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CUIDADO INTEGRAL À SAÚDE DO ADOLESCENTE Aline do Amaral Zils Costa Anticoncepção na adolescência Objetivos de aprendizagem Ao final deste texto, você deve apresentar os seguintes aprendizados: Conceituar anticoncepção, mostrando as características da sexualidade na adolescência. Descrever os métodos contraceptivos que podem ser utilizados pelos adolescentes. Reproduzir ações de orientação para anticoncepção na adolescência. Introdução A sexualidade faz parte da vida humana, desde o nascimento até a morte. Embora muitos pensem que a sexualidade se inicia na puberdade, isso não é verdadeiro. O que ocorre é que, na adolescência, há transforma- ção corporal e aumento da libido, por isso, a maioria das pessoas têm a iniciação sexual nesse período. Em razão desse tempo de transformação e de experimentação de novas vivências, os adolescentes tornam-se um público vulnerável para a gravidez não planejada. Neste capítulo, você vai conhecer, em um aspecto geral, a sexualidade na adolescência e os métodos contraceptivos indicados. Esses conhecimen- tos são fundamentais para os profissionais de saúde realizarem orientações adequadas para a prevenção da gravidez na adolescência, bem como para a prevenção de infecções sexualmente transmissíveis (ISTs). Anticoncepção na adolescência De acordo com Reis (2012), a sexualidade é uma característica básica dos seres humanos. Ela infl uencia sentimentos, emoções, pensamentos e ações e envolve aspectos físicos, orientação sexual, prazer, intimidade e reprodução. A sexualidade na adolescência ganha um foco especial em razão da pu- berdade, com a “explosão” de hormônios e a maturação sexual. As meninas vivenciam a menarca, primeira menstruação e marco biológico da capacidade de reprodução, e os meninos a primeira ejaculação, que ocorre, em geral, no período do sono, o que demonstra a capacidade de produção dos espermato- zoides e, logo, a possibilidade de reprodução. Os adolescentes apresentam a necessidade de experimentar o afeto e o prazer a partir do contato físico consigo mesmo, na masturbação, e com o outro. Nessa fase, os jovens iniciam seus primeiros relacionamentos amorosos e, a maioria deles, inicia a vida sexual. Por ser uma fase de ex- perimentação, é considerado um público de extrema vulnerabilidade tanto para a ocorrência de uma gravidez não planejada quanto para o contágio com uma IST. Todos os adolescentes têm o direito de receber orientações adequadas sobre o uso de preservativos e de contraceptivos. A gravidez na adolescência ocorre em decorrência da prática sexual inse- gura e desprotegida. No Brasil, é considerada um problema de saúde pública considerando a alta ocorrência de nascimentos de bebês filhos de mães entre 10 e 19 anos de idade. As consequências dessa gravidez atingem a mulher, o bebê, a família como um todo e a sociedade. Veja no Quadro 1, a seguir, os dados coletados no site do Departamento de Informática do SUS (DATASUS), do Sistema de Informação de Nascidos Vivos (SINASC), sobre a proporção de nascimentos de bebês de mães ado- lescentes em cinco Estados brasileiros, nos anos de 2014, 2015 e 2016. Foram escolhidos aleatoriamente um Estado de cada região geográfica do País. Embora haja uma pequena diminuição da proporção em todos os Estados, os Anticoncepção na adolescência2 resultados encontrados ainda são considerados altos e sinalizam a necessidade de investimentos na orientação desse público. A contracepção ou a anticoncepção significa a adoção de métodos que im- pedem a ocorrência de uma gravidez e são considerados métodos preventivos. No Sistema Único de Saúde (SUS) são ofertados oito métodos diferentes para a anticoncepção, que devem ser orientados e disponibilizados para a popula- ção adolescente. Infelizmente, existem alguns fatores como receio ético ou julgamento de valores por parte dos profissionais de saúde que negligenciam e não prescrevem e orientam a contracepção. O julgamento do início precoce da vida sexual de um adolescente não o impede de se relacionar sexualmente e, ainda , de se relacionar de forma insegura e desprotegida. O único método contraceptivo contraindicado para adolescentes é o definitivo (esterilização). Os profissionais de saúde devem estar comprometidos com a educação sexual dos adolescentes e orientá-los sobre a prática do sexo seguro e sobre os métodos contraceptivos disponíveis. É fundamental o esclarecimento de Fonte: Adaptado de Datasus (2008, documento on-line). Estado 2014 2015 2016 Rio Grande do Sul 15,66% 14,54% 13,95% São Paulo 14,56% 13,82% 13,18% Mato Grosso do Sul 20,51% 19,97% 19,03% Pernambuco 21,37% 20,58% 20,69% Pará 27,27% 26,53% 25,73% Quadro 1. Proporção de nascimentos de bebês de mães adolescentes em alguns estados do Brasil nos anos 2014, 2015 e 2016 3Anticoncepção na adolescência dúvidas e o apoio para a escolha do método que será adotado. Um aspecto importante é a conscientização de ambos os sexos de que a contracepção é responsabilidade dos parceiros sexuais e não somente das meninas. A utilização de preservativos (camisinha) em todas as relações sexuais deve ser sempre enfocada, pois somente a camisinha confere a dupla proteção: contracepção e prevenção de infecção por ISTs. Métodos contraceptivos Os métodos contraceptivos são divididos em algumas categorias, são elas: métodos definitivos (irreversíveis); não hormonais (comportamentais e de barreira); hormonais; métodos de longa duração. A seguir, serão abordados cada um desses métodos, com exceção dos métodos definitivos (laqueadura tubária e vasectomia), pois eles não são recomendados para os adolescentes (PASSOS et al., 2017). A Lei nº. 9.263, de 12 de janeiro de 1996, trata do planejamento familiar. Ela proíbe a realização de métodos contraceptivos definitivos, ou seja a esterilização masculina ou feminina, em pessoas menores de 25 anos de idade com menos de dois filhos. Contracepção não hormonal A contracepção não hormonal pode ser dividida em dois tipos: métodos comportamentais; métodos de barreira. Anticoncepção na adolescência4 Métodos comportamentais Fazem parte dos métodos comportamentais: curva de temperatura basal; avaliação do muco cervical; tabela de Ogino-Knauss (tabelinha); coito interrompido. Esses métodos exigem determinação precisa do ciclo menstrual e do período fértil, disciplina e conhecimento aprofundado do seu próprio corpo. Tais competências são uma exigência alta para os adolescentes. Durante o período puberal, ocorre o desenvolvimento das características sexuais e os adolescentes necessitam lidar com essas mudanças físicas e aprender sobre o próprio corpo. Além disso, outros fatores que podem atrapalhar essa observação são a menarca, nas meninas, e a ejaculação precoce, nos meninos. Nos primeiros anos após a menarca, muitas meninas têm ciclos anovulatórios e sangramentos irregulares e os meninos, no início da atividade sexual, apresentam maior dificuldade em controlar o momento da ejaculação. Os métodos comportamentais não são recomendados para os adolescentes, pois exigem disciplina e planejamento. Métodos de barreira O grupo dos métodos de barreira é composto por: Preservativo masculino (camisinha) — é uma capa feita de borracha que recobre o pênis e impede o seu contato direto com a vagina durante a relação sexual. Ele retém o esperma após a ejaculação e deve ser colocado com o 5Anticoncepção na adolescência pênis ereto, antes do ato sexual e retirado após a ejaculação. A camisinha masculina é de uso único e deve ser descartada no lixo após o uso. Preservativo feminino (camisinha) — é um tubo de borracha, flexível, que é adaptado dentro do canal vaginal e protege a vagina do contato direto com o pênis. Pode ser colocado horas antes da relação sexual, mas deve ser retirado após a relação e descartado no lixo. A camisinha feminina também é de uso único. Diafragma — é um dispositivo de borracha ou de siliconeem forma de “capuz” que protege o colo do útero e impede a entrada dos esper- matozoides. Ele pode ser usado sozinho ou com espermicidas. Pode ser colocado imediatamente antes da relação sexual, porém deve-se esperar 8 horas, após a relação, para retirá-lo. Espermicida — é uma substância química que é aplicada na vagina antes da relação sexual. Em contato com o esperma esse produto irá matar ou paralizar os espermatozoides. Após a aplicação, o espermicida mantém sua ação por cerca de 1 hora. Contracepção hormonal A contracepção hormonal impede a ovulação. Fazem parte desse grupo de concraceptivos: Anticoncepcionais orais combinados — pílulas com hormônios pro- gesterona e estrogênio que devem ser tomados por via oral diariamente. Anel vaginal — anel flexível inserido dentro da vagina, que libera diariamente as dosagens de hormônios necessários para a contracepção. Adesivo transdérmico — adesivo impregnado de hormônios que, em contato com a pele, libera diariamente a quantidade necessária para impedir a ovulação. Deve ser usado por 3 semanas consecutivas seguidas por 1 semana sem uso. O adesivo precisa ser trocado semanalmente. Anticoncepcional injetável mensal — anticoncepcional administrado por via intramuscular uma vez ao mês, que causa o espessamento do muco cervical e inibe a ovulação. Anticoncepcional injetável trimestral — anticoncepcional adminis- trado por via intramuscular a cada 3 meses, que atua no organismo impedindo a ovulação e espessando o muco cervical. Anticoncepcional de emergência — trata-se de um comprimido hormo- nal ingerido por via oral, em dose única, após a relação sexual desprote- gida. Como o próprio nome diz é pra ser usado em casos de emergência, Anticoncepção na adolescência6 como rompimento do preservativo durante a relação, casos de violência sexual, etc.. Não deve ser usado como um contraceptivo de rotina. Contracepção de longa duração São considerados métodos de longa duração (LARC, do inglês long acting reversible contraception): Dispositivo intrauterino (DIU) — há dois tipos de DIUs: um hormonal e o outro não. O DIU não hormonal possui formato da letra “T” e é composto de cobre. O DIU hormonal também possui formato da letra “T”, porém é de vinil e impregnado com hormônio. A ação de ambos os DIUs é semelhante, causam uma reação no endométrico como um corpo estranho, atrofiam o endométrio e espessam o muco cervical. O DIU de cobre tem validade de 10 anos e o DIU hormonal de 5 anos, ambos devem ser substituídos após esse período caso a mulher deseje continuar utilizando esse método. Observe, na Figura 1, as ilustrações dos dois tipos de DIU e a localização de um DIU inserido no útero. Implante subdérmico — é uma pequena haste de vinil com 4cm de comprimento, impregnada de hormônio, que deve ser implantada no tecido subcutâneo do braço. O procedimento pode ser realizado no consultório médico com anestesia local. A validade do implante é de 3 anos, e precisa ser substituído caso a mulher deseje continuar utilizando esse método. A sua ação inibe a ovulação e espessa o muco cervical. Figura 1. Dispositivos de contracepção de longa duração. (a) Dispositivo não hormonal, (b) dispositivo hormonal e (c) DIU inserido no útero. Fonte: DeCherney et al. (2014, p. 941). 7Anticoncepção na adolescência Ações para a orientação sobre anticoncepção na adolescência Os adolescentes recebem diversas informações pela internet, pelas redes sociais, pelos círculos de amigos e colegas, pela família, pela escola e pelos profi ssionais de saúde. Mas, se há tanta informação, por que a incidência de gravidez na adolescência permanece tão alta? Essa pergunta revela o desafi ador papel do enfermeiro(a) na orientação e no cuidado a essa população. A informação está disponível, porém é necessário desenvolver um processo de aprendizado para que esse conhecimento seja apreendido e se manifeste no autocuidado e na autonomia. Todo adolescente tem direito a ter privacidade no atendimento de saúde e sigilo das informações confidenciadas durante a consulta. A escola e os outros espaços comunitários devem ser explorados pelas equipes da Atenção Primária à Saúde (APS) para o desenvolvimento de ati- vidades educativas contextualizadas e para a distribuição de preservativos. As atividades com a metodologia de roda de conversa parecem ser mais efetivas por serem espaços de fala aberta para todos os participantes e não somente um momento de transmissão de conteúdos. Nos contatos com os adolescentes, deve ser enfocada a importância da utilização da camisinha masculina ou feminina em todas as relações sexuais, pois somente esse método garante a dupla proteção. Outra orientação fundamental para as adolescentes na escolha do método contraceptivo é sobre a necessidade da adesão e de compromisso com o mé- todo. Anticoncepcionais orais devem ser tomados por via oral diariamente, os injetáveis administrados no tempo adequado (mensal ou trimestral), o adesivo transdérmico substiuído no intervalo adequado e o diafragma aplicado e retirado respeitando o tempo necessário em todas as relações. Considerando esse compromisso com a adesão e a grande ocorrência de falhas nos métodos por esquecimento ou por negligência, os métodos de longa duração são indicados para as adolescentes. Ainda existe bastante preconceito, mas não há nenhuma contraindicação para a inserção de DIU ou de implante intradérmico. Esses são métodos eficazes e devem ser ofertados para as meninas. Para finalizar, segue uma lista de orientações importantes a serem repassadas para os adolescentes a respeito dos cuidados necessários com a camisinha masculina e feminina: armazenar a camisinha em local seco e arejado; não expôr a camisinha ao sol; Anticoncepção na adolescência8 não guardar o preservativo em locais que possam danificar sua emba- lagem, como, por exemplo, carteira, bolso, agenda e mochila; não utilizar objetos cortantes para a abertura da embalagem; deve-se utilizar o picote na lateral do pacote; não utilizar lubrificantes oleosos (vaselina e manteiga) junto com a camisinha; não usar duas camisinhas ao mesmo tempo (duas masculinas, duas femininas ou uma masculina + uma feminina), pois o risco de rompi- mento é aumentado; verificar o prazo de validade do preservativo; observar, antes do uso, se a embalagem não está furada. DATASUS. SINASC-Sistema de Informações de Nascidos Vivos. 2008. Disponível em: datasus. saude.gov.br. Acesso em: 26 mar. 2019. DECHERNEY, A. H. et al. Current diagnóstico e tratamento: ginecologia e obstetrícia. 11. ed. Porto Alegre: AMGH, 2014. PASSOS, E. P. et al. Rotinas em ginecologia. 7. ed. Porto Alegre: Artmed, 2017. REIS, R. M. Ginecologia da infância e adolescência. Porto Alegre: Artmed, 2012. 9Anticoncepção na adolescência