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1 FUNDAMENTOS TEÓRICOS E PRÁTICOS DO ENSINO DE HISTÓRIA 2 Sumário FUNDAMENTOS TEÓRICOS E PRÁTICOS DO ENSINO DE HISTÓRIA ................................... 1 NOSSA HISTÓRIA ............................................................................................................................. 3 1. A HISTÓRIA ENQUANTO DISCIPLINA ESCOLAR ............................................................. 4 2. A HISTÓRIA ENSINADA NA ATUALIDADE ........................................................................ 8 3. A HISTÓRIA EM SALA DE AULA: DINAMIZANDO CONCEITOS .................................. 12 3.1-Aceitar valores diferentes dos nossos .............................................................................. 12 3.2-Brincando com a História .................................................................................................... 13 4. O ESTUDO DA HISTÓRIA: O TEMPO E O FATO HISTÓRICO ......................................... 14 4.1-Por que se estudava uma História factual? ..................................................................... 16 4.2-Longe de uma História apenas de fatos ........................................................................... 17 4.3-Mexendo com os fatos......................................................................................................... 18 4.4-A compreensão do fato por meio da imagem .................................................................. 19 5. A IMPORTÂNCIA DO CONHECIMENTO HISTÓRICO ...................................................... 21 5.1-Discussões sobre as propostas dos PCN e o estudo do tempo histórico .................. 22 5.2-Tempo histórico e valores permanentes .......................................................................... 26 6. AS PROPOSTAS DOS PCN: OS TEMAS TRANSVERSAIS E A CIDADANIA.................. 27 7. REFERÊNCIAS: ........................................................................................................................ 30 file:///W:/EDUCAÇÃO/DOCENCIA%20NO%20ENSINO%20DE%20HISTORIA%20E%20GEOGRAFIA/FUNDAMENTOS%20TEÓRICOS%20E%20PRÁTICOS%20DO%20ENSINO%20DE%20HISTÓRIA/FUNDAMENTOS%20TEÓRICOS%20E%20PRÁTICOS%20DO%20ENSINO%20DE%20HISTÓRIA.docx%23_Toc126680925 3 NOSSA HISTÓRIA A nossa história inicia com a realização do sonho de um grupo de empresários, em atender à crescente demanda de alunos para cursos de Graduação e Pós-Graduação. Com isso foi criado a nossa instituição, como entidade oferecendo serviços educacionais em nível superior. A instituição tem por objetivo formar diplomados nas diferentes áreas de conheci- mento, aptos para a inserção em setores profissionais e para a participação no desenvolvi- mento da sociedade brasileira, e colaborar na sua formação contínua. Além de promover a divulgação de conhecimentos culturais, científicos e técnicos que constituem patrimônio da humanidade e comunicar o saber através do ensino, de publicação ou outras normas de comunicação. A nossa missão é oferecer qualidade em conhecimento e cultura de forma confiável e eficiente para que o aluno tenha oportunidade de construir uma base profissional e ética. Dessa forma, conquistando o espaço de uma das instituições modelo no país na oferta de cursos, primando sempre pela inovação tecnológica, excelência no atendimento e valor do serviço oferecido. 4 1. A HISTÓRIA ENQUANTO DISCIPLINA ESCOLAR Figura: 1 Ao relatar sobre a História, verificaremos que seu desempenho como disciplina teve início na França, em um cenário presidido pelo “iluminismo”, onde razão e ciência se uniram para promover a libertação do homem e uma relativa igualdade entre eles. Esse era o ideal da educação burguesa oferecida na França de Napoleão, onde o ensino público, gratuito e obrigatório foi a “novidade” do século XIX. Segundo a historiadora Elza Nadai (1986, p. 106), “o século XIX acrescentou, para- lelamente aos grandes movimentos que ocorreram visando construir os Estados Nacionais” a utilidade da História como uma disciplina que atendia à necessidade de se retornar ao passado “com o objetivo de identificar a ‘base comum’ formadora da nacionalidade”. Foi onde se começou a falar em conceitos que ainda hoje existem em nossas histórias ensina- das: 5 • nação, • pátria, • nacionalidade e cidadania. Paralelamente a este requisito, tivemos a escola metódica ou positivista, sendo posta a serviço da República Francesa pós-napoleônica quando ocorria aquela que Bourdé e Martin (1984, p. 110) chamam de “exaltação permanente” da mãe pátria: uma propaganda “nacionalista desenfreada” trazia em primeiro lugar o que se esperava do aluno-soldado, inflamado por exemplos e cantos marciais: Para ser um homem é preciso saber escrever E em pequeno, aprender a trabalhar. Pela Pátria, uma criança deve instruir-se na escola, aprender a trabalhar. Soou a hora, marchemos a passo, Jovens crianças sejamos soldados (BOURDÉ; MARTIN 1984, p. 110). Esse canto, citado ao nível da escola maternal e do atual Ensino Fundamental, en- trava em um clima onde “os manuais de história” selecionavam “os feitos de armas que ilustravam a defesa do território contra o invasor”. Foi ainda nessa época que Joana d’Arc tornou-se “heroína nacional, o símbolo da resistência”, uma das figuras mais impressionan- tes que apareceram na Terra; nenhum outro povo tinha em sua história “uma Joana d’Arc conforme trazia o Manual Gautier-Deschamps” (BOURDÉ; MARTIN, 1984, p. 111). No Brasil, segundo Schmidt e Cainelli (2004), a trajetória da História como disciplina teve início no Segundo Reinado e a partir do colégio Dom Pedro II, sempre sustentada pelas diferentes concepções e "escolas" históricas, como querem Bourdé e Martin (1984). A República “Velha” brasileira, sob a égide de republicanos “históricos” como Rui Barbosa, Benjamin Constant e outros, pretendia um Estado presidido pela “ordem e pro- gresso”, como até hoje lemos em nossa bandeira. E este não é outro senão um dístico positivista, que em sua origem com Augusto Comte (1798-1857) se acrescentava ainda da palavra “amor”. 6 A Europa era, principalmente no foco francês, a principal referência de nossos his- toriadores como Capistrano de Abreu (1853-1927) na época positivista. É de Capistrano a tese ensinada em todas nossas escolas até pelo menos a década de 50 do século passado, que o Brasil foi descoberto por acaso. Segundo ele, teriam sido as calmarias as principais responsáveis pelo afastamento da esquadra de Cabral das cos- tas africanas para o Atlântico Sul, na latitude da atual Bahia. Mesmo após a comprovação da experiência náutica portuguesa e seu evidente conhecimento de terras, que pensavam ser uma grande ilha, décadas anteriores a Cabral, muitos ainda acreditavam na teoria do acaso. Historiadores como Tito Lívio Ferreira e outros muitos discutiram até que a intencio- nalidade no descobrimento português do Brasil deixasse de ser vista como obra do acaso, e assumisse o caráter de empresa de navegação planejada por uma nação mercantilista, visto o mercantilismo como a política econômica do capitalismo em sua fase comercial. Capistrano, como todo historiador positivista, tinha suas preferências e elegia seus ídolos ou desafetos, como podemos comprovar em notas sobre sua obra compiladas por José Honório Rodrigues (1979) em seu “História da História do Brasil (tomoI, fase colonial)”: “Capistrano de Abreu, que não foi muito simpático à oratória do Padre Vieira, escre- veu a João Lúcio de Azevedo (historiador português) em 14 de abril de 1918: entre os colonos e os jesuítas minha posição é bem definida: sou pelos jesuítas” (RODRIGUES, 1979, p. 478). Essa parcialidade, que pode ser vista como a parcialidade intencional dospositivistas para colocar a História a ser viço de uma exaltação de valores cívicos e nacio- nalistas, começou a ceder a outra “escola”, desta vez a marxista, quando o historiador, Caio Prado Júnior fez escola entre nós. Por meio das leituras realizadas, percebemos que Capistrano de Abreu foi um dos primeiros grandes historiadores do Brasil, o qual produziu ainda nos campos da etnografia e da linguística. A sua obra é caracterizada por uma rigorosa investigação das fontes e por uma visão crítica dos fatos históricos. Hoje, ao lado desta explicação e de outras, entre as quais avultam as explicações tiradas à Nova História, herdeira da escola dos Annales de Bloch (1976) e Braudel (o his- toriador da longa duração), temos historiadores que pensam em termos de descontinuidade e relação, outra história que procura analisar mitos, textos e rituais, outros que como Henri Marrou, Paul Veyne ou Michel de Certeau inserem pontos de dúvida sobre a história. 7 Michel Foucault mostrou, sobretudo, a intenção de “exibir os princípios” da transfor- mação em curso na história. A história estrutural e serial de Braudel (1965), que se esfor- çava por tirar consequências teóricas dos eventos, deu lugar à conhecida “Arqueologia do Saber”, de 1969. Aquilo que Bourdé e Martin, comentando Foucault, chamam de mutaci- onismo “que privilegia as rupturas bruscas e a emergência de estruturas novas” passou a ser a tônica (1984, p. 189). Bourdé e Martin (1984, p. 197) mencionam um corte que confi- gura uma escrita “etnológica que consiste em distinguir, por detrás da irredutível estra- nheza, a presença de certo número de invariantes que se encontram ligados a uma única e mesma natureza humana” ou, ainda, a uma lógica universal. Paul Veyne pode ser visto como um hipercrítico que procura banir da História as filosofias totalizantes como o marxismo, ainda que sua crítica não seja a de um cético do valor histórico: “a história continua a ser capaz de elaborar um conhecimento autêntico” apesar de parcial, do homem (BOURDÉ; MARTIN, 1984, p. 201). No nosso país, Brasil, continuamos as reflexões ao impacto dessas escolas, que trazem o dinamismo à nossa disciplina e são muito importantes na medida em que norteiam os rumos da escola em nível fundamental ou médio, seja qual for o objeto de nossa discus- são e, ainda, os rumos dos estudos universitários ligados à disciplina histórica. Um desses momentos aconteceu durante o período da ditadura, por volta de 1964 e 1985, quando não havia preocupação em resgatar o homem como sujeito de sua história, mas sim reservar para ele um caráter de mero espectador, dentro da perspectiva de que o indivíduo serve o seu Estado. Nesse sentido, foram introduzidas no currículo disciplinas que privilegiavam o civismo em detrimento da crítica ao conhecimento advindo do passado, como foi o caso da Educação Moral e Cívica. A Lei de Diretrizes e Bases da Educação de 1996 (Lei Federal n. 9.394) procurou adequar os conteúdos das ciências na direção da democracia e verdadeira cidadania. Sendo assim, há alguns anos tivemos a composição dos Parâmetros Curriculares Nacio- nais (PCNs), programados para servirem de referência em conteúdos e metodologias de ensino para a estruturação escolar brasileira. 8 2. A HISTÓRIA ENSINADA NA ATUALIDADE Figura: 2 A colocação da História como disciplina e não apenas como matéria escolar é um primeiro passo indicado por Circe Bittencourt (2004), onde ocorre uma explanação sobre conceitos. A História deve ir além daquela “transposição didática” que caracterizou o nosso passado, e se situar em um processo dinâmico de produção, que obedece a uma finalidade e definição de métodos que garantam a sua eficácia como “disciplina”. Segundo Bittencourt (2004, p. 35), “responder à pergunta ‘o que é uma disciplina escolar’ não é simples, e existe séria polêmica a respeito desse conceito”. Para entender- mos a disciplina escolar em seu sentido amplo, é preciso situá-la em um processo dinâmico de produção. Isso é o mesmo que dizer que toda disciplina precisa ter estabelecida suas nacionalidades, explicitar os conteúdos a serem ensinados e definir os métodos que garan- tam tanto a apreensão de tais conteúdos como a avaliação de tal aprendizagem. Assim: 9 Cada disciplina formula seus objetivos no intuito de contribuir para uma formação intelectual e cultural que desenvolva o espírito crítico e capacidades diversas de com- paração, dedução, criatividade, argumentação, lógica e habilidades técnicas, entre outras (BITTENCOURT, 2004, p. 41). Um constituinte fundamental da disciplina é seu conteúdo explícito que se articula com os outros componentes da disciplina escolar, que envolve os métodos de ensino e de aprendizagem. A avaliação é o momento final do ensino-aprendizagem, e por isso tem de estar relacionada a métodos e finalidades. Temos afirmado que a concepção de disciplina escolar está intimamente associada à de pedagogia e à escola e, portanto, ao papel histórico de cada um desses com- ponentes. Ao concebermos a disciplina escolar como produção coletiva das institui- ções de ensino, admitimos que a pedagogia não pode ser entendida como uma ati- vidade limitada a produzir métodos para melhor 'transpor' conteúdos externos, sim- plificando da maneira mais adequada possível os saberes eruditos ou acadêmicos (BITTENCOURT, 2004, p. 49). “Dar aula” é uma ação complexa, que demanda do professor o domínio de saberem característicos e heterogêneos: o trabalho profissional que se define como “saber docente” traz a necessidade de liberar esses saberes do professor, e submetê-los ao reconheci- mento por parte dos grupos produtores de saberes da comunidade científica, enquanto um saber original sobre o qual detêm o controle é um empreendimento que lhe parece condição básica para um novo profissionalismo (TARDIFF, 2002, p. 232). Quando pensamos em qual História devemos ensinar, poderemos refletir sobre o que escreve a respeito dos objetivos da História no então "curso secundário” (hoje Ensino Fundamental – nível 2) (COSTA, 1957 apud BITTENCOURT, 2004, p. 93), em um exemplar de 1957, da Revista de História, mas que ainda permanece atual quanto ao seu legado, ressalta: “A História matéria tem uma finalidade a preencher (...) como a de formar a perso- nalidade integral do adolescente e, em segundo plano, fornecer-lhe conhecimentos bási- cos”. A autora cita como matéria o que hoje tomamos como disciplina, mas à parte dessa diferença avulta a necessidade de formar antes de informar, no melhor sentido que lhe 10 davam os gregos antigos quando pensavam em uma educação liberal, voltada para a for- mação integral do ser humano. Costa (1957 apud BITTENCOURT 2004, p. 94) prossegue, indagando-se como seria possível à História preencher tal função, e aí encontramos um mote para a resposta que buscamos em nossa pergunta título: “Inicialmente pelo seu caráter informativo, amplia a visão intelectual, fornece conhecimentos novos. Por outro lado, ela dá margem à expansão do aluno – oralmente e por escrito”. A partir da informação básica obtida por leitura em documento real, virtual ou aula expositiva, a expressão do aluno será consequente e natural. Ainda sobre isso, Costa (1957 apud BITTENCOURT, 2004, p. 94) esclarece: “A exposição oral contribui para dar segu- rança ao aluno, domínio e controle de si mesmo, hábito de falar em público. Diminui inibi- ções. Dessa forma, estamos contribuindo para a formação de sua personalidade”. Nesse ponto, a historiadora passa da informação para a ênfase à formação, porém, outras aplicações para o conhecimento histórico que podem nos responder sobre qual a melhor História a ser ensinada são expostas: A História ainda pode também desenvolver o raciocínio indutivo. Educa a imagina- ção. Formulando problemas, analisando os porquês,as razões, as condições que explicam um determinado fenômeno, problemas da sociedade. Enxergar soluções. Mas tudo isto sempre que a História ensinada permaneça num plano explicativo e não se restrinja a fastidiosa enumeração de fatos, dados, nomes, geralmente sem significado, e que são obrigatoriamente decorados pelos alunos (grifo nosso) (COSTA, 1957 apud BITTENCOURT, 2004, p. 94). Schmidt e Cainelli (2004) nos dão orientações sobre como efetivar uma aula de His- tória: Abordagem magistral é um método tradicional que possibilita receber muitas infor- mações dadas pelo professor em pouco tempo. Porém, o aluno fica em posição passiva e não se pode garantir que ele seja capaz de reproduzir os conhecimentos fora da aula. 11 Abordagem dialogada parte de perguntas direcionadas aos alunos, mobilizando o conhecimento apreendido em aulas anteriores. Os alunos precisam estar motivados a par- ticipar para que surta o efeito desejado. Contudo, por apresentar questões fechadas que não demandam uma reflexão ou que não possam ser colocadas em um conjunto de pro- blemáticas, “traz o risco de dar ao aluno uma concepção positivista da história, que significa mais a restituição coletiva de uma pseudoverdade histórica do que a reconstrução hipoté- tica do passado” (SCHMIDT; CAINELLI, 2004, p. 39). Por fim, a Abordagem construtivista favorece a autoaprendizagem experimental, colocando o aluno como agente de sua própria formação. Entre os métodos científicos desta abordagem, conforme Bittencourt (2004), encontramos: ► Método Indutivo – sua aproximação dos fenômenos se encaminha do particular para o geral, ou seja, parte das constatações mais específicas para as mais abrangentes, numa conexão ascendente. Podemos partir da biografia do indivíduo inserido em sua so- ciedade e tempo de vida para o retrato de uma época histórica, por exemplo. ► Método Dedutivo – parte das teorias e leis, num âmbito geral, para a ocorrência de fenômenos particulares, numa conexão descendente. Ou seja, podemos estudar a glo- balização e então compreender suas características e aplicações na sociedade brasileira. Percebemos que o pensamento de Viotti da Costa é basicamente ilustrativo, para que entendamos a História não mais como uma matéria meramente decorativa, mas sim como uma disciplina que nos permite a apropriação de um conhecimento científico que tem um método e atende a uma finalidade. 12 3. A HISTÓRIA EM SALA DE AULA: DINAMIZANDO CON- CEITOS Os conceitos fundamentais para o estudo da História (fato histórico, sujeito histórico e tempo histórico), podem ser trabalhados em sala de aula a partir de atividades cotidianas. A leitura ou a dinâmica de história em sala podem ser executadas do ponto de vista do fato histórico; uma reflexão sobre as atividades cotidianas da criança em casa ou na escola é o suporte para uma avaliação sobre o tempo, o tempo histórico e, finalmente, uma observa- ção e avaliação sobre as ações cotidianas identificam o sujeito histórico, não só o sujeito histórico de ações acontecidas em um passado distante, mas um sujeito histórico identifi- cável nas ações de um grupo dentro da comunidade local, em atividades desenvolvidas pela classe escolar, em trabalhos e ações do aluno e seus pares. 3.1-Aceitar valores diferentes dos nossos Essa é uma das questões-chave para serem abordadas. A criação de uma identifi- cação ou a observação de usa existência e a compreensão das diferenças. Trabalhar va- lores diferenciados e hábitos distintos é um dos elementos em questão. É preciso que se tome como fonte tudo o que rodeia a vida da criança: brinquedos, coisas pessoais, hábitos e costumes e, a partir do exame sobre outros elementos que são características diferentes e que pertencem a outro colega, estabelecer análises e conclusões sobre diferenças cultu- rais e sociais. A partir de esse olhar, é possível que se desenvolva com a criança a noção de dife- renças que irão se manifestar também em nível da sexualidade, da classificação social etc., procurando ter como resposta a aceitação do outro e de seu universo. 13 3.2-Brincando com a História Figura: 3 Para que a criança tenha acesso a diferentes episódios da História, é interessante o trabalho não somente com quadros e gravuras prontas, mas também fazer o trabalho de releitura de tais figuras, paisagens ou personagens. Assim, é possível desenvolver com a criança não somente o reconhecimento dessas localidades ou indivíduos, mas também tra- balhar determinada habilidade, principalmente que desenvolvesse o controle dígito-manual. Para tanto, essas imagens podem ser revisadas e trabalhadas várias vezes e, em cada fase, a criança pode agregar novos dados à sua leitura anterior. Por exemplo, caso se trabalhe uma imagem do Coliseu romano, da Acrópole grega ou das Pirâmides egípcias, podem ser desenvolvidas atividades com o objetivo de preen- cher a figura com bolinhas de jornal ou revistas; também se pode utilizar o cordão para traçar as bordas e margens do desenho (contorno de figuras) ou mesmo perfuração e ali- nhavo de determinados desenhos. Esse tipo de atividade não só estimula as questões de habilidade motora, como também pode servir de base para a reflexão sobre aquela locali- dade, povo ou personagem histórico. 14 Após esse exercício, é possível solicitar o aluno que apresente aos seus colegas o trabalho que foi desenvolvido. Isso tudo é extremamente lúdico e pode ser feito de maneira livre, deixando o aluno produzir seu trabalho da forma que melhor lhe convier, a partir de sua observação das formas e contorno da figura, ou seja, de seu olhar sobre o desenho ou a obra. Esse tipo de atividade pode ser desenvolvido com as áreas ou lugares da comuni- dade/localidade do aluno. 4. O ESTUDO DA HISTÓRIA: O TEMPO E O FATO HISTÓ- RICO Há muito tempo, os historiadores rumaram para uma nova concepção acerca da História e da construção da Ciência Histórica. Essa nova abordagem apontava não mais a velha exposição dos fatos e seus encadeamentos, que fez parte do ofício do historiador no século XIX e parte do século XX, período este denominado, sinteticamente, de positivismo. Essa nova proposta voltou-se para novos discursos e para um processo mais reflexivo e conjuntural de construção da História. Grandes partes dessas mudanças e das novas abordagens aconteceram principal- mente na década de 1920, com o surgimento da Escola dos Annales, cujos principais re- presentantes foram Lucian Febvre e Marc Bloch. As propostas dos Annales foram impor- tantíssimas para a renovação dos estudos históricos e geraram desdobramentos conside- ráveis. O grupo de intelectuais dos Annales serviu como uma espécie de grupo de contes- tação ao que fora produzido no século XIX e denunciava uma história de eventos de pouco alcance histórico. A ideia dos acontecimentos e do tempo históricos, e a construção de conceitos consoantes a estas questões foram à base da obra historiográfica desses dois pensadores. 15 Complementando essa renovação ocorrida dentro da História em 1929, deve ser ainda lembrada a publicação de Fernand Braudel na revista dos Annales: “História e Ciên- cias Sociais: a longa duração”. Sem dúvida alguma, essa obra é peça chave para a com- preensão do conceito de tempo adotado pelos historiadores contemporâneos. A partir de então, a História, de forma geral, passou a trabalhar com os conceitos de tempo de longa e curta duração, tempo da estrutura, da conjuntura e do acontecimento breve. Todavia, mesmo avaliando o tempo histórico dentro de novas perspectivas, não se pode deixar de considerar que o entendimento dos fatos históricos compõe, justamente, esse cordão de ações humanas que podem ser elencados ao longo do tempo. É importante ressaltar que estes estudos sejamfeitos com fatos contextualizados. Mas o que é, então, fato histórico? O fato histórico é algum acontecimento ou evento cujo significado é importante para a compreensão do passado. Esses fatos podem ter ocor- rido em um passado distante, bem como em um passado mais próximo. Eles podem ser também apresentados de uma maneira isolada ou descontextualizada, o que, na verdade, é uma opção do professor, mas que, com certeza, empobrece o trabalho que está sendo desenvolvido. Ainda, o fato histórico pode ser entendido como um sinônimo do que Fernand Brau- del denominou de tempo do acontecimento breve, ou seja, aquele que representa a dimen- são de um acontecimento breve, correspondendo a um momento preciso. Pode ser algum acordo firmado em determinada data, o nascimento de algum personagem histórico, o fim de um governo ou a independência de uma nação. O conceito de fato histórico e a definição dos fatos que serão investigados e estuda- dos naquele ano escolar orientam as noções e o tipo de trabalho que serão desenvolvidos em sala de aula. Se, por muitos anos, ilustrar os fatos históricos e torná-los a única ferra- menta ou objeto da História foi a grande referência para a formação do conhecimento his- tórico escolar, hoje, o que se propõe é que este fato tenha um sentido de importância maior, capaz de trazer em si fundamentos para compreender as mudanças materiais e culturais ocorridas ao longo do tempo e traduzindo a dinâmica histórica das sociedades humanas. O fato histórico deixa de ser um dado singular solto no tempo e passa a ter raízes mais profundas para a compreensão da história. 16 4.1-Por que se estudava uma História factual? Até a década de 1980, fazer História ou ensinar História no Brasil tinha em sua es- sência uma relação com o civismo e com o poder do Estado. Para que o professor e o aluno fossem bons, era preciso que dominassem o conceito de tempo histórico. Todavia, essa compreensão limitava-se a entender o tempo cronológico e a sucessão de datas, ca- lendário e sequência entre passado, presente e futuro. Isso ocorria justamente porque era fundamental para o Estado que se criasse uma consciência cívica, normatizadora e moralizante nos cidadãos, e não uma compreensão e elaboração da História de uma maneira mais crítica. A História estava na escola para ser decorada e sua prática constava de recitar lições, datas e nomes considerados significati- vos. Esse tipo de História e de conhecimento escolar sobre História esteve presente desde o século XIX, com algumas pequenas mudanças ou descaminhos em determinados mo- mentos. Assim, foi dominante a criação de programas de História com narrativas morais, de grandes eventos e de grandes heróis, uma História factual. O exemplo disso, podemos citar a escola e o conteúdo ensinado nos estabelecimen- tos de ensino durante o Período Imperial brasileiro. Nesse momento, meados do século XIX, a História da civilização substitui a antiga História Sagrada; no entanto, assimila alguns de seus traços. A ordem dos acontecimentos era articulada com uma sucessão de reis e de lutas, bem como de grandes eventos, como a Independência. Segue, portanto, a velha fórmula da criação de uma identidade pátria, o alicerce da pedagogia do cidadão, um pas- sado glorioso, permeado por feitos heroicos e personagens históricos perfeitos. Pode-se observar, por exemplo, as habilidades de Duque de Caxias, patrono do Exército, ou a ina- balável imagem do mito de Tiradentes, criada na República. Sem contar, é claro, com a triunfante Guerra do Paraguai, por muito tempo citada como a grande batalha da vitória brasileira. Esse modelo permaneceu inalterado, mesmo com algumas reformas instituídas pe- los primeiros governos republicanos. A situação da escola pública pouco mudou e da mesma maneira pouco se viu alterações curriculares, o que aconteceu também com a His- 17 tória. A partir de 1930, com o governo getulista, e uma forma ditatorial de governar, perse- guem-se as mesmas condições de ensino da História, salvo uma mudança: a ênfase em um discurso democrático racial para encobrir um governo extremamente racista e despó- tico. Nas décadas de 1960 e 1970, sob o domínio militar, a História passa a ser uma disciplina mais significativa, conhecida como Estudos Sociais, dentro do espírito naciona- lista de caráter moralizante e cívico. A História factual mantém seu curso. Trata-se de enal- tecer alguns fatos importantes e manter na população a imagem da nação perfeita e da aceitabilidade de que o poder e a glória cabem somente a alguns. O que aconteceu, então, na década de 1980, para que um novo projeto de História na escola fosse apresentado? Por que ensinar História tão cedo e de uma maneira crítica? 4.2-Longe de uma História apenas de fatos No decorrer da década de 1970, as lutas de profissionais, desde a sala de aula até a universidade, ganharam maior expressão, além da força que foram buscar junto a asso- ciações como a Associação Nacional de História (ANPUH) e a Associação dos Geógrafos Brasileiros (AGB), na busca do retorno da Geografia e da História como disciplinas autôno- mas. A nova clientela e as mudanças políticas e sociais brasileiras permitiam um espaço de discussão maior sobre o papel da escola e também sobre a necessidade de novas po- líticas educacionais. Nessa corrente de mudanças de caráter pedagógico, se inseriram também às modificações quanto ao ensino de História. Nesse momento, foi possível que se pensasse também na possibilidade do retorno da História e da Geografia para as Séries Iniciais. Com a possibilidade de voltar a ser uma disciplina e de ter novamente um papel mais definido na formação da cidadania, a História Tradicional passa a sofrer contestações. Di- ante de uma nova forma de fazer e ensinar História, de acordo com o novo projeto da His- 18 tória Crítica, os currículos foram modificados e ampliados. A disciplina passou a ser ensi- nada nas escolas, desde a Educação Infantil até os primeiros anos do Ensino Fundamental. Não aquela velha História dos fatos isolados e dos heróis mitificados, mas a História dos fatos contextualizados e da presença de pessoas. E como sugerem os Parâmetros Curri- culares Nacionais: “reafirmar sua importância no currículo” não se prende somente a uma preocupação com a identidade nacional, mas, sobretudo no que a disciplina pode dar como contribuição específica ao desenvolvimento dos alunos como sujeitos conscientes, capazes de entender a História como conhecimento, como experiência e prática da cidadania. 4.3-Mexendo com os fatos ´ Figura: 4 Já que o fato puro não agrega criticidade, o professor não deve limitar-se a ensinar aos seus alunos os nomes e feitos de personalidades, mas mostrá-los no contexto em que sua ação ganhou significado. Dessa forma, a História deixa de ser o resultado da vontade de alguns indivíduos imperando sobre os outros, ou mesmo de fatos estanques, e passa a 19 ser uma História vinculada há um tempo histórica, e à vida de uma nação, de um povo ou de uma comunidade. É provável que, por meio do estudo de um fato, possa-se fazer uma abordagem sociocultural da política que orienta determinado período da História. Por exemplo, por meio da morte de Tiradentes e da iconografia a respeito desse fato, é possível fazer uma releitura de época e absorver os interesses da elite brasileira. O mito é apresentado com características que lembram Cristo (a barba e os cabelos longos, trajes alvos, os pés des- calços têm um sentido). O que Tiradentes e sua morte sugerem? O importante é saber o que Tiradentes tem a acrescentar para a vida das crianças. Por que se comemora o dia de Tiradentes até hoje nas escolas? Por que o Brasil transformou Tiradentes em um herói? Quando ela passou a ter importância para a historiografia? É possível, assim,mais do que forjar a identidade nacional, que se compreenda a alteridade do sentimento, da crença, da cultura e dos sonhos de uma nação pela leitura de seus diferentes segmentos: pobres e ricos. Do Período Colonial até os dias de hoje, a população mais simples é tida como incapaz, indolente, inculta, perigosa, demoníaca, sub- versiva e selvagem. Tiradentes é quem entre eles? Assim, apresentando traços por meio das diferentes linguagens (iconografia, letras de músicas, arquitetura e propaganda), um fato histórico pode ter múltiplas facetas, vários olhares e uma compreensão e valoração maior. Em suma, ao observar a sociedade local ou nacional, o aluno deve ser capaz de compreender que determinados fatos são de suma importância para a história daquele grupo. Cabe ao professor o trabalho de reelaboração do que é proposto como conteúdo a ser trabalhado, transformando- o, da melhor maneira possível, em conteúdo transmissível e assimilável pelos estudantes. Ao passar determinado fato ou data cívica, o professor deve buscar metodologias e técnicas que motivem o aluno a compreender e a se interessar pelo que estuda. Para tanto, é importante que se tenha claras técnicas de motivação e elaboração de atividades instigantes. 4.4-A compreensão do fato por meio da imagem 20 É sabido, no entanto, que muitos professores ainda têm como referencial os textos impressos. A essa predominância dos textos escritos é o que Debray (1995) chama de “racionalidade grafosfera”. Essa utilização quase que limitada ao texto escrito e que o pro- fessor administra em classe é que deve ser quebrada. A fonte escrita é importante, mas, principalmente nas Séries Iniciais (1.° ciclo), o trabalho com a imagem é fundamental. Não se pode esquecer que continuamente os alunos sofrem influências da televisão, e essa deve ser também um recurso constante. O aluno chega à sala de aula com algum grau de informação sobre alguns temas ou fatos que estão sendo trabalhados pelo professor. É claro que com as apropriações distor- cidas das informações adquiridas por intermédio dos meios de comunicação. Cabe ao professor empregar em suas aulas recursos visuais e tornar mais rico o fato histórico tra- balhado. Assim, o referencial do aluno será, além do texto escolar, oral ou escrito, aquele que lhe é veiculado pela televisão ou pelo filme. É importante que o professor seja capaz de utilizar esse recurso (o filme) e fazer, por tanto, essa conversação entre o fato histórico mostrado no filme e aquele trabalhado em sala. De acordo com Saliba, as imagens não falam, mas agregam referenciais: “as ima- gens são estratégias para conhecimento da realidade, mas não constituem sucedâneos para nenhum suporte escrito. Ao contrário do que se diz, frequentemente, a imagem não fala. Sem comentários, uma imagem não significa rigorosamente nada.” (1996, p. 161). A articulação da imagem com o texto escrito trará ao aluno elementos suficientes para que ele tenha uma compreensão mais ampla do fato/conhecimento histórico. Além do que é veiculado na televisão, o filme revela também o acontecimento. Ele não é somente a obra de arte, mas também o produto, uma imagem-objeto, cujas significa- ções e compreensões podem extrapolar o simples limite cinematográfico. O filme pode ser abordado como um documento que revela momentos passados ou contemporâneos. O professor pode utilizar-se da análise de filmes, ou fragmentos de filme, de acordo com a sua necessidade, em diferentes abordagens: cenário, narrativa, público, período, etc. Re- velando o mundo da ficção e da história. De acordo com Ferro, “o filme pode suscitar, no nível da imagem, o factual”. 21 5. A IMPORTÂNCIA DO CONHECIMENTO HISTÓRICO Figura: 5 A História estuda a vida humana através do tempo. Estuda o que os homens fize- ram, pensaram e sentiram como seres sociais. O conhecimento histórico, construído pe- los historiadores e trabalhado em sala de aula, alarga a compreensão humana enquanto ser que constrói seu tempo. A reflexão histórica ajuda a compreender o que podemos ser e fazer. A grande importância do conhecimento histórico em sala de aula relaciona-se tam- bém com o quanto a História capacita os alunos para desenvolver uma consciência mais crítica e, ao mesmo tempo, humana. É saber que por meio do ensino da História é possível que os alunos possam estabelecer relações entre identidades individuais, sociais e coleti- vas, relacionando o particular e o geral, dentro de uma perspectiva temporal. Reconhecer a sua localidade e outras em diferentes tempos históricos. É saber-se parte dessas trans- formações. É conhecer-se pelos elementos que são comuns e tão diferentes em relação 22 ao outro. É criar o senso de cidadania, de solidariedade e de respeito ao diferente. É reco- nhecer e ter admiração pelas conquistas humanas. É saber que fazemos parte de um todo e somos produtos de uma grande jornada humana. Que nada do que vivemos está aí por acaso, e sim foi construído pela coletividade ao longo de centenas de anos. São esses valores e essa perspicácia com relação ao patrimônio que legamos a História humana, que os alunos devem reconhecer e respeitar. Segundo Eric Hobsbawn, (1998, p. 22). [...] ser membro de uma comunidade humana é situar-se em relação ao seu passado (ou da comunidade), ainda que apenas para rejeitá-lo. O passado é, portanto, uma dimensão permanente da consciência humana, um componente inevitável das insti- tuições, valores e outros padrões da sociedade humana. O conhecimento e a percepção do outro e a compreensão do eu, utilizando a História como elemento fundamental para essa assimilação, é o que se busca. É, na verdade, o trabalho com a construção da identidade que envolve o eu e o outro, aspectos sociais, e também da continuidade e permanência, o outro, meu antepassado e o que já foi vivido e transformado, aspectos temporais, que o estudo da História deixa como contribuição. Esse conhecimento possibilita crescer como pessoa, como grupo e como nação à medida que eu sei quem/como sou pelas minhas peculiaridades e semelhanças em relação ao outro (PCN, p. 33, v. 5). 5.1-Discussões sobre as propostas dos PCN e o estudo do tempo histórico As propostas dos Parâmetros Curriculares Nacionais (PCN) para o primeiro ciclo procuram apresentar atividades que incentivem o aluno a descobrir semelhanças e diferen- ças, permanências e transformações no modo de vida cultural, social e econômico de sua localidade, ou seja, privilegia-se como eixo temático a História local e do cotidiano. Para esse período de ensino, recomenda-se a utilização de fontes orais e iconográficas. O que se trabalha nesse período são as mudanças e permanências, os diferentes modos de viver, 23 no presente e em outros tempos e que existem e existiram em um mesmo espaço: a comu- nidade/localidade do aluno. Espera-se que, no final do primeiro ciclo, os alunos sejam capazes de: comparar acontecimentos no tempo, tendo como referência anterioridade, posteridade e simultanei- dade (grifo nosso); que saibam reconhecer permanências e transformações (grifo nosso) sociais, econômicas e culturais nas vivências cotidianas das famílias, da escola e da cole- tividade, no tempo (grifo nosso), no mesmo espaço de convivência; e que possam caracte- rizar a vida das coletividades indígenas. Para que possa se estabelecer tais relações, os PCN propõem que o aluno saiba trabalhar com a periodização e consiga, a partir de atividades como medições e calendá- rios, transpor no tempo essas comunidades estudadas. Seguindo as propostas dos Parâmetros Curriculares, pretende-se que o aluno seja capaz de estabelecer relações entre a sua comunidade e outros locais de estudo, para que possa melhor identificar a sua realidade e buscar, mediante a compreensão daHistória, elementos que tornem a sua realidade inteligível. De acordo com as proposições dos parâ- metros, o estudo da História deve servir como um recurso para que problemas semelhantes tenham soluções cabíveis e parecidas com aquelas do passado. Os Parâmetros Curriculares Nacionais apresentam como proposta de trabalho para o segundo ciclo do Ensino Fundamental a compreensão da História a partir do entendi- mento de conteúdos que abordem as relações estabelecidas entre os homens em vários tempos e espaços. Tal como no primeiro ciclo, permanecem as noções de semelhanças e diferenças, permanências e transformações da vivência e das experiências de diferentes grupos humanos dispostos em distintas localidades e temporalidades, ou seja, nesse mo- mento de estudo, a abordagem passa a ser sobre as relações estabelecidas entre a coleti- vidade local e outras coletividades. O eixo temático do segundo ciclo é a História das orga- nizações populacionais. No segundo ciclo, os alunos devem trabalhar com obras de conteúdo histórico, mi- tos, lendas, textos didáticos, documentários e telejornais. Para que essas fontes de infor- mação sejam mais bem trabalhadas, cabe ao professor criar momentos instigantes e de leitura pessoal, para despertar nos alunos questionamentos pertinentes e relações possí- veis entre os fatos tratados no material disponível e o seu cotidiano. 24 Ao final do segundo ciclo, o aluno deverá ser capaz de: reconhecer algumas relações sociais, econômicas e culturais que a sua coletividade estabeleceu com outras localidades, no presente e no passado (grifo nosso); identificar as ascendências e descendências das pessoas que pertencem à sua localidade, quanto à nacionalidade, etnia, língua, religião e costumes, contextualizando seus deslocamentos e confrontos culturais e étnicos, em diver- sos momentos históricos nacionais (grifo nosso); identificar as relações estabelecidas entre a sua localidade e os demais centros políticos, econômicos e culturais, em diferentes tem- pos (grifo nosso); utilizar diferentes fontes de informação para as leituras críticas e valorizar as ações coletivas que repercutem na melhoria das condições de vida das localidades. Essas propostas estão diretamente relacionadas com a compreensão do tempo. Para que esses objetivos sejam plenamente atingidos, é preciso que se trabalhe na perspectiva temporal, de forma que essa abrangência seja capaz de proporcionar ao aluno a capacidade de visualizar fronteiras temporais e de compreender a sua identidade a partir das diferenças que ele possa estabelecer. Diferenças que se caracterizam também no tempo e que são estabelecidas entre comunidades, classes sociais, etnias, gêneros e na- cionalidades, dentro de um ciclo. A identidade do aluno será não somente trabalhada no aspecto individual, mas também buscando uma identidade coletiva, ou seja, a identidade que nasce a partir da observação da diversidade. Como dinamizar o estudo do tempo em sala de aula – propostas didática e trabalho com fontes Por muito tempo, o ensino tradicional da História se preocupou apenas com um grande número de informações pautadas em datas e nomes. Longe das necessidades e realidades da sala de aula e da comunidade, a disciplina se tornava árida e vinculada à ideia de coisas antigas, “amarelas” e desgastadas. Hoje, há outras discussões pertinentes à significação da História. Uma nova visão pedagógica sobre a construção do conheci- mento, e mesmo uma nova dinâmica e perspectiva dos historiadores, trouxe à História um novo gás e um novo colorido. Para usar uma expressão mais correta, um novo colorido que colocou fim ao amarelo pálido dos antigos livros. É possível sentir uma nova procura na História. Ela se realiza a partir da diversidade de atividades que se pode realizar com os alunos e que faz com que eles tomem gosto pela 25 compreensão da História, além, é claro, de atender às propostas dos PCN, como a desco- berta de si, do outro, das diferenças e das completudes. Para tanto, o professor pode utilizar diversos recursos e fontes de trabalho, como: jornais, revistas, fotografias, filmes, cartas, músicas e outros. Para o primeiro ciclo, o professor poderá trabalhar as mudanças ocorridas no tempo por meio das transformações de costumes. É possível trabalhar com fotografias antigas, preferencialmente de família, e, a partir de uma análise e de um questionamento, com a ajuda e orientação do professor, identificar as mudanças ocorridas nas construções, nos meios de transporte e na moda. Essas modificações podem ser pesquisadas e articuladas com as datas em que ocorreram. Dessa forma, os alunos desenvolvem a prática da pes- quisa, da análise, da reflexão e da observação. Outra atividade interessante para realizar com os alunos no primeiro ciclo é solicitar que tragam para a sala de aula as fotos de seus parentes e de seus avós, para que os alunos saibam conversar e possam perguntar coisas sobre o passado de seu bairro e de sua cidade. Mais proveitoso seria, se fosse possível, ilustrar essa conversa com fotos de época que mostrem como eram determinados lugares da cidade. Ao final, pode ser mon- tado um painel com essas fotos e com os relatos dos alunos sobre cada época (ontem e hoje). Dessa forma, torna-se compreensível a noção temporal. Para que os alunos possam identificar também outras peculiaridades de sua reali- dade, é interessante que eles identifiquem outras comunidades que, mesmo contemporâ- neas, vivem de maneira diferente e apresentam hábitos e costumes distintos dos seus. Dessa maneira, é possível que eles busquem em jornais e revistas ilustrações de outras formas de relações sociais, como a dos indígenas brasileiros. O trabalho no primeiro ciclo com a utilização da iconografia é fundamental, uma vez que os alunos estão no início da alfabetização e, como esse tipo de fonte é de mais fácil compreensão, estabelece uma melhor clareza da proposta. A partir dessa atividade, eles serão capazes de observar diferenças de moradia, de vestuário e, assim, construíram a sua identidade e identificaram a pluralidade de costumes e formas de viver que temos no país. Essas atividades podem também ser desenvolvidas e adaptadas ao segundo ciclo. Para que os alunos possam ter uma noção de outros grupos e culturas, devem, nesse 26 período, ser trabalhados materiais de leitura (textos, jornais, revistas). Podem ser aborda- dos temas como migração, religiosidade, hábitos alimentares entre outros, de povos do passado ou contemporâneos. Essas noções que devem ser trabalhadas desde a perspec- tiva familiar – como procedência da família, hábitos alimentares e religião – até uma pers- pectiva maior (comunidade, grupos), que seja capaz de fornecer dados para a elaboração de uma identidade da turma. Para identificar a pluralidade étnica que é o Brasil, a construção de um quadro com recortes de revista que apresente diversos tipos humanos que compõem a sociedade bra- sileira pode suscitar debates e descobertas interessantes sobre a composição variada de tipos que temos no país: brancos, negros, orientais, índios; bem como pobres, ricos, entre outros. Esses questionamentos ampliam o leque de discussões possíveis e pertinentes sobre preconceito, diferença, respeito e cultura. Pode, ainda, ser estudado o desenvolvimento de determinada comunidade, ou mesmo as mudanças ocorridas em uma cidade ao longo do tempo. A partir dessas ativi- dades, o aluno poderá perceber aspectos sobre o passado, o presente e o futuro, bem como deverá ser capaz de apresentar graficamente as mudanças e permanências no tempo. Outra proposta interessante para ser trabalhada com os alunos é utilizar a música como recurso. Por meio da música, os alunos podem observar as mudanças de estilo mu- sical, não só de região para região como também os estilos que caracterizam cada época. Trabalharcom a letra de determinadas canções e também produzir (compor) músicas sobre assuntos atuais e do passado, após longa pesquisa, também traz bons resultados. 5.2-Tempo histórico e valores permanentes Com base no texto constitucional os Parâmetros Curriculares Nacionais propuseram uma educação comprometida com a cidadania. Foram eleitos alguns princípios essenciais para a discussão com as crianças: dignidade humana, igualdade de direitos, entre outros. A História é uma das áreas que está diretamente relacionada com a discussão desses te- mas e pode possibilitar fontes e materiais de discussão riquíssimos para essa abordagem. 27 •Ética – Os PCN propõem uma escola que realize um trabalho que possibilite o desenvolvimento da autonomia moral, com base em conteúdos como justiça, respeito mú- tuo e solidariedade. Trabalhar com algumas dessas concepções de cidadania e participa- ção social a partir da história dos gregos seria bastante interessante, bem como a própria noção de justiça e confiança que se construiu na civilização romana, principalmente no direito romano do período republicano. Buscar material para leitura ou figuras do período que ilustram tais situações abriria uma porta de diálogo entre passado e presente e se tornaria um veículo significativo para uma atuação na dimensão social e pessoal. Por sua vez, desperta nos alunos o desenvolvimento de valores e atitudes cidadãs. • Pluralidade - Trabalhar a construção das obras de irrigação do Egito antigo é um bom viés para abordar o processo de solidariedade e de rejeição às atitudes individualistas, visto que torna compreensível a necessidade de ajuda mútua entre os egípcios para melhor aproveitar as cheias do Nilo e garantir a alimentação de todo o povo. Por outro lado, para que se compreenda e se faça uma reflexão sobre os diferentes grupos e culturas que com- põem a sociedade brasileira, tendo em vista a superação da discriminação e dos precon- ceitos, podem ser desenvolvidas um trabalho de reconhecimento da Pré-História do Brasil, ou mesmo da origem dos povos do Brasil. Para finalizar, quando se pensa em trabalhar o conceito de tempo, não é necessário ficar restrito à História do Brasil. Ao contrário, é extremamente enriquecedor e ilustrativo, que os alunos tenham noção de que as atitudes e os valores que temos ou queremos hoje já fazem parte dos comportamentos e dos anseios humanos há muito tempo. 6. AS PROPOSTAS DOS PCN: OS TEMAS TRANSVERSAIS E A CIDADANIA Um dos objetivos do Ensino Fundamental, de acordo com os Parâmetros Curricula- res Nacionais, é que os alunos sejam capazes de: [...] compreender a cidadania como participação social e política, assim como exer- cício de direitos e deveres políticos, civis e sociais, adotando, no dia-a-dia, atitudes 28 de solidariedade, cooperação e repúdio às injustiças, respeitando o outro e exigindo para si o mesmo o respeito. (PCN, v. 8, p. 5) Essa ideia está embasada no primeiro artigo introdutório da Constituição Federal do Brasil, promulgada em 1988. De acordo com esse artigo, o Estado brasileiro está funda- mentado em direitos civis, políticos e sociais e tem por justificativa a soberania, a cidadania, a dignidade da pessoa humana, os valores sociais do trabalho e da livre iniciativa e o plu- ralismo político. Sabe-se, no entanto, que, longe de representarem a realidade de nosso país, esses elementos são, na verdade, objetivos a serem alcançados pela nação e que, em forma de lei, apelam para a consciência dos cidadãos de que isso, na prática, seja o que deve ser vivido. Essa garantia da cidadania direitos civis e políticos é legitimada pela forma demo- crática de governo. É essa concepção de governar que garante uma amplitude maior na compreensão do conceito de cidadania e abre espaço para discussões mais extensas so- bre a sua ausência ou exclusão em alguns lugares, ou momentos da História do Brasil. Na tentativa de fazer com que as pessoas compreendam o verdadeiro sentido do conceito de cidadania, ela foi eleita como o eixo da educação escolar. Para tanto, deverão ser trabalhados, dentro das escolas, valores e conhecimentos suficientes para que as pes- soas tenham capacidade de discutir, participar e comprometer-se de forma efetiva com as questões sociais. As discussões referentes às questões de democracia e cidadania passam necessa- riamente pela escola. Desde a estrutura da escola, as relações que ela estabelece com a comunidade, as opiniões e distribuição de responsabilidades no ambiente escolar, as rela- ções entre professor e aluno e seus pares, bem como a apropriação do conhecimento, são norteadas por comportamentos e condutas que revelam seu espírito democrático ou auto- ritário. A educação para a cidadania requer que os alunos, no convívio com essas relações, façam uma reflexão e extrapolem o ambiente escolar, compreendendo que essas também são questões mais macro na sociedade em que eles estão inseridos. Os Temas Transversais consistem em questões sociais que recebem esse título de- vido à metodologia e ao tratamento didático que recebem. São temas de urgência e abran- gência social e que ajudam a preservar a cidadania. Tais temas possuem uma perspectiva transversal, uma vez que envolvem as diferentes áreas do conhecimento e rompem as 29 barreiras entre essas áreas e os professores, chamando-os à responsabilidade para a for- mação do aluno. Longe de ser entendida como uma metodologia aplicada apenas para o estudo de alguns conteúdos e de forma episódica, esses conteúdos passam a fazer parte do que é trabalhado cotidianamente pelo professor em sala de aula. Não é por isso que os professo- res, principalmente dos 3.° e 4.° ciclos, deixarão de ter como referencial os seus conteúdos. Ao contrário, dentro de sua área, outras reflexões, em outro prisma, serão suscitadas. Além disso, essa proposta de transversalidade quebra a fragmentação do conhecimento em áreas estanques. Para as Séries Iniciais do Ensino Fundamental, mais ainda serão perce- bidos os efeitos benéficos de trabalhar temas que podem ser discutidos em diferentes óti- cas e variadas áreas do conhecimento, facilitado justamente por ser realizado por um mesmo professor. Os Parâmetros reconhecem as dificuldades do ensino e da aprendizagem de valores e atitudes. No entanto, sabe-se que esse é um trabalho necessário e educativo, no sentido de propiciar uma avaliação e compreensão dos comportamentos e fazer dessa avaliação um dado interessante para o desenvolvimento moral e social. Quando se fala em auxiliar na formação moral e ética, fala-se em garantir atitudes cidadãs. Fala-se em comprometimento, em honestidade, em solidariedade e em respeito. Conquistas de uma sociedade justa e democrática. É justamente por isso que trabalhar essas atitudes em sala de aula é fundamental para que se construa uma sociedade cada vez melhor e mais igualitária 30 7. REFERÊNCIAS: BRASIL. 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