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BARROCO E ARCADISMO EM PORTUGAL

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DESCRIÇÃO
Estudo da literatura portuguesa a partir da estética do Barroco e do Arcadismo.
PROPÓSITO
Conhecer o contexto e a produção literária barroca e arcádica em Portugal para a ampliação de seus estudos sobre arte, literatura e
história cultural em língua portuguesa.
PREPARAÇÃO
Tenha à mão um dicionário de literatura para compreender o vocabulário específico da área. Na internet, você acessa gratuitamente
o E-dicionário de termos literários , de Carlos Ceia, e o Dicionário de cultura básica , de Salvatore D’Onofrio. No portal Domínio
público, você pode ter acesso a obras de autores consagrados da literatura portuguesa.
OBJETIVOS
MÓDULO 1
Identificar o contexto e as características do Barroco em Portugal
MÓDULO 2
Reconhecer as características barrocas da obra do Padre Antônio Vieira
MÓDULO 3
Identificar as principais características do Arcadismo em Portugal
INTRODUÇÃO
O que é o Barroco? Posso considerar uma obra como barroca por ela ser antiga e ter cunho religioso? E o que é o Arcadismo? Qual
é sua relação com a cultura clássica?
Essas são algumas perguntas bem elementares que podem surgir quando tratamos de duas estéticas importantes na Europa dos
séculos XVI, XVII e XVIII.
Responderemos a elas neste conteúdo e abordaremos outras questões relevantes no estudo sobre o Barroco e o Arcadismo em
Portugal, particularmente em sua produção literária.
Veremos os principais elementos relacionados ao contexto e às características estéticas dessa produção literária, além de
elaborarmos uma panorâmica acerca dos autores e das obras que marcaram essas estéticas literárias em Portugal. Verificaremos
ainda que as fases históricas não são isoladas dos estudos literários ou artísticos, pois elas estão intrinsecamente conectadas aos
valores e ao modo de produzir a vida de cada sociedade.
Desse modo, compreenderemos as estéticas barroca e árcade à luz dos eventos em seus contextos e origens históricas. Além
disso, entenderemos que as denominações estéticas são fruto de terminologias criadas por estudiosos, englobando, por conta
disso, diferentes produções em um só nome.
Também faremos algumas relações entre a cultura literária portuguesa e a brasileira. Para isso, estudaremos, por exemplo, a
literatura do Padre Antônio Vieira, português que produziu boa parte de sua obra quando esteve radicado no Brasil. Ele é
considerado um dos maiores escritores da língua portuguesa de todos os tempos.
MÓDULO 1
 Identificar o contexto e as características do Barroco em Portugal
ANTECEDENTES HISTÓRICOS DO BARROCO
Comecemos este módulo pontuando alguns elementos que antecedem o movimento do Barroco em Portugal.
No final da Idade Média, o sistema feudal entrou em colapso devido às novas formas econômicas e de organização social que
surgiam de uma nascente cultura burguesa.
O Feudalismo se caracterizava pela predominância de uma cultura teocêntrica, centrada na figura do rei e da Igreja. Em termos
políticos e econômicos, havia uma interdependência entre rei, vassalos e servos.
Tratava-se de uma sociedade fechada, baseada na agricultura, em que a mobilidade social era reduzida; portanto, a cultura e as
práticas sociais também se abasteciam das referências religiosas.
Portugal se tornou um país autônomo no reinado de D. Afonso Henriques, conhecido como Afonso I de Portugal (1109-1185), no
século XII.
As organizações política e econômica do país, entre os séculos XI e XIV, eram tipicamente feudais. As letras portuguesas do
período se abasteciam de:
Jograis
Cancioneiros
Trovas
Canções de amigo
Cantigas de amor
Satíricas
Hagiografias (narrações da vida dos santos)
Novelas de cavalaria
As novelas de cavalaria eram muito marcantes e resultavam de variações estéticas oriundas, principalmente, das traduções
francesas. Tratava-se de uma literatura cujos valores eram absolutamente dependentes da cultura cristã, com personagens e
situações concebidas pela Igreja Católica.
Uma importante modificação na dinastia portuguesa se deu graças à Revolução de Avis (1383-1385), com a consequente ascensão
ao trono de monarcas oriundos da Casa de Avis. Como consequência, ao mesmo tempo em que se manteve a autonomia de
Portugal, houve uma diminuição do poder monárquico em detrimento dos poderes locais.
Foi a época na qual o país dava início ao processo da expansão naval e aos descobrimentos. D. João I (1357-1433) e seus
sucessores eram apoiados pelos mercadores burgueses. Com isso, ocorreu um enfraquecimento do poder da nobreza e,
consequentemente, de todas as referências culturais da Igreja, o que levou Portugal a se abrir para o mundo.
Essa abertura marcou o início do que foi chamado de Humanismo, tendo o cronista Fernão Lopes (1385-1460) como uma das
referências nas letras, já que, em suas crônicas, havia um substrato que fortalecia a ideia de que a história é resultado do
empreendimento humano.
Posteriormente, entre os séculos XV e XVI, eclodiu o Renascimento, que era uma espécie de evolução do humanismo. Suas
referências eram a cultura clássica greco-romana, o racionalismo e o antropocentrismo. O questionamento do poder divino e o
elogio da razão humana são a marca dele.
O Renascimento pressupunha que o desenvolvimento da arte passava por um viés de racionalização dos costumes, da arte e da
própria vida, sendo a consequência de uma sociedade voltada para o comércio e a livre concorrência, o que deixava transparecer a
ascensão da burguesia urbana.
Esse movimento foi uma arte marcada pelas visões humanista e clássica. Seu momento histórico de abertura ocorreu graças à
aproximação entre Portugal e Espanha.
Portugal, entre 1580 e 1640, esteve sob o domínio espanhol.
Essa proximidade entre os dois países vizinhos foi fundamental para o surgimento do Barroco nas terras lusitanas, pois as trocas
culturais entre ambos fizeram com que Portugal iniciasse uma ruptura de seu sistema feudal não aberto às fronteiras.
Devemos compreender o Barroco a partir de seu nascedouro religioso, principalmente como uma reação à Reforma Protestante
ocorrida no começo do século XVI. Martinho Lutero (1483-1586) e João Calvino (1509-1564) são peças importantes na história da
Reforma. Parte da burguesia comerciante aderiu ao protestantismo, abandonando as crenças católicas.
 SAIBA MAIS
Padre alemão, Lutero começou a denunciar a Igreja Católica pela venda de perdões aos seus fiéis. Ele pregava que a absolvição
divina deveria vir por conta de uma vida religiosa e pela fé, contrariamente ao perdão oferecido em troca de doações, prática no
catolicismo do período. Dessa forma, muitos fiéis começaram a seguir suas ideias e aderir ao protestantismo.
Já Calvino defendia que o lucro obtido por meio do trabalho não era pecado, o que fazia coro com as práticas sociais do período, já
que, no século XVI, o mundo europeu se expandia comercialmente por meio da abertura de novos mercados, iniciando o que
chamamos atualmente de capitalismo.
Como reação à ascensão protestante, a Igreja Católica, no Concílio de Trento (1545 - 1563), construiu ações muito duras para
combater a Reforma Protestante. Esse movimento ficou conhecido como Contrarreforma.
Imagem: Pedro Berruguete/Museo Nacional del Prado/Domínio Público
 Pintura de Pedro Berruguete, representando um auto de fé da Inquisição Espanhola.
Com isso, ressurgiram os tribunais do Santo Ofício (Santa Inquisição). Livros considerados profanos foram proibidos. Vale
mencionar a criação da Companhia de Jesus, também conhecida como Ordem dos Jesuítas, antes mesmo do Concílio de Trento.
O Barroco, desse modo, foi a arte que deu suporte e vazão à Contrarreforma com marcas fortemente religiosas. Forma artística
originária do conservadorismo da Igreja, ele reagia aos novos tempos e aos novos valores implementados pela burguesia.
As marcas desses valores burgueses eram:
Apelos sensoriais do corpo
Novas concepções de amor
Elogio ao dinheiro, ao luxo, às posições sociais e às descobertas da ciência
Imagem: Diego Velázquez/Museo del Prado/Domínio Público As Meninas , por Diego Velázquez.
PRINCÍPIOS ESTÉTICOS DO BARROCO
CONCEPÇÃO
Nesse contexto tensionado e dúbio entre a Reforma e a Contrarreforma, assim como entre as marcas históricas deixadas pelo
Feudalismo e o surgimento da Modernidade, eclodia uma literatura também dúbia, que trabalhava com opostos e era conflitante em
suas concepções e formas.
Ao mesmo tempo em que o Barroco dava vazão aos ares de uma reação religiosa conservadora, que recuperava os valores
medievais, já não era possível apagar as transformações históricas que o Ocidente experimentou a partir do Renascimento, cujas
bases se assentavam sobre a liberdade, o empreendimento individual e o alargamento da visão humana.
Por isso, a estética barroca acabou por conciliar, entre outros, estes opostos:
CARNE
X
ESPÍRITO
FÉ
X
RAZÃO
MEDIEVAL
X
MODERNO
Ela o fez por meio de uma linguagem repleta de antíteses, oscilações, contrapontos, sinestesias, trocadilhos, rebuscamentos,
tensões e irregularidades. Essas dicotomias históricas fundamentam os princípios estéticos do Barroco tanto nas artes em geral
quanto na literatura.
ORIGEM E ANÁLISE
A origem e a definição do Barroco são controversas: há vários e importantes autores que divergem entre si. Mas vale a pena
recuperar alguns pontos, pois o importante é que você, estudioso da literatura, saiba as principais concepções e os princípios das
argumentações.
A origem da palavra “barroco”, para muitos teóricos, seria castelhana: o barrueco aludia às pérolas consideradas imperfeitas ou
deformadas, tendo como parâmetro de comparação a regularidade da arte clássica renascentista, principalmente em comparação
com as obras de Leonardo da Vinci, consideradas um protótipo de bom gosto. Segundo Lopes e Saraiva (2000), inicialmente, essa
palavra assumia um tom pejorativo.
Importante estudioso do movimento barroco, o filósofo e escritor suíço Heinrich Wölflin (1864-1945) recuperou o termo em 1888 – só
que com um valor positivo. Ele fez isso em sua obra Renascimento e Barroco por meio da observação e da descrição de várias
artes aproximadas, criando, para tal, definições esquemáticas que opunham o Barroco ao Clássico.
Imagem: Rudolf Duhrkoop/Wissenschaftliche Sammlungen der HU Berlin/Domínio Público
 Heinrich Wölflin.
Para João Adolfo Hansen (2001), muito do que sabemos sobre o Barroco, na verdade, não corresponde exatamente às obras e às
manifestações consideradas barrocas, já que tais considerações estão apenas baseadas na visão esquemática de Wölflin (criada no
século XIX como tentativa de compreensão do movimento). Portanto, para Hansen, o Barroco nunca existiu, sendo um conceito
criado por Wölflin.
OBRAS E MANIFESTAÇÕES ARTÍSTICAS
O fato é que aquilo que chamamos Barroco, em um sentido historicamente amplo, designa um grande número de obras ligadas a
inovações técnicas e científicas muito diferentes entre si produzidas na Europa a partir do século XVI.
Apontaremos alguns exemplos de obras barrocas em:
Imagem: Caravaggio/ Basilica Parrocchiale Santa Maria del Popolo/Domínio Público
 Crucificação de São Pedro, por Caravaggio, 1601.
ARTES PLÁSTICAS
Foram produzidas obras pictóricas que exploravam gradações intensas de cor. Elas atingiam uma atmosfera de profundidade por
meio dos contratastes entre claro e escuro, assim como pela sensação de movimento das linhas.
Exemplo: obras do pintor italiano Caravaggio (1571-1610).
Nessa tela de Caravaggio, de 1601, nota-se o contraste entre claro e escuro e o apelo sensorial às imagens de sofrimento. A
personagem caída é clara, contrastando-se com o fundo escuro, o que sugere uma ideia de profundidade. O tema religioso reforça
os dogmas da Igreja: há um apelo ao efeito criado no espectador, como se ele devesse ser impactado diante da arte.
Imagem: Caravaggio/Rabanus Flavus/Domínio Público
 Transcrição de O Sacred Head, Now Wounded, do Bach.
MÚSICA
Desenvolveu-se a exploração de elementos polifônicos entre contraponto e fuga, cujas características são a exploração de duas ou
mais vozes simultâneas e entrelaçadas.
Exemplo: composições dos alemães Johann Sebastian Bach (1685-1750) e Georg Friedrich Händel (1685-1759).
Imagem: Sílvia Schumacher/Own work/Domínio Público
 Santuário de Bom Jesus de Matozinhos.
ARQUITETURA
Inferindo aspectos de pompa e grandiloquência, notava-se a exploração de:
Reentrâncias
Ornamentos
Saliências
Modulações em curvas
Exemplo: o arquiteto italiano Francesco Borromini (1599-1667) e o escultor brasileiro Aleijadinho (1738-1814).
Imagem: Luis de Góngora/Rômulo Rosa/Domínio Público
 Luis de Góngora, Fábula de Polifemo y Galatea , 1612.
LITERATURA
Em oposição ao espírito da clareza e da harmonia, houve a recusa de vocábulos populares e a aproximação com uma escrita
aristocrática, empolada e, até certo ponto, obscura, com laivos de misticismo e opulência, sendo, muitas vezes, até hermética.
Exemplo: o cultismo ou gongorismo, em referência ao poeta espanhol Luis de Góngora (1561-1627), foi uma vertente que
explorava o preciosismo vocabular e uma linguagem ornamental, dando especial atenção aos aspectos formais por intermédio de
jogos sonoros e sintáticos. Já no conceptismo ou quevedismo, termo referente ao poeta espanhol Francisco de Quevedo (1580-
1645), há uma ênfase na exploração de conceitos e ideias, havendo uma atenção especial aos conteúdos temáticos da linguagem
literária.
 RESUMINDO
Em suma, o chamado Barroco, assim como suas variações, produz um efeito de euforia dos sentidos.
BARROCO EM PORTUGAL: PANORAMA HISTÓRICO
Imagem: Cristóvão de Morais/Royal Collection/Domínio Público
 D. Sebastião.
O Barroco português, como em toda a Europa, deve muito ao desenvolvimento desse estilo na Espanha. Após o desaparecimento
de D. Sebastião na batalha no Marrocos (Alcácer-Quibir), em 1578, o Cardeal D. Henrique (1512-1580), tio de D. Sebastião,
assumiu o trono.
D. SEBASTIÃO
Nascido em Lisboa, em 1554, D. Sebastião tem seu desaparecimento ou morte cercado de mistérios, dando origem ao
chamado sebastianismo. O sebastianismo, mito sebástico ou mito do encoberto, foi uma crença messiânica e mística presente
em Portugal após a segunda metade do século XVI, sendo espalhada após o desaparecimento do rei de apenas 24 anos.
Essa crença supunha que ele retornaria para restaurar a autonomia e a glória portuguesas por conta da dominação espanhola
na figura do rei D. Filipe II. O sebastianismo, após o fim do período filipino, no entanto, continuou existindo em Portugal como
mito de restauração de uma identidade perdida e, ao mesmo, tempo, em vias de ser conquistada.
O reinado de D. Henrique não duraria muito. Sem descendentes, a morte do monarca decretou o fim da chamada dinastia de Avis,
que havia consolidado Portugal como nação. Com o fim dessa dinastia, a Espanha passou a dominar seu vizinho.
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Imagem: Autor desconhecido/Lumastan/Domínio Público
 D. Henrique.
Esse domínio, que durou 60 anos, é um período de união ibérica conhecido como período filipino. Na era da dinastia filipina, as
trocas culturais entre os dois países se intensificaram, fortalecendo as influências barrocas espanholas em Portugal.
No governo de Filipe IV (1605-1665), ocorreu a chamada revolução restauradora. Portugal enfim retomava sua autonomia com D.
João (1604-1656), Duque de Bragança e futuro D. João IV, findando a dominação espanhola.
FILIPINO
Em alusão aos reis Filipe II, Filipe III e Filipe IV.
BARROCO EM PORTUGAL: PRINCIPAIS CARACTERÍSTICAS
O período dessa dominação foi marcante para a produção literária em Portugal, pois a Espanha tinha interesses comerciais com tal
união ibérica, fato que atraiu muitos judeus (os chamados cristãos-novos) para o país. Esse grupo possuía aportes monetários altos
que ajudaram a financiar os projetos de expansão marítima de Portugal e Espanha unidos.
Nessa junção, havia forças aparentemente antagônicas, mas que, na verdade, ajudaram a formar a atmosfera de produção barroca
em Portugal:
De um lado...
Um país com forteestrutura e cultura feudal tardia, que permanecia atrelado ao espírito cristão medieval, estando sob o domínio da
contrarreforma jesuítica;
Por outro lado...
A presença dos cristãos-novos emigrados e de uma burguesia comercial crescente, que inspirava os ares mercantis e unia uma
rede mundial de comércio.
Do ponto de vista cultural, havia, portanto, um país dividido entre um Renascentismo, que nunca chegou completamente, e uma
cultura da Contrarreforma, que trazia da Espanha fortes influências barrocas. Dessa forma, a atmosfera da Contrarreforma e do
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Barroco é marcada por um período de crise política e social ocorrido entre a chamada Restauração Portuguesa e as reformas do
Marquês de Pombal no século XVIII.
A literatura do período filipino foi marcada por um teor sebastianista e anticastelhano, reivindicando, por meio de uma resistência
popular espontânea, a autonomia portuguesa em oposição à dominação espanhola.
Destacava-se uma literatura oral e escrita com tons satíricos, sendo composta por romances, cartas, versos soltos, atas e
entremezes, além de outros textos curtos e clandestinos. O fim desse período teve como marco uma obra-prima da prosa barroca
portuguesa, A arte de furtar , atualmente atribuída ao Padre Manuel da Costa (1601-1667).
Mesmo após o período filipino, a maior parte da produção literária portuguesa ainda possuía um tom da retórica jesuítica, com forte
influência espanhola, tendo a maior parte dela origem clerical. Contudo, como vimos, a influência burguesa também se fazia
presente, mesclando temas, linguagens e tonalidades de uma aristocracia (nobreza) e uma burguesia letrada.
Isso confirma, aliás, a exploração das contradições e antíteses barrocas. Mesclava-se, nessa literatura, tonalidades profanas e
religiosas, satíricas e moralistas, passadistas e artificiais, com textos mais densos sobre a condição humana.
Eis alguns temas tratados nesses escritos:
Finitude da vida
Desejo da eternidade
Contradições do amor
Liberdade do espírito versus moralidade cristã
Apego ao passado aristocrata
Arroubos de uma nova vida citadina burguesa
Sensualidade da carne
Espiritualidade a ser sempre alcançada
Em suma, trata-se de um período contraditório nas letras, embora ele revele, de forma profunda e em um sentido histórico, as
contradições de uma sociedade portuguesa decadente: acachapada entre uma aristocracia agônica e uma burguesia incipiente,
ainda sem um desenvolvimento próprio e muito dependente do ouro das colônias, bem como de suas atividades comerciais.
Ainda tratando das características do barroco literário em Portugal, vale destacar que a poesia barroca portuguesa foi marcada
pelo aparecimento de academias literárias (academia dos Singulares e a dos Generosos, por exemplo). Elas eram geralmente
ligadas à aristocracia e com forte influência da lírica espanhola.
Essas poesias são líricas cujos temas refletem o espírito da corte sob o domínio espanhol, estando voltadas para as experiências
formais e linguísticas típicas do gongorismo.
As poesias da época estão reunidas em coletâneas como Fênix renascida (1716-1728) e Postilhão de Apolo (1761-1762), cujo
conteúdo marca a decadência cultural portuguesa. Essas coletâneas documentam um período no qual a poesia:

[...] PROCURA A SÍNTESE DE UM CONTEÚDO ARTIFICIAL E DE UMA FORMA
POBRE: ANTÍTESES FORÇADAS, PEDANTISMO, USO EXAGERADO DE
HIPÉRBATOS (ESVAZIANDO SEU SENTIDO POÉTICO), RIMAS IMPOSTAS,
USO OBRIGATÓRIO DE CERTAS PALAVRAS E TROCADILHOS.
(ABDALA JR.; PASCHOALIN, 1985, p. 61)
Elas eram, portanto, produções que marcavam a atmosfera de transformações e tensões históricas da vida portuguesa por meio do
declínio da nobreza frente à burguesia e das críticas à vida religiosa e beata, embora ainda fossem carentes de fortes referências
culturais que pudessem fortalecer a criação de estéticas vigorosas e inovadoras. Por isso, tais escritos foram produções marcadas
pela pompa, pelos exageros e pelos artificialismos.
BARROCO EM PORTUGAL: AUTORES E OBRAS
Imagem: Autor desconhecido/Portal da história/Domínio Público
 Padre Antônio Vieira.
O maior autor da literatura barroca portuguesa é o Padre Antônio Vieira (1608-1697), sem dúvida um dos maiores artistas e
intelectuais de toda a língua portuguesa – incluindo-se as obras produzidas no Brasil.
 COMENTÁRIO
Estudaremos a obra de Vieira com a devida atenção no módulo 2.
No entanto, outros autores também devem ser destacados, pois muitas de suas obras possuem um evidente valor literário, cultural e
histórico:
SÓROR MARIANA ALCOFORADO (1640-1723)
Freira do convento de Nossa Senhora da Conceição, em Beja, Alcoforado foi apaixonada por um oficial francês que serviu em
Portugal nas guerras da restauração, mas que foi obrigado a voltar a seu país após as guerras.
Autora de uma prosa rica, ela escreveu as Cartas portuguesas , obra em que descreve seu sentimento pelo oficial francês e revela
um espírito tipicamente barroco, preso entre as volúpias de uma paixão ausente e o espírito casto do convento.
Historicamente, segundo Lopes e Saraiva (2000), Alcoforado representa mais um dos inúmeros casos de mulheres sem
identificação religiosa que eram enviadas aos conventos por famílias aristocratas que não queriam ver suas filhas em enlace
matrimonial com burgueses ou com cristãos-novos (judeus).
Isso revela muito da sociedade conservadora portuguesa, ainda presa a uma aristocracia que ia se findando, mas sem adentrar com
profundidade no mundo burguês. A obra de Sóror Mariana, com efeito, é marcada pela descrição de uma paixão violenta e sensual
em crise com uma consciência moral.
Imagem: Autor desconhecido/Cartas de amor ao cavaleiro de Chamilly/Domínio Público
RODRIGUES LOBO (1580-1622)
Imagem: Autor desconhecido/Corte na Aldea/Domínio Público
Tendo vivido na dinastia filipina, Rodrigues Lobo produziu uma obra com fortes influências da cultura hispânica – inclusive, a maioria
de seus textos foi escrita em espanhol.
Escrito em homenagem à coroa portuguesa – mais especificamente a D. Duarte, irmão do Duque de Bragança –, o livro Corte da
aldeia constitui uma das primeiras manifestações barrocas em Portugal.
Nessa obra, o autor descreve a vida da corte. Sua temática faz referência ao fim da corte portuguesa diante da dominação
espanhola durante a dinastia filipina. Esse livro, portanto, absorve as influências barrocas. Há também a inserção de temas
portugueses, incorporando, de certa forma, o Barroco ao espírito da nação.
Rodrigues Lobo também escreveu, entre outras obras, as novelas Primavera e Pastor peregrino .
PADRE MANUEL BERNARDES (1644 - 1710)
Bernardes escreveu Nova floresta , obra elaborada em cinco volumes, retratando o espírito religioso e o culto das virtudes da fé.
Seus escritos refletem a condição da clausura inerente à vida religiosa e casta do período.
Imagem: Autor desconhecido/Biblioteca Nacional Digital/Domínio Público
FRANCISCO MANUEL DE MELO (1608-1666)
Imagem: Nicolas Regnesson/Biblioteca Nacional de Portugal/Domínio Público
Destacou-se em sua escrita o gênero epistolar (mais de 20.000 cartas foram produzidas), mas sua obra é vasta, envolvendo teatro,
biografias e poesia, além de outros gêneros.
Em 1651, Melo escreveu Carta de guia de casados , obra que possui uma forte influência aristocrática em oposição a valores
puramente nobres e cristãos, o que imprime a ela um tom irônico e bem-humorado.
ANTÔNIO JOSÉ DA SILVA, “O JUDEU” (1705 - 1739)
Teatrólogo, José da Silva foi um inovador. Ele escreveu suas peças em prosa, o que era novidade no contexto português. Elas
tinham uma forte influência da comédia renascentista espanhola e francesa, além de aludirem à mitologia e aos autores da
Antiguidade Clássica.
Sua obra foi marcada pelo riso e pela sátira. Inspirada na linguagem e nas práticas populares, ela ironizava os costumes e os
valores da sociedade de Lisboa. Nascido no Brasil, o autor foi perseguido e morto pela coroa portuguesa e pela Inquisição, já que
era acusado daprática de “judaísmo”.
Silva é considerado o maior autor teatral de seu tempo, compondo o que chamou de “ópera”, uma vez que ela continha música e
canto. Em Guerras do alecrim e da manjerona , ele alcançou o ápice de seu estilo.
Imagem: Autor desconhecido/Courtesy of Museum of the Inquisition/Domínio Público
FREI ANTÔNIO DAS CHAGAS (1631-1682)
Imagem: Autor desconhecido/Courtesy of Museum of the Inquisition/Domínio Público
Trata-se do nome pelo qual ficou conhecido o autor Antônio da Fonseca Soares. Ele deixou uma obra em prosa e verso repleta de
traços barrocos.
Os poemas de circunstância o aproximam da escrita do espanhol Góngora, mas é em Cartas espirituais que ele conseguiu
desenvolver todo o seu estilo. Chagas também escreveu Sermões , tendo Sermões genuínos como o exemplo de uma prosa
elegante e clara.
Um famoso soneto barroco atribuído ao Frei Antônio das Chagas, Conta e tempo , mostra toda a dualidade de seu estilo, repondo
em choque os vícios humanos versus as virtudes divinas. Isso, aliás, dialogava perfeitamente com sua biografia. Suas
experiências, afinal, estão divididas entre a guerra e os prazeres terrenos, por um lado, e uma existência voltada à vida religiosa, por
outro.
No poema, há um diálogo tenso com o divino: o eu lírico exclama suas dúvidas em relação ao destino diante da fugacidade da vida,
o que representa um tópico recorrente da lírica barroca.
CONTA E TEMPO
Deus pede estrita conta de meu tempo.
E eu vou do meu tempo, dar-lhe conta.
Mas, como dar, sem tempo, tanta conta
Eu, que gastei, sem conta, tanto tempo?
Para dar minha conta feita a tempo,
O tempo me foi dado, e não fiz conta,
Não quis, sobrando tempo, fazer conta,
Hoje, quero acertar conta, e não há tempo.
Oh, vós, que tendes tempo sem ter conta,
Não gasteis vosso tempo em passatempo.
Cuidai, enquanto é tempo, em vossa conta!
Pois, aqueles que, sem conta, gastam tempo,
Quando o tempo chegar, de prestar conta
Chorarão, como eu, o não ter tempo...
(CHAGAS, 2021)
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No vídeo a seguir, o professor Daniel Abrão abordará o contexto e as características da estética barroca em Portugal:
VERIFICANDO O APRENDIZADO
1. O ENTENDIMENTO DO CONTEXTO E DAS CARACTERÍSTICAS DO BARROCO LITERÁRIO
PORTUGUÊS PASSA PELA RELAÇÃO HISTÓRICA ENTRE PORTUGAL E ESPANHA, RELAÇÃO MUITAS
VEZES CONFLITUOSA E DE LUTA PELA AUTONOMIA OU SOBERANIA PORTUGUESA. A POESIA
BARROCA PORTUGUESA DOS ANOS DA DINASTIA FILIPINA (1580-1640) É MARCADA PELA
ARTIFICIALIDADE E PELOS TEMAS SUPERFICIAIS, RECHEADA DE EXERCÍCIOS DE LINGUAGEM
TÍPICOS DE UM GONGORISMO DESLOCADO DE SEU CONTEXTO DE ORIGEM. TAL ARTIFICIALIDADE
ACONTECE PORQUE ESSA PRODUÇÃO LITERÁRIA ERA HISTORICAMENTE:
A) Caracterizada esteticamente como uma poesia com forte influência do modo de vida dos mosteiros, ou seja, uma vida de
castidade.
B) Resultante das academias literárias portuguesas conhecidas como Singulares e Generosos, compostas de poetas aristocratas
que ansiavam pelo retorno dos valores portugueses abandonados pela dinastia filipina.
C) Escrita por poetas da corte portuguesa dominada pela dinastia filipina, enquanto Portugal vivia a tensão entre o fim da autonomia
e a crise da nobreza, bem como a ascensão da aristocracia e da burguesia comercial.
D) Consequência da estética conceptista do Barroco vinda da Espanha, que pressupunha uma lírica com forte ênfase nos jogos de
linguagem.
E) Expressão dos poetas portugueses que, mesmo dentro do período barroco, tinham como referência a cultura clássica.
2. EM RELAÇÃO AO CONTEXTO DO BARROCO EM PORTUGAL E ÀS INFLUÊNCIAS RECEBIDAS,
ASSINALE A ALTERNATIVA CORRETA:
A) A estética barroca em Portugal é resultado principalmente da influência dos cristãos-novos (judeus) em Portugal.
B) O Barroco foi um movimento criado pela forte atuação das academias literárias portuguesas.
C) A produção literária barroca foi decorrente da forte presença da estética renascentista em Portugal.
D) As influências da arte barroca se intensificaram após o domínio espanhol durante a dinastia filipina.
E) As influências barrocas se devem à retomada da autonomia do país após a restauração portuguesa.
GABARITO
1. O entendimento do contexto e das características do Barroco literário português passa pela relação histórica entre
Portugal e Espanha, relação muitas vezes conflituosa e de luta pela autonomia ou soberania portuguesa. A poesia barroca
portuguesa dos anos da dinastia filipina (1580-1640) é marcada pela artificialidade e pelos temas superficiais, recheada de
exercícios de linguagem típicos de um gongorismo deslocado de seu contexto de origem. Tal artificialidade acontece
porque essa produção literária era historicamente:
A alternativa "C " está correta.
Os poemas possuíam temas artificiais porque refletiam o clima histórico da perda da autonomia de Portugal para a Espanha e a
consequente crise da nobreza frente à ascendente burguesia.
2. Em relação ao contexto do Barroco em Portugal e às influências recebidas, assinale a alternativa correta:
A alternativa "D " está correta.
O Barroco dominou a cultura espanhola dos séculos XVI e XVII; após a dominação de Portugal, as trocas culturais entre os dois
países se intensificaram. Isso contribuiu para o incremento da produção literária barroca naquele país.
MÓDULO 2
 Reconhecer as características barrocas da obra do Padre Antônio Vieira
PADRE ANTÔNIO VIEIRA
O Padre Antônio Viera nasceu em Portugal, em 1608, e morreu na Bahia, com quase 90 anos, em 1697. Aos 7 anos, foi trazido para
o Brasil, onde o pai exerceria funções burocráticas no governo. Ele ingressou na Companhia de Jesus aos 15 anos; desde cedo, já
conseguia redigir textos, desenvolvendo uma cadeira de retórica dentro do universo jesuíta.
Ele se tornou uma figura política importante no Brasil durante o reinado de D. João IV. Agindo politicamente, Vieira escreveu textos,
cartas e sermões em prol das questões políticas de Portugal, opondo-se, muitas vezes, aos pares da Companhia de Jesus.
Imagem: Autor desconhecido/Biblioteca Nacional de Portugal/Domínio Público
 Vieira.
Vieira foi um ferrenho defensor do Rei D. João IV, a quem dedicou, em parceria política, muitas lutas e dissabores, chegando a
tomar, em muitas querelas, partido mais próximo do rei do que da Companhia de Jesus.
Ele desenvolveu uma luta em favor dos cristãos-novos (judeus) em Portugal, pois entendia que o país precisava ter “uma política
fundada no poder econômico da burguesia”, explicam Lopes e Saraiva (2000, p. 518).
Por esse motivo, foi perseguido e exilado pelo Santo Ofício, já que os jesuítas se opunham aos cristãos-novos por questões
religiosas, políticas e de interesse econômico. Os jesuítas tinham a massa popular a seu favor, além de inúmeros grupos internos
que disputavam o poder com os judeus na constante luta da nobreza contra a burguesia do período.
Apesar de pertencer ao clero e à Companhia de Jesus, além de, em princípio, estar a favor da nobreza, Vieira acabou tomando,
nessas questões, partido da burguesia mercantil, pois tinha uma visão de futuro mais pragmática, antecipando inclusive alguns
elementos pragmáticos do que viria a ser a política na época do Marquês de Pombal (1699-1782), um déspota esclarecido em favor
da burguesia e contra os jesuítas.
Vieira tinha consciência de que a máquina mercante era algo definitivo e irreversível; portanto, ele via que lamentar sua intrusão nos
portos da colônia seria uma atitude vã. Por conta disso, era necessário dominar essa máquina, “imitando os seus mecanismos e
criando, na esfera do poder monárquico luso, uma estrutura similar que pudesse vencê-la na concorrência entre os impérios”,
aponta Bosi (1998, p. 120).
A visão e a atuação política dele no Brasil também suscitaram inimigos, principalmente em questões relacionadas aos colonos
locais. Afinal, eles eram a favor da escravidão indígena, mas o Padre Antônio Vieira e uma parte dos jesuítas se opunham a ela.
Ele escreveu muitos textos em favor dos ameríndios, acabando por sugerir, emdecisão controversa (no seu tempo e ainda nos dias
atuais), que Portugal deveria trazer os escravos da África a fim de substituir a mão de obra escrava indígena, embora, segundo
Saraiva e Lopes (2000, p. 521), “o próprio Vieira tenha escrito páginas vibrantíssimas sobre os sofrimentos desses mesmos negros”.
Bosi (1998) afirma que Vieira, em seus Sermões , acabou assumindo as próprias contradições, as quais, aliás, eram inerentes ao
próprio projeto português, por ele assumido, entre a fé cristã e a benevolência, assim como à necessidade de imprimir no Brasil o
projeto de domínio de Portugal.
Com esses dois conflitos intensos (em relação à política portuguesa e à questão dos colonos no Brasil), o Padre Antônio Vieira
acabou sendo exilado no Maranhão e, posteriormente, em 1661, expulso da Companhia por ação dos jesuítas.
Imagem: Peter Paul Rubens/Revista de História da Arte/Domínio Público
 D. João IV.
D. João IV, o principal sustentáculo político de Vieira, já estava morto havia cinco anos. Após esse acontecimento, o padre foi
processado por heresia, embora tenha sido anistiado posteriormente.
Em 1669, ele partiu para Roma, onde continuou seu ofício de pregador e defensor de uma política econômica aberta para Portugal.
Vieira regressou definitivamente à Bahia em 1681, onde desempenhou tarefas na coordenação das missões, além do trabalho de
compilação de suas obras.
PRINCIPAIS CARACTERÍSTICAS DA ESCRITA DO PADRE
ANTÔNIO VIEIRA
Vieira é o ourives da palavra. Poucas vezes a língua portuguesa encontrou uma maestria tão eficiente em suas construções
sintáticas, lexicais e imagéticas.
Toda a sua obra se funda no trabalho com a palavra e suas variações infinitas. Sua escrita era engenhosa e aguda, trazendo a
marca barroca, embora, na época, fosse denominada “retórica da agudeza”, aponta Hansen (2000).
O engenho não submete o pensamento ou o bom senso à lógica. A escrita engenhosa pensa por intermédio das palavras,
arrancando delas uma outra lógica persuasiva, artística e encantadora em oposição a uma retórica clássica racionalista e calcada
em silogismos puramente lógicos.
Nos sermões de Vieira, assim como em muitos textos, o tema é desenvolvido a partir de um trecho bíblico comentado e
desenvolvido. Para entender sua escrita, é fundamental reconhecer que ele não só comenta moral e doutrinariamente os trechos
escolhidos, mas que também “desempenha” esses textos.
Desempenhar o texto consiste em tomar um termo isoladamente. Isso significa, entre outros recursos:

[...] FORJAR UMA PRETENSA ETIMOLOGIA DAS PALAVRAS, EM ATENDER À
SUA POSIÇÃO, ÀS REPETIÇÕES, AO NÚMERO DE SÍLABAS E LETRAS DE
QUE SE COMPÕEM, AOS SEUS VÁRIOS SIGNIFICADOS, AO JOGO DE
SINÔNIMOS E ANTÔNIMOS, À INTERPRETAÇÃO ALEGÓRICA OU
ANALÓGICA.
(LOPES; SARAIVA, 2000, p. 552)
Para Vieira, existe uma analogia entre palavra e mundo, a natureza e seus sinais. A palavra, assim, é um sinal da natureza, que
esconde mistérios e conceitos. Essa é a essência do pensamento “engenhoso” (ou pensamento alegórico).
A natureza não seria conhecida pela revelação ou pelo desempenho dos conceitos arraigados no interior da palavra. Para esse
intento, Vieira apela para a etimologia das palavras, desdobrando-as em conceitos associativos. Para as associações, é válido
utilizar não somente os significados, mas também os significantes das palavras, ou seja, o corpo fônico e gráfico delas.
Os efeitos desse tipo de discurso não são apenas lógico-dedutivos: eles também procuram a persuasão pelas qualidades estéticas
do texto. A palavra e seus desdobramentos são o centro do trabalho retórico-literário. Os sinais da natureza, neste caso,
manifestam-se na palavra e no vislumbre.
Vieira investe na palavra os silogismos progressivos. E investe no vislumbre a tradução dos sinais, de forma que a aparência do
rigor do pensamento esconde a manipulação artística da língua e da linguagem na criação de conceitos que se passam por
naturais, enquanto são artifícios associativos.
 ATENÇÃO
Esse tipo de procedimento recebe nos estudos literários o nome de “jogo de ideias”, porém é preciso ressaltar que tal jogo só
acontece diante de um extremo conhecimento das possibilidades da língua.
Confira um exemplo no seguinte trecho dos Sermões escolhidos :
Os homens não amam aquilo que cuidam que amam. Por quê? Ou porque o que amam não é o que cuidam; ou porque amam o que
verdadeiramente não há. Quem estima vidros, cuidando que são diamantes, diamantes estima e não vidros; quem ama defeitos,
cuidando que são perfeições, perfeições ama, e não defeitos. Cuidais que amais diamantes de firmeza, e amais vidros de
fragilidade: cuidais que amais perfeições Angélicas, e amais imperfeições humanas. Logo os homens não amam o que cuidam que
amam. Donde também se segue, que amam o que verdadeiramente não há; porque amam as coisas, não como são, senão como
as imaginam, e o que se imagina, e não é, não o há no mundo.
(VIEIRA, 1984, p. 144-145)
ANÁLISE
O sentido central do texto é que não devemos amar o ideal, e sim o real. Mas, até chegar a essa ideia, Vieira realiza uma série de
comparações positivas:
AMAR
X
CUIDAR
VIDROS
X
DIAMANTES
DEFEITOS
X
PERFEIÇÕES
FIRMEZA
X
FRAGILIDADE
SER
X
IMAGINAR
IDEAL
X
REAL
IDEAL X REAL
Pressuposto com o qual Vieira finaliza a questão.
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O cultismo e o conceptismo ainda estão presentes em seu texto. No caso do ocultismo, por meio do uso frequente da metáfora e
da hipérbole; no caso do conceptismo, por intermédio do uso frequente de um jogo de ideias encadeado por um raciocínio “lógico”.
Existe, porém, uma função específica no discurso de Vieira, a qual, aliás, merecerá especial atenção quando falarmos nos
Sermões , já que um texto sempre é escrito na hipótese de um interlocutor. No caso dessa obra, o interlocutor é aquele que precisa
ser persuadido para a fé católica presente nas igrejas ou nos espaços de interlocução religiosa do período.
Essa necessidade retórica de persuasão molda o discurso de Vieira, embora absorva grande parte dos procedimentos linguístico-
literários do período. Esses procedimentos, aos quais parte considerável da crítica literária chama de Barroco, funcionalizam as
atividades específicas de interlocução.
ATIVIDADE DE REFLEXÃO
MAS POR QUE VIEIRA É CONSIDERADO UM AUTOR IMPORTANTE
PARA A LÍNGUA E A LITERATURA PORTUGUESA?
RESPOSTA
Na França, o poeta Mallarmé (1842-1898), em resposta ao pintor Degas (1834-1917), teria dito que a poesia é feita com palavras, e
não com ideias. Fazendo uma analogia, diríamos que Vieira, comparado ao pensamento artístico da atualidade, estaria próximo
daquele que considera a escrita literária como arte – e não apenas como filosofia ou pensamento a ser veiculado pelas palavras.
No contexto do que entendemos como Barroco, a elaboração da forma requer o “desempenho”, ou seja, uma geometria de opostos
que se tencionam e se desdobram. Com isso, o mistério da palavra é revelado e o divino se acende no encadeamento de conceitos
criados.
O SERMÃO DA SEXAGÉSIMA
O Sermão da sexagésima é considerado uma obra exemplar da escrita “barroca”, o que não deixa de ser verdade por conta da
nomeação sofrida pelas escritas dos Setecentos. Porém, ainda que sutis, as variações desse sermão, em contraste com os
tratados e os autores considerados barrocos, são importantes e merecem ser comentadas.
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Imagem: António Vieira/Biblioteca Nacional de Portugal/Domínio Público
 Primeira edição publicada do Sermão da Sexagésima.
SETECENTOS
Produção literária do século XVII.
Observando os poemas de Góngora, principalmente no tocante ao conceptismo, veremos que eles são textos de difícil
compreensão, já que sua agudeza exige uma leitura culta, atenta e interpretativa. No caso do Padre Antônio Vieira, os Sermões
foram feitos para serem pregados para o povo; portanto, isso exigia deles um grau de comunicabilidade maior e uma clareza de
exposição que surtisse o efeito desejado: a catequização de povos que, em sua maioria,eram analfabetos.
Para tanto, Vieira recorreu a algumas práticas de escritas tanto da Igreja quanto do que se considera Barroco. Apesar do
rebuscamento de suas ideias, ele escolheu temas ou chaves muito claras.
 EXEMPLO
Situações, fenômenos, palavras e imagens que estabelecem uma ligação objetiva com os elementos da realidade imediata.
O Sermão da sexagésima estabelece um diálogo com a parábola do semeador, retirada do Evangelho de São Lucas, na Bíblia. O
tema do Sermão é a própria pregação do Evangelho; portanto, trata-se de um tema metalinguístico, já que ele traz reflexões sobre
a fé, mas, principalmente, sobre o ato de pregar e o de receber os ensinamentos da pregação.
Sua temática reflete, em última instância, o próprio texto que profere, bem como suas qualidades na eficiência da pregação. Todo o
Sermão é elaborado a partir da imagem da semeadura, desdobrando-se em metáforas. Vamos então ao Sermão da Sexagésima
(VIEIRA, 1984):
“Começou ele a semear (diz Cristo), mas com pouca ventura. Uma parte do trigo caiu entre espinhos, e afogaram-no os espinhos.
Outra parte caiu sobre pedras, e secou-se nas pedras por falta de humidade, outra parte caiu no caminho, e pisaram-no os homens
e comeram-no as aves.”
A semeadura é comparada à pregação, pois três partes das sementes são desperdiçadas, só a quarta parte frutificou; assim,
metaforicamente, apenas uma parte daqueles que ouvem os sermões e as pregações do Evangelho é tocada pela palavra de
Cristo.
Logo adiante, Vieira incrementa a reflexão, afirmando que, para uma conversão, são necessários três elementos:
PREGADOR
OUVINTE
GRAÇA DE DEUS
Analogamente, por meio de silogismos, ele estabelece comparações desses três elementos com os olhos, o espelho e a luz:
“Para um homem se ver a si mesmo, são necessárias três cousas: olhos, espelho e luz. Se tem espelho e é cego, não se pode ver
por falta de olhos; se tem espelho e olhos, e é de noite, não se pode ver por falta de luz. Logo, há mister luz, há mister espelho e há
mister olhos. Que cousa é a conversão de uma alma, senão entrar um homem dentro em si e ver-se a si mesmo? Para essa vista
são necessários olhos, é necessário luz e é necessário espelho. O pregador concorre com o espelho, que é a doutrina; Deus
concorre com a luz, que é a graça; o homem concorre com os olhos, que é o conhecimento. Ora suposto que a conversão das
almas por meio da pregação depende destes três concursos: de Deus, do pregador e do ouvinte, por qual deles devemos entender
que falta? Por parte do ouvinte, ou por parte do pregador, ou por parte de Deus?”
Ele conclui observando que se a evangelização não produz efeito, o problema pode estar no pregador, no ouvinte ou em Deus: o
pregador doutrina com a persuasão, o ouvinte assimila com o entendimento e Deus ilumina com a graça.
Comparando, afirma que para um homem ver a si mesmo, isto é, compreender-se, há a necessidade dos olhos, do espelho e da
luz, pois o espelho sem olhos, o espelho sem luz, ou a cegueira com olhos e espelhos de nada adiantam. Os ouvintes, pois, são os
diferentes tipos de terrenos em que caem os grãos da semeadura. Analogamente, estabelece as seguintes proximidades:
 Atenção! Para visualização completa da tabela utilize a rolagem horizontal
Espelho Ensinamento dos pregadores
Olhos Ouvintes
Luz Graça de Deus
Em seguida, outras instâncias foram fundadas em relação à pregação. Para Vieira, havia cinco circunstâncias necessárias para a
evangelização:
1. A PESSOA
Para a pessoa do pregador, o importante não é pregar pelas palavras, e sim por suas ações:
A definição do pregador é a vida e o exemplo. Por isso Cristo no Evangelho não o comparou ao semeador, senão ao que semeia.
Reparai. Não diz Cristo: saiu a semear o semeador, senão, saiu a semear o que semeia.
Nessa passagem, Vieira critica os pregadores que não dão exemplo pelas ações, fazendo com que as “sementes” não frutifiquem
ou que os ouvintes não se vejam no espelho. Trata-se daqueles pregadores mais preocupados consigo do que com a conversão
religiosa.
2. A CIÊNCIA
Vieira defende que o pregador deve ensinar aquilo que sabe, não o que os outros sabem:
Muitos pregadores há que vivem do que não colheram e semeiam o que não trabalharam. [...] Quando David saiu a campo com o
gigante, ofereceu-lhe Saul as suas armas, mas ele não as quis aceitar. Com armas alheias ninguém pode vencer, ainda que seja
David. As armas de Saul só servem a Saul, e as de David a David; e mais aproveita um cajado e uma funda própria, que a espada e
a lança alheia. Pregador que peleja com as armas alheias, não hajais medo que derrube gigante.
3. A MATÉRIA
Mais uma vez, ele utiliza recursos metafóricos baseados em imagens: Vieira compara o sermão a uma árvore, cujo tronco é matéria
única, enquanto os galhos e as flores são comparados aos diferentes desdobramentos da mesma matéria.
Dessa maneira, ele reivindica, para a eficiência da pregação, que o sermão deve ter uma matéria única para não confundir ou
dispensar ouvintes:
Se o lavrador semeara primeiro trigo, e sobre o trigo semeara centeio, e sobre o centeio semeara milho grosso e miúdo, e sobre o
milho semeara cevada, que havia de nascer? Uma mata brava, uma confusão verde. Eis aqui o que acontece aos sermões deste
género. Como semeiam tanta variedade, não podem colher coisa certa. Quem semeia misturas, mal pode colher trigo.
4. O ESTILO
Com efeito, o estilo precisa ser claro, já que, metaforicamente falando, para Vieira, as sementes devem cair naturalmente. Ele
compara o estilo correto com o próprio céu, pois ele seria o mais antigo estilo de onde os homens aprenderam.
O estilo, portanto, é comparado à natureza:
Será porventura o estilo que hoje se usa nos púlpitos? Um estilo tão empeçado, um estilo tão dificultoso, um estilo tão afetado, um
estilo tão encontrado a toda a arte e a toda a natureza? Boa razão é também esta. O estilo há de ser muito fácil e muito natural. Por
isso Cristo comparou o pregar ao semear.
5. A VOZ
Vieira afirma a “definição do pregador, cuidava eu que era: voz que arrazoa e não voz que brada” com a intenção de esclarecer que
o ouvinte se vê no espelho por meio de uma persuasão arrazoada, não exatamente racional, e sim branda, já que ela toca o
coração mais do que o grito, o que corresponderia ao horror ou ao medo.
É o que a estrutura do Sermão nos diz com suas progressivas associações entre formas e ideias.
Todos esses temas são estruturados a partir de fortes influências. Destacaremos duas influências a seguir:
Pregações cristãs mais antigas e praticadas pela Igreja
Vieira resgata uma oratória medieval de construção de alegorias para os comentários bíblicos, pois o interlocutor é um público geral
e não culto.
Discurso engenhoso ou agudo muito utilizado no século XVII na Península Ibérica
Ele retoma essa prática sermonária nos termos da agudeza, isto é, próximo dos artifícios verbais típicos da prosa denominada
“barroca”.
De acordo com Saraiva (1980, p. 120), prevalecem, no Sermão da sexagésima , “as leis da repetição, da simetria e da oposição”
em sua construção. Podemos verificar a repetição de pares antônimos. Eis algumas repetições de Vieira (1984): “boca e mão, ver e
ouvir, cair e subir, arte e natureza, semear e ladrilhar, soar e significar, contente e descontente”.
A construção das frases evidencia, para Saraiva (1980, p. 120), os dois membros desses pares, os quais, às vezes, aparecem numa
oposição simétrica. Vieira constrói essas oposições tomando a palavra em seu significante e significado, separando-os e
desdobrando-os em pares de opostos que dialogam.
Imagem: Autor anônimo/Escarlati/Domínio Público
 Baltasar Gracián.
Existe uma referência místico-religiosa nesse procedimento, pois o autor retoma a palavra como se ela contivesse, em suas
conexões, os mistérios divinos, ou seja, como se ela fosse o invólucro de uma verdade misteriosa. No entanto, há algo muito
próximo dos procedimentos da agudeza descritos pelo escritor jesuíta Baltasar Gracián (1601-1658),que trata da escrita produzida
pelo engenho e pela agudeza.
O Padre Antônio Vieira, afinal, isola um termo e força de maneira muito pessoal uma etimologia. Diferentemente de Gracián,
entretanto, esses procedimentos ou “desempenhos” vão criando conceitos que se dirigem a uma Verdade. Para esse escritor
jesuíta, os efeitos deveriam ser estéticos, caminhando rumo ao Belo – e não ao Verdadeiro.
O fato é que, apesar de se dirigir à construção de uma verdade, Vieira constrói tal discurso por meio de associações que aparentam
uma engenharia sólida do raciocínio lógico, mas que, no fundo, constituem operações criadas e inventadas exatamente com o
intuito de convencer os ouvintes. Trata-se de construções não lógicas, e sim funcionais, que se utilizam de efeitos estéticos em sua
composição.
Já Gracián se propunha exatamente a descobrir palavras dentro de outras e, a partir disso, escolher os extremos a serem operados
por oposições e analogias. A capacidade de, nessas analogias, distinguir os extremos, segundo esse escritor jesuíta, configurava a
agudeza ou o concepto.

NAS PRECEPTIVAS RETÓRICAS DO SÉCULO XVII, A AGUDEZA É DEFINIDA
COMO A METÁFORA RESULTANTE DA FACULDADE INTELECTUAL DO
ENGENHO, QUE A PRODUZ COMO “BELO EFICAZ” OU EFEITO
INESPERADO DE MARAVILHA QUE ESPANTA, AGRADA E PERSUADE.
(HANSEN, 2000)
Existe, na concepção de escrita de Vieira e Gracián, uma distinção entre juízo e engenho. Juízo seria adequado ao discurso
clássico, que apela para a lógica e toma as palavras como referentes de significados e ideias. Já Engenho entenderia que elas se
abrem e que é por meio delas – e nunca sem as palavras – que um efeito (no caso de Vieira, uma verdade) é construído.
O Padre Antônio Vieira se insurgiu contra os pregadores que procuravam apenas efeitos estéticos, pois um sermão deveria
transmitir uma mensagem. Ela nunca deveria ser construída apenas pelo engenho, e sim para revelar a palavra de Deus por meio
do engenho e da agudeza.
Confira alguns comentários a partir da leitura de trechos do Sermão da sexagésima :
VERIFICANDO O APRENDIZADO
1. INDIQUE A ALTERNATIVA QUE POSSUI UMA DAS CARACTERÍSTICAS DA OBRA OU DA ESCRITA
DO PADRE ANTÔNIO VIEIRA:
A) Escrita marcada pela simplicidade do estilo, não sendo engenhosa e aguda.
B) Desenvolvimento das temáticas bíblicas a partir de reflexões teóricas e filosóficas mundanas.
C) Recusa a recursos alegóricos e metafóricos ao mesmo tempo em que valoriza a etimologia.
D) Uso de recursos de repetição e de jogo de sinônimos e antônimos, além de interpretação alegórica.
E) Trabalho apenas com o significado das palavras, desprezando os aspectos fônicos e gráficos do significante.
2. CONSIDERE O SEGUINTE TRECHO DO SERMÃO DA SEXAGÉSIMA :
POR ISTO SÃO MAUS OUVINTES OS DE ENTENDIMENTOS AGUDOS. MAS OS DE VONTADES
ENDURECIDAS AINDA SÃO PIORES, PORQUE UM ENTENDIMENTO AGUDO PODE-SE FERIR PELOS
MESMOS FIOS E VENCER-SE UMA AGUDEZA COM OUTRA MAIOR; MAS CONTRA VONTADES
ENDURECIDAS NENHUMA COISA APROVEITA A AGUDEZA, ANTES DANA MAIS, PORQUE QUANDO
AS SETAS SÃO MAIS AGUDAS, TANTO MAIS FACILMENTE SE DESPONTAM NA PEDRA. OH! DEUS
NOS LIVRE DE VONTADES ENDURECIDAS, QUE AINDA SÃO PIORES QUE AS PEDRAS.
(VIEIRA, 1984)
A PARTIR DESSE TEXTO, É CORRETO AFIRMAR QUE O SERMÃO DA SEXAGÉSIMA ABORDA
A) as questões da pregação religiosa a partir do papel dos pregadores e da resposta dos fiéis.
B) a conclamação ao envolvimento dos fiéis nas lutas contra os colonizadores infiéis.
C) as humilhações e as perseguições por causa da defesa dos índios e dos negros.
D) a admoestação do pregador para adesão ao projeto da Campanha das Índias Ocidentais.
E) a reprovação lançada aos governantes locais pela rejeição deles ao mercantilismo português.
GABARITO
1. Indique a alternativa que possui uma das características da obra ou da escrita do Padre Antônio Vieira:
A alternativa "D " está correta.
O Padre Antônio Vieira não se limitou a comentar moral e doutrinariamente os trechos bíblicos em sua obra. Ele trabalhava ou
“desempenhava” o texto, usando recursos que se caracterizam pela engenhosidade e pela agudeza e lançando mão de
procedimentos, como, por exemplo, repetições de pares de antônimos, uso de analogias, interpretação alegórica e exploração de
elementos fônicos e gráficos das palavras.
2. Considere o seguinte trecho do Sermão da sexagésima :
Por isto são maus ouvintes os de entendimentos agudos. Mas os de vontades endurecidas ainda são piores, porque um
entendimento agudo pode-se ferir pelos mesmos fios e vencer-se uma agudeza com outra maior; mas contra vontades
endurecidas nenhuma coisa aproveita a agudeza, antes dana mais, porque quando as setas são mais agudas, tanto mais
facilmente se despontam na pedra. Oh! Deus nos livre de vontades endurecidas, que ainda são piores que as pedras.
(VIEIRA, 1984)
A partir desse texto, é correto afirmar que o Sermão da sexagésima aborda
A alternativa "A " está correta.
O Sermão da sexagésima dialoga com a narrativa bíblica da “parábola do semeador”, abordando o próprio ato da pregação e
questionando os motivos pelos quais muitos ouvintes não assimilam a evangelização ou a doutrina por intermédio da pregação
religiosa.
MÓDULO 3
 Identificar as principais características do Arcadismo em Portugal
O ILUMINISMO NA EUROPA
Imagem: Gabriel Lemonnier/Private collection/Domínio Público
 Pintura “A Leitura de O Órfão da China de Voltaire no Salão da Madame Geofrin”, de Lemonnier.
Você já deve ter notado que existe uma relação muito estreita entre literatura e história, não é mesmo?
Sempre que estudamos uma manifestação artística, notamos que ela sequer existiria – e nem teria a capacidade de surgir – se não
fossem as condições sociais de cada período. Não se trata de falar somente em “contexto social”, listando os eventos históricos do
mesmo período.
Na verdade, trata-se de pontuar a origem histórica de tais manifestações, compreendendo a existência de um entrelaçamento
inevitável entre:
Condições políticas, econômicas e históricas
Cada escola, autor ou manifestação artístico-literária estudada
Com o Arcadismo, isso não é diferente. Para entendermos esse movimento em Portugal, precisamos compreender o significado
do século XVIII – o chamado Séculos das Luzes – para a Europa.
Para isso, a seguir, analisaremos esse fenômeno a partir de dois pontos de vista:
ECONÔMICO
CAMPO DAS IDEIAS
Foto: Shutterstock.com
ECONÔMICO
A Inglaterra encabeçava o processo industrial no continente. Sabemos que o desenvolvimento das indústrias requer grande
investimento nas ciências, o que leva a um apreço pela razão. Esse fato gerou muitas ideias e ações contra os conhecimentos
dominados pela Igreja e pela religião da época.
Após um período mercantilista, a classe burguesa fica cada vez mais insurgente, pois ela luta contra o poder dos Estados
absolutistas comandados pela nobreza, já que a propriedade privada e a não intervenção do Estado se transformam em algo
essencial para o desenvolvimento da economia.
 RESUMINDO
Em suma, no período, há o poder da Igreja, da nobreza e dos Estados absolutistas contra o da burguesia e do capitalismo
insurgente.
CAMPO DAS IDEIAS
Devemos compreender as implicações do Iluminismo relacionadas com o pensamento da burguesia em ascensão no século XVIII, o
que foi o resultado das transformações políticas e econômicas do período.
As principais bases do pensamento iluminista são:
Elogio da razão;
Revisão do conhecimento até então produzido;
Mudança de um ensino religioso para um ensino laico;
Luta pela liberdade individual na economia por meio do elogio da propriedade privada;
Defesa pela igualdade entre os poderes sociais.
Nesse contexto, surgiram alguns pensadores fundamentais para tal movimento:
Imagem: Jaybear/University of Chicago/Domínio Público
PENSADORES FRANCESES (SÉCULO XVII)
Na França, em 1751, é lançada a Enciclopédia das ciências, das artes e dos ofícios (imagem). Seu objetivo era compilar o
conhecimento produzido até então como forma de contraposiçãoao conhecimento clerical.
Imagem: Nicolas de Largillierre/Palace of Versailles/Domínio Público
FRANÇOIS-MARIE AROUET, CONHECIDO COMO VOLTAIRE (1694-1778)
Filósofo e escritor francês, Voltaire (imagem) elaborou sua obra contra o poder da Igreja. Ele não era exatamente a favor de uma
revolução social ampla, e sim da ascensão de um “déspota esclarecido”, isto é, de alguém que concentrasse o poder, embora ainda
mantivesse ideais iluministas.
Imagem: Maurice Quentin de La Tour/Musée Antoine-Lécuyer/Domínio Público
JEAN-JACQUES ROUSSEAU (1712-1778)
Filósofo, político e escritor francês, Rousseau (imagem) defendeu uma liberdade individual e coletiva que só seria possível por meio
de um “contrato social”. Tal contrato era o instrumento que garantiria tanto a liberdade quanto a igualdade, pois, a fim de existir o
bem comum, seria necessário equilibrar as vontades individuais e a necessidade para o bem-estar da sociedade. Rousseau foi um
dos principais influenciadores da Revolução Francesa.
Imagem: Autor desconhecido/Scottish National Gallery/Domínio Público
ADAM SMITH (1723-1790)
No contexto britânico, o economista e filósofo Adam Smith, autor da obra A riqueza das nações , defendia um Estado que não
interferisse na economia, pois ele seria um entrave para o crescimento do capitalismo, o qual, por sua vez, se equilibraria entre a
oferta e a procura de bens e serviços.
CONTEXTO DO SURGIMENTO DO ARCADISMO EM
PORTUGAL
Em 1775, D. José assumia o reinado em Portugal. Seu ministro, o Marquês de Pombal, foi um dos grandes responsáveis pela
adoção das transformações políticas, educacionais e culturais do país. O projeto de Pombal era antijesuítico em todos os sentidos.
A concepção dos Estados absolutistas comandados pela nobreza submete todos os poderes à mediação da Igreja. A concepção de
Pombal, porém, era de que as leis de Deus (e da Igreja) deviam ser mediadas e interpretadas pelo monarca, pois ele seria um
“déspota esclarecido”.
Pombal, tanto em Portugal quanto no Brasil, substituiu o ensino religioso pelo ensino burguês, ligado às ciências desenvolvidas até
a época. Pouco a pouco, a influência espanhola foi dando lugar à francesa, à italiana, à inglesa e à alemã.
Em 1779, foi fundada a Academia Real das Ciências, importante instituição que conectava o ensino às práticas e às necessidades
econômicas. Pombal fortalecia, com isso, o Estado e seu poder em relação às colônias portuguesas, como o Brasil.
Imagem: Autor desconhecido/Academia das Ciências de Lisboa/Domínio Público
Outra atuação importante foi a do Padre Luís Antônio Verney (1713-1792), autor de O verdadeiro método de estudar , obra
fundamental que influenciou as ideias do Marquês de Pombal.
Padre Verney foi um discípulo dos jesuítas portugueses, mas boa parte de sua formação se deu em Roma, onde ele, além de
membro da Arcádia de Roma e secretário do embaixador, foi feito Cavaleiro da Ordem de Cristo. Verney escreveu muitos manuais
didáticos, cujos temas, políticos, econômicos e estéticos, estavam direcionados para um amplo projeto iluminista em Portugal.
Ele defendia:
Educação laica: proposição de mudanças profundas nos currículos escolares e nas universidades, introduzindo novas concepções
no Direito, na Medicina, no estudo das Humanidades e das línguas latinas e europeias.
Governo assentado na opinião pública.
Fonte: Autor/Shutterstock
Extinção de ações da Inquisição e das delações religiosas direcionadas aos cristãos-novos.
Em relação à literatura, Verney preconizava o fim dos excessos da retórica da agudeza, criticando inclusive a escrita do Padre
Vieira, dado à retórica artificial composta por silogismos irreais e forçados.
Esse cenário mudou com a morte do Rei D. José (1714-1777). Pombal teve de sair do poder. Retornam toda a nobreza e o poder da
Igreja.
A maçonaria, os burgueses, o ensino laico, as ciências – tudo isso passou a ser reprimido novamente. Livros foram proibidos;
escritores foram exilados. Criou-se uma tensão histórica entre Portugal e o resto da Europa, pois, enquanto o continente respirava
os ares da revolução burguesa e a ascensão do modo de produção capitalista, Portugal retomava o poder da nobreza.
CARACTERÍSTICAS DO ARCADISMO EM PORTUGAL
Equilibrando-se entre reformas e contrarreformas, vivenciando tensões entre os poderes da nobreza e da burguesia e entremeado
pela ascensão capitalista e o modo de economia imperial com as colônias, está o Arcadismo em Portugal.
Ele floresceu sob a inspiração do contexto europeu. As ideias iluministas, afinal, impõem uma troca de referências culturais.
Enquanto o Barroco tinha como pano de fundo as ideias eclesiásticas, com forte influência medieval tanto nos temas e na retórica
quanto nas formas, o Arcadismo teve como referência o universo da cultura clássica greco-romana. Autores da Antiguidade
Clássica, como Horácio, são prestigiados, operando em contraposição ao conhecimento escolástico ainda presente na educação
europeia.
CONHECIMENTO ESCOLÁSTICO
Filosofia cristã presente nas universidades medievais.
 SAIBA MAIS
Filósofo e poeta latino, Horácio (65 a.C. – 8 a.C.) foi uma referência para os princípios classicistas do Arcadismo. Em seu livro Arte
poética , ele defendia uma poética dominada por técnica, razão, objetividade, bom senso e simplicidade: todos esses predicados
deveriam permitir a construção de textos que contivessem unidade e que fossem naturais, como a natureza. Cada gênero literário
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ou artístico deveria ser respeitado em sua integridade (respeito às convenções); para tanto, os antigos (greco-romanos) deveriam
servir como modelos ainda na observação, já que, para eles, a arte deve seguir o Belo, o Bom e o Verdadeiro.
Do ponto de vista literário e artístico, sabemos que a cultura clássica tem como princípios:
Harmonia das formas;
Verossimilhança em relação à natureza;
Ideal da razão que conduz ao belo; e
Equilíbrio das emoções e dos arroubos da subjetividade (fenômeno chamado de despersonalização lírica).
Nesse sentido, dada a universalidade do mundo clássico, os princípios estéticos que serviam como referência para os poetas
árcades portugueses não diferiam dos princípios árcades (ou classicistas) da França, da Itália ou mesmo do Brasil:
Vida no campo (fugere urbem );
Contemplação equilibrada e calma da natureza (locus amoenus );
Uso da simplicidade, do bom senso e do meio-termo na escola dos vocábulos e procedimentos estéticos (aurea mediocritas );
e
Eliminação do supérfluo e do inútil nas composições (inutilia truncat ).
Imagem: Friedrich von Kaulbach/Art Renewal Center/Domínio Público
 Representação de Arcádia, do pintor romântico Friedrich von Kaulbach (1850-1920).
 ATENÇÃO
Esses temas ou tópicos não eram exatamente correspondentes à vida pessoal de cada poeta, pois eram convenções clássicas,
modelos e situações artificiais que revestiam o labor poético.
As mudanças, nesse sentido, foram incrementadas pelo surgimento de várias academias literárias. Como verificamos anteriormente,
as academias, no período barroco, eram formadas por aristocratas que atuavam para a manutenção dos poderes existentes. Já na
era árcade, tais academias serviam como renovação.
Em 1756, é fundada a Arcádia Lusitana; 34 anos depois, a Academia de Belas-Artes (chamada posteriormente de Nova Arcádia).
A escrita barroca, recheada de oposições, contrapontos obscuros e vernáculos rebuscados, é substituída por uma linguagem clara,
simples e objetiva, fazendo coro com o ideal clássico da simplicidade e de uma vida natural e campestre. Os versos brancos (sem
rima) se tornaram mais comuns, embora as métricas continuassem próximas das formas fixas.
Nem tudo, entretanto, foi evolução, até porque as estéticas se sobrepõem conforme as épocas, sem que delas possamos extrair
uma análise qualitativa engendrada a partir de valores fixos.
Segundo Lopes e Saraiva (2000), a escrita elocubrante do barroco foi substituída por um excesso de regras e regulamentações
estabelecidas a partir de uma leiturainterpretativa dos moldes clássicos. Alguns críticos ainda falam que a recorrência à mitologia
clássica, misturada ao racionalismo iluminista, acabou por modelar os padrões e gostos, disfarçando as limitações de certas
poéticas pessoais.
O certo é que, de todo modo, vários autores surgiram – alguns mais criativos e outros nem tanto, como ocorre, aliás, em toda
geração literária.
NOMES E OBRAS DO ARCADISMO EM PORTUGAL
Não há forma melhor de entender a literatura do que o conhecimento de seus autores e obras. Por isso, falaremos a seguir sobre os
principais nomes da Arcádia Lusitana e da Nova Arcádia:
ARCÁDIA LUSITANA
Como vimos anteriormente, o Arcadismo em Portugal se fortaleceu com a criação de academias – e a mais importante delas foi a
Arcádia Lusitana. Em torno dela, estiveram reunidos diversos nomes.
Listaremos alguns deles a seguir:
ANTÔNIO DINIS DA CRUZ E SILVA
TEOTÔNIO GOMES DE CARVALHO
MANUEL NICOLAU ESTEVES NEGRÃO
VALADARES E SOUZA
MANUEL DE FIGUEIREDO
CORREIA GARÇÃO
PADRE JOSÉ FREIRE (CÂNDIDO LUSITANO)
Imagem: Autor desconhecido/Biblioteca Nacional de Portugal/Domínio Público
 Cândido Lusitano.
Cândido Lusitano sistematizou em vários trabalhos os princípios da academia, sendo uma das referências teóricas do grupo. Em
sua Arte poética , ele definiu os princípios ou códigos estéticos dos árcades portugueses. Já em seus tratados, Lusitano defendia a
proeminência da lógica frente à estética, polemizando com Verney.
Voltado aos preceitos clássicos, ele se baseou em Aristóteles ao falar que a arte precisa se voltar à verossimilhança em sua
criatividade. Como todo classicista de origem, Lusitano pensava que a arte deve ser pautada pela proporção equilibrada, pela ordem
e pela unidade.
As academias, bem como o Arcadismo, eram o resultado do surgimento da chamada burguesia ilustrada, isto é, não aristocrata
(nobre), culta, letrada e, mais especificamente, ciente e cordata em relação aos valores emanados do Iluminismo: ciência, razão e
liberdade.
Em sua maioria, esses acadêmicos eram recém-saídos das faculdades de Direito. Bacharéis, eles não encontravam de imediato
uma ocupação dada a situação social de Portugal. Tal condição levava a maioria dos jovens poetas a procurar mecenas e postos de
trabalho no governo por meio de bajulações, não raras vezes presentes na forma de temas no interior dos poemas árcades.
A Arcádia Lusitana possuía regras rígidas. Para o ingresso, havia provas, juízes, avaliações coletivas e procedimentos voltados para
a verificação da adequação de cada obra aos princípios árcades e aos modelos dos antigos.
Os grandes autores latinos da Antiguidade Clássica eram observados com rigores doutrinários e serviam como modelos quase que
absolutos.
Entre as regras sociais de convívio e trato, havia a diretiva de que todos deveriam ser iguais independentemente de sua origem
(estirpe): nobre, aristocrata, pobre ou rica. Isso levou os poetas a assumirem pseudônimos latinos como forma ou tentativa de
apagar suas origens em busca desse ideal de simplicidade – ideal, aliás, da cultura clássica.
Cruz e Silva era Elpino Nonacriense; Correia Garção era Alcino Micênio; e Manuel de Figueiredo era Lícidas Cíntio.
O pseudônimo também era uma forma de adequação aos novos tempos políticos, já que a burguesia em crescimento não possuía,
como os nobres, exatamente um sobrenome que pudesse garantir, pela origem, um status social. Isso era um sinal, inclusive, das
transformações sociais e políticas de Portugal!
NOVA ARCÁDIA
Posteriormente, desentendimentos esmoreceram a Academia Lusitana. Por isso, em 1790, foi fundada a Nova Arcádia. Ela era
composta por diversos autores, como Agostinho de Macedo e Manuel Maria Barbosa du Bocage (do qual falaremos mais adiante de
forma detalhada).
 SAIBA MAIS
Alguns poetas importantes não pertenceram às academias, como, por exemplo, Nicolau Tolentino de Almeida. Outros ainda foram
dissidentes: isso foi o caso de Felino Elísio, Basílio da Gama e Silva Alvarenga.
Mencionaremos brevemente alguns poetas da Academia Lusitana:
PEDRO ANTÔNIO CORREIA GARÇÃO (CORIDÓN ERIMANTEU) (1724 - 1772)
Muito influente nas discussões, ele escreveu suas “dissertações”, que continham parâmetros para a escrita árcade. Garção cultivou
os gêneros clássicos, inclusive canções báquicas, como os ditirambos, que eram típicos dos gregos e estão na origem da
tragédia grega.
REIS QUITA (ALCINO MENÉCIO) (1728-1770)
Reis Quita escreveu tragédias, como Hermíone , Mégara , Inês de Castro e Astarto , além do drama pastoril Licore . Ele tinha
preferência por estéticas arcaicas com temas bucólicos ou o saudosismo. Suas Obras poéticas foram publicadas postumamente
em 1176.
NICOLAU TOLENTINO DE ALMEIDA (1740-1811)
Autor de Obras poéticas e Obras póstumas , Nicolau Tolentino de Almeida escreveu uma obra satírica, embora tenha
homenageado mecenas que os sustentavam em muitas odes. Muito rica é a dimensão de sua crítica de costumes dirigida aos
poderosos, mas também ao cidadão comum, explorando situações sociais caricaturais daqueles vulneráveis do período português.
Isso fez com que seus escritos tivessem um certo tom de coloquialidade e de formas populares – até de autoironia – em muitos
momentos, já que sua condição social nunca foi das melhores.
MANUEL DE FIGUEIREDO (LÍCIDAS CÍNTIO) (1725-1801)
Figueiredo foi o maior dramaturgo português do século XVIII. Representante do teatro neoclássico, ele escreveu mais de 30 obras.
Apresentou as peças Viriato e Édipo na Arcádia Lusitana, pelas quais recebeu valorosos elogios.
Bastante autocrítico, Figueiredo considerava-se mais filósofo do que dramaturgo ou poeta, já que suas peças, segundo muitos
críticos e o próprio autor, possuíam muitos defeitos, os quais, muitas vezes, as tornavam irrepresentáveis.
Sua obra é marcada por uma discrepância entre a composição e o gosto do público da época. As comédias burguesas João
Fernandes feito homem , A mulher que não parece ou O homem que o não quer ser são textos que ironizam os fidalgos e as
linhagens nobres, exaltando os valores da burguesia.
CANÇÕES BÁQUICAS
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Em louvor ao deus do vinho, Baco (Dionísio para os gregos).
DITIRAMBOS
Forma de lírica coral arcaica em louvor ao deus Dionísio.
BOCAGE
Vamos destacar agora um dos principais expoentes do Arcadismo em Portugal.
VIDA E OBRA
Manuel Maria Barbosa du Bocage nasceu em Setúbal, em 1765, e viveu em Macau. Na Nova Arcádia, escrevia sob o pseudônimo
de Almano Sadino. Os temas satíricos, recheados de erotismo e humor, levaram Bocage à fama, tornando-o talvez o poeta árcade
português mais conhecido até os dias atuais.
Imagem: Francisco Augusto Flamengo/Sapo Viagens/Domínio Público
 Manuel Maria Barbosa du Bocage.
Sua fase mais lírica abarca elementos gerais do Arcadismo, cujos temas estão voltados para a desilusão amorosa e os dramas
existenciais, além de terem uma predileção por tópicos misteriosos e noturnos.
Bocage foi tradutor de poetas latinos e franceses. Por conta de sua inclinação para a autorrepresentação lírica mais confessional e
sentimental, foi considerado um precursor do Romantismo em Portugal.
O escritor foi preso pela acusação de proximidade com os ideais da Revolução Francesa e por ter publicado um poema político,
Pavorosa ilusão da eternidade , que atacava os poderes vigentes. Entregue à Inquisição, ele posteriormente fez acordos que lhe
garantiram a continuidade de sua vida desde que se convertesse às crenças religiosas em voga.
Vejamos um soneto de Bocage:
CONVITE À MARÍLIA
Já se afastou de nós o Inverno agreste,
Envolto nos seus húmidos vapores;
A fértil Primavera, a mãe das flores
O prado ameno de boninas veste:
Varrendo os ares o subtil nordeste
Os torna azuis: as aves de mil cores
Adejam entre Zéfiros, e Amores,
E torna o fresco Tejo a cor celeste;
Vem, ó Marília, vem lograr comigo
Destes alegres campos a beleza,
Destas copadas árvores o abrigo:
Deixa louvar da corte a vã grandeza:
Quanto me agradamais estar contigo
Notando as perfeições da Natureza!
(BOCAGE, 1968)
ANÁLISE
O soneto de Bocage apresenta as seguintes marcas do Arcadismo:
Descrição e valorização do ambiente bucólico para onde a amada deve fugir com seu amado (fugere urbem ).
Natureza como lugar agradável e de paz (locus amoenus ).
Ideal de simplicidade e alegria (aurea mediocritas ).
Ideias e linguagem caracterizadas pela clareza e simplicidade.
Ainda vemos nesse soneto uma referência ao mundo clássico por meio da citação de elementos mitológicos. Um exemplo é a
alusão ao vento do Ocidente usando aquele que personifica mitologicamente esse vento: Zéfiro.
Acompanhe a abordagem das características da estética árcade em Portugal, com leitura e comentários de poema(s) de Bocage,
feita pelo professor Daniel Abrão:
VERIFICANDO O APRENDIZADO
1. INDIQUE A ALTERNATIVA COM UMA CARACTERÍSTICA DO ARCADISMO EM PORTUGAL:
A) Abandono das influências estéticas greco-latinas, como, por exemplo, a obra de Horácio.
B) Presença dos temas bíblicos e do prestígio da educação escolástica.
C) Rejeição à lírica marcada pela harmonia das formas e pela verossimilhança em relação à natureza.
D) Uso mais comum dos versos brancos e linguagem mais próxima do ideal clássico de simplicidade.
E) Escrita marcada por oposições, contrapontos enigmáticos e rebuscamentos do vocabulário.
2. (UNIFESP – ADAPTADO) LEIA O SEGUINTE SONETO DE BOCAGE:
“OLHA, MARÍLIA, AS FLAUTAS DOS PASTORES
QUE BEM QUE SOAM, COMO ESTÃO CADENTES!
OLHA O TEJO A SORRIR-SE! OLHA, NÃO SENTES
OS ZÉFIROS BRINCAR POR ENTRE FLORES?
VÊ COMO ALI, BEIJANDO-SE, OS AMORES
INCITAM NOSSOS ÓSCULOS ARDENTES!
EI-LAS DE PLANTA EM PLANTA AS INOCENTES,
AS VAGAS BORBOLETAS DE MIL CORES.
NAQUELE ARBUSTO O ROUXINOL SUSPIRA,
ORA NAS FOLHAS A ABELHINHA PARA,
ORA NOS ARES, SUSSURRANDO, GIRA:
QUE ALEGRE CAMPO! QUE MANHÃ TÃO CLARA!
MAS AH! TUDO O QUE VÊS, SE EU TE NÃO VIRA,
MAIS TRISTEZA QUE A MORTE ME CAUSARA.”
(BOCAGE, 1968)
ASSINALE A ALTERNATIVA NA QUAL OS DOIS VERSOS REPRESENTAM RESPECTIVAMENTE O
BUCOLISMO E A VALORIZAÇÃO DA CULTURA CLÁSSICA GRECO-ROMANA:
A) Tudo o que vês, se eu te não vira/Olha, Marília, as flautas dos pastores.
B) Ei-las de planta em planta as inocentes/Naquele arbusto o rouxinol suspira.
C) Que bem que soam, como estão cadentes!/Mais tristeza que a morte me causara.
D) Mais tristeza que a morte me causara./Olha o Tejo a sorrir- se! Olha, não sentes.
E) Que alegre campo! Que manhã tão clara!/Os Zéfiros brincar por entre flores?
GABARITO
1. Indique a alternativa com uma característica do Arcadismo em Portugal:
A alternativa "D " está correta.
Identificamos na escrita arcádica uma diferença em relação ao rebuscamento e ao uso de oposições presentes na escrita barroca. A
escrita no Arcadismo é caracterizada por uma linguagem mais simples, próxima ao ideal clássico de simplicidade. Além disso, há
uma presença mais comum dos versos sem rima (versos brancos), ainda que a métrica mantenha características também próximas
das formas fixas.
2. (Unifesp – adaptado) Leia o seguinte soneto de Bocage:
“Olha, Marília, as flautas dos pastores
Que bem que soam, como estão cadentes!
Olha o Tejo a sorrir-se! Olha, não sentes
Os Zéfiros brincar por entre flores?
Vê como ali, beijando-se, os Amores
Incitam nossos ósculos ardentes!
Ei-las de planta em planta as inocentes,
As vagas borboletas de mil cores.
Naquele arbusto o rouxinol suspira,
Ora nas folhas a abelhinha para,
Ora nos ares, sussurrando, gira:
Que alegre campo! Que manhã tão clara!
Mas ah! Tudo o que vês, se eu te não vira,
Mais tristeza que a morte me causara.”
(BOCAGE, 1968)
Assinale a alternativa na qual os dois versos representam respectivamente o bucolismo e a valorização da cultura clássica
greco-romana:
A alternativa "E " está correta.
O verso “Que alegre campo! Que manhã tão clara!” remete ao bucolismo, porque o eu lírico valoriza o ambiente campestre e a
natureza como lugar de alegria e desejável. O verso “Os Zéfiros brincar por entre flores?” traz uma referência à mitologia clássica na
menção que faz aos Zéfiros, personificação mitológica do vento que sopra do Ocidente.
CONCLUSÃO
CONSIDERAÇÕES FINAIS
Percorremos neste tema o universo do Barroco e do Arcadismo em Portugal, extraindo relações da produção literária em diálogo
com a história. Observamos que, enquanto o Barroco tem sua referência no universo da Igreja e da Contrarreforma, capitaneada
pelos jesuítas, o Arcadismo tem suas referências na Antiguidade Clássica.
Enquanto o Barroco prima pela chamada “retórica da agudeza”, apostando em silogismos e contrapontos e extraindo sua força
desses extremos que se digladiam, o Arcadismo se destaca pela limpeza do verso, pela busca da simplicidade das formas e pelo
apelo à razão, características que, aliás, deveriam se destacar na realização de seus efeitos estéticos. As duas estéticas, em
Portugal, conviveram com idas e vindas entre os poderes, se equilibrando na relação tensa entre os valores da aristocracia e da
burguesia em conflito.
Entre os módulos do Barroco e do Arcadismo, conhecemos ainda a obra do Padre Antônio Vieira, uma das mais belas homenagens
à língua portuguesa que conhecemos. Sua obra representa o que, em português, existe de mais elaborado para o que ficou
conhecido didaticamente como Barroco.
AVALIAÇÃO DO TEMA:
REFERÊNCIAS
ABDALA JR, B.; PASCHOALIN, M. A. História social da literatura portuguesa. São Paulo: Ática, 1985.
BOSI, A. Dialética da colonização. São Paulo: Companhia das letras, 1998.
BOCAGE, M. M. M. Obras. Porto: Lello & Irmão, 1968.
CHAGAS, F. A. Conta e tempo. In: Conta e tempo – um poema de Frei Antonio das Chagas – 1631-1682. Consultado em meio
eletrônico em: 18 mar. 2021.
GRACIÁN, B. Arte de Ingenio: tratado de la agudeza. Madri, 1648.
HANSEN, J. A. A retórica da agudeza. In: Letras Clássicas. n. 4. 2000. p. 317-342.
HANSEN, J. A. Barroco, Neobarroco e outras ruínas. In: Teresa - revista de literatura brasileira. n. 2. 2001.
LOPES, Ó.; SARAIVA, A. J. História da literatura portuguesa. 17. ed. Porto: Porto Editora, 2000.
SARAIVA, A. J. O discurso engenhoso. São Paulo: Perspectiva, 1980.
VIEIRA, P. A. Sermões escolhidos. Seleção, introdução e notas de Maria das Graças Moreira de Sá. Lisboa: Ulisseia, 1984.
EXPLORE+
Veja como é polêmico o nome “Barroco” na historiografia literária lendo o artigo Barroco, Neobarroco e outras ruínas , de João
Hansen, disponível no portal de revistas da USP.
Há um estudo muito interessante, escrito por Marina Massini, sobre o uso de imagens na retórica de Padre Vieira. O artigo se
chama A função das imagens na elaboração da experiência em sermões de Antônio Vieira e suas matrizes conceituais e está
disponível no portal da UFRN.
Navegue por diversos poemas e textos de Bocage acessando o portal Domínio Público.
CONTEUDISTA
Daniel Abrão
 CURRÍCULO LATTES
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