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10 - FILOSOFIA E ÉTICA - AULAS 19 E 20Arquivo

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FILOSOFIA E ÉTICA UNEC 
 
NÚCLEO DE ENSINO A DISTÂNCIA – NEAD 
Prof. Cláudio Soares Barros: claudiobarros0108@gmail.com Página 1 
 
2.2.3 Os objetivos equivocados 
 
A primeira vertente da crítica à esterilidade da tradição filosófica diz respeito 
aos objetivos do conhecimento. Bacon1 não hesita em condenar a elevação do espí-
rito ou a honra pública, o prazer ou a tranquilidade da alma como fins inferiores e 
degenerados. A seus olhos, a função meramente contemplativa da filosofia e a au-
sência de uma tentativa de compreensão que representasse um domínio da natureza 
são as principais razões da estagnação, dos "destemperos do conhecimento" e de 
seus procedimentos dogmáticos. 
Uma das causas básicas da confusão de objetivos estava, para Bacon, "na 
mescla danosa" com a teologia. Platão é condenado por sua falta de interesse pela 
filosofia natural e por ter corrompido o estudo da natureza com a religião, o que o teria 
levado a entender e explicar a natureza em termos do sumo bem. Também Aristóte-
les e sua doutrina da causa final acabam segundo Bacon (The advancement of lear-
ning. VI, 223), incorrendo numa perspectiva teleológica equivalente à de Platão. Esta 
perspectiva impedia, a seu ver, a busca das causas físicas que possibilitam ter algum 
domínio sobre os fenômenos naturais. Explicações finalistas sobre operações da na-
tureza, como a de que as chuvas são feitas para aguar a terra e as folhas das árvores 
para proteger os frutos, transformam, segundo Bacon, a ciência numa teologia. As 
causas finais são, portanto, vistas como questões acerca da providência divina, e suas 
especulações como "uma virgem consagrada a Deus, que não produz nada". 
Assim, é razoável que Bacon colocasse os pré-socráticos naturalistas acima 
de Platão e Aristóteles. Especialmente Demócrito, que, a seu ver, removeu Deus e 
a mente da fábrica das coisas e tratou das causas das coisas particulares como ne-
cessidades da matéria, sem nenhuma intromissão das causas finais. Também os cé-
ticos serão reverenciados por suas críticas às pretensões do conhecimento filosófico, 
mas não serão poupados da acusação de esterilidade, por causa da desesperança 
e conformação que seus pontos de vista levavam. 
 
1 Francis Bacon (1561-1626) foi um filósofo, político e ensaísta inglês. Recebeu os títulos de Vis-
conde de Albans e Barão de Verulam. Foi importante na formulação de teorias que fundamentaram 
a ciência moderna. É considerado o pai do método experimental. Fonte: https://www.ebiogra-
fia.com/francis_bacon/ 
Aulas 19 e 20 
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Ao tentar compreender as razões da adoção de objetivos equivocados, Bacon 
se deterá em alguns momentos na análise dos elementos psicológicos e culturais. 
Assim, em O parto masculino do tempo, a inca-
pacidade dos filósofos em procriar (filosofias 
estéreis em obras) expressa uma atitude moral-
mente culpada, advinda da soberba daqueles 
que não prestaram atenção aos limites, nem ti-
veram apreço pela realidade e respeito pela 
obra do Criador, colocando acima de tudo “as 
astúcias do engenho e a obscuridade das pala-
vras”. Esta postura se revela, por exemplo, na 
pretensão de encerrar a universalidade do saber e a totalidade da natureza em prin-
cípios e doutrinas. 
Já em The advancement of learning, Bacon trata dos erros e da futilidade como 
destemperos do conhecimento, que seriam de três tipos: “...o primeiro, conhecimento 
fantástico, o segundo, contencioso e o terceiro, delicado. Vãs imaginações, vãs 
altercações e vãs afetações”. Estes três destemperos caracterizariam as principais 
tendências de sua época: neoplatonismo, escolástica aristotélica e retórica hu-
manista. 
 
O Concílio de Trento, em 1545, e a recém-for-
mada Companhia de Jesus reforçam, na Europa 
Católica, a Escolástica em torno da autoridade 
de Santo Tomás de Aquino. Na época de Bacon, 
o espanhol Francisco Suárez e o grupo de pro-
fessores da Universidade de Coimbra são os 
principais representantes da Escolástica. 
 
 
Mas a denominação pejorativa de estéril não diz respeito somente a estas cor-
rentes, mas ao conjunto das filosofias antigas e de sua época. Mesmo a obra do itali-
ano Bernardino Telesius, por quem Bacon nutre reconhecida admiração, não deixa 
de ser considerada, pejorativamente, como contemplativa e pastoral. 
 
Imagem alusiva à Escolástica extraída do 
Breviarium Romanum do Ofício de Matinas, 
Ad Nocturnum, Lectio III, www.ipsa-conte-
ret.blogspot.com 
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A esterilidade vale frisar, não é propriamente teórica, mas em termos de frutos 
(obras) que aliviem a condição material dos homens. Bacon considera os sistemas 
dos filósofos como teias de aranha. Com esta imagem ele exprime, simultaneamente, 
a percepção de sua perfeição e de seu deslocamento da realidade. Ou seja, reco-
nhece a beleza e a habilidade das mentes na construção dos sistemas que, como os 
fios com que as aranhas tecem suas teias, são tirados delas mesmas, sem comércio 
com a natureza, e pairando acima e fora do mundo real. 
O interesse dos gregos pela teorização, que diferenciava seu conhecimento 
dos de outros povos e que geralmente é visto como elemento fundador da cultura 
ocidental é visto por Bacon como um equivocado excesso, que desvirtuara toda a 
filosofia. Isto não quer dizer que o conhecimento operatório, que ele proporá em subs-
tituição, deva abrir mão de qualquer teorização. Bacon defenderá, como veremos, 
uma verdadeira união da teoria com a prática e, portanto, criticará também o desin-
teresse dos técnicos pelas teorias e métodos que potencializassem o conhecimento-
domínio da natureza e o avanço das invenções. Mas a seu ver a "inclinação grega" 
fora excessiva, levando a um descaminho que praticamente esterilizou toda tradição 
filosófica. 
 Como se poder ver, a refutação dos objetivos 
equivocados da tradição filosófica vai indireta-
mente revelando as finalidades do programa baco-
niano. Ou seja, expressos negativamente como 
crítica da esterilidade, os objetivos da ciência ba-
coniana se revelarão positivamente como transfor-
mação da ciência (filosofia natural) em tecnolo-
gia. 
 
Não há surpresa que o curso não seja percorrido 
quando os caminhos se desviam para fins menores. De 
fato, até onde eu saiba, o objetivo nunca foi definido. 
Este é, simplesmente, que a raça humana seja incessan-
temente enriquecida com novas obras e poderes. 
(Bacon. Thoughts and conclusions, 76) 
 
Filosofia Natural - Gravura Flammarion , 
(autor anônimo, aparecido em el libro 
L'Atmosphere: Météorologie Populaire, 
Paris, 1888) – extraído de http://coctel-
marx.blogspot.com.br 
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1) Com base no texto abaixo, é CORRETO afirmar que Francis Bacon: 
“Que ninguém espere um grande progresso nas ciências, especial-
mente no seu lado prático, até que a filosofia natural seja levada às ciências 
particulares e as ciências particulares sejam incorporadas à filosofia natu-
ral. [...] De fato, desde que as ciências particulares se constituíram e se 
dispersaram, não mais se alimentaram da filosofia natural, que lhes poderia 
ter transmitido as fontes e o verdadeiro conhecimento dos movimentos, dos 
raios, dos sons, da estrutura e do esquematismo dos corpos, das afecções 
e das percepções intelectuais, o que lhes teria infundido novas forças para 
novos progressos.” 
(BACON, Francis. Novum Organum. Trad. de José Aluysio Reis de 
Andrade. 4ªed. São Paulo: Editora Nova Cultural, 1988. p. 48.) 
 
a) Afirma que a única finalidade da filosofia natural é contribuir para o desenvol-
vimento das ciências particulares. 
b)Defende que o que há de mais importante nas ciências particulares é o seu 
lado prático. 
c) Propõe que o progresso da filosofia natural depende de que ela incorpore as 
ciências particulares. 
d) Vincula a possibilidade do progresso nas ciências particulares à dependência 
destas à filosofia natural. 
 
2) Com base no texto abaixo, assinale a alternativa que apresenta CORRETAMENTE 
a interpretação que Bacon fazia da filosofia aristotélica. 
 
“[...] Aristóteles estabelecia antes as conclusões, não consul-
tava devidamente a experiência para estabelecimento de suas reso-
luções e axiomas. E tendo, ao seu arbítrio, assim decidido, submetia 
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a experiência como a uma escrava para conformá-la às suas opini-
ões”. 
(BACON, Francis. Novum Organum. Trad. de José Aluysio Reis de 
Andrade. 4ª ed. São Paulo: Editora Nova Cultural, 1988. p. 33.) 
 
a) Aristóteles consultava a experiência para estabelecer os resultados e axiomas 
da ciência. 
b) Aristóteles afirmava que o conhecimento teórico deveria submeter-se, como um 
escravo, ao conhecimento da experiência. 
c) Aristóteles desenvolveu uma concepção de filosofia que tem como consequência 
a desvalorização da experiência. 
d) A filosofia aristotélica valorizava a experiência, por considerá-la um caminho se-
guro para superar a opinião e atingir o conhecimento verdadeiro. 
 
3) No texto The advancement of learning Francis Bacon trata dos erros e da futilidade 
como destemperos do conhecimento, criticando a esterilidade da ciência e outros 
aspectos da filosofia antiga. 
Assinale a alternativa que NÃO contempla elementos dessa crítica. 
a) A Escolástica Aristotélica. 
b) O Neoplatonismo. 
c) A Retórica Humanista. 
d) A transformação da ciência (filosofia natural) em tecnologia.

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