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O Batismo de Crianças e a Doutrina Bíblica do Batismo por Oscar Cullmann Clique aqui para baixar a fonte grega usada neste artigo. Em que medida Jesus instituiu o batismo cristão? Não basta para responder a esta pergunta, remeter a Mt. 28.19, pois esta frase do ressuscitado não faz mais que dar a ordem de batizar, sem explicar qual é o vínculo interior entre o batismo, a pessoa e a obra de Cristo. Por outro lado, o judaísmo não ignorava a prática do batismo, já que submetia os prosélitos pagãos a ele. João Batista, pondo os judeus na mesma altura dos prosélitos, chamava-os ao batismo de arrependimento, por causa da vinda iminente do messias. O próprio ato de batizar não foi, pois, instituído por Jesus. Sob este aspecto, o batismo se distingue do outro sacramento cristão, a eucaristia, cuja forma particular se remonta a Cristo. Porém o vínculo entre Cristo e o batismo parece mais tênue, todavia, se se leva em conta que Jesus não batizou, pelo menos durante seu ministério público[1]. A situação é a seguinte: João Batista batizou, relacionando seu batismo com o dos prosélitos; Jesus não batizou, porém depois de sua morte, a Igreja primitiva reconheceu a prática do batismo. Foi simplesmente uma volta ao batismo de João? Ou antes, não se deve distinguir o batismo conferido pelos apóstolos em nome de Jesus, do batismo de João, que, todavia, foi celebrado já com vistas ao perdão dos pecados? Se isto é certo, que há então de novo no batismo da Igreja nascente, e em que medida se remonta este a Jesus, que todavia não o praticou nem o "instituiu" sob sua forma exterior? 1. O fundamento do batismo: a morte e ressurreição de Jesus Cristo. João Batista, em sua pregação, teve o cuidado em definir a diferença entre seu próprio batismo e o de Cristo: "Eu vos batizo com água para a conversão... porém Ele vos batizará com o Espírito Santo e com fogo" (Mt. 3.11; Lc. 3.16). O fogo faz sem dúvida alusão ao juízo final, o batismo que vem com Cristo não é somente um batismo de preparação, provisório, mas antes definitivo, e fará o batizado entrar diretamente no reino de Deus. Porém no intervalo no qual o cristianismo primitivo tem consciência de encontrar-se, entre a ressurreição de Cristo e seu retomo, o que há de essencial no batismo conferido pelo Messias é o dom do Espírito Santo, dádiva escatológica que se realiza a partir de agora (aparcnjjj, arrsabwjn). Isso explica porque Marcos pode limitar-se a mencionar o batismo do Espírito (1.8).Segundo a pregação de João Batista, o dom do Espírito Santo constitui então o elemento novo no batismo cristão; com efeito, nem o batismo judeu dos prosélitos, nem seu próprio batismo conferiam o Espírito. Este dom está ligado à pessoa e a obra de Cristo. Pois bem, como a efusão do Espírito Santo sobre "toda carne" (At. 2.17) pressupõe, no desenrolar da história da salvação, a morte e a ressurreição de Cristo, e como esta efusão teve lugar no pentecostes, o batismo cristão Page 1 of 31O Batismo de Crianças e a Doutrina Bíblica do Batismo 22/3/2008http://www.monergismo.com/textos/batismo/batismo_cullmann.htm http://www.monergismo.com/textos/batismo/batismo_cullmann.htm não é possível senão depois deste acontecimento, que fez da Igreja o lugar do Espírito Santo. Por esta razão o livro de Atos menciona os primeiros batismos cristãos somente depois da história de pentecostes. Igualmente Pedro, depois de ter explicado o milagre da efusão do Espírito, termina seu discurso com esta exortação: "Convertei-vos e cada um de vós seja batizado em nome de Jesus" (2.38). Isto é, que, o que foi passado de maneira coletiva no dia de pentecostes, vai repetir-se no que se sucede individualmente no sacramento do dom do Espírito.Porém, por que este dom do Espírito se apresenta então na Igreja sob a forma de um batismo? Por que fica ligado ao banho de imersão "para o arrependimento", que os judeus praticavam com os prosélitos e que João Batista havia reconhecido? Que relação há entre o Espírito Santo e a água, a ablução pela água ou a imersão na água? Compreende-se, com efeito, que o batismo dos prosélitos ou o de João se apresentam como um ato de ablução, posto que o efeito deste sacramento é o perdão dos pecados. Como a água comumente purifica fisicamente o corpo, assim a água do batismo deve tirar os pecados da alma. Surpreende-nos que a realização plena do batismo de João no batismo do Espírito do Messias, deva, todavia, tomar a forma de um banho por imersão. Seria de esperar antes que o sacramento cristão revestisse uma forma exterior diferente. Porém é necessário perguntar-se se o batismo de João, com sua significação precisa (Lc. 3.3: bajptsma metanoiaijav eiv ajfesin ajmartiwn), foi considerado como verdadeiramente prescrito depois da aparição do novo sacramento cristão que confere o Espírito Santo. É necessário perguntarmos se o Espírito Santo não teria nada a ver com o perdão dos pecados. Pois bem, no livro de Atos se diz: "Que cada um de vós seja batizado em nome de Jesus, para obter a remissão dos pecados e recebereis o dom do Espírito Santo" (2.38). Os cristãos têm todavia necessidade, também na Igreja, do perdão dos pecados; não é suficiente que o dom do Espírito lhes seja concedido. O batismo para a remissão dos pecados não é por tanto abolido. Seria inconcebível, por demais para os cristãos, só o dom do Espírito Santo sem a remissão dos pecados. Por isso o sacramento cristão, preparado e anunciado pelo batismo de João, se estabeleceu em um batismo, um banho por imersão, ainda que o dom sacramental do Espírito Santo não tenha, à primeira vista, nenhuma relação com a forma deste ato. Todavia, o vínculo que, no batismo cristão une o perdão dos pecados e o dom do Espírito é real. Não se pode dizer que à imersão para o perdão vem ajuntar-se simplesmente um elemento novo: o dom do Espírito. O elemento novo, em relação ao batismo judeu, não diz respeito somente ao dom do Espírito, senão também, em relação estreita com este dom, ao perdão dos pecados. Segundo o livro de Atos, a Igreja sentiu, num determinado momento, a necessidade de ajuntar ao ato exterior da imersão, um ato especial correspondente à transmissão do Espírito Santo: a imposição das mãos. Pois parecia normal que às duas significações do batismo correspondessem igualmente dois atos exteriores: o banho por imersão para o perdão dos pecados e a imposição das mãos paro o dom do Espírito. Sem dúvida, isto faria o batismo correr o perigo de perder sua unidade e de cindir-se em dois sacramentos distintos. Se a Igreja pôde finalmente evitar esta cisão, é porque a ligação entre os efeitos do batismo cristão era fortemente sentida. A narração que Atos faz de certos batismos prova, não obstante, que tal cisão foi quase estabelecida no uso da Igreja. Releia-se a narração de Felipe em Samaria! Quando os samaritanos "creram na pregação de Felipe que lhes anunciava o reino de Page 2 of 31O Batismo de Crianças e a Doutrina Bíblica do Batismo 22/3/2008http://www.monergismo.com/textos/batismo/batismo_cullmann.htm http://www.monergismo.com/textos/batismo/batismo_cullmann.htm Deus e o nome de Jesus Cristo, foram batizados homens e mulheres" (8.12). Nos versículos 14 s., se refere que os apóstolos de Jerusalém, tendo recebido esta noticia, enviaram a Samaria Pedro e João para que orassem, a fim de que os que tivessem sido batizados com água recebessem também o Espírito, "pois este não havia, todavia, descido sobre nenhum deles. Haviam sido batizados somente em nome do Senhor Jesus. Então Pedro e João lhes impuseram as mãos e receberam o Espírito Santo". O batismo com água para a remissão dos pecados e a imposição das mãos para a comunicação do Espírito, estão aqui separados no tempo e administrado por pessoas diferentes.Em Atos 10.44, encontra-se um fato análogo, com a diferença de que a ordem cronológica é inversa. A Cornélio e aos seus, tendo recebido o Espírito Santo (sem imposição das mãos), Pedro os batizou com água.É necessário mencionar finalmente Atos 19.1- 7: Paulo pergunta aos discípulos de Éfeso se tinham recebido o Espírito Santo quando creram. "Estes responderam: nem sequer ouvimos que exista o Espírito Santo. Ele perguntou de novo: que batismo tendes recebido? Responderam: o batismo de João". São, então, batizados com água em nome do Senhor Jesus, e "depois que Paulo lhes impôs as mãos, o Espírito Santo desceu sobre eles e se puseram a falar em línguas e a profetizar". Deste modo se acentuava o perigo de ver, na primeira conseqüência do batismo, somente uma sobrevivência de tempos passados, sem ligação interna com o dom do Espírito prometido por Cristo. É pois, muito possível que quando João recorda que não se nasce só pela água, senão pela água e pelo Espírito (3.3-5), quis reagir contra esta cisão do batismo cristão em dois atos diferentes[2]. Ademais, os textos judaico- cristãos citados nas Pseudo-Clementinas provam que no começo do século II, existia efetivamente uma seita judaica cristã para a qual o batismo havia descido ao nível de um rito judaico.O problema das relações entre a água do batismo e o sacramento do Espírito preocupou, durante muito tempo, à Igreja antiga[3]. Tertuliano, por exemplo, em seu tratado sobre o batismo[4], trata de resolver o problema estabelecendo uma relação essencial entre o Espírito e a água. Remete-nos para isto a Gn 1.1 s., onde se diz que no princípio "o Espírito de Deus se movia sobre a face das águas". Estima que desde sempre o Espírito esteve ligado com a água e, por conseguinte, o próprio batismo do Espírito não pode prescindir da água.Esta solução não pôde, todavia, sustentar-se para definir adequadamente a relação entre o perdão dos pecados, o dom do Espírito e o batismo pela água. A explicação deve ser buscada, como veremos mais abaixo, no próprio batismo de Jesus, interpretado teologicamente por Paulo no capítulo 6 de sua Epístola aos Romanos. Veremos também, que não se pode considerar o batismo cristão, entendido também como batismo para a remissão dos pecados, como uma simples repetição de João. É, pelo contrário, seu cumprimento, tomado possível somente pela obra expiatória de Cristo. Por demais, esta obra une estreitamente os efeitos do batismo. Isso é o que evidencia este célebre capítulo, no qual Paulo mostra que, por nosso batismo participamos na morte e na ressurreição de Cristo[5]. Cada um participa aí desse perdão dos pecados, conquistado por Jesus de uma vez por todas morrendo na cruz. O batismo de João, portanto, não é aceito sem nenhuma ressalva pela Igreja cristã, posto que, segundo Rm. 6.5, nós chegamos a ter, pelo ato batismal, "uma mesma semelhança" com Cristo, morrendo e ressuscitando com Ele. O ato externo do batismo pela água, toma assim seu sentido pelos dois efeitos do batismo cristão. Uma ligação nova é estabelecida entre o ato externo do Page 3 of 31O Batismo de Crianças e a Doutrina Bíblica do Batismo 22/3/2008http://www.monergismo.com/textos/batismo/batismo_cullmann.htm http://www.monergismo.com/textos/batismo/batismo_cullmann.htm baptjzein e o perdão dos pecados. Aquele não é, já somente o banho, a ablução que limpa, senão a imersão enquanto tal, porque nesse momento, o batizado é "sepultado com Cristo" (v. 4). Ressuscita quando sai da água [6]. Graças somente a este ato, os dois efeitos do batismo se tomam inseparáveis, posto que ser sepultado com Cristo significa o perdão dos pecados, enquanto que ressuscitar com Ele quer dizer "viver uma vida nova" (v.4), isto é, viver segundo o Espírito (Gl. 5.16). Os dois efeitos do batismo estão assim, ligados tão indissoluvelmente como a morte e a ressurreição de Cristo. O recurso da obra expiatória de Cristo, para resolver o problema do batismo cristão, engendra três conseqüências: a) o perdão dos pecados, anunciado já antes da vinda de Cristo, está agora fundado sobre a morte expiatória, b) o perdão dos pecados e o dom do Espírito se encontram unidos por um estreito laço teológico, c) as significações do batismo se encontram ligadas ao único ato exterior do banho de água, a imersão e emersão tomam sua plena significação teológica.A equação "ser batizado = morrer com Cristo" que, como veremos, tem sua origem no próprio batismo de Jesus, se encontra em todo o Novo Testamento e não somente em Rm. 6.1 s. Esta equação se encontra em primeiro plano em outra passagem paulina, em I Co. 1.33, onde o batismo é considerado sem equívoco possível como uma participação na cruz de Cristo: "Foi Paulo quem foi crucificado por vós, ou fostes batizados em nome de Paulo?" As expressões "estais batizados" e "um outro foi crucificado por vós" são aqui utilizadas como sinônimas. Esta curiosa maneira de expressar-se mostra também que, segundo o Novo Testamento, é Cristo quem atua no batismo, enquanto que o batizado é objeto passivo desta ação.Na Epístola aos Hebreus ocorre o mesmo. A impossibilidade de um segundo batismo está motivada, no capítulo 6.4 s., pelo fato de que o batismo é uma participação na cruz de Cristo:É impossível, pois, que aqueles que uma vez foram iluminados e provaram o dom celestial e se tomaram participantes do Espírito Santo, e provaram a boa palavra de Deus e os poderes do mundo vindouro, e caíram, sim, é impossível reconduzi-los ao arrependimento; pois para si mesmos estão crucificando de novo o Filho de Deus, sujeitado-O à desonra pública. (Hb. 6.4 s.) Esta passagem mostra também quão estreito é o vínculo entre o dom do Espírito Santo e a morte expiatória de Cristo. Os escritos joaninos, finalmente, fazem também alusão à relação entre a água do batismo e o sangue de Cristo[7].Porém, para compreender todo o alcance do vínculo entre o batismo e a morte de Cristo, e por conseguinte, para compreender o aspecto essencial da doutrina batismal do Novo Testamento, é necessário perguntar qual é o sentido do batismo pelo qual o pr6prio Jesus se submeteu no Jordão. Que significa para Jesus seu pr6prio batismo? Essa é uma pergunta freqüentemente delineada na Igreja primitiva, como testemunha o evangelho ap6crifo dos ebionitas e o dos hebreus. Não é de se estranhar. Pois, por que Jesus, que estava sem pecado, se batizou no batismo de João destinado aos pecadores? Mateus sentiu também a dificuldade, pois colocou no começo do seu relato a pergunta do Batista: "Sou eu quem tem necessidade ser batizado por ti, e tu vens a mim?" (3.14). Ao que Jesus responde: "Deixa por enquanto, porque assim convém cumprir toda a justiça".É o próprio relato do batismo de Jesus, tal como é referido nos três evangelhos sinópticos, quem dá a verdadeira resposta a esta pergunta. Está contida na voz que ressoa no céu: "Este é o meu filho amado em quem me comprazo" (Mc. 1.10 s.; Mt. 3.16 s.; Lc. 3.22). Se queremos deduzir a significação que teve para Jesus seu próprio Page 4 of 31O Batismo de Crianças e a Doutrina Bíblica do Batismo 22/3/2008http://www.monergismo.com/textos/batismo/batismo_cullmann.htm http://www.monergismo.com/textos/batismo/batismo_cullmann.htm batismo, como queremos compreender sua "consciência messiânica", é de uma importância capital advertir que esta voz celeste cita Is. 42.1, o começo dos cantos do servo de Yavé. Por estas palavras, com efeito, é interpretado no Antigo Testamento o servo de Deus que deve sofrer em lugar de seu povo[8]. Aqui encontramos, em última análise, a resposta à questão delineada por Mateus e mais tarde pelos evangelhos apócrifos: Qual é a significação para o pr6prio Jesus, do batismo para a remissão dos pecados? Podemos formular a resposta da maneira seguinte: no instante de seu batismo, Jesus foi investido da missão de realizar o papel de servo sofredor, que deve carregar os pecados de seu povo. Os outros judeus vão ao Jordão para serem batizados por João por causa de seus próprios pecados. Jesus, no mesmo momento em que todo o povo se fez batizar, ouve uma voz que diz: "Tu não és batizado por teu próprio pecado, senão pelo pecado de todo o povo, pois de ti profetizouIsaías: será destroçado por causa dos pecados do povo". Isto é, Jesus é batizado visando um sofrimento substitutivo, implicando sua morte, pela qual será outorgado o perdão dos pecados a todos os homens. Temos aqui porque Jesus deve solidarizar-se no batismo com todo o seu povo, ir ele também à beira do Jordão, a fim de que "toda justiça seja cumprida".Deste modo as palavras de Jesus ao Batista adquirem um sentido muito preciso. Fala-se de cumprir "toda justiça" (nÂllProcrat nãcrav õtxatoo"úvllv, Mt. 3.15) é porque seu batismo está em relação com a õtxatoo"úvll, não com a sua própria, senão com a de todo o povo. É preciso sublinhar o termonãcrav. A resposta de Jesus, que confunde tanto os exegetas, tem deste modo um sentido muito concreto: Jesus provocará um perdão geral. Se Lucas (assim como Mc) não refere esta palavra, não deixa de sublinhar menos o mesmo fato à sua maneira no versículo 21: "Como todo o povo (&nav'ta 'tôv Âaóv) se fez batizar, Jesus se batizou também". A voz celeste nos revela a razão pela qual Jesus deve atuar como os outros judeus. Diferente caso de todos aqueles que se fazem batizar por seus próprios pecados, ele é posto a parte e chamado a cumprir em favor daqueles o ministério do servo de Yavé[9].O batismo de Jesus já anuncia assim o fim, o ponto culminante de sua vida, a cruz, sobre a qual se cumprirá o que o batismo de João deveria conferir: o perdão dos pecados para todo o povo. No momento de sua crucificação, Jesus celebrará um batismo geral, conforme a missão que lhe havia sido designada, quando foi batizado no Jordão.A interpretação do batismo de Jesus que propomos, está confirmada pela significação que toma a palavra !3a7t'tíÇetv em sua boca. Temos visto que o pr6prio Jesus não batizou, e compreendemos ago- ra o porque. Para ele, "ser batizado" significa no que sucederia, "sofrer, morrer por seu povo". Não se trata so:mente de uma suposição. Com efeito, as duas únicas passagens em que Jesus utiliza o verbo !3a7t'tíÇecr8at, são apresentadas por Mc. 10.38 e Lc. 12.50. Em Mar- cos 10.38 ("podeis ser batizados com o batismo com o qual eu vou ser batizado?"), "ser batizado" significa "morrer". Sucede o mesmo em Lucas 12.50: "Tenho que receber um batismo e como me angus- tio até que seja levado a cabo!" As duas vezes é Jesus quem fala. A identificação entre o batismo e a morte concerne pois à sua pr6pria morte, e por analogia, esta maneira de falar poderá identificar-se também ao batismo cristão. Jesus não batizará a particulares, como João Batista, senão que realizará um batismo geral, de uma vez por todas, no momento de sua morte expiat6ria. Este batismo geral, realizado por Jesus, tem como essencial o ser totalmente independente da fé e da compreensão dos que se beneficiaram dele. A graça batismal que encontra aqui sua origem Page 5 of 31O Batismo de Crianças e a Doutrina Bíblica do Batismo 22/3/2008http://www.monergismo.com/textos/batismo/batismo_cullmann.htm http://www.monergismo.com/textos/batismo/batismo_cullmann.htm é, em sentido estrito, uma "graça preveniente".Nos próximos parágrafos, veremos como é preciso compreender que os discípulos, depois da morte e ressurreição de Jesus, voltaram a batizar os indivíduos com água. Veremos claramente porque a prática eclesiástica dos batismos individuais não é um retorno ao batismo de João, senão que se encontra indissoluvelmente ligada à morte de Cristo. Compreenderemos também porque o batismo é uma participação na morte e na ressurreição de Cristo, porque temos ido até às raízes da doutrina batismal do Novo Testamento, tal como foi formulada explicitamente em Rm. 6.1s. No evangelho de João (1.29-34), encontramos, de alguma maneira, um primeiro comentário do relato sin6ptico do batismo de Jesus, que confirma o que já temos visto, descobrindo no batismo de Cristo a origem do batismo cristão. O batismo de Jesus é aqui referido sob a forma de uma ~ap't\)pía, de um testemunho de João Batista em favor de Cristo, depois de seu batismo. O batismo mesmo não é narrado, porém sem dúvida se pressupõe. Este testemunho está resumido no versículo 29 com estas palavras: "Eu sou o cordeiro de Deus que tira o pecado do mundo". No versículo 33, João Batista recorda que viu descer o Espírito Santo sobre Jesus e repousar nele, conclui com o versículo 34: "Eu o tenho visto e dou testemunho de que este é o eleito de Deus". Isso é uma alusão clara à voz celeste que se fez ouvir para designar Jesus, em seu batismo, como o ebed Yahvé de Is. 42.11[10].Enquanto que, segundo os sin6pticos, s6 a voz celeste estabelece uma relação entre o batismo de Jesus e os sofrimentos substitutivos do servo de Yavé, o evangelho de João é aqui mais explícito. O Batista tira a conclusão da designação da voz celeste, especificando que Jesus "é o cordeiro de Deus que tira o pecado do mundo". Entende pois, com razão, esta designação como uma chamada dirigida a Jesus de encarregar-se da missão do servo de Yavé[11].A narração que os evangelhos fazem do batismo de Jesus, segundo a interpretação que temos dado, considerando a sua importância para a história da salvação, aclara também a relação que o Novo Testamento estabelece entre os efeitos do batismo cristão: o perdão dos pecados e ,o dom do Espírito Santo. Os sinópticos mostram, com efeito, tão bem como o evangelho de João, que o batismo cristão tem sua origem no batismo de Jesus na medida em que é um batismo do Espírito. Pois também Jesus, no momento de seu batismo com água, recebe o Espírito de maneira plena. Este dom está também relacionado com o sofrimento substitutivo do servo de Yavé. Com efeito, na segunda metade do versículo de Is. 42.1, citado pela voz celeste, se diz: "Pus o meu Espírito sobre ele (o servo), ele fará reinar a justiça no meio das nações". Assim comprovamos que a possessão do Espírito é prometida no mesmo versículo do ebed Yahvé. É pois, em virtude deste Espírito que Cristo poderá realizar seus milagres, 'seus dinameiv, e Mt. 8.14 e 12.17-22, têm razão em relacioná- los com Is. 42.1-4; 53.4.O batismo de Jesus na água do Jordão anuncia assim o coroa- mento de sua obra: sua morte e sua ressurreição. E se compreende agora porque o batismo cristão está ligado temporalmente com a mor- te e ressurreição de Cristo: isto não é possível mais que uma vez quando a obra de salvação esteja cumprida. É preciso recordar aqui os textos de Jo. 7.39, onde se diz que "o Espírito não tinha sido dado todavia porque Jesus não tinha sido glorificado" e de Jo. 16.7, onde Jesus disse a seus discípulos: "Se eu não for, o consolador não virá a vós". Para que fosse possível o batismo cristão, a participação na morte e na ressurreição de Cristo, era necessário que Jesus realizasse em primeiro lugar sobre a cruz, este batismo geral, com vistas ao qual ele mesmo havia sido batizado Page 6 of 31O Batismo de Crianças e a Doutrina Bíblica do Batismo 22/3/2008http://www.monergismo.com/textos/batismo/batismo_cullmann.htm http://www.monergismo.com/textos/batismo/batismo_cullmann.htm no Jordão. Temos manifestado, com efeito, que somente a partir de pentecostes iniciou-se o acolhimento dos cristãos na Igreja por meio do batismo. O fato de que a prática do batismo eclesiástico tenha começado somente a partir de pentecostes, depende do desenvolvimento da história da salvação. Assim, a morte expiatória e a ressurreição de Cristo, ponto central da história que concerne ao xócr~oç de maneira completa, se encontra também no centro da história do batismo. Com efeito, a partir do momento em que, em pentecostes, a Igreja passa a ser o lugar onde atua o Espírito Santo, o corpo do crucificado e ressuscitado, o batismo único, realizado na cruz, vai estender seus efeitos sobre os batismos que a Igreja celebrará. Pentecostes é portanto, no que concerne à história do batismo, a dobradiça que encadeia a realização da salvação sobre a cruz com o desdobramento ulterior dessa salvação.É necessário que vejamos agora em que relação se encontramo batismo único de Cristo e o dos membros de seu corpo. 2. O batismo, agregação ao corpo de Cristo Nos parágrafos anteriores, vimos que, segundo o Novo Testamento, todos os homens receberam fundamentalmente o batismo desde há muito tempo: no Gólgota, no dia da sexta feira santa e da páscoa. Deste modo o verdadeiro ato batismal já foi realizado, sem nossa colaboração, como também sem nossa fé. O mundo inteiro já foi batizado em virtude do ato absolutamente soberano de Deus, que em Cristo "nos amou primeiro" (1 Jo. 4.19), antes que nós O amássemos, antes que nós crêssemos. Então, por que a Igreja batiza? O batismo não se converteu em algo supérfluo, posto que Cristo já morreu e ressuscitou por cada homem, naquela data única da história que, para o crente, dá sentido e transcendência ao desenvolvimento do tempo?A maior parte dos teólogos contemporâneos coincidem em dizer que o ato batismal da Igreja primitiva se caracteriza pela relação que estabelece entre a cruz e a ressurreição por um lado, e um indivíduo por outro, que no momento deste ato, morre e ressuscita com Cristo (Rm. 6.3 S.)[12]. Suas interpretações divergem quando se trata de precisar o sentido desta relação, isto é, de estabelecer como se realiza, para o batizado, sua participação na morte e na ressurreição de Cristo. Segundo Karl Barth[13], que recorre aqui a uma expressão de Calvino, o batismo neo-testamentário confere somente um cognitio da salvação, de sorte que ele excluiria perfeitamente atribuir-lhe uma virtude realmente causativa: não é mais que um "participar" na salvação, dada àquele que é batizado[14]. Vendo no acontecimento batismal somente um cognitio, a questão ào batismo de crianças se encontra delineada e resolvida de antemão negativamente, porque seria absurdo querer "fazer participar" um recém-nascido da morte e ressurreição com Cristo. Por outro lado a fé, isto é, a única possibilidade que teria de aceitar esse "participar" e de responder a ele, estaria neste caso excluída. Por isso tem razão Barth, se parte da cognitio, em por em dúvida o caráter bíblico do batismo de crianças. Quem aprova a noção barthiana da graça batismal terá grande dificuldade em defender o batismo de crianças[15]. Todavia esta redução da virtude do batismo à cognitio salutis não nos parece estar conforme a concepção neo- testamentária. Os textos da Escritura, como vamos ver, nos convidam a dar uma definição diferente do acontecimento batismal. Advertimos em primeiro lugar que é preciso estudar o batismo de crianças, sempre como o fez Barth, a partir de uma definição teológica do batismo do Novo Testamento. Considerando as fontes de que dispomos, é inútil, Page 7 of 31O Batismo de Crianças e a Doutrina Bíblica do Batismo 22/3/2008http://www.monergismo.com/textos/batismo/batismo_cullmann.htm http://www.monergismo.com/textos/batismo/batismo_cullmann.htm definitivamente, perguntar se a Igreja nascente já batizava aos recém- nascidos. Os escritos do Novo Testamento não nos permitem dar resposta alguma, negativa ou positiva, a esta pergunta, e seria de desejar que todos se persuadissem disto. Os textos que falam do batismo de "toda uma casa" nos deixam na incerteza, pois não sabemos se nessas "casas" havia crianças pequenas. Estas passagens não podem ser levadas em conta mais que para definir a doutrina do batismo, porém não para atestar a prática do batismo de crianças na idade apostólica. Seria desejável que os defensores do caráter bíblico do batismo de crianças não tentassem facilitar a tarefa aduzindo estes textos, como se fossem uma prova peremptória da prática do batismo de crianças desde as origens. Porém, os que crêem poder negar a prática do batismo de crianças na Igreja nascente deveriam, por sua vez, absterem-se de aduzir o argumento da ausência, no Novo Testamento, de uma menção precisa desta prática. Pois é evidente que em uma Igreja missionária, como era a do tempo apostólico, em uma Igreja que estava se constituindo, a ocasião desta prática -ainda se está em perfeito acordo com sua doutrina -era mais rara que em uma Igreja constituída. Não se apresentava mais que: 1. Quando uma casa inteira, na qual havia crianças pequenas, passava a fazer parte da Igreja; 2. Quando as crianças nasciam depois da conversão e batismo de seus pais (eventualmente só do pai ou só da mãe, se somente um dos cônjuges estava convertido). Este segundo caso, se não era freqüente no próprio começo da vida da Igreja, se produziu certa mente antes de que fosse redigido o último livro do Novo Testamento. Quase todos os que não crêem que a Igreja nascente batizasse às crianças, caem no erro de não distinguir estes dois casos tão diferentes. Todavia, esta consideração deveria ser levada em conta muito atentamente, por conta do fato de que o judaísmo contemporâneo a fazia para os batismos dos prosélitos. A obra de Joachim Jeremias[16], que é de capital importância para a discussão desta questão, recorda com efeito que no judaísmo se batizava não somente os pagãos adultos, como também às suas crianças, enquanto que as crianças que nasciam depois da conversão dos pais já não eram batizadas, sendo consideradas como santas por causa de seus pais. Esta comprovação é importante também por sua analogia com o que Paulo escreve em I Co.7.14[17]. O estudo muito esmerado de J. Jeremias nos parece provar que é, pelo menos possível, sustentar que os textos bíblicos atestam, de maneira indireta, a prática do batismo de crianças no período apostólico. Cremos também que se pode invocar a este respeito a maneira como os sinópticos (Mc. 10.13 s.; Mt. 19.13 s. e Lc. 18.15 s.) referem a benção das crianças por Jesus[18]. Não queremos dizer mais no momento. Porém se intencionalmente nos mantemos tão prudentes a respeito da questão histórica da constatação pedobatista do Novo Testamento, queremos antes de tudo, e sem dúvida alguma, recordar com insistência que o Novo Testamento não contém nenhum vestígio da prática de um batismo de adultos cujos pais foram cristãos que educadaram estes adultos. Este fato pode ter se produzido a partir do ano 50 ou até antes, portanto antes da redação da maior parte dos livros do Novo Testamento. A única coisa que sabemos a respeito das crianças filhas de pais cristãos, é o que Paulo disse em I Co. 7.14 e que corresponde à prática do batismo dos prosélitos, o qual não era administrado mais que às crianças nascidas antes da conversão de seus pais. Esta passagem paulina exclui igualmente a idéia de um batismo desses filhos de cristãos uma vez tornados maiores.Os impugnadores do caráter bíblico do batismo de crianças deveriam portanto Page 8 of 31O Batismo de Crianças e a Doutrina Bíblica do Batismo 22/3/2008http://www.monergismo.com/textos/batismo/batismo_cullmann.htm http://www.monergismo.com/textos/batismo/batismo_cullmann.htm render-se diante da evidência. O que estes preconizam, a saber, o batismo na idade adulta das crianças nascidas de pais cristãos e educadas por estes, está todavia pior atestada no Novo Testamento que o batismo de crianças (em favor do qual se pode pelo menos descobrir certos vestígios), e até mais, seu ponto de vista não está atestado de maneira absoluta.Porém não é do ângulo testemunhal da Escritura de onde se deve delinear a questão do batismo de crianças. Se levarmos em conta nossas fontes nesta matéria, não podemos encontrar mais que uma resposta a partir da doutrina geral do Novo Testamento. O problema é o seguinte: o batismo de crianças é compatível com a concepção neo-testamentária do batismo? O valor inquestionável do prospecto de Karl Barth é o de ter levado a discussão a este terreno. Porém ainda que descubra aspectos capitais e amiúde desconhecidos dI;) batismo, a interpretação do nosso colega não pode, a nosso ver, ser seguida em suas principais conclusões, segundo o Novo Testamento. Não tem menos mérito em haver convidado a igreja a refletir de novo sobre a significação bíblica do batismo.O problema dobatismo de crianças deve antes de tudo ser considerado no terreno da exegese e da teologia neo-testamentárias. Não seria útil, por conseguinte, estudá-Io de um só golpe em outras perspectivas, por exemplo, sob o ângulo "Igreja da multidão -Igreja confessante". Por isso, K. Barth, com seu hinc, hinc, illae lacrima[19], acusa os defensores do batismo de crianças de se deixarem guiar, de maneira definitiva, pela preocupação de salvar a "multidão". Esse pode ser o caso de numerosos pedo-batistas. Porém da leitura do opúsculo barthiano não se pod,e impedir a pergunta se seu hinc, hinc, illae lacrimae não poderia ser-lhe devolvido e aplicado ao vivo interesse, certamente legítimo, que K. Barth põe na constituição de uma Igreja confessante. Sua negação do caráter bíblico do batismo de crianças que ele chega até a chamar de "uma ferida no corpo da Igreja"[20], não está posta à serviço desta causa?Portanto, se se faz intervir a questão "Igreja da multidão - Igreja confessante" no debate, a propósito do sentido do batismo, se dá de antemão a todo o problema, uma perspectiva que não é a do Novo Testamento. Isto não quer dizer, por demais, que o estudo da essência e da significação do batismo não permita tirar conclusões eclesiol6gicas precisas, porém estas não serão mais que a consequência lógica da doutrina estabelecida previamente. Pedimos, pois, que para buscar o que constitui o fundamento do ato batismal, não se estudem os textos da Escritura a partir de um a priori quase sempre não conforme o Novo Testamento. A Igreja, na qual o batizado é acolhido, é certamente, segundo o Novo Testamento, uma Igreja "confessante". É exato igualmente que os batismos de adultos, vindos do judaísmo ou do paganismo, isto é, os únicos que nos são explicitamente referidos pelos textos, permitem regularmente comprovar a fé dos batizados. Porém, é errôneo tirar de um só golpe as duas conclusões seguintes: em primeiro lugar, o caráter "confessional" da Igreja primitiva estaria ligado ao batismo; em segundo lugar, a fé e sua confissão seriam a condição de um batismo regular. Isto é: se é verdade que o batismo -o batismo de adultos -foi no cristianismo primitivo uma ocasião importante para o crente de confessar sua fé, não era a única. Com efeito, é impossível pretender que só o batismo garantia à Igreja seu caráter de comunidade de confessantes. Porque a fé era ademais confessada em cáda culto, nos exorcismos, no ensino da Igreja[21] e pode ser que também quando um ministério era conferido. Era-o igualmente quando os cristãos, diante dos tribunais, deviam "dar conta da esperança que havia neles" (IPe. 3.15). E quanto ao Page 9 of 31O Batismo de Crianças e a Doutrina Bíblica do Batismo 22/3/2008http://www.monergismo.com/textos/batismo/batismo_cullmann.htm http://www.monergismo.com/textos/batismo/batismo_cullmann.htm segundo ponto, que concerne ao laço inegável e indissolúvel que une o batismo e a fé, será necessário mostrar com detalhes como deve ser definido de uma maneira mais precisa. Faremo- 10 no próximo capítulo. No momento, basta notarmos que não podemos nos apoiar no fato de que a fé geralmente está presente no momento do batismo de um adulto, para então afirmar que está simultaneidade constitui o primeiro elemento das relações entre batismo e fé.Finalmente, voltamos a advertir que é necessário separar o problema do batismo das crianças desse outro da "Igreja da multidão -Igreja cofessante", pois muito tempo antes do triunfo do imperador Constantino e suas conseqüências eclesiológicas, Irineu já aprovava o batismo de crianças[22]. Ninguém negará, todavia, que Irineu era membro de uma "Igreja confessante".Em seu estudo sobre a origem e significação do batismo, F. J. Leenhrdt[23] pretende defender que o batismo de crianças seria, no fundo, um sacramento distinto daquele dos adultos. Recorda a este respeito que, para fundamentar biblicamente o batismo de crianças, se tem o costume de basear-se em textos neo- testamentários que não dizem uma palavra sobre o batismo, quando não podem ser invocados os verdadeiros textos batismais em favor do batismo de crianças. Esta opinião, de nosso colega de Genebra, se explica por sua interpretação da doutrina do batismo, que. está aparentada com a de K. Barth e que não nos parece corresponder plenamente com a concepção bíblica. N6s comprovaremos, pelo contrário, que esta pode muito bem aplicar- se ao batismo de crianças, tenha sido este praticado ou não. Em troca, os outros textos neo-testamentários invocados geralmente para justificar o batismo de crianças, podem ser legitimamente aplicados também ao batismo de adultos[24]. Por isso importa agora compreender bem o que significa teologicamente morrer e ressuscitar individualmente com Cristo pelo ato batismal, depois que o batismo coletivo decisivo já tenha sido realizado por todos os homens no Calvário.Para esclarecer este ponto é necessário partir do que distingue o batismo da santa ceia. Em um livro anterior[25], mostramos que a Igreja primitiva não conhecià provavelmente mais que duas classes de assembléias cultuais: a do alimento compartilhado da eucaristia (compreendendo certamente a pregação do evangelho) e o batismo. Pois bem, no momento da ceia, a assembléia participa também da morte e ressurreição de Cristo. Qual é, pois, a diferença entre os dois sacramentos?Advertimos em primeiro lugar que é essencial para a ceia o ser repetida[26], em troca o batismo deve ser um ato realizado para cada indivíduo, uma só e única vez. Na ceia, é a comunidade constituída enquanto tal quem participa na morte e na ressurreição de Cristo, enquanto que pelo batismo esta relação se aplica, no seio da Igreja, a um indivíduo. Assim se encontra refutada a objeção de Karl Barth, segundo a qual se se batiza aos recém-nascidos seria igualmente necessário admiti-los na ceia[27]. Com efeito, a participação reiterada da comunidade na morte e ressurreição de Jesus Cristo, no momento da eucaristia, encontra precisamente seu sentido no fato de que são aqueles que já crêem os que asseguram de novo sua salvação, com a exclusão dos incrédulos e daqueles que não são todavia capazes de crer. No batismo, ao contrário, é o indivíduo quem, pela primeira e única vez é situado na Igreja, isto é, ali onde, segundo a vontade de Deus, o perdão dos pecados e o dom do Espírito Santo atuam em seu favor no tempo que separa a ascensão da parousia. O que distingue, pois, o batismo da ceia é seu caráter único, enquanto que o que lhes é comum é a relação com a morte e a ressurreição do Senhor.Em Rm. 6.3 s., Paulo descreve o que se Page 10 of 31O Batismo de Crianças e a Doutrina Bíblica do Batismo 22/3/2008http://www.monergismo.com/textos/batismo/batismo_cullmann.htm http://www.monergismo.com/textos/batismo/batismo_cullmann.htm passa no batismo: o batizado se toma uma "mesma planta" com o crucificado e ressuscitado. Em I Co. 12.13, define claramente como essa participação na morte e ressurreição de Cristo se efetua precisamente no batismo: por um só espírito, todos nós fomos batizados para sermos introduzidos em (Eiç) um mesmo corpo. O versículo precedente mostra que se trata do corpo de Cristo, isto é, da Igreja, como indica todo o contex- to. Para definir a essência da significação do batismo, nos parece, pois, importante recorrer por sua vez, a Rm. 6.3 s. e a I Co. 12.13.Este último texto responde sem equívoco à pergunta que delineamos no começo deste capítulo, concernente à diferença entre o ato batismal da Igreja primitiva e aquele batismo geral já realizado no Calvário.A justa posição dos textos citados, Rm. 6.3 s. e I Co. 1213, não é arbitrária. Com efeito, estão intimamente ligados, posto que o corpo de Cristo no qual somos batizados, é por sua vez o corpo crucificado (11 Co. 1.5; Cl. 1.24; 1Pe. 4.13) e o corpo ressuscitado (I Co. 15.20-22) de Cristo. E Paulo, unindo de maneira análoga a morte e a ressurreição com Cristo por um lado e a incorporação à única Igrejade Cristo por outro, escreve aos Gálatas esta outra passagem capital: "Todos v6s que haveis sido batizados em Cristo (Eiç XptO"t6v), vos haveis revestido de Cristo..., pois v6s sois todos um em Jesus Cristo" (3.27) s.).Entre os textos neo-testamentários que falam do batismo, vistos pelo ângulo doutrinal, não se encontra nenhum pelo qual o acontecimento essencial do ato batismal seria a comunicação cognoscitiva da obra salvadora de Cristo, a cognitio, como quer K. Barth e como pensa também, no fundo, F.-J. Leenhard[28]. Não encontramos uma só passagem que diga ou dê a entender que essa cognitio, esse "participar", justifique, ao lado do batismo geral realizado no C6lgota, a celebração do ato batismal na vida da Igreja e que defina sua essência. É verdade que a maior parte das vezes, o Novo Testamento refere que o batizado -adulto - chegou à fé antes de seu batismo e que ele à confessava sem dúvida no momento de ser batizado[29]. Porém esta cognitio não é jamais o elemento essencial. Em troca, os textos decisivos de I Co. 12.13 e Gl. 3.27-28, que acabamos de recordar, determinam claramente que o acontecimento essencial do ato batismal é a agregação ao corpo de Cristo. Deus incorpora, não dá apenas um informe sobre esta incorporação. No instante do acontecimento, o batizado se limita a ser objeto passivo deste ato de Deus, ele é incorporado por Deus. "É agregado", como diz Atos com um estilo eminentemente passivo (2.41)[30]. Todos os outros elementos que entram todavia em consideração devem ser subordinados a essa definição e explicados a partir dela. Certamente também Karl Barth fala da edificação da Igreja por meio do batismo, porém, e isto é o essencial, não reconhece a este ato de Deus, enquanto tal, uma força causativa para aquele que se beneficia dele. Considera a graça batismal como uma declaração divina que se dirige à fé.A ceia igualmente é um acontecimento que conceme ao corpo de Cristo, distinguindo-se do batismo, como temos notado. Na mesma carta aos coríntios (I Co. 10.16 s.), se diz que a comunhão no partir do pão é uma comunhão no corpo de Cristo e que os que tomam parte do mesmo pão formam um só corpo, ainda que sendo muitos. Pois na ceia, o corpo de Cristo não é aumentado com novos membros que lhe seriam agregados, mas que a comunidade existente é cada vez mais fortalecida tanto quanto o corpo de Cristo, na acepção mais alta deste termo. O ato batismal, pelo contrário, concerne ao corpo de Cristo de uma maneira diferente. "Pela associação" (7tpoae'tt'e"aav, Atos 2.41) ao corpo de Cristo (eic; EV aro~a) daqueles que são batizados, este Page 11 of 31O Batismo de Crianças e a Doutrina Bíblica do Batismo 22/3/2008http://www.monergismo.com/textos/batismo/batismo_cullmann.htm http://www.monergismo.com/textos/batismo/batismo_cullmann.htm corpo aumenta quantitativamente. Este aumento é para ele um ato sumamente real. O batismo, por conseguinte, não afeta só ao batizado, como se diz habitualmente, mas antes à Igreja em sua totalidade. Cada batismo significa assim uma vitória sobre a potência do maligno, posto que coloca o batizado num lugar onde pode escapar desta potência[31].Como no Calvário, também no batismo é Deus quem atua em Cristo. Esta "associação" é um ato soberanamente livre de Deus, que não depende nem do nosso comportamento humano nem tão pouco de nossa fé. O batismo eclesiástico teria, com efeito, um caráter fundamentalmente diferente do batismo geral realizado por Cristo na cruz, se a obra de Deus estivesse aqui ligada ao ato de fé e a confissão do homem. Pois precisamente o sentido mais profundo desta obra expiatória consiste no fato de que foi realizada sem o concurso e ainda contra a vontade, o conhecimento e a fé daqueles que deviam beneficiar-se dela[32]. Pois se no batismo da Igreja, a fé não é, antes de tudo, uma resposta que segue ao ato de Deus, senão uma condição deste ato, então o Cal vário e o batismo não se situam no mesmo plano. No parágrafo seguinte vamos definir o papel da fé no aconteci- mento do batismo e explicar porque o Novo Testamento menciona tão freqüentemente a fé do batizado adulto, seja antes, seja no mo- mento de seu batismo. Porém, aqui se trata de mostrar que o batismo do Calvário e o batismo na Igreja estão íntima e essencIalmente liga- dos, pois são um e outro uma obra divina totalmente independente do concurso humano. Do fato, da soberania deste ato de Deus, a fé enquanto resposta humana, não pode senão seguir-se. Deve acompanhar o batismo eclesiástico ainda quando a fé, no batismo geral do Calvário, preceda o sacramento, quero dizer, nos casos que o Novo Testamento menciona correntemente. O batismo na água dado pela Igreja requer, neste caso também, uma fé que não pode vir senão depois do ato batismal, fé no acontecimento particular que acontece na presença da Igreja: associação de um novo membro ao corpo crucificado e ressuscitado de Cristo. Se esta fé não segue o batismo, o dom divino é menosprezado, blasfemado, e os frutos que deveria produzir são aniquilados. Porém, o dom em si mesmo conserva toda sua realidade, pois não depende do fato de que um homem tenha confessado a Cristo por sua fé, mas antes é Cristo quem, agregando- o a seu corpo, o tem confessado e por conseguinte o fez participar em sua morte e em sua ressurreição.Tudo o que o Novo Testamento ensina implicitamente da graça preveniente (Rm. 5.8-10; Jo. 15.16; I Jo. '4.10 e 19) vale com maior razão para o batismo enquanto incorporação ao corpo de Cristo. A graça batismal não é somente a "imagem" daquela graça preveniente pela qual Deus no Calvário veio ao nosso encontro. É ademais -em dependência absoluta do acontecimento do Gólgota -uma manifestação nova e especial dessa mesma graça preveniente, que é a obra divina da salvação perpetuando-se no tempo da Igreja.Na sexta-feira santa, a graça preveniente de Deus foi dada em Cristo a todos os homens e o acesso a seu reino aberto a cada um. Pelo batismo, se pode entrar no que em outro lugar chamamos "o centro"[33] desse reino, isto é, o corpo terrestre de Cristo, a Igreja[34]. A cruz do Calvário se refere, pois, ao batismo como o evento no qual o reino de Cristo, em toda sua extensão, conceme à Igreja. Neste sentido, a graça batismal não é mais que uma manifestação particular da graça preveniente do Gólgota. A existência desta manifestação particular depende do fato de que o Novo Testamento conhece por um lado uma humanidade salva por Cristo e por outro uma Igreja: um regnum Christi e um corpus Christi.Os teólogos protestantes Page 12 of 31O Batismo de Crianças e a Doutrina Bíblica do Batismo 22/3/2008http://www.monergismo.com/textos/batismo/batismo_cullmann.htm http://www.monergismo.com/textos/batismo/batismo_cullmann.htm têm amiúde um temor verdadeiramente exagerado em fazer a pergunta da qual nós temos partido desde o começo deste capítulo: Cristo, no momento de cada batismo individual celebrado na Igreja no curso da história, realiza uma obra nova, distinta do simples anúncio de sua única obra expiatória? Certamente, Jesus Cristo não morre de novo em cada batismo, e sua obra única do cal vário não se repete. Porém, aquele que agora está assentado à direita de Deus, autoriza o batizado a participar, em sua Igreja, do que foi realizado E<pá.1taç, de uma vez por todas, no dia de sexta-feira santa e da páscoa. Não se trata de um "infonne" dirigido à fé e ao conhecimento do homem, mas antes que Jesus o introduz nesse lugar particular que é seu corpo terrestre[35]. Uma postura negativa a delinear-se em relação ao problema da ação particular de Cristo e dos efeitos que se desdobra na vida presente de sua Igreja, ou seja, se trata-se do batismo ou de outra ação, constitui uma falta de submissão à sagrada Escritura. E isto é simplesmente pelo temor de chegar a interpretações "católico- romanas" ou somente "anglicanas" ou "luteranas". Responder de modo negativo quando se propõe a pergunta, é igualmente, sinal de uma idênticafalta de submissão aos ensinos neo-testamentários. Porque em nosso caso, tal atitude significaria que se confundem as situações respectivas do regnum Christi e sua amplitude, com a Igreja em seus contornos mais restritos [36]. O acontecimento único do batismo geral do Calvário concerne, com efeito, ao grande círculo do reino de Cristo, enquanto que o ato do batismo se dirige, enquanto acontecimento novo, à Igreja. Se é pois verdade que Cristo morreu por todos os homens, batizados ou não, se é verdade que todos têm parte em sua morte e ressurreição, esta participação está, no que diz respeito aos membros da Igreja, ligada a seu batismo Eiv croola, em sua agregação ao corpo crucificado e ressuscitado do Senhor. Deste ponto de vista da história da salvação, a relação cronológica entre o acontecimento do Calvário e o batismo é idêntica à relação entre a cruz e a ceia. Isto é, o batismo não é uma repetição daquele acontecimento histórico único, senão que é sempre novo. Cada vez que um membro é "agregado" à Igreja, nos recorda que a história da salvação continua também no presente. Ademais este acontecimento presente está totalmente determinado por aquele que, de uma vez por todas, foi realizado no Calvário pelo é<pá7taç que dividiu o tempo[37]. Segundo os ensinos do Novo Testamento sobre a Igreja, corpo de Cristo, nos atrevemos a afirmar que, segundo o plano de Deus para a salvação do mundo, a participação na morte e na ressurreição de Cristo está ligada à Igreja, certamente não de maneira exclusiva, porém sim de maneira muito particular. Em virtude da economia divina, a Igreja é o lugar do Espírito Santo, ainda que este Espírito possa soprar "onde quiser". No que diz respeito à salvação, isso significa que se os membros da Igreja não são necessariamente mais favorecidos que os não batizados pelos quais Cristo também morreu e ressuscitou, a graça batismal especial, outorgada aos cristãos, consiste no fato de que Cristo os toma especialmente ao seu cuidado. K. Barth tem o mérito de ter trazido a público este aspecto do problema[38]. Porém é necessário perguntarmos de novo, por que este "responsabilizar- se" (Inpflichtnabme), no ato batismal, deve depender da cognitio simultânea? Porque este "responsabilizar-se" constitui, na realidade, uma graça causativa que tem por efeito o "revestir-se de Cristo" do apóstolo (GI. 3.27) tão exatamente como a incorporação de um jovem no exército implica levar um uniforme[39]. Sem dúvida, é infinitamente mais grave para os batizados que para os não batizados atraiçoar a participação na Page 13 of 31O Batismo de Crianças e a Doutrina Bíblica do Batismo 22/3/2008http://www.monergismo.com/textos/batismo/batismo_cullmann.htm http://www.monergismo.com/textos/batismo/batismo_cullmann.htm cruz e na ressurreição de Cristo, quer dizer não responder a ela pela fé. Com efeito, à incorporação na Igreja que se produz no batismo, deve corresponder obrigatoriamente a fé do novo membro. É nesta perspectiva que é necessário compreender os textos neo-testamentários que falam de um pecado que não será perdoado, para o qual o arrependimento está excluído. Diga-se o mesmo dos textos concernentes a uma exclusão definitiva da comunidade cristã. Porém não é menos verdade que quem perde a graça batismal porque não tem fé, permanece, apesar de tudo, sob o sinal do batismo. O próprio Karl Barth sublinha, e não se pode fazê-Io com mais força, seu caráter indelével[40]. "Toda humanidade ocidental, indiscutivelmente má, se encontra sob este sinal[41]. Portanto se a incredulidade não pode destruir mais que o efeito que segue o batismo e não o acontecimento sacramental propriamente dito, é preciso admitir que o Novo Testamento não requer a fé no momento do batismo senão depois.Os adversários do batismo de crianças intentam amiúde apresentar o problema como se toda noção que não faça da fé uma condição sine qua non do batismo, pressupõnha já inevitavelmente uma concepção mágica, simbólica, como se o batismo de adultos fosse a única possibilidade de escapar a esta alternativa. Somente então, pensam estes, o batismo pode ser um acontecimento real, que não está nem liqüefeito pelo simbolismo nem paganizado pela magia[42]. Se nós definimos aqui a graça batismal como a incorporação do batizado à Igreja e se supormos que esta graça não depende do homem, não permitimos portanto, uma interpretação mágica desta afirmação, posto que é somente em virtude de sua resposta que o homem poderá permanecer nessa graça, como veremos no parágrafo seguinte. Veremos também que a participação ativa da comunidade no momento do ato do batismo exclui o opus operatum[43]. Porém, o que queremos mostrar no momento é que no próprio ato do batismo não se está tratando de um acontecimento simbólico, senão de um fato muito real, ainda que seus efeitos ulteriores estejam intimamente ligados à fé subsequente do batizado e que até dependam profundamente dela. É necessário distinguir aqui cuidadosamente entre a incorporação à Igreja, que se produz no momento do ato batismal e representa uma graça real independente da acolhida que o batizado lhe faça, e as conseqüências de dita incorporação que são uma graça real, ainda que dependente da constância da fé.Para ilustrar a primeira das duas realidades, a graça da recepção na Igreja, não vemos analogia mais feliz do que a que Karl Barth [44] propõe: o ato de nacionalização concedido pelo governo de um estado.Este exemplo nos parece, por outro lado, amenizar a maneira como K. Barth interpreta o acontecimento do batismo. Com efeito, o essencial para uma nacionalização não é na realidade o fato de que o nacionalizado tenha conhecimento do alcance do ato, senão até do pr6prio ato, para sua admissão entre os cidadãos do estado em questão. O ato tem, pois, em si mesmo uma virtude "causativa". Não se trata unicamente de um "participar" da nacionalização, senão também de um acontecimento real e novo. Todas as vantagens que o estado em questão pode oferecer em virtude de sua história e de suas tradições não são somente prometidas ao recém-chegado para quando ele soubesse se mostrar digno delas. São-lhe perfeitamente outorgadas no momento de sua nacionalização, independentemente de que as use ou as entenda. Para a vida do novo cidadão este ato é uma mudança decisiva, é algo real, não dependente nem de seu comportamento no futuro nem tão pouco de sua intenção de fazer honra à sua nova pátria. Se é pré-requisito que o candidato testemunhe Page 14 of 31O Batismo de Crianças e a Doutrina Bíblica do Batismo 22/3/2008http://www.monergismo.com/textos/batismo/batismo_cullmann.htm http://www.monergismo.com/textos/batismo/batismo_cullmann.htm previamente seus desejos de ser nacionalizado, este testemunho não é constitutivo do próprio ato de nacionalização, que depende do governo do país. Se o que foi nacionalizado tem filhos menores de idade, estes podem, sem que o queiram, ser nacionalizados ao mesmo tempo que o pai, o qual vai determinar de maneira muito real toda sua vida civil, posto que vão ser submetidos, ao longo do tempo, ao mesmo regime que seu pai. Isso é o que K. Barth esquece.Pode-se recordar também que, depois de uma guerra, os estados vitoriosos chegam a decretar a nacionalização coletiva dos habitantes de toda uma região sem que estes testemunhem previamente sua aceitação e sua vontade de respeitar no futuro esta mudança de nacionalidade.Este ato tem um efeito absolutamente idêntico ao de uma nacionalização privada conferi da por petição de um candidato. É um acontecimento eminentemente real que, no dia de sua entrada em vigor, confere àqueles a quem concernem, os direitos e os deveres dos outros cidadãos da nação vitoriosa[45]. Não discutimos aqui a questão de, se este ato é legítimo ou não; se trata unicamente de pôr em evidência seu poder causativo. Este exemplo nos parece particularmente feliz pela seguinte razão: nos permite compreender que no mesmo instante em que é promulgadoo ato de nacionalização, o governo em questão é o único que atua concedendo ao novo cidadão o privilégio de sua nova nacionalidade. O recém-chegado permanece passivo. O fato de que tanto crianças quanto adultos, tenham pedido ou não, poderem ser beneficiados por este ato, cujos efeitos são semelhantes para as duas categorias, demonstra que não se poderia fazer do comportamento prévio do beneficiário e de sua aquiescência ao ato uma condição para o próprio ato. Para o estado, cdmo por outro lado para o novo cidadão, seu comportamento ulterior é evidentemente da maior importância. Porém, até se não permanece digno de sua nacionalização, esta não perde todo seu valor de acontecimento real e não simbólico. Se mais tarde, o que foi nacionalizado -como menor, portanto sem seu consentimento, ou como adulto -renegue, por sua conduta a nacionalidade que realmente lhe foi conferida (e não somente comunicada por meio de um papel oficial que é o certificado de nacionalização ),acabará por não desfrutar mais dos privilégios de sua nova nacionalidade. Ao tomar-se um traidor, será julgado e condenado à prisão perpétua ou à pena de morte. Assim, perderá as vantagens conseguidas por sua nova nacionalidade. O fato de que possa tomar-se um traidor, prova então a posteriori que o ato de nacionalização, a partir de sua promulgação, lhe permitia efetivamente desfrutar de tudo, ao longo do tempo, que perde por sua traição. Poderia desfrutá-lo inclusive quando se opunha talvez a este ato, ou quando todavia não o compreendia. Sem dúvida a comparação não é totalmente adequada, porém apresenta bem o batismo como um ato divino que confere ao batizado, independentemente de seu comportamento, a graça de "revestir-se de Cristo" (GI. 3.27; Rm. 6.3 s.), de chegar a ser membro de seu corpo. Com efeito, neste corpo atua o poder de ressurreição do Espírito Santo. Este poder fonna esse corpo. O batismo significa, pois, que se é admitido no único corpo onde depois de pentecostes se irrompeu este poder[46]. Temos visto, com efeito, que o essencialmente novo no batismo cristão é que Cristo, em virtude de sua obra expiatória, "batiza no Espírito Santo". A este respeito, é também necessário distinguir entre o que se passa no momento do ato batismal e os efeitos ulteriores deste. Para o cristianismo primitivo, o n<;>vo batizado pertencerá para sempre ao reino do Espírito na condição de que pennaneça na fé. No seio das assembléias da comunidade, será sobretudo Page 15 of 31O Batismo de Crianças e a Doutrina Bíblica do Batismo 22/3/2008http://www.monergismo.com/textos/batismo/batismo_cullmann.htm http://www.monergismo.com/textos/batismo/batismo_cullmann.htm preservado das tentações, próprias dos "últimos dias" em que vive (Hb. 10.25; cf. Did 16.2). O culto eucarístico da Igreja lhe permitirá realizar de novo a experiência da presença de Cristo. Porém se as conseqüências do batismo modificam até tal ponto a existência do batizado, é preciso que este ato solene, pelo qual Deus coloca de uma vez por todas o homem diante de tantas graças, possua também uma virtude própria. Esta consiste no dom batismal que é a incorporação do batizado à igreja pelo Espírito Santo. Este dom, cuja apropriação subseqüente em sua vida dependerá de sua fé, lhe é gratuitamente concedida por Deus no ato de seu batismo, sem sua intervenção. Quando Paulo disse que por um só Espírito fomos batizados em um só corpo, não quer com isto dizer que o dom do Espírito Santo seja a condição da admissão na Igreja, mas antes que o Espírito atua no próprio ato da incorporação. Em virtude de sua própria essência, o Espírito não pode ser transmitido como uma coisa estática, senão somente in actu, e esta ação do Espírito, nesse instante, consiste precisamente no fato de que "agrega" o batizado à Igreja. Dito de outra maneira: no que concerne ao ato batismal não há incorporação à Igreja sem ação do Espírito, e não há ação do Espírito sem incorporação à igreja.Poderia se objetar que um ser humano que não pode nem compreender nem crer, não é capaz de receber, ainda que passiva- mente, este dom do batismo, não pode portanto, ser objeto de uma tal ação do Espírito. O problema, por conseguinte, não está em saber se um recém- nascido tem necessidade de beneficiar-se da morte e ressurreição de Jesus Cristo[47], senão se lhe é possível receber o Espírito Santo, ainda que passivamente. Poderíamos responder com a pergunta seguinte: como o acontecimento do Calvário pode exercer seus efeitos em favor de todos os homens antes de crerem e a despeito de sua incredulidade manifesta e de sua postura negativa em deixarem-se redimir desta maneira? Todavia, tratando-se aqui do Espírito Santo, surge uma dificuldade que é preciso não fazer desaparecer: pode o Espírito Santo atuar em um recém-nascido apesar da sua incapacidade de crer? Esta pergunta deve ser delineada deste modo por- que o batismo cristão é inconcebível fora da ação simultânea do Espírito Santo. Não há batismo cristão sem dom do Espírito Santo[48]. É necessário tomar a sério o que aqui temos dito[49], a saber que tudo o que se disser sobre o batismo deve poder aplicar-se também ao batismo de crianças.Não trairemos nosso objetivo se mencionarmos aqui o gesto da benção que Cristo fez sobre as crianças que lhe eram apresentadas (Mt. 19.13 s., juntamente). E isto não somente porque a maneira como os evangelistas nos referem o fato[50], deixa supor que queriam dar com isto diretivas a respeito do batismo de crianças, sendo este, talvez já, objeto de discussão eclesiástica[51], senão sobretudo porque a imposição das mãos era precisamente o gesto que acompanha a doação do Espírito. A mão que Jesus coloca sobre as crianças em sinal de benção é o instrumento do Espírito assim como a que impõe sobre os enfermos. As crianças (~pé<p1l, Lc. 18.15) de que fala o evangelho entram, em virtude desse ato, em comunhão com Jesus. Certamente não se trata do batismo[52], porém com direito, todavia, desde os. tempos mais antigos, este episódio é invocado para legitimar o batismo de crianças, pois trata de introduzir as crianças na comunhão com Cristo. "Não as impeçais de entrar nessa comunhão!" ~i1 xroÀÚE'tE.Não é, por isto mesmo, sinal de pouca fé declarar impossível o milagre invisível que constitui a introdução pelo Espírito, de uma criança na comunhão com Cristo?Porém se objetará então -e a isto já temos feito alusão[53] -que quem pretende relacionar este Page 16 of 31O Batismo de Crianças e a Doutrina Bíblica do Batismo 22/3/2008http://www.monergismo.com/textos/batismo/batismo_cullmann.htm http://www.monergismo.com/textos/batismo/batismo_cullmann.htm milagre com o ato exterior está próximo da magia. Por isto é indispensável falar aqui da fé da comunidade, reunida durante o batismo, fé que tomou possível a obra do Espírito. Com efeito, no Novo Testamento só excepcionalmente - caso do batismo do eunuco (At. 8.26 s.) -a comunidade, ainda reduzida a "dois ou três", está ausente na celebração do sacramento[54]. A fé da comunidade não é uma fé substitutiva, como dizem os Reformadores[55]. Com efeito, o batizado desprovido de fé não se beneficia da fé da comunidade reunida ao redor dele. Erroneamente se invoca esta concepção nas apologias clássicas do batismo de crianças. Não se trata disso. A comunidade crê que se realiza diante de seus olhos um acontecimento decisivo que conceme ao batizado, e que este acontecimento é real, seja criança ou adulto, tenha consciência ou não. Se a comunidade reunida para o batismo não cresse nisto, não seria Igreja e o Espírito Santo estaria ausente. Porém ali onde há uma comunidade crente, o Espírito Santo que atua soberana- mente nela, tem o poder de comunicar- se a um recém-nascido da mesma fonna que a todos aqueles que, segundo Paulo, "por um só Espírito são batizados em (eiv) um só corpo". É necessário, a este propósito, falar do matrimônio, que existe também em função da vida da comunidade. Está enobrecido, segundoEf. 5.22 s.[56], porque é um reflexo das relações que unem Cristo à sua Igreja[57]. Por isso uma criança nascida de um matrimônio de pais batizados participa por seu mesmo nascimento do corpo qe Cristo (I Co. 7.14)[58]. Este texto paulino não atesta nem o batismo de crianças nem o de adultos. Pois um e outro são supérfluos para as crianças nascidas de pais cristãos; a nosso entender Paulo pensa aqui que a santidade conferida pelo nascimento em si, basta neste caso para que se seja membro da Igreja[59]. Porém esta passagem como as que se referem ao batismo de toda uma casa, não permite tirar conclusões precisas concernentes à prática batismal nem num sentido nem noutro. É necessário, pois, invocá-lo em relação com a doutrina geral do batismo. Pois bem, se nos situarmos sobre esse terreno, é necessário reconhecermos que atesta de todos os modos uma noção coletiva de santidade. A admissão no corpo de Cristo não depende, pois, de uma decisão pessoal, senão do fato de que se nasceu de pais cristãos, portanto, batizados. Isto quer dizer, que esta admissão consiste em um ato da graça de Deus, independentemente do homem. Que Paulo julgue o batismo de tais crianças ou não, uma coisa é certa: a noção de santidade implicada pelo que foi dito, conduz diretamente à prática do batismo de crianças. Opõe-se à idéia de que os filhos de cristãos não poderiam receber o batismo senão depois de decidirem por si mesmos. E a hipótese de J. Jeremias[60], a saber que já nos tempos do Novo Testamento se praticava o batismo das crianças, adquire assim a partir dessa observação, um alto grau de probabilidade. No caso que se refere I Co. 7.14 não se trata de uma evolução que vai do batismo de adultos ao de crianças, senão que a primitiva comunidade cristã, como a comunidade Israelita, renunciava o batismo dos filhos nascidos de pais cristãos, porém, depois passou ao batismo das crianças, sempre segundo a mesma noção coletiva de santidade[61]. É preciso, com efeito, observar que em I Co. 7.14, Paulo fala exclusivamente de crianças de pais já membros da Igreja. Não se pode, pois, aduzir esta passagem para legitimar o batismo dos filhos de pagãos ou de judeus que se convertiam à fé cristã. Para aqueles é preciso recorrer aos textos que referem o batismo de casas inteiras. Vimos que baseando- se somente nestes, não se pode afirmar com certeza que tais batismos de filhos de pagãos foram celebrados ao mesmo tempo que os de seus pais, Page 17 of 31O Batismo de Crianças e a Doutrina Bíblica do Batismo 22/3/2008http://www.monergismo.com/textos/batismo/batismo_cullmann.htm http://www.monergismo.com/textos/batismo/batismo_cullmann.htm ainda que a prática judaica do batismo dos prosélitos faça com que seja uma hipótese provável. Porém no que concerne à doutrina do batismo, essas passagens permitem concluir que nesse caso também a solidariedade batismal da familia[62] devia superar a decisão individual de cada membro. Uma graça batismal que beneficia a toda uma comunidade, a saber o povo de Israel no momento da passagem pelo mar Vermelho, se supõe também em I Co. 10.1 s., texto que seria necessário sublinhar nas discussões sobre o batismo de crianças. Mostra, com efeito, claramente que o ato da graça, considerado como tipo de batismo, concerne à aliança que Deus concluiu com todo o povo.A este aspecto, é preciso mencionar a continuidade da linha que vai desde a aliança pactuada por Deus com Abraão em favor de sua posteridade, com a da Igreja. Esta, da mesma forma que corpo de Cristo, única posteridade verdadeira de Abraão (Gl. 3.16), cumpre e realiza a primeira aliança. Em Rm. 4.11 seu sinal, a circuncisão, é designado como uma sfpagijv, um selo: da justiça que Abraão havia obtido pela fé, a fim de ser pai de todos os crentes (v. 11b e 12). Pois bem, esse termo sfpagijv designa no Novo Testamento o batismo, pois a este sacramento faz alusão sfpagizeqai, de II Co. 1.22; Ef. 1.13 e 4.30. Como a circuncisão, a sfpagijv do batismo é mais que uma "imagem" ou um "símbolo". É o selo pelo qual Deus sela a aliança que conclui com a comunidade livremente eleita.Será necessário voltar sobre esta questão no parágrafo consagrado às relações entre a circuncisão e o batismo. Até agora nos é suficiente comprovar que sobre este ponto também se encontra confirmada nossa tese, segundo a qual o fim essencial do ato batismal é integrar um novo membro no corpo de Cristo, em virtude da aliança que Deus selou com a Igreja, realização da de Abraão. 3. O batismo e a fé Vimos que é necessário distinguir no sacramento do batismo dois elementos sucessivos, a saber o ato soberano de Deus, que incorpora um indivíduo à Igreja, corpo de Cristo, e as conseqüências deste ato para a vida inteira do indivíduo. Faremos uma distinção entre o papel da fé antes e durante o ato do batismo e o que desempenha depois.Permitem os textos do Novo Testamento fazer esta distinção? Já o texto citado mais atrás, I Co. 10.1 s., não autoriza a responder afirmativamente. Com efeito, Paulo distingue escrupulosamente o que sucedeu quando a libertação do povo eleito no momento da passagem pelo mar Vermelho, tipo de batismo, do acontecimento subseqüente: a maneira negativa como a maior parte do povo reage diante deste batismo e suas conseqüências funestas. A mesma distinção se encontra também nas outras passagens neo-testamentárias que falam de uma perda da graça batismal (Hb. 6.6 e 10.26). Pois se se pode per- der esta graça, isso significa que a vida ulterior do batizado decide também sobre o acontecimento sacramental. Porém, apesar disso, não se pode pôr em dúvida a realidade do que se passou no próprio momento do batismo[63]. No momento, trata-se somente de demonstrar o quão bem fundada está esta distinção. Para isto teremos que recorrer a Rm. 6, passagem capital que justamente, nos recentes debates sobre o batismo, se destacou sem cessar. Nela também se faz esta distinção, posto que o indicativo do batismo (estamos mortos) está ligado de maneira tão característica ao imperativo (que o pecado não reine mais). Para todo batizado, o batismo está na origem de outros aconteci- mentos. É verdade que somos eleitos em Cristo desde antes de nosso nascimento. Porém, no curso da vida terrestre de um batizado, o batismo é um ponto de partida. Da mesma Page 18 of 31O Batismo de Crianças e a Doutrina Bíblica do Batismo 22/3/2008http://www.monergismo.com/textos/batismo/batismo_cullmann.htm http://www.monergismo.com/textos/batismo/batismo_cullmann.htm maneira que a história da salvação se desdobra no tempo, assim independentemente de seu nascimento natural, há na vida de um indivíduo um primeiro ato redentor, um novo nascimento, seguido de um desdobramento no tempo. Essa é a razão pela qual o Novo Testamento chama o batismo: de um "novo nascimento" (Tt. 5.5; Jo. 3.3 s.). Tal é o batismo; um começo muito real em si mesmo, porém que leva consigo uma continuação, assim como o nascimento natural é um começo ao que não se saberia negar sua realidade. Pois bem, apesar disto, privado de uma continuação, isto é, se a morte sobrevém em seguida, perderia todo o efeito.A distinção que o Novo Testamento nos convida a fazer é, pois, de grande importância para a questão do batismo de crianças. Com efeito, os adversários do batismo de crianças crêem que devem negar seu caráter bíblico precisamente porque falta-lhes a fé no instante do ato batismal. Por outro lado, quiçá, K. Barth não tenha intentado fazer esta distinção temporal, à propósito das relações entre o batismo e a fé, pelo fato de não ter uma concepção linear do tempo[64]. Será necessário que à fé coincida com o ato batismal? É legitimo que nos façamos esta pergunta, pois o batismo é chamado um "novo nascimento". Este fato nos permite sem dúvida alguma responder negativamente. Advertimos que este segundo nascimento perde seu efeito se for seguido da morte, isto é, no caso de ausência da fé. Mas por isso não perde sua realidade. No momento em queocorreu, era perfeitamente uma participação na morte de Cristo. Segue-se portanto que este ato batismal único, este "nascimento", não está ligado à fé prévia e não depende dela. O qual é distinto da vida que se seguirá. É verdadeiramente necessário levar a sério o fato de que o batismo é um voltar a um começo radical: as coisas antigas já não contam mais, nem sequer a fé que existia, talvez, antes deste nascimento. Para o homem que o recebe o batismo é um sepultamento total. Toda a doutrina de Rm. 6.1 s., se dirige a homens que já estão batizados, a quem o batismo selou sua salvação. Não é, pois, um catecismo preparatório, senão que explica a posteriori àqueles que já são membros do corpo de Cristo o que então havia se passado: "Considerai-vos, pois, como mortos para o pecado e como vivos para Deus em Jesus Cristo" (Rm. 6.11). Segundo esta passagem, ainda se trata de pessoas batizadas na idade adulta, o "participar" da salvação, a compreensão e a fé que isto supõe não são constitutivos do primeiro ato do acontecimento batismal, senão do segundo. Dá- se um duplo ensinamento aos batizados: primeiramente que foram objeto de um ato redentor e em segundo lugar, agora que o sabem, devem permanecer dignos, isto é, segundo Paulo, crer na realidade deste ato. E ainda se o apóstolo não faz aqui mais que recordar a seus leitores o que já lhes havia sido talvez comunicação antes de seu batismo, não é menos certo que se dirija a cristãos batizados e que lhes fale do batismo como de um ato passado do qual foram objetos passivos.Por outro lado, Paulo não menciona esta prefiguração do batismo que é a passagem do mar Vermelho (I Co. 10.1 s.) senão para mostrar que no primeiro ato é só Deus quem atua, o homem não responde senão no momento do segundo ato. A seqüência: ação de Deus-resposta do homem é determinante a este respeito. O que aconteceu a todos os membros do povo (7táV'tEÇ, cinco vezes nos quatro primeiros versículos), este milagre de Deus é oposto à iniquidade e ao castigo de alguns ('ttVEÇ, v. 7) que não puderam ser salvos pois não puderam responder pela fé. Está, pois, claro que o batismo aponta para o futuro e espera no futuro uma resposta daqueles que se beneficiam dele, o qual é um elemento essencial para um sacramento de Page 19 of 31O Batismo de Crianças e a Doutrina Bíblica do Batismo 22/3/2008http://www.monergismo.com/textos/batismo/batismo_cullmann.htm http://www.monergismo.com/textos/batismo/batismo_cullmann.htm admissão. Isto é válido para todo membro da comunidade, batizado quando criança ou adulto, havendo ou não tido a fé antes de ser incorporado à Igreja. Porém se é essencial para o acontecimento batismal que o batizado, em todos os casos, creia depois da celebração do sacramento, por que o Novo Testamento refere tantos casos nos quais a fé precede e parece autorizar o batismo? Porque os únicos relatos precisos que temos apresentam pagãos e judeus convertidos em idade adulta. Para estes é de rigor que não sejam admitidos na Igreja de Cristo senão pela condição de afirmarem, sobre a base da fé, sua intenção sincera de responder no futuro à graça do batismo por uma fé e uma vida dignas dela. A fé do candidato neste caso é uma condição humana que tomará possível a obra divina. Não é tão pouco uma garantia da perseverança futura do batizado. Constitui um sinal, um critério que permite, à Igreja, fazer uma eleição entre os homens que vai agregar pelo batismo. Assim para um pagão ou um judeu convertidos quando adultos, como não nasceram em uma família cristã, é sua fé pessoal que mostra à Igreja que Deus quer aumentar o corpo de seu Filho acrescentando-lhe um novo membro. Por isso se requer afé de um adulto no momento de seu batismo. Seria, com efeito, contrário à vontade de Deus, no que diz respeito ao batismo, que a Igreja batizasse indistintamente a todo o mundo, isto é, sem haver um sinal divino que lhe faça esperar que o batizado viverá fielmente em seu seio. O batismo de um adulto sem esse sinal da fé seria tão inaceitável como o de uma criança moribunda. Com efeito, é preciso admitir neste caso, porém por outras razões, que a criança não participará do corpo terrestre de Cristo, posto que o segundo ato necessário para o acontecimento batismal não se produzirá. Pode-se objetar aqui que do mesmo modo que se batiza a um recém-nascido do qual se ignora a reação futura, os adultos indiferentes ou hostis poderiam ser batizados, pois adiante lhes seria oferecida a possibilidade de chegar um dia à fé. Seria então possível nos batismos de adultos, prescindir dessa pergunta sobre a fé do candidato de que fala o Novo Testamento, se esta não tem mais significação que a que nós lhe atribuímos. Para responder a esta objeção é necessário dizer que o batismo de um recém-nascido, tal como se apresenta sobre a base dos textos estudados no parágrafo precedente era bastante diferente do batismo de um adulto incrédulo. O pertencer do recém- nascido, por seu nascimento natural, à uma família cristã ou ao menos a um pai ou uma mãe cristãos, constitui um sinal para a Igreja, em virtude da solidariedade batismal e da santidade notada previamente. Este sinal indica que o acontecimento batismal divino da incorporação à Igreja deve produzir-se. A fé do adulto que sai do judaísmo ou do paganismo e que por este fato não nasceu em uma família cristã, deve desempenhar o papel deste nascimento e constituir um sinal válido para a Igreja e por conseguinte indispensável. Mostra que Deus quer atuar e somar pela água e pelo Espírito um novo membro à sua Igreja. Esta tem necessidade de tal sinal para não cair na arbitrariedade quanto à eleição dos que se batizam. Deste modo o sinal será em um caso o nascimento da criança em uma família cristã e noutro a fé do adulto. O testemunho da fé antes do batismo é para os adultos um elemento que forma parte das "ordenanças batismais". A fé que seguirá ao batismo dá sentido a esta fé prévia. O pertencer de uma criança a uma família cristã não é uma garantia de fé subsequente, senão uma indicação divina de sua probabilidade. Ocorre o mesmo com a fé de um adulto pagão ou judeu testemunhada no momento de seu batismo. Esta não é mais que uma indicação divina assinalando Page 20 of 31O Batismo de Crianças e a Doutrina Bíblica do Batismo 22/3/2008http://www.monergismo.com/textos/batismo/batismo_cullmann.htm http://www.monergismo.com/textos/batismo/batismo_cullmann.htm como provável a fé subsequente, única, decisiva. A fé que precede o batismo não é então um elemento constitutivo do próprio acontecimento batismal, da incorporação de um ser humano à Igreja de Cristo. É somente necessária no caso - mais freqüentemente nos primeiros tempos da Igreja - em que o candidato ao batismo é um adulto procedente do judaísmo ou do paganismo. Se a fé que segue ao batismo é requerida a todos os batizados, a fé que o precede não é condição para o batismo, senão no caso dos adultos que não têm laços naturais com a Igreja cristã. A situação particular da Igreja nascente, que batizava sobretudo adultos, explica o porque a mais antiga liturgia batismal conhecida[65] contenha uma declaração da fé do candidato. Porém não teremos direito em tirar disto conclusões para a significação do batismo. Por outro lado, J. Jeremias recordou com razão que as declarações litúrgicas ou teológicas que acompanham o batismo de prosélitos judeus não menciona mais que a adultos. Por- tanto está provado que as crianças dos prosélitos eram batizadas ao mesmo tempo que seus pais[66]. Pode-se dizer então que o batismo dos adultos não se distingue do batismo das crianças, mas que na medida em que se trata de neófitos que vêm do judaísmo ou paganismo. A confissão de sua fé é de praxe antes do batismo. Porém, nos dois casos a doutrina do batismo é a mesma, sendo o elemento decisivo para a confissão da fé cristã os atos e os os gestos do batizado depois do batismo. A fé está essencialmente ligada ao segundo ato do acontecimento
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