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As quatro artes do número e da realidade observações dos planetas, das estrelas e dos seus movimentos, notando quais estavam à frente dos outros, sempre em relação à Terra, baseado principalmente na observação da duração de seus ciclos. Antes de tudo um esquema já fora estabelecido: havia mais de um céu. Havia o das estrelas fixas e um para cada planeta, pelo menos. Assim como haviam sido distinguidos o mundo sublunar do mundo supralunar. O sublunar era aquele imediatamente abaixo da esfera da Lua, onde habitam os entes sujeitos ao ciclo das mutações — sujeitos à geração e à corrupção. Nele habitamos nós, os seres humanos. O mundo supralunar é o dos astros, não sujeitos à geração nem à corrupção. Hoje em dia, afirma-se que o mundo supralunar está, sim, sujeito à corrupção, mas em uma escala de tempo tão longa, que os torna quase eternos. Essa percepção de que os céus possuíam uma estabilidade que o mundo terreno não possui conduziu os estudiosos a perceber que os céus marcam e são causa dos grandes ciclos de mutação na Terra e, a partir daí, conduziría aos postulados mais específicos e audaciosos da astrologia. Acontece que essa possibilidade nunca foi desmentida de todo; pelo contrário, quanto mais o homem voltou-se para o céu, sempre este lhe apontou algo. Mostrou-lhe as épocas certas para o sucesso nas colheitas, guiou-lhe em viagens marítimas para além dos seus continentes, e até sinalizou da chegada do Messias, como consta nas Escrituras Sagradas. Ainda enfocando o aspecto material, Cassiodoro elenca o essencial aos estudos astrológicos e astronômicos. A primeira coisa é o estudo da posição esférica, que diz respeito à compreensão da esfera celeste e da nossa posição como observadores. A totalidade material do cosmos é expressa, portanto, por uma imensa esfera, comportando outras menores, num total de 9 esferas, desde a esfera das estrelas fixas, o firmamento, até o centro, onde estão os elementos Fogo, Ar, Água e Terra, cuja compreensão não deve ser tomada em sentido literal; tratam-se símbolos que expressam princípios cosmológicos. Com relação aos planetas, a esfera da Lua é a menor, e a de Saturno 213 Quadrivium a maior; entre élas situam-se os demais planetas: Mercúrio, Venus, Sol, Marte e Júpiter. Sol e Lua são também planetas, neste esquema, pois também apresentam um movimento contrário ao da esfera do primeiro céu, o que move as estrelas. A partir desse esquema, pode-se passar ao estudo dos movimentos das esferas, modo pelo qual conhecemos o nascimento (oriente) e o ocaso (ocidente) de constelações e de astros menos ou mais afastados da Terra. Hemisfério sobre a Terra é o estudo do que está acima do observador em dada época; hemisfério sob a Terra trata do céu oculto de nossa visão pela Terra, isto é, aquele que é visto pelos antípodas do observador. Pelo número orbital se conhece o período de movimento dos astros; na precedência, se conhecem movimentos ditos inesperados dos astros; regresso ou recuo é o estudo de astros que parecem se mover em dois sentidos, devido ao reconhecimento de um dos movimentos da esfera e de outro no sentido contrário; repouso, momento em que algumas estrelas parecem repousar; Magnitude do Sol, da Lua e da Terra, é o estudo que demonstra as diferenças de tamanho dos astros; Eclipse do Sol e Eclipse da Lua, o estudo dos momentos em que um ou outro são ocultados, do Sol pela Lua, ou sempre que a Lua é ocultada pela sombra da terra. Isso, em síntese, é parte material desses estudos. Cabe ainda, como se trata de uma arte liberal, não apenas apresentar a Astronomia como se listássemos as coisas do universo, numa visão epicurista, mas falar da origem e do reflexo desses estudos para a alma humana. Para isso, vamos nos valer de um estudo mais cuidadoso, principalmente no que diz respeito a etapas históricas da tradição que permitiu ao homem o conhecimento do céu. Os primeiros observadores não imaginaram serem os astros apenas brilhos ou luzes, mas sim criaturas com personalidade, que transitavam em um curso próprio. Os sábios descreveram os astros todos como possuidores de características e o Cosmo como se povoado e operado por criaturas vivas. A mitologia grega narra que o titã Atlas suporta o céu nas costas, por exemplo, o qual também foi sustentado por Hércules em um de seus trabalhos. 214 As quatro artes do número e da realidade Cada astro é um personagem de uma narrativa a ser interpretada pelo homem. As constelações guardam a memória dos deuses e das criaturas mitológicas. Assim ilustra Francisco Marotta num dos capítulos de “Sinfonia Cósmica, Mitologia Celeste”, do qual apresentamos um bom trecho: “O Navio Argo ‘Quando Jasão do Pélion lançou o Navio ao mar...’, teve início a mais fantástica, arriscada e — ao mesmo tempo — proveitosa viagem da História Mitológica! Foi conquistado o Tosão de Ouro e as proezas foram tantas que o nosso Jasão reclamou um reino, e o navio, o famoso Navio Argo, mereceu um lugar de destaque no grandioso Museu celeste, para onde os nossos ancestrais enviavam — em exposição permanente — tanto os heróis como os frutos de suas fabulosas façanhas. (...). Argos foi o que hoje chamaríamos de armador e o que deu nome ao navio. Jasão foi quem assumiu seu comando e o principal interessado da Viagem. Os tripulantes se tornariam em breve tempo ‘mundialmente’ conhecidos como Argonautas... mas que equipagem de ‘elite’! Além de Jasão, o capitão, (Argos como todos os armadores preferiu ficar em terra para gozar o produto de sua indústria), Hércules, o famoso e famélico herói de doze Trabalhos, Orfeu, que com sua Lira — que já tinha vencido o inflexível Plutão — encantaria as próprias encantadoras Sereias, salvando assim a tripulação toda (pois os heróis sucumbem humanamente aos Encantos), Decalião, que já havia praticado a navegação quando, com a sua esposa Pirra, tinha pilotado a Arca durante os longos nove dias daquele Dilúvio extra bíblico da Mitologia Grega, Castor e Polux, os afetuosos gêmeos inseparáveis, Lincéu, o telescópio e Raio-X de bordo (pois sua vista além de neblina atravessava também as muralhas) e que mais tarde seria morto por Castor, que com seu gêmeo Polux iriam raptar Febe e Hilaira no dia anterior aos seus casamentos com Lincéu e seu irmão, e Pirithoo e Telamon e Tifis (o Timoneiro) e mais outros 44 Valentes, todos em “ótima forma” como diriamos em nossos dias, e, ainda, com pelo menos uma pitada de iniciativa dos deuses em suas vidas ou em suas façanhas. 215
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