno participa no mundo fora da escola. Os autores agruparam os elementos que entendem compor o letramento digital em quatro habilidades, a saber: Quadro 8.3: Habilidades do letramento digital Linguagem Saber fazer e compreender textos diversos, (físico na forma impressa ou digital na forma de hipertexto) multimídias (imagens, sons e vídeos). Informação Saber interpretar e criar recursos on-line, utilizar recursos de busca, compreender suas funções de pesquisa, avaliar dispositivos e recursos de forma crítica, avaliando a confiabilidade, origem e credibilidade. Conexão Saber gerenciar a participação em rede na internet, prezando por criar um perfil/identidade online, reputação em redes sociais. Reutilização Saber redesenhar e reutilizar conteúdos, para fins diferentes daqueles para os quais foram criados. Fonte: Elaborado pelos autores a partir de Dudeney, Hockly e Pegrum (2016) A Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura compreende o letramento digital como sendo a “habilidade de acessar, gerir, entender, integrar, comunicar, avaliar e criar informações de forma segura e apropriada por meio de equipamentos digitais” 117 (UNESCO, 2018, p. 6). Observa-se a presença dos elementos segurança e avaliação como parte de um processo de desenvolvimento de competências em informação que se inicia com o letramento informacional. O letramento digital é um assunto ainda pouco estudado no Brasil e entende-se que este é “fruto de pensamento crítico e busca potencializar os métodos de estudo pela tecnologia da informação” (BOERES, 2018 p. 484). Essa afirmativa relaciona-se com o que Caldin e Blattmann (2020, p. 679) entendem por letramento digital quando indicam que este “[...] pressupõe um conjunto de competências, habilidades e atitudes cujo domínio permite a compreensão e utilização dos conteúdos nos meios digitais de forma crítica e participativa”. De acordo com o discurso até aqui apresentado, entende-se que o letramento digital é um esforço necessário para desenvolver nos estudantes competências para o uso da informação disponível em ambientes tecnológicos. Esse esforço envolve o aluno que está em processo de desenvolvimento das competências e habilidades do letramento digital e também o professor e demais educadores responsáveis pelos processos didáticos de ensino eaprendizagem. Para Snyder (2009, p. 44), os educadores devem proporcionar aos estudantes “oportunidades cuidadosamente planejadas para que eles aprendam como podem se tornar navegadores críticos dentro do novo panorama do letramento em tempos digitais”. Portanto é, de forma planejada e não ocasional, que deve ser realizada a inserção dos alunos no meio digital para colaborar com o letramento deles. Esse importante papel do professor faz com que ocorra uma inversão do seu antigo papel de “informador” (aquele que detém e centraliza todo o conteúdo da aula) para um papel de coordenador do processo de aprendizagem, tendo como ações a sensibilização dos alunos para o conteúdo, canais onde será exposto o este conteúdo e a motivação para que percebam a importância do aprendizado deste conteúdo conectados às suas vidas (MORAN, 1997). Para Boeres (2018) o letramento digital transcende a necessidade de professor e aluno aprenderem a decodificar sinais ou realizar pesquisas na internet, pois é uma nova forma de pensar, compreender, assimilar e gerar novos conhecimentos. Significa o aprender de forma 118 constante a usar novas ferramentas e recursos para acompanhar a evolução tecnológica e informacional. Compreende-se desta forma que, da mesma forma como o letramento informacional deve acontecer ao longo da vida de um indivíduo, o digital segue o mesmo padrão devido às constantes mudanças tecnológicas. Assim, os chamados “nativos digitais” - indivíduos que já nasceram com telas digitais em suas mãos e usam diariamente recursos tecnológicos em suas vidas, possuem a mesma necessidade de serem letrados digitalmente do que um indivíduo considerado “imigrante digital” - aqueles que se adaptam diariamente as TDIC usando-as de modo limitado e mais ainda os “refugiados digitais” - os indivíduos que ignoram ou evitam a tecnologia. Salienta-se essa questão pois, um indivíduo considerado “nativo digital” quando colocado sob análise e investigação, não explora todos os recursos que as tecnologias oferecem, ou seja, falta-lhe o letramento digital para saber utilizar todas as potencialidades de determinado site da Web ou até mesmo de um smartphone. Isso se dá, porque não utilizam com vistas a adquirir competências educacionais ou informacionais, muitas vezes usam com fins de entretenimento ou para superficial busca por alguma dúvida/questão em motores de busca (SANTOS, 2019; CAMARGO, LIMA, TORINI, 2019). Considerações finais A supremacia das tecnologias digitais na atualidade nos mostra que essa permeabilidade tecnológica atingiu todos os segmentos da sociedade de forma irreversível. Com esse cenário, o letramento informacional e digital faz-se pertinente e necessário na jornada acadêmica dos estudantes de todos os níveis, visto que estes precisam desenvolver habilidades e competências para selecionar, analisar e utilizar as informações disponibilizadas a poucos cliques na internet. O indivíduo letrado na informação e nas tecnologias digitais têm recursos importantes para atender as demandas da sociedade da informação e do conhecimento à qual pertence, sendo capaz de percorrer pela multiplicidade tecnológica disponibilizada em ambientes sociais, educacionais e profissionais. Frente a essa realidade, os projetos desenvolvidos de forma 119 planejada, intencional e com investimentos tecnológicos adequados podem proporcionar uma formação ampla em todas as áreas do conhecimento. Alinhada aos propósitos preconizados pela UNESCO através dos ODS, em especial o de número 4 que se refere à educação inclusiva, equitativa e de qualidade, oferecendo acesso digital para a aprendizagem para todos e às competências destacadas na BNCC, principalmente quinta, Cultura Digital, promove, sem sombra de dúvidas, uma educação básica de qualidade, formativa e integrada com a sociedade do século XXI (BRASIL, 2017; UNESCO, 2018). Deve-se inserir, para o cotidiano escolar e nos processos de ensino e de aprendizagem, o uso desafiador e prático das tecnologias digitais com vistas a promover o letramento digital e informacional. A consequência natural será planejar ações pedagógicas capazes de preparar indivíduos habilidosos, competentes, autônomos e realizados, tanto pessoal como profissionalmente. Referências ACRL - ASSOCIATION OF COLLEGE AND RESEARCH LIBRARY (EUA). Information literacy competency for higher education. Chicago: ALA, 2000. Disponível em: http://www.ala.org/acrl/standards/informationliteracycompetency . Acesso em: 20 set.2019. ALA. American Library Association. Presidential Committee on Information Literacy: Final Report. 1989. Disponível em: http://www.ala.org/acrl/publications/whitepapers/presidential Acesso em: 2 set.2019. AZEVEDO, I. C. M. de; GASQUE, K. C. G. D. Contribuições dos letramentos digital e informacional na sociedade contemporânea. 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Formação de professores para atuar como guia/intérprete no ensino regular Tamyres de Fátima dos Santos 126 Introdução Estudantes com necessidades educacionais especiais (NEE) por muito tempo foram excluídos de qualquer participação na educação e ainda hoje precisam de ações para ter seus direitos garantidos. A sociedade, durante muito tempo, considerou qualquer pessoa que não se encaixasse em uma definição de normalidade como inútil e incapaz, não se preocupando, portanto, em criar serviços para sua capacitação, escolarização ou mesmo para atender suas necessidades individuais. Conforme algumas áreas do conhecimento, como a medicina e principalmente a pedagogia, foram se desenvolvendo, novas possibilidades para as pessoas com necessidades especiais foram vislumbradas. Em 1747, Jacob Rodrigues Pereira tentou ensinar surdos congênitos a se comunicar. Sua tentativa foi tão bem-sucedida que inspirou outros pesquisadores, em diversos países, a fazerem estudos com pessoas com outras deficiências. No entanto, apenas no início do séc. XIX surge a educação especial. Esta é caracterizada por promover a assistência e cuidados necessários às pessoas com deficiência. Tais pessoas passaram a partir de então a ter o direito de frequentar classes de ensino regular, porém em turmas especiais. Além disso, foram criadas instituições de ensino especializado. Apesar dessa tentativa de integração das pessoas com deficiência, estas ainda continuavam isoladas e entravam muitos entraves na busca de seus direitos, principalmente na educação. Na década de 1990 o cenário passou a mudar mais rapidamente, com os levantes de várias minorias sociais, e as pessoas com deficiência passaram a ganhar mais visibilidade nos espaços educacionais e contextos sociais a partir de legislações específicas. Um dos marcos que merece destaque, e até hoje é muito importante na luta pelos direitos destas pessoas, é a Declaração Mundial sobre Educação para Todos, aprovada em 1990 durante a Conferência Mundial sobre Educação para Todos realizada em Jomtien, na Tailândia. Apesar de a Constituição Federal de 1988 já apresentar a educação como direito de todos e conter algumas considerações sobre as pessoas com deficiência, o Atendimento Educacional Especializado (AEE) não se efetivou nesta época e a grande maioria das pessoas com deficiência 127 continuavaa não frequentar a escola regular. Em segundo lugar destaca- se a Conferência Mundial sobre Educação Especial na Espanha, em 1994, onde um documento foi elaborado com o propósito de oferecer orientações básicas para a concepção e reforma de políticas na educação de acordo com o movimento mundial de inclusão social. Trata-se da Declaração de Salamanca, assinado em 1994, que é um dos documentos mais importantes mundialmente na questão da educação inclusiva. A partir da Declaração de Salamanca o conceito de inclusão foi ampliado e passou a abarcar não só as pessoas com deficiência, mas qualquer pessoa que por algum motivo não conseguisse se adaptar à escola, ou seja, que tivesse alguma necessidade educacional especial. A partir dos anos 2000 surgem novas perspectivas para o cenário educacional das pessoas com NEE. Entre elas, a Lei nº 10.436/2002 que dispõe sobre a Língua Brasileira de Sinais reconhecendo-a como Língua e meio legal de comunicação e expressão nacional da comunidade surda (BRASIL, 2002). Nela foi decretado, além de outras coisas, o direito dos alunos surdos a um guia/intérprete que os acompanhasse em sala de aula no ensino regular. Apesar da lei, muitos entraves foram encontrados, como por exemplo algumas falhas na formação destes profissionais e a falta de pessoas habilitadas e capacitadas para trabalhar. Esses entraves causam grandes problemas à inclusão de pessoas surdas em classes regulares de ensino e por isso devem ser discutidas mais detalhadamente. A questão do Intérprete e da deficiência na formação Há tempos que a sociedade discute a questão inclusiva, e ultimamente a principal pauta é a da inclusão nas escolas regulares. Segundo a Política Nacional de Educação Especial na perspectiva da Educação Inclusiva (BRASIL, 2008), todos têm o direito a aprender e a se desenvolver em qualquer escola, a qual deve respeitar as diferenças, limites e dificuldades de cada estudante. O caminho para conquista dos direitos que hoje os deficientes têm garantidos foi imenso e cheio de grandes lutas por reconhecimento. No caso dos surdos, desde 24 de abril de 2002, quando foi sancionada a Lei de LIBRAS, (Lei nº 10.436/2002) é reconhecido não só o direito do aluno surdo à frequentar escolas regulares, como é seu direito ter um 128 guia/intérprete à sua disposição na sala de aula (BRASIL,2002). Escolas de todo o mundo, impulsionadas, sobretudo pela Convenção de Salamanca, tiveram que dar conta de incluir crianças que precisavam de ajuda em classes já existentes, muitas vezes com grande número de alunos e professores, cuja formação não havia se preocupado com esses aspectos. Neste momento, a opção para muitos foi colocar um profissional especializado na sala de aula. (MOUSINHO et. al., 2010, p. 2). Esse profissional é chamado de professor de apoio. No caso dos surdos, o professor de apoio é um intérprete. Deve-se salientar que o professor de apoio deve estar em sintonia com o professor regente e precisa ser encarado como um profissional que assume o papel de auxiliar na inclusão do aluno com deficiência, mas nunca o papel de professor principal da criança (SOUZA; VALENTE, 2015). O professor de apoio é parte importante do processo de aprendizagem e desenvolvimento da pessoa com deficiência, e, portanto, atua como um agente de mediação das intervenções realizadas pelo professor regente, intervindo na Zona de Desenvolvimento Proximal (ZDP), conceito postulado por Vygotsky (1998), estimulando a autonomia e a capacidade de se desenvolver, a partir de intervenções e adaptações curriculares (SOUZA; VALENTE, 2015). O problema, no Brasil, é que há ainda poucos cursos superiores de Língua Brasileira de Sinais (LIBRAS) e a demanda por intérpretes, não só no contexto escolar, é crescente. Nesse impasse, as escolas acabam aceitando profissionais sem formação superior na área e muitas vezes pouco capacitados e sem fluência. Como qualquer língua, a LIBRAS para ser interpretada depende da fluência do intérprete e do seu conhecimento lexical pois as línguas de sinais possuem um conjunto visual de regras gramaticais, natural dos surdos usuários desta língua. Elas são diferenciadas, ou seja, da mesma forma que as línguas orais, cada país possui a sua, e também apresentam regionalismos. Os documentos legais e de orientação disponibilizados pelo estado de Minas Gerais apontam como primeira opção para o cargo de professor de apoio ao surdo alguém que tenha licenciatura ou bacharelado em Letras-LIBRAS. Porém, caso não haja esse profissional pode se candidatar qualquer Licenciado com curso de LIBRAS maior que 160 horas realizado no CAS/MG. Os cursos chamados de nível D oferecidos pelos CAS 129 (Centros de atendimento à pessoa com surdez) não dão ao aluno essa fluência e sim uma breve noção da língua, o que não é nem remotamente suficiente para que se consiga interpretar uma aula. Ademais, os cursos de Licenciatura e Bacharelado em Letras- Libras possuem muita teoria e pouca prática, o que acarreta na pouca experiência dos profissionais para lidar com os surdos (SOUZA, 2010). Os poucos que conseguem a fluência preferem trabalhar como intérpretes em outros ambientes que não sejam a escola, pois a remuneração e reconhecimento é maior. Os professores de apoio são vistos como coadjuvantes e ganham muito pouco se comparado à quantidade de estudos que é necessário para se tornar um profissional de excelência. É verdade que com a Lei 10.436/02 também ficou instituído que qualquer curso de licenciatura deve ter uma matéria de Libras. Porém ela é muito superficial, pois não há como aprender tudo em apenas um semestre, nem mesmo saber o mínimo necessário. Nesse sentido, opta-se por uma disciplina mais generalizada e que contemple mais a história dos surdos e suas particularidades, e assim sendo os professores regentes não têm como ajudar os intérpretes. O ideal era que existisse além da disciplina básica de LIBRAS, uma disciplina que contemplasse os principais sinais de cada curso, como por exemplo LIBRAS para química ou LIBRAS para biologia. Para Facion (2009): Para que isso transcorra com coerência e sabedoria, é necessário que haja uma redefinição do papel da escola e, consequentemente, dos professores e dos demais agentes educativos. Estes precisam estar devidamente preparados para assumir novos valores profissionais que abranjam, além de uma prática diferenciada, um conhecimento pedagógico, científico e cultural transformador, voltado às características individuais dos seus alunos. (p. 168) Esse é um grande problema, pois o aluno surdo necessita da tradução fiel e detalhista de cada matéria para compreendê-la. Sem fluência, como o profissional fará? Além disso, mesmo os profissionais capacitados têm dificuldade com palavras específicas das matérias como física, biologia, química e matemática, o que faz com que os surdos tenham muita dificuldade nessas matérias (OLIVEIRA; BENITE, 2015). Essas disciplinas contam com um repertório de palavras muito específicas que muitas vezes não têm sinal em LIBRAS ou o sinal é muito pouco conhecido. Pensando em diminuir essas dificuldades, em 2019 foi 130 publicado e compartilhado nas redes sociais um dicionário de sinais de biologia e a Universidade Federal do Piauí tornou público um arquivo com sinais para ciências. Essas iniciativas contribuíram muito com os profissionais desta área em pensar novas práticas para os alunos, assim como ajudou os intérpretes com a tradução e interpretação dos termos técnicos. Mais iniciativas como esta deveriam ser incentivadas para que haja a inclusão real dos alunos e melhor compreensão da disciplina por eles. Percebe-se então, olhando esse panorama geral, como é deficitária a formação e a escolha de profissionais para atuar como intérpretes em sala de aula, o que nos faz refletir também sobre a formação dos licenciados.Os licenciados precisam agir em conjunto com os intérpretes para oferecer o melhor tipo de ensino aos seus alunos, ajudando-os a vencer suas dificuldades. Salienta-se também que o processo de integração desses profissionais não é alcançado com facilidade ou rapidez apenas pela instauração de uma lei. Este é um processo que exige uma série de medidas gradativas de reformulação do ensino que deveriam começar pelos já citados currículos e métodos. Segundo Facion (2009): Acreditamos ser de extrema relevância preparar o professor para os novos desafios da educação. A promoção de uma postura reflexiva e crítica, por meio da apropriação de conhecimentos, proporcionará a esse profissional condições de se posicionar e atuar com responsabilidade e autonomia, reivindicando uma educação que respeite os ideais de uma sociedade justa e democrática. (FACION, 2009: p.166) Ou seja, faz-se necessário apostar na formação continuada tanto dos professores regentes de turma quanto dos intérpretes. Porém observa-se que grande parte dos professores se esquiva dessa formação, o que nos faz refletir sobre quais seriam os entraves que os fazem desistir de dar continuidade aos estudos. Acredita-se que muitos sejam os motivos para essa não continuidade na formação, como por exemplo a falta de tempo, o cansaço, a falta de dinheiro para investimento, entre tantas outros. Mas assim como afirma Romanowski (2007) acredita-se que: A formação continuada é uma exigência para os tempos atuais. Desse modo, pode-se afirmar que a formação docente acontece num continuum, 131 iniciada com a escolarização básica, que depois se complementa nos cursos de formação inicial, com instrumentalização do professor para agir na prática social, para atuar no mercado de trabalho; continua ao longo da carreira do professor pela reflexão constante sobre a prática, continuidade dos estudos em cursos, programas e projetos. (p. 138) Entende-se que um bom programa de formação continuada é aquele que faz com que o professor reflita sobre sua prática, pois a reflexão ajuda na tomada de consciência dos problemas na prática do ensino e estimula a mudança de postura. O professor intérprete, assim como o regente, devem sempre acreditar no potencial de seus alunos e criar métodos para que todos consigam aprender, independentemente de suas particularidades. Agora mais do que nunca, esses debates sobre a formação de intérpretes são necessários, pois o atual governo brasileiro (2019-2022) propôs a criação de escolas bilíngues português-LIBRAS. E as perguntas que ficam são: teremos profissionais gabaritados para isso? A formação de intérprete ou Licenciado em Letras-LIBRAS dará conta dessas classes? Os Licenciados terão um curso de capacitação para atuar como professores bilíngues? Acredita-se que, primeiramente, deve-se rever a formação dos profissionais que queiram trabalhar como intérpretes para não prejudicar ainda mais a formação dos alunos surdos. E em seguida deve-se apostar na formação continuada desses profissionais. Nas últimas décadas têm-se falado muito em inclusão, mas a verdadeira inclusão ainda não foi alcançada. Para que ela ocorra necessitamos de um maior esforço por parte da sociedade e uma reconstrução nos currículos escolares, desde a base até o ensino superior, além de políticas mais definidas quanto à contratação de professores regentes e de apoio. A capacitação desses profissionais e sua proficiência é de extrema importância e fará toda diferença no sucesso escolar dos alunos, sejam eles surdos ou não. 132 Considerações Finais Nos últimos anos a inclusão tem sido um tópico cada vez mais frequente nos debates sociais. O uso do termo inclusão, feito muitas vezes de maneira equivocada, contribui para que a palavra vá perdendo seu significado histórico/cultural e se torne vazia de significado social. Muito foi conquistado pelas pessoas com deficiência, principalmente os surdos, mas ainda há muito o que lutar. Ter um intérprete presente nas salas de aula de ensino regular para fazer a tradução simultânea do que é falado em aula é de direito dos alunos surdos e dever do Estado. Porém, como discutido, a existência da lei não garante sua efetivação. A defasagem nos cursos de formação dos profissionais intérpretes têm causado sérios problemas à educação dos surdos como a dificuldade em certas disciplinas por não entenderem os termos técnicos ou mesmo não ter uma tradução/interpretação clara e detalhista da matéria que está sendo lecionada. Além disso, sofremos com a falta de profissionais que queiram trabalhar na escola, pois é um serviço de grande desgaste físico, mental e psicológico, possui baixa remuneração e quase nenhuma visibilidade. Quanto a isso, recomenda-se a promoção destes profissionais e um maior incentivo por parte do governo para formação continuada destes. Sabe-se que a luta pela inclusão é diária e deve ser incansável, pois uma escola inclusiva contribui para o ensino não só dos alunos deficientes, como de todos os alunos. E esses alunos são o futuro da nação, portanto se queremos um país mais justo e igualitário, é neles que devemos investir. Para isso é necessário engajamento social, boa formação de nossos profissionais de ensino e mudança nas políticas públicas e no currículo escolar. Referências BRASIL. Lei 10.436, de 24 de abril de 2002. Dispõe sobre a Língua Brasileira de Sinais - Libras e dá outras providências. Diário Oficial da União, Brasília, DF, 2002. Disponível em:< http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/2002/l10436.htm> Acesso em 12 set. 2021. BRASIL. Ministério da Educação/Secretaria de Educação Especial. Política 133 Nacional de Educação Especial na Perspectiva da Educação Inclusiva. Brasília: MEC, 2008c. Disponível em<https://portal.mec.gov.br/arquivos/pdf/politicaeducespecial.pdf > 26 set. 2021. FACION, José Raimundo. (Org.). Inclusão escolar e suas implicações. Curitiba: Ibpex, 2009. MOUSINHO, R; SCHMID,E; MESQUITA, F; PEREIRA, J; MENDES, L; SHOLL, R & NÓBREGA, V. Mediação Escolar e inclusão: revisão, dicas e reflexões. Revista de Psicopedagogia, São Paulo, vol 27, nº 82, 2010, p. 02-08. 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Neste trabalho procura-se descrever as características da Síndrome de Asperger e as dificuldades encontradas pelo indivíduo portador dessa síndrome nas escolas tanto regulares quanto as consideradas especiais. É pensando nisso que esse estudo relaciona as informações contidas na literatura, consecutivamente confrontando com a realidade sobre Inclusão Escolar. Partindo dessa realidade, faz-se necessário que avaliemos as condições que demarca quem é e quem não é peculiar à síndrome de Asperger e que, portanto, acabam fundamentado filosoficamente e ideologicamente a própria natureza da educação especial que praticamos. Isso por uma razão bem simples: se os processos de desenvolvimento são peculiares nas “crianças especiais”, consequentemente, também o serão os de aprendizagem e, contudo, também devem sê-lo, os conceitos de adaptação e de normalidade que fundamentam a educação especial. Assim, o espaço escolar deve vislumbrar como objetivo uma interação e flexibilidade, onde o aluno sinta-se mais acolhido, tanto na dificuldade, quanto na aprendizagem. Assim como defende Ribeiro (2003, p. 41), “a perspectiva da inclusão exige o repensar das condições da prática docente e de suas dimensões, bem como de suas repercussões na organização curricular e na avaliação”. Ainda na linha de pensamento desta autora, a educação nunca deixará de ser especial. Pelo contrário, ela o será para todos. E o mundo também será especial, quando olhar com dignidade e respeito para a especificidade de cada um. Neste sentido, a proposta atual da educação está pautada na construção de uma escola fundamentada nos princípios de cooperação e inclusão, por considerar que estas são proposições que abrem a possibilidade de um novo pensar sobre o projeto político-pedagógico, onde os pilares da Educação fundamentada por Jacques Delors (1999) 136 configuram a importância do aprender a fazer para um novo século educacional. Desse modo, a proposta de Inclusão Educacional deve ser incondicional e, portanto, não admite qualquer forma de segregação, o que ainda não acontece. Esta opção de inserção, que tem como meta principal não deixar nenhum aluno fora do ensino regular. Isto porque, todos têm o direito de desenvolver-se em ambientes que não os discriminam, mas que procuram conviver e trabalhar com as diferenças, respeitando seus comprometimentos e limitações. Diante dos desafios que a Educação enfrenta nos dias atuais, diferencia-se entre eles o começo da Escola Inclusiva, onde o educador assume a responsabilidade de ser o facilitador desse processo. Nessa definição, a complexidade da problemática que envolve a inclusão vem instigando pesquisadores dessa área de informação. Entendida como um dos requisitos básicos para a inclusão de alunos com necessidades educacionais especiais, a formação docente parece depender de sólido corpo de estudos capaz de fundamentar as diretrizes para a prática docente. O que é Autismo? A palavra “autismo” foi criada por Eugene Bleuler, em 1911, para apresentar um sinal da esquizofrenia, que definiu como sendo uma “fuga da realidade”. Sua descrição veio à tona com o médico austríaco Leo Kanner em 1943. O autismo é definido como uma alteração cerebral que afeta a capacidade da pessoa se comunicar, estabelecer relacionamentos e responder apropriadamente ao ambiente. Algumas crianças apesar de autistas apresentam inteligência e fala intactas, outras apresentam também retardo mental, mutismo ou importantes retardos no desenvolvimento da linguagem. Alguns parecem fechados e distantes, outros presos a comportamentos restritos e rígidos padrões de comportamento. Muitas das pessoas que sofrem de autismo vivem num "mundo" à parte, interagindo com coisas que eles imaginam. É como se criassem o seu próprio mundo (KUCZYNSKI; ASSUMPÇÃO JR., 1998). Enquanto Kanner e Asperger utilizaram a palavra para nomear os 137 sintomas que eram observados em seus pacientes. Embora o grande número de estudos e investigações realizadas em diversas áreas e abordagens de trabalho, não se pode dizer que o autismo é um transtorno claramente definido. Há correntes teóricas que apontam as alterações comportamentais nos primeiros anos de vida como relevantes para definir o transtorno. Segundo Olivier (2006, p. 111), “o autismo é entendido como um distúrbio que pode variar do grau leve ao severo, sendo considerado como limítrofe, em casos leves”. Alguns indivíduos podem apresentar traços autísticos e outros como portadores da Síndrome de Asperger, que é um tipo de autismo de alta funcionalidade. Na visão desta autora “autismo pode ser associado a diversas síndromes e que deve ser visto com cuidado”, pois, o número de erros de diagnóstico é muito grande em decorrência das características de cada síndrome. O sujeito autista depara-se com falhas no diálogo, na interação social e no pensamento, e, como implicação vem às dificuldades de comportamentos. Na visão de Olivier (2006, p. 112), “como falha e dificuldade qualitativa da comunicação, pode-se dizer que é a dificuldade em utilizar, com sentido, todos os aspectos da comunicação verbal e não verbal”. O portador de autismo apresenta em muitos quadros quociente de inteligência abaixo da média, esse transtorno vai além de fronteiras geográficas e sociais, enfim, ocorre no mundo inteiro independente de classes sociais e econômicas. Cintra (1988, p. 38), em seu artigo, ressalta que Ritvo (1976) adverte que a “Síndrome Autística é decorrente de uma patologia específica do Sistema Nervoso Central e propôs diagnóstico diferencial”. Esse Transtorno Autístico é definido pelo DSM V (Associação Americana de Psiquiatria) como: “Presença de um desenvolvimento acentuadamente anormal ou prejudicado na interação social e comunicação e um repertório marcante restrito de atividades e cronológica do indivíduo”. O autismo é comumente diagnosticado por um médico neuropediatra ou por um psiquiatra especializado em autismo. Ainda não se tem uma causa específica, mas há várias suspeitas de prováveis 138 motivos, dentre eles a contaminação por mercúrio e outros metais pesados como possíveis causas. O que é a Síndrome de Asperger? A Síndrome de Asperger (SA) foi descrita pelo pediatra e psiquiatra austríaco Hans Asperger, em 1944 (um ano após o primeiro trabalho de Leo Kanner em autismo). O Dr. Asperger discutiu em seu trabalho quatro indivíduos que exibiam comportamentos alterados principalmente na tríade: comportamento, interação social e linguagem. Apesar de ter as habilidades intelectuais preservadas, as crianças apresentavam uma notável pobreza na comunicação não verbal, que incluía tanto gestos como tom afetivo da voz, empatia pobre e tendência a intelectualizar as emoções (KLIN, 2006). O autismo e a Síndrome de Asperger são os mais conhecidos entre os transtornos invasivos do desenvolvimento (TID), se caracterizando por um conjunto de fatores que levam ao desvio no desenvolvimento das habilidades sociais, comunicativas entre outras. Em relação ao transtorno de Asperger, esse é o termo aplicado ao mais suave e de alta funcionalidade espectro de desordens pervasivas (presentes e perceptíveis a todo tempo) de desenvolvimento (ou espectro de autismo). A Síndrome de Asperger é também chamada “Desordem de Asperger” é uma categoria relativamente atual no meio das chamadas desordens de desenvolvimento. Parece representar uma desordem de desenvolvimento neurologicamente baseada, muito frequentemente de causa ainda desconhecida na qual há desvios e anormalidades em três amplos aspectos do desenvolvimento: dificuldade de interação social e empatia; interpretação literal da linguagem; dificuldades com mudanças e postura estranha. (VOLKMAR, 1988) Esta síndrome é considerada uma desordem do fim do espectro do autismo. Comparando indivíduosdentro desse espectro nota-se que crianças com autismo de baixa funcionalidade "vivem em seu próprio mundo”, enquanto que crianças com autismo de alta funcionalidade "vivem em nosso mundo”, mas do seu próprio jeito. Segundo Volkmar (1988, p. 513), “A Síndrome de Asperger difere do autismo no sentido de que está associada com níveis superiores de habilidades cognitivas e ausência de sinais de disfunção do SNC; preocupações incomuns e altos 139 graus de egocentrismo são comuns”. Evidentemente, nem todas as pessoas portadoras desta síndrome são diferentes. Exatamente porque cada sujeito com SA tem sua própria personalidade, sintomas da SA se manifestam de forma peculiar para cada indivíduo. A Síndrome de Asperger é qualificada pelo DSM-V como: “Transtorno Invasivo do Desenvolvimento, marcado por danos severo e invasivo em diversas áreas do desenvolvimento: habilidades de interação social recíproca, habilidades de comunicação, ou presença de comportamento, interesses e atividades estereotipadas”. Os prejuízos qualitativos que definem essas condições representam um desvio acentuado em relação ao nível de desenvolvimento ou idade mental do indivíduo. De acordo com o Volkmar (1988, p. 516), pessoas com Síndrome de Asperger habitualmente têm inteligência média ou acima da média, mas fracassam em pensamentos de alto nível e habilidades de compreensão. Tendem a ser muito literais: suas imagens são concretas, a abstração é pobre. Seu jeito pedante de falar e espantoso léxico dão a falsa impressão de que entendem daquilo que estão falando, quando em verdade estão simplesmente reproduzindo o que leram ou ouviram. O sujeito com SA comumente tem extraordinária memória, mas isso é de caráter automático, ou seja, ele pode responder como um vídeo que toca em sequência e as habilidades de solução de problemas são fracas. Indivíduos com Síndrome de Asperger têm a capacidade de cursar o ensino regular, mas eles frequentemente não têm a estrutura emocional para encarar as cobranças de sala de aula. Esses sujeitos são facilmente estressados devido à sua intolerância. A autoestima é pequena, e eles geralmente são muito autocríticos e incapazes para admitir erros. Indivíduos com SA, principalmente adolescentes, podem ter tendência à depressão. Reações de exaltação são corriqueiras em resposta a stress/frustração. Os portadores desta síndrome raramente relaxam e ficam facilmente aborrecidos quando as coisas não são como sua forma rígida diz que devem ser. Os jovens com a Síndrome de Asperger são tão prontamente sobrecarregados pelas pressões do ambiente, e tem grande diferença na habilidade de desenvolver relações interpessoais, que não é de se 140 espantar que causem a impressão de "frágil vulnerabilidade e infantilidade patética" (WING, 1981 p.117). Everard (1976, p. 2), escreveu que quando esses jovens são comparados aos colegas sem problemas, "instantaneamente se nota como são diferentes e que enormes esforços têm de fazer para viver num mundo onde não se fazem concessões e onde se esperam que sejam conformes". Os profissionais da educação são de grande importância para ajudar o Asperger a aprender a trabalhar com as pessoas ao seu redor. O Asperger é inábil para expressar seus temores e aflições, e, é muito importante que adultos façam isso por eles para levá-los do mundo protegido de ilusão em que vivem para as incertezas do mundo exterior. As pessoas que trabalham com esses jovens na escola fornecem estrutura externa, organização e estabilidade que lhes falta. É imprescindível que sejam usadas técnicas didáticas criativas, com apoio particular para o portador da Síndrome de Asperger. Não somente para promover o sucesso acadêmico, mas também para ajudá- los a sentirem-se menos alienados de outros seres humanos e menos sobrecarregados pelas demandas do dia-a-dia. Desenvolvimento Cognitivo e Aprendizagem A aprendizagem e o desenvolvimento estão inter-relacionados, a partir da compreensão de Vygotsky apud Goulart (2001). Piaget elaborou vários conceitos e também enunciou fases pelas quais as crianças passam e participam ativamente para a formação e aquisição do conhecimento. A fim de compreender as dificuldades de acomodação e assimilação do autista em seu processo de aprendizagem, é pertinente ressaltar os estudos de Piaget com o objetivo de analisar o comportamento de um autista. Logo, um dos principais conceitos de sua teoria é o esquema. Esses esquemas são estruturas cognitivas pelas quais o indivíduo se adapta e organiza o meio. Outro fator relevante na teoria deste autor é a adaptação do indivíduo ao meio. Esta compreende dois processos: A assimilação e a acomodação. Sendo que a assimilação é o processo através do qual o indivíduo incorpora o mundo exterior, pessoas e coisas, às estruturas existentes, não derivando em alteração de esquema. Já o processo de acomodação consiste em reajustar novas 141 estruturas, ou criarmos novas, de acordo com as exigências do meio. Isso acontece toda vez que uma nova informação não pode ser incorporada ou assimilada por não contar com um esquema em que possa ser encaixado. Esses processos não geram um estado de equilíbrio ou mesmo de desequilíbrio, a depender da situação em que o indivíduo esteja. O indivíduo encontra-se em desequilíbrio quando uma expectativa ou conhecimento prévio não é confirmado pela experiência. De acordo com a abordagem construtivista de Piaget, o indivíduo constrói significados pelas experiências de acomodação e assimilação. Segundo Fonseca (2007, p. 62), a abordagem cognitiva da aprendizagem humana resulta da fusão da psicologia e da neuropsicologia experimental cuja introdução sumarizada tentou desenhar nos dois números anteriores, para além de integrar dados de investigação transdisciplinares sobre a cognição, ou melhor, sobre os processos de pensamento e de conhecimento que a consubstanciam. Vigotsky apud Goulart (2001) destaca alguns pontos relevantes de sua teoria sobre o desenvolvimento intelectual: o valor da fala; o relacionamento entre o desenvolvimento e a aprendizagem; a existência de uma zona proximal e a importância do estímulo. Com relação ao primeiro item – o valor da fala, Vigotsky coloca que outros estudiosos ignoraram a importância da mesma, bem como a relação direta que tinha com a inteligência. Mas, “o momento de maior significado no curso do desenvolvimento intelectual, que dá origem às formas mais humanas de inteligência prática abstrata, acontece quando a fala e a atividade prática, então duas linhas completamente independentes de desenvolvimento, convergem” (VIGOTSKY apud GOULART, 2001, p. 172). Outro ponto de destaque na teoria de Vigotsky é o relacionamento entre o desenvolvimento e a aprendizagem. Os processos de maturação e aprendizagem não são excludentes, mas sim complementares e interdependentes. Dessa forma ocorre que o processo de maturação prepara e permite a ocorrência da aprendizagem e por outro lado, o processo de aprendizagem estimula e empurra para frente o processo de maturação. O terceiro ponto refere-se à existência da zona de desenvolvimento proximal e a necessidade de estimulação. Segundo Vigotsky apud Goulart 142 (2001), observou que existe uma variação na capacidade de crianças com o mesmo nível mental, que aprenderam sob a orientação de um mesmo professor. Ele concluiu que isso era resultado do fato de que estas crianças não tinham a mesma idade mental, por isso o curso de seu aprendizado seria diferente. Foi essa diferença que Vigotsky denominou zona de desenvolvimento proximal. Diante de seus estudos, Vigotsky observou que o nível de desenvolvimento real pode ser entendido como o conjunto de funções que já amadureceram. A zona de desenvolvimento proximal caracteriza as funções que ainda não amadureceram e que podem ser estimuladaspelos educadores, daí a importância da estimulação. Em resumo, para Vigotsky, o processo de desenvolvimento nada mais é do que a apropriação ativa do conhecimento disponível na sociedade em que o jovem nasceu. As dificuldades de aprendizagem provenientes de aspectos naturais ou secundários são passíveis de alterações por meio de recursos de adaptação ambiental. Segundo Barros (1998, p. 13), “o desenvolvimento da inteligência constrói-se a partir da expansão ativa do campo da consciência em relação à realidade vivida”. As dificuldades de aprendizagem decorrentes de aspectos secundários são oriundos de alterações estruturais, emocionais ou neurológicas, mentais, que refletem nas técnicas de aquisição, construção e acréscimo das funções cognitivas. Entretanto, é através da aprendizagem adquirida pelo indivíduo, que se torna fácil sua adaptação ao meio em que vive, atendendo suas necessidades, resolvendo seus problemas. A aprendizagem relaciona-se com o desenvolvimento, causando abertura nas zonas de desenvolvimento proximal relativo à distância entre aquilo que o sujeito faz sozinho e o que ele é capaz de fazer com a influência de um adulto. Este desequilíbrio requer que o sujeito reajuste seu esquema mental ou invente um novo esquema para perceber o fato que ocasionou o desequilíbrio. A relação com o ambiente faz com que o indivíduo formule estruturas mentais e adquira maneiras de fazê-las funcionar. O eixo central, portanto, é a interação organismo-meio e essa 143 interação acontece através de dois processos simultâneos: a organização interna e a adaptação ao meio, funções exercidas pelo organismo ao longo da vida. A cognição irá se modificando em virtude de um contínuo processo de teste dos conceitos organizados pelo indivíduo, a partir da ação. Piaget assumiu um estilo interacionista a respeito da inteligência. Para Piaget o estudo da inteligência envolveria uma análise de como o ser humano se torna progressivamente capaz de construir o conhecimento. O plano de desenvolvimento na visão de Vigotsky é concebido pelo real e pelo potencial. Sendo que o real é obtido ou desenvolvido determinando o que o sujeito já é capaz de fazer por si próprio, expondo a possibilidade de um desempenho independente do sujeito. O desenvolvimento do ser humano está fundamentado no aprendizado que, para Vygotsky, sempre envolve intervenção, direta ou indireta, de outros indivíduos e a reconstrução pessoal da experiência e dos significados. Inclusão no Brasil A temática da inclusão escolar tem sido amplamente discutida por muitos autores que veem os benefícios que este tipo de prática proporciona para o desenvolvimento e aprendizagem das crianças ao serem inseridas em um ambiente que há pouco tempo atrás nem se imaginaria possível, uma vez que a segregação de crianças com necessidades educativas especiais, do convívio social, era uma prática corrente. A inclusão traz a ideia de igualdade de direitos e, principalmente o respeito às diferenças, ao afirmar que independente das necessidades especiais todo sujeito tem o direito de frequentar uma escola regular e aprender os conceitos trabalhados. Nas últimas décadas tem sido discutido o tema inclusão na vida social, no trabalho, na educação para pessoas portadoras de diversos tipos de deficiências. Mas, vale ressaltar, que existe uma visão distorcida do que seja efetivamente esse tema, qual o seu significado real. Vemos muitas instituições de ensino configurarem-se como 144 inclusivas, mas na realidade são exclusivas. Esse processo não tem sido homogêneo ou fácil de historiar dada a vastidão de nosso país, com grandes desníveis econômicos e sociais. O espaço escolar deve vislumbrar como objetivo uma interação e flexibilidade, onde o aluno sinta-se mais acolhido, tanto na dificuldade, quanto na aprendizagem. Assim como defende Ribeiro (2003, p. 41), “a perspectiva da inclusão exige o repensar das condições da prática docente e de suas dimensões, bem como de suas repercussões na organização curricular e na avaliação”. Acredita-se numa sociedade onde a pluralidade e a heterogeneidade podem ser um caminho para uma solução de preconceitos e de dificuldades no reconhecimento das diferenças, sejam individuais ou coletivas, visíveis ou invisíveis, abrindo espaço para uma modificação social, a partir de nossas crianças, caminhando a passos largos para uma sociedade mais justa, solidária e Inclusiva. Nessa acepção a inclusão pode ser também educativa, pois exigirá de todos os que dela se aproximarem e se apaixonarem uma radical mudança de mentalidade e de paradigmas. De acordo com Carvalho (2000, p.17), “é importante destacar que “especiais” devem ser consideradas as alternativas e as estratégias que a prática pedagógica deve assumir para remover barreiras para a aprendizagem e participação de todos os alunos”. Para que a escola seja inclusiva é preciso que haja uma tolerância e comprometimento acerca da autonomia do educando, pois educar é mais que buscar métodos é acima de tudo uma reflexão sobre a prática “ação- reflexão-ação”. A partir do momento em que se elaborar programa de desenvolvimento através da formação profissional do professor, a problemática das necessidades educacionais passará a ser muito mais valorizada e discutida em todos os parâmetros. Escola Regular X Escola Especial A ciência é à base de toda construção do saber acadêmico e a escola regular atua com esse saber comum, produzindo e reproduzindo, em detrimento do saber particular. Ela expande toda e qualquer informação que o aluno traz da sua experiência pessoal, social e cultural e busca meios de fazer com que o aluno extrapola o senso comum. A escola não deve se contentar apenas com o que o aluno já sabe, tem de estimulá-lo a prosseguir no 145 entendimento de várias áreas do conhecimento. Independente de qualquer coisa, a escola tem o papel de ensinar os alunos a repartirem o saber, as opiniões diferentes das coisas, as emoções, a discutir, a trocar pontos de vista. É na escola que ampliamos nosso senso crítico, a observação e o conceito do outro em todas as suas dimensões. Em resumo, a escola regular tem uma obrigação primordial e insubstituível: inserir o aluno no mundo social, cultural e científico; e todo ser humano, incondicionalmente tem direito a esse ingresso. Como a escola regular tem caráter elitista, homogeneizador e competitivo, elas oprimem o professor e o reduz a um estado de isolamento e ineficácia, principalmente frente a alunos com deficiência. Diante disso, a saída encontrada pela maioria desses educadores é desvencilhar-se desses alunos que não seguem a turma. Ao invés de adequar e diferenciar o ensino para esses alunos, a escola regular precisa recriar suas práticas, mudar sua visão, rever sua função, sempre reconhecendo e valorizando as diferenças. A escola especial ocupa-se do acolhimento e do ensino de indivíduo com deficiência. Sendo que a educação especial realiza-se fora do âmbito regular de ensino, ela é preparada para atender específica e unicamente alunos com determinadas necessidades especiais. Algumas escolas especiais acolhem somente a um tipo de necessidade, enquanto que outras se dedicam a vários “problemas”. Estas escolas têm sido alvo de críticas, por não promover o convívio entre crianças consideradas “especiais” e as consideradas “normais”, é necessário que haja heterogeneidade. O entendimento era que esses alunos precisavam de condições escolares especiais o que abarcava currículos e ensino ajustado, número menor de alunos por turma, professores especializados e outras condições particulares de organização pedagógica do processo educacional. Assim sendo, dada a essa composição peculiar, a escola especial sempre enfrentou o impossível: substituir adequadamente o compromisso da escola regular. Porsua vez, a insistência em buscar uma substituição impossível, foi descaracterizando-a e impedindo-a de construir uma identidade própria, no correr dos tempos. Diante da inclusão, o desafio das escolas regular e especial é o de tornar definido o papel de cada uma, pois uma educação para todos, não 146 nega nenhuma delas. Se os compromissos educacionais desses não são sobrepostos, nem substituíveis, cabe a escola especial complementar a escola regular, atuando sobre o saber particular que invariavelmente vai determinar e possibilitar a construção do saber universal. Considerações finais As principais conclusões deste trabalho são: falta de prática e sensibilidade dos profissionais da área de educação para relacionar-se com um aluno (síndrome de Asperger), bem como, resistência a mudanças e acima de tudo a reformulação curricular adequada em especial o respeito às especificidades de cada aluno (independente de sua problemática). Percebe-se que as descrições científicas são importante referencial para o estabelecimento do diagnóstico da síndrome de Asperger e este deve ser feito por um profissional da área de saúde. No entanto, esta descrição mais generalizada acaba não nos fornecendo um importante dado acerca das implicações de ser portador desta síndrome ou de ter uma relação familiar com este, ou seja, a percepção da síndrome de Asperger a partir da perspectiva de quem a vivência ou convive cotidianamente com ela. É importante que se tenha estudos mais aprofundados sobre a prática educativa com alunos com síndrome de Asperger. Por este modo, esse estudo configura-se em compreender e refletir acerca da recepção e comportamento de um aluno com esta síndrome nas escolas regulares e especiais. Compreender as particularidades deste sujeito permite ao educador entender as barreiras que este aluno enfrenta para a aquisição de aprendizagens escolares. Enfim, ressalta-se que a possibilidade de conhecimento desta síndrome pode contribuir para uma maior aceitação do indivíduo, maior respeito às suas limitações e um estímulo mais efetivo de suas potencialidades, que podem possibilitar a ele uma convivência social muito mais saudável e produtiva. 147 Referências BARROS, Vera de Oliveira; BOSSA, Nádia Aparecida. Avaliação psicopedagógica do adolescente. Petrópolis, RJ: Vozes, 1998. p 13. CERIGNONI, Francisco Núncio; RODRIGUES, Maria Paula. Deficiência: uma questão política? São Paulo: Paulus, 2002. CINTRA, Ana Maria de Oliveira. In: Vitrô Psiquiatria – A síndrome do autismo: Revisão de literatura. Volume 2 nº 2. Abril – Maio de 1988. P. 38 R.J. DELORS, Jacques (Coord.). Os quatro pilares da educação. In: Educação um tesouro a descobrir. UNESCO, MEC. São Paulo: Cortez, 1999. p. 89- 102. EVERARD, M.P. Mildly autistic young people and their problems. Paper presented at the International Symposium on Autism, St. Gallen, Switzerland. July, 1976. P. 2 FONSECA, Vitor da. Cognição, neuropsicologia e aprendizagem: abordagem neuropsicológica e psicopedagógica. Petrópolis, RJ: Vozes, 2007. P. 62 KUCZYNSKI, Evelyn.; ASSUMPÇÃO, Francisco B. In: Vitrô Psiquiatria – A síndrome do autismo: Revisão de literatura. Volume 2 nº 2. Abril – Maio de 1988. R.J. KLIN, Ami. Autismo e Síndrome de Asperger: uma visão geral. Rev. Bras. Psiquiatr. v.28, p.S3-S11, 2006. Disponível em: Acesso em 10 jun. 2014. OLIVIER, Lou de. Distúrbios de aprendizagem e de comportamento. Rio de Janeiro: Wak Ed., 2006, p. 111 e 112. OLIVEIRA, M. K. de. Aprendizado e desenvolvimento um processo sócio-histórico. São Paulo: Scipione, 1995. RIBEIRO, Maria Luisa S.; Baumel, Roseli Cecília R. de C. Educação especial: do querer ao fazer. São Paulo: Avercamp, 2003. p. 41 148 VIGOTSKY apud GOULART, I. B. Psicologia da educação: fundamentos teórico-práticos, aplicações à teoria pedagógica. Petrópolis: Vozes, 2001. VOLKMAR, Fred R.; BREGMAN J.; COHEN, D.J.; et al: DSM III and DSM III – R Diagnoses of Autism. Am J Psychiatry. VOLKMAR, Fred R. In: Vitrô Psiquiatria – Autismo e Transtornos Globais do Desenvolvimento: Revisão de literatura. Volume 2 nº 2. Abril – Maio de 1988. R.J. p. 513 - 516 WING. L. The relationship between Asperger’s syndrome and Kanner’s autism. In: U. Frith. Autism and Asperger syndrome. Cambridge, England: Cambridge University Press, 1981. 149 11. É possível combater forças e variar utilizando diferentes linguagens, na composição de pensamentos de geografias possíveis e espacialidades, com autistas no ensino básico? Marlene Neves Furlan Lozano 150 Introdução Sempre fui apaixonada por Educação e minha inspiração para me tornar uma educadora tem muito das contribuições da minha professora de Geografia da 5ª a 8ª série (antigo Ginásio), a Dona Claudete. Ela com seu sorriso amplo, sempre cordial, com uma escuta especial para cada um de seus alunos era muito diferente dos demais professores, no vestir, no agir e no encantamento que nos proporcionava ao trabalhar e permitir que nossos pensamentos fossem além das páginas dos amarelados livros didáticos que eram passados de mãos em mãos, de irmão para irmãos, e até de uma série para outra. Ela era mágica, transformava os livros, mapas, o velho globo terrestre e até as escassas figuras, na época, em viagens fantásticas, fazendo percorrermos por caminhos muito além do tempo. Lembro que ao soar do sino estridente, para o findar das aulas reclamávamos, pois queríamos mais “do diferente” e esperávamos ansiosos pelo próximo encontro e desejosos de termos mais professores como ela. E em 2021, depois de 40 anos, posso trazer a memória a Prof.ª Claudete, um recorte do tempo, a história, as vivências de suas aulas que me “habitam” e reencontrei de forma ampliada e significativa em cada aula: “Cartografias de modos de fazer geografias”, “Mapeamentos e multiplicidades/Etnocartografias em territórios de exclusão”, “Narrativas e imaginações espaciais em fotografias”, “Desmanchar imagens didáticas”; “Lugar-escola e cinema: afetos e metamorfoses mútuas”, “Atlas geográficos: montagens, desmontagens, remontagens”, “O que vemos e como vemos: imagens como produtoras de espacialidades”. Redescobri nestes encontros, uma viagem de possibilidades por meio das reflexões e no partilhar das pesquisas e experiências o quanto temos e precisamos de “Claudetes” para combater “forças bloqueadoras” que impedem um aprendizado significativo dos nossos alunos do Ensino Básico ao Superior, e o quanto linguagens e as imagens, em sua dimensão pedagógica, podem dar origem e sustentação nos processos de subjetivação e no pensamento acerca do espaço geográfico e que também podem estender às demais áreas do conhecimento, facilitar os processos de ensinar e aprender, além de evidenciar as potencialidades dos alunos e educadores, pois nos trazem para outras geografias possíveis, outros processos de educação necessários que precisam ser considerados/valorizados. 151 No que se refere ao uso da linguagem é importante pontuar o que dizem Oliveira Jr. e Girardi (2011 apud PREVE, 2019), ao analisarem um conjunto de artigos apresentados por diferentes autores nos Grupos de TrabalhAs aulas, estudos, as leituras, os debates e reflexões permitem fazer conexões e ampliar o meu foco de pesquisa atual e de muitos anos, sobre inclusão e aprendizagem de autistas, pois há mais de 21 anos estou ao lado do meu filho “autista de grau leve” aprendendo diariamente, com ele, a superar obstáculos e também dos muitos alunos com necessidades especiais que encontrei ao longo da minha trajetória de educadora, principalmente adultos, com baixa ou sem escolarização. Oliveira Jr (2020) me trouxe um significativo encontro em seu texto “Geografias Giratórias” com Fernand Deligny (1913–1996): (...) conhecido na França como pedagogo, preferia ser chamado “poeta e etólogo“. Durantemais de cinquenta anos trabalhou na isolada região francesa das Cevenas, num centro de acolhimento informal de crianças que não se adaptaram à sociedade: crianças delinquentes, psicóticas, autistas ou, nas palavras do pensador, simplesmente “crianças à parte. (DELIGNY, 2015, p.10). Essa e outras leituras me levaram ampliar minhas pesquisas relacionadas ao trabalho e contribuições Deligny com autistas e pessoas excluídas em suas diferenças. Para esse estudo e narrativa, pretende-se elucidar a fotografia, entre todas as demais linguagens estudadas, no momento, e que podem ser de igual importância para dinamizar imaginários, observar possíveis relações e tensões existentes entre a ideia de representação, delinear potencialidades de pensamentos diferenciais que estabeleçam novos sentidos para o combate às forças bloqueadoras que impedem muitas vezes a integração de autistas e neurotípicos na composição de pensamentos geográficos e de espacialidades no ensino básico. É possível estabelecer uma relação aberta com o mundo, com o lugar ou o não lugar dos autistas? Antes de adentrarmos a essa questão, considera-se pertinente uma breve descrição das singularidades de pessoas com TEA. O termo médico que o define atualmente é TEA (Transtorno do Espectro Autista). Por se tratar de um transtorno se manifesta em diferentes níveis caracterizado 152 por quadros complexos do neurodesenvolvimento com alterações que influenciam na capacidade de comunicação e interação social (estabelecer relacionamentos) e comportamentos restritos e repetitivos (responder apropriadamente ao ambiente segundo as normas que regulam essas respostas). Geralmente autistas revelam dificuldades próprias na aprendizagem em função da percepção sensorial desordenada, ou seja, não conseguem assimilar toda a informação originada pelos sentidos como audição, olfato, paladar e toque. Apresentam outras formas de percepção sobre o ambiente e enfrentam desafios para lidarem com o seu próprio cotidiano. A prevalência do TEA acomete cerca de 2% População Mundial e no Brasil cerca de 4 milhões de autistas, sendo 1 autista a cada 54 pessoas. As manifestações variam de um indivíduo para outro. Há pessoas com TEA que não falam outras que têm um vocabulário acima da média, porém com outras dificuldades, como entender metáforas e sutilezas da comunicação. Há outros, muito sensíveis ao toque e/ou que ao contrário, que buscam mais estímulos do ambiente, por serem hipossensíveis. Não podemos generalizar a condição do indivíduo com TEA. É necessário enxergar em cada um suas singularidades e potencialidades, observando-se comportamentos de como se comunica, quais suas características mais relevantes, do que ela gosta ou não. Evitar o contato físico e expressar de forma clara e direta podem facilitar a interação e a comunicação. É importante não esperar um comportamento de retribuição de pessoas com TEA, isso não quer dizer que não tenham gostado, pois constitui uma dificuldade na compreensão de regras sociais em grande parte delas. Uma linguagem clara e direta durante um diálogo facilita para que a pessoa com TEA tenha mais atenção e compreenda melhor. Em vez de dizer: “Hoje está calor, vamos caminhar no parque aqui perto? Você gosta de fazer caminhadas? Diga: ‘Vamos caminhar no parque?” Seja o mais sucinto possível e evite fazer uma sequênciação de perguntas. Nem sempre elas serão respondidas. O ideal é fracionar as informações pausadamente. Algumas pessoas com TEA necessitam de apoio visual para associar a fala à imagem e o celular pode ser um bom aliado na 153 comunicação. É importante dar tempo para o autista processar o que dizemos, falar muito pode confundi-lo. A noção de previsibilidade, tempo e de acontecimentos também é um fator importante, antes de iniciar alguma ação, explique claramente. Se essa previsibilidade for dada com certa antecedência, favorecerá muito a organização e os retornos. A rotina é uma forte aliada na organização e autonomia de autistas. Tudo precisa ser previsto e mudanças nas rotinas, em ambientes e até mesmo em vestimentas, alimentação podem provocar crises. Assuntos abstratos, colocação com duplo-sentido, uso de metáforas e piadas ou situações que requerem compreensão refinada de linguagem dificultam a comunicação e o entendimento. Questões avaliativas mais complexas, textos longos e com muitas informações também dificultam a compreensão e a resolução de situações que são postas. Muito importante dar um tempo para processar o que foi dito, informações e leituras. Situações que envolvem precipitação e ansiedade, por respostas, acabam deixando tudo mais confuso e desestabilizam bem como ambientes com muitos estímulos sensoriais e intensos podem não ser favoráveis aos indivíduos com TEA. As respostas destes também podem estar associadas a ações corporais, pois nem sempre responderão verbalmente, mas se mostrarão favoráveis ou insatisfeitos com sinais sociais ou ações. Precisamos cuidar para que não se sintam invadidos. Muitas vezes não haverá contato visual, porém isso não quer dizer que não há interação. As reações nem sempre são as esperadas para cada situação. Ao perceber o engajamento de uma autista em uma atividade de interesse, devemos aguardar ou ter a sua permissão para fazer parte. Interrupções ou aproximações, não permitidas, podem gerar estresse e irritação. O envolvimento em uma proposta, tarefa, seja ela, escolar ou não, requer o engajamento desses, por meio de ações do outro como guia e com consentimento, e não pela fala/comando e determinação “faça ou cumpra...”, pois precisam compreender o que se espera deles, e dentro das suas potencialidades e consentimentos. Geralmente apresentam dificuldades para reconhecer, expressar e gerir emoções, dessa forma, as reações nem sempre são as esperadas para a situação, como um choro ou risada fora do contexto ou nenhuma expressão. Se não conseguirmos um contato, uma resposta esperada, uma interação, significa que naquele momento não houve recursos para que essa troca aconteça. É importante observar e retomar com uma nova 154 abordagem. As brincadeiras sensoriais para as crianças normalmente são bem- vindas (como girar, cavalinho, pega-pega, brincadeira com água, bolinha de sabão) e o autista adulto, requer tratamento adequado para a sua idade (sem infantilizar), pois é uma pessoa que tem a sua história, gostos, jeitos e não somente autismo. Nosso mundo é imerso nas lógicas da linguagem e da significação, as quais, segundo Deligny (apud OLIVEIRA JR., 2020, p.5) afirmam que essas [...] distanciam ou mesmo impedem as pessoas de estabelecer uma relação aberta com o mundo, com o lugar. Para este autor, isto ocorre porque “a linguagem chega antes” do encontro que temos com os materiais e formas que compõem o mundo, fazendo com que nos relacionemos não com as pedras, a água, as árvores, a pele, mas com seus significados. Para pessoas com TEA é necessário tornar visíveis suas experiências de “mundo” onde segundo Deligny essas possam encontrar espaços para agirem e se emancipem, mesmo que minimamente. Nesse contexto, pensa em termos de valorização da imaginação da criança, em lhe dar a oportunidade de se apropriar de sua potência própria (OLIVEIRA JR., 2020, p.12). [...] Para Deligny o bem, o mal e o si mesmo são produtos da linguagem como instituidora de mundos, do mundo. Para ele, os autistas não estão condenados pela linguagem, pelos signos, pela significação e, por isso, são tidos, por aqueles que se pensam humanos devido à linguagem, como selvagens, por estarem fora da linguagem. Propõe, então, como central para se lidar com os autistas (mas não só com eles!) “a noção de território; mas um território não identitário, um lugar onde viver, onde situar-se no espaço, sentir o corpo de um e estrangeirar o outro”. Seria no estar aí quese daria o verdadeiro da vida de cada homem, mas não necessariamente do (tido como) humano. Localizar (se) seria encontrar (se) (em) um topos, encontrar (se) com aquilo que afeta o corpo no terreno, que efetiva o sensível que (se) constitui (uma) vida ali; encontros que se dão nas e através das errâncias que cada corpo realiza enquanto é afetado pelas “coisas” do mundo, pelas trajetórias heterogêneas e copresentes no lugar. Além das manifestações do TEA, podem apresentar também comorbidades associadas tais como: Deficiência intelectual; TDAH; TOC; 155 Epilepsia; Esquizofrenia; Transtorno do sono; Transtornos motores; Problemas gastrointestinais, entre outras. Para essas comorbidades há tratamentos para diminuição de sintomas, porém para o TEA não há remédios ou cura, pois não é uma doença. Quanto mais conhecemos das características específicas do autista, do nosso aluno, mais vínculos são possíveis, maiores são as possibilidades de intervenções pedagógicas, mais inclusão e aprendizagem. Apesar de ainda não termos todas as respostas, sabemos que o autismo por mais amplo que possa parecer, existem momentos de conquistas e alegrias. Em sala de aula geralmente anseiam por organização do espaço e das rotinas, e sua memória necessita de elementos de apoio visual. Diante das características expostas faz-se necessário o desenvolvimento de habilidades cognitivas e funcionais, currículo e materiais- didáticos pedagógicos adaptados e uso de metodologias e recursos que favoreçam o autista em suas necessidades e aprendizagem e possam efetivamente variar na composição de pensamentos de geografias possíveis e espacialidades. Cada indivíduo é diferente do outro e jamais devemos generalizar, mas sim evidenciar suas potencialidades com amor e afeto. Na perspectiva de Massey (2008 apud OLIVEIRA JR., 2020), o conceito de lugar está associado à copresença de uma constelação específica de trajetórias, fazendo com que um lugar seja estabelecido pelas interconexões e desconexões entre essas trajetórias e não por algum parâmetro de localização, de extensão, de origem ou de identidade. E nesse lugar, nessa perspectiva que podemos ter um lugar para o autista. Qual é esse lugar que os autistas ocupam no ensino e na aprendizagem dos conceitos de lugar, de espaço? Qual a representação cartográfica esperada deles? Diante das perguntas e sem as respostas encontro forças em Preve (2020, p.16) [...] Há aqui uma importância e um cuidado (uma confiança que se cria nos meios) para que o que seja dito não seja enquadrado no que deve ser dito, ou que seja excluído porque não coincide com um saber maior. Esse dizer “esse não é o meu lugar” está aqui neste fragmento como parte do que tenho a dizer hoje e só está aqui porque como tudo que quer nascer, 156 que precisa nascer, insiste. Às vezes, a gente não escuta tamanha a nossa surdez configurada pelos espaços institucionais, pelos mapas escolares que é a escuta do que se quer ouvir, mas ainda bem que o que precisa ser dito insiste. Insistir é uma das potências daquilo que é intensivo. O que a gente tem é a insistência disso. “Eu não vivo aqui. Isso não é o meu lugar.” E nos mapas de varetas apresentados em Girardi (2019 p.7 - 9): [...] A riqueza dos mapas de vareta e seus contextos podem funcionar para nós como intercessores para pensar espacialidade e geograficidade, tal como o cinema e cineastas funcionaram como intercessores para Deleuze pensar sobre o movimento, entendendo este não como um mero deslocamento no espaço, mas como variações de vida. [...] Viver, no movimento, novas descobertas e, na volta, colocar mais uma vareta ou mais uma concha, como pequenos disparadores posteriores de memórias. [...] Os mapas de varetas, como intercessores, foram aqui convocados para nos ajudar a pensar em geografias menores. As geografias menores foram inicialmente apontadas por Oliveira Júnior (2009) e derivaram das ecologias menores de Ana Lúcia Godoy. Menor aqui não se refere a relações de tamanho, a hierarquias, a graus de importân-cia, mas ao que é estabilizado (maior, padrão) e o que está em movimento (menor, devir minoritário), recusando qualquer estabilização, fluindo, inventando novos modos (Deleuze e Guattari, 1977). Assim, geografias menores são lugares de criação, geografias-arquipélago que expandem o continente da Geografia maior (estável, hegemônica). São geografias possíveis in (dentro da) Geografia, ao mesmo tempo geografias impossíveis de ser toda a Geografia. Talvez pudéssemos pensar que entre o arquipélago das geografias menores e o continente da Geografia maior há também mar, ondulações, refrações, difrações… Olhar e agir entre “Geografias menores e maiores” implicam em observar nossos alunos e a nós mesmos frente a como colocamos nossos corpos a sentir suas vibrações e potencialidades? Como produzir movimentos e habitá-los? Como dar vigor aos pensamentos, como desbloquear forças “do mesmo”? Para essas indagações Girard (2019 p. 9) nos traz “[...] Precisamos construir nossas canoas”. 157 Narrativas, fotografias, imaginações geográficas e possibilidades para autistas e neurotípicos Conviver com autistas é observar de forma primária “o mundo” pela primeira impressão das coisas, pois esses respondem a outras leis de percepção muito diferente das nossas visões arraigadas e imersas no “mesmo”. Tomo emprestado, parte da frase “re-existir e inventar modos de combater forças bloqueadoras que impedem o pensamento de variar...” no trabalho com autistas e neurotípicos seja no ensino e aprendizagem da Geografia e das demais áreas do conhecimento precisamos fazer diferente e fazer diferença. É preciso desacostumar no campo das imagens os nossos sentidos e significados que repetidamente damos a elas e romper a ideia de imagens como representação e vislumbrar o quanto elas podem contribuir para a potencialização e ampliação das linguagens e expressão do imaginário dos nossos alunos. O movimento de observar, no campo dos conceitos outras composições, que tragam a existência outras formas imagéticas humanas e inumanas que negociam poderes a cada momento e lugar para as atividades educativas (usos, sentidos e expressividade) e que possam variar na composição de pensamentos de geografias possíveis e espacialidades e que se façam existir, autistas e não autistas nas nossas escolas e no mundo. Dentre essas imagens destaca-se a fotografia muito comum nas práticas e materiais didáticos e também presentes nos mais diversos materiais que circulam na sociedade. Segundo Hollman (2019, p.1, tradução nossa) [...] A fotografia se inscreve no nosso cotidiano e percorre as formas de aprender sobre o mundo: fixa, comunica e dá forma às nossas experiências. Desde sua invenção, este dispositivo moldou a nossa cultura visual, bem como a consciência espacial e sua própria organização. Da mesma forma, a fotografia moldou a produção e maneiras de olhar para outros registros visuais usados para ordenar, divulgar e ensinar informação espacial. Massey (2017, p.37) afirma que muito da nossa Geografia está na mente e que enquanto educadores precisamos mostrar a irrelevância dessas imaginações e submetê-las a interrogatórios: [...] Carregamos conosco imagens mentais do mundo, desde o país em que 158 vivemos até da rua ao lado. Tais imagens mentais, caracterizam o que a autora denomina imaginações geográficas." Provavelmente, é mais aceito agora, embora ainda seja importante argumentar, que muito da nossa Geografia está na mente. Ou seja, nós carregamos conosco imagens mentais do mundo, do país em que vivemos (...) E refletir sobre essas coisas e falar sobre elas parece-me um bom caminho para começar a examinar o que significa “pensar Geograficamente”. A fotografia nos remete a uma narrativa a ser compreendida, decodificada e interpretada,que pode ser utilizadanão só como fonte para o ensino da Geografia, mas também para pesquisas acadêmicas ou não e como ilustrações e informações. Para Oliveira Jr (2009, p. 10), as imagens imprimem em nós pensamentos sobre o espaço geográfico. [...] Não só por nos darem visualidade dos lugares, estas imagens estão a grafar nos pensamentos sobre o espaço geográfico. Impregnados no visual nos chegam também para estes lugares, maneiras de significá-los uns em relação ao outros, propondo-nos raciocínios e imaginações acerca de cada um deles e das relações que existem entre eles. Dependendo da proposta educativa é possível tratar a própria imagem (fotografia) como espaço de experiência, deslocando-as do lugar de ilustração, representação, informação para variar, desarranjar, deslocar, suprimir legendas, mover continentes das páginas dos livros didáticos, movimentar essas imagens, experimentar com e a partir delas outros encontros, outras imagens. Entende-se que é possível conceber um pensamento espacial mobilizado pelas diferenças geográficas, marcado pelo reconhecimento de que os outros existem e têm suas próprias histórias como propõe Doreen Massey. Segundo Oliveira Jr (2009, p 10), De maneira geral, no entanto, as fotografias que povoam os materiais e percursos escolares possuem um objetivo bem específico: ilustrar/mostrar um determinado fato ou elemento ou fenômeno geográfico de maneira realista, de modo a amparar e auxiliar o professor a ensinar um conteúdo curricular específico. Esta forma de o ensino de Geografia se relacionar com a fotografia leva a restringir a estética fotográfica a imagens que tenham uma luminosidade semelhante em todas as partes, bem como uma nitidez absoluta do visível e que parecem nos indicar que tudo o que importa ser visto – o real geográfico fidedigno – encontra-se dentro do quadro fotografado. 159 Sabemos, no entanto, que as fotografias povoam o nosso cotidiano para muito além dos livros e materiais didáticos e se apresentam em estéticas muito variadas, tais como as selfies, onde o centro é a subjetividade e o rosto do fotógrafo, e as fotografias artísticas, em que o real é nitidamente uma construção fotográfica. Esse mover nos remete a importância de um novo olhar para as imagens que podem trazer a inclusão de autistas na sua forma de ver o mundo. Em todo processo de aprendizagem, há interpretações diferentes, feitas por indivíduos diferentes, ainda que sejam respostas a um mesmo estímulo. O comportamento do ser humano responde o como ele percebe o mundo exterior e nessa há ingerência de dois mecanismos: a sensação e a percepção. A sensação é o registro imediato fornecido ao nosso cérebro e a percepção denota a nossa capacidade de associar, comparar e interpretar as sensações. Para o autista suas descobertas são influenciadas pelas sensações e com pouca inferência cognitiva. Dessa forma os educadores precisam estimular essa percepção, contribuir para o desenvolvimento de abstrações, pensamentos e ideias e as imagens podem contribuir muito no desenvolvimento de capacidades que envolvem a linguagem, a subjetividade, o sensorial, o espacial, e a simbolização dentre outras. Por meio da fotografia e outras linguagens (recortes de cenas cinematográficas também podem colaborar muito nesse sentido) pode-se pensar e propor atividades assertivas que explorem essas capacidades e evidenciem as potencialidades dos autistas e neurotípicos. Dessa forma, retomo Massey (2017 p. 37) [...] Uma das nossas (muitas) habilidades como professores de Geografia é de mostrar a irrelevância dessas imaginações e submetê-las a interrogatório. Algumas considerações... Para dar voz àqueles que são carentes de linguagem e comunicação verbal, Deligny (2015) inventou um sistema de transcrição espécie de cartografia sobre papel na qual registrava os percursos “espontâneos” da criança autista, seus hábitos, gestos e percepções, livres de qualquer desejo de representação. [...] que considerava uma de suas principais contribuições, É desse fora da linguagem cotidiana, numa espécie de linguagem do infinitivo, sem sujeito, que o autor francês rompeu com os paradigmas de sua época e 160 criou uma antropologia alternativa, política, a qual inventou incessantemente formas inéditas de viver junto (p.16). A partir da experiência de Deligny com autistas que busca outros modos de vida abertos a circunstâncias, repletos de trocas e encontros — é possível vislumbrar a radicalidade de seu pensamento, por meio de seus escritos poéticos e de suas cartografias — um dispositivo que desbanca a primazia da linguagem. Ao observarmos como Deligny lidava de forma diferente com as “doenças mentais”, inventando formas inéditas de “viver juntos” bem com os encontros e estudos em Imagens, Geografias e Educação nos deparamos com variadas possibilidades “de variar” sem esmagar ou distorcer “o diferente” ou tentar encaixá-lo em uma visão de correto/normal e contingente produto da sociedade que habitamos. Retomo Preve (2020 p.16) [...] O que a gente tem é a insistência disso. “Eu não vivo aqui. Isso não é o meu lugar.” O que precisamos é insistir, re-existir enquanto educadores e pessoas, variar, dar lugar, habitar espaços, combater forças de poder, construir mapas de varetas, canoas, camerar, girar e girar e continuar insistindo e fazer diferença no mundo com todas as diferenças e potencialidades dos diferentes em suas essências. Referências ACSELRAD, Henri. Mapeamentos, identidades e territórios. In: Acselrad, H (org.). (Org.). Cartografia social e dinâmicas territoriais: marcos para o debate. 1ed. Rio de Janeiro, 2010, v. 2, p. 9-45. Disponível em http://www.beu.extension.unicen.edu.ar/xmlui/bitstream/handle/12 3456789/347/ACSELRAD%20%28coord%29_2010_cartografia%20so cial%20e%20din%C3%A2micas%20territoriais.pdf?sequence=1&isA llowed=y CAZETTA, Valéria. A visualidade dos atlas geográficos escolares brasileiros e a ideologia visual do perspectivismo. Geografares, n. 12, p. 289–234, 2012. Disponível em: https://periodicos.ufes.br/geografares/article/view/3196 COSTA, Luciano Bedin da. Cartografia: uma outra forma de pesquisar. Revista Digital do LAV, v. 7, n.2, p. 66-77, 2014. 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É membro do GRFP - Grupo de Estudos e Pesquisas Formação de Professores e do CNPq, nas linhas de Tecnologias, Digitais e Sociais Para a Popularização da Ciência, e Criação de Produtos Técnicos, Métodos e Metodologias. Currículo: http://lattes.cnpq.br/7838443572475953 Contato: profcarol.moraes@gmail.com Carlos Lema Garcia Graduado em Direito Civil pela Universidade de São Paulo, foi ordenado Sacerdote pela Igreja Católica no dia 2 de junho de 1985. Obteve o Doutorado em Teologia Dogmática pela Pontifícia Universidade da Santa Cruz. Desde 2014 é Bispo Auxiliar da Arquidiocese de São Paulo, atuando à frente do Vicariato para a Educação e a Universidade e do Setor Juventude da Arquidiocese. Também é Bispo Referencial da Pastoral do Ensino Religioso e do Setor Universidades do Regional Sul-1 da CNBB. Desempenha a função de Diretor Eclesiástico da União dos Juristas Católicos de São Paulo. É conselheiro emérito do Conselho Estadual de Educação de São Paulo. Sua atividade pastoral tem levado a presença da Igreja ao mundo da educação: acompanhar escolas e universidades; participar de eventos de formação para professores e educadores; e fomentar o diálogo sobre questões de interesse das diversas instituições de ensino – confessionais ou não, particulares e públicas. http://dgp.cnpq.br/dgp/espelhorh/7838443572475953 http://dgp.cnpq.br/dgp/espelhorh/7838443572475953 http://lattes.cnpq.br/7838443572475953 mailto:profcarol.moraes@gmail.com 165 Claudete dos Santos Graduada em Educação Física pela Universidade Federal de Sergipe – UFS, com Especialização em Psicomotricidade - UFS, Supervisão em Psicomotricidade no Centro de Desenvolvimento Pessoal Profissional Ltda – CEDEPP, Gestora Escolar e Professora da Rede Estadual de Educação do Estado de Sergipe, professora da área de Educação de Jovens e Adultos (EJA), com experiência em Gestão Escolar na rede pública e privada de ensino de Sergipe, Vice-Diretora na rede privada. Possuo os cursos de Espanhol e Inglês Básico. Atualmente exercendo função pedagógica na Secretária de Estado da Educação, do Esporte e da Cultura - SEDUC –SE, onde trabalhei, com trajetória profissional em diversos setores, entre eles: no Centro de Qualificação de Pessoal – CQP, na Ouvidoria e atualmente trabalhando na Biblioteca Pública Epifânio Dória, na mesma Secretaria (SEDUC-SE). Participa virtualmente como Membro do Grupo Interinstitucional de Estudos e Pesquisas: Formação de Professores (GRFP), criado para reunir, docentes de forma organizada para analisar e discutir a realidade educacional no enfrentamento à Pandemia que mudou o mundo. Currículo: http://lattes.cnpq.br/1593939974897144 Contato: claudetestos2021@gmail.com Claudiana Ribeiro dos Santos Andrade Possui Graduação em História pelo UniAGES, Graduação em Pedagogia pela UNICESUMAR, Especialização em Ensino de História - UCAM, Educação Infantil e Psicopedagogia, Coordenação Pedagógica e Libras - UNIBF. Atualmenteé Mestranda em Políticas Públicas pela FLACSO. É professora na Faculdade AGES de Senhor do Bonfim e Jacobina- BA, é membro do Grupo de Pesquisa em Educação Científica - UNEB e do GRFP - Grupo de Estudos e Pesquisas Formação de Professores. Currículo: http://lattes.cnpq.br/4323124898256151 Contato: claudianaribeirohistoria@gmail.com http://lattes.cnpq.br/1593939974897144 mailto:claudetestos2021@gmail.com http://lattes.cnpq.br/4323124898256151 mailto:claudianaribeirohistoria@gmail.com 166 Gilvânia de Jesus Silva Graduação em Pedagogia (UNINTA-EAD). Nível técnico de Magistério e Contabilidade (SEED). Cursos de aperfeiçoamento na área da Educação: inclusão. Atuou no cargo de Professora de Apoio Pedagógico na Escola Municipal Leonel Brizola - SE. Membro do GRFP - Grupo de Estudos e Pesquisas Formação de Professores Currículo: http://lattes.cnpq.br/8707360114662511 Contato: gilvania2105@gmail.com Diego Kenji de Almeida Marihama Doutorando em Educação pela Universidade Federal do Amazonas e Universidad Internacional Iberoamericana. É Mestre em Ensino de Ciências pela Universidade Federal de Itajubá, tem especialização em Gestão Escolar pela Escola de Gestores da Universidade Federal de Minas Gerais, especialização em Designer Instrucional, Orientação e Supervisão Escolar. É graduado em Filosofia pela Arquidiocese de São Paulo e 2ª graduação em Pedagogia pela Faculdade Alpha América. Participa como coordenador do GRFP - Grupo de Estudos e Pesquisas Formação de Professores, membro do GPPE - Políticas Públicas e Educação/UFAM, membro do GEPECUMA/UNESP - Educação, Cultura, Memória e Arte. É Orientador Profissional na Fundação Bradesco, tem experiência nas áreas de Filosofia e Educação, com ênfase em Formação de Professores e práticas pedagógicas, diálogo interdisciplinar: Teologia e Filosofia. Currículo: http://lattes.cnpq.br/8685829647191794 Contato: diegomarihama@yahoo.com.br http://lattes.cnpq.br/8707360114662511 mailto:gilvania2105@gmail.com http://lattes.cnpq.br/8685829647191794 mailto:diegomarihama21@gmail.com mailto:diegomarihama21@gmail.com 167 Iara Carnevale de Almeida Doutora em Informática pela Universidade de Évora, Portugal. Docente do Mestrado em Gestão do Conhecimento nas Organizações da Unicesumar, e graduação em Engenharia de Software (modalidades presencial e EaD), Unicesumar/PR. Pesquisador do Instituto Cesumar de Ciência, Tecnologia e Inovação. Bolsista Produtividade em Pesquisa do ICETI. Linhas de pesquisa: Educação e Conhecimento; Educação tecnológica; Engenharia do Conhecimento. Currículo: http://lattes.cnpq.br/3392917229544828 Contato: iara.carmevale.almeida@gmail.com Jose Moran Nascido na Espanha, naturalizado brasileiro. Possui graduação em Filosofia pela Faculdade Nossa Senhora Medianeira, Mestrado e Doutorado em Ciências da Comunicação pela Universidade de São Paulo. Foi professor de Novas Tecnologias na Universidade de São Paulo (aposentado). Professor, Pesquisador, Conferencista e Orientador de Projetos de Transformação da Educação com metodologias ativas e bbmodelos híbridos. Acesso aos materiais do Prof. Moran: http://www2.eca.usp.br/moran/ Currículo: http://lattes.cnpq.br/4035390540170184 Larissa Maiara Barbosa Gomes Mestranda do Programa de Gestão do Conhecimento nas Organizações, Campus Maringá/PR, Universidade Cesumar - UNICESUMAR – Bolsista Institucional. Linha de pesquisa: Educação e Conhecimento. Currículo: http://lattes.cnpq.br/8535647119327320 Contato: barbosa.larissa@outlook.com http://lattes.cnpq.br/3392917229544828 mailto:iara.carmevale.almeida@gmail.com http://www2.eca.usp.br/moran/ http://lattes.cnpq.br/4035390540170184 http://lattes.cnpq.br/8535647119327320 mailto:barbosa.larissa@outlook.com 168 Letícia de Souza Nascimento É especialista em Metodologia do Ensino de Língua Portuguesa (UNICAMP) e em Educação Especial na Perspectiva da Educação Inclusiva (UNESP). Graduada em Letras e Pedagogia. Docente do Ensino Básico no Estado de São Paulo, atuando no Programa de Ensino Integral. Atualmente cursa especialização em Metodologias Ativas pela FARESE. Currículo: http://lattes.cnpq.br/9105544774855444 Contato: leticia.s.nascimento@hotmail.com Maria da Paixão Dias Santos Graduada em Letras com Inglês pelo Centro Universitário Jorge Amado. Pós graduada Lato Sensu em Psicopedagogia pela Faculdade FACCEBA e Psicomotricidade Lato Sensu pela Faculdade Visconde de Cairú; Concluiu duas disciplinas isoladas como aluna especial do Programa de Pós Graduação em Letras e Cultura da UCS - Universidade de Caxias do Sul (Ensino de Língua como Objeto de Pesquisa e Leituras Orientadas em Saussure e Benveniste); Membro da Anfope Sergipe; Pesquisadora do Grupo de Pesquisa em Políticas Públicas, Gestão Socioeducacional e Formação de Professores da Universidade Tiradentes - GPGFOPE/UNIT/CNPq e voluntária no TRANSEJA/UNIT/OBEDUC/CAPES/INEP; Pesquisadora do GEES/GEPED - Grupo de Estudos em Educação Superior na UFS- Universidade Federal de Sergipe. Currículo: http://lattes.cnpq.br/7726110792531092 Contato: maradiassantos@yahoo.com.br http://lattes.cnpq.br/9105544774855444 http://lattes.cnpq.br/9105544774855444 mailto:leticia.s.nascimento@hotmail.com http://lattes.cnpq.br/7726110792531092 mailto:maradiassantos@yahoo.com.br 169 Maria Lucia Zanesco Possui Bacharelado e Licenciatura em História pela USP, Especialização em História na PUC-SP e Mediadora de Enriquecimento Instrumental de Feuerstein - Instituto Feuerstein e Educvida. Aluna da Especialização em Psicopedagogia na FAI, Santa Rita do Sapucaí. Professora de História na Fundação Bradesco - Itajubá e membro do GRFP - Grupo de Estudos e Pesquisas Formação de Professores. Currículo: http://lattes.cnpq.br/4894555503367130 Contato: mlzanesco@yahoo.com.br Marlene Neves Furlan Lozano Graduada em Pedagogia pela UNESP, especialização em Psicopedagogia Institucional e Clínica pela FACINTER/IBPEX, especialização em Psicologia Positiva e Coaching pelo IBC - Instituto Brasileiro de Coaching e BCI - Behavioral Coaching Institute - USA. Membro do Grupo GRFP - Grupo de Estudos e Pesquisas Formação de Professores. Experiência de 33 anos em coordenação de projetos, implantação de cursos, formação de educadores e produção de materiais didáticos, com ênfase na Educação Básica e Inclusiva, EJA/Alfabetização e Educação Profissional. Atualmente é Consultora Educacional com foco em Avaliação, Currículo, Didática, Ensino, Planejamento e Inovação; Coach Life e Ericksoniana e Orientadora Pedagógica do Ensino Fundamental II no Colégio Presbiteriano Mackenzie. Currículo: http://lattes.cnpq.br/3400214827556931 Contato: marlene.furlan.lozano@gmail.com http://lattes.cnpq.br/4894555503367130 mailto:mlzanesco@yahoo.com.br http://lattes.cnpq.br/3400214827556931 mailto:marlene.furlan.lozano@gmail.com 170 Patrícia Aparecida Gonçalves de Faria É doutora em Letras pela Universidade Estadual Paulista Júlio de Mesquita Filho - Campus de São José do Rio Preto. Docente do Ensino Básico no Estado de São Paulo. Atua como pesquisadora no grupo de pesquisa "Narrativas maravilhosas, míticas ou populares: da oralidade à Literatura". Atualmente é docente do curso de Letras do UNISAGRADO. Currículo: http://lattes.cnpq.br/5090412904533672 Contato: patricia_faria09@yahoo.com.br Rosana Meire de Lima Possui graduação em História - Faculdade de Filosofia, Ciências e Letras de Itajubá (1997); Especialização em Gestão de Programa de Reforma Agrária e Assentamento - UFLA; Mestrado em Educação pela Universidade Vale do Rio Verde (2006), atuando principalmente nos seguintes temas: memória, história oral, arquivo, história da educação, historiador local, assentamentos e formação de professores. Currículo: http://lattes.cnpq.br/7705122206869582 Contato: rosana_me@uol.com.br RosimeyreMaria dos Santos Passaro Graduada em História pela Faculdade de Filosofia Ciências e Letras de Itajubá (1992), Especialização em Programa de Assentamento e Reforma Agrária pela Universidade Federal de Lavras - UFLA e Mestrado em Educação pela Universidade Vale do Rio Verde (2005). Professora de História do Ensino Básico. Tem experiência na área de formação de professores, currículos e história da educação, atuando nos seguintes temas: educação, currículo, filosofia e história. Currículo: http://lattes.cnpq.br/7231862555997573 Contato: rosyms.santos@gmail.com http://lattes.cnpq.br/5090412904533672 http://lattes.cnpq.br/5090412904533672 http://lattes.cnpq.br/7705122206869582 mailto:rosana_me@uol.com.br https://wwws.cnpq.br/cvlattesweb/PKG_MENU.menu?f_cod=CC86D91F5C6DD894782B7F813DE0FACF mailto:rosyms.santos@gmail.com 171 Tamyres de Fátima dos Santos Graduada no curso de Licenciatura em Ciências Biológicas pela Universidade Federal de Lavras. Participou por 2 anos como voluntária no Laboratório de Drosofilídeos da UFSC com Taxonomia (voltada para a identificação de espécies de Drosophilas bioindicadoras) e análise de cromossomos politênicos de Drosophila Polymorpha. Na UFLA, participou do Projeto Acessibilidade na Saúde em Atendimento aos Surdos (Projeto ASAS) de 2017 a 2020, foi bolsista do programa institucional PADNEE (Programa de Apoio à Discentes com Necessidades Educacionais Especiais e do UFLA Libras, entre outros projetos voltados à acessibilidade. No momento é graduanda no curso de Letras- LIBRAS na Universidade Única de Ipatinga e mestranda em Educação pela World Christian University -WCU. Currículo: http://lattes.cnpq.br/0858515332776152 Contato: tamybio27@gmail.com Viviane Sartori Mestre e Doutora em Engenharia e Gestão do Conhecimento pela Universidade Federal de Santa Catarina. Graduada em Pedagogia pela Universidade Estadual de Maringá. Docente do Mestrado em Gestão do Conhecimento nas Organizações da Unicesumar. Linhas de pesquisa: Educação e Conhecimento; Conhecimento e Inovação; Investigação, Formação, Interculturalidade e Inovação da Educação. Currículo: http://lattes.cnpq.br/3011021663764259 Contato: vivi.sartori19@gmail.com http://lattes.cnpq.br/0858515332776152 http://lattes.cnpq.br/3011021663764259 mailto:vivi.sartori19@gmail.com 172 Quarta capa