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Universidade de Brasília – UnB Instituto de Ciências Biológicas – IB Programa de Pós-Graduação em Biologia Molecular Peptídeos isolados da peçonha da aranha caranguejeira Acanthoscurria paulensis: caracterização da atividade eletrofisiológica em canais iônicos dependentes de voltagem Autor: Diogo Vieira Tibery Brasília - DF Fevereiro, 2020 2 Agradecimentos Inicialmente, gostaria de agradecer aos meus pais e minha família que me apoiaram todos os dias e me deram condições para me dedicar exclusivamente à pesquisa. Agradecer à minha namorada que me deu todo o apoio nessa etapa crucial da minha vida e sempre me deu suporte nos momentos mais difíceis. Agradecer à minha orientadora Elisabeth Schwartz por ter me dado oportunidade desde 2013, quando iniciei a pesquisa, oferecendo projetos de iniciação científica. Por toda a orientação necessária para a realização desse trabalho e suporte. Agradecer à Dra. Caroline Barbosa Mourão por ter me aceitado como seu estagiário e compartilhado conhecimentos sobre a toxinologia. Agradecer ao Dr. Leandro Ambrósio por ter me ensinado a técnica de Patch Clamp. Aos meus colegas de pesquisa que me ajudaram diariamente durante esse projeto ou em algum momento dentro da pesquisa Daniel da Mata, Alessa Bembom, Isolda Monteiro, Mariza Mendanha, Gabriel Avohay, Luís Felipe Santos Menezes, Harry Morales, Beatriz Sarmiento, Adolfo Carlos Barros de Souza, Elias Sabiá e Danilo Gustavo. Agradeço ao Professor Lourival Possani por me aceitar em seu laboratório no Instituto de Biotecnologia (IBT) da Universidad Autónoma De México - Cuernavaca (UNAM). Ao Dr. Ernesto Ortiz e Dra. Rita Restano-Cassulini por terem me oferecido todo o suporte necessário para minha estadia no México. Agradeço ao programa de Pós-graduação em Biologia Molecular pela oportunidade. Agradeço a CAPES, CNPq e FAPDF pelo apoio financeiro dado durante o período deste projeto. 3 Resumo Aranhas são artrópodes da ordem Aranae que possuem em suas peçonhas uma grande diversidade de compostos, como sais, ácidos orgânicos, enzimas, proteínas e peptídeos. Dentre esses compostos os peptídeos possuem grande interesse farmacológico devido à atividade neurotóxica por meia da ação em canais iônicos dependentes de voltagem presentes no sistema nervoso central, sistema nervoso periférico, músculo cardíaco e músculo esquelético. Da peçonha da aranha caranguejeira encontrada no território brasileiro Acanthoscurria paulensis, foram descritos aproximadamente 100 componentes. Dentre esses componentes apenas uma toxina peptídica Ap1a foi purificada e caracterizada quanto à sua atividade biológica. Neste trabalho foram purificadas cinco novas toxinas peptídicas nomeadas como Ap2, Ap3, Ap4, Ap5 e Ap6 por RP-HPLC, sequenciadas por In-souce Decay e suas sequências completadas e confirmadas pela análise no transcritoma da glândula de peçonha de A. paulensis. Os peptídeos Ap2, Ap3, Ap4, Ap5 e Ap6 possuem, respectivamente, com 42, 41, 35, 46 e 31 resíduos de aminoácidos, e, massas moleculares experimentais de 4886,3 Da, 4883,7 Da, 3870,76 Da, 5454,9 Da e 3717,9 Da, sendo que o peptídeo Ap2, apresenta a serina do C-terminal amidada. Buscas em bancos de dados públicos de sequências indicaram que peptídeos Ap2, Ap3, Ap4, Ap5 e Ap6 possuem similaridades com toxinas peptídicas que apresentam o motivo estrutural conhecido como ICK (Inhibitory Cystine Knot) sendo possíveis moduladoras de canais iônicos. Desta forma, as toxinas isoladas neste trabalho foram submetidas a ensaios eletrofisiológicos em canais de Na+ (NaV) e de Ca2+ (CaV) dependentes de voltagem. Dentre os canais NaV1.1, NaV1.5, NaV1.7, CaV1.2, CaV2.1 e CaV2.2 testados, as toxinas Ap2, Ap3, Ap5 e Ap6, apresentaram atividade, com inibição entre 10 e 30%, nos canais CaV2.1. Estas quatro toxinas são, portanto, caracterizadas como as primeiras ω-toxinas de aranhas caranguejeiras do gênero Acanthoscurria com atividade em canais de cálcio descritas. A toxina Ap3 inibiu em 6,6%, 4,2% e 12,05% os canais NaV1.1, Nav1.5 e Nav1.7 respectivamente. O presente trabalho contribui para a ampliação do conhecimento a respeito dos componentes da peçonha de aranhas no Brasil, assim como para a descrição de novos compostos bioativos que podem ser utilizados como ferramentas farmacológicas para compreensão do mecanismo de funcionamento de canais iônicos e da interação com toxinas peptídicas. 4 Resumo em Inglês – Abstract Spiders are arthropods from the Aranae order that have in their venoms a great diversity of compounds, such as salts, organic acids, enzymes, proteins and peptides. Among these compounds, peptides are of pharmacological interest due to their neurotoxic activity, acting on voltage-dependent ion channels present in the central nervous system, peripheral nervous system, cardiac muscle and skeletal muscle. In the venom of the spider Acanthoscurria paulensis found in Brazilian territory, approximately 100 components were described, among these components only the peptide toxin Ap1a was purified and had experiments to characterize biological activity. In this present work, five new peptide toxins entitled as Ap2, Ap3, Ap4, Ap5 and Ap6 were purified by RP-HPLC, sequenced by In-souce Decay and their sequences completed and confirmed by analysis in the transcriptome of the venom gland. A. paulensis. The Ap2, Ap3, Ap4, Ap5 and Ap6 peptides have, respectively, 42, 41, 35, 46 and 31 amino acid residues, and experimental molecular masses of 4886.3, 4883.7, 3870.76, 5454.9 and 3717.9 Da, with the Ap2 peptide having the amidated C-terminal serine. Searching in sequence databases indicated that Ap2, Ap3, Ap4, Ap5 and Ap6 peptides have similarities with peptide toxins that present the structural motif known as ICK (Inhibitory Cystine Knot), which have the possibility of modulating ion channels. The toxins isolated in the present work were submitted to electrophysiological experiments in voltage-dependent Na+ (NaV) and Ca2+ (CaV) channels. Among the channels NaV1.1, NaV1.5, NaV1.7, CaV1.2, CaV2.1 and CaV2.2 tested, the toxins Ap2, Ap3, Ap5 and Ap6, showed inhibition activity between 10 and 30%, in CaV2.1 channel. These four toxins are, therefore, characterized as the first ω-toxins of spiders of the genus Acanthoscurria that have activity in calcium channels described. The Ap3 toxin inhibited the channels NaV1.1, NaV1.5 and NaV1.7 by 6.6%, 4.2% and 12.05% respectively. With these results, the present work contributes to the expansion of knowledge about the components of the venom of spiders in Brazil, as well as to the description of new bioactive compounds that can be used as pharmacological tools to understand the mechanism of functioning of ion channels and interaction with peptide toxins. 5 Lista de Ilustrações Figura 1 - Espécime fêmea de Acanthoscurria paulensis. ........................................ 11 Figura 2 - Representação esquemática do Canal de Sódio Dependente de Voltagem.. 17 Figura 3 - Ilustração Canal de Cálcio Dependente de Voltagem. ............................... 22 Figura 4 - Protocolos de estímulo utilizado para o Patch Clamp................................ 33 Figura 5 - Cromatograma de 5 mg peçonha bruta A. paulensis por RP-HPLC.. ......... 36 Figura 6 – Cromatograma purificação do peptídeo Ap2.. .......................................... 37 Figura 7 - Espectro de Massas do peptídeo Ap2. ....................................................... 37 Figura 8 – Cromatograma Purificação do peptídeo Ap3. ........................................... 38 Figura 9 - Espectro de Massas do peptídeo Ap3. ....................................................... 39 Figura 10 – Cromatograma Sub-fracionamento da fração os peptídeos Ap4 e Ap5. ... 40 Figura 11 – Cromatograma Purificação do peptídeoAp4. ......................................... 41 Figura 12 - Espectro de Massas do peptídeo Ap4.. .................................................... 41 Figura 13 – Cromatograma Purificação do peptídeo Ap5. ......................................... 42 Figura 14 - Espectro de massas do peptídeo Ap5 ...................................................... 43 Figura 15 – Cromatograma Purificação do peptídeo Ap6. ......................................... 44 Figura 16 - Espectro de massas do peptídeo Ap6. ..................................................... 44 Figura 17 - Sequência parcial do peptídeo Ap2 obtida por meio da técnica de espectrometria de massas (MS) pelo método de In-Source Decay (ISD). .............................. 45 Figura 18 - Sequência parcial do peptídeo Ap3 obtida por meio da técnica de espectrometria de massas (MS) pelo método de In-Source Decay (ISD). .............................. 46 Figura 19 - Sequência parcial do peptídeo Ap4 obtida por meio da técnica de espectrometria de massas (MS) pelo método de In-Source Decay (ISD).. ............................. 47 Figura 20 - Sequência parcial do peptídeo Ap5 obtida por meio da técnica de espectrometria de massas (MS) pelo método de In-Source Decay (ISD).. ............................. 48 Figura 21 - Sequência parcial do peptídeo Ap6 obtida por meio da técnica de espectrometria de massas (MS) pelo método de In-Source Decay (ISD).. ............................. 49 Figura 22 - Alinhamento múltiplo das sequências completas obtidas dos peptídeos purificados.. ......................................................................................................................... 49 Figura 23 - Espectro de massas da fração contendo Ap4 e Ap4b. .............................. 50 Figura 24 - Alinhamento dos peptídeos Ap4 e Ap4b. ................................................ 50 Figura 25 - Probabilidade de abertura em canais NaV na presença da Ap2 (1µM). ..... 51 6 Figura 26 - Traços Brutos obtidos nos Canais NaV na presença do peptídeo Ap2 1µM. ............................................................................................................................................ 51 Figura 27 - Probabilidade de abertura em canais NaV na presença da Ap3 1µM. ........ 52 Figura 28 - Traços Brutos obtidos nos Canais NaV na presença da Ap3 1µM. ........... 52 Figura 29 - Probabilidade de abertura em canais NaV na presença da Ap4 1µM......... 53 Figura 30 - Traços Brutos obtidos em Canais NaV na presença da Ap4 1µM. ............ 53 Figura 31 - Probabilidade de abertura em canais NaV na presença de Ap5 1µM. ....... 54 Figura 32 - Traços Brutos obtidos em Canais NaV na presença de Ap5 1µM. ............ 54 Figura 33 - Probabilidade de abertura em canais NaV na presença de Ap6 1µM. ....... 55 Figura 34 - Traços Brutos obtidos em Canais NaV na presença de Ap6. .................... 55 Figura 35 – Caracterização eletrofisiológica obtida em canais CaV na presença do Peptídeo Ap2 ....................................................................................................................... 58 Figura 36 – Caracterização eletrofisiológica obtida em canais CaV na presença do Peptídeo Ap3. ...................................................................................................................... 59 Figura 37 – Caracterização eletrofisiológica obtida em canais CaV na presença do Peptídeo Ap4. ...................................................................................................................... 60 Figura 38 – Caracterização eletrofisiológica obtida em canais CaV na presença do Peptídeo Ap5.. ..................................................................................................................... 61 Figura 39 – Caracterização eletrofisiológica obtida em canais CaV na presença do Peptídeo Ap6. ...................................................................................................................... 62 Figura 40 - Alinhamento Ap2, Ap3 e Ap5 ................................................................ 65 Figura 41 – Alinhamento múltiplo com peptídeos que apresentaram similaridade com os Peptídeos Ap2, Ap3 e Ap5. .............................................................................................. 68 Figura 42 - Alinhamento Múltiplo com os peptídeos que apresentaram similaridade com o peptídeo Ap4.. ................................................................................................................... 70 Figura 43 - Alinhamento Múltiplo com os peptídeos que apresentaram similaridade com o peptídeo Ap6. .................................................................................................................... 72 7 Lista de tabelas Tabela 1 - Isoformas do Canais NaV humanos. SNC - Sistema Nervoso Central; SNP – Sistema Nervoso Periférico .................................................................................................. 18 Tabela 2 - Isoformas das subunidades α1 dos canais CaV .......................................... 21 Tabela 3 – Nomenclatura de toxinas baseadas na função farmacológica. Adaptado de King et al., 2008................................................................................................................... 23 Tabela 4 Valores das médias de ΔV1/2 e Fu obtidos para os canais de sódio na presença dos peptídeos de aranha. Dados obtidos pelo ajuste na equação de Boltzmann (ΔV1/2), cálculo da fração de fração não inibida (Fu) e número de observações (n). Valores de média e erro padrão. Valores com (*) são estatisticamente significantes. .................................................. 56 Tabela 5 – Valores das médias da porcentagem de inibição (%) em canais cálcio. Valores com * são estatisticamente significantes. ................................................................. 63 8 Lista de Siglas e Abreviaturas ABS: Absorbância ACN: Acetonitrila BLAST: Basic Local Alignment Search Tool CaV: Canal de cálcio dependente de voltagem CHO: Células de Ovário de hamster chinês Da: Daltons DDH: Disulfide-directed β-hairpin DRG: Gânglios da raiz dorsal DUM: Dorsal unpaired median gNa: Condutância ao íon sódio HEK: Células embrionárias de rim humano HVA: High-voltage-activated ICK: Inhibitory Cystine Knot TFA: Ácido trifluoroacético ACN: Acetonitrila HCCA: α-Cyano-4-hydroxynnamic acid DAN: 1,5 Diaminonaftaleno ISD: In-source Decay NaV: Canal de sódio dependente de voltagem KV: Canal de potássio dependente de voltagem VMax: Voltagem que estimula a corrente de maior amplitude HnTx: Hainantoxina HwTx: Huwentoxina PSM: Motivo estrutural principal ICK ESM: Motivo estrutural extra ICK 9 Sumário Agradecimentos ...................................................................................................... 2 Resumo .................................................................................................................. 3 Lista de Ilustrações ................................................................................................. 5 1 – Introdução ....................................................................................................... 11 Aranhas caranguejeiras – Generalidades ........................................................... 11 Acanthoscurria paulensis .................................................................................. 11 Composição bioquímica da peçonha de aranhas ................................................ 12 Acilpoliaminas .................................................................................................. 12 Peptídeos Lineares ............................................................................................ 12 Motivos estruturais de toxinas peptídicas de aranhas ......................................... 13 Eletrofisiologia– História ................................................................................. 14 Canais iônicos e o Potencial de Ação ................................................................ 15 Canais de Sódio (NaV) ...................................................................................... 16 Sítios de Ligação nos NaV e as Toxinas ICK ..................................................... 18 Canais de Cálcio (CaV)...................................................................................... 20 Nomenclatura para toxinas .................................................................................... 23 Peçonha de aranha e seus potenciais farmacológicos ......................................... 24 Estudos da caracterização da peçonha de Acanthoscurria paulensis .................. 25 2 – Justificativa ..................................................................................................... 26 3 – Objetivos ........................................................................................................ 27 3.1 – Objetivo Geral .......................................................................................... 27 3.2 – Objetivos Específicos ............................................................................... 27 4 - Metodologia .................................................................................................... 28 4.1 Extração da Peçonha por eletroestimulação ................................................. 28 4.2 Cromatografia Líquida de Alta eficiência em Fase Reversa (RP-HPLC) ...... 28 4.3 Espectrometria de massa (MALDI TOF/TOF) ................................................ 30 10 4.4 Quantificação dos peptídeos (Colorimetria BCA-Cobre) ................................. 30 4.5 Sequenciamento (In-source Decay – MALDI TOF-TOF) ................................ 30 4.6 Busca por similaridade .................................................................................... 30 4.7: Cultura de células .......................................................................................... 31 4.8 Plasmídeos – Canais de cálcio dependentes de voltagem ............................. 31 4.9 Transfecção Transiente canais de Calcio dependentes de voltagem ............. 32 4.10 Eletrofisiologia – Setup experimental para Patch Clamp ........................... 32 4.11 Eletrofisiologia – Análise de dados............................................................ 33 5 – Resultados ...................................................................................................... 36 5.1 Fracionamento de peçonha Bruta e Purificação dos peptídeos ..................... 36 5.2 Sequenciamentos......................................................................................... 45 5.3 Eletrofisiologia em canais de sódio dependentes de voltagem...................... 51 5.4 Eletrofisiologia em canais de cálcio dependentes de voltagem ..................... 57 6 – Discussão ........................................................................................................ 64 5 – Conclusão ....................................................................................................... 75 6 – Perspectivas .................................................................................................... 76 Referências Bibliográficas .................................................................................... 77 11 1 – Introdução Aranhas caranguejeiras – Generalidades As aranhas são artrópodes, filo que constitui aproximadamente 75-85% das espécies conhecidas. Pertencem à ordem Aranae e habitam o ambiente terrestre há mais de 300 milhões de anos, pela datação de fósseis. Existindo atualmente catalogadas 48.424 espécies em 120 famílias e 4154 gêneros (Natural History Museum Bern, 2020). A família das aranhas Theraphosidae popularmente conhecidas como tarântulas ou caranguejeiras, possuem atualmente 147 gêneros descritos (Escoubas and Rash, 2004; Natural History Museum Bern, 2020; Rash and Hodgson, 2002). As aranhas possuem glândulas produtoras de peçonha localizadas abaixo do segmento queliceral e quelíceras capazes de injetar a peçonha, sendo a peçonha utilizada tanto para predação de invertebrados e pequenos vertebrados, como proteção contra vertebrados maiores (Escoubas and Rash, 2004). Acanthoscurria paulensis Dez espécies do gênero Acanthoscurria foram descritas no Brasil por Mello-Leitão em 1923 (Mello-Leitão, 1923). Dentre essas espécies foi catalogada a Acanthoscurria paulensis a partir de um macho encontrado em Pirassununga no Estado de São Paulo. Vellard, em 1924, descreveu a espécie Acanthoscurria atrox que posteriormente foi identificada como a mesma espécie que A. paulensis por Lucas e colaboradores 2010 e foi mantido o nome dado por Mello- Leitão (Lucas et al., 2010). Figura 1 - Espécime fêmea de Acanthoscurria paulensis. Fotos: Diogo Tibery. Esquerda: Vista Dorsal de exemplar de Acanthoscurria paulensis fêmea. Direita: Vista ventral de exemplar de Acanthoscurria paulensis fêmea 12 Composição bioquímica da peçonha de aranhas Os componentes da peçonha de aranha são produzidos pelas glândulas secretoras, sendo revestidas por uma camada de músculo que controla a liberação de peçonha e inervada por pequenos axônios, sugerindo um controle nervoso sobre as células secretoras (Malli et al., 2000). São descritos componentes de baixa massa molecular, peptídeos, proteínas e enzimas (Langenegger et al., 2019). Os componentes de baixa massa molecular caracterizados são aminoácidos livres, íons, acilpoliaminas, ácidos orgânicos, nucleotídeos e nucleosídeos (Kuhn- Nentwig et al., 2011). Acilpoliaminas As acilpoliaminas são um grupo de compostos estruturados a partir de um grupo aromático acil e um esqueleto de poliaminas, podendo estar presente alguns aminoácidos em seu esqueleto, com massas moleculares de 350 a 1000 Da (Kuhn-Nentwig et al., 2011; Manzoli-Palma et al., 2006). As acilpoliaminas possuem como um dos alvos moleculares os canais ionotrópicos, atuando, por exemplo, em receptores de glutamato (GluR) de insetos e de mamíferos, despertando interesse como inseticidas, ou como fármacos (Mellor and Usherwood, 2004). A acilpoliamina AG489 da aranha Agelenopsis aperta apresentou atividade inibitória no receptor de capsaicina TRPV1, um canal catiônico não seletivo, mostrando o grande potencial farmacológico desses compostos (Manzoli-Palma et al., 2006). Peptídeos Lineares Os peptídeos lineares da peçonha de aranha não apresentam cisteínas em suas sequências primárias, podendo apresentar a formação de α-hélices, e são classificados como possíveis peptídeos citolíticos ou antimicrobianos (AMPs), apresentando características catiônicas (Kuhn-Nentwig, 2003; Langenegger et al., 2019). Tais toxinas possuem alta densidade de aminoácidos com cadeias laterais carregadas positivamente, como Arginina e Lisina (Corzo and Escoubas, 2003), que apresentam atração pelos grupos com carga negativa presentes nos fosfolipídios de membranas celulares e promovem desestabilização com formação de poros (Langenegger et al., 2019). 13 Motivos estruturais de toxinas peptídicas de aranhas Toxinas peptídicas ricas em cisteínas encontradas em peçonhas de aranhas caranguejeiras formam ligações dissulfeto entre si, permitindo a formação de estruturas compactadas. Três motivos estruturais compreendem tais toxinas peptídicas, o motivo ICK (inhibitor cystine-knot), o motivo DDH (disulfide direct β-hairpin) e o motivo Kunitz-like (Vassilevski et al., 2009). O motivo de ICK é caracterizado por uma folha beta de 3 fitas antiparalelas que são estabilizados por 3 ligações dissulfeto (King et al., 2002). O motivo estrutural segue o consenso da disposição dos resíduos de cisteínas C1X3-7C2X3-6C3X0-5C4X1-4C5X4-13C6, onde Cn é onúmero da cisteína na estrutura primária e Xn é número de resíduos de aminoácidos entre as cisteínas; ocorre um anel de cistina nas ligações C1-C4 e C2-C5 e que são transpassados por uma terceira cistina C3-C6 formando um nó entre as cistinas (Norton and Pallaghy, 1998; Pallaghy et al., 1994). O “submotivo” PSM (Principal structural Motif) dentro do motivo ICK, restringe as quatro primeiras cisteínas C1X3-7C2X3-6C3X0-5C4X1 como a região responsável pela possível atividade neurotóxica. Outro “submotivo” foi descrito para toxinas com 7 ou 8 cisteínas que seguem o padrão ICK nas 6 primeiras cisteínas mas apresentam cisteínas extras, tal motivo foi escrito como ESM (Extra structural motif) e apresenta a adição de resíduos de aminoácidos após a C6 com mais duas cisteínas intercaladas por apenas um resíduo de aminoácidos, seguindo o consenso C5X4-13 C6XnC7X1C8 (Kozlov et al., 2005) No motivo DDH, não existe a formação do nó de cistinas e ocorre a formação de uma estrutura β-Hairpin estabilizada por duas ligações dissulfeto obrigatórias (C1-C4 e C2-C5), seguindo uma sequência consenso de CX5-19CX2-[G ou P]-X2CX6-19C. Acredita-se que o motivo DDH seja a estrutura que deu origem, na evolução molecular, ao motivo ICK (Wang et al., 2000; Escoubas and Rash, 2004). O motivo do tipo Kunitz apresenta a ligação das cisteínas no consenso C1-C6, C2-C5, C3-C5, permitindo a formação de uma folha-β antiparalela (Langenegger et al., 2019). Nas aranhas caranguejeiras Ornithoctonus huwena e O. hainana foi descrita uma nova família de KTT (Kunitz type toxins) capaz de inibir serinoproteases e que apresenta atividade fraca em canais de potássio KV1.1 (Yuan et al., 2008). 14 Eletrofisiologia – História O início da eletrofisiologia se dá pelos estudos de Luige Galvani ,em 1771, ao supor uma energia elétrica vital em formato de fluido, responsável pela condução nervosa e a contração muscular ao observar a contração muscular nas pernas de sapo após contato de um equipamento eletricamente carregado (Piccolino, 1998). Allesandro Volta, em 1800, produziu a primeira bateria eletroquímica baseada em placas de zinco e cobre, sendo um passo essencial para os futuros experimentos de Giovanni Aldini que utilizou a energia proveniente das baterias para demonstrar a “reanimação” do corpo de um assassino recém executado. Carlo Matteuci, em 1840, após a criação do galvanômetro em 1820 por Hans Oersted, utilizou o galvanômetro para detecção de um fluxo de corrente elétrica em músculos intactos e, ao colocar pernas de rã em série, a corrente detectada apresentava-se maior com a adição de mais pernas em série, mostrando a origem de natureza biológica da corrente elétrica detectada (Piccolino and Wade, 2012). A eletrofisiologia “moderna” se inicia em 1939 por Alan Hodgkin e Andrew Huxley pelo primeiro registro de um potencial de ação da fibra de um axônio gigante de lula (Hodgkin and Huxley, 1939). Entre 1947 e 1949, surgiu a ideia de controle da voltagem (Voltagem Clamp) das membranas com o uso de dois eletrodos, sendo um para o controle da voltagem e outro para o registro da variação de corrente. Dessa forma, permitiu o registro de correntes iônicas diretamente, sem a presença dos problemas causados pelos outros métodos de registro, sendo tal advento do trabalho de K. S. Cole, G. Marmont, A. Hodgkin e A. Huxley (Hille, 2001). A. Hodgkin e A. Huxley , em 1952, após diversos estudos com variações de condições das soluções de registro descobriram que as correntes iônicas tinham como principais componentes os íons Na+ e K+, sendo esses dois componentes separados e descritos como correntes de sódio e correntes de potássio. Ao analisar as cinéticas das correntes de sódio e potássio foi proposto o modelo “m3h, n4,” em que se supôs que para um canal de potássio abrir por uma variação de voltagem necessitaria de partículas carregadas “n”, sendo que n4 apresentaria a cinética ideal para o ajuste dentro dos dados experimentais, sendo a condutância do íon potássio gK = Gkn4 e, para as correntes de sódio, foi proposto a presença partículas m, sendo m3 o ajuste ideal para a ativação do canal e h a partícula de inativação, sendo a condutância do sódio gNa=gNam3h. Descrição de tal modelo na época impressiona, pois não havia conhecimento sobre os sensores de voltagem do canal de sódio, que foi apenas descrito 15 em 1980 por Beneski e Catterral, sendo o movimento de três sensores associados diretamente ao processo de ativação do canal e um sensor relacionado ao processo de inativação do canal (Hodgkin and Huxley, 1952; Schwiening, 2012; Beneski and Catterall, 1980; Catterall, 2017). Canais iônicos e o Potencial de Ação Os canais iônicos dependentes de voltagem são proteínas transmembrânicas que apresentam seletividade maior para um íon específico dos fluídos intracelulares ou extracelulares. A estrutura básica de um canal iônico dependente de voltagem consiste em quatro domínios transmembrânicos que se unem formando poro iônico seletivo e uma região ao redor do poro responsável por captar as variações de voltagem na membrana e produzir alterações conformacionais para a abertura do poro iônico. Tal estrutura básica é conservada com modificações específicas para cada um dos canais dependentes de voltagem existentes. Os canais iônicos são responsáveis pela excitabilidade elétrica das células em organismos, sendo os elementos excitáveis básicos na membrana celular dos nervos, músculos e outros tecidos possibilitando a iniciação, propagação e transdução do sinal elétrico (Hille, 2001; Yu and Catterall, 2003; Yu, 2005). Os canais de sódio dependentes de voltagem são ativados com variação de milivolts na membrana que, ao atingir o limiar, permite o influxo substancial de íons Na+ para o interior da célula e promove a despolarização da membrana. Ao despolarizar a membrana, canais de potássio são ativados e permitem o efluxo de íons K+ para a repolarização da membrana em valores negativos. Entre o processo de despolarização total da membrana e a repolarização, ocorre a ativação dos canais de cálcio, que apresentam limiar de ativação entre os canais de sódio e potássio, gerando o influxo do íon Ca2+ que, além de transmitir cargas positivas para dentro da célula, funciona como segundo mensageiro em respostas celulares. Tal processo descrito é conhecido como potencial de ação (Catterall et al., 2017). O potencial de ação foi o mecanismo selecionado pela evolução para a rápida transmissão de informações em formato de sinal elétrico a partir do sistema nervoso para células, tecidos, músculos, com velocidade de transmissão e amplitudes constantes em condições fisiológicas ideais (Raghavan et al., 2019). 16 Canais de Sódio (NaV) Os canais de sódio dependentes de voltagem (NaV) são proteínas transmembrânicas formadas por duas subunidades (α/β), a subunidade α formadora de poro possui aproximadamente 260 kDa e 2000 resíduos de aminoácidos organizados em quatro domínios homólogos (DI-DIV), sendo que cada um dos domínios é formado por seis segmentos transmembrânicos (S1-S6) (Figura 2). Os domínios são bem conservados entre si, apresentando a região conhecida como sensor de voltagem localizada entre os segmentos transmembrânicos S1-S4 e a região formadora de poro S5-S6. Os segmentos transmembrânicos S4 possuem resíduos de Arg e Lys intercalados por outros aminoácidos, caracterizando uma região rica em resíduos com cargas positivas conhecidas como Gating charges (Ahern et al., 2016). A condutância ao sódio pelo canal se inicia pela despolarização da membrana que altera o campo elétrico em que as Gating charges dos resíduos Arg e Lys estão estabilizadas e promove assim o deslocamento dos segmentos transmembrânicos S4 para a porção extracelular e o movimento dos segmentos S4 entre segmentos hidrofóbicos em que estão alocados promove a movimentação entre as alçasde ligação entre segmentos S4-S5 e afasta assim os segmentos S6, iniciando o influxo do íon Na+ (Yan et al., 2017; Clairfeuille et al., 2019; Ahern et al., 2016). Os sensores de voltagem dos domínios DI, DII e DIII se movimentam mais rápido que o sensor de voltagem do DIV e essa assincronia na movimentação é uma característica essencial no processo de ativação e inativação do canal, uma vez que a movimentação do sensor de voltagem do domínio 4 está associada ao deslocamento de uma alça intracelular entre o DIII e DIV que contém um motivo IFM (isoleucina, fenilalanina, metionina) que atua como uma comporta de inativação do canal, interrompendo rapidamente a condutância do Na+ e caracterizando o processo de inativação rápida, única dos canais NaV (Lacroix et al., 2013; Goldschen-Ohm et al., 2013; Capes et al., 2013). 17 Figura 2 - Representação esquemática do Canal de Sódio Dependente de Voltagem. Em verde a representação da região sensor de voltagem S1-S4. Em vermelho as alças intracelulares entre os segmentos S4-S5. Em Azul escuro representação dos segmentos formadores de poro S5-S6 (Adaptado de W. A. Catterall and Swanson 2015). O filtro de seletividade está presente na parte superior do caminho de passagem para o íon, sendo formado por 4 cargas negativas oriundas de resíduos de ácido glutâmico na parte mais extracelular no canal de bactéria NaVAb, formando a estrutura chamada de HFS (High- Field-Strength) altamente carregada, também conhecida como DEKA em canais de mamífero, formada pelos resíduos Asp373-Glu901-Lys1421-Ala1713, sendo essa estrutura essencial para a seletividade ao íon Na+ (Payandeh et al., 2011; Catterall, 2017; Jiang et al., 2020). Em humanos, são descritas atualmente 9 isoformas da subunidade α (NaV1.1-NaV1.9) com particularidades quanto ao funcionamento e distribuição nos tecidos do sistema nervoso central, sistema nervoso periférico, músculo esquelético e músculo cardíaco (Alexander et al., 2015; Kwong and Carr, 2015) (Tabela1). 18 Tabela 1 - Isoformas do Canais NaV humanos. SNC - Sistema Nervoso Central; SNP – Sistema Nervoso Periférico Isoforma Expressão Gene NaV1.1 SNC, SNP SCN1A NaV1.2 SNC, SNP SCN2A NaV1.3 SNC, SNP SCN3A NaV1.4 Músculo Esquelético SCN4A NaV1.5 Músculo Cardíaco SCN5A NaV1.6 SNC, SNP SCN8A NaV1.7 SNP SCN9A NaV1.8 SNP SCN10A NaV1.9 SNC SCN11A Existem dois tipos de subunidades β no canal de sódio β1/β3 e β2/β4, sendo que as subunidades β1/β3 não são ligadas covalentemente à subunidade α, já as subunidades β2/β4 apresentam ligações dissulfeto com a subunidade formadora de poro (Gilchrist et al., 2013). As subunidades beta são capazes de modular o funcionamento da subunidade alfa aumentando a amplitude das correntes, alterando a dependência de voltagem na ativação e inativação do canal (Bouza and Isom, 2018). Os canais de sódio dependentes de voltagem em insetos são bastante semelhantes aos canais de mamíferos, com pequenas modificações em sequência e sensibilidade aos moduladores. Igualmente aos canais de mamífero, são constituídos de 4 domínios homólogos e cada domínio possui os seis segmentos transmembrânicos, com a região do sensor de voltagem, a região formadora de poro e a de inativação rápida pela presença de um motivo MFM, similar ao motivo IFM de mamíferos (Du et al., 2016). Já foram caracterizados diversos canais de insetos, como o BgNaV da barata Blattella germanica, Vssc1 da mosca doméstica e os canais PaFPC1e NaVpas da barata Periplaneta americana (Du et al., 2016; Shen et al., 2017) Sítios de Ligação nos NaV e as Toxinas ICK Devido à sua grande função como iniciador do potencial de ação em diversos tecidos, o canal de sódio é o alvo de diversas toxinas com sítios de ligação ao canal bem definidos (Cestèle and Catterall, 2000; Catterall et al., 2007). 19 São descritos 5 sítios de interação das neurotoxinas ao canal de sódio, o sítio de interação 1 é o poro iônico, formado pelas alças intracelulares S5-S6 dos quatro domínios, sendo esse o sítio de ligação das toxinas tetrodotoxina (TTX) e saxitoxina (STX), que ao ligarem ao canal promovem bloqueio da corrente iônica sem alteração na dependência da voltagem. O sítio de interação 2 consiste no segmento S6 do domínio I pela porção intracelular, sendo o alvo molecular toxinas lipossolúveis e alcaloides, a ligação a esse sítio promove uma inibição do processo de inativação rápida do canal de sódio. O sítio de interação 3 é conhecido por ser a região de interação das toxinas α de escorpião, constituído da alça extracelular S3-S4 do domínio 4, sua interação por toxinas α de escorpião promove um atraso ou inibição do processo de inativação rápida, efeito similar ao da ligação pelo sítio 2, mas com interação extracelular. O sítio de interação 4 é o sítio de atuação das toxinas β de escorpião, formado pelas alças extracelulares do sensor de voltagem do domínio II, a sua ligação por β-toxinas de escorpião promove um aumento da excitabilidade do canal em voltagens próximas ao potencial de repouso, alterando a dependência de voltagem do canal de sódio junto com a inibição da amplitude de corrente. O sítio de interação 5 é composto pelo segmento S6 do domínio I e do segmento S5 do domínio 4 pela região intracelular, sua ligação por compostos lipofílicos promove efeito parecido com o da ligação ao sitio 2, com inibição da inativação rápida, mas com o adicional de deslocamento da voltagem para ativação do canal para potenciais mais negativos (Catterall et al., 2007; Cestèle and Catterall, 2000; Cestèle et al., 1998; Zilberberg et al., 1997; Lukowski and Narayan, 2019). Toxinas de aranha com o motivo ICK são descritas com a capacidade de interagir com os sítios 3 e/ou 4 dos canais de sódio, promovendo tanto a inibição do canal por aprisionar o sensor de voltagem do domínio II no estado fechado, quanto o aumento da excitabilidade do canal por manter o sensor de voltagem do domínio II no estado ativado up e a inibição da inativação rápida por manter o sensor de voltagem do domínio 4 aprisionado na posição down (Dongol et al., 2019). A superfície hidrofóbica rodeada por resíduos carregados formado pelo dobramento das toxinas compactadas pelo motivo ICK é uma característica essencial para a interação com canais iônicos (Dongol et al., 2019). A presença de resíduos hidrofóbicos e aromáticos entre as cisteínas C1 e C2, entre C5 e C6 e na região C-terminal, juntamente com os resíduos com carga positiva entre C5 e C6 e no C-terminal são essenciais para a complementariedade da toxina (Dongol et al., 2019). Na interação da toxina ProTx-II e o canal Nav1.7, o triptofano na posição 20 24 forma uma espécie de âncora hidrofóbica com a cavidade hidrofóbica entre os segmentos S2 e S3 do canal formada pelos resíduos A766-S2, L770-S2 e L812-S3 (Xu et al., 2019). Na toxina HwTx-IV, a substituição da tirosina por um aminoácido mais hidrofóbico, triptofano, Y33W, aumentou a potência da toxina em NaV1.7 (Revell et al., 2013). A carga geral do peptídeo afeta a interação com os canais de sódio, tal efeito foi mostrado com mutações na toxina HwTx-IV, apresentando uma redução de potência na inibição com a substituição de resíduos carregados negativamente de ácido glutâmico para resíduos neutros, glicina, nas posições 1 e 4 (Revell et al., 2013). Canais de Cálcio (CaV) Os canais CaV são proteínas de múltiplas subunidades, sendo compostas por uma subunidade principal (α1) e quatro subunidades auxiliares (α2, β, γ e δ). A subunidade α1 possui uma massa molecular de 190kDa, formada por quatro domínios repetidos (I-IV), cada domínio possui seis segmentos transmembrânicos (S1-S6), sendo que entre os segmentos S5-S6 de cada domínio existe um loop que é responsável pela formação do poro iônico e o segmentos S1-S4 responsáveis pelos sensores de voltagem, seguindo omesmo padrão encontrado nos canais de sódio dependentes de voltagem (Wu et al., 2015). As subunidades α1 são caracterizadas pelo tipo de corrente produzida e pelas características farmacológica em L, P, Q, N, R e T, cada tipo dessas correntes é produzida por uma isoforma por uma das dez subunidades α1 existentes ou um grupo de isoforma α1 (Catterall, 2011; Catterall and Swanson, 2015). As correntes do tipo L são produzidas pelos canais CaV1 e suas isoformas Cav1.1, Cav1.2, Cav1.3 e CaV1.4, e são caracterizadas por apresentarem corrente duradoura quando utilizado o íon bário como principal íon condutível (Long Lasting) e serem sensíveis a dihidropiriminas (Lipscombe, 2004). As correntes produzidas pelos canais CaV2 são conhecidas como P-Q, N e R dependendo do subtipo. O subtipo CaV2.1 produz corrente do tipo P nos canais com splicing alternativo encontrado nas células de Purkinje e Q para o splicing alternativo encontrado no cerebelo. Ambas são correntes que apresentam sensibilidade a toxinas de artrópodes e moluscos do gênero Conus (Richards et al., 2007). As correntes produzidas pelo subtipo CaV2.2 são caracterizadas como N por sua distribuição em neurônios do sistema nervoso central e periférico, relacionado também com o processo de exocitose em terminais pré-sinápticos, 21 apresentando sensibilidade a uma grande diversidade de toxinas de artrópodes (Catterall, 2011; Liu et al., 2006; Dolphin, 2016). O subtipo CaV2.3 é o canal responsável pela corrente do tipo R, tendo esse nome por sua característica de resistência a compostos que inibem as correntes dos outros representantes CaV2, sendo a toxina SNX-482 caracterizada como seu bloqueador mais sensível (Dolphin, 2016; Newcomb et al., 1998). As correntes produzidas pelo subtipo CaV3.1, CaV3.2 e CaV3.3 são responsáveis pela corrente do tipo T, devido à sua abertura transiente, rápida. São os únicos representantes do grupo dos canais de cálcio ativados por pequena variação de voltagem (Low Voltage Activated – LVA) (Dolphin, 2016). Estão distribuídos em diversos neurônios e sua função está relacionada com a capacidade de disparos repetitivos de potenciais de ação e a atividade de marca-passo (Catterall, 2011; Zhao et al., 2019). Tabela 2 - Isoformas das subunidades α1 dos canais CaV Isoforma Tipo de corrente Distribuição Gene CaV1.1 L Fibras musculares CACNA1S CaV1.2 L Musculo Cardíaco CACNA1C CaV1.3 L Neural CACNA1D CaV1.4 L Retina CACNA1F CaV2.1 P - Q Neural CACNA1A CaV2.2 N Neural CACNA1B CaV2.3 R Neural CACNA1E CaV3.1 T Neural CACNA1G CaV3.2 T Neural, Cel. Marca passo CACNA1H CaV3.3 T Neural CACNA1I A subunidade β possui 55 kDa, formada por estrutura de α-hélice localizada na porção intracelular do canal (Wu et al., 2015). Sua associação à subunidade alfa promove deslocamento na dependência de voltagem para valores mais negativos. Em associação ao canal CaV2.1 diminuiu o efeito da inibição de corrente por estímulos em alta frequência além de proteger o canal CaV2.2 de degradação proteossomal (Dolphin, 2003, 2016; Richards et al., 2007; Page et al., 2016). 22 A subunidade γ é uma glicoproteína associada com quatro segmentos transmembrânicos e possui massa molecular de 33 kDa. Tal subunidade só foi encontrada em associação ao canal CaV1.1 em músculos esqueléticos (Wu et al., 2015; Logan and Iii, 2003). As subunidades α2 e δ estão presentes no mesmo gene, sendo a região responsável pela subunidade δ alocada no final 3’. Estas duas subunidades são ligadas por ligação dissulfeto, muitas vezes sendo reconhecida apenas como subunidade α2δ de 170 kDa (Wu et al., 2015). As subunidades α2δ estão presentes apenas nos canais CaV1 e CaV2. Sua atividade está relacionada com o aumento da densidade de canais na membrana celular por facilitar a apresentação da proteína na membrana e modulação das cinéticas de ativação do canal (Dolphin, 2018). Figura 3 - Ilustração Canal de Cálcio Dependente de Voltagem. Adaptado de Catterall, 2000 Durante o registro das correntes de cálcio, algumas técnicas são utilizadas para obtenção de registros com melhor qualidade e correntes mais estáveis. As correntes de cálcio em canais de cálcio dependentes de voltagem apresentam, durante os registros, um fenômeno conhecido como Rundown, que consiste na diminuição da amplitude da corrente. Esse efeito tem início imediato após o rompimento da membrana e diluição do citosol, que contém fatores que regulam o canal de cálcio (Zamponi and Ph, 2005). Diversas técnicas podem ser usadas para minimizar esse efeito, desde o uso da técnica de Perforated Patch Clamp que leva à formação de pequenos poros na região de contato da pipeta de registro com a membrana celular (pelo uso de antimicrobianos formadores de poro ex: Amfotericina B), promovendo menor diluição do conteúdo intracelular, quanto à suplementação da solução interna de pipeta com ATP e inibidores de protease tipo calpastatina (Zamponi and Ph, 2005; Springer, 2013). 23 Nomenclatura para toxinas Em 2008 King e colaboradores elaboraram uma nomenclatura racional para as toxinas peptídicas baseados na sua propriedade farmacológica e a posição taxonômica da espécie (King et al., 2008). Foi utilizado um caractere grego para representação da atividade farmacológicas, como, por exemplo, α para atividade em receptores de acetilcolina, β para moduladores da ativação de canais de Na+ e ω inibidores de canais de Ca2+ (Tabela 3) (King et al., 2008). Tabela 3 – Nomenclatura de toxinas baseadas na função farmacológica. Adaptado de King et al., 2008 Caractere Grego Função farmacológica α(alpha) Receptores de acetilcolina β (Beta) Altera Dependência de voltagem para ativação dos canais de Na+ γ (gamma) Canais catiônicos não específicos HCN δ (Delta) Atrasa inativação dos canais de Na+ ε (Episolon) Canais de Cl- ζ (Zeta) Canais cíclicos ativados por nucleotídeos η (eta) Canais de potássio tipo KIR θ (Theta) Canais de Potássio tipo K2P ι (Iota) Agonista de canais de Na+ κ (Kappa) Bloqueadores de canais de Potássio KV λ (Lambda Bloqueadores de canais de Potássio Dependentes de Cálcio Kca μ (Mu) Bloqueadores de canais de sódio NaV ν (Nu) Receptores de Acetilcolina ξ (Xi) Receptores de Endotelina ο (Omicron) Receptores de Octopamina π (Pi) Canais sensíveis a ácidos ASICs ρ (Rho) Adrenoreceptores σ (Sigma) Receptores de 5-HT τ (Tau) Canais TRP υ (Upsilon) Receptores de vasopressina/Oxitocina φ (Phi) Receptores de Rianodina χ (Chi) Transportadores de Noradrenalina ψ (Psi) Antagonista não-competitivos dos receptores de acetilcolina ω (Omega) Bloqueadores de canais de Ca2+ Γ (Gamma) Receptores de Glutamato Λ (Lambda) Receptores de GABA ο (Omicron) Receptores P2X Σ (Sigma) Canais CFTR Ω (Omega) Receptor do Fator de Crescimento Epitelial Δ (Delta) Atividade citolótica U (Unknown) Atividade desconhecida 24 Peçonha de aranha e seus potenciais farmacológicos As peçonhas dos animais evoluíram por milhares de anos resultando na formação de compostos para proteção e predação, sendo selecionados pela natureza e que apresentam grande potencial farmacológico com alvos moleculares específicos (Pennington et al., 2018). Compostos peptídicos com o motivo ICK vêm sendo descritos na peçonha de aranhas caranguejeiras e apresentam atividades em diversos tipos de canais iônicos dependentes de voltagem. Um dos compostos mais bem conhecidos é a toxina PrTx-II da aranha Thrixopelma pruriens com atividade inibitória em uma grande gama de canais NaV, com maior especificidade ao canal NaV1.7 (IC50 = 0,3 nM) que está diretamente relacionado ao processo da dor (Middleton et al., 2002). A sensibilidade do canal Nav1.7 a toxinas de aranhas não está restrito à toxina ProTx-II, outras toxinas como a Huwentoxin-IV de Selenocosmia huwena possui um IC50 de 26 nM em NaV1.7(Xiao et al., 2008), μ-theraphotoxin-Pn3a de Pamphobeteus nigricolor com IC50 de 0,9 nM (Deuis et al., 2017). Toxinas isoladas de aranhas e seu potencial uso em doenças cardiovasculares é um tema bem discutido, sendo os canais iônicos com maior relevância nesse estudo os canais NaV1.1, NaV1.3, NaV1.5, KV1, KV2, KV4, KV11, KATP e o canal sensível a estiramento SAC (Lima, 2009). As toxinas PaTx1 e PaTx2 isoladas da aranha Paraphysa scrofa apresentam atividade nos canais KV4.2 e KV4.3 que possuem alta expressão no tecido cardíaco e modulam a duração e o formato do potencial de ação por suas correntes de potássio (Diochot et al., 1999). As toxinas JZTX-I/Delta-theraphotoxin-Cg1a e JZTX-III/Beta/kappa-theraphotoxin-Cg1a isoladas da aranha Chilobrachys guangxiensis apresentam atividade em diversos canais de NaV. Entretanto, tais toxinas apresentam uma maior sensibilidade sobre o canal NaV1.5 que é o canal de sódio majoritário nas células cardíacas (Xiao et al., 2004, 2005). A utilização de toxinas de aranhas como biopesticidas é uma proposta biotecnológica como alto valor agregado no mercado de agrotóxicos para o controle de pragas (Windley et al., 2012). Toxinas com alvo molecular para canais iônicos de insetos são uma das estratégias evolutivas utilizadas pelas aranhas para sua predação efetiva, com a ocorrência de proteínas ricas em cisteínas formando muitas delas o motivo ICK (Windley et al., 2012). A toxina x- HXTX-Hv2a, da aranha Hadronyche versuta, é um dos exemplos de toxinas que convergiram para atuação mais seletiva em canais de insetos, apresentando o motivo ICK, tal toxina atua nos canais de cálcio de insetos com uma preferência avaliada em 10.000 vezes em comparação a canais de cálcio em vertebrados (Wang et al., 2001). A toxina Ap1a, isolada da aranha 25 Acanthoscurria paulensis, apresentou atividade de paralisia sobre larvas de Spodoptera frugiperda, considerada uma das maiores pragas para a agricultura do milho no Brasil (Mourão et al., 2013a). Estudos da caracterização da peçonha de Acanthoscurria paulensis No primeiro estudo com a peçonha da aranha Acanthoscurria paulensis em 2012, a partir da separação cromatográfica da peçonha bruta, foram identificados 97 distintos componentes com massas moleculares entre 601,4 Da e 21.932,3 Da. Adicionalmente foi também caracterizada a LD50 da peçonha bruta em camundongos de 25,4 ± 2,4 mg/g (Mourão et al., 2013b). A primeira toxina isolada da peçonha foi a toxina Ap1a, sendo o peptídeo mais abundante na peçonha, com massa molecular monoisotópica de 5457,79 Da. Ao ser testada em lagartas Spodoptera frugiperda apresentou efeito dose-dependente de paralisia com uma DE50 de 13.0±4.2 μg/g (Mourão et al., 2013a). Injeções intra-craniais da toxina Ap1a apresentara toxicidades em camundongos na dose de 30 ug por animal promovendo mioclonias, hipermotilidade, saltos e convulsões generalizadas. A partir do RNA total da glândula de peçonha de Acanthoscurria paulensis foi construída uma biblioteca de cDNA(Mourão et al., 2013a). Experimentos no circuito de Fibra Gigante de Drosophila melanogaster indicaram atividade sobre a junção neuromuscular, sugerindo possível efeito sobre receptores glutamatérgicos. Ap1a não apresentou atividade em canais de sódio NaV1.2, NaV1.4, NaV1.5, NaV1.6 e no receptor de acetilcolina nAch (Mourão et al., 2013a). Posteriormente, foi caracterizada fraca atividade em canais de sódio NaV1.1, NaV1.3 e NaV1.7 com inibição máxima de 30 % no canal NaV1.7 (Garcia, 2018). 26 2 – Justificativa Estudos de componentes que possam modificar a atividade de canais são de grande interesse para os pesquisadores, tanto na descrição de suas estruturas quanto seus alvos farmacológicos. Na peçonha das aranhas, diversos componentes são descritos com atividade em canais iônicos, mais especificamente os peptídeos. Todavia da grande quantidade de aranhas existentes, poucas têm sua peçonha estudada e com isso diversos componentes potencialmente úteis para esses estudos farmacológicos não foram ainda descritos. Da peçonha da aranha Acanthoscurria paulensis foram identificados inicialmente 97 componentes com massas de entre 601,4 Da e 21.932,3Da. Desses componentes, apenas o peptídeo Ap1a foi descrito quanto à sua atividade biológica em canais iônicos, atividade em camundongos e potencial bioinseticida. O mal funcionamento de canais iônicos dependentes de voltagem pode levar a doenças conhecidas como canalopatias, sendo as mais conhecidas o distúrbio cardíaco intitulado síndrome de Brugada, síndromes de paralisia, dores crônicas e alguns tipos de epilepsia. O uso de moduladores de canais iônicos dependentes de voltagem, que podem interferir no funcionamento do canal e promover uma possível reversão da condição patológica é uma área da pesquisa de grande interesse médico. O estudo de toxinas da peçonha de aranhas caranguejeiras é importante tanto para a caracterização dos componentes existentes na peçonha desse grupo de aranhas quanto para o potencial biotecnológico da utilização de suas toxinas como ferramentas farmacológicas para estudo de seus alvos. 27 3 – Objetivos 3.1 – Objetivo Geral Caracterização da atividade de toxinas isoladas da peçonha da aranha caranguejeira Acanthoscurria paulensis em canais iônicos dependentes de voltagem 3.2 – Objetivos Específicos • Purificar os peptídeos presentes na peçonha da aranha Acanthoscurria paulensis • Determinar as sequências primárias dos peptídeos purificados • Avaliar ação dos peptídeos isolados por meio de ensaios eletrofisiológicos nos canais de Na+ NaV1.1, NaV1.5, Nav1.7 e canais de Ca2+ CaV1.2, CaV2.1 e CaV2.2 28 4 - Metodologia 4.1 Extração da Peçonha por eletroestimulação Espécimes adultos da aranha Acanthoscurria paulensis de ambos os sexos, acondicionados vivos no Biotério do Instituto de Biologia da Universidade de Brasília, foram estimulados na região basal das quelíceras utilizando eletroestimulador caseiro e suas peçonhas foram coletadas diretamente em tubos de polietileno tipo eppendorf de 1,5 ml. Amostras foram solubilizadas em água Mili-Q, centrifugadas a 10.000 x g por 15 minutos para a remoção de substâncias que possam sedimentar, quantificadas por espectrofotômetro com luz UV a 280 nm (NanoVue® GE Healthcare) para proteínas totais, secas a vácuo (SpeedVac) e armazenadas a - 20ºC. O processo de extração é realizado com um intervalo de 40 dias e os animais são alimentados após a extração com baratas Nauphoeta cinerea. Os espécimes de Acanthoscurria paulensis foram coletados conforme a permissão legal 24227-1 cedida pelo ICMBio. Espécimes foram coletados na região de cerrado próximo a Universidade de Brasília. 4.2 Cromatografia Líquida de Alta eficiência em Fase Reversa (RP-HPLC) 4.2.1 Fracionamento da Peçonha Bruta Alíquotas de 5,0 mg de peçonha bruta foram ressuspendidas em uma solução de 0,12 % (v/v) de ácido trifluoracético (TFA) em água. O material foi submetido ao sistema de cromatografia liquida de alta eficiência LC10A Shimadzu Co. (Kyoto, Japão) em coluna semipreparativa C18 Phenomenex. Para a eluição, utilizou-se gradiente binário de solução aquosa de TFA 0,12% (A) e de solução de acetonitrila de TFA 0,1 % (B), com fluxo de 1,5 mL/min e detecção a 216 e 280 nm de absorbância. O gradiente iniciou-se com 0% de B por 10 minutos; seguido de 0 a 60 % de B em 60 minutos; 60 a 100 % de B em 10 minutos; e 100 % de B mantidos pelos 10 minutos finais, para então equilibrar a coluna novamente na solução A. As frações cromatográficas foram manualmente coletadas, secas a vácuo e armazenadas a -20º C até seu uso. 4.2.2 Purificação do peptídeo Ap2 Após a separação da fração contendo o peptídeo Ap2 na cromatografia de peçonha bruta foi realizada uma segunda etapa de cromatografia utilizando coluna Phenomenex Kinetex F5 Core-shell. O método foi elaborado da seguinteforma: A partir da concentração de 15% ACN 29 atingida aos 15 min de corrida, um gradiente de 0,375 % de ACN por minuto foi iniciado até os 50 minutos de corrida atingindo concentração máxima de 50 % de ACN. 4.2.3 Purificação do peptídeo Ap3 A etapa final de purificação da fração contendo o peptídeo Ap3 utilizou uma coluna Phenomenex Kinetex F5 Core-shell aquecida a 45º C em um forno para coluna. O método utilizado foi construído da seguinte forma: A partir de uma concentração de 10 % de ACN estabelecida aos 10 minutos, foi iniciado um gradiente de 0,33 % de ACN por minuto até os 70 minutos de corrida atingindo a concentração final de 30% de ACN. 4.2.4 Purificação do peptídeo Ap4 A fração contendo o peptídeo Ap4 foi purificada utilizando coluna Phenomenex Kinetex F5 Core-shell. As garrafas contendo as soluções de HPLC foram resfriadas a 4º C por banho frio e as soluções foram preparadas utilizando uma concentração de 1 % de TFA. O método foi construído da seguinte forma: A partir de uma concentração de 10 % de ACN estabelecida aos 10 minutos, foi iniciado gradiente de 0,33 % de ACN por minuto até os 70 minutos de corrida atingindo a concentração final de 30 % de ACN. 4.2.5 Purificação do peptídeo Ap5 A etapa final de purificação da fração contendo o peptídeo Ap3 utilizou coluna Phenomenex Kinetex F5 Core-shell aquecida a 45ºC em forno para coluna. O método utilizado foi construído da seguinte forma: A partir de uma concentração de 15% de ACN estabelecida aos 10 minutos, foi iniciado um gradiente de 0,33 % de ACN por minuto até os 70 minutos de corrida atingindo a concentração final de 35 % de ACN. 4.2.6 Purificação do peptídeo Ap6 O peptídeo Ap6 após a separação de sua fração na cromatografia de peçonha bruta foi submetido a apenas uma etapa adicional de purificação utilizando Coluna Phenomenex Kinetex C18 Core-shell. O método foi construído da seguinte forma: A partir de uma concentração de 20% acetonitrila estabelecido aos 10 minutos, iniciou-se um gradiente de 0,5% ACN por minuto até os 50 minutos de corrida atingindo a concentração final de 40% ACN. 30 4.3 Espectrometria de massa (MALDI TOF/TOF) Para a avaliação do grau de pureza dos peptídeos de interesse e aferência da massa experimental utilizou-se espectrometria de massas em sistema MALDI TOF/TOF Ultraflex III (Bruker Daltonics, Alemanha). Os peptídeos foram solubilizados em água Milli-Q e dissolvidos em matriz saturada de ácido α-ciano-4-hidroxicinâmico (acetonitrila/água/TFA 3 %; 5:4:1) em uma razão de 2 µL de amostra para 2 µL de matriz, depositadas em uma placa de aço inox Anchorchip (600 mm) e secas à temperatura ambiente. As análises foram realizadas em modo linear para avaliação da massa média e no modo refletido para avaliação das massas monoisotópicas utilizando o software FlexAnalysis 3.3 (Bruker Daltonics, Alemanha) 4.4 Quantificação dos peptídeos (Colorimetria BCA-Cobre) Os peptídeos puros foram quantificados utilizando o kit para proteína BCA Protein Assay Kit® (ThermoFischer) utilizando o protocolo enhanced. Os peptídeos foram diluídos em água Milli-Q, misturados com os reagentes do kit na razão 1:1 e incubados a 60º C por 30 minutos. O produto da reação foi lido na absorbância de 562 nm e quantificado por cálculo em curva padrão calibrada com albumina bovina. 4.5 Sequenciamento (In-source Decay – MALDI TOF-TOF) O sequenciamento parcial foi realizado em um sistema MALDI TOF-TOF Ultraflex III (Bruker Daltonics, Alemanha) com o método de In-source Decay (ISD). Amostras dos peptídeos foram solubilizados em água Milli-Q em uma concentração de 1 µg/µl e dissolvidos em uma matriz redutora saturada de 1,5-diaminonaptaleno em uma razão de 1,5 µL de amostra para 1,5 µL de matriz. 4.6 Busca por similaridade As sequências completas obtidas foram submetidas a buscas por similaridade usando o programa BlastP, disponível online em https://blast.ncbi.nlm.nih.gov/Blast.cgi. Os alinhamentos de sequências foram realizados pelo programa Clustal Omega disponível online em https://www.ebi.ac.uk/Tools/msa/clustalo/. https://blast.ncbi.nlm.nih.gov/Blast.cgi https://www.ebi.ac.uk/Tools/msa/clustalo/ 31 4.7: Cultura de células 4.7.1 Culturas de células expressando canais de sódio dependentes de voltagem (NaV1.1-NaV1.7) Células HEK (Human Embrionic Kidney 293 cells) expressando canais iônicos Nav1.1, e Nav1.5 de forma estável foram cultivadas em meio DMEM suplementado com 4,5 % de Glicose, 10 % de Soro Fetal Bovino e 1 % de MEM (Non Essential Aminoacids) e antibiótico G418 (0,4 mg/mL). Células CHO (Chinese Hamster Ovary) expressando canais iônicos Nav1.7 foram cultivadas em meio DMEM suplementado com 4,5 % de Glicose, 10 % de Soro Fetal Bovino e antibiótico G418 (0,5 mg/mL). As células foram incubadas em uma atmosfera umedecida contendo 5 % de CO2 a 37º C. As culturas estáveis expressando canais de sódio dependentes de voltagem foi uma generosa doação da Dra. Rita Restano-Cassulini do Instituto de Biotecnologia da Universidade Autônoma do México (IBT-UNAM Cuernavaca – Morelos). 4.7.2 Célula HEK 293T Células HEK 293T (Human Embrionic Kidney SV-40 T-antigen) foram cultivadas em meio DMEM suplementado com 4,5 % de Glicose, 10 % de Soro Fetal Bovino e 1 % de Antibiotic-Antimycotic® (Gibco). As células foram incubadas em uma atmosfera umedecida contendo 5 % de CO2 a 37º C. A cultura de células HEK293T foi obtida comercialmente do Banco de Células do Rio de Janeiro – BCRJ. 4.8 Plasmídeos – Canais de cálcio dependentes de voltagem Os plasmídeos contendo as sequências para a expressão dos canais de cálcio foram obtidos comercialmente do repositório da Addgene (Estados Unidos). Para a expressão das subunidades alfas foram utilizados os plasmídeos pcDNA6CaV1.2 (número de catálogo #26572) – CaV1.2, pcDNA6-CaV2.1(#26578) – CaV2.1, pcDNA6-CaV2.2 (#26570) – CaV2.2. Para a expressão da subunidade Beta foi utilizado o plasmídeo pcDNA3.1-β3 (#26574) - CaVβ3. Para a expressão da subunidade α2δ foi utilizado o plasmídeo pcDNA3.1- α2δ1 (#26575). O plasmídeo pEGFP-c1(Clontech, EUA) foi utilizado como repórter de transfecção transiente por expressar a proteína fluorescente verde enhanced green fluorescent protein EGFP. 32 4.9 Transfecção Transiente canais de Calcio dependentes de voltagem Células HEK293T cultivadas em placas de petri de 40x10mm com confluência de 70- 90% foram transfectadas utilizando Lipofectamine3000® (ThermoFischer scientific) em meio Opti-MEM® (Gibco) com 4 plasmídeos simultaneamente: pcDNA6-CaVα, pcDNA3.1-CaVβ3, pcDNA3.1-α2δ1 e pEGFP-c1 em uma razão 1:1:1:0,1 µg respectivamente. 4.10 Eletrofisiologia – Setup experimental para Patch Clamp 4.10.1 Ensaios eletrofisiológicos em canais de sódio dependentes de voltagem As macrocorrentes dos canais NaV foram estimuladas e registradas com a técnica de Patch Clamp utilizando o amplificador HEKA EPC 10 na configuração Whole Cell e o software PATCHMASTER (HEKA Elektronik Dr. Schulze GmbH, Germany). Experimentos foram realizados a temperatura ambiente (21 a 25º C). Pipetas feitas de vidro borosilicato foram fabricadas imediatamente antes do uso no Puller horizontal (Sutter Instruments, USA) e após o preenchimento com a solução interna foram detectadas resistências de pipeta entre 1,5 e 2,5 MΩ. A Resistência em série foi de aproximadamente 10MΩ para todos os experimentos e foi compensada em pelo menos 60 %. Correntes capacitivas foram canceladas por protocolo online de estímulos p/4 com a voltagem de repouso em -120 mV. As correntes foram ativadas por um protocolo duplo de estímulo a partir de uma voltagem de repouso de -100 mV. Na primeira parte do protocolo, as correntes foram ativadas por 27 sweeps sequenciais com acréscimos de 5mV por sweep durante 30 ms, atingindo uma voltagem máxima de 30 mV, para a avaliação da ativação do canal. Na segunda parte do protocolo,um estimulo de -10 mV durante 10ms imediatamente após a primeira parte foi utilizado para avaliação da Inativação Lenta dos canais de sódio. Entre cada sweep do protocolo completo de estímulo foi realizado um intervalo de 2 s (Figura 5A). As micropipetas foram preenchidas com solução interna contendo (mM): 105 CsF, 27 CsCl, 5 NaCl, 2 MgCl2, 10 EGTA, 10 HEPES (pH ajustado para 7,3 com CsOH). As células foram banhadas em uma solução externa contendo (mM): 130 NaCl, 5 KCl, 2 MgCl2, 2 CaCl2, 10 HEPES, 10 Glicose (pH ajustado para 7,4 com NaOH). 4.10.1 Ensaios eletrofisiológicos em canais de cálcio dependentes de voltagem As macrocorrentes dos canais CaV foram estimuladas e registradas com a técnica de Patch Clamp utilizando o amplificador HEKA EPC 10 na configuração Whole Cell e o software PATCHMASTER (HEKA Elektronik Dr. Schulze GmbH, Germany). Experimentos foram realizados a temperatura ambiente (21 a 25º C). Pipetas feitas de vidro borosilicato foram 33 fabricadas imediatamente antes do uso no Puller horizontal (Sutter Instruments, USA) e suas pontas foram polidas em uma microforja MF-900 (Narishige, Japão), após o preenchimento com a solução interna foram detectadas resistências de pipeta entre 2,5 e 4 MΩ. Correntes capacitivas foram canceladas por protocolo online de estímulos p/4 com a voltagem de repouso em -100 mV. As correntes foram inicialmente estimuladas em um protocolo I/V, aonde as correntes foram estimuladas apartir -50 mV até 30 mV, com acréscimos de 5 mV por sweep para determinação da voltagem que promove a corrente com maior amplitude (VMax). Após a determinação de VMax foram relizados estimulos com a voltagem estabelecida durante 200ms com intervalos de 30s entre cada estímulo (Figura 5B). As micropipetas foram preenchidas com solução interna contendo (mM): 126 CsCl2, 10 EGTA, 1 EDTA, 10 HEPES, 4 Mg ATP (pH ajustado para 7,3 com CsOH). As células foram banhadas em uma solução externa contendo (mM): 5 BaCl2, 135 Colina-Cl, 10 HEPES, 4 MgCl2 (pH ajustado para 7,4 com CsOH). Figura 4 - Protocolos de estímulo utilizado para o Patch Clamp. A: Representação esquemática do protocolo de variação de voltagem utilizado para ativar as correntes de sódio dependentes de voltagem. B: Representação esquemática do protocolo de variação de voltagem utilizado para ativar as correntes de cálcio dependentes de voltagem. 4.11 Eletrofisiologia – Análise de dados 4.11.1 Análise de dados – Ensaios em canais de sódio dependentes de voltagem A condutância ao sódio (gNa) foi calculada a partir das correntes obtidas na primeira parte do protocolo utilizando a lei de Ohm, 𝑔𝑔𝑔𝑔𝑔𝑔 = 𝐼𝐼𝑔𝑔𝑔𝑔 (𝑉𝑉 − 𝑉𝑉𝑉𝑉𝑉𝑉𝑉𝑉) 34 onde V representa o potencial de estímulo que ativou a corrente, INa a corrente do íon sódio no dado potencial V, e VRev é o potencial de reversão do íon sódio calculado a partir das soluções internas e externa com a equação de Nernst, 𝑉𝑉𝑉𝑉𝑉𝑉𝑉𝑉 = 𝑉𝑉𝑅𝑅 𝐹𝐹 ln [𝑔𝑔𝑔𝑔]𝐸𝐸𝐸𝐸𝐸𝐸𝑉𝑉𝑉𝑉𝐸𝐸𝑔𝑔 [𝑔𝑔𝑔𝑔]𝐼𝐼𝐸𝐸𝐸𝐸𝑉𝑉𝑉𝑉𝐸𝐸𝑔𝑔 onde R é a constante dos gases ideais, T a temperatura em Kelvin, F é a constante de Faraday, [Na]Externa é a concentração do íon sódio no meio externo e [Na]Interna é a concentração do íon sódio no meio interno. Os dados experimentais foram ajustados em uma equação simples de Boltzmann para avaliar a probabilidade de abertura dos canais (pO), 𝑔𝑔 𝑜𝑜𝑜𝑜 𝑝𝑝𝑝𝑝 = 1 1 + 𝑉𝑉�(𝑉𝑉−𝑉𝑉1/2)/𝑘𝑘� onde V1/2 é a voltagem em que metade dos canais estão no estado aberto, k é slope de voltagem. Os valores de ΔV1/2 foram estipulados pela diferença entre o ΔV1/2 na condição controle menos ΔV1/2v na presença do composto avaliado. As correntes obtidas da segunda parte do protocolo (Figura 4) foram ajustados em equação simples de Boltzmann para avaliação da inativação lenta ou Steady-State Inactivation (SSI) 𝑆𝑆𝑆𝑆𝐼𝐼 = 1 1 + 𝑉𝑉�(𝑉𝑉−𝑉𝑉1/2)/𝑘𝑘� A porcentagem de canais de sódio foi estipulada pela a seguinte fórmula, 𝑃𝑃𝑜𝑜𝑉𝑉𝑃𝑃𝑉𝑉𝐸𝐸𝐸𝐸𝑔𝑔𝑔𝑔𝑉𝑉𝑃𝑃 𝑑𝑑𝑉𝑉 𝑖𝑖𝐸𝐸𝑖𝑖𝑖𝑖𝑖𝑖çã𝑜𝑜 = � 100 𝐸𝐸 𝐼𝐼𝑃𝑃𝑔𝑔𝐸𝐸𝑅𝑅𝑜𝑜𝐸𝐸𝑖𝑖𝐸𝐸𝑔𝑔 𝐼𝐼𝑃𝑃𝑔𝑔𝐸𝐸𝐼𝐼𝑜𝑜𝐸𝐸𝐸𝐸𝑉𝑉𝑜𝑜𝐼𝐼𝑉𝑉 � − 100 4.11.2 Análise de dados – Ensaios em canais de cálcio dependentes de voltagem As correntes de cálcio em Patch Clamp na configuração Whole Cell apresentam uma diminuição da amplitude da corrente conhecido como Rundown. Para que seja possível a avaliação da porcentagem de bloqueio de um composto sobre um canal que sofre Rundown é 35 necessário estimar o valor de corrente controle (IPred) correspondente ao mesmo tempo do valor da corrente na presença do composto avaliado, assumindo a tendência linear na ausência da toxina, levando em consideração o número de sweep decorridos a partir da aplicação da toxina. A corrente controle foi estipulada com a seguinte fórmula: 𝑰𝑰𝑝𝑝𝑉𝑉𝑉𝑉𝑑𝑑 = (𝑰𝑰𝐼𝐼𝑔𝑔𝑉𝑉𝑔𝑔𝑔𝑔𝑉𝑉𝑃𝑃 𝐸𝐸𝑜𝑜𝐸𝐸𝑖𝑖𝐸𝐸𝑔𝑔 − 𝑰𝑰𝑃𝑃𝑜𝑜𝐸𝐸𝐸𝐸𝑉𝑉𝑜𝑜𝐼𝐼𝑉𝑉) (#𝑺𝑺𝑺𝑺𝐼𝐼𝑔𝑔𝑉𝑉𝑔𝑔𝑔𝑔𝑉𝑉𝑃𝑃𝐸𝐸𝑜𝑜𝐸𝐸𝑖𝑖𝐸𝐸𝑔𝑔 − #𝑺𝑺𝑺𝑺𝑃𝑃𝑜𝑜𝐸𝐸𝐸𝐸𝑉𝑉𝑜𝑜𝐼𝐼𝑉𝑉)(#𝑺𝑺𝑺𝑺𝑺𝑺𝑜𝑜𝐸𝐸𝑖𝑖𝐸𝐸𝑔𝑔 − #𝑺𝑺𝑺𝑺𝑃𝑃𝑜𝑜𝐸𝐸𝐸𝐸𝑉𝑉𝑜𝑜𝐼𝐼𝑉𝑉) + 𝑰𝑰𝑃𝑃𝑜𝑜𝐸𝐸𝐸𝐸𝑉𝑉𝑜𝑜𝐼𝐼𝑉𝑉 Onde, IControle é amplitude da corrente do último sweep antes da aplicação da toxina, IToxina é a amplitude corrente avaliada na presença da toxina, ILavagemToxina é a amplitude da corrente do último sweep da lavagem da toxina, IPred é a amplitude da corrente controle assumindo o comportamento linear Rundown., #SWControle é o número do sweep no qual a IControle foi medida, #SWToxina é o número do sweep no qual a IToxina foi medida e #SWLavagemToxina é o número do sweep no qual a ILavagem foi medida. A porcentagem de inibição (%Inib) foi calculada da seguinte maneira: %𝐼𝐼𝐸𝐸𝑖𝑖𝑖𝑖 = (𝐼𝐼𝑅𝑅𝑜𝑜𝐸𝐸𝑖𝑖𝐸𝐸𝑔𝑔 × 100) 𝐼𝐼𝑝𝑝𝑉𝑉𝑉𝑉𝑑𝑑 − 100 As diferenças entre as médias foram avaliadas estatisticamente com Teste T pareado e foram considerados estatisticamente quando obtido o valor de P<0.05. Análises foram realizadas com o software GraphPad prism 5 36 5 – Resultados 5.1 Fracionamento de peçonha Bruta e Purificação dos peptídeos Foram realizadas 20 cromatografias de peçonha bruta de Acanthoscurria paulensis utilizando aproximadamente 100 mg de peçonha bruta extraída de espécimes machos e fêmeas. As frações de interesse eluíram entre 26 e 33 % de acetonitrila (36 a 43 min), sendo que a fração eluída entre 36 e 38 minutos (26-28 %ACN) contém os peptídeos Ap2, Ap3 e Ap6. A fração que elui entre 39 e 41 minutos(29-31 % ACN) contém os peptídeos Ap1a, previamente descrito em Mourão e colaboradores 2013, e o peptídeo Ap4. A fração que elui aos 43 minutos (33 % ACN) contém o peptídeo Ap5 (Figura 5). Para a subsequente purificação dos compostos de interesse encontrados nas frações foram realizadas recromatografias utilizando colunas analíticas Kinetex C18, Core Shell C18, Core Shell F5 (Phenomenex) seguidos de otimização de gradiente de acetonitrila, concentração do agente de emparelhamento de íons TFA e temperatura da fase móvel e estacionária. Figura 5 - Cromatograma de 5 mg peçonha bruta A. paulensis por RP-HPLC. O fracionamento foi realizado por meio de uma coluna C18 semipreparativa C18 (Phenomenex) com gradiente de acetonitrila conforme representado pela linha vermelha com um fluxo de 1,5mL/min e absorbância monitorada a 216 nm. O peptídeo Ap2 eluiu aos 35,9 minutos com 22,80 % de acetonitrila (Figura 6). A avaliação da pureza do peptídeo foi realizada por MALDI TOF/TOF no modo linear e sua massa molecular monoisotópica experimental foi de 4886,32 Da (Figura 7). Foi obtido total de 95,92 µg desse peptídeo puro. 37 Figura 6 – Cromatograma purificação do peptídeo Ap2. A purificação foi realizada por meio de uma coluna Analítica C18 (phenomenex) com um gradiente de acetonitrilaconforme representado pela linha vermelha , com um fluxo de 1,0 mL/min e absorbância monitorada a 216 nm. Figura 7 - Espectro de Massas do peptídeo Ap2. A: Massa molecular média [M+H]+ de 4888,1 Da do peptídeo Ap2 utilizando a técnica de espectrometria de massas (MS) no modo linear. B: Massa molecular monoisotópica de [M+2H]2+ de 2443,6 Da utilizando a espectrometria de massas no modo refletido, totalizando massa experimental de 4886,3 Da. 38 O peptídeo Ap3 eluiu aos 30 minutos na recromatografia apresentada na purificação do peptídeo Ap2 (Figura 6) aos 22,62 % de ACN, entretanto não continha o grau de pureza necessário para as etapas subsequentes e foi submetido a mais uma etapa de purificação (Figura 8). A avaliação da pureza do peptídeo foi realizada por MALDI TOF/TOF no modo linear e sua massa molecular monoisotópica experimental inferida de 4883,7 Da (Figura 9). Foi obtido total de 57,6 µg desse peptídeo puro. Figura 8 – Cromatograma Purificação do peptídeo Ap3. A purificação foi realizado por meio de coluna Analítica Core Shell F5 (Phenomenex) com gradiente de acetonitrila conforme representado pela linha vermelha, coluna aquecida a 45º C, fluxo de 1,0 mL/min e absorbância monitorada a 216 nm. 39 Figura 9 - Espectro de Massas do peptídeo Ap3. A: Massa molecular média [M+H]+ de 4883,66 Da do peptídeo Ap3 utilizando a técnica de espectrometria de massas (MS) no modo linear. B: Massa molecular monoisotópica de [M+2H]2+ de 2442,36 Da utilizando a espectrometria de massas no modo refletido, totalizando massa experimental de 4883,7 Da. O peptídeo Ap4, Ap5 e Ap1a eluíram juntos no mesmo processo de cromatografia (Figura 5). Com isso, foi necessária uma etapa adicional de cromatografia utilizando a coluna Core shell F5 para um fracionamento dessa fração com diversos compostos. Essa fração foi subfracionada em 5 subfrações, sendo que na subfração 1 (20,50% ACN) foi encontrado um composto com a massa molecular média de 5478 Da, na subfração 2(20,60% ACN), o composto com massa molecular média de 5443 Da que é, provavelmente, a toxina Ap1b (dados não mostrados), na sub-fração 3 (20,70% ACN) foi encontrado o peptídeo Ap1a , em ambas subfrações 4 e 5 foram encontrados os peptídeos Ap4 e Ap5 (Figura 10). 40 Figura 10 – Cromatograma Sub-fracionamento da fração os peptídeos Ap4 e Ap5. Cromatografia da fração contendo os peptídeos Ap4 e Ap5 utilizando coluna core shell F5 com gradiente de acetonitrila. Os peptídeos Ap4 e Ap5 estão presentes em ambas sub-frações 4 e 5. As subfrações 4 e 5 foram reunidas e submetidas a cromatografia de fase reversa com a coluna Core shell F5, com as soluções contendo 1% de TFA e a 4º C utilizando-se um banho resfriado. O peptídeo Ap4 eluiu aos 52,6 minutos com 25,33 % de acetonitrila (Figura 11). A avaliação da pureza do peptídeo foi realizada por MALDI TOF/TOF no modo linear e sua massa molecular monoisotópica experimental de 3870,7 Da (Figura 12). Foi obtido um total de 29,36 µg desse peptídeo puro. 41 Figura 11 – Cromatograma Purificação do peptídeo Ap4. O fracionamento foi realizado por meio de coluna Analítica Core Shell F5 (Phenomenex) com gradiente de acetonitrila conforme representado pela linha vermelha com 1 % de TFA(v/v), fase móvel resfriada a 4º C, fluxo de 1,0 ml/min e absorbância monitorada a 216 nm. Figura 12 - Espectro de Massas do peptídeo Ap4. A: Massa molecular média [M+H]+ de 3871,95 Da do peptídeo Ap4 utilizando a técnica de espectrometria de massas (MS) no modo linear. B: Massa molecular monoisotópica de [M+2H]2+ de 1935,88 Da utilizando a espectrometria de massas no modo refletido, totalizando massa experimental de 3870,76 Da. 42 O peptídeo Ap5 eluiu na cromatografia de purificação da Ap4 aos 56,7 minutos com 26,64 % de acetonitrila (Figura 11); entretanto, por não possuir o grau de pureza necessário, foi submetido a mais uma etapa de cromatografia (Figura 13), eluindo aos 41,3 minutos, com 25,11 % de acetonitrila. A avaliação da pureza do peptídeo foi realizada por MALDI TOF/TOF no modo linear e sua massa molecular monoisotópica experimental de 5454,9 Da (Figura 14). Foi obtido total de 36,12 µg desse peptídeo puro. Figura 13 – Cromatograma Purificação do peptídeo Ap5. O fracionamento foi realizado por meio de coluna Analítica Core Shell F5 (Phenomenex) com gradiente de acetonitrila conforme representado pela linha vermelha com 0,1% de TFA(v/v), a coluna foi aquecida a 45º C, fluxo de 1,0 ml/min e absorbância monitorada a 216 nm. 43 Figura 14 - Espectro de massas do peptídeo Ap5.A: Massa molecular média [M+H]+ de 5458,3 Da do peptídeo Ap5 utilizando a técnica de espectrometria de massa (MS) no modo linear. B: Massa molecular monoisotópica de [M+2H]2+ de 2727,96 Da utilizando a espectrometria de massa no modo refletido, totalizando uma massa experimental de 5454,9 Da. O peptídeo Ap6 foi submetido a apenas uma etapa de purificação adicional após fracionamento da peçonha bruta (Figura 15) e eluiu 16,8 minutos com 23,14 % de acetonitrila. A avaliação da pureza do peptídeo foi realizada por MALDI TOF/TOF no modo linear e sua massa molecular monoisotópica experimental de 3717,9 Da. Foi obtido total de 51,79 µg desse peptídeo puro. 44 Figura 15 – Cromatograma Purificação do peptídeo Ap6. O fracionamento foi realizado por meio de coluna Analítica C18 (Phenomenex) com gradiente de acetonitrila conforme representado pela linha vermelha com 0,1% de TFA (v/v). Figura 16 - Espectro de massas do peptídeo Ap6. A: Massa molecular média [M+H]+ de 3720,33 Da do peptídeo Ap6 utilizando a técnica de espectrometria de massas (MS) no modo linear. B: Massa molecular monoisotópica de [M+2H]2+ de 1859,45 Da utilizando a espectrometria de massas no modo refletido, totalizando massa experimental de 3717,9 Da. 45 5.2 Sequenciamentos Os peptídeos Ap2, Ap3, Ap4, Ap5, Ap6, após purificados, foram parcialmente sequenciados utilizando a espectrometria de massas no equipamento Maldi TOF TOF Ultraflex III no método de In-source decay (Figuras 17-21) e as sequências parciais que foram posteriormente completadas com a análise do transcritoma da glândula de peçonha de A. paulensis. (Figura 22). Figura 17 - Sequência parcial do peptídeo Ap2 obtida por meio da técnica de espectrometria de massas (MS) pelo método de In-Source Decay (ISD). Foram obtidos 24 aminoácidos pela diferença de massa entre os fragmentos. 46 Figura 18 - Sequência parcial do peptídeo Ap3 obtida por meio da técnica de espectrometria de massas (MS) pelo método de In-Source Decay (ISD). Foram obtidos 25 aminoácidos pela diferença de massa entre os fragmentos. 47 Figura 19 - Sequência parcial do peptídeo Ap4 obtida por meio da técnica de espectrometria de massas (MS) pelo método de In-Source Decay (ISD). Foram obtidos 21 aminoácidos pela diferença de massa entre os fragmentos. 48 Figura 20 - Sequência parcial do peptídeo Ap5 obtida por meio da técnica de espectrometria de massas (MS) pelo método de In-Source Decay (ISD). Foram obtidos 32 aminoácidos pela diferença de massa entre os fragmentos. 49 Figura 21 - Sequência parcial do peptídeo Ap6 obtida por meio da técnica de espectrometria de massas (MS) pelo método de In-Source Decay (ISD). Foram obtidos 19 aminoácidos pela diferença de massa entre os fragmentos. Figura 22 - Alinhamento múltiplo das sequências completas obtidas dos peptídeos purificados. Regiões nas sequências em vermelho foram obtidas por sequenciamento ISD e completadas pela comparação com as sequências em biblioteca de cDNA. Durante o processo de purificação do peptídeo Ap4 (3870,9 Da) foi encontrado um composto com 27 Da a mais que a massa molecular do peptídeo Ap4, uma massa monoisotópica de 3897,9 Da. Tal informação corrobora com as informações encontradas no transcritoma da glândula de peçonha de A. paulensis sobre a existência
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