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Prévia do material em texto

PLANEJAMENTO, ORGANIZAÇÃO 
CURRICULAR E AVALIAÇÃO 
EDUCACIONAL (POCE) 
Sumário 
UNIDADE I – Currículo ................................................................... 4 
UNIDADE II – Organização, Gestão e Avaliação ........................ 23 
Introdução 
 
 
O conteúdo “Planejamento, organização curricular e avaliação 
educacional (POCE)” é um dos quatro pilares da Especialização em Docência 
para o Ensino Superior, além de fazer parte da “Coleção Educação”, 
organizada pela Biblioteca IMES, da Faculdade ImesMercosur, integrando 
também outros componentes curriculares de estudo. 
 
A literatura disponível a respeito da docência, em sua maioria, prioriza 
temas referentes a prática docente na Educação Básica. Renomados autores 
abordam aspectos da docência nesse nível de ensino, fazendo, portanto, que 
na compilação desse material proposto no Curso de Especialização em 
Docência para o Ensino Superior façamos a releitura dessas obras, voltando o 
olhar diretamente a aplicação/adaptação daqueles conceitos à docência 
universitária. 
 
Essa visão nos acompanhará ao longo dos quatro conteúdos específicos 
desse Curso. O tópico “Planejamento, organização curricular e avaliação 
educacional (POCE)” traz, em seu desenvolvimento, a compilação de 
relevantes textos sobre o assunto, reunindo os autores Vani Moreira Kenski, 
Jussara Hoffmann, Mary Rangel, Jaume Carbonell e a contribuição de 
Jucimara Oliveira da Silva na reflexão sobre a complexidade do processo de 
organização e de gestão da escola, culminando no processo de avaliação 
educacional frente a não menos complexa formulação dos currículos, 
resgatando estudos de Ireno Antonio Berticelli e Tomaz Tadeu Silva, que se 
mostram atualíssimos diante o cenário vivenciado hoje na construção do 
currículo nos variados níveis de ensino. 
 
Tenha dedicação ao estudo desse compêndio, na perspectiva do seu 
aprimoramento docente e no desenvolvimento da educação nacional de 
qualidade. 
UNIDADE I – Currículo 
 
CURRÍCULO: TENDÊNCIAS E FILOSOFIA 
 
Ireno Antonio Berticelli 
 
 
Este estudo é convite a uma incursão pela história do currículo, para 
conhecer algo de sua genealogia, das tendências e da filosofia. Não se trata de 
levar às últimas consequências nenhum destes aspectos, nem mesmo de 
defender um ponto de vista, nem, tão pouco, de se ater a um único olhar ou 
destacar e, muito menos, propor uma teoria curricular com acento privilegiado 
sobre qualquer outra. Partindo da gênese do conceito de currículo, busca-se, 
sim, verificar em que contextos e a partir de que lugares se construíram 
modos de entender o que é currículo. E, reconstruídos os modos de 
entendimento do currículo, tentou-se acompanhar-lhe os movimentos, isto é, 
as migrações, as desterritorializações e transformações que sofreu ao longo 
do tempo e nos diversos lugares. 
Partindo do pressuposto de que o currículo é construção, subentende- 
se que as várias formas que assume obedecem a discursividades diferentes, 
em que habitam filosofias resultantes das intencionalidades que o produzem, 
nos diversos tempos e nos mais diferentes lugares. Tempo e lugar ou, se se 
quiser, tempo e espaço diferentes produzem discursividades diferentes e, 
portanto, modos diferentes de entender e de produzir currículo (os 
currículos). Quer-se, aqui, entender que sendo o currículo resultante de 
discursividades diferentes, de intencionalidades diversas, de representações 
várias, nem sempre mostra, na superfície, tudo o que pode mostrar ou 
significar, em termos de consequências que pode produzir (McNeil, 1995). 
Currículo é lugar de representação simbólica, transgressão, jogo de poder 
multicultural, lugar de escolhas, inclusões e exclusões, produto de uma lógica 
explícita muitas vezes e, outras, resultado de uma “lógica clandestina”, que 
nem sempre é a expressão da vontade de um sujeito, mas imposição do 
próprio ato discursivo. 
Além de examinar o currículo como instrumento prescritivo utilizado 
ao longo do tempo, buscou-se situá-lo no contexto social, quando extrapola 
o âmbito fechado do sujeito para inserir-se na memória coletiva como 
expressão política e ideológica mais complexa e plural. Busca-se entender 
como este fenômeno aconteceu no Brasil, no decurso do tempo, destacando 
as tendências principais para, finalmente, fazer uma abordagem das mais 
recentes tendências de entender o currículo à luz dos estudos culturais, em 
que as diferenças produzem situações, entendimentos, resultados, ações, 
tratamentos, significados, coisas e estados de coisas diferentes que devem e 
necessitam ser levadas em conta por todas as pessoas em geral e pelos 
educadores em particular. Afinal, a questão do currículo é a questão central 
que diz respeito àquilo que a escola faz e para quem faz ou deixa de fazer. 
 
Velhos e novos olhares: um pouco de história 
 
 
O termo “currículo” deriva do verbo latino currere (correr). Há os 
substantivos cursus (carreira, corrida) e curriculum que, por ser neutro, tem o 
plural curricula. Significa “carreira”, em forma figurada. Daí derivam 
expressões como cursus forensis. Carreira do foro, cursus bonorum: carreira 
das honras, das dignidades funcionais públicas, sucessiva e 
progressivamente ocupadas (Enciclopédia Mirador Internacional). O termo 
cursus passa a ser utilizado, com variedade semântica a partir dos séculos 
XIV e XV, nas línguas como o português, o francês, o inglês e outras, como 
linguagem universitária. A palavra curriculum é de uso mais tardio, nessas 
línguas. Em 1682 já se utiliza em inglês, a palavra curricle, com o sentido de 
“cursino”. Nesta mesma língua, se utiliza, a partir de 1824, a palavra 
curriculum com o sentido de um curso de aperfeiçoamento ou estudos 
universitários, traduzido, também, pela palavra course. Somente no século XX 
a palavra curriculum migra da Inglaterra para os Estados Unidos sendo 
empregada no sentido de curriculum vitae. O aportuguesamento da palavra, 
no Brasil, se dá por volta de 1940. 
Há que se atentar para a seguinte particularidade: em determinados 
momentos (a partir de 1756), a palavra curriculum foi utilizada como diminutivo 
de currus (carro), que nada tem a ver com o sentido que lhe atribuímos hoje, 
nem como curriculum vitae nem como currículo escolar. 
Ao buscar as origens do currículo, tal como se entende hoje, sob a 
dupla dimensão do documento escrito e daquilo que é educativo, colocamo- 
nos, desde já, num emaranhado de filigranas semânticas e históricas que só 
muito lenta e recentemente se mostram como questão de domínio geral. Para 
exemplificar isto, citamos, abaixo, a definição da Enciclopédia Mirador 
Internacional: 
Currículo, do ponto de vista pedagógico, é um 
conjunto estruturado de disciplinas e atividades, 
organizado como objetivo de possibilitar seja 
alcançada certa meta, proposta e fixada em função de 
um planejamento educativo. Em perspectiva mais 
reduzida, indica a adequada estruturação dos 
conhecimentos que integram determinado domínio do 
saber, de modo a facilitar seu aprendizado em tempo 
certo e nível eficaz. 
 
Esta é uma síntese cuja elaboração histórica percorreu longo e plural 
caminho. Supõem-se, neste conceito, várias construções, como: pedagogia, 
disciplinas, atividades, objetivos, metas, função, planejamento (educativo), 
domínio do saber (ciências particulares), aprendizagem, “tempo certo”, nível 
de aprendizagem, eficácia da aprendizagem. Estes são domínios de 
conhecimentos bem tardios. 
Verificamos que a palavra curriculum migrou da Inglaterra para os 
Estados Unidos por volta de 1940. É apenas a partir de aproximadamente 
1945 que o conceito começa a se delinear, como produto da era industrial, 
quando se diversificam os saberes e as demandas de saberes emergentes. 
Ainda que a partir de 1920 já se tenham orientações sobre a 
problemática do currículo, é somente a partir da Segunda Guerra Mundial 
que “aparecem as primeiras formulaçõescom um maior grau de articulação” 
(Diaz Barriga, 1992, p.16, apud Terigi, op. Cit. P.162). Fruto da modernidade, 
quando a unidade filosófico-teológico se rompe para dar origem às mais 
diversas ciências particulares, emergentes da técnica, o saber educacional 
adquire a forma de uma ciência nova, a ciência pedagógica. 
Neste contexto é que surge o currículo, como ordenamento de 
saberes educativos. O conceito de currículo, acima transcrito, revela a 
multiplicidade de saberes, correlatos de várias ciências. Isto nos leva a 
assumir que o currículo se desenvolve concomitante e inspirado nas linhas 
conceituais da pedagogia estadunidense a que Dias Barriga chama de 
“pedagogia da sociedade industrial”. 
Cremos ocorrer isto pelas razões arroladas que dizem respeito ao 
desenvolvimento da tecnologia, uma das características marcantes da 
modernidade inaugurada por Galileu, a qual passa por Descartes, 
amadurece com Newton e se expande definitivamente com a era industrial. A 
partir da era industrial se faz a produção do sentido atual do currículo, 
fenômeno que se estabelece definitivamente no pós- Segunda Guerra 
Mundial. 
Não se pode olvidar a presença do currículo no Oxford English 
Dictionary, desde 1633, segundo nos informa Hamilton (1991, p.197, apud 
Terigi, op. Cit, p.162), mais como uma ocorrência terminológica que como um 
significante, com o sentido que conhecemos hoje. Em Platão e Aristóteles, 
currículo era o termo que utilizavam quando queriam referir-se aos temas 
ensinados. Portanto, num sentido bem próximo daquele que emergiu da 
modernidade. Não significa isto que tenha havido um “amadurecimento”, 
ainda, da questão curricular, mesmo em países tidos como muito “avançados” 
e de grande desenvolvimento cultural. Na França, a discussão em torno do 
currículo tardou muito a se configurar. Os teóricos da reprodução, na 
elaboração da crítica da cultura escolar, em dias tão recentes, tratam das 
questões curriculares de forma apenas indireta (Forquin, 1996). E, segundo 
Forquin, as discussões sociologias sobre o assunto aparecem, na Grã- 
Bretanha, somente a partir dos anos de 1960. Ou seja, por muito tempo, os 
saberes escolares foram tidos como “naturais” e não “problemáticos”. 
Terigi faz uma importante distinção ternária, ao se reportar à 
“verdadeira” origem do currículo, segundo três enfoques de três autores 
diferentes. Diz, textualmente: 
 Se curriculum é a ferramenta pedagógica de massificação da 
sociedade industrial, acharemos sua origem nos Estados Unidos, 
em meados do século, como a encontra Díaz Barriga, ou ainda um 
pouco antes, na década de 1920; 
 Se é um plano estruturado de estudos, expressamente referido como 
curriculum, podemos achá-lo pela primeira vez em alguma 
universidade europeia, como propõe Hamilton; 
 Se é qualquer indicação do que se ensina, podemos chegar, como 
Marsh, a Plantão e, talvez, até antes dele (Terigi, 1996). 
 
Esta distinção tem o mérito de contemplar o sentido de “origem” em 
sua multiplicidade de sentidos. A autora se atém às três possibilidades de 
determinar a origem do currículo, sem descartar a possibilidade de tantas 
outras mais, na dependência de diferentes enfoques. 
 
Filosofia e currículo: as prescritividades 
 
Partimos do pressuposto teórico de que currículo é construção. Se é 
construção, então a pluralidade curricular é correlata às formas 
epistemológicas das discursividades. “Sua construção supõe certa 
perspectiva assumida na área da filosofia da educação, dado que é em 
função do sistema a que se dá assentimento que se precisam a direção e o 
sentido próprio do processo pedagógico” (Enciclopédia Mirador Internacional). 
O autor do verbete currículo, da enciclopédia que aqui se cita, vincula o 
conceito de currículo a realidades sociais e culturais, tendo em vista que são 
estas que decidem sobre a possibilidade ou não de certa organização, 
mesmo de sua conveniência ou inconveniência. Põe-se em relevo, nestes 
termos, o caráter político e a ordem do poder, na determinação do currículo: é 
a concretude da prescritividade que materializa no currículo. Isto autoriza os 
estudiosos a fazer o currículo remontar à Grécia clássica, dada a 
prescritividade da educação entre gregos, a exemplo da educação 
espartana, de caráter eminentemente militar, em que, para cada tempo 
(idade do educando), havia exercícios físicos e intelectuais bem marcados. 
Vale dizer o mesmo para a educação praticada em Atenas, onde o ideal da 
Paidéia se realizava prescritivamente. Se considerada a prescritividade 
como parâmetro, a Idade Média se caracterizou pela educação e ensino 
pautados pelo Trivium e pelo Quadrivium, um currículo disciplinar bem 
definido. A prescritividade já não caracteriza apenas um dos aspectos da 
origem do currículo, senão que diz respeito à sua ontologia, se tido em seu 
conceito. 
A prescritividade continua presente em toda a ideia de currículo e em 
todas as práticas curriculares. Contudo, não se sustenta mais manter um 
critério curricular universal e um currículo fechado em uma prescritividade 
única. Em currículo, cultura e sociedade (Moreira e Silva, 1994, p.28), os 
autores rejeitam o conceito de currículo como um rol de coisas a serem 
transmitidas e absorvidas com passividade. O currículo é, antes, “...um terreno 
de produção e de política cultural, no qual os materiais existentes funcionam 
como matéria-prima de criação, recriação e, sobretudo, de contestação e 
transgressão”. “Recriação” e “transgressão” são os termos que põem de 
manifesto a dinâmica curricular. Rompe-se, assim, o sentido monolítico em 
que tantas vezes se enredam professores, diretores e supervisores, na 
prática escolar. Uma concepção dinâmica de currículo só pode ser construída 
quando se pensam, conjuntamente, currículo e sociedade. 
Na acepção corrente nos países de língua inglesa e francesa, o 
currículo é entendido como conjunto de coisas que se ensinam e coisas que 
se aprendem, de conformidade com uma ordem e progressão previstas, 
compreendendo um ciclo de estudos. Currículo se caracteriza como 
programa de formação, global, com coerência didática e distribuição no 
tempo, de forma sequencial, com situações e atividades ordenadas. Trata-se 
de um “programa” de estudos, um “programa” de formação. Este é o 
conceito formal, prescritivo de currículo (Forquin, 1996, p.187). Pode, ainda, 
ser entendido, o currículo, acessoriamente, segundo Forquin, como “...aquilo 
que é realmente ensinado nas salas de aula e que está, às vezes, muito 
distante daquilo que é oficialmente prescrito”. Nesta linha se entende, 
também, currículo como todas as ações previstas, organizadas pela escola. 
Portanto, a prescritividade se atém, aqui, no nível do estabelecimento de 
ensino. Em sentido ainda mais lato, podem-se entender como currículo os 
conteúdos não expressos, mas latentes da socialização escolar, “...o 
conjunto de competências ou de disposições que se adquire na escola por 
experiência, impregnação, familiarização ou inculação difusas, ou seja, tudo 
aquilo que os autores anglófonos designam, às vezes, pelo termo „currículo 
oculto‟, em contraste com aquilo que se adquire através de procedimentos 
pedagógicos explícitos ou intencionais” (Idem). Lato sensu, currículo diz 
respeito a saberes, conteúdos, competências, símbolos, valores. A 
normatividade maior ou menor, a maior ou menor prescritividade, é que 
determinam os vários sentidos de currículo e seus vários conceitos. 
Em qualquer acepção que se tome o currículo, sempre se está 
comprometido com algum tipo de poder. Não há neutralidade nessa opção. 
Inclusões e exclusões estão sempre presentes no currículo. Como se 
expressa Santomé (1996), “Toda propuesta curricular implica tomar opciones 
entre distintas parcelas de la realidad, supone una sellección cultural que se 
ofrece a las nuevas generaciones para facilitar su socialización” (p.5). E o 
autor se interroga,a seguir, sobre quem são as pessoas que vão participar 
dessa tomada de decisões acerca da seleção de conteúdo que visam ajudar as 
novas gerações a compreender o mundo que as cerca, conhecer-lhe sua 
história, promover valores e utopias. Em tais decisões é que se faz sentir o 
poder político, econômico, cultural e religioso. Esse é o momento em que se 
incluem ou excluem etnias, grupos sociais desfavorecidos e marginalizados 
de mulheres, trabalhadores, pessoas da terceira idade, os pobres, os mais 
desvalidos, os homossexuais e lésbicas, o mundo rural, meninos e meninas, 
adolescentes e aqueles que caracterizam o assim denominado Terceiro 
Mundo. Nessa exclusão / inclusão, segundo o mesmo autor, funcionam os 
materiais didáticos e livros-texto que materializam as propostas curriculares. 
Portanto, a elaboração curricular remete à questão que diz respeito ao tipo de 
cidadãos que se quer construir. Daí a importância do currículo posto em 
confronto com a sociedade. No currículo é que se colocam as parcelas da 
realidade que se levam à análise e conhecimento de educandos e 
educadores. Os recortes do real são decisivos na configuração do cidadão 
que se quer produzir. Nisto se efetiva a intencionalidade do currículo, a 
ideologia, a filosofia educacional. Neste caso, o currículo é veículo, numa 
coincidência feliz com o diminutivo da palavra latina Currus (carro, veículo), 
ou seja: curriculum. Currículo é veículo que contém a filosofia, a ideologia, a 
intencionalidade educacional. Santomé (op. Cit.) ressalta: 
 
Desarrollar proyectos curriculares en las aulas 
obliga a estar alerta ante un sin número de 
cuestiones: a las tareas que cada uno de los chicos 
llevan a cabo, al seguimiento de sus realizaciones, 
de lo que saben y de aquello que todavía les 
resulta ininteligible; a detectar sus percepciones de 
la realidad, valoraciones, expectativas y prejuicios; 
a la apreciación de su desarrollo social y emocional y 
de las situaciones problemáticas que afectan a sus 
interacciones sociales (p.1). 
 
Efetivamente, o currículo sempre é currículo para alguém, construído 
a partir de alguém. Urge, pois, que autor e destinatário coincidam ao 
convencionar o que é de fato importante. E esta coincidência só pode nascer da 
participação efetiva de uma proposta curricular. O professor se afigura 
personagem importante deste cenário, juntamente com seus alunos e não 
com alunos hipotéticos. O conceber um currículo demanda experiência 
(vivência) e reflexão teórica. Disto é que podem resultar projetos curriculares 
comprometidos com realidades concretas. E que tipo de questões podem 
interessar à reflexão e estudo de quem se compromete com um plano ou 
proposta curricular? As questões culturais, as questões do trabalho, as 
questões econômicas e políticas “são imprescindíveis para alcançar uma 
adequada compreensão da comunidade e do mundo em que ela vive”, diz 
Jurjo Torres Santomé. 
No ato de escrever um currículo também funciona a lógica clandestina 
do compreender, do pensar e do escrever, que medeia entre as intenções 
iniciais e o que vai para o papel como tão bem nos esclarece Flickinger 
(1995), quando “O conteúdo, presumidamente disponível, embaralha-se; 
privado inexplicavelmente da precisão intuída, ele recusa agora a 
representação em palavras, conceitos e frases. Ao escrever, escapa-nos a 
ideia às quais havíamos chegado na fase preliminar das considerações em 
torno do tema”. Esta situação ocorre para aqueles que estão impregnados de 
compromisso com o discurso pensado, com o currículo elaborado. Por isto, há 
premente necessidade de engajamento profissional daqueles que são 
responsáveis pelos currículos. 
 
Currículo e sociedade 
 
Até os anos 1960, as questões curriculares eram tratadas “em si 
mesmas”. Não se confrontavam com a sociedade onde se inseriam. A 
implicação social do currículo começou a ser pensada na Grã-Bretanha, a 
partir dessa década. 
Um tema desenvolvido por Raumond Williams em seu livro The long 
revolution (1961) vai se tornar um dos primeiros motivos dessa reflexão: o da 
cultura como “tradição coletiva”, processo de decantação e de 
reinterpretação permanente da herança deixada pelas gerações anteriores 
(Forquin, 1996 p. 189). 
Compreende-se, a partir de então, que o currículo traduz elementos 
da memória coletiva, expressão ideológica, política, expressão de conflitos 
simbólicos, de descobrimento e ocultamento, segundo os interesses e jogos 
de força daqueles que estão envolvidos (ou não) no processo educativo. 
Forquin, tanto quanto Santomé, destaca a função seletiva currículo, na 
escolha de conteúdos. Trata-se, segundo Forquin, da “seleção cultural 
escolar”. Quando se fala em “seleção de conteúdos”, não se fala de coisa 
neutra: na escolha de conteúdos curriculares se determinam variáveis 
sociais significativas e dinâmicas. Põem-se em jogo interesses, exercita-se 
poder, determinam-se rumos políticos. Urde-se uma trama social complexa, 
cujas derivações rizomáticas configuram a complexidade e mobilidade em 
que se movem os sujeitos, se constituem e destituem forças concretizadas 
em sujeitos do processo educativo, quando nem sempre o interesse da 
maioria “é o que interessa” e onde minorias são, tantas vezes, simplesmente 
ignoradas. O currículo é um dos “lugares” em que se “concede a palavra” ou 
“se toma a palavra”, no jogo das forças políticas, sociais e econômicas. A 
manipulação da informação é facilmente exercitada através do currículo 
explicitado nos manuais escolares que circulam internamente à escola, mas 
que são curriculum (veículo) das ideias e das práticas que “rolam” fora da 
escola-instituição. No currículo pode-se “ler”, assim social, as estratificações, 
o pensamento dominante, os interesses explícitos e implícitos do poder 
difuso, multipartite e multifacetado (de muitos rostos), polífono (de muitas 
vozes). É bom lembrar que poder não diz respeito somente (e talvez nem 
principalmente) aos grandes blocos de poder visível e constituído: há um 
poder, como atesta Foucault em várias obras, que é difuso, que se distribui 
em mil instâncias pequenas, individuais, de pequenos grupos, nas 
reentrâncias da sociedade. No currículo não é diferente: o exercício do poder 
por meio do currículo é muito difuso, passando pela instituição, pelos grupos 
que circulam na instituição, pelos sujeitos diversos da comunidade escolar e 
extraescolar. 
 
Tendências no Brasil 
 
Não temos, no Brasil, algo que corresponda efetivamente a um estudo 
aprofundado, de tradição consolidada sobre o problema do currículo. É um 
campo do conhecimento educacional pouco explorado ainda. Esta questão 
tem sido discutida de forma difusa em muitos “lugares”, por exemplo, junto 
com a questão do livro didático, na discussão das relações escola e sociedade, 
junto com a questão das dificuldades de aprendizagem dos alunos, com o 
problema da competência técnica e política do professor e outras temáticas 
mais. 
A relação estreita entre currículo e sociedade começou a ser posta no 
Brasil a partir do final da década de 1960. Este fenômeno, que já ocorrera no 
assim chamado Primeiro Mundo a partir da mesma década e que recebeu o 
nome de Nova Sociologia da Educação (NSE), tem, com efeito, por 
característica essencial, considerar o conjunto dos funcionamentos e dos 
fatores sociais da educação a partir de um ponto de vista privilegiado que é 
o da seleção, da estruturação, da circulação e da legitimação dos saberes e 
dos conteúdos simbólicos incorporados nos programas e nos cursos. Na 
busca de uma resposta a uma série de questionamento em torno do 
currículo, surgiu a Sociologia do Currículo. Questões tais como: (a) O que 
pode ou não ser considerado de valor educativo para fazer parte dos 
conteúdos a serem transmitidos pela escola? (b) Quem faz a seleção dos 
conteúdos e, portanto, dos elementos das culturas que fazem parte dos 
currículos? (c) A quemservem os conteúdos ensinados nas escolas? (d) 
Como é tratada a cultura das classes populares nos currículos? Estas 
questões determinam o desencadeamento dos estudos da Sociologia do 
currículo, em muitos lugares do planeta, inclusive no Brasil. 
As diferenças culturais emergiam como temática importante, cujo 
estudo vem tomando corpo no Brasil, especialmente na Universidade 
Federal do Rio Grande do Sul que, nos cursos de pós-graduação em 
educação, tem oferecido vários seminários avançados sobre o assunto. Além 
de apresentar uma produção notável para a incipiência do tema. O grande 
desafio ainda por vencer é conseguir que estes enfoques cheguem às escolas. 
Por ora, a discussão, em nosso país, se encontra ainda em nível de 
academia. Não se deve, contudo, negar, a qualquer título, a abertura de 
caminhos que representaram as discussões de caráter dialético-marxista 
encetadas em 1979 por Dermeval Saviani e numerosos outros educadores, que 
resultaram em teorização tais como a teoria crítico-social dos conteúdos, a 
pedagogia histórico-crítica e outras, com uma produção científica avantajada. 
Mas foi mais tarde que começou, no Brasil, a discussão em torno do 
multiculturalismo, os Estudos Culturais iniciados na Inglaterra. Justo num país 
como o nosso, em que se entrelaçaram culturas tão diferentes, o 
multiculturalismo deveria estar ocupando lugar de destaque, o que está longe, 
ainda, de acontecer. 
Enfocado como um problema precipuamente prático, o currículo, no 
Brasil, demorou a alcançar um nível de discussão sociológica. Mas, na 
década de 1980, neste país, como destacamos acima, houve um progresso 
notável. O debate foi aceso e abrangente. A educação popular ganhou 
espaços na reflexão e na prática pedagógica, bem como em nível teórico. 
Além das teorias crítico-sociais, o construtivismo teve grande aceitação nos 
meios educacionais brasileiros (e prossegue tendo, em larga escala). As 
propostas curriculares oficiais avançaram muito em seus aspectos teóricos, 
ensejando práticas consequentes, ainda que tenhamos a convicção de que 
as práticas ficaram muito e muito aquém das teorizações. 
Seguindo essa linha de investigação, podemos dividir em três 
momentos distintos a produção de pesquisa em torno do currículo escolar 
dos últimos dez anos: em 1983 – 1985, os raros autores que trataram do 
currículo, pouco uso fizeram da teoria da reprodução como recurso 
interpretativo. A NSE não era de domínio desses autores. As teorizações de 
Michael W. Apple e Henry Giroux eram citadas, sem que se fizesse delas 
utilização maior. Nem mesmo autores brasileiros, como Paulo Freire, 
inspiraram a produção científica sobre currículo. A inspiração teórica básica 
continuou sendo Tyler. Alguns autores se limitaram a discutir o lugar de 
algumas disciplinas e não muito mais que isto. Apareceram trabalhos 
meramente exploratórios, sem expressão teórica maior. 
O que predomina são as já amplamente discutidas teorização da 
década de 1970. O conceito de currículo, até esse período, se atinha muito à 
ideia de rol de disciplinas e ainda não se percebia, no Brasil, como em outros 
países, a mera função instrumental das disciplinas no contexto curricular. 
Fizeram-se estudos que trataram de currículos e programas, nos quais o 
acento é posto no papel social a ser desempenhado tanto pela escola 
quanto pela comunidade. Fizeram-se, ainda, estudos cujos resultados e 
recomendações eram de que se tratasse do maior número possível de 
assuntos nos currículos, para, dessa forma, se instrumentalizarem as 
camadas populares para que pudessem superar os estereótipos, 
experiências e pressões da ideologia dominante. 
A pesquisa em torno do currículo do primeiro grau se intensifica em fins 
de 1985, visando buscar causas de evasão e repetência, grave problema 
educacional. Tais estudos tendiam a encontrar as causas dos problemas na 
questão dos conteúdos. Não se chegou a apontar as mudanças que 
poderiam reverter os problemas e gerar o fortalecimento da educação formal 
do país. 
O período de 1986 a 1989 trouxe mudanças significativas. Tais 
mudanças se relacionam a um artigo de L. Domingues, intitulado “Interesses 
humanos e paradigmas curriculares”, na Revista Brasileira de Estudos 
Pedagógicos, onde aplicou a classificação de currículo feita por McDonald, 
inspirado em Habermas, para a realidade brasileira. Afinal, nesse período se 
superou a concepção de currículo como elenco de disciplinas ou listagem de 
conteúdos e se pensou no sentido de que todas as atividades da escola são 
significativas para o saber do aluno, para sua apropriação de conhecimento. 
A escola é que, nesta visão, assume tal papel social. Os estudiosos dessa 
época também trabalham a questão da adequação dos conteúdos aos 
alunos. Fez-se a análise que se faz, hoje, dos silenciamentos e dos modos e 
métodos de provocá-los. A tendência mais corrente é a de adotar um currículo 
crítico ou, ao menos, uma postura crítica diante das questões curriculares. 
Começou-se a pensar sobre a adequação do currículo às classes e grupos 
mais excluídos sobretudo pela pobreza material. Buscou-se discutir a 
questão da formação básica para todos os brasileiros, com respeito mantido 
pelas questões e interesses regionais. Considerou-se importante, neste 
período, discutir os conteúdos que se configuram como necessários à 
educação. Fez-se uma crítica e reconsideração sobre os encaminhamentos da 
década de 1970. Lançaram-se novas propostas curriculares, na tentativa de 
rearticular o que se propunha como saída para os reais problemas de sala 
de aula. Mas os estudos da NSE continuaram sendo ignorados. 
De 1990 em diante, as teorias que já se haviam fortemente firmado em 
vários países desenvolvidos, passaram a ser utilizadas para a análise dos 
problemas curriculares, no Brasil. Não se fez mera importação teórica, mas 
fez-se uma utilização crítica das teorias mais atualizadas de então. 
Tomaz Tadeu da Silva iniciou importantes estudos curriculares, 
resultado de seus contatos produtivos com educadores estrangeiros. Teceu 
várias e fundamentadas críticas ao que se vinha fazendo em termos de estudo 
do currículo, sobretudo o fato de se terem ignorado os avanços da NSE e o 
rápido abandono da teoria da reprodução. Voltou-se com força para a 
produção e divulgação de análises conectadas, agora, a um novo campo de 
discussão – os Estudos Culturais. Esta trajetória de Silva prossegue com 
várias reflexões, e aparece em ensaios como Os novos mapas culturais e o 
lugar do currículo numa paisagem pós-moderna (publicado em Silva e 
Moreira, 1995) e Currículo e identidade social: territórios contestados 
(publicado em Silva, 1995), indicando novos rumos para o debate. Este breve 
levantamento corre o risco de ser incompleto, pela sua contemporaneidade. É 
mesmo difícil fazer justiça ao citar obras que se impuseram no cenário 
nacional e internacional, na discussão do currículo, nos dias recentes. O que 
se pode dizer é que a questão dos Estudos Culturais vem ganhando espaço 
na preocupação dos estudiosos do currículo. É, no Brasil, uma discussão 
que começa a se expandir. O curso de pós-graduação em educação da 
Universidade Federal do Rio Grande do Sul tem sido um ambiente de 
receptividade e produtividade nesta linha. 
Currículo e cultura 
 
Como já foi comentado, uma das mais recentes tendências quanto 
aos estudos curriculares é a de ligar o tema às questões culturais. Os 
Estudos Culturais, que tiveram sua origem na Inglaterra, vêm influenciando 
significativamente a questão do currículo, como se ressaltou acima. É 
pertinente o que afirmam Moreira & Silva (1994); “... a cultura é o terreno em 
que se enfrentam diferentes e conflitantes concepções de vida social, é aquilo 
pelo qual se luta e não aquilo que recebemos” (p. 27). Numa perspectiva 
foucaultiana, a variável “poder” é decisiva na atual análise dos fenômenos 
sociais. Toda ênfase nas questõesculturais é dada, na análise, tanto dos 
componentes, quanto dos veículos desses componentes, no estudo do 
currículo, bem como na maneira pela qual se desenvolvem na escola. A 
variável “inclusão/exclusão” é amplamente empregada nessa mesma análise. 
O “olhar” se tornou parâmetro interpretativo dos fenômenos sociais. Basta 
verificar quantos artigos vêm intitulados com a palavra “olhar/olhares”. Mas 
não se trata, aqui, de ver a cultura como algo geral, genérico, abrangente, 
categoria universal. Trata-se, mais, de descobrir na cultura as diferenças 
mínimas, mas significativas, dinâmicas, diferenças que produzem diferenças. 
É significativo o cuidado, por exemplo, de vários autores e autoras e 
docentes, em ressaltar a diferença que faz se se trata de homem ou de 
mulher, de professor ou de professora, quando a categoria gênero entra em 
cena na análise dos fenômenos sociais. Daí a explicar-se o fato da utilização, 
na linguagem escrita e mesmo falada, da forma masculina e feminina 
(homem/mulher – professor/professora), grafia e verbalização, 
convenhamos, incômoda, mas reveladora de sentidos. Nos Estudos 
Culturais voltados para o currículo não se podem mais ignorar as diferenças 
culturais, de gênero, de raça, de cor, sexo etc. 
Se aprofundássemos certos aspectos filosóficos destas questões, 
desembocaríamos na filosofia prática: a ética. Há, em todo o enfoque cultural 
destas questões, uma profunda preocupação com os valores éticos do 
respeito, do cuidado heideggeriano com a vida, com o outro, com o sujeito 
diferente, com a dor da exclusão, com a mágoa das minorias 
marginalizadas, com os excluídos, com a discriminação dos gays e lésbicas, 
com a exploração da mulher, com o abandono das crianças, com o 
silenciamento dos jovens e adolescentes. 
De fato, sem entrar em profundidade em nenhuma destas graves 
questões, podemos afirmar que o argumento ético é forte, prevalece, torna 
visíveis as feridas sociais, nos estudos culturais e nestes, quando voltados 
para o currículo, entre outras questões candentes deste fim de milênio. As 
análises foucaultianas do poder, do disciplinamento dos corpos e das almas, 
a microfísica dos poderes que pervadem tudo, a política miúda, pulverizada 
mas eficiente, que submete, tudo isto que Foucault magistralmente trouxe à 
visibilidade tem servido amplamente para sustentar a análise social da 
educação e análise curriculares. Vários teóricos, ao lado de e junto a 
Foucault, como Derrida, Deleuze, Guattari, Gilddens, Gadamer, Baudrillard, 
Vattimo e tantos outros, possibilitaram uma base de discussão teórica das 
práticas, sem pretenderem se tornar um “Grund”, ou seja, um fundamento, na 
argumentação dos fenômenos sociais em que se insere a educação e o 
currículo escolar. O currículo está intimamente ligado às questões culturais, 
desde o momento em que se faz a pergunta: “Currículo para quem?” Afinal, 
a questão do currículo é a questão central que diz respeito àquilo que a 
escola faz e para quem faz ou deixa de fazer. 
 
Resumindo 
 
O currículo tem história recente. Ainda que seja um termo utilizado 
desde a antiguidade clássica, como é hoje entendido, o currículo começou a 
fazer história apenas nas últimas décadas. Se por algum tempo (até a 
década de 1960) as questões curriculares estiveram desconectadas dos 
problemas sociais, a partir de então, com a Nova Sociologia Educacional, 
começando pela Grã-Bretanha, pela França, este enfoque, o sociológico, se 
espalhou pelo mundo todo, chegando ao Brasil pelo fim da década de 1980. 
Hoje, as questões curriculares estão intimamente conectadas aos 
problemas sociais e, em dias mais recentes, aos aspectos culturais. Mais uma 
vez a Inglaterra tomou a frente nestes estudos. A tendência atual é aprofundar 
esta questão, numa forte tentativa de eticidade perante asdiferenças. A filosofia 
pós-moderna contribui, sem dúvida, a refletir a contingência, a pluralidade, a 
descontinuidade, o discurso, os recortes mínimos, as realidades pequenas: a 
“realidade real”. Fortaleceu a convicção de que a vontade de poder 
determina rumos históricos, toma decisões, encaminha a história, dispõe dos 
corpos e das almas para submetê-los aos interesses, à filigrana dos 
interesses manifestos e ocultos nas mais recônditas fendas e fissuras, nos 
mais intricados labirintos produzindo inclusões e exclusões, deitando 
“olhares”, ditando normas (normatividade), instituindo “realidades”. 
A sociedade pós-moderna se caracteriza pela complexidade. A 
técnica é multifacetada: é um mundo brilhante, luzidio, atraente, tentador, que 
traz conforto e felicidade a um tempo e massificação e depressão moral 
noutro tempo. A massificação é brutal. O currículo é o lugar dos eventos 
micro e macro, dos sistemas educacionais, das instituições, a um tempo, e o 
lugar, também, dos desejos mínimos, por outro. As decisões tomadas a 
respeito do currículo (micro ou macro) afetam sempre vidas, sujeitos. Daí, a 
sua importância. 
TEORIAS DO CURRÍCULO: O QUE É ISTO? 
 
Tomaz Tadeu Silva 
 
 
Extraído do livro: 
SILVA, Tomaz Tadeu. Documentos de Identidade: uma introdução às 
teorias do currículo. Belo Horizonte: Autêntica, 2005. 
 
O que é uma teoria do currículo? Quando se pode dizer que se tem 
uma "teoria do currículo"? Onde começa e como se desenvolve a história 
das teorias do currículo? O que distingue uma "teoria do currículo" da teoria 
educacional mais ampla? Quais são as principais teorias do currículo? O que 
distingue as teorias tradicionais das teorias críticas do currículo? O que 
distingue as teorias críticas do currículo das teorias pós-críticas? 
Podemos começar pela discussão da própria noção de "teoria". Em 
geral, está implícita, na noção de teoria, a suposição de que a teoria 
"descobre" o "real", de que há uma correspondência entre "teoria" e 
"realidade". De uma forma ou de outra, a noção envolvida é sempre 
representacional, especular, mimética: a teoria representa, reflete, espelha a 
realidade. A teoria é uma representação, uma imagem, um reflexo, um signo 
de uma realidade que – cronologicamente, ontologicamente – a precede. 
Assim, para já entrar no nosso tema, uma teoria do currículo começaria por 
supor que existe, "lá fora". Esperando para ser descoberta, descrita e 
explicada, uma coisa chamada "currículo". O currículo seria um objeto que 
precederia a teoria, a qual só entraria em cena para descobri-lo, descrevê-lo, 
explicá-lo. 
Da perspectiva do pós-estruturalismo, hoje predominante na análise 
social e cultural, é precisamente esse viés representacional que torna 
problemático o próprio conceito de teoria. De acordo com essa visão, é 
impossível separar a descrição simbólica, linguística da realidade – isto é, a 
teoria – de seus "efeitos de realidade". A "teoria" não se limitaria, pois, a 
descobrir, a descrever, a explicar a realidade: a teoria estaria 
irremediavelmente implicada na sua produção. Ao descrever um "objeto", a 
teoria, de certo modo, o inventa. O objeto que a teoria supostamente 
descreve é, efetivamente, um produto de sua criação. 
Nessa direção, faria mais sentido falar não em teoria, mas em 
discursos ou textos. Ao deslocar a ênfase do conceito de teoria para o de 
discurso, a perspectiva pós-estruturalista quer destacar precisamente o 
envolvimento das descrições linguísticas da "realidade" em sua produção. 
Uma teoria supostamente descobre e descreve um objeto que tem uma 
existência independentemente relativamente à teoria. Um discurso, em troca, 
produz seu próprio objeto: a existência do objeto é inseparável da trama 
linguística que supostamente o descreve. Para voltar ao nosso exemplo do 
"currículo", um discurso sobre o currículo – aquilo que, numa outra 
concepção, seria uma teoria – não se restringe a representar uma coisa que 
seria o "currículo", que existiria antes desse discurso e que está ali, apenas à 
espera de ser descoberto e descrito. Um discurso sobre ocurrículo, mesmo 
que pretenda apenas descrevê-lo "tal como ele realmente é", o que 
efetivamente faz é produzir uma noção particular de currículo. A suposta 
descrição é, efetivamente, uma criação. Do ponto de vista do conceito pós- 
estruturalista de discurso, a "teoria" está envolvida num processo circular: 
ela descreve como uma descoberta algo que ela própria criou. Ela primeiro 
cria e depois descobre, mas, por um artifício retórico, aquilo que ela cria 
acaba aparecendo como uma descoberta. 
Podemos ver como isso funciona num caso concreto. Provavelmente 
o currículo aparece pela primeira vez como um objeto específico de estudo e 
pesquisa nos Estados Unidos dos anos vinte. Em conexão com o processo 
de industrialização e os movimentos imigratórios, que intensificavam a 
massificação da escolarização, houve um impulso, por parte de pessoas 
ligadas sobretudo à administração da educação, para racionalizar o 
processo de construção, desenvolvimento e testagem de currículos. As 
ideias desse grupo encontram sua máxima expressão no livro de Bobbitt, 
The curriculum (1918). Aqui, o currículo é visto como um processo de 
racionalização de resultados educacionais, cuidadosa e rigorosamente 
especificados e medidos. O modelo institucional dessa concepção de 
currículo é a fábrica. Sua inspiração "teórica" é a "administração científica", 
de Taylor. No modelo de currículo de Bobbitt, os estudantes devem ser 
processados como um produto fabril. No discurso curricular de Bobbitt, pois, 
o currículo é supostamente isso: a especificação precisa de objetivos, 
procedimentos e métodos para a obtenção de resultados que possam ser 
precisamente mensurados. Se pensarmos no modelo de Bobbitt através da 
noção tradicional de teoria, ele teria descoberto e descrito o que, 
verdadeiramente, é o "currículo". Nesse entendimento, o "currículo" sempre 
foi isso que Bobbitt diz ser: ele se limitou a descobri-lo e a descrevê-lo. Da 
perspectiva da noção de "discurso", entretanto, não existe nenhum objeto "lá 
fora" que se possa chamar de "currículo". O que Bobbitt fez, como outros 
antes e depois dele, foi criar uma noção particular de "currículo". Aquilo que 
Bobbitt dizia ser "currículo" passou, efetivamente, a ser o "currículo". Para 
um número considerável de escolas, professores, de estudante, de 
administradores educacionais, "aquilo" que Bobbitt definiu como sendo 
currículo tornou-se uma realidade. 
A noção de discurso teria uma vantagem adicional. Ela nos 
dispensaria de fazer o esforço de separar – como seríamos obrigados, se 
ficássemos limitados à noção tradicional de teoria – asserções sobre a 
realidade de asserções sobre como deveria ser a realidade. Como sabemos, 
as chamadas "teorias do currículo", assim como as teorias educacionais 
mais amplas, estão recheadas de afirmações sobre como as coisas 
deveriam ser. Da perspectiva da noção de discurso, estamos dispensados 
dessa operação, na medida em que tanto supostas asserções sobre a 
realidade quanto asserções sobre como a realidade deveria ser têm "efeitos 
de realidade" similares. Para dizer de outra forma, supostas asserções sobre 
a realidade acabam funcionando como se fossem asserções sobre como a 
realidade deveria ser. Elas têm o mesmo efeito: p de fazer com que a 
realidade se torne o que elas dizem que é ou deveria ser. Para retomar o 
exemplo de Bobbitt, é irrelevante saber se ele está dizendo que o currículo 
é, efetivamente, um processo industrial e administrativo ou, em vez disso, 
que o currículo deveria ser um processo industrial e administrativo. O efeito 
final, de uma forma ou outra, é que o currículo se torna um processo 
industrial e administrativo. 
Apesar dessas advertências, a utilização da palavra "teoria" está 
muito amplamente difundida para poder ser simplesmente abandonada. Em 
vez de simplesmente abandoná-la, parece suficiente adotar uma 
compreensão da noção de "teoria" que nos mantenha atentos ao seu papel 
ativo na constituição daquilo que ela supostamente descreve. É nesse 
sentido que a palavra "teoria", ao lado das palavras "discurso" e 
"perspectiva", será utilizada ao longo deste livro. 
A adoção de uma noção de teoria que levasse em conta seus efeitos 
discursivos nos pouparia de uma outra dor de cabeça: a das definições. 
Todo livro de currículo que se preze inicia com uma boa discussão sobre o 
que é, afinal, "currículo". Em geral, começam com as definições dadas pelo 
dicionário dadas por uns quantos manuais de currículo. Na perspectiva aqui 
adotada, que vê as "teorias" do currículo a partir da noção de discurso, as 
definições de currículo não são utilizadas para capturar, finalmente, o 
verdadeiro significado de currículo, para decidir qual delas mais se aproxima 
daquilo que o currículo essencialmente é, mas, em vez disso, para mostrar 
que aquilo que o currículo é depende precisamente da forma como ele é 
definido pelos diferentes autores e teorias. Uma definição não nos revela o 
que é, essencialmente, o currículo: uma definição nos revela o que uma 
determinada teoria pensa o que o currículo é. A abordagem aqui é muito 
menos ontológica (qual é o verdadeiro "ser" do currículo?) e muito mais 
histórica (como, em diferentes momentos, em diferentes teorias, o currículo 
tem sido definido?). 
Talvez mais importante e mais interessante do que a busca da 
definição última de "currículo" seja a de saber quais questões uma "teoria" 
do currículo ou um discurso curricular busca responder. Percorrendo as 
diferentes e diversas teorias do currículo, quais questões comuns elas 
tentam, explícita ou implicitamente, responder? Além das questões comuns, 
que questões específicas distinguem as diferentes teorias do currículo? 
Como essas questões específicas distinguem as diferentes teorias do 
currículo? 
A questão central que serve de pano de fundo para qualquer teoria do 
currículo é a de saber qual conhecimento deve ser ensinado. De uma forma 
mais sintética a questão central é: o quê? Para responder a essa questão, 
as diferentes teorias podem recorrer a discussões sobre a natureza humana, 
sobre a natureza da aprendizagem ou sobre a natureza do conhecimento, da 
cultura e da sociedade. As diferentes teorias se diferenciam, inclusive, pela 
diferente ênfase que dão a esses elementos. Ao final, entretanto, elas têm 
que voltar à questão básica: o que eles ou elas devem saber? Qual 
conhecimento ou saber é considerado importante ou válido ou essencial 
para merecer ser considerado parte do currículo? 
A pergunta "o quê?", por sua vez, nos revela que as teorias do 
currículo estão envolvidas , explícita ou implicitamente, em desenvolver 
critérios de seleção que justifique, a resposta que darão àquela questão. O 
currículo é sempre o resultado de uma seleção: de um universo mais amplo 
de conhecimentos e saberes seleciona-se aquela parte que vai constituir, 
precisamente, o currículo. As teorias do currículo, tendo decidido quais 
conhecimentos devem ser selecionados, buscam justificar por que "esses 
conhecimentos" e não "aqueles" devem ser selecionados. 
Nas teorias do currículo, entretanto, a pergunta "o quê?" nunca está 
separada de uma outra importante pergunta: "o que eles ou elas devem 
ser?" ou, melhor, "o que eles ou elas devem se tornar?". Afinal, um currículo 
busca precisamente modificar as pessoas que vão "seguir" aquele currículo. 
Na verdade, de alguma forma, essa pergunta precede à pergunta "o quê?", 
na medida em que as teorias do currículo deduzem o tipo de conhecimento 
considerado importante justamente a partir de descrições sobre o tipo de 
pessoa que elas consideram ideal. Qual é o tipo de ser humano desejável 
para i, determinado tipo de sociedade? Será a pessoa racional e ilustrada do 
ideal humanista de educação? Será a pessoa otimizadora e competitiva dos 
atuais modelos neoliberais de educação? Será a pessoa ajustada aos ideais 
de cidadania do moderno estado-nação? Seráa pessoa desconfiada e 
crítica dos arranjos sociais existentes preconizada nas teorias educacionais 
críticas? A cada um desses "modelos" de ser humano corresponderá um tipo 
de conhecimento, um tipo de currículo. 
No fundo das teorias do currículo está, pois, uma questão de 
"identidade" ou de "subjetividade". Se quisermos recorrer à etimologia da 
palavra "currículo", que vem do latim curriculum, "pista de corrida", podemos 
dizer que no curso dessa "corrida" que é o currículo acabamos por nos 
tornar o que somos. Nas discussões cotidianas, quando pensamos em 
currículo pensamos apenas em conhecimento, esquecendo-nos de que o 
conhecimento que constitui o currículo está inextricavelmente, centralmente, 
vitalmente, envolvido naquilo que somos, naquilo que nos tornamos: na 
nossa identidade, na nossa subjetividade. Talvez possamos dizer que, além 
de uma questão de conhecimento, o currículo é também uma questão de 
identidade. É sobre essa questão, pois, que se concentram também as 
teorias do currículo. 
Da perspectiva pós-estruturalista, podemos dizer que o currículo é 
também uma questão de poder e que as teorias do currículo, na medida em 
que buscam dizer o que o currículo deve ser, não podem deixar de estar 
envolvidas em questões de poder. Privilegiar um tipo de conhecimento é 
uma operação de poder. Destacar, entre as múltiplas possibilidades, uma 
identidade ou subjetividade como sendo a ideal é uma operação de poder. 
As teorias do currículo não estão, neste sentido, situadas num campo 
"puramente" epistemológico, de competição entre "puras" teorias. As teorias 
do currículo estão ativamente envolvidas na atividade de garantir consenso, 
de obter hegemonia. As teorias do currículo estão situadas num campo 
epistemológico social. As teorias do currículo estão no centro de um território 
contestado. 
É precisamente a questão do poder que vai separar as teorias 
tradicionais das teorias críticas e pós-críticas do currículo. As teorias 
tradicionais pretendem ser apenas isso: "teorias" neutras, científicas, 
desinteressadas. As teorias críticas e as teorias pós-críticas, em contraste, 
argumentam que nenhuma teoria é neutra, científica ou desinteressada, mas 
que está, inevitavelmente, implicada em relações de poder. As teorias 
tradicionais, ao aceitar mais facilmente o status quo, os conhecimentos e os 
saberes dominantes, acabam por se concentrar em questões técnicas. Em 
geral, elas tornam a resposta à questão "o quê?" como dada, como óbvia e 
por isso buscam responder a uma outra questão: "como?". Dado que temos 
esse conhecimento (inquestionável?) a ser transmitido, qual é a melhor 
forma de transmiti-lo? As teorias tradicionais se preocupam com questões de 
organização. As teorias críticas e pós-críticas, por sua vez, não se limitam a 
perguntar "o quê?", mas submetem este "quê a um constante 
questionamento. Sua questão central seria, pois, não tanto "o quê?", mas 
"por quê?". Por que esse conhecimento e não outro? Quais interesses fazem 
com que esse conhecimento e não outro esteja no currículo? Por que 
privilegiar um determinado tipo de identidade ou subjetividade e não outro? 
As teorias críticas e pós-críticas de currículo estão preocupadas com as 
conexões entre saber, identidade e poder. 
Como vimos, uma teoria define-se pelos conceitos que utiliza para 
conceber a "realidade". Os conceitos de uma teoria dirigem nossa atenção 
para certas coisas que sem eles não "veríamos". Os conceitos de uma teoria 
organizam e estruturam nossa forma de ver a "realidade". Assim, uma forma 
útil de distinguirmos as diferentes teorias do currículo é através do exame 
dos diferentes conceitos que elas empregam. Neste sentido, as teorias 
críticas de currículo, ao deslocar a ênfase dos conceitos simplesmente 
pedagógicos de ensino e aprendizagem para os conceitos de ideologia e 
poder, por exemplo, nos permitiram ver a educação de uma nova 
perspectiva. Da mesma forma, ao enfatizarem o conceito de discurso em vez 
do conceito de ideologia, as teorias pós-críticas de currículo efetuaram um 
outro importante deslocamento na nossa maneira de conceber o currículo. 
Por isso, à medida que percorrermos, nos tópicos a seguir, as diferentes 
teorias do currículo, pode ser útil ter em mente o seguinte quadro, que 
resume as grandes categorias de teoria de acordo com os conceitos que 
elas, respectivamente, enfatizam. 
 
 
 
TEORIAS 
TRADICIONAIS 
TEORIAS CRÍTICAS TEORIAS PÓS- 
CRÍTICAS 
Ensino Ideologia Identidade, alteridade, 
diferença 
Aprendizagem Reprodução cultural e 
social 
Subjetividade 
Avaliação Poder Significação ediscurso 
Metodologia Classe social Saber-poder 
Didática Capitalismo Representação 
Organização Relações sociais de 
produção 
Cultura 
Planejamento Conscientização Gênero, raça, etnia, 
sexualidade 
Eficiência Emancipação e 
libertação 
Multiculturalismo 
Objetivos Currículo oculto 
 Resistência 
Quadro 1. Teorias do Currículo, compilação. 
UNIDADE II – Organização, Gestão e Avaliação 
 
AS FUNÇÕES CONSTITUTIVAS DO SISTEMA DE ORGANIZAÇÃO E DE 
GESTÃO DA ESCOLA 
 
 
 
Jucimara Oliveira da Silva 
 
 
A gestão democrática-participativa valoriza a participação da 
comunidade escolar no processo de tomada de decisão, concebe à docência 
como trabalho interativo e aposta na construção coletiva dos objetivos e do 
funcionamento da escola, por meio da dinâmica intersubjetiva, do diálogo, do 
consenso. 
O processo deliberativo inclui tanto a decisão (por meio de reuniões, 
discussões, estudo e documentos, consultas, etc.) quanto as ações 
necessárias para pô-la em prática. Em razão disso, faz-se necessário o 
emprego de funções do processo organizacional. 
De fato, como toda instituição, as escolas buscam resultados, o que 
implica uma atividade racional, estruturada e coordenada. Ao mesmo tempo, 
sendo de caráter coletivo, essa atividade não depende apenas das 
capacidades e das responsabilidades individuais, mas também de objetivos 
comuns e compartilhados, de meios e ações coordenadas e controladas dos 
agentes do processo. 
O processo de organização escolar dispõe, portanto, de funções, 
propriedades comuns ao sistema organizacional de uma instituição, com 
base nas quais se definem ações e operações necessárias ao funcionamento 
institucional. São quatro as funções constitutivas desse sistema: 
 
A. planejamento: explicitação de objetivos e antecipação de decisões para orientar a 
instituição, prevendo o que se deve fazer para atingi-los; 
B. organização: racionalização de recursos humanos, físicos, materiais, financeiros, 
criando e viabilizando as condições e modos para realizar o que foi planejando; 
C. direção/coordenação: coordenação do esforço humano coletivo do pessoal da 
escola; 
D. avaliação: comprovação e avaliação do funcionamento da 
escola. 
 
A seguir, detalhes de cada uma dessas funções. 
O Planejamento escolar e o Projeto Pedagógico 
 
O planejamento consiste em ações e procedimentos para tomada de 
decisões a respeito de objetivos e de atividades a ser realizadas em razão 
desses objetivos. É um processo de conhecimento e de análise da realidade 
escolar em suas condições concretas, tendo em vista a elaboração de um 
plano ou projeto para a instituição. O planejamento do trabalho possibilita uma 
previsão de tudo o que se fará com relação aos vários aspectos da 
organização escolar e prioriza as atividades que necessitam de maior 
atenção no ano a que ele se refere. Assim, podem ser distribuídas as 
responsabilidades a cada setor da escola e aos membros da equipe. 
Toda organização precisa de um plano de trabalho que indique os 
objetivos e os meios de sua execução, superando a improvisação e a falta de 
rumo. A atividade de planejamento resulta, portanto, naquilo que aqui 
denominamos de projeto pedagógico. O projeto é um documento que propõe 
uma direção política e pedagógica para o trabalho escolar, formula metas,prevê as ações, institui procedimentos e instrumentos de ação. 
É pedagógico porque formula objetivos sociais e políticos e meios 
formativos para dar uma direção ao processo educativo, indicando porque e 
como se ensina e, sobretudo, orientando o trabalho educativo para as 
finalidades sociais e políticas almejadas pelo grupo de educadores. O projeto 
expressa, pois, uma atitude pedagógica, que consiste em dar um sentido, 
um rumo, às práticas educativas, onde quer que sejam realizadas, e firmar 
as condições organizativas e metodológicas para a viabilização da atividade 
educativa (Libâneo, 2005). 
É curricular porque propõe, também, o currículo, o referencial concreto 
da proposta pedagógica. O currículo éo desdobramento do projeto pedagógico, 
ou seja, a projeção dos objetivos, das orientações e das diretrizes 
operacionais previstas nele. Mas, ao pôr em prática esse projeto, o currículo 
também o realimenta e o modifica. Supõe-se, portanto, estreita articulação 
entre o projeto pedagógico e a proposta curricular, a fim de promover um 
entrecruzamento dos objetivos e das estratégias para o ensino - formulados 
com base na identificação de necessidades e de exigências da sociedade e 
do aluno, mediante critérios filosóficos, políticos, culturais e pedagógicos – 
com as experiências educacionais a ser proporcionadas aos alunos por meio 
do currículo. 
Deve-se salientar que o projeto pedagógico é um documento que 
reproduz as intenções e o modus operandi da equipe escolar, cuja 
viabilização necessita das formas de organização e de gestão. Não basta ter o 
projeto, é preciso que seja levado a efeito. As práticas de organização e de 
gestão executam oprocesso organizacional para atender ao projeto. 
A Organização geral do trabalho 
 
 
A segunda função do processo organizacional é a organização 
propriamente dita. Refere-se à racionalização do uso de recursos humanos, 
materiais, físicos, financeiros e informacionais e à eficácia na utilização 
desses recursos e dos meios de trabalho. A organização incide diretamente na 
efetividade do processo de ensino e aprendizagem, à medida que garante as 
condições de funcionamento da escola. Sua presença ou ausência 
interferem na qualidade das atividades de ensino. É necessário, portanto, 
que todos os aspectos da vida escolar sejam devidamente contemplados na 
organização geral de escola, ao longo de todo o ano letivo. A organização 
geral diz respeito a: condições físicas, materiais, financeiras; sistemas de 
assistência pedagógico-didática ao professor; serviços administrativos, de 
limpeza e de conservação; horário escolar, matrícula, distribuição de alunos 
por classes; normas disciplinares; contatos com pais, etc. 
Essas várias atividades podem ser agrupadas em quatro aspectos: 
organização da vida escolar, organização dos processos de ensino e 
aprendizagem, organização das atividades de apoio técnico-administrativo, 
organização das atividades que asseguram as relações entre escola e 
comunidade. 
 
Organização da vida escolar 
 
 
Trata-se da organização do trabalho escolar em função da 
especificidade e dos objetivos da escola. É o estabelecimento de condições 
ótimas de organização do espaço físico, de relações humanas satisfatórias, 
de adequada distribuição de tarefas, de sistema participativo de tomada de 
decisões, de condições apropriadas de higiene e limpeza, bem como de outras 
que concorram para o desenvolvimento e para o alto rendimento escolar dos 
alunos, e de utilização eficaz dos recursos e meios de trabalho. 
A estrutura organizacional e o cumprimento das atribuições de cada 
membro da equipe constituem elementos indispensáveis para o 
funcionamento da escola. Um mínimo de divisão de funções faz parte da lógica 
da organização educativa, sem comprometer a gestão participativa. Contudo, 
deve-se evitar a redução da estrutura organizada de gestão, subordinando o 
pedagógico ao administrativo, impedindo a participação e a discussão e não 
levando em conta as ideias, os valores e a experiência dos professores. 
Importante aspecto a ser mencionado ainda é a organização do 
tempo escolar, de modo que as atividades de aprendizagem sejam 
distribuídas racionalmente pelos dias da semana, observados os critérios 
pedagógicos e curriculares. Organização do processo de ensino e 
aprendizagem. 
Este aspecto refere-se ao suprimento dos suportes pedagógicos- 
didáticos necessários à organização do trabalho escolar. Compreende o 
currículo, a organização pedagógica-didática (planos, metodologias, 
organização dos níveis escolares, horários, distribuição de alunos por 
classes), assistência pedagógica sistemática aos professores, avaliação, 
ações de formação continuada, conselhos de classe, etc. 
Além de prover as condições físicas, materiais e didáticas 
mencionadas, é preciso organizar e acompanhar as atividades de elaboração 
do plano de ensino e prestar assistência pedagógico-didática aos 
professores na sala de aula. A organização do trabalho na sala de aula não 
visa apenas ao cumprimento dos programas, mas também ao envolvimento 
dos alunos, à sua participação ativa, ao desenvolvimento de habilidades e 
capacidades intelectuais, ao trabalho independente, o que requer a 
imprescindível colaboração da coordenação pedagógica. 
 
Organização das atividades de apoio técnico-administrativo 
 
As tarefas administrativas têm a função de fornecer o apoio 
necessário ao trabalho docente. Abrangem as atividades de secretaria 
(prontuário de alunos e professores, registro escolar, arquivos, livros de 
registro, atendimento de pessoas, etc.), serviços gerais (inspetores de alunos, 
serventes, merendeira, porteiros e vigias, etc.), atividades de limpeza e de 
conservação do prédio, provimento e conservação dos recursos materiais 
(equipamentos, mobiliário escolar, material didático), administração do 
espaço físico e das dependências. Incluem também a gestão de recursos 
financeiros. 
 
Organização de atividades que asseguram a relação entre escola e 
comunidade 
 
Implica ações que envolvem a escola e suas relações externas, tais 
como os níveis superiores de gestão do sistema escolar, os pais, as 
organizações políticas e comunitárias, a cidade e os equipamentos urbanos. 
O objetivo dessas atividades é buscar as possibilidades de cooperação e de 
apoio, oferecidas pelas diferentes instituições, que contribuam para o 
aprimoramento do trabalho da escola, isto é, para as atividades de ensino e 
de educação dos alunos. Espera-se, especialmente, que os pais atuem na 
gestão escolar, mediante canais de participação bem definidos. 
 
 
Direção e coordenação 
 
A direção e a coordenação correspondem a tarefas agrupadas sob o 
termo gestão. A gestão refere-se a todas as atividades de coordenação e de 
acompanhamento do trabalho das pessoas, envolvendo o cumprimento das 
atribuições de cada membro da equipe, a realização do trabalho em equipe, 
a manutenção do clima de trabalho, a avaliação de desempenho. Essa 
definição aplica-se aos dirigentes escolares, mas é igualmente aplicável aos 
professores, seja em seu trabalho na sala de aula, seja quando são investidos 
de responsabilidade no âmbito da organização escolar. 
Dirigir e coordenar significa assumir, no grupo, a responsabilidade por 
fazer a escola funcionar mediante o trabalho conjunto. Para isso, compete a 
quem dirige assegurar: 
a) A execução coordenada e integral de atividades dos setores e dos 
indivíduos da escola, conforme decisões coletivas anteriormente 
tomadas; 
b) O processo participativo de tomada de decisões, cuidando, ao mesmo 
tempo, que estas se convertam em medidas concretas efetivamente 
cumpridas pelo setor ou pelas pessoas em cujo trabalho são aplicadas; 
c) A articulação das relações interpessoais na escola e no âmbito em que o 
dirigente desempenha suas funções. 
Uma das qualidades da introdução, na escola, do projeto pedagógico 
curricular é adiscussão pública de objetivos, atividades e normas de 
funcionamento. A falta de unidade da ação educativa escolar pode resultar 
em efeitos prejudiciais aos objetivos de aprendizagem. Por exemplo, torna-se 
necessário haver um mínimo de norma, sempre decididas conjuntamente, 
sobre condutas dos professores com relação a cuidados com o mobiliário da 
escola, à sistemática de tarefas de casa, ao cumprimento dos horários de 
saída e de entrada, a interrupções de aulas para merenda, a avisos 
administrativos. 
Todos os profissionais da escola precisam estar aptos a dirigir e a 
participar das formas de gestão. Todavia, em razão de necessária divisão de 
funções, correspondente à lógica da administração, deve-se ressaltar que 
algumas pessoas têm atribuições específicas de direção e coordenação, o que 
implica especialização profissional. Assim, o diretor e o coordenador 
pedagógico assumem o papel de coordenadores de ações voltadas para 
objetivos coletivamente estabelecidos. Na nova perspectiva de gestão, esses 
dois profissionais recebem a delegação de coordenar o trabalho coletivo, 
assegurando as condições de sua realização e, especialmente, as do 
ambiente formativo, para o desenvolvimento pessoal e profissional. Para 
isso, precisam reconhecer que sua ocupação tem uma característica 
genuinamente interativa, ou seja, está a serviço das pessoas e da 
organização, delas requerendo uma formação específica a fim de buscar 
soluções para os problemas, a saber coordenar o trabalho conjunto, discutir 
e avaliar a prática; assessorar os professores e prestar-lhes apoio logístico na 
sala de aula. 
A Avaliação da organização e da gestão da escola 
 
A avaliação é função primordial do sistema de organização e de 
gestão. Ela supõe acompanhamento e controle das ações decididas 
coletivamente, sendo este último a observação e a comprovação dos objetivos 
e das tarefas, a fim de verificar o estado real do trabalho desenvolvido. A 
avaliação permite pôr em evidência as dificuldades surgidas na prática 
diária, mediante a confrontação entre o planejamento e o funcionamento real 
do trabalho. Visa ao melhoramento do trabalho escolar, pois, conhecendo a 
tempo as dificuldades, pode-se analisar suas causas e encontrar meios de 
sua superação. 
O controle e a avaliação dependem de informações concretas e 
objetivas sobre o andamento dos trabalhos, tendo como base o projeto 
pedagógico-curricular e as ações efetivas praticadas pelos vários elementos 
da equipe escolar. Para a coleta de informações, o diretor pode servir-se de 
observação, de acompanhamento das salas de aula e do recreio, de 
entrevistas pessoais com professores e com outros servidores, de reuniões 
sistemáticas ouextraordinárias, deencontros informais com o pessoal docente, 
técnico e administrativo. 
O acompanhamento e o controle comprovam os resultados do 
trabalho, evidenciam os erros, as dificuldades, os êxitos e os fracassos 
relativos ao que foi planejado. A avaliação das atividades implica a análise 
coletiva dos resultados alcançados e a tomada de decisões sobre as 
medidas necessárias para solucionar as deficiências encontradas. 
 
O QUE É AVALIAÇÃO? 
 
 
Em quase todos os encontros com professores, bem como nos relatos 
de outros especialistas e pesquisadores da avaliação, constata-se a 
contradição entre as intenções proclamadas e o processo efetivamente 
aplicado. Certamente, tal contradição nasce da autocensura gerada pelo 
descompasso entre uma imagem idealizada da avaliação – auferida em 
tinturas de teorias mais atuais e progressistas 
– e a realidade cotidiana das escolas, condicionadas, estruturalmente, pelo 
sistema de promoção e seriação e, conjunturalmente, pelas péssimas 
condições concretas de trabalho e pelas determinações dos superiores de 
plantão. 
Talvez, por isso mesmo, surjam tantas concepções de avaliação, 
sempre vagamente implicadas nas formulações verbais de professores, 
alunos e pais, que a identificam com tudo que ocorre nas práticas correntes: 
prova, nota, conceito, boletim, aprovação, reprovação, recuperação etc. 
Já entre os estudiosos do tema, trava-se uma interminável batalha 
pelo monopólio da verdade e da precisão do conceito, surgindo também uma 
variação conceitual na razão direta da diversificação das concepções 
pedagógicas assumidas. Se tentarmos levantar os diversos conceitos de 
avaliação da aprendizagem, certamente encontraremos tantos quantos são 
seus formuladores. É claro que em cada conceito de avaliação subjaz uma 
determinada concepção de educação. Então, haveria tantas concepções de 
educação quantos são seus formuladores? Pensamos que não. Percebemos 
que, embora apresentando pequenas variações formais, na sua substância 
elas podem ser agrupadas em um número menor de conjuntos. 
Como o tema de que nos ocupamos neste momento é a avaliação e 
como suas concepções derivam das de educação em geral, vejamos 
algumas definições de avaliação encontradas nos autores mais consagrados 
e nas publicações mais recentes. 
Avaliação é o processo de atribuição de símbolos a fenômenos com o 
objetivo de caracterizar o valor do fenômeno, geralmente com referência a 
algum padrão de natureza social, cultural ou científica. 
Esta definição reflete, claramente, a postura classificatória dos autores, 
pois consideram a avaliação como um julgamento de valor, com base em 
padrões consagrados e tomados previamente como referência. A distinção que 
estabelecem entre padrões “sociais”, “culturais” ou “científicos” denota uma 
postura positivista, na medida em que não incorporam a ideia de que os 
padrões científicos são também socialmente elaborados. No entanto, sua 
obra é preciosa no sentido do tratamento técnico que emprestam aos 
instrumentos de medida e avaliação. 
Avaliar é julgar ou fazer a apreciação de alguém ou alguma coisa, tendo 
como base uma escala de valores (ou) interpretar dados quantitativos e 
qualitativos para obter um parecer ou julgamento de valor, tendo por base 
padrõesoucritérios. 
Em alguns autores já percebemos a preocupação em não se deixar 
enquadrar na “teoria conservadora”, propondo um “redirecionamento” do 
julgamento e da classificação quase sempre presentes em concepções mais 
conservadoras. Volta-se para uma visão diagnóstica, na qual a avaliação 
passa a ser um processo de verificação e pesquisa das mudanças de 
estratégias e instrumentos que interferem na condução do processo 
educativo. Destaca-se, ainda, a formulação coletiva deste processo, que 
deve garantir a aprendizagem do aluno, mas não avança sobre a discussão 
do grau de socialização desse coletivo, nem qualifica o projeto alvo de 
aprendizagem do aluno. Ou seja, embora avance em relação às concepções 
meramente classificatórias, não explora todas as potencialidades políticas e 
politizadores do que denomina “coletivo”, sem dos componentes do projeto 
pedagógico cuja aprendizagem pelo aluno será garantida. Assim, para que a 
avaliação não se enquadre no universo das “tradicionais” basta que ela seja 
apenas instrumento do processo de tomada de decisão dos “agentes 
escolares”, que trabalham um projeto pedagógico coletivamente formulado e 
que se comprometa com a aprendizagem dos alunos. 
A avaliação consistirá em estabelecer uma comparação do que foi 
alcançado com o que se pretende atingir. Estaremos avaliando quando 
estivermos examinando o que queremos, o que estamos construindo e o que 
conseguimos, analisando sua validade e eficiência (= máxima produção com 
um mínimo de esforço). 
(A avaliação é) um juízo de qualidade sobre dados relevantes para 
uma tomada de decisão (Luckesi, 1995). 
Os trabalhos do Professor C. Luckesi já vinham sendo considerados 
como verdadeiros “clássicos” da avaliação brasileira, pois, como ele próprio 
confessa na coletânea que reuniu a maioria deles, seu pensamento, neste 
particular, evolui das posições mais “tradicionalistas” e “conservadoras” até 
asmais “avançadas” (preocupadas com o caráter apenas diagnóstico da 
avaliação). Muito embora sua contribuição seja inestimável, especialmente no 
que diz respeito ao eu poderíamos denominar uma verdadeira “teoria do erro”, 
pensamos que o Professor Luckesi peca – como os pedagogos e pensadores 
mais recentes e preocupados com a superação da teoria “tradicional” – pelo 
excesso de desconsideração dos aspectos positivos das teorias 
classificatórias. 
Muitas outras definições ou conceitos poderiam ser relacionados, mas, 
para os objetivos deste trabalho, os destacados já são suficientes. Com 
relativo risco reducionista ou de simplificação exorbitante, de maneira geral, 
podemos reduzir as concepções de avaliação a dois grandes grupos – 
referenciados em duas concepções antagônicas de educação. Estas, por sua 
vez, referenciam-se nas visões de mundo positivista ou dialéticas, isto é, 
buscam seus parâmetros em cosmovisões que entendem o universo e as 
relações que nele se travam como estruturas ou como processos. Dizendo-o 
de modo mais simples: se encaramos a vida como algo dado, tendemos para 
uma epistemologia positivista e, consequentemente, para um sistema 
educacional perseguidor de “verdades absolutas” e “padronizadas”. Se, pelo 
contrário, encaramos a vida como processo, tendemos para uma teoria 
dialética do conhecimento e, por isso mesmo, engendradora de uma 
concepção educacional preocupada com a criação e a transformação. No 
caso da primeira, forçosamente construiremos uma teoria da avaliação 
baseada no julgamento de erros e acertos que conduzem a prêmios e 
castigos; no caso da segunda, potencializaremos uma concepção avaliadora 
de desempenhos de agentes ou instituições, em situações específicas e 
cujos sucessos ou insucessos são importantes para a escolha das 
alternativas subsequentes. 
Entre os educadores brasileiros temos encontrado essas duas 
concepções de avaliação com mais frequência, derivadas, evidentemente, de 
concepções antagônicas de educação que, ao penetrarem nos umbrais 
escolares, acabam por provocar uma completa dissonância entre as 
convicções proclamadas e as práticas efetivamente levadas a efeito no 
cotidiano das relações pedagógicas. As profundas diferenças que as 
caracterizam não constituem um mal em si. Contudo, a mútua exclusão que 
se instalou radicalmente entre elas, cada uma rechaçando a outras e 
autovalorizando-se como única alternativa científica e válida, acabou por 
implantar um verdadeiro maniqueísmo – típico das concepções que dividem 
qualquer universo em apenas dois semi-universos incompatíveis -, cegando-as 
para uma possibilidade de aproximação e complementaridade. 
Desconfiamos que tal dicotomia pese mais negativamente para muitos 
professores do que as próprias condições salariais e de trabalho adversas. E 
por que, se eles se colocam de um lado ou de outro? Por que, se a maioria 
dos professores considera a primeira concepção como “tradicional” e a 
segunda como “progressista” ou “construtivista”? Não é o que acontece na 
realidade. A maioria dos docentes incorpora a primeira como teoria válida, 
rechaçando a segunda, mas, de fato, “se sentem obrigados” a aplicar a 
segunda. Ora, ninguém consegue equilibrar- se, pessoal e socialmente, se 
sente obrigado a defender determinados princípios e ideias e, ao mesmo 
tempo, vivenciar o contrário do que pensa. Todos estamos à procura de 
equilíbrios, de coerência, pelo menos para com nossa própria consciência. 
Ninguém consegue olhar para um espelho e dizer “enganei-te hoje”. Sempre 
procuramos explicações e justificativas razoáveis para nossos gestos e 
ações. 
Esta reação compensadora manifestada na simulação de uma 
“dedicação exclusiva e incondicional à escola”, com sacrifícios enormes nos 
outros segmentos da vida social e afetiva dos docentes – mais explícita nos 
de ensino fundamental -, pode ser a manifestação de uma síndrome singular. 
Pesquisadores já levantaram uma série de fatores, classificando-os em 
“contextuais” (institucionais) e “textuais” (interativos). Dentre os primeiros, 
destaca-se a progressiva responsabilidade do professor em ambientes 
multiculturais, levando-o a assumir discursos e papéis contraditórios e 
ambíguos (daí, a síndrome). Não estaria entre eles a assunção de um 
discurso pedagógico institucionalmente progressista e uma prática interativa 
conservadora? Somente com uma pesquisa mais profunda e abrangente, 
com o levantamento, cruzamento e análise de variáveis sociais, políticas, 
econômicas, culturais e pedagógicas, seria possível chegar a conclusões 
mais definitivas. Neste particular, chama-nos a atenção o trabalho realizado 
por Maria Eliana Novaes, Professora primária: mestra ou tia (1986), no qual a 
pesquisadora, dentre várias outras conclusões, destaca que muitas docentes 
das primeiras letras – a maioria é constituída de mulheres – não se casam e 
não têm filhos, e que “algumas delas, possivelmente, encontram no 
Magistério uma alternativa de sublimação para a maternidade frustrada (como 
se pode inferir das constantes referências do ‘amor maternal’ que a professora 
deve dedicar ao aluno)”. 
A escola não é o universo que esgota a trajetória do itinerário individual 
e do processo civilizatório, nem o trabalho docente pode resumir a razão da 
existência de quem quer que seja, porque nem a primeira nem o segundo são 
fins em si mesmos, mas apenas e respectivamente um dos espaços e um 
dos instrumentos de relacionamento do ser humano, cuja realização só 
alcança sua plenitude numa variada gama de espaços e de relações 
interpessoais. Dizer que o trabalho na escola “é a razão de ser de sua própria 
existência” e, como resultado de tal presunção, monopolizar todas as 
atividades pessoais no que-fazer-pedagógico é afundar-se em uma síndrome 
de alienação. E, certamente, a escola, enquanto instituição alienada, torna- 
se instituinte da alienação de seus atores, não atendendo nem mesmo às 
finalidades de seus criadores liberais, gerando “disfuncionalidades” e 
ameaçando a tão proclamada “produtividade” – quase sempre traduzida nos 
reclamos de “eficácia” e “eficiência”. 
Simultaneamente, a síndrome docente é alimentada pelo desencontro 
entre as convicções pedagógicas assumidas e as práticas educativas 
desenvolvidas, em função das limitações estruturais e circunstanciais que 
caracterizam o ambiente de trabalho. E o educador, na ânsia de “mostrar 
serviço”, compensar e camuflar seu próprio sentimento de impotência, 
trabalha exaustivamente e tenta responder, desesperadamente, aos desafios 
de uma sociedade cada vez mais complexa e mais exigente. 
 
A escola e as concepções de avaliação 
 
No caso específico da avaliação da aprendizagem, a escola brasileira 
encontra-se prensada entre as duas já mencionadas correntes resultantes de 
duas concepções pedagógicas radicalmente antagônicas. De um lado, as 
teorias educacionais que se auto intitulam “progressistas” ganham maior 
expressão nas intenções proclamadas dos profissionais do setor, de outro, 
as idealizações competitivas, classificatórias e meritocráticas, embora 
também rechaçando as anteriores, apresentam maior frequência nas 
práticas efetivas destes mesmos profissionais, no dia-a-dia da escola. A figura 
apresentada a seguir expressa melhor o que estamos querendo dizer. 
 
 
Procurando não qualificar nenhuma das duas concepções, 
denominando-as, simplesmente, “I” e “II”, porque cada uma delas, em sua 
fobia dicotômica, irá adjetivar a si mesma como “avançada”, “atualizada” e 
“progressista” e irá considerar a outra como “atrasada”, “desatualizada” e 
“retrógrada”. 
Analisemos os procedimentos que cada uma delas propõe. 
Os defensores mais radicais do primeiro tipo de avaliação acreditam 
que apenas a auto avaliação ou a avaliação interna são legítimas, 
considerando espúria toda e qualquer verificação que faz apelo a avaliadores 
externos ao universo alvo do processo avaliativo.

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