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UNIVERSIDADE FEDERAL DA PARAÍBA – SANTA RITA CENTRO DE CIÊNCIAS JURÍDICAS – CCJ DEPARTAMENTO DE CIÊNCIAS JURÍDICAS – DCJ CURSO DE DIREITO DISCIPLINA: Direito Administrativo I PROFESSOR: Rodrigo Portela Gomes Aluna: Laryssa Sherydha Marinho Almeida Gomes 1ª AVALIAÇÃO A iniciativa dos estudantes da UFPB em criar uma empresa de tecnologia para conectar catadores de materiais recicláveis com a população, especialmente nas periferias não atendidas pela coleta pública de lixo, exibe aspectos importantes que demandam uma análise cuidadosa à luz do regime jurídico aplicável à administração pública. Preliminarmente, é fundamental adotar uma abordagem baseada nos princípios da administração pública, que irão não apenas fundamentar a legalidade das ações, mas também assegurar que a iniciativa promova igualdade, ética, transparência e efetividade. Além disso, a legitimidade do empreendimento deve ser examinada minuciosamente, considerando diversas perspectivas, a fim de garantir sua conformidade integral com as normas éticas e legais que regem as atividades ligadas à administração pública. Em primeiro lugar, a atuação da empresa para suprir uma lacuna na prestação de serviços públicos de coleta de lixo em áreas não atendidas pela coleta pública é um aspecto positivo. A Constituição Federal, em seu artigo 23, inciso VI, atribui competência comum aos entes federativos para cuidar do meio ambiente, o que inclui a gestão de resíduos sólidos. Assim, a iniciativa de conectar catadores de materiais recicláveis com a população pode ser vista como uma forma de colaboração para o cumprimento desse dever constitucional, respeitando os princípios administrativos da eficiência e da moralidade. Outrossim, a intenção de potencializar a economia solidária, beneficiando mais de 300 trabalhadoras cadastradas em associações, reforça o impacto positivo no tecido social, fomentando a igualdade de oportunidades e a valorização da diversidade de gênero. A promoção da inclusão social e econômica está em consonância com os princípios da dignidade da pessoa humana (artigo 1º, inciso III, da Constituição Federal/1988) e da busca pelo desenvolvimento nacional (artigo 3º, inciso II, da Constituição Federal/1988). Ainda assim, é indispensável analisar a conformidade do empreendimento com a legislação vigente e com os princípios da administração pública (artigo 37, caput, da Constituição Federal/1988), uma vez que, mesmo sendo uma iniciativa privada, está atuando em uma área sensível que tem impacto direto no interesse público. A criação de uma empresa de tecnologia para esse fim deve observar as normas aplicáveis para o estabelecimento e o funcionamento de empresas, além das regulamentações específicas para o setor de tecnologia e resíduos sólidos, como por exemplo, a NBR 10004 da Associação Brasileira de Normas Técnicas (ABNT) que “classifica os resíduos sólidos quanto aos seus riscos potenciais ao meio ambiente e à saúde pública, para que possam ser gerenciados adequadamente” (ABNT NBR n° 10004 de 2004 – Suape). Assim, os procedimentos necessários para regular a atuação desta empresa envolvem diversas etapas. Primordialmente, é fundamental que a empresa esteja devidamente constituída e regularizada perante os órgãos competentes, como a Junta Comercial e a Receita Federal, conforme as normas aplicáveis às empresas em geral. A formalização da empresa perante os órgãos competentes não apenas confere legitimidade ao seu funcionamento, mas também estabelece parâmetros claros para sua atuação no mercado, garantindo segurança jurídica tanto para a empresa quanto para seus clientes e fornecedores. Além disso, considerando a natureza do negócio, a empresa deve observar as regulamentações específicas para o setor de resíduos sólidos. Isso inclui a obtenção de licenças ambientais, autorizações de órgãos competentes e o cumprimento de normas técnicas relacionadas à coleta, transporte, armazenamento e destinação final de resíduos. Nesse sentido, Coelho (2022), destaca no capítulo 21 da obra “Introdução à Responsabilidade Civil” a importância da responsabilidade ambiental das empresas e das obrigações de mitigação de danos ambientais, reforçando a necessidade de conformidade com tais normas para garantir a sustentabilidade e moralidade das atividades empresariais. No âmbito tributário, a empresa deve cumprir com suas obrigações fiscais, tais como o pagamento de impostos e contribuições, de acordo com a legislação aplicável. Além disso, a empresa deve estabelecer políticas internas que garantam a observância dos princípios constitucionais e legais, bem como mecanismos de controle e transparência em suas operações, de modo a assegurar a efetividade de sua atuação e evitar desvios de conduta. Apesar dos aspectos positivos da iniciativa, também é importante considerar os eventuais riscos que o negócio jurídico pode produzir ao interesse público. Um dos principais riscos está relacionado à possível precarização das condições de trabalho dos catadores de materiais recicláveis. Embora a intenção seja potencializar a economia solidária e beneficiar esses trabalhadores, é necessário garantir que eles sejam adequadamente remunerados e que suas condições de trabalho sejam dignas. Outro risco é a falta de controle e fiscalização adequados sobre as atividades da empresa. Sem um monitoramento efetivo, há o risco de que práticas prejudiciais ao meio ambiente e à saúde pública possam ocorrer, como o descarte inadequado de resíduos ou a poluição ambiental. Nesse contexto, a jurisprudência do STF, como demonstrado no Recurso Extraordinário nº 732.686, é um ótimo exemplo da importância do papel do Estado na regulação e fiscalização das atividades empresariais para garantir a proteção ambiental e a saúde da população e do princípio da supremacia do interesse público sobre o interesse privado na administração pública. Além disso, a falta de transparência nas operações da empresa pode gerar desconfiança por parte da população e das autoridades, comprometendo a legitimidade e a sustentabilidade do negócio a longo prazo. Portanto, é essencial que a empresa e os órgãos competentes atuem de forma colaborativa para mitigar esses riscos, por meio da implementação de mecanismos de controle, fiscalização e transparência, garantindo assim que a iniciativa contribua efetivamente para o interesse público e para o desenvolvimento sustentável da região. Por fim, a iniciativa dos estudantes da UFPB em criar uma empresa de tecnologia para conectar catadores de materiais recicláveis com a população é louvável, pois visa suprir uma lacuna na prestação de serviços públicos e promover a inclusão social e econômica. No entanto, para garantir sua legitimidade e sustentabilidade a longo prazo, é crucial que a empresa atue em conformidade com a legislação vigente, respeitando os princípios da administração pública e implementando medidas efetivas de controle, fiscalização e transparência. Somente através da colaboração entre a empresa, os órgãos competentes e a sociedade, será possível mitigar os riscos associados e assegurar que essa iniciativa contribua efetivamente para o interesse público e para o desenvolvimento sustentável da região. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS ABNT NBR n° 10004 de 2004. SUAPE. Disponível em: https://analiticaqmcresiduos.paginas.ufsc.br/files/2014/07/Nbr-10004-2004- Classificacao-De-Residuos-Solidos.pdf. Acesso em: 28 fev. 2024. BRASIL. Constituição da República Federativa do Brasil de 1988. Brasília, DF: Senado Federal, 1988. Disponível em: https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/constituicao.htm. Acesso em: 24 fev. 2024. BRASIL. Supremo Tribunal Federal. Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental nº 559. Relator: Min. Roberto Barroso. Julgamento em 13 de junho de 2022. Publicado no Diário da Justiça Eletrônico em23 de junho de 2022. Disponível em: https://portal.stf.jus.br/constituicao- supremo/artigo.asp?abrirBase=CF&abrirArtigo=37. Acesso em: 24 fev. 2024. BRASIL. Supremo Tribunal Federal. Recurso Extraordinário nº 732.686. Brasília, DF, 2022. Disponível em: https://redir.stf.jus.br/paginadorpub/paginador.jsp?docTP=TP&docID=767097935. Acesso em: 24 fev. 2024. COELHO, Fábio. Capítulo 21, Introdução à Responsabilidade Civil. In: COELHO, Fábio. Direito Civil. São Paulo (SP): Editora Revista dos Tribunais. 2022. Disponível em: https://www.jusbrasil.com.br/doutrina/secao/capitulo-21-introducao-a- responsabilidade-civil-terceira-parte-civil-responsabilidade-direito-civil/1540361429. Acesso em: 24 fev. 2024.
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