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No caso do exemplo 5, o comportamento (a atitude do leitor) depende completamente do conhecimento de mundo que ele possa ter sobre o gênero crônica, mas, principalmente, nesse caso, do conhecimento que ele tenha sobre o autor da crônica, José Simão. Sabendo que se trata de um jornalista que se caracteriza, entre outras coisas, por escrever crônicas humorísticas "escrachadas", o leitor, ao interagir com os textos desse autor, se prepara para entender o humor ácido presente normalmente nos textos, e é a partir dessa atitude que ele dá sentido ao texto. Vejamos, agora, como esse tipo de conhecimento interacional se relaciona com os outros tipos de conhecimento. Peguemos, por exemplo, o trecho "Mas, no Rio, ninguém mais se abala! Há bala!". Como já sabemos que o texto pretende gerar efeitos humorísticos, vemos que o locutor faz um jogo com "abala" e "Há bala": nosso conhecimento linguístico nos permite saber que ambas possuem a mesma sonoridade, mas têm diferentes estruturas sintáticas (a primeira é uma forma verbal; a segunda, uma oração) e diferentes conteúdos semânticos. Percebemos que, no texto, a primeira estrutura é "substituída" pela segunda. O humor estabelecido pela substituição só é compreendido se, além do conhecimento linguístico, ativarmos o conhecimento de mundo sobre a situação de banalização da violência no Rio de Janeiro. O que nós temos, então, é a ativação dos três tipos de conhecimento para a interpretação. Vejamos outro exemplo: a expressão "esculhambador-geral da república" é, naturalmente, confrontada com outra expressão: "procurador-geral da república". O nosso conhecimento lexical, associado ao conhecimento de mundo, nos informa que a última expressão está associada à figura de alguém sério, preocupado em defender os interesses da nação. Na crônica, em virtude de sabermos que se trata de um texto humorístico, é possível interpretar o "esculhambador-geral" como aquele que faz graça com tudo, sem respeitar limites. E ele pode fazer isso nesse espaço, porque a interação que se estabelece em torno desse texto permite (na verdade, necessita) o deboche. Os dois exemplos dados aqui são meramente ilustrativos. Para o texto todo, é preciso integrar os sistemas de conhecimento a fim de promover uma efetiva compreensão do que se lê. No final das contas, a análise desse texto cumpre papel de comprovar o que foi dito no final do tópico 1: "o texto é um evento comunicativo em que estão presentes os elementos linguísticos, os fatores cognitivos e sociais". Isso está totalmente relacionado ao próximo conteúdo deste tópico: o contexto. Tipos de contexto Para atribuir sentidos a um texto, vimos que é preciso mobilizar vários conhecimentos. Compreendemos a importância dos elementos linguísticos presentes na superfície textual e na forma de organização do texto, porém percebemos que os sentidos não existem nas palavras em si, mas são construídos na interação locutor-texto-interlocutor. 9
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