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neves_-_parasitologia_humana_-_11ed-43

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formação de ascite e também complicações vasculopulmo- profiláticas (quimioterapia, aplicação de moluscicidas, sane- 
nares, icterícia e encefalopatias. Um paciente pode apresen- amento básico etc.). 
tar apenas uma forma, apresentar mais de uma ou passar de 
urna para outra forma durante a evolução da doença. Além 
disso, deve-se salientar que a maior ou menor gravidade da 
esquistossomose depende diretamente da carga parasitária. 
Quanto maior o número de vermes, maior será a deposição 
de ovos e, conseqüentemente, maiores serão as lesões. O 
tempo do parasitismo e o estado nutricional do paciente 
também são fatores importantes na gravidade do caso, uma 
vez que quanto mais antigo for o parasitismo, maior acúmulo 
de lesões ocorrerá. 
Finalmente, a esquistossomose deve ser encarada como 
uma doença de múltiplos mecanismos, com lesões direta- 
mente ligadas a presença local do agente etiológico 
(cercárias, esquistossômulos, vermes adultos, ovos), altera- 
ções hemodinâmicas, alterações da reatividade imunológica, 
lesões a distância devidas a imunocomplexos, e repercus- 
sões gerais sobre o organismo, além de interagir e favore- 
cer outras patologias por agentes infecciosos. 
No diagnóstico clínico, deve-se levar em conta a fase da 
doença (pré-postural, aguda ou crônica, já definidas ante- 
riormente). Além disso, é de fundamental importância a 
anamnese detalhada do caso do paciente origem, hábitos, 
contato com água - pescarias, banhos, trabalhos, recrea- 
ção, esportes etc.). 
Os métodos parasitológicos ou diretos se fundamentam 
no encontro dos ovos do parasito nas fezes ou tecidos do 
paciente. 
Exame de Fezes 
Pode ser feito por métodos de sedimentação ou centrifuga- 
ção em éter sulfúrico (ver Capítulo 55), métodos estes com 
base na alta densidade dos ovos, ou por método de concen- 
tração por tamização (Kato e Kato-Katz). Quando existe uma 
carga parasitária média ou alta, todos estes métodos de exame 
dão resultados satisfatórios. Entretanto, com cargas parasitá- 
rias baixas, há necessidade de repeti-los. A Emea acasalada do 
S. mansoni elimina diariamente cerca de 200 ovos pelas fezes. 
Assim, a probabilidade de uma lâmina do método de Kato de- 
tectar a infecção por um casal de vermes (200 ovoslfêmea - 
200g fezeddia - 42mg de fezes examinadas) seria de cerca de 
1/24. Portanto, principalmente para controle de cura, após 
quirnioterapia, deve-se pedir vários exames de fezes para se ter 
certeza da cura parasitológica. O controle de cura por exames 
de fezes deve ser feito após três meses da administração da 
droga devendo-se considerar a possibilidade de reinfecções. 
Para levantamentos epidemiológicos, recomenda-se a 
técnica quantitativa de Kato-Katz. Apesar da grande varia- 
ção diária no número de ovos eliminados por paciente, 
quando se trabalha com população, a média reflete com bas- 
tante precisão a carga parasitária da comunidade. Por outro 
lado, a quantificação desta carga parasitária é indispensável 
para se ter elementos para avaliar a eficácia de medidas 
Biópsia ou Raspagem da Mucosa Reta] 
Constitui um método que depende de pessoal treinado 
e resulta em inegável desconforto para o paciente. A prin- 
cipal vantagem da técnica é a maior sensibilidade e a verifi- 
cação mais rápida do efeito da quimioterapia. Como se sabe, 
os ovos depositados nos tecidos levam cerca de seis dias 
para formar o miracídio e, se uma semana depois do trata- 
mento forem encontrados só ovos maduros, pode-se infe- 
rir que as fêmeas não estão realizando postura. Este resul- 
tado não significa necessariamente cura, pois as fêmeas po- 
dem não ter sido mortas, mas somente cessado temporaria- 
mente a postura de ovos. Assim, a interpretação do resul- 
tado deve ter em conta esta ressalva. 
A biópsia hepática, para o diagnóstico exclusivo da 
esquistossomose, não pode jamais ser recomendada. Só se 
justifica procurar ovos em tecido hepático quando existem 
suspeitas de outras etiologias que demandem biópsia hepá- 
tica; neste caso, um pequeno fragmento poderia ser envia- 
do para o exame parasitológico. 
Ultra-sonografia 
Constitui-se em um dos mais importantes avanços para 
o diagnóstico clínico, principalmente na fase crônica da 
doença, e está se tomando de uso corrente no nosso país. 
E uma técnica que diagnostica as alterações hepáticas de- 
terminando com precisão o grau de fibrose. Ainda assim, 
quando a fibrose é pouco extensa pode ser confundida com 
outras etiologias (hepatitie, salmoneloses, tuberculose). 
MÉTODOS IMUNOL~GICOS OU 
INDIRETOS 
As técnicas imunológicas medem a resposta do organis- 
mo do hospedeiro (reações alérgicas, produção de anticor- 
pos etc.) frente a antígenos do parasito. Estas técnicas não 
permitem a certeza absoluta do parasitismo, a exemplo do 
encontro de ovos na biópsia ou no exame de fezes, pois 
ocorrem reações cruzadas dando resultados falso-positivos. 
Do mesmo modo, os resultados negativos não permitem a 
certeza da ausência do parasitismo, já que ocorrem também 
reações falso-negativas. 
Diversas técnicas foram descritas para o diagnóstico 
imunológico da esquistossomose. Entretanto, algumas des- 
tas, pela dificuldade de execução, baixa sensibilidade etc., só 
são utilizadas eventualmente, em algum trabalho de pesqui- 
sa. Dentre estas, podemos citar a reação pericercariana, a 
reação periovular ou circum-ovular, reação de imobilização 
do miracídio e o teste de aglutinação cercariana. 
As técnicas com perspectivas de uso em diagnóstico in- 
dividual ou de população são: 
É um teste alérgico (hipersensibilidade tipo I) que se ba- 
seia na medida da pápula formada 15 minutos após a inocu- 
lação intradérmica de 0,05ml de antígeno (40pg nitrogênio 
protéicolml) de verme adulto. A reação é positiva quando a 
pápula formada atinge a área de 1 ,Ocm em crianças e 1,2cm 
em adultos. A reação apresenta uma sensibilidade de 95% 
em maiores de 20 anos do sexo masculino e cerca de 65% em 
mulheres e jovens. A especificidade da reação, de maneira 
geral, pode ser considerada boa (2,1% de falso-positivo em 
homens maiores de 20 anos do sexo masculino e 1,9% em 
mulheres e jovens). Em algumas áreas com alta incidência de 
dermatites por outros tipos de cercaria, esta incidência de 
falso-positivo pode aumentar para até 10%. A reação não se 
toma negativa após uma quimioterapia eficaz, portanto, não 
serve como critério de cura. A indicação da aplicação des- 
ta técnica para casos individuais só se justifica para escla- 
recer casos em que a anarnnese reforça a suspeita de infec- 
ção e que os vários exames de fezes deram resultados ne- 
gativos. Um teste positivo individual justificaria a recomen- 
dacão de novos exames de fezes. 
A aplicação mais evidente do teste seria em inquéritos 
epidemiológicos pois, sabendo-se das limitações da técni- 
ca frente a variáveis com sexo, idade, tratamento anterior 
etc., poder-se-ia estimar com bastante precisão a prevalên- 
cia da endemia em determinada área. A rapidez da leitura (1 5 
minutos) e a simplicidade de execução da técnica permitem 
que uma equipe reduzida de pessoal treinado realize o tes- 
te, em espaços de poucas horas, em centenas de indivíduos. 
O custo por teste também é reduzido. A intradermorreação 
em inquéritos epidemiológicos deve se associar ao exame de 
fezes quantitativo, que é a técnica que mede a carga para- 
sitária da população. 
A sensibilidade da reação é de 90% em casos com exa- 
mes de fezes positivos. A especificidade é muito boa, me- 
nos de 1% de falso-positivos. A técnica não serve como 
controle de cura. É uma técnica que já foi muito utilizada em 
estudos epidemiológicos e, hoje em dia, devido a complexi- 
dade do método, está sendo pouco utilizada. 
A sensibilidade varia de 7 1% a 93% e a especificidade, 
88%. É uma técnica pouco utilizada devido a problemas 
logísticos (obtenção e conservação das hemácias marca- 
das etc.). 
Esta técnica, na verdade, não leva nenhuma vantagem 
frente as citadas quanto a sensibilidade e a especificidade. 
Além disso, dependede equipamento sofisticado, con- 
dições especiais para manuseio de substâncias radioativas, 
como também é difícil e cara a obtenção de radioisótopos. 
O teste apresenta uma sensibilidade semelhante a do tes- 
te de fixação do complemento, embora a especificidade seja 
inferior. A cura por quimioterapia não leva a negativação da 
reação e o teste começa a dar resultados positivos entre 
quatro e sete semanas após contato com cercárias. Com exe- 
cução complicada e leitura demorada, esta técnica não apre- 
senta vantagens para ser empregada rotineiramente. 
MÉTODO IM~OENZIMÁTICO OU ELISA 
Este método se constitui hoje em dia em um dos me- 
lhores instrumentos para o diagnóstico das doenças infec- 
ciosas e parasitárias. 
Vários trabalhos foram publicados nos quais se utiliza- 
ram vários tipos de antígenos. O excelente trabalho de Mott 
& Dixon (1982), com amostragem de diversos países, mos- 
tra que a técnica imunoenzimática é igual ou superior a to- 
das as outras técnicas sorológicas até então descritas quan- 
to a sensibilidade e especificidade. Além disso, o uso do 
antígeno do verme adulto é mais econômico com relação a 
rendimento e facilidade de obtenção e não apresenta que- 
das significativas na sensibilidade e especificidade quando 
se compara com outros antígenos mais complexos de se ob- 
ter e com rendimento menor. Esta técnica tem a grande van- 
tagem de se usar quantidades ínfimas de soro e antígenos 
(microgramas). Um técnico bem treinado pode executar mais 
de 500 reações em um único dia. Depois do advento da téc- 
nica de ELISA, os outros testes sorológicos podem ser con- 
siderados obsoletos. Estudos em camundongos e macacos 
Cebus, seguramente curados por quimioterapia, os títulos 
de anticorpos relativos a diversos antígenos decrescem sig- 
nificativamente e o teste se toma negativo em tomo do quar- 
to mês após tratamento. 
As técnicas desenvolvidas para detecção de antígenos 
circulantes poderiam, em princípio, ser consideradas como 
verdadeiros métodos diretos, pois detectam matéria-prima 
parasitária, Entretanto, como o resultado é medido por de- 
senvolvimento de coloração nas placas de ELISA, e não 
pela visualização do ovo do parasito, permanece a dúvida 
da posição real desta técnica, se direta ou indireta. Nesta 
técnica se utiliza um anticorpo monoclonal fixado as pare- 
des das cubas da placa de ELISA, que se ligará aos deter- 
minantes antigênicos do chamado antígeno catódico cir- 
culante ou anódico (CCAICAA), provenientes do soro ou 
urina de pacientes infectados. Estes antígenos circulantes 
são proteoglicanos provenientes do tubo digestivo do 
verme e apresentam. notável estabilidade estrutural, pois 
foi possível ser detectado em eluatos de tecidos de múmi- 
as egípcias com milhares de anos. Outra grande vantagem, 
além da estabilidade, é o rápido desaparecimento (em tor- 
no de 10 dias) deste antígeno do sangue circulante, após 
a cura por drogas. 
Atualmente, a técnica do PCR tem mostrado resultados 
promissores podendo, após alguns aperfeiçoamentos liga- 
dos a descoberta de novos iniciadores (primers), ser usada 
principalmente nos casos de controle de cura após quimio- 
terapia e em infecções com baixas cargas parasitárias. O 
206 Capitulo 22 
custo desta técnica e a complexidade da mesma ainda são 
fatores limitantes para seu uso generalizado. 
EPIDEMIOLOGIA 
A esquistossomose é doença que interage com popula- 
ções humanas há milhares de anos. Foram encontradas em 
múmias egípcias da XX dinastia (> 3.000 anos de idade), le- 
sões típicas da doença como também antígenos do parasi- 
to detectados por anticorpos monoclonais em eluato de te- 
cido. Sendo o homem o principal hospedeiro vertebrado 
para manutenção do S. mansoni na natureza, é permitido 
supor que esta relação homernís. mansoni se situe em tem- 
pos ainda mais remotos. 
A introdução do S. mansoni no Brasil foi decorrência da 
importação de escravos afhcanos que traziam consigo o para- 
sito. A presença de hospedeiros intermediários suscetíveis 
(Biomphalaria) permitiu a instalação desta espécie no território 
brasileiro. Certamente o Schistosoma haematobium foi também 
introduzido nesta ocasião com os escravos africanos, como 
também, posteriormente, o S. japonicum com imigrantes asiá- 
ticos, mas a ausência de moluscos suscetíveis não permitiu a 
instalação de focos de transmissão destas duas espécies (S. 
japonicum - caramujos do gênero Oncomelania e S. 
haematobium - caramujos do gênero Bulinus). Os focos pri- 
mitivos da doença se instalaram na região canavieira do Nordes- 
te e, com os movimentos migratórios que ocorreram em vários 
momentos da história econômica do país (ciclo do ouro e dia- 
mantes, ciclo da borracha, ciclo do café, industrialização etc.), 
a doença se expandiu para outras regiões (Fig. 22.10). 
Sobrevida do S. mansoni no Homem 
A sobrevida do S. mansoni no homem pode ser longa, 
já que imigrantes oriundos de áreas endêmicas que se ins- 
taram há 33 anos na Austrália, área sem transmissão, e ja- 
mais abandonaram o país desde então, continuavam a elimi- 
nar ovos viáveis pelas fezes. 
Distribuição Geográfica 
As Figs. 22.1 I (distribuição da doença) e 22.12 (dis- 
tribuição dos caramujos transmissores) mostram uma es- 
treita relação entre a presença de áreas de média e alta en- 
demicidade e a presença de Biomphalaria glabrata. Pode- 
mos afirmar que, onde ocorre esta espécie, temos transmis- 
são da esquistossomose mansoni. A presença de B. 
glabrata é responsável pela área contínua de transmissão 
que ocorre desde o Rio Grande do Norte até Minas Gerais. 
A espécie Biomphalaria straminea é a única que transmi- 
te a doença no Ceará, como também nas zonas do agreste 
nordestino e em focos isolados no Pará (Fordlândia, já ex- 
tinto, e Belém) e Goiás (Goiânia). Entretanto, é a espécie com 
a distribuição geográfica mais ampla. A Biomphalaria 
tenogophila constitui o caramujo transmissor em algumas 
regiões do Estado do Rio de Janeiro, em São Paulo (no Vale 
do Paraíba), Santa Catarina e, em Minas Gerais, em focos iso- 
lados nas cidades de Ouro Branco, Jaboticatubas, Itajubá, 
Paracatu e Belo Horizonte. Também apresenta ampla dis- 
tribuição geográfica, partindo do Espírito Santo até o Rio 
Grande do Sul. 
FATORES LIGADOS A PRESENÇA E 
EXPANSÃO DA ESQUISTOSSOMOSE 
O clima de país tropical permite, na maioria dos estados 
brasileiros, as condições necessárias para a transmissão da 
doença. Assim, existe uma incrível variedade de hábitats 
aquáticos, que funcionam como criadouros de moluscos; as 
altas temperaturas e luminosidade intensa estimulam a mul- 
tiplicação de microalgas, que são o alimento dos moluscos. 
Por outro lado, a eclosão do miracídio, penetração deste no 
molusco, evolução das formas parasitárias no caramujo, 
emergência e penetração de cercárias são também fortemen- 
te dependentes dessas duas variáveis (temperatura e 
luminosidade). 
A condição fundamental para o estabelecimento de um 
foco de transmissão seria a contaminação do criadouro de 
caramujos suscetíveis com fezes contendo ovos viáveis. O 
Vida parasitária 
I w 
Fonte de infecção 
Via de eliminação Porta de entrada I 
Fig. 22.10 - Esquema da cadeia epidemiolbgica do Schistosoma mansoni (segundo Barbosa, F.S. in Cunha, A.S., Esquistossomose mansoni, 1970) 
Capitulo 22 207 
Area de 
I Amazonas I Pará 
h 
R. Grande 
/" / / i /i ~ k i b a 
média e alta endemicidade 
- 
:mJ~pirito Sanb 
Í''Rio de Janeiro 
do Norte 
Area de baixa endemicidade Santa Catarina 
Focos isolados 
Grande. Escala 
0 Area não-pesquisada, ou onde não há transmissão w 
O 200 400 600 800 
Fonte: Paraense, 1986. V 
k m 
Fig. 22.1 1 - Area de endemicidade da esquistossomose - Brasil (1999). 
hospedeiro definitivo, que tem real importância na epidernio- 
logia, é o humano. Roedores, marsupiais, carnívoros, 
primatas e, recentemente, bovinos, foram encontrados com 
infecção natural. Algumas espécies de roedores (Nectomys 
squamipes e Holochilus brasiliensis) e bovinos (bezerros 
girolandos)foram capazes, em condições seminaturais, de 
manter o ciclo. Entretanto, não se tem notícia de encontro 
de foco de transmissão no Brasil onde não exista primaria- 
mente uma contaminação dos criadouros de caramujos com 
dejetos humanos. 
Desta maneira, fica claro que o problema central da pre- 
sença de focos de transmissão se relaciona com a contami- 
nação fecal humana das coleções aquáticas. Existe ainda 
uma prática generalizada de se construir esgotos domésticos 
que desembocam diretamente nos criadouros, o que favo- 
rece sobremaneira a infecção dos caramujos. Por outro lado, 
uma certa poluição orgânica favorece a multiplicação do 
fitoplâncton, alimento dos moluscos, o que leva a uma acen- 
tuada proliferação dos caramujos. A propósito, ambientes 
naturais bem preservados apresentam baixíssimas taxas de 
densidade populacional de B. glabrata. 
As chuvas apresentam efeitos variáveis, conforme a área 
e a espécie de caramujos em questão. Assim, nas áreas das 
secas do Nordeste, as chuvas ocasionam o aparecimento de 
inúmeros criadouros e observa-se um aumento da transmis- 
são (B. straminea) no período chuvoso e logo após este 
período. Entretanto, em áreas endêmicas sujeitas a regime de 
chuvas copiosas, os caramujos são muitas vezes arrastados 
pela enxurrada, ficando com populações pouco densas nos 
criadouros. Nessas condições, a transmissão pode declinar 
neste período. Cabe ainda alertar que este período chuvo- 
so pode, por outro lado, propiciar a dispersão dos caramujos 
pelas enchentes e a formação de novos criadouros tempo- 
rários, e, deste modo, provocar um aumento da população 
planorbídica logo após a diminuição da intensidade das chu- 
vas (Capítulo 58 - Exame de Vetores). 
Outro aspecto importante ligado as condições ambien- 
tais se relaciona com a capacidade dos caramujos de entra- 
rem em anidrobiose (estivação e sobreviverem por meses no 
barro úmido dos criadouros secos (ver Capítulo 23 - 
Moluscos). 
A existência de clima apropriado para a transmissão e as 
condições socioeconômicas precárias (saneamento básico, 
educação sanitária etc.) permitem a manutenção da endemia 
nas áreas onde foi implantada e, com exceção do foco de 
Fordlândia, Pará, não se tem notificação de extinção de ou- 
tros focos importantes de transmissão no país. 
A expansão geográfica da doença é um fato preocupan- 
te, pois se considerarmos que no estado com melhores 
condições socioeconômicas do Brasil - o Estado de São 
Paulo - verificou-se nestas últimas décadas um aumento 
alarmante do número de focos de transmissão, imagine-se o 
que deve estar ocorrendo em outros estados com situações 
sanitárias piores. A transmissão no Estado de São Paulo e 
mantida por B. tenagophila nos vales dos rios Paraíba e 
Tietê. Na bacia do Paranapanema, na fronteira com o Estado 
do Paraná, a transmissão se processa por intermédio da B. 
glabrata. Esta espécie também encontrada infectada no vale 
do Rio dos Sinos, próximo a Porto Alegre (RS), provavelmen- 
te foi introduzida recentemente. 
Os fatores mais importantes relacionados com o proble- 
ma da expansão da doença são migrações internas, presen- 
ça de caramujos potencialmente transmissores, ausência de 
inh-estrutura sanitária adequada na maioria do temtório na- 
cional, educação sanitária precária ou inexistente e dis- 
seminação de espécies de Biomphalaria suscetíveis. 
Esta população menos favorecida é a que tende a migrar 
a procura de melhores condições de vida, seja para a peri- 
feria de centros urbanos, onde a manutenção dos mesmos 
costumes sanitários (fossas desembocando nos córregos 
etc.) vai favorecer a implantação de novos focos de 
transmissão, seja para colonizar novas fronteiras agrícolas 
ou atividades de garimpo etc. Linhagens de S. mansoni 
desses pacientes poderão se adaptar aos caramujos locais; 
por outro lado, estas mesmas populações migrantes pode- 
rão levar consigo os caramujos suscetíveis das regiões de 
origem (através de plantas aquáticas ornamentais, aquári- 
os, barcos etc.). 
Os caramujos transmissores podem ainda ser dis- 
seminados por diversas maneiras, como projetos de pisci- 
cultura e "pesque-e-pague" (com os caramujos ou desovas 
vindo com as alevinos para os piscicultores ou com os pei- 
xes adultos para locais onde se explora o sistema "pesque- 
e-pague"), e também por atividades de aquariofilia, comér- 
cio de plantas aquáticas etc. Finalmente, vale acrescentar 
que já foram encontradas desovas de Biomphalaria na par- 
te inferior das patas de aves migratórias, principalmente 
anseriformes (patos, marrecos etc.). 
IIIIIIIIIII Biomphalaria glabrafa 
pA B. sframinea 
- 
E B. fenagophila 
Fig. 22.12 - Distribuição geográfica das três espécies de Biomphalaria, com importância epidemiológica na esquisfossomose. Conforme Paraense, L. 1990. 
Elaborado especialmente para este livro. 
Capitulo 22 209

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