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1LIVRO2 VERSAO FINAL LIVRO ENVIADO A GRAFICA

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APOIO:
Rede Brasileira de Tecnologia de
ARMAZENAGEM
E USO DE BIODIESEL:
PROBLEMAS ASSOCIADOS E FORMAS DE CONTROLE
Rede Brasileira de Tecnologia de
APOIO:
Copyright © 2016
TODOS OS DIREITOS RESERVADOS. É permitida a reprodução total ou parcial, de qualquer forma ou por qualquer meio, desde que mencionada a fonte.
MINISTÉRIO DA CIÊNCIA, TECNOLOGIA, INOVAÇÕES E COMUNICAÇÕES
MINISTRO DA CIÊNCIA, TECNOLOGIA, INOVAÇÕES E COMUNICAÇÕES
Gilberto Kassab
SECRETÁRIO EXECUTIVO
Elton Santa Fé Zacarias
SECRETÁRIO DE DESENVOLVIMENTO TECNOLÓGICO E INOVAÇÃO
Alvaro Toubes Prata
COORDENAÇÃO GERAL DE TECNOLOGIAS SETORIAIS
Eduardo Soriano Lousada Gustavo de Lima Ramos Rafael Silva Menezes
REDE BRASILEIRA DE TECNOLOGIA DE BIODIESEL - RBTB
EDITORES
Paulo Anselmo Ziani Suarez (Instituto de Química, UnB) David Mark Mendes Pinho (Instituto de Química, UnB)
PROJETO CONSOLIDAÇÃO DA REDE DE ESTUDOS E PROJETOS SOBRE PARÂMETROS FÍSICO-QUÍMICOS PARA A REAÇÃO DE TRANSESTERIFICAÇÃO DE ÓLOES E GORDURAS (FISQUIBIODIESEL)
Fábio Moreira da Silva (Coordenador do Projeto, Instituto de Química, UnB)
Paulo Anselmo Ziani Suarez (Vice-Coordenador do Projeto, Instituto de Química, UnB)
REVISÃO
Maxwell Gomes Miranda (Curso de Letras, ICHS/CUA/UFMT)
DIAGRAMAÇÃO E PROJETO GRÁFICO
Roberto Cassemiro Alves
PREFÁCIO	09Sumário
1 - CAPÍTULO I: PROBLEMAS DE FORMAÇÃO DE BORRAS DURANTE A ESTOCAGEM VERIFICADOS APÓS A OBRIGATORIEDADE DO BIODIESEL E AS POSSÍVEIS CAUSAS 1.1 Introdução	12
1.2 Produção de Biodiesel.	13
1.3 Os problemas associados com a adição de biodiesel.	15
1.3.1 Processos físicos de precipitação.	16
1.3.2 Degradação química por oxidação.	18
1.3.3 Degradação microbiana.	22
1.4 Considerações finais	24
1.5 Referências bibliográficas.	24
2 - CAPÍTULO II: PESTABILIDADE AO ARMAZENAMENTO E VIDA DE PRATELEIRA DE BIODIESEL
2.1 Introdução.	28
2.2 Objetivos	36
2.3 Metodologia	37
2.3.1 Caracterização prévia dos diferentes tipos de biodiesel estudados
e montagem dos ensaios de vida de prateleira	37
2.3.2 Monitoramento da temperatura e umidade relativa.	38
2.4 Resultados e discussão.	50
2.4.1 Aspecto.	52
2.4.2 Teor de Água.	52
2.4.3 Estabilidade Oxidativa.	52
2.4.4 Massa específica a 20 °C.	53
2.4.5 Viscosidade Cinemática a 40 °C.	54
2.4.6 Índice de Acidez	54
2.4.7 Ponto de Entupimento de Filtro a Frio.	55
2.4.8 Teor de Éster	56
2.5 Conclusões.	56
2.6 Continuidade & desdobramentos.	57
2.7 Agradecimentos	59
2.9 Referências bibliográficas.	60
3 - CAPÍTULO II: ADITIVOS QUÍMICOS PARA A MELHORIA DAS PROPRIEDADESA FRIO DE BIODIESEL E BLENDAS
3.1 Introdução.	70
3.2 comportamento do biodiesel frente à redução da temperatura	72
3.3 Agentes redutores do ponto de fluidez	73
3.4 Mecanismo de ação dos aditivos poliméricos anticongelantes	74
3.5 Parte experimental	76
3.5.1 Síntese dos polímeros precursores dos aditivos	76
3.5.2 Esterificação dos homopolímeros e copolímeros ácidos.	77
3.5.3 Determinação do ponto de fluidez e névoa	77
3.6 Resultados e discussão.	77
3.6.1 Síntese dos aditivos poliméricos.	77
3.6.2 Determinação do ponto de fluidez e do ponto de névoa (PP e CP)	78
3.7 Considerações finais	86
3.8 Agradecimentos	87
3.9 Referências bibliográficas.	88
4 - CAPÍTULO IV: ADITIVOS QUÍMICOS PARA O CONTROLE DA ESTABILIDADE OXIDATIVA DE BIODIESEIS
Introdução.	90
Metodologia	92
Materiais	92
Síntese dos biodieseis e caracterização físico-química.	92
Obtenção dos extratos.	93
Resultados e discussões.	95
Caracterização dos biodieseis.	95
Efeito antioxidante dos aditivos em biodiesel	96
Considerações finais	109
Agradecimentos	110
Referências bibliográficas.	110
- CAPÍTULO V: DIAGNÓSTICO, MONITORAMENTO E CONTROLE DA CONTAMI- NAÇÃO MICROBIANA EM BIODIESEL E MISTURAS DURANTE O ARMAZENAMENTO 5.1 Introdução.	112
Diagnóstico: como e quando ocorre a contaminação microbiana?.	115
Origem do combustível e biocombustível.	115
Presença de água	116
Combustível como veículo de contaminação	118
Composição microbiana dos resíduos	118
Temperatura e pH	122
Oxigênio	123
Nutrientes	123
5.2.8. Adição de biodiesel	128
5.2.9 Teores de enxofre	138
Consequências do processo de deterioração:	142
Monitoramento da contaminação microbiana em combustível	143
5.4.2 Métodos Tradicionais	144
5.4.2 Métodos alternativos	146
Controle da contaminação microbiana	151
Métodos de controle físico.	151
Métodos de controle químico	152
Atividade antimicrobiana de aditivos antioxidantes comerciais	160
Seleção de moléculas biocidas para uso em combustíveis.	163
Considerações finais	165
Agradecimentos	166
Referências bibliográficas	166
- CAPÍTULO VI: MODIFICAÇÃO QUÍMICA DE BIODIESEL PARA AUMENTAR A SUA ESTABILIDADE QUÍMICA
Introdução.	176
Hidrogenação	176
Hidroformilação	182
Teste de perfuração em ágar	184
Teste de Concentração Inibitória Mínima em blendas positivas no teste de perfuração em ágar	186
Teste de inibição de crescimento dos micro-organismos	186
Considerações finais	187
Referências bibliográficas	187
- CAPÍTULO VII: ESTABILIDADE OXIDATIVA DO BIODIESEL POR CORRELAÇÃO RANCIMAT - VOLTAMETRIA
Introdução	190
Experimental.	191
Materiais.	191
Métodos	192
Resultados e discussão	193
Introdução	193
Determinação de antioxidantes em B100:etanol	194
Antioxidantes em microemulsão A/O de biodiesel	198
Controle de qualidade: Rancimat vs. VPD	201
Considerações finais	204
Referências bibliográficas	204
7
8
	Prefácio
O Ministério de Ciência, Tecnologia, Inovações e Comunicações (MCTIC), como integrante do Programa Nacional de Produção e Uso de Biodiesel (PNPB) possui a função de impulsionar o desenvolvimento tecnológico desse biocombustível no País. Nesse contexto, o MCTIC promove diversas ações junto aos diversos atores envolvidos na cadeia produtiva, principalmente por meio da Rede Brasileira de Tecnologia de Biodiesel (RBTB).
A RBTB envolveu quase a totalidade dos grupos de pesquisa relacionados ao biodiesel no País, que foram alocados em cinco sub-redes temáticas: (i) matéria-prima; (ii) produção; (iii) arma- zenamento, estabilidade e problemas associados; (iv) caracterização e controle da qualidade e (v) coprodutos. Desde 2005, com o apoio dos pesquisadores da RBTB, o MCTIC promove reuniões setoriais, seminários, congressos científicos e estudos diversos com o objetivo de avaliar as ações em execução no âmbito da Rede e de identificar eventuais entraves surgidos durante a evolução do PNPB e que necessitem de investimentos em PD&I.
No âmbito das sub-redes de Produção e Armazenamento foram financiadas pesquisas como o objetivo de solucionar diferentes problemas da cadeia produtiva, como, por exemplo, aque- les advindos da maior biodegradabilidade e menor estabilidade oxidativa do Biodiesel quando com- paradas às do petrodiesel. Certamente o principal desafio nesse contexto foi solucionar a formação indesejada de borras durante a estocagem do biodiesel verificada no País, principalmente após a obrigatoriedade do uso da mistura B5. O livro “Armazenagem e Uso de Biodiesel: problemas asso- ciadas e formas de controle” apresenta para a comunidade técnico-científica resultados de estudos produzidos por pesquisadores de renomadas ICT’s, que identificaram as possíveis causas e as formas de evitar a formação dessas borras.
No Capítulo 1, os autores fizeram uma abrangente introdução sobre a temática e detalharam as possíveis causas da formação de borras no biodiesel (precipitação, degradação/polimerização oxidativa, degradação hidrolítica e crescimento microbiano). A consequência de o biodiesel possuir baixas estabilidades hidrolítica, oxidativa e térmica, ao longo de toda a cadeia é tema do Capítulo 2, que também trará ao leitor resultados técnicos sobre a estabilidade ao armazenamento e da vida de prateleira de três diferentes tipos de biodieseis.
Os possíveis problemas de funcionamento de equipamentos e motores advindos da exposição do biodiesel a baixas temperaturas é tema do Capítulo 3, que explora o uso de aditivos anticongelantes. Em especial, apresentaum estudo detalhado sobre o mecanismo de ação dos aditivos poliméricos. O uso de aditivos também é tema do Capítulo 4, que aborda os fatores que influenciam diretamente na estabilidade oxidativa do biodiesel e dará destaque a um estudo realizado com extratos vegetais com potencial antioxidante aplicados em biodiesel de baixa estabilidade oxidativa.
Outro fator potencial de formação de borras na cadeia de abastecimento de óleo diesel e bio- diesel no Brasil é a contaminação microbiana. A formação de sedimentos biológicos, suas principais causas e as medidas que visam proteger e evitar a formação indesejada de borra biológica é tema do Capítulo 5.
Apesar de eficientes, os aditivos antioxidantes apenas retardam a oxidação biodiesel, mas, considerando a longo prazo, são ineficazes para conter a oxidação. O Capítulo 6 apresenta duas tecno- logias inovadoras alternativas que modificam quimicamente o combustível de forma a aumentar a sua estabilidade química e inibir o crescimento de micro-organismos: (i) hidrogenação parcial das cadeias poli-insaturadas; e (ii) eliminação das insaturações das cadeias com a introdução de grupos funcionais nitrogenados.
Por fim, o Capítulo 7 apresenta o desenvolvimento de metodologia eletroanalítica para análise direta do antioxidante sintético tert-butilhidroquinona (TBHQ), de modo a atender a necessidade da in- dústria de maior rapidez na avaliação da qualidade do biodiesel na linha de produção. Apesar de eficien- te, o ensaio do Rancimat é demorado, e, por esta razão, o desenvolvimento de uma metodologia rápida e que apresente correlação com o ensaio oficial é de interesse para a indústria, seja para avaliação da eficácia dos antioxidantes, seja para ajustes do processo.
Na certeza que esta publicação irá contribuir para fortalecer a literatura técnico-científica refe- rente às temáticas de produção, armazenamento, estabilidade e problemas associados ao biodiesel desejo uma ótima leitura e bons estudos.
Dr. Rafael Silva Menezes Coordenador de Ações de Desenvolvimento Energético Secretaria de Desenvolvimento Tecnológico e Inovação
Ministério da Ciência, Tecnologia, Inovações e Comunicações
11
CAPÍTULO 101
PROBLEMAS DE FORMAÇÃO DE BORRAS DURANTE A ESTOCAGEM VERIFICADOS APÓS A OBRIGATORIEDADE DO BIODIESEL E AS POSSÍVEIS CAUSAS
David Mark Mendes Pinho1 Paulo Anselmo Ziani Suarez1
Simoni Margareti Plentz Meneghetti2 Ellen Tanus Rangel1
1Instituto de Química, UnB
2Instituto de Química e Biotecnologia, UFAL
ARMAZENAGEM E USO DE BIODIESEL:1
PROBLEMAS ASSOCIADOS E FORMAS DE CONTROLE
1.1 Introdução
O uso de óleos e gorduras de origem vegetal ou animal como combustível remonta ao início do século passado, desde que Rudolf Diesel, criador do motor que leva seu nome, utilizou óleo de amendoim como combustível (Suarez et al., 2007). No entanto, os óleos e gorduras foram abando- nados, pois a utilização dos mesmos não conseguia competir economicamente com a indústria do petróleo em plena expansão. Posteriormente, os motores foram sendo modificados para melhorar a sua eficiência, tornando impossível o uso de óleos e gorduras in natura diretamente, pois ocorre a formação de depósitos de coque nas câmaras de combustão e sistemas de injeção, reduzindo os períodos de manutenção e a vida útil desses dispositivos.
A necessidade de substituição total ou parcial dos combustíveis fósseis por fontes renová- veis está associada ao constante aumento da demanda energética e à redução da disponibilida- de do petróleo. Além disso, nas últimas décadas esta substituição também vem sendo motivada por problemas ambientais associados à queima de combustíveis fósseis, tais como o aquecimento global e a chuva ácida. No caso do Brasil, além desses motivos, a necessidade de redução da importação de petróleo e derivados é mais uma motivação para o investimento em combustíveis alternativos (Pousa et al., 2007).
Nesse contexto, a produção de biocombustíveis alternativos ao diesel a partir de óleos e gorduras foi viabilizada por duas rotas distintas: (a) craqueamento ou hidrocraqueamento de mate- riais graxos para obtenção de hidrocarbonetos, e (b) a esterificação de ácidos graxos ou transeste- rificação de acilglicerídeos para a síntese de mono-ésteres, conhecidos como biodiesel (Dupont et al., 2009). Assim, os produtos obtidos possuem características físicas e químicas mais compatíveis com o óleo diesel que o óleo in natura, permitindo o seu uso puro ou misturado ao diesel em motores convencionais.
No Brasil, até o momento, foi introduzido na matriz energética apenas o biodiesel. Para tal, o governo federal criou em 2004 o PNPB (Programa Nacional de Produção e Uso de Biodiesel), que objetiva de forma técnica e econômica a produção e uso do biodiesel com enfoque na inclusão social, geração de emprego e distribuição de renda (Pousa et al., 2007). A produção e uso comer- cialde biodiesel se tornou realidade em 2005, quando a lei federal n° 11.097 de 13 de janeiro de 2005 tornou obrigatória a sua mistura com o diesel comercializado no varejo. Esta lei previu o uso facultativo de uma mistura com 2%vol de biodiesel, chamada de B2, entre janeiro de 2005 e janeiro de 2008. Quando passou a ser obrigatório, aumentou-se o teor gradativamente até chegar a uma mistura B5 em janeiro de 2010. Com a lei federal nº 13.033, de 24 de setembro de 2014, a mistura obrigatória passou a ser B7 a partir de novembro de 2014. Recentemente, com o decreto de Lei 3834/2015, prevê-se a obrigatoriedade do uso de B8 em março de 2017, o B9 em março de 2018 e o B10 em março de 2019. Além disso, esta lei ainda prevê que o Conselho Nacional de Política Energética (CNPE) poderá aumentar a mistura de biodiesel para até 15% em 36 meses, a partir de novos testes e ensaios que serão realizados nos motores.
100
13
Desde 2005, o crescimento da produçãoe uso do biodiesel no Brasil foi enorme, seja para atender o aumento do seu teor na mistura ou o incremento significativo na demanda por combus- tível. De fato, a produção de biodiesel no Brasil atingiu em 2015 algo em torno de 3,3 milhões de metros cúbicos (Produção de Biodiesel, 2015).
Para entender a importância da produção nacional de biodiesel na economia do país, de- ve-se destacar que, mesmo com a atual mistura (B7) e as reservas pré-sal, o país ainda não é autosuficiente na produção de petróleo e tampouco de seus derivados diesel e gasolina. Segundo os dados disponíveis no portal da Agência Nacional de Petróleo (ANP), o Brasil importou, em 2014, cerca de 71 milhões de barris de óleo diesel, isso é um aumento de 50 % em comparação com 2012, quando o país importou cerca de 50 milhões de barris. De fato, como mostra o gráfico apresentado na Figura 1.1, a demanda aumenta de forma contínua em um ritmo superior à elevação da produ- ção. Mesmo em 2015, quando houve um decréscimo na demanda por diesel provavelmente decor- rente da recessão que passou a afetar o país, pode-se observar que a quantidade de importação do combustível continuou alta.
Figura 1.1: Produção nacional e importação de óleo diesel ao longo dos anos. Bep= barril equivalente de petróleo (Produção de derivados de Petróleo, 2016; importações e exportações, 2016).
1.2 Produção de Biodiesel
O processo de produção de biodiesel é realizado a partir do triacilglicerídeo ou do ácido gra- xo por transesterificação ou esterificação, respectivamente, com um mono-álcool de cadeia curta, como metanol, na presença de catalisador. Estas reações são apresentadas na Figura 1.2.
CAPÍTULO 1: PROBLEMAS DE FORMAÇÃO DE BORRAS DURANTE A ESTOCAGEM VERIFICADOS APÓS A OBRIGATORIEDADE DO BIODIESEL E AS POSSÍVEIS CAUSAS
ARMAZENAGEM E USO DE BIODIESEL:1
PROBLEMAS ASSOCIADOS E FORMAS DE CONTROLE
O
O		R1 O
O
+	3 R4 OH
[CAT]
O
R4
R1	O
O	OH
R4	+
(a)
O		O R2 R3
R2	O	OH
O	OH
R4
R3	O
O
R1	OH
+ R2 OH
O
R2 +
R1	O
H2O
(b)
Figura 1.2: Reações de obtenção de biodiesel: (a) transesterificação; (b) esterificação.
Apesar do estágio maduro da produção de bioetanol no Brasil,deve-se destacar que todo o biodiesel produzido no país utiliza metanol, que é importado e de origem fóssil. Esta situação é bastante desconfortável, uma vez que o uso de bioetanol levaria a um combustível totalmente reno- vável, além de gerar emprego e renda no país. No entanto, tanto a reatividade superior do metanol quanto o seu menor custo, mesmo sendo importado, fazem com que ele seja o mono-álcool de preferência da indústria (MEC, 2016).
Em relação à matéria-prima graxa, percebe-se uma grande diversidade de fontes oleagi- nosas. Segundo os boletins emitidos mensalmente pela ANP constando as matérias-primas uti- lizadas na produção de biodiesel, pode-se perceber, no entanto, que há uma predominância da soja, com a média de 75% de todo biodiesel produzido (veja Figura 1.3), e em segundo lugar a gordura bovina, sendo as demais fontes utilizadas em quantidades pequenas e de forma sazonal. O domínio da soja como matéria-prima para o biodiesel no Brasil é facilmente entendido quando se sabe que cerca de 90% de todo óleo produzido no país advém desse grão (CI Soja, 2016).
Figura 1.3: Porcentagem das oleaginosas utilizadas na produção de biodiesel no Brasil ao longo dos anos, segundo a ANP (Boletim do Biodiesel, 2015).
1.3 Os problemas associados com a adição de biodiesel
Para que os motores funcionem da forma correta, é necessário que os combustíveis utili- zados tenham propriedades físicas e químicas específicas. Atualmente, a resolução que descreve os parâmetros físico-químicos exigidos para o diesel, as normas técnicas adotadas para a sua ava- liação e seus limites é a Resolução ANP n° 50 de 2013 e para o biodiesel é a ANP n° 45 de 2014. Deve-se destacar que a ANP tem atualizado constantemente estas resoluções e espera-se que com o próximo aumento do teor de biodiesel ao diesel as mesmas venham a sofrer alterações.
Após o início da adição do biodiesel no diesel, verificou-se um aumento considerável nos problemas relacionados com a formação de borras durante o transporte e a armazenagem do com- bustível. Por exemplo, segundo relatos dos representantes de postos de combustível, itens do siste- ma de armazenamento e bombeamento são trocados a cada 15 dias, sendo que antes da implanta- ção do biodiesel eram trocados uma vez por mês (Biodieselbr, 2010). A Figura 1.4 mostra a situação do filtro da bomba de combustível de um posto, em que é possível verificar a borra formada.
Além das informações do setor de postos, dados gerados pelo Programa de Monitoramento da Qualidade de Combustíveis (PMQC) também demonstram uma relação clara do aumento de não conformidades do diesel após o início do uso de biodiesel no mercado brasileiro. Na Figura 1.5 é possível verificar que, após a criação do PMQC, o índice de não conformidade estava caindo gra- dativamente até 2007 e que, a partir de 2008, quando a obrigatorie- dade do B2 inicia, este índice volta a aumentar.
Figura 1.4: Fotografia do filtro de uma bomba de combustível. Fonte: Fecombustíveis 2011.
7
6
5% de nao conformidade
4
3
2
1
CAPÍTULO 1: PROBLEMAS DE FORMAÇÃO DE BORRAS DURANTE A ESTOCAGEM VERIFICADOS APÓS A OBRIGATORIEDADE DO BIODIESEL E AS POSSÍVEIS CAUSAS
16
15
0
2000
2002
2004
2006
2008
ano
2010
2012
2014
Figura 1.5: Índice de não conformidade para amostras de diesel (PMQC, 2016).
ARMAZENAGEM E USO DE BIODIESEL:1
PROBLEMAS ASSOCIADOS E FORMAS DE CONTROLE
Outro indício que também indica a possível relação do aumento no índice de não confor- midades com a adição do biodiesel ao diesel, está apresentado na Figura 1.6. Quando analisada a Figura 1.6, verifica-se que as não conformidades podem ter relação com a presença do biodiesel, tais como o aspecto visual (oxidação do biodiesel), teor de biodiesel (adulteração da composição química do biodiesel), ponto de fulgor (contaminação com álcool residual da produção do biodiesel), dentre outras.
Figura 1.6: Índice de não conformidade para amostras de diesel (PMQC, 2016).
A maior formação de borras e não conformidades apresentadas pelas misturas que contém biodiesel parece ser o resultado das diferenças físicas e químicas entre o biocombustível e o diesel. O entendimento das diferenças existentes entre o diesel e as misturas diesel/biodiesel é essencial para mitigar os problemas verificados e viabilizar o uso do biocombustível sem trazer prejuízos para o consumidor. Para entender este problema, sem esgotar o tema, serão discutidos a seguir quatro processos de separação de fases e de degradação que ocorrem nas misturas: (1.3.1) Processos físicos de precipitação; (1.3.2) Degradação microbiana; e (1.3.3) Degradação química por oxidação.
1.3.1 Processos físicos de precipitação
Em termos de estrutura química, a principal diferença entre o biodiesel e o diesel é a pre- sença de átomos de oxigênio nas moléculas que compõem o biocombustível, enquanto que nos hidrocarbonetos do combustível fóssil existe apenas carbono e hidrogênio. A presença de oxigênio torna os ésteres metílicos mais polares e capazes de realizar ligações de hidrogênio com a água. Assim, o biodiesel possui um caráter mais higroscópico que o diesel, ou seja, o biodiesel tem uma maior capacidade de absorver água e sua adição ao diesel tornará o caráter higroscópico das mis- turas relativamente superior. Uma das consequências dessa diferença de polaridade é que diversas moléculas apresentam solubilidade diferenciada nesses dois combustíveis.
Como os tanques de transporte e os de armazenagem de combustíveis são abertos, a sua altahigroscopicidade faz com que o biodiesel absorva rapidamente grandes quantidades de água. Quando o biocombustível é misturado ao diesel a diminuição da polaridade do meio leva à forma-
ção de gotículas de água, aumentando a turbidez da mistura. A coalescência das gotículas leva à formação de depósitos de água no fundo dos tanques. Além disso, a maior higros- copicidade da mistura em relação ao diesel leva a uma maior absorção de água durante a sua estocagem e a variação de temperatura gera um aumento na precipitação de água quan- do comparada à que se verifica em um tanque que armazena o combustível fóssil puro. A Figura 1.7 mostra a água coletada no fundo de um tanque de um posto em São Paulo. Além disso, a presença de água nos tanques acarreta diversos problemas. Por exemplo, a presença de água, como será discutida mais detalhadamente nos próximos tópicos, leva à degradação quí- mica do biodiesel, como processos de oxidação e hidrólise, e também permite a proliferação de micro-organismos. Estes problemas são minimizados com boas práticas, como a drena- gem frequente dos tanques.
Figura 1.7: Foto da água presente no fundo de tanque de diesel de um posto de combustíveis no estado de São Paulo. Foto: Cristiano Campelo.
Além da maior segregação de fase devido à água, também pode ocorrer a formação de precipitados ou borras pela incompatibilidade de moléculas solúveis no biodiesel ou no diesel após a mistura desses. De fato, a variação da polaridade do meio ao misturar os dois combustíveis diminui a solubilidade de muitas moléculas. A seguir, serão discutidos dois grupos de compostos químicos que já foram relatados na literatura associados à precipitação devido à diferença de solubilidade entre o biodiesel e a mistura diesel/biodiesel. Note que estes não são os únicos casos, mas apenas exemplos.
Como descrito anteriormente, a transesterificação é uma reação do triacilglicerídeo (TAG) com três moléculas de mono-alcool para formar uma molécula de glicerol e três de mono-éster (FAME). No entanto, esta reação ocorre em três etapas distintas, em que cada uma é consumida uma molécula de mono-álcool e formada uma de FAME. Além disso, na primeira etapa é formada uma molécula de di-acilglicerídeo (DAG), na segunda esta reage e é produzido um mono-acilglice- rídeo (MAG), o qual é consumido na terceira para finalmente liberar o glicerol. Como as três etapas da transesterificação envolvem reações reversíveis, no equilíbrio haverá uma mistura de TAG, DAG,MAG, FAME, mono-álcool e glicerol, conforme pode ser visto na Figura 1.8. Deve-se destacar que a atual regulamentação da ANP especifica como sendo 96,5% a concentração mínima de FAME na mistura para que esta possa ser comercializada como biodiesel, mas sempre haverá presente quantidades de TAB, DAG, MAG e glicerol. Com a mistura do biodiesel ao diesel ou com a variação de temperatura tanto do biodiesel puro quanto após a mistura, pode ocorrer a precipitação dos com- postos contendo glicerol (Dunn, 2012).
CAPÍTULO 1: PROBLEMAS DE FORMAÇÃO DE BORRAS DURANTE A ESTOCAGEM VERIFICADOS APÓS A OBRIGATORIEDADE DO BIODIESEL E AS POSSÍVEIS CAUSAS
18
17
ARMAZENAGEM E USO DE BIODIESEL:1
PROBLEMAS ASSOCIADOS E FORMAS DE CONTROLE
H
O
H	C H
O
C	 
O	c	b	a
2
O C H
H	C H2
C H2
O
H
G licerol
O C H
C H2
O
H
O
Monoacilglicerídeo ( MAG )
C	 
O	O	c	b	a
 		C	 
C H2
a	O C Hb	c
C H2
O
H
O
Diacilglicerídeo ( DAG )
C	 
O	O	c	b	a
 		C	 
C H2
a	O C Hb	c
C H2
O	 
C	c	b	a O
Triacilglicerídeo ( TAG )
O
C	 
O	c	b	a
R
R OH
Mono-álcool
Mono-éster de ácido graxo ( F AME )
Figura 1.8: Produtos da reação incompleta da produção de biodiesel.
Dependendo da matéria-prima, diversas outras substâncias polares podem ser encontra- das, como as isoflavonas no óleo de soja ou os esteróis (colesterol no sebo bovino ou β-sitosterol no óleo de soja). Assim como os compostos glicerídeos, também existem relatos de precipitação destas substâncias quando o biodiesel é misturado ao diesel ou quando ocorre variação na tem- peratura tanto do biocombustível puro quanto das suas misturas com diesel (Bezerra et al., 2015).
1.3.2 Degradação química por oxidação
Os triacilglicerídeos, componentes majoritários dos óleos e gorduras de origem vegetal ou animal, possuem em sua estrutura diferentes funcionalidades que são decorrentes da estrutura quí- mica dos ácidos graxos que lhe deram origem (Figura 1.8) (Suarez et al., 2007). Essa diversidade conduz a propriedades químicas importantes e uma delas está relacionada com a ocorrência de reações entre as insaturações do tipo C=C, presentes na estrutura das moléculas de triacilglicerídeo ou derivados e o oxigênio molecular existente no meio.
É importante salientar que durante o processo de produção do biodiesel as insaturações presentes na estrutura de determinado óleo vegetal continuarão presentes nos ésteres alquílicos formados, pois tais funcionalidades não participam de reação de transesterificação ou esterificação, permanecendo intactas. Como já citado (Figura 1.3), muitas das matérias-primas empregadas na produção do biodiesel no Brasil são ricas em ácidos graxos insaturados (Tabela 1.1), estruturas que poderão sofrer oprocesso de oxidação química.
Tabela 1.1: Composição típica em ácidos graxos (%) de algumas matérias-primas oleaginosas empregadas na produção de biodiesel.
	MATÉRIA-PRIMA OLEAGINOSA
	Ácido Graxo
	Soja
	Palma
	Algodão
	Gordura bovina
	C14:0 (mirístico)
	1
	2
	1
	5
	C16:0 (palmítico)
	14
	43
	21
	20
	C17:0 (margárico)
	-
	-
	-
	6
	C16:1 cis 9 (palmitoleico)
	-
	-
	1
	2
	C18:0 (esteárico)
	2
	5
	3
	26
	C18:1 (oleico)
	23
	40
	19
	36
	C18:2 cis/cis 9,12 (linoleico)
	52
	10
	54
	3
	C18:3 cis/cis/cis 9,12,15 (linolênico)
	8
	-
	1
	4
	Saturados (%)
	17
	50
	25
	55
	Monoinsaturados (%)
	23
	40
	20
	38
	Poliinsaturados (%)
	60
	10
	55
	7
Fonte: Dados experimentais obtidos no GCAR (Grupo de Catálise e Reatividade Química).
Esse complexo processo de oxidação é responsável pela formação de diversos compostos, muitos de elevada massa molecular, que podem estar relacionados com os depósitos observados em tanques, sistemas de injeção e outras partes do motor ciclo diesel. Além disso, compostos volá- teis são formados e podem contribuir para o envelhecimento e desgaste de partes do motor.
A oxidação dos triacilglicerídeos ou derivados é decorrente de uma série de reações em que há a formação de radicais livres que posteriormente se rearranjam e se recombinam (Figura 1.9). Esses arranjos e recombinações, que serão detalhados ao longo do texto, levarão a um aumento da massa molecular do sistema, com formação de materiais insolúveis no meio. O processo de oxi- dação será mais favorecido quanto maior for: (i) o número de insaturações presentes; (ii) o grau de conjugação dessas insaturações, pois duplas ligações conjugadas são mais reativas do que as não conjugadas; (iii) a temperatura; e (iv) a presença de substâncias, que agindo como catalisadores, aceleram o processo (Fazenda, 1995).
CAPÍTULO 1: PROBLEMAS DE FORMAÇÃO DE BORRAS DURANTE A ESTOCAGEM VERIFICADOS APÓS A OBRIGATORIEDADE DO BIODIESEL E AS POSSÍVEIS CAUSAS
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ARMAZENAGEM E USO DE BIODIESEL:1
PROBLEMAS ASSOCIADOS E FORMAS DE CONTROLE
R	 	 	R'	óleo
cisão holítica de uma ligação C-H
R	 	 	R'
R	R'
O
R O 	
O2
 		R'
R	 	 	R'
O2
cisão holítica de uma ligação C-H
OH
R O 		 		R'	R	R'
série de reações de decomposição e rearranjo de hidroperóxidos
série de reações de combinação
com outros radicais (processo de polimerização)
Figura 1.9: Reações que ilustram a natureza do processo de oxidação, mostrando a formação de radicais livres.
A oxidação dos triacilglicerídeos ou derivados envolve uma série de reações que podem ocorrer simultaneamente ou em sequência, gerando um complexo processo, que pode ser dividido basicamente em duas etapas subsequentes: oxidação e polimerização (com formação de material insolúvel no meio) (Sheldon et al., 1981).
A etapa de oxidação se caracteriza pela ocorrência de uma série de processos químicos que envolvem reações com oxigênio molecular, presente no meio, seguido da formação e decom- posição de hidroperóxidos (Sheldon et al., 1981). A formação e decomposição de hidroperóxidos envolve um processo reacional de iniciação e de propagação. A iniciação pode ocorrer com a ação de alguma espécie química (normalmente uma espécie que atue como catalisador, tais como traços de metais presentes na matéria-prima, tanques ou partes do motor) ou mesmo por decomposição térmica, conforme Esquema 1. A propagação pode ocorrer através da abstração do hidrogênio me- tilênico pelo radical anteriormente formado ou com a entrada da molécula de oxigênio no processo, garantindo a continuidade do mesmo, Esquema 1. Esse processo de geração de um radical livre é termodinamicamente favorável, visto que o radical formado pode ser estabilizado por ressonância (Figura 1.9) (Mallégol et al., 2000; Grokum et al., 2005).
Esquema 1
Iniciação
ROOH	RO	+	HO
Propagação
CH CH CH2 CH CH	+ RO	CH CH CH CH CH	+	ROH
.
O
CAPÍTULO 1: PROBLEMAS DE FORMAÇÃO DE BORRAS DURANTE A ESTOCAGEM VERIFICADOS APÓS A OBRIGATORIEDADE DO BIODIESEL E AS POSSÍVEIS CAUSAS
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 	. 
 	O 
CH CH CH CH CH	+	O2
CH CH CH CH CH
É importante salientar que à medida que o processo reacional avança, há um aumento da quantidade e da complexidade dos hidroperóxidos formados. Através da decomposição dos hi- droperóxidos é que se observa a maior geração de radicais livres e essas espécies dão origem a compostos de maior massa molecular, além de espécies oxigenadas, normalmente, voláteis. De fato, a decomposição desses hidroperóxidos se dá através da quebra homolítica da ligação OO (Esquema 2) (Gorkum et al., 2005). É justamente nesse período, em que há a geração de espécies oxigenadas voláteis, que podem contribuir para o envelhecimento e desgastes de peças do motor (Frankel, 1980; Hancock et al., 1989).
Pode ocorrer, também, a adição de radicais a ligações duplas remanescentes, formando outros radicais mais complexos, conforme mostrado no Esquema 3, seguida de recombinação (Pa- tankar, 2004).
Esquema 2
Rearranjos
OH
 		 	O
R	R'
 		 	
R	R'O
+	OH
 
aldeídos cetonas
ácidos orgânicos éteres
todos de baixa massa molecular
Esquema 3
R	+ C C
RC C
RO	+ C C
RO C C
ROO
+ C C
RO O C C
ARMAZENAGEM E USO DE BIODIESEL:1
PROBLEMAS ASSOCIADOS E FORMAS DE CONTROLE
A reação de terminação é a etapa finaldo processo, na qual ocorre um aumento do tamanho da cadeia e, consequentemente, um incremento da massa molecular das moléculas que compõem o sistema. Ou seja, é formada uma rede polimérica tridimensional, que constitui o material insolú- vel. Nessa etapa ocorre a recombinação dos radicais complexos formados na etapa de oxidação (Esquema 4) (Gorkum et al., 2005; Mallégol et al. 2001).O mecanismo de recombinação de radicais é, na realidade, bastante complexo e pode ser considerado como único na formação da rede tridi- mensional.
Esquema 4
Polimerização
2 RO	ROOR
2 ROO	ROOR +	O2
Peróxido
ROO + R	ROOR
2 R	R R
RO + R	ROR
Alquil Éter
1.3.3 Degradação microbiana
Por volta de 1960, surgiram os primeiros relatos de contaminação microbiana dos combustíveis (Hendey, 1964). No Brasil, o primeiro relato do problema descreve a contaminação de um tanque de querosene, onde foi isolado o fungo Cladosporium resinae (Gutheil, 1966). Desde então, foram realizados diversos estudos sobre contaminação microbiológica em combustíveis no país, uma vez que os microrganismos estão frequentemente presentes e os relatos do crescimento dos mesmos em tanques e reservatórios têm aumentado consideravelmente nos últimos anos, prin- cipalmente quando os combustíveis são armazenados por longos períodos, ocasionando grandes problemas (Gassen et al., 2015; Schultz, 2010). Os principais micro-organismos encontrados em combustíveis são diversas espécies de fungos, leveduras e bactérias (Bucker, 2009). Com o início da produção, estocagem e comercialização em larga escala de biodiesel, puro ou misturado com diesel, foi observado um aumento no que se refere à contaminação microbiológica quando compa- rada aos derivados de petróleo puros (Gaylarde et al., 1999; Ramos, 2009).
A contaminação por microrganismos no combustível pode ocorrer de várias maneiras, den- tre elas, através do ar, do solo, da água para limpeza já contaminada, do biofilme presente nas paredes dos reservatórios, caso estes não recebam a devida limpeza, entre outros. O biofilme for- mado apresenta-se como uma aglomeração de microrganismos que formam uma película sobre os tanques, geralmente relacionadas com o entupimento de tubulações, filtros, bicos e válvulas, além de um maior desgaste de bombas (Schultz, 2010; Gaylarde et al., 1999). Em casos de contamina- ção mais grave pode ocorrer também a formação de sedimentos biológicos (Bucker, 2009; Gaylar-
de et al., 1999). Além da formação de biofilmes e sedimentos, o desenvolvimento microbiológico pode acarretar na redução do pH na fase aquosa que se forma nos tanques de armazenagem de combustíveis devido ao seu metabolismo de produzir metabólitos ácidos, levando a um aumento na corrosão interna. Observa-se, também, a formação de outros compostos oxigenados, tais como cetonas, aldeídos e ácidos, produtos relacionados com o processo de oxidação nos sistemas de estocagem (Chung et al., 2000).
No entanto, para que os micro-organismos proliferem e formem biofilmes e sedimentos são necessárias condições favoráveis do meio, tais como a presença de água, condições ideais de temperatura, oxigênio, pH e nutrientes (Bucker, 2009; Gaylarde et al., 1999). Por exemplo, apesar de que algumas espécies até conseguem sobreviver na ausência de umidade, para que os micror- ganismos proliferem, é essencial a presença de água no sistema. Segundo a resolução da ANP nº 65/2011, no Brasil, por exemplo, é permitida uma concentração máxima de 0,05% de água no óleo diesel. Vale ressaltar que mesmo nessa concentração já é possível um crescimento microbiológico inicial, apesar de que 1% de água é considerada uma concentração ideal para o desenvolvimento da maioria dos microrganismos.
Logo após o início do crescimento microbiológico, observa-se que ocorre a produção de água no sistema, levando a um aumento da contaminação (Schultz, 2010; Chapelle, 2001; RANP 65 2011). Por outro lado, ocrescimento microbiológico também é pautado pela presença de nu- trientes minerais, tais como magnésio, fósforo, potássio, dentre outros. Já a existência de oxigênio nos tanques favorece o desenvolvimento microbiológico de microrganismos aeróbios, porém, sua falta não resulta na ausência de contaminação microbiológica, uma vez que existem microrganis- mos anaeróbios e outros facultativos que continuam a se desenvolver em ambientes anaeróbios. Ao se deparar com as condições ideais de nutrientes e água, uma população de microrganismos consegue rapidamente se desenvolver em um tanque de estocagem em uma extensa faixa de pH e temperatura, podendo variar o pH entre 4 e 9 e a temperatura de 4 ºC a 60 ºC (Yemashova et al.).
Entender o aumento da formação de biofilmes e biosedimentos após a introdução do biodie- sel na matriz energética é bastante simples. Como descrito acima, as condições ideais para a proli- feração de microrganismos é a presença de água e de alguns nutrientes. Como já descrito no item 1.1, o biodiesel é mais higroscópico e ele acarreta uma maior absorção de água. Por outro lado, no processo de produção de biodiesel usualmente é utilizado hidróxidos ou alcóxidos de potássio como catalisador, por apresentar uma maior atividade, levando a contaminações com íons deste metal no biodiesel. Para neutralizar o catalisador no final da reação são utilizados ácidos fracos, como cítrico ou fosfórico, originando, assim, uma contaminação de fósforo no biocombustível. Outros íons de metais, tais como cálcio e magnésio, provenientes da água de lavagem, também se encontram no biodiesel. Assim, apesar da ANP em sua resolução limitar os teores de potássio, magnésio, cálcio e fósforo, usualmente estes nutrientes estão presentes no biocombustível, contribuindo para a pro- liferação dos microrganismos.
CAPÍTULO 1: PROBLEMAS DE FORMAÇÃO DE BORRAS DURANTE A ESTOCAGEM VERIFICADOS APÓS A OBRIGATORIEDADE DO BIODIESEL E AS POSSÍVEIS CAUSAS
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ARMAZENAGEM E USO DE BIODIESEL:1
PROBLEMAS ASSOCIADOS E FORMAS DE CONTROLE
1.4 Considerações finais
A introdução do biodiesel na matriz energética brasileira conseguiu em apenas uma década estruturar um parque industrial capaz de produzir cerca de 4 bilhões de litros de biodiesel anual- mente. Esta indústria é estratégica para o país, pois consegue substituir parte da importação de derivados de petróleo, gerando emprego e renda.
No entanto, as características químicas do biodiesel trouxeram alguns problemas para o setor de combustíveis no país, principalmente com a formação de sedimentos e formação de com- postos oxigenados que aumentam o desgaste e a corrosão de tanques, tubulações, bombas, filtros, mangueiras, sistemas de injeção, etc. Para contornar estes problemas é essencial o estudo de suas causas e mecanismos de ação. Diversos pesquisadores da Rede Brasileira de Tecnologia de Bio- diesel têm-se debruçado no estudo destes problemas e na proposição de soluções. Nos próximos capítulos deste livro serão apresentados alguns destes estudos.
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CAPÍTULO 1: PROBLEMAS DE FORMAÇÃO DE BORRAS DURANTE A ESTOCAGEM VERIFICADOS APÓS A OBRIGATORIEDADE DO BIODIESEL E AS POSSÍVEIS CAUSAS
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ARMAZENAGEM E USO DE BIODIESEL:1
PROBLEMAS ASSOCIADOS E FORMAS DE CONTROLE
Relatório Anual da Revenda de Combustíveis. Federação Nacional do Comércio de Combustíveis e Lubrificantes. 2011.
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Yemashova, N. A., Murygina, V. P., Zhukov, D. V., Zakharyantz, A. A., Gladchenko, M. A., Appanna,
V. & Kalyuzhnyi, S. V. Biodeterioration of crude oil and oil derived products: a review. Reviews in Environmental Science and Biotechnology. Vol. 6, n. 4, p. 315-337, 2007.
CAPÍTULO 2
ESTABILIDADE AO ARMAZENAMENTO
E VIDA DE PRATELEIRA DE BIODIESEL
Eduardo H. de S, Cavalcanti 0,1 Vera Lucia Dionísio Resende1 Jéssica C. G. de Freitas1 Mariana R. F. do Nascimento1 Felipe S. Soares1
Elizabeth da Silva Figueiredo2 Deise Mendes2
Ismael Carlos da Silva2 Camila Calicchio Lopes2 Ellen Holanda de Souza2
Amanda Cecília da Silva2 Luana Castilho Neves2 Sandro Dourado Silveira2 Kátia Ferreira Cavalcanti2 Marcos Gaertner Brasil2
Luiz Fernando da Silva Almeida2 Cristiane M. de M. A. Portella3 Mônica Maria J. Vinhoza3 Fernanda Ribeiro Bürgel3 Andréa dos Santos Vieira3
02
0Coordenador do Projeto
1Laboratório de Corrosão e Proteção, Instituto Nacional de Tecnologia (LACOR-INT) 2Laboratório de Combustíveis e Lubrificantes, Instituto Nacional de Tecnologia (LACOL-INT) 3Laboratório de Biocombustíveis, Departamento de Química, Pontifícia Universidade Católica
do Rio de Janeiro (LABIO-PUC-RIO)
ARMAZENAGEM E USO DE BIODIESEL:2
PROBLEMAS ASSOCIADOS E FORMAS DE CONTROLE
2.1 Introdução
Considerável esforço vem sendo dedicado pelos setores de agronegócios, industrial e de serviços, bem como pelos governos federal, estadual e municipal, instituições de ensino e pesquisa, ciência e tecnologia (ICTs) e empreendedores em geral no sentido de introduzir o biodiesel na ma- triz energética do país. Às vésperas de comemorarmos os doze primeiros anos do lançamento do Programa Nacional de Produção e Uso de Biodiesel (PNPB), tonelagens relativamente significativas de produção de biodiesel estão sendo atingidas. Investimentos privados e públicos significativos vêm sendo feitos para nucleação e aprimoramento das nossas competências no setor. No campo da ciência, tecnologia e inovação, cifras em torno de 150 milhões de reais foram repassadas pelo Ministério da Ciência, Tecnologia, Inovações e Comunicações (MCTIC) para diversas instituições de investigação cientifica e tecnológica e empresas desde 2003. Cabe também destacar a atuação da ANP, notadamente através das equipes da Superintendência de Qualidade no Rio de Janeiro e do seu Centro de Pesquisas Tecnológicas em Brasília (CPT) em prol do desenvolvimento do PNPB. Juntamente com a comunidade científica e tecnológica em particular dos pesquisadores integrantes da Rede Brasileira de Tecnologia de Biodiesel (RBTB). Nesse fórum foram produzidos mais de 1000 trabalhos apresentados nos últimos quatro Congressos da Rede Brasileira de Tecnologia sendo que 15% desse universo envolve a temática da estabilidade ao armazenamento e seus problemas associados, bem como o estudo e o desenvolvimento de soluções de controle e mitigadoras que miniminizem os seus efeitos.
A estabilidade ao armazenamento pode ser definida como a capacidade do combustível de não se deteriorar. Ou seja, a habilidade do combustível em resistir a um conjunto de modificações químicas que são inerentes ao processo de armazenamento ao longo do tempo (Knothe, 2006) Tra- ta-se de um conceito relativamente mais amplo que contempla três variantes principais, decorrentes do contato do combustível com o ar, a água e a temperatura. Integram esse conceito um conjunto de processos degradativosenvolvendo primeiramente interações com:
a) a umidade;
b) o oxigênio do ar e,
c) a temperatura.
Ou seja, o biodiesel deve exibir estabilidade hidrolítica, oxidativa e térmica, ao longo de toda a cadeia, desde a sua fabricação até o momento da queima no motor, já na condição adicionado ao diesel de petróleo.
Com relação à estabilidade térmica temos que diferenciar três níveis de temperatura sob o ponto de vista prático, ou seja, sob a ótica da utilização. Referimo-nos a três patamares distintos de influências térmicas, a saber:
28
29
a) a baixos valores de temperatura (na faixa de – 5 °C até 50 °C) e ação por tempo prolon- gado, como no caso dos tanques de estocagem em fábricas, bases e terminais;
b) temperaturas na faixa de 50 a 70 °C, como, por exemplo, em sistemas de alimentação e tanques de armazenamento em veículos, que recebem retorno de combustível não queimado nessa faixa de temperatura, e
c) a temperaturas excessivamente altas (> 90 °C) por curtos espaços de tempo sob pres- são, como no caso da proximidade do motor, como em bicos injetores de sistemas de injeção em motores veiculares, também conhecidas, como em condições de “choque térmico”. (Shober, 2005; Luche, 2008; Atadashi. 2010; Hoshino, 2007; Knothe, 2005; Knothe; 2006).
No presente trabalho concentraremo-nos no primeiro caso de ausência de choque térmico, envolvendo simulações de estocagem em fábricas, bases e terminais.
Relatório alentador emitido pela Rede Brasileira de Tecnologia do Biodiesel em parceria com a ANFAVEA (MCTI, 2009), liberou sob o ponto de vista técnico a utilização de mistura B5. Destacou que 5% de biodiesel poderiam ser adicionados ao diesel de petróleo sem a necessidade da introdução de alterações nos sistemas de alimentação, injeção e motores de veículos movidos a diesel. Seria pertinente frisar que esse fato é verdade desde que os parâmetros físico-químicos estabelecidos na especificação do biodiesel vigente (ANP, 2012) sejam respeitados não só no mo- mento da produção. A aderência do produto aos parâmetros limites da especificação ao longo de toda a cadeia de comercialização deve ser preservada notadamente nas demais fases de estoca- gem, distribuição e transporte, incluindo-se aí os atos subsequentes de entrega nas distribuidoras, de adição ao diesel e subsequentes operações até o momento de queima da mistura no motor.
O biodiesel é uma denominação genérica para combustível derivado de fontes renováveis, tais como óleos vegetais e gordura animal, com características similares ao diesel de petróleo. Apresenta vantagens como a de reduzir as emissões de CO2 e a contaminação da atmosfera com compostos de enxofre durante sua combustão. Exibe um ponto de fulgor mais alto, o que lhe confe- re manuseio e armazenamento mais seguros, apresentando, ainda, boa lubricidade, não obstante apresentar um teor de enxofre na faixa de 10 ppm (Knothe, 2006). A Agência Nacional de Petróleo, Gás Natural e Biocombustíveis (ANP, 2012), por sua vez, define o biodiesel, com um combustível composto de alquil ésteres de ácidos carboxílicos de cadeia longa, produzido por transesterificação e/ou esterificação de matérias graxas, a partir de gorduras de origem vegetal ou animal. O mesmo deve atender ao regulamento técnico integrante das Resoluções da ANP. Apresenta-se a seguir nas Tabelas 2.1 e 2.2 uma síntese das especificações ASTM e EN/ISO, que deram origem a especifi- cação brasileira ANP. O Regulamento Técnico ANP nº 042/2012, vigente à época da realização do presente trabalho, é resumidamente apresentado na Tabela 2.3.
CAPÍTULO 2: ESTABILIDADE AO ARMAZENAMENTO E VIDA DE PRATELEIRA DE BIODIESEL
ARMAZENAGEM E USO DE BIODIESEL:2
PROBLEMAS ASSOCIADOS E FORMAS DE CONTROLE
Tabela 2.1: Especificação de Biodiesel pelas Normas ASTM D6751 e EN 14214 (ASTM, 2008; EN/ISO, 2008)
MÉTODOS TESTE E LIMITES
CARACTERÍSTICASASTM D6751
Limite
EN 14214
Limite
Densidade a 15 °C (kg/m3)
-
-
EN ISO 3675
860 – 900
Viscosidade Cinemática a 15°C (mm2/s)
D445
1,9 – 6,0
EN ISO 3104
3,5 – 5,0
Número de cetano (min.)
D613
47
EN ISO 5165
51
Ponto de fulgor (°C)
D93
93
EN ISO 3679
101,0
Corrosividade ao Cobre
D130
n° 3 máx.
EN ISO 2160
Classe 1
Ponto de névoa (°C)
D2500
Reportar
-
-
Estabilidade a oxidação a 110 °C (h)
-
-
EN 14112
6
Índice de Acidez (mg KOH/g)
D664
0,50 máx.
EN 14104
0,5 máx.
Índice de Iodo
-
-
EN 14111
120 máx.
Poliinsaturados (P4 ligações dupla)
-
-
EN 14103
1 máx.
Água e sedimentos ( % vol.)
D2709
0,050 máx.
-
-
Teor de água (mg/kg)
-
-
EN ISO 12937
500 máx.
Teor de éster % (m/m)
-
-
EN 14103
96,5 min.
Glicerina livre % (m/m)
D6584
0,020 máx.
EN 14105
0,02
Glicerina total %(m/)
D6584
0,240 máx.
EN 14105
0,25 máx.
Teor de metanol % (m/m)
-
-
EN 14110
0,2 máx.
Teor de monoglicerídeos % (m/m)
-
-
EN 14105
0,8 máx.
Teor de diglicerídeos % (m/m)
-
-
EN 14105
0,2 máx.
Teor de triglicerídeos % (m/m)
-
-
EN 14105
0,2 máx.
Metais alcalinos (Na + K) (mg/kg)
-
-
EN14108
5 máx.
Metais alcalinos terrosos (Ca + Mg)
-
-
EN 14538
5 máx.
Contaminação total (mg/kg)
-
-
EN 12662
24 máx.
Tabela 2.2: Especificação de Biodiesel ANP (ANP, 2012).
	
	
	MÉTODOS TESTES E LIMITES
	
	
	CARACTERÍSTICAS
	LIMITE
	ABNT NBR
	ASTM D
	EN/ISO
	
	
	Aspecto
	L II (1)
	-
	-
	-
	
	
	Massa específica a 20ºC (kg/m³)
	850 a 900
	7148
14065
	1298
4052
	EN ISO 3675
EN ISO 12185
	
	
	Viscosidade cinemática 40ºC (mm²/s)
	3,0 a 6,0
	10441
	445
	EN ISO 3104
	
	
	Teor de água (mg/kg))
	(2)
	-
	6304
	EN ISO 12937
	
	
	Contaminação total (mg/kg)
	Max. 24
	15995
	-
	EN ISO 12662
	
	
	Ponto de fulgor, (3)
	Min. 100
	14598
	93
	EN ISO 3679
	
	
	Teor de éster (%m/m)
	Mín. 96,5
	15764
	-
	EN 14103
	
	
	Resíduo de carbono (%m/m) (4)
	Max. 0,050
	15586
	4530
	-
	
	
	Cinzas sulfatadas (%m/m)
	Máx. 0,020
	6294
	874
	EN ISO 3987
	
	
	Enxofre total (mg/kg)
	Máx. 10
	15867
	5453
	EN ISO 20846
EN ISO 20884
	
	
	
Sódio + Potássio (mg/kg)
	
Max. 5
	15553
15554
15555
15556
	
-
	EN 14108
EN 14109
EN 14538
	
	Cálcio + Magnésio (mg/kg)
	Máx. 5
	15553
15556
	-
	EN 14538
	Teor de fósforo (mg/kg)
	Max. 10
	15553
	4951
	EN 14107
	Corrosividade ao cobre (3h a 50ºC)
	Máx. 1
	14359
	130
	EN ISO 2160
	Número de cetano (5)
	Anotar
	-
	613 / 6890 (6)
	EN ISO 5165
	Ponto de entupimento de filtro a frio (ºC)
	(7)
	14747
	6371
	EN 116
	Índice de acidez (mgKOH/g)
	Max. 0,50
	14448
	664
	EN 14104 (8)
	Glicerina livre (% m/m)
	Max. 0,02
	15341 (8)
15771
	6584 (8)
	EN 14105 (8)EN
14106 (8)
Tabela 2.2: Especificação de Biodiesel ANP (cont.) (ANP, 2012)CARACTERÍSTICAS
LIMITES
MÉTODOS TESTES
	ABNT NBR
	ASTM D
	EN/ISO
	Glicerina total (% m/m) (9)
	Max. 0,25
	15344 / 15908
	6594 (8)
	EN 14105 (8)
	Monoacilglicerol (%m/m) (4)
	Max. 0,80
	15342 (8); 15344
15908
	6584 (8)
	EN 14105 (8)
	Diacilglicerol (%m/m)
	Max. 0,20
	15342 (8); 15344
15908
	6584 (8)
	EN 14105 (8)
	Triacilglicerol (%m/m)
	Max. 0,20
	15342 (8); 15344
15908
	6584 (8)
	EN 14105 (8)
	Metanol e/ou Etanol (% m/m)
	Max. 0,20
	15343
	-
	EN 14110 (8)
	Índice de iodo (g/100g)
	Anotar
	-
	-
	EN 14111 (8)
	Estabilidade à oxidação a 110 ºC, (h) (10)
	Mín. 6
	-
	-
	EN 14112 e EN 15751 (8)
Nota:
(1) Límpido e isento de impurezas, com anotação da temperatura de ensaio.
(2) Será admitido o limite de 380 mg/kg 60 dias após a publicação da Resolução. A partir de 1º de janeiro de 2013 até 31 de dezembro de 2013 será admitido o limite máximo de 350 mg/kg e a partir de 1º de janeiro de 2014, o limite máximo será de 200 mg/kg.
(3) Quando a análise de ponto de fulgor resultar em valor superior a 130º C, fica dispensada a análise de teor de metanol ou etanol.
(4) O resíduo deve ser avaliado em 100% da amostra.
(5) Estas características devem ser analisadas em conjunto com as demais constantes da tabela de especificação a cada trimestre civil. Os resultados devem ser enviados à ANP pelo Produtor de biodiesel, tomando uma amostra do biodiesel comercializado no trimestre e, em caso de neste período haver mudança de tipo de material graxo, o Produtor deverá analisar número de amostras correspondente aonúmero de tipos de materiais graxos utilizados.
(6) O método ASTM D6890 poderá ser utilizado como método alternativo para determinação do número de cetano.
(7) Limites varáveis conforme a época do ano e a região do país (consultar referencia [1]). No caso do Rio de Janeiro onde foi conduzido o presente trabalho entre outubro e dezembro de 2013 o limite máximo de o PEFF foi estabelecido em 14 ºC. Para os estados não contemplados na tabela o ponto de entupimento a frio permanecerá 19ºC.
(8) Os métodos referenciados demandam validação para os materiais graxos não previstos no método e rota de produção etílica.
(9) Poderá ser determinado pelos métodos ABNT NBR 15908, ABNT NBR 15344, ASTM D6584 ou EN14105, sendo aplicável o limite de 0,25% em massa. Para biodiesel oriundo de material graxo predominantemente láurico, deve ser utilizado método ABNT NBR 15908 ou ABNT NBR 15344, sendo aplicável o limite de 0,30% em massa.
(10) O limite estabelecido deverá ser atendido em toda a cadeia de abastecimento do combustível.
CAPÍTULO 2: ESTABILIDADE AO ARMAZENAMENTO E VIDA DE PRATELEIRA DE BIODIESEL
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ARMAZENAGEM E USO DE BIODIESEL:2
PROBLEMAS ASSOCIADOS E FORMAS DE CONTROLE
Ao contrário dos hidrocarbonetos de origem fóssil, que são relativamente inertes e mantém as suas características físico-químicas praticamente inalteradas por longos períodos de estocagem, o biodiesel degrada com o tempo, notadamente em ambientes aerados e climas quentes e úmidos como os que prevalecem no Brasil (Cavalcanti, 2012). Destaque deve ser dado a umidade do ar que tende a induzir a incorporação de água dissolvida no biodiesel face a sua elevada higroscopicidade. Com efeito, verifica-se o estabelecimento de processos de degradação hidrolítica na massa de bio- diesel armazenado com sérias consequências para o usuário final. A água pode estar presente da forma dissolvida ou livre (Knothe, 2006). Enquanto o diesel de petróleo pode absorver cerca de 50 ppm de água dissolvida, o biodiesel pode absorver cerca de 1500 ppm (Schumacher, 2002). A incor- poração de água dissolvida em excesso tende a promover, liberação de radicais livres, a hidrólise dos ácidos graxos de cadeia longa presentes, que também causam o aumento da acidez do produto (Knothe, 2006). Como consequência, podemos observar ataques a materiais metálicos (corrosão) e a degradação de materiais poliméricos, falhas prematuras em sistemas de injeção e a formação de produtos de corrosão, sedimentos e ferrugem, que podem levar a entupimentos e dedução da eficiência de filtragem (Gerpen, 2006).
Cabe salientar que em situações críticas de crescente incorporação de água ao biodiesel, pode-se observar a sua saturação e o aparecimento de água livre nas paredes e no fundo da tanca- gem. Esse quarto tipo de instabilidade, a exemplo do caso do diesel, pode favorecer a proliferação de fungos, bem como a acidulação da água presente no fundo do tanque, também denominada água de lastro, estimulando os processos de corrosão induzida por microrganismos ou biocorrosão. Constata-se também a formação de biomassa na interface óleo-água comumente denominada de borra microbiana.
Com respeito ao processo degradativo de oxidação, podemos defini-lo como a interação das moléculas do oxigênio com as cadeias de ácidos graxos presentes no biodiesel (Toshino, 2007). A exemplo da manteiga, que rancifica à temperatura ambiente, o biodiesel tende a oxidar-se em maior ou menor grau, em função da presença de ligações duplas nas cadeias das matérias-primas que lhes dão origem, dependendo fortemente do grau de insaturação dos ácidos graxos presentes (Knothe, 2006). A sua propensão a sofrer oxidação - também conhecida como rancificação oxidati- va, ou envelhecimento, causam a deterioração eventual do combustível, associada à presença das espécies formadas durante o processo, que exibe características auto-catalíticas (Knothe, 2006). Trata-se de processo que se desenrola em três fases: iniciação, propagação e terminação. Cons- tata-se, ao longo desse processo, a liberação de radicais livres, a formação de hidroperóxidos, relativamente instáveis, que se decompõem, promovendo a elevação da acidez. Em sua fase ter- minal verifica-se a produção de oligômeros. Com efeito pode-se verificar o crescimento da acidez, o escurecimento de determinados tipos de biodiesel e o desenvolvimento de odor. A última etapa de formação de polímeros, a exemplo das demais etapas, é extremamente indesejável. Apesar de exibirem características polares, ou seja, solúveis no biodiesel, os mesmos tornam-se insolúveis quando misturados ao diesel de petróleo, constatando-se a formação de produtos escuros sob a forma de gomas, também denominadas de borras abióticas, responsáveis por entupimentos, com grandes implicações para a garantia da qualidade do produto até o momento da sua adição ao die- sel na refinaria ou na distribuidora, e a sua queima derradeira no motor do veículo.
Tomemos por exemplo o caso do óleo de soja, que é a matéria prima mais utilizada no país para a produção de biodiesel. Esse óleo contém onze tipos de ácidos graxos em sua composição. Dentre estes predominam 4 tipos de cadeias carbônicas (> que 50%) com 18 átomos de carbono, como os ácidos graxos esteárico (18:0), oléico (18:1), linoléico (18:2) e linolênico (18:3), que é base hoje para cerca de 77 % do biodiesel metílico hoje produzido no Brasil. Os algarismos 0, 1, 2 e 3 denotam o número de insaturações (duplas ligações) existentes na cadeia. Cabe salientar que o processo de transesterificação que converte este óleo em biodiesel carrega essas cadeias carbôni- cas para o produto final. Essas duplas ligações, na realidade, atuam com sítios de desestabilização da molécula, ou seja, como um portão de entrada para a ação devastadora do oxigênio. Enquanto o ácido graxo esteárico é imune a oxidação, por ser ricamente saturado (ácido este que predomina, na composição do biodiesel de sebo, por exemplo), os ácidos insaturados que predominam na com- posição do óleo de soja exibem taxas elevadíssimas de oxidação (Knothe, 2006). Convém destacar que tais ácidos graxos como o linoléico e linolênico exibem respectivamente taxas de oxidação 41 e 98 vezes mais intensas do que a do ácido oléico (Frankel, 1998). Por conseguinte, tanto o biodiesel metílico de soja como o de algodão, igualmente rico em ácidos insaturados, são os produtos exis- tentes no mercado brasileiro, extremamente susceptíveis a oxidação.
As perdas de estabilidade até o presente relatadas são típicas em ambientes úmidos e temperados. Mas é na operação a baixas temperaturas que se verifica um quinto tipo de perda de estabilidade. Referimo-nos aos processos de perda de fluidez, em decorrência da nucleação de cristais, abaixo de determinadas temperaturas, que se aglomeram notadamente no caso dos tipos de biodiesel, ricos em saturações, como o biodiesel de sebo e o de dendê. A sua propensação a solidificação a baixas temperaturas resulta na redução da sua fluidez, notadamente em condições extremas como as de inverno observadas na Região Sul e tendem a promover entupimentos em filtros e solidificação de carregamentos em caminhões-tanque, bem como no fundo dos tanques de armazenamento.
O estudo da capacidade de absorção de água pelo biodiesel ao longo do tempo reveste-se de grande importância em face a sua elevada higroscopicidade. Enquanto o diesel é extremamente estável, o biodiesel incorpora água a sua molécula com facilidade. Com efeito, face a sua elevada higroscopicidade, o biodiesel pode transformar-se em produto fora da especificação durante a esto- cagem (Hoshino, 2007). Cabe ressaltar que o limite máximo de teor de água à época da realização do presente estudo era de 350 ppm.
Estudos conduzidos pelo CENPES/PETROBRAS (Vieira, 2006) revelam que o biodiesel metílico apresenta sistematicamente uma elevada maior capacidade de absorver umidade do que biodiesel etílico e que via de regra o biodiesel de mamona incorpora mais água do que o de soja. Os autores recomendavam que um bom acompanhamento da evoluçãodo teor de água deveria ser conduzido até momentos antes de adição do biodiesel ao diesel. Estudos conduzidos pelo INT também sinalizam a vida de prateleira reduzida do biodiesel de soja (Cavalcanti, 2012).
CAPÍTULO 2: ESTABILIDADE AO ARMAZENAMENTO E VIDA DE PRATELEIRA DE BIODIESEL
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ARMAZENAGEM E USO DE BIODIESEL:2
PROBLEMAS ASSOCIADOS E FORMAS DE CONTROLE
Destaca-se também que a medida em que se eleva o teor de água dissolvida no biodiesel é constatada uma leve elevação da sua acidez. Isso pode incorrer no incremento da sua corrosi- vidade em relação aos materiais metálicos, como o aço, e a elevação do poder de detergência do biodiesel, no tocante a materiais poliméricos. Estudos conduzido pela UFRGS em parceria com o INT destacam esse aspecto para o caso de biodiesel metílico de soja armazenado em recipientes de aço (Zimmer, 2012). Ou seja, a hidrólise do biodiesel tende a interferir não somente nas suas próprias características físicas e físico-químicas, mas também pode afetar a integridade e a estabi- lidade dos materiais que estão em contato com esse bicombustível, tais como materiais metálicos e poliméricos presentes em peças de automóvel e em estruturas de armazenamento.
Interessante notar que quase a totalidade das publicações científicas sobre estabilidade ao armazenamento observadas na literatura versam sobre variedades de biodiesel de procedência externa, como de colza (Mittelbach, 2001). Os mesmos restringem-se as condições de estocagem do hemisfério norte. São poucos os trabalhos que retratam o perfil oxidativo e a estabilidade ao armazenamento do biodiesel nacional e sob condições climáticas nacionais.
Tais preocupações afligem não só a comunidade científica e tecnológica, produtores, gran- des compradores, distribuidoras, bem como a ANP, o SINDICOM, a FECOMBUSTÍVEIS, que tam- bém manifestaram as suas inquietações tão logo a mistura B5 foi tornada obrigatória em 2010. Nesse sentido, cabe destacar o trabalho desenvolvido pelo INT, publicado em Workshop promovi- do pela EMBRAPA, que revelou que cerca de 25% dos carregamentos de biodiesel chegavam ao seu destino nas distribuidoras, fora da especificação (Cavalcanti, 2012).
Com efeito, a estabilidade ao armazenamento torna-se preocupante quando o biodiesel é armazenado por um longo tempo. Referimo-nos a grandes volumes que permanecem estoca- dos por longos períodos em ambientes fechados, semi-fechados e atmosféricos - com válvulas de alívio apenas, ou eventualmente abertas para operações de abastecimento. Estas condições caracterizam-se pela presença de ar, umidade e de variações de temperatura na faixa de – 5 °C até 49 °C. Caracterizam-se também pela ausência de choques térmicos – como os encontrados nas proximidades dos motores veiculares e estacionários, processo de instabilidades que será discutido na continuação do presente trabalho.
A mudança na composição e a perda de aderência às especificações é provavelmente uma das primeiras preocupações desses problemas associados, decorrentes da extensão de exposição ou contato com o ar atmosférico. Além disso, estabilidade no armazenamento pode ser influenciada também pelo efeito da temperatura, da exposição à luz solar, bem como quando o biodiesel é colo- cado em contato com superfícies de ligas metálicas, ricas em metais de transição, tais como o cobre e o zinco (Yang, 2013; Bondioli, 2003). Mudanças operacionais em containeres de armazenamento, operações de carregamento em condições climáticas adversas, como por exemplo, em condições de umidade relativa elevada, e a natureza do fluxo no abastecimento, também podem influenciar o comportamento do biodiesel (Leung, 2006).
Com base na literatura internacional consultada, tem sido reportado o caso do biodiesel de colza, que domina o mercado europeu, que exibe elevada propensão a sofrer oxidação. Com efeito, devido a sua considerável tendência à perda de estabilidade ao longo da estocagem, não é reco- mendada a sua adição ao diesel, após de seis meses armazenados (Mittelbach, 2001).
Com o intuito de minimizar estes problemas, existem no mercado aditivos antioxidantes, originalmente desenvolvidos para produtos alimentícios. Tais aditivos são capazes de inibir os pro- cessos de degradação oxidativa e não de extingui-los por completo. Tratam-se de produtos que se oxidam preferencialmente ao biodiesel, retardando o processo, que serão discutidos no Capítulo 3. Os principais aditivos existentes no mercado são produtos antioxidantes sintéticos importados e de elevado custo como o α-tocoferol, o butilhidrotolueno (BHT) o terbutilhidroquinona(TBHQ), o hidro- xianbisolbutilado (BHA), o pirogalol (PY) e o propilgalato (PG) (Shober, 2004).
Relatos internacionais destacam alterações em algumas propriedades do biodiesel e ao longo do tempo de armazenamento. As principais propriedades que se alteram são: o teor de água dissolvida (TAD), o índice de acidez (IA), índice de peróxidos (IP), período de indução (PI) ou índice de estabilidade oxidativa (IEO), ponto de ignição, índice de iodo (IO), a densidade (ME), a viscosi- dade cinemática (VC), dentre outras (Mitlebach, 2001; Leung, 2006; Schober 2004; Ashraful, 2014).
As principais propriedades do biodiesel sensíveis à incidência de processos degenerativos de origem abiótica (hidrolítica e oxidativa) passíveis de sofrer significativas alterações ao longo da estocagem, bem como os limites reportados para o armazenamento do biodiesel de soja e o efeito do contato com metais, são apresentadas nas Tabelas 2.3, 2.4 e 2.5, com base na literatura con- sultada.
Verifica-se que a duração aceitável de estocagem do biodiesel de soja pode variar de 6 e 14 semanas, dependendo obviamente das condições de exposição ao intemperismo. Já para os mais variados tipos de biodiesel comercializados no mercado internacional a duração aceitável de estocagem pode variar de 1 a 12 meses.
No caso brasileiro o biodiesel de soja, as blendas soja/sebo e de sebo dominam o nosso mercado. Procurou-se, portanto, examinar essa questão no presente trabalho e definir a vida de prateleira desses três tipos mais comuns de biodiesel metílico nacional em condições reais de es- tocagem em recipientes de aço.
CAPÍTULO 2: ESTABILIDADE AO ARMAZENAMENTO E VIDA DE PRATELEIRA DE BIODIESEL
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ARMAZENAGEM E USO DE BIODIESEL:2
PROBLEMAS ASSOCIADOS E FORMAS DE CONTROLE
Tabela 2.3: Principais propriedades do biodiesel com impacto na sua estabilidade
	Propriedades do Biodiesel
	Critério de Indicação
	Período de Indução (PI) ou Índice de Estabilidade
Oxidativa (IEO)
	Traduz a reserva antioxidante ainda existente no biodiesel; reflete também o tempo de propagação do processo de oxidação e é determinado através do ensaio de oxidação acelerada. Valor baixo de PI ou IEO indica baixa resistência à estabilidade oxidativa. Biodieseis ricos em ácidos saturados resistem positi- vamente aos processos de oxidação
	Índice de Acidez (IA)
	Alto valor de IA, alta formação de produtos ácidos por oxidação e/ou hidrólise.
	Índice de Peróxido (IP)
	Reflete o progresso da oxidação e indica a formação de produtos de oxidação secundários. Alto valor de IP reflete alta taxa de formação de peróxidos.
	Índice de Iodo (IO)
	IO mede o nível de insaturação em compostos orgânicos do biodiesel. Baixo índice de iodo reflete baixo grau de insaturação.
	Densidade (D) e
Viscosidade(V)
	Alguns autores destacam como resultado dos processos de oxidação em sua fase final, o aumento da densidade e também resultando em elevação da viscosidade. Em sua fase final oligômeros podem ser observados contribuindo dessa forma para a elevação dos valores dessas propriedades
	Teor de água dissolvida
	Indica a extensão de degradação hidrolítica que o biodiesel pode sofrer, pro- movendo a geração de radicais livres ácidos
Tabela 2.4: Limites de estocagem do biodiesel de soja
	Tipos de biodiesel
	Período estocado
	Propriedade medida e mudanças
	Limite de estocagem: baseado na medição das características estabilidade de propriedades
	Biodiesel de Soja
	3,5 anos
	PI ↓
	14semanas
	Biodiesel de Soja
	10 meses
	PI ↓
	6 semanas
Tabela 2.5: Efeito do contato de diferentes biodieseis com diferentes tipos de metal e ligas
	Tipos de biodiesel
	Estado físico do metal exposto
	Propriedade medida e mudanças
	Influência relativa do metal na degradação
	Biodiesel de Soja
	Folhas metálicas
	Composição↓
	Aço carbono
	Biodiesel de Soja
	Cupons metálicos
	PI ↓ IA ↑
	Aço carbono e aço galvanizado
	Biodiesel de Sebo
	Recipientes metálicos
	IP ↑ PI ↓
	Cu >Ni> Fe
2.2 Objetivos
O presente estudo teve como objetivo principal avaliar a estabilidade ao armazenamento de três diferentes biodieseis metílicos característicos de comercialização no mercado nacional, sendo o primeiro 100% soja (A), o segundo constituído por 65% de soja e 35% de sebo (B) e o terceiro composto por 100% sebo (C). Objetivou-se também a determinação da vida de prateleira dos bio- dieseis em estudo, após um período prévio de 60 dias em que foram mantidos hermeticamente fechados nas bombonas de origem, ou seja, na condição de como enviados pelos seus fabricantes, permanecendo dessa forma no laboratório com temperatura controlada até o momento da sua es- tocagem por 90 dias.
2.3 Metodologia
2.3.1 Caracterização prévia dos diferentes tipos de biodiesel estudados e montagem dos ensaios de vida de prateleira
Conforme enunciado anteriormente, o comportamento ao longo do tempo de estocagem dos biodieseis metílicos 100% soja (A), 65% soja e 35% de sebo (B), e o biodiesel integralmente de sebo (C) foi monitorado. Os mesmos foram enviados pelos fabricantes em bombonas de polietileno de alta densidade (PEAD) preenchidas até a boca e lacradas. Passados 60 dias nessas condições herméticas de estocagem das bombonas no laboratório, as mesmas foram abertas e envasados nos recipientes de aço. Paralelamente, amostras foram colhidas e enviadas para análises de ca- racterização, denominadas de amostras tempo 0, nos laboratórios, do LACOR-INT, LACOL-INT e LABIO-PUC-RIO, com o intuito de verificar se os biodieseis ainda se encontravam em conformidade com os parâmetros estabelecidos pela ANP, 60 dias após o recebimento no INT.
Esses 60 dias prévios à estocagem em aço foram estabelecidos com base nas informações repassadas pelos especialistas do mercado de distribuição. Foram informados casos em que a adi- ção de biodiesel ao diesel se dava após um máximo 60 dias de fabricação pelos produtores. Isso foi constatado notadamente em regiões em que as bases de recebimento e de distribuição se encon- travam a grandes distâncias do centros produtores (e.g. regiões norte e nordeste). Durante os 90 dias de armazenamento 800 mL dos mesmos foram mantidos em recipientes de aço-carbono sob condições abrigadas expostas ao calor e umidade. Cada biodiesel foi adicionado em dois conjuntos de quatro recipientes de 1L constituídos de aço-carbono AISI 1020 (observando-se, portanto um “head-space” de 80%). Foram utilizadas tampas rosqueadas com 1 polegada de diâmetro contendo telas de proteção de aço inoxidável com malha de 0,8 mm, a fim de permitir somente a entrada de umidade e não de impurezas externas, conforme indicado na conforme Figura 2.1. Procurou-se re- tratar a situação mais crítica de estocagem em que tanques atmosféricos são comumente utilizados. Utilizaram-se recipientes em triplicata, para cada remoção periódica mensal. Dada à susceptibili- dade à corrosão atmosférica nas paredes internas destes recipientes, um processo de jateamento
prévio das partes internas dos mesmos foi realizado de acordo com procedimento do LACOR-INT.
	
	
	
	(a)
	(b)
	(c)
Figura 2.1: Imagens dos recipientes de aço carbono AISI 1020 utilizados para armazenar os biodieseis: (a) superfície externa pintada; (b) superfície interna jateada; (c) tampa rosqueada com tela de proteção.
CAPÍTULO 2: ESTABILIDADE AO ARMAZENAMENTO E VIDA DE PRATELEIRA DE BIODIESEL
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PROBLEMAS ASSOCIADOS E FORMAS DE CONTROLE
Durante o período de ensaio, os tanques permaneceram em um corredor das dependências do LACOR-INT, próximos à janela para que ficassem expostos às condições ambientais externas de calor e umidade, conforme ilustrado na Figura 2.2. Ao longo de 90 dias foi portanto realizado o monitoramento mensal de seis características físico-químicas (itens 2.3.3.1 a 2.3.3.6), conforme metodologia aplicada pelo laboratório em estudos anteriores (Cavalcanti, 2009: Zimmer, 2012).
Figura 2.2 Conjunto de recipientes de aço carbono AISI 1020, contendo biodiesel expostos a 90 dias de armazenamento nas instalações do INT. Foto: os autores, 2014.
2.3.2 Monitoramento da temperatura e umidade relativa
A temperatura ambiente e a umidade relativa externa aos reci- pientes foram monitoradas de duas formas distintas. A primeira, coletada manualmente com a ajuda de um aparelho termo hi- grômetro digital três vezes ao dia. A segunda, consistiu em ex- trair os dados adquiridos através de medições programadas no intervalo de 4 horas ao longo do dia por um sistema de monito- ramento automático e de um software denominado MASTER- LOGGER. Este era constituído de um aquisitor de dados, um sensor de temperatura e umidade ambientes externos; um sen- sor de temperatura e umidade tanque; e de um termopar de isolação mineral reto com cabeçote mini tipo “J”, conforme re- presentado na Figura 2.3.
Figura 2.3: Sistema automatizado de monitoramento da temperatura e umidade. Foto: os autores, 2014
2.3.3 Principais Propriedades Monitoradas
2.3.3.1 Aspecto/Aparência
No tocante à determinação do aspecto, foi adotado o método de análise visual estabelecido pela ANP. Já a aparência foi determinada seguindo método descrito na norma ABNT NBR 16048 – Biodiesel: Determinação da aparência (ABNT, 2012), cuja avaliação consistiu em observar o nível de turbidez e a presença de impurezas nas mesmas a uma temperatura de 26 ºC mais ou menos
1 ºC. Foi utilizada uma carta-padrão de classificação da turbidez - ver Figura 2.3 a seguir ASTM D 4176 – Standard test method for free water and particulate contamination in destillate fuels (visual inspection procedures).
Figura 2.4: Fotografia-padrão de um biodiesel límpido e isento de impurezas (LII). Foto: os autores, 2014
- Ensaio realizado no LACOR-INT.
2.3.3.2. Massa Específica a 20 ºC
A massa específica foi determinada mensalmente a 20 °C, sendo utilizado o método de acordo com a norma ASTM D 4052 - Density and relative density of liquids by digital density meter. O equipamento usado foi o Densímetro Digital ANTON PAAR, modelo DMA 5000.
Figura 2.5: Densímetro digital utilizado pelo LACOR-INT. Foto: os autores, 2014.
- Ensaio realizado no LACOR - INT.
2.3.3.3 Viscosidade Cinemática a 40 ºC
A viscosidade cinemática a 40 °C foi também monitorada men- salmente. O método adotado foi o preconizado pela norma ABNT NBR 10441 - Produtos de petróleo - Líquidos transparentes e opacos - Determinação da viscosidade cinemática e cálculo da viscosidade dinâmica. Utilizou-se como um conjunto de viscosí- metros Cannon Fenske, cronômetros calibrados com resolução de 0,01s, banho termostático, termômetro calibrado com subdi- visão de ± 0,05 °C, conforme ilustrado na Figura 2.6 e uma bom- ba a vácuo manual.
Figura 2.6: Sistema de medição da Viscosidade Cinemática a 40ºC. Foto: os autores, 2014.
- Ensaio realizado no LACOR – INT.
CAPÍTULO 2: ESTABILIDADE AO ARMAZENAMENTO E VIDA DE PRATELEIRA DE BIODIESEL
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PROBLEMAS ASSOCIADOS E FORMAS DE CONTROLE
2.3.3.4 Teor de Água Dissolvida (TAD)
O monitoramento mensal do teor de água foi efetuado através do método Karl Fischer Coulométrico, sendo observada a norma ASTM D 6304 - Standard Test Method for Determination of Water in Petroleum Products, Lubricating Oils, and Additives by Coulometric Karl Fischer Titration. O equipamento usado foi o Titulador de Karl Fischer METROHM (modelo 756 KF) com auxílio de uma balança analítica Mettler XP-205 de 0,1 mg de resolução, conforme indicado na Figura 2.7.
Figura 2.7: Equipamento

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