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LIBRAS BÁSICO PARA SERVIDORES PÚBLICOS 2016 Governador Paulo Henrique Saraiva Câmara Secretário de Administração Milton Coelho Secretária Executiva de Pessoal e Relações Institucionais – SAD Marília Raquel Simões Lins Diretora do Centro de Formação do Servidor Público – CEFOSPE Analúcia Mota Vianna Cabral Coordenadora de Educação Corporativa – SAD Priscila Viana Canto Matos Diretor da Academia Integrada de Defesa Social – ACIDES Manoel Caetano Cysneiros de A. Neto Diretora da Escola Fazendária de Pernambuco – ESAFAZ Vânia Arruda Alencar Pernambuco Diretora da Escola Penitenciária de Pernambuco – EPPE Charisma Cristina Alves Tomé Belo Apostila elaborada por: Maria do Carmo Nascimento Lins Pós-graduada em LIBRAS Mestranda em Educação 4 PLANO DO CURSO 1. Nome do curso: LIBRAS BÁSICO PARA SERVIDORES PÚBLICOS 2. Público-alvo: Servidores Públicos 3. Objetivo de Aprendizagem: Ao final do curso o servidor será capaz de promover atendimento de qualidade aos surdos. 4. Planejamento do Curso: 4.1. Carga Horária: 40 horas/aula 4.2. Conteúdo Programático: História da Educação dos Surdos; Cultura e Identidade surda; Gramática e Direitos dos Surdos. 5. Metodologia: 5.1. Metodologia de Ensino: Aulas expositivas, Vídeos, Apostila, Dinâmicas, Práticas diárias. 5.2. Metodologia de Avaliação: Ao final das aulas terão atividades avaliativas, ao final do curso haverá uma prova e uma dramatização. 5 SUMÁRIO Capítulo 1 História da Educação dos Surdos Capítulo 2 Aspectos Linguísticos 2.1 Variação Linguística 2.2 Estrutura Gramatical 2.3 Formação das Frases 2.4 Flexão de Gêneros 2.5 Adjetivos 2.6 Sistema pronominal 2.7 Advérbios 2.8 Verbos 2.9 Classificadores 3.0 Tipos de frases 3.1 Números 3.2 Valores monetários Capítulo 3 Identidade e Cultura Surda Capítulo 4 Direitos dos Surdos 6 MÓDULO I 7 HISTÓRIA DA LÍNGUA DE SINAIS IDADE ANTIGA A surdez era vista como uma patologia, que incapacitava o surdo de raciocinar, exercer sua cidadania, casar, constituir patrimônio, tomar decisões. A Igreja Católica considerava que suas almas não eram imortais porque não tinham condições de pronunciar os sacramentos. Segundo a visão aristotélica, a linguagem era o que dava condição de humano ao indivíduo. Como os surdos não desenvolviam linguagem eram considerados então como não humanos. Os surdos tinham um destino pré-determinado; eram condenados a sofrer a mesma morte reservada aos retardados ou deformados; morriam asfixiados ou tinham a garganta cortada, ou eram lançados no precipício, no mar. A ideia negativa de que os surdos não eram educáveis persistiu até o século XV, sendo mantidos à margem da sociedade, sem seus direitos assegurados. No Sistema Romano, os surdos eram privados de seus direitos legais. Entre os Egípcios e os Persas, o seu destino era assunto de interesse religioso, pois sua debilidade era considerada sinal dos deuses. Tem-se pouca referência com relação aos surdos e a sua educação. No final da idade média, iniciou-se um processo de reconhecimento do surdo como ser social. Inicialmente, a educação se processava com um professor que ensinava os surdos a falar, ler e escrever, para que pudessem adquirir os direitos legais aos títulos e à herança da família (visão preceptora). Posteriormente, essa educação tornou-se institucionalizada (em escolas). IDADE MODERNA Surgiram os primeiros educadores que influenciaram na concepção de como os surdos são concebidos e educados até os dias atuais. SÉCULO XVI O monge beneditino Ponce de León (1520-1584) foi considerado o primeiro professor de surdos da história, e esse período foi considerado o verdadeiro início da educação. Dedicou-se a educar os surdos, filhos de nobres e de famílias de poder aquisitivo alto (Sec. XVI), para que tivessem acesso aos direitos de herança, o que só aconteceria, caso pudessem falar. Para tanto, utilizava uma metodologia que fazia uso de datilologia (representação manual das letras do alfabeto), escrita e oralização (comunicação através da fala), tendo criado também uma escola para professores de surdos. SÉCULO XVIII Surge no cenário Charles Michel de L’epée (1750), abade francês, que desenvolve um trabalho com os surdos nas ruas de Paris. Observou que os surdos se comunicavam por um conjunto de gestos com significados funcionais. Utilizando-se dos gestos, desenvolveu estratégias pedagógicas diferenciadas. A metodologia e os resultados eram registrados e divulgados com a expectativa de que a sociedade compreendesse que o desenvolvimento intelectual dos surdos dependia, essencialmente, de um canal de comunicação, O GESTUAL. 8 No século XVIII, o abade prosseguia com seu trabalho de educação dos surdos pelas ruas de Paris, usando a língua de sinais para ensiná-los. Criou o Instituto Nacional para Surdos- Mudos, a primeira escola a obter apoio público. Formou diversos professores para surdos que criaram vinte e uma escolas na França e no resto da Europa. L’epée foi considerado o pai dos surdos, e a corrente filosófica defendida por ele denominou- se GESTUALISTA. A corrente filosófica que surge com muita força denominou-se ORALISTA, baseada nas ideias de SAMUEL HEINICK. Este defendia que os surdos precisavam desenvolver a competência linguística oral e o comportamento dentro dos padrões “normais”. Samuel Heinick, importante pedagogo e professor alemão, defendia que o desenvolvimento cognitivo tinha origem no uso da palavra e trabalhava com os surdos a produção da fala. Era reprimido tudo o que fizesse lembrar que os surdos não podiam falar como os ouvintes, a fim de que eles fossem aceitos socialmente. Nesse processo, ficaram fora da possibilidade de desenvolvimento educacional, pessoal e integração com a sociedade, obrigando-os a se organizarem de forma clandestina. Heinick fundou a primeira escola pública que utilizava apenas a língua oral na educação das crianças surdas, considerando essa situação ideal para inseri-las na comunidade de ouvintes. Esse método foi adotado por quase todos os países de língua alemã. Surge, então, outra corrente pedagógica referente à metodologia para ensinar os surdos...9 Na segunda metade do século XVIII, existiam, basicamente, dois métodos de ensino de surdos: MÉTODO FRANCÊS DE L’EPÉE Surgido em Paris, Baseando-se na Língua de Sinais. MÉTODO ALEMÃO DE HEINECK Originado em Hamburgo e Leipzig, enfatizava o desenvolvimento da oralização. SÉCULOS XVIII E XIX Thomas Gallaudet (1787-1851), professor americano, passou a dedicar-se ao estudo da surdez, com o intuito de criar uma escola pública para surdos nos Estados Unidos. Viajou para a Europa a fim de aprender o método de Bradwood, bastante difundido nos Estados. Tomou conhecimento, também, do método desenvolvido por L’Epée e viajou à França, realizando estágio no Instituto Nacional para Surdo-Mudo, onde aprendeu o método e a Língua de Sinais com Laurent Clerc (1785-1869). Este frequentou o Instituto desde os 12 anos de idade como aluno, tornando-se, depois, professor de surdos. Posteriormente, Gallaudet contratou Clerc para trabalharem juntos e, no ano de 1916, fundaram a primeira escola pública para surdos nos Estados Unidos. TERRÍVEL MARCO HISTÓRICO 10 IDADE CONTEMPORÂNEA Um evento gerou uma radical mudança nos rumos da educação dos surdos. Considerado um marco histórico, no ano de 1880, em Milão, ocorreu o I Congresso Internacional de Educadores de Surdos. Esse evento foi organizado por uma maioria oralista com o propósito de fortalecer suas convicções. Assim, o método alemão ganhava, aos poucos, a adesão dos países europeus. As discussões do Congresso foram realizadas por meio de debates acalourados, momentos em que se apresentaram muitos surdos que falavam bem, com exceção da delegação americana (apenas 05 membros) e de um professor britânico. A única oposição clara ao oralismo foi apresentada por Gallaudet, baseada na metodologia de L’Epée. Todos os participantes, em sua maioria europeia e ouvintes, votaram, e, por aclamação, venceu a metodologia oralista. A língua de sinais foi banida e considerada um perigo para o desenvolvimento da linguagem oral, e os professores surdos foram expulsos das escolas. A interdição durou 100 anos SÉCULOS XIX E XX O Oralismo permaneceu sem grandes questionamentos, porém, após algumas décadas de trabalho, havia uma grande insatisfação com os resultados da fala dos surdos. A maioria dos surdos profundos, além de não revelar uma comunicação oral satisfatória, não apresentava desenvolvimento na leitura nem na escrita, provocando um visível fracasso da metodologia. 11 SÉCULO XX O descontentamento com o Oralismo tomava conta do cenário educacional. A falta de socialização dos surdos e os pequenos progressos apresentados induziram a novos questionamentos sobre a educação dos surdos e surgiram novas propostas pedagógico- educacionais em relação à educação da pessoa surda e volta ao cenário a perspectiva sobre o uso da língua de sinais. A Língua de Sinais foi estudada por meio das pesquisas de William Stokoe, em 1960 sendo demonstrado que a Língua Americana de Sinais (ASL) apresentava todas as características das línguas orais. Após a publicação de Stokoe, na década de 70, cresceram as pesquisas voltadas para a Língua de Sinais e sua aplicação na educação e na vida dos surdos. A grande insatisfação que pairava sobre o cenário educacional, desde os educadores até os surdos deu origem a experiências envolvendo tanto a língua de sinais como outros métodos manuais, desde que propiciassem uma melhor comunicação entre ouvintes e não ouvintes. Nessa época, Dorothy Schifflet, que era professora e mãe de um surdo, iniciou uma nova metodologia de ensino e introduziu língua de sinais, língua oral, leitura labial, treino auditivo e alfabeto manual, denominado “Total Aproach”. Posteriormente, Roy Holcom adotou esse trabalho e o rebatizou de Total Communication, dando origem à filosofia da Comunicação Total. Como ainda não havia uma metodologia única, muitas eram as experiências desenvolvidas com os surdos. A Universidade Gallaudet, que utilizava o inglês sinalizado, adotou a Comunicação Total e se tornou o maior centro de pesquisa dessa nova filosofia. UM NOVO HORIZONTE 12 COMUNICAÇÃO TOTAL A tendência ganhou impulso nos anos 70; a junção de métodos era permitida, como a língua de sinais, leitura orofacial, amplificação e datilologia a fim de fornecer inputs linguísticos para estudantes surdos, podendo eles se expressarem mediante a modalidade a que melhor se adaptassem. Os profissionais que adotaram a filosofia em questão percebiam os surdos não como portadores de uma patologia, mas sim, como uma pessoa capaz de se desenvolver e superar suas limitações. O objetivo é desenvolver uma comunicação real entre os surdos e os seus familiares, professores e coetâneos, para que eles possam construir seu mundo e suas convicções internamente. A oralização não é o objetivo em si da comunicação total, mas uma das áreas trabalhadas para possibilitar a integração social do indivíduo surdo. 13 Após a euforia do momento inicial e análises avaliativas, observou-se que os surdos ainda apresentavam sérias dificuldades para expressar sentimentos e ideias e comunicar-se em contextos extraescolares. Referente à escrita, os problemas apresentados continuam a ser muito importantes, sendo que poucos sujeitos alcançam autonomia nesse modo de produção de linguagem, sendo poucos os casos bem-sucedidos. E sobre os sinais, estes ocupam um lugar meramente acessório de auxiliar da fala, não havendo um espaço para seu desenvolvimento. SÉCULO XX A Comunicação Total proporcionou maior resultado positivo que o oralismo, a observância aos aspectos do desenvolvimento cognitivo dos surdos, a convocação dos familiares em prol da educação dos filhos surdos. A filosofia vigente, porém, não privilegia o fato de a língua de sinais ser a língua natural dos surdos; não privilegia o fato de ser um fenômeno natural da comunidade surda nem sua carga cultural, inserindo recursos artificiais com o intuito de facilitar a interação. Isso gera, em alguns casos, uma certa desordem na comunicação, uma vez que o domínio dos recursos depende da habilidade individual de cada um, o que torna a codificação confusa. No final da década de 70, alguns educadores adotaram a Língua de Sinais, independentemente da língua oral; com isso, o surdo deveria utilizar, em determinados momentos, a Língua de Sinais e, em outros, a língua oral. Surgiu, então, a proposta do Bilinguismo a partir da década de 80, ganhando adeptos em todos os países do mundo. A reivindicação dos surdos para se comunicarem por meio da Língua de Sinais tem sua legitimidade construída a partir dos anos 1960, quando as pesquisas das neurociências começaram a oferecer as bases científicas que atribuíam às Línguas de Sinais o papel de único instrumento capaz de atender as necessidades comunicativas dos surdos (RAMOS, 2011). Os avanços dos estudos de neuroimagens por meio de exames, como a ressonância magnética funcional e a tomografia computadorizada, por exemplo, permitiram analisar a atividade sináptica das diversas regiões cerebrais, possibilitando a observação em tempo real da funcionalidade do cérebro.AJUDA DA COMUNIDADE CIENTÍFICA 14 Fonte: Freitas (2012) Pelas imagens, é possível se verificar a similaridade funcional das áreas da linguagem em surdos e ouvintes que utilizam a língua de sinais e a língua oral. Estudos como esse contribuíram para o reconhecimento das línguas de sinais como línguas independentes. Nesse sentido, as análises sobre os aspectos funcionais da linguagem têm demonstrado que, embora pertençam a modalidades diferentes, as línguas orais e as de sinais apresentam funcionamento análogo entre si, ativando as mesmas estruturas cerebrais tanto para produção quanto para compreensão das mensagens. Esses achados científicos contribuíram, de forma sistemática, para a compreensão do status linguístico das línguas de sinais e, em consequência, para o surgimento de outra abordagem educacional denominada “bilinguismo”. O Bilinguismo consiste numa proposta sócio-antropológica da surdez, que se baseia na condição bilíngue e bicultural do surdo, que convive, em seu dia a dia, com duas línguas: a língua de sinais e a língua oral de seu país, e duas culturas: a cultura da comunidade surda e a da comunidade ouvinte de seu país (QUADROS, 2006). UMA NOVA FILOSOFIA... 15 O conceito central da educação bilíngue afirma que os surdos formam uma comunidade com cultura e linguagem próprias. Apresenta uma filosofia diferente do modelo oralista, porque considera o canal viso-gestual de fundamental importância para a aquisição de linguagem da pessoa surda. Diferencia-se também do modelo da comunicação total porque defende um espaço efetivo para a língua de sinais no trabalho educacional. O Bilinguismo defende que cada língua apresentada possui características próprias não devendo nunca ser misturadas. A proposta é que sejam ensinadas duas línguas: a língua de sinais como língua materna, e a outra do grupo ouvinte majoritário, língua país. IMPORTANTE O objetivo da educação bilíngue é propiciar à criança surda o desenvolvimento cognitivo- linguístico equivalente ao observado na criança ouvinte, que possa desfrutar de uma relação harmoniosa também com ouvintes, tendo acesso às duas línguas (sinais e majoritária). A A língua de sinais estará sempre um pouco mais desenvolvida e adiante da língua falada, de modo que a competência linguística na língua de sinais servirá de base para a competência na aquisição da língua falada. Trata-se da aprendizagem de uma língua por meio da competência em outra língua, modelo natural dos ouvintes, quando aprendem uma segunda língua. A base é sua língua materna. 16 filosofia em questão busca otimizar a relação entre o adulto surdo e a criança, abrindo um caminho para o processo de construção de uma autoimagem positiva como sujeito surdo, sem perder a possibilidade de se integrar a uma comunidade de ouvintes. São poucos os países que implantaram a educação bilíngue. A aplicação prática não é simples e exige cuidados especiais, formação de profissionais habilitados e diferentes instituições envolvidas. Projetos realizados em diversas partes do mundo, como Suécia, Estados Unidos, Venezuela e Uruguai, têm princípios filosóficos semelhantes, embora se diferenciem em alguns aspectos metodológicos. Diante desse panorama, é possível constatar que, de alguma maneira, as três principais abordagens de educação de surdos, Oralista, Comunicação total e Bilinguismo, coexistem com adeptos de todas elas nos diferentes países. Cada uma delas possui sua história, uma ideologia, cada qual com seus prós e contras, embora não seja possível se instituir uma metodologia sem levar em consideração os aspectos que propiciam o desenvolvimento humano. Como podemos observar as línguas de sinais são faladas em todo o mundo, para exemplificar temos: comunidade surda britânica utiliza a British Sign Language (BSL); a francesa, a Language Française des Signes (LFS); os surdos portugueses utilizam a LSP – Língua de Sinais Portuguesa;b a comunidade estadunidense, a American Sign Language (ASL); e, claro, a comunidade surda brasileira, a Língua Brasileira de Sinais (Libras). A Língua de sinais americana, bem como a língua brasileira de sinais tiveram suas origens na língua francesa de sinais. Nos Estados Unidos, o americano Thomas Hoppins Gallaudet sensibilizado com uma garotinha surda, Alice Cogswell de 8 anos, viaja à Europa em busca de novos métodos para ajudar o desenvolvimento educacional desta menina, visto que não confiava muito nos métodos para oralizar pessoas surdas que existiam naquela época no país. No Brasil, em 1855 um surdo francês, Ernest Huet, em comum acordo com o imperador Dom Pedro II, chaga ao país e cria a primeira escola nacional de surdos, atualmente o Instituto Nacional de Educação de Surdos – INES na cidade do Rio de Janeiro Em 1855, a partir da iniciativa do imperador Dom Pedro II, o professor surdo francês Edward Huet, iniciou, no Brasil, um trabalho de educação de duas crianças surdas, com bolsas de estudo pagas pelo governo. Em 26 de setembro de 1857, foi fundado o Instituto Nacional de Surdos-Mudos, atual Instituto Nacional de Educação dos Surdos - INES, que utilizava a língua de sinais em seus procedimentos educacionais. Em 1911, no Brasil, o INES, seguindo a tendência do Congresso de Milão, estabeleceu o oralismo puro em todas as disciplinas. Ainda que não fosse a metodologia mais adequada, era a primeira vez que os surdos estavam alcançando alguma visibilidade, considerando que antes eram condenados a uma vida de clausura e descaso. Apesar de todas as proibições, a língua de sinais sempre foi utilizada pelos alunos nos pátios e corredores da escola. HISTÓRIA DA EDUCAÇÃO DE SURDO NO BRASIL 17 A filosofia da Comunicação Total chegou ao Brasil, no final dos anos 70, após a visita de Ivete Vasconcelos, educadora de surdos da Universidade de Gallaudet. O INES adotou a Comunicação Total como metodologia para o ensino de suas turmas. Na década seguinte, baseado nas pesquisas da linguista Lucinda Ferreira Brito sobre a Língua Brasileira de Sinais (LIBRAS), o Bilinguismo tem início, passando a ser implantado em algumas escolas e clínicas brasileiras, na década de 90. SÉCULO XXI Nesse século, houve o reconhecimento da Língua Brasileira de Sinais (Libras), como língua da comunidade surda brasileira, através da Lei N O 10.436, de 24 de abril de 2002. O Brasil se tornou Estado-parte e país signatário dos principais acordos e convenções internacionais que estabelecem medidas de respeito aos Direitos Humanos, em um esforço significativo para a prevenção e eliminação do preconceito, em relação às pessoas com deficiência e para a promoção da acessibilidade e da inclusão social. Realizou-se em Salamanca, na Espanha, a Conferência Global sobre Educação Inclusiva, no período de 21 a 23 de outubro de 2009, com a participação de 58 países, além do Brasil. Nessa conferência foi produzida a Declaração de Salamanca. A DECLARAÇÃO ENFATIZA DUAS DIRETRIZES: Transformar os sistemas de ensino para que acolham todas as crianças; Eliminar a discriminação no acesso à educação. O foco são os Princípios, a Política e a Prática em Educação Especial. Trata-se de uma resolução das Nações Unidas, adotada em Assembleia Geral, a qual apresenta os Procedimentos-Padrõesdas Nações Unidas objetivando a Equalização de Oportunidades para Pessoas Portadoras de Deficiências. A Declaração de Salamanca é considerada mundialmente um dos mais importantes documentos que visam à inclusão social, juntamente com a Convenção sobre os Direitos da Criança (1988) e da Declaração Mundial sobre Educação para Todos (1990). O Instituto Nacional de Educação de Surdos - INES tornou-se órgão do Ministério da Educação - MEC, tendo como missão institucional a produção, o desenvolvimento e a divulgação de conhecimentos científicos e tecnológicos na área da surdez, em todo o território nacional. 18 Ainda referente às missões, deve também subsidiar a Política Nacional de Educação, na perspectiva de promover e assegurar o desenvolvimento global da pessoa surda, sua plena socialização e o respeito às suas diferenças. NOSSO OUVIDO OUVIDO EXTERNO: Orelha e canal auditivo com a membrana timpânica no fundo do canal. OUVIDO MÉDIO: 03 ossículos (martelo, bigorna, estribo) e a abertura da tuba auditiva. OUVIDO INTERNO (labirinto): aparelho vestibular (equilíbrio) e cóclea (audição). 19 SURDEZ Diminuição da capacidade de percepção normal dos sons, sendo considerado surdo o indivíduo cuja audição não é funcional na vida comum, e parcialmente surdo aquele cuja audição, ainda que deficiente, é funcional com ou sem prótese auditiva. Essa diminuição pode ser de nascença ou causada posteriormente por doenças. POSSÍVEIS CAUSAS PRÉ-NATAIS A criança adquire a surdez por mieo da mãe, no período de gestação. PERINATAIS Problemas no parto PÓS-NATAIS Problemas após o nascimento Desordens genéticas ou hereditárias relativas à consanguinidade ou ao fator Rh.. Pré-maturidade Remédios ototóxicos em excesso ou sem orientação. Doenças infectocontagiosas, como rubéola, sífilis, toxicoplasmose, herpes. . Anóxia Exposição contínua a ruídos ou sons muito altos. Remédios ototóxicos, drogas, alcoolismo materno, exposição à radiação. Fórceps Sífilis adquirida. .Desnutrição/Subnutrição, Carências alimentares. Infecção hospitalar Diabetes, pressão alta.. GRAU DE PERDA O Decreto nº 3.298, de 20 de dezembro de 1999, versa, em seu Art. 4º, que a pessoa portadora de deficiência deve se enquadrar em uma das seguintes categorias: PARCIALMENTE SURDO Surdez leve 25 a 40 dB Surdez moderada 41 a 55 dB Surdez acentuada 56 a 70 dB SURDO Surdez severa 71 a 90 dB Surdez profunda Acima de 91 dB Anacusia 20 ATENÇÃO UMA BREVE EXPLICAÇÃO DESINFORMAÇÃO Algumas pessoas acreditam que a comunicação gestual é um conjunto aleatório de gestos que possibilitam uma comunicação qualquer. O QUE É A LÍNGUA BRASILEIRA DE SINAIS LIBRAS, ou Língua Brasileira de Sinais, é a língua materna dos surdos brasileiros. Como língua possui um sistema altamente estruturado, constituído de toda a complexidade gramatical das línguas faladas, regras bem definidas e vários níveis de estrutura linguística, como morfologia, sintaxe, semântica, pragmática, sendo também dotada de riqueza lexical e variações linguísticas. Apenas na década de 60, as línguas de sinais passaram a ocupar um status linguístico. Os itens lexicais, que nas línguas orais são denominados palavras, na língua de sinais, são denominados “sinais”; estes possuem duas formas: icônicos ou arbitrários e conseguem, devidamente aplicados dentro das regras da língua de sinais, descrever toda a complexidade do pensamento humano. A comunidade surda também não é simpática ao termo deficiente auditivo, pois remete à incapacidade, preferem que os chamem de surdos.. 21 NA LÍNGUA ORAL: PALAVRAS NA LÍNGUA DE SINAIS: GESTOS GESTOS PODEM SER: ICÔNICOS - reproduzem a imagem. ARBITRÁRIOS -Não reproduzem a imagem. CURIOSIDADES QUAL O CORRETO? ( ) Língua dos sinais ( ) Língua de sinais Trata-se de uma língua viva e, portanto, a quantidade de sinais está em aberto, possibilitando o acréscimo de novos sinais. LÍNGUA DE SINAIS COMO CHAMAR ATENÇÃODOS SURDOS... Toque-o no ombro Apague e acenda a luz Levante a mão discretamente 22 QUANDO SURGIU O PRIMEIRO LIVRO? O 1º livro em inglês, que descreve a língua de sinais, foi escrito por J. Bulwer, datado de 1644 (Ramos, 2011), quase quatro mil anos após o surgimento dos primeiros livros. LEITURA LABIAL Nem todo surdo faz leitura labial; estima-se que o surdo só compreende 20% da mensagem. ?O QUE É DATILOLOGIA...? É a soletração de uma palavra, utilizando-se o alfabeto manual de sinais ou alfabeto digital. O uso da datilologia não substitui o uso dos sinais. 23 MÓDULO II 24 ASPECTOS LINGUÍTICOS Ainda hoje, erroneamente, as línguas de sinais são vistas apenas como um conjunto de pantomimas, uma combinação de gestos que permitem aos seus usuários uma comunicação rudimentar (HICKOK; BELLUGI&KLIMA, 2001 apud BRASIL, 2011). Existe também, a visão equivocada de que os surdos comunicam-se, escrevendo no ar as palavras da língua oral por meio do alfabeto digital. As línguas de sinais são sistemas altamente estruturados, constituídos de toda a complexidade gramatical das línguas faladas, regras próprias e vários níveis de estrutura linguística, como morfologia, sintaxe, semântica, pragmática, além de serem dotadas de riqueza lexical e de sofrerem variações linguísticas. Embora seja uma língua articulada espacialmente, lugar onde são constituídos seus mecanismos fonológicos, morfológicos e sintáticos, certifica-se que as línguas de sinais são icônicas e arbitrárias e que as formas icônicas não são universais. Trata-se, portanto, de uma língua que possui os mesmos universais linguísticos das línguas orais, caracterizando a formação dos sinais a partir dos fonemas e morfemas. Percebe-se, ainda, por meio da sua morfologia e sintaxe, o seu caráter flexional, complexo e econômico na produção e articulação das frases.(SOUSA, 2010). VARIAÇÃO LINGUÍSTICA Em todo o mundo, há comunidades surdas, que usam a língua de sinais amplamente diferente daquela da língua falada utilizada na mesma área geográfica. Isso comprova que as línguas de sinais são independentes das línguas orais, uma vez que foram produzidas dentro das comunidades surdas. A Língua de Sinais Americana é diferente da Língua de Sinais Britânica que é diferente da Língua de Sinais Francesa. (ASL) (BSL) (LSF) 25 Exemplo: a palavra NOME ASL LIBRAS A LIBRAS APRESENTA VARIAÇÃO REGIONAL Exemplo: VERDE Rio de JaneiroSão Paulo Curitiba A LIBRAS APRESENTA VARIAÇÃO SOCIAL Exemplo: AJUDAR (ambos os sinais estão corretos) 26 A LIBRAS APRESENTA MUDANÇAS HISTÓRICAS Com o passar do tempo, um sinal pode sofrer alterações. Exemplo: AZUL AS LÍNGUAS SÃO DIVIDIDAS EM DUAS MODALIDADES ORAL-AUDITIVA ESPAÇO-VISUAL Significa que a mensagem é transmitida através da fala (boca) e recebida através da audição Significa que a mensagem é transmitida através do espaço (mãos que se mexem no espaço) e recebida através da visão LÍNGUA DE SINAIS 27 A LÍNGUA BRASILEIRA DE SINAIS É UMA LÍNGUA DE MODALIDADE GESTUAL- VISUAL-ESPACIAL. DEVIDO À NATUREZA LINGUÍSTICA, A REALIZAÇÃO DE UM SINAL PODE SER MOTIVADA PELAS CARACTERÍSTICAS DO DADO DA REALIDADE A QUE SE REFERE, EMBORA ISSO NÃO É UMA REGRA. Os itens lexicais, que nas línguas orais são denominados de palavras, nas línguas de sinais, são denominados “sinais”. LÍNGUAS ORAIS LÍNGUA DE SINAIS Os sinais podem ser icônicos ou arbitrários, sendo capazes de descrever toda a complexidade, concretude e abstração inerentes ao pensamento humano. Exemplo: TELEFONE BORBOLETA Exemplo: CONVERSAR DEPRESSA Um sinal é considerado icônico quando reproduz a imagem do referente. Um sinal é considerado arbitrário quando não possui nenhuma semelhança com o referente. 28 29 ESTRUTURA GRAMATICAL PARÂMETROS A LIBRAS tem sua estrutura gramatical organizada a partir de cinco parâmetros, que estruturam sua formação nos diferentes níveis linguísticos. São cinco elementos que se combinam de forma sequencial para a composição dos sinais: CONFIGURAÇÃO DE MÃOS Consiste na forma que a mão assume durante a realização de um sinal, trata-se da unidade mínima de realização do sinal, comparando com a língua oral a configuração de mão é o fonema. São 64 configurações. 1. Configuração de mãos 2. Ponto de articulação 3. Movimento 4. Direção 5. Expressão facial 30 Exemplo: Nas palavras veado e ontem, podemos observar que a configuração das mãos é diferente em cada uma delas. Veado ontem PONTO DE ARTICULAÇÃO É o espaço frente ao corpo ou em uma região do próprio corpo onde os sinais são executados. Podem ser realizados diante do corpo, próximo ou tocando uma região. Exemplo: A palavra trabalho tem o ponto de articulação no espaço neutro 31 As palavras abaixo diferem apenas em relação ao local do ponto de articulação. Observe que cada uma das figuras significa diferentes palavras. região do peito frente à boca frente à testa (A configuração de mão e o movimento são iguais, sendo o ponto de articulação diferente, alterando totalmente o significado.). MOVIMENTO Os sinais podem ou não ter movimento, que consiste no deslocamento da mão no espaço, durante a realização do sinal, podendo ser em linha reta, curva ou circular, realizado no espaço ou sobre o corpo. Galinha Homem 32 TIPOS DE MOVIMENTO RETILÍNEO: ENCONTRAR ESTUDAR PORQUE Helicoidal: ALT@ MACARRÃO AZEITE 33 Circular: BRINCAR IDIOTA BICICLETA Semicircular: SURD@ SAP@ CORAGEM 34 Sinuoso: BRASIL RIO NAVIO Angular: RAIO ELÉTRICO DIFÍCIL 35 DIREÇÃO Durante a realização do sinal, a palma da mão assume uma direção: para cima, para baixo, para frente, para a direita ou esquerda, para o corpo. A inversão de um sinal pode significar oposição 36 EXPRESSÃO FACIAL Devido à modalidade viso-espacial da língua de sinais, as expressões faciais possuem uma função decisiva na língua de sinais, pois substituem a entonação da voz usada na pontuação das sentenças afirmativas, negativas, interrogativas e exclamativas. O sinal precisa da expressão facial para ter seu significado completo. 37 ESTRUTURA SINTÁTICA FORMAÇÃO DAS FRASES A ordem das frases em língua de sinais obedece a regras próprias, que refletem a forma pela qual o surdo processa suas ideias, baseando-se em sua percepção visual-espacial da realidade. OBSERVE A ESTRUTURA SINTÁTICA DA LÍNGUA PORTUGUESA: Exemplos: Eu gosto de rosa Eu vou de carro OBSERVE A ESTRUTURA SINTÁTICA DA LÍNGUA DE SINAIS: Exemplos: Libras: EU IR CASA Português: EU IREI PARA CASA (para - não se usa em LIBRAS, porque está incorporado ao verbo). Libras: IDADE VOCÊ + expressão facial de interrogação Português: QUANTOS ANOS VOCÊ TEM? FLEXÃO DE GÊNERO Não há flexão de gênero em Libras; quando é preciso explicitar o sexo, acrescenta-se o sinal homem ou mulher. Substantivos e adjetivos não são marcados. Adjetivos, artigos, pronomes e numerais não apresentam flexão de gênero, apresentam-se em forma neutra. A forma de representação gráfica é @ Exemplo: namorad@, gat@, fri@,amig@, pouc@, macac@. A língua de sinais não possui conectivos, artigos ou preposições. Os verbos são no infinitivo. Os verbos de ligação são desconsiderados. Obedece à ordem sujeito+verbo+objeto (SVO) 38 ADJETIVOS Sempre estará de forma neutra, não havendo marcador para masculino e feminino nem para singular e plural. Os adjetivos estarão posicionados na frase, após o substantivo que qualifica. Ex: Blusa azul boit@ Menin@ bonit@ Gord@ Magr@ SISTEMA PRONOMINAL PRONOMES PESSOAIS A Libras apresenta três pessoas do discurso: Primeira pessoa Segunda pessoa Terceira(s) pessoa(s) EU TU ELE/ELES Observe o quadro SINGULAR DUAL TRIAL QUATRIAL PLURAL Conf mão: G Conf mão: K ou V Conf mão: W Conf mão: 54 Conf mão: Pessoa do discurso + Foto sinal grupo Para todas as pessoas, o sinal é o mesmo, o que diferencia é a orientação das mãos. A mão ficará em formato de dois. A mão assume o formato de três. O formato da mão será de quatro. Sinal composto: pessoa do discurso no singular + sinal de grupo.39 PRIMEIRA PESSOA Primeira do singular: EU - apontar para o peito do enunciador - a pessoa que fala Primeira do plural: NÓS 2, NÓS 3, NÓS 4 - GRUPO NÓS - TOD@ NÓS Dual: mão em formato de dois Trial: mão em formato de três Quatrial: mão em formato de quatro Plural: NÓS - GRUPO NÓS - TOD@ 40 SEGUNDA PESSOA Segunda do singular: VOCÊ - aponta para o interlocutor - a pessoa com quem se fala Segunda do plural: VOCÊ 2, VOCÊ 3, VOCÊ 4, VOCÊ - TOD@ VOCÊS – GRUPO 41 TERCEIRA PESSOA Terceira do singular: EL@ - aponta para uma pessoa que não está na conversa ou para um lugar convencionado para uma pessoa Terceira do plural: EL@2, El@ 3, El@ 4, El@s/El@s-todos, El@s-GRUPO. Quando se quer falar de uma terceira pessoa presente, mas se deseja ser discreto, por educação, não se aponta para essa pessoa diretamente. Ou se faz um sinal com os olhos e um leve movimento de cabeça em direção à pessoa mencionada ou aponta-se para a palma da mão (voltada para a direção onde se encontra a pessoa referida). 42 RESUMO 1ª pessoa do singular EU 1ª pessoa do plural NÓS 2 – dual NÓS 3 – trial NÓS 4 – quatrial NÓS – tod@ (plural) NÓS – grupo 2ª pessoa do singular VOCÊ 2ª pessoa do plural VOCÊ 2 VOCÊ 3 VOCÊ 4 VOCÊ - TOD@ 3ª pessoa do singular EL@ 3ª pessoa do plural EL@2 El@ 3 El@ 4 El@s/El@s-todosEl@s- GRUPO PRONOMES DEMONSTRATIVOS PRONOMES DEMONSTRATIVOS E ADVÉRBIOS DE LUGAR Estão relacionados às pessoas do discurso e representam o que está bem próximo, perto ou distante. Eles possuem a mesma configuração de mãos dos pronomes pessoais, e o que vai fazer a diferença são os pontos de articulação e a orientação do OLHAR. Configuração de mão [G] EST@ / AQUI - olha para a coisa ou lugar apontado, perto da 1ª pessoa. ESS@ / AÍ - olha para a coisa ou lugar apontado, perto da 2ª pessoa. AQUEL@ / LÁ - olha para a coisa ou lugar distante apontado. 43 Vamos observar e comparar por meio da tabela Pessoa do discurso Pronome Demonstrativo Advérbio de lugar Localidade 1ª EU Est@ Aqui bem próximo 2ª VOCÊ Ess@ Aí perto 3ª ELE Aqul@ Lá distante PRONOMES POSSESSIVOS Não possuem marca para gênero, estando relacionados às pessoas do discurso e não, à coisa possuída, como acontece em Português. Os pronomes possessivos se relacionam com: 1ª pessoa m@ - Pode haver duas configurações de mãos: A primeira configuração é a mão aberta com os dedos juntos e batendo levemente no peito da pessoa que fala. A segunda configuração é a mão em P com o dedo batendo no peito, significando MEU-PRÓPRIO. 44 2ª pessoa te@ - A mão estará na configuração de P, porém o movimento é em direção à pessoa com quem se fala. 3ª pessoa se@ - A mão estará na configuração de P, porém o movimento é em direção à pessoa que está sendo mencionada. PRONOMES INTERROGATIVOS Os pronomes interrogativos QUE, QUEM e ONDE se caracterizam, essencialmente, pela expressão facial interrogativa feita simultaneamente ao pronome. São usados no início da frase. Exemplos: QUEM NASCER BRASIL? QUE GOSTAR COMER? ONDE NASCER VOCÊ? QUE e QUEM, no sentido de QUEM É ou DE QUEM É, são usados no final da frase. Exemplos : PESSOA, QUEM-É? Português: Quem é esta pessoa? CARRO DE-QUEM-É? Português: De quem é este caderno? QUANDO: a pergunta com quando está relacionada a um advérbio de tempo (hoje, amanhã, ontem) ou está relacionado a um dia específico. É preciso observar que há 3 sinais diferentes para QUANDO: 1- Que se refere ao passado Ex: El@ viajar Rio de Janeiro quando-passado? 2- Que se refere ao futuro Ex: El@ viajar Rio de Janeiro quando-futuro? 3- Sinal soletrado D-I-A que especifica o dia Ex: Eu convidar você para viajar. Você poder D I A? Que? Quem? Onde? Quando ? 45 Os pronomes interrogativos qual, como e para que podem ser usados no início ou final da frase, assim como POR-QUE, pois não há diferença entre o “por que” interrogativo e o “porque” explicativo. O contexto da frase e as expressões faciais vão direcionar o conteúdo da frase. Qual ? Qual (comparativo) Qual (comparativo) Como? Para que? QUAL COMO PARA QUE 46 QUE HORAS E QUANTAS HORAS Há dois sentidos Um para horário cronológico Outro para tempo decorrido QUE HORA - TEMPO CRONOLÓGICO Que horas? Aponta para o pulso + expressão interrogativa QUE HORA Horas do dia? Sinal hora + Numeral para quantidade + expressão facial para frase interrogativa? OBS: Após 12h, começa-se a contar novamente: hora1, hora2 + sinal tarde, ou noite, ou madrugada. Exemplo: Aula começar que hora hoje? Você sair que hora? QUE HORA – TEMPO DECORRIDO Círculo ao redor do rosto+ expressão facial interrogativa. Exemplo: imagem Estudar Libras quantas-horas? OBS: hora, minuto e segundo será explicado em numeral. 47 PRONOME INDEFINIDO Pessoa nenhum ninguém/nada/nenhum ninguém/acabar Nenhum/nada/ninguém nenhum pouquinho de nada PALAVRA SENTIDO USO NINGUÉM Pessoa acabar Pessoa NINGUÉM – NADA NENHUM Mãos abertas esfregando uma sobre a outra Pessoa, animal e coisa. NENHUM – NADA Dedo polegar e indicador com formato oval e os outros dedos estendidos. A mão com movimento de balanço Pessoa, animal e coisa, e pode em alguns contextos, no sentido de ter ou não ter. NENHUM POUQUINHO Palma da mão virada para cima, juntando os dedos polegar e indicador. É um reforço para a frase negativa e pode vir após o sinal NADA. Soletrado DE N A D A Datilologia Resposta para agradecimento 48 Exemplos: Ninguém (acabar) Ter-não ninguém na sala. Nenhum Você ter telefone? Eu, nenhum telefone. Nenhum - Pouquinho El@ comer tud@ ter-não nenhum-pouquinho.ADVÉRBIOS DE TEMPO E COMO SABEREMOS A QUE TEMPO A FRASE ESTÁ SE REFERINDO? O tempo é marcado por meio dos advérbios de tempo, que indicarão o momento da ação: presente, passado ou futuro. Pode acontecer de a frase não possuir um advérbio específico, sendo mais comum em frases que estão no presente. Em frases que se refiram ao passado, pode utilizar o sinal passado ou o sinal já. Para frases no futuro, pode-se utilizar o sinal de futuro. PRESENTE Nas expressões hoje e agora o que muda são as expressões facias. AGORA HOJE Observaremos que, na Libras, não há marca de tempo nas formas verbais; a maioria dos verbos permanecerão no infinitivo. 49 PASSADO FUTURO AMANHÃ FUTURO Recapitulando: Nenhum marcador = Ideia de tempo presente Marcador de passado = Ação que foi realizada Marcador de futuro = Evento que vai ser realizado 50 Na libras, há 6 sinais, e cada um deles possui um contexto: mais mais mais (acréscimo) (soma) (exagero) mais mais mais pra lá/ (quantidade) (superlativo) falta mais DICA IMPORTANTE Sinais para “MAIS” 51 COM O OBJETIVO DE ESTUDARMOS OS VERBOS E OS TIPOS DE FRASES, SERÃO INTRODUZIDOS ALGUNS ASPECTOS PECULIARES À LÍNGUA DE SINAIS. É PRECISO ATENÇÃO, UMA VEZ QUE ESTAREMOS NOS REFERINDO A UMA MODALIDADE DE COMUNICAÇÃO VISO-ESPACIAL E, QUE MUITAS VEZES, O SIGNIFICADO DE UMA SENTENÇA DEPENDERÁ DO CONTEXTO NO QUAL ESTARÁ INSERIDA. INTENSIFICADOR E ADVÉRBIO DE TEMPO Na língua de sinais há substantivos e verbos que são representados pelo mesmo sinal, isso também acontece com alguns adjetivos. ATENÇÃO PARA COMPREENDER AS DIFERENÇAS Adjetivos e verbos podem incorporar o intensificador muito Verbos podem incorporar advérbios de modo ESSES SINAIS SE DIFERENCIAM A PARTIR DO CONTEXTO SINTÁTICO O intensificador muito e alguns advérbios de modo podem ser expressos por meio das expressões facial e corporal. Ex.: Andar lentamente / Andar rapidamente ATENÇÃO 52 Para intensificar uma ação, há uma repetição do sinal e uma incorporação de um movimento lento. Para estabelecer um modo rápido de se realizar a ação, existe uma repetição do sinal e a incorporação de um movimento acelerado. Demora Demora muito Rápido Muito rápido ALGUNS EXEMPLOS DE SINAIS COM INCORPORAÇÃO DE INTENSIFICADOR OU ADVÉRBIO DE MODO Leve – Muito leve Frio – Muito frio 53 Na Libras não há formas de flexão verbal. Há dois tipos de verbos: a) Verbos que NÃO possuem marca de concordância, verbos direcionais: É como se eles ficassem no infinitivo. Exemplo: EU MORAR RECIFE; EL@ MORAR RECIFE; EL@ MORAR RECIFE. DIVIDEM-SE EM: Ancorados no corpo: são sinais realizados em contato com o corpo Ex.: conversar gostar Verbos que incorporam o objeto: Ex.: comer: beber: Comer comer maçã beber beber água beber café b) Verbos que possuem marca de concordância, verbos direcionais: ENFIM, OS VERBOS... 54 b.1 Concordância número - pessoal – a orientação marca as pessoas do discurso; o ponto inicial concorda com o sujeito e o final, com o objeto. Exemplo: Eu aviso você Você me avisa Verbos direcionais que incorporam o objeto: Ex: Trocar b.2 Verbos classificadores - são denominados porque concordam com o sujeito ou objeto da frase. A configuração de mão marca a concordância de gênero, que pode ser pessoa, animal, coisa ou veículo. Exemplo: Pessoa andar animal andar veículo andar 55 b.3 Verbos que possuem concordância com a localização – referem-se ao local que uma pessoa, objeto, animal ou veículo estão sendo colocados, carregados ou manuseados. O ponto de articulação marca a localização. Exemplo: tesoura cortar cabelo cortar cortar unha PARA RESUMIR ESQUEMA DE CONCORDÂNCIA VERBAL NA LIBRAS Concordância número-pessoal Parâmetro orientação Concordância de gênero e número Parâmetro configuração de mão Concordância de lugar Parâmetro ponto de articulação A NEGAÇÃO Ela pode ser obtida por meio do sinal lexical NÃO, pela alteração do movimento do sinal (negação interna). Ex.: SABER e NÃO – SABER Ela também pode ser obtida pelo uso simultâneo do lexema verbal e da negação realizada com o balanceamento da cabeça para os lados. Ex.: PRECISAR e NÃO PRECISAR 56 OS CLASSIFICADORES E OS ADJETIVOS DESCRITIVOS NA LIBRAS Classificadores são uma forma pela qual a língua estabelece um tipo de concordância. Exemplo: menino – menina: a desinência classifica o gênero Na Libras, os classificadores são representados pelas configurações de mãos que, substituindo o nome que as precedem, podem vir junto de verbos de movimento e de localização para classificar o sujeito ou objeto (coisa, pessoa, animal e veículo) que está ligado à ação do verbo. Funcionam como marcadores de concordância de gênero. Fig 1 dois pessoa Fig 2 uma pessoa passando pela outra Explicando a figura: Na figura está sendo informado que existem duas pessoas e que elas estão passando uma pela outra. Observe a figura 2 o classificador de pessoas. 57 TIPOS DE CLASSIFICADORES Quanto à forma e ao tamanho dos seres (tipos de objetos): Conf mão em B - para superfícies planas, lisas ou onduladas (papel, bandeja, porta, rua, etc.) ou qualquer superfície que se possa localizar um objeto (em cima, embaixo, à direita, à esquerda, etc.); para veículos. Conf mão em V - para pessoas (uma ou mais pessoas andando, juntas ou separadas). Aorientação da palma da mão pode diferenciar o sentido do sinal, a depender da direção para onde estiver voltada em relação ao corpo. Conf mão em 4 - Pessoas (quatro pessoas andando juntas, pessoas em fila), árvores. Conf mão em Y - Pessoas gordas, veículos aéreos, objetos altos e largos, de forma irregular (jarra, peças decorativas, gancho de telefone, sapato de salto alto, chifre de touro ou vaca). Conf mão em C - objetos cilíndricos e grossos (copos, vasos, garrafas). Conf mão em G - representa objeto, pessoas, coisas. 58 Observe que as configurações de mão se repetem, o que vai determinar o sentido das sentenças será o contexto da frase. AFIRMATIVA As expressões faciais farão o papel da entonação, do sinal a que se referem: Expressão facial neutra. Ex: El@ amig@ INTERROGATIVA Sobrancelhas franzidas e movimento de cabeça inclinado para cima: Expressão facial de dúvida + sinal (qual, onde, etc) Ex: Nome qual? TIPOS DE FRASE 59 EXCLAMATIVA Sobrancelhas levantadas e movimento de cabeça para cima e para baixo: Expressão de surpresa, espanto, etc. Ex: El@ bonit@! FORMA NEGATIVA Pode ser feita de três formas: incorpora o acréscimo do sinal não na frase Ex: comer/não comer DICA: Podem em algumas situações, ser utilizados dois tipos de negação ao mesmo tempo, o movimento da cabeça + a mão em V no pescoço. NÃO-PODER 60 Incorpora o movimento contrário ao sinal realizado Ex.: Ter não ter gostar não gostar Faz um sinal negativo com a cabeça simultaneamente ao sinal que está sendo realizado. Ex: Conhecer não conhecer IMPERATIVA Ex: Expressão facial marcante Cala a boca! 61 Aspectos morfológicos O grau nas línguas orais A modificação na duração e na extensão do movimento de alguns sinais pode acrescentar a ideia de grau. (o sinal é feito de forma bem lenta). Ex.: LENTO/LENTÍSSIMO. Isso demonstra que os adjetivos podem ter marca de superlativo e de comparativo de superioridade. Nos substantivos, os graus aumentativo e diminutivo são expressos pelos sinais MUITO/POUCO ou GRANDE/PEQUENO, geralmente pospostos ao sinal. Ex.: CASA PEQUENA Número e quantificação Nos substantivos, a ideia do valor dual é expressa pela repetição do sinal e pela anteposição ou posposição do número dois. A pluralidade é obtida pela repetição do sinal três ou mais vezes e pela anteposição ou posposição de sinais indicativos de números. A ideia de plural é expressa, pospondo-se o sinal MUITO. Comparativo de Igualdade, Superioridade e Inferioridade Na LIBRAS, podemos comparar qualidades ou ações. PARA COMPARAR OS ADJETIVOS 1- Expressões comparativas de superioridade xxxxx + sinal de mais + adj + sinal do que + xxxxx 2- Expressões comparativas de inferioridade xxxxx + sinal de menos + adj + sinal do que + xxxxx PARA RELEMBRAR PARA REFLETIR 62 Ex.: Você mais bonit@ DO QUE el@ PARA COMPARAR AS AÇÕES 1- xxxxx + verbo + sinal de mais + sinal do que + xxxxx 2- xxxxx + verbo + sinal de mais + sinal do que + xxxxx Ex.: Você falar mais DO QUE eu A expressão comparativa DO QUE tem flexão para as pessoas do discurso, e a orientação para onde o sinal aponta indicará a segunda pessoa/objeto/animal que estarão sendo comparados no contexto da frase. Para o comparativo de igualdade, temos duas formas: Igual: duas mãos em B, viradas para frente, encostadas lado a lado. Os dedos indicadores médios das duas mãos, roçando um no outro. Igualdade superioridade inferioridade Do que1 63 Na língua de sinais, temos diversas formas de representar os números; afinal, eles se apresentam em diversos contextos: Cardinais Ordinais Quantidade Valores Monetários Medidas Dias da semana, Mês, Ano VAMOS CONHECER O USO ADEQUADO PARA CADA UMA DELAS CARDINAIS Ex.: Você Morar onde? Casa número 22 NÚMEROS 64 ORDINAIS Possuem a mesma forma dos números ordinais, porém eles possuem movimentos, sendo do 1º ao 4º movimentos para cima e para baixo. Do 5º ao 9º, possuem movimentos para os lados. A partir do 10º não apresentam mais nenhuma diferença, sendo o contexto a propiciar o sentido da sentença. Ex.: Você estudar andar qual? Eu estudar 1º Ex.: 1º lugar na prova Ex.: 3º da fila do banco QUANTIDADE Ex.: Idade você? 15 anos Ex.: Que horas são? 12 horas Ex.: Quanto tempo? 6 horas de viagem 65 VALORES MONETÁRIOS Na LIBRAS, para representar os valores monetários, usamos os sinais correspondentes aos numerais seguidos dos sinais: Dinheiro Real Nota Moeda Para representar os valores de um mil até nove mil, também existe a incorporação do sinal “vírgula”, podendo ser usado também o sinal de ponto. Ex.: Mil Cinco Mil 66 Dez mil Para valores de um milhão em diante, deve ser usado o numeral correspondente, acrescido do sinal de vírgula, porém com um movimento rotativo e mais alongado, assim como a expressão facial mais enfática. Ex.: Um milhão 67 SINAIS RELACIONADOS A COMPRAS Banco Cartão Cheque Pagamento Depositar Saque Empréstimo Aumento Quanto custa? Pagar-à-vista Pagar-a-prazo Desconto68 Porcentagem Juros Prestação Promoção SINAIS RELACIONADOS A PESOS E MEDIDAS Balança leve pesado metro Espaço pessoa Balança Leve Pesado 69 IDENTIDA DE E CULTURA SURDA 70 A COMUNICAÇÃO É UMA BARREIRA... Você já imaginou acordar fora de seu país? Pessoas em sua volta falando um idioma totalmente estranho? Os surdos vivenciam momentos difíceis em diversas fases de suas vidas, nos hospitais, nas lojas, nas escolas, nas universidades, enfim... Segundo o censo de 2000, realizado pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), estima-se que, no Brasil, existam cinco milhões, setecentos e cinquenta mil surdos, e cerca de 15 milhões de pessoas no mundo possuem algum tipo de perda auditiva de acordo com os dados apresentados pela Organização Mundial de Saúde. PREVENÇÃO – FATORES DE RISCO A perda de audição pode se desenvolver, mesmo sem haver casos na família e fatores de riscos aparentes. A audição se inicia a partir do 5º mês de gestação, e qualquer recém-nascido pode apresentar problemas auditivos ou adquiri-los nos primeiros anos de vida. Faz-se necessário realizar o Teste da Orelhinha em todas as crianças ao nascerem, pois, quando os bebês, que possuem perda auditiva diagnosticada cedo, iniciam o tratamento até os 06 meses de idade, apresentam desenvolvimento muito próximo ao de uma criança ouvinte. Fatores de risco que devem ser observados: 0 a 28 dias (recém-nascido) - Histórico familiar; - Infecção intrauterina (rubéola, sífilis, herpes genital ou toxoplasmose); - Anomalia crânio-facial (deformações que afetam a orelha ou canal auditivo); - Pré-maturidade eou baixo peso (inferior a 1.500 gramas ao nascer); - Hiperbilirubinemia; - Medicação ototóxica(antibióticos do tipo aminoglicosídeos); - Meningite bacteriana; - Necessidade de ventilação mecânica em UTI neonatal por mais de 05 dias; - Dificuldades físicas associadas às síndromes neurológicas. 29 dias a 02 anos (crianças) - Atraso na fala; - Meningite bacteriana ou virótica; - Trauma de cabeça associada à perda de consciência ou fratura craniana; - Medicação ototóxica; - Síndromes neurológicas; - Infecção de ouvido persistente ou recorrente por mais de 03 meses. 71 Adultos - Os mesmos sintomas observados nas crianças; - Uso continuado de aparelho com fone de ouvido com o volume constantemente acima de 50% da capacidade máxima; - Trabalho em ambiente de alto nível de pressão sonora; Acidentes. O SUJEITO SURDO O ser humano vive e se desenvolve dentro de uma comunidade. A linguagem, a cultura, a vivência fazem parte do processo de interação e desenvolvimento individual e coletivo. Desde os primeiros dias de vida, o sujeito ouvinte já pode vivenciar o processo de interação, mediante as trocas com os ruídos e com os sons emitidos pelas pessoas, os quais ele consegue identificar e emitir seus balbucios numa tentativa maravilhosa de troca com o meio. O bebê que nasce surdo não possui, de início, a possibilidade de interação, ficando esse processo adiado até o momento em que sua família toma conhecimento da surdez. É difícil a percepção imediata, pois o bebê surdo também balbucia, porém, com o passar do tempo e a falta do estímulo externo, as emissões de sons vão desaparecendo, e este indivíduo não constrói a memória auditiva, não adquire a linguagem pelo processo natural. Na maioria dos casos, a família leva um tempo para adaptar-se a rotina de uma criança surda e a adequação pela qual todos os membros deverão adotar visando iniciar o processo de interação. Para o sucesso do processo de socialização da criança surda com o mundo é importante que toda a família adote a língua de sinais o mais cedo possível. Os surdos são capazes de oralizar e escrever, desde que sejam estimulados, uma vez que mudez e surdez são situações distintas. Mudez é a incapacidade de emitir sons. Entre a condição normal de emitir sons e a mudez, existe um vasto leque de distúrbios da fala (afasias), geralmente decorrentes de transtornos do sistema nervoso central nos centros coordenadores da compreensão e da conversão das ideias em símbolos aptos à transmissão verbal. Ao surdo que deseja alcançar êxito na oralização cabe muito esforço e dedicação, não só individual como de toda a família. Deve-se considerar, ainda, que a oralização de um surdo envolve questões éticas e pessoais, sendo uma decisão a ser bastante discutida com a família e baseada nos valores construídos ao longo da vida. ORALIZAR PARA INTERAGIR? Oralizar é sinônimo de negação da língua dos surdos. É sinônimo de correção, de imposição de treinos exaustivos, repetitivos e mecânicos da fala. A figura do adepto convicto do oralismo, Alexandre Graham Bell, por exemplo, ganhou força durante o movimento eugênico e, especialmente, no famoso Congresso de Milão, em 1880, durante o qual ele pregava que a surdez era uma aberração para a humanidade, pois perpetuava características genéticas negativas (GESSER, 2009, p.50). Ora transcrever aqui dois relatos de pessoas surdas, extraídos do ((GESSER,2009, p.51). Trata-se de dois irmãos nascidos em ocasiões filosóficas diferentes. Observe o quanto a postura educacional influenciou os jovens. 72 Mas tomemos essa questão da perspectiva relatada por uma colega surda. Vou chamá-la de Paula. O irmão mais velho de Paula também é surdo. Paula me disse que, ao contrário da sua experiência com a surdez e com a língua de sinais, a experiência de seu irmão tinha sido muito diferente. Ele foi oralizado, e ela, não. A ele foi negado, em muitas ocasiões e contextos, o acesso à língua de sinais, vista como uma língua perversa e inadequada. Mas sempre que ele estava com um grupo de amigos surdos, os sinais eram naturalmente utilizados. Paula me contou que, quando ela nasceu, os tempos eram outros: seus pais já respeitavam mais a língua de sinais e também algumas escolas permitiam seu uso. Nessa história, Paula não foi oralizada como seu irmão, os dois são muito fluentes em LIBRAS; contudo, enquanto Paula demonstrava curiosidade em fazer treino labial e fonoarticulatório, seu irmão – com o intuito de preservá-la e protegê- la – tenta convencê-la, a todo custo, a desistir disso, porque “a língua dos surdos é a língua de sinais, e os surdos têm preconceito contra aqueles que querem ou gostam da oralização (GESSER, 2009). Podemos observar, com base nos relatos, dois pontos de vista bastante diferentes. A postura do irmão é política e ideológica; preza por sua legitimidade como surdo e como ser humano capaz, sobrevivente a traumas e discriminações sofridos por sua geração. Lembro aqui que a oralização de Paulo lhe foi imposta. Paula, por sua vez, cresce num ambiente favorável ao seu desenvolvimento; tem no seu irmão um interlocutor, uma identificação, o que faz despertar naturalmente a vontade de ultrapassar as barreiras e desenvolver-se cada vez mais, além da vontade de participar voluntariamentedos treinos fonoaudiólogos. É recorrente ouvir, nos discursos mais extremistas, entretanto, que o surdo oralizado não é “surdo de verdade”: “Surdo que é surdo defende e só usa língua de sinais”. Parece que, além de uma questão muito forte (e naturalmente compreensível, dado que esse é um momento de transição), há também imbricações tanto de um discurso de contrarreação (também disseminador de preconceitos, ou seja, um tipo de preconceito às avessas) como o de uma visão essencialista em prol de um purismo linguístico e cultural surdo. A rejeição da oralização a todo custo por surdos mais politizados e militantes é mais uma discussão político-ideológica e definitivamente pertinente e importante para a visibilização da LIBRAS (GESSER, 2009, p.52) Podemos observar que a questão principal não é a surdez e sim, a afirmação de existência, uma questão de assumir a condição de surdo, detentor de uma língua e cultura que devem ser respeitadas, sendo uma questão de livre escolha a transição entre as culturas oral, visual e bilíngue. Uma sociedade, que busca solidificação na justiça, deve demonstrar respeito diante das decisões de seus membros. No caso dos surdos, devemos respeitar seus direitos e as escolhas individuais e coletivas dos componentes da comunidade, pois intolerância e imposição não induzem ao desenvolvimento humano. 73 IDENTIDADE E CULTURA Existe Cultura Surda? Um país é formado por diferentes culturas; os diferentes hábitos, as diferentes manifestações sociais são o reflexo do povo. Muito se proclama a cultura surda nos ambientes de articulação política, e o legado de lutas e vitórias é, sem dúvida, visível e reconhecido por todos os que acompanham a trajetória dos surdos, mas a justificativa para essa proclamação é a necessidade que essa comunidade possui de se firmar pessoas capazes, politizadas e dispostas a conquistar seus direitos. A cultura é um instrumento de identificação e integração de pessoas, que, por afinidade, passam a pertencer a um mesmo grupo, uma comunidade. Essa integração é o atestado que o sujeito faz parte de um todo, é seu lugar, é sua identidade. Identificar a cultura surda é reconhecer o papel dessa comunidade dentro da sociedade. Não é um reconhecimento pela deficiência e sim, pela sua organização política, estruturada pelas potencialidades dos membros e fundamentada em sua forma peculiar viso-espacial de perceber e se relacionar com o mundo. Dentro da comunidade surda, preferencialmente predomina a língua de sinais, sendo a interação com o mundo feita por meio dos olhos. Constitui-se uma fonte viva de hábitos, conceitos e sonhos, sendo, sem dúvida, um local de identificação, desenvolvimento coletivo, intelectual, social e, principalmente, desenvolvimento pessoal. Não tenhamos a visão equivocada de que uma comunidade surda é um local silencioso e quieto, numa perspectiva surda; o barulho se manifesta por meio das atitudes das pessoas que estão em sua volta, por exemplo, os gestos, a velocidade dos sinais, as expressões de alegria, tristeza e ira, etc. Essa vivência é adquirida e socializada dentro de um ambiente coletivo, livre dos rótulos e preconceitos. Para uma sociedade que dita padrões de beleza e comportamento, nem sempre conseguimos, de imediato, conviver com o diferente. Pode parecer politicamente mais correto pronunciarmos deficiente auditivo a pronunciarmos surdo, mas nem deficiente auditivo nem portador de deficiência, surdo-mudo de forma alguma, o único termo aceito é surdo. A comunidade surda se refere aos membros por Surdos com S maiúsculo como marca social e política, cujo objetivo é dirimir qualquer ligação com deficiência ou impotência. Essa história de dizer que surdo não fala, que é mudo, está errada. Eu sou contra o termo surdo-mudo e deficiente auditivo porque tem preconceito... Vocês sabem quem inventou o termo deficiente auditivo? Os médicos! Eu não estou aqui só para vocês aprenderem a Libras, eu estou aqui também para explicar como é a vida do surdo, da cultura, da nossa identidade... (professora surda, 2002) (GESSER, 2009, p.45). Recuso-me a ser considerada excepcional, deficiente. Não sou. Sou surda. Para mim, a língua de sinais corresponde a minha voz, meus olhos são os meus ouvidos. Sinceramente nada me falta, é a sociedade que me torna excepcional (GESSER, 2009, p. 46) 74 COMUNIDADES SURDAS NO BRASIL No Brasil, a Federação Nacional de Educação e Integração dos Surdos é uma importante conquista; o espaço é local de intensa e rica interação social, onde os surdos compartilham ideias, concepções, significados, valores e sentimentos, que emergem, também, no Teatro Surdo, no Humor Surdo, na Poesia Surda, na Pintura Surda, na Escultura Surda, entre outras manifestações culturais e artísticas, sem sofrerem a interferência dos ouvintes; os aspectos e as peculiaridades do modo de vida dos surdos afloram e se desenvolvem na interação das questões de relacionamento, educação, etc. As comunidades surdas no Brasil, com o objetivo de promover a integração de seus membros, desenvolvem programas que abrangem os esportes e as interações sociais, existindo uma organização hierárquica, constituída por uma Confederação Brasileira de Desportos de Surdos (CBDS); seis Federações Desportivas e aproximadamente 113 associações, clubes, sociedades, congregações. As associações dos surdos possuem funcionamento semelhante às demais, com estatutos, eleições e gestão de dois anos; os ouvintes que participam são pessoas ligadas à causa dos surdos, como intérpretes, familiares, professores, etc, é essencial que sejam pessoas ativas e que interajam com outras associações de outros estados ou cidade, como também com as Federações (como exemplo a Federação Nacional de Educação e Integração dos Surdos – Feneis) e Confederações diversas. É importante observar que as associações são espaços bilíngues; a Libras e a língua portuguesa são fluentes entre os membros, trata-se de um local de integração social, cultural e articulação política. O foco é a conquista dos direitos e notoriedade por suas habilidades. EDUCAÇÃO DOS SURDOS A educação dos surdos no Brasil ainda é uma questão em construção; ainda não se chegou a um nível satisfatório, estando poucas escolas aptas a suprir as necessidades dos surdos, e poucas instituições educacionais respeitam a condição bilíngue destes. A visão patológica da surdez desviou os objetivos e as práticas educacionais nas quais ideias clínicas e terapêuticas de oralização se instauraram, deteriorando o espaço educativo, determinando, consequentemente, o fracasso escolar de muitos, comprometendo a natureza social, cultural, linguística e cognitiva do surdo e contribuindo para sua marginalização ( SKLIAR,1997 apud MOURA et al., 2008). A trajetória do processo da educação dos surdos, que passou por diversas práticas filosóficas, determinou a atual conjuntura educacional instaurada. Desde a Declaração de Salamanca, da qual o Brasil é país assinante, e, portanto, país cujo tratamento se adequa a todos os cidadãos portadores de necessidades educativas específicas, observamos o crescente aumento de pessoas surdas nas instituições de ensino, porém sem maiores especificidades as suas necessidades e anseios, onde o fracasso escolar, muitas vezes, é evidente. 75 Como já vimos anteriormente, a linguagem é essencial à vida em sociedade; é por meio dela que partilhamos ideias, emoções e experiências. É crucial que o indivíduo compreenda a linguagem do país onde vive; caso contrário, suas oportunidades ficarão bastante reduzidas. A fim de tornar a aprendizagem
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