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2008 - Rosa Virgínia Mattos e Silva - Caminhos da Linguística Histórica - ouvir o inaudível

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caminhos da 
linguística 
históRica
Rosa Virgínia Mattos e Silva
ouvir o inaudível
Direitos reservados à
Parábola Editorial
Rua Sussuarana, 216 - Ipiranga
04281-070 São Paulo, SP
pabx: [11] 5061-9262 | 5061-1522 | fax: [11] 5061-8075
home page: www.parabolaeditorial.com.br
e-mail: parabola@parabolaeditorial.com.br
Todos os direitos reservados. Nenhuma parte desta obra pode ser reproduzida ou 
transmitida por qualquer forma e/ou quaisquer meios (eletrônico ou mecânico, 
incluindo fotocópia e gravação) ou arquivada em qualquer sistema ou banco de 
dados sem permissão por escrito da Parábola Editorial Ltda.
ISBN: 978-85-88456-88-4
© da edição brasileira: Parábola Editorial, São Paulo, outubro de 2008
Editor: Marcos Marcionilo
Capa E projEto gráfiCo: Andréia Custódio
ConsElho Editorial: 	Ana Maria Stahl Zilles [Unisinos]
 Carlos Alberto Faraco [UFPR]
 Egon de Oliveira Rangel [PUCSP]
 Gilvan Müller de Oliveira [UFSC, Ipol]
 Henrique Monteagudo [Univ. de Santiago de Compostela]
 Kanavillil Rajagopalan [Unicamp]
 Marcos Bagno [UnB]
 Maria Marta Pereira Scherre [UFRJ, UnB]
 Rachel Gazolla de Andrade [PUC-SP]
 Salma Tannus Muchail [PUC-SP]
 Stella Maris Bortoni-Ricardo [UnB]
CiP-braSil. CataloGaÇÃo Na FoNtE
SiNdiCato NaCioNal doS EditorES dE liVroS, rJ
S583c
Silva, Rosa Virgínia Mattos e
Caminhos da linguística histórica - “ouvir o inaudível” / Rosa Virgínia 
Mattos e Silva. -São Paulo, Parábola Editorial, 2008. 
208 p. (Lingua[gem] ; 30)
Inclui bibliografia
ISBN 978-85-88456-88-4
1. Linguística histórica. 2. Mudança linguística. 3. Filologia. 4. Sociolin-
guística. I. Título. II. Série 
08-4415 CDD: 417.7
	 CDU : 81´28
 � 
SumáRio
“OUVIR O INAUDÍVEL” ............................................................. 7
 Introdução ............................................................................... 7
A. De que trata a linguística histórica? ....................................... 8
B. Será possível separar sincronia de diacronia? ........................ 10
C. Qual a diferença entre linguística histórica e linguística 
diacrônica? .............................................................................. 12
D. É possível fazer linguística histórica ou diacrônica sem 
considerar a filologia? ............................................................. 13
E. Qual a relação entre linguística histórica e linguística teórica? 15
parte i
A mUDANçA LINgUÍStICA Em pERSpECtIVA 
INtRALINgUÍStICA E INtRASSIStêmICA ................... 27
1. A teoria neogramática da mudança linguística ..................... 29
2. O estruturalismo diacrônico .................................................. 35
3. O gerativismo diacrônico ....................................................... 43
parte ii
A mUDANçA LINgUÍStICA Em pERSpECtIVA 
SóCIO-hIStóRICA OU ExtRALINgUÍStICA ............... 55
1 precursores .............................................................................. 56
 Antoine Meillet ...................................................................... 56 
Michael Bakhtin ..................................................................... 58 
Otto Jespersen ......................................................................... 60 
Ramón Menéndez Pidal ......................................................... 62
 Émile Benveniste .................................................................... 65
2 A mudança linguística no funcionalismo .............................. 71
 Sobre o sociofuncionalismo ................................................... 91
3 A teoria da variação e mudança laboviana ............................. 95
 A sociolinguística paramétrica: o “casamento” da variação 
intrassistêmica e intersistêmica ............................................. 133
 As tradições discursivas numa perspectiva 
histórico-diacrônica ................................................................ 146
4 Algumas observações conclusivas .......................................... 149
parte iii
A REALIzAçãO DA mUDANçA LINgUÍStICA ................... 157
 preliminar ............................................................................... 157
1 Alguns precursores ................................................................. 158
 J. H. Bredsdorff ....................................................................... 158
 O. Jespersen ............................................................................. 159
 R. Menéndez Pidal .................................................................. 160
 E. Sapir .................................................................................... 161
 É. Benveniste ........................................................................... 164
2 Os neogramáticos ................................................................... 167
3 O estruturalismo diacrônico .................................................. 170
 Eugenio Coseriu ..................................................................... 172
4 Na sociolinguística .................................................................. 175
5 No gerativismo ....................................................................... 180
 R. Lass ..................................................................................... 184
Consideração final ......................................................................... 187
REfERêNCIAS BIBLIOgRáfICAS ............................................ 189
 � 
“ouViR o inauDÍVEL”
Os principais testemunhos para o passado linguístico mais remoto 
são os textos escritos: inscrições, manuscritos, livros impressos (R. Lass 1997: 44).
Introdução
“Ouvir o inaudível” [“hearing the inaudible” (Lass 1997: 
45)] ou “a arte de fazer o melhor uso de maus dados” (Labov 1982: 20) são 
apropriadas metáforas, utilizadas por dois especialistas contemporâneos, 
para definir o tipo de dados de que dispõem os que trabalham no campo da 
linguística histórica. metáforas que também podem, em parte, delimitar o 
que seja o trabalho nesse campo da linguística.
Nesta introdução, desenvolvo conceitos básicos, tanto referentes à lin-
guística histórica, no seu sentido estrito, como a sua relação com a filologia e 
com a linguística teórica. Busco também responder às seguintes questões:
A. De que trata a linguística histórica?
B. Será possível separar sincronia de diacronia?
C. Qual a diferença entre linguística histórica e linguística diacrônica?
D. Será possível fazer linguística histórica e linguística diacrônica sem 
considerar a filologia?
E. Qual a relação entre linguística histórica e linguística teórica?
 � 
Caminhos da linguística histórica
A. De que trata a linguística histórica?
tradicionalmente, define-se a linguística histórica como o campo da 
linguística que trata de interpretar mudanças — fônicas, mórficas, sintáticas 
e semântico-lexicais — ao longo do tempo histórico, em que uma língua ou 
uma família de línguas é utilizada por seus utentes em determinável espaço 
geográfico e em determinável território, não necessariamente contínuo. Con-
tudo, a história de uma língua, como a história dos homens, como diz m. 
foucault, “não é uma duração: é uma multiplicidade de tempos que se emara-
nham e se envolvem uns nos outros” (2000 [1972]: 293). Se assim é, a lineari-
dade temporal das mudanças nas línguas deve ser revista, e a “multiplicidade 
de tempos que se emaranham” deve ser levada na devida conta por aquele que 
faz linguística histórica. Uma regra ou lei do tipo neogramático, em que x (no 
tempo A) > Y (no tempo B), não se sustenta porque, entre A e B, múltiplos 
fatores podem ter tido efeitos inesperados sobre a mudança de x > Y.
tendo mencionado uma regra ou lei do tipo neogramático, direi apenas, 
para retornar à teoria neogramática na parte I deste livro, que ela foi a pri-
meira teoria sobre a mudança linguística. Depois do admirável trabalho dos 
comparativistas da primeira metade do século xIx, na reconstrução genética 
das línguas,sobretudo as indoeuropéias, de que não tratarei neste livro ( cf., 
p. ex., Weedwood, 2002: 103-106; faraco 2005: 139-142, para citar apenas 
autores cujos livros estão em português), os neogramáticos foram, certa-
mente, como diz C. A. faraco, “um divisor de águas” (id.: 139).
Com base em Eugenio Coseriu, no clássico Sincronia, diacronia e his-
tória, que afirma que a “descrição e a história da língua situam-se, ambas, 
no nível histórico da linguagem e constituem juntas a linguística histórica” 
(1979: 236) e ainda fundamentada no também clássico Fundamentos empí-
ricos para uma teoria da mudança linguística (2006/1968), cujos autores 
— U. Weinreich, estudioso do contato linguístico (cf. Languages in Con-
tact), publicado pela mouton em 1953 e reeditado em 1964, m. herzog, 
dialetólogo, autor do atlas linguístico do iídiche na Europa, e W. Labov, então 
discípulo de U. Weinreich —, cheguei a uma formulação do que trata a lin-
guística histórica, ou seja, não se trata apenas das mudanças das línguas ao 
longo do seu tempo de uso. É algo mais.
De meu ponto de vista, já exposto em artigo de 1988, que não foi con-
testado, considero que se podem admitir duas grandes vertentes na linguís-
 � 
Ouvir o inaudível
tica histórica, que designei, e mantenho, de linguística histórica lato sensu e 
linguística histórica stricto sensu.
A linguística histórica lato sensu trabalha com dados datados e loca-
lizados, como ocorre em qualquer trabalho de linguística baseado em cor-
pora, que, necessariamente são datados e localizados, tal como os estudos 
descritivos, sobretudo do estruturalismo americano, que teve seguidores 
no Brasil, inclusive eu mesma no livro de 1989, Estruturas trecentistas. 
Nesse livro, descrevi os dados de um longo texto do século xIV, Os quatro 
livros dos Diálogos de São Gregório; os estudos dialetológicos, tanto atlas 
linguísticos, como monografias sobre dialetos regionais; os estudos socio-
linguísticos, como os da sociolinguística variacionista, que refina o méto-
do de quantificação por meio de programas informatizados, que permitem 
cruzar variáveis intra e extralinguísticas e estabelecem os pesos relativos 
dessas variáveis; os estudos etnolinguísticos, que, utilizando informantes 
adequados aos objetivos, constituem corpora para análise, em geral de 
natureza qualitativa. poderia ainda incluir na linguística histórica lato 
sensu as teorias do texto, do discurso e da conversação, que se baseiam em 
corpora datados e localizados.
Considero a linguística histórica stricto sensu a que se debruça sobre o 
que muda e como muda nas línguas ao longo do tempo em que tais línguas 
são usadas. É essa a tradicional concepção da linguística histórica, que, no seu 
sentido estrito, pode ser trabalhada em duas orientações: 
a) a linguística histórica sócio-histórica e 
b) a linguística diacrônica associal. 
A do tipo a considera fatores extralinguísticos ou sociais, também fato-
res intralinguísticos, como a sócio-história proposta por S. Romaine (1985) 
e as sociolinguísticas, que tratam da mudança linguística, como é o caso da 
teoria laboviana da variação e mudança. Desse tipo de linguística histórica 
tratarei na parte II deste livro. 
A do tipo b considera apenas fatores intralinguísticos, como é o caso 
dos estruturalismos diacrônicos, cujo exemplo maior é o de A. martinet, no 
seu livro de 1955, Économie des changements phonétiques, e do gerativis-
mo diacrônico, que tem como representante maior D. Lightfoot, que, desde 
1979, com o seu livro Principles of Diachronic Syntax, vem reformulando 
 10 
Caminhos da linguística histórica
sua teoria da mudança sintática, de acordo com as modificações do modelo 
gerativista. Desse tipo de linguística histórica tratarei na parte I.
A linguística histórica no sentido estrito depende, diretamente, da filologia, 
uma vez que tem como base de análise inscrições, manuscritos e textos impres-
sos no passado, que, recuperados pelo trabalho filológico, tornam-se os corpora 
indispensáveis às análises das mudanças linguísticas de longa duração.
O que foi exposto até aqui, no que se refere à questão A, pode ser sin-
tetizado no gráfico seguinte:
B. Será possível separar sincronia de diacronia?
Desde que f. de Saussure foi divulgado no célebre Cours de linguisti-
que générale (1916), a dicotomia “sincronia” vs. “diacronia” tornou-se, para 
os estruturalismos que se iniciavam, um dos postulados básicos da linguís-
tica moderna.
Saussure defendia que a langue ou “sistema” seria um complexo sis-
tema de valores puros, ou seja, que os termos que o compunham não se 
Filologia Linguística histórica
A “ciência do tex-
to”, base dos da-
dos da linguística 
histórica.
Stricto sensu Lato sensu
Todo tipo de linguís-
tica que trabalha com 
corpora datados e 
localizados.
Linguística histórica
sócio-histórica
Linguística diacrônica
associal
Considera fatores 
extralinguísticos 
ou sociais
Considera, sobretudo, 
fatores intralinguís-
ticos
 11 
Ouvir o inaudível
definiam por si mesmos, mas por relações recíprocas. Esse sistema homo-
gêneo constituiria um état de langue e seria o objeto de estudo precípuo da 
linguística, da linguistique de la langue. A diacronia, por sua vez, trataria 
das mudanças por que uma língua passa no tempo e essas mudanças ocor-
reriam na parole. Saussure deu prioridade à linguistique de la langue, em 
detrimento da linguistique de la parole. Contudo, Saussure admitiu que a 
análise apenas sincrônica seria uma abstração teórica, idealizada como ob-
jeto de estudo, uma vez que estava consciente do movimento das línguas ao 
longo do tempo. No estruturalismo americano, sobretudo o de orientação 
bloomfieldiana, é que a descrição sincrônica, ou linguística descritiva, evi-
tando argumentos histórico-diacrônicos, domina soberana.
Com a hegemonia dos estudos sincrônico-descritivos, os estudos his-
tórico-diacrônicos passaram a plano secundário. Entretanto, não tardou que 
surgissem os “revisionistas” dos postulados saussurianos. No que concerne 
à dicotomia “sincronia” vs. “diacronia”, destacarei primeiro Coseriu.
Coseriu, um dos grandes linguistas do século xx, no seu livro Sincronia, 
diacronia e história: o problema da mudança linguística, publicado em portu-
guês em 1979, ao admitir que “a descrição e a história da língua… constituem 
juntas a linguística histórica” (1979: 236) e sendo coerente com a distinção 
que desenvolve entre funcionamento, sincrônico, e o constituir-se, diacrônico, 
e que sincronia e diacronia são duas faces do mesmo fenômeno, afirma:
A língua se faz…: é um fazer-se num quadro de permanência e de continuidade… 
mas o fato de se manter parcialmente idêntica a si mesma e o fato de incorporar 
novas tradições é, precisamente, o que assegura sua funcionalidade como língua e 
seu caráter de “objeto histórico”. Um objeto histórico só o é, se é, ao mesmo tem-
po, permanência e sucessão (id.: 237-238).
Com a sociolinguística laboviana ou variacionista, cai por terra a “ho-
mogeneidade” do objeto de estudo saussuriano, quando, já nos Fundamentos 
empíricos para uma teoria da mudança linguística, de 1968, defendem os 
autores a “heterogeneidade” sincrônica. Essa “heterogeneidade ordenada” 
permitiu que a mudança linguística se integrasse a esse modelo teórico, que 
criou o artifício metodológico do “tempo aparente”, dando margem à de-
monstração da mudança numa diacronia sincrônica, com base no estudo da 
variação de falantes de faixas etárias diferentes, conviventes numa mesma 
comunidade de fala, em um mesmo tempo e lugar. pelas frestas da variação 
etária se evidenciava, na sincronia, a diacronia.
 12 
Caminhos da linguística histórica
C. Qual a diferença entre linguística histórica 
e linguística diacrônica?
Costuma-se não distinguir linguística histórica de linguística diacrôni-
ca. Contudo, essa distinção deve ser feita.
fiquei alerta para essa diferença, quando Ian Roberts ministrou um 
curso sobre gerativismo diacrônico e, por ter se interessado pelo que nos-
so grupode pesquisa — programa para a história da Língua portuguesa 
(pROhpOR) fazia, disse que fazíamos linguística histórica e não diacrônica, 
isto é, trabalhávamos com o objetivo de descobrir ou desvelar a constituição 
histórica da língua portuguesa ao longo de seu tempo histórico.
Os gerativistas buscam “explicar” (entre aspas explicar, porque prefiro 
“interpretar”) as mudanças — no caso, sintáticas — que ocorreram sem consi-
derar fatores externos, ou sócio-históricos, interessados apenas nos fatores pró-
prios à grammar do falante, ou seja, em seu processamento computacional.
Essa posição teórica é consequente com a teoria gerativa, que considera 
a linguística como uma “ciência natural” e não “histórica”.
No livro Clause Structure and Language Change (1995), A. Battye e I. 
Roberts são taxativos e bem definem, da teoria de princípios e parâmetros, a 
linguística histórica, contrapondo a tradição e a perspectiva que adotam:
A maioria do trabalho tradicional na linguística histórica e na filologia é trabalho 
sobre a “E-language”… a análise de uma língua como “E-language” é indepen-
dente, em princípio, de qualquer propriedade que possa ser atribuída à mente/
cérebro dos falantes nativos… à gramática concerne fundamentalmente a “I-lan-
guage” (id.: 7).
Depois de relacionarem “questões tradicionais” aos estudos diacrôni-
cos afirmam:
Qualquer resposta que possamos divisar para as questões dadas dependerá desta 
questão: quais são os mecanismos da mudança de parâmetros… Acreditamos que 
o estudo da sintaxe diacrônica, uma vez que nos dá um insight sobre os mecanis-
mos da mudança de parâmetro, pode nos dizer alguma coisa sobre a marcação de 
parâmetros, isto é, sobre a aquisição da linguagem (id.: 6-8).
I. Roberts tinha razão ao afirmar que linguística histórica é o que faze-
mos no pROhpOR, e diacrônica, o que fazem os gerativistas como ele. Volta-
 13 
Ouvir o inaudível
rei à teoria da mudança numa perspectiva intrassistêmica na parte I deste livro 
e também à teoria da mudança no gerativismo diacrônico.
D. É possível fazer linguística histórica ou 
diacrônica sem considerar a filologia?
Ao buscar responder à Questão A, apresentei em um gráfico a relação 
entre a linguística histórica, que no seu sentido estrito deve estar relaciona-
da, mesmo dependente, do trabalho da filologia e, ali, sinteticamente, digo 
que a filologia é a “ciência do texto”, isso na verdade diz muito pouco.
Buscando uma definição para a filologia no âmbito dos estudos filoló-
gicos e linguísticos sobre a língua portuguesa, começo com o mestre Leite 
de Vasconcellos que, nas suas Lições de filologia portuguesa, define com 
amplitude a filologia:
A filologia abrange pois: história da língua (glotologia, glótica, linguística e seus 
ramos) com a estilística e a métrica; história literária. faz-se aplicação prática da 
filologia quando se edita criticamente um texto (1950: 8).
E conclui Leite de Vasconcellos
Nas minhas preleções, entendo de ordinário por filologia portuguesa o estudo de 
nossa língua, em toda a sua amplitude, no tempo e no espaço, e acessoriamente o 
da literatura, olhada sobretudo como documento formal da mesma língua (id.: 9).
filólogos brasileiros como Serafim da Silva Neto, Antenor Nascentes, 
Sousa da Silveira, entre outros, filólogos declaradamente discípulos de Leite 
de Vasconcellos, aceitam essa concepção abrangente para filologia.
Nesse “tempo” muito bem definido por Ivo Castro, também filólogo, 
em estudo em homenagem ao grande filólogo brasileiro Celso Cunha, editor 
dos Cancioneiros de paay gomez Charinho, martin Codax e Joan zorro, 
apropriadamente, diz que era o “tempo”:
em que linguistas também eram etnógrafos, historiadores, folcloristas, arqueólo-
gos e não tinham problema de identidade disciplinar, pois se sabiam participantes 
de uma vasta empresa de aquisição de conhecimentos diversificados, mas harmo-
nizáveis em torno de um interesse comum pela palavra documental ou artística e 
pelo seu comportamento na história. Conhecerem-se todos por filólogos era tradi-
cional e apropriado (1995: 512).
 14 
Caminhos da linguística histórica
Já Joaquim mattoso Câmara Jr., o chamado “pai da linguística” (mo-
derna) no Brasil, contrapõe a linguística à filologia, no seu Dicionário. No 
verbete “Linguística” diz:
trata-se de uma ciência desinteressada, que observa e interpreta os fenômenos lin-
guísticos: a. numa dada língua; b. numa família ou bloco de línguas; c. nas línguas 
em geral, para depreender os princípios fundamentais que regem a organização e 
o funcionamento da linguagem entre os homens. há assim, portanto, a linguística 
especial (portuguesa, francesa etc.); a linguística comparativa (indoeuropéia, camí-
tico-semítica etc.); a linguística geral. Não são termos equivalentes à gramática, 
em qualquer de suas acepções e à filologia, que pressupõe uma língua culta e uma 
escrita (1970 [1956]: 1956; grifos meus).
mattoso Câmara Jr. restringe o campo de trabalho da filologia. Dele 
discordo quando diz que a filologia “pressupõe uma língua literária”. Basta 
referir os textos não-literários (oficiais ou particulares) que já foram edi-
tados, ou estão a ser, no projeto para a história do português Brasileiro, 
coordenado por Ataliba de Castilho, e a edição monumental de L. f. Lindley 
Cintra sobre os Foros de Castelo Rodrigo, de 1959.
A filologia, hoje, parece integrar-se melhor como uma das formas de 
abordar a documentação escrita, tanto literária como documental em sen-
tido amplo, enriquecida pelas vias da crítica textual, tanto de textos antigos 
como modernos. Assim a filologia assume o seu lugar como a “ciência do 
texto”, herança benéfica semeada há quase vinte séculos pelos alexandri-
nos, num retorno que, no dizer do filólogo português I. Castro, não é uma 
restauração, mas renovado retorno, por causa dos dimensionamentos de seu 
objeto, por causa dos avanços da informática (cf. Castro, 1995: 531). E no que 
concerne aos estudos linguísticos, por causa do também renovado retorno 
relativamente aos estudos histórico-diacrônicos.
Qual será então o trabalho do filólogo? Ninguém melhor do que a filóloga 
italiana, no sentido mais amplo possível do termo, Luciana Stegnano picchio, 
para responder a essa interrogação. No seu livro A lição do texto: filologia e 
literatura, diz:
filólogo é quem, utilizando todos os instrumentos dos quais pode dispor, estudan-
do todos os documentos, se esforça por penetrar no epistema [espaços sincrônicos 
ideologicamente unitários] que decidiu estudar, procurar a voz dos textos e de um 
passado que já não considera sufocado pelos estados sobrepostos (1979: 234).
Espero que se veja que não se pode fazer linguística histórica ou diacrô-
nica sem a documentação remanescente do passado. Lembre-se que o gerati-
 1� 
Ouvir o inaudível
vista David Lightfoot no seu Principles of Diachronic Syntax, de 1979, entre 
outros problemas que levanta na introdução de seu livro, ressalta o papel do 
filólogo, editor de textos do passado, sem os quais se torna impossível aplicar 
qualquer teoria sobre a mudança linguística, inclusive a gerativa.
Como no Brasil, a filologia recuou para dar espaço à linguística mo-
derna, aqui aportada na década de 1960, viu-se de repente, ao retornarem os 
estudos histórico-diacrônicos — pela via da sociolinguística, do gerativismo 
e, mais recentemente, pela via dos funcionalismos — que muitos linguistas 
foram em busca da relegada filologia.
No que se refere à metodologia, deve-se ressaltar que não se pode nem 
se deve utilizar qualquer edição de texto do passado para a análise histórico-
diacrônica: a edição tem de ter sido feita com rigor filológico e com o obje-
tivo claro de servir a estudos linguísticos; há edições úteis ao historiador ou 
ao estudioso da literatura ou ao chamado grande público, mas que, contudo, 
não devem ser usadas para estudos de história linguística.
E. Qual a relação entre linguística histórica e 
linguística teórica?
Em obras clássicas sobre a linguística histórica,tais como a Historical 
Linguistics, de theodora Bynon (1990 [1977]); a Historical and Comparati-
ve Linguistics, de Raimo Anttila (1989 [1972]); a Socio-Historical Linguis-
tics, de Suzanne Romaine (1985 [1982]) e a de Raimo Lass, Historical Lin-
guistics and Language Change (1997), não tratam esses autores da relação 
entre linguística histórica e linguística teórica.
Robert martin, em Para entender a linguística (2003 [2002]), organiza 
o seu livro em seis capítulos: no primeiro, trata da linguística descritiva; no 
segundo, da linguística teórica; em seguida, da linguística geral; da filosofia 
da linguagem; da linguística histórica e da linguística aplicada.
Nessa obra, que tem como subtítulo Epistemologia elementar de uma 
disciplina, vou me deter no que diz o autor sobre a linguística teórica, capí-
tulo 2, e sobre a linguística histórica, capítulo 5.
Define martin linguística teórica, logo no primeiro parágrafo do capí-
tulo, dizendo que a “finalidade da linguística não é somente descrever, mas 
 16 
Caminhos da linguística histórica
também explicar: dizer por que os fatos são como são. Que espécie de causa-
lidade a linguística pode alegar?” (id: 51).
É a essa pergunta que ele vai tentar responder. martin descarta a “cau-
salidade” histórica — “por mais esclarecedora que possa ser, se prende a 
uma causalidade fenomenal: um dado fenômeno provém de outro mais an-
tigo” (id.: 52).
À p. 53, ele diz que tentará mostrar que a “explicação não pode escapar 
de uma teoria”, que deve “dar conta do discurso” (id.: 57). E explica que “dar 
conta” significa “predizer”. Conclui que a “função da teoria é, então, uma 
função preditiva, se exerce essencialmente em dois domínios: a combinação 
e a inferência” (id.: ib.).
Continuando, diz ele que a “combinação”
deve predizer as combinações que são aceitáveis e as que não são: um dos grandes 
méritos do linguista americano N. Chomsky foi ter colocado o problema nesses 
termos e tê-los vinculado às exigências do que se chama “formalização” (id.: ib.).
Conclui o item sobre a “combinação”, afirmando que, “no fim das con-
tas, são meras descrições sistematizadas, abertas sobre o possível, mas muito 
fracamente explicativas” (id.: 62)
Quanto à “inferência”, diz que “ocupa um lugar importante na teoria 
semântica” (id.: 62), e mais adiante, a partir de exemplos, afirma o autor que 
é importante a relação inferencial, porque uma das funções da teoria será 
predizê-la corretamente (cf. p. 63). Destaca ainda:
uma exigência essencial: a da generalidade. Uma explicação supõe sempre que nos 
elevemos a um nível superior de abstração. As teorias preditivas podem se situar 
em níveis muito variáveis de generalidade (id.: 67).
Depois de desenvolver os “níveis de generalidade”, conclui o capítulo 2, 
mostrando que, como a linguística apresenta “toda sorte de modelos” (id.: 73),
disso resulta uma formidável variedade teórica, da qual não podemos dar neste 
livro, nem sequer um panorama… o perigo, de todo modo, é que se multipliquem 
“as igrejinhas”: as opções teóricas podem até ser tão exclusivas que os membros 
de uma escola olhem soberbamente os de outra. mas as perspectivas estão mu-
dando… Se é preciso rejeitar os ecletismos e as sínteses, a linguística teórica, por 
outro lado, tem tudo a ganhar se privilegiar,para além das diferenças, os princípios 
unificadores e a investigação de universais metodológicos (id.: 73-74).
 1� 
Ouvir o inaudível
No capítulo 5, martin tratará da linguística histórica. Afirma, de início, 
que “todas as línguas evoluem” e só “permanecem estáticas as línguas mor-
tas” (id.: 135). Considera que a 
linguística, portanto, tem obrigatoriamente uma dimensão histórica. Decerto, é 
possível desinteressar-se da história. A linguística “estruturalista”, americana ou 
européia, considerou que o bom funcionamento das línguas não supunha em nada 
conhecimentos históricos (id.: 135).
Considera martin que há uma “dupla dimensão” na linguística histórica:
toda língua é feita de camadas diversas: é necessário um mínimo de cultura his-
tórica para discerni-las. Explicar uma língua é, ao menos, em parte, compreender 
sua história… eis, portanto, o que justifica a abordagem histórica, mesmo em pura 
sincronia contemporânea. mas fica óbvio que a história da língua encontra em si 
mesma amplas razões para modificar sua prática (id.: 141-142).
Ao tratar da “explicação histórica”, diz que essa “explicação se baseia 
em dois tipos de noções: os universais diacrônicos e as tendências tipológi-
cas” (id.: 147). Não desenvolverei aqui esse tópico, que será focalizado na 
parte III deste livro.
Ao finalizar o capítulo 5, afirma martin que “de fato a história se situa 
fora de toda previsibilidade” (id.: 160). E encerra:
Após um período de relativo apagamento, a linguística diacrônica recupera uma 
vitalidade toda nova: os dados não param de se acumular e os métodos explicativos 
de se fortalecer. Aqui, como em outros campos, o progresso exigiria um esforço 
de unificação. Se é ilusório — e talvez pernicioso — querer unificar os métodos, é 
urgente harmonizar da melhor maneira possível o acesso aos dados; cada vez mais 
documentos são eletronicamente consultáveis; só a unificação relativa de sua bali-
zagem hipertextual permitiria uma exploração verdadeiramente eficaz (id.: 160).
Embora os capítulos 2 e 5 de martin não tenham a intenção de relacio-
nar linguística teórica e linguística histórica, informam, sem dúvida, sobre o 
objeto de estudo dessas duas linguísticas.
Conquanto obras clássicas sobre a linguística histórica não tratem da 
relação entre as duas linguísticas em causa, o livro de Carlos Alberto faraco, 
Linguística histórica (2005), trata da relação entre “linguística descritiva/
teórica x linguística histórica” (2005: 98) e diz:
mais modernamente, em decorrência da forma como se vêm dando os estudos sin-
crônicos, os manuais costumam usar a denominação linguística teórica para os estu-
 1� 
Caminhos da linguística histórica
dos sincrônicos (pelo fato de esses estudos se ocuparem antes com a construção de 
modelos teóricos, dedutivos, dos sistemas linguísticos e não com descrições induti-
vas) em oposição à linguística histórica (id.: 99).
Ao tratar de “concepções de linguagem e orientações teóricas diferen-
tes”, diz faraco:
A formulação e a discussão crítica dos conceitos de sincronia e diacronia revelam 
a questão epistemológica central da linguística histórica, ou seja, a concepção do 
objeto de estudo que cada uma das diferentes orientações tem. Dizemos que essa 
é a questão central porque é ela (a concepção de linguagem) que vai direcionar o 
modo como cada orientação teórica vai entender a mudança, o que, por sua vez, vai 
determinar seus diferentes métodos (id.: 102-3).
E, à p. 105, afirma:
Em razão da diversidade teórica que caracteriza a ciência em cada momento de sua 
história, e em razão dos respectivos conflitos entre as teorias e a teoria e o real, 
o processo acumulativo se dá menos por soma do que por amplas reelaborações 
teóricas, isto é, por retomadas de questões empíricas e procedimentos analíticos 
em novas chaves interpretativas.
Em “Selecionando teorias”, diz faraco:
Ao iniciar-se em linguística histórica… o estudante não tem apenas de dominar 
conceitos e métodos, mas principalmente ter clareza quanto a certas opções ante-
riores a conceitos e métodos que ele deverá fazer (id.: 105).
pergunta-se faraco: “o ecletismo seria uma saída?” E responde:
O ecletismo facilmente gera contradição interna, o que é um defeito capital de 
qualquer elaboração teórica. Ao mesmo tempo, o ecletismo nunca garante uma 
base metodológica consistente e, justamente por isso, acaba por não fornecer as 
bases para uma ação produtiva… Isso não quer dizer que não haja teorias compa-
tíveis, entre si, nem que a opção por uma teoria signifique dogmatismo. A com-
patibilidade de teorias se dá, em geral, quando elas compartilham fundamentos 
filosóficos (id.: 110).
Continua faraco:
Condenar o ecletismonão significa — é importante repetir — que as teorias não se 
entrecruzem… Assim, uma coisa é o ecletismo (um amontoado acrítico, ingênuo, 
de teorias) e outra é a síntese teórica que implica a negação de uma teoria (pela 
crítica a seus fundamentos) e a retomada das questões empíricas e de seus proce-
dimentos analíticos em novo esquema teórico, em nova chave interpretativa. Se o 
ecletismo é condenável, a síntese é, evidentemente, desejável (id.: 111).
 1� 
Ouvir o inaudível
Concordo plenamente com as posições de faraco. Exporei, contudo, 
meu ponto de vista, que não diverge do dele, mas está esteado na prática de 
quase quinze anos do pROhpOR.
No texto com que nos apresentamos, em 1992, ao CNpq, um de nossos 
problemas era exatamente este: que linha teórica seguir? Optamos não pelo 
“ecletismo teórico”, mas por ser “heterodoxos”; não seguir uma linha teórica 
única. Já havia no grupo “estruturalistas”, “variacionistas” e “gerativistas”. 
hoje há também “funcionalistas”, “filólogos”, “lexicólogos/lexicógrafos” e 
alguns que buscam reconstituir a sócio-história do português brasileiro.
A decisão do grupo foi: qualquer trabalho/pesquisa deveria ter uma “base 
descritiva” e, de acordo com a formação e objetivo de cada um e cada trabalho/
pesquisa, a base teórica deveria ter coerência e consistência teórica, qualquer 
que fosse. Estudamos textos clássicos da linguística histórica ou diacrônica 
de A. Kroch, D. Lightfoot, S. Romaine; de funcionalistas (alemães, ingleses, 
americanos e brasileiros), tendo como objetivo a reconstituição do passado da 
língua portuguesa.
S. Romaine, no seu livro de 1985 — Socio-Historical Linguistics —, nos 
deu uma pista fundamental, sobretudo no que se refere a um aspecto meto-
dológico (toda teoria tem o seu método): analogamente às classes sociais dos 
estudos de mudança linguística no “tempo aparente” da teoria laboviana, 
o “tipo” ou “gênero de texto” são variáveis externas ou extralinguísticas 
que devem ser consideradas. A partir daí, as pesquisas do pROhpOR, que 
tratam de mudança no “tempo real de longa duração”, têm buscado levantar 
dados em textos de natureza distinta.
para o período arcaico da língua portuguesa (séc. xIII a meados do séc. 
xVI), não são muitas as opções: textos notariais (particulares e oficiais); tex-
tos historiográficos; textos de literatura religiosa; textos ficcionais (como é 
o caso do Ciclo do graal) e a rica documentação poética do Cancioneiro me-
dieval português, tanto o profano como o sagrado.
No que se refere à história do português brasileiro, a mesma estratégia 
de seleção de textos vem sendo adotada: cartas oficiais e particulares; docu-
mentos oficiais (atas, testamentos/inventários), anúncios de jornais e edi-
toriais (estes últimos, a partir do século xIx), sempre buscando se a “mão” 
 20 
Caminhos da linguística histórica
que escreveu o documento é a de um brasileiro, de um português ou de um 
africano ou afrodescendente. Neste último caso está a pesquisa de Klebson 
Oliveira, com base no Arquivo da Sociedade protetora dos Desvalidos, uma 
irmandade de cor, criada na 2ª década do século xIx por africanos para alfor-
riar escravos. Ele vem pesquisando a relação fala/escrita na documentação 
não-literária oitocentista. É interessante saber que a primeira lei para a or-
tografia em língua portuguesa é do começo do século xx.
Uma questão pendente e candente, não colocada no início desta intro-
dução, é a da relação fala/escrita na documentação do passado. para alguns 
autores, a linguística histórica é a história da língua escrita, mas sem a fala 
não se escreve, pode-se entrever ou entreouvir a voz através dos textos: ta-
refa difícil e apenas aproximativa, “ouvir o inaudível”.
S. Romaine, em seu Socio-Historical Linguistics (1985), trata do tema 
língua falada vs. língua escrita. Sintetizarei alguns pontos do seu texto:
pode-se dizer que língua falada e língua escrita são instâncias de uma mesma 
língua incorporada por meios distintos… A função da escrita não é simplesmente 
gravar a língua falada: o ato de escrever tem uma existência independente (1985: 
14-15).
À p. 17, ela afirma que a linguística tem marginalizado a língua escrita 
e afirma:
A posição que se deve tomar é esta: há métodos de análise linguística que são váli-
dos, se a língua escrita é uma instância da língua, então as mesmas técnicas podem 
ser aplicadas a todas as instâncias. Em outras palavras, a teoria linguística não de-
veria, necessariamente, ser estendida para cobrir todos os casos relevantes; deveria 
aplicar-se àqueles casos da escrita como tem sido feito por toda parte (id.: 17).
Como sociolinguista que é, diz Romaine:
A língua escrita tem sido objeto de estudo, mas meu ponto de vista é que técnicas 
da sociolinguística (ou pelo menos técnicas consideradas especificamente sociolin-
guísticas) não têm sido empregadas e aqueles que se autodenominam de sociolin-
guistas ainda não se engajaram em tais estudos (id.: 20).
Considerando o período arcaico da língua portuguesa, discute-se é possível 
chegar, através da documentação escrita, ao português corrente. há até quem 
defenda que sobre a documentação arcaica só se possam construir gramáticas de 
textos, nunca uma gramática de um estado de língua do passado.
 21 
Ouvir o inaudível
Sendo a documentação escrita que permanece e sendo ela uma repre-
sentação convencional da fala, teremos o reflexo da fala, que permite tirar 
conclusões, até certo ponto seguras, no nível morfofônico, já que, não ha-
vendo uma normatização ortográfica, a análise da variação da escrita oferece 
indícios para alguma percepção da voz, ou seja, da língua no seu uso pri-
meiro, em qualquer dos níveis em que se pode estruturá-la: fônico, mórfico, 
sintático, discursivo. também a ausência de um controle normativo faz com 
que no texto medieval a variação seja constante, fato que também pode ser 
indicador de usos variáveis da fala.
O mesmo se pode dizer da documentação do período colonial brasileiro, 
em que os manuscritos, às vezes de leitura muito difícil, permitem entreou-
vir a voz pelas frestas da variação da escrita. 
para concluir esse tópico, escolhi R. Lass. Sobre a metáfora “ouvir o 
inaudível” diz Lass: “muito do nosso trabalho tem a ver relativamente 
com línguas antigas, de que não dispomos de gravações nem temos acesso 
aos falantes” (1997: 45). A propósito do que a escrita representa, ele opi-
na que “ingenuamente, a escrita representa a língua; mas em que nível e 
com que precisão?” (id.: 47). Conclui o capítulo 2 — “Written Records” 
(1997: 44-103) — com o item, dramaticamente intitulado: “Interpretar vs. 
desaparecer” (id: 96) e diz que fecha o capítulo “tratando de um problema 
intratável” (id.: ib.), porque:
emendar, normalizar e outras formas de editar falsificam e traduzem sob o título 
de tornar acessível, ao tempo em que pretendem ‘representar’ objetos do passado. 
pior ainda, tais processos produzem pseudodados e prejudicam a leitura de monu-
mentos históricos (id.: 102).
Se seguíssemos o pessimismo de R. Lass, não haveria linguística histó-
rica! Nem ele mesmo, que é autor de um volume alentado — 423 páginas 
—, Historical Linguistics and Language Change, publicado em 1997 por 
insistência de J. Ayling, sua amiga, para que publicasse o “bloody book”, 
como se pode ler no prefácio (p. xx).
Se pelas teorias da linguística histórica e com o suporte de teorias lin-
guísticas em geral, se pode chegar à caracterização esquemática de um mo-
mento da história passada de uma língua, são os dados empíricos, fornecidos 
pela documentação remanescente, que confirmarão ou não as teorias e que 
permitem rastrear e em parte reconstruir seu uso vivo. Assim, para chegar, 
 22 
Caminhos da linguística histórica
por exemplo, às possibilidades gramaticais do português arcaico, as teorias e 
os dados deverão estar interligados.
Ainda destaco o que dizem R. Lass e Labov sobre o caráter paradoxal da 
linguística histórica e da mudança linguística.
Diz o primeirona pequena nota que introduz o livro: “A conclusão pa-
radoxal é que nossos métodos historiográficos são frequentemente melhores 
do que os dados com que se tem de trabalhar” (1997: s/n).
também Labov destaca o caráter paradoxal da linguística histórica, que 
define como “paradoxo histórico”:
Sendo o passado diferente do presente, não há como saber quão diferente ele foi … O 
fenômeno que estamos estudando — a mudança linguística — é irracional, violen-
to e imprevisível. Desenvolver princípios de mudança linguística pode parecer um 
empreendimento quixotesco, como muitos estudiosos já concluíram… A linguística 
histórica é marcada pela prevalência de contradições paradoxais que oferecem um 
rico leque de desafios para o especialista que deseje resolvê-los (1994: 21).
para concluir esta introdução buscarei dimensionar ainda algumas 
questões que envolvem a linguística histórica:
por que as línguas mudam? Como as línguas mudam? São essas as per-
guntas primárias e primeiras para as quais a linguística histórica busca res-
posta, desde que se constitui, com rigoroso método, a partir do século passado, 
mas certamente desde antes, como especulação em torno de problemas cru-
ciais para a compreensão do fenômeno da linguagem humana, ou mesmo des-
de muito antes ainda: lembro o mito de Babel, nos confins de nossa história.
Na contemporaneidade, a apreensão do fenômeno se volta, com pre-
dominância, para captá-lo nas sincronias convenientes em determinado 
momento e lugar da história, no tempo aparente da diacronia sincrônica. E 
assim o âmbito da linguística histórica se alarga e se estreita, não se podendo 
hoje deixar de pensar tanto na linguística histórica no seu sentido estrito e 
antigo — a mudança das línguas ao longo do tempo —, como na linguística 
histórica, em um sentido lato e recente, que abarca as manifestações con-
temporâneas de fatos linguísticos não coetâneos.
Daí por que hoje a linguística histórica engloba os estudos de línguas 
integrados no movimento sincrônico das sociedades em que são usadas. In-
clui, portanto, aspectos dominantes da sociolinguística da segunda metade 
 23 
Ouvir o inaudível
deste século, também da dialetologia, nascida já no século passado, como 
desdobramento subsequente e natural do historicismo neogramático domi-
nante na segunda metade do século xIx.
Nessa conjugação da linguística histórica no seu sentido estrito, o 
da mudança no tempo real, com a que trabalha com dados das línguas 
na sua variação e mudança social e espacial sincrônicas, vê-se em cau-
sa o postulado laboviano conhecido como “princípio uniformitário”, o 
de que o conhecimento das realidades in praesentia abre caminho para 
melhor compreensão de fenômenos passados e o conhecimento de rea-
lidades passadas documentadas clareia a compreensão de fenômenos da 
atualidade. posição bem expressa nesta passagem do Building on Empi-
rical Foundations de Labov:
A aliança que Weinreich-Labov-herzog (1968) propunham entre dialetologia, so-
ciolinguística e linguística histórica é orientada para um tipo de teoria que equili-
braria a balança entre explicação histórica e sincrônica, corrigindo o viés a-históri-
co da linguística geral do século xx. (1982: 21).
mais recentemente, vê-se que o processo de constituição das línguas 
começa a entrar como argumento de teorias linguísticas que têm como ob-
jetivo fundamental não o responder ao porquê e ao como as línguas mudam, 
mas como elas se desencadeiam ontogenicamente no indivíduo e como re-
presentar essa possível gramática “natural”. É campo novo de busca em que 
parece se poderão encontrar vertentes antípodas das línguísticas deste sé-
culo, em que as formulações dos sistemas e/ou gramáticas e as formulações 
históricas sobre o construir-se das línguas seriam incompatíveis.
Esse entendimento da posição do estudo da mudança linguística em 
uma teoria da gramática está explicitado em muitos trabalhos de D. Li-
ghtfoot, formulado como na passagem seguinte de The Language Lottery: 
Se olharmos para o ponto em que certas mudanças ocorrem, podemos obter in-
formações sobre os limites de gramáticas possíveis, sobre o momento em que o 
ambiente linguístico muda de tal maneira que desencadeie um diferente tipo de 
gramática (1984: 149).
Com essas novas abordagens que marcam a ciência da linguagem dos 
fins deste século, tem-se um renascimento da linguística histórica, tipo de 
linguística que fez nascer a ciência da linguagem no século passado. 
 24 
Caminhos da linguística histórica
Deve-se notar, contudo, que esse renascer não implica numa revolução 
paradigmática na linguística histórica, muito menos na linguística em geral, 
mas apenas numa reentrada da linguística histórica no cenário das correntes 
linguísticas hegemônicas. Não sou eu, nos limites de minha circunstância, 
que afirmo isso. Concordo entretanto, com h. h. hock que, em seus Princi-
ples of Historical Linguistics, depois de analisar os percursos da linguística 
histórica na atualidade, conclui:
Vale notar que, ao longo desse percurso, não se conduziu a reflexão sobre a lin-
guística histórica e sua prática a uma completa “revolução”, mas antes a modifica-
ções — pela incorporação de conceitos que provaram ser úteis e suficientemente 
importantes para serem adotados, e rejeitando (ou ignorando) outros (1986: VI).
Em 1977, no seu discurso como presidente da Linguistics Society of 
America — Rethinking Linguistics Diachronically (1979: 275) —, J. h. gre-
enberg assume o crescente interesse pela linguística histórica e o aumento 
do papel dos fatores diacrônicos na teoria sincrônica. Afirma que muitos ca-
minhos são indicadores de que começam eles a entrar em vários níveis como 
participantes na estrutura explanatória da ciência da linguagem. Ressalva, 
entretanto, que essa nova face da linguística contemporânea não indica que 
se tenha posto abaixo a dicotomia saussuriana que opôs a abordagem sin-
crônica à diacrônica, mas que mudou a relação entre elas na compreensão do 
fenômeno linguístico, levando as análises sincrônicas a tornarem-se dinâ-
micas. Diga-se, aliás, que isso já vinha sendo proposto pelos estruturalistas 
do Círculo de praga, nos idos de 1920, mas se diluiu no processo de desen-
volvimento dos estruturalismos e posteriormente dos gerativismos que se 
encaminharam para tratar as línguas como fenômenos a-históricos.
Quando a LSA assume essa realidade, de fato estava “oficializando” 
fatos que começaram a surgir na década anterior. Vale destacar que, a partir 
do Simpósio do texas, organizado por W. Lehmann e Y. malkiel, em 1966, 
começaram a suceder-se, em vários pontos, encontros, seminários e congres-
sos sobre a linguística histórica, suas perspectivas, seus avanços e já em 1973 
ocorre o First International Congress of Historical Linguistics.
Sabemos todos que, na linguística hegemônica de então, foi de signifi-
cação crucial para os destinos da linguística histórica o clássico da fonologia 
gerativa, Sound Pattern of English (1968), de Chomsky e halle, em que 
argumentos diacrônicos são considerados para as interpretações da teoria 
 2� 
Ouvir o inaudível
fonológica padrão. Rompe-se assim a muralha que antagonizava as aborda-
gens sincrônica e diacrônica. Recorde-se que artigos anteriores de m. halle 
são os predecessores de propostas que vinculam diacronia/sincronia no ma-
nual de fonologia antes referido.
Contemporaneamente ao que acontecia nas hostes da fonologia gerativa, 
começam a tomar vulto, a partir de 1966, as propostas de W. Weinreich, Labov 
e m. herzog, publicadas em 1968 nos Fundamentos empíricos para uma teo-
ria da mudança linguística, fundadas nos trabalhos de campo precedentes de 
Labov em martha’s Vineyard e Nova York, nos estudos de contato linguístico 
de Weinreich e na experiência dialetológica de m. herzog. Estava lançada no 
campo a teoria da variação e mudança da sociolinguística americana.
Assim, concomitantemente se esgarçava a oposição metodológica que an-
tagonizava os férteis conceitos saussurianos e tambémse voltava a linguística 
para os dados das línguas enquanto fenômenos históricos, depois de rigoroso 
jejum que excluía o corpus de dados da metodologia e da análise linguísticas.
O texto clássico de 1970 (publicado no Brasil em 1976) de p. Kiparsky 
“Linguística histórica” — último capítulo dos Novos horizontes em lin-
guística, organizado por J. Lyons, veiculará para um público mais amplo as 
relações entre argumentos diacrônicos e sincrônicos na análise fonológica 
sincrônica e processos diacrônicos. Nesses trabalho, Kiparsky almeja, ao fi-
nalizá-lo, que o pêndulo entre teoria linguística e linguística histórica tenha 
chegado à posição de equilíbrio (id.: 304).
No que se refere à teoria fonológica, o desejo de Kiparsky se confir-
mou. Entretanto, parece ainda longe de equilibrar-se o pêndulo que balança 
entre as teorias linguísticas essencialmente a-históricas, que não aceitam 
argumentos históricos para aperfeiçoarem-se, e as chamadas empiricistas 
que, a partir dos dados, evidenciam realidades sócio-históricas das línguas. A 
batalha ocorre agora nessa frente.
Desses confrontos (apesar de mortos e feridos) têm crescido sucessiva-
mente, e com sucesso, as teorias que buscam a compreensão do fenômeno 
da linguagem humana tanto na sua face biopsíquica quanto na sócio-histó-
rica. O reconhecimento da complementaridade — parece-me que possível 
— desses caminhos que correm paralelos será a meta de uma teoria explica-
tiva abrangente para a linguagem humana.
 26 
Caminhos da linguística histórica
Surpreende que o sugerido por Kiparsky em 1970 tenha tomado rumos 
independentes e hoje lemos teóricos gerativistas que trabalham com mudan-
ça linguística que não reconhecem a sociolinguística e vice-versa. No referido 
texto, se afirma que tais orientações são complementares, pelo menos no que se 
refere à questão basilar da linguística histórica, que é a mudança linguística:
As pesquisas que focalizam o contexto social da fala e a aquisição da linguagem 
pela criança completam a abordagem dessa questão fundamental que é a das mu-
danças… As formas e pronúncias variantes, independentemente de sua conscien-
tização pelo falante, podem conter conotações sociais capazes de influenciar o cur-
so das mudanças (1976: 292).
Um indicador interessante de que tal divórcio perdura e não a comple-
mentação sugerida por Kiparsky está no capítulo “Linguística histórica” de 
R. Coates, publicado em 1987 nos New Horizons in Linguistics 2, também 
organizado por J. Lyons. Aí fica patente que não convergiam os gerativistas 
e os sociolinguistas na tentativa de um teoria compreensiva da mudança. A 
orientação desse texto demonstra que a opção foi feita: privilegiam-se, com 
quase exclusividade, as contribuições das escolas sociolinguísticas — a ame-
ricana e a inglesa — para a questão da mudança e pouco se menciona como 
o problema é tratado nos gerativismos.
A complementaridade sugerida no texto análogo de 1970 não se mate-
rializou substancialmente no percurso da linguística histórica dessas últimas 
décadas, no sentido de se construir uma teoria da mudança que conjugasse 
modelos gerativos e sociolinguísticos, mas sem dúvida, para os que não mi-
litam em uma ou outra hoste, os caminhos abertos são promissores.

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