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48 Re vi sã o: R os e - Di ag ra m aç ão : M ár ci o - 10 /1 1/ 20 15 Unidade II Unidade II 2 A PráticA 2.1 O Ensino Literário através do conflito “Where do you begin telling somebody their world is not the only one?” (Manacle, Ravensong) 2.1.1 Um modelo de aula A nossa proposta de aula, a partir do Letramento Crítico e atendendo aos requerimentos dos alunos, é desconstruir o mito de que a interpretação das narrativas literárias, em geral, e das estrangeiras, em particular, é reservada a uns poucos, professores e críticos consagrados, que têm a bagagem intelectual para tal. A ideia é reverter esse processo, mostrando para o aluno que as narrativas literárias estão em um pé de igualdade com as outras narrativas desenvolvidas em uma comunidade, em todos os seus contextos, e que o processo de interpretação se realiza a partir das experiências de vida dentro e fora da sala de aula, tanto do aluno como do professor. Uma situação muito comum nas aulas de literatura é, como fala Graff (1993, a dificuldade dos alunos de saber o que dizer a respeito das narrativas, de criar sua própria mensagem, o que pode ser entendido pelos professores por falta de interesse, uma educação fundamental deficiente ou o desejo de só conseguir um diploma, mais do que de estudar. Contudo, como assinala Graff (1993) e nós concordamos, muitas vezes os alunos não são mais participativos porque não sabem como fazer, porque foram educados no mito de que há algum significado oculto no texto que eles não têm a capacidade de descobrir e que só o professor (que tem algum texto misterioso com todas as respostas) pode fazê-lo. Essa insegurança, somada ao fato de que os nomes das grandes narrativas às vezes provocam temor no aluno, explica a falta de participação. Daí a importância de dessacralizar as narrativas literárias e de conscientizar os alunos de que os professores sempre trazem uma interpretação do texto literário, construída a partir de suas leituras e que essa não é uma chave mágica, privilégio de uns poucos, mas produto de um processo de leitura. O importante, então, como tentamos mostrar na discussão anterior é conscientizar os alunos de que os significados das narrativas não são descobertos, mas criados, a partir da interação entre a narrativa e a leitura que fazemos, conforme nossa comunidade interpretativa. Em todo caso, a descoberta deveria ser a admiração frente à própria capacidade de poder se posicionar sobre os textos lidos. 49 Re vi sã o: R os e - Di ag ra m aç ão : M ár ci o - 10 /1 1/ 20 15 Ensino dE LitEraturas dE Língua ingLEsa Como também pode ser inferido da nossa discussão do literário da perspectiva do Letramento Crítico, uma maneira em que pode se desenvolver essa atitude por parte dos alunos é aprimorando as ferramentas teóricas e literárias que lhes façam criar seus próprios significados e se posicionar frente ao texto. Mais uma vez, concordamos com Graff (1993) que ensinar as narrativas, por meio do conflito e não da reverência emudecedora, é uma maneira de provocar os alunos a se posicionarem frente à narrativa. O primeiro passo é desmistificar o discurso literário. O segundo, desmistificar o discurso das literaturas de língua inglesa. Então, do ângulo do Letramento Transcultural, o nosso modelo de aula visa desenvolver nos alunos a habilidade de ler narrativas de outras culturas, as que se apresentam como longínquas do contexto cultural, literário e linguístico dos alunos. Como apontam Brydon e Coleman (2008), todas as comunidades desenvolvem suas estratégias interpretativas com os elementos que lhes são familiares. Então, aquilo que causa estranhamento é, muitas vezes, difícil de aceitar. Desde o nome das personagens e os lugares, os costumes e interesses de outras sociedades, os conflitos apresentados, o tipo de humor, as motivações e reações, até a linguagem e metáforas literárias fazem com que a leitura dos textos literários de língua inglesa se torne, às vezes, marcadamente complexa e distante em alguns contextos brasileiros de educação superior. Aliás, muitas vezes, essas literaturas, embora lidas em tradução, são associadas com as dificuldades que os alunos possuem do aprendizado de língua inglesa. Nesse panorama, a pergunta a ser feita é: “Qual a relação entre o aluno brasileiro e a língua e as literaturas de língua inglesa?” Essa pergunta pode ter inúmeras respostas se considerarmos área geográfica e cultural, contexto social, faixa etária do país etc. A nossa resposta tem dois aspectos. Por um lado, muitos alunos procuram a Licenciatura em Português que, muitas vezes, vai lhes permitir se tornarem professores das escolas de Ensino Fundamental e Médio da rede pública. Muitos deles não tiveram contato regular com a língua inglesa e as disciplinas da Licenciatura de Língua Inglesa dificultam a obtenção do diploma e, por isso, são associadas com discursos de exclusão da vida acadêmica. Essa dificuldade leva os alunos, muitas vezes, a se afastar dessas manifestações literárias e, em alguns casos, a supervalorizar as metáforas da literatura nacional em língua portuguesa. Por outro lado, a nossa resposta é que é importante lembrar que a língua inglesa e as literaturas em inglês são associadas, no ideário brasileiro e latino-americano, com a língua e a literatura do colonizador inglês e o imperialismo norte-americano. Se, por um lado, a língua inglesa está associada ao mito de ser um acesso que facilita a entrada no mercado de trabalho, pelo outro, está associada a um conceito de cultura que se passa por universal e se impõe sobre os próprios modelos locais, o que gera resistência. Essa resistência, então, não é só literária, mas cultural. O nosso foco é fornecer estratégias de leitura que levem a que o texto literário se torne uma zona de contato no sentido de que torne a “diferença cultural” uma instância crítica de “comunicação intercultural” que nos faça problematizar sobre a nossa posição de inferioridade ou subserviência frente ao Outro diferente, articulado nos textos de literatura estrangeira. Por sua vez, é importante mostrar para os alunos que a língua inglesa é multicultural e, portanto, é falada em diferentes partes do mundo e associada a diversas realidades culturais, ainda dentro de nações como os Estados Unidos. Por isso hoje se fala de Literaturas em Inglês, mais do que Literatura 50 Re vi sã o: R os e - Di ag ra m aç ão : M ár ci o - 10 /1 1/ 20 15 Unidade II Inglesa ou Literatura Norte-americana, desconstruindo o currículo baseado na nação-estado e considerando outras metáforas aglutinantes, das narrativas literárias, que surgem em função de diferentes comunidades de interesse. Um outro aspecto a levar em conta é que alguns dos conflitos mais críticos na sociedade globalizada de hoje, como a discriminação por questões de raça, sexo, etnicidade, idade etc., não são associados a uma comunidade nacional em particular, mas, embora se manifestando de maneiras variadas, afetam as diferentes comunidades nacionais. Nesse sentido, as narrativas literárias, entendidas como narrativas multiculturais, nos ajudam a cruzar fronteiras, enxergar os nossos conflitos em perspectiva no âmbito global e local, nos solidarizarmos com as pessoas, além dos limites da nação e, assim, problematizar sistemas de opressão. Por sua vez, a metáfora literária e o conceito de “transculturalidade” podem ser empregados em sentido amplo ao desconstruir, em primeiro lugar, o contraponto entre literaturas canônicas e não canônicas (em línguas multiculturais como a inglesa), não somente por meio da inclusão de narrativas de uma e outra tradição, mas de considerar essas narrativas em termos dos parâmetros estéticos e culturais que são próprios de seus contextos de enunciação. É muito comum que alunos de minorias se sintam desapontados ao perceber a maneira com que seus textos são lidos em sala de aula, revelando uma atitude de condescendência ou ignorância de seus parâmetros culturais.Em segundo lugar, a partir de uma perspectiva multigenérica, é reconsiderada a dicotomia entre as literaturas chamadas “eruditas” e as literaturas consideradas como “populares”, cruzando fronteiras literárias e culturais, ainda dentro das fronteiras nacionais. Finalmente, levando em conta uma perspectiva multimodal, o conceito de narrativa é considerado de maneira estendida ao incluir outros tipos de discurso, como o do cinema, e assim reconsiderar o status de privilégio outorgado à metáfora literária. Para melhor demonstrar como funcionaria esse modelo de aulas, os exemplos foram organizados em quatro temas e módulos: • Módulo 1: “Narrativas de Língua Inglesa”. • Módulo 2: “Desconstruindo a Dicotomia entre Literatura Erudita e Literatura Popular”. • Módulo 3: “A Literatura e o Cinema”. • Módulo 4: “Oficina Literária”. 2.1.2 Objetivos das aulas Os objetivos das aulas foram baseados nos princípios do Letramento Crítico e Transcultural e se apoiam nas três seguintes perguntas: 51 Re vi sã o: R os e - Di ag ra m aç ão : M ár ci o - 10 /1 1/ 20 15 Ensino dE LitEraturas dE Língua ingLEsa • Quais os benefícios de ler de maneira crítica textos literários de outras culturas dentro e fora das fronteiras nacionais? • De que maneira a leitura de textos literários ajuda a problematizar representações do Ser, Lugar e do Outro? • Quais os desafios e dificuldades dessa abordagem do texto literário? Objetivos da leitura crítica e reflexiva • Dar subsídios aos alunos para se tornarem leitores culturais críticos. • Estabelecer uma relação de igualdade entre autor e leitor. • Considerar as motivações do autor para escrever o texto e como o autor se utiliza desse texto para nos levar a enxergar o mundo a partir de uma determinada perspectiva. • Compreender que a perspectiva do autor não é a única. • Conscientizar os alunos de que eles são agentes ativos da informação nos textos, não reprodutores passivos de ideias. Nesse sentido, torná-los cientes de que podem desenvolver perspectivas independentes sobre diferentes tópicos. • Levar o aluno a se conscientizar sobre sua própria capacidade de reinventar significados, dando uma interpretação ao texto diferente da do autor. Torná-los cientes da sua capacidade de ‘criar significados’. O discurso literário • Reconsiderar o status quo da literatura, quando considerada em relação a outros tipos de discurso. • Mudar a relação dos alunos com as narrativas literárias e outras formas de discurso. • Desconstruir a ideia de que em todo texto literário há um significado escondido, que é de difícil acesso e que só o professor conhece. Se os alunos são parte da cultura, eles não ‘descobrem’ códigos no texto que só o professor conhece, mas eles desenvolvem esses códigos, a partir da sua experiência. • Captar, guiar e estender o processo de criação de significados nos alunos. • Relacionar a teoria literária e sua aplicação às narrativas literárias. • Desconstruir e problematizar o conceito de ‘gosto literário’, considerando as narrativas que tanto o professor como o aluno trazem para sala de aula. 52 Re vi sã o: R os e - Di ag ra m aç ão : M ár ci o - 10 /1 1/ 20 15 Unidade II 2.1.3 O modelo de aula O nosso modelo de aula está inspirado na proposta de leitura crítica de Lankshear e Knobel (1997) e de Garbutcheon e Moran (1997), que têm como objetivo desenvolver nos alunos a habilidade de leitura crítica que colabore na formação de cidadãos ativos e responsáveis que promovam a agência social. Neste projeto, associamos essas estratégias de leitura crítica com a perspectiva transcultural e as aplicamos à leitura de narrativas literárias, relacionando três formações discursivas: social, ética e estética. Cada atividade do módulo consta de três partes desenvolvidas em duas ou três aulas. O primeiro segmento da atividade, segundo o modelo de Lankshear e Knobel (1997), foca-se no professor, chama- se de “Prática Situada”. Nela, o professor contextualiza o tema, os recursos literários utilizados na sua articulação e explica e demonstra a sua estratégia de leitura. O professor cria um contexto apropriado para o aluno se familiarizar com as narrativas. Embora o professor lidere as atividades, os alunos participam ativamente, contribuindo com seus conhecimentos sobre o tema e seus questionamentos sobre a matéria apresentada. O segundo segmento da atividade (o que pode ser desenvolvido tanto na primeira como na Segunda aula:) está focado nos alunos e chama-se de “Prática crítica”, também segundo o modelo de Lankshear e Knobel (1997). Em grupos, os alunos desenvolvem as estratégias de leitura sobre o tema apresentado pelo professor e criam leituras alternativas. Esse é o momento em que os alunos se tornam parte da elaboração do texto, no sentido de que refletem sobre de que maneira a narrativa faz sentido para eles, no seu contexto cultural, e o saturam de novos significados. Para que a prática seja bem-sucedida é importante que o professor alente o pensamento independente dos alunos e atribua à sua experiência e conhecimento o mesmo valor que o seu próprio. Isso se faz por meio da conscientização dos alunos de que o processo de criação de significados é sempre plural e que está em contraponto com a maneira pela qual novos e diferentes significados podem ser criados em outros contextos culturais. Luke e Freebody (1997a, p 214) definem essa Prática crítica por uma série de perguntas que têm a ver com o questionamento da relação que se estabelece entre o texto, o autor e o leitor: “Que tipo de pessoa, e com que interesses e valores, escreveu esse texto? Que tipo de pessoa pode ler esse texto sem problemas? De que maneira o texto atua sobre mim? Quem se beneficia com esse processo? Que vozes e interesses estão em jogo? Que vozes e interesses foram silenciados?”. O terceiro segmento da atividade (o que tem lugar na Segunda aula:) denomina-se “Prática de transferência”, seguindo o modelo de Lankshear e Knobel (1997), e também está focado nos alunos. Da perspectiva de uma leitura informada, que se baseia nas práticas de leitura crítica desenvolvida e a nova informação adquirida, os alunos refletem sobre as estratégias de leitura desenvolvidas e as aplicam na reescrita dos textos apresentados no primeiro e segundo segmento da aula em relação ao seu próprio contexto cultural. Esse é o momento em que a prática de letramento se estende além do texto literário e da sala de aula e conecta as narrativas e os conceitos discutidos por meio deles com a comunidade a que o aluno pertence. Como apontam Garbutcheon e Moran (1997), esse é o momento quando a prática pedagógica se torna um processo de cidadania informada e crítica, porque fornece aos alunos novas ferramentas para explorar construções alternativas de cidadania. 53 Re vi sã o: R os e - Di ag ra m aç ão : M ár ci o - 10 /1 1/ 20 15 Ensino dE LitEraturas dE Língua ingLEsa Luke e Freebody (1997a, p. 214) definem essa prática de leitura como “pragmática”, no sentido de que coloca ênfase no uso que o leitor faz do texto e formulam as seguintes perguntas: “O que eu faço com esse texto aqui e agora? O que outros fazem com esse texto?” No caso do nosso projeto, o que fazemos com o texto literário é tratá-lo como um âmbito de criação de significados e como uma “zona de contato” que nos ajude a nos aproximarmos de outras culturas, e assim promover o conceito de cidadania global. Assim, a aula torna-se um intercâmbio entre as ideias articuladas no texto, a leitura que o aluno faz, a partir do conhecimento que traz para sala de aula e o conhecimento do professor. Por sua vez, essas atividades estão baseadas na ideia de que, como sugerido na primeira parte deste material, a prática de leitura é social, situada e múltipla: • Social (e não somente individual): porque sempre precisa relacionar o texto discutido em sala de aula com as nossas experiências do dia a dia. Luke e Freebody (1997a, p. 191)apontam que os modelos de leitura não são neutros, mas estão relacionados com temas de identidade, poder político e cultural, gênero, etnicidade, classe e cidadania. • Situada: porque precisa ser adequada aos valores e crenças do local onde será desenvolvida. Os modelos de leitura estão baseados em modelos sociais que, como vimos, não são universais, mas locais. Eles articulam modos de enxergar o mundo. Por isso, não há nem textos nem leituras que sejam neutras. Como apontam Luke e Freebody (1997a, p. 194), todas as linguagens, os textos e os discursos constroem versões e visões particulares do mundo social e natural que contribuem para os interesses de determinadas classes, gêneros e grupos culturais. Esse processo torna-se explícito no caso do ensino das literaturas estrangeiras, construídas segundo outros modelos epistemológicos. Por meio do processo de leitura crítica, o aluno se conscientiza sobre esse processo e interpreta a visão de mundo exposta no texto. • Múltipla: porque vai variar de um contexto para o outro. O aluno se conscientiza desse processo quando, por meio da Prática de transferência, se apropria do texto e estabelece uma relação de contraponto entre os símbolos, valores, crenças de outras culturas e a sua. Entendida dessa maneira, a prática de leitura, como apontam Luke e Freebody (1997a, p. 191), torna-se uma atividade cultural na qual se examinam e contestam “os discursos culturais, as ideologias políticas e os interesses econômicos repassados pela educação”. Por isso, na preparação das atividades do módulo deve-se levar em conta que o que lemos é tão importante quanto como o lemos: as estratégias empregadas devem sempre apontar para uma epistemologia que sublinha a leitura como um processo de criação de significados e um ato social. Esse modelo de leitura contribui para o desenvolvimento dos quatro objetivos do projeto: desenvolver habilidades de leitura crítica; aproximar-se de outros contextos culturais; refletir sobre o próprio contexto de enunciação; promover um conceito de cidadania informada e responsável. O perfil de leitor que se desprende desse modelo é engajado porque há uma motivação autêntica: curiosidade, satisfação emocional e troca social. Por sua vez, por meio das diferentes atividades 54 Re vi sã o: R os e - Di ag ra m aç ão : M ár ci o - 10 /1 1/ 20 15 Unidade II desenvolvidas em sala de aula, o aluno compartilha esse conhecimento com professores e colegas e o ressignifica a partir da sua própria perspectiva. Como resultado, entende a leitura não como literal, mas como um processo de construção de significados no qual sente-se envolvido; esses significados o levam a responder de maneira que faz sentido. 2.1.4 Elaboração das aulas dos diferentes módulos Estratégias de leitura Na elaboração das aulas foram utilizadas e adaptadas uma série de estratégias que promovem a leitura de textos em geral e literários em particular, como práticas críticas, sociais e transculturais, desenvolvidas por McLaughlin e DeVoodg (2004). • Perspectivas alternativas sobre o texto: articular a mesma história a partir da perspectiva de uma outra personagem ou de um outro ponto de vista não considerado na narrativa. • Desafiando o texto: os alunos fazem uma análise crítica e cética sobre as ideias apresentadas no texto. • Justaposição de textos com perspectivas em conflito sobre o mesmo tema: eles apontam a diferença e geram debate, que levam a um entendimento crítico. A discussão pode estar organizada em trechos dos textos, escolhidos pelos alunos. • Leitura crítica de dois ou mais artigos críticos sobre o mesmo texto literário. • Do texto à teoria: interpretar a narrativa e logo a reconsiderar a partir de uma perspectiva teórica. • Da teoria ao texto: fazer uma contextualização teórica da narrativa e logo uma análise crítica. • O Outro na narrativa: fazer uma leitura crítica da narrativa a partir da perspectiva de uma personagem considerada como marginalizada. • O resto da história: os alunos utilizam seu próprio conhecimento para indicar o que falta na narrativa, as vozes que foram silenciadas etc. • Escrever um “capítulo fantasma”: inventar uma continuação da narrativa que dê voz aos silenciados: considere uma visão alternativa, estabeleça um contraponto com o autor, reescreva a história; tudo a partir da perspectiva cultural do aluno. • Leitura conotativa e denotativa: ler entre linhas para perceber camadas de valores e temas que não estão explicitamente expressos. 55 Re vi sã o: R os e - Di ag ra m aç ão : M ár ci o - 10 /1 1/ 20 15 Ensino dE LitEraturas dE Língua ingLEsa 2.1.5 As aulas Por sua vez, problematizamos o conceito de “transculturalidade” ao nos referirmos ao encontro entre diferentes culturas, tanto dentro como fora da cultura nacional, e reconhecemos três instâncias nos estudos literários: narrativas que abrangem diferentes metáforas culturais, neste caso de línguas multiculturais como a inglesa e a portuguesa; narrativas multigenéricas no sentido de incluir expressões literárias de comunidades que, pelo seu gênero ou conteúdo, não são incluídos no cânone, tal o caso do rap; narrativas multimodais: no momento presente da revolução digital e imagética que considere o discurso da literatura em relação a outras formações discursivas, como o cinema. As atividades das diferentes aulas estão organizadas a partir da perspectiva de Graff (1993) de ensinar os textos literários, das diferentes tradições em contraponto, por meio do conflito. O conceito de Graff é de centralidade e relevância para o ensino de um currículo multicultural do que hoje se chama Literaturas em Inglês que, mais do que ter foco em uma só tradição nacional, como a das disciplinas Literatura Inglesa ou Literatura Norte-americana, tem foco no entrecruzamento das narrativas em língua inglesa, escritas em diferentes partes do mundo. Como vimos, o objetivo não é simplesmente aplicar a intertextualidade, de maneira neutra, nem mostrar que textos de várias comunidades discutem os mesmos temas, mas entender como essas diferentes visões de mundo se entrecruzam, complementam, opõem e constituem os loci de enunciação das diferentes culturas. Dessa maneira, o que se discute não é quais narrativas ensinar, mas como ensiná-las. Quando o aluno percebe que sua leitura é parte dessa estratégia crítica, ele não só se engaja no debate literário, mas também no social e político. Assim, como explica Graff (1993), o texto literário não se reduz a uma construção ideológica, mas apresenta-se como um espaço de conflito ideológico. 2.2 Modelos de aula: parte 1 2.2.1 Módulo 1: As Literaturas de Língua Inglesa Objetivo: • Familiarizar-se com outros contextos culturais e tradições literárias. • Refletir sobre como essas narrativas literárias de outras culturas adquirem novos significados quando lidas no contexto brasileiro. • Refletir criticamente sobre essas narrativas, em termos da relação de poder entre leitor e autor. • Propor ações alternativas às oferecidas no texto diretamente relacionadas com o nosso contexto de enunciação. • Problematizar o conhecimento dos alunos por meio de sua exposição a outras noções culturais em língua portuguesa e língua inglesa por meio de outras concepções literárias. 56 Re vi sã o: R os e - Di ag ra m aç ão : M ár ci o - 10 /1 1/ 20 15 Unidade II • Desconstruir clichês culturais e encurtar distâncias entre culturas. • Problematizar o conceito de “tolerância”: como se relacionar com a “diferença” de cultura. • Conhecimento do Outro diferente que leve a uma problematização do Eu. Narrativas a serem interpretadas Narrativas de língua inglesa, em todos os gêneros. Em todos os casos, as narrativas serão interpretadas levando em consideração o conceito do “literário” de cada cultura. Primeira atividade • Tema: relendo e reescrevendo os Clássicos. • Texto base: TWAIN, M. Adventures of Huckleburry Finn. Nova Iorque;Londres: W.W. Norton & Company, 1977. • Estratégia de leitura: “Entre Teoria e Texto”. • Número de aulas: duas. Primeira aula: Prática situacional • Contextualização de Huckleberry Finn: — Uma narrativa épica da civilização norte-americana. — O conceito de “fronteira” e a vida no Oeste. — Valores norte-americanos versus valores europeus. — A atitude paternalista sobre a discriminação racial. — O bildungsroman. — O romance picaresco. — Humor e crítica social. — A natureza, “a civilização” e o Cristianismo. 57 Re vi sã o: R os e - Di ag ra m aç ão : M ár ci o - 10 /1 1/ 20 15 Ensino dE LitEraturas dE Língua ingLEsa • O professor faz uma leitura do primeiro capítulo de Adventures of Huckleberry Finn junto com os alunos considerando os seguintes temas: — Qual a relevância de Twain apresentar a sociedade norte-americana da perspectiva de uma criança “sem educação”? — Qual a relevância de que Huck fale em sua voz e jargão e não na voz da sociedade “civilizada”? — Qual o conceito de “tolerância” no romance? Huck é considerado como um igual ou há uma atitude condescendente? — Quais valores sociais são problematizados no capítulo? — Qual a funcionalidade do humor no capítulo? • Tarefa: ler os seguintes trechos de artigos críticos sobre o romance: Texto 1 Huckleberry, its immortal hero, runs away from his worthless father, and floats down the Mississippi on a raft, in company with Jim, a runaway negro. This plot gives great opportunity for varying incidents. The travelers spend some time on an island; they outwit every one they meet; they acquire full knowledge of the hideous fringe of civilization that then adorned the valley; and the book is a most valuable record of an important part of our motley American civilization. Fonte: Perry (1977, p. 289). Texto 2 [Huck] is a walking repository of the juvenile folklore of the Mississippi Valley – a folklore partly traditional among white settlers, but largely influenced by intimate association with the negroes. Fonte: Matthews (1977, p. 291). Texto 3 [Mark Twain] could scarcely have estimated [The Adventures of Huckleberry Finn] for what it is, one of the world’s great books and one of the central documents of American culture […]. Where does its greatness lie? Primarily in its power of telling the truth. […] No one, as Twain well knew, sets a higher value on truth than a boy. Truth is the whole of a 58 Re vi sã o: R os e - Di ag ra m aç ão : M ár ci o - 10 /1 1/ 20 15 Unidade II boy’s conscious demand upon the world of adults. He is likely to believe that the adult world is in a conspiracy to lie to him, and it is this belief, by no means unfounded, that arouses Tom and Huck and all boys to their moral sensitivity, their everlasting concern with justice, which they call fairness. At the same time, it often makes them skillful and profound liars in their own defense, yet they do not tell the ultimate lie of adults: they do not lie to themselves […]. Huckleberry Finn was once banned from certain libraries and schools for its alleged subversion of morality. The authorities had in mind the book’s endemic lying, the petty thefts, the denigration of respectability and religion, the bad language and the bad grammar. We smile at that excessive care, yet in point of fact, Huckleberry Finn is indeed a subversive book – no one who reads thoughtfully the dialectic of Huck’s great moral crisis will ever again be wholly able to accept without some question and some irony the assumptions of the respectable morality by which he lives, nor will ever again be certain that what he considers the clear dictates of moral reason are not merely the engrained customary beliefs of his time and place. Fonte: Trilling (1977, p. 245). Texto 4 Huck Finn’s vernacular voice, which ostensibly articulates an alternative perspective – the perspective of an alternative class – actually serves as a way for the alienated middle-class author and reader to criticize their own class from within. Fonte: Jehlen (1990, p. 13). Segunda aula: Prática crítica • Em grupos, os alunos discutem os textos críticos lidos em função das seguintes perguntas: — Qual o “gênero” literário de Huck, segundo os diferentes autores? De que maneira o conceito de “gênero” simplifica ou torna a leitura do texto mais complexa? — De que maneira o conceito de “raça” é apresentado nos textos? Que mudanças podem ser percebidas ao longo dos anos? — Qual o conceito de “civilização” apresentado nos textos? — Qual o conceito de “verdade” e “moralidade” apresentado no romance, segundo Lionell Trilling? — De que maneira Twain desconstrói o conceito de “classe” em Huck Finn, segundo Myra Jehlen? 59 Re vi sã o: R os e - Di ag ra m aç ão : M ár ci o - 10 /1 1/ 20 15 Ensino dE LitEraturas dE Língua ingLEsa • Faça uma leitura crítica do primeiro capítulo de Huckleberry Finn em termos dos conceitos apresentados nos trechos críticos e de sua própria leitura crítica: — Na sua opinião, qual o conceito de verdade dramatizado por Twain em Huckleberry Finn? — Porque Twain decidiu narrar a sua estória a partir da perspectiva de Huck Finn? Que afirmação sobre a sociedade norte-americana está implícita nessa escolha? — A respeito da questão de gênero literário, como definiria o romance? — Qual sua leitura da questão de classe social e raça dramatizados no capítulo? Prática de transferência • Reescreva a seguinte cena de The Adventures of Huckleburry Finn, da perspectiva de Jim: quando a Tia Sally perguntou para Huck se alguém tinha sido ferido na explosão do navio no Mississipi, Huck respondeu “Não, senhora. Só um negro”. A Tia respondeu, “Ainda bem. Porque, às vezes, as pessoas se machucam”. • Leia o primeiro capítulo de The Catcher in the Rye, de J. D. Salinger, e estabeleça uma comparação entre Holden Caulfield e Huck Finn. • Leia o primeiro capítulo de O menino no espelho, de Fernando Sabino, e estabeleça uma comparação com Huck Finn. 2.2.2 Módulo 2: Literatura Erudita e Literatura Popular Objetivo: • Desconstruir a dicotomia cultura erudita versus cultura popular. • Considerar o conceito de literatura como um “construto” e não como um “dado”. • Problematizar a formação do cânone literário, levando em conta seu caráter de construto cultural e as relações de poder implícitas na sua formação. Narrativas Serão consideradas narrativas literárias, em língua inglesa e em língua portuguesa, não incluídas no cânone por serem consideradas como “populares” e não terem valor estético. Primeira atividade • Tema: “O rap é poesia?” 60 Re vi sã o: R os e - Di ag ra m aç ão : M ár ci o - 10 /1 1/ 20 15 Unidade II • Texto base: Trecho do rap “Penny For Your Thoughts”, de Gemineye, que pode ser encontrado em: LUNDBERG, J. Watch: is rap poetry? The Huffington Post, Nova Iorque, 26 maio 2008. Disponível em: <http://www. huffingtonpost.com/john-lundberg/watch-is-rap-poetry_b_101906.html>. Acesso em: 8 out. 2015. • Estratégia de leitura: desafiando o texto. • Número de aulas: duas. Primeira aula: Prática situacional (foco no professor) • O professor distribui entre os alunos vários poemas: com rima, sem rima, da tradição oral e um rap. Texto 1 Cecília Meireles “Segundo Motivo da Rosa” Por mais que te celebre, não me escutas, embora em forma e nácar te assemelhes à concha soante, à musical orelha que grava o mar nas íntimas volutas. Fonte: Meireles (2002). Texto 2 William Carlos Williams “The Red Wheel Barrow” so much depends upon a red wheel barrow glazed with rain water beside the white chickens. Fonte: Williams (1985, p. 32). 61 Re vi sã o: R os e - Di ag ra m aç ão : M ár ci o - 10 /1 1/ 20 15 Ensino dE LitEraturas dE Língua ingLEsa Texto 3 Racionais MC’s: “Tempos Difíceis” Eu vou dizer porque o mundo é assim. Poderia ser melhor, mas ele é tão ruim. Tempos difíceis. Está difícil viver. Procuramos um motivo vivo,mas ninguém sabe dizer. Milhões de pessoas boas morrem de fome. E o culpado, condenado disto é o próprio homem. O domínio está em mão de poderosos, mentirosos. Que não querem saber. Porcos, nos querem todos mortos. Pessoas trabalham o mês inteiro. Se cansam, se esgotam, por pouco dinheiro. Enquanto tantos outros nada trabalham. Só atrapalham e ainda falam. Que as coisas melhoraram. Ao invés de fazerem algo necessário. Ao contrário, iludem, enganam otários. Prometem 100%, prometem mentindo, fingindo, traindo. E na verdade, de nós estão rindo. Tempos... tempos difíceis! (4x) Tanto dinheiro jogado fora. Sendo gasto por eles em poucas horas. Tanto dinheiro desperdiçado. E não pensam no sofrimento de um menor abandonado. O mundo está cheio, cheio de miséria. Isto prova que está próximo o fim de mais uma era. O homem construiu, criou, armas nucleares. E o aperto de um botão, o mundo irá pelos ares. Extra, publicam, publicam extra os jornais Corrupção e violência aumentam mais e mais. Com quais, sexo e droga se tornaram algo vulgar. E com isso, vem a arte pra com todos liquidar. A morte, enfim. Vem destruição. Causam terrorismo. E cada vez mais o mundo afunda num abismo. Tempos... tempos difíceis! (4x) 62 Re vi sã o: R os e - Di ag ra m aç ão : M ár ci o - 10 /1 1/ 20 15 Unidade II Menores carentes se tornam delinquentes. E ninguém nada faz pelo futuro dessa gente. A saída é essa vida bandida que levam. Roubando, matando, morrendo. Entre si se acabando. Enquanto homens de poder fingem não ver. Não querem saber. Faz o que bem entender. E assim... aumenta a violência. Não somos nós os culpados dessa consequência? Destruíram a natureza e o que puseram em seu lugar jamais terá igual beleza. Poluíram o ar e o tornaram impuro. E o futuro eu pergunto, confuso: “como será?” Agora em quatro segundos irei dizer um ditado: “Tudo que se faz de errado aqui mesmo será pago” O meu nome é Edy Rock, um rapper e não um otário. Se algo não fizermos, estaremos acabados. KL Jay! Tempos difíceis! Tempos difíceis! Fonte: Edi Rock e KL Jay (1990). Texto 4 Nação Zumbi: “Etnia” Composição: Chico Science/ Lucio Maia Somos todos juntos uma miscigenação E não podemos fugir da nossa etnia Índios, brancos, negros e mestiços Nada de errado em seus princípios O seu e o meu são iguais Corre nas veias sem parar Costumes, é folclore é tradição Capoeira que rasga o chão Samba que sai da favela acabada É hip hop na minha embolada É o povo na arte É arte no povo E não o povo na arte De quem faz arte com o povo 63 Re vi sã o: R os e - Di ag ra m aç ão : M ár ci o - 10 /1 1/ 20 15 Ensino dE LitEraturas dE Língua ingLEsa Por de trás de algo que se esconde Há sempre uma grande mina de conhecimentos e sentimentos Não há mistérios em descobrir O que você tem e o que gosta Não há mistérios em descobrir O que você é e o que você faz Maracatu psicodélico Capoeira da Pesada Bumba meu rádio Berimbau elétrico Frevo, Samba e Cores Cores unidas e alegria Nada de errado em nossa etnia. Fonte: Chico Science e Maia (1996). • O professor organiza uma discussão sobre os seguintes temas: — O que é poesia, na sua opinião? — Como se originam os gêneros? — Quem cria os gêneros? — Por que se criam novos gêneros narrativos? — Qual o seu propósito? — Que diferenças e semelhanças acha entre os poemas? — O que é rap? — Qual a diferença com os outros gêneros? — É um gênero oral ou escrito? — Que faixa etária está familiarizada com o rap? — Que grupos sociais estão familiarizados com o rap? — Que tipos de estórias narram? 64 Re vi sã o: R os e - Di ag ra m aç ão : M ár ci o - 10 /1 1/ 20 15 Unidade II — Como são os gêneros literários “prescritivos” ou “descritivos”? • Os alunos leem e discutem o seguinte artigo: Rap had about as much relevance to my life in Centreville, Virginia as Beowulf, but I loved it. It was emotional. It was raw. Even then, I noticed in it the power of rhythm and rhyme and the power of witnessing. I can’t say it had much to do with my becoming a poet, but it was where I got a first taste of the power of the word. Even in the halls of academia, you’ll hear whispers of admiration for rap. Watching an Eminem video with a fellow poet, she leaned in and confided, “I think he’s kind of a genius.” A poetry professor I know takes unabashed pride in his own rapping ability (I’m too nice to out him). But while poets can and should appreciate the power in rap, is it poetry? It’s the kind of question that makes poetry’s gatekeepers spin in their office chairs, and it’s easy to understand why. Comparing the two genres, there’s a huge difference in artfulness and intent. It’s hard to compare John Keats’ meditations on the sublime to Nelly’s meditations on sneakers, and Plath and P. Diddy just look silly together. At the same time- -especially at a time when many consider poetry to be a dying art--I’m a proponent of its having a big tent. Spoken word poetry offers something of a bridge between traditional poetry and rap, and some in the poetry establishment are trying to take advantage of it. One example of this is Poetry Out Loud, wherein high school students across the country memorize and recite poems. “We are taking the impulse of the electric popular culture and linking it to the masterpieces of poetry,” poet Dana Gioia told the Washington Post. It’s a smart way to try to get kids in the door. Spoken word is closer to rap than traditional poetry, but it’s got a little of each genre in it. Fonte: Lundberg (2008). Segunda aula: Prática crítica Em grupos, os alunos leem ou escutam o seguinte rap e discutem as seguintes perguntas: • Qual o tema do rap? • Que estória narra o rap? • Qual o contraponto entre “sexo” e “mente”? • O que fala sobre a sociedade urbana? 65 Re vi sã o: R os e - Di ag ra m aç ão : M ár ci o - 10 /1 1/ 20 15 Ensino dE LitEraturas dE Língua ingLEsa • Qual o registro da linguagem empregada? • O rap é poesia? Penny for your Thoughts (by Gemineye) Can I offer you a penny for your thoughts? As a matter of fact, how about three? One penny for you, one penny for me, And one penny for our minds engaged not so sexually. Getting intimately closer as we approach the Climactic altitude of nude, mental, sensational...conversation. Because I’m trying to get to know everything about you From the neck...UP. So these are not your typical, sexual, poetical prose. I’m trying to close the door on that all too familiar freaky foreplay game. With which most guys have chose to approach you. While they are trying to get deeply embedded in the fine fibers of your bed sheets, I’m trying to find and define the fibers of which your mind speaks. I want to engage you By putting a two karat solitaire diamond ON YOUR MIND Marrying your every thought! Fonte: Lundberg (2008). Prática de transferência Individualmente ou em pares, os alunos escrevem um rap sobre um dos temas centrais na sua comunidade: • Falta de empregos. • Conflitos raciais. • Discriminação social. • Conflitos entre gerações. • Problemas do meio ambiente etc. 66 Re vi sã o: R os e - Di ag ra m aç ão : M ár ci o - 10 /1 1/ 20 15 Unidade II 2.3 Modelos de aula: parte 2 2.3.1 Módulo 3: o Discurso Literário e o Cinema Objetivo: • Considerar o termo “texto” de uma maneira ampla que implique diferentes tipos de textos: pictóricos e cinematográficos. • Considerar o papel dos filmes em uma cultura na qual os textos visuais têm cada vez mais centralidade. • Oferecer uma outra opção ao currículo limitado às narrativas de textos escritos. • Reconsiderar o lugar da literatura no mundo de hoje, séc. XXI, frente ao avanço das imagens. • Considerar a relação entre literatura e cinema. • Desenvolver no aluno a habilidade de ler, criticar e discutir esses textos. • Desconstruir a ideia da imagem como “mimese” da realidade. • Desconstruir a ideia da imagem como “objetiva” e “universal”. • Entender que amaneira como “lemos” imagens também revelam o nosso lócus de enunciação. • Entender que, mais do que descrever cenas, as imagens criam cenas. Narrativas Serão considerados diferentes tipos de narrativas: pictóricas, auditivas, cinematográficas, digitais, em seus próprios termos e em contraponto com as narrativas literárias. • Narrativas “multimodais”. • Literatura e outros tipos de narrativas. Primeira atividade • Tema: a intolerância. • Material base: — Curta metragem: STRANGERS. Dir: Guy Nattiv; Erez Tadmor. Israel: Fox Searchlight Pictures, 2003. 7 minutos. 67 Re vi sã o: R os e - Di ag ra m aç ão : M ár ci o - 10 /1 1/ 20 15 Ensino dE LitEraturas dE Língua ingLEsa — Texto: YEATS, W. B. Remorse for Intemperate Speech. In: JEFFARES, A. N. (Ed.) Poems of W. B. Yeats. Londres: Macmillam, 1984. • Estratégia de leitura: da palavra à imagem. • Número de aulas: três. Primeira aula: Prática situacional (foco no professor) • O professor faz uma contextualização sobre os conflitos comunalistas, ou seja, as lutas entre diferentes comunidades étnicas, religiosas etc. em diferentes partes do mundo. Logo, focaliza-se no caso das lutas entre católicos e protestantes na Irlanda. • O professor faz uma leitura crítica, junto com os alunos, do poema “Remorse for Intemperate Speech”, de William Butler Yeats, em termos das seguintes perguntas: — A que acontecimentos se refere o poema? — À versão de quem dá voz o poema? — Os interesses de quem são enfatizados no poema? — Por meio de que metáforas Yeats constrói a realidade política na Irlanda? — O que se espera do leitor? 28 August 1931 I ranted to the knave and fool, But outgrew that school, Would transform the part, Fit audience found but cannot rule My fanatic heart. I sought my betters: though in each Fine manners, liberal speech, Turn hatred into sport, Nothing said or done can reach My fanatic heart. Out of Ireland have we come, Great hatred, little room, Maimed us at the start. I carry from my mother’s womb A fanatic heart. Fonte: Jeffares (1984, p. 56) 68 Re vi sã o: R os e - Di ag ra m aç ão : M ár ci o - 10 /1 1/ 20 15 Unidade II • Tarefa: — Fazer pesquisa sobre o conflito entre Israel e Palestina. — Ler o seguinte artigo: Palestinos recebem como heróis 198 presos libertados por Israel Centenas de palestinos receberam hoje em Ramala como heróis nacionais os 198 presos postos em liberdade por Israel, durante a visita da secretária de Estado americana, Condoleezza Rice, que pretende impulsionar as negociações de paz. Parentes e amigos, agitando bandeiras palestinas e do Fatah e cantando hinos da resistência, deram as boas-vindas na Muqata (sede do governo) aos presos postos em liberdade. O presidente da Autoridade Nacional Palestina (ANP), Mahmoud Abbas, recebeu pessoalmente todos os libertados, dos quais apertou a mão e abraçou ao lado do túmulo do histórico líder Yasser Arafat. “Vejo 198 heróis. Estamos felizes por sua libertação, mas ainda temos tristeza em nossos corações, porque ainda há onze mil detidos em prisões israelenses”, disse Abbas. “O nome de cada prisioneiro está impresso em nossos corações e esperamos ver livres também líderes como Marwan Barghouti, Ahmed Saadat e Aziz Dweik”, disse, acrescentando que “não haverá paz sem que os prisioneiros sejam libertados”. Cenas de emoção Houve cenas de emoção na Muqata e muitas lágrimas de alegria, com mães, esposas e filhos recebendo familiares que não viam havia anos e que não sabiam quando voltariam a ver. As famílias davam longos abraços em seus parentes libertados e os emocionados encontros davam lugar a festas, aplausos e homens que eram levantados nos ombros. A libertação dos presos foi considerada por Israel como um “gesto de boa vontade” em relação a Abbas, durante a visita da secretária de Estado americana ao Estado judeu. Os libertados mais importantes são Saeed el-Atava e Abu Ali Yatta, que permaneceram 32 e 28 anos presos, assim como Hussam Khader, um dos mais proeminentes líderes políticos do Fatah e que estava preso há sete anos. O presidente da associação de presos palestinos, Abdallah Zghari, disse que “esta libertação não é suficiente. “Israel deve pôr em liberdade todos os presos políticos, pois 69 Re vi sã o: R os e - Di ag ra m aç ão : M ár ci o - 10 /1 1/ 20 15 Ensino dE LitEraturas dE Língua ingLEsa não são criminosos, mas lutam pela liberdade e permanecem durante anos em prisões sem serem julgados”. Zghari denunciou as condições em que vivem os palestinos presos por Israel e assegurou que “há mais de mil que precisam de tratamento médico urgente”, mas não estão recebendo. Israelenses criticam Do lado israelense, há sentimentos contraditórios sobre a libertação, que gerou uma sensação amarga e duras críticas por parte da oposição. O escritório de imprensa do governo israelense afirmou, em comunicado, que este gesto mostra que o Estado judeu “está disposto a fazer concessões dolorosas para avançar nas negociações de paz”. “Israel procura intensificar seu contínuo diálogo com parceiros que estão comprometidos com a diplomacia e se opõem ao terrorismo”, afirma a nota. Também ressalta que os libertados são todos “membros de facções que apoiam a liderança” de Abbas, para deixar claro que esta medida não representa nenhuma concessão aos islamitas do Hamas. O movimento islâmico, que governa a Faixa de Gaza e tenta negociar sua própria troca de prisioneiros com Israel, classificou a libertação de “uma tentativa por parte de Israel de dividir o povo palestino”. Fonte: EFE (2008). Segunda aula: Prática crítica • Os alunos compartilham com os colegas e o professor sua pesquisa sobre o conflito entre Israel e Palestina. • Os alunos assistem ao curta Strangers. Em seguida, fazem uma leitura crítica em torno dos seguintes temas: — Que objetos revelam a identidade cultural das personagens? — O que acontece com o seu comportamento, segundo quem está presente? — Qual o conceito de cultura dramatizado no curta? Como se relaciona com o conceito de “contingência”? 70 Re vi sã o: R os e - Di ag ra m aç ão : M ár ci o - 10 /1 1/ 20 15 Unidade II — De que maneira o diretor problematiza os conceitos de “amigo” e “inimigo”? — Qual a opinião do diretor sobre nacionalismo e xenofobia? — De que maneira o autor problematiza os conceitos de “tolerância” e “intolerância”? — Que visão de mundo apresenta o diretor no curta? • Pedir aos alunos fazerem uma reescrita do curta a partir da ótica de uma das personagens: o judeu; o islamita; o skinhead; um pedestre. Terceira aula: Prática de transferência • Discussão em Grupo: O que significa ser “tolerante”? Discuta as seguintes ideias. Você concorda/ não concorda? Por quê? Na sua opinião: — O que significa “tolerar”? — Quem tolera? — Quem “precisa” ser tolerado? — Quem é “superior”, quem tolera ou quem é tolerado? — Qual a relação entre tolerância, moral e virtude? — Que tipo de relação se estabelece pela tolerância: superioridade, inferioridade ou igualdade? — Quem é considerado como “superior” ou “inferior”? — Quem é “civilizado” e quem é “bárbaro”? — O que decide a superioridade de uns ou a inferioridade de outros? — O que implica ser “diferente”? — Quem é “diferente”? — Alguns são “diferentes” e outros não? — Que fatores levam à discriminação do outro diferente? 71 Re vi sã o: R os e - Di ag ra m aç ão : M ár ci o - 10 /1 1/ 20 15 Ensino dE LitEraturas dE Língua ingLEsa — Considere os seguintes binarismos. Quais são considerados como “diferentes”? Quais são “normais”? Você concorda? – heterossexual/homossexual; – branco/negro; – ocidental/oriental; – cristão/judeu; – cristão/muçulmano. — Você se considera “diferente”? — Você já foi tratado como “diferente”? • Leia o poema do poeta indiano Kabir, do século XV: Por meio de que tema e metáforas o poeta articula o tema da tolerância? O Servant,where dost thou Seek Me? Lo! I am beside thee. I am neither in temple nor in mosque: I am neither in Kaaba nor in Kailash: Neither I am in rites or ceremonies, nor in Yoga and renunciation. If thou art a true seeker, thou shalt at once see Me: thou shalt meet Me in a moment of time. Kabir says, “O Sadhu! God is the Breath of all breath”. Fonte: Bly (2007, p. 42). Segunda atividade • Tema: arte e cinema. • Material base: — CHEVALIER, T. Girl with a pearl earring. Londres; Nova Iorque: Plume Book, 1999. — GIRL with a pearl earring. Dir: Peter Webber. EUA: Lions Gate Films, 2003. 100 minutos. 72 Re vi sã o: R os e - Di ag ra m aç ão : M ár ci o - 10 /1 1/ 20 15 Unidade II — GUEDES, P. V. A busca de identidade numa obra em que arte, história e a ficção se misturam: os discursos e intertextos de Moça com brinco de pérola, de Tracy Chevalier. Revista eletrônica do Instituto de Humanidades, Rio de Janeiro, v. 2, n. 8, jan./mar. 2004. Disponível em: <http://publicacoes.unigranrio.com.br/index.php/reihm/article/viewFile/435/427>. Acesso em: 8 out. 2015. • Estratégia de leitura: “Multimodalidade” – a narrativa na pintura, na palavra, no cinema. • Número de aulas: três. Primeira aula: Prática situacional • O professor apresenta o pintor holandês Johannes Vermeer (1632-1675), um dos mais famosos pintores flamencos do século XVII. • Logo, mostra para os alunos uma série de pinturas e faz as seguintes perguntas: — O que elas têm em comum? — Que tipo de pessoas representam? — Pertencem à mesma classe social? — O que eles estão fazendo? — Preste atenção aos nomes dos quadros. Qual a intencionalidade do pintor? Figura 2 – The Milkmaid (1658 – 1660) 73 Re vi sã o: R os e - Di ag ra m aç ão : M ár ci o - 10 /1 1/ 20 15 Ensino dE LitEraturas dE Língua ingLEsa Figura 3 – Girl with a Pearl Earring (1665), “The Mona Lisa of the North” Figura 4 – The Girl with the Wine Glass (1660) • O professor foca no quadro Girl with a Pearl Earring e pede para os alunos escreverem uma estória sobre ela. • Em seguida, os alunos leem suas estórias. • Tarefa: — Leitura da seção do romance Girl with a Pearl Earring, de Tracy Chevalier. — Leitura do artigo de Peonia Viana Guedes: A busca de identidade numa obra em que arte, história e a ficção se misturam: os discursos e intertextos de “Moça com brinco de pérola”, de Tracy Chevalier. 74 Re vi sã o: R os e - Di ag ra m aç ão : M ár ci o - 10 /1 1/ 20 15 Unidade II Segunda aula: Prática crítica • Os alunos discutem em grupos o romance, levando em conta as observações de Viana Guedes e focando nas seguintes questões: — A que classe social pertence a moça, segundo Chevalier? — Em que dados históricos se baseia a criação da personagem, segundo o artigo de Viana Guedes? — De que maneira a autora interpreta o enigmático rosto da moça, que tem sido comparada com a Mona Lisa? — O que provoca o olhar e o rictus da boca? — Em que lugar do texto e de que maneira se entrecruzam o discurso da história, da pintura e da literatura? • Tarefa: assistir ao filme Girl with a Pearl Earring. Terceira aula: Prática crítica • Em grupos, os alunos assistem a trechos do filme e discutem a adaptação do romance para tela: — O que se destaca: a palavra ou a imagem? Por quê? — O diretor inspirou-se somente no romance de Chevalier? Que pesquisa há por trás do filme? — O que lembram algumas passagens do filme? Congele a imagem e interprete. — De que recursos se utiliza o diretor para marcar a personalidade da moça do brinco de pérola? — Que cenas mostram a relação que se estabelece entre Griet e Vermeer? De que recursos se utiliza o diretor? — Que cenas mostram a maneira em que a moça se torna musa inspiradora? De que recursos se utiliza o diretor? — Que pontos em comum há entre os quadros de Vermeer e o filme? 75 Re vi sã o: R os e - Di ag ra m aç ão : M ár ci o - 10 /1 1/ 20 15 Ensino dE LitEraturas dE Língua ingLEsa Prática de transferência • Em pares, os alunos desenvolvem um texto crítico sobre: — A relação entre os diferentes discursos: pintura, cinema, história, literatura. — A maneira com que cada uma dessas linguagens repassa uma visão de mundo. • Os alunos criam categorias de análise e as aplicam a um capítulo de alguma telenovela ou propaganda que esteja passando na TV na atualidade. A busca de identidade numa obra em que arte, história e a ficção se misturam: os discursos e intertextos de Moça com Brinco de Pérola, de Tracy Chevalier. As fronteiras de um livro jamais são nítidas: o título, a primeira linha, o ponto final, a configuração interna, a forma autônoma, tudo isto está envolto em um sistema de referências a outros livros, outros textos, outras frases; o livro é como se fosse um pequeno elo numa vasta cadeia. (Michel Foucault, The Archeology of Knowledge) Em 1996 houve em Haia, na Holanda, e em Washington, D.C., uma exposição das obras do pintor Johannes Vermeer, que despertou grande interesse mundial. Em menos de dois anos, foram publicadas três excelentes obras ficcionais, que usavam como intertexto os quadros do grande pintor holandês do século XVII: The Music Lesson, de Katharine Weber; Girl in Hyacinth Blue, de Susan Vreeland; e Girl With a Pearl Earring, de Tracy Chevalier. Qualquer uma dessas três obras mereceria um estudo aprofundado de como a literatura pode dialogar com a pintura, estabelecendo interessantes jogos intertextuais. Escolhi, para esse trabalho, fazer uma reflexão sobre o romance de Tracy Chevalier, traduzido para o português, em 2002, com o título de Moça com brinco de pérola. A razão de minha escolha deve-se ao fato de que o romance de Chevalier é particularmente rico no diálogo estabelecido entre arte, história e ficção, além de se constituir em fascinante Bildungsroman feminino, no qual a personagem principal é a narradora de sua história e se constrói, gradativamente, como sujeito de sua vida e de suas escolhas. Tracy Chevalier, escritora norte-americana que vive em Londres desde 1984, comprou aos 19 anos o poster da Moça com brinco de pérola, que conserva até hoje em seu escritório. Sua admiração pela ambiguidade, revelada na expressão da moça pintada por Vermeer, e pelo talento do pintor é expressa por Chevalier, em uma entrevista para o Time Out: “O que eu admiro nesse quadro é que ele permite diversas leituras. Muitas vezes ele reflete meus próprios sentimentos. Algumas vezes, a moça parece muito tristonha; outras vezes, extremamente sedutora” (CHEVALIER, 1999, p. 33). A ideia de escrever um livro sobre o quadro também é relatada por Chevalier na mesma entrevista: “Eu estava deitada um dia, olhando para o meu poster da Moça com brinco de pérola do Vermeer, 76 Re vi sã o: R os e - Di ag ra m aç ão : M ár ci o - 10 /1 1/ 20 15 Unidade II e tentando decidir o tema do meu próximo livro. Então pensei sobre o que Vermeer teria dito ou feito para que a moça tivesse aquela expressão no rosto. Aí decidi: isso dá uma história” (CHEVALIER, 1999, p. 32). Uma das estratégias narrativas mais características da literatura pós-moderna é a apropriação, releitura, e reescritura de textos canônicos da literatura e da arte ocidental. Essa estratégia narrativa é de especial importância para o estabelecimento de uma literatura feminista de sobrevivência, de resistência, de subversão, e de imensa criatividade pois desafia os pressupostos e os vieses de cânones artísticos e literários, estabelecidos a partir de critérios hegemônicos que privilegiam a cultura dominante, de cunho patriarcal. Resignificação e recontextualização de signos, desconstrução de conceitos inseridos nas crenças e práticas culturais, e representação da experiência feminina tornaram-se parte da escrita e da crítica feminista das últimas décadas. Em Sexual/Textual Politics: Feminist Literary Theory, a crítica Toril Moi insiste no caráter político da apropriação enquanto estratégia feminista,uma estratégia que deve visar mudanças na própria realidade e não se constituir apenas em um mero jogo de palavras (MOI, 1985, p. 72). Em Writing Beyond the Ending: Narrative Strategies of Twentieth-Century Women Writers, Rachel Blau DuPlessis enfatiza a falsa neutralidade das convenções literárias e demonstra como a prática narrativa pode ser utilizada para interferir e influenciar a construção psicossocial e sociocultural do feminino (DUPLESSIS, 1985, p. 2-4). Em relação às artes visuais, a crítica feminista tem demonstrado que a representação não pode ser considerada uma atividade politicamente neutra. Como diz Monica Gagnon em Work in Progress: Building Feminist Culture, “A questão da representação se situa entre o feminismo e a arte. Ela questiona a forma pela qual a repetição inerente às imagens culturais tem a função particularmente ideológica de apresentar e posicionar a subjetividade ‘feminina’ ou ‘masculina’ como estável e fixa” (GAGNON, 1987, p. 116). [...] Outra questão teórica, particularmente relevante para a análise de Moça com Brinco de Pérola, é o da metaficção historiográfica, termo cunhado por Linda Hutcheon em A Poetics of Postmodernism: History, Theory, Fiction, e retomado em The Politics of Postmodernism, livros nos quais a crítica canadense argumenta que história e ficção são construtos discursivos, representações narrativas, ambas com seus poderes e limitações. Para Hutcheon, “A história, como relato narrativo, é inevitavelmente figurativa, alegórica, fictícia; ela é sempre já textualizada, sempre já interpretada” (HUTCHEON, 1990, p. 143). Outro importante conceito de Hutcheon é o do papel exercido pelo personagem marginal ou marginalizado, silencioso ou silenciado, membro de qualquer uma das diversas minorias, habitante das margens da cultura dominante, personagem ao qual ela dá o nome de “ex-centric”. Hutcheon mostra como a literatura pós-moderna tem trazido para o centro narrativo esse personagem marginalizado, dando-lhe uma voz própria e uma posição de sujeito de sua própria história (HUTCHEON, 1990, p. 60-62). [...] Esses conceitos teóricos nos são extremamente úteis no exame de Moça com Brinco de Pérola. Nesse romance, Tracy Chevalier, usando tanto seu conhecimento das obras e 77 Re vi sã o: R os e - Di ag ra m aç ão : M ár ci o - 10 /1 1/ 20 15 Ensino dE LitEraturas dE Língua ingLEsa da vida de Johannes Vermeer como das fontes históricas sobre a Holanda do século XVII; utilizando uma sensibilidade refinada em relação ao mundo e à arte da pintura; e mostrando uma especial empatia com o desenvolvimento de uma subjetividade feminina, produz uma obra maravilhosa e precisamente evocativa do passado mas, também e principalmente, de forte e poética atualidade. Através da personagem Griet, jovem de 16 anos, filha de uma modesta família protestante de Delft, cidade holandesa famosa por sua cerâmica, Chevalier nos oferece um detalhado panorama da vida social, material e emocional dos habitantes dessa rica cidade, de seus movimentados canais e mercados, de seus abastados e influentes burgueses, da briga entre protestantes e católicos, da opressão exercida sobre criados e operários, e dos rígidos códigos de conduta, que regiam a população de Delft na segunda metade do século XVII. Mas é a história de Griet – do seu envolvimento com a família de Vermeer, da sua busca por uma identidade própria, de suas descobertas, sofrimentos e escolhas – que constitui o cerne do romance. Filha de um talentoso ceramista, que perde a visão na explosão de um forno, Griet herda de seu pai uma sensibilidade especial para formas e cores, para a harmonia de composições variadas, que vão da apreciação de quadros ao cortar de legumes para uma sopa. Sem a renda do pai, Griet e seu irmão são obrigados a trabalhar, o que representa, para a família, descer um degrau na rígida escala social da época. Através de suas relações na importante guilda de São Lucas, o pai de Griet consegue que ela seja contratada como criada para trabalhar na casa de Vermeer, chefe da guilda. Na visita que Vermeer e sua esposa Catharina fazem à casa de Griet para contratá-la, Vermeer nota imediatamente o talento da moça para arrumar as diversas fatias de legumes para a sopa: “Eu sempre colocava os legumes num círculo, cada um numa parte, como fatias de torta. Havia cinco fatias: repolho roxo, cebola, alho-porro, cenoura e nabo. ... O homem tamborilou os dedos na mesa. – Estão na ordem em que vão ser colocados na sopa? ... – Vejo que separou os brancos – disse ele, indicando os nabos e cebolas. – Depois, o laranja e o roxo não estão juntos: por quê? ... – As cores brigam quando ficam lado a lado, senhor” (CHEVALIER, 2002, p. 11). Ao saber que o homem que a havia entrevistado era o autor de um quadro que ela já havia apreciado em uma exposição na prefeitura, Griet mostra novamente sua sensibilidade artística ao recordar para o pai cego os detalhes do famoso quadro “Vista de Delft” (CHEVALIER, 2002, p. 13-14). Apesar de ficar a apenas dez minutos de sua casa, a residência da família Vermeer, na Esquina dos Papistas, era um mundo totalmente estranho para Griet. Lá, separada de tudo que lhe era familiar, a jovem é forçada a desempenhar as árduas tarefas domésticas de uma casa muito maior, onde reinava a intriga, a confusão, e a ciumeira entre seus habitantes. Apesar de muito jovem e inexperiente, Griet logo aprende a contornar habilmente os conflitos da vida quotidiana. Em poucas semanas, seu sentimento de solidão e estranheza é atenuado, e sua admiração pelos quadros de Vermeer fazem com que ela descubra um mundo desconhecido e fascinante. Quando ela retorna, aos domingos, à sua própria casa, sente se uma estranha e seu maior prazer é descrever para o pai cego o trabalho desenvolvido por seu patrão ao pintar “A mulher do colar de pérolas” e “Senhora escrevendo uma carta”, que tiveram como modelo a esposa do patrono de Vermeer, o abastado e lascivo van Ruijven. O outro quadro que Griet descreve para o pai é o retrato da filha de rico padeiro, que recebe 78 Re vi sã o: R os e - Di ag ra m aç ão : M ár ci o - 10 /1 1/ 20 15 Unidade II o nome de “Mulher com jarro de água”, e que gera discussão entre pai e filha sobre uso de cores em pintura. A habilidade de Griet em limpar móveis e objetos, sem mudá-los de lugar, desenvolvida em função da cegueira do pai, leva Vermeer a convencer sua mulher e sua poderosa sogra, a matriarca Maria Thins, a deixar que Griet se encarregue da limpeza de seu ateliê, ao qual ninguém da casa tinha acesso. Isso gera uma situação de ainda maior conflito entre Griet e Catharina, grávida do sexto filho, e ciumenta da crescente intimidade entre seu marido e a jovem criada. Outra fonte de problemas para Griet é a hostilidade da velha empregada da casa, Tanneke, que já havia posado, quando mais jovem, para o quadro “A leiteira”. Griet fica ainda mais próxima de Vermeer quando este lhe pede para moer e misturar as tintas para suas pinturas e até aceita suas sugestões quanto à colocação de determinados objetos que irão compor os quadros. A mãe de Griet percebe a atração da filha por todo esse novo universo e tenta convencê-la a aceitar a corte de Pieter, um jovem açougueiro apaixonado pela jovem. Para aumentar os problemas de Griet, van Ruijven – que já havia sido protagonista de um escândalo, convencendo Vermeer a pintar o quadro “Mulher e dois homens”, onde ele aparece oferecendo vinho a uma jovem criada engravidada por ele – tenta persuadir Vermeer a pintar um quadro de Griet, um pedido que o artista procura evitar atender, propondo a van Ruijven pintar uma outra obra onde ele apareça novamente, com duas mulheres de sua família, quadro que recebe o nome de “O concerto”. Cada vez mais pressionada por sua mãe a aceitar o pedido de casamento de Pieter, ciente dos boatos que correm pela cidade sobre as investidas de van Ruijven, e percebendo o crescente clima erótico,que se desenvolve entre ela e Vermeer, Griet pressente que uma escolha entre seus dois mundos terá que ser feita brevemente. A crise acontece quando Vermeer decide pintar Griet para, em parte, satisfazer van Ruijven: “ – Vou pintar como vi você pela primeira vez, Griet. Só o rosto” (CHEVALIER, 2002, p. 185). Toda uma complicada negociação, carregada de simbolismo, pois envolve as rígidas convenções de representação da época, se desenvolve entre Vermeer e Griet: a pose do corpo, o virar do rosto para o pintor, o mostrar da orelha, o entreabrir dos lábios e – o pedido final – a retirada da touca de criada. Chocada, Griet recusa o pedido de Vermeer e reflete, “Não podia mostrar para ele o meu cabelo. Não era o tipo de moça que deixava a cabeça descoberta” (CHEVALIER, 2002, p. 188). Irritado, Vermeer lhe joga algumas toucas e pedaços de tecido e manda que veja o que pode fazer com aquilo. Depois de algumas tentativas com várias faixas de pano, Griet consegue fazer um turbante, que lhe cobre o cabelo, e Vermeer fica satisfeito com o resultado. O quadro gera toda uma série de tensões na residência de Vermeer e Griet receia que o fato de ter posado para a obra cause vergonha e problemas para sua família. A situação entre a jovem e Vermeer se torna ainda mais tensa quando o artista se mostra insatisfeito com o efeito final do quadro, “ – Isso vai agradar a van Ruijven, mas não a mim” (CHEVALIER, 2002, p. 197). Pela primeira vez, Griet contempla seu rosto no quadro e tem a mesma impressão: “Meu patrão estava certo: o quadro podia agradar a van Ruijven, mas faltava alguma coisa 79 Re vi sã o: R os e - Di ag ra m aç ão : M ár ci o - 10 /1 1/ 20 15 Ensino dE LitEraturas dE Língua ingLEsa nele. Eu sabia, antes de ele dizer. Quando vi o que faltava (aquele ponto brilhante que ele usara nos outros quadros para captar a visão), estremeci. Isso vai ser o fim, pensei. Eu tinha razão” (CHEVALIER, 2002, p. 197-198). O ponto brilhante que faltava no quadro – como sabiam Vermeer e Griet – eram os brincos de pérola de Catharina e, apesar de ter plena consciência do escândalo que isso acarretaria, Vermeer se mostra inteiramente insensível às ponderações de Griet. Logo após a conversa dos dois, Griet está trocando o turbante no quarto de despejo, quando Vermeer a surpreende com os cabelos soltos. Isso causa um profundo impacto em Griet, que reflete: “Depois que ele viu meus cabelos, depois que me revelei, achei que não tinha mais nada de precioso para esconder e guardar comigo. Poderia ser mais livre, senão com ele, então com outra pessoa. Não interessava mais o que eu fizesse ou não” (CHEVALIER, 2002, p. 202). Griet continua a posar para Vermeer e cede a seus pedidos, “ – Umedeça os lábios, Griet. ... – Solte a boca.” Griet, ciente do que esse tipo de representação significa, reflete: “Fiquei tão espantada com o pedido, que minha boca abriu sozinha. Contive as lágrimas. Mulheres honradas não ficavam de boca aberta nos quadros. ... O senhor me destruiu, pensei” (CHEVALIER, 2002, p. 204). Depois disso, Griet fura, com grande sofrimento, as orelhas, coloca os brincos de pérola de Catharina, entregues a ela por Maria Thins, e Vermeer termina o quadro, sem que Griet veja o resultado final da obra. Cornélia, uma das filhas de Vermeer e Catharina, e que sempre havia demonstrado ressentimento pela presença de Griet na casa, conta à mãe sobre o quadro e a leva ao ateliê. Catharina tem um acesso de raiva – menos pelo uso de seus brincos do que pelo fato de jamais ter sido pintada pelo marido, como ela mesma diz – ninguém da casa se pronuncia em defesa de Griet, e Catharina tenta destruir o quadro com uma espátula, sendo impedida por Vermeer. Griet, sem esperar que a mandem embora, sai decididamente da casa, onde viveu por dois anos, e se encaminha para a Praça do Mercado, no centro de Delft, onde um grande círculo de ladrilhos com uma estrela de oito pontas no centro, a faz pensar: “Cada ponta mostrava uma direção que eu podia tomar” (CHEVALIER, 2002, p. 222). Aos dezoito anos, após todas as experiências pelas quais passou, Griet avalia objetivamente suas opções e faz sua escolha. Dez anos depois, a narrativa nos mostra Griet no Mercado de Carne, casada com Pieter e com dois filhos. Tanneke, a velha empregada, traz um recado de Maria Thins para que Griet compareça à casa da família de Vermeer naquela tarde. Griet sabe que Vermeer morreu dois meses atrás, deixando enormes dívidas a serem saldadas. Para sua surpresa, Catharina e o testamenteiro a esperam para entregar-lhe os brincos de pérola, deixados para ela por expressa vontade de Vermeer. Griet aceita os brincos, os leva a uma casa de penhor, onde obtém vinte florins. Guarda quinze florins para entregar a Pieter, saldando com eles uma dívida deixada pela família de Vermeer com a compra de carne. Guarda cinco florins para escondê-los em algum lugar onde não seriam descobertos. Seu último pensamento é: “Pieter ficaria contente com a quantia, a dívida estava saldada. Eu não teria custado nada para ele. Uma criada que se libertara” (CHEVALIER, 2002, p. 239). 80 Re vi sã o: R os e - Di ag ra m aç ão : M ár ci o - 10 /1 1/ 20 15 Unidade II Assim termina o romance de Tracy Chevalier, que na fictícia Griet cria e dá voz a uma personagem que percorre um longo caminho em seu desenvolvimento como mulher, dialoga com várias obras renomadas de Vermeer, discute a arte e as técnicas da pintura, e nos apresenta um maravilhoso e sensível retrato de Delft e da sociedade holandesa no século XVII. Vale a pena mencionar que o quadro que motivou Chevalier a escrever o romance é conhecido como Moça com Brinco de Pérola ou Moça do Turbante. Qualquer um dos dois títulos me parece extremamente significativo como indicação do conflito central enfrentado pela personagem. Fonte: Guedes (2004, p. 1-5). Terceira atividade • Tema: “Inventário de um mundo conflitivo”. • Material base: — Filme: BABEL. Dir: Alejandro Gonzalez Iñarritu. França; EUA; México: Paramount Vantage, 2006. — RICH, A. Atlas of a Difficult World. Nova Iorque; Londres: W. W. Norton Company, 1991. • Estratégia de leitura: “Multimodalidade”. • Número de aulas: duas. Primeira aula: Prática situacional • Junto com os alunos, o professor interpreta em sala de aula o seguinte poema de Adrienne Rich: 10 Memory says: Want to do right? Don’t count on me. I’m a canal in Europe where bodies are floating I’m a mass grave I’m the life that returns I’m a table set with room for the Stranger I’m a field with corners left for the landless I’m accused of child-death of drinking blood I’m a man-child praising God he’s a man I’m a woman bargaining for a chicken I’m a woman who sells for a boat ticket I’m a family dispersed between night and fog I’m an immigrant tailor who says A coat 81 Re vi sã o: R os e - Di ag ra m aç ão : M ár ci o - 10 /1 1/ 20 15 Ensino dE LitEraturas dE Língua ingLEsa is not a piece of cloth only I sway in the learnings of the master-mystics I have dreamed of Zion I’ve dreamed of world revolution I have walked the children of others through ranks of hatred I’m a corpse dredged from a canal in Berlin a river in Mississippi I’m a woman standing with other women dressed in black on the streets of Haifa, Tel Aviv, Jerusalem there is spit on my sleeve there are phonecalls in the night I am a woman standing in line for gasmaks I stand on a road in Ramallah with naked face listening I am standing here in your poem unsatisfied lifting my smoky mirror 1989-1990 Fonte: Rich (1991, p. 67). • O professor organiza a leitura crítica em torno das seguintes questões, sempre motivando os alunos a contribuir com suas opiniões sobre os diferentes temas: — O que é um inventário? — Que eventos o Eu lírico inclui nesse inventário? — Como funcionam os eixos “temporal” e “espacial” no poema? — Quais as geografias e histórias inventariadas no poema? Como se entrelaçam umas com asoutras? — Como se relacionam esses eventos e lugares? — Que “mundo” é construído no poema? Nesse contexto, qual o significado do título An Atlas of a Difficult World? — Que histórias/estórias narra o poema? — Que relação pode estabelecer entre o Eu lírico e a seguinte citação: “Uma pessoa pode trazer clareza momentânea e fazer a diferença. A individualidade pessoal, mesmo em um mundo dominado pelo sofrimento de massa, ainda tem importância” (BRYDON, 2007, p. 10)? — Como se relaciona o Eu lírico com esses eventos inventariados? — Como se relacionam o racional, o emocional e o político, na descrição desse mundo devastado politicamente? Eles são antagônicos ou estão estreitamente relacionados? 82 Re vi sã o: R os e - Di ag ra m aç ão : M ár ci o - 10 /1 1/ 20 15 Unidade II — Qual o “tropo” narrativo: a paixão ou a razão? — Qual o conceito de transculturalidade repassado pelo poema? — De que maneira o poema “reescreve” o discurso da história e do jornalismo? — Que tom imprime a poeta aos elementos desse inventário quando os reescreve por meio de sua poesia? — O inventário de quem reconstrói Rich no seu poema? — Qual a imagem da comunidade global que pode se construir a partir do poema? — Como se relacionam o local e o global no poema? — Quais saberes o leitor precisa ativar para ler o poema? • Tarefa: assistir ao filme Babel. Segunda aula: Prática crítica • O professor escolhe uma passagem do filme Babel. Em grupos, os alunos discutem os seguintes itens: — Como se estrutura a narrativa? Quais seus aspectos em comum com um “rizoma”? Qual a conexão com o nome do filme, Babel? — Qual o conceito de transculturalidade repassado pelo filme? — Que mapa do mundo constrói o filme? Que geografias são essas? Políticas? Sociais? Emocionais? — Como funcionam os conceitos de causa e consequência, assonância/dissonância? — De que maneira interagem o “local” e o “global” no filme? — Como funcionam os conceitos de “tempo” e “espaço” no filme? — De que maneira interagem o “público” (a sociedade em geral) e o “privado” (o lar das personagens), no filme? — Qual a “comunidade global” que constrói o filme? 83 Re vi sã o: R os e - Di ag ra m aç ão : M ár ci o - 10 /1 1/ 20 15 Ensino dE LitEraturas dE Língua ingLEsa • Os alunos fazem uma leitura crítica do poema e o filme em contraponto: — Que similaridades/diferenças pode-se estabelecer entre o nome do poema An Atlas of a Difficult World e Babel? — De que maneira o poema e o filme desenvolvem o conceito de “cidadania afetiva e global”? [Ideia de que nós estamos implicados uns com outros]. — Qual o conceito de democracia desenvolvido por ambas narrativas? — De que maneira as duas narrativas criticam o desastre civilizatório criado pelos sistemas políticos atuais? — Discuta o poema e o filme em contraponto em termos da seguinte citação de Adrienne Rich: Também podemos descrever o estético não como uma visão privilegiada e isolada do sofrimento humano, mas como notícia de conscientização, de resistência, que os sistemas totalizantes querem subjugar: arte alcançando o que ainda é apaixonado, ainda não é reprimido, ainda não subjugado [...] O discurso crítico sobre poesia tem dito pouco sobre as condições diárias de nossa existência material passada e presente, como elas imprimem a vida dos sentimentos, das respostas humanas involuntárias [...] Mas quando a poesia pousa sua mão sobre nosso ombro, nós somos, a um grau quase físico, tocados e comovidos. As vias da imaginação se abrem diante de nós, dando vida àquele dictum brutal: não há alternativa (RICH, 2006). Prática de transferência Os alunos fazem uma leitura crítica de diferentes jornais ou telejornais do dia para ver como os discursos das diferentes notícias fazem um “inventário” do mundo do nosso dia a dia e influenciam nossas vidas. Nesse processo, os alunos levam em conta: • A relação entre os diferentes tipos de notícias nas diferentes seções do jornal. • A relação entre notícias nacionais e internacionais. • A maneira como a mesma notícia é apresentada em diferentes jornais. • A maneira na qual os eventos do âmbito do “público” influenciam o nosso mundo “privado”. 84 Re vi sã o: R os e - Di ag ra m aç ão : M ár ci o - 10 /1 1/ 20 15 Unidade II 2.3.2 Módulo 4: Oficina Literária Objetivo: • Oferecer aos alunos a possibilidade de pôr em prática a habilidade de interpretação crítica desenvolvida nos módulos anteriores. • Reescrita de todos os gêneros literários pelos alunos. • Os alunos fazem uma publicação interna com as narrativas desenvolvidas durante as atividades do módulo. Narrativas Todas as narrativas serão escolhidas pelos alunos participantes do módulo. Primeira atividade • Tema: “As Relações Familiares”. • Gênero: conto. • Texto base: — MICHAELS, L. The hand. In: ___. The collected stories. Nova Iorque: Farrar, Straus and Giroux, 2008. — TREVISAN, D. Ah, é? 2. ed. Rio de Janeiro: Record, 1994. • Estratégia de leitura: leituras em contraponto. • Número de aulas: duas. Primeira aula: Prática situacional • O professor contextualiza o gênero “conto”. • O professor contextualiza o autor Leonard Michels. • O professor interpreta com os alunos o conto “The Hand”, de Leonard Michaels, considerando os seguintes aspectos: — Quais as personagens? 85 Re vi sã o: R os e - Di ag ra m aç ão : M ár ci o - 10 /1 1/ 20 15 Ensino dE LitEraturas dE Língua ingLEsa — Considere o uso de discurso direto. Quem fala? — Considere o uso de foco narrativo. — Como interpreta o final do conto? — Qual a classe social das personagens? — Como funcionam os níveis: denotativo, conotativo e crítico? The Hand I smacked my little boy. My anger was powerful. Like justice. Then I discovered no feeling in the hand. I said, “Listen, I want to explain the complexities to you”. I spoke with seriousness and care, particularly of fathers. He asked, when I finished, if I wanted him to forgive me. I said yes. He said no. Like trumps. Fonte: Lodge (1992, p. 215). Prática crítica • Em grupos, os alunos fazem uma leitura crítica do conto “Ah, é?”, de Dalton Trevisan: Ah, é? Mal a pobre se queixa: — Ai, que vida infeliz. Ele a cobre de soco e pontapé: — E agora? Está se divertindo? Apanha ela (grávida de três meses) e apanham as cinco pestinhas. Uma das menores fica de joelhos e mão posta: — Sai sangue, pai. Não com o facão, paizinho. Com o facão, dói. Fonte: Trevisan (1994, p. 53-54). • A partir do texto, os alunos devem refletir a partir das seguintes questões: — Qual são as personagens? 86 Re vi sã o: R os e - Di ag ra m aç ão : M ár ci o - 10 /1 1/ 20 15 Unidade II — Quando e onde o conto foi escrito? — Quais os conflitos familiares apresentados? — Qual a classe social das personagens? Segunda aula: Prática de transferência • Em grupos, os alunos debatem o tema das relações familiares em função dos seguintes aspectos: — De que maneira as relações familiares mudam de uma época para outra e de uma cultura para outra, de uma classe social para outra? — Os conflitos entre gerações são os mesmos ainda hoje? — Quais são os conflitos entre pais e filhos neste momento? — De que maneira se manifesta a violência familiar em uma e outra cultura? • Os alunos escrevem um conto. Veja a seguir um exemplo de conto criado por um dos alunos: No Bar Como se há anos não vissem um ao outro. — Olá, como tem passado? Ela vira um gole, leva um minuto, pensativa. — Melhor impossível! Olham-se novamente, levam mais uns minutos e... Por mais uma noite ela esquece os porres, e as surras (Hugo Monteiro, aluno). Segunda atividade • Tema: “O amor através dos tempos”. • Gênero: poesia. • Textos base: 87 Re vi sã o: R os e - Di ag ra m aç ão : M ár ci o - 10 /1 1/ 20 15 Ensino dE LitEraturas dE Língua ingLEsa — SHAKESPEARE, W. Soneto CXVI. In: ___. Os sonetos completos. Tradução de Vasco Graça
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