Baixe o app para aproveitar ainda mais
Prévia do material em texto
TEORIA DA COMUNICAÇÃO AULA 5 Prof. Alexandre Correia dos Santos 2 CONVERSA INICIAL Olá! Tudo bem? Devemos perceber os movimentos e as especificidades das práticas diárias dos indivíduos, para compreendermos o todo comunicacional. Vamos, nesta aula, aprender novos conceitos e teorias para mergulhar nesse oceano de possibilidades multimidiáticas. Eis a verdadeira razão da nossa profissão. Boa leitura, divirta-se! CONTEXTUALIZANDO Uma compreensão necessária O compartilhamento de informações é uma atividade quase automática das nossas práticas diárias, como usuários das diferentes plataformas e redes sociais. Por vezes, propagamos notícias que mal sabemos se são verdadeiras; não raro, repassamos brincadeiras ou piadas para grupos de amigos. A partir de agora, vamos tentar compreender os embasamentos teóricos que justificam essas nossas práticas. Bons estudos! TEMA 1 – A PROPAGABILIDADE DA MÍDIA A propagabilidade versa principalmente sobre os diferentes formatos de circulação de informação, nos dias atuais. Usamos o termo circulação porque este talvez seja, por si só, uma atualização do termo distribuição de informações e/ou conteúdo. Mais uma vez, esse é um termo que trata da forma com que os conteúdos são mais produzidos para públicos de diferentes mídias. Jenkins (2008) aborda isso como cultura participativa, esta como a descrição básica da forma com que os conteúdos são produzidos e distribuídos na mídia e, mais do que isso, como são os modos interacionais. Talvez a tecnologia do compartilhamento, no início, não tivesse como objetivo esse tipo de função, mas contou com o fato de o ser humano sentir-se importante e ativo participante da informação. A propagabilidade (ou o nível de retransmissão de um conteúdo) está diretamente ligada à sua propriedade de gerar audiência e resultar em monetização, ou geração de renda, em um mundo em constante mudança, onde os textos gerados pela própria mídia são autorreproduzidos por meio do fenômeno do compartilhamento. 3 Em pesquisas recentes, as pessoas afirmam se sentir bem informadas por notícias que são compartilhadas ou reproduzidas pelos seus pares ou pessoas mais próximas. A principal dificuldade que os administradores midiáticos encontram é justamente a incapacidade das grandes indústrias de mídia para gerir ou administrar os diferentes modelos de propagação de conteúdo, este entendido aqui como conteúdo relevante ou que possui grande atrativo de leitura. A propagabilidade de notícias ruins também tem sido objeto de preocupação por parte das empresas e das pessoas que administram os conteúdos. Gerir uma crise, por exemplo, advinda da propagação de uma notícia mal formulada ou equivocada é um grande desafio para as plataformas e agentes midiáticos. Vale lembrar que, em tempos de propagabilidade, o poder de viralização de uma má notícia é gigantesco e, por vezes, incontrolável. Além disso, alinhar os diferentes interesses das empresas com o dos consumidores, por exemplo, é um desafio gigantesco para os estudos dessa relação, até porque esses interesses podem ser completamente antagônicos, opostos. Esse desentendimento pode ser tratado como um conflito econômico existente entre esses dois agentes, empresas e consumidores; mas também pode ser visto como uma apropriação indevida do trabalho e esforço de outrem. São inúmeros os casos, também, de contribuições públicas para fins privados que não recebem nem reconhecimento, nem retorno de origem financeira. Hoje, uma das maiores discussões é justamente a exploração do público cliente nessa economia que pode ser tratada como uma economia à parte, a economia digital, pois as organizações apropriam-se dos comentários ou criações de seus públicos/stakeholders, sem bonificá-los por suas contribuições. Ainda no campo da propagabilidade, o que percebemos hoje é a valorização do clássico ou ainda a revalorização de resíduos que ganham, por natureza, notabilidade pelo seu caráter de nostalgia ou crítica, sendo trabalhados com uma ideia de recuperação de valor, assumindo um papel de objeto antigo valorizado, mas por tempo difícil de ser mensurado. Assim, as empresas revalorizam conteúdos antigos, justamente por isso abrir caminhos para que seus consumidores possam gerar os conteúdos. Algumas correntes teóricas afirmam ainda que as pessoas não se importariam de pagar por conteúdos, desde que pudessem escolher quando e 4 como consumi-los. Porém, equivocadamente, algumas empresas e marcas ignoram completamente esses públicos, gerando assim uma espécie de audiência engajada que é completamente desvalorizada. Vale lembrar que, enquanto uma parcela de clientes está preocupada apenas com receber novos conteúdos, uma nova geração está trabalhando para, além de gerar conteúdo relevante, engajar-se na valorização de determinadas marcas e empresas. Esse tipo de ação – engajamento – é o principal objetivo das organizações, uma vez que um consumidor engajado é sinônimo de, graciosamente, a marca ter alguém como seu “advogado”, que, além de propagar as principais vantagens das empresas, ainda as defende ferozmente. Ainda que, nessa fase de estudos, estejamos pensando apenas em novos formatos e novas mídias, é importante sempre lembrar que isso tudo não significa, por exemplo, o fim das mídias de massa tradicionais. Ainda que muitas empresas lancem mão do digital, elas continuarão com a devida propagação de conteúdos nas antigas mídias. Na verdade, quem mais ganha com esses diferentes formatos de propagação, pela proliferação de conteúdos relevantes e importantes para a marca, é o consumidor, uma vez que todos esses atos comunicacionais ampliam sobremaneira a comunicação. TEMA 2 – O DETERMINISMO TECNOLÓGICO Pensar o determinismo tecnológico em teoria da comunicação é praticar um exercício fundamental para a compreensão dos fenômenos atuais que envolvem a criação de novos suportes comunicacionais e os seus impactos e efeitos na sociedade. Se pensarmos nos efeitos e na potencialidade de tais impactos e recordarmos as várias escolas e teorias da comunicação, muitas já tentaram – com sucesso ou não – dar conta de tais estudos. Vale lembrar que esse tipo de estudo sempre foi o mister central dos pesquisadores envolvidos com fenômenos comunicacionais. Ao analisarmos o determinismo tecnológico na base da teoria, devemos construir conhecimento relacionando, por exemplo, o surgimento de um novo meio ou plataforma comunicacional e como esse aparecimento afeta social e/ou culturalmente os indivíduos. 5 Para Williams (1983, tradução nossa), pensar o determinismo tecnológico “[...] implica tornar abstratas as transformações técnicas e tecnológicas e tentar explicar de forma generalizada as mudanças sociais”. Assim, essa forma de pensar vem desde o surgimento da imprensa ou do alfabeto, quando, à época, tentaram submeter a essas criações crises como a da tradição católica ou do repensar da democracia. Pensar os efeitos sociais pós-surgimento de um novo meio também significa analisar subjetivamente as práticas e, desproporcionalmente, tentar descobrir quais as implicações destas na forma de comunicação. A internet, por exemplo, ainda é questionada sobre o seu potencial democrático. E essa dúvida surge desde o momento da sua criação até os dias atuais. Se pensarmos primeiro os meios de comunicação off-line ou denominados tradicionais e seu formato um para muitos, ele explicita a antiga teoria da transmissão de informações de um emissor ativo para um receptor passivo, escancarando uma ruptura perceptível entre um produtor que, de acordo com as suas possibilidades e ações, filtra os conteúdos até a recepção de uma sociedade que aguarda informações sobre assuntos de interesse geral e que recebe, normalmente, uma mensagem homogênea. Mais ou menos como oprincípio da informação que todos devem saber. Portanto, a par e ao passo que a tecnologia surge como produto de pesquisas, estudos técnicos e práticos, essa mesma criação afeta ou gera transformações no entorno da sua aplicação. E Williams (1983, tradução nossa) ainda reforça que, “[...] se nos adaptarmos ou nos acostumarmos rapidamente com o novo invento, é porque ele é apenas a consequência da era moderna”. O mesmo autor compreende que a invenção da televisão, por exemplo, “[...] não resulta de um acontecimento isolado ou de uma série de acontecimentos” (Williams, 1983, tradução nossa). Afinal, tal meio dependeu, antes, do surgimento de outras tecnologias como a eletricidade, a fotografia, o rádio e o cinema. Para vários autores, os dispositivos móveis (como o celular) não promovem um afastamento; “se consideramos que o dispositivo móvel (ou aparato tecnológico) afasta as pessoas, estaremos incorrendo em um erro de determinismo tecnológico” (Marquioni, 2017). Justamente por isso, algumas análises relacionadas com o determinismo tecnológico são superficiais, genéricas e incompletas, porque na prática simplificam conceitos complexos. 6 Assim, fica claro que o que – de fato – influi na maneira das pessoas em sociedade agirem ou pensarem não são os aparatos tecnológicos ou gadgets1, mas, sim, o seu uso. Marquioni (2017) sugere uma experiência prática: “[...] ao ler este material, simultaneamente coloque seu aparelho telefônico móvel pessoal sobre a mesa e deixe-o ali, imóvel, por cinco minutos. Permaneça olhando para o aparelho e para o mundo a sua volta e, decorridos os cinco minutos, responda: o aparelho mudou algo no mundo?”. O autor ainda responde: “a resposta certamente deverá ser não (a menos que algo inusitado tenha acontecido, como a explosão do dispositivo)”. E vai ainda mais longe: “[...] pegue seu aparelho e acesse um aplicativo qualquer (por exemplo, um site de previsão do tempo): a partir de agora (se você realizou o experimento), você está atualizado em relação ao tempo” (Marquioni, 2017). Assim, pela notável diferença tecnológica entre os meios de comunicação, pode-se, ainda que subjetiva ou abstratamente, estimar ou prever certos fenômenos que poderão surgir com o desenvolvimento das novas tecnologias. O próprio surgimento da internet, no formato agora de muitos para muitos, aprofunda o conceito, em uma primeira análise, de não se ter uma distribuição fixa ou definida, misturando-se os papéis de atores produtores e receptores de uma mensagem. Afinal, cada usuário ou internauta define qual informação deseja acessar e quando deve utilizá-la, porque não está submetido, por exemplo, aos horários fixos e predeterminados de um canal de televisão aberto. A internet ou o ciberespaço, ainda como exemplo de recurso ou meio tecnológico, pode prover ou promover uma interação entre um e um, entre muitos e muitos, entre um e muitos, muitos e um, entre outras formas, fazendo com que os pesquisadores sociais e comunicacionais precisem rever todos os seus conceitos e preconceitos, por terem que reanalisar determinações de como se portar em um meio interativo, porque o problema passa a ser qual o sentido de interatividade e suas implicações em uma sociedade. Como provocação, qual o sentido de interatividade? Pesquise e procure encontrar a definição que você acredite ser a mais válida para o conceito. Diferenças na conceituação de termos de múltiplos sentidos nos fazem orientar por pesquisas distintas, acerca da comunicação. E é nesse ambiente de 1 Gadget deriva de inspector gadget – assim, podemos associar o termo gadget com bugiganga, geringonça, enfim: uma espécie de apetrecho tecnológico. 7 falta de concordância que os pesquisadores acertadamente recorrem a diferentes percepções e análises, porque um debate complexo como aquele sobre a influência e os efeitos da internet em uma sociedade rapidamente recai e se endereça àqueles que sugerem diferentes mudanças. Com tudo isso, não devemos incorrer no antigo discurso de que uma nova tecnologia comunicacional, por si só, é a única responsável pelo progresso e avanço das civilizações. Intelectuais sempre criticaram a edição, nos meios de comunicação de massa tradicionais. Hoje, criticam severamente a falta de edição, nos novos meios. Em síntese, devemos entender o determinismo tecnológico por meio de estudos mais aprofundados da relação de causalidade existente entre a tecnologia e a cultura. Se ainda levarmos em consideração o exemplo do aparelho celular, devemos entender o determinismo tecnológico como um processo de forma de uso, de prática e processo individual, marcado não pelo seu conceito de instrumento ou aparato tecnológico, mas sim por como tal recurso é utilizado como forma de comunicação, afinal com ele podemos jogar, estabelecer conversações, enviar mensagens de texto, recepcionar imagens e sons, ressaltando a ideia equivocada de que, por si só, o instrumento pode influenciar a convivência em sociedade, por exemplo. Afinal, são atitudes como essas que desconstroem e irrefletem a relação de causalidade que há entre tecnologia e cultura. TEMA 3 – AS RELAÇÕES ESPAÇO-TEMPO DAS INTERAÇÕES Faz algum tempo que as mídias deixaram de ser instrumentos completamente fechados em si, com claras aplicações técnicas para – segundo seus usos – se transformar em infinitas possibilidades de interação social, modificando inclusive relações largamente estudadas e compreendidas como aquelas entre espaço e temporalidade. Nesse escopo, devemos pensar a internet como exemplo de mídia de convergência estritamente técnica (que alia texto, som e imagem), que conta com diferentes possibilidades de interação (cuidado com o determinismo do conceito), se transformando também em uma ambiência que transforma seus conteúdos e informações em experiências. Além disso, tal consideração serve como norte ou parâmetro para diferentes meios, uma vez que a internet e suas aplicações mostram-se como 8 indicadores para os antigos meios de comunicação de massa se reestruturarem. Os próprios conceitos comunicacionais – como já visto anteriormente – estão sofrendo modificações e atualizações constantes pelas novas possibilidades e perspectivas de relações identitárias, entre os sujeitos. Sodré (2002) infere sobre as novas tecnologias como modos que transformam a pauta normal, costumeira em direção a uma qualificação virtualizante da vida. O autor ainda conceitua como revolução da informação contemporânea a capacidade que temos de acumular dados, transmiti-los e fazê-los circularem. Assim, podemos desenvolver novas formas de saber e pensar. Podemos perceber, assim, que há, hoje, uma forte tendência de mistura entre as velhas e boas mídias tradicionais ou analógicas e os suportes digitais. Dispositivos já usados em larga escala, como o sistema de posicionamento global (GPS), as smart TVs, os celulares, misturam diferentes tecnologias para servir aos intentos do usuário, deixando claro que a mídia e a comunicação estão disponíveis e explicitadas em todas as áreas. Com a disponibilidade da comunicação, os meios mais tradicionais são alcançados, fazendo com que antigas práticas como a de assistir à TV (que, originalmente e até hoje, ainda é dependente de uma fixação e de energia elétrica, na maioria dos casos) possam ser substituídas por audiências de conteúdos veiculados em totens, celulares, tablets, veículos automotores etc. A experiência, nesse caso, acaba de ser reconfigurada. Na televisão aberta, por exemplo, podemos assistir a programas produzidos por canais ou grupos de comunicação e, na internet, podemos, além de também assistir a esses canais, receber vídeos produzidos por indivíduos particulares. Fato é que a atual audiência assiste à TV simultaneamente conectada com dispositivosmóveis, talvez para complementar aquilo a que assistem, interagindo com o mesmo programa em redes sociais, mudando completamente os antigos modelos de experiência. Sodré (2002) afirma que, na mídia tradicional ou linear, prevalece uma realidade construída, sob efeito irradiativo do sujeito que construiu e produziu a informação. Na digital, o usuário adentra a mídia e o acesso tradicional é suprimido pela vivência do virtual. Martin-Barbero (2004) diz que podemos compreender a globalização quanto às transformações nos modelos e modos da comunicação; enquanto Wolton (2003) alega que experimentamos uma espécie de nova figura, que se 9 liberta dos territórios, autorizando e reforçando identidades e laços por meio de redes extraterritorializadas. Thompson (1995, tradução nossa) considera que as redes de computadores podem ser entendidas como “[...] desenvolvimentos que ampliam a acessibilidade no tempo e no espaço, enquanto dão aos usuários maior flexibilidade e maior controle sobre as condições de seu uso”. Quando falamos dessa importante relação com o tempo e o espaço, podemos citar as novas gerações de usuários que já não têm mais tempo, nem paciência de esperar uma simples resposta via e-mail, por exemplo: há muito pouco tempo atrás, era muito comum usarmos o correio para o envio de curriculum vitae. Era necessário, no final de semana, comprarmos o melhor jornal da cidade ou do estado e, depois de lermos com atenção os cadernos de empregos, formular currículos adaptados às ofertas de vaga disponíveis. Depois, era necessário envelopar e enviar via correio a carta para que o próprio jornal a distribuísse em caixas-postais destinadas a cada um dos clientes que ofereciam as vagas de emprego. Era comum levar pessoalmente tais documentos à editora do jornal para a distribuição da carta nas caixas, para garantir a sua entrega. Depois, aguardava-se que um mensageiro da empresa recolhesse as cartas para levá-las aos recursos humanos da organização para, só então, passados mais alguns dias, se receber algum retorno da empresa que ofertava a vaga. Detalhe: uma das formas desse contato das empresas (ou o feedback) já era via e-mail (aquela ferramenta que, hoje, já não usamos mais com tanta frequência). Vire-se a página: agora, os mais jovens, ao enviar um e- mail ou mensagem, por exemplo, ficam aguardando ansiosamente pela resposta, dando F5 constante para que as páginas atualizem as informações, em busca de uma virtual resposta. Essas mudanças influenciam sobremaneira a forma de como agimos em sociedade. Vários aspectos individuais e sociais são influenciados pela mudança dessa relação com o tempo-espaço: os modos de sociabilidade, de convivência, de pertencimento do indivíduo, de gestão das organizações, as relações de troca, além – obviamente – da forma com que administramos e estocamos esse grande volume de dados e que implicam as formas de sua transmissão e recepção instantânea, que se tornaram grandes preocupações dos usuários, especialmente das novas gerações. Nesse novo formato ou, como alguns pesquisadores denominam, bios, a mídia ganha um poder quase simultâneo, instantâneo e global manifestado por 10 meio das diferentes e múltiplas tecnologias da informação, alterando completamente as formas como administramos e acolhemos os fatos do mundo, cada vez mais conectados. A rápida fluidez das informações e os processos de comunicação e interatividade (como a internet, por exemplo) desafiam não somente os agentes organizacionais ou empresas, como também o indivíduo, resgatando a urgência de interpretações e compreensão dos estudos da comunicação social, afinal os processos de emissão e recepção de informações estão ganhando novos status e constantes atualizações. Outro importante aspecto é a visão e a consideração de um tempo móvel, resultado dessa midiatização cada vez mais emergente, que submete todas as audiências a uma espécie de sensações sem projeção temporal, o que distancia cada vez mais o indivíduo de uma experiência mais concreta. Hoje, a impressão que temos é que acompanhar uma novela, um documentário ou um telejornal parece ter o mesmo valor, uma vez que a internet catalisa tais sensações, promovendo a interação dos indivíduos, fazendo com que programas tão distintos na sua forma de produção e geração se pareçam muito, ressaltando suas poucas diferenças em termos de tempo e espaço. Basta notarmos que, nesses exemplos, a novela, o telejornal e o documentário possuem marcos temporais completamente distintos. É preciso entender e encarar que a globalização e as transformações midiáticas estão unidas, conectadas, imbricadas. Essa capacidade de realização virtual – característica mais forte da midiatização – reconfigura identidades e formas ou práticas do fazer comunicacional. Assim, deixamos de viver, experiencialmente, um tempo linear para vivermos sim um tempo circular, em que nosso conhecimento é construído com base na negociação do seu reconhecimento por outros. Esse novo compreender do subjetivo ou das culturas é cada vez mais presente e mais forte nos meios de comunicação. Ao passo que a sociedade valida novas práticas, também se desfaz de outras, uma vez que os processos midiáticos reconfiguram decisivamente os modos e práticas atuais. Novos sentidos sociais para o espaço e para o tempo reorganizam as culturas, nessa nova ambiência comunicacional, seja para o trabalho, seja para a diversão ou para a convivência em grupo, sujeitando o indivíduo a novas experiências, tramas e formas de perceber e reagir aos processos do real, em tempo e espaço reais. 11 TEMA 4 – O CONSUMO MIDIÁTICO Pensarmos no ato de comunicar define mais a nossa função de comunicadores sociais do que propriamente os fatos comunicados. Analogamente, se pensarmos no ato de consumir, ele é mais importante do que os bens consumidos. Podemos nos definir, contemporaneamente, como sociedade comunicacional e de consumo. Nesse sentido de consumo como uso, as percepções econômicas e antropológicas nos fazem refletir acerca da comunicação. O indivíduo, por essência, tende a habitar e experienciar o mundo pelo consumo das mídias, como forma de integração comunicacional. McLuhan (1969), um dos maiores pesquisadores comunicacionais, afirmava – já na década de 1960 – que toda cultura se forma ou define por suas bases técnicas (objetos técnicos) e tecnológicas (novas relações sociais). Para o autor, a cultura do consumo audiovisual-eletrônica, por exemplo, deve ser definida não pelos seus conteúdos veiculados, mas pelas suas formas de veiculação (McLuhan, 1969). Hoje, existe uma necessidade latente de economia política da atenção da audiência. Os anunciantes pagam para ter a atenção dos seus consumidores potenciais, sob a forma de propaganda ou matéria paga de jornal. Organizar as mídias para essas formas de consumo é um desafio, porque, dependendo da forma de comunicação, meio, público, target etc., o resultado pode não ser o pretendido. As pesquisas de mídias atuais procuram mensurar e versar sobre o papel dos meios e suas ações sobre os diversos públicos em que elas atuam. Há um esforço constante de correlação dos receptores (destinatários) com os programas que costumam dar audiência, por serem preferidos, em detrimento de outras atrações. É preciso pensar as pesquisas atuais de consumo de mídias mais qualitativamente, inclusive sobre os seus efeitos, deixando um pouco o lado do quantitativo, também muito importante, numa segunda análise. A análise de fatores que explicam as preferências de consumo para um determinado meio ou para um gênero específico deve ser feita pela estratificação dos grupos sociais que manifestam esses hábitos de consumo. Existe uma variação muito grande, na diferença de consumo midiático, em relação às características de público, tais como idade, sexo, profissão, classesocial, entre outros elementos. 12 Outro aspecto relevante é o estabelecimento de públicos em modelos mais específicos de verificação: expectativas, confiança, experiências, preferências, comportamentos, justamente para cada meio de comunicação ou gêneros específicos de programas e mídias. Devemos lembrar que são essas características socioculturais que estruturam uma audiência. A percepção lógica de confiança nos meios em que buscamos determinadas informações também é preponderante para a escolha das fontes em que acreditamos receber uma informação íntegra, de qualidade. Em tempos de empresas e editoras comerciais, por exemplo, cada vez mais focadas no business do que necessariamente na notícia, é importante verificarmos nossas fontes primárias de informação e conteúdo. Afinal, são nelas que baseamos todas as nossas percepções da verdade dos fatos. A evolução da comunicação favorece o desenvolvimento de novas técnicas, ferramentas e hábitos em mídias alternativas e comunidades virtuais, fazendo aflorar a liberdade de expressão propiciada pela existência de múltiplos canais de comunicação. A internet propõe e favorece a difusão de campos de discussão, nos mais diferentes níveis, em que todos podem colaborar, facilitando que haja transparência e universalidade da informação. Isto dá margem a uma importante renovação de práticas sociais, comunicacionais e políticas, com mais discussão, participação. Para Lévy (2010), cibercultura, por definição, pode ser entendida como termo que dá conta dos processos e situações que podem surgir cotidianamente às voltas da comunicação e seus aparatos ou maquinismos cibernéticos. Como a definição não se expandiu semanticamente, também serviu para designar um conjunto de fenômenos cotidianos promovidos com o progresso das mídias digitais ou com as novas tecnologias da comunicação. A criação e a emergência da internet prolongaram e estabeleceram novas conexões midiáticas que favoreceram a comunicação de todos com todos. Isso já se vê presente nas discussões estabelecidas na esfera pública nacional, que gera profundas reflexões na vida democrática do Brasil, por exemplo. O que hoje podemos verificar é uma intensa ruptura quando falamos de esfera pública, que parece, agora, não ter mais tantas trancas ou censuras como havia em um passado recente. Ninguém – ou quase ninguém – pode mais controlar as informações e mensagens que circulam na esfera pública da internet. Nem governos, nem Estados, nem jornais, nem editores, nem 13 produtores dão conta de organizar ou regular tudo o que é postado por intermédio desses processos ciberculturais. A intermediação agora emergente no ciberespaço lança mão de recursos e contribuições de inteligência coletiva, destruindo a antiga forma de mediação clássica que antes vigorava nos meios de comunicação de massa do mundo todo. TEMA 5 – A CONVERGÊNCIA Também diretamente relacionada com a internet, a convergência é outra cultura que se desenvolveu à luz da experiência com novas tecnologias. A cultura da convergência, assim batizada por Henry Jenkins (2008) – mas que se baseia em estudos de Sola Pool, da década de 1980, no mesmo espaço de pesquisa, o Massachussetts Institute of Technology (MIT) – se debruça sobre as diferentes percepções e formas de compreensão de temáticas como consumo e cultura de fãs. A convergência é, afinal, a imbricação de limites ou fronteiras que existe entre os meios de comunicação em que as mensagens, independentemente de qual o seu suporte midiático, transitam, sem se limitarem a apenas um meio físico. Há que se notar que Jenkins (2008) citava muito pouco a internet como meio ou mídia. Muitos pesquisadores renomados do MIT consideravam o fenômeno da convergência um fato inevitável, que certamente ditaria e reformularia os conceitos e bases da comunicação e das mídias, que foram denominadas e assim permanecem até os dias atuais como remodelagens. Autores e pensadores contemporâneos franceses são largamente utilizados por Jenkins (2008) como suas referências primárias, entre os quais podemos destacar o papel de Pierre Lévy (2010) como um dos grandes mentores de sua obra, principalmente quando este aborda temas como cultura de fã, participação e construção de conhecimento coletivo. Defensores dessa nova corrente ressaltam a importância da convergência como uma possível extensão para democratizar o uso e as formas dos meios. Os consumidores hoje são vistos como partícipes dos processos de produção de mídia, tornando-se parte fundamental ou imprescindível dos processos comunicacionais. Para Jenkins (2008), “as velhas e novas mídias colidem, onde mídia corporativa e mídia alternativa se cruzam, onde o poder do produtor de mídia e 14 o poder do consumidor interagem de maneiras completamente imprevisíveis”. Assim, o consumidor é alçado a um papel de protagonista, deixando para trás, completamente, a sua função de mera peça passiva do processo comunicacional. Fazer parte dessas mudanças incorre em compreender, fazer parte delas e consumindo o que a nova geração vem produzindo. Jenkins (2008) ainda é mais pontual ao afirmar, com base nos estudos de seus mentores franceses, que há uma indústria midiática mandando e tentando moldar os processos em conjunto com toda a sociedade, tentando diferenciar essa convergência corporativa, inclusive, do que chama de convergência alternativa, que trataria apenas dos conceitos de fãs. Seus estudos mais recentes apontam para uma forte tendência de que a convergência seja construída sobre o escopo e as referências de vários conglomerados midiáticos, em que a produção de mídia tradicional assume e toma conta, absorve a própria definição e composição dos fãs, configurando-se em criações indistintas, indissociáveis e que têm na Internet – por exemplo – um campo fértil para crescimento (agora citando a rede como importante espaço de crescimento de manifestações). Os processos de produção da denominada indústria midiática se dão com base no pressuposto teórico e na observação do mercado de que os fãs precisam dos produtos e os produtos precisam desses fãs, sendo o público (fã) e consumidor não necessariamente uma invenção ou concessão da indústria, mas um caminho e/ou forma para tornar esse agente (o fã) um consumidor/fã de produtos cada vez mais legítimos e fiéis aos seus seguidores e adoradores, segundo segmentos e/ou nichos que são e serão estabelecidos segundo seus próprios interesses, que, nesse caso, são gostos e interesses em comum. A convergência é a verdadeira responsável pela criação desses novos nichos e segmentos de mercados, global ou regionalmente falando, o que faz com que esses produtos passem a circular sem problemas de limitação de territórios, primeiro com o objetivo específico de – por óbvio – expandir os lucros para, só depois disso então, passar a figurar como fonte de orgulho e ostentação, sobretudo, do que Jenkins (2008) denomina economia afetiva, porque o cliente/consumidor tem suas vontades e desejos transformados em mercadoria, pois os meios, de uma forma geral, apropriam-se da cultura para conquistar e cativar a audiência e seu público, justamente por meio da criação de nichos e segmentos de mercado. 15 Notório crítico de autores que preconizam o fim das velhas mídias ou mídias tradicionais, com uma visão muito idealista, o mesmo autor defende largamente a convergência como uma “[...] interação que absorve e retoma as velhas mídias em conjunto (trabalhando junto) com as novas mídias” (Jenkins, 2008). Enquanto as novas mídias trabalham sob o formato de narrowcasting (estreitamento) que permite o livre acesso e participação do público e de fãs, com uma grande repercussão e reciprocidade, mediante comunicação chamada ponto a ponto, as velhas mídias operam no formato broadcasting (de rádio ou teledifusão),por exemplo, em que o acesso ou a participação, pelo menos direta, é restrita, voltando ao conceito de comunicação do tipo um para muitos. Em síntese, o que Jenkins (2008) defende é que a participação de fãs, por exemplo, não destruirá as mídias comerciais, mas terá condições de reinventá- las, reinscrevê-las, porque acredita que “[...] é mais provável que as novas ideias surjam no ambiente digital, porém, monitoradas em um ambiente em busca de conteúdos para cooptar e circular”. Por fim, o que notamos é que a indústria midiática adota a cultura da convergência para gerir o campo do consumo, área demandada pelos próprios consumidores. TROCANDO IDEIAS Para debate Há quem diga que a palavra consumo não deveria ser aplicada ao uso das práticas comunicacionais. Você concorda com isso? Crie um grupo de debate para discussão desse tema. É enriquecedor. NA PRÁTICA As relações entre indivíduos e o espaço-tempo Muitas das nossas práticas estão sendo reconfiguradas cotidianamente: a forma de assistir à televisão, de consumir conteúdos, de interagir com nossos pares. Pense em práticas comuns comunicacionais (e tecnológicas) que você, como emissor ou receptor, está, ainda que inadvertidamente, mesmo sem perceber, deixando de realizar. Não lembra de nada? Auxiliarei você: há quanto 16 tempo você não lê um jornal impresso? Uma revista segmentada? Há quanto tempo não pesquisa a lista telefônica? Ou há quanto tempo não compra um compact disc (CD) de música original? E ainda: há quanto tempo não envia uma carta escrita à mão pelo correio? Arrisco-me a dizer que, dependendo da sua idade, você não realizou pelo menos uma dessas atividades. Exercite sua memória! É uma tarefa gostosa, que trará boas lembranças a você. FINALIZANDO Teorias superadas Muito do que aprendemos em teoria são marcos (pedras fundamentais) para a compreensão dos estudos comunicacionais. Mas, como em todas as áreas e ciências, temos teorias que podem estar sendo superadas. E isso é fascinante, pois mostra a capacidade real de mudanças da área que escolhemos como profissão! Bons estudos, até a próxima aula! 17 REFERÊNCIAS JENKINS, H. A cultura da convergência. São Paulo: Aleph, 2008. LÉVY, P. A inteligência coletiva: por uma antropologia do ciberespaço. Tradução de Luiz Paulo Rouanet. São Paulo: Loyola, 2010. MARQUIONI, C. E. Teorias contemporâneas da comunicação. Curitiba: Editora InterSaberes, 2017. MARTIN-BARBERO, J. Ofício de cartógrafo: travessias latino-americanas da comunicação na cultura. São Paulo: Edições Loyola, 2004. MCLUHAN, M. O meio são as mensagens. Rio de Janeiro: Record, 1969. SODRÉ, M. Antropológica do espelho: uma teoria da comunicação linear e em rede. São Paulo: Vozes, 2002. THOMPSON, J. B. The media and modernity: a social theory of the media. Stanford: Stanford University Press, 1995. WILLIAMS, R. Towards 2000. Londres: The Hogart Press, 1983. WOLTON, D. Internet e depois? Uma teoria crítica das novas mídias. Porto Alegre: Sulina, 2003.
Compartilhar