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UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO GRANDE DO NORTE CENTRO DE EDUCAÇÃO DEPARTAMENTO DE FUNDAMENTOS E POLÍTICAS DA EDUCAÇÃO CURSO DE PEDAGOGIA NADIANE MARIA DA SILVA TIBÚRCIO METODOLOGIAS NO ENSINO DE PSICOLOGIA EDUCACIONAL: PERSPECTIVAS PARA A FORMAÇÃO DE PROFESSORES NATAL-RN 2022 NADIANE MARIA DA SILVA TIBÚRCIO METODOLOGIAS NO ENSINO DE PSICOLOGIA EDUCACIONAL: PERSPECTIVAS PARA A FORMAÇÃO DE PROFESSORES Monografia apresentada ao curso de Graduação em Pedagogia do Centro de Educação da Universidade Federal do Rio Grande do Norte, como parte dos requisitos para obtenção do título de Licenciada em Pedagogia Orientadora: Professora. Dra. Cynara Teixeira Ribeiro. NATAL-RN 2022 Universidade Federal do Rio Grande do Norte - UFRN Sistema de Bibliotecas - SISBI Catalogação de Publicação na Fonte. UFRN - Biblioteca Setorial Moacyr de Góes – CE NADIANE MARIA DA SILVA TIBÚRCIO METODOLOGIAS NO ENSINO DE PSICOLOGIA EDUCACIONAL: PERSPECTIVAS PARA A FORMAÇÃO DE PROFESSORES Monografia apresentada como requisito parcial para obtenção do grau de licenciando no curso de Pedagogia da Universidade Federal do Rio Grande do Norte. Aprovada em: ______/______/______ BANCA EXAMINADORA _________________________________________________ Profa. Dra. Cynara Teixeira Ribeiro Orientadora UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO GRANDE DO NORTE _________________________________________________ Profa. Dra. Géssica Fabiely Fonseca Membro interno UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO GRANDE DO NORTE _________________________________________________ Profa. Dra. Mônica Karina Santos Reis Membro interno UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO GRANDE DO NORTE AGRADECIMENTOS Agradeço, primeiramente, ao meu gracioso Deus pela realização e conclusão dessa monografia. Foi por intermédio dEle que tive toda a força, coragem, dedicação e sabedoria necessária para o processo de construção desse trabalho. Por isso, sem Ele nada do que foi construído seria possível. “Porque dEle, por meio dEle e para Ele são todas as coisas" (Romanos 11.36). Agradeço imensamente à professora Cynara Ribeiro que me ensinou o caminho árduo, porém gratificante, da pesquisa em Educação, e me orientou, apoiou e ensinou durante todo meu percurso formativo. Sua paixão e dedicação à docência me inspiram. Agradeço à professora Géssica Fonseca que me inseriu na pesquisa científica e me fez despertar para o universo acadêmico. Seu entusiasmo e amor pela pesquisa me motivam a continuar lutando todos os dias por uma educação equitativa. Agradeço à professora Mônica Reis por todo incentivo, apoio e ensinamentos. Seus conselhos foram fundamentais para a minha jornada e crescimento acadêmico. Agradeço à minha turma de Pedagogia 2017.2, composta por pessoas incríveis, que me acolheram, ajudaram e apoiaram ao longo de toda a graduação, tornando minhas tardes mais leves e aconchegantes. Para mim, foi um privilégio fazer parte de uma turma tão empática e motivadora. Agradeço também às minhas amigas de graduação Ariadna, Chrislaine, Dayane e Ravena que caminharam junto comigo a jornada enriquecedora da docência. Com elas compartilhei experiências, sonhos, anseios e momentos de muitas risadas. Aprendi muito com cada uma de vocês! Agradeço à minha família que me apoiou em todas as etapas formativas. Em especial à minha mãe, Deuza, que não mediu esforços para investir na minha educação. Agradeço ao meu namorado Mateus por acreditar no meu potencial e me incentivar a seguir em busca dos meus objetivos e sonhos. Você me inspira a ser alguém melhor! Por fim, agradeço à Universidade Federal do Rio Grande do Norte por todo acolhimento e por fornecer tantas oportunidades aos seus alunos. Que prossigamos buscando e lutando por uma educação de qualidade! É pensando criticamente a prática de hoje ou de ontem que se pode melhorar a próxima prática. Paulo Freire RESUMO O presente trabalho tem como objetivo analisar a importância das metodologias adotadas por professores no ensino de Psicologia Educacional na aprendizagem dos estudantes na trajetória formativa dos estudantes de licenciatura. Os construtos deste estudo são baseados nos conceitos de ensino de aprendizagem propostos por Vygotsky (1991) a partir da Psicologia Histórico-Cultural, destacando, principalmente, a interação entre professor, aluno e conhecimento. Trazendo também as contribuições das metodologias na construção dos saberes pedagógicos na formação docente com base nas publicações de Masetto (2011) e Moran (2018). Desse modo, foi realizada uma pesquisa de inspiração etnográfica, mediante observações participantes online em dois componentes curriculares, a saber, Psicologia Educacional II no curso de Licenciatura em Pedagogia e Fundamentos da Psicologia Educacional no curso de Licenciatura em Ciências Biológicas, ambos ofertados na UFRN, no semestre letivo de 2021.2. Adicionalmente, foram aplicados questionários semiestruturados com os estudantes das referidas turmas com intuito de os participantes avaliarem os aspectos mais importantes de suas aprendizagens e experiências com as metodologias adotadas na sala de aula virtual no contexto do Ensino Remoto. Os resultados provenientes das observações participantes online nas turmas permitiram constatar que as metodologias adotadas para o ensino de Psicologia Educacional na formação de professores na UFRN promoveram um ambiente de interação e intercâmbio de ideias que permitiram a articulação entre teoria e prática nos componentes, favorecendo a construção de reflexões e relações aproximadas das teorias psicológicas com a realidade educacional, na perspectiva de promoção de um processo de aprendizagem ativa e significativa na formação inicial. Quanto às avaliações dos estudantes acerca de sua experiência no componente, foi constatado que a didática, as metodologias adotadas, a interação professor-aluno, os materiais e recursos pedagógicos disponibilizados e as discussões teórico-práticas na sala de aula virtual contribuíram substancialmente para as aprendizagens dos licenciandos, ampliando os conhecimentos iniciais sobre a docência. Todavia, a duração do semestre letivo proposto pela UFRN e as limitações do Ensino Remoto foram apontadas pelos licenciandos como aspecto negativo, tendo sido apontado que as aulas online eram exaustivas e desmotivadoras, além de impossibilitar a realização de discussões mais aprofundadas no componente. As conclusões do estudo apontam que o ensino de Psicologia Educacional na formação de professores tem se destacado por sua relevância teórico-prática na promoção de modos de enxergar a realidade educacional através das lentes da ciência, no entanto, ainda é necessário refletir sobre as condições existentes para esse ensino em termos de carga horária, dias e horários destinados, cultura de valorização ou desvalorização da formação voltada à docência, para que assim venha a ser possível superar os entraves de um ensino apressado, enviesado e pouco aprofundado e buscar promover um ensino de Psicologia Educacional capaz de formar profissionais que compreendam e signifiquem as teorias psicológicas na realidade escolar a partir de uma postura ativa e reflexiva em sua prática pedagógica. Palavras-chave: Psicologia Educacional. Metodologias. Formação de professores. ABSTRACT The present work aims to analyze the importance of the methodologies adopted by teachers in the teaching of Educational Psychology in the learning of students in the formative trajectory of undergraduatestudents. The constructs of this study are based on the concepts of teaching and learning proposed by Vygotsky (1991) from Historical-Cultural Psychology, highlighting, mainly, the interaction between teacher, student and knowledge, also bringing the contributions of methodologies in the construction of pedagogical knowledge in educational formation based publications of Masetto (2011) and Moran (2018). Thus, an ethnographic inspiration research was carried out, through online participant observations in two curricular components, that is, Educational Psychology II in the degree course in Pedagogy and Fundamentals of Educational Psychology in the Degree course in Biological Sciences, both offered at UFRN, in the school semester 2021.2. Additionally, semi-structured questionnaires were applied with the students of these classes in order to evaluate the most important aspects of their learning and experiences with the methodologies adopted in the virtual classroom in the context of Remote Teaching. The results from the observations participating online in the classes allowed us to verify that the methodologies adopted for the teaching of Educational Psychology in the education of teachers at UFRN promoted an environment of interaction and exchange of ideas that allowed the articulation between theory and practice in the components, favoring the construction of reflections and approximate relationships of psychological theories with the educational reality, the prospect of promoting an active and meaningful learning process in initial training. As for the students' evaluations about their experience in the component, it was found that didactics, methodologies adopted, teacher- student interaction, pedagogical materials and resources made available and theoretical- practical discussions in the virtual classroom contributed substantially to the learning of undergraduates, expanding initial knowledge about teaching. However, the duration of the academic semester proposed by UFRN and the limitations of Remote Education were pointed out by the undergraduate students’ as a negative aspect, and it was pointed out that the online classes were exhaustive and demotivating, besides making it impossible to conduct further discussions in the component. The conclusions of the study indicate that the teaching of Educational Psychology in educational formation has been highlighted for its theoretical- practical relevance in promoting ways of seeing educational reality through the lens of science, however, it is still necessary to reflect on the existing conditions for this teaching in terms of workload, days and schedules intended, culture of valorization or devaluation of teaching-related training, so that it may be possible to overcome the obstacles of a hasty, biased and little-deepened teaching and seek to promote an educational psychology teaching capable of training professionals who understand and signify psychological theories in the school reality from an active and reflective posture in their pedagogical practice. Keywords: Educational Psychology. Methodologies. Educational formation. LISTA DE SIGLAS AVA Ambientes Virtuais de Aprendizagem FFCL Faculdade de Filosofia, Ciências e Letras PIBIC Programa Institucional de Bolsas de Iniciação Científica SIGAA Sistema Integrado de Gestão de Atividades Acadêmicas TDIC Tecnologias digitais de informação e comunicação UFRN Universidade Federal do Rio Grande do Norte USP Universidade de São Paulo SUMÁRIO 1 INTRODUÇÃO ........................................................................................................ 16 2 PSICOLOGIA E FORMAÇÃO DOCENTE E O ENFOQUE NAS METODOLOGIAS DE ENSINO ........................................................................... 19 2.1 Um breve percurso histórico da Psicologia Educacional no Brasil............................ 19 2.2 O ensino de Psicologia Educacional e o papel das metodologias na formação de professores .................................................................................................................. 25 3 MATERIAL E MÉTODOS ..................................................................................... 32 4 RESULTADOS ......................................................................................................... 37 4.1 Conteúdos programáticos ........................................................................................... 38 4.2 Didática ...................................................................................................................... 41 4.2.1 Metodologias .............................................................................................................. 42 4.2.2 Relação teoria e prática...............................................................................................50 4.2.3 Interações enterpessoais ............................................................................................. 52 4.3 Análise dos questionários: o olhar dos licenciandos....................................................53 5 CONSIDERAÇÕES FINAIS .................................................................................... 56 REFERÊNCIAS......................................................................................................................58 APÊNDICE.............................................................................................................................. 63 Apêndice A: roteiro de observação virtual (diário de bordo) ................................................... 63 Apêndice B: questionário ......................................................................................................... 64 16 1 INTRODUÇÃO Os saberes necessários que constituem à docência, de acordo com Pimenta (1996), fundamentam-se a partir dos saberes do conhecimento, da experiência e da prática pedagógica. Estes, articulam-se ao processo constitutivo da identidade docente, que se dá através da significação dos pressupostos teóricos e das suas experiências profissionais e pedagógicas. Compreendendo, portanto, a relevância de tais saberes para a formação de professores, o presente estudo, apoia-se na essencialidade dos saberes do conhecimento como o conjunto de diversos conhecimentos científicos, destrezas e atitudes que um professor deve possuir em sua atuação profissional. Dentre as ciências que oferecem subsídios e constituem a base da formação docente nos cursos de licenciaturas, está a Psicologia Educacional, definida como uma área da ciência psicológica que se dedica à investigação dos processos de ensino e aprendizagem e desenvolvimento humano, a qual, em diálogo com outras ciências pedagógicas, oferece subsídios necessários para que o ato educativo alcance seus objetivos (GOULART, 2007). No entendimento de Bzuneck (1999, p. 41), consiste também em uma disciplina de formação acadêmica “que apresenta um meio para compreensão da complexa tarefa educacional no contexto da sala de aula”, cuja função é fazer os futuros professores desenvolverem uma perspectiva psicológica útil em sua atuação profissional, isto é, desenvolver modos de ver e compreender a realidade educacional a partir das lentes da ciência, articulando-as à sabedoria da prática (BZUNECK, 1999). O aprofundamento no estudo da Psicologia Educacional ocorreu por intermédio da experiência como monitora voluntária em componentes curriculares da área de Psicologia Educacional, no período de 2019, na Universidade Federal do Rio Grande do Norte (UFRN) e, posteriormente, como bolsista no âmbito no Programa Institucional de Bolsas de Iniciação Científica (PIBIC) na mesma instituição. Por um lado, a experiência na monitoria voluntária proporcionou uma visão mais aproximada da prática pedagógica desenvolvidaem sala de aula no ensino de Psicologia Educacional, tendo sido possível concluir que o uso de metodologias que envolviam diretamente o planejamento e a atuação pedagógica contribuíam na compreensão do aporte teórico do componente e para a construção do saber-fazer dos futuros professores (TIBÚRCIO; FONSECA, 2021). Por sua vez, participando enquanto bolsista de Iniciação Científica de diferentes etapas da realização do projeto de pesquisa “Ensino, aprendizagem e ciclos de vida: concepções de estudantes dos cursos de formação de professores da UFRN e suas implicações para a prática pedagógica”, foi possível 17 compreender melhor a complexidade dessa área e suas relações com a formação e prática docente, na medida em que foram sendo constatadas as articulações intrínsecas entre aprendizagem e desenvolvimento de funções psicológicas, havendo ainda especificidades relativas aos modos de aprender nos diferentes momentos do ciclo vital: infância, adolescência, juventude, idade adulta e velhice. Os resultados provenientes deste projeto de Iniciação Científica apontaram que os conhecimentos psicológicos trazem impactos substanciais no que tange à compreensão dos processos de ensino-aprendizagem, todavia têm sido insuficientes para reestruturar as crenças dos licenciandos advindas de suas experiências de vida (PINTO, 2018). A partir desses resultados começaram a surgir inquietações acerca da importância da prática pedagógica no ensino de Psicologia Educacional na formação inicial de professores, impulsionando a investigação e escrita deste trabalho de conclusão de curso. Pesquisas anteriores apontam diversos desafios que são enfrentados no ensino de Psicologia Educacional no espaço das licenciaturas, entre eles estão: a desarticulação entre teoria e prática; o distanciamento do aporte teórico com a realidade educacional; a ênfase nos conteúdos específicos (COSTA, 2015; LAROCCA, 2007); dificuldades em estabelecer relações interdisciplinares; o excesso de psicologismo na educação; e o desenvolvimento de um ensino apressado, fragmentado e pouco aprofundado bem como uma carga horária insuficiente mediante o conteúdo programático (TIBÚRCIO; RIBEIRO, 2020; CHECCHIA, 2015; PAINI, 2006). Diante disso, urge, pois, a necessidade de pesquisas que se disponham a investigar as práticas de ensino na área de Psicologia Educacional na formação docente. Além disso, compreendendo a necessidade de incluir no escopo dos estudos da Psicologia Educacional as atuais mudanças no cenário educativo, tendo em vista um contexto de Ensino Remoto1 advindo da pandemia pelo novo coronavírus, esta pesquisa pretende responder a seguinte questão: qual a importância das metodologias adotadas por professores no ensino de Psicologia Educacional na aprendizagem dos estudantes de licenciatura em sua trajetória formativa? Desse modo, a presente pesquisa tem como objetivo analisar a importância das metodologias adotadas por professores no ensino de Psicologia Educacional na aprendizagem dos estudantes na trajetória formativa dos estudantes de licenciatura. Na busca de encontrar possíveis respostas à nossa questão de pesquisa, a pesquisa traz como objetivos específicos: compreender o papel das metodologias no ensino de Psicologia Educacional no que tange à facilitação da aprendizagem dos conteúdos dessa área 1 Segundo Garcia et al. (2020) consiste em um formato de escolarização mediado por tecnologias digitais com intuito de manter as condições de distanciamento entre professor e aluno. 18 em cursos de formação inicial de professores; analisar as interações entre concepções, metodologias e demais aspectos da dinâmica do ensino de Psicologia Educacional; e, uma vez que a pesquisa ocorreu em contexto de ensino remoto, refletir sobre os impactos do ensino remoto no fazer docente dos professores de Psicologia Educacional e na formação integral dos estudantes de licenciatura. Para alcance de tais objetivos foi realizada uma pesquisa participante, caracterizada como uma investigação de inspiração etnográfica virtual ou netnográfica (HINE, 2000), que consiste em um estudo detalhado das práticas e relações sociais nos espaços virtuais (MERCADO, 2012). Desse modo, na primeira etapa da pesquisa foi realizada uma observação participante online em dois componentes curriculares, a saber, de Psicologia Educacional II no curso de Licenciatura em Pedagogia e Fundamentos da Psicologia Educacional no curso de Licenciatura em Ciências Biológicas, ambos ofertados na UFRN, no período letivo de 2021.2. Em seguida, foram aplicados questionários semiestruturados com os estudantes de licenciatura das referidas turmas com intuito de os participantes escreverem e expressarem os aspectos mais importantes de suas aprendizagens, destacando as experiências com as metodologias adotadas na sala de aula virtual no contexto do Ensino Remoto. Os construtos desta pesquisa são baseados nos conceitos de ensino e de aprendizagem proposto por Vygotsky (1991), ressaltando, assim, a interação entre professor, aluno e conhecimento. Além disso, o estudo foi subsidiado pelos estudos da última década acerca das contribuições das metodologias na construção dos saberes pedagógicos na formação inicial de professores, em especial as publicações de Masetto (2011) e Moran (2018). A escolha por este aporte teórico justifica-se pelo pressuposto de que o processo formativo é constituído no espaço social e no tempo histórico, na relação entre sujeito e sociedade, compreendendo o papel ativo do sujeito enquanto ser histórico. Desse modo, o trabalho, primeiramente, trará um breve percurso histórico da Psicologia Educacional no Brasil, ressaltando a natureza da relação entre a ciência psicológica e o processo educativo. Em seguida, discutirá as metodologias no ensino de Psicologia Educacional nos cursos de formação inicial de professores, apresentando algumas experiências bem-sucedidas na área, destacando a articulação entre teoria e prática no processo formativo. Na sequência, serão descritos os caminhos metodológicos trilhados para o desenvolvimento da pesquisa. Posteriormente, serão realizadas as análises e discussões das interações entre concepções, metodologias e demais aspectos da dinâmica do ensino de Psicologia Educacional bem como das concepções discentes por meio das respostas obtidas nos questionários. Por fim, assim, serão apresentadas as considerações finais deste estudo. 19 2 PSICOLOGIA E FORMAÇÃO DOCENTE E O ENFOQUE NAS METODOLOGIAS DE ENSINO 2.1 Um breve percurso histórico da Psicologia Educacional no Brasil Investigar um campo científico implica em compreender as delimitações epistemológicas e teóricas subjacentes a cada ciência, bem como seu percurso histórico marcado por interesses políticos, sociais, econômicos e culturais. É com essa perspectiva que o campo da Psicologia Educacional é investigado e analisado neste estudo, aprofundando as complexas relações entre Psicologia e o processo educativo. Primeiramente, é necessário entender que a natureza dessa relação se manifesta a partir de duas dimensões centrais: a primeira trata-se da Psicologia Educacional como um dos fundamentos científicos que subsidia a Educação e a prática pedagógica, sendo considerada uma subárea de conhecimento da Psicologia, “que tem como vocação a produção de saberes relativos ao fenômeno psicológico constituinte do processo educativo” (ANTUNES, 2008, p. 470); e a segunda refere-se à Psicologia Escolar como modalidade de atuação profissional aplicada em contextos educativos no decorrer do processo de escolarização, tendo como objeto a escola (ANTUNES, 2008). Diante disso, compreende-se, pois, que historicamente a Psicologia Educacional e a Psicologia Escolar estão correlacionadas, no entanto, ambas possuem campos de atuação e investigação divergentes. Estas distinções estão vinculadas,sobremaneira, aos objetos de estudo, finalidades e métodos de intervenção e atuação das áreas “que, por sua vez, estão relacionados à visão de homem, de mundo, de sociedade, de educação e de escola e também quanto ao foco de olhar à interface Psicologia e Educação” (BARBOSA; SOUZA, 2012, p. 165). Entretanto, este estudo volta-se especificamente às bases epistemológicas da Psicologia Educacional no Brasil e não entrará nas discussões acerca da Psicologia Escolar. Para tanto, em um primeiro momento, considera-se importante explicitar alguns conceitos que auxiliam na compreensão do escopo da Psicologia Educacional, como: Educação, Escola e Pedagogia. Tais conceitos terão como base os estudos de Antunes (2008), que compreende Educação como prática social humanizadora, intencional, cuja finalidade é transmitir a cultura construída historicamente pela humanidade. O homem não nasce humanizado, mas torna-se humano por seu pertencimento ao mundo histórico-social e pela incorporação desse mundo em si mesmo, processo este para o qual concorre a educação. A historicidade e a sociabilidade são 20 constitutivas do ser humano; a educação é, nesse processo, determinada e determinante (ANTUNES, 2008, p. 469). Essas afirmações permitem entender a natureza em que se delimita o estudo, referente a uma prática social multidisciplinar. No que tange à definição de escola, Antunes (2008) ressalta que é uma instituição gerada pelas necessidades produzidas por sociedades que, por sua complexidade crescente, demandavam formação específica de seus membros. A escola adotou ao longo da história diversas formas, em função das necessidades a que teria que responder, tendo sido, em geral, destinada a uma parcela privilegiada da população, a quem caberia desempenhar funções específicas, articuladas aos interesses dominantes de uma dada sociedade (ANTUNES, 2008, p. 469). No entanto, a autora também afirma que essa instância deve ser compreendida a partir de suas contradições, visto que, atualmente, a escola é considerada uma das instituições fundamentais para a democratização e emancipação da educação, provendo a universalização dos bens culturais construídos historicamente e a efetivação da aprendizagem e desenvolvimento de todos os indivíduos (ANTUNES, 2008). Quanto à Pedagogia, Antunes (2008 p. 470) afirma que pode ser compreendida como “fundamentação, sistematização e organização da prática educativa”, baseando-se em diversas concepções teóricas oriundas da filosofia, sociologia, antropologia e psicologia, as quais estabelecem proposições para ação educativa. Posto isto, iniciamos a análise da história das relações entre Psicologia e Educação no Brasil, a fim de esclarecer melhor a assertiva de Lima (1990, p. 3), segundo a qual estas nem sempre foram harmônicas, na medida em que “[...] a Psicologia tanto assumiu quanto foi considerada portadora de uma autoridade que ultrapassou, evidentemente, os limites de sua competência”. Tal história iniciou-se no Período Colonial, quando emergiram preocupações que articularam educação e fenômeno psicológico, em especial no âmbito da filosofia, da moral, da educação e medicina, fazendo surgir temas como: “aprendizagem, desenvolvimento psicológico, motivação, jogos infantis, controle do comportamento, prêmios e castigos, personalidade, educação feminina e educação indígena” (ANTUNES, 2011, p. 14), os quais paulatinamente tornaram-se objetos de estudo da Psicologia. É válido ressaltar que a maioria das obras produzidas nesta época estavam comprometidas com os interesses metropolitanos e expressavam as mazelas da camada dominante (ANTUNES, 2008). Entretanto, em algumas destas obras houve contradições que 21 se opuseram aos ideais da metrópole, como, por exemplo, a defesa da educação feminina e as críticas relacionadas aos prêmios e castigos como forma de controle do comportamento da criança. Diante disso, muitas das discussões levantadas neste período anteciparam questões e formulações que viriam a ser incorporadas pelos estudos da Psicologia no século XX (ANTUNES, 2011). É importante destacar também que os saberes psicológicos produzidos no século XIX estavam articulados às instituições de ensino superior, secundário e normal, além de algumas instituições de medicina, construídas a partir da chegada da Corte portuguesa no Brasil (ANTUNES, 2011). Os estudos produzidos nas Faculdades de Medicina traziam assuntos educacionais relacionados ao fenômeno psicológico articulados à formação e ao “saneamento físico e moral”, que, nesse contexto, buscavam estabelecer padrões normativos para as condutas nas escolas, com vistas à formação moral e à normalização do comportamento do alunado através da ação repressiva às condutas vistas como perniciosas (ANTUNES, 2011). No que concerne à Educação, as escolas normais, criadas no Brasil na década de 1830, foram os espaços que iniciaram as discussões sobre o processo educativo da criança, destacando temas como aprendizagem, desenvolvimento e metodologias de ensino (ANTUNES, 2008). Mas foi apenas em meados do século XIX que as relações entre Psicologia e Educação começaram a ser mais explícitas, sendo apenas nos anos finais desse século, que as ideias produzidas no âmbito das escolas normais se aproximariam daquilo que, mais tarde, seria denominado de Psicologia Educacional (ANTUNES, 2011). É importante destacar que na última década do século XIX já existiam disciplinas com a denominação de Psicologia no âmbito das escolas normais, as quais tratavam da educação das faculdades psíquicas, estudando temas como inteligência, sensações e vontades, aprendizagem, uso de recompensas e castigos e desenvolvimento psíquico (ANTUNES, 2011). Diante disso, nos anos finais do século XIX e início do século XX, começou um movimento de modernização do Brasil, apoiado principalmente no pensamento liberal. Esse período foi marcado por diversas transformações na sociedade brasileira, em sua estrutura econômica, política e social, como, por exemplo, a consolidação da República e a luta contra a hegemonia do modelo agrário em prol do processo de industrialização (ANTUNES, 2008). Nesse cenário, ganhou força uma nova concepção de sociedade e de homem, as quais tinham que responder às exigências de um novo modelo de produção e relações de trabalho, ficando a cargo da Educação a tarefa de formar esses novos sujeitos por meio de uma pedagogia à altura 22 dos novos tempos, tornando, assim, o escolanovismo2 predominante na Educação brasileira (ANTUNES, 2008). Nesse contexto, surgiram diversos debates sobre a educação no que se refere à difusão da escolaridade para a massa da população, a partir de uma maior sistematização e organização das ideias pedagógicas (ANTUNES, 2008). Com isso, as escolas normais, consideradas lócus de circulação do conhecimento e da cultura escolar, propiciando mudanças de ordem educacional, social e política (SILVA; RODRIGUES, 2018), foram as instâncias responsáveis pela propagação dos princípios da Escola Nova, a fim de formar novos professores e produzir obras e conhecimentos através dos laboratórios de Psicologia (ANTUNES, 2011). Nesta época foram realizadas as Reformas Estaduais de Ensino da década de 1920, que integraram a Psicologia como fundamento científico para as novas práticas educativas, propiciando as condições necessárias para que esta ciência tenha se consolidado como área específica do conhecimento e fosse reconhecida como uma autônoma no Brasil (ANTUNES, 2008). Essa via também possibilitou que os saberes psicológicos produzidos na Europa e Estados Unidos fossem incorporados, paulatinamente, ao pensamento educacional brasileiro (ANTUNES, 2011). A partir do momento em que a Psicologia ganhou autonomia como ciência e área específica do conhecimento, sendo difundida através da Escola Nova, surgiram os primeiros“profissionais da Educação” oriundos principalmente das áreas de Medicina e Direito (CHECCHIA, 2015), além da criação do primeiro laboratório de Psicologia no Brasil, nomeado de Pedagogium e inserido em um centro de produção de conhecimento e estímulo para investigações educacionais, o qual foi planejado por Binet em Paris, com a colaboração de Manoel Bomfim (ANTUNES, 2011). A partir da década de 1930, período caracterizado pela consolidação da Psicologia como área de conhecimento e prática no Brasil, estabeleceram-se, então, pesquisas, publicações, criação de associações e realizações de congressos que impulsionaram a organização do campo de atuação da Psicologia, a qual se desenvolveu a partir da atuação 2 Foi um movimento iniciado pelos pensadores William James, John Dewey e Édouard Claparède, que tinha como proposta um ensino centrado na aprendizagem baseada na experiência e no desenvolvimento autônomo do aluno (BACICH; MORAN, 2018), o qual buscava promover a articulação entre teoria e prática na atuação pedagógica, além de defender que a escola tem um papel integrador e emancipatório na democratização da sociedade. No Brasil, diversos educadores foram influenciados por este movimento, como Lourenço Filho, Anísio Teixeira e Rui Barbosa, o que impulsionou a escrita do Manifesto dos Pioneiros da Educação Nova em 1932 (PIES; WACHS, 2014). O Manifesto, então, propiciou a criação de diversas escolas públicas no Brasil, sendo um marco importante na educação brasileira, por voltar o olhar para a educação de toda a população na perspectiva da promoção de uma educação pública, gratuita e laica (PIES; WACHS, 2014). 23 clínica e a intervenção sobre a organização do trabalho, tendo ainda a Educação como seu principal substrato (ANTUNES, 2011). À vista disso, o ensino de Psicologia em cursos de nível superior foi oficializado, articulando-se estritamente à Educação, nas seções de Filosofia e de Pedagogia da Faculdade de Filosofia, Ciências e Letras (FFCL) da Universidade de São Paulo (USP), na qual já era denominada como Psicologia Educacional (ANTUNES, 2008) e concedida como sustentáculo teórico importante para a didática, metodologia de ensino e fundamento da prática educativa (ANTUNES, 2011). Nesse sentido, o principal fundamento científico que subsidiava a Educação era a Psicologia e, concomitantemente, o principal campo sobre o qual a Psicologia se desenvolvia era o educacional. No entanto, essa relação não foi harmônica nem isenta de críticas, posto que o papel da psicologia na educação acabou por converter-se em um psicologismo exacerbado, o qual, segundo Libâneo (2012, p.156), possui “um enfoque estritamente psicológico [que] ignora o efeito das condições sociais e políticas sobre o comportamento, tornando subjetivos problemas gerados pela estrutura social e econômica”. Além disso, passou a reduzir o processo educativo a apenas uma de suas dimensões, perdendo a sua totalidade e complexidade (ANTUNES, 2011). Desse modo, a partir dos currículos dos cursos Normais e de Pedagogia percebia-se um domínio dos saberes psicológicos em detrimento dos saberes pedagógicos, sendo fator determinante para a Psicologia Educacional direcionar seu olhar para a “criança problema” e seus “problemas de aprendizagem” no processo de escolarização (BARBOSA; SOUZA, 2012). Vale ressaltar, que a utilização dos testes psicológicos também contribuiu para a rotulação de alunos, diagnosticando-os precariamente como “deficientes”, transformando, assim, a escola em um espaço de segregação e de uma educação desigual (ANTUNES, 2011). Diante disso, a Psicologia Educacional, que à época configurava-se como uma ciência elitista e individualista fortemente influenciada por teorias racistas e pressupostos higienistas, baseada na hegemonia do pensamento liberal e no modo capitalista de compreender a realidade (PATTO, 1999), passou a culpabilizar o aluno pelo seu fracasso escolar, isto é, a responsabilizar o indivíduo por questões de ordem social e historicamente produzidas que constituem o processo educativo (PATTO, 1999; CHECCHIA, 2015). No ano de 1962 houve o reconhecimento da profissão do psicólogo pela lei 4119, que também homologou os cursos de formação em Psicologia (ANTUNES, 2011). Em 1968, durante a ditadura militar, a Reforma Universitária ampliou o ensino superior por meio da privatização e instaurou muitos cursos de Psicologia (ANTUNES, 2011). Nesse contexto, a relação entre Psicologia e o processo educativo passou a ser fortemente criticada por 24 educadores e psicólogos em razão da falta de rigor teórico que subsidiasse essa articulação, resultando na incorporação de maneira superficial do conhecimento psicológico no campo pedagógico e na prática educativa (CHECCHIA, 2015). Ademais, a atuação do psicólogo estava relacionada à perspectiva clínica, voltada para o atendimento individual de alunos e seus “problemas de aprendizagens” (CHECCHIA, 2015; ANTUNES, 2008). Em meados da década de 1970, fortaleceram-se às críticas ao psicologismo na Educação e à utilização de testes psicométricos de inteligência que responsabilizava o aluno por seus “problemas de aprendizagem”, sem levar em consideração às condições pedagógicas (CHECCHIA, 2015). Nesse contexto, os conhecimentos científicos psicológicos foram aplicados à Educação com o objetivo de resolver problemas do âmbito educacional. Esta concepção de Psicologia Aplicada à Educação, como afirma Larocca (2007), se consolidou, principalmente, em razão do modus operandi dos cursos de licenciatura ser baseado no modelo racional-técnico, que considera a ação pedagógica como a aplicação linear de princípios e teorias construídos pela ciência. Tais concepções reverberaram no ensino de Psicologia na formação de professores contribuindo para o processo de medicalização da Educação e refletiram para uma visão individualista da Psicologia Educacional, sendo muitas vezes associada e confundida com a Psicologia Escolar. No final do século XX e início do século XXI, as concepções críticas de homem, sociedade e conhecimento foram sendo aprofundadas e compreendidas de modo mais complexo, possibilitando mudanças das práticas tradicionais da Psicologia e, consequentemente, o surgimento de novas práticas comprometidas com as necessidades das camadas populares (ANTUNES, 2011) alicerçadas em concepções que consideram o psiquismo como fenômeno histórico-social, complexo e multideterminado; mais que isso, são formulações teóricas que se baseiam em concepções progressistas de homem e de mundo, condição esta necessária para dar base a uma atuação comprometida com a transformação da realidade educacional na direção de uma educação democrática, igualitária e radicalmente inclusiva (ANTUNES, 2011, p. 29). Assim, a relação entre Psicologia e Educação passou por diversas transformações ao longo da história, tendo a primeira ora se inclinado para atender interesses conservadores e capitalistas, ora se voltado para a contribuição de reflexões revolucionárias e emancipatórias (BARBOSA; SOUZA, 2012). Tal panorama permite um entendimento mais contextualizado da diversidade de perspectivas assumidas pela Psicologia Educacional na formação inicial de professores, em especial das dificuldades ainda existentes relativas à desarticulação entre 25 teoria e prática, o distanciamento da realidade educacional e a ênfase nos conteúdos específicos (COSTA, 2015; LAROCCA, 2007); dificuldades em estabelecer relações interdisciplinares, o excesso de psicologismo na educação e uma carga horária insuficiente mediante o conteúdo programático, tornando-se, assim, muitas vezes, um ensino fragmentado, apressado e pouco aprofundado (TIBÚRCIO; RIBEIRO, 2020; PAINI, 2006). 2.2 O ensino de Psicologia Educacional e o papel das metodologias na formação de professores Segundo Larocca (2007, p. 300), é imprescindívelsalientar a presença da mentalidade racional-técnica no ensino de Psicologia Educacional, a qual é herdeira da visão positivista de conhecimento que se enraizou na década de 70 na formação docente, devido ao modus operandi das licenciaturas ser baseado na aplicação linear dos princípios e leis da investigação científica na resolução de problemas educacionais, na qual adotava uma organização curricular sequencial pautada em “teorias antes” e “práticas depois”, trazendo profundas implicações para o saber-fazer dos professores, promovendo, assim, “dicotomias entre teoria e prática, pensar e fazer, fundamentos, conteúdos e metodologias”. Ademais, esta mentalidade favoreceu a concepção de uma Psicologia aplicada à Educação, que ainda hoje é fortemente difundida nas práticas de formação no ensino superior (BZUNECK, 1999). Essa concepção remete à compreensão historicamente construída segundo a qual a Psicologia Educacional é uma disciplina iminentemente teórica inserida na metáfora tradicional de fundamento, portanto “tratada como um conjunto de conhecimentos a serem aprendidos pelos futuros professores, a título de base para sua atuação profissional” (BZUNECK, 1999, p. 42). Nesse sentido, a concepção de Psicologia como fundamento tem contribuído para um ensino com sérias dificuldades de se articular ao chão da escola. Larocca (2007) afirma que essa é uma das razões pelas quais atualmente o ensino de Psicologia Educacional no espaço das licenciaturas vivencia uma situação artificial, isto é, apenas se aproxima dos problemas educacionais e da prática pedagógica, porém não os vive, de fato, com os estudantes de licenciatura. Desse modo, autores como Bzuneck (1999), Paini (2006), Larocca (2007), Almeida e Azzi (2007), Costa (2015), Checchia (2015) e outros consideram que a Psicologia Educacional deve assumir o papel de uma disciplina teórico-prática, modificando, assim, o seu status na formação inicial de professores, para que desenvolva um trabalho vivo e não artificial, fazendo-se necessário, para tanto, 26 considerar a Psicologia da Educação como uma unidade dialética, cujos pólos estão em contínuo movimento, num ir e vir entre o domínio da ciência Psicologia, que fornece as teorias, e o domínio da Educação, que é a prática social que desejamos ver transformada com a interferência dos professores que se formam nas licenciaturas (LAROCCA, 2007, p. 301). Dessa forma, o ensino de Psicologia Educacional deve contribuir para a construção de uma postura docente mais ativa e reflexiva, a partir da compreensão segundo a qual o professor é um mediador do conhecimento que tem condições de, com sua atuação, propiciar a aprendizagem, consequentemente potencializando o desenvolvimento do educando (VYGOTSKY, 1991), bem como um intelectual transformador da realidade em que vive, baseada em uma perspectiva reflexiva, crítica e emancipatória (FREIRE, 1989). Tal perspectiva ressalta a construção de um ensino que tenha como pilar o processo de ação- reflexão-ação3 (LAROCCA, 2007). Diante disso, Larocca (1996) sugere como diretriz norteadora do ensino de Psicologia Educacional na formação de professores uma tríade constituída a partir dos seguintes elementos: o aluno que o professor tem diante de si; a realidade educacional, escolar e social; e as diferentes contribuições da Psicologia para a Educação. Dessa forma, este ensino deve: pensar o aluno na sua multidimensionalidade humana, reconhecendo-o como sujeito omnilateral em que as subjetividades são construídas em contato com o mundo cultural e social; acentuar o seu vínculo com as demandas da escola e abordar temas ou problemas emergentes da realidade educacional; e dinamizar interlocuções entre os temas e problemas emergentes da realidade educacional e as diferentes interpretações à luz das abordagens teóricas da Psicologia, de maneira a contribuir nas discussões e na resolução de problemas (LAROCCA, 2007). Assim, compreendendo a complexidade em que se apresenta a formação de professores, acrescenta-se aqui mais um elemento norteador que deve ser considerado na organização desse ensino: a construção de uma prática pedagógica que priorize metodologias teórico-práticas no ensino da Psicologia Educacional no espaço das licenciaturas. Essa afirmativa é baseada na perspectiva de Pimenta e Lima (2005/2006), as quais ressaltam que a prática docente e as metodologias adotadas em sala de aula são elementos cruciais na formação inicial de professores, visto que muitos licenciandos aprendem o seu saber-fazer “a 3 Esse processo, como afirma Micheletto e Levandovski (2008), coloca em evidência a contribuição da reflexão crítica no exercício da docência, a partir da qual o professor pode refletir sobre sua própria prática de forma sistemática, orientado pelas concepções teórico-metodológicas que promovem um movimento constante de (re)pensar e problematizar a ação educativa que é desenvolvida em sala de aula. 27 partir da observação, imitação, reprodução e, às vezes, da re-elaboração dos modelos existentes na prática, consagrados como bons” (PIMENTA; LIMA, 2005;2006, p. 7). Nessa dimensão, busca-se hoje superar as problemáticas já conhecidas no ensino de Psicologia Educacional, mas também elevar a qualidade do ensino na formação de professores, incluindo metodologias que permitam maior participação dos licenciandos e promovam articulações mais aproximadas ao contexto educacional. Cabe ressaltar que a adoção de metodologias que dinamizem as estratégias de ensino na sala de aula tem sido uma alternativa para favorecer uma aprendizagem significativa no ensino superior (ANARUMA, 2017) e, no presente estudo, proporemos que tal assertiva também atende às especificidades do ensino de Psicologia Educacional nos cursos de licenciatura. As instituições universitárias têm buscado ampliar os debates sobre o conceito de inovação pedagógica em seu ensino, o qual pode ser compreendido a partir de duas perspectivas que se complementam. A primeira diz respeito a um “conjunto de intervenções, decisões e processos, com certo grau de intencionalidade e sistematização, que trata de modificar atitudes, ideias, culturas, conteúdos, modelos e práticas pedagógicas” (CARBONELL, 2002, p. 19); e a segunda está atrelada, mais especificamente, às demandas e exigências do ensino superior, sendo um “conjunto de alterações que afetam pontos-chave e eixos constitutivos da organização do ensino universitário provocadas por mudanças na sociedade ou por reflexões sobre concepções intrínsecas à missão da Educação Superior” (MASETTO, 2004, p. 197) Essa ideia de inovação na educação universitária fundamenta-se em uma concepção de currículo que contempla conhecimentos, saberes, competências, habilidades, experiências, atitudes e valores que visam não somente à formação de um profissional competente, mas também de um cidadão que possa atuar de maneira contextualizada na sociedade em seu espaço histórico, político, econômico e social (MASETTO, 2011). Ademais, esta formação também abrange a organização da aprendizagem mediante adoção de práticas pedagógicas e metodologias de ensino intencionais, bem como incorpora as mudanças sociais e as atuais exigências do mercado de trabalho (MASETTO, 2011). Nesse sentido, novas propostas e demandas têm sido pensadas para a educação de nível superior, as quais têm permitido o desenvolvimento de novas competências por parte dos docentes, principalmente no que se refere ao ensinar e aprender, contribuindo para a formação de um arsenal de recursos e materiais pedagógicos que podem contemplar também as chamadas metodologias ativas de aprendizagem e as Tecnologias Digitais de Informação e Comunicação (TDICs). É válido ressaltar que o contexto do Ensino Remoto aprofundou ainda 28 mais as demandas existentes e propiciou uma multiplicidade de experiências no contexto educacional(RÊGO et al., 2020). Partindo desses pressupostos, foi possível encontrar, por meio de pesquisa bibliográfica empreendida no Google Acadêmico, algumas experiências bem-sucedidas utilizando diferentes metodologias na prática pedagógica no âmbito do ensino de Psicologia Educacional na formação de professores. Tal pesquisa foi realizada através do recorte temporal dos últimos sete anos (2014 a 2021), em que foram selecionados artigos apenas na língua portuguesa e utilizou-se como procedimento para levantamento a busca de artigos publicados em periódicos ou em congressos científicos a partir dos descritores: ensino de psicologia educacional; metodologias no ensino de psicologia educacional; metodologias ativas no ensino de psicologia educacional; psicologia educacional e tecnologias digitais; psicologia e tecnologia. Desse modo, foram selecionados cinco artigos que envolviam diretamente a descrição de experiências metodológicas no ensino de Psicologia Educacional na formação de professores. É importante ressaltar que todas as experiências selecionadas têm como princípio a articulação entre teoria e prática, dispondo de metodologias em sala de aula que integram práticas de observação dos contextos educacionais, trabalhos de campo, seminários, pôsteres (LAROCCA, 2007), fóruns de discussão (SCORSOLINI-COMIN, 2014), seminários temáticos (VASCONCELOS et al., 2018), mapas conceituais, portifólios com diários de atividades (DOURADO; FRANÇA-CARVALHO, 2019), oficinas pedagógicas, aplicações de testes psicopedagógicos4 (TIBURCIO; FONSECA, 2021), entre outros. Com essa perspectiva, Anaruma (2017) descreve uma experiência na turma de Psicologia Educacional no curso de Licenciatura em Física, cujo objetivo foi ensinar as abordagens inatista, ambientalista e interacionista. A proposta da atividade constou na elaboração de pôsteres contendo as representações das concepções dos licenciandos através de imagens e palavras, sendo dividida em 4 etapas: a primeira foi a organização dos pequenos grupos para a elaboração do pôster, juntamente com a leitura especializada; a segunda, constou na exposição dos pôsteres para apreciação e identificação das concepções; a terceira, foi a realização do debate entre os estudantes com objetivo de identificar as características de cada concepção e as impressões acerca dos pôsteres; e a quarta etapa culminou no encerramento dos trabalhos e das ideias levantadas. A autora conclui afirmando que a 4 Esses testes representam situações experimentais retiradas das obras dos teóricos Piaget, Vygotsky e Wallon para o estudo do desenvolvimento infantil. Na experiência descrita pelas autoras, são aplicados com intuito de elucidar as ideias dos teóricos acerca das noções básicas do pensamento infantil e o desenvolvimento da inteligência e não possuem como foco diagnosticar ou mensurar o nível psicológico das crianças. 29 experiência trouxe contribuições significativas para as aprendizagens dos licenciandos no que tange às abordagens teóricas e suas relações com a prática pedagógica. Ademais, o contato com metodologias que envolvem diretamente a resolução de problemas e que priorize a reflexão dos licenciandos proporcionou uma nova perspectiva para a sala de aula e para o desenvolvimento de uma aprendizagem ativa na atuação profissional dos futuros professores. Outra experiência foi relatada pelas autoras Vasconcelos et al. (2018), desenvolvida na monitoria do curso de Pedagogia no componente de Psicologia Educacional de uma Universidade Estadual da Paraíba. Nesta experiência foi observada a aplicação dos chamados “Seminários temáticos”, que visam a construção do conhecimento por todos os participantes independente do grupo que estejam inseridos ou da temática que estejam abordando, visto que o foco da atividade é a delegação de tarefas e o rodízio entre tais tarefas a cada apresentação, sendo elas: grupo organizador, que tem como responsabilidade fornecer um ambiente propício para a apresentação; grupo expositor, tem a tarefa de organizar uma apresentação criativa a partir de pesquisas sobre a temática visando articulações com a prática pedagógica; grupo questionador, responsável pela elaboração de questões para o debate; grupo debatedor, promove a discussão acerca do tema que foi abordado; e grupo avaliador, que tem como tarefa avaliar os demais grupos a partir dos pontos elencados pela turma. Além disso, ao final das apresentações houve uma autoavaliação da turma para que refletissem sobre suas aprendizagens. As autoras afirmam que os licenciandos reconheceram a importância do uso de metodologias que visem o envolvimento e integração de todos, construindo, assim, autonomia, reflexão e criticidade, além de corroborar para uma aprendizagem colaborativa. Já as autoras Dourado e França-Carvalho (2019) relatam suas experiências na disciplina de Psicologia da Educação em uma turma de Letras/LIBRAS, a qual caracteriza-se como uma turma mista, composta por surdos e ouvintes. A experiência foi conduzida a partir de uma perspectiva de inclusão, tendo sido organizada uma proposta didática a partir de metodologias diferenciadas aguçando a criatividade dos estudantes na construção de suas aprendizagens, utilizando de atividades mais lúdicas e visuais, como: construção de cartazes, a criação de um caderno da compreensão e sugestão para o planejamento pedagógico, atividade de representação da identidade com argila, apresentações de seminários em mobiles com base de cabides utilizando mapas conceituais, além de portifólios com diários de atividades contendo as impressões dos licenciandos acerca das metodologias adotadas. Para as autoras, a experiência permitiu uma inovação da prática docente, ultrapassando o rótulo da Psicologia Educacional ser mais uma disciplina pedagógica obrigatória, impulsionando, assim, para um pensamento reflexivo sobre o processo de ensino e aprendizagem. 30 As autoras Tibúrcio e Fonseca (2021) também relataram uma experiência bem- sucedida realizada na monitoria do componente curricular de Psicologia Educacional II na turma de Pedagogia em uma universidade pública, descrevendo as principais ações e metodologias adotadas na organização do ensino neste componente. Elas realizaram duas atividades principais como avaliação das aprendizagens dos licenciandos: testes psicopedagógicos e oficinas temáticas. A aplicação dos testes psicopedagógicos teve como objetivo permitir, através da observação, a compressão dos aspectos do desenvolvimento cognitivo de crianças em diferentes idades, utilizando de situações experimentais retiradas das obras dos autores Piaget, Vygotsky e Wallon. Desse modo, os testes foram aplicados para elucidar as teorias levantadas por cada teórico acerca do desenvolvimento infantil e não possuíram o enfoque diagnóstico ou classificatório. No que se refere a teoria psicogenética de Piaget, foram aplicados testes de noções lógico-matemáticas que podem indicar o nível que se encontra o pensamento da criança (sensório-motor, pré-operatório, operatório concreto e operatório formal), como, por exemplo, a prova da noção do objeto permanente, a prova da constância da grandeza, a prova da conservação do volume e conservação do comprimento etc. Já para a teoria histórico- cultural de Vygotsky foram aplicados testes com o objetivo de compreender a importância da atenção voluntária na memória, bem como a importância da brincadeira de faz de conta no desenvolvimento da criança, realizando, assim, jogos de atenção voluntária e da memória e brincadeiras espontâneas e mediadas. Quanto à teoria de Wallon, os testes aplicados tinham o intuito de compreender a integração organismo-meio e a relação cognição-afetividade- movimento no desenvolvimento infantil. Vale salientar que após a aplicação e observação dos testes os licenciados registravam suas impressões e aprendizagens em um resumoexpandido, no qual, muitos afirmaram que, a partir desta metodologia, foi possível compreender de maneira teórico- prática o desenvolvimento e pensamento da criança, além de contribuir na interação professor-aluno e no planejamento pedagógico adequado para cada etapa da infância. Já as oficinas pedagógicas tiveram o intuito de aprofundar os estudos acerca das abordagens interacionistas e suas implicações para o campo educacional, possibilitando aos licenciandos experiências com o planejamento pedagógico e a atuação docente. Dessa forma, os licenciandos tinham que planejar uma oficina pedagógica a partir de um tema de interesse e aplicá-la em contexto escolar ou não escolar, fundamentando teoricamente a proposta nas abordagens dos autores interacionistas estudados em sala de aula. As autoras, então, finalizam o relato de experiência afirmando que o uso de metodologias que tem como princípio a 31 relação teoria e prática e busca estabelecer articulações com a realidade escolar corroboram para a constituição do ser docente. Por fim, no que concerne o uso de metodologias apoiadas nas TDIC no ensino de Psicologia Educacional, Scorsolini-Comin (2014) destaca como as mediações pedagógicas nos Ambientes Virtuais de Aprendizagem (AVA) podem ser organizadas através dos fóruns de discussão ou ambientes de bate-papo, os quais devem promover um efetivo contato e compartilhamento de ideias, opiniões e impressões, para que, de fato, seja produzido um espaço interativo. Desse modo, os fóruns devem partir de uma proposição inicial, gerando algum nível de conflito ou discordância entre os educandos, para que estes sintam-se provocados ao debate e defesa de argumentos, possibilitando um ambiente de constante reflexão, interação e aprendizagens. Sendo assim, a literatura disponível tem evidenciado reflexões e perspectivas possíveis para o desenvolvimento de uma proposta didática no ensino de psicologia educacional que traga contribuições significativas para a formação de professores, buscando, principalmente, trazer um novo olhar para o trabalho docente, envolvendo uma atuação pedagógica e metodologias de ensino que estejam fundamentadas nas teorias científicas psicológicas vinculadas a realidade educacional, para que, dessa forma, a Psicologia Educacional conquiste seu status de disciplina teórico-prática e seu caráter dialético na formação inicial de professores. 32 3 MATERIAL E MÉTODOS O presente estudo classifica-se como uma pesquisa exploratória, cujo objetivo é promover maior familiaridade com o problema investigado (GIL, 2010). Considerando esta classificação foram trilhados alguns percursos metodológicos e procedimentos técnicos da pesquisa, sendo eles: pesquisa bibliográfica, pesquisa participante e etnografia virtual ou netnografia. A pesquisa bibliográfica de acordo com Gil (2010), reúne a revisão da literatura de materiais já elaborados e disponíveis em livros, revistas e artigos, sendo eletrônicos ou físicos, na busca de conhecimentos científicos que subsidiem a pesquisa. Este procedimento proporciona ao pesquisador “uma gama de fenômenos muito mais ampla do que aquela que poderia pesquisar diretamente” (GIL, 2010, p. 30). Desse modo, com intuito de aprofundar o embasamento teórico da pesquisa, foi elaborada uma revisão bibliográfica reunindo os principais estudos sobre experiências bem-sucedidas no ensino de Psicologia Educacional na formação inicial de professores com destaque para o uso de metodologias teórico-práticas na atuação docente. No tocante à pesquisa participante, Gil (2010) afirma que é um método de pesquisa que tem como objetivo diminuir as relações hierárquicas, buscando promover interações entre o pesquisador e os membros envolvidos na situação de investigação. Este modelo de pesquisa trata-se, portanto, de uma “investigação efetivada a partir da inserção e na interação do pesquisador ou da pesquisadora no grupo, comunidade ou instituição investigado” (PERUZZO, 2017, p.163), permitindo aos membros envolvidos uma participação ativa no planejamento e condução da pesquisa (GIL, 2010). Nesse sentido, Peruzzo (2017), em seus estudos, elabora uma síntese com o intuito de realizar uma caracterização introdutória de estratégias para a inserção do pesquisador no ambiente de investigação, elencando quatro pressupostos que implicam na pesquisa participante, os quais são: a) Na presença constante do observador no ambiente investigado, para que ele possa “ver as coisas de dentro”. b) No compartilhamento, pelo investigador, das atividades do grupo ou do contexto que está sendo estudado, de modo consistente e sistematizado – ou seja, ele se envolve nas atividades, além de co-vivenciar “interesses e fatos”. c) Na necessidade [...] de o pesquisador “assumir o papel do outro” para poder atingir “o sentido de suas ações”. [...] d) Na necessidade de o pesquisador não só vivenciar o contexto e as atividades, mas possibilitar ao investigado participar da realização da pesquisa cujos resultados revertem em benefício do próprio grupo pesquisado (PERUZZO, 2017, p. 163). 33 O conhecimento de tais pressupostos é essencial para compreender a pesquisa participante e, assim, poder aplicá-la baseada em seus procedimentos e critérios metodológicos, visto que existem diferentes modalidades de pesquisa participante, as quais dependem diretamente da intencionalidade da investigação e da intensidade de participação do pesquisador e dos sujeitos investigados no processo da pesquisa (PERUZZO, 2017). Por conseguinte, para fins específicos deste estudo será adotada a modalidade de pesquisa participante denominada como observação participante. A observação participante consiste em uma abordagem de observação etnográfica em que o observador participa ativamente das atividades de recolha dos dados de análise, sendo necessária a capacidade de adaptação do investigador às diversas situações de investigação (MÓNICO et al., 2017). Segundo Correia (2009, p.31) este método de observação é realizado a partir do “contacto direto, frequente e prolongado do investigador, com os atores sociais, nos seus contextos culturais, sendo o próprio investigador instrumento de pesquisa”. Ademais, é normalmente utilizada como método de investigação em estudos exploratórios, descritivos, etnográficos ou estudos interpretativos (MÓNICO et al., 2017). Nesse sentido, Peruzzo (2017) sistematizou, em seus estudos, as principais características da observação participante, as quais são: a) O pesquisador ou a pesquisadora se insere no grupo pesquisado, participa de suas atividades na condição de observador/a, ou seja, acompanha as situações de vida do ambiente investigado. [...] b) O observador pode ser “revelado” ou “encoberto”, ou seja, o grupo pode ter ou não conhecimento de que está sendo investigado. [...] c) O pesquisador é autônomo no processo de pesquisa. O grupo investigado não interfere nos planos da pesquisa, na definição dos objetivos, nem no tipo de informações registradas e nas interpretações dadas ao que for observado. (PERUZZO, 2017, p. 170). Nessa direção, a observação participante foi adotada com o intuito de subsidiar a compreensão das interações entre concepções, metodologias e demais aspectos da dinâmica da sala de aula no âmbito da Psicologia Educacional, a fim de estabelecer relações diretas e compreensões aprofundadas acerca das metodologias adotadas no ensino de Psicologia Educacional no espaço das licenciaturas, tendo como cenário o Ensino Remoto Emergencial. Tendo em vista que na observação participante os pesquisadores buscam estabelecer relações comunicativas com os sujeitos pesquisados nas diversas situações de investigação, tem-se, atualmente, ampliado as formas de observação nos múltiplos espaços de comunicação e interação, buscando inserir a pesquisa observacional participante emambientes online, na 34 qual a comunicação é mediada por computador (PERUZZO, 2017). Este tipo de observação é nomeado de etnografia virtual (HINE, 2008) ou netnografia, ciberantropologia, webnografia, etnografia digital, dentre outras nomenclaturas (MERCADO, 2012). A etnografia virtual é o estudo detalhado das práticas e relações sociais nos espaços virtuais, buscando compreender as interações online, na qual a internet é a principal interface entre estas interações, isto é, o lugar de encontro que forma novas comunidades (MERCADO, 2012; STEINMETZ, 2012; HINE, 2008). De acordo com Steinmetz (2010) a etnografia virtual é uma metodologia em expansão tendo em vista uma sociedade cada vez mais tecnológica e conectada, sendo premente o desenvolvimento de metodologias adequadas que estudem as interações online. Neste mesmo sentido, Oliveira (2010, p. 105) afirma que “as relações, interações e mediações que se estabelecem no espaço virtual adquirem especificidades que devem ser levadas em consideração no momento de sua coleta e análise em pesquisas científicas”, como por exemplo, o fato que nos espaços virtuais há uma existência de interações volúveis, distintas e simultâneas. Vale ressaltar que a etnografia virtual caracteriza-se como um método de investigação cujo seu caráter é qualitativo, multifatorial, indutivo e dialógico: qualitativo uma vez que a análise de dados implica na interpretação dos sentidos e significados da atuação humana nos ambientes virtuais, nas quais são expressas através das descrições e explicações utilizando linguagem verbal, não verbal e mista; multifatorial tendo em vista que é conduzido pelo emprego de variedade de métodos e técnicas de coleta de dados, de natureza qualitativa ou quantitativa, com objetivo de triangular uma conclusão, na qual é consolidada a partir de múltiplos métodos de investigação e análise; indutivo na medida em que permite a intensa imersão pessoal nas interações mediadas, explorando o acúmulo descritivo de detalhes de modo a construir modelos de teorias explicativas; e dialógico dado que as interpretações e conclusões construídas pelos pesquisadores podem ser discutidas pelos membros participantes (MERCADO, 2012). Com base nisso, as etapas da etnografia virtual ou netnografia, em geral podem ser listadas considerando, principalmente, a definição do tema e do problema de pesquisa (THEES, 2021). Nessa perspectiva, compreendendo a necessidade de analisar a importância, das metodologias adotadas por professores no ensino de Psicologia Educacional na aprendizagem dos estudantes na trajetória formativa dos licenciandos e reconhecendo que o laboratório de pesquisa e investigação do professor é a própria sala de aula (BZUNECK, 1999), a etnografia virtual aplica-se a este estudo na medida em que busca compreender e analisar as interações sociais estabelecidas no âmbito do ensino de Psicologia Educacional em 35 sala de aula virtual decorrente do contexto de Ensino Remoto advindo da pandemia pelo novo coronavírus. Em razão dessas justificativas, optou-se por imergir na realidade da sala de aula virtual no âmbito da Psicologia Educacional na formação de professores, a qual foi mediada pela plataforma Google Meet com o intuito de observar como as interações entre professores e alunos e as metodologias adotadas no âmbito da Psicologia Educacional repercutem nas aprendizagens dos licenciandos. Diante disso, foi realizada uma observação participante online nos componentes curriculares de Psicologia Educacional II no curso de Licenciatura em Pedagogia e Fundamentos da Psicologia Educacional no curso de Licenciatura em Ciências Biológicas, ambos ofertados na UFRN. Tais observações foram realizadas no semestre letivo de 2021.2 e contaram com a presença constante da pesquisadora nos momentos síncronos de aula, por um período de aproximadamente três meses5, contabilizando um total de sete aulas síncronas, do componente curricular de Psicologia Educacional II e um total de nove aulas síncronas do componente e Fundamentos da Psicologia Educacional. Essas observações permitiram conhecer, além do perfil dos participantes (número, características, gênero), a cronologia dos eventos, a descrição dos comportamentos e o registro das interações verbais, imagens e orais (MERCADO, 2012). Os registros das observações ao longo do processo de investigação foram realizados em um diário de bordo (APÊNDICE A), analisando cinco dimensões pré-estabelecidas, como: conteúdos programáticos, didática, materiais didáticos, interações interpessoais e pedagógicas e as avaliações das aprendizagens na perspectiva da pesquisadora. Contudo, para fins específicos desse estudo serão analisadas apenas as dimensões que se referem aos conteúdos programáticos e a didática. Vale salientar que para a realização das observações online foi solicitada às referidas turmas a permissão para a efetivação da pesquisa, concordando com a afirmação de Peruzzo (2017, p. 170) que “é de bom tom pedir a permissão ao grupo, comunidade, movimento social ou instituição para se realizar alguma pesquisa”. Desse modo, foi utilizado o Termo de Consentimento Livre e Esclarecido da pesquisa para assegurar a participação voluntária, respeitando a privacidade dos envolvidos e a legitimidade das informações coletadas. Para consolidação das análises foram aplicados questionários semiestruturados com 21 estudantes de licenciatura das turmas concernentes, sendo 6 da turma de Psicologia Educacional II e 15 da turma de Fundamentos da Psicologia Educacional, com o intuito de os 5 Esse período foi determinado pela UFRN como duração do semestre letivo vigente em decorrência à pandemia pela COVID-19. 36 participantes expressarem os aspectos mais importantes de suas aprendizagens no contexto do Ensino Remoto, destacando a importância das metodologias adotadas na sala de aula virtual. A análise dos dados oriundos das observações online e dos questionários foi interpretada com base os critérios e normas da Análise de Conteúdo de Bardin (1995), no qual consiste em um conjunto de instrumentos metodológicos interpretativos que tem como objetivo desvelar os sentidos contidos nos discursos dos diversos atores sociais. 37 4 RESULTADOS Inicialmente, com o intuito de compreender os resultados obtidos nas observações participantes online e mediante as respostas aos questionários semiestruturados, será realizada a caracterização das turmas participantes da pesquisa. As duas turmas participantes da pesquisa serão nomeadas como Turma 1, referente à turma de Psicologia Educacional II ofertada no curso de Licenciatura em Pedagogia6 no turno vespertino com a carga horária obrigatória de 52 horas, dividindo-se em teóricas (42h) e práticas (10h); e Turma 2, correspondente à turma de Fundamentos da Psicologia Educacional no curso de Licenciatura em Ciências Biológicas, também do turno vespertino com carga horária obrigatória de 60 horas, ambas ofertadas pelo Departamento de Fundamentos e Políticas da Educação do Centro de Educação da UFRN. A Turma 1 é composta por 50 participantes, sendo eles, 40 mulheres e 10 homens, cursando entre o terceiro e sexto período do curso de licenciatura em Pedagogia, havendo estudantes em sua primeira graduação, bem como estudantes que já concluíram um ou mais cursos de uma graduação. Vale salientar que a maioria dos licenciandos da turma possuem experiência com a docência, atuando tanto como professores de área específica, quanto como estagiários em escolas públicas ou privadas. Já a Turma 2 é composta por 51 estudantes, sendo 26 são mulheres e 25 são homens, a qual caracteriza-se como uma turma diversa, com estudantes de diferentes licenciaturas, entre elas Licenciatura em Artes Visuais, Teatro, Música, Dança, Filosofia, Letras (Espanhol e Língua Portuguesa), Geografia, Matemática e Química, cursandoentre o primeiro e último período da graduação. A turma é composta por licenciandos jovens e adultos que estão em sua primeira graduação e outros que já possuem mais de uma graduação, havendo estudantes que já possuem experiência com a docência e outros que ainda não possuem experiência docente. Pretende-se agora analisar a importância das metodologias adotadas por professores no ensino de Psicologia Educacional na aprendizagem dos estudantes na trajetória formativa dos licenciandos das respectivas turmas. A seguir, serão elucidadas algumas constatações baseadas nos registros das observações participantes online e nas respostas obtidas a partir dos questionários semiestruturados. Tais registros das observações participantes online foram realizados em um diário de bordo, analisando dimensões pré-estabelecidas, que serão 6 Na UFRN os cursos de licenciatura possuem ao menos um componente curricular obrigatório da área de Psicologia Educacional, sendo apenas nos cursos de licenciatura em Pedagogia dois componentes curriculares obrigatórios, os quais são: Psicologia Educacional I e Psicologia Educacional II, com carga horária de 52h cada. 38 explicitadas na sequência: conteúdos programáticos, didática, materiais didáticos, interações interpessoais e pedagógicas e as avaliações das aprendizagens. À vista disso, para fins analíticos dessa pesquisa, serão analisadas apenas as dimensões que se referem aos conteúdos programáticos e à didática. 4.1 Conteúdos programáticos Os conteúdos programáticos apresentados, a seguir, foram ministrados nas duas turmas que participaram das etapas de investigação da pesquisa, ressaltando as principais abordagens teóricas ensinadas nos componentes curriculares de Psicologia Educacional. Vale destacar, que estes componentes integram o rol de fundamentos da educação, contendo os saberes científicos que formam o eixo da docência, assim como os aspectos históricos da psicologia na educação e as principais abordagens psicológicas que trazem implicações para a formação docente (TIBÚRCIO; FONSECA, 2020). Diante disso, na Turma 1 são abordados os conteúdos previstos para o componente curricular de Psicologia Educacional II, conforme ementa cadastrada no Sistema Integrado de Gestão de Atividades Acadêmicas (SIGAA): Compreensão dos processos de ensino e aprendizagem à luz das teorias psicogenéticas. Estudo das relações desenvolvimento-aprendizagem, afetividade-cognição e pensamento-linguagem nos diferentes ciclos de vida: infância, adolescência, juventude, vida adulta e velhice. Relações da Psicologia Educacional com as práticas pedagógicas nos campos de atuação do Pedagogo. Nesse sentido, esse componente abrange de maneira específica o processo de ensino e aprendizagem e desenvolvimento humano nos diferentes momentos do ciclo vital: infância, adolescência, juventude, vida adulta e velhice. Esta compreensão acerca da periodicidade do desenvolvimento humano, como afirma Pinto (2018), contribui na formação inicial no que tange ao planejamento pedagógico adequado para cada ciclo de vida, contemplando, assim, as especificidades dos sujeitos e modos de aprender, sendo imprescindível para reflexão, planejamento e atuação do pedagogo. Com isso, os conteúdos programáticos selecionados para a Turma 1 buscam sistematizar os conhecimentos acerca das teorias científicas relativas às contribuições dos autores Piaget, Vygotsky e Wallon para a prática pedagógica, trazendo as principais especificidades de cada teoria, bem como as convergências e divergência entre tais autores. O 39 Quadro 1, a seguir, apresenta os conteúdos programáticos abordadas ao longo da primeira unidade na Turma 1. Quadro 1 – Conteúdos Programáticos ministrados na Turma 1 Unidade Conteúdos programáticos 1° unidade Introdução às teorias de Piaget, Vygotsky e Wallon – Periodização do desenvolvimento psicológico humano. A periodização do desenvolvimento psicológico de bebês e crianças pequenas na perspectiva de Piaget, Vygotsky e Wallon. A infância pré-escolar abordada pelos autores Piaget, Vygotsky e Wallon. Transição do pensamento simbólico ao pensamento lógico na perspectiva de Vygotsky e Piaget. Fonte: Elaborado pela autora (2022). Analisando os conteúdos programáticos estabelecidos para a primeira unidade na Turma 1, percebe-se uma preocupação e cautela da docente ministrante do componente curricular na escolha, organização e planejamos dos conteúdos, em que busca apresentar os principais conceitos referentes às diferentes infâncias na perspectiva dos autores Piaget, Vygotsky e Wallon, dando ênfase à periodização do desenvolvimento psíquico na infância e às contribuições pedagógicas elaboradas por cada autor nesta etapa da vida. Vale ressaltar que a abordagem da adolescência e vida adulta fica a cargo da segunda unidade do componente. Segundo Facci (2004), o conhecimento acerca da periodização do desenvolvimento psicológico na infância orienta os professores que atuam ou atuarão na educação infantil e no ensino fundamental na compreensão sobre as peculiaridades do desenvolvimento psíquico nas diferentes etapas evolutivas e contribui na organização de estratégias de ensino que favoreçam a aprendizagem das crianças. Anjos (2012), nessa mesma perspectiva, ressalta que para ser efetivado um bom ensino e uma educação eficiente, o professor, dentre os diversos saberes que abrangem sua competência, também deve ter o domínio acerca das forças motrizes do desenvolvimento psíquico. Nas observações realizadas na Turma 1, foi possível constatar que durante a primeira unidade da disciplina, os licenciandos realizaram um estudo detalhado sobre os conceitos acerca da periodização do desenvolvimento e da aprendizagem na infância a partir de diferentes perspectivas teóricas. Esses dados também buscam sanar as lacunas formativas, apresentadas no estudo de Pinto (2018), acerca do ensino da periodização do desenvolvimento 40 psicológico humano nos cursos de formação de professores, o qual tem se configurado como um conteúdo pouco visto ou aprofundado nas licenciaturas. Quanto aos conteúdos programáticos ministrados na Turma 2, a ementa que consta no SIGAA informa: “Principais abordagens históricas da psicologia e suas implicações na educação. Conceitos básicos da psicologia da aprendizagem e do desenvolvimento”. Desse modo, identificou-se a seguinte configuração no que diz respeito os conteúdos programáticos ministrados na primeira e segunda unidade da Turma 2: Quadro 2 – Conteúdos Programáticos ministrados na Turma 2 Unidades Conteúdos programáticos 1° unidade Relações entre a ciência e o senso comum e a evolução da Psicologia. Apontamos históricos entre Psicologia e Educação. A Psicologia Educacional e as tendências contemporâneas. 2° unidade Teorias da aprendizagem: Inatismo-Maturacionismo Behaviorismo Teoria da Gestalt Humanismo Psicanálise Cognitivismo Fonte: Elaborado pela autora (2022). A partir do Quadro 2 é possível constatar que este componente curricular, ofertado nas licenciaturas, apresenta os conceitos iniciais e a evolução histórica da Psicologia na Educação, além de abordar as principais teorias psicológicas da aprendizagem e desenvolvimento e suas contribuições para o contexto escolar. Diante disso, as teorias apresentadas estão em consonância aos dizeres de Anaruma (2017), segundo a qual uma das primeiras reflexões necessárias que a disciplina de Psicologia Educacional deve propor aos licenciandos é a relação entre desenvolvimento e aprendizagem na atuação pedagógica a partir das teorias de aprendizagem, para que, dessa forma, os licenciandos não apenas conheçam os conteúdos, mas saibam significá-los na prática docente. Além das teorias apresentadas, outros temas transversais se fizeram
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