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UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO GRANDE DO NORTE CENTRO DE CIÊNCIAS HUMANAS, LETRAS E ARTES PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO E PESQUISA EM GEOGRAFIA SONEIDE MOURA DA COSTA A ATIVIDADE COMERCIAL NAS RUAS POMPÉIA, CHEGANÇA E BOA SORTE NO CONTEXTO DA PRODUÇÃO DO ESPAÇO URBANO DA ZONA NORTE DE NATAL/RN – BRASIL Dissertação de Mestrado apresentada ao Programa de Pós-Graduação e Pesquisa em Geografia (PPGE) da Universidade Federal do Rio Grande do Norte para a obtenção do Título de Mestre em Geografia Orientadora Prof.ª Doutora Rita de Cássia da Conceição Gomes NATAL - RN 2017 SONEIDE MOURA DA COSTA A ATIVIDADE COMERCIAL NAS RUAS POMPÉIA, CHEGANÇA E BOA SORTE NO CONTEXTO DA PRODUÇÃO DO ESPAÇO URBANO DA ZONA NORTE DE NATAL/RN – BRASIL Natal, 07/03/2017 BANCA EXAMINADORA ________________________________________ Profª Drª Rita de Cássia da Conceição Gomes Orientadora (UFRN) _________________________________________ Profª Drª Ione Rodrigues Diniz Morais Examinador Interno (UFRN) __________________________________________ Profª Drª Kátia Cristina Ribeiro Costa Examinador Externo (UFCG) NATAL - RN 2017 Caminhante, são teus passos o caminho e nada mais; Caminhante, não há caminho, faz-se caminho ao andar. (Antônio Machado) AGRADECIMENTOS Não se imagine capaz de construir um sonho sozinho. A solidão é escura e perversa. Quando achamos que estamos seguros e confiantes no nosso caminho, nos deparamos com o vazio e a sensação de que nada mais importa. Por isso, agarre-se constantemente aos sinais da liberdade da mente e elevação do espírito. Atreva-se a sorrir para o desconhecido e torne-o participante da sua vida. Vivi de muitas formas; desconhecida de mim e dos outros, me senti em vários momentos caminhando sozinha. Por várias vezes tentei e tentaram me desviar, contudo fui resgatada por pessoas que caminharam comigo e me ajudaram a realizar este sonho. Pelo caminho que trilhei, agradeço a todos que, de modo muito peculiar, deram mais significado à minha vida. Obedecendo a cronologia da minha jornada, agradeço: À Deus, que me privilegiou com o dom da vida ao lado da família certa. Usaria todas as formas para agradecer a semente que plantou no meu coração, ainda quando pequena, do desejo incansável de estudar. Como as palavras não dão conta de explicar o tamanho da minha gratidão, lhe ofereço a voz do meu coração que só o Senhor pode ouvir. À minha mãe, Alice, que cuida muito bem de mim desde o primeiro dia que me teve em seus braços; aliás é justamente em seus braços onde me sinto segura e inteira. Mãe, muito obrigada por celebrar as minhas conquistas e chorar as minhas decepções junto comigo. Obrigada pelo incentivo e por me guardar em suas orações todas as noites. Eu te amo! Ao meu pai, Fernando, motivo indireto desta conquista. Pai, o senhor me ajudou a ressignificar muitos sentimentos. Obrigada pela vida! Que possamos trilhar lindos caminhos. À minha irmã, Simone, pelas lindas lembranças de infância quando esperávamos ansiosamente pelo amanhecer, depois das tão aguardadas chuvas no sertão, para brincarmos nas poças de água que a terra, temporariamente saciada, já não tinha condições de beber. Lembro ainda de mamãe nos chamando após as brincadeiras, para tomarmos aquele delicioso café feito no fogão à lenha. Obrigada por ter me presenteado com a dádiva de ser tia e assim viver um amor puro. Os meus sobrinhos: Jarley, Samuel Lucas e Ana Cecília são pérolas preciosas que guardo no meu coração. Ao meu irmão, Adair, um homem que tem me ensinado que é possível superar muitas adversidades quando se crer em dias melhores. Estarei sempre ao seu lado. Aos meus avós maternos Severino Costa (in memoriam) e Alice; e Francisco Moura (in memoriam) e Maria Beatriz pelas histórias que contavam do “povo de antigamente” que prendiam a minha atenção nos finais de tarde na calçada de barro batido. Às minhas professoras das séries iniciais, Geisa e Julinha, que na humilde escola do Sítio Timbaúba (Ouro Branco/RN), lugar onde nasci, me fizeram iniciar o percurso acadêmico. Ao meu professor de Geografia do 8º ano, Luiz Figueiredo, que me fez amar a ciência que escolhi e ora defendo. À toda a equipe da Pro-Reitoria de Assuntos Estudantis (PROAE/UFRN), em especial a assistente social Graça, por ter me ajudado durante todo o meu percurso acadêmica na UFRN. Obrigada por ter me acolhido e feito o possível, juntamente com sua esquipe, para que eu permanecesse tendo o melhor acompanhamento que a universidade poderia oferecer. Às minhas amigas da época da residência universitária: Marluce, Jucimeire, Taís, Iselda, Gabi e Arianne, com quem tive muitos anos de excelente convivência e companheirismo. À minha admirada e, sempre professora, Ione Rodrigues Diniz Morais. Não conheço mulher mais íntegra e verdadeira nas ações que visam exclusivamente o crescimento acadêmico e pessoal dos seus alunos. Você atende com excelência todos as definições cabíveis para a palavra professor, pois sempre defendeu a ética e o ensino de qualidade. Seguirei os seus passos sempre. À professora Ana Cláudia Ventura dos Santos pelos sábios conselhos e pelo acolhimento físico e emocional. Pessoas como você são raras porque conseguem enxergar no outro o que está além do aparente, portanto se tornam especiais e prazerosas de ser ter por perto. Compartilhamos muitas opiniões e dividimos muitas batalhas. À professora Drª. Maria Aparecida Pontes pelas pertinentes contribuições no exame de qualificação. À professora Drª Kátia Cristina Ribeiro Costa por ter conduzido, com tanto delicadeza e competência, as suas palavras como membro da banca de defesa da presente dissertação. À Rita de Cássia da Conceição Gomes, minha orientadora do presente trabalho e também da vida. Obrigada por ter me recebido na sua família GPEUR, a qual quero ser membro sempre. Agradeço especialmente pelas vezes que me acolheu com suas palavras sábias, por me animar diante das tristezas, por me conduzir a um encontro mensal com Deus, através das missas em Arês/RN. Obrigada ainda pelos cafés das 14:30 e risadas compartilhadas. De modo especial você sempre me mostrou que podemos fazer mais do hoje e vislumbrar um amanhã de possibilidades. Obrigada pelo sonho realizado! À minha família GPEUR, pela troca de experiências pessoais e acadêmicas em nome de quem quero me dirigir à Rosa, Jomara, Ândria, Moacir e Josélia. À Kelson (in memoriam), amigo de poucas palavras, mas que muito me ensinou com o seu coração imenso. Um homem íntegro, educado e que emitia paz e boas energias. Alguém a ser sempre lembrado pela família GPEUR. À Joabio, grande amigo, aquele que tem a história de vida parecida com a minha; meu irmão do Seridó, com quem dividi angústias profundas e alegrias extremas. Obrigada pela construção dos mapas e sua companhia, ela me faz muito bem. À Anderson e Marília pelos ensinamentos compartilhados e amizade consolidada. À um anjo especial, Moizés Muniz, principalmente pela paciência em tentar me compreender, quando nem eu mesma consegui. A sua participação na minha vida foi/é fundamental para eu entender que podemos confiar no outro sem medidas quando nos propomos capazes de ser felizes. Muito obrigada por cuidar de mim e por me ajudar com a pesquisa de campo. Você me faz acreditar na bondade humana, cada vez mais rara. Ao Laboratório de Estatística Aplicada (LEA/UFRN), às pessoas de Pedro Luciano e Érica, pelo acompanhamento da minha pesquisa e pela elaboração das amostras de campo. Às Secretarias de Tributação Municipal de Natal (SEMUT), Meio Ambiente e Urbanismo (SEMURB) e Transportese Trânsito Urbano (STTU) pelo fornecimento de dados secundários importantes para a consecução da pesquisa. Por fim, aos que, direta ou indiretamente caminharam comigo, Obrigada! RESUMO Sendo o binômio comércio e cidade, indissociável, empreende-se que a produção do espaço urbano pode ser entendida à luz da atividade comercial ao passo que este, ou seja, o espaço, influencia na produção e localização do comércio. Desta forma, a pesquisa enveredou pela discussão do processo de expansão urbana de Natal/RN em direção à Zona Norte via política habitacional e o percurso assumido pelo comércio tradicional nas ruas Pompéia, Chegança e Boa Sorte. O trabalho está embasado em pesquisa bibliográfica, documental e pesquisa de campo. Do ponto de vista teórico-metodológico, adotou-se o método regressivo-progressivo proposto por Lefebvre (2000), cuja perspectiva de investigação está organizada em três momentos: descritivo; analítico-regressivo e histórico-genérico. A análise desenvolvida revelou que a atividade comercial na Pompéia, Chegança e Boa Sorte apresenta um caráter de proximidade física e social, uma vez que, além de atender a demanda de consumo local e de bairros próximos a estas, também mantém uma clientela fidedigna no que concernem às relações de compra com o comerciante da rua. Outrossim, mesmo não se configurando como grandes corredores de passagem na Zona Norte, estas ruas se constituem em lócus de representação sócio-espacial embasada, por um lado na lógica de reprodução hegemônica e por um lado na reprodução da vida. Ainda que inserido no contexto da crise econômica, também vivenciada no Rio Grande do Norte e que repercute em altas taxas de desemprego, o comércio da Pompéia, Chegança e Boa Sorte apresenta perspectivas de crescimento, principalmente no tocante ao comércio informal, sendo este último uma possibilidade de garantia de renda familiar alternativa. PALAVRAS-CHAVE: Produção do espaço urbano de Natal/RN; Política habitacional; comércio tradicional; ruas Pompéia, Chegança e Boa Sorte. ABSTRACT Understanding the binomial commerce and city, inseparable, it is realized that the production of the urban space can be understood from the commercial activity whereas this, that is, the space, influences in the production and location of the commerce. In this way, the research began by discussing the process of urban expansion of Natal / RN towards the North Zone through housing policy and the path taken by the traditional commerce in the streets Pompeia, Chegança and Boa Sorte. The dissertation is based on bibliographical research, documentary and field research. From the theoretical-methodological point of view, the regressive- progressive method proposed by Lefebvre (2000) was adopted. The research perspective of this method is organized in three moments: descriptive; analytic- regressive and historical-generic. The analysis revealed that the commercial activity in Pompeia, Chegança and Boa Sorte has a physical and social proximity, because it meets the demand of local consumption and neighborhoods close to them and maintains a trustworthy clientele in relation to the purchase relations with The street merchant. Moreover, even though they are not configured as major passageways in the North Zone, these streets constitute a locus of socio-spatial representation based on the logic of hegemonic reproduction and reproduction of life. Although in the context of the economic crisis, also experienced in Rio Grande do Norte and which has a high unemployment rate, the commercial activity in the streets of Pompeia, Chegança and Boa Sorte presents growth prospects, especially with regard to informal commerce, which is a possibility to guarantee alternative family income. Keywords: Production of the urban space of Natal / RN; Housing policy; traditional commerce; Pompeia, Chegança and Boa Sorte streets LISTA DE ABREVIATURAS E SIGLAS AABB – Associação Atlética Banco do Brasil ABRASCE – Associação Brasileira de Shopping Centers APERN – Associação de poupança e empréstimo do Rio Grande do Norte BNH – Banco Nacional da Habitação CAERN – Companhia de Água e Esgotos do RN CAGED – Cadastro Geral de Empregados e Desempregados CCAB – NORTE - Centros Comerciais Aloisio Bezerra Norte CCAB –SUL- centros comerciais Aloisio Bezerra Sul COAHB-RN- Companhia de Habitação Popular do RN COSERN – Companhia de Serviços Elétricos do RN CNAE – Classificação Nacional de Atividades Econômicas CNB – Construtora Norte Brasil DER – Departamento de Estradas e Rodagens DETRAN – Departamento Estadual de Trânsito DIN – Distrito Industrial de Natal ED – Escola Doméstica de Natal FARN – Faculdade Natalense para o Desenvolvimento do Rio Grande do Norte FIERN – Federação das Indústrias do Rio Grande do Norte HC – Colégio Henrique Castriciano IBGE – Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística IFRN – Instituto Federal do Rio Grande do Norte IMA – Instituto Maria Auxiliadora INOCOOP – Instituto de Orientação às Cooperativas Habitacionais IPI – Impostos sobre Produtos Industrializados ITEP – Instituto Técnico-Científico de Polícia do Rio Grande do Norte LEA/UFRN – Laboratório de Estatística Aplicada da UFRN LOT. – Lote PROAE – Pró-reitora de Assuntos Estudantis PROCON – Fundação de Proteção e Defesa do Consumidor PMC – Pesquisa Mensal do Comércio PROMORAR – Programa de Erradicação de Sub-Moradias SEBRAE – Serviço Brasileiro de Apoio às Micro e Pequenas Empresas SELIC – Sistema Especial de Liquidação e de Custódia SEMURB – Secretaria Municipal de Meio Ambiente e Urbanismo SEMUT – Secretaria de Tributação Municipal de Natal SM – Salários Mínimos STTU – Secretaria Municipal de Transportes e Trânsito Urbano SUDENE – Superintendência do Desenvolvimento do Nordeste UNI-RN – Centro Universitário do Rio Grande do Norte LISTA DE ILUSTRAÇÕES FIGURAS Figura 1 – Síntese do itinerário da pesquisa ..................................................................... 28 Figura 2 - Placa que anuncia primeiro voo transatlântico ocorrido em 1930 entre São Luis do Senegal e Natal ........................................................................................................ 94 Figura 3 - Ponte Rodoferroviária de Igapó nos anos de 1970 ....................................... 97 Figura 4 - Distrito Industrial de Natal – DIN nos anos 1970 ........................................... 98 Figura 5 - Ponte Costa e Silva (Igapó) duplicada ........................................................... 108 Figura 6 - Ilustração de rua na cidade Pompéia, Itália em 150 a.C. ........................... 112 Figura 7 - Rua Pompéia – Zona Norte de Natal/RN/2016 ............................................ 112 Figura 8 - Noticiário sobre abalos sísmicos em João Câmara (a direita) e evasão da população da cidade (a esquerda) ................................................................................... 118 Figura 9 - Rua na cidade Pompéia-Itália 150 a.C .......................................................... 123 Figura 10 - Nome das ruas adjacente à Chegança - 2016 ........................................... 137 Figura 11 - A dança da chegança ..................................................................................... 138 Figura 12 - Barraca de feira na Rua Chegança - Natal/RN - 2016 .............................. 145 Figura 13 - Ponte Newton Navarro - Natal/RN - 2011 ................................................... 154 GRÁFICOS Gráfico 1 - Número de estabelecimentos de comércio e serviços quanto à formalização – Pompéia/2016 ............................................................................................. 60 Gráfico 2 - Percentual de funcionários que trabalham no estabelecimento – Pompéia/2016 ........................................................................................................................62 Gráfico 3 - Motivos para escolha do comércio – Pompéia/2016 ................................... 63 Gráfico 4 - Lugar de compra da mercadoria pelo comerciante – Pompéia/2016 ........ 64 Gráfico 5 - Preço da mercadoria de acordo com o consumidor – Pompéia/2016 ...... 65 Gráfico 6 - Número de estabelecimentos de comércio e serviços quanto à formalização – Boa Sorte/2016 ........................................................................................... 71 Gráfico 7 - Percentual de funcionários que trabalham no estabelecimento – Boa Sorte/2016 ............................................................................................................................... 73 Gráfico 8 - Motivos para escolha do comércio – Boa Sorte/2016 ................................. 74 Gráfico 9 - Lugar de compra de mercadoria pelo comerciante – Boa Sorte/2016 ...... 75 Gráfico 10 - Qualidade da mercadoria de acordo com o consumidor – Boa Sorte/2016 ............................................................................................................................... 76 Gráfico 11 - Número de estabelecimentos de comércio e serviços quanto à formalização – Chegança/2016 ........................................................................................... 81 Gráfico 12 - Percentual de funcionários que trabalham no estabelecimento – Chegança/2016 ...................................................................................................................... 82 Gráfico 13 - Motivos para escolha do comércio – Chegança/2016 ............................... 83 Gráfico 14 - Lugar de compra da mercadoria pelo comerciante – Chegança/2016 ... 84 Gráfico 15 - Qualidade da mercadoria de acordo com o consumidor – Chegança/2016 ...................................................................................................................... 85 Gráfico 16 - Evolução da população da Zona Norte de Natal/RN – 1980 a 2010 .... 107 Gráfico 17 – Intenção de compra das famílias brasileiras entre Jan de 2010 e Jan de 2017 ....................................................................................................................................... 157 Gráfico 18 – Escala de crescimento do comércio de 0 a 10 na perspectiva do comerciante nas ruas Pompéia, Chegança e Boa Sorte - 2016 .................................. 160 Gráfico 19 - Utilização de mecanismos de publicidade pelos comerciantes das ruas Pompéia, Chegança e Boa Sorte/2016 ............................................................................ 162 Gráfico 20 - Lugar de moradia do comerciante - Pompéia, Chegança e Boa Sorte - 2016 ....................................................................................................................................... 171 Gráfico 21 - Origem da Clientela – Pompéia, Chegança e Boa Sorte/2016 ............. 173 Gráfico 22 - Motivo de escolha do consumidor para fazer compras – Pompéia, Chegança e Boa Sorte/2016 .............................................................................................. 174 QUADROS Quadro 1 – Síntese dos procedimentos metodológicos .................................................. 30 Quadro 2 - Atributos do comércio varejista moderno e tradicional, segundo Fernandes; Cachinho e Ribeiro (2000) .............................................................................. 46 Quadro 3 - Lojas da Rua Pompéia - 2016 ......................................................................... 54 Quadro 4 - Lojas da Rua Boa Sorte – 2016 ...................................................................... 69 Quadro 5 - Lojas da Rua Chegança – 2016 ...................................................................... 78 Quadro 6 - Conjuntos habitacionais construídos na Zona Norte de Natal/RN .......... 102 Quadro 7 - Ordem de serviço operacional da linha de transporte público 02 - Gramoré/Mirassol - Empresa Guanabara/2016 .............................................................. 121 Quadro 8 - Ordem de serviço operacional das linhas de transporte público que circulam nas ruas Pompéia, Chegança e Boa Sorte – 2016 ........................................ 166 MAPAS Mapa 1- Ruas Pompéia, Chegança e Boa Sorte , Zona Norte de Natal/RN ............... 22 Mapa 2 – Natal/RN: Zonas Administrativas e Bairros - 2017 ......................................... 35 Mapa 3 - Conjuntos Habitacionais e Loteamentos na Zona Norte/2016 ...................... 45 Mapa 4 - Rua Pompéia, Natal/RN – 2016 ......................................................................... 54 Mapa 5 - Rua Boa Sorte - Natal/RN – 2016 ...................................................................... 66 Mapa 6 - Rua Chegança - Natal/RN – 2016 ..................................................................... 77 Mapa 7 – Rua Pompéia-Natal/RN ..................................................................................... 114 Mapa 8 - Perfil de produção de ruas em torno da Pompéia nos bairros Pajuçara e Potengi – Natal/RN .............................................................................................................. 116 Mapa 9 - Boa Sorte - Natal/RN .......................................................................................... 129 Mapa 10 – Rua Chegança -Natal/RN ............................................................................... 141 Mapa 11 - Abrangência territorial das linhas de ônibus que circulam nas ruas Pompéia, Chegança e Boa Sorte ............................................................................168 Mapa 12 - Abrangência territorial das linhas de ônibus que circulam nas ruas Pompéia, Chegança e Boa Sorte no âmbito da Zona Norte de Natal/RN...............169 FOTOS Foto 1 - Principais Avenidas da Zona Sul de Natal/RN/2015 ......................................... 43 Foto 2 - Comércio na Rua Pompéia - 2016 ....................................................................... 52 Foto 3 - Comércio na Avenida Coronel Estevam (Av. 9) - Alecrim/2016 ..................... 52 Foto 4 - Lojas de preço único, Pompéia, Natal/RN/2016 ................................................ 58 Foto 5 - Incoerência entre divulgação e venda de mercadorias, Boa Sorte, Natal/RN – 2015 ...................................................................................................................................... 67 Foto 6 - Incoerência entre divulgação e venda de mercadorias, Boa Sorte, Natal/RN – 2015 ...................................................................................................................................... 68 Foto 7 - Exposição de mercadorias na Rua Chegança - 2015 ...................................... 86 Foto 8 - Casas adaptadas para agregar o comércio- Pompéia-Natal/RN - 2016 ..... 124 Foto 9 - Trecho da Rua Pompéia sem estacionamento ................................................ 127 Foto 10 - Buraco na Rua Boa Sorte (2016) ..................................................................... 134 CROQUIS Croqui 1 – Distribuição do comércio - Pompéia (CNAE, 2.2/2015) – 2016................56 Croqui 2 - Distribuição do comércio - Boa Sorte (CNAE, 2.2/2015) – 2016...............70 Croqui 3 - Distribuição do comércio - Chegança (CNAE, 2.2/2015) – 2016..............79 LISTA DE TABELAS Tabela 1 - Distribuição da renda familiar na Zona Norte Natal/RN, por bairro (2010)50 Tabela 2 - Evolução da população da Zona Norte de Natal/RN – 1980 a 2010 ....... 107 Tabela 3 - Evolução da população residente em Natal de 1991-2010 ....................... 152 Tabela 4 - Taxa de crescimento de Natal/RN por Zona Administrativa 2000-2010 . 153 SUMÁRIO 1. INTRODUÇÃO .............................................................................................................. 202. DESCREVENDO A REALIDADE .............................................................................. 32 2.1. NATAL/RN: A ATIVIDADE COMERCIAL EM FOCO ............................................... 33 2.1.1. A ATIVIDADE COMERCIAL NA ZONA NORTE DE NATAL/RN ........................ 46 2.1.2. POMPÉIA: O ALECRIM DA ZONA NORTE ....................................................... 51 2.1.3. BOA SORTE: ESPAÇO COMERCIAL DE ROTATIVIDADE ........................... 66 2.2.4. CHEGANÇA: A DESCOBERTA DE UM COMÉRCIO DISTANTE ..................... 76 3. A CONSTRUÇÃO DA REALIDADE .......................................................................... 90 3.1. A PRODUÇÃO DO ESPAÇO URBANO DE NATAL/RN E O COMÉRCIO: NAS TRILHAS DA ZONA NORTE ............................................................................................... 92 3.2. O RESGATE DA MEMÓRIA: NARRATIVAS SOBRE AS RUAS POMPÉIA, BOA SORTE E CHEGANÇA ............................................................................................. 110 3.2.1. MEMÓRIAS SOBRE A RUA POMPÉIA ............................................................ 111 3.2.2. MEMÓRIAS SOBRE A RUA BOA SORTE ....................................................... 128 3.2.3. MEMÓRIAS SOBRE A RUA CHEGANÇA ....................................................... 136 4 - A RECONSTRUÇÃO DA REALIDADE ...................................................................... 147 4.1. DO ESPAÇO DO HABITAR AO ESPAÇO DO HABITAT ..................................... 149 4.2. A CRISE ECONÔMICA E A REALIDADE “POSSÍVEL” ........................................ 156 4.3. A FUNÇÃO SOCIAL DO COMÉCIO NAS RUAS POMPÉIA, BOA SORTE E CHEGANÇA ......................................................................................................................... 170 À GUISA DE CONCLUSÃO ............................................................................................... 179 REFERÊNCIAS .................................................................................................................... 182 APÊNDICE A - FORMULÁRIO APLICADO AO COMERCIANTE ............................... 190 APÊNDICE B - FORMULÁRIO APLICADO AO CONSUMIDOR ................................. 192 APÊNDICE C – ROTEIRO DA ENTREVISTA REALIZADA COM COMERCIANTE E CONSUMIDOR .................................................................................................................... 194 APÊNDICE D - PERFIL DO COMERCIANTE DA RUA POMPÉIA COM BASE DOS FORMULÁRIOS APLICADOS/2016 ................................................................................. 195 APÊNDICE E - PERFIL DO COMERCIANTE DA RUA CHEGANÇA COM BASE DOS FORMULÁRIOS APLICADOS/2016 ....................................................................... 196 APÊNDICE F - PERFIL DO COMERCIANTE DA RUA BOA SORTE COM BASE DOS FORMULÁRIOS APLICADOS/2016 ....................................................................... 197 APÊNDICE G - PERFIL DO CONSUMIDOR DAS RUAS POMPÉIA, CHEGANÇA E BOA SORTE COM BASE DOS FORMULÁRIOS APLICADOS/2016 ........................ 198 APÊNDICE H - PERFIL DOS COMERCIANTES E/OU CONSUMIDORES DAS RUAS POMPÉIA, CHEGANÇA E BOA SORTE COM BASE NAS ENTREVISTAS REALIZADAS/2016 ............................................................................................................. 199 19 20 1. INTRODUÇÃO O comércio viabiliza a existência da cidade, explica a sua organização e justifica muito do movimento e animação que nesta acontece. (SALGUEIRO E CACHINHO, 2009, p.9) No fragmento acima, extraído do texto “As relações cidade-comércio: dinâmicas de evolução e modelos interpretativos”, Salgueiro e Cachinho (2009) discutem a correlação existente entre a atividade comercial e a cidade. Para os autores, mesmo que o comércio não esteja necessariamente relacionado à origem da forma espacial ora citada, esta se constitui como substrato de distribuição, realização e organização da atividade comercial. Já no que se refere à relação de origem entre ambos os temas mencionados, a afirmação do historiador Pirenne (1992) de que “as cidades são filhas do comércio”, evidencia a relação existente, posto que, para o autor, estas assumem a função majoritária de agregar pessoas, informações e mercadorias. Pirenne (1992) também se refere à cidade como importante substrato de realização do encontro mediado pela atividade comercial. Corroborando com a ideia do autor supracitado, Salgueiro (1996) acrescenta alguns fatores que ultrapassam a relação de origem entre o comércio e a cidade, ao enfatizar que a atividade comercial tem a capacidade de influenciar na formação de núcleos populacionais e na integração entre centro e periferia estabelecendo a conexão entre bairros do conjunto urbano. Somam-se a estas informações a influência que o comércio exerce sobre a paisagem urbana, modificando-a de um espaço para o outro mediante diversificação de uso e apropriação pela atividade comercial. Se por um lado o comércio influencia a produção da cidade pelos fatores apresentados, por outro, esta última apresenta condicionantes para a localização dos equipamentos comerciais. Desta forma, compreende-se que este binômio deve ser analisado de forma indissociada, visto que o espaço da cidade pode ser entendido à luz da atividade comercial ao passo que este influencia na produção e localização do comércio. 21 Com base nos pressupostos acerca do binômio comércio e cidade, o trabalho ora apresentado se faz pertinente por contemplar a análise do comércio no contexto da produção do espaço urbano de Natal/RN. Nesta cidade, fora observado a expansão deste segmento econômico, principalmente a partir da década de 1980, com destaque para o comércio desenvolvido nas ruas Pompéia, Chegança e Boa Sorte, quando houve uma acentuada expansão urbana de Natal intermediada pela política habitacional. Esta política ocorreu de forma contundente na Zona Norte e em parte da Zona Sul, demandando em paralelo, a expansão também das atividades comerciais e, por ocasião, o surgimento do varejo moderno, este marcadamente expresso pelo livre serviço e presença de grandes superfícies comerciais. Cabe mencionar que a instalação do supermercado Hiper Bom Preço em 1982, no Bairro Lagoa Nova, foi o marco do surgimento deste segmento na capital potiguar. Neste período, a Zona Norte de Natal que tinha o Nordestão, localizado na Avenida Bacharel Tomaz Landim, como único empreendimento de destaque, ficou à parte da dinâmica comercial promovida pelo varejo moderno até então ascendente na Zona Sul. O varejo moderno passou a firmar-se na Zona Norte principalmente a partir da segunda metade da década de 1980, e mais fortemente na década de 1990 e 2000, no contexto da expressiva expansão urbana da referida porção da cidade em detrimento da atuação da Companhia de Habitação Popular (COAHB/RN) por meio da construção de conjuntos habitacionais naquela área. A partir de então, grandes superfícies comerciais por exemplo supermercados de grande porte, shoppings e outros estabelecimentos se fixaram nas avenidas Bacharel Tomaz Landim e Doutor João Medeiros Filho, principais eixos articuladores entre a Zona Norte e o restante da cidade, de modo que esta área passou a integrar a mesma lógica do comércio moderno localizado na Zona Sul de Natal. Este tipo de comércio, assim como a consolidação da política de habitação, por meio de conjuntos habitacionais, resultaram da concepção de forças vetorizadas do capital hegemônico. Chama-se de capital hegemônico àquele liderado por grupos de força política, econômica ou financeira sobre os grupos constituintes da massa. Não obstante, no entorno dessas avenidas, desenvolveu-se um comércio tradicional em ruas como Pompéia, Chegança e Boa Sorte (Mapa 1), pertencentes, seja a conjuntos habitacionais projetadospelo Estado ou a loteamentos, resultante da própria força de reprodução social. A atividade existente nas ruas supracitadas é 22 caracterizada pela presença de lojas pouco especializadas, de caráter predominantemente familiar e com a oferta de mercadorias de caráter popular. Concebidas pelo Estado ou pela própria população residente, estas ruas foram construídas para atender à necessidade da habitação e tiveram essa função fundamental transformada, tornando-se ruas de comércio na medida em que o uso do solo tornou-se quase que totalmente ocupado por esta atividade. Pompéia, Chegança e Boa Sorte, objeto desse estudo, além de serem comercialmente representativas para a Zona Norte, se configuraram em espaços contra- Mapa 1- Ruas Pompéia, Chegança e Boa Sorte , Zona Norte de Natal/RN Fonte: Secretaria Municipal de Meio Ambiente e Urbanismo – Natal/RN; malha municipal do Brasil/IBGE, 2010. Elaboração: Joabio Costa; Soneide Moura 23 hegemônicos de reprodução do capital. Espaço de produção contra-hegemônico são aqueles que se consolidaram, que ganharam conteúdo a partir das práticas dos grupos sociais de classes não dominantes. Essas ruas, do ponto de vista da nomenclatura, são designadas pela Secretaria Municipal de Meio Ambiente e Urbanismo (SEMURB/RN) como avenidas de modo que, no intuito de não contrariar a definição do referido órgão público, os mapas da pesquisa contêm a nomenclatura oficial. Entretanto, no decurso do trabalho, optou-se por nomeá-las de ruas, em virtude do conteúdo social incorporado nas relações cotidianas nelas desenvolvidas. Outrossim, o sentido de rua assumido pela pesquisa baseia-se nas discussões elaboradas por Lefebvre (1999, p. 27) ao discorrer a favor do uso dos espaços públicos, segundo o qual a rua: Não se trata simplesmente de um lugar de passagem e circulação. (...) A rua é o lugar (topia) do encontro, sem o qual não existem outros encontros possíveis nos lugares determinados (cafés, teatros, salas diversas). Esses lugares privilegiam, animam a rua e são favorecidos por sua animação, ou então não existem. Carlos (2001, 2007) é tributária da ideia de Lefebvre e se refere a rua como o lugar das experiências cotidianas. A autora acrescenta o sentido múltiplo de atividades que incluem o encontro, o lazer, mas também a troca e o trabalho. A essência do encontro apontada por Lefebvre (1999) e a multiplicidade apresentada por Carlos (2001, 2007) são características inerentes à Pompéia, Chegança e Boa Sorte que desenvolvem um comércio de proximidade física e social, na medida em que atendem à demanda de consumo local e de bairros próximos, também mantém uma clientela fidedigna no que concerne as relações de compra com o comerciante da rua. Outrossim, foram ruas que, mediante processo de produção do espaço urbano da Zona Norte de Natal, se ergueram comercialmente como resultado das práticas sócio-espaciais de seus moradores. Diante do contexto social e comercial de contra-hegemonia e proximidade elucidados nas ruas, se problematiza: como se caracteriza o comércio em Natal com destaque para as ruas Pompéia, Chegança e Boa Sorte? Que fatores contribuíram para o surgimento da atividade comercial nestas ruas? Qual a importância do comércio desenvolvido na Pompéia, Chegança e Boa Sorte para a dinâmica da atividade comercial na Zona Norte? Qual o papel social do comércio nestas ruas? 24 Norteada por tais questionamentos, a pesquisa objetiva analisar a dinâmica das atividades de comércio nas ruas Pompéia, Chegança e Boa Sorte no contexto da produção do espaço urbano da Zona Norte de Natal/RN, bem como caracterizar o comércio na cidade do Natal com base nas Regiões Administrativas, com destaque para as atividades desenvolvidas nas ruas mencionadas; discutir os fatores que contribuíram para a formação do comércio nas referidas ruas; compreender a importância do comércio nessas ruas para a dinâmica da atividade comercial na Zona Norte; analisar o papel social do comércio nas ruas Pompéia, Chegança e Boa Sorte. A escolha por se trabalhar com Pompéia, Chegança e Boa Sorte como objeto empírico, se explica pelo fato de que, nestas, há uma expressiva expansão da atividade comercial com características de pequeno porte, de gestão familiar e de proximidade física e social. Estas ruas são corredores secundários intraurbanos no contexto na Zona Norte e se constituem em lócus de representação sócio-espacial embasada por um lado, na lógica de reprodução hegemônica e, por outro, na reprodução da vida. Desta forma, o espaço revela, portanto, uma “(...) relação contraditória entre o uso dos lugares de realização da vida e os lugares produzidos como valor de troca, contradição esta que está na base dos conflitos em torno da reprodução do espaço” (CARLOS, 2011, p. 65). A utilização do conceito sócio-espacial no decurso do trabalho, está embasada na definição de Souza (2013), quando tratou dos conceitos fundantes da pesquisa sócio-espacial na Geografia. Nas palavras do autor, para se compreender e elucidar o espaço “é necessário interessar-se pela sociedade concreta, em que relações sociais e espaço são inseparáveis, mesmo que não se confundam” (SOUZA, 2013, p. 16). Para o autor, o conceito sócio-espacial está longe apenas de qualificar o espaço, como assim o faz o socioespacial, preocupando-se também com as relações sociais. O arquétipo teórico-metodológico que estrutura o conteúdo da pesquisa está baseado na tríade conceitual elaborada por Lefebvre (2000): espaço concebido, percebido e vivido. O espaço concebido é entendido como estruturas construídas pelas representações capitalistas resultantes de um saber técnico que se materializam através das ações hegemônicas; o espaço vivido é justamente aquele que se revela no âmbito das práticas sociais que diferentemente umas das outras produzem espaços variados e o espaço percebido se evidencia entre o espaço, 25 produto das ações hegemônicas de instituições como Estado, e o resultante das práticas sociais locais. Em outras palavras, é aquele é aquele que se encontra entre a ordem distante e a ordem próxima, segundo o próprio Lefebvre (2000). Se o espaço geográfico é um produto social, não é neutro, mas reflete as contradições e os conflitos sociais de sua produção. A partir de tal premissa, direciona-se o olhar para as ruas de comércio sem perder de vista o processo que engloba, desde a sua produção embasada na lógica capitalista, até a sua reprodução a partir de práticas sócio-espaciais que alteraram a sua função inicial de fundamentalmente habitacional para eminentemente comercial. Deste modo, a tríade conceitual concebido-percebido-vivido perpassa o texto em consonância com o método regressivo-progressivo também proposto por Lefebvre (2000), cuja perspectiva de investigação está organizada em três momentos: descritivo; analítico-regressivo e histórico-genérico. O primeiro momento do método trata da descrição da realidade social em evidência, cujo ponto de partida é a paisagem; o segundo momento busca, a partir da realidade descrita, fragmentá- la e historicizá-la evidenciando as coexistências dos processos sociais. O terceiro momento trata do vir a ser, ou seja, as tendências que se anunciam mediante contexto descrito e fragmentado nos momentos anteriores do método. Cada momento serviu de base para a estruturação do trabalho, o qual está dividido em quatro seções. Na segunda seção trata-se da descrição atual da atividade comercial na Pompéia, Chegança e Boa Sorte tendo como ponto de partida o comércio na cidade do Natal por Zona Administrativa. A pesquisa adotou como referência a descrição da paisagem comercial, por entender que esta é capaz de revelar a materialização dos instantes sociais presentes no estudo emquestão. A descrição da paisagem permitiu uma leitura das ruas em discussão, que em tempos de outrora foram pensadas e construídas pelas representações capitalistas resultantes de um saber técnico que se materializou através das ações hegemônicas, ou seja, o espaço concebido. Na terceira seção do trabalho analisa-se as coexistências evidenciadas na representação daquilo que está situado entre o espaço edificado como reflexo das ações hegemônicas e aquele criado e apreendido pelas agentes sociais do/no lugar. A análise das representações, podem ser compreendidas no que Lefebvre (2000) denomina de espaço percebido. 26 Na quarta seção discute-se as possíveis tendências para a produção do espaço em questão em consonância com o terceiro momento do método regressivo- progressivo de Lefebvre (2000) denominado histórico-genérico. Também chamado de o vir a ser, este momento do método constitui-se na “tentativa de retornar ao que foi anteriormente descrito, com a finalidade de reencontrar o presente, no entanto elucidado e compreendido” (VIEIRA, 2015, p.32). Para tanto, realizou-se o retorno a paisagem inicialmente descrita, posteriormente fragmentada e analisada, para então se apontar perspectivas a partir da realidade vivida. Vale salientar que embora as seções estejam norteadas consecutivamente obedecendo a tríade concebido- percebido-vivido, esta ganha substância maior empiricizada em todo o corpo do trabalho, de modo que, mesmo ao tomar como base, por exemplo, o concebido como encaminhamento da discussão da segunda seção, não foi negligenciado o percebido ou vivido, visto que na leitura do espaço geográfico, essa tríade deve ser analisada de forma indissociada. Desta forma, é imprescindível que o vivido, o concebido e o percebido sejam empregados na análise espacial inseparavelmente. Para Lefebvre (2000, p.474) “a triplicidade garante a possibilidade de uma produção sem fim, enquanto cada momento considerado separadamente ou cada oposição binária se esgota”. Do ponto de vista metodológico, a pesquisa assume um caráter analítico cuja discussão teórica envereda pela leitura dos trabalhos de Salgueiro (1996), Pintaudi (1999, 1992), Fernandes, Cachinho e Ribeiro (2000) que empreenderam discussões sobre o aparelho comercial e a sua relação com a cidade. Outras contribuições importantes para a tessitura teórica foram dadas por Carlos (2011, 2008, 2007, 2001), Lefebvre (2008, 2001, 2000, 1999, 1991), Lipovetsky (2006, 2007), Baudrillard (2010) e Bauman (2008). Esses foram fundamentais para a compreensão da produção do espaço empiricizado das ruas em análise e também da reprodução das relações sociais nelas envolvidas. Na construção deste trabalho ressalta-se a contribuição, dos estudos realizados pelo filósofo Lefebvre (2000) sobre a produção do espaço. Para tanto, o autor inicia a sua discussão trilhando caminhos sobre o sentido da produção no sentido stricto sensu. O mesmo induz a compreensão de que é preciso que se entenda as diversas relações existentes no processo de produção sem que se perca de vista aquelas que se efetivam do âmbito da família à esfera do Estado. A 27 produção, no trabalho de Lefebvre, é entendida não apenas pelo sentido economicista, mas também social. Neste sentido, Lefebvre também considera o espaço enquanto uma estrutura social na qual estão impressas as relações sociais por ela produzidas, sem desconsiderar que estas podem ser parte das relações de produção. Por esta concepção, Lefebvre (2000) aponta que a cidade, o lugar de obras diversas, é o melhor exemplo para se entender a produção do espaço e a reprodução das relações sociais. Do ponto de vista comercial, a apropriação teórica acerca de algumas obras do autor se faz ímpar no exercício da análise do comércio nas ruas estudadas, uma vez que este tece ricas considerações sobre a produção do espaço pela sociedade através de suas práticas. Essas práticas conferem ao espaço características peculiares que o tornam diferentes da ordem hegemônica estabelecida. No que se refere à análise do desenvolvimento do comércio e suas implicações sócio-espaciais na Zona Norte de Natal e também nas ruas estudadas, a apropriação teórica e empírica de alguns trabalhos foram imprescindíveis. Cita-se as obras produzidas por geógrafas do Rio Grande do Norte como Cunha (1987) que discutiu o processo da expansão territorial urbana de Natal; Araújo (2004) que analisou a história da produção do espaço na Zona Norte à luz do planejamento urbano e da gestão do território, e Paula (2010) que fez um estudo sobre a dinâmica comercial da atividade varejista moderna também na Zona Norte. Os trabalhos destas autoras favoreceram sobremaneira a contextualização da produção do espaço urbano da referida Zona Administrativa de forma a estreitar o percurso empírico da presente pesquisa. Para compartilhar com o leitor os pensamentos traçados e os caminhos percorridos, a figura 1 faz uma síntese do itinerário da pesquisa. A ilustração tem por finalidade explicitar o ponto de partida das discussões empreendidas no trabalho, a construção das decisões tomadas e os passos executados. 28 Sendo assim, conforme representado na figura 1, cada momento do método constitui-se num guia para a construção das seções do trabalho, sendo a descrição da realidade comercial concebida o ponto de partir da discussão. Após a realidade descrita, efetuou-se um movimento de regressão a fim de analisar as coexistências dos momentos sociais presentes no espaço percebido. Nomeado “a construção da realidade, a terceira seção teve por objetivo evidenciar os fatores de formação do comércio nas ruas Pompéia, Chegança e Boa Sorte, considerando o processo de expansão urbana e comercial de Natal mais especificamente da Zona Norte. A figura 1 ainda apresenta a estrutura da quarta seção elaborada com base no procedimento histórico-genérico, cujo propósito esteve envolto na reconstrução da realidade descrita e analisada. Este procedimento esboçou o vir a ser com base no espaço vivido. Em outras palavras, apresentou a tendência crescente do comércio nas ruas estudadas mostrando que, a partir das práticas sócio-espaciais Fonte: Elaboração da autora, 2017. Figura 1 – Síntese do itinerário da pesquisa 29 na Pompéia, Chegança e Boa Sorte, a função nestas ruas se projetará substancialmente para o comércio. O caminho traçado se encerra na relação cidade e comércio visto que o processo de produção do espaço urbano de Natal, que demandou a expansão do comércio para outras localidades da cidade, fez com que novas práticas fossem emergindo e se reproduzindo no espaço. A discussão feita sobre comércio e cidade, empiricizada no início e no final da pesquisa e representada no trabalho, ratifica sua relação de origem e indissociabilidade. No que se remete aos procedimentos técnicos, a pesquisa de campo exploratória se constituiu na principal fonte de referência, visto que no Rio Grande do Norte os bancos de dados sobre a atividade comercial são ainda pouco explorados e com informações pouco depuradas. Desse modo, foi realizada a priori, uma categorização do comércio existente nas ruas Pompéia, Chegança e Boa Sorte, cujo ponto de partida constituiu-se na descrição da forma comercial nas referidas. Após essa descrição e anotação de cada segmento existente, foi realizada a categorização de cada estabelecimento comercial e de serviços adotando como referência a Classificação Nacional de Atividades Econômicas (CNAE) versão 2.2/2015. Esta categorização também auxiliou na tomada de decisão no que se remete à quantidade de formulários a serem aplicados considerando o total de estabelecimentos. Para melhor compreensão dos procedimentos metodológicos e técnicos, está disposto no quadro 1 uma síntesecompondo as questões norteadoras da pesquisa, os objetivos e os procedimentos adotados. 30 Quadro 1 – Síntese dos procedimentos metodológicos QUESTÕES OBJETIVOS PROCEDIMENTOS METODOLÓGICOS Como se caracteriza o comércio em Natal tendo por referência as Regiões Administrativas, com destaque para as ruas Pompéia, Chegança e Boa Sorte? Caracterizar o comércio em Natal tendo por referência as Regiões Administrativas, com destaque para as ruas Pompéia, Chegança e Boa Sorte. - Pesquisa de campo com base na observação do comércio em Natal por Zona Administrativa e categorização dos estabelecimentos nas ruas Pompéia, Chegança e Boa Sorte para a descrição das atividades nos recortes mencionados; - Aplicação de formulários a uma amostra não probabilística a comerciantes e uma amostra por conveniência a consumidores para descrever o perfil do comércio nas ruas estudadas; - Pesquisa documental em fontes como IBGE, SMUT, SEMURB para obter dados sobre formalização da atividade comercial nas ruas e também indicares sociais nos recortes espaciais pesquisados; - Pesquisa bibliográfica que subsidiou o entendimento científico do objeto empírico. Quais os fatores que contribuíram para o surgimento do comércio nas ruas Pompéia, Chegança e Boa Sorte? Discutir os fatores que contribuíram para a formação das ruas de comércio Pompéia, Chegança e Boa Sorte. - Pesquisa de campo com realização de entrevista com os primeiros moradores e/ou comerciantes e consumidores das ruas, para com base na análise de conteúdo, identificar a história de formação das ruas e também do comércio nelas existente; - Pesquisa bibliográfica que subsidiou o entendimento científico do objeto empírico. Qual é o papel social no comércio nestas ruas? Analisar o papel social do comércio nas ruas Pompéia, Chegança e Boa Sorte. - Aplicação de formulários a uma amostra não probabilística a comerciantes e uma amostra por conveniência a consumidores que ajudaram a entender o perfil atual do comércio nas ruas estudadas que pudessem ser pensadas nas perspectivas; - Produção de representações cartográficas, a partir do uso de técnicas de geoprocessamento, para demonstrar a espacialização das ruas de comércio no que diz respeito ao fluxo de pessoas e mercadorias. - Pesquisa bibliográfica que subsidiou o entendimento científico do objeto empírico. Fonte - Elabora da autora, 2016. 31 32 2. DESCREVENDO A REALIDADE A presente seção realiza uma caracterização sumária da atividade comercial na cidade do Natal/RN para, em seguida, se aprofundar na descrição do comércio da Zona Norte, com atenção especial direcionada às ruas Pompéia, Chegança e Boa Sorte. Para tanto, metodologicamente, o ponto de partida é observação e descrição da paisagem atual do comércio nestes recortes espaciais, na medida em que este conceito geográfico permite a interpretação dos instantes históricos, sociais e culturais de produção do espaço pela sociedade. De acordo com Carlos (2008, p. 48): A paisagem é humana, histórica e social e se justifica; existe pelo trabalho do homem, ou melhor, da sociedade que a cada momento ultrapassa a anterior. É produzida e justificada pelo trabalho considerado como atividade transformadora do homem social, fruto de um determinado momento das forças produtivas, e que aparece aos nossos olhos, através do tipo de atividade, do tipo de construção, etc. No trabalho estruturado a partir do método regressivo-progressivo, Vieira (2002, p.27), ao analisar do processo de revalorização do centro da cidade de São Paulo, também utiliza o conceito de paisagem, ressaltando que: A bem da verdade, este momento do método resgata uma categoria bastante cara aos geógrafos, tal seja, a paisagem. Afinal, os elementos da paisagem guardam em si a aparência da realidade. São mais do que isto é verdade, mas em um primeiro momento é o que mostram: a aparência. Vale salientar que, assim como no trabalho desenvolvido por Vieira (2002), a paisagem é adotada como ponto de partida por se configurar como recurso de investigação fundamental ao que sugere o primeiro momento do método regressivo- progressivo. Desta forma, a descrição da paisagem comercial dos recortes espaciais propostos, principalmente das ruas Pompéia, Chegança e Boa Sorte, a partir deste conceito geográfico se realiza sem a preocupação, a priori, de relacionar a diversidade das relações sociais com sua data de origem, afinal este é o momento de descrever o que se mostra aparente. Na pesquisa, o olhar está voltado principalmente para a descrição da paisagem comercial no recorte empírico representado nas ruas Pompéia, Chegança e Boa Sorte, que em tempos de outrora foram pensadas e construídas pelas representações capitalistas resultantes de um saber técnico que se materializou 33 através das ações hegemônicas, ou seja, o espaço concebido. Este último é entendido como espaços materializados pelas intenções capitalistas das relações de produção ligados ao conhecimento, é o espaço fecundado pela ordem distante. Parafraseando Lefebvre (2000, p. 67): O espaço concebido é aquele dos cientistas, dos planifica dores, dos urbanistas, dos tecnocratas retalhadores e gerenciadores, de certos artistas próximos da cientificidade, identificando o vivido e o percebido ao concebido (o que perpetua as sábias especulações sobre os Números: o número de ouro, os módulos e canhões). É o espaço dominante numa sociedade (um modo de produção). Em consonância com o pensamento de Lefebvre (2000), a presente seção está dividida em duas partes: na primeira constitui-se uma breve apresentação da atividade comercial na cidade do Natal, adotando por referência o comércio e os serviços em cada Zona Administrativa. Na segunda parte descreve-se o comércio na Zona Norte, com destaque para a presença desta atividade nas ruas Pompéia, Chegança e Boa Sorte, objeto empírico da pesquisa, como pode ser lido na sequência. 2.1. NATAL/RN: A ATIVIDADE COMERCIAL EM FOCO O município de Natal, capital do Rio Grande do Norte, está localizado na Mesorregião Leste Potiguar, mais especificamente na Microrregião de Natal. O município se limita ao Norte com Extremoz, ao Sul com Parnamirim, ao Leste com o Oceano Atlântico e ao Oeste com São Gonçalo do Amarante e Macaíba. Natal teve o seu território considerado institucionalmente totalmente urbano em 1984 quando áreas rurais, que atualmente correspondem à Zona Norte, foram incorporadas ao perímetro urbano pelo plano diretor-Lei 3.175/84. Contribuíram para esse processo, a contundente atuação da indústria naquela área, que por sua vez, atraiu a atenção do Estado que atuou fortemente por meio da política habitacional, consolidada pela construção de conjuntos habitacionais pela COHAB. Vidal (1998, p.18), ao discutir a expansão urbana de Natal em direção à Zona Norte, aponta que: A partir de então a população da cidade passou a ser considerada urbana. (...) principalmente em decorrência da construção intensiva de conjuntos habitacionais pela COHAB, que ampliou a cidade aos limites geográficos do município, extinguindo as áreas rurais 34 A total urbanização da capital potiguar necessitou da ampliação de serviços e de infraestrutura de modo que, para a gestão estratégica dos 167, 263 Km² da cidade1, efetivou-se a sua divisão em Zonas Administrativas: Leste, Oeste, Norte e Sul, criadas pela Lei Ordinária nº 03878/89. Os critérios para a divisão em Zonas Administrativas levaram em consideração aspectos físicos e naturais da cidade como também as demandas administrativas a fim de gerar tendências descentralizadoras político/gerenciais. A cidade é composta por 36 bairros (mapa 2) agrupados nas zonas administrativas mencionadas e possui uma população de 803.739 habitantes e uma densidade demográfica de47,69 hab/ha, (SEMURB, 2014). 1 Em virtude da total urbanização de Natal/RN e pela própria indefinição legislativa em diferenciar cidade e município no que se refere ao recorte espacial em questão, a pesquisa adota o conceito de cidade, visto que já não existem espaços rurais na capital potiguar. 35 Mapa 2 – Natal/RN: Zonas Administrativas e Bairros - 2017 Fonte: Secretaria Municipal de Meio Ambiente e Urbanismo de Natal/RN, 2014. Adaptação da autora, 2017. 36 De acordo com o Censo Demográfico do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) (IBGE, 2010), a Zona Leste é a menor zona administrativa do ponto de vista territorial, com 1.614,76 ha (2), cuja população é de 115.297 habitantes, correspondente 14, 35 % da população total de Natal. Essa Zona Administrativa possui o menor percentual populacional da cidade, no entanto é a de maior densidade demográfica com 71, 40 hab/ha. Esta porção da cidade é composta pelos bairros Santos Reis, Rocas, Praia do Meio, Cidade Alta, Petrópolis, Areia Preta, Mãe Luiza, Alecrim, Barro Vermelho, Ribeira, Tirol e Lagoa Seca. A renda média mensal da Zona Leste é de 2,86 salários mínimos – SM. Os bairros que dispõem de população de maior poder aquisitivo são Petrópolis e Tirol, com um rendimento médio mensal de 6,74 e 6,46 SM, consecutivamente, (SEMURB, 2012). Esses se desenvolveram consideravelmente na década de 1940 por meio da articulação que existia entre as avenidas Hermes da Fonseca e Salgado Filho com o Aeroporto Augusto Severo em Parnamirim, de modo que esta conexão possibilitou o crescimento de Natal a partir dos bairros mencionados que abrigavam pessoas de alto poder aquisitivo e político, logo na Segunda Grande Guerra. Diferentemente do evidenciado em Petrópolis e Tirol, Mãe Luiza, que possui a segunda maior densidade demográfica dentre os 36 bairros de Natal com 156,33 hab/ha, é o bairro de maior vulnerabilidade econômica da Zona Leste, com um rendimento médio mensal de 0,87 SM - SEMURB, 2012 - ou seja, menos do que o estipulado enquanto um valor considerado apropriado para uma vida em situação de sobrevivência. O mesmo pode ser dito de quase 23, 28% da população desta área que apresenta um rendimento mensal de meio até um salário mínimo. Isto significa que quase ¼ das pessoas que residem na Zona Leste vive abaixo da linha da pobreza que estabelece um rendimento diário de 7,32 R$ no caso do Brasil3. Do ponto de vista comercial, ao se fazer a descrição da paisagem da Zona Leste, se faz indispensável à alusão ao comércio dos bairros Alecrim, Cidade Alta e Ribeira que historicamente são referência da referida atividade na capital potiguar. 2 1 hectare equivale a 10.000m² ou 0,01 Km² 3 Informação coletada do site da BBC Brasil com base em informações fornecidas pelo banco mundial. Fonte: http://www.bbc.com/portuguese/noticias/2015/10/151009_reducao_pobreza_banco_mundial_ac_lgb http://www.bbc.com/portuguese/noticias/2015/10/151009_reducao_pobreza_banco_mundial_ac_lgb 37 Estes, além de serem emblemáticos no processo de formação de Natal, também se configuraram como áreas tradicionais de comércio. O comércio do Alecrim apresenta uma diversidade de mercadorias e se constitui como referência para os potiguares no quesito preço baixo, variedades e exclusividade de mercadorias da cultura tradicional. “Tudo que você procura tem no Alecrim”! Essa é a frase comumente mais escutada quando o assunto é o comércio neste bairro; isso porque a atividade dispõe de mercadorias já não comercializadas no restante da cidade como utensílios domésticos tradicionais, por exemplo: colher de pau, raspador de côco, mangai e também lojas especializadas em chás, licores e outros. Esse comércio, pela sua pluralidade, tanto no que concerne ao tipo de mercadoria quanto ao público atendido, apresenta uma intensa dinâmica de pessoas e informações. Difícil mesmo é percorrer as ruas de grandes dimensões comerciais no Alecrim sem chocar-se fisicamente com as pessoas. No quesito vendas, este bairro permanece na liderança do ranking do comércio popular na cidade. Diante dessa pluralidade destaca-se o camelódromo, construído pelo poder público na década de 1980, como uma tentativa de resolver os conflitos entre ambulantes e comerciantes do bairro. Trata-se de uma forma comercial constituída de um aglomerado de pequenas lojas de comércio informal no centro de maior movimentação comercial do bairro. Aliás, a informalidade não é uma característica inerente apenas ao camelódromo, mas também ao comércio de rua que se territorializa nas calçadas de forma que os ambulantes chegam a misturar-se com os próprios consumidores, tornando-se difícil diferenciá-los dos transeuntes. A este respeito, cabe mencionar a presença de serviços ambulantes de alimentação que ocupam as ruas ou mesmo as calçadas das lojas. De longe é possível escutar o som que ecoa sem cerimônia: “olha a água de côco geladinha!”, “Cocada, só um real!”, “Olha o picolé Caicó!!!” Aliás, difícil é identificar de onde vem cada som especificamente, uma vez que, na prática da venda ambulante, as vozes se misturam. Assim também acontece com os vendedores de lojas que ficam na porta do estabelecimento convidando o transeunte para “dar uma olhadinha”! Essa prática de abordar o cliente é comum, exceto para o popularmente conhecido “comércio chinês”, que está ocupando cada vez mais espaço no comércio do Alecrim e atraindo um público interessado na variedade de mercadorias de baixíssimo preço. 38 As ruas são também corriqueiramente disputadas entre pedestres e veículos, públicos e privados, porque é justamente no centro comercial do Alecrim, no cruzamento das avenidas Presidente Bandeira com Coronel Estevam, sentido Zona Sul-Cidade Alta, que existe um ponto nodal da rede de transporte público da cidade. Do ponto de vista das atividades de comércio e de serviços, situação similar é encontrada no Bairro Cidade Alta, também com a marcante presença do comércio varejista com lojas de pequeno e grande porte. O comércio de Cidade Alta apresenta um mister com estabelecimentos que vão desde lojas de departamento como Riachuelo e CeA a pequenas lojas de roupas e calçados. A grande concentração da atividade se estende ao longo da Avenida Rio Branco, um corredor de passagem que se constitui numa via que interliga o bairro ao comércio do Alecrim e da Ribeira. Ainda que com toda a expressividade do ponto de vista comercial, a Cidade Alta também apresenta serviços representativos para Natal no que concernem a equipamentos de ordem administrativa como órgãos públicos de poder executivo federal e municipal, a exemplo do Centro Administrativo e da Prefeitura Municipal; e de ordem judiciária como a Assembleia Legislativa, o Tribunal de Justiça do Rio Grande do Norte; de saúde como a Secretaria de Saúde. Também existem equipamentos religiosos como a Catedral Metropolitana e as igrejas históricas - Igreja do Galo, Igreja de Nossa Senhora da Apresentação (antiga catedral da cidade) e Igreja de Nossa Senhora do Rosário dos Pretos. Esses espaços apresentam estrutura arquitetônica de influência portuguesa com a formação de praças e largos. A cultura está representada por meio de museus e exploração de lugares e prédios históricos e atrações similares, como também outros segmentos do comércio e de serviços. Pode-se inferir que a Cidade Alta se constitui num lócus importante de estruturação do poder. Mesmo com a descentralização das atividades comerciais do Alecrim, Cidade Alta e Ribeira, na década de 1980, em virtude da expansão do terciário em Natal e também pelademanda de consumo da população de outras áreas da cidade, os dois primeiros bairros conseguiram manter a condição de centros comercias. No entanto, o bairro da Ribeira é recorrentemente lembrado pelo papel que assume na história da cidade, apesar da existência de alguns serviços e do comércio atacadista e especializados. Neste bairro, alguns prédios são emblemáticos, do ponto de vista histórico, por terem servido ou ainda estarem em condições de servirem de cenário 39 para grandes eventos ocorridos na cidade. A este respeito, fazem-se salutares alguns exemplos como a antiga Capitania dos Portos, a Antiga Escola Doméstica de Natal, o Antigo Palácio do Governo, a Casa Câmara Cascudo, a Casa onde nasceu Café Filho, o Teatro Alberto Maranhão, o Solar Bela Vista e outros. Ainda que a Ribeira seja referência quando se trata da história da cidade, cabe lembrar a existência de alguns serviços que se encontram no bairro como a Fundação de Proteção e Defesa do Consumidor (PROCON), o Instituto Técnico- Científico de Polícia do Rio Grande do Norte (ITEP) e serviços voltados para a população estudantil como o NatalCard, com a oferta de confecção de carteira de estudante. A Ribeira representa, junto com a Cidade Alta, o berço histórico e cultural de Natal. Nesses bairros semanalmente ocorrem programações com música ao vivo, como é o caso do Beco da Lama na Cidade Alta, cujo nome justificado pelo lamaçal que se formava na rua não pavimentada – Coronel Cascudo – durante as chuvas na segunda metade do século XX. No Beco da Lama alguns espaços são promotores da vida noturna, a exemplo do Bar da Meladinha, famoso por servir uma bebida à base de aguardente, limão e mel; e o Bar da Nazaré que inclui na sua programação grupos de samba. As atividades de lazer também se inserem em praças públicas da Cidade Alta, a exemplo do samba que acontece todas as quintas-feiras na praça André de Albuquerque, popularmente conhecida como Praça Vermelha. Essa atividade não recebe investimentos do poder público, sendo desencadeada pela iniciativa dos ambulantes que, juntos, contratam o grupo musical a fim de atrair apreciadores da boa música. Na Ribeira, representações culturais se fazem presentes no Teatro Alberto Maranhão e na Casa da Cultura, esta última sendo um espaço que recebe grupos de todo o país e promove eventos como o circuito cultural que ocorre na Rua Chile, localizada na área do centro histórico, composta de prédios antigos como armazéns que estocavam os produtos que eram escoados pelo porto. No entorno desta rua também estão localizados bares que atraem a população boemia como o Buraco da Catita, Consulado Bar, Atelier Bar, Bar Central Ribeira e outros que, juntos, compõem um dos espaços da manifestação musical formada por rodas de choro na cidade. 40 Os três bairros, Alecrim, Cidade Alta e Ribeira, se destacam em termos de comércio na Zona Leste. Nesta zona administrativa a expressão de centralidade no segmento de saúde é conferida aos bairros de Petrópolis e Tirol por concentrarem equipamentos de saúde que atendem às pessoas da cidade e de outros lugares, como clínicas de exames laboratoriais diversos a exemplo do: Centro Clínico da Dor, Clínica de Urologia de Natal, Centro Integrado de Reumatologia. Outrossim, estão localizados nestes bairros hospitais como: Hospital Municipal de Natal, Natal Hospital Center, Hospital de Olhos do Rio Grande do Norte, Hospital Memorial, Hospital Universitário Onofre Lopes e Hospital Monsenhor Walfredo Gurgel/Pronto Socorro Dr. Clóvis Sarinho. No que concerne aos serviços de educação e lazer, Petrópolis e Tirol são expressivos no âmbito da Zona Leste. Em Petrópolis localizam-se: Cidade da Criança, Atheneu Norte-Riograndense, UNI-RN, Instituto Maria Auxiliadora (IMA), Palácio dos Esportes, Praça Cívica e Câmara Municipal de Natal. Em Tirol cita-se: Colégio Marista de Natal, Museu Câmara Cascudo/UFRN, Liga de Ensino do Rio Grande do Norte (Escola Doméstica de Natal (ED)/Colégio Henrique Castriciano (HC)/ Faculdade Natalense para o Desenvolvimento do Rio Grande do Norte (FARN), 16º Batalhão de Infantaria Motorizado, Shopping Midway Mall, Aeroclube do Rio Grande do Norte, Associação Atlética Banco do Brasil (AABB-Natal), Educandário Oswaldo Cruz, Instituto Federal do Rio Grande do Norte (IFRN - Campus Central), Estádio Juvenal Lamartine, Hotel Tirol, Sede Social do América Futebol Clube e Seminário de São Pedro. No tocante à Zona Oeste, esta é a segunda menor porção administrativa de Natal em termos de área correspondente a 3.575, 89 ha, (SEMURB, 2012). No entanto, a sua população é de 218.405 habitantes, a segunda maior da cidade, correspondente 27,17 % do total de Natal. Essa zona administrativa também possui a segunda maior densidade demográfica com 61, 08 hab/ha, de acordo com o censo demográfico do IBGE, 2010. Esta porção da cidade é composta pelos bairros Quintas, Nordeste, Dix-Sept Rosado, Bom Pastor, Nossa Senhora de Nazaré, Felipe Camarão, Cidade Nova, Guarapes e Planalto. O rendimento médio mensal da Zona Oeste é de 0, 99 SM, menor do que a média da cidade que é de 1,78 SM, (SEMURB, 2012). Os bairros que dispõem de população de maior poder aquisitivo são Cidade da Esperança e Nossa Senhora de Nazaré com um rendimento médio mensal de 1,67 e 1,47 SM, respectivamente, (SEMURB, 2012). O restante dos 41 bairros tem rendimento abaixo de 1 SM (IBGE, 2010). Esta área da cidade possui um padrão de habitação popular, principalmente no Bairro Guarapes e no Conjunto Habitacional Leningrado, localizado no Bairro Planalto, onde parte da população adquire a renda a partir da coleta e venda de resíduos recicláveis. No que se refere ao Guarapes, o rendimento médio mensal é de apenas 0,53 SM - SEMURB, 2012 - ou seja, praticamente meio salário mínimo. De acordo com Souza (2008), ao discutir a história de formação da capital potiguar, Guarapes só foi elevado à condição de bairro com casas de alvenaria, ruas asfaltadas e avenidas bem traçadas, na primeira metade da década de 1990, visto que até os anos de 1980 as residências eram quase todas feitas de palha. A Zona Oeste, onde está localizado o bairro supracitado, possui os piores indicadores socioeconômicos. Silva (2003, p.12), ao analisar o processo de produção do espaço com base nas construções irregulares, afirma que: das quatro Regiões Administrativas, as Zonas Norte e Oeste apresentam-se como os loci da pobreza na cidade, contrastando com as Zonas Leste e Sul, onde o maior poder aquisitivo da população e a melhor oferta de serviços públicos podem ser encontrados. Do ponto de vista comercial, a Zona Oeste apresenta um padrão comercial similar ao perfil econômico e social da população, anteriormente descrito. No geral são equipamentos do varejo, atacado e serviços de pequenas proporções físicas e que, geralmente, atendem a um público de poder aquisitivo menos elevado. No entanto, existem alguns segmentos específicos a esta porção da cidade, a exemplo, dos serviços de saúde como o Hospital Giselda Trigueiro, especializado no tratamento de doenças infectocontagiosas e o Hospital Dr. Luiz Antônio – Liga Norte-Riograndense Contra o Câncer, ambos localizados no Bairro das Quintas. O Bairro Nossa Senhora da Esperança, localizado na Zona Oeste, dispõe de atividades de serviço importantes como o Departamento Estadual de Trânsito (DETRAN), a rodoviária e o Terminal de Integração de Transportes Urbanos de Natal. Também existem serviços de segurança como a Delegacia Especial de Furtos e Roubos. No que concerne ao comércio, este não apresenta especificidade de acordo com o evidenciado no restante da zona administrativa. Cita-se, entre outras categorias, o comércio atacadista de alimentos, vestuário, medicamentos, de máquinas e produtos de uso agropecuário. No varejo, existe a presença marcante 42das lojas de materiais de construção, artigos para festas, vestuário e acessórios e outros. No que se refere à Zona Administrativa Sul, esta possui a segunda maior área territorial, com 4.570, 11 ha, (SEMURB, 2012). Mesmo com estas dimensões territoriais, esta porção da cidade possui a segunda menor população em relação às demais Zona Administrativas, com 166.491 habitantes (SEMURB, 2012), correspondente a 20,71% da população total de Natal. Não chegando a representar ¼ da população total da capital potiguar, a Zona Sul possui a menor densidade demográfica da cidade com números que revelam 36, 43 hab/ha (IBGE, 2010). Do ponto de vista financeiro, a população da Zona Sul apresenta o maior rendimento médio mensal com 3,45 SM, (SEMURB, 2012). Os seus bairros constituintes são Lagoa Nova, Nova Descoberta, Candelária, Capim Macio, Pitimbu, Neópolis e Ponta Negra. Dentre estes, a população de maior poder aquisitivo está localizada nos bairros Capim Macio e Candelária com rendimento mensal de 4,71 e 4,35 SM, respectivamente. O Bairro de Nova Descoberta, que tem a maior densidade demográfica dentre os demais bairros, com 78,50 hab/ha, possui a população de menor poder aquisitivo da Zona Administrativa em questão, com rendimento de 2,07 SM (IBGE, 2010). A Zona Sul é um dos principais espaços de reprodução da atividade turística, sendo esta de expressiva importância para a economia da cidade. Quando se põe em evidência os aspectos que caracterizam a Zona Sul, torna-se emblemático a concentração de renda da população e investimentos de infraestrutura como grandes avenidas, concentração de shoppings, serviços de saúde, educação, comércio e lazer. A este respeito, menciona-se Hiper Bompreço, Nordestão, Shopping Centers, Sam's Club Natal, Carrefour, Makro Natal, Centro Administrativo do Estado do Rio Grande do Norte, Campus Central da Universidade Federal do Rio Grande do Norte, Estádio de Futebol Arena das Dunas, Parque da Cidade Dom Nivaldo Monte e Sede da Igreja Universal do Reino de Deus no RN. A maioria destes equipamentos está localizada nas vias expressas de circulação, como por exemplo as avenidas Senador Salgado Filho e Engenheiro Roberto Freire, conforme denominadas por Gomes; Silva; Silva (2002). Nelas estão concentrados grandes investimentos do setor terciário moderno como bancos, hotéis, faculdades, casas de shows, Shopping Centers e outros equipamentos que tem a sua localização justificada pela intensa dinâmica de pessoas, mercadorias e https://www.google.com.br/search?es_sm=93&q=shoppings+center&spell=1&sa=X&ved=0CBoQvwUoAGoVChMI_M7qgPaCxwIVQYiQCh1xswP7 https://www.google.com.br/search?es_sm=93&q=shoppings+center&spell=1&sa=X&ved=0CBoQvwUoAGoVChMI_M7qgPaCxwIVQYiQCh1xswP7 43 informações. Nas palavras de Gomes; Silva; Silva (2002, p. 295) “as vias expressas de circulação, isto é, as grandes avenidas, têm no contexto da cidade, uma função importante: permitir a articulação de todo o território da cidade [...]”. Os Shopping Centers, construídos na década de 1990, agregaram valorização econômica e social para a Zona Sul atraindo novos equipamentos. Nesse processo, a instalação dos shoppings promoveu a dinamização do espaço de sua localização, a exemplo das avenidas Bernardo Vieira, Salgado Filho e Engenheiro Roberto Freire representadas na foto 1. No que se refere à Zona Norte, esta apresenta as maiores dimensões territoriais em relação às demais zonas administrativas da cidade. Com um total de 5.888,50 ha, representa quase 35% de todo o território da capital potiguar e sua população é de 303.543, o que equivale a 37,77% da população total de Natal (SEMURB, 2012). Essa porção da cidade concentra o maior contingente Foto 1 - Principais Avenidas da Zona Sul de Natal/RN/2015 Imagem 1 e 2 – Avenida Bernardo Vieira na qual localiza-se o Shopping Midway Mall Imagem 3- Avenida Salgado Filho na qual localizam-se os shoppings Via Direta e Natal Shopping Imagem 4- Avenida Engenheiro Roberto Freire na qual localizam-se os shoppings Cidade Jardim e Praia Shopping Fonte: Acervo da autora, 2015. https://www.google.com.br/search?es_sm=93&q=shoppings+center&spell=1&sa=X&ved=0CBoQvwUoAGoVChMI_M7qgPaCxwIVQYiQCh1xswP7 https://www.google.com.br/search?es_sm=93&q=shoppings+center&spell=1&sa=X&ved=0CBoQvwUoAGoVChMI_M7qgPaCxwIVQYiQCh1xswP7 44 populacional da capital potiguar e apresenta uma densidade demográfica de 51,55 hab/ha, de acordo com o censo demográfico do IBGE (2010). A Zona Norte é composta pelos bairros Lagoa Azul, Pajuçara, Potengi, Nossa Senhora da Apresentação, Redinha, Igapó e Salinas, conforme apresentado no Mapa 2. Dentre estes, a maior densidade demográfica está no Bairro de Igapó, cuja área é de 220,16 ha, a menor dessa zona administrativa, no entanto apresenta 130,90 hab/ha, (SEMURB, 2012). No que se refere à renda média mensal da população da Zona Norte, o valor é de 0,92 SM, abaixo do valor estipulado para um salário mínimo, (SEMURB, 2012). O único bairro a atingir níveis acima de 1 SM é Nossa Senhora da Apresentação com 1,23 SM. O caso mais expressivo é o de Salinas, que detém o rendimento de 0,46 SM, não só o pior no âmbito da Zona Norte, mas também de toda a cidade do Natal. Este bairro, mesmo com a terceira maior área da Zona Norte – 1.031,22 ha, possui densidade demográfica de apenas 1,14 hab/ha (IBGE, 2010). Isto pode ser justificado devido a sua proximidade com o mangue e também com a inundação quase que total do bairro provocada pela elevação dos níveis do Rio Potengi, em virtude da sua proximidade com a mar. Este bairro apresenta altos índices de violência urbana e também precariedade quantos aos serviços básicos de saúde e saneamento básico. A Zona Norte, de modo geral, tem um perfil de construção civil eminentemente horizontal. Isso segue o Plano Diretor de Natal que proíbe construções na zona acima de 7,5 metros de altura. As justificativas para tal medida se devem ao desequilíbrio entre saneamento básico e o considerável adensamento do solo. Entretanto, mesmo com o elevado contingente populacional, esta zona da cidade tem apresentado crescimento expressivo, principalmente para quem paga aluguel, em virtude de preços mais acessíveis em comparação com outras áreas da cidade, (SEMURB, 2012). O território desta porção da cidade foi expressivamente ocupado por conjuntos habitacionais entre as décadas de 1980 e 1990, principalmente para atender à necessidade de moradia para a mão-de-obra empregada na indústria e na construção civil em vigência neste período. Esses conjuntos foram construídos pelo Estado por meio da atuação da COHAB, de modo que atendeu a parcial necessidade de moradia no contexto de expansão urbana de Natal em direção à Zona Norte. Em concomitância a estes, também surgiu um grande número de 45 loteamentos (Mapa 3) que dividirão o solo urbano desta zona da cidade em lotes destinados à edificação para fins de moradia para a população que não fora beneficiada com residência em conjunto habitacional. No que tange ao comércio, segundo Mendes (2013), a Zona Norte “é a região da cidade que mais cresce economicamente”, principalmente no que se refere ao comércio tradicional, este tipo de comércio entendido como aquele de pequeno porte, de base familiar e principalmente que não se utiliza do autosserviço. Isto não quer dizer que o comércio moderno não tenha repercussão nesta porção da cidade. Este último está bem representado nas principais vias expressas de circulação como as avenidas Doutor João Medeiros Filho e Bacharel Tomas Landim. Nestas percebe- se a presença de grandes lojas especializadas, de Shopping Centers, redes de supermercados e outros. Próximo a essas avenidas, desenvolveram-se em corredores secundários intraurbanoscomo ruas Pompéia, Chegança e Boa Sorte, um comércio de mercadorias eminentemente populares e de baixo preço, com lojas não especializadas e de estabelecimentos de menores proporções físicas. Por se tratar da área de estudo da presente pesquisa, mais informações sobre essas ruas serão aprofundadas na subcessão seguinte. Esta se deterá de forma pormenorizada, não apenas do comércio da Zona Norte, mas também e principalmente, nas ruas Pompéia, Chegança e Boa Sorte. LEGENDA Conjuntos habitacionais Loteamentos Mapa 3 - Conjuntos Habitacionais e Loteamentos na Zona Norte/2016 Fonte: Secretaria Municipal de Meio Ambiente e Urbanismo, 2014 https://www.google.com.br/search?es_sm=93&q=shoppings+center&spell=1&sa=X&ved=0CBoQvwUoAGoVChMI_M7qgPaCxwIVQYiQCh1xswP7 https://www.google.com.br/search?es_sm=93&q=shoppings+center&spell=1&sa=X&ved=0CBoQvwUoAGoVChMI_M7qgPaCxwIVQYiQCh1xswP7 46 2.1.1. A ATIVIDADE COMERCIAL NA ZONA NORTE DE NATAL/RN O processo de expansão urbana de Natal, na década de 1980, fez com que as atividades comerciais também se expandissem para atender à demanda da população. Nesse período inicia-se o processo de descentralização do comércio do varejo moderno, até então concentrados nos bairros do Alecrim e da Cidade Alta, passando a localizar-se inicialmente nas principais vias expressas de circulação na Zona Sul. A partir da década de 1990, esse varejo moderno também começou a se fazer presente na Zona Norte, nos principais eixos articuladores desta área: avenidas Bacharel Tomaz Landim e Doutor João Medeiros Filho. Em paralelo ao processo de incorporação do varejo moderno nestas avenidas principais, o comércio tradicional firmou-se em corredores secundários intraurbanos como as ruas Pompéia, Chegança e Boa Sorte, fato que contribuiu para a dinâmica comercial da Zona Norte. Assim sendo, na Zona Norte de Natal, a atividade comercial se expressa de duas formas: uma correspondente ao comércio constituído principalmente pelo varejo moderno, que se espacializa em seus principais eixos articuladores; e a outra representada pelo comércio tradicional marcadamente presente nas ruas Pompéia, Chegança e Boa Sorte, que atendiam a função residencial e foram transformadas, sendo quase que totalmente ocupadas, pela atividade comercial com estabelecimentos de pequenas lojas generalistas, de base predominantemente familiar e de caráter de proximidade. O emprego dos conceitos de comércio moderno e tradicional baseia-se nas discussões elaboradas pelos geógrafos portugueses Fernandes; Cachinho e Ribeiro (2000, p.11), ao discorrerem sobre o comércio retalhista português. Para estes autores, há atributos que diferenciam essas duas expressões, considerando várias dimensões de análise (Quadro 2): Quadro 2 - Atributos do comércio varejista moderno e tradicional, segundo Fernandes; Cachinho e Ribeiro (2000) DIMENSÕES DE ANÁLISE ATRIBUTOS DO COMÉRCIO VAREJISTA TRADICIONAL MODERNO Formato das lojas Pequenas lojas generalistas; Pequenas lojas especializadas; Feiras. Grandes superfícies especializadas; Centros comerciais; Grandes superfícies alimentares: supermercados, hipermercados, etc. 47 Formas de venda Relação estreita entre comerciante e consumidor; Venda ao balcão. Venda automática e a distância; Presença do autosserviço. Tipo de comerciante Pequenos retalhistas; Comerciantes independentes. Grandes cadeias de distribuição; Redes sucursalistas. Estratégia de gestão das empresas Predomínio da gestão familiar. Gestão estratégica (capitalista). Localização: lugares e princípios Proximidade, vizinhança; Bairros residenciais. Acessibilidade; Grandes artérias da cidade. Fonte: Fernandes; Cachinho e Ribeiro, 2000 (adaptação da autora, 2016). Ao analisarem a realidade portuguesa, Fernandes; Cachinho e Ribeiro (2000) compreendem o comércio tradicional como uma classe da atividade comercial que se contrapõe às novas formas (centros comerciais, hipermercados, supermercados, grandes superfícies especializadas etc.) no contexto da “Revolução Comercial”. Esta caracteriza-se em linhas gerais, pela introdução de novas formas de organização e gestão das atividades no interior dos estabelecimentos, introdução de novas tecnologias, novas formas de venda e a implantação do autosserviço. Para os autores, “o aparelho comercial tradicional, é formado por pequenos estabelecimentos, generalistas ou especializados na oferta de um número reduzido de produtos afectos a ramos de actividade específicos” (FERNANDES; CACHINHO e RIBEIRO, 2000, p. 10). Neste tipo de comércio os estabelecimentos são geridos essencialmente por pequenos empresários, comerciantes independentes e pequenas sociedades por quota. Do ponto de vista de venda, o comércio moderno dispõe do autosserviço ao passo que o comércio tradicional privilegia a venda a balcão, isto porque: (...)de pequena dimensão, os estabelecimentos tradicionais alicerçavam a arte de comerciar na venda ao balcão, no contacto direto com o cliente e no atendimento personalizado. O comerciante não só vende mercadorias como também presta um serviço; expõe os artigos, informa os clientes sobre as suas características e ajudando-a a tomar decisões”. (FERNANDES; CACHINHO E RIBEIRO, 2000, p.11-12). No que concerne às estratégias de gestão dos empreendimentos, a grande característica que difere o comércio tradicional do comércio moderno são os agentes envolvidos na administração. No primeiro predomina o gerenciamento familiar, enquanto no segundo a gestão é realizada por estratégias capitalistas. 48 Tomando por referência esses atributos, infere-se que o comércio moderno imprimiu novas formas de consumo à Zona Norte, a partir da implantação de equipamentos deste segmento. Nesta área da cidade é marcante a presença de escolas, equipamentos de saúde especializados como o Instituto do Rim, além de investimentos do varejo e do atacado como o Carrefour, inaugurado em 2006; o Natal Norte Shopping, renomeado em 2014 para Partage Nort Shopping, por ocasião da gestão pela rede de investimentos imobiliários Partage; o Atacadão e o Shopping Estação, de 2008; o Supermercado Nordestão do Conjunto Santa Catarina, estabelecido em 1981, e o Atacadão Autosserviço, inaugurado em 2008. Além dos equipamentos mencionados, também se fazem presentes lojas especializadas em eletroeletrônicos e eletrodomésticos que ofertam ao consumidor produtos de caráter popular, chamados de bens de consumo da linha branca, caracterizada pela baixa sofisticação na produção no que concerne ao corte, pintura e acabamento. Alguns exemplos de lojas com esse perfil de mercadoria na Zona Norte são: Lojas Maré Mansa, Lojas Insinuante, Casas Bahia, Rede Unilar, Magazine Luiza, Laser Eletro, Atacadão dos Eletros e Armazém Pará, localizados nas avenidas Bacharel Tomaz Landim e Doutor João Medeiros Filho. Em consonância com o comércio moderno, existe também na Zona Norte de Natal o comércio tradicional. Este é composto de lojas de pequeno porte, pouco ou nada especializadas, além de apresentar um atendimento marcado pelas relações de proximidade com o cliente. A partir do exposto sobre o comércio moderno e tradicional, percebe-se que, no processo de produção do espaço urbano da Zona Norte, existem lugares que tem a configuração espacial regida por um comércio de ordem global, mas também há aqueles que criam a sua própria sinergia frente a essa ordem. Tratam-se de lugares que possuem na sua história, características próprias e também a coexistência dos momentos sociais. Lefebvre (2001) denomina de ordem distante e de ordem próxima. A primeira é aquela verticalizada, regida pelas grandes instituições, ao passo que, a segunda, se realiza no âmbito do cotidiano, se efetiva através das práticas espaciais de indivíduos, de pequenos grupos e se concretiza no lugar.Nesta perspectiva, chama-se a atenção para as ruas Chegança, Pompéia e Boa Sorte, sendo a primeira pertencente ao Conjunto Habitacional Nova Natal e as outras duas aos loteamentos Nova Repúblicas e Santarém, respectivamente. Essas 49 ruas inicialmente, visavam atender à função habitacional, mas foram transformadas, tornando-se predominantemente ruas de comércio. Faz-se importante a observação da forma comercial presente nas ruas estudadas a fim de descrever sua paisagem atual, que se encontra composta de um conteúdo diferente do momento de sua edificação. Fala-se de espaços comerciais que suscitam a busca pela mercadoria ofertada na rua; mercadoria esta que para chegar ao consumidor não precisa necessariamente estar em lugares especializados a exemplo dos shopping centers. Nas ruas de comércio, há uma extensão de lojas e intensiva exposição das mercadorias que atrai o consumidor e o seduz à compra. “A mercadoria, tornada espetáculo (provocante, atraente), transforma as pessoas em espetáculo, uma para as outras” (LEFEBVRE, 1999, p. 17). O autor refere-se ao efeito que a mercadoria tem de espetacularizar as pessoas, tornado-as mais perceptíveis para as outras. Nas ruas Pompéia, Chegança e Boa Sorte, o espetáculo também está na forma como a atividade se reproduz, através, por exemplo, do vestuário que, mesmo sendo popular, segue a moda recorrentemente lançada na mídia. A atividade comercial na Pompéia, Chegança e Boa Sorte se constitui num comércio de proximidade física, uma vez que atende sobremaneira à população dos bairros e de localidades vizinhas, e também social, pois os comerciantes mantém uma relação estreita com o consumidor. De acordo com Barreta (2012, p.14) “o conceito de comércio de proximidade retrata o comércio que está próximo da sua procura, não só fisicamente, mas também, e principalmente, social, cultural, patrimonial e comercialmente”. O tratamento personalizado com o cliente; a organização simples do estabelecimento; o pequeno, mas significativo, estoque de mercadorias; e o pouco uso da publicidade constituem algumas características comuns às atividades do comércio de proximidade. Este se refere ao conjunto de relações entre as pessoas que compartilham experiências comerciais no lugar, criando laços profundos de identidade, de solidariedade. Também é de proximidade, pelas relações estabelecidas com os clientes, correspondendo à definição apresentada pelo autor. Assumindo essa compreensão, entende-se que o comércio de proximidade, presente nas ruas estudadas, está relacionado a uma questão espacial, pois as características desta atividade nestes lugares estão vinculadas à demanda de consumo e a situação socioeconômica do consumidor tanto dos bairros onde se 50 localizam as ruas, mas também da Zona Norte. O quadro econômico desta zona administrativa, revelado pelo IBGE (2010) e melhor representado na tabela 1, mostra que a população dos bairros da Zona Norte, exceto Potengi, sobrevive com um rendimento mensal abaixo de 1 SM. Tabela 1 - Distribuição da renda familiar na Zona Norte Natal/RN, por bairro (2010) De modo geral, as condições socioeconômicas encontras na Zona Norte são desfavoráveis em relação a outras zonas da cidade, por exemplo, Leste e Sul. Além da situação de renda elucidada, outros fatores não identificados na tabela 1 podem ser problematizados na Zona Norte, como serviços públicos deficitários de saneamento básico e pavimentação, ambos com um quantitativo abaixo de 50%, e baixa taxa de alfabetização entre 5 anos de idade ou mais com índice de 88% (SEMURB, 2014). Mesmo diante das condições mencionadas, a Zona Norte apresenta uma dinâmica comercial crescente, principalmente no que se refere ao comércio informal. Por não ter licenciamento e pouca fiscalização, muitos comerciantes não pagam impostos do estabelecimento à Secretaria de Tributação do Estado, e mesmo assim conseguem gerar renda que garanta a sobrevivência da família no cenário de crise econômica que atinge, segundo o IBGE, taxas exorbitantes de 12 milhões de desempregados no segundo semestre de 2016 em todo o país e consequentemente Bairro Renda (R$) Rendimentos Médios Igapó 484, 5 0,95 Lagoa Azul 402,9 0,79 Nsa. Sra da Apresentação 413,1 0,81 Pajuçara 469,2 0,92 Potengi 627, 3 1,23 Redinha 428,4 0,84 Salinas 234,6 0,46 Fonte: IBGE – Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística, Censo Demográfico 2010. (Salário mínimo vigente em 2010 R$ 510, 00). (Adaptação da autora, 2016). 51 no Rio Grande do Norte. O comércio informal também é representativo nas ruas Pompéia, Chegança e Boa Sorte, de modo que, das três ruas, apenas a Boa Sorte tem o número de estabelecimentos formais superior ao de informais. Diante do exposto, com o propósito de atender à segunda seção “Descrevendo a Realidade”, com base no primeiro momento do método regressivo- progressivo, realizou-se a descrição das atividades de comércio na Zona Norte e nas ruas Pompéia, Chegança e Boa Sorte. Para tanto, adotou-se como fundamento a seguinte metodologia: após a descrição das atividades de comércio e de serviços desenvolvidas nas ruas estudadas, foi possível construir um croqui apresentando a espacialização por segmento. Vale salientar que, do ponto de vista técnico, o croqui não tem nenhuma intenção de mapeamento, mas sim de representação sendo a rua, inclusive, entendida como um plano. A construção desta representação tomou por base o levantamento de informações a partir da pesquisa de campo com a anotação de cada estabelecimento e a sua posterior categorização de acordo com a Classificação Nacional das Atividades Econômicas (CNAE), versão 2.2/2015. 2.1.2. POMPÉIA: O ALECRIM DA ZONA NORTE A Rua Pompéia, está localiza entre os bairros Potengi, Pajuçara e Redinha, sendo o primeiro bairro citada, o mais antigo da Zona Norte com ocupação iniciada no final da década de 1970, enquanto que o segundo e o terceiro tiveram sua ocupação, principalmente na década de 1990. Pompéia delimita, portanto, três dos sete bairros da Zona Norte, no entanto, o comércio se desenvolve nos bairros Pajuçara e Potengi, visto que, foi entre estes bairros que o comércio da rua surgiu e ganhou dinamicidade com a incorporação desta via na maioria das rotas de transporte público que circulam nesta porção da cidade. A pujança comercial da Pompéia está impressa na paisagem (Foto 2) em que é possível encontrar uma variedade de lojas, de modo que atende a demanda de consumo, principalmente local. 52 A foto 2 demonstra o potencial comercial da Pompéia que apresenta intenso fluxo de pessoas e veículos, o que implicitamente remete à circulação de mercadorias. O comércio da rua muito se assemelha ao do Alecrim (Foto 3), consagrado como referência de comércio popular em Natal ao dispor de uma enorme variedade de mercadorias, o que favorece o consumidor no que concerne a satisfação de suas necessidades básicas de vestuário, acessórios, alimentação e de serviços como reparação de veículos automotores, motocicletas, bicicletas, consertos de eletroeletrônicos e eletrodomésticos, dentre outros. Fonte: Street View Google Maps, 2016. Foto 2 - Comércio na Rua Pompéia - 2016 Foto 3 - Comércio na Avenida Coronel Estevam (Av. 9) - Alecrim/2016 Fonte: Mineiro, 2015. 53 Chama a atenção no comércio da Pompéia, a dinâmica marcada pela diversidade de mercadorias, fazendo com que a atividade comercial nesta rua se assemelhe a existente no Alecrim, de modo que, comerciantes e consumidores lhe atribuam o apelido de “o Alecrim da Zona Norte”. O comércio existente nesta rua tem uma proposta de atender a uma demanda do consumo diferenciada daquela existente na Avenida Doutor João MedeirosFilho. Trata-se de uma atividade que apresenta um mix de lojas e mercadorias, embora predomine o segmento de vestuário e acessórios. No mapa 4 está representada a Rua Pompéia onde o lado corresponde ao limite territorial do Bairro Potengi faz parte do Conjunto Habitacional Santarém, construído pela COHAB em 1981 para atender a demanda da moradia de famílias de 3 a 5 salários mínimos. Já no lado pertencente ao Bairro Pajuçara (Mapa 4), estão localizados os loteamentos Nova República e Dom Pedro I. No decurso da Rua Pompéia, seja no lado margeado pelo Bairro Potengi ou Pajuçara as edificações residenciais se fazem presentes em concomitância com o comércio e os serviços. 54 O quadro 3 representa o número de lojas presentes na Rua Pompéia. Ainda com base na metodologia adotada, que envolveu a descrição e a categorização do comércio, elaborou-se um croqui que demostra a espacialização desta atividade por segmento ao longo da Pompéia (Croqui 1). A obtenção dos dados para a elaboração da referida representação aconteceu por meio de atividade de campo na qual executou-se um percurso por toda a extensão da rua, observando e anotando cada estabelecimento e a sua correspondente localização. Vale lembrar que o mesmo procedimento metodológico fora empregado nas ruas Chegança e Boa Sorte. Quadro 3 - Lojas da Rua Pompéia - 2016 Lojas Números Segmento comercial Nº de estabelecimentos (%) na rua Comércio varejista de mercadorias em 5 2 % Fonte: Secretaria Municipal de Meio Ambiente e Urbanismo, Natal/ RN, 2000 . Elaboração: Soneide Moura da Costa.; Joabio Alekson Cortez, 2016. Mapa 4 - Rua Pompéia, Natal/RN – 2016 55 geral, com predominância de produtos alimentícios - minimercados, mercearias e armazéns Serviços de lavagem, lubrificação e polimento de veículos automotores 9 4% Comércio atacadista de artigos do vestuário e acessórios, exceto profissionais e de segurança 10 4% Comércio varejista de bebidas 6 2 % Serviços de borracharia para veículos automotores 3 1% Comércio varejista de artigos do vestuário e acessórios 172 68% Restaurantes e similares 11 5% Comércio varejista de carnes – açougues 4 2% Comércio varejista de mercadorias em geral, com predominância de produtos alimentícios – supermercados 2 0,7% Comércio varejista de produtos farmacêuticos, sem manipulação de fórmulas 8 3% Casas lotéricas 1 0,3% Fabricação de produtos de panificação industrial 6 2 % Atividade odontológica com recursos para realização de procedimentos cirúrgicos 5 2% Bares e outros estabelecimentos especializados em servir bebidas 10 4% TOTAL 252 100% Fonte: Elaboração da autora com base na pesquisa de campo, 2016. 56 57 De acordo com as informações obtidas (Croqui 1), é possível perceber que o comércio e os serviços da Pompéia apresentam-se variados ao longo da sua extensão, embora seja notável a predominância de lojas de vestuário e acessórios. Caminhando pela rua, evidenciou-se ainda, que saindo da Avenida Doutor João Medeiros Filho, em direção à Rua Plano Piloto, é possível notar a presença marcante de residências e de bares. No decorrer do percurso pela rua, percebeu-se a presença de lojas de vestuário e acessórios entre as ruas Plano Piloto e Três Poderes. A predominância deste segmento também é evidenciada entre as ruas Santo Expedito e Castelo Banco e desta em direção à Rua das Flores. Entre a Av. Doutor João Medeiros Filho e a Travessa Piracanjuba, chama atenção a concentração do segmento de comércio atacadista de artigos do vestuário e acessórios, exceto profissionais e de segurança, composta no caso da Pompéia por estabelecimentos de pronta entrega. Também neste primeiro trecho, expressa- se fortemente a oferta de serviços automobilísticos como: lavagem, lubrificação e polimento de veículos. Próximo a este último segmento também são evidenciados, com maior frequência, os bares e o comércio varejista de bebidas especializados na comercialização de bebidas de modo geral, incluindo os chamados disk entrega de água, estabelecimentos de vendas de bebidas alcoólicas e refrigerantes. Ainda percorrendo a Pompéia, nota-se que da Rua Cerro Azul a Rua Santa Margarida evidencia-se a presença marcante de serviços odontológicos, cabeleireiros, manicure e pedicure, casas lotéricas, farmácias, supermercado. É também nesta porção que se encontra a maior concentração de lojas de vestuários e acessórios. Com relação a este último segmento, a sua composição é basicamente de lojas que comercializam mercadorias de caráter popular, a maioria com oferta de confecções de preço único (Foto 4). 58 A foto 4 evidencia lojas de preço único que estão localizadas entre as ruas Itororós e Santa Margarida. O fato de estes estabelecimentos estamparem em faixas ou em fachada o apelo da oferta de todas as mercadorias vendidas por um preço único, denota a concorrência entre comerciantes, uma vez que existe forte semelhança entre as mercadorias. Neste caso, o comerciante chama a atenção do consumidor por meio de mensagens subjetivas, seja numa proposta de fazer com que este sinta-se bem recebido e com possibilidades de compras para a toda a família, conforme exposto na imagem 1 e 2 da foto 4, seja pela sensação de poder que a informação transmite, seduzindo o consumidor para a compra, a exemplo do que se evidencia na imagem 3 da mesma foto. Existem também aquelas lojas que lançam promoções relâmpago com preço único, a fim de provocar no consumidor o desejo de conferir as mercadorias postas à venda. Não só as fachadas das lojas funcionam como instrumento de comunicação e sedução à prática do consumo. Os próprios manequins, que funcionam como vitrines, são trajados com a mercadoria da loja com o propósito de despertarem, no consumidor, o desejo da compra mediante possibilidade deste se enxergar vestido tal qual o exposto. Desta forma, pode-se pensar na ideia de vitrine com “uma forma Foto 4 - Lojas de preço único, Pompéia, Natal/RN/2016 Fonte: Acervo da autora, 2015. 1 2 3 4 59 de manifestar o imaginário social, representando, dessa maneira, um modo possível de apreender as relações” (DEMETRESCO, 2004, p. 23). Essa noção de vitrine apreendida pela autora, ao discutir o poder que a mesma tem sobre a decisão de comprar tomada pelo consumidor, conduz a interpretação de que estas não são apenas espaços de exposição de mercadorias, mas também reprodutoras de significados estéticos, emocionais e midiáticos. Nesta perspectiva, Oliveira (1997), ao escrever sobre o efeito que a vitrine causa no consumidor referente à semiótica dos designers e arranjos da mercadoria, explica que: (...) as imagens são percebidas pelo observador a partir de seu grau de pertinência. Assim, a vitrina é percebida tanto em função da relevância prática ou objetiva do produto para o passante, quanto da relevância das referências simbólicas que ela pode estimular no observador (OLIVEIRA, 1997, p. 73). O consumidor tem o olhar apreendido pela mercadoria exposta nas vitrines. No caso da Pompéia, o manequim exerce essa função quase que predominantemente. Nesta rua, o comércio é popular e os estabelecimentos comerciais são, na maioria, informais do ponto de vista da tributação. A partir dos dados coletados na pesquisa de campo, fez-se uma comparação entre o número de estabelecimentos existentes na Pompéia e os dados fornecidos pela Secretaria Municipal de Tributação do Natal (SEMUT) (Gráfico 1). Tal fato deixa clara a importância de se realizar a pesquisa de campo em função da alta representatividade do comércio informal na rua que não é contabilizada pelosórgãos de fiscalização, visto que a atribuição deste último concerne ao acompanhamento de estabelecimentos formais. 60 Os dados fornecidos pela Secretaria de Tributação de Natal (SEMUT) dizem respeito aos estabelecimentos formais do ponto de vista da arrecadação de impostos. A partir deste requisito, percebe-se que na Pompéia existem 13 estabelecimentos catalogados pela SEMUT dentre os quais estão o único supermercado, casas lotéricas, clínicas e estabelecimentos de carnes e frios. O restante dos estabelecimentos, que juntos somam 239, não são contribuintes, e, portanto, são considerados como estabelecimentos informais. Do total de estabelecimentos informais, destacam-se as lojas de vestuário e reparação de eletroeletrônicos e eletrodomésticos. Segundo Tavares (2002, p.13), ao discutir a precarização do trabalho, o setor informal compreende “atividades de sobrevivência orientadas para a reprodução do trabalhador e do seu núcleo familiar, comportamento que se inscreve entre as características definidoras do que se conhece como ‘setor informal”. A autora também expõe que este setor, no qual também está incluso o comércio informal, é comum entre comerciantes que aderem Gráfico 1 - Número de estabelecimentos de comércio e serviços quanto à formalização – Pompéia/2016 Fonte: Secretaria Municipal de Tributação – SEMUT, Natal, 2014; pesquisa de campo, 2015 (Adaptação da autora, 2016). 61 à atividade como possibilidade de gerar renda mediante adversidade como desemprego e desejo de não se submeter às ordens de chefes. Além dos fatores apontados por Tavares (2002), a presença marcante do comércio informal na Pompéia também está relacionada à baixa renda dos comerciantes, que inclusive na sua maioria, optam por fixarem estabelecimentos para complementarem a renda familiar ou mesmo sobreviverem do rendimento da atividade. Em relação as atividades comerciais desenvolvidas na Pompéia, do total de 27(4) entrevistados, todos possuem o estabelecimento gerido pela organização familiar. Lea (1991, p. 5), ao discorrer sobre o significado de empresa familiar, a conceitua como empresa “totalmente ou na sua maior parte controlada por uma pessoa ou pelos membros de uma família”. No caso da rua em foco, questionados sobre quantos funcionários trabalhavam com o entrevistado, todos respondem entre nenhum e no máximo três funcionários (Gráfico 2) e que, mesmo no caso daqueles que possuem até três pessoas trabalhando no estabelecimento, a sua gestão pertence ao comerciante diretamente ligado à atividade. 4 O número de comerciantes entrevistados foi definido com base na elaboração de uma amostra aleatória simples a partir da seguinte fórmula: , sendo assim, em que, v é a Variância das respostas obtidas; z é o quantil da normal que acumula , com α = 0.05, temos que z = 1.96; e é a margem de erro admitida. Para os dados, temos que: V = 2.079051; Z = 1.96; e = 0.45, estamos assumindo um erro de 0.45 unidades, ou seja, é o que a estimativa estará diferindo da real média. Dado isto, obtivemos um n = 40. O mesmo procedimento foi adotado nas ruas Chegança e Boa Sorte. 62 O gráfico 2 demostra um número reduzido de funcionários por estabelecimento e a predominância de até mesmo nenhum, visto que, na maioria dos casos, o desenvolvimento de todos as funções fica a cargo do próprio proprietário. Torna-se implícito que, se inexiste funcionários ou estes constituem um número reduzido, a empresa possui dimensões relativamente pequenas e tem a gestão majoritariamente conferida à família. Corroborando com o conceito de Lea (1991) sobre empresa familiar, Leone (1992), ao realizar um estudo sobre as atividades comerciais em João Pessoa/PB, argumenta que este tipo de empresa deve ter a presença de membros da família na organização gestora do estabelecimento, os valores da família devem estar corporificados na firma e a sucessão de gestão deve acontecer no âmbito familiar. No que se refere à sucessão da gestão familiar, a pesquisa deixou evidente que grande parte dos entrevistados na Pompéia escolheram trabalhar nesta rua para dar continuidade aos negócios da família. No caso, 31% dos comerciantes assumiram a gestão ou mesmo a propriedade dos estabelecimentos consolidados pelos pais, por exemplo. Ainda mediante pergunta elaborada sobre os motivos que que os fizeram escolher a rua para fixarem estabelecimento, 44% responderam que a escolha se deveu à aposentadoria. Gráfico 2 - Percentual de funcionários que trabalham no estabelecimento – Pompéia/2016 Fonte: Elaboração da autora, 2016. 63 A partir das respostas obtidas, infere-se que o comércio da Pompéia esteja predominantemente representado por comerciantes que, ao cumprirem o tempo de serviço em outros setores, decidiram estabelecer comércio na rua. Desta forma, pode compreender que a atividade comercial na Pompéia se constituiu como oportunidade para muitas pessoas se tornarem comerciantes e poderem continuar exercendo atividades. O fato do número de entrevistados revelar predominância de aposentados, demostra a faixa etária aproximada dos comerciantes da rua. A representatividade expressa pelo número de aposentados que decidiram estabelecer comércio na rua, é também um dos vieses interpretativos da informalidade presente nos estabelecimentos observados. Tal fato pode ser explicado pelo fato destes estabelecerem o comércio como uma atividade que, além de complementar a renda familiar, também se constituiu numa forma de vencer a ociosidade. Além do mais, a não formalização do estabelecimento acaba por não trazer problemas para o comerciante do ponto de vista da previdência posto a sua própria situação de já ter aposentadoria. A maioria dos comerciantes trabalha no segmento de vestuário e acessórios. Neste caso, a mercadoria, comprada para abastecer a loja, é oriunda principalmente de outros estados conforme expresso no gráfico 4: Gráfico 3 - Motivos para escolha do comércio – Pompéia/2016 Fonte: Elaboração da autora, 2016. 64 Dentre os estados citados, cerca de 90% dos entrevistados apontou fazer compras no Ceará, principalmente em Fortaleza, e em Pernambuco, predominantemente nas cidades de Caruaru e Toritama, esta última conhecida como a capital do Jeans. Marcadamente, o polo de confecções de Agreste pernambucano, formado por Caruaru, Toritama e Santa Cruz do Capibaribe, exerce grande influência do ponto de vista da distribuição de mercadorias populares não apenas para a Pompéia e as outras ruas estudadas, mas também em grande parte do Nordeste e outras porções do país. A mercadoria ofertada por estas cidades é de baixo custo, explicado pelas precárias condições de sua produção. Negreiros (2010, p. 42), ao estudar a relação entre o arranjo produtivo local da produção de jeans em Toritama e as condições de vida da população, explica que nesta cidade, “praticamente todas as etapas da produção do jeans são realizadas nas residências das pessoas trabalhadoras de Toritama. Algumas são para atender pequenas iniciativas familiares de ultrapassar o processo de produção e levar seus produtos para os consumidores nos “dias de feira”, mas a maioria é para atender as encomendas das fábricas ou fabricos”. Desta forma, o trabalho em casa é uma estratégia da fábrica para diminuir os custos tributários da mercadoria e Gráfico 4 - Lugar de compra da mercadoria pelo comerciante – Pompéia/2016 Fonte: Elaboração da autora, 2016. 65 consequentemente o seu preço final até os compradores. No caso, comerciantes interessados em comprar mercadoriabarata que mesmo após aferir o seu lucro com a mercadoria, consegue revendê-la a preço médio. Considerando o poder de compra dos consumidores de baixo rendimento salarial como é o caso daqueles que habitam os bairros de Pajuçara e Potengi, com 0,92 e 1,23 SM, (SEMURB, 2012), consecutivamente, a Pompéia é o melhor lugar para se efetuar compras a preços acessíveis. Dos 7(5) consumidores entrevistados, quase 90% respondeu achar o preço da mercadoria regular, de acordo com o exposto do gráfico 5. Referente à mercadoria do vestuário, segmento preponderante no comércio da rua, esta apresenta durabilidade quanto ao tempo de uso e condição do material empregado na sua produção. De modo geral, 58% dos entrevistados responderam que a mercadoria é de boa qualidade, considerando o preço. 5 O número de formulários aplicados com os consumidores na Rua Pompéia foi definido a partir de uma amostra não probabilística por conveniência em que foram selecionados passantes eventuais. Cabe lembrar que os formulários pararam de ser aplicados quando as respostas passaram a ser repetitivas. A mesma metodologia foi aplicada nas ruas Chegança e Boa Sorte Gráfico 5 - Preço da mercadoria de acordo com o consumidor – Pompéia/2016 Fonte: Elaboração da autora, 2016. 66 2.1.3. BOA SORTE: ESPAÇO COMERCIAL DE ROTATIVIDADE A Rua Boa Sorte (Mapa 5) está localizada no Bairro Nossa Senhora da Apresentação. Este bairro se consolidou na década de 1980 a partir da construção do Conjunto Habitacional Parque dos Coqueiros e teve seus limites estabelecidos apenas na década de 1990. O comércio desta rua apresenta uma tipologia variada de lojas, com estabelecimentos de pequena dimensão voltados para atender a população de classe menos favorecida, em especial. Também se percebeu uma característica que não aparece nas ruas Pompéia e Chegança: em quase toda a sua extensão identificou-se que os estabelecimentos comerciais são quase todos geminados com Fonte: Secretaria Municipal de Meio Ambiente e Urbanismo – Natal – Natal/ 2000, RN, 2000 Elaboração: Soneide Moura da Costa.; Joabio Alekson Cortez Costa, 2016 Mapa 5 - Rua Boa Sorte - Natal/RN – 2016 67 as residências (em alguns casos há uma adaptação e a casa passa a localizar-se na parte de cima do estabelecimento). Na Boa Sorte existe uma rotatividade dos estabelecimentos comerciais ao longo da rua, chegando um mesmo imóvel a ter sido ocupado por vários segmentos em um curto intervalo de tempo. A alta rotatividade faz com que a paisagem comercial da rua se altere constantemente. Esse fato exigiu um olhar mais aguçado no momento da identificação dos estabelecimentos, visto que, em muitos casos, as informações contidas nas fachadas não condiziam com o conteúdo da loja, conforme exposto na foto 5. A foto 5 é emblemática quanto à mudança das propostas dos estabelecimentos, mostrando que não existe uma preocupação por parte do comerciante quanto a apresentação da forma física da loja. A mesma anuncia um segmento do comércio voltada para o varejo de bebidas e alimentos, quando o produto posto à venda pertence ao vestuário e acessórios. Esse exemplo põe à mostra a dissonância entre o aparente e o existente. Casos semelhantes se repetem ao longo da Rua Boa Sorte, podendo ser exemplificados na foto 6, onde as categorias de comércio representadas nas Foto 5 - Incoerência entre divulgação e venda de mercadorias, Boa Sorte, Natal/RN – 2015 Fonte: Acervo da autora, 2015 68 imagens 1 e 2 da mesma foto não são coerentes com as atuais funções dos estabelecimentos. Essa característica de rotatividade é perceptível ao longo da rua, observando-se a mudança de segmento comercial sem que seja alterada a fachada da loja. A fachada do estabelecimento comercial (Foto 6/Imagem1) registra, a título de informação para o consumidor, que se trata de um restaurante, enquanto em seu interior há uma marcenaria. O mesmo ocorre com a imagem 2 da mesma foto, onde é anunciado um comércio varejista de mercadorias em geral, com predominância de produtos alimentícios do tipo minimercado, quando na verdade, oferta no seu interior um serviço de reparação e manutenção de equipamentos de eletrodomésticos. Nesta rua existem estabelecimentos comerciais que possuem tempos de instalação variados. Isso inclui desde lojas de material de construção e minimercados com mais de dez anos de funcionamento até estabelecimentos instalados a poucos meses. A maioria do formato das lojas é de organização espontânea, não seguindo uma lógica de disposição das mercadorias, além destas serem pouco sofisticadas do ponto de vista da estrutura. Este tipo de comércio comumente encontrado na Rua Boa Sorte está voltado para atender principalmente as necessidades básicas, como Foto 6 - Incoerência entre divulgação e venda de mercadorias, Boa Sorte, Natal/RN – 2015 Fonte: Acervo da autora, 2015 1 2 69 vestuário e alimentação, principalmente da população do bairro e de localidades vizinhas. O quadro 4 representa o número de lojas presentes na Rua Boa Sorte. Ao realizar-se a análise a partir das informações coletadas em campo, foi possível elaborar o croqui 2. Vale mencionar que este não tem a intenção de mapear, mas de espacializar os estabelecimentos no decurso da rua. Quadro 4 - Lojas da Rua Boa Sorte – 2016 Lojas Números Segmento comercial Nº de estabelecimentos (%) na rua Comércio varejista de mercadorias em geral, com predominância de produtos alimentícios - minimercados, mercearias e armazéns 7 2% Cabeleireiro, manicure e pedicure 6 2% Serviços de borracharia para veículos automotores 13 4% Comércio varejista de artigos do vestuário e acessórios 232 75% Restaurantes e similares 5 2% Comércio varejista de artigos de ópticas 3 0,9% Comércio varejista de produtos farmacêuticos, sem manipulação de fórmula 8 3% Comércio varejista de móveis 2 0,6% Fabricação de produtos de panificação industrial 2 0,6% Atividade odontológica em recurso para realização de procedimentos cirúrgicos 5 2% Bares e outros estabelecimentos especializados em servir bebidas 7 2% Atividade de organizações religiosas ou filosóficas 12 4% Comércio varejista de carnes - açougues 3 0,9% Chaveiros 4 1% TOTAL 309 100% Fonte: Elaboração da autora com base na pesquisa de campo, 2016. 70 71 Com base no croqui 2, torna-se notória a presença de restaurantes na Rua Boa Sorte, no acesso da Avenida das Fronteiras à Rua Vitória Régia, situação que se repete marcadamente no trecho que corresponde da Rua da Consolação à Rua Padre João Maria e também desta até a Rua Monte Sinai. No percurso realizado na rua, correspondente à Travessa Boa Sorte e Rua dos Portugueses, o comércio de vestuário compartilha espaço com estabelecimentos de bares, serviços de borracharia e outros. Entre as ruas mencionadas, observou-se a ínfima presença de residências apenas entre as ruas dos Protetores e dos Portugueses. As residências estão fixadas, de forma mais contundente, entre as ruas Dianópolis e Manoel Fernandes. A Boa Sorte possui um total de 309 estabelecimentos contabilizados em pesquisa, dos quais a maior parte é composta por comércio varejista de vestuário e acessórios. Do total de estabelecimentos, a maioria é formal em detrimento dos informais, conforme representado no gráfico 6. Gráfico 6 - Número de estabelecimentos de comércio e serviços quanto à formalização – Boa Sorte/2016 Fonte: Secretaria Municipal de Tributação – SEMUT, Natal, 2014(Adaptação da autora, 2016). 72 Por ser uma rua em que o comércio já surgiu em concomitância com a habitação, do ponto de vista da formalização, a Boa Sorte se apresenta mais consolidada em relação às demais ruas estudadas, além de ser a única em que o número de estabelecimentos formais é superior ao número de estabelecimentos informais, conforme evidenciado no gráfico 6. Fato curioso que suscita a interpretação é que, sendo o comércio rotativo nesta rua, isto não exclui o seu caráter de preponderante formalização. Uma das explicações para este fato é que o comércio que muda de localização, necessariamente não deixa de existir; apenas transfere sua localização de um ponto para outro ao longo da rua. Outro caminho interpretativo é que ao passo que alguns estabelecimentos alteram a sua localização no decurso da rua e outros podem até deixar de funcionar em virtude de uma série de fatores, como por exemplo crise econômica que reduz a parcela da clientela; mudança de emprego ou violência urbana, novos estabelecimentos estão surgindo como óticas e farmácias que, para atuarem no mercado, precisam ser formalizados. No intuito de compreender melhor o perfil do comércio na Rua Boa Sorte, foram aplicados 23 formulários à comerciantes ao longo da rua. A partir da sistematização das informações obtidas, algumas questões puderam ser elencadas, a saber: a presença da gestão familiar, conforme representado no gráfico 7, com predominância de nenhum ou 1 funcionário atuando no estabelecimento, situação também revelada na Pompéia e na Chegança. Dos entrevistados, 31% exercem a função de dono e funcionário ao mesmo tempo e 37% possuem um funcionário. Esse percentual, tanto dos estabelecimentos que não tem nenhum ou até um funcionário, é bem representado por pessoas que ajustaram as suas residências para acomodar o estabelecimento comercial. Fala-se geralmente de cabeleireiro, manicure e pedicure, costureira, lojas especializadas em suprimentos de informática, restauração e manutenção de equipamentos e até mesmo as pequenas lojas de roupas. Neste caso, as residências, além de atenderam à função da moradia, passaram a estabelecer pequenas lojas em cômodos como garagens ou até salas reformadas. Com esta adaptação, a casa passou a exercer dupla função: o lugar da moradia e do trabalho e com isto o comerciante usufruiu de benefícios como: não custear um imóvel fora de casa e ainda otimizar gastos, distância e tempo. 73 No que se refere ao motivo de escolha da Rua Boa Sorte para fixar estabelecimento, as respostas foram distintas (Gráfico 8). Apenas 12% dos entrevistados responderam optar pelo comércio na rua supracitada, em virtude de estarem aposentados. Grande parte deste percentual justificou a resposta afirmando que a decisão por atuar no comércio depois da aposentadoria foi uma forma encontrada por eles para continuar trabalhando, seja para vencer a ociosidade ou mesmo por afinidade com a atividade. No caso da Boa Sorte, o dado difere das demais ruas estudadas, em que o maior percentual foi justamente acerca dessa resposta. Conforme já foi discutido, o fato da maioria de comerciantes ser aposentados na Pompéia e na Chegança, pode ser um indicativo da informalidade representativa nestas duas ruas. Ao contrário, das outras duas ruas estudadas, a Boa Sorte tem percentuais significativos em torno das repostas como sempre trabalhou no comércio e escolheu a rua para fixar estabelecimento em razão de dar continuidade ao negócio da família, circunstâncias favoráveis ao entendimento da predominância do comércio formal. Gráfico 7 - Percentual de funcionários que trabalham no estabelecimento – Boa Sorte/2016 Fonte: Elaboração da autora, 2016. 74 Dando continuidade à interpretação do gráfico 8, percebeu-se um equilíbrio de 23% em torno das respostas “sempre trabalhou no comércio” e “desempregado (a) ”; e de 21% de “continuidade ao negócio da família” e “para complementar renda”. As respostas que tiveram percentual de 23% podem servir de viés interpretativo para explicar duas características: a primeira é que, mediante observação de tantos comerciantes que atuam na atividade desde o seu surgimento na rua, isto pode explicar em partes, o seu caráter de formalidade; a segunda é que o comércio tem se constituído como alternativa para muitas famílias sobreviverem no cenário crescente de desemprego. Já o expressivo número de comerciantes que respondeu escolher a rua para continuar gerindo o estabelecimento comercial da família, ratifica a informação de que o comércio da Rua Boa Sorte se trata de um comércio familiar. A partir da pergunta acerca de onde o comerciante realiza compras para abastecer sua loja, semelhante à Pompéia e a Chegança, a maioria dos entrevistados da Boa Sorte responderam “outros estados” (Gráfico 9). Possivelmente isso se deve à predominância de lojas de vestuário. Os estados mais Gráfico 8 - Motivos para escolha do comércio – Boa Sorte/2016 Fonte: Elaboração da autora, 2016. 75 citados foram, Ceará e Pernambuco. Já nos casos dos comerciantes de óticas, por exemplo, a mercadoria é adquirida preferencialmente no estado de São Paulo. Foram aplicados 7 formulários aos consumidores da Rua Boa Sorte. O intuito foi compreender o comércio da rua com base em visões diferentes dos comerciantes. No que se refere à qualidade da mercadoria, 72% dos consumidores, responderam ser de boa qualidade. Essa resposta foi fortemente influenciada pelo preço da mercadoria que, de modo geral, foi apontado como regular. Tratam-se, na maior parte dos casos, de mercadorias populares vendidas em pequenas lojas que atendem sobremaneira as camadas populares, predominantemente do bairro. Gráfico 9 - Lugar de compra de mercadoria pelo comerciante – Boa Sorte/2016 Fonte: Elaboração da autora, 2016. 76 2.2.4. CHEGANÇA: A DESCOBERTA DE UM COMÉRCIO DISTANTE A Rua Chegança, está localizada no Conjunto Habitacional Nova Natal, no Bairro Lagoa Azul (Mapa 6), construído em 1981 também pela COHAB. O referido bairro está situado no extremo norte na Zona Norte, constituindo-se, portanto, no mais distante do centro histórico da capital potiguar. Gráfico 10 - Qualidade da mercadoria de acordo com o consumidor – Boa Sorte/2016 Fonte: Elaboração da autora, 2016. 77 Para se chegar à Rua Chegança, a orientação é sair da Avenida Doutor João Medeiros Filho e acessar a Rua Nosso Senhor do Bonfim na Zona Norte de Natal, que permite o acesso à Rua Serra Negra. Esta indica o caminho para Avenida Bela Vista que mais parece anunciar a chegada da Rua Cirandas, portal de entrada para a Chegança. Tal descrição do percurso não se deu à toa, uma vez que diferentemente das outras duas ruas estudadas, a Chegança não está situada diretamente próxima a uma via de circulação de referência do ponto de vista da articulação da Zona Norte ao restante da cidade. Do ponto de vista comercial, a Chegança apresenta-se dinâmica em toda a sua extensão com um perfil de lojas variado, onde se percebe a presença de estabelecimentos que vão desde pequenas lan houses até grandes lojas de móveis e farmácia. Mapa 6 - Rua Chegança - Natal/RN – 2016 Fonte: Secretaria Municipal de Meio Ambiente e Urbanismo, Natal/ RN, 2000. Elaboração: Soneide Moura da Costa.; Joabio Alekson Cortez Costa, 2016. 78 O quadro 5 representa o número de lojas presentes na Rua Chegança. Após a descrição e categorização do comércio da Chegança, elaborou-se o croqui 3 em que estão dispostos os estabelecimentos de comércio e serviço nodecurso da rua. Igualmente à representação feita nas outras ruas, o croqui da distribuição do comercio na Rua Chegança não tem a intenção de realizar um mapeamento, portanto não pode ser confundido com um mapa. Quadro 5 - Lojas da Rua Chegança – 2016 Lojas Números Segmento comercial Nº de estabelecimentos (%) na rua Comércio varejista de mercadorias em geral, com predominância de produtos alimentícios - minimercados, mercearias e armazéns 1 0,4% Cabeleireiro, manicure e pedicure 7 3% Restaurante e manutenção de equipamentos 4 2% Serviços de borracharia para veículos automotores 7 3% Comércio varejista de vestuário e acessórios 170 72% Restaurantes e similares 3 1% Comércio varejista de artigos de ópticas 3 1% Exploração de jogos eletrônicos recreativos 7 3% Comércio varejista de mercadorias em geral, com predominância de produtos alimentícios – supermercados 3 1% Comércio varejista de produtos farmacêuticos, sem manipulação de fórmulas 7 3% Comércio varejista de móveis 4 2% Fabricação de produtos de panificação industrial 1 0,4% Atividade odontológica com recurso para realização de procedimentos cirúrgicos 6 3% Bares e outros estabelecimentos especializados em servir bebidas 6 3% Atividades de organizações religiosas ou filosóficas 1 0,4% Lojas de variedades, exceto lojas de departamento ou magazines 2 0,8 Comércio varejista de carnes 3 1% TOTAL 235 100% Fonte: Elaboração da autora com base na pesquisa de campo, 2016. 79 80 No lado direito do croqui 3, pode-se perceber que a Chegança é formada por ruas perpendiculares que recebem o nome de instrumentos musicais, versos, e nomes de formas espaciais do período da escravidão, enquanto do lado esquerdo as ruas fazem referência a festas folclóricas e comidas de origem africana. Desta forma, compreende-se que a origem do nome da Rua Chegança pode estar relacionada às festas folclóricas europeias que ao chegarem ao Brasil sofreram influência da cultura indígena e africana. Do ponto de vista comercial, está representado no croqui 3, a distribuição dos estabelecimentos na rua, torna notório o quanto se faz presente o segmento do comércio varejista de vestuário e acessórios. No percurso que corresponde, da avenida das Cirandas à aproximadamente a Rua da Berlinda, fica nítido que, mesmo com a diversidade de atividades que compõem a Chegança, a sua maior expressividade se revela no comércio do vestuário. Embora não seja predominância, a habitação ainda está presente na rua, principalmente nas proximidades da Avenida dos Caboclinhos. Contudo, na espacialização revelada pelo croqui 3, observa-se que o comércio da Chegança se apresenta variado não apenas do ponto de vista da diversidade de segmentos, mas também no que refere à distribuição espacial dos estabelecimentos. Em meio à concentração de lojas de vestuários e acessórios estão os estabelecimentos de serviço de borracharia para automóveis, conforme observado entre as ruas da Sanfona e Moté Glossa. No caso da Pompéia, estes serviços de cunho mais grosseiro estavam concentrados, não entre as lojas de vestuário, mas próximo a outros segmentos semelhantes como serviços de lavagem, lubrificação e polimento de veículos, localizados bem próximos a Avenida Doutor João Medeiros Filho. A partir do número de estabelecimentos formais fornecidos pela SEMUT, foi possível delimitar o quantitativo de informais a partir do levantamento minucioso em campo. O reconhecimento realizou-se a partir da descrição de cada estabelecimento, seguido da sua categorização com base na CNAE e da sua posterior comparação com o número de formais disponibilizados pela secretaria. Desta forma, de acordo com o expresso no gráfico 11, pode-se inferir que o comércio da Chegança é, em sua maioria, composto por estabelecimentos informais. 81 Dentre os estabelecimentos formais estão o comércio varejista de carnes– açougues, atividade odontológicas, supermercados, produtos farmacêuticos sem manipulação de fórmulas e outros. Estes estabelecimentos são remanescentes dos primeiros que surgiram na rua; é caso da Farmácia Chegança e do atual Supermercado Nova Vida, cuja gestão permanece sob administração das primeiras famílias a ocuparem a rua. É possível perceber que, mesmo com um grande número de estabelecimentos informais, em termos de arrecadação municipal de impostos, a atividade comercial da Chegança tem crescido expressivamente. A mesma situação também foi evidenciada nas ruas Pompéia e Boa Sorte. Estas carregam, dentre tantas outras similitudes, uma particularidade em especial: são ruas que desenvolvem um comércio tradicional e de proximidade. Nestas ruas, a lógica de reprodução do capital hegemônico arrefeceu por meio de ações dos grupos sociais que nelas residem ou mesmo fixaram estabelecimentos comerciais e buscam no trabalho e na vida cotidiana a reprodução do comércio e da rua. Gráfico 11 - Número de estabelecimentos de comércio e serviços quanto à formalização – Chegança/2016 Fonte: Fonte: Secretaria Municipal de Tributação – SEMUT, Natal, 2014 (Elaboração da autora, 2016). 82 Com base nas informações adquiridas a partir da aplicação de 40 formulários aos comerciantes da Chegança, fora constatado que 98% dos entrevistados, possuem entre nenhum e até 4 funcionários envolvidos em seus estabelecimentos, conforme expresso no gráfico 12. Todavia, a maioria dos comerciantes respondeu ter apenas 1 funcionário. Ficou nítida a participação de membros da família, mesmo naqueles casos onde o estabelecimento possui mais de 4 funcionários, denotando- se a ocorrência da gestão familiar. Nos estabelecimentos que possuem um funcionário, geralmente este pertence à família do dono, na maioria dos casos são filhos que acompanham o ofício do pai ou da mãe no intuito de substituí-los futuramente. Já entre os motivos que fizeram os comerciantes escolherem a Chegança, e não outra rua, para estabelecer sua loja, a resposta “continuação ao negócio da família” está bem representada no gráfico 13. Gráfico 12 - Percentual de funcionários que trabalham no estabelecimento – Chegança/2016 Fonte: Elaboração da autora, 2016. 83 De acordo com os informantes, 26% estão atuando no comércio pelo motivo outrora mencionado, demostrando que esta parece ser uma prática que vem se conformando no comércio da rua. São empresas geralmente de pequeno porte e que tem os valores da família corporificados nas suas ideologias. Ainda se percebeu que 37%, respondeu escolher a rua por ser aposentados. Isto significa que são pessoas que, mesmo após a aposentadoria, optaram por seguir desenvolvendo alguma atividade e, por morarem próximos a Chegança, encontraram nesta rua a oportunidade de se envolverem na atividade comercial. Acerca do lugar de compra da mercadoria para abastecer as lojas, 54% respondeu se dirigir a outros estados (Gráfico 14). Com a grande representatividade do segmento de vestuário e acessórios, os estados mais citados foram Ceará, principalmente Fortaleza, e Pernambuco, em especial as cidades de Toritama e Caruaru. Gráfico 13 - Motivos para escolha do comércio – Chegança/2016 Fonte: Elaboração da autora, 2016. 84 O gráfico 14 mostra que, mesmo com a maioria das mercadorias sendo adquiridas em outros estados, existe um expressivo número de comerciantes que o faz na própria cidade. Neste caso, são geralmente estabelecimentos vinculados aos segmentos de restaurante e similares, comércio varejista de carnes e também de bebidas. Em se tratando da mercadoria, algumas questões foram apontadas pelosconsumidores do comércio na Chegança após a aplicação de 7 formulários na rua. Sobre a qualidade da mercadoria, os consumidores foram unânimes em afirmar que são de boa qualidade (Gráfico 15). Todos os informantes responderam que as mercadorias ofertadas pelos comerciantes na rua eram de boa qualidade tomando como referência o preço a elas conferido. Gráfico 14 - Lugar de compra da mercadoria pelo comerciante – Chegança/2016 Fonte: Elaboração da autora, 2016. 85 Essa avaliação foi feita pelo consumidor tendo em vista o preço acessível dos produtos comercializados na rua, em que 86% dos entrevistados responderam achar o preço regular. Na Chegança, chama a atenção a forma como a mercadoria é exposta num amontoado de manequins em frente às lojas, o que representa a necessidade de o produto estar ao alcance da visão do consumidor. O comerciante tem a necessidade de expor todas as mercadorias à venda na loja (Foto 7). Gráfico 15 - Qualidade da mercadoria de acordo com o consumidor – Chegança/2016 Fonte: Elaboração da autora, 2016. 86 A foto 7 retrata a falta de planejamento do comerciante na disposição das mercadorias, fato que se contrapõe à lógica do comércio moderno que leva em consideração, inclusive, estudos de especialistas sobre iluminação, composição e disposição dos manequins e o espaço a ser ocupado por cada mercadoria na vitrine. No caso da Chegança, a preocupação maior é apresentar aos passantes da rua, a variedade de ofertas que a loja dispõe, de modo que os próprios manequins funcionam como vitrines. Desta forma: A rua, série de vitrines, exposição de objetos à venda, mostra como a lógica da mercadoria é acompanhada de uma contemplação (passiva) que adquire o aspecto e a importância de uma estética e de uma ética (LEFEBVRE, 1999, p31). A partir da descrição do comércio presente nas três ruas, alguns aspectos são importantes para serem discutidos. No caso das ruas estudadas, o comércio está bem representado através do vestuário popular, que mesmo com mercadorias de baixo preço e qualidade não tão expressivas, seguem a moda recorrentemente lançada na mídia. Neste caso, este tipo de vestuário serve como uma forma do consumidor se sentir inserido nas tendências da moda. O conceito de moda adotado neste estudo está baseado nas ideias de Lipovestky (2007), segundo o qual esta é um instrumento gerador de valor, sujeito a Foto 7 - Exposição de mercadorias na Rua Chegança - 2015 Fonte: Acervo da autora, 2015. 87 mutações, podendo fazer surgir “novos valores”, considerando a mudança da moda. Isso porque as roupas são portadoras de significados culturais e demarcam fronteiras de idade, gênero, grupo social, etc. O autor discute a dinâmica do consumo como uma tendência cada vez mais relacionada à esfera emocional, fazendo com que a sociedade deixe de lado os princípios de racionalidade, baseada na sensatez, para ser guiada pela racionalidade hedonista, ou seja, pelo prazer ligado diretamente ao bem de consumo. De acordo com Lipovestky (2007, p. 63) “já não se trata mais apenas de vender serviços, é preciso oferecer experiência vivida, o inesperado e o extraordinário capazes de causar emoção, ligação, afetos, sensações [...]”. Vive-se cada vez mais em função do consumo, naquilo que Baudrillard (2010) denomina de sociedade do consumo. Devido a voracidade do sistema de produção e a fragilidade da vida útil das mercadorias, o consumo torna-se massificado e cada vez mais são utilizadas estratégias de vendas sedutoras através do uso excessivo, por vezes agressivo, da publicidade. Neste cenário, Baudrillard (2010) aponta para a criação, cada vez mais recorrente, de novos desejos de consumo e a necessidade de compreender a subjetividade existente no consumo e os signos contidos nas mercadorias. Para este autor, os consumidores da sociedade contemporânea estão mais interessados no significado das mercadorias do que na sua utilidade, pois estas podem servir, na sociedade do consumo, como interlocutores das relações entre as pessoas. O consumo pelas camadas populares das ruas Pompéia, Chegança e Boa Sorte acontece por meio da imitação das mercadorias recorrentemente lançadas pela mídia e também de marcas famosas como Lacoste, Dudalina, Puma, Chanel e outras. Mesmo sendo imitações das marcas originais, despertam no consumidor o desejo do consumo como uma tentativa deste se inserir no meio social dos grupos que tem em comum o consumo de determinadas mercadorias ou marcas. A imitação serve, dentre outros fatores, para que o sujeito tenha a sensação de estar em harmonia com o grupo no qual está inserido, servindo também como comportamento gerador de proximidade social. De acordo com o pensamento de Bauman (2008), o consumo tem atuado com uma forma de afiliação social. O vestuário encontrado na Pompéia, Chegança e Boa Sorte não foge à regra no quesito da imitação de mercadorias que tem como ideal a raridade e 88 exclusividade para o consumidor. Neste caso, as marcas imitadas, ao contrário da raridade, se reproduzem com abundância e assuem um caráter popular. De acordo com o Serviço Brasileiro de Apoio às Micro e Pequenas Empresas (SEBRAE) o comércio varejista de vestuário e acessórios é um segmento promissor e em expansão no Brasil; inclusive foi responsável pelo movimento de 9, 3 milhões de reais em salários no ano de 2013. Isto se explica pelo crescente mercado de inovação deste segmento no que concerne à moda, favorecendo principalmente as classes sociais B e C. Essa moda, consumida pelas classes mencionadas, é reproduzida pelas camadas populares que não abrem mão de seguir as tendências em vigência, (SEBRAE, 2014). Da realidade mostrada, algumas indagações foram construídas, sendo as mais contundentes: Pompéia, Chegança e Boa Sorte sempre foram ruas comerciais? Se não, que fatores contribuíram para a consolidação do comércio nessas ruas? As repostas às indagações estão evidenciadas no texto que segue. 89 90 3. A CONSTRUÇÃO DA REALIDADE Conduzida pela necessidade de entendimento dos fatores que contribuíram para a construção da realidade anteriormente descrita, a presente seção tem por objetivo discutir os fatores que contribuíram para o surgimento do comércio nas ruas Pompéia, Chegança e Boa Sorte. Para tanto, optou-se por realizar a investigação com base na regressão analítica dos processos sociais de produção do espaço urbano da Zona Norte, especialmente das ruas, objeto de estudo. O movimento de retorno aos processos de produção do espaço, consubstancia-se como o segundo momento do método de investigação regressivo-progressivo de Lefebvre (2000) adotado para a construção do trabalho em evidência. A seção está dividida em duas partes. Na primeira discute-se os processos históricos da expansão urbana de Natal com base na política habitacional e suas contribuições à formação da Zona Norte. Para tanto, buscou-se informações sobre a produção do espaço urbano da Zona Norte de Natal no contexto da expansão da cidade a partir de dados secundários como: dissertações, artigos científicos e informações compartilhadas das secretarias de tributação estadual e municipal. Na segunda parte, realizou-se um resgate histórico sobre a construção das ruas Pompéia, Chegança e Boa Sorte no que tange à função inicial de cada uma delas, voltada para a habitação e também sobre a sua trajetória comercial. Mediante a fragilidade de dados para subsidiar a pesquisa por parte de instituições públicas, o caminho de investigação utilizado na segunda parte da seção foi a análise de conteúdo que, segundo Bardin (2011, p.15), é um “conjunto deinstrumentos de cunho metodológico em constante aperfeiçoamento, que se aplicam a discursos (conteúdos e continentes) extremamente diversificados”. Por meio dela, permite-se desvendar o que está por trás do aparente, além do evidenciado na comunicação. Sendo assim, a análise de conteúdo possibilitou a interpretação crítica da fala dos entrevistados com base na exploração e análise de instrumentos verbais e/ou não verbais. Desse modo, para a interpretação das ruas Pompéia, Chegança e Boa Sorte, a análise do conteúdo foi empreendida a partir da realização de entrevistas com moradores, comerciantes e consumidores mais antigos a fim de se compreender, não somente o surgimento destas ruas e do comércio, mas fazer inferências críticas com base nos relatos do público entrevistado. Cabe mencionar que a transcrição 91 das entrevistas foi fiel às falas dos inquiridos, o que explica, em alguns trechos, a dificuldade de compreendê-los na sua completude. A partir da análise de conteúdo das entrevistas realizadas, compreendeu-se os processos que engendraram a produção do espaço das ruas em apreço, dando realce às suas dimensões social e econômica, considerando as permanências e coexistências. Desse modo, os momentos dessa produção foram analisados como pertencentes a um processo espiralar e não linear. Seguindo este raciocínio, utilizou-se das orientações de Bardin (2011) sobre análise de conteúdo, para estabelecer os caminhos de investigação, efetuada em três etapas distintas, a saber: pré-análise; exploração do material e tratamento dos resultados; inferência e interpretação. Para a primeira etapa foram definidos os indicadores iniciais com base na sistematização das ideias coletadas a partir das questões elaboradas para a entrevista. Na segunda, efetuou-se a decodificação das informações a partir da transcrição das entrevistas e levantamento de fragmentos do texto com indicadores comuns no intuito de agrupá-los em categorias temáticas. Já na terceira e última etapa, os fragmentos textuais foram interpretados e na sequência realizadas inferências sobre estes e também sobre conteúdos latentes, apresentados de forma subjetiva nas falas dos entrevistados. O caminho traçado por meio destas etapas foi crucial para responder à questão norteadora da seção, ou seja, quais fatores contribuíram para a consolidação do comércio nas ruas Pompéia, Chegança e Boa Sorte? Ademais, os eventos responsáveis por explicar os processos de produção do espaço urbano de Natal, especialmente da Zona Norte, foram obtidos a partir de fontes secundárias discriminadamente desenvolvidas na subseção seguinte. Quanto ao entendimento da produção do espaço nas suas nuances econômicas e sociais, desde à consolidação deste, pensado pela lógica do capital, até à incorporação das vivências do grupo que nele atua, as ruas estudadas foram interpretadas, teoricamente, a partir do pensamento desenvolvido por Lefebvre (2000) acerca da atuação das ordens próxima e distante na produção do espaço. Para o autor, a ordem distante é aquela que se realiza a partir de forças de comando externas ao espaço, como por exemplo os grandes capitais hegemônicos, instituições, e igrejas ao passo que a ordem próxima é aquele concernente ao local. Além disso, as ruas estudadas, como constituintes do espaço, são também 92 interpretadas à luz da discussão teórica desenvolvida pelo próprio Lefebvre (2000) quando trata do espaço concebido, percebido e vivido, entendidos inseparadamente. 3.1. A PRODUÇÃO DO ESPAÇO URBANO DE NATAL/RN E O COMÉRCIO: NAS TRILHAS DA ZONA NORTE As perguntas efetuadas impõem o entendimento do processo de produção do espaço, não apenas das ruas em foco, mas da própria cidade do Natal, uma vez que não se pode analisá-las como um elemento em si mesmo, mas enquanto parte constituinte de uma totalidade. Entretanto, o tempo não deve ser analisado pelo eixo da sucessão, mas sim das coexistências e simultaneidade e o próprio espaço geográfico carece de ser entendido à luz da mediação simultânea tanto de relações econômicas quanto sociais. A afirmação precedente foi desenvolvida com base nas ideias elaboradas por Santos (2008), ao discutir o espaço enquanto totalidade e por Lefebvre (2000), quando se debruçou sobre o entendimento deste conceito em sua ampla acepção. Não foi despretensiosa a fusão das ideias dos dois autores, visto que para se compreender a dinâmica hoje existente na Zona Norte de Natal e principalmente nas ruas Pompéia, Chegança e Boa Sorte, objeto empírico da pesquisa, faz-se mister a compreensão da produção do espaço urbano da cidade do Natal à luz de momentos que coabitam-se e debruçam-se sobre a inserção da Zona Norte neste processo. Desta forma, a referência temporal situa-se a partir da década de 1930, mas com alguns resgates pretéritos. Até esta década, Natal se apresentava como uma cidade com atividades, predominantemente executadas, na Cidade Alta, Ribeira e Alecrim, visto que, no começo do século XX e até mesmo em períodos anteriores, essas áreas eram expressivas em relação à concentração de investimentos, motivados principalmente pela necessidade de equipamentos urbanos que permitissem o escoamento da produção potiguar para outros países. Nas áreas mencionadas estava concentrada a maior densidade populacional de Natal com aproximadamente 16.056 habitantes no início do século supracitado (CUNHA ,1987). É válido ressaltar que esse contingente populacional computava um expressivo número de pessoas, vindas do interior do estado, em decorrência da 93 seca ocorrida em 1915. Cunha (1987, p. 13), na discussão sobre o processo da expansão territorial urbana da capital potiguar, destaca que esta cidade era como “o lugar que oferecia alternativas de sobrevivência, sede do comércio, dos organismos público e privados, e os imigrantes constituíam a força de trabalho abundante e barata”. O Alecrim foi o bairro que mais atendeu à necessidade de moradia dos migrantes de baixo poder aquisitivo, além do mais tornou-se preferido pelo modo de vida interiorano nele existente, com destaque para as feiras e fragmentos da vida rural, como a presença de granjas e a criação de gado bovino. Essa pressão populacional foi um fator importante para que Natal, também, nas primeiras décadas do século XX, tivesse uma expansão territorial relevante, surgindo, a necessidade de equipamentos urbanos como: a construção da ponte sobre a Rio Potengi, a criação de agências bancárias e ainda a expansão das estradas na cidade para atender o emergente setor de transporte. Somando-se a esses eventos, destaca-se a instalação da luz elétrica, sendo este um fator fundamental para o crescimento da cidade. No âmbito deste, cabe mencionar o crescimento interno da indústria de bens de consumo como alimentos, sal, calçados, bebidas e tecelagem por ocasião da proibição de importações durante a I Guerra Mundial (CUNHA, 1987). Toda a transformação ocorrida na cidade requereu a elaboração do chamado Plano de Sistematização de Natal no final da década de 1920 que priorizou o sistema viário da cidade e a articulação dos Bairros Ribeira e Cidade Alta. O referido plano traçava a organização urbanística da capital potiguar para os próximos 50 anos a partir de sua implantação. No entanto, foi a partir da Segunda Guerra Mundial que Natal apresentou um crescimento urbano expressivo associado às melhorias urbanas consideráveis, as quais lhes garantiu a reafirmação do estatuto de cidade e de capital do estado. Dentre os eventos que impulsionaram o crescimento da dinâmica sócio-espacial de Natal, destacou-se a Segunda Guerra Mundial – 1939-1945, que projetou a cidade para o mundo. Neste período a capital potiguar inseriu-se nos planos de pouso dos americanos devido a sua localização estratégica, servindo como importante ponto de apoio aos interesses bélicosdaquele país. Pode-se inferir que o interesse americano decorreu do fato de que, já nos anos de 1930, a capital potiguar era especulada pela sua localização estratégica ao sediar o primeiro voo transatlântico entre São Luis do Senegal e Natal, sem escala, sendo este fato documentado na figura 2. 94 A figura 2, portanto, é emblemática ao evidenciar o interesse, não apenas dos franceses, mas também dos italianos e americanos devido à localização da cidade. Desse modo, observado o sucesso do voo de São Luis no Senegal para Natal e tantos outros realizados sem a necessidade de escala, ficara evidente o potencial desta cidade como frente de apoio na deflagração de um conflito mundial. Foi então na Segunda Guerra Mundial, que os americanos viram a possibilidade de proteger seu território e construíram a maior base aérea fora do país, criada em 2 de março de 1942 pelo Decreto Lei nº 4.142. A base aérea abrigou 10.000 soldados, o que correspondia à época a 20% da população de Parnamirim, conhecida internacionalmente como Parnamirim field (CASCUDO, 19996). Câmara Cascudo (1999), ao se referir à Natal como terra de “tradição e história”, carrega nas tintas a construção da história da cidade. O autor resgata a importância da instalação da base aérea em Paramirim durante a Segunda Guerra Mundial como um feito na projeção de Natal para o restante do mundo naquele período. Nas palavras do autor, “Parnamirim começou a ser citada porque aí 6 Edição comemorativa do centenário de nascimento de Luís da Câmara Cascudo (1998), sendo a obra original de 1980. Figura 2 - Placa que anuncia primeiro voo transatlântico ocorrido em 1930 entre São Luis do Senegal e Natal Fonte: Bertazzo, 2016. 95 chegavam ministros de Estado, embaixadores, generais, almirantes, jornalistas, industriais, gente de fotografia em jornal e freguesia nos noticiários” (CASCUDO, 1999, p. 421-422). Com Natal também em evidência no cenário mundial, o interesse pela cidade foi despertado não apenas por estrangeiros, mas também por pessoas migrantes de outras partes do Rio Grande do Norte. Por conseguinte, a chegada dos soldados americanos, em concomitância com o grande contingente de migrantes vindos do interior do estado, fez surgir novas demandas de cunho econômico e social em Natal. De acordo com Vidal (1998), uma cidade que inicialmente mostrou-se deficiente quanto às ofertas de comércio e moradia, passou a apresentar uma dinâmica sócio-espacial significativa, tendo em vista que a sua população quase duplicou, fazendo emergir a necessidade de novas moradias e casas comerciais com mercadorias mais sofisticadas à época. Nas palavras da autora (1998, p. 24), “a procura por casas de aluguel se intensificou e a construção de moradias para este fim passou a ser um negócio lucrativo”. Neste período, a cidade se mostrou cada vez mais atrativa, despertando o interesse pela moradia na capital, o que ocasionou o crescimento das construções imobiliárias. Esse crescimento se conformou acompanhado de uma crescente mão- de-obra para a construção civil e também comercial, fazendo com que Natal quase duplicasse sua população entre as décadas de 1940 e 1950, passando de 54.836 para 103.215 habitantes. A partir de então, a demanda por habitação aumentou, de modo que, já na década seguinte, ou seja, 1960, ocorreu a primeira intervenção do Estado em relação à habitação com a construção do Conjunto Habitacional da Cidade da Esperança, localizado na Zona Oeste, conformado como o primeiro empreendimento habitacional na cidade. O referido empreendimento foi construído na gestão do Governo Aluísio Alves por meio da Fundação de Habitação Popular, que objetivou a construção de 560 casas populares voltadas a atender à população de baixa renda que não tinha condições de acesso à moradia (ARAÚJO, 2004). Desta forma, iniciou-se em Natal a política habitacional expressamente empreendida na produção do espaço urbano. Sobre este conceito de produção do espaço, Lefebvre (2000) o desenvolveu trilhando caminhos sobre a produção no sentido stricto sensu. O autor induz a interpretação de que é preciso que se compreenda as diversas relações existentes no processo de produção sem perder de vista àquelas que se efetivam do âmbito da família à esfera do Estado. O autor 96 discorre sobre o espaço geográfico e as práticas espaciais que os homens desenvolvem no mesmo. Lefebvre (2000, p.77) supõe que “na prática espacial, as representações do espaço e os espaços de representação intervêm diferentemente na produção do espaço: segundo suas qualidades e propriedades, segundo as sociedades (modo de produção), segundo as épocas”. No contexto da produção do espaço, enquanto o restante de Natal crescia em termos habitacionais e econômicos, a urbanização da Zona Norte caminhava a passos lentos, tendo início em Igapó, cuja área deixou de pertencer à zona rural do município de Macaíba, ocupada por casas de farinha, pequenas plantações de feijão e milho e também pela criação de gado destinado à produção de leite para o consumo doméstico, passando a ser incorporada à Zona Rural de Natal em 1953 pelo decreto 981/53. Esta área passou a ser ocupada por loteamentos entre 1957- 1975 que foram reparcelados nas décadas de 1980 e 1990. São eles: Parque Floresta (1957), Parque Santa Catarina [1960 (ocupado pela COHAB para transformar em conjunto habitacional em 1978)]; loteamento de Humberto Pignataro e outros (1964), Loteamento América (1965), loteamento Aldeia Velho e por último o loteamento Santarém (1974), (SILVA, 2003). 7 Por estar localizado do outro lado da cidade, separado pela fronteira natural constituída pelo Rio Potengi, o Bairro de Igapó permaneceu por muito tempo em condições de crescimento desanimadoras. Entretanto, a integração física entre este bairro e o restante da cidade foi efetivada com a construção da Ponte Rodoferroviária de Igapó (Figura 3) em 1969, iniciando assim o processo de expansão urbana em direção à porção norte da cidade do Natal. 7 O reparcelamento dos loteamentos se justifica pelo fato de que, no final da década de 1950-1960, o mercado de terras fazia a divisão do terreno em proporções aproximadas de grande dimensão de 20X30m² por lote em virtude do baixo preço do solo. No entanto, com a implantação do Distrito Industrial de Natal – DIN - na década de 1970, fazendo surgir a necessidades de moradia para atender à força de trabalho empregada na indústria, os lotes existentes precisaram ser reparcelados tendo suas dimensões reajustadas para a construção de conjuntos habitacionais. 97 A construção da ponte possibilitou novas perspectivas de crescimento para Igapó através da instalação de empresas de grande porte como a Seridó Indústria Têxtil, de capital estrangeiro, além de outros investimentos (CUNHA, 1987). Este fato, atrelado ao baixo preço do solo na Zona Norte, despertou interesse do mercado imobiliário, visto que no restante da cidade, os terrenos se valorizavam frente aos incentivos fiscais e financeiros à indústria e à infraestrutura efetivados pela Superintendência do Desenvolvimento do Nordeste (SUDENE), conjuntamente com a política de desenvolvimento do regime militar em 1964. Sobre os equipamentos resultantes desta política, podem ser citados grandes unidades como o Centro Administrativo, o Campus Universitário da Universidade Federal do Rio Grande do Norte, o Hospital Walfredo Gurgel, Médico Cirúrgico, a ampliação da Policlínica, etc. Neste contexto de expansão de Natal, a Zona Norte ganhou expressividade a partir de Igapó, com a implantação do Distrito Industrial de Natal (DIN) na décadade 1970 (Figura 4) influenciado pela SUDENE. Para Araújo (2004, p. 43) A instalação do DIN em área de expansão da cidade deixa claro que: a intervenção planejada do Estado no sentido de favorecer o capital industrial, ao definir uma área de expansão urbana e com potenciais recursos humanos, concentrando abundante mão-de-obra necessária às industrias a serem instaladas. Fonte: CUNHA, 1987. Figura 3 - Ponte Rodoferroviária de Igapó nos anos de 1970 98 Nesta conjuntura, o crescimento territorial de Natal em direção à Zona Norte fez emergir a preocupação com a questão habitacional. Desta forma, nos anos de 1970, seguindo o mesmo padrão de construção e perfil de público atingido no caso do Conjunto Habitacional da Cidade da Esperança na Zona Oeste, a política habitacional passou a atuar na Zona Norte, dando maior expressão à produção do espaço daquela área. Sobre este conceito, deve-se compreendê-lo, não apenas como a produção no sentido restrito dos economistas – isto é, o processo de produção das coisas e de seu consumo -, mas também a reprodução das relações de produção. Nesta ampla acepção, o espaço da produção implicaria e encerraria uma orientação comum a todas às atividades dentro da sociedade neocapitalista. Trata-se da produção no mais amplo sentido da palavra: produção das relações sociais e reprodução de determinadas relações (LEFEBVRE, 2000). Seguindo a perspectiva de Lefebvre (2000), observa-se que na Zona Norte, a reprodução das relações sociais de produção se efetivavam por meio da habitação na medida em que a moradia se consolidou nesta área da cidade, de acordo com o processo de instalação do DIN, o qual ocorreu em três etapas, conforme resgate feito por Araújo (2004). A primeira etapa ocorreu entre junho de 1978 e junho de 1980 consistindo na desapropriação de áreas e na edificação das instalações físicas; a segunda fase, situada entre junho de 1980 e junho de 1984, objetivava a Figura 4 - Distrito Industrial de Natal – DIN nos anos 1970 Fonte: CUNHA, 1987 99 implantação de 2,06 km de via férrea, armazéns de carga e estações ferroviárias. A terceira etapa, ocorrida entre junho de 1984 e junho de 1988 consistiu na implantação de armazéns, ampliação das estações ferroviárias e investimentos na aparelhagem de equipamentos básicos como abastecimento de água por parte da Companhia de Água e Esgotos do RN (CAERN), energia elétrica de responsabilidade Companhia de Serviços Elétricos do RN (COSERN) e a interligação da área através da construção de vias por meio do Departamento de Estradas e Rodagens (DER). O espaço em formação deu margem a uma nova dinâmica sócio-espacial fazendo emergir um roteiro que viabilizasse a ligação entre a Zona Norte e o restante da cidade facilitando, por exemplo, a acesso ao porto de Natal, localizado na Ribeira, Zona Leste. Como consequência, a questão da habitação passou a ser um tema de interesse por parte de agentes produtores do espaço, interessados na reprodução do capital, ocasionando então o início da expansão urbana de Natal em direção à Zona Norte. A expansão da cidade ganhou representatividade com a política habitacional coordenada pelo Banco Nacional da Habitação (BNH) criado em 1964, com o objetivo de fomentar uma política de habitação que atendesse, sobretudo, às camadas mais populares da população, visto que a industrialização, em expansão em todo o país, fazia emergir o problema da moradia. No caso de Natal foram importantes para a produção do espaço urbano, a atuação da COHAB/RN com a construção de moradias para a população de baixa renda, principalmente na Zona Norte, a partir da década de 1970, e o Instituto de Orientação às Cooperativas Habitacionais (INOCOOP), que projetava construções para a Zona Sul para atender à população de poder aquisitivo mais elevado. A diferenciação entre os conjuntos habitacionais edificados pelo INOCOOP na Zona Sul em relação à construção pela COHAB na Zona Norte, permite reflexões sobre a produção do espaço que resulta de uma racionalidade social. Esta racionalidade também deriva da ação de agentes concretos que atuam no espaço, conforme interesses particulares, a exemplo do próprio Estado que produz o espaço também por meio de políticas públicas e atua como agente regulador. Os conjuntos habitacionais construídos pelo INOCOOP, como por exemplo, o conjunto Neópolis, Candelária, Mirassol, Parque das Serras, Parque das Rosas e Ponta Negra valorizaram a Zona Sul de forma que esta valorização, deu margem à 100 formação de diversos loteamentos como Cidade Jardim, Max Santana, Capim Macio, Jardim Holanda e tantos outros, entre 1970-1980. Em virtude do padrão de habitação e poder aquisitivo de seus moradores, a Zona Sul se transformou na área de status mais elevado de Natal. Já a COHAB se responsabilizou pela construção de conjuntos na Zona Norte, que atendessem aos trabalhadores com baixos salários, sendo o conjunto Potengi e Igapó, construídos na década de 1970, os embriões da expansão urbana daquela área da cidade. Além da classe trabalhadora na indústria, os conjuntos habitacionais da Zona Norte atenderam parte dos moradores que foram pressionados a migrar para áreas periféricas da cidade. Este fato é explicado pela valorização do solo urbano decorrente da implantação de equipamentos de infraestrutura e serviços para atender às necessidades da classe mais favorecida na Zona Sul, enquanto que a Zona Norte se encontrava carente de tais investimentos. Enquanto viés interpretativo sobre a produção do espaço que resulta de uma racionalidade social e da ação de agentes concretos que nele atuam conforme interesses particulares, o Estado viabilizou a produção do espaço em Natal também por meio de políticas públicas urbanas e atuou como agente regulador. Em verdade, conforme explicitado por Harvey (2005) o Estado cumpre o papel na sociedade capitalista de viabilizar as bases para a reprodução capitalista no espaço. A produção do espaço refere-se, neste caso, a um processo sócio-espacial determinado pelas relações sociais de produção em que “de fato toda sociedade produz “seu” espaço, ou, caso se prefira, toda sociedade produz “um” espaço. (LEFEBVRE, 2008b, p. 55). Dito isto, entende-se que este processo é mediado pela prática de agentes que deixam impressas suas marcas. A motivação de Lefebvre (2000) ao escrever sobre este tema decorreu das suas indagações sobre a reprodução das relações sociais e a organização do espaço no contexto da produção capitalista sobre o território. Por este viés interpretativo, percebe-se que, a produção do espaço urbano de Natal através da política habitacional consolidada pelo INOCOOP e COHAB, ocasionou a formação de uma malha urbana desigual. Sobre este processo, Rodrigues (1989, p. 29), ao discutir as mais variadas formas de habitação nas cidades brasileiras, expõe que: 101 A diversidade dos grandes conjuntos, com a monotonia das edificações – sejam os vinculados ao BNH – (COHABs, INOCOOPs) ou empresários; dos condomínios fechados, com total infraestrutura e segurança – sejam em blocos de edifícios, sejam em unidades térreas; dos sobrados e casas geminadas; das garndes mansões; das casas eteramente inacabadas; das favelas e dos cortiços, deixam visível uma cidade com vários bairros segregados entre si, uns pela riqueza e a grande maioria pela pobreza. Desta forma, a produção do espaço urbano de Natal a partir da política habitacional financiada pelo BNH, deixa evidente um perfil de construção diferenciado quando postas em comparação às áreas Sul e Norte de Natal. Esta última, muito claramente marcada por uma desvalorização socioeconômica, sendo compreendida, por alguns, como um espaço de segregação social. Cunha (1987, p.65), ao discorrer sobre a expansão urbana de Natal, apontaque “há uma relação direta entre a forma espacial da cidade e os processos gerais resultantes da alocação de recursos governamentais no meio urbano”. Neste caso, a desprovida infraestrutura para atender a população do Zona Norte, se constituiu num fator de segregação sócio-espacial daquele espaço em relação ao restante da cidade, visto que nem a Ponte Rodoferroviária de Igapó fora capaz de superar. A segregação sócio-espacial de Natal, tomando por referência a política habitacional desenvolvida nas zonas Sul e Norte, foi discutida por Vidal (1998), que se referiu a estas zonas como “os dois lados da cidade” de tal modo tão diferentes, que nem a construção da ponte de Igapó foi capaz de integrá-las. Sobre o tema da segregação, a autora assinala que: No que diz respeito à estruturação do espaço urbano aceita-se que à segregação urbana, que é recriada nos diferentes momentos da expansão da cidade, é um processo que organiza o espaço em zonas com alto grau de homogeneidade social interna e grandes disparidades entre si, não só em termos de características distintas como hierarquia (VIDAL, 1998, p.52). Corrobora-se com a autora, visto que a Zona Norte se configurou como um espaço de segregação por uma série de fatores inerentes ao seu próprio processo de produção, dentre os quais cabe mencionar, na presente pesquisa, a construção de habitação para os trabalhadores nas proximidades dos seus postos de trabalho, como forma de baratear o custo de reprodução social da força de trabalho. Contudo, é a partir da década de 1980 que a Zona Norte apresentou uma transformação significativa na sua dinâmica espacial marcada pela expansão urbana de Natal. Foi neste período que o poder público agiu com maior contundência nesta 102 área da cidade com a construção de grandes conjuntos habitacionais financiados pelo BNH, a exemplo dos conjuntos Santa Catarina com 2.200 habitações e Soledade II com 1.945 habitações. A política habitacional teve continuidade nos anos 1990 e 2000 conforme mostra o quadro 6: Quadro 6 - Conjuntos habitacionais construídos na Zona Norte de Natal/RN BAIRRO CONJUNTO ANO UNIDADES Potengi Potengi 1976 379 Panorama I 1977 260 Panorama II 1978 80 Soledade I 1978 540 Panatis I e III 1979 1123 Santa Catarina 1980 2200 Panatis II (Programa de Erradicação de Sub- Moradias (Promorar)) 1981 220 Soledade II 1982 1945 Santarém 1983 2579 Morada CNB I e II 1991 144 Apern 1991 48 Planície das mangueiras 1991 76 Nossa Sra. da Apresentação Parque dos coqueiros 1990 2088 Alvorada IV 1991 260 Planície das Mangueiras 1991 76 Alameda das Fronteiras 1992 50 Icapuí * 96 Igapó Igapó 1976 113 IPE * 32 Nova Igapó * 28 Manoel Leopoldo * 48 Cidade do Sol 144 Lagoa Azul Gramoré 1983 1708 Nova Natal (lotes urbanizados) 1983 1000 Nova Natal 1984 1863 Eldorado 1991 153 Cidade Praia * * Pajuçara I 1985 992 103 Pajuçara Pajuçara II 1988 948 Novo Horizonte 1990 204 Vista Verde 1990 216 Vista Verde I 1990 281 Vista Verde II 1990 216 Parque das Dunas I-IV 1990 1512 Brasil Novo 1990 324 Além Potengi 1990 216 Morada Alvorada 1991 190 João Paulo II * 154 Redinha Jardim das Flores * 126 Niterói * 300 Raio de Sol * * Casa Nova * * Habitacional do EMPERCOM * * Salinas Autoconstrução * * Total 22.932 A partir dos dados apresentados é possível inferir que a construção de conjuntos habitacionais na Zona Norte, que até então limitava-se praticamente a Igapó, ganhou impulso a partir da década de 1980. Foi neste período que Natal se tornou um município totalmente urbano, fortemente influenciado pela chegada da indústria, fato que ocorreu interligado ao contexto nacional de industrialização brasileira. Dentre os conjuntos habitacionais construídos neste período na Zona Norte, pode-se citar Santa Catarina, Soledade e Santarém, que juntos ofertaram 7.264 unidades habitacionais. Reportando-se novamente ao quadro 3, percebe-se uma maior concentração de conjuntos construídos na década de 1990, em especial no Bairro de Pajuçara, sinalizando a expansão da Zona Norte. No entanto, espacializando os números apresentados, percebe-se que a ocupação desta área não ocorreu de forma simultânea e progressiva ao longo do tempo, uma vez que já na década de 1980 o Bairro de Lago Azul, localizado do extremo norte da Zona Norte Fonte: Secretaria Municipal de Meio Ambiente e Urbanismo – SEMURB, 2008 * Informação indisponível 104 continha três conjuntos, a saber Gramoré, Nova Natal e Nova Natal (com lotes urbanizados). Diante dessa expressiva expansão do espaço urbano de Natal, por meio da política habitacional, surgiu nas áreas recém ocupadas, uma contundente atividade comercial que passou a atender às necessidades de consumo da população da área, reafirmando, desse modo, o protagonismo indissociável entre cidade e comércio. Assim, a expansão urbana impulsionada pela política habitacional criou a necessidade da construção de equipamentos vinculados ao crescimento da atividade comercial, desencadeando a sua desconcentração da área central de negócios de Natal formada pelos bairros Alecrim, Ribeira e Cidade Alta. Essa desconcentração das atividades de comércio não se constituiu num fenômeno específico de Natal, mas acorreu também em outras cidades brasileiras. Segundo Justino e Lopes (2015, p. 89), ao se remeteram à discussão do comércio informal na cidade de Uberlândia/MG, problematizam que as modificações ocorridas nas áreas centrais das cidades brasileiras, a exemplo da descentralização das atividades comerciais, foram decorrentes de “uma saturação devido aos altos valores do preço da terra, congestionamento nas vias, falta de vagas para o estacionamento e falta de espaço para a expansão das lojas, propiciando a descentralização dessas atividades comerciais”. Como fator para a descentralização do comércio nas áreas centrais também está a distância geográfica do centro comercial em relação às áreas de expansão. Neste sentido, Corrêa (1997), destaca que esse rápido crescimento não só da cidade, mas também do urbano aumentou a distância entre a área central e as novas áreas ocupadas. A desconcentração da atividade comercial nas áreas centrais de Natal ocorreu simultaneamente com a chegada do comércio varejista moderno na cidade, cujo marco foi a instalação do Hiper Bom Preço em 1982 no Bairro Lagoa Nova. Cabe mencionar que o varejo moderno em Natal não se conformou num fato isolado do cenário brasileiro, cujo marco temporal foi a década de 1970. Neste período a modernização das relações socioeconômicas do setor terciário, relacionado às inovações tecnológicas, promoveu esse processo nas cidades. Desta forma, enquanto parte do terciário em contexto de inovações, o varejo moderno começou a ganhar evidência nas grandes cidades brasileiras. 105 Guimarães Neto e Santos (2006), ao discutirem a economia de Pernambuco à luz do comércio varejista moderno, o conceituam como uma expressão diferenciada no que se refere à combinação de negócios, às estratégias de marketing utilizadas, o padrão de atendimento, a utilização de novas tecnologias, além de uma tendência à especialização do mercado e o elevado índice de formalização e profissionalização de seus funcionários. Este tipo de comércio foi se expandido em Natal, após a chegada do Hiper Bom Preço, de forma que outros estabelecimentos foram surgindo também na Zona Sul da cidade não só no que diz respeito ao segmento voltado preponderantemente para a alimentação, mas também para outros segmentos como o Shopping Centers Natal Sul e Cidade Jardim e os Centros Comerciais Aloisio Bezerra (CCAB-SUL e CCAB-Norte). A chegada destes estabelecimentos sinalizou a conformação de equipamentos comerciais modernos em Natal, a exemplo docentro comercial no formato de Shopping Centers. Todavia esta forma já pertencia à realidade de algumas cidades brasileiras como reflexo do comércio e do consumo modernos evidenciados em décadas anteriores em outros países, a exemplo dos Estados Unidos em que os Shopping Centers já compunham a paisagem no segundo pós- guerra. No Brasil, esta forma surgiu na década de 1960, “no momento em que as condições de desenvolvimento do capitalismo necessitavam do monopólio do espaço, para reprodução continua e ampliada do capital” (PINTAUDI, 1992, p.16) Todavia, a implantação dos Shopping Centers Natal Sul e Cidade Jardim e os centros comerciais Aloisio Bezerra (CCAB-SUL e CCAB-Norte) em Natal eram empreendimentos que não compartilhavam da mesma semântica dos Shopping Centers estudados por Pintaudi (1992), ou seja, aqueles vinculados ao varejo sofisticado com ambientes fechados e climatizados, estacionamento e demais características de um shopping moderno. O Natal Shopping Center, aberto em 1992, e o shopping Via Direta, inaugurados em 1993, foram os primeiros a atenderem a estes requisitos. Os equipamentos do comércio moderno e das atividades de serviços passaram a ocupar os principais eixos articuladores da capital potiguar como as avenidas Engenheiro Roberto Freire, Tomaz Landim, Airton Sena, Romualdo Galvão e Jaguarari (GOMES; SILVA; SILVA, 2002). Nestas se concentram atividades ligadas ao varejo moderno com destaque para o comércio e os serviços como supermercados, serviços bancários, shopping centers, lojas, hotéis e outros, 106 mudando assim, o padrão de localização do setor que até a década de 1980 estava centralizado nos bairros do Alecrim, Ribeira e Cidade Alta. No contexto do crescimento urbano de Natal e sua consequente descentralização dos bairros Alecrim, Cidade Alta e Ribeira, a cidade passou a apresentar a emergência do varejo moderno também na Zona Norte. Paula (2010), ao discutir a dinâmica do comércio varejista moderno nesta área da cidade, expressa que “com a expansão do terciário, a cidade amplia seu espaço econômico e busca outros mercados consumidores (mais pessoas pra consumir, em outros locais da cidade” (PAULA, 2010, p. 39). Nesta área da cidade foram implantadas estratégias pela Prefeitura Municipal a fim de impulsionar a atividade comercial, principalmente a partir da implantação de formas do varejo moderno nos principais eixos articuladores como as avenidas Bacharel Tomaz Landim e Doutor João Medeiros Filho. A forma comercial emblemática para a chegada deste segmento de comércio na Zona Norte ocorreu em 1982, quando foi instalado na Avenida Bacharel Tomaz Landim, no Conjunto Habitacional Santa Catarina, uma unidade da rede de supermercado “o Nordestão”. De acordo com Paula (2010), o estabelecimento começou a funcionar na Zona Norte com a bandeira do Hiperbox (uma rede formada por mercados maiores e variedade de produtos) e após uma grande reforma ocorrida em 1986, passou a atuar como supermercado, sendo o de maior referência para a Zona Norte. Após passar pela segunda reforma, no ano de 2006, o supermercado ganhou a forma que se conhece no presente ano de 2017. Contudo, mesmo com o embrião do varejo moderno nesta área da cidade em potencial de expansão, a mesma ainda ficou a parte da oferta de comércio e serviços relacionados ao segmento, dependendo da dinâmica da atividade comercial que acontecia na Zona Sul. Somente na segunda metade da década de 1990 é que o varejo moderno começou a se expandir na Zona Norte devido o interesse dos grandes empresários em construir equipamentos comerciais nesta área. O objetivo consistia em atender ao expressivo crescimento populacional da área, principalmente entre as décadas de 1980-1990-2000, conforme observado na tabela 2 e melhor representado no gráfico 16. 107 Tabela 2 - Evolução da população da Zona Norte de Natal/RN – 1980 a 2010 Fonte: Mineiro (1998), Prefeitura Municipal de Natal (2012) (Elaboração da autora, 2016). Gráfico 16 - Evolução da população da Zona Norte de Natal/RN – 1980 a 2010 No gráfico 16, pode-se observar um expressivo crescimento populacional em todos os bairros da Zona Norte entre as décadas de 1980 – 2000, exceto no Bairro Salinas que apresentou uma pequena diminuição populacional entre os anos de 1996 e 2000, porém recuperando o quantitativo populacional já em 2010. Os números da tabela 2 e, de forma mais clara no gráfico 16, demonstram a expansão Bairro Ano Potengi Nossa Sra. da Apresentação Igapó Lagoa Azul Pajuçara Redinha Salinas 1980 20.604 1.074 14.055 475 485 3.632 155 1991 55.877 12.982 24.354 9.864 13.259 6.581 529 1996 56.221 38.708 25.577 40.199 35.300 9.084 1.026 2000 56.259 56.522 27.032 50.413 42.130 11.504 883 2010 57.848 79.759 28.819 61.289 58.021 16.630 1.177 Fonte: Mineiro (1998), Prefeitura Municipal de Natal (2012) (Elaboração da autora, 2016). 108 urbana da Zona Norte a partir da política habitacional. Faz-se salutar chamar a atenção para o caso dos bairros Pajuçara, Nossa Senhora da Apresentação e Lagoa Azul, onde se localizam respectivamente as ruas Pompéia, Boa Sorte e Chegança. A população dos dois primeiros bairros cresceu exponencialmente quase triplicando na primeira metade da década de 1990 e no caso de Lagoa Azul, quadruplicando. A duplicação da Ponte Costa e Silva, conhecida popularmente como a Ponte de Igapó, se constituiu no evento explicativo para a representatividade da ocupação da Zona Norte na década de 1990, conforme mostrado na figura 5. Este equipamento promoveu a sua integração com as demais zonas administrativas da cidade, facilitando assim o uso do automóvel. Na expressão de Araújo (2004, p. 44) “a nova Ponte de Igapó tornou-se um evento aliado ao novo processo que se configurava, dando maior fluidez ao tráfego destinado ao referido espaço e aos municípios vizinhos”. Ainda para a autora, a referida ponte se constituiu num importante equipamento de infraestrutura da cidade impulsionando a construção civil na Zona Norte e sua consequente especulação imobiliária. Fonte: Costa (2012). Todavia, foi a partir da primeira década do século XXI que a dinâmica espacial da Zona Norte passou a ser fortemente influenciada pelo varejo moderno, redefinido os hábitos de consumo da área. Tal fato se deu principalmente a partir da Figura 5 - Ponte Costa e Silva (Igapó) duplicada 109 instalação do Carrefour inaugurado em 2006; Natal Norte Shopping em 2007, renomeado em 2014 para Partage Nort Shopping em virtude da gestão pela rede de investimentos imobiliários Partage; Atacadão e o Shopping Estação, ambos inaugurados em 2008 e Atacadão Autosserviço e o Armazém Pará que entrou em funcionamento também em 2008. Estes estabelecimentos se instalaram nos principais eixos articuladores da Zona Norte, a saber a Avenida João Medeiros Filho e Tomaz Landim. Nas proximidades destas avenidas, as vias de acesso secundário como as ruas Pompéia, Chegança e Boa Sorte, passaram a contar com estabelecimentos comerciais de pequeno porte para suprir, inicialmente nos anos 1980-1990, a necessidade de consumo da população que se instalava, principalmente por meio de ocupação espontânea. A posteriori, a partir dos anos 2000, a atividade comercial passou a exercer papel importante nestas ruas, configurando-se como estratégia de reprodução das próprias relações locais, resultante da produção do espaço numa lógica contra-hegemônica. A expansão da atividade comercial nas ruas mencionadas evidencia que o comércio na Zona Norte é permeado por duas lógicas: aquela de conteúdo hegemônico efetivado pelas forças do capital e paralelamente aquele comércio que se conformou numa contra-hegemonia de conteúdo social. Essa segundalógica de comércio, além de gerar emprego, tem uma função de proximidade tanto física quanto social. A primeira expressão, chamada de comércio moderno, é marcada principalmente pelo autosserviço, pela gestão capitalista e pela localização em principais vias de circulação de veículos, pedestres e informações. Em contrapartida o comércio tradicional mantém uma relação de proximidade social com o cliente em que a figura do vendedor permanece importante para a decisão de compra da mercadoria. Este tipo de comércio se localiza nas vias de acesso secundárias e apresenta o predomínio de gestão familiar nos estabelecimentos. Corrobora-se então com Pintaudi (1999) quando explana que o crescimento da cidade impulsiona o aumento e o desenvolvimento do comércio. Na Zona Norte, as duas expressões de comércio se fazem presente: o comércio moderno e o tradicional. A presente pesquisa debruça-se sobre a segunda expressão fortemente representada no comércio das ruas Pompéia, Chegança e Boa Sorte, objeto empírico em discussão. 110 Foi o crescimento da atividade comercial nas ruas estudadas que suscitou o questionamento sobre os fatores que influenciaram o surgimento desse processo. A inquietação conduz à busca de respostas para a leitura destas ruas, pensadas inicialmente dentro da lógica de produção do espaço, seja através da política habitacional ou de autoconstruções para suprir a carência da moradia no início dos anos 1980 e consecutivamente 1990-2000, e que nos dois primeiros decênios do século XXI vem incorporando expressivamente a atividade de comércio. Responder à questão suscitada é o que se pretende na subseção que segue por meio de resgate da memória sobre o lugar. 3.2. O RESGATE DA MEMÓRIA: NARRATIVAS SOBRE AS RUAS POMPÉIA, BOA SORTE E CHEGANÇA A memória é a consciência inserida no tempo (Fernando Pessoa) Para responder à questão acerca dos fatores que contribuíram para o surgimento do comércio nas ruas Pompéia, Chegança e Boa Sorte, o ato de pensar e refletir torna-se fundamental entendendo que este requer organização das ideias para a elaboração consciente das lembranças, tanto atuais quanto passadas. Pensar sobre o tempo no fragmento elaborado por Pessoa é refletir sobre os conteúdos nas mais diversas temporalidades que os indivíduos são capazes de carregar nas suas memórias. É comum encontrar um grupo de pessoas normalmente recordando entre si ou individualmente sobre o tempo vivido no passado ou no presente, seja com boas ou não tão agradáveis lembranças. São diversos os assuntos: família, festa, amores, viagens, trabalho. A memória está ligada diretamente à identidade de cada indivíduo, ou seja, uma identidade ligada à imagem de si mesmo. Discutindo sobre memória e identidade na história, Pollak (1992, p.5) argumenta que: Se podemos dizer que, em todos os níveis, a memória é um fenômeno construído social e individualmente, quando se trata da memória herdada, podemos também dizer que há uma ligação fenomenológica muito estreita entre a memória e o sentimento de identidade. Aqui o sentimento de 111 identidade está sendo tomado no seu sentido mais superficial, mas que nos basta no momento, que é o sentido da imagem de si, para si e para os outros. Isto é, a imagem que uma pessoa adquire ao longo da vida referente a ela própria, a imagem que ela constrói e apresenta aos outros e a si própria, para acreditar na sua própria representação, mas também para ser percebida da maneira como quer ser percebida pelos outros. A memória que, também pode ser utilizada como recurso num processo investigativo de finalidade acadêmica, se associa à ideia de que a interpretação das falas de consumidores, moradores e/ou comerciantes mais antigos das ruas Pompéia, Chegança e Boa Sorte, baseada na análise de conteúdo, fornece elementos explicativos para responder à questão da pesquisa acerca dos fatores que contribuíram para o surgimento do comércio nas ruas citadas. Parte-se da conjuntura de que a rua, onde o comércio se desenvolve, constituiu-se no “caminho (espaço) público onde as relações de troca podem ser realizadas através do trato social, da convivência e da conversação” (VIEIRA FILHO, 2011, p. 2). 3.2.1. MEMÓRIAS SOBRE A RUA POMPÉIA A memória pode servir como um cominho para a interpretação das recordações. Ela pode aflorar a partir do esforço do pensar sobre as lembranças espontâneas e eternizadas em pensamentos, imagens e fotografias que carregam no seu conteúdo a materialização de acontecimentos diversos, inclusive de eventos construídos no imaginário dos leitores da história. Pensando nisto, remete-se às figuras 6 e 7 que representam o ponto de partida para se retratar a ocupação da Rua Pompéia, na Zona Norte de Natal/RN. 112 Entre as sombras de uma montanha e as águas cintilantes da baía de Nápoles, um dia existiu uma cidade viva e vibrante. (PLATT, 2011, p.2) O comércio dessa rua aí é forte! O comércio da Pompéia é forte! (Comerciante da Rua Pompéia/RN, 2016) Figura 6 - Ilustração de rua na cidade Pompéia, Itália em 150 a.C. Figura 7 - Rua Pompéia – Zona Norte de Natal/RN/2016 Fonte: Platt, 2011. Fonte: View, 2015. 113 Pode parecer ousado apresentar para o leitor, ilustrações de rua na cidade Pompéia na Itália de 150 anos a.C e a Rua Pompéia na Zona Norte de Natal em 2016. No entanto, mesmo com temporalidades e contextos espaciais muito distantes, as duas imagens deixam transparecer algumas questões merecedores de uma interpretação que indica semelhanças, em especial a origem do nome da Rua Pompéia da Zona Norte, hoje oficialmente denominada de Avenida Governador Antônio de Melo e Souza. Seria coincidência a rua da Pompéia Italiana da figura 6 se constituir como uma linha divisória de dois tipos de habitação da mesma forma que acontece na rua de mesmo nome na Zona Norte de Natal? No caso da rua na cidade italiana, fica claro que no lado esquerdo da figura 6 existe um perfil de habitação composto por pequenas dependências ocupadas por pessoas aparentemente menos abastadas, enquanto que do lado direito à moradia é absolutamente constituída por grandes casarões. No caso da Pompéia Potiguar (figura 7) também existe uma divisão no perfil de ocupação da rua em que de um lado construiu-se um conjunto habitacional e do outro a habitação aconteceu de forma desordenada sem o acompanhamento de qualquer instituição. A Rua Pompéia constitui-se numa linha divisória entre os Bairros Potengi, Pajuçara e Redinha (Mapa 7). No entanto, nesta rua, o comércio desenvolve-se no recorte correspondente aos dois primeiros bairros mencionados onde se localizam o Conjunto Habitacional Santarém e o Loteamento Nova República, respectivamente. 114 A ocupação do Bairro Potengi aconteceu predominantemente por meio da construção de conjuntos habitacionais como: Potengi, Soledade I e II, Panorama I e II, Panatis I, II e III, Santa Catarina, Santarém, Morada – Construtora Norte Brasil (CNB) I e II, Associação de poupança e empréstimo do Rio Grande do Norte (APERN) e Planície das Mangueiras. No Bairro Pajuçara, também prevaleceu a ocupação por meio de conjuntos habitacionais, a saber: Novo Horizonte, Vista Verde, Vila Verde I e II, Parque das Dunas I, II, III, IV, V e VI, Brasil Novo, Pajuçara I e II, Morada Alvorada, Além Potengi e João Paulo II. Mapa 7 – Rua Pompéia-Natal/RN Fonte: IBGE. Malhas de setores censitários e divisões intramunicipais - Censo 2010. Elaboração: Soneide Moura; Joabio Costa, 2016. 115 Em entrevista realizada na Rua Pompéia, procurou-se obter informações sobre o tempo e a forma de ocupação da referida rua,sendo apresentado por um entrevistado, a seguinte informação: A Pompéia faz uma divisão entre conjunto Santarém que veio antes e depois loteamento Nova República que não foi loteado que era umas terras que tinha aí e o povo foi se apossando. Tanto que no conjunto Santarém foi feito tudo direitinho, o povo tem escritura da casa e tudo. No Nova República, não. Foi posse é tanto que ele é mau projetado. Tem rua aí que só passa bicicleta de tão estreita que é. (Comerciante 1) Esta diferença no processo de ocupação da Pompéia está atrelada ao fato de que o lado esquerdo da rua pertence ao Bairro Potengi sendo este último, projetado pela COAHB/RN por meio da construção de vários conjuntos habitacionais, principalmente entre as décadas de 1980 – 1990, dentre os quais está o Conjunto Santarém, construído em 1983. No que se refere ao lado direito da rua, este pertence ao Bairro Pajuçara, cuja ocupação aconteceu preponderantemente por meio de loteamento, dentre os quais está o Nova República. A ocupação mencionada fica claramente evidenciada por meio do mapa 8 que torna notório o perfil desordenado de produção de alguns recortes no Bairro Pajuçara, percebidos por meio de ruas estreitas e de difícil acesso, principalmente às margens da Pompéia. Isso leva a crer que a ocupação desta área, tenha se iniciado no que hoje se conformou no entorno da referida rua. 116 Desta forma, empreende-se que a Pompéia surgiu na Zona Norte como resultado de uma produção do espaço mediado pela política habitacional e pela definição de loteamentos no início da década de 1980, conforme relatado pelo comerciante entrevistado acerca do período de criação da rua. Eu estou aqui desde 1982. Não tinha a Pompéia ainda, quando eu cheguei. Nova República foi o seguinte..... porque Pompéia é Nova República! Ali começou por posse, o povo se apossou mesmo. Tudo ali foi posse! As pessoas passavam com as tábuas para marcar o terreno que dizem que era do INCRA. O que tinha de placa da rua o povo trazia e fazia a sua casinha com ela, com faixa, com...pra morar mesmo. Os letreiros maior do mundo alí dentro, rapaz! Aí depois em 1984 ia chegando aquele mais.... que iam comprando e iam comprando e iam construindo, sabe? (Comerciante 1) O fragmento extraído deixa claro que as casas foram edificadas fazendo parte do processo chamado de autoconstrução. Sobre essa questão, Rodrigues (1989), ao Mapa 8 - Perfil de produção de ruas em torno da Pompéia nos bairros Pajuçara e Potengi – Natal/RN Fonte: Secretaria Municipal de Meio Ambiente e Urbanismo, Natal/ RN, 2000 . Elaboração: Soneide Moura da Costa.; Joabio Alekson Cortez Costa, 2016. 117 se debruçar sobre a problemática da moradia nas cidades brasileiras, aborda o tema da autoconstrução apontado como a principal forma de acesso à moradia de baixo custo pela classe trabalhadora brasileira menos favorecida. De acordo com a autora: A autoconstrução reproduz – ao produzir casas em lugares em infraestrutura e com um sobre-trabalho individual – as condições gerais de reprodução do espaço urbano, onde é possível morar, de que modo é possível morar, definindo e redefinindo o lugar de cada um na cidade. A autoconstrução também é uma reivindicação dos sem terra/casa, que buscam, com enorme sacrifício, obter um teto para morar. A autoconstrução produz um valor de uso que tem também um valor de troca. (RODRIGUES, 1989, p. 34) Essa forma das famílias carentes resolverem o problema da moradia foi constatada na produção do loteamento Nova República enfatizada na fala do entrevistado. Para o mesmo, o referido loteamento surgiu antes da conformação da Pompéia enquanto rua, visto que esta passou a existir a partir de 1983 com a construção do Conjunto Habitacional Santarém. Ainda de acordo com o entrevistado, foram utilizados rejeitos como pedaços de madeiras e placas de propaganda para demarcar e edificar os barracos, denotando que a ocupação do referido loteamento aconteceu de forma espontânea por meio da apropriação irregular de terras ainda não urbanizadas na Zona Norte da cidade. A respeito desta questão, Cunha (1987), ao se debruçar sobre o contexto de produção do espaço de Natal na década de 1980, assinala que o Estado atua neste processo não apenas través de políticas públicas, mas também do estabelecimento de leis que regulem o solo urbano e estratégias de promoção do mesmo. Como consequência, o encarecimento do solo resultou no surgimento de loteamentos clandestinos em Natal, na década de 1980, fato que é reflexo da produção do espaço no Brasil à época. A esse respeito, Cunha (1987, p. 98) afirma que: A produção do espaço urbano, no Brasil, está caracterizada pelas constantes incorporações de terras rurais à cidade. Estes aspectos são geralmente responsáveis, no espaço urbano, pelo surgimento de loteamentos clandestinos nestas áreas periféricas, onde a oferta de benefícios é precária ou inexistente. Neste sentido, a ocupação do loteamento configurado como marco do surgimento da Pompéia, ocorreu em condições inapropriadas com a moradia em situação de precarização e falta de assistência básica em termos de serviços. No 118 entanto, habitar aquela área era uma das poucas alternativas para os seus moradores, visto que a partir do exposto pelo entrevistado acerca da origem da população que ocupou a Pompéia, o mesmo respondeu: É, a maioria é de João Câmara, né? E o resto veio de outra cidade como Ruy Barbosa, outra..mas no começo o foco foi João Câmara por causa dos estrondos que tiveram lá em 1986. (Comerciante 1) O entrevistado menciona que no início de sua ocupação, Nova República, consequentemente a Pompéia, recebeu moradores vindos principalmente da cidade João Câmara/RN no ano de 1986, mesmo ano em que esta cidade registrou um terremoto de 5,1 na escala Richter, destruindo cerca de 3.000 casas desabrigando centenas de famílias, conforme mostra a figura 8. Fonte: Norte (2012). Esses habitantes, vindos de João Câmara, viram uma nova oportunidade de refazer suas vidas numa área em expansão parcialmente desordenada em Natal. Os camarenses cercavam o seu território no loteamento com placas, folhas de bananeira ou pedaços de madeira, como forma de mostrar que aquele lote já havia sido ocupado, e retornavam para João Câmara apenas para resgatar as suas famílias. E assim, conforme o loteamento se formava, os primeiros moradores abriam trilhas para a aquisição de pedaços de madeira para a construção e também para servir de fonte de combustão para o cozimento dos alimentos. Essas trilhas deram Figura 8 - Noticiário sobre abalos sísmicos em João Câmara (a direita) e evasão da população da cidade (a esquerda) 119 origem às ruas e vielas desordenadas do Loteamento Nova República, reflexo do caráter espontâneo de sua formação, e também à conformação da Pompéia, que dividia o referido loteamento do Conjunto Habitacional Santarém. Mesmo com a Pompéia sendo umas das primeiras ruas a se concretizar naquele contexto espacial e social, já era notório o seu diferencial no que concerne a sua dimensão e localização. Ainda sobre a origem desta rua, o comerciante expressa que: A Pompéia é mais larga, né? Porque a Pompéia se diferencia das outras ruas porque alí termina o loteamento que não faz parte de Nova República, né? O loteamento tinha uma firma aí venderam os terreno, os lote, aí o pessoal tinha dinheiro e ia comprando, né? A Pompéia é o seguinte: ela divide de um lado o que na época era chamado de Conjunto Santarém e do outro lado Loteamento Nova República porque o povo foi invadindo e botaram esse nome por que como se diz: tamo invadindo é nova, né? foi uma ocupação rápida, rapaz! Nunca vi uma coisa tão rápida, rapaz. Povo começou a arrancar até as palhasdos coqueiros pra fazer as casas e aí uns cinco nos depois o povo começou a fazer as casas de alvenaria. (Comerciante 1) Na fala do entrevistado a diferenciação da rua em relação às suas adjacentes é retratada, fornecendo pistas sobre a origem do nome Pompéia. Fica evidente na fala deste, a relação do nome com o comércio, da mesma forma que foi evidenciado na Pompéia italiana. Segundo Mendes (2013) entre os séculos VI e VII foi encontrada uma inscrição da rua italiana cuja frase dizia “Salve, Lucru” (bem-vindo, dinheiro!). Essa expressão serve de referência para a rua da Zona Norte, pois no momento em que as casas de alvenaria começaram a substituiu as de palha e madeira, o comércio surgiu e a partir de então tem apresentado crescimento considerável. O primeiro estabelecimento comercial a se instalar na Pompéia foi o Supermercado Nova República, que atendia à demanda de consumo da população em crescimento. Ainda hoje esse supermercado é uma referência para o consumo no bairro. Em entrevista realizada com o gerente desse supermercado, o qual trabalha no estabelecimento desde a sua fundação em 1986 e mora na rua há 31 anos, foi possível perceber, através de suas palavras, o orgulho e a dedicação de zelar pela memória e significado do estabelecimento para o loteamento e também para o comércio da Pompéia. Quando perguntado sobre o porquê do comércio ter surgido na rua, o referido entrevistado assim se expressou: Na época que o loteamento estava sendo criado, não tinha nada. Então vimos que era importante chegar junto com a população. Inclusive depois 120 do supermercado Nova República outros estabelecimentos surgiram, por exemplo: o supermercado não tem padaria, o cara vem e bota uma padaria, bota uma farmácia de lado porque a pessoa vem pro supermercado e aproveita e resolve outras coisas. Nessa época, a gente chegava aqui no supermercado e via o comércio da Pompéia todo por exemplo: uns dez metros prum lado, uns dez metros pro outro. Hoje não! (Funcionário1) O supermercado foi o ponto de partida para o surgimento do comércio na rua. A partir dele outros moradores perceberem que era possível, fazendo uso de sua própria moradia, adquirir uma renda por meio da atividade. Porém, somente nos anos 1990, a atividade comercial da Pompéia se expandiu significativamente. Tal fato é justificado pelo asfaltamento da rua durante a gestão da prefeita da época, Vilma de Faria, o que favoreceu a implantação de uma linha de transporte público, que propiciou maior acessibilidade e dinamicidade ao comércio da Pompéia. Essa compreensão se deu a partir da resposta dada pelo funcionário quando questionado se a rua era atendida por transporte público e se, em caso afirmativo, que mudanças foram observadas na rua e mais especificamente na atividade comercial. A este respeito, ele acrescentou que: A rua foi calçada no governo de Vilma aí o comércio cresceu e desenvolveu o bairro. Antes o ônibus só passava na Itapetinga. Hoje a Pompéia é mais comercial. Isso vem numa evolução. De uns dez anos pra traz isso cresceu muito. (Funcionário 1) Quando a Pompéia foi asfaltada e passou a ser inserida nas rotas do transporte público, teve o nome modificado para Avenida Governador Antônio de Melo e Souza, em homenagem ao Governador de mesmo nome que criou o Decreto Estadual nº 156 de 18 de novembro de 1921 intitulado “Código do Telégrafo Óptico” cujo objetivo era reestabelecer o serviço de semáforo na cidade. De acordo com a Prefeitura Municipal de Natal (2007), o telégrafo óptico servira de inspiração para o governador por ter sido o primeiro meio de comunicação da capital potiguar no final do século XIX a utilizar cores para indicar a entrada e a saída de navios, se atracariam em Natal ou estavam de passagem e se serviam à guerra ou eram de carga. A partir do exposto, compreende-se que o nome Av. Governador Antônio de Melo e Souza substituiu o topônimo Pompéia após a sua inserção ao sistema de transporte público, devido a contribuição do referido governador no que se refere aos aparelhos de sinalização urbana. Entretanto, as melhorias implementadas na Rua Pompéia que lhes credenciaram à condição de avenida, não foram suficientes 121 para que moradores e comerciantes, de modo geral, a reconhecessem com esse nome. Assim, Pompéia permaneceu como referência para a comunidade e até mesmo para as empresas de transporte que continuam com o nome da rua nos painéis dos ônibus. O transporte público dinamizou o comércio da Pompéia. A linha de ônibus 02 da empresa Guanabara trouxe impactos para a população que ali residia em função da transformação da dinâmica local. O ponto de partida desta linha acontece na Rua Pirassununga no Bairro Lagoa Azul, mesmo bairro onde se localiza a Rua Chegança, segue em direção à Avenida Engenheiro Roberto Freire na Zona Sul, conforme expressa o quadro 7. Quadro 7 - Ordem de serviço operacional da linha de transporte público 02 - Gramoré/Mirassol - Empresa Guanabara/2016 IDA Av. Pirassununga (Terminal) Rua Riversul Av. Piratininga Rua Atibaia Rua Eldorado Av. Guararapes Av. Tocantinea Rua Flor do Paraiso Rua São Rufino Pompéia Av. Dr. João Medeiros Filho Av. Bacharel Tomaz Landim Av. Felizardo Moura Rua Jandira Rua Dr. Mário Negócio Av. Bernardo Vieira Av. Senador Salgado Filho Marginal da BR 101 Viaduto de Ponta Negra Av. Eng. Roberto Freire Retorno Nordestão Cidade Jardim VOLTA Av. Eng. Roberto Freire Marginal da BR 101 Av. Senador Salgado Filho Av. Antônio Basílio Rua Rui Barbosa Av. Bernardo Vieira Rua Dr. Mário Negocio Av. Felizardo Moura Av. Bacharel Tomaz Landim Av. Dr. João Medeiros Filho Av. Itapetinga Rua Itororos Pompéia Rua São Rufino Rua Flor do Paraiso Av. Tocantinea Av. Guararapes Rua Eldorado Rua Atibaia Av. Piratininga Av. Penapoles Av. Pirassununga (Terminal) Vale destacar que a presença do transporte público não se configura numa situação isolada à Pompéia porque é consequência da própria lógica de produção da cidade por meio das articulações entre os sistemas técnicos e sua relação com o urbano. Em vista disso, Eposito (2016, p. 133), ao discutir a produção do espaço Fonte: Guanabara (2017). 122 urbano considerando as suas múltiplas escalas espaciais e sociais, enfatiza que: “[...] desde o aparecimento do transporte automotivo, configuram-se mais descontínuos. Tal transporte não é causa dessa mudança que se reflete diretamente na morfologia urbana, mas é sua condição, do ponto de vista técnico”. Desta forma, pode-se inferir que o acesso à Pompéia por meio do transporte público lhe conferiu maior dinamicidade em virtude da sua integração ao restante da cidade. A notoriedade comercial desta rua no âmbito da Zona Norte, contribuiu para que muitos moradores vissem nessa atividade a possibilidade de lucrarem e de obter renda para sobreviverem. Por sua vez, muitos deles venderam suas casas e retornaram à sua cidade de origem ou as transformaram em estabelecimento comercial. Aqueles que permaneceram, fizeram adaptações na residência para abrirem um estabelecimento comercial visando garantir o sustento da família ou alugaram o ponto do comércio e se estabeleceram na parte superior ou inferior do imóvel. Desta forma, consolidar um estabelecimento voltado para a atividade comercial ou alugar um ponto para este fim, tornou-se a maior fonte de renda da população que, inicialmente, veio para Natal guiada pela oportunidade da moradia. Desse modo, a Rua Pompéia passou a ser, não apenas um espaço de moradia, mas também um espaço próspero, economicamente falando. E assim, mais um parâmetro de semelhança com a Pompéia italiana, esta, formada por grandes casarões, mas também por pequenos cômodos que dividiam a moradia com o comércio para uma parcela da população de poder aquisitivonão tão elevado. De acordo com Platt (2011) nem todas as casas eram grandes e luxuosas. De acordo com o autor, com a cidade em constante crescimento, algumas famílias pobres alugavam cômodos ou dividiam a moradia com seus estabelecimentos comerciais conforme evidenciado na figura 9, que apresenta o cotidiano da Pompéia italiana em que, na rua se misturavam a vida em família executando suas práticas do lar na parte de cima dos imóveis e, logo na parte inferior, a atividade comercial. 123 A Pompéia da prosperidade de 150 a.C, muito tem em comum com a Pompéia potiguar das duas primeiras décadas do século XXI, representada na foto 8. Nesta rua, muitos comerciantes fizeram adaptações nas suas moradias, passando a morar no pavimento superior ou na parte de trás do imóvel para agregar o estabelecimento comercial. Figura 9 - Rua na cidade Pompéia-Itália 150 a.C Fonte:.Platt, 2011. 124 Embora tenham características semelhantes, a figura 9 e a foto 8 retratam contextos econômicos diferentes. A primeira, representa o comércio num cenário de pujança econômica, enquanto que a segunda, não necessariamente traduz a prosperidade, mas uma realidade sobre um sistema econômico em crise que se reinventa, sendo a informalidade um dos motores dessa reinvenção. A informalidade é explicada por vários fatores, dentre eles as altas taxas de desemprego, as quais evoluíram significativamente a partir da restruturação produtiva na década de 1990, quando as indústrias se modernizaram e reduziram a força de trabalho, forçando o trabalhador a buscar estratégias de sobrevivência. Nessa década o país teve um número expressivo de 3,3 milhões de desempregados (POCHMANN, 2001). Outro fator é a aposentadoria precoce que faz com que o aposentado queira, além de sair da ociosidade, complementar a renda familiar e para isso busca alternativas de sobrevivência que não lhe exija carga tributária. Também pode-se citar como fator que explica a informalidade a flexibilidade e autonomia por meio da gestão do próprio empreendimento, visto que, na contemporaneidade, o cidadão é pressionado a exercer atividades diárias diversas e o setor informal acaba se configurando como uma alternativa de gestão do seu próprio tempo. Foto 8 - Casas adaptadas para agregar o comércio- Pompéia-Natal/RN - 2016 Fonte: Acervo da autora, 2016. 125 Se por um lado o trabalho informal garante a sobrevivência do trabalhador, por outro se constitui em um dos fatores responsáveis pela precarização da força de trabalho. Sobre essa questão, Tavares (2002, p.15), ao discutir a precarização do trabalho a partir do setor informal na atual dinâmica capitalista, afirma que o trabalho informal tem se consubstanciado em “atividades de sobrevivência orientadas para a reprodução do trabalhador e do seu núcleo familiar, comportamento que se inscreve entre as características definidoras do que se conhece como setor informal”. Na Pompéia, a atividade comercial, conforme foi evidenciado na segunda seção, favorece sobremaneira o consumo local de modo que os consumidores não precisam se deslocar grandes distâncias para adquirir a mercadoria desejada. Em virtude de muitos comerciantes que participaram da gênese da atividade comercial na rua ainda permanecerem ativos, estabeleceu-se uma relação que extrapola o sentido econômico com o consumidor, criando-se vínculos de fidelidade. Nesta rua, a prática da confiança ainda é expressiva entre os moradores/consumidores e comerciantes do lugar, e assim, a venda no crediário é comumente realizada. Isto não quer dizer que a máquina de crédito não seja utilizada para se efetuar pagamento, ao contrário, em alguns estabelecimentos o uso do cartão se faz presente coexistindo com a caderneta, de modo que esta ainda não pode ser considerada totalmente obsoleta. A coexistência das duas formas evidencia o fato de que, na contemporaneidade, torna-se cada vez mais difícil traçar uma linha entre o tradicional e o moderno no que se refere às formas de pagamento em virtude da relação imbricada entre ambas. A atividade comercial da Pompéia, entretanto, expressa contundentemente características de comércio tradicional no que se refere à forma de gestão, ao formato das lojas e nas relações de compra e venda. Desta forma, o estabelecimento é pensado levando em consideração a lógica de consumo existente no bairro, conforme evidenciado na fala do gerente do supermercado Nova República, marco do surgimento da atividade comercial na Pompéia, quando indagado sobre o perfil da clientela. De acordo com o entrevistado: Antes a gente fazia parte da Rede Super Show e aí por causa da propaganda vinha gente de toda a cidade, mas a gente saiu por vários fatores. Por exemplo a gente quando fomo fazer parte, a gente queria fazer parte de uma cooperativa aonde a gente 5 ou 6 donos de supermercados se juntasse pra comprar um valor maior de produtos com um preço mais barato. Depois veio a ideia de fazer uma rede de supermercado, aí a gente 126 já tava dentro e continuamos, só que...isso chegou um que a gente entrou em dificuldade comercial naquela época que veio aquela rede de supermercado “é show” que atingiu muitos os comerciantes aqui, eles desequilibraram muita gente aqui que até hoje tem muita gente que ainda paga o preço deles. Ai a gente não tinha mais condições de permanecer na rede porque a gente da Zona Norte tinha que comprar os mesmos produtos que o dono de um supermercado em Nova Parnamirim, mas a clientela dele é diferente da nossa clientela, o perfil do cliente dele é diferente do perfil do cliente da gente e a gente teria que os mesmos produto que ele teria na loja dele. Então chegava um ponto que não era mais viável pra gente. (Funcionário 1) A fala do comerciante reflete a insustentabilidade do estabelecimento de bairro em continuar membro de uma rede de supermercados devido a incompatibilidade das lógicas comerciais. A rede varejista de supermercados, mesmo formada por estabelecimentos também de pequeno porte, é concebida a partir de interesses rentistas meramente capitalista em que os estabelecimentos devem atender ao um perfil padronizado de estrutura física e de mercadorias, enquanto que formas comerciais, como no caso do supermercado Nova República, não se adaptam às transformações ora mencionadas. O recebimento de layouts mais moderno, por exemplo, de certa forma descaracteriza o estabelecimento que muitas vezes tem uma relação com a história do bairro ou da rua como é o caso do supermercado Nova República. Outra interpretação a partir da entrevista, é que a rede varejista de supermercados causa um rebatimento no pequeno comércio de forma a desencadear uma desestruturação deste frente às grades estratégias corporativistas traçadas a fim de atrair o maior número de consumidores possível, repercutindo na redução de vendas pelo comerciante dono de mercearias. Também cita-se, com base no fragmento extraído da entrevista, que a padronização de preços de mercadorias entre os estabelecimento membro da rede varejista foi decisivo na desligamento do Nova República. Neste caso, não fora observado as peculiaridades de consumo do bairro no que se refere ao poder de compra da clientela, viso que em Pajuçara o rendimento mensal domiciliar é inferior ao de Nova Parnamirim, sendo este último um dos bairros mais valorizados da cidade de Parnamirim, embora sua ocupação seja majoritariamente por pessoas que antes moravam na cidade do Natal. Mesmo diante do crescimento do comércio na Pompéia, procurou-se colocar em foco os problemas que se constituem como fatores limitantes para que a 127 atividade pudesse se expandir cada vez mais. Dentre vários fatores apontados por comerciantes e consumidores, o de maiordestaque na rua foi a falta de estacionamento (Foto 9), sendo o transporte público, a alternativa mais viável para acessar a Pompéia. Além de não dispor de vagas de estacionamento, a rua também não tem espaços horizontais em ruas perpendiculares para acomodar veículos de consumidores de outros locais da cidade. Essa realidade reflete o perfil de ocupação em torno da Pompéia. Vale ressaltar que a falta de estacionamento não é um problema específico da Pompéia, mas do espaço urbano natalense, fazendo com que muitos consumidores procurem estabelecimentos que disponham de estacionamento para realizar suas compras. No caso da Pompéia, tanto a falta de lugar para estacionar veículos, quanto outros motivos como poluição sonora e visual foram justificativas para a SEMURB não conceder licença de funcionamento para muitos estabelecimentos, inclusive para o Supermercado Nova República. E assim, atrelada à expansão urbana de Natal, a Pompéia se formou. Tributária do contexto da política habitacional da Zona Norte, esta rua dividiu não somente três bairros, mas também formas de habitação. No entanto, compartilhou a atividade comercial que nela se formou desde a sua fundação aos dias atuais. Foto 9 - Trecho da Rua Pompéia sem estacionamento Fonte: Acervo da autora, 2016. 128 O comércio da Pompéia é fruto, não somente da imposição do capital, mas da reprodução da vida, dos desejos da população em suprir suas necessidades de consumo e, por isso, está intimamente atrelada à história do lugar. Apesar da intervenção do Estado ao substituir seu nome para Avenida Governador Antônio de Melo e Souza, Pompéia continua mais viva do que nunca na memória e nas ações dos sujeitos que usufruem do seu espaço. Mesmo não tendo a prosperidade da Pompéia europeia, a Pompéia potiguar assegura a reprodução das relações sócio- espaciais. Assim, Pompéia é o lugar do encontro, das vivências cotidianas de seus frequentadores da Zona Norte e de outras porções da cidade. 3.2.2. MEMÓRIAS SOBRE A RUA BOA SORTE A Rua Boa Sorte (Mapa 9), assim como a Pompéia, surgiu na Zona Norte no contexto da produção do espaço urbano da área por meio da construção de loteamento. A rua está localizada no Bairro de Nossa Senhora da Apresentação (Mapa 9), cuja ocupação preponderante ocorreu por meio de loteamentos como Acirel – II, Jocaza (Lot. 79 e 136), Aliança Derval Gonçalves Ramos, Boa sorte II, Aliança (Q - 04), Boa Sorte, Libanêz, Santarém, Alvorada, Vale Dourado, Parque Ponte Nova, Bom Jesus. 129 Com o objetivo de entender a história da Boa Sorte, realizou-se entrevista com uma das primeiras comerciantes desta rua. Quando questionada sobre o período e o processo de criação da rua, a comerciante assim se expressou: Quando eu cheguei aqui em 1992, essa rua aqui ainda não era comércio, não. Tava começando assim, né?....o pessoal tava construindo as casas ainda, não era calçado ainda, ainda era areia, era barro. Então não existia ainda um comércio, né? Mas... Já... eu acho que quem construiu, já construiu com comércio. Não existia comércio aqui ainda porque aqui ainda não tinha nada, né? (Comerciante 1) Mapa 9 - Boa Sorte - Natal/RN Fonte: IBGE. Malhas de setores censitários e divisões intramunicipais - Censo 2010. Elaboração: Soneide Moura; Joabio Costa, 2017. 130 Para a comerciante, a Boa Sorte pertencia ao Loteamento Santarém e teve sua ocupação iniciada no início da década de 1990. Segundo a mesma: Bom a avenida Boa Sorte é dividida em vários loteamentos. Na época que a Boa Sorte foi feita aqui se chamava loteamento Santarém que pegava toda a área mais próxima das Fronteiras. Mais lá pra baixo o povo foi se apossando mesmo. Na época quem vendeu o terreno pra gente foi seu Raimundo e Manoel que vendeu o terreno que era granja pra imobiliária que loteou e vendeu pra gente. Depois de um certo tempo dividiram, né? O bairro Nossa Senhora da Apresentação que na época era bairro Potengi. Agora no bairro ficou divido aí comunidade Vale Dourado, Aliança, Jardim Progresso, Cidade Praia. (Comerciante 1) No entanto, acredita-se que a Boa Sorte pertença ao loteamento de mesmo nome, uma vez que a datas de ocupação do Santarém não coincidem com a real ocupação da Boa Sorte por ela descrita. No relato da entrevistada, fica claro que na década de 1990, a obra ainda não havia sido iniciada. Assim ela se expressa: Quando eu cheguei aqui em 1992 não existia exatamente um comércio. No ano que eu cheguei, eu construí a minha casa nessa rua (RUA DAS FLORES) como aqui nesses terrenos que a gente tá hoje não existiam casas ainda, o pessoal tudo construindo, tudo na mesma época, tudo na mesma época construindo. Estavam tudo construindo, não tinha nada de calcamento ainda. [...]então quando surgiu esses terrenos aqui pra dentro na época foi muitos lotes, então todo mundo comprou tudo de uma vez e começamo a construir tudo no mesmo período. Aí nesse tempo eu tinha um terreno alí embaixo aí quando eu vinha subindo, vinha pra vender aqui. Então toda essa construção da Boa Sorte com essas casa vizinhas são tudo da mesma época. (Comerciante 1) A Rua Boa Sorte juntamente com a Pompéia, fazem parte de uma lógica de produção do espaço guiada pela concepção de seus usuários e não pela ação planejada do Estado por meio da política habitacional. Esses loteamentos também são espaços concebidos, mas a sua construção acontece de forma desordenada a partir das práticas dos moradores sobre o lugar. O loteamento foi ocupado por pessoas de diversas cidades do Rio Grande do Norte que construíram suas casas por conta própria, obedecendo tão somente as suas necessidades e as suas possibilidades econômicas A partir do questionamento sobre a origem da população, a entrevistada, ao falar da concepção do loteamento, e consequentemente da Boa Sorte, respondeu: Assim, né... a maioria veio do interior mesmo.Por alí....São Rafael, Santana do Matos, Itajá... Marcelino Vieira, Açu, Lages e até Pau dos Ferros. (Comerciante 1) 131 De modo geral, o processo de construção da moradia sob o formato da autoconstrução, efetuado pelas pessoas vindas do interior é lento devido à limitada capacidade de compra de materiais pelos moradores. Nas palavras de Rodrigues (1989, p.30) “de posse do lote começa a construção da casa, através de um processo longo e penoso, calcado na cooperação entre amigos e vizinhos ou apenas na unidade familiar: a autoconstrução”. Para a autora, a moradia por autoconstrução tem se constituído na melhor alternativa para a classe trabalhadora adquirir a sua casa própria não só no Brasil, mas na América Latina como um todo. Os moradores do loteamento Boa Sorte projetaram na capital a realização do emprego e da casa própria e como forma de sobreviver agregaram às suas casas a atividade comercial. Essa tendência ficou evidente na fala da comerciante, diante da indagação acerca de período de surgimento dos primeiros estabelecimentos: Esse meu vizinho que agora é uma distribuidora, esse aí o primeiro supermercado foi o dele que era o de Domiro. Ele construiu a casa dele e já o supermercado junto. Era construído tudo junto ao comércio. Ai já foi surgindo o comércio daí, né?! (Comerciante 1) Durante as pesquisas de campo realizadas, foram feitas perguntas aos moradores sobre o período de habitação predominante na Boa Sorte e sobre o surgimento do comércio. As repostas eram as mesmas, apontando que não existiu tempo para uma ou para outro de forma individual e que tanto o comércio quanto a habitação surgiram juntos na rua. Uma das explicações pode residir no fato de que poucos meses após a ocupação da rua, o transporte público já passou a atender a população. Um dos motivos apontados pela comerciantefoi a presença da Avenida das Fronteiras que devido a sua intensa dinâmica comercial e populacional estendeu a sua influência para a Boa Sorte. Passado poucos meses, aí já começou a passar o ônibus. A avenida das fronteiras contribui muito pra os ônibus passem aqui. Se não fosse a proximidade da Boa Sorte com as Fronteiras com certeza o comércio não existia. Por quê. Porque a Avenida das Fronteiras ela sai de igapó da Tomaz Landim que já vem de Ceará-mirim né? E já pega aqui. A estrada da redinha também e os conjuntos todos que fizeram na época; Gramoré, o Nova Natal que foram os primeiros conjuntos que fizeram aqui na Zona Norte. E aqui que as Fronteiras pega a Boa Sorte e vai pra BR 101 e Extremoz (moradora/comerciante antiga na rua). (Comerciante 1) Assim, percebe-se que, como na Pompéia e na Chegança, foi o transporte público que alavancou o comércio na Boa Sorte. A partir da implantação deste 132 serviço público, o único estabelecimento comercial existente na rua, o Mercadinho “Bandeirantes”, do Senhor Domiro, dividiu espaço com novos estabelecimentos como supermercado Avelino, o salão quatro estações, o armarinho de dona Neuza e outros, promovendo a atividade em ascensão. Para Bentes Filho e Pinho (2014), se há uma facilidade de circulação do transporte público, o crescimento do comércio é influenciado. Desta forma, compreende-se que a interação da cidade articulada por esse sistema permite que as pessoas tenham acesso a diversos lugares e que o itinerário do ônibus influencia a formação de materialidades comerciais e de serviços. No caso da Boa Sorte quando questionada sobre o motivo de surgimento do comércio, a moradora foi enfática em responder: Porque já era uma rua mais larga e já começou logo a passar o ônibus. Era o acesso melhor que tinha. O acesso foi principal pra ficar o comércio. A atividade comercial ganhou grandes proporções na rua e hoje ocupa quase toda a sua extensão. Diante da pergunta se a Boa Sorte até o presente momento da pesquisa é ocupada mais para fins de moradia ou de comércio, a entrevistada respondeu: A Boa Sorte é mais comercial. Eu acho que de uns 12 anos, 2004 pra cá o comércio deu um salto, um pulo. O que contribuiu foram todos os sentidos porque essa dificuldade de você atravessar essa ponte velha, principalmente com aqueles engarrafamentos... a dificuldade de chegar pra lá, essa coisa toda fez com que as pessoas realmente foi começando a crescer, a se desenvolver realmente, e a chegada do Norte Shopping ai você criou mais desejo de aumentar o seu comércio também. Já que chegou um shopping aqui vai ficar melhor a Zona Norte! Na época que o north shopping chegou eu escutei muito isso aqui. Aí chegou a linha 600 que levava o pessoa shoppinh-Boa Sorte. Aí foi feito também o hospital da mulher a maternidade aqui perto e aí começou a surgir também lanchonetes, farmácias. (Comerciante 1) A entrevistada deixou implícito na sua fala o quanto os equipamentos comerciais do varejo moderno como o Norte Shopping – hoje Partage Norte Shopping – são importantes para a Zona Norte porque conferem notoriedade comercial a esta área da cidade e, consequentemente atraem consumidores de toda a cidade. Ainda pode-se inferir que a chegada desta forma comercial planejada, ao expandir o comércio moderno, pulverizou ainda mais o consumo na Zona Norte, especialmente nas ruas de comércio tradicional de pequenas lojas de gestão 133 familiar, onde a atividade cresce exponencialmente. Porém, pela conotação da fala da comerciante, essa expectativa não foi atendida no comércio da Boa Sorte, no entanto não prejudicou a atividade na rua justamente por se tratarem de segmentos comerciais com lógicas, tanto de localização quanto de estrutura, diferenciadas. A conjuntura de crescimento do comércio na Boa Sorte no ano de 2004 repercutiu no conteúdo da rua, que passou a ser eminentemente composta pela atividade comercial. Alguns moradores da época da ocupação inicial da rua, venderam suas residências ou as transformaram em estabelecimento comercial. De acordo com o elucidado pela entrevistada, diante da pergunta se o comércio havia contribuído para que os moradores se evadissem da rua, a inquirida assim se expressou: Com o forte crescimento do comércio teve gente que deixou pra alugar os pontos e morar em outro lugar, mas na época muita gente botou o comércio por necessidade porque não tinha condições pra sobreviver naquela época, mas depois de um certo tempo muita gente foi embora, comprou casa em outros cantos, né? Mais afastado do barulho por aqui também é muito barulhento, foi morar em outros cantos e os comércios ficaram e alugara a outras pessoas (moradora/comerciante antiga na rua). (Comerciante 1) O fragmento apresentado explicita que não só o surgimento, mas o crescimento do comércio da rua resultou da iniciativa dos próprios moradores como forma, de garantir a renda familiar e também atender a necessidade de consumo da população do bairro. Entretanto, fora esse mesmo crescimento que ocasionou a saída de parte dos moradores da rua, tornando-a preponderantemente comercial. Para que a realidade hoje existente seja melhor compreendida, foi questionado, se ao longo da história da Boa Sorte, quais eram os problemas que poderiam ser apontados como fatores limitantes do processo de expansão da atividade comercial na rua. Diante do questionamento, a comerciante respondeu: Na verdade, eu acho que não nem só aqui, mas em toda a Zona Norte. A infraestrutura daqui é péssima, né? As calçadas são horríveis de andar, as casas são pra frente desalinhadas, tem esgoto estourado direto, sujeira, as ruas são esburacadas... não tem estrutura. Então essa falta de estrutura da Zona Norte é o que não melhora o comércio. Agora aqui tem tudo o que você imaginar, mas é uma péssima estrutura. E assim o comércio não cresce não se desenvolve, não fica bonito, chamativo. (Comerciante 1) A foto 10 comprova a fala da senhora, ao retratar um trecho da Boa Sorte que estava totalmente impossibilitado para o tráfego de veículos. Diante dessa realidade, 134 o comércio torna-se prejudicado porque a rua de acesso à atividade não dispõe das mínimas condições para o tráfego de veículos. Mesmo assim, os comerciantes permanecem com seus estabelecimentos abertos, recebendo consumidores predominantemente de ruas próximas, que se deslocam para o comércio a pé, de moto ou de bicicleta. É salutar afirmar que é comum, em Natal, realidades semelhantes à apresentada na foto 10, principalmente nas ruas localizadas fora dos espaços mais valorizados pelo capital imobiliário. O comércio da Boa Sorte atende sobremaneira a população da rua e de seus arredores, seja do bairro ou mesmo na Zona Norte. Tal afirmação pôde ser comprovada diante da pergunta acerca da origem da clientela. A esse respeito a entrevistada respondeu: A minha clientela, a maioria é daqui mesmo, né....da Zona Norte. Mas também atendo gente de outros lugares de Natal, até da Zona Sul... porque eu trabalho com aluguel de vestido de noiva, então vem gente de todo canto e minha roupa é boa, né.... (Comerciante 1) No caso específico da entrevistada, o segmento de trabalho da mesma não deixa margem para um estrato social específico da população da rua ou do seu entorno, visto que não faz parte do consumo cotidiano de seus moradores. Por trabalhar com uma mercadoria mais elaborada, a comerciante fez transformações Foto 10 - Buraco na Rua Boa Sorte (2016) Fonte: Acervo da autora, 2016. 135 mais sofisticadas no seu estabelecimento, de modo a chamar a atenção do consumidor interessado numa forma comercial mais sofisticada em comparação ao restante dos estabelecimentos existente na rua. Na Boa Sorte, a maioria dos comerciantes ainda são os mesmo da década de 1990 e 2000 e conservam as suaspráticas de vendas como uso da caderneta, a venda à fiado e ausência da informatização. No caso da comerciante entrevistada e de alguns outros de atividade recente na rua, são representantes de uma minoria, visto que estes agregam novos equipamentos ao comércio, buscando incorporar tecnologia e modernização aos seus estabelecimentos. A entrevistada fez curso pelo SEBRAE e modernizou a sua loja. Quando perscrutada sobre os motivos que poderiam explicar a permanência das práticas iniciais dos outros colegas de oficio, ela respondeu: A mente ainda é muito bitolada. Porque assim... aqui na Zona Norte as pessoas vieram do interior e antigamente as pessoas que vinham do interior botavam aquela barraquinha em frente as suas casas, uma vendinha. Então a mente dessas pessoas da época de 1992 era essa mesma. Vinha pra cá e botavam aquele barraquinho porque achavam que não precisavam mais do que aquilo. Eu tiro pelo meu marido que tem uma loja de móveis aqui e olhe que ele nem é muito venho, mas ainda tem uma mente bitolado ao caderno, a não usar uma internet, usar um site, ele não faz um cartão de visita. E permanecem todos assim, com a caderneta, com essa venda a fiado.. tem demais, tem muito, tem muitos! Então eu acho que também é isso. Não procura uma SEBRAE, Vish! O SEBRAE pra eles é o fim do mundo pra fazer um curso se aperfeiçoar, pra se profissionalizar, entender. Talvez se o governo investisse um pouquinho mais talvez abrisse mais a mente do comerciante, né... (Comerciante 1) As ideias expostas na fala da entrevistada, que também se difundem entre os novos comerciantes, refletem a busca por meios mais modernos que dinamizam a atividade comercial. Todavia, a entrevistada alerta sobre os cuidados com a modernização: Agora a gente tem que ter muita sensibilidade com o comércio da Zona Norte, né? Com o público. Aquela coisa arruada, mas não tão arrumada porque se você arruma demais....você afasta. Se você arrumar o estabelecimento demais com iluminação diferente, ar condicionado o consumidor daqui tem até medo de entrar porque acha que não pode comprar. Eu mudei o meu comerciozinho porque trabalho com aluguel de roupas pra festas, mas não quis botar ar condicionado, preferi ficar com ventilador pra não botar a porta de vidro e afastar o cliente do mesmo jeito. (Comerciante 1). Mesmo com as mudanças anunciadas na fala da entrevistada, ainda persiste o cuidado com o público consumidor que reside na rua e nas suas proximidades. O 136 fragmento da entrevista denota, desta forma, que as práticas de consumo que são peculiares ao comércio tradicional são inerentes à própria constituição do comércio na rua estudada. A Rua Boa Sorte, se formou no final da década de 1980 e início da década de 1990, no contexto da expansão urbana de Natal em direção à Zona Norte. Como muitas outras ruas desta porção da cidade que se ergueram por meio de loteamentos, como forma de resolver o problema da falta de moradia, o espaço onde se localiza a rua em questão também não foi diferente. Boa Sorte é uma expressão repleta de sentido para os moradores que edificaram suas casas, comércio e também as suas vidas em meio ao cenário de expansão urbana da Zona Norte em terras recém ocupadas. O comércio é o sustentáculo econômico de muitas famílias que permaneceram na rua, e que, na maioria dos casos, ainda otimizaram suas residências para fixar o estabelecimento comercial e assim, evitar eventuais gastos com aluguel e transporte, por exemplo. O comércio na rua continua a trazer “boa sorte” aos seus usuários. 3.2.3. MEMÓRIAS SOBRE A RUA CHEGANÇA Sou pataxó, Sou xavante e cariri, Ianonami, sou tupi Guarani, sou carajá. Sou pancaruru, Carijó, tupinajé, Potiguar, sou caeté, Ful-ni-o, tupinambá. (...) Mas de repente Me acordei com a surpresa: Uma esquadra portuguesa Veio na praia atracar. Da grande-nau, Um branco de barba escura, Vestindo uma armadura Me apontou pra me pegar. E assustado Dei um pulo da rede, Pressenti a fome, a sede, Eu pensei: "vão me acabar". Me levantei de borduna já na mão. Ai, senti no coração, O brasil vai começar. Chegança (Antonio Nóbrega) 137 A letra da música reflete à chegada dos portugueses ao litoral do Nordeste e os conflitos estabelecidos com os diversos povos indígenas. O nome da música se refere a uma dança folclórica chamada “chegança” que acontecia na região, ao som do tambor, percussão e rabeca. Outras danças também fazem parte da chegança a exemplo do xaxado, fandango, bumba meu boi e boi calemba. Na Zona Norte de Natal/RN existe uma rua com este nome, Chegança, cuja localização está no Bairro Lagoa Azul, predominantemente ocupado pelos conjuntos habitacionais Eldorado, Cidade Praia, Gramoré e Nova Natal. A Rua Chegança é formada por vias perpendiculares que recebem o nome de instrumentos musicais, versos, nomes de formas espaciais do período da escravidão e comidas de origem africana de acordo com o exposto na figura 10, indicando que a origem do nome da Rua Chegança está relacionada às festas folclóricas, que ao chegarem ao Brasil, sofreram influência da cultura indígena e africana. Ao observar a figura 10 pode-se perceber que a Rua Chegança encontra-se em meio a ruas perpendiculares, cujos nomes se remetem à cultura nordestina, descendente da africana; como sejam: Afinins, Sequilho, Xaxado, Boi Calemba, Rabeca, Pífanos, Caboclinho, Ciranda, Sanfona e outros. Os nomes recebidos pelas ruas são manifestações culturais nordestinas que projetam a região para o restante do mundo. Nesta perspectiva, Nepomucemo (2005, p. 119), ao discorrer sobre o impacto da globalização na cultura popular nordestina, discute as diversas Fonte: Google Maps, 2016. Figura 10 - Nome das ruas adjacente à Chegança - 2016 138 manifestações carnavalescas do Nordeste com ênfase para a capital do Pernambuco, Recife. A autora se refere à dança, caboclinho como: Um dos bailados mais antigos do Brasil. Além de ser uma dança guerreira e religiosa, é um drama que trata de aspectos da vida indígena: guerras, colheita, caçadas ... e cultos. Acredita-se que essa manifestação tenha sido criada com a ajuda dos padres jesuítas, cujo objetivo era utilizá-la como um “artifício” para catequizar os nativos. O fragmento extraído do texto de Nepomucemo (2005) retrata o cotidiano dos índios e as ameaças de descaracterização da cultura destes, frente à influência dos colonizadores. A conotação do conflito expresso na dança caboclinho é semelhante aquele da chegança portuguesa que enfatizava a luta entre cristãos e mouros em Portugal no século XVIII, país de origem da referida dança. Também de conotação marítima, esta expressa o ato dos marinheiros de “chegarem” ao continente após turbulentas jornadas marítimas, conforme exposto na figura 11. Oliveira (2009), ao realizar um estudo para a Fundação Joaquim Nabuco sobre a história da dança no Brasil, expressa que: A disposição básica dos personagens da Chegança é em fileiras e a movimentação dos pés é mínima durante a dança. Sem sair do lugar os dançarinos movimentam o corpo de um lado para o outro, imitando acompanhar o movimento de uma embarcação no mar. Figura 11 - A dança da chegança Fonte: Oliveira, 2011. 139 A figura 11 representa a dança que reúne uma multidão de pessoas para comemorarem o retorno dos marinheiros. Pelo conteúdo da imagem, percebe-se que a festa se realiza no porto de desembarque da tripulação. No Brasil, a dança incorporou diversas denominações como Marujada (Minas Gerais, São Paulo), Fangango (Paraíba, Rio Grande do Norte, Pernambuco, Maranhão, Amazônia, Ceará), Nau-Catarineta (Paraíba), Marujos (Bahia, Sergipe), Barca (Paraíba). Como expressão cultural realizada no Rio Grande do Norte, o fandango é um ato populartambém chamado de bailado dos marujos ou chegança em que as danças ocorriam inicialmente em Barra de Cunhaú, depois passando a ocorrer em Canguaretama, e Vila Flor, por exemplo. Mendengo Filho (2009, p. 8), ao realizar um estudo antropológico da dança enquanto expressão de linguagem, expressa que: Chegança como dramalhão de rua, só começou a se populariza no Brasil, no início do século XIX. Momento em que os autores românticos abandonaram as regras de composição e estilo dos autores clássicos e passaram a escrever e divulgar sua origem em antigas tradições ibéricas. Romances, altamente bem difundidos por que narravam às grandes expedições náuticas e também, as representações teatrais conhecidas como mouriscas, que usualmente encenavam o combate entre cristãos e mouros, relacionados a episódios da vida marítima e as lutas entre esses dois povos. Em Natal, na primeira metade da década de 1980, existiam apresentações culturais durante o período natalino e festas de padroeiro com danças como fandango, boi calemba, bumba meu boi, além de serem comercializadas comidas típicas da região. Esta festa acontecia no conjunto Nova Natal, localizado no Bairro Lagoa Azul na Zona Norte da cidade. O evento acontecia numa rua estrategicamente central, chamada então de chegança pela sua função de acolher as pessoas para as celebrações culturais. A informação supracitada ganha notoriedade a partir do fragmento de uma entrevista realizada com um dos primeiros moradores da rua. A partir do questionamento da origem do nome atribuído à Chegança, o morador assim relatou: Os nomes das ruas aqui vizinha a chegança recebe o nome de danças e comidas típicas do folclore realizadas na rua de 1981-1984 e os moradores chegavam pra olhar pra prestigiar. Essa rua aqui também é central, né? (Morador 1). 140 Ao contrário da Pompéia e Boa Sorte, que se firmaram por meio de loteamento num processo de concepção mediada pelas relações cotidianas do espaço vivido, a Rua Chegança foi conformada pela lógica do espaço concebido a partir da construção do Conjunto Habitacional Nova Natal. Para Lefebvre (2000) no espaço concebido entram na prática social e política a relação entre sujeito e objeto dependente da lógica que o faz, enquanto no espaço vivido, mais que concebido, este jamais perde sua coerência. Desta forma, enquanto espaço concebido, o Conjunto Habitacional Nova Natal foi construído a partir da ação da COHAB sob financiamento da Caixa Econômica Federal. O referido conjunto foi entregue à população em etapas: a primeira em 1982 e a segunda em 1983. O entrevistado não afirmou com tanta certeza, mas sinalizou que as terras para a construção do conjunto habitacional pertenciam a uma viúva que as doou para a Companhia de Habitação implantar o conjunto habitacional. No início de sua ocupação, Nova Natal, consequentemente a Chegança, receberam moradores vindos de várias cidades do interior do estado como Caicó, Apodi, da própria Natal e também de Souza-PB, conforme comprovado na fala do morador: Rapaz, aqui veio gente de vários lugá. Vêi gente de Caicó, Apondi...e até de Souza na Paraíba. Vêi gente da também da praia do meio, não foi? (pergunta ao amigo) (Morador 1) A Chegança se localiza no Bairro de Lagoa Azul no extremo norte da Zona Norte (Mapa 10). Devido a sua distância em relação as áreas comerciais, surgiram na rua, em conformidade com a habitação, os primeiros estabelecimentos comerciais. 141 Para o morador, os precursores da atividade comercial na Chegança foram os estabelecimentos de “Zé da Veja” e “Juvêncio”; ambos os mercadinhos foram criados em 1983. Em concomitância com a habitação da rua foi se formando a emblemática feira-livre. Bentes Filho e Pinho (2014, p. 31-32), ao discorrerem sobre a história de formação do Bairro Lagoa Azul, expressam que: A feira é um marco representativo para a população do Nova Natal, assim como para toda a Zona Norte de Natal. Shopping Center do povo, onde há uma verdadeira troca de culturas, saberes e vivências. Lugar de muita memória, onde diariamente o velho e o novo se encontram.[...] Feira do Nova Natal na Av. Chegança, lugar onde pessoas passam, vem e vão, e deixam muito mais que dinheiro, deixam sentimentos e emoções, deixam Mapa 10 – Rua Chegança -Natal/RN Fonte: IBGE. Malhas de setores censitários e divisões intramunicipais - Censo 2010. Elaboração: Soneide Moura; Joabio Costa, 2017. 142 suas memórias, muitas vezes na mesa de um barzinho ou na banca de verduras, enfim memórias da Feira, dos passantes, da Av. Chegança (BENTES FILHO E PINHO, 2014, p. 31-32). A feira foi instalada por um morador chamado Poti e ainda acontece todos os domingos iniciando nas primeiras horas do dia e se encerrando por volta das 14 horas da tarde. Ela impulsionou sobremaneira o comércio na rua que surgiu como estratégia dos próprios comerciantes para gerar renda e prestação de serviços no lugar. Mediante a questão efetuada sobre o período de surgimento dos primeiros estabelecimentos e os fatores que contribuíram para tal evento, o morador entrevistado respondeu. Porque a Chegança é o principal ponto de localização do bairro e também por causa da feira, né? A feira daqui é muito grande! Ela já é grande do que a de Santarém...(Morador 1) Com a população da rua e do loteamento atendida minimamente pelo comércio de segmentos básicos como mercadinho e farmácia, já foram amenizados problemas de distância e de transtornos, a exemplo da violência que no início da década de 1980 já compunha o quadro social da Zona Norte expressivamente. Num fragmento extraído do trabalho de Bentes Filho e Pinho (2014), tem-se o relato de uma moradora chamada dona Chaguinha, natural da cidade de Lajes, localizada na Mesorregião Central Potiguar. A senhora mudou-se para Natal e residiu durante alguns anos no bairro de Petrópolis na área central da cidade onde os serviços de saúde, educação e transporte eram ofertados favoravelmente à população. Entretanto, mediante possibilidade de adquirir a casa própria, dona Chaguinha mudou-se para o Conjunto Habitacional Nova Natal. Segundo os autores, a senhora que antes morava numa localização com equipamentos urbanos satisfatórios passara a conviver com a realidade contrária. Bentes Filho e Pinho (2014) capturaram o seguinte relato da senhora: Se precisasse de uma emergência, o Santa Catarina8 já funcionava [...] mas quase sempre o povo não conseguia ficha e levava, a maior dificuldade; era uma dificuldade grande que tinha. Tinha só o posto antigo, que hoje é a AME, aí depois construíram esse posto aqui. (Morador 1) 8 Hospital Dr. José Pedro Bezerra (popularmente conhecido como Santa Catarina), localizado no bairro Potengi, distante 3,5 quilômetros do conjunto Nova Natal. 143 Até à primeira metade da década de 1980, Nova Natal não oferecia serviços de saúde, obrigando a população residente a se deslocar por mais de três quilômetros para receber atendimento. A mesma senhora relatou que em outras situações tinha que caminhar até o Conjunto Habitacional Soledade para ter acesso ao transporte público. Entretanto, essa situação não perdurou por muito tempo e em meados da década de 1980 uma linha de ônibus da Empresa Guanabara passou a beneficiar a área e também a Chegança com o transporte público. No entanto, uma única linha de ônibus era insuficiente para atender a toda a população que precisava se deslocar para além das fronteiras de Nova Natal. Nesse período, o comércio que havia mostrado seus primeiros sinais de existência, fez da dificuldade a sua oportunidade. Novos estabelecimentos foram surgindo, fazendo com que a atividade ganhasse expressão naquele espaço de tanta carênciade equipamentos urbanos básicos. O transporte público, desta forma, mostra-se como um dos elementos importantes na dinamização da atividade comercial na rua. De acordo com o exposto por um entrevistado mediante pergunta se a Chegança era atendida por este tipo de serviço, o morador assim respondeu: Sim! Desde 1984 passa ônibus aqui pra gente... é aquela linda 02. E ela passa até hoje aqui na Chegança. Depois que ele chegou, melhorou que precisa de ônibus, né? Porque antes nós não tinha...(...) o comércio melhorou demais, aqui.... Antes não tinha quase nada... depois começou a aparecer um comércio, outro e hoje tá assim...Depois, em 1990 chegou outros: o 01, 02, 64, 10-29 e 43. (Morador 1) A fala do morador, deixa claro a importância do transporte público pela integração que promoveu entre Nova Natal e ao restante da cidade. A partir da implantação deste serviço, o comércio passou a crescer na Chegança e atrair novos olhares para esta atividade em expansão. As casas, antes voltadas para suprirem a necessidade da moradia, foram ajustadas parcialmente ou totalmente para dar lugar ao comércio. Muitos moradores transformaram a residência em estabelecimentos comerciais relocando a moradia para ruas adjacentes à Chegança enquanto que outros venderam o imóvel para terceiros e retornaram para as suas cidades de origem. Questionado se o comércio da Chegança contribuiu para que as pessoas deixassem de morar nesta rua, o morador foi enfático ao relatar: 144 Sim! Com certeza....O comércio fez aumentar o preço dos aluguel daqui muito! Aí muita gente voltou pra interior porque não podia mais pagar...Quem não voltou, deixou a Chegança e vou morar nessas ruas vizinha. (Morador 1) Neste caso, o transporte público que impulsionou a expansão e consequentemente a valorização do solo urbano daquela área resulta de uma lógica capitalista. Carlos (2008), ao analisar a produção ou a reprodução do espaço urbano adotando como referência a cidade de Cotia, expõe que o uso do solo é mediado por uma lógica de mercado que define as escolhas e influencia no modo de vida no espaço. Fazendo interpretações mediadas por Carlos (2008) e também pelo fragmento da entrevista representada, acredita-se que a preponderante apropriação da Chegança pelo comércio, resultou na diferenciação de uso do solo e variação de seu preço a partir da localização desta atividade. Nesta rua, a chegada de lojas de móveis, farmácias, padarias, restaurantes e principalmente confecções, esta última compondo o segmento de predominância, conferiram notoriedade à Chegança que se configurou como um espaço de reprodução econômica, juntamente com a Pompéia, e Boa Sorte no espaço comercial da Zona Norte. Na Chegança, a atividade emergiu da carência de mercadorias básicas para a manutenção das famílias de sua constituição inicial e agora responde pela geração de renda e pelo consumo de grande parte dos moradores que residem na rua e também no seu entorno. O comércio da Rua Chegança atende, predominantemente a população do bairro, mas o seu público consumidor ultrapassa os limites da Zona Norte e até de Natal. Diante do crescimento anunciado, alguns fatores limitantes para a expansão da atividade comercial na Chegança foram apostados pelos comerciantes e consumidores, sendo o principal deles a violência que faz com que muitas pessoas não optem pela rua seja para fazer compras, seja para fixar estabelecimento comercial ou mesmo morar. Na opinião de comerciantes e consumidores, a feira (Figura 12) é a grande causadora desse problema por atrair mendigos que ocupam a rua durante toda a semana e também pessoas mal-intencionadas que amedrontam a população. 145 O processo de expansão urbana de Natal alcançou lugares longínquos como foi o caso do extremo norte da Zona Norte. Nesta terra distante, a vida urbana se iniciou em conformidade com a atividade comercial, justamente pela dificuldade que a população tinha de acessar outras áreas da cidade. Assim se formou Chegança; lugar de realização de festas folclóricas ou prenúncio de boas-vindas àqueles que chegavam inebriados pelas tempestuosas jornadas marítimas. Hoje, a rua não perdeu a sua conotação de festividade, ao contrário é porta de entrada para o encontro e compartilhamento de vivências que o comércio lhe proporciona cotidianamente. O quadro de referência delineado a respeito dos fatores que ajudam ao entendimento da realidade atual a partir da reconstrução do processo de produção da capital potiguar, especialmente das ruas estudadas e o percurso que a atividade comercial assumiu nestes espaços, encaminhará a uma discussão para a perspectiva futura que se desencadeará a partir das práticas sócio-espaciais. Essa discussão será construída na próxima seção apresentando, a partir do retorno à realidade descrita e analisada, as tendências projetadas para as ruas Pompéia, Chegança e Boa Sorte. Figura 12 - Barraca de feira na Rua Chegança - Natal/RN - 2016 Fonte: View, 2014. 146 147 4 - A RECONSTRUÇÃO DA REALIDADE Seguindo o procedimento teórico-metodológico, histórico-genérico, a seção em transcurso teve sua tessitura construída a partir do retorno à realidade inicialmente descrita na segunda seção e decomposta na segunda, para se alcançar uma compreensão ainda não efetivada acerca da atividade comercial nas ruas Pompéia, Chegança e Boa Sorte. Também chamado de vir a ser, a seção lança mão das projeções além do tempo presente, a partir dos indícios que apontam uma realidade reconstruída que revela tendências além do momento atual. É a busca da realidade possível anteriormente descrita na sua forma de concepção da paisagem, e, posteriormente analisada à lente do percebido e do vivido. Nesse movimento de pensamentos, é possível compreender as contradições sociais historicamente estabelecidas no processo de produção do espaço, portanto também das ruas estudadas e do comércio nelas desenvolvido. Desta forma, a seção tem a preocupação de apresentar questões relacionadas às tendências a se concretizarem na atividade comercial nas ruas estudadas, assim como responder as seguintes questões: Qual é o papel social do comércio nas ruas Pompéia, Chegança e Boa Sorte? Qual a importância do comércio desenvolvido nestas ruas para a dinâmica da atividade comercial na Zona Norte? Embora não elaboradas anteriormente, outras questões se configuraram como pertinentes para o entendimento do que a seção propõe responder. Deste modo também se questiona: qual o cenário previsto para comércio da Pompéia, Chegança e Boa Sorte do ponto de vista da informalidade mediante crise econômica evidenciada no país? O que se esperar das potencialidades desta atividade nas ruas Pompéia, Chegança e Boa Sorte? Do ponto de visto do arquétipo teórico de abordagem, a seção realiza uma análise horizontal do objeto de estudo a partir do cotidiano compreendido enquanto resultado das ações executadas pelos grupos que ali residem. Não obstante, no âmbito da sociedade capitalista, o objeto de estudo apresenta uma proposta que difere dos grandes espaços comerciais conformados pela ordem distante. Portanto, faz-se pertinente enxergar o objeto de estudo sob a ótica da ordem próxima, ou seja, das relações que se estabelecem no lugar, uma vez que, como orienta Lefebvre (2000, p.66), sob o desenrolar da ordem próxima “a prática espacial de uma 148 sociedade engendra seu espaço; ela o põe e o supõe, numa interação dialética: ela o produz lenta e seguramente, dominando-o e dele se apropriando”. Isto não quer dizer que a interpretação da atividade comercial, considerando as virtualidades do lugar e das práticas sócio-espaciais com base no cotidiano, atendam totalmente ao propósito teórico-metodológico da seção, visto que compatível com o terceiromomento do método regressivo-progressivo chamado de histórico genérico, a finalidade é retornar à realidade descrita e interpretada sem, no entanto, a ela se resumir. Isto posto, se a seção pretende desvendar as projeções futuras para o comércio nas ruas estudadas, deve incorporar o estudo desta realidade materializada pelos grupos sociais naquele espaço no seio da ordem próxima; incorporando também as possibilidades a se concretizarem no futuro concernentes à ordem distante, ou seja, a atuação das forças hegemônicas sobre a Zona Norte, o que consequentemente surtirá efeitos nas ruas Pompéia, Chegança e Boa Sorte. Evidentemente, quando a ordem distante se materializa no lugar aglutina muitas de suas características peculiares, visto que a ordem distante “contendo a ordem próxima, ela a mantém, sustenta relações de produção e de propriedade; é o lugar de sua reprodução” (LEFEBVRE, 2001, p. 52). Dito isto, confirma-se a indissociabilidade das proposições teóricos de Lefebvre, seja sobre a complementariedade mútua das ordens distante e próxima, seja dos espaços concebido, percebido e vivido na conformação do processo de produção do espaço geográfico. Essa conjuntura teórica subsidia a compreensão das ruas em apreço no tocante a sua origem, enquanto conjuntos habitacionais planejados e executados pelo Estado, desconsiderando a opinião da população beneficiada com tais construções ou loteamentos edificados espontaneamente. Essa configuração de moradia, conformada na Zona Norte, é passível de uma leitura cujo lastro teórico está vinculado às proposições de Lefebvre (2000), quando trata do habitar enquanto realização da moradia resultante de um projeto de produção do espaço com participação cidadão; e do habitat enquanto obra de reprodução das forças produtivas. A este respeito, o referido autor discorre sobre as formas de habitar enquanto resultado da produção de seus usuários e o habitat, situação a qual a população é pressionada a ser receptáculo da reprodução do poder imposto de fora sem que lhe seja concedido o direito à obra. 149 No tocante às ruas em discussão, antes destas serem eminentemente comerciais, tinham a função predominantemente voltada para moradia, seja pela ação projetada pelo Estado ou pelos próprios moradores. Ao longo de sua transformação por parte da própria população beneficiada, Pompéia, Chegança e Boa Sorte passaram a agregar o habitar porque nelas foram incorporadas as práticas sócio-espaciais e as ruas tornaram reflexo das ações cotidianas. A discussão do habitar e do habitat desenvolvida por Lefebvre será elucidada na subseção seguinte. Outrossim a análise acerca deste assunto servira de norte para o entendimento do processo de produção e transformação de função nas ruas em evidência. 4.1. DO ESPAÇO DO HABITAR AO ESPAÇO DO HABITAT O processo de urbanização brasileiro, tendo como marco a década de 1950, acontece de forma desigual não somente em relação à força produtiva, mas também em relação às condições de moradia. Em alguns estados, principalmente aqueles do Sul e Sudeste, a máquina substituiu parte da mão-de-obra. Já em outros estados do Nordeste principalmente, a incorporação efetiva do maquinário não se perfilou numa realidade concreta em toda a região. De acordo com Santos (2008), ao discutir a urbanização brasileira, o crescimento numérico anual da população urbana entre 1970-1980 foi de 2.900.000, sendo um número maior que o crescimento da população anual total que chegou aos expressivos 2.600.000. Conforme a urbanização se acentuou, as pessoas migraram cada vez mais do campo para a cidade ocasionado a formação de grandes massas de despossuídos, obrigados a ocuparem a periferia dos grandes centros. Desse modo, as áreas periféricas desprovidas de infraestrutura e serviços sociais urbanos foram ocupadas sobremaneira pelo segmento socioeconômico menos favorecido. Nestas áreas, a intervenção do Estado por meio da política habitacional, gerou moradias para trabalhadores em situação de precarização social, conforme ocorrido na Zona Norte de Natal/RN. Sendo assim, foram construídos conjuntos habitacionais para atender a necessidade de habitação dessa população migrante. No entanto, por ocasião deste momento, não houve participação da população na tomada de decisão acerca do planejamento e consolidação das unidades habitacionais, assumindo assim, segundo o pensamento do Lefebvre 150 (2000) a forma do habitat. Fato semelhante ocorrido na França fez Lefebvre (2000, p. 81) entender o habitat como o resultado da ordem que se concretizou no espaço num processo “instaurado pelo alto: aplicação de um espaço global homogêneo e quantitativo obrigando o “vivido” a encerrar-se em caixas, gaiolas, ou, máquinas de habitar”. Por esta lógica, e em consonância com o pensamento de Lefebvre (2000), pode-se compreender que os moradores participantes do processo inicial de expansão urbana da Zona Norte de Natal foram privados da obra, visto que não tiveram a oportunidade de decidir sobre a sua própria moradia. Esta fora inclusive projetada para as áreas periféricas, tanto do ponto de vista geográfico em relação ao centro da cidade, quanto do ponto de vista social pelas precárias condições de vida em um espaço pouco aparelhado no que se refere a infraestrutura e serviços urbanos. No entanto, ao se debruçar sobre a história relatada por alguns moradores e/ou comerciantes na seção anterior, nota-se que a ação do Estado, ainda que em sua essência não tenha lhes concedido a condição de habitar, fez emergir o desejo da casa própria e a partir daí a construção do lugar da moradia. Ao adquirir a casa própria, os moradores passaram a desenvolver práticas no intuito de atender as suas necessidades básicas de consumo como alimentação, medicamentos e vestuário e aos poucos foram incorporando àquele espaço equipamentos básicos resultado da reprodução da própria vida. O cenário atual da Zona Norte, ainda que se trate de realidades e tempos diferenciados daquele tratado por Lefebvre, pode ser interpretado à luz do pensamento do autor quando infere que a classe operária é aquela que sofre as consequências da explosão das antigas morfologias. Ela é vítima de uma estratégica segregação de classe permitida por essa explosão. Na visão de Lefebvre (2000), a antiga miséria proletária se atenua e tende a desaparecer nos países industriais fazendo surgir uma nova forma de precarização, a do habitat, que se expande na cidade e atinge sobremaneira o proletariado, mesmo sem isentar outros segmentos sociais, de modo que a população seja conduzida a uma cotidianidade organizada (na e pela sociedade burocrática de consumo dirigido). Em paralelo ao habitat instaurado na Zona Norte, formas de ocupação desordenada foram surgindo como meio da população, que não fora beneficiada com o conjunto habitacional, construir sua própria residência à maneira desejada em 151 consonância com as vivências do próprio grupo. Cita-se como exemplo, os loteamentos em que, de posse do lote, o morador construiu sua casa desvencilhado de padrões pré-estabelecidos. Nestas construções, o maior interessado, o morador, foi sujeito atuante no processo de produção do espaço urbano da Zona Norte. Deixando-se influenciar também pelas ideias do filósofo Heidegger, quando discute a habitação com o resultado de um planejamento, torna pertinente pensar sobre a produção espontânea do espaço da Zona Norte em forma de loteamentos que perpassa pela questão central situada em torno do “habitar” ou seja, o espaço essencialmente caracterizado como aquele de apropriação por um grupo, cujo objetivo ultrapassa o sentido de estabelecer residência. Em outras palavras “O habitar é a própria essência da relação homem-meio, expressa na totalidade vivida e nas ligações com o construir” (PROENÇA, 2011, p. 22). A este respeito,vale acrescentar que nem toda construção pode ser habitada, apenas aquelas destinadas à moradia. Uma ponte não pode ser habitada, nem tampouco um salão, mas todos são construções. No entanto, se desvencilhando do simples fato de construir, “o habitar é o traço fundamental da condição humana. Pelas suas diversas dimensões, ele constitui-se num traço do ser, pelo qual os mortais estão sobre a terra. A habitação revela ao homem a sua situação de ser mortal” (PROENÇA, 2011, p.23). Por esta ideia, compreende-se então que habitar significa não simplesmente uma condição de morar a partir de uma construção, mas a realização de um desejo resguardado ao ser humano. Pela compreensão do habitar em discussão, infere-se que o espaço urbano da Zona Norte, edificado pelo Estado ou pelos próprios moradores, serviu a uma população que construiu no dia-a-dia não somente o desejo da moradia, mas também a consolidação da reprodução da vida em terras praticamente vazias. As práticas iniciadas no solo consideravelmente desnudo, cedeu lugar ao desejo da sobrevivência e para sua realização, foram incorporadas ao lugar, atividades urbanas para atender às necessidades dos moradores. Desta forma, aquela Zona Norte da década de 1980 em contexto de expansão urbana, mas ainda com muitas terras vazias, de longe parecia pertencer a uma cidade de crescimento econômico e social tão pujante conduzido pela Zona Sul. Enquanto esta última crescia consideravelmente em habitação de padrão elevado e sediava equipamentos comerciais importantes no âmbito da cidade, a Zona Norte apresentava um crescimento lento não só do ponto de vista do 152 contingente populacional, mas principalmente do ponto de vista econômico, o que lhe concedeu durante muito tempo a denominação de espaço dormitório. Porém, a partir dos anos 1990 e principalmente 2000, quando houve uma maior construção de unidades habitacionais pelo Estado e também um aumento no número de imóveis, a Zona Norte apresentou outra realidade de modo que, segundo informações censitárias representadas na tabela 3, foi a porção que mais cresceu em termos populacionais em relação às outras zonas administrativas da cidade desenhando uma geografia que de longe se assemelha aquela de sua constituição inicial nos anos de 1980. Tabela 3 - Evolução da população residente em Natal de 1991-2010 Z.A BAIRRO POPULAÇÃO RESIDENTE 1991 1996 2000 2010 N O R T E Lagoa Azul 9.864 40.199 50.413 61.289 Igapó 24.354 25.477 27.032 28.819 N.Sra. da Apresentação 12.982 38.708 56.522 79.759 Pajuçara 13.259 35.300 42.130 58.021 Potengi 55.877 56.221 56.259 57.848 Redinha 6.581 9.084 11.504 16.630 Salinas 529 1.026 883 1.177 SUBTOTAL 123.446 206.015 244.743 303.543 S U L Lagoa Nova 44.651 35.712 35.669 37.518 Nova Descoberta 14.307 13.130 12.481 12.467 Candelária 15.233 18.018 18.684 22.391 Capim Macio 13.984 18.103 20.522 22.760 Pitimbu 20.402 22.755 22.985 24.209 Neópolis 18.606 21.092 22.041 22.465 Ponta Negra 18.070 20.061 23.600 24.681 SUBTOTAL 145.253 148.871 155.882 166.491 L E S T E Santos Reis 7.480 6.633 6.820 5.640 Rocas 12.316 10.833 10.525 10.452 Ribeira 1.826 1.839 2.110 2.222 Praia do Meio 3.304 4.139 4.193 4.770 Cidade Alta 7.548 6.254 6.692 7.123 Petrópolis 7.506 5.222 5.105 5.521 Areia Preta 3.137 2.926 2.652 3.878 Mãe Luiza 17.416 16.324 16.058 14.959 Alecrim 39.219 32.100 32.356 28.705 Barro Vermelho - 8.024 8.145 10.087 Tirol 15.176 13.071 14.799 16.148 Lagoa Seca 13.844 7.088 6.651 5.791 SUBTOTAL - 114.453 116.106 115.297 O E S T E Quintas 35.265 32.184 29.751 27.375 Nordeste 12.045 12.041 11.436 11.521 Dix-Sept Rosado 36.233 14.869 16.141 15.689 Bom Pastor 19.015 17.746 17.984 18.224 N.Sra. de Nazaré - 18.123 15.623 16.136 Felipe Camarão 37.021 41.398 45.907 50.997 Cidade da Esperança 21.172 20.629 20.235 19.356 Cidade Nova 16.821 15.694 15.778 17.651 Guarapes 8.334 13.908 8.415 10.250 Planalto - - 14.314 31.206 153 SUBTOTAL - - 195.584 218.405 TOTAL - - 712.317 803.739 Fonte: Prefeitura Municipal de Natal/RN. Anuário Natal 2011-2012. Elaboração da Autora, 2016 Se na década de 1980 aquela área era ocupada basicamente por trabalhadores da indústria e se mantinha distante geograficamente do centro da cidade, inclusive, pelo precário acesso às outras áreas, hoje o cenário é outro. Do ponto de vista econômico, a Zona Norte apresenta grandes equipamentos comerciais que geram emprego para a população residente, principalmente da área, e também concentra serviços de saúde, a exemplo do Instituto do Rim e do Hospital Maria Alice. Cabe mencionar ainda a substituição do Aeroporto Augusto Severo, localizado em Parnamirim pelo Aeroporto Internacional Governador Aluízio Alves, inaugurando em 2014, cuja localização está no município de São Gonçalo do Amarante, vizinho a Zona Norte. A presença desse equipamento atraiu mão-de-obra para perto de sua localização de modo que a Zona Norte se configurou como uma das melhores opções, não somente para o estabelecimento da moradia por parte da maioria dos funcionários, como também dinamizou serviços de transporte para aquela área, como a inserção de linhas de ônibus e a otimização de praças de taxis na para atender a demanda vinda do aeroporto. Do Ponto de vista populacional, entre as décadas 2000 e 2010 conforme expresso na tabela 4, a maior taxa de crescimento está na Zona Norte, se comparado às outras regiões administrativas de acordo com a (SEMURB, 2015). Tabela 4 - Taxa de crescimento de Natal/RN por Zona Administrativa 2000-2010 Zona Administrativa População Residente Percentual de crescimento (2000-2010) 2000 2010 Zona Norte 244.743 303.543 19,3% Zona Sul 155.882 166.491 6,3% Zona Leste 116.106 115.297 -0,7% Zona Oeste 195.584 218.405 10,4% Fonte: Prefeitura Municipal de Natal/RN. Anuário Natal 2011-2012. Elaboração da Autora, 2016 Parte desse crescimento da Zona Norte se explica pelo fato de muitas pessoas investirem em imóveis nesta área em função do seu baixo valor do solo urbano em comparação com o restante da cidade. A referida área tem se constituído numa alternativa viável economicamente para se fugir do aluguel em outras áreas da 154 cidade. De acordo com a SEMURB (2015), os bairros da Zona Norte que mais cresceram em 2015 foram Pajuçara, acima de 500 imóveis, seguidos de Potengi e Nossa Senhora da Apresentação, entre 21 e 50 imóveis. O aumento populacional da Zona Norte deve-se ainda a maior integração desta área ao restante da cidade, promovida pela Ponte Newton Navarro (Figura 13), (popularmente conhecida como ponte todos), inaugurada em 2007. A referida ponte facilitou a mobilidade dos habitantes de outras áreas da cidade em direção a porção norte e vice e versa e também otimizou a procura daquela área por parte dos turistas. A Zona Norte detém a maior perspectiva de crescimento populacional pela sua disponibilidade não somente em área territorial, mas também em termos de verticalização. Entretanto isto depende, sobremaneira, de investimentos do Estado em conjunto com a Prefeitura Municipal para investir em infraestrutura urbana, como saneamento básico, para que se possa revogar o gabarito previsto no atual Plano Diretor de Natal, que veta qualquer construção acima de 7,5 metros naquela zona. O aumento no número de pessoas na Zona Norte também significa aumento no percentual de consumo na área, visto que à medida que a cidade cresce, o comércio também cresce e se desenvolve (PINTAUDI, 1999). Dito isto, compreende- Figura 13 - Ponte Newton Navarro - Natal/RN - 2011 Fonte: Menezes, 2011. 155 se que, para acompanhar o aumento populacional, haverá um crescimento nas atividades de comércio e de serviços para que a crescente demanda de consumo evidenciado na Zona Norte possa ser atendida. O crescimento do comércioestá atrelado principalmente à instalação de grandes equipamentos mencionados na segunda seção, em conjunto, com serviços como: Ginásio Nélio Dias, Campus da Universidade do Estado do Rio Grande do Norte, Instituto do Rim, Central do Cidadão, Campus da Universidade Potiguar, Faculdade Estácio de Sá e outros que se configuraram como vetores para o crescimento da Zona Norte, principalmente entre as décadas de 2000 e 2010. No tocante ao varejo, cabe mencionar a inauguração do Assaí, grande equipamento de comércio do segmento do atacado e varejo, em dezembro de 2016. O referido empreendimento está localizado na Avenida Bacharel Tomaz Landim, na divisa de São Gonçalo do Amarante com a Zona Norte de Natal e se projeta como um grande dinamizador do consumo no ramo de alimentos e variedades. Por estar localizado próximo ao Supermercado Nordestão de Igapó, poder-se- ia presumir que o atacarejo Assaí impulsionasse uma queda nas vendas do supermercado mencionado. No entanto, acredita-se que isto não ocorrerá em virtude das estratégias de publicidade veiculadas pelo referido. A logomarca do Nordestão, “gente da terra da gente”, explicita valores corporificados pela emprega em divulgar uma imagem de supermercado concatenado com a cultura potiguar. Outrossim, o Nordestão aplica capital no desenvolvimento de políticas de preocupação com o desenvolvimento local, meio ambiente, educação e cidadania. Diante desse quadro de crescimento econômico e populacional elucidado e projetado para a Zona Norte não se pode negar os impactos sofridos por esta área mediante a crise econômica instaurada não só no estado, mas em todo o país. Em conjunto com outros segmentos econômicos, o varejo moderno tem sido atingido consideravelmente com a redução de produção e vendas ocasionando, deste modo, um grande número de desempregados. Como estratégia, tem-se investido cada vez mais em geração de renda alternativa. A este respeito, cita-se os casos de pessoas que, após perderem seus empregos, passaram a desenvolver novas atividades como ambulantes ou mesmo com a abertura de pequenos estabelecimentos de base fixa. Esta alternativa de sobrevivência se constitui como garantia de permanência das condições básicas da vida de muitos desempregados. Como consequência da 156 crise, o habitar é colocado em situação de instabilidade podendo mais uma vez ser transformado no habitat, neste caso não pela obra projetada pelas forças hegemônicas, mas pela manutenção da sobrevivência em ambientes urbanos e no caso específico da pesquisa, na cidade do Natal. Mediante problematização, o habitat passa a ser o espaço da própria reprodução do sistema capitalista que se reinventa na crise e projeta em ruas com Pompéia, Chegança e Boa Sorte a possibilidade de continuar gerando lucro por meio de novas artérias produtivas como o pequeno comércio de base informal. Tendo em vista a análise sumária apresentada, maiores aprofundamentos são abordados na subseção seguinte. 4.2. A CRISE ECONÔMICA E A REALIDADE “POSSÍVEL” A crise econômica, iniciada no Estados Unidos em 2008, atingiu fortemente o mercado imobiliário do país em virtude da queda do dinamismo das vendas de imóveis já evidenciada em 2007. Segundo o Banco Central do Brasil, mediante situação financeira dos EUA, o Brasil se preparou para enfrentar possíveis desdobramentos da crise americana, investindo em programas como aumento de crédito por parte dos bancos públicos, Programa Minha Casa Minha Vida, redução da taxa do Sistema Especial de Liquidação e de Custódia – Selic – e a redução de Impostos sobre Produtos Industrializados – IPI, (Banco Central do Brasil, 2010) Entretanto, mesmo com as medidas adotadas para se proteger da crise, o Brasil acabou sendo atingido logo em 2009, e principalmente a partir de 2015, quando o mercado consumidor e a classe trabalhadora sofreram rebatimentos negativos de forma direta. Porém, do ponto de vista comercial, a crise tornou-se mais evidente com a redução das demandas de exportação. De acordo com informações divulgadas pela Federação das Indústrias do Rio Grande do Norte – FIERN (2016), o volume de exportações do estado apresentou queda de 18,7 no primeiro semestre de 2016 em relação ao mesmo período de 2015. Segundo Pochmann (2009), que discorreu sobre os primeiros sinais da crise econômica em 2009, o Brasil foi atingido em três dimensões: desemprego, ocupação precária e alta rotatividade. Com relação ao comércio varejista, de acordo com a Pesquisa Mensal do Comércio (PMC), divulgada pelo IBGE (2017), a crise se fez 157 sentir na redução de vendas de 3,5% em novembro de 2016 em relação ao mesmo mês do ano anterior, tendo o segmento de Tecidos, vestuário e calçados apresentado crescimento negativo de -9,6% em novembro de 2016. O segmento que teve menor impacto negativo foi o de Hipermercados, supermercados, produtos alimentícios, bebidas e fumo, com redução de vendas de apenas (-1, 1%), enquanto que o de maior impacto negativo foi o de Livros, jornais, revistas e papelaria (- 11,8%). Para a construção da PMC, o IBGE investigou empresas com 20 ou mais pessoas ocupadas, cuja receita bruta provenha inteiramente do comércio varejista. Para o comércio, as expectativas de consumo ainda não são animadoras para o primeiro trimestre de 2017, se levado em consideração a intenção de compra para janeiro do corrente ano, conforme expresso no gráfico 17. Conforme mostra o gráfico 17 houve um leve aumento na intenção de compra de janeiro de 2017 em relação ao mesmo mês de 2016. Embora apresentando aumento, 2017 teve uma redução do consumo se comparado a janeiro de 2011. Essa diminuição do consumo está relacionada, segundo a Confederação Nacional Gráfico 17 – Intenção de compra das famílias brasileiras entre Jan de 2010 e Jan de 2017 Fonte: CNC, 2017. 158 do Comércio e do Turismo (CNC), ao fato de que mais da metade das famílias brasileiras encontrou dificuldade de acesso ao crédito em relação em 2017. A causa foi o aumento desenfreado do desemprego que impossibilita o acesso à empréstimos, o que acabou rebatendo sobre o comércio. Ainda de acordo com a CNC, a intenção de compra das famílias brasileiras apresentou redução de 1,7% em relação ao mesmo mês de 2016. Para o órgão, também houve uma diminuição da expectativa de emprego em janeiro de 2017 em relação a dezembro de 2016. No Rio Grande do Norte, o desemprego atingiu números expressivos em 2016. De acordo com dados do Cadastro Geral de Empregados e Desempregados (CAGED/2016) foram demitidas 9.097 pessoas na indústria, 6.602 na construção civil, 3.378 no comércio e 3.179 nos serviços no referido ano. A economia do estado desaqueceu em 2016, resultado sobremaneira da baixa produção industrial, o que repercutiu negativamente no comércio varejista causando retração de vendas. A baixa produção industrial fez aumentar o preço da mercadoria, de modo que o consumidor passou a ser mais cauteloso com pesquisas e comparação de preço. De acordo com o Ministério do Desenvolvimento, Indústria e Comércio Exterior, o ano de 2017 apresentará perspectivas de crescimento do ponto de vista comercial se o consumidor retomar sua confiança para o consumo. Acerca das Políticas Públicas para tentar superar a crise econômica, o Ministério do Desenvolvimento, Indústria e Comércio Exterior pretende investir, entre 2016 e 2019, em medidas para a retomada do crescimento industrial por meio da agregação de valor à mercadoria e fomento à novos mercados. Esses investimentos em efetividade, repercutirão na retomada do aquecimento comercial no estado de modo que o comércio volte a crescer. Dentre as principais demandas que o Ministério prevê para o comércio não apenas do Rio Grande do Norte, mas de todo o país, é o estímulo à competitividade por meio da melhoria do estabelecimento e uma maior flexibilizaçãopara abertura de novas empresas e manutenção das já existentes, através da desburocratização de processos de forma que o setor volte a gerar mais empregos. Do ponto de vista da internacionalização serão estimuladas novas formas de comércio como o comércio eletrônico. Aliás, mesmo em meio à crise econômica, este segmento cresceu 11% em 2016 em relação à 2015 e tem perspectiva de 159 faturamento estimado para 59,9 bilhões de reais para 2017, conforme apontado pela Associação Brasileira de Comércio Eletrônico. Já em relação ao comércio de base fixa, as compras do varejo também são expressivas nos Shopping Centers, diferentemente do observado em países da Europa como exemplo em Portugal, o comércio de rua é mais representativo. De acordo com a Associação Brasileira de Shopping Centers (ABRASCE) estes tiveram um faturamento de 151, 5 milhões de reais em 2015. Ainda de acordo com a referida associação o faturamento anual de 2016 foi de 159,075 milhões de reais, com estimativas animadoras de faturamento para 2017, com rendimento na ordem de 170,210 milhões de reais. Uma das explicações reside nas possibilidades que este centro comercial oferece, no que se refere à segurança, estacionamento seguro, reunião de lojas especialidades, serviços diversos ao consumidor e maiores atrativos para a efetivação das compras. Na Zona Norte, em paralelo ao crescimento do consumo em Shopping Centers, a atividade comercial também ganhou espaço de visibilidade em ruas. No tocante ao comércio de base fixa realizado na rua, também existem perspectivas animadoras (Gráfico 18). A projeção toma por base a realidade atual no tocante à escala de crescimento do comércio nas ruas Pompéia, Chegança e Boa Sorte na perspectiva do comerciante. Ao ser questionado se numa escala de 0 a 10, qual seria a nota que o mesmo atribuía ao crescimento do comércio nas ruas em questão, as respostas foram satisfatórias no tocante à ratificação de que existe uma dinâmica pujante no comércio nas ruas estudadas. 160 O gráfico 18 explicita que, mesmo diante da crise e da avassaladora insegurança que assola os espaços de comércio aberto, o comércio executado na rua aponta para um crescimento. O fato de 82% dos entrevistados apontarem que a atividade comercial das ruas em discussão cresceu entre 8 e 10 significa que os comerciantes se mostram otimistas quanto ao permanente crescimento do comércio nestes espaços. O grande diferencial da atividade comercial desenvolvida na rua em relação ao shopping diz respeito principalmente ao tratamento personalizado, à priorização do atendimento no tocante à compreensão das necessidades do consumidor e a livre organização da loja considerando a variedade de mercadorias. A este respeito, Oliveira (2006), ao discutir sobre a dinâmica da rua de comércio na cidade de São Paulo, aponta a espontaneidade e criação de seu próprio mix de mercadoria como um fator que favorece o comércio desenvolvido na rua em detrimento daquele executado no shopping. Diante do agravamento da crise em 2016, que acarretou índices de desemprego na ordem de 12 milhões em todo o país e, consequentemente a Gráfico 18 – Escala de crescimento do comércio de 0 a 10 na perspectiva do comerciante nas ruas Pompéia, Chegança e Boa Sorte - 2016 Fonte: Elaboração da autora, 2016. 161 redução do poder de consumo pela população, muitos tem aderido ao comércio popular. Esta adesão aponta que o crescimento indicado no gráfico 18 tenderá a se acentuar, principalmente através do aumento do comércio informal, visto que este se constituiu numa das estratégias do trabalhador ao ficar desempregado. Ao mesmo tempo, a informalidade também faz parte das estratégias de reprodução do próprio capital que a utiliza como válvula de escape para fugir dos efeitos da crise. A informalidade também contribui para aumentar a oferta e procura por produtos a custos mais baratos. Na compreensão de Tavares (2004, p. 10), ao problematizar sobre a precarização do trabalho informal, afirma que a informalidade é uma estratégia que se reproduz com o desenvolvimento da produção capitalista. A autora entende o trabalho informal não apenas como aquele em oposição ao formal, mas também como um movimento de valorização do capital que tira proveito da crise para se reproduzir e gerar lucro a qualquer maneira, seja, suscitando novos postos de trabalho com esta característica ou incentivando o consumo como alternativa para as pessoas investirem cada vez mais em seu próprio negócio. Outro fator que tem favorecido o comércio nas ruas Pompéia, Chegança e Boa Sorte é a utilização da publicidade (Gráfico 19). Esta tem sido uma das alternativas encontradas pelos comerciantes para fazerem a divulgação da mercadoria, principalmente nas redes sociais. O facebook é a rede social mais utilizada para a divulgação da mercadoria, visto que não necessita de grandes esforços para criar um vínculo comunicativo com o público consumidor. Este veículo de comunicação é o mais utilizado, mas outras estratégias de publicidade são empregadas como carros de som, panfleto e, em alguns casos, anúncios em programas de rádio. As várias formas do comerciante estabelecer contato com seus potenciais consumidores não deixam margem para excluir nenhum segmento social ou faixa etária acerca do conhecimento sobre as mercadorias. 162 Os dados mostram que, mesmo se constituindo num comércio tradicional composto de pequenos estabelecimentos, com oferta reduzida de produtos e geridos essencialmente por pequenos empresários, de gestão familiar e de organização modesta, a presença da tecnologia assume importância para os comerciantes superarem a crise. Desta forma, se antes não havia necessidade deste recurso, sua estimativa de crescimento se acentua, pela possibilidade que o comerciante tem de fazer a divulgação da mercadoria sem nenhum custo empregado. Lefebvre (1991, p.116), ao se debruçar sobre a produção do espaço e a publicidade, afirma que: (...) A publicidade exerce função de ideologia; ela vincula o tema ideológico a uma coisa (o after shave) à qual confere assim uma dupla existência, real e imaginária. Ela vincula os termos das ideologias e amarra, para além das mitologias, os significantes aos significados, já recuperados e utilizados. A grande maioria dos comerciantes que se utiliza da publicidade é do segmento de vestuários e acessórios através da promoção do discurso da beleza e da inserção social através da moda. A interpretação está no fato de que, na contemporaneidade, o consumo constitui-se como um caminho central para o Gráfico 19 - Utilização de mecanismos de publicidade pelos comerciantes das ruas Pompéia, Chegança e Boa Sorte/2016 Fonte: Elaboração da autora, 2016. 163 entendimento dos grupos populares brasileiros, pois entende-se que é por meio deste que os sujeitos se encontram mais integrados e atualizados com o global e com a vida cotidiana. Estudar o consumo popular significa investigar essa prática em ambientes populares e a relação dos consumidores desta no tocante à sociedade na qual é praticado. O consumo popular é entendido no referido trabalho como uma prática exercida por pessoas de poder de compra reduzido que se realiza em ruas de comércio tradicional com Pompéia, Chegança e Boa Sorte. Estas ofertam mercadorias que, sobremaneira, são imitações da moda recente. É a imitação da moda que a classe popular busca na tentativa de se inserir na sociedade. Para o filósofo, sociólogo e psicólogo Gabriel Tarde, quando trata do comportamento do ser humano acerca da imitação, afirma que “todas as semelhanças de origem social que se observam no mundo social são o fruto directo ou indirecto da imitação sob todas as suasformas: imitação costume ou imitação-moda”[ Tarde (s/d, p. 37)]. A imitação ganha maior força com a publicidade desenfreada transmitida a todos os públicos e durante todas as horas no decurso do dia pela televisão. Este veículo de comunicação aliena os telespectadores de modo a implantar nestes o desejo incansável de imitar as vestes, acessórios e até a maneira de se expressar de seus ídolos. Influenciado pelas ideias veiculados por Tarde, o geógrafo Santos (2016), ao se debruçar sobre o duplo fenômeno imitação/repetição da mercadoria no recorte espacial de pesquisa shopping popular Feiraguai em Feira de Santana – BA, infere que a publicidade tem um papel fundamental na otimização do consumo nos espaços de comércio. O autor diz que uma das explicações do desejo de imitar está no próprio processo produtivo da mercadoria que demanda a imitação de cópias autênticas que apontam para a realização do desejo de estar parecido com o outro. Ancorado nas ideias de Tarde, o autor ainda explica que a imitação, no microuniverso do indivíduo, é alimentada por uma ambição maior como possibilidade de se programar o infinito segundo tendências e modas. O conceito de moda adotado na pesquisa em questão é contundentemente estudado por Lipovestky (2006), que faz uma análise da moda como instrumento gerador de valor, o qual está sujeito a mutações podendo fazer surgir “novos valores” considerando a mudança da moda. Entretanto a consumo pelas classes populares é uma tentativa de estar em harmonia, parecido com o outro no intuito de 164 estabelecer elo de proximidade. Nesta perspectiva faz-se importante, mesmo que pontualmente, a ideia do filósofo Immanuel Kant (1770), referenciada por Svendsen (2010) acerca do assunto. A este respeito, a imitação “é uma inclinação natural do homem comparar seu comportamento com o de alguém mais importante [...]. Uma lei de tal imitação, que praticamos para não parecermos menos importantes que outros. (KANT, 1770 apud SVENDSEN, 2010, p. 43). As pessoas compram mercadorias parecidas com as dos famosos e que estão expostas nas vitrines de shoppings. O intuito é se inserir no cotidiano e exercer a sua cidadania por meio do consumo, pois este também provoca uma cisão na sociedade no sentido de mostrar que as pessoas são vistas e aceitas por aquilo que elas mais consomem. De acordo com o pensamento de Bauman (2008), ao discutir a alienação das pessoas em virtude do consumo, o ato de consumir vem sendo cada vez mais um investimento que o indivíduo faz em si mesmo, em sua afiliação social, a fim de se tornar vendável, tal qual uma mercadoria. Os indivíduos consomem produtos, serviços e valores simbólicos em troca de uma afirmação social que lhes garanta o caráter de cidadãos. Todos querem ser reconhecidos e aceitos e, para isso, fazem de si mesmo mercadorias a serem expostas na sociedade. A lógica social do consumo da sociedade contemporânea é guiada pela ideologia da felicidade como um caminho possível para a realização pessoal. Dessa forma, “a felicidade ostente, à primeira vista, semelhante significado e função, induz consequências importantes quanto ao respectivo conteúdo: para ser o veículo do mito igualitário, é preciso que a felicidade seja mensurável” (BAUDRILLARD, 2010, p.47). Entretanto, para Baudrillard (2010), é ingenuidade pensar o discurso do consumo como busca de uma felicidade proporcionada simplesmente pelos objetos materiais. Para ele, o processo de consumo pode ser analisado por dois aspectos fundamentais: 1) Como processo de significação e de comunicação (o consumo funciona aqui como um sistema de permuta e equivalente de uma linguagem); 2) Como processo de classificação e diferenciação social. O amento do consumo incitado pelo recurso à imitação da moda ou mesmo pela simples procura de mercadoria a preços mais baratos tem ganhado notoriedade nas três ruas, que são referência de consumo popular na Zona Norte. 165 O comércio das ruas Pompéia, Chegança e Boa Sorte reproduz, de forma contundente, a prática da imitação tendo como grande propulsor desta questão a publicidade. As mercadorias postas à venda nos estabelecimentos destas ruas não fogem à regra daquelas discutidas por Santos (2006) em Feira de Santana na Bahia, nem tampouco da Rua 25 de março em São Paulo, maior rua de comércio popular do Brasil, visto que a publicidade atinge a todos de modo a despertar o desejo pelo consumo mesmo que de mercadorias imitadas como é o caso dos espaços populares de consumo outrora citados. Aliás, conforme Lipovetsky (2006), ao discutir a moda como um fenômeno social ocidental moderno, a publicidade está em todos os lugares. Ela trabalha com os princípios da moda: “a originalidade a qualquer preço, a mudança permanente, o efêmero. Tudo menos dormir no ponto e tornar-se invisível por hábito” (LIPOVETSKY, 2006, p. 215). Ao se referir ao poder desenfreado de sedução provocado pela publicidade, o autor diz que esta se encontra cada vez mais embebida pelo hiperespetáculo e que cada vez menos atende à solicitude, a tenção calorosa, mas sim a teatralidade hollywoodiana. As mercadorias utilizadas por celebridades são ainda mais vendáveis porque faz criar, através da publicidade, o desejo de ser ousado e exclusivo. Em Pompéia, Chegança e Boa Sorte, arrisca-se a dizer que mais do que hollywoodiana, as mercadorias são propagadoras, de forma expressiva, de um modo de vida fictício da Rede Globo de Televisão. Para que as mercadorias das lojas destas ruas representem uma nova tendência basta que uma atriz global se exponha com mercadorias inesperadas. Mas afinal, quem dita a moda que se divulga nos canais de comunicação e rapidamente se pulveriza nos espaços de comércio, seja em shoppings propagadas pelas mercas ou em espaços abertos como ruas de comércio que reproduz a imitação? Lipovetsky (2006) ajuda na elaboração de um esforço interpretativo quando diz que a moda já não encontra seu modelo em reminiscências do passado e que, na contemporaneidade, ela se organiza segundo transformações organizacionais, sociais e culturais. O autor logo adverte que a emergência de um novo sistema necessariamente não exclui outro. Tomando por referência, a discussão empreendida pelo autor sobre a moda, pode-se inferir que esta se cria orquestrada pela mão de profissionais e é absorvida por uma lógica industrial serial que recria coleções sazonais e ritz que circulam em emissoras de rádio, televisão e redes sociais. A respeito dessas modas que “pegam facilmente” nas redes sociais, pode-se citar a famosa frase da cantora baiana Ivete 166 Sangalo durante um show, quando em plena apresentação viu o seu esposo na plateia conversando com uma moça e logo perguntou: “Quem é essa aí, papai? ”. Essa frase ganhou repercussão de tal forma que em menos de sua semana, após o acontecido, já circulavam nas ruas de comércio camisetas com a frase estampada, além de músicas envolvendo a situação. As ruas de comércio Pompéia, Chegança e Boa Sorte, seguem esta e outras tendências que são divulgadas rapidamente devido a sua expressiva dinâmica. Estas são conhecidas em toda a cidade do Natal como referência de comércio popular na Zona Norte. Um dos vetores dessa dinâmica é a conexão da Zona Norte, e consequentemente das ruas estudadas, pelo transporte público que tem promovido à mobilidade do consumidor interessado em mercadorias de baixo preço, sem, no entanto, destoar da moda propagada nos vários canais de comunicação. De acordo com informações da Secretaria de Transportes e Trânsito Urbano de Natal/RN/STTU acerca das ordens de serviço de transportes públicos que circulam nas ruas Pompéia, Chegança e Boa Sorte (Quadro 8), boa parte dos ônibus que trafegam nas ruas citadas, realiza em seus itinerários, rotas que engloba quase toda a cidade, passível de visualização nos mapas 11 e 129. Quadro8 - Ordem de serviço operacional das linhas de transporte público que circulam nas ruas Pompéia, Chegança e Boa Sorte – 2016 Linha Bairros Empresa 64A43 Nova Natal / Candelária - Via Praia do Meio Guanabara 02 Gramoré/Mirassol Guanabara 81 Vila Verde / Petrópolis - Via Ponte Newton Navarro Guanabara 592 Soledade I/Santa Cecília Guanabara A Ribeira/Redinha –Via Parque das Dunas/Alecrim/Pajuçara/Parque das Dunas/Brasil Novo / Av. Dr. João Medeiros Filho Reunidas ORDEM SE SERVIÇO OPERACIONAL DAS LINHAS DE TRANSPORTE PÚBLICO QUE CIRCULAM NA RUA BOA SORTE Linha Bairros Empresa 07 Alvorada IV/Cidade Jardim – Via Av. Paulistana Urbana/Av. Bernardo Vieira/Natal Shopping/Av. Boa Sorte Reunidas 27 Alvorada IV/Ribeira – Via Alecrim/Av. Boa Sorte/Av. Paulistana/Alecrim/Av. Rio Branco Reunidas 9 Em virtude de os mapas terem escala de 1/3200, tornou-se inviável a sua visualização em detalhes. No entanto, os mesmos possibilitam a interpretação do potencial de abrangência territorial de consumo das ruas Pompéia, Chegança e Boa Sorte 167 68 Alvorada IV/Petrópolis Av. Bernardo Vieira/Midway Mall/Av. Alexandrino de Alencar/Av. Hermes da Fonseca/Praça Cívica Reunidas 600 Circular Norte Fácil Parque dos Coqueiros/Santarém/Norte Shopping Guanabara e Cidade do Natal ORDEM SE SERVIÇO OPERACIONAL DAS LINHAS DE TRANSPORTE PÚBLICO QUE CIRCULAM NA RUA CHEGANÇA Linha Bairros Empresa 01 A Cidade da Esperança/Gramoré – Via Parque dos Coqueiros Guanabara 10-29 Nova Natal/Nova Descoberta Via Campus Guanabara 64 Nova Natal/Petrópolis Guanabara 64 A – 43 Nova Natal/Candelária – Via Praia do Meio Guanabara Fonte: Guanabara, 2017 Nas três ruas, a articulação de algumas linhas ocorre apenas na Zona Norte, como é o caso da 592 (Pompéia) e 600 (Boa Sorte), enquanto as demais circulam em quase toda a Natal. A este respeito pode-se citar a linha 64A43, cujo ponto de partida é o Bairro de Nova Natal na Zona Norte, com sentido à Zona Sul e retorna pela Zona Leste. Esta mesma linha acessa a Chegança e também a Pompéia, provendo a integração comercial das duas ruas. As três zonas administrativas mencionadas também fazem parte do percurso executado pelo 10-29, cuja importância ultrapassa a razão comercial visto que esta linha é a única, dentre as que abrangem as ruas estudadas, a ter a UFRN incorporada a sua rota, trazendo para a instituição estudantes e funcionários que residem, não somente na Zona Norte, mas também em Candelária e Praia do Meio. Os itinerários apresentados apontam para uma maior integração da cidade, facilitando o acesso às ruas pela maior mobilidade proporcionada e, desta forma, paulatinamente as ruas estudadas vão se apresentado no cenário comercial da cidade do Natal. Como foi explicitado na segunda seção, o comércio desenvolvido nestas ruas já não apresenta uma endogenia acentuada por servir também às pessoas que habitam em outras partes da cidade. Mesmo assim, é válido ressaltar a função social que o comércio na Pompéia, Chegança e Boa Sorte assume no contexto da Zona Norte, questão a ser discutida na sequência. 168 Mapa 11 - Abrangência territorial das linhas de ônibus que circulam nas ruas Pompéia, Chegança e Boa Sorte Fonte: Sistema de Transporte Público de Passageiros do Município do Natal – STPP, 2012. 169 Mapa 12 - Abrangência territorial das linhas de ônibus que circulam nas ruas Pompéia, Chegança e Boa Sorte no âmbito da Zona Norte de Natal/RN Fonte: Sistema de Transporte Público de Passageiros do Município do Natal – STPP, 2012. 170 4.3. A FUNÇÃO SOCIAL DO COMÉCIO NAS RUAS POMPÉIA, BOA SORTE E CHEGANÇA O comércio constitui-se numa atividade importante para a reprodução do capital. Ele fornece suporte aos ramos da economia no que concerne à produção, distribuição e consumo de mercadorias e se dinamiza com a inserção, inclusive, de novas frentes tecnológicas como inovadoras estratégias de reprodução. Na escala da cidade, as inovações tecnológicas aplicadas ao comércio, repercutem nas práticas de consumo pela população, assim como na possibilidade de mudança locacional de atividades como, por exemplo no comércio varejista. Compreendo-a além da sua conjuntura econômica, a atividade comercial também desenvolve uma função social junto ao seu público beneficiário. Dentre os atributos da função social do comércio estão: geração renda e compatibilidade com os interesses comunitários locais. Por esta perspectiva, o comércio está relacionado aos sujeitos partícipes da atividade, tanto no que se refere ao comerciante diante da possibilidade de garantir, senão total, mas parcial, o sustento da família, quanto ao consumidor diretamente relacionado ao perfil do comércio pretendido. No que se refere ao comércio das ruas estudadas, a função social engloba as características supracitadas com uma dimensão ainda peculiar relacionada à manutenção de práticas de gestão familiar, a fixação de sociabilidade com o consumidor e ainda a aproximação física da população atendida. Do ponto de vista dessa aproximação, os comerciantes das ruas estudadas relacionaram o local de suas moradias com os motivos de fixação do estabelecimento comercial. Dentre os motivos está a pouca distância física entre o comércio e a sua residência, conforme expressa o gráfico 20. Morar perto do comércio significa, não somente para o comerciante, mas também para o consumidor, uma série de benefícios dentre eles diminuir custos com transporte, evitar trânsito e otimizar tempo durante o deslocamento de casa para o trabalho, quando necessário. 171 O comércio desenvolvido nestas ruas, apresenta uma função social, visto que o contato mais próximo entre comerciante e consumidor repercute em práticas saudáveis de socialização com troca de experiências e até a criação de vínculos de amizade. Outrossim, pode-se mencionar a fidelidade e a confiança estabelecida entre ambos por meio, por exemplo, da venda utilizando a caderneta como instrumento de garantia da relação de compra e venda e, portanto, garantia de pagamento. As características elencadas são típicas do comércio tradicional desenvolvido nas ruas Pompéia, Chegança e Boa Sorte. Trata-se de uma atividade desvencilhada do autosserviço e que se reproduz com base nas ações cotidianas de seus envolvidos. Também é característico do comércio tradicional o estabelecimento do pequeno comércio na própria residência do comerciante. Este fenômeno confere à residência uma dupla função: o lugar da moradia e do desenvolvimento do ofício cotidiano. Com isto as atividades geralmente executadas na rua passam a ser agregadas à residência de forma que se estabeleça uma relação entre a casa, enquanto lugar de descanso, e a rua, enquanto espaço de passagem ou de trabalho. Este cenário que se reproduz de forma ainda mais contundente, em períodos de Gráfico 20 - Lugar de moradia do comerciante - Pompéia, Chegança e Boa Sorte - 2016 Fonte: Elaboração da autora, 2016. 172 crise quando se torna pertinente à imposição do pensamento acerca da realidade contida da relação casa/rua. A este respeito Damatta (1997), ao discorrer sobre a vida em sociedade e o sentido da casa e do trabalho para a sociedade brasileira, explica melhor a relação casa/rua. O autor compreende que, quando a casa se transforma para receber a atividade comercial, isto significa que os donos são os próprios patrões do estabelecimento e seus filhos, seus funcionários e que, nestes casos, está cada vez mais difícil dissociar categoricamente casa e rua. Para o autor, não existe oposição entre ambas, visto que a rua pode servir de moradia em alguns casos, enquanto, em outros, a vida na rua é levada para o convíviodo lar, como é o caso da atividade comercial. Desta forma, casa e rua tem uma dinâmica “na dramaticidade dos espaços brasileiros, rua e casa se reproduzem mutuamente” (DAMATTA, 1997, p. 55). Dito isto, outras particularidades que reforçam tendências futuras podem ser discutidas a partir das informações apresentadas no gráfico 20. No que se refere à Rua Boa Sorte, no tocante à justaposição conferida entre estabelecimento comercial e residência, 32% dos comerciantes moram na rua onde o comércio se desenvolve, reafirmando o quão expressivo é o número de lojas que funcionam na própria casa mediante adaptação para agregar o comércio. Isto é comum na rua, em lojas de pequeno porte que são ajustadas para funcionar num cômodo reformado da casa e assim agregar valor à residência, que antes servia apenas para moradia e passou a gerar renda. Essa adaptação apresenta dois aspectos importantes: um diz respeito à proximidade do ambiente de trabalho ao de moradia e o outro refere-se ao valor agregado à rua, enquanto espaço de consonância destas duas funções de forma que, mesmo após o fechamento das lojas no final do turno de trabalho, a rua não perde o seu sentido de reprodução social, ao contrário permanece ativa pela vida que nela se reproduz. No caso da Pompéia, torna-se evidente o grande percentual de comerciantes que mora nos bairros Pajuçara ou Potengi em detrimento do reduzido percentual de residência na própria rua, como já fora observado na segunda seção quando, no momento da descrição do comércio, evidenciou-se a sua expressiva dinâmica comercial em detrimento da moradia. Já no que se refere a Rua Chegança, o percentual de comerciante que mora no Bairro Lagoa Azul está muito próximo daquele que expressa as moradias em outros bairros. Faz-se pertinente o esclarecimento de que, mesmo aqueles comerciantes que responderam morar em 173 outro bairro da cidade, se referem, na grande maioria, a outros bairros da própria Zona Norte. O comércio destas ruas assume importante papel social ao gerar renda para o comerciante que, na grande maioria, mora no entorno da rua e ainda atende a população eminentemente do lugar. Nas três ruas estudadas, a clientela é predominantemente do bairro em que o comércio se localiza, de acordo com o expresso no gráfico 21, mediante questionamento ao comércio acerca do lugar de moradia dos consumidores. O lugar da moradia exerce influência na escolha do lugar de consumo. O caso do gráfico 21 ter apontado predominância de origem da clientela nas próprias ruas citadas, ou mesmo nos bairros de sua localização e em outros bairros da Zona Norte, denota a importância deste comércio para a referida área, uma vez que a intensa atividade desenvolvida nas ruas é um fator de dinamização da economia da Zona Norte no tocante à geração de renda e aumento no potencial de consumo da população beneficiada. O comércio da Pompéia, Chegança e Boa Sorte torna-se atrativo fisicamente e socialmente para o consumidor porque oportuniza a realização de compras Gráfico 21 - Origem da Clientela – Pompéia, Chegança e Boa Sorte/2016 Fonte: Elaboração da autora, 2016. 174 próximo da residência, anulando a necessidade de enfrentar transtornos urbanos, como deslocamento para outras áreas da cidade, e também pela oferta de mercadorias acessíveis economicamente que suprem à necessidade de consumo local. Portanto, os consumidores das ruas estudadas apontam a proximidade como fator de extrema importância na hora de escolher onde realizar suas compras. Conforme observado no gráfico 22, a maioria dos entrevistados foi categórica em responder que a escolha das ruas Pompéia, Chegança e Boa Sorte como lugar de consumo se justifica pelo fato destas estarem localizadas próximo de suas residências. Dessa forma, pode-se constatar o quanto é expressiva a influência da proximidade nas escolhas de local de compra pelos consumidores. A escolha por fazer compras nas ruas ainda pode ser explicada por vários motivos, como exemplo o fato do comerciante ser conhecedor do seu público consumidor, não apenas no tocante ao conhecimento dos seus desejos de compra, mas pela interação entre ambos de forma a compartilharem experiências cotidianas. Dito isto, compreende-se que, no desenrolar das práticas espaciais concretizadas Gráfico 22 - Motivo de escolha do consumidor para fazer compras – Pompéia, Chegança e Boa Sorte/2016 Fonte: Elaboração da autora, 2016. 175 nos espaços das ruas Pompéia, Chegança e Boa Sorte, se desenham as ações do dia-a-dia de comerciantes e consumidores. Com base na realidade elucidada, pode-se inferir que o comércio das ruas Pompéia, Chegança e Boa Sorte se configuram como o lugar do consumo guiado pela própria vida cotidiana. Ao falar sobre o estatuto miraculoso do consumo e o mito do cargueiro, Baudrillard (2010) expressa que a força vital que impulsiona o consumo é compartilhada pelas pessoas como um receptáculo de sonhos e realizações e que a cotidianidade significa a dissociação da práxis total numa esfera abstrata e sedutora. Para o autor (2010, p.22) “é o pensamento mágico que governa o consumo, é uma mentalidade sensível ao miraculoso que rege a vida cotidiana, é a mentalidade primitiva, no sentido em que foi definida como baseada na crença na omnipotência dos signos”. A discussão tecida pelo autor favorece a compreensão do consumo exercido nas ruas como resultante das ações cotidianas mediante os desejos e as necessidades que se criam no lugar. Para dar maior nitidez à compreensão do cotidiano, buscou-se em Lefebvre (1991, p.20), a compreensão do conceito e sua relação com as construções sociais. O referido autor entende essa relação como “(...) um momento composto de momentos (necessidades, trabalho, diversão-produtos e obras-passividade e criatividade-meios e finalidade, etc) interação dialética da qual seria impossível não partir para realizar o possível (a totalidade dos possíveis) ”. Para este filósofo, de forma generalizada, o cotidiano compõe-se de repetições, de movimentos mecânicos das horas, dias e anos. É no cotidiano que as pessoas vivem e moram, bem ou mal. “É no cotidiano que elas ganham ou deixam de ganhar suas vidas, num duplo sentido: não sobreviver ou sobreviver, apenas sobreviver ou viver plenamente. É no cotidiano que se tem prazer ou sofre. Aqui e agora” (LEFEBVRE, 1999, p.27). Já o sociólogo alemão Norbert Elias, em seus estudos sobre a vida cotidiana no tocante aos aspectos comportamentais, analisou o cotidiano de um grupo juvenil numa comunidade inglesa e discorreu sobre aspectos das transformações dos costumes da Idade Média e da Moderna. A discussão traçada na corrente pesquisa se aproximou deste sociólogo a partir da apropriação teórica feita por Medeiros (2007) acerca do cotidiano quando faz uma discussão sobre a ideia de relações de poder entre os indivíduos. Essa discussão contempla a categoria de cotidiano 176 levando em consideração que “as ações cotidianas compõem um campo extremamente frutífero para o desenvolvimento das relações sociais e, consequentemente, de estudos sobre a sociedade” (MEDEIROS, 2007, p.177). Porém, ainda é salutar ao trabalho desenvolvido, a compreensão de cotidiano efetuada por Medeiros (2007) a partir do pensamento de Heller (1972) segundo o qual: (...) a vida de todos os dias e de todos os homens em qualquer época histórica que possamos analisar. Segundo a autora, não existe vida humana sem o cotidiano e sem cotidianidade. As atividades do dia a dia promovem a reprodução do indivíduo singular e, por consequência, a reprodução do social. A condição humana, desta forma, depende do cotidiano, porém, não se limita a ele, pois nessa relação estão presentes, sobretudo, a intersubjetividade dossujeitos, os significados do mundo e as instituições que ordenam a experiência do vivido. (Heller, 1972, apud Medeiros, 2007, p.58). Estes referenciais permitem afirmar que o cotidiano no espaço das ruas é fruto de uma prática frequente de relações sociais e comerciais entre comerciante e consumidor, favorecida sobremaneira pela proximidade. A proximidade favorece a criação de um conjunto de relações entre as pessoas que compartilham experiências comerciais no lugar, criando laços profundos de identidade, de solidariedade. Essa proximidade da atividade comercial também é decorrente dos novos padrões de distribuição da atividade comercial, os quais, segundo Salgueiro (1996, p. 124), são marcados pela expansão da atividade nos grandes centros em direção à outras áreas da cidade. Assim sendo, a referida autora assinala que “os pontos fortes do pequeno comércio, em relação às grandes superfícies, são a proximidade com os consumidores e a qualidade do serviço prestado”. Desta forma, o atendimento especial com o consumidor, a modesta organização do estabelecimento com ausência de materiais como mármore, vidro, iluminação planejada, papel de parede e acessível disposição das mercadorias, constituem algumas características marcantes desse comércio que se reproduz cotidianamente na Pompéia, Chegança e Boa Sorte por meio de seus atuantes comerciantes e consumidores. Por este motivo, entende-se que a dimensão social do comércio das ruas Pompéia, Chegança e Boa Sorte se reproduz continuadamente a partir dessa proximidade física que é também social. Nessa mesmo linha de raciocínio, Barreta 177 (2012, p. 14) discute a relação entre o centro das urbes e o comércio de proximidade em Portugal, considerando que “(...) O conceito de comércio de proximidade retrata o comércio que está próximo da sua procura, não só fisicamente, mas também, e principalmente, social, cultural, patrimonial e … comercialmente”. Este conceito foi elaborado com base em outros de similar proposição como é o caso do comércio tradicional que também se caracteriza pela estreita relação entre comerciante e consumidor, atendendo também a demanda de consumo do bairro e de localidades vizinhas. O comércio de proximidade é formado por estabelecimentos que também são formas de animação no seu espaço de atuação porque estão próximos do cliente, não apenas no que concerne a sua localização, mas também estreitam as relações de amizade e vizinhança. A respeito, Diniz (2004) discorre sobre a função social do comércio de proximidade nas bodegas da cidade de Campina Grande/PB. Nas palavras do autor, (2004, p.131-132) o comércio de proximidade não é somente físico: [...]mas também a intimidade existente entre freguês e proprietário ou outro despachante, cria uma relação familiar. O proprietário por sua vez, coloca a disposição desta clientela, além dos produtos comercializados, formas específicas de pagamento das compras do freguês, como o fiado, tipo de crédito baseada na confiança dada ao freguês, para um pagamento posterior, que constitui um instrumento muito comum nas vendas deste tipo de comércio. Mais do que físico, este comércio se refere às relações que se concretizam nos vínculos entre comerciantes e consumidor, em que a efetivação da troca prioriza o encontro, o diálogo, as relações fidedignas não somente comerciais, mas de amizade. Desta forma, o comércio de proximidade (...) remete para a proximidade para com o cliente, traduzida no conhecimento das suas necessidades e desejos, na relação próxima estabelecida entre as partes, extravasando a mera proximidade física. Diante da importância da função social do comércio de proximidade, convém destacar que boa parte dos consumidores e comerciantes das ruas estudadas mora nas proximidades, facilitando o acesso ao comércio existente na rua, fato que certamente contribui para a reafirmação da atividade. Isto porque o comércio próximo às residências facilita a resolução de necessidades básicas como vestuário e alimentação fazendo com que o consumidor e até mesmo o comerciante busque 178 outras áreas da cidade apenas para solucionar eventuais problemas de ordem maior. Corrobora com essa realidade, os meios de locomoção utilizadas pelas pessoas que são, geralmente, a bicicleta, a motocicleta ou mesmo a pé. Perante a realidade em discussão, presume-se que estes dois aspectos basilares no cumprimento da função social do comércio de proximidade são fundamentais na sua composição e continuidade. Nesse sentido, também são elementos constituintes da (re) produção do espaço urbano de Natal, que assim como tantas outras cidades se reproduz por meio das contradições inerentes ao próprio capital. A partir dessas reflexões, presume-se que, as perspectivas futuras de reprodução da atividade comercial nas ruas estudadas, se ancora no fato de que, na sociedade capitalista o consumo ocupou o lugar da cadeia produtiva de modo que as necessidades passaram a ser mercantilizadas. Lipovetsky (2007), ao discutir o consumo na contemporaneidade, elucida que a vida com suas necessidades básicas cedeu lugar à busca da realização pessoal plena, ao hedonismo, digitais da sociedade do hiperconsumo como denominou Lipovetsky (2007). Neste contexto, a cidade se tornou o espaço de reprodução da exaltação dos fenômenos em que o consumidor continua guiado pelo mundo imagético propagado pela avassaladora publicidade divulgada nos veículos de comunicação de modo geral. Para o autor a nova economia-mundo não se define apenas pela lógica financeira, mas também pelo potencial de consumo gerador, isto é “economia do comprador”, Lipovetsky (2007). Desprovido de seu consciente poder de compra e pela crescente insatisfação pessoal e profissional, o consumidor busca sempre saciar as suas necessidades de consumo material incrementadas também pelo desejo de consumir experiências emocionais afim de experimentar o ápice da felicidade, de modo que a realização do prazer se torna cada vez mais objeto da mercantilização geradora do que o autor chama de felicidade paradoxal. E assim, no contexto das contradições produzidas no cotidiano, referendado pela magia do prazer no ato do consumo, as ruas Pompéia, Chegança e Boa Sorte, ao se reproduzirem, reafirmam a produção do espaço urbano de Natal ainda que, na sua essência, se faça presente a “felicidade paradoxal”. 179 À GUISA DE CONCLUSÃO O texto ora finalizado embasou reflexões importantes sobre a cidade e o comércio enquanto tributários de uma relação indissociável, e, portanto, imprescindível para a elaboração de qualquer análise geográfica que pretenda discutir o tema comércio. Essa indissociabilidade se manifesta, não só na sua relação de origem, mas também nos desdobramentos do processo de produção do espaço de tal modo, encaminha-se algumas ideias que não colocam um ponto final na discussão feita ao longo dessa dissertação, mas aponta para questões importantes a serem consideradas, ao mesmo tempo que demarca possibilidades de pesquisas futuras. Reporta-se à indissociabilidade do binômio cidade-comércio, que se expressa empiricizado na cidade do Natal já em períodos pretéritos, desde à Segunda Guerra Mundial, quando a chegada de militares americanos e o grande contingente populacional vindo do inteiro do estado faz a cidade crescer. Esse crescimento faz emergir novas necessidades de consumo, até a expansão da cidade em direção à Zona Norte, situação que conduziu ao crescimento da atividade de comércio. Desta forma, pode-se empreender que o comércio cresceu e se desenvolveu seguindo o percurso de expansão da cidade. Em conformidade com o procedimento teórico metodológico do método regressivo-progressivo adotado, a descrição acerca da atividade comercial em Natal por Zona Administrativa, especialmente no tocante ao comércio das ruas Pompéia, Chegançae Boa Sorte (segunda seção), suscitou compreensões ratificadoras da relação cidade e comércio. Percebeu-que que a atividade comercial e de serviços em Natal apresenta-se substancialmente correlacionada com a produção do espaço na cidade, por Zona Administrativa. A Zona Leste detém a referência de comércio tradicional popular da cidade, por nela se encontrar localizada os bairros Alecrim, Cidade Alta e Ribeira, núcleo de ocupação inicial da cidade. Ainda se referindo à Zona Leste, existem lojas de marcas reconhecidas no Bairro de Petrópolis. Este, juntamente com Tirol, concentram a maioria dos serviços de saúde ofertados pela cidade. A Zona Oeste tem um comércio pouco expressivo quanto à equipamentos de grande porte, dispondo de pequenos estabelecimentos do varejo e do atacado. Todavia, esta porção dispõe de serviços de transporte importantes em escala 180 urbana e interurbana como é o caso da rodoviária, do DETRAN e algumas empresas de ônibus. A Zona Oeste também dispõe de serviços como o Hospital de doenças infectocontagiosas Giselda Trigueiro e alguns hospitais de oncologia de Natal. A Zona Sul é referência em termos de varejo moderno, sendo a precursora do surgimento e expansão deste segmento para o restante da cidade. Também ressalta-se sua importância no que se refere à concentração de grandes centros comerciais como shopping centers, hipermercados e supermercados. A Zona Sul possui o metro quadrado mais caro da cidade em função, não apenas da sua majoritária ocupação por conjuntos habitacionais de alto padrão, mas também do seu comércio e de serviços importantes como a Universidade Federal do Rio Grande do Norte, que atrai cada vez mais pessoas e serviços para esta porção da cidade. Já na Zona Norte, referência espacial da pesquisa, existem duas lógicas de ocupação do solo urbano bem definidas: conjuntos habitacionais e loteamentos. No contexto dessas duas lógicas, sobressaem dois tipos de comércio marcantes: o comércio moderno e o comércio tradicional. O primeiro está localizado principalmente nos principais eixos articuladores da cidade e o segundo tem maior expressividade em corredores secundários, como é o caso das ruas Pompéia, Chegança e Boa Sorte. Nestas ruas desenvolve-se um comércio resultado da reprodução da vida que nelas surgiu. Ao se debruçar sobre os fatores de surgimento das ruas estudadas e o comércio nelas existente, a terceira seção resgatou a história do lugar contida na memória dos primeiros moradores, consumidores ou comerciantes. Através da investigação empreendida com a análise de conteúdo ficou claro que o surgimento das ruas esteve intrinsecamente relacionado a ocupação via conjuntos habitacionais e também loteamentos com a finalidade de amenizar a carência por moradia na cidade do Natal. No entanto, em virtude da pouca conexão da Zona Norte com o restante da cidade e pela própria condição socioeconômica dos moradores, fez-se necessário o surgimento de alguns estabelecimentos comerciais para a satisfação de suas necessidades. No curso desse processo, os estabelecimentos foram mudando a paisagem destas ruas, tornando-as eminentemente comerciais. Desde a sua origem até os dias de hoje, o comércio nas ruas citadas tem se conformado numa prática de iniciativa local e espontânea. A maioria da população beneficiada é a dos bairros onde se localizam os estabelecimentos ou próximos, denotando a função social desta atividade no âmbito da Zona Norte. Além de 181 atender à demanda de consumo predominantemente local, o comércio da Pompéia, Chegança e Boa Sorte ainda se constituiu nua fonte de renda não só para comerciantes, mas também para pessoas que atuam na atividade, mesmo sabendo que esta é de base familiar. Sendo então um comércio familiar, tradicional e com caráter de proximidade, esta atividade assume uma função social importante no contexto de sua localização. Isto ocorre em virtude deste comércio atender às demandas dos consumidores, mas também pelo significado na construção da sociabilidade e vivências no lugar. A pesquisa mostrou que o comércio destas ruas apresenta tendências de crescimento, mesmo diante do cenário econômico que o Rio Grande do Norte, junto com o restante do país vivenciam. A expansão deste comércio é, na realidade, uma resposta ao aumento populacional apresentado pela Zona Norte, denotando desta forma, que a cidade e comércio estão intimamente relacionados. À busca pelas mercadorias ofertadas nestas ruas anuncia um cenário crescente em virtude, não somente do perfil popular, mas também porque trata-se de um comércio que atende a uma dimensão que regula a própria reprodução da vida: a aparência; o parecer, o imitar na contemporaneidade que significa, não apenas uma expressão do consumo pelo consumo, mas também a mercantilização das necessidades, mesmo que estas, no contexto da sociedade do hiperconsumo, se configurem além do mundo material. Que estas últimas linhas não signifiquem o encerramento desta pesquisa, posto que a ciência jamais se encontrará pronta e acabada. Que o termo “ À guisa de conclusão” se resuma apenas a uma exigência acadêmica e que esta investigação, portanto, possa ter continuidade nas mãos de outras mentes inquietas interessadas no objeto de estudo proposto. Que assim como as questões suscitadas durante a pesquisa, outras mais possam se desdobrar até que novos trabalhos possam ser gerados. Que este produto acadêmico sirva de intermediário para outros questionamentos e que, assim como a pesquisa sempre se renova, que novos leitores do espaço geográfico e de outras ciências possam colaborar com esta. 182 REFERÊNCIAS ABRASCE (São Paulo). Desempenho da indústria de Shopping Centers no Brasil. 2016. Disponível em: <http://abrasce.com.br/monitoramento/desempenho-da-industria>. Acesso em: 4 jan. 2017. ARAÚJO, Josélia Carvalho de. "Outra leitura" do outro lado: o espaço da Zona Norte em questão. 2004. 267 f. Dissertação (Mestrado) - Curso de Geografia, Universidade Federal do Rio Grande do Norte, Natal, 2004. Cap. 3. Disponível em: <ftp://ftp.ufrn.br/pub/biblioteca/ext/bdtd/JoseliaCA.pdf>. Acesso em: 4 fev. 2016. BANCO CENTRAL DO BRASIL. Relatório Anual. Brasília (DF): BCB, 2010. BARDIN, Laurence. Análise de conteúdo. São Paulo: Edições 70, 2011, 229 BARRETA, João. Fazer acontecer a regeneração urbana: comércio de proximidade. Confederação empresarial de Portugal, 2012. 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Acesso em: 23 maio 2016. 190 APÊNDICE A - FORMULÁRIO APLICADO AO COMERCIANTE UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO GRANDE DO NORTE - UFRN CENTRO DE CIÊNCIAS HUMANAS LETRAS E ARTES - CCHLA PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO E PESQUISA EM GEOGRAFIA – PPGe FORMULÁRIO APLICADO AO COMERCIANTE PERFIL SÓCIOECONÔMICO Nº Questão Alternativas1 Idade _____ 2 Gênero 1 – Masculino 2 – Feminino 3 Estado civil 1 – Solteiro (a) 2 – Casado (a) 3 – Divorciado (a) 4 – Desquitado (a) 5 – Viúvo (a) 6 – NA 4 Escolaridade 1 – Analfabeto 2 – Fundamental Incompleto 3 – Fundamental Completo 4 - Ensino Médio Incompleto 5 – Ensino Médio Completo 6 – Ensino Superior Incompleto 7 – Ensino Superior Completo 8 – Pós-graduação completa 9 – Pós-graduação incompleta 10 – NA 5 Local de moradia 1 – Na rua onde se localiza o comércio 2 – No bairro onde se localiza o comércio 3 - Em outro bairro, qual? ______________________ _ 4 – NA PERFIL COMERCIANTE 6 Há quanto tempo trabalha no comércio? _____ 7 Por qual motivo o senhor (a) escolheu trabalhar no comércio? 1 – Continuidade ao negócio da família 2 – Para complementar a renda 3 – Aposentado (a) 4 – Estava desempregado (a) 5 – Sempre trabalhou no comércio 6 – Outro __________ 7 – NA 8 Por qual motivo escolheu esta rua para fixar o estabelecimento? 1 – Próximo da residência 2 – Aluguel do estabelecimento acessível 3 – Boa clientela 4 – NS 5 – Outro 9 Há quanto tempo tem o estabelecimento nesta rua? _____ 10 Já mudou o endereço do estabelecimento? 1 – Sim 2 – Não ( ) 3 – NA 10.1 Se sim, onde o seu estabelecimento funcionava anteriormente? _____ 1 – NA 11 O imóvel é: 1 – Próprio 2 – Alugado 3 – Cedido 4 – Arrendado 5 – NA 12 Utiliza algum mecanismo de publicidade? 1 - Sim 2 - Não 3 – NA 12.1 Se sim, qual? 1 – Internet 2 – Carro de Som 3 – Encarte 4 – NA 5 – Outro _______________ 191 13 De onde vem a mercadoria? 1 – Natal 2 – Outra Cidade do RN 3 – Outros Estados 5 – Outro País 6 – Outro _______________ 7 – NA 14 Qual a forma de pagamento mais utilizada para a aquisição da mercadoria? 1 – Dinheiro 2 – Cartão 3 – Cheque 4 – Boleto 5 – Nota Promissória 6 – Outro_____ 7 – NA 15 Quantos funcionários trabalham no estabelecimento? _____ 15.1 Quantos são da família? _____ 15.2 O membro da família recebe remuneração? 1 – Sim 2 – Não 3 – NA 16 Existe algum fator que desfavorece o comércio nesta rua? 1 – Insegurança 2 – Falta de iluminação 3 – Falta de estacionamento 4 – Falta de manutenção das ruas 5 – Outro_________________ 6 – NS 7 – NA 17 De modo geral de onde vem sua clientela? 1 – Da rua onde se localiza o comércio 2 – Do bairro onde se localiza o comércio 3 –De outro bairro da Zona Norte 4 – De outras áreas da cidade 5 – De outra cidade 18 De modo geral como o senhor define a sua clientela? 1 – Fiel 2 – Ocasional 3 – NS 4 – NA 19 Qual a frequência de acesso dos clientes ao estabelecimento? 1 – Diariamente 2 – Semanalmente 3 – Quinzenalmente 4 – Mensalmente 5 – Semestralmente 6 – NS 7 – NA 20 Quais as formas de pagamento oferecidas pelo estabelecimento? 1 – Dinheiro 2 – Cartão 3 – Cheque 4 – Boleto 5 – Nota Promissória 6 – Caderneta 7 – Vale alimentação 8 – Outro, qual? ______________________ _____ 9 – NS 10 – NA 21 Quais as formas de pagamento mais utilizadas pelos clientes? 1 – Dinheiro 2 – Cartão 3 – Cheque 4 – Boleto 5 – Nota Promissória 6 – Caderneta 7 – Vale alimentação 8 – Outro, qual? ___________ 9 – NS 10 – NA 22 Renda 1 – _____ 2 – NA( ) 23 Numa escala de 0 a 10, qual a nota que o (a) senhor (a) atribui ao crescimento do comércio nesta rua? ______ 192 APÊNDICE B - FORMULÁRIO APLICADO AO CONSUMIDOR UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO GRANDE DO NORTE - UFRN CENTRO DE CIÊNCIAS HUMANAS LETRAS E ARTES - CCHLA PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO E PESQUISA EM GEOGRAFIA – PPGe FORMULÁRIO APLICADO AO CONSUMIDOR PERFIL SÓCIOECONÔMICO Nº Questão Alternativas 1 Idade _____ 2 Gênero 1 – Masculino 2 – Feminino 3 Estado civil 1 – Solteiro (a) 2 – Casado (a) 3 – Divorciado (a) 4 – Desquitado (a) 5 – Viúvo (a) 6 – NA 4 Escolaridade 1 – Analfabeto 2 – Fundamental Incompleto 3 – Fundamental Completo 4 – Ensino Médio Incompleto 5 – Ensino Médio Completo 6 – Ensino Superior Incompleto 7 – Ensino Superior Completo 8 – Pós-graduação completa 9 – Pós-graduação incompleta 10 – NA 5 Local de moradia 1 – Na rua em questão 2 – No bairro onde se localiza a rua 3 - Em outro bairro, qual? ______________________ _____________ 4 – NA 6 Há quanto tempo nesse local? _____ PERFIL CONSUMIDOR 7 Há quanto faz compras nesta rua? _____ 8 Por qual motivo escolheu esta rua para fazer compras? 1 – Próximo da residência 2 – Valor da mercadoria 3 – Atendimento 4 – Relações familiares 5 – Forma de pagamento 6 – Outro __________ 7 – NS 9 O valor da mercadoria é: 1 – Alto 2 – Regular 3 – Baixo 10 A qualidade da mercadoria é: 1 – Excelente 2 – Boa 3 – Regular 4 – Ruim 11 Como o (a) senhor (a) avalia o atendimento? 1 – Excelente 2 – Boa 3 – Regular 4 – Ruim 5 – Péssima 6 – NA 12 Com que frequência o (a) senhor (a) faz compras nesta rua? 1 – Diariamente 2 – Semanalmente 3 – Quinzenalmente 4 – Mensalmente 5 – Semestralmente 6 – NS 7 – NA 13 O (a) senhor (a) faz compras pela internet? 1 – Sim 2 – Não 193 13.1 Se sim, qual? 1 – Eletroeletrônico 2 – Eletrodoméstico 3 – Vestuário e acessórios 4 – Alimentação 5 – Outro _______________ 6 – NA 14 O (a) senhor (a) frequenta o comércio do Alecrim, Cidade Alta ou Ribeira 1 – Sim 2 – Não 3 – NA 14.1 Com que frequência o (a) senhor (a) vai ao comércio do Alecrim, Cidade Alta ou Ribeira? 1 – Diariamente 2 – Semanalmente 3 – Quinzenalmente 4 – Mensalmente 5 – Semestralmente 6 – NS 7 – NA 194 APÊNDICE C – ROTEIRO DA ENTREVISTA REALIZADA COM COMERCIANTE E CONSUMIDOR UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO GRANDE DO NORTE - UFRN CENTRO DE CIÊNCIAS HUMANAS LETRAS E ARTES - CCHLA PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO E PESQUISA EM GEOGRAFIA – PPGe QUESTÕES 1. Quando e como a rua foi criada? 2. Qual a origem do nome da rua? 3. A rua pertence a conjunto habitacional ou loteamento? 4. Qual o lugar de origem da população que ocupou inicialmente a rua? 5. Quando começaram a surgir os primeiros estabelecimentos comerciais? O que contribuiu para o surgimento do comércio nesta rua? 6. Na sua opinião por que o comércio começou a surgir nesta rua? 7. A atividade comercial contribuiu para que as pessoas deixassem de morar nesta rua? Se sim, para onde eles foram? Se não onde eles estão? 8. A rua é atendida por transporte público? Desde quando? Se não, depois que o ônibus começou a passar o senhor (a) percebeu alguma mudança no comércio da rua? 9. Local de moradia? 10. Desde quando o senhor (a) possui o estabelecimento e/ou residência nesta rua? 11. O senhor poderia citar algum problema no comércio? 12. Numa escala de 0 a 10, qual a nota que o (a) senhor (a) atribui ao crescimento do comércio nesta rua? 195 APÊNDICE D - PERFIL DO COMERCIANTE DA RUA POMPÉIA COM BASE DOS FORMULÁRIOS APLICADOS/2016 UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO GRANDE DO NORTE - UFRN CENTRO DE CIÊNCIAS HUMANAS LETRAS E ARTES - CCHLA PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO E PESQUISA EM GEOGRAFIA – PPGe PERFIL DO COMERCIANTE DA RUA POMPÉIA COM BASE DOS FORMULÁRIOS APLICADOS/2016 COMERCIANTE IDADE GÊNERO ESTADO CIVIL TEMPO DE TRABALHO NO COMÉRCIO DA POMPÉIA 1 47 Anos Masculino Casado 30 Anos 2 32 Anos Feminino Solteira 3 Anos 4 51 Anos Masculino Casada 4 Meses 5 45 Anos Feminino Casada 10 Anos 6 35 Anos Masculino Casado 3 Anos 7 28 Anos Feminino Solteira 4 Meses 8 49 Anos Feminino Casada 8 Anos 9 35 Anos Feminino Solteira 6Anos 10 46 Anos Feminino Casada 13 Anos 11 28 Anos Masculino Solteiro 3 Meses 12 50 Anos Feminino Viúva 20 Anos 13 29 Anos Masculino Casado 2 Anos 14 36 Anos Feminino Casada 15 Anos 15 38 Anos Masculino Casado 6 Anos 16 46 Anos Masculino Casado 10 Anos 17 40 Anos Feminino Casada 8 Anos 196 APÊNDICE E - PERFIL DO COMERCIANTE DA RUA CHEGANÇA COM BASE DOS FORMULÁRIOS APLICADOS/2016 UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO GRANDE DO NORTE - UFRN CENTRO DE CIÊNCIAS HUMANAS LETRAS E ARTES - CCHLA PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO E PESQUISA EM GEOGRAFIA – PPGe PERFIL DO COMERCIANTE DA RUA CHEGANÇA COM BASE DOS FORMULÁRIOS APLICADOS/2016 COMERCIANTE IDADE GÊNERO ESTADO CIVIL TEMPO DE TRABALHO NO COMÉRCIO DA POMPÉIA 1 57 Anos Masculino Casado 26 Anos 2 42 Anos Masculino Casado 10 Anos 4 48 Anos Feminino Desquitada 23 Anos 5 26 Anos Masculino Solteiro 6 Anos 6 40 Anos Feminino Casada 15 Anos 7 55 Anos Masculino Casado 20 Anos 8 33 Anos Masculino Casado 20 Anos 9 40 Anos Masculino Casado 15 Anos 10 35 Anos Feminino Casada 10 Anos 11 51 Anos Feminino Desquitada 8 Anos 12 20 Anos Masculino Solteiro 1 Semana 13 39 Anos Masculino Casado 8 Anos 14 33 Anos Feminino Casada 10 Anos 15 47 Anos Feminino Casado 6 Anos 16 46 Anos Feminino Casada 10 Anos 17 35 Anos Masculino Solteiro 6 anos 18 20 Anos Masculino Solteiro 1 Mês 19 49 Anos Feminino Casada 20 Anos 20 24 Anos Masculino Solteiro 2 Anos 21 37 Anos Feminino Solteira 1 Ano 22 36 Anos Feminino Casada 8 Anos 23 49 Anos Masculino Casado 10 Anos 24 25 Anos Masculino Solteiro 2 Meses 25 34 Anos Masculino Divorciado 7 Anos 26 21 Anos Masculino Casado 1 Ano 27 23 Anos Feminino Solteira 2 Meses 28 47 Anos Feminino Casada 8 Anos 29 34 Anos Feminino Solteira 6 Anos 30 44 Anos Feminino Casada 5 Anos 31 18 Anos Masculino Solteiro 2 Semanas 32 37 Anos Feminino Casada 5 Anos 33 59 Anos Masculino Viúvo 25 Anos 34 38 Anos Feminino Desquitada 2 Anos 35 32 Anos Masculino Casado 2 Anos 36 25 Anos Feminino Casada 8 Anos 37 22 Anos Feminino Solteira 1 Ano 38 23 Anos Feminino Solteira 3 Anos 39 40 Anos Feminino Casada 10 Anos 40 25 Anos Feminino Casada 3 Anos 197 APÊNDICE F - PERFIL DO COMERCIANTE DA RUA BOA SORTE COM BASE DOS FORMULÁRIOS APLICADOS/2016 UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO GRANDE DO NORTE - UFRN CENTRO DE CIÊNCIAS HUMANAS LETRAS E ARTES - CCHLA PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO E PESQUISA EM GEOGRAFIA – PPGe PERFIL DO COMERCIANTE DA RUA BOA SORTE COM BASE DOS FORMULÁRIOS APLICADOS/2016 COMERCIANTE IDADE GÊNERO ESTADO CIVIL TEMPO DE TRABALHO NO COMÉRCIO DA POMPÉIA 1 50 Anos Feminino Casada 4 Anos 2 30 Anos Masculino Casado 10 Anos 4 34 Anos Feminino Casada 6 Anos 5 35 Anos Masculino Casado 21 Anos 6 43 Anos Masculino Casado 2 Anos 7 40 Anos Feminino Casada 2 Anos 8 47 Anos Feminino Casada 4 Anos 9 46 Anos Feminino Divorciada 30 Anos 10 36 Anos Masculino Solteiro 4 nos 11 54 Anos Feminino Casada 8 Meses 12 37 Anos Feminino Solteira 6 Anos 13 24 Anos Feminino Casada 7 Anos 14 30 Anos Feminino Desquitada 5 Anos 15 35 Anos Feminino Casada 20 Anos 16 30 Anos Feminino Solteira 15 Anos 17 35 Anos Masculino Solteiro 3 Anos 18 30 Anos Feminino Casada 2 Anos 19 55 Anos Masculino Casado 20 Anos 20 40 Anos Masculino Solteiro 2 Meses 198 APÊNDICE G - PERFIL DO CONSUMIDOR DAS RUAS POMPÉIA, CHEGANÇA E BOA SORTE COM BASE DOS FORMULÁRIOS APLICADOS/2016 UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO GRANDE DO NORTE - UFRN CENTRO DE CIÊNCIAS HUMANAS LETRAS E ARTES - CCHLA PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO E PESQUISA EM GEOGRAFIA – PPGe PERFIL DO CONSUMIDOR DA RUA POMPÉIA COM BASE DOS FORMULÁRIOS APLICADOS/2016 COMERCIANTE IDADE GÊNERO ESTADO CIVIL TEMPO CONSUMO NO COMÉRCIO DA POMPÉIA 1 26 Anos Feminino Solteira 10 Anos 2 38 Anos Masculino Casado 8 Anos 3 18 Anos Feminino Casada 2 Anos 4 52 Anos Masculino Casado 10 Anos 5 29 Anos Masculino Casado 15 Anos 6 41 Anos Masculino Casado 8 Anos 7 35 Anos Feminino Casada 15 Anos PERFIL DO CONSUMIDOR DA RUA CHEGANÇA COM BASE DOS FORMULÁRIOS APLICADOS/2016 COMERCIANTE IDADE GÊNERO ESTADO CIVIL TEMPO CONSUMO NO COMÉRCIO DA POMPÉIA 1 54 Anos Feminino Casada 10 Anos 2 32 Anos Masculino Solteiro 10 Anos 3 42 Anos Feminino Casada 12 Anos 4 36 Anos Masculino Casado 3 Anos 5 26 Anos Feminino Casada 10 Anos 6 49 Anos Masculino Casado 4 Anos 7 28 Anos Masculino Solteiro 3 Anos PERFIL DO CONSUMIDOR DA RUA BOA SORTE COM BASE DOS FORMULÁRIOS APLICADOS/2016 COMERCIANTE IDADE GÊNERO ESTADO CIVIL TEMPO CONSUMO NO COMÉRCIO DA POMPÉIA 1 41 Anos Masculino Casado 5Anos 2 56 Anos Masculino Divorciado 30 Anos 3 45 Anos Masculino Casado 25 Anos 4 30 Anos Feminino Casada 16 Anos 5 21 Anos Masculino Solteiro 3 Anos 6 42 Anos Masculino Casado 3 Anos 7 25 Anos Masculino Solteiro 3 Anos 199 APÊNDICE H - PERFIL DOS COMERCIANTES E/OU CONSUMIDORES DAS RUAS POMPÉIA, CHEGANÇA E BOA SORTE COM BASE NAS ENTREVISTAS REALIZADAS/2016 UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO GRANDE DO NORTE - UFRN CENTRO DE CIÊNCIAS HUMANAS LETRAS E ARTES - CCHLA PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO E PESQUISA EM GEOGRAFIA – PP PERFIL DO COMERCINATE E/OU CONSUMIDOR DA RUA POMPÉIA COM BASE NAS ENTREVISTAS REALIZADAS/2016 ENTREVISTADOS IDADE GÊNERO ESTADO CIVIL TEMPO DE MORADIA NA RUA Comerciante 1 64 Anos Masculino Casado 34 Anos Funcionário 1 53 Anos Masculino Casado 31Anos PERFIL DO COMERCINATE E/OU CONSUMIDOR DA RUA CHEGANÇA COM BASE NAS ENTREVISTAS REALIZADAS/2016 ENTREVISTADO IDADE GÊNERO ESTADO CIVIL TEMPO DE MORADIA NA RUA Morador 1 Anos Masculino Casada Anos PERFIL DO COMERCINATE E/OU CONSUMIDOR DA RUA BOA SORTE COM BASE NAS ENTREVISTAS REALIZADAS/2016 ENTREVISTADO IDADE GÊNERO ESTADO CIVIL TEMPO DE MORADIA NA RUA Comerciante 1 45 Anos Feminino Casada 24 Anos