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Fra nc sic o A tai lo Rod rig ue s d e O liv eir a 9 20 .99 0.3 33 -1 5 Fra nc sic o A tai lo Rod rig ue s d e O liv eir a 9 20 .99 0.3 33 -1 5 Cooperativismo financeiro no Brasil e no mundo Márcio Port Piracicaba | Pecege 2019 Fra nc sic o A tai lo Rod rig ue s d e O liv eir a 9 20 .99 0.3 33 -1 5 © 2019 PECEGE Todos os direitos reservados. Permitida a reprodução desde que citada a fonte. A responsabilidade pelos direitos autorais de texto e imagens desta obra são dos autores. Organizadores Carlos Shinoda Daniela Flôres Joze Aparecida Mariano Correa Maria Cecília Perantoni Fuchs Ferraz Mariana Luzia Bettinardi Ricardo Harbs Projeto Gráfico e Editoração José Eurico Possebon Cyrino Marcos Valerio Saito Rodrigo Iwata Fujiwara Revisão Fernanda Latanze Mendes Rodrigues Layane Rodrigues Vieira P839c Port, Márcio. Cooperativismo Financeiro no Brasil e no Mundo / Márcio Port - - Piracicaba: Pecege, 2019. Série Didática ISBN 978-85-92582-06-7 1. Economia Financeira CDD. 332 Fra nc sic o A tai lo Rod rig ue s d e O liv eir a 9 20 .99 0.3 33 -1 5 Prezado(a) aluno(a), Esse material foi desenvolvido no intuito de auxiliá-los com os estudos nos cursos de MBA da Esalq/USP, servindo como um referencial teórico básico e complementar às aulas oferecidas nos cursos. Desejamos que esse material, de alguma forma, contribua para acrescentar novos conhecimentos, impulsionar o aprendizado e aprimorar as competências que já possui. Bons estudos!! Equipe Pecege Prefácio Fra nc sic o A tai lo Rod rig ue s d e O liv eir a 9 20 .99 0.3 33 -1 5 Fra nc sic o A tai lo Rod rig ue s d e O liv eir a 9 20 .99 0.3 33 -1 5 Bacharel em Administração de Empresas, pós-graduado em Gestão de Serviços e em Gestão de Cooperativas. ingressou na Sicredi Pioneira RS, a mais antiga Cooperativa de Crédito da América Latina, em 1992. Em 2008, deu origem ao Portal do Cooperativismo Financeiro e co-autor dos livros “O Cooperativismo de Crédito, ontem, hoje e a amanhã” e “Cooperativismo Financeiro, percurso histórico, perspectivas e desafios”. Passou por diversas funções na cooperativa, caixa, gerente de unidade, encarregado de crédito, gerente regional administrativo financeiro, superintendente regional e eleito em 2011 para o cargo de presidente do Conselho de Administração da cooperativa Pioneira, onde permaneceu até dezembro de 2017. Atualmente, é vice-presidente da Central Sicredi Sul/Sudeste. Márcio Port sobre o autor Fra nc sic o A tai lo Rod rig ue s d e O liv eir a 9 20 .99 0.3 33 -1 5 Sumário 1. Introdução 9 2. Os 7 princípios do cooperativismo 12 3. História do Cooperativismo 15 4. A Expressão Mundial e Nacional 17 5. Legislação e Tipos de Cooperativas 21 6. Fidelização e Relacionamento 25 7. Modelo de Governança 28 8. Balanço Social 32 9. Referências 34 Fra nc sic o A tai lo Rod rig ue s d e O liv eir a 9 20 .99 0.3 33 -1 5 9 M. Port 1. Introdução O cooperativismo é uma doutrina e um estilo de vida, organizado por meio da união das pessoas em torno de objetivos comuns. As cooperativas seguem princípios e valores únicos, percebidos pelas mais de 1,2 bilhão de pessoas associadas a elas. Recentemente, em 2012, a ONU (Organização das Nações Unidas) reconheceu que “cooperativas constroem um mundo melhor”, estando comprovado que, entre outros aspectos, o cooperativismo gera: desenvolvimento local, equidade, empreendedorismo, manutenção de empregos, riqueza, inclusão social, desenvolvimento de lideranças, integração e organização social. O cooperativismo demonstra na prática que as pessoas podem viver conjuntamente, baseados na ajuda mútua, sem renunciar a sua individualidade, a propriedade privada e às características pessoais e naturais de cada um. A partir da fundação da primeira cooperativa, a dos Pioneiros de Rochdale, em 1844 na Inglaterra, várias outras cooperativas foram fundadas em várias partes do mundo, demonstrando o poder mobilizador e inspirador do cooperativismo em torno de causas econômicas e sociais que afligem as pessoas. Explicando de uma forma de fácil entendimento, o cooperativismo prega que possamos fazer nós mesmos aquilo que alguma empresa ou terceiro faria por nós com o objetivo de obter alguma vantagem às nossas custas. Como afirma o autor Pontes de Miranda: “as pessoas mais se unem em cooperativas, não para lucrar, mas sim para que outros não lucrem sobre elas”. A criação de uma cooperativa presume que uma pessoa alcança, em união com outras pessoas, ganhos maiores do que se estivesse sozinha, fato este que deixa claro que uma cooperativa deve ser rentável e eficiente, do contrário o ganho de escala não existirá. “Sem viabilidade econômica a organização cooperativa não existe. Sem responsabilidade social uma cooperativa não tem razão de ser” Organização das Cooperativas do Brasil Fra nc sic o A tai lo Rod rig ue s d e O liv eir a 9 20 .99 0.3 33 -1 5 Cooperativismo Financeiro no Brasil e no Mundo 10 Nos dias atuais, todas as pessoas (físicas ou jurídicas) demandam produtos e serviços oferecidos por uma instituição financeira ou fintech. Ao escolher uma instituição financeira, a população brasileira conta com mais de 100 bancos, incluídos os grandes bancos de varejo (Banco do Brasil, Caixa Econômica Federal, Itaú, Bradesco, Santander) e uma centena de instituições financeiras especializadas em algum nicho de mercado (crédito consignado, financiamento de veículos ou outras operações). Essas instituições bancárias têm como característica ser de propriedade de um pequeno número de pessoas (os DONOS dos bancos) que buscam obter o máximo retorno possível (LUCRO) sobre o capital que possuem investido. Este lucro é obtido através das movimentações financeiras realizadas pelos CLIENTES, pessoas que não possuem nenhum poder de decisão sobre a forma de atuação do banco com o qual operam, apenas usufruindo dos produtos e serviços que utiliza e pagando o preço estabelecido. Já ao conceituar uma cooperativa de crédito, podemos afirmar que se trata de uma instituição financeira com atuação local e regional, de propriedade dos membros, constituída em forma de cooperativa, sem o objetivo de lucro, que tem como objetivo atender as necessidades dos associados. Significa dizer que, em uma cooperativa, os donos são os próprios usuários dos produtos e serviços. Tabela 1. Diferenças entre uma cooperativa e um banco BANCOS INSTITUIÇÕES FINANCEIRAS COOPERATIVAS São sociedades de capital São sociedades de pessoas O poder é exercido na proporção do número de ações O voto tem peso igual para todos (uma pessoa, um voto) As deliberações são concentradas As decisões são partilhadas entre muitos Os administradores são terceiros (homens do mercado) Os administradores-líderes são do meio (associados) O usuário das operações é mero cliente O usuário é o próprio dono (cooperado) O usuário não exerce qualquer influência na definição dos produtos e na sua precificação Toda a política operacional é decidida pelos próprios usuários/donos (associados) Podem tratar distintamente cada usuário Não podem distinguir: o que vale para um, vale para todos (art.37 da Lei nº 5.764/71) Preferem o público de maior renda e as maiores corporações Não discriminam, servindo a todos os públicos (Continua) Fra nc sic o A tai lo Rod rig ue s d e O liv eir a 9 20 .99 0.3 33 -1 5 11 M. Port O pleno entendimento de como atua uma cooperativa é possível através do estudo dos 7 princípios do cooperativismo, que demonstram na prática os diferenciais e pilares deste modelo econômico e social. BANCOS INSTITUIÇÕES FINANCEIRAS COOPERATIVAS Priorizam os grandes centros (embora não tenham limitação geográfica) Não restringem, tendo forte atuação nas comunidades mais remotas Têm propósitos mercantilistas A atividade mercantil não é cogitada (art.79, parágrafoúnico, da Lei nº 5.764/71) A remuneração das operações e dos serviços não tem parâmetro/limite O preço das operações e dos serviços tem como referência os custos e como parâmetro as necessidades de reinvestimento Atendem em massa, priorizando, ademais, o autosserviço O relacionamento é personalizado/ individual, com o apoio da informática Não têm vínculo com a comunidade e o público-alvo Estão comprometidas com as comunidades e os usuários Avançam pela competição Desenvolvem-se pela cooperação Visam ao lucro por excelência O lucro está fora do seu objeto, seja pela sua natureza, seja por determinação legal (art.32 da Lei nº 5.764/71) O resultado é de poucos donos (nada é dividido com os clientes) O excedente (sobras) é distribuído entre todos (usuários), na proporção das operações individuais, reduzindo ainda mais o preço final pago pelos cooperados e aumentando a remuneração de seus investimentos No plano societário, são regulados pela Lei das Sociedades Anônimas São reguladas pela Lei Cooperativista e por legislação própria (especialmente pela Lei Complementar 130/2009) Tabela 1. Diferenças entre uma cooperativa e um banco (Conclusão) Fra nc sic o A tai lo Rod rig ue s d e O liv eir a 9 20 .99 0.3 33 -1 5 Cooperativismo Financeiro no Brasil e no Mundo 12 2. Os 7 princípios do cooperativismo Os princípios universais do cooperativismo, definidos em 1995, pela Aliança Cooperativa Internacional (ACI) são: 1. Adesão livre e voluntária: as cooperativas são abertas à todas as pessoas aptas a utilizar seus serviços e a assumir as responsabilidades como membros, sem discriminação de sexo, gênero, social, racial, política ou religiosa, observados os requisitos constantes no estatuto social. 2. Gestão democrática: são os próprios membros que administram e controlam as cooperativas, participando ativamente na formulação das políticas e na tomada de decisão. Os sócios, eleitos como representantes dos demais membros, são responsáveis perante estes. 3. Participação econômica: os membros contribuem equitativamente na formação do capital das suas cooperativas e parte desse capital é de propriedade comum da cooperativa, indivisível. Ao final de cada exercício, os sócios participam da distribuição dos resultados excedentes (sobras) ou de eventual rateio das perdas, normalmente observando o nível de reciprocidade / negócios que cada um teve com a cooperativa. 4. Autonomia e independência: cada cooperativa é autônoma e independente, gerida pelos próprios sócios e, por esse motivo, não deve firmar convênios ou acordos que tragam prejuízo para a cooperativa ou para seus próprios membros. Ao mesmo tempo, o sucesso ou insucesso da cooperativa afetam unicamente seus associados. Deve também atuar de forma a não depender financeiramente ou administrativamente de outras organizações, sejam elas econômicas, políticas ou sociais. Fra nc sic o A tai lo Rod rig ue s d e O liv eir a 9 20 .99 0.3 33 -1 5 13 M. Port 5. Educação, formação e informação: sendo a cooperativa administrada pelos próprios membros é necessário garantir que estes tenham plenas condições de fazê-lo, sendo a educação um dos princípios de fundamental importância para isto. A ausência da educação, formação ou informação impacta negativamente nos demais princípios cooperativos: ao não ter o preparo adequado, a cooperativa passa a depender de outras pessoas para fazer a sua gestão (impactando no 4º princípio); ao não ter o preparo adequado, a cooperativa possivelmente enfrentará dificuldades financeiras e gerará perdas (impactando no 3º princípio); ao não ter o preparo adequado, a gestão democrática ficará prejudicada (impactando no 2º princípio), e assim por diante. 6. Intercooperação: pessoas se unem em torno de cooperativas para obter ganhos de escala e organização que sozinhas não teriam. Da mesma forma, a união de cooperativas em torno de objetivos comuns, organizadas através de centrais e confederações, propicia ganhos de escala ainda maiores. Já cooperativas de diferentes ramos ou atividade podem se fortalecer através da realização de negócios entre si, intercooperando, fortalecendo e desenvolvendo a própria região. 7. Interesse pela comunidade: um dos grandes diferenciais de uma cooperativa é o fato de ser uma empresa da própria região, que convive com as dificuldades e aflições dos sócios e da comunidade, interagindo e interferindo positivamente na solução das situações encontradas. As cooperativas normalmente são fortes agentes de desenvolvimento econômico e social das comunidades em que atuam, colocando em funcionamento o círculo virtuoso do cooperativismo. Fra nc sic o A tai lo Rod rig ue s d e O liv eir a 9 20 .99 0.3 33 -1 5 Cooperativismo Financeiro no Brasil e no Mundo 14 O círculo virtuoso acima demonstra que os recursos depositados em uma cooperativa, ao serem reinvestidos na própria região, incrementam a renda e o emprego locais, contribuindo para a permanência dos jovens em suas cidades e ampliando o consumo. Impactam também o aumento do faturamento das empresas, gerando mais impostos, potencializando os investimentos públicos em projetos educacionais, econômicos e sociais e em infraestrutura. Esta atuação repercute na melhoria da qualidade de vida não só dos associados, mas de toda a população da área de abrangência da cooperativa. Figura 1. Círculo virtuoso do cooperativismo Fra nc sic o A tai lo Rod rig ue s d e O liv eir a 9 20 .99 0.3 33 -1 5 15 M. Port Com tantos diferenciais apresentados por uma cooperativa, por qual motivo o número de pessoas sócias de uma cooperativa não é ainda maior? O que faz com mais pessoas não se unam em torno de uma cooperativa, buscando a ajuda mútua, para obter benefícios a si próprios e ao conjunto de associados? A resposta para esta pergunta talvez seja: o desconhecimento. Ainda carecemos de encontrar uma forma adequada de comunicar o que é o cooperativismo e de que forma as cooperativas atuam. É o desconhecimento que faz com que uma pessoa física (ou empresa) procure uma instituição financeira bancária tradicional (banco público ou privado) para fazer suas operações quando poderia realizar todas as suas movimentações com sua própria instituição financeira, constituída de forma cooperativa. Como afirma Roberto Rodrigues, somos muito bons de falar do cooperativismo entre nós mesmos, mas temos dificuldades ao falar para outras pessoas. O desconhecimento é, portanto, um dos grandes desafios do cooperativismo. Cabe a cada um de nós ser um embaixador do cooperativismo entre nossos familiares, amigos e conhecidos. 3. História do Cooperativismo A primeira cooperativa constituída no mundo foi em Rochdale, na Inglaterra, no ano de 1844. Foi lá que um grupo de 28 tecelões constituiu uma cooperativa de consumo com o objetivo de oferecer produtos com melhor qualidade e preço para seus sócios. Esta cooperativa já encerrou suas atividades, mas, por meio de sua história, continua prestando um grande serviço a milhares de pessoas que se inspiram em seus ideais. Alguns anos depois, em 1850, na cidade de Delitzsch, na Alemanha, inicia a história do cooperativismo de crédito, com a criação da primeira cooperativa urbana, e, em 1862, em Anhausen, também na Alemanha, a primeira cooperativa de crédito rural, liderada por Friedrich Wilhelm Raiffeisen. Apesar da iniciativa de Raiffeisen não ter sido a pioneira dentre as cooperativas de crédito, foi ele que inspirou muitas outras pessoas, de diferentes países, como: Áustria, Suíça, Holanda, França, Canadá e Brasil, entre outros. Fra nc sic o A tai lo Rod rig ue s d e O liv eir a 9 20 .99 0.3 33 -1 5 Cooperativismo Financeiro no Brasil e no Mundo 16 O modelo Raiffeisen chegou ao Brasil pelas mãos do padre jesuíta suíço Theodor Amstad, que em 1885, após ter sido ordenando padre na Inglaterra e ter estudado na Alemanha, foi destinado a atuar no sul do Brasil, na região colonizadapor pessoas de origem germânica, distante cerca de 90 km de Porto Alegre. Com o passar do tempo o sacerdote percebeu que o que as pessoas precisavam ia além da fé e da religião, havendo carências em áreas como saúde, segurança, educação e finanças. Amstad atuou em várias frentes, tendo liderado a fundação de escolas, asilos, hospitais, associações e cooperativas de crédito, inspiradas no modelo Raiffeisen. Foi em Nova Petrópolis, na serra gaúcha, que, em 1902, Amstad liderou a fundação da Sicredi Pioneira RS, a primeira de uma série de 38 cooperativas de crédito, que inicialmente tinham como objetivo financiar a compra de terras por parte dos imigrantes que chegavam ao Brasil e que aqui haviam sido abandonados à própria sorte, sem amparo do governo que os havia trazido para cá e que, sem dinheiro, precisavam reiniciar suas vidas, carecendo de recursos para comprar um lote de terra que lhes serviria de moradia e fonte de sustento. Na primeira metade do século XX as cooperativas viveram um momento de grande crescimento e expansão, com várias iniciativas surgindo em diferentes partes do país, algumas seguindo o modelo Raiffeisen (rural) e outras, o modelo urbano. Na década de 1960 iniciou um período difícil para o cooperativismo e para o país. O regime militar, além de severas limitações normativas impostas pelo Banco Central do Brasil, praticamente exterminou as cooperativas. Algumas das limitações existentes na época eram:  Cooperativas não podiam ter filiais ou pontos de atendimento;  Não podiam ter talão de cheques;  Não podiam receber depósitos a prazo, ou seja, não podiam captar recursos pagando juros para os mesmos;  Não podiam emprestar no crédito rural a mais de 13%aa;  Não podiam emprestar no crédito geral a mais de 24%aa;  60% da carteira de crédito deveria ser rural. Fra nc sic o A tai lo Rod rig ue s d e O liv eir a 9 20 .99 0.3 33 -1 5 17 M. Port Some-se à essas restrições o fato de que a inflação anual rondava os 60%, o que fez com que as cooperativas fossem consumindo suas reservas pouco a pouco até muitas chegarem ao ponto de encerrarem suas atividades. Como exemplo, no Rio Grande do Sul, o berço do cooperativismo de crédito, das 66 cooperativas de crédito que existiam na década de 60, apenas 13 restaram. O ressurgimento do cooperativismo na década de 80 se deu a partir da liderança de Mário Kruel Guimarães, um funcionário aposentado do Banco do Brasil, que reuniu 9 das cooperativas remanescentes e criou uma central de cooperativas, a Cocecrer, atual Central Sicredi Sul/Sudeste. Mário Kruel pregava a união das cooperativas em torno de estruturas verticais e horizontais, criando um modelo sistêmico, que permitiria que as cooperativas fossem mais fortes e eficientes. Um dos anseios do cooperativista Mário Kruel Guimarães, que infelizmente até hoje não se concretizou, era um projeto que visava ao cooperativismo de crédito, com uma única confederação e um único banco em amplitude nacional, com centrais estaduais e cooperativas regionais e filiadas. O momento de desalento que vivia o cooperativismo de crédito só mudou a partir da Constituição Federal promulgada em 1989, que trouxe consigo o estímulo ao cooperativismo, marco importante para provocar: a) a revogação das resoluções que impunham limitações às cooperativas e; b) a publicação, por parte do Conselho Monetário Nacional, de novas resoluções, desta vez estimulando o crescimento das mesmas. O que se viu neste período foi um espetacular crescimento, sempre próximo de 20% ao ano, nos últimos 20 anos. 4. A Expressão Mundial e Nacional O cooperativismo financeiro assume papel de fundamental importância em vários países, notadamente nos mais desenvolvidos, onde facilmente encontram- se percentuais expressivos de participação de mercado. São exemplos desta força: a França, com cerca de 60% de market share, a Holanda, com 40%, a Itália, com 35%, a Áustria, com 30%, Alemanha, com 25%. Países como o Canadá, Espanha e Estados Unidos também possuem uma boa participação, com 10% do mercado. Nos EUA, por exemplo, que apresenta população de cerca de 310 Fra nc sic o A tai lo Rod rig ue s d e O liv eir a 9 20 .99 0.3 33 -1 5 Cooperativismo Financeiro no Brasil e no Mundo 18 milhões de habitantes, praticamente 110 milhões são sócios de cooperativas de crédito, muito distante do Brasil, onde dos quase 210 milhões de habitantes apenas 10 milhões são cooperados. Neste aspecto, o cooperativista Roberto Rodrigues afirma que “o cooperativismo é uma doutrina primorosa para os países com problemas sociais, mas acaba funcionando melhor nos países ricos”, o que demonstra uma grande contradição. É importante ressaltar que, principalmente na Europa, as instituições financeiras cooperativas estão constituídas por meio de bancos cooperativos e não de cooperativas, o que faz com que a forma de atuação apresente algumas diferenças em relação a outros países. Como diferenças marcantes entre os bancos cooperativos e o cooperativismo financeiro brasileiro podem ser destacadas:  Benefícios tributários, muitos deles não existentes nos países em que a legislação prevê a existência de bancos cooperativos; NÚMERO DE ASSOCIADOS AO COOPERATIVISMO DE CRÉDITO PERÍODO DEZ/16 JUN/2017 DEZ/17 JUN/18 SICOOB 3.553.138 3.735.558 3.940.977 4.163.767 SICREDI 3.478.478 3.581.730 3.703.901 3.836.562 UNICRED 179.157 187.320 189.334 196.889 CRESOL 469.445 452.680 468.492 486.227 CREDISIS 18.821 19.159 24.712 27.228 AILOS 546.519 581.062 616.206 658.552 CECRERS 17.129 24.980 24.649 24.191 CECOOPES 4.397 4.422 4.502 6.496 UNIPRIME 42.072 42.617 44.156 42.804 NÃO FILIADAS A CENTRAL 365.769 449.914 580.097 568.338 TOTAL 8.674.925 9.079.442 9.597.026 10.011.054 Tabela 2. Número de associados de cooperativas de crédito no Brasil Fonte: OCB 2015/FGCoop 2016 Fra nc sic o A tai lo Rod rig ue s d e O liv eir a 9 20 .99 0.3 33 -1 5 19 M. Port  Estímulo ao capital social nas cooperativas financeiras, aspecto inexistente nos bancos cooperativos, onde boa parte do patrimônio líquido é formada por reservas;  Possibilidade de os bancos cooperativos operarem também com clientes que não sejam associados, o que permitiu grande expansão em negócios, mas que, ao mesmo tempo, dificultou a propagação da filosofia cooperativista;  Existência, em alguns casos, de bancos cooperativos com ações negociadas em bolsas de valores;  Possibilidade de os bancos cooperativos atuarem em vários países, não tendo uma área de ação restrita, como no caso das cooperativas financeiras. O que se constata é que o modelo adotado em cada país é uma consequência de questões culturais, econômicas e legais, e que cabe a cada instituição financeira cooperativa atender às necessidades de seus associados, o que por si só já torna necessário que cada modelo se adapte às realidades locais, ou seja, não existe um modelo único que sirva para todos os países, ou mesmo que atenda as diferentes realidades regionais de um país como o Brasil. Atualmente, no Brasil, atuam em torno de 900 instituições financeiras cooperativas, com uma rede de atendimento de mais de 6.000 pontos e administrando algo em torno de 6% dos depósitos do país (SNCC, 2019). Quando somados todos os pontos de atendimento das instituições financeiras cooperativas do país, considerando-se como se fossem um conglomerado, estas possuem a maior rede de atendimento do país. Tabela 3. Instituições financeiras com maior rede de atendimento Fonte: BC/setembro-2018 UNIDADES DE ATENDIMANETO ORDEM INSTITUIÇÃO JUN/18 SET/18 VAR 1 Cooperativas de crédito 5.931 6.075 144 2 Banco do Brasil S. A. 4.759 4.765 6 3 Banco Bradesco S. A. 4.695 4.647 -48 4 Caixa Econômica Federal 3.386 3.379 -7 5 Itaú Unibanco S. A. 3.344 3.342 -2 Fra nc sic o A tai lo Rod rig ue s d e O liv eir a 9 20 .99 0.3 33 -1 5 Cooperativismo Financeiro no Brasil e no Mundo 20 De toda a rede de atendimento das cooperativas,81% encontra-se nas regiões Sul e Sudeste, regiões que também concentram cerca de 80% dos associados do país, o que demonstra que o modelo de negócios das cooperativas ainda está muito ligado ao contato presencial, à existência de uma rede de atendimento com boa capilaridade. Em termos de organização, a maioria das cooperativas são filiadas a algum sistema cooperativo, seja ele de 2 níveis (singulares e central) ou de 3 níveis (singulares, centrais e confederação), sendo os principais: Sicoob, Sicredi, Unicred, Ailos e Cresol. Figura 2. Pontos de atendimento no país Fonte: BC/setembro-2018 1 Classificação da informação: Uso Interno NORTE 249 NORDESTE 360 SUDESTE 2.153 CENTRO OESTE 546 SUL 2.767 UNIDADES DE ATENDIMENTO POR REGIÃO 5.806 5.868 5.931 6.075 DEZ/17 MAR/18 JUN/18 SET/18 UNIDADES DE ATENDIMENTO COOPERATIVO 1 Classificação da informação: Uso Interno NORTE 249 NORDESTE 360 SUDESTE 2.153 CENTRO OESTE 546 SUL 2.767 UNIDADES DE ATENDIMENTO POR REGIÃO 5.806 5.868 5.931 6.075 DEZ/17 MAR/18 JUN/18 SET/18 UNIDADES DE ATENDIMENTO COOPERATIVO Fra nc sic o A tai lo Rod rig ue s d e O liv eir a 9 20 .99 0.3 33 -1 5 21 M. Port 5. Legislação e Tipos de Cooperativas Ao longo da história do cooperativismo financeiro brasileiro, muitas foram as mudanças normativas que ocorreram. Apesar do grande retrocesso ocorrido nas décadas de 60 e 70, hoje a legislação aplicada às instituições financeiras cooperativas em nosso país é considerada uma das melhores do mundo. Uma das principais evoluções diz respeito à possibilidade de qualquer pessoa física ou jurídica poder se associar a uma cooperativa, neste caso em uma cooperativa de livre admissão de associados, cuja possibilidade foi reconhecida em 2003. Outro grande avanço foi a conquista de uma Lei Complementar própria (LC 130/09), que reconheceu muitos dos avanços que o cooperativismo financeiro havia conquistado na década anterior, mas que até aquele momento constavam apenas em Resoluções do Conselho Monetário Nacional. Tabela 4. Instituições financeiras com maior rede de atendimento Fonte: BC/setembro-2018 NÚMERO DE COOPERATIVAS SINGULARES PERÍODO SET/16 SET/17 SET/18 SICOOB 493 476 456 CRESOL 156 116 97 SICREDI 121 116 115 UNICRED 35 34 34 AILOS 14 13 13 CECRERS 10 8 6 CREDISIS 11 11 11 UNIPRIME 9 8 8 CECOOPS 4 4 7 NÃO FILIADAS A CENTRAL 196 197 191 TOTAL 1049 983 938 Fra nc sic o A tai lo Rod rig ue s d e O liv eir a 9 20 .99 0.3 33 -1 5 Cooperativismo Financeiro no Brasil e no Mundo 22 Ainda antes da Livre Admissão, no ano 2000 (Resolução nº 2.771), foi permitida a constituição de cooperativas de crédito rural e de crédito mútuo, neste caso formada por empregados ou servidores de entidades públicas ou privadas ou pessoas dedicadas a determinada profissão regulamentada ou atividade definida quanto à especialização e, em 2002 (Resolução nº 3.058), foi introduzida a possibilidade da formação de cooperativas de pequenos empresários, microempresários ou microempreendedores. Atualmente, as cooperativas classificadas como de Livre Admissão, que em quantidade respondem por 39% do total de cooperativas do país, respondem por cerca de 75% dos números do SNCC (Sistema Nacional de Crédito Cooperativo), demonstrando o quão importante foi o avanço normativo que em 2003 (Resolução 3.106) permitiu que as cooperativas atuassem de forma aberta, associando pessoas físicas e jurídicas de diferentes origens. Tabela 5. Quantidade de cooperativas por tipo de associação Fonte: BC/setembro-2018 QUANTIDADE DE COOPERATIVAS SINGULARES DE CRÉDITO EM FUNCIONAMENTO SEGMENTAÇÃO POR TIPO DE ASSOCIAÇÃO JUN/18 % SET/18 % VAR 2º TRIM Atividade Profissional 80 8,39 78 8,32 -2 Critérios de Associação Mistos - Empresários 25 2,62 25 2,67 0 Critérios de Associação Mistos - Outros 39 4,09 34 3,62 -5 Empregados ou Servidores Empresários 325 34,07 315 33,58 -10 Empresários 24 2,52 22 2,35 -2 Livre Admissão 353 37,00 368 39,23 15 Natureza Associativa ou Cadeia de Negócios 5 0,52 4 0,43 -1 Produtor Rural 103 10,80 92 9,81 -11 Total 954 100,00 938 100,00 -16 Fra nc sic o A tai lo Rod rig ue s d e O liv eir a 9 20 .99 0.3 33 -1 5 23 M. Port Tal normativo permitiu que as cooperativas ampliassem sua atuação mesmo para pequenos municípios, que normalmente não apresentariam viabilidade financeira para uma cooperativa que fosse focada em apenas um público específico, mas que sendo de livre admissão passaram a atender a comunidade inteira, chegando, em set/18, a um total de 576 municípios que contavam com uma cooperativa como única instituição financeira presente. Foi também o avanço da Livre Admissão que estimulou que os principais sistemas cooperativos avançassem na oferta de produtos e serviços, chegando ao ponto de ter em seu portfólio todas as ofertas encontradas nas demais instituições financeiras, tais como: consórcios, cartões de crédito e débito, adquirência, câmbio, seguros de todas as modalidades, diversas possibilidades de aplicações financeiras, empréstimos e financiamentos para todas as necessidades, inclusive crédito imobiliário, dentre outros. O portfólio atual de uma cooperativa Figura 3. Mapa de municípios que são atendidos apenas por cooperativas Fonte: IBGE e BC/setembro-2018 2 Classificação da informação: Uso Interno 7. Mapa de municípios que são atendidos apenas por cooperativas Fra nc sic o A tai lo Rod rig ue s d e O liv eir a 9 20 .99 0.3 33 -1 5 Cooperativismo Financeiro no Brasil e no Mundo 24 permite que uma pessoa física possa tranquilamente concentrar 100% de sua movimentação financeira em uma cooperativa, eliminando totalmente a dependência do sistema financeiro tradicional. Recentemente, em 2015, outra evolução normativa permitiu que qualquer cooperativa, mesmo que tenha tido sua origem como cooperativa segmentada ou rural, pudesse passar a atuar de portas abertas para a associação de qualquer pessoa. Esta importante mudança, instituída pela Resolução CMN 4.434/15, simplificou os tipos de cooperativas existentes, revogando o modelo em que existiam cooperativas de livre admissão, rurais ou segmentadas. Passaram a existir 3 tipos de cooperativas, classificadas agora conforme a complexidade dos produtos oferecidos e não mais de acordo com o público associado:  Cooperativas de Capital e Empréstimo: que não podem captar depósitos à vista ou a prazo;  Cooperativas Clássicas: caracterizadas por não poder operar com commodities, moeda estrangeira (operações de câmbio), ações (ou fundo de ações) e derivativos;  Cooperativas Plenas: que podem realizar todos os tipos de operações com seus sócios. A atual classificação, considerando o risco das operações realizadas, é que define o modelo de governança que cada cooperativa deve adotar:  Cooperativas de Capital e Empréstimo: observam o disposto na Lei 5.764/71, elegendo conselho de administração e diretoria (formada por presidente e vice-presidente). Neste caso, assim como foi quando da origem de todas as cooperativas, a diretoria executiva será composta pelo presidente e vice-presidente, associados estes eleitos em assembleia, que acumulam as funções estratégicas e executivas da cooperativa;  Cooperativas Clássicas: quando administram mais de R$ 50 milhões em ativos devem adotar estrutura de governança integrada por Conselho de Administração (eleito em assembleia) e Diretoria Executiva (contratada pelo Conselho). Nas situações em que administram menos de R$ 50 milhões não é obrigatória a segregação de funções, podendo a diretoria executiva ser composta pelo presidente e vice-presidente; Fra nc sic o A tai lo Rod rig ue s d e O liv eir a 9 20 .99 0.3 33 -1 5 25 M. Port  Cooperativas Plenas: devem adotar estrutura de governança integrada por Conselho de Administração e Diretoria Executivacontratada, devendo observar a segregação total de funções. A lógica é: quanto mais complexas as operações realizadas pela cooperativa maiores devem ser os conhecimentos e habilidades dos seus administradores. 6. Fidelização e Relacionamento Segundo Roberto Rodrigues, “o cooperativismo como doutrina, com seus valores, princípios, uma ética básica, todo um conjunto dogmático de regras, na verdade, só floresce em cooperativas dentro de três condições básicas. Primeiro, é preciso que haja uma necessidade, porque é um movimento de base. Então, a base deve sentir a necessidade e essa surge sempre de pressões externas que atrapalham alguma comunidade. Segundo, ela precisa ter viabilidade econômica. A cooperativa não tem a menor condição de ser uma “sociedade de poetas mortos”, não é uma encenação romântica, é uma empresa atuante. Então, tem de ter viabilidade econômica. E terceiro, precisa haver liderança, porque sem liderança, nada funciona bem.” Participar de uma cooperativa presume que as pessoas tenham, em grupo, ganhos maiores do que se estivessem sozinhas. Estes ganhos podem ser de ordem econômica, social, educacional, política, de relacionamento, qualidade dos produtos etc. Considerando-se estas afirmações, por qual motivo um sócio de cooperativa deixa de realizar suas operações financeiras com a sua cooperativa e o faz com um banco? A analogia que poderia ser feita é: o que leva um proprietário de um restaurante a almoçar no restaurante do vizinho e não no seu? Presumindo que uma cooperativa não esteja atendendo seus associados a contento, o modelo de gestão democrática, onde são os próprios sócios que aprovam as políticas e forma de atuação da cooperativa, deveria resolver a questão, com os próprios sócios se reunindo para avaliar e resolver as dificuldades que surgem em seu próprio negócio, voltando a garantir os ganhos de escala (e qualidade nos produtos e serviços) para todos. A gestão democrática traz para uma cooperativa um importante diferencial que não existe em um banco tradicional, os associados podem influenciar na gestão da cooperativa, enquanto que em um banco um cliente será sempre um cliente. Cabe aqui uma afirmação de Leonardo Boesche, superintendente do Sescoop/ PR: “as cooperativas não têm sócios, são os sócios que tem uma cooperativa”. Fra nc sic o A tai lo Rod rig ue s d e O liv eir a 9 20 .99 0.3 33 -1 5 Cooperativismo Financeiro no Brasil e no Mundo 26 Com relação à fidelização e relacionamento, volta a ter grande importância o 5º princípio cooperativo, o da “educação, formação e informação”. É por meio da educação cooperativista que os associados conhecem seus direitos e deveres. Neste aspecto é louvável o trabalho de organização do quadro social realizado por muitas cooperativas, doutrinando seus associados e esclarecendo o que é e como funciona uma cooperativa, uma empresa de propriedade coletiva que deve buscar o bem comum de todos. Ainda quanto ao tema fidelização, as cooperativas demonstram grande força no interior, em pequenos municípios, notadamente naqueles com menos de 30 mil habitantes. A imagem abaixo demonstra que, em nov/2018, 51% dos associados de cooperativas residiam em municípios com menos de 50 mil habitantes, enquanto que em nível nacional 32% da população reside nestes municípios. Significa que as cooperativas têm uma adesão muito grande em municípios menores. Demonstra também o grande desafio, ou oportunidade, que existe nos municípios com população superior a 250 mil habitantes, onde residem 42% dos brasileiros, mas que, ao analisar os associados de cooperativas, só encontramos 22% dos sócios nestes grandes municípios. Figura 4. Onde residem os associados Fonte: Banco Central do Brasil - Censo dos Cooperadores Elaboração: Portal do Cooperativismo Financeiro Fra nc sic o A tai lo Rod rig ue s d e O liv eir a 9 20 .99 0.3 33 -1 5 27 M. Port Uma questão que deve ser checada nas cooperativas, provavelmente com grande aderência na maioria delas, é que a Regra de Pareto, ou Lei 80/20, criada pelo economista Vilfredo Pareto, que prega que 80% de alguma coisa tem como fato gerador 20% de um público, é realidade também nas cooperativas. No caso das cooperativas significa dizer que 80% do faturamento ou dos negócios de uma cooperativa são oriundos de 20% dos associados. Poderia ser também que 80% dos cheques devolvidos em uma cooperativa são oriundos de 20% dos emissores de cheques sem fundos, o que significa que resolvendo a situação destes 20% (e não a postergando) reduz-se as devoluções em 80%. É muito provável que 80% dos números de determinada cooperativa (associados, depósitos, crédito, sobras) sejam oriundos de 20% de seus pontos de atendimento. A lógica de Pareto é que esta regra pode ser encontrada em qualquer lugar, com qualquer assunto, fato que já foi amplamente testado e comprovado. Esta lógica vale também para o número de associados no país, onde 80% dos associados são oriundos de 20% dos municípios. Fato interessante de ser analisado é que, enquanto os bancos cresceram menos de 15% nos últimos 15 anos, as cooperativas cresceram acima de 20% no mesmo período. Diante desta estatística fica o questionamento sobre: o que faz com que as cooperativas cresçam mais? Respostas rápidas poderiam indicar: a) o fato de serem menores do que os bancos, portanto crescer percentualmente é mais fácil; b) a maior proximidade e a identidade local. Estas respostas podem, sim, estar presentes como parte da explicação, mas, além delas, temos outros aspectos bastante relevantes que deveriam ser considerados e que, ao coexistirem, apresentam grande força:  Grande rede de atendimento;  Ampliação do foco de atuação, com a livre admissão;  Possuem os mesmos produtos e serviços que os bancos;  Tem, normalmente, uma marca conhecida, conquistada através da união das cooperativas em torno de sistemas cooperativos;  Praticam preços justos, ou adequados ao mercado;  Buscam oferecer um atendimento diferenciado;  Reinvestem os recursos na região (captação e empréstimos), diferente dos bancos que podem captar recursos em uma região do país e emprestar em outra totalmente diferente;  Distribuem as sobras entre os associados, na proporção dos negócios que cada um fez com a cooperativa; Fra nc sic o A tai lo Rod rig ue s d e O liv eir a 9 20 .99 0.3 33 -1 5 Cooperativismo Financeiro no Brasil e no Mundo 28  A administração da cooperativa é feita pelos próprios associados, eleitos em assembleia;  Houve um importante avanço regulatório recente (últimos 15 anos);  Grandes investimentos em tecnologia, buscando não ficar para trás em um mercado que tem avançado rapidamente. 7. Modelo de Governança No aspecto governança, deve ser levada em conta a grande diversidade que existe no cooperativismo financeiro brasileiro. Das mais de 900 cooperativas existentes, cerca de 50% administram ativos inferiores a R$ 50 milhões e não tem nenhum ponto de atendimento além da sede. Várias destas cooperativas são formadas por menos de 2.000 pessoas. Na outra ponta, temos cooperativas que já ultrapassaram o montante de R$ 5 bilhões em ativos e várias com mais de 100 mil associados. Qual o modelo de governança adequado para cada uma delas? Como deveria ser uma assembleia em uma cooperativa pequena e em uma grande? Qual o tamanho adequado para uma cooperativa de forma a manter os associados próximos o suficiente da gestão? O certo é que: o que hoje pode fazer sentido para uma cooperativa, pode não ter importância para outra neste mesmo momento. Apesar disto, de todo o avanço normativo conquistado pelas cooperativas, talvez um dos maiores desafios seja conquistar e avançar na maturidade em termos de governança, colocando ao menos em discussão com os associados, as chamadas (boas) práticas de governança corporativa tão disseminadas na última década. Entende-se por Governança Corporativa a forma como as sociedades são geridas, envolvendoo relacionamento entre associados, conselho de administração, diretoria executiva, auditoria independente, conselho fiscal e demais interessados (stakeholders). Caracterizadas como sociedades de pessoas, e não de capital, as cooperativas têm na união de indivíduos, pela adesão voluntária e livre, na gestão democrática, na participação econômica dos membros e na autonomia e independência, princípios basilares de sua gestão. As cooperativas são administradas por seus associados, que são os “donos do negócio”, tendo cada associado direito a um voto, independentemente do valor de seu capital social. Fra nc sic o A tai lo Rod rig ue s d e O liv eir a 9 20 .99 0.3 33 -1 5 29 M. Port A estrutura de governança de uma cooperativa pode ser demonstrada pelo organograma abaixo: A assembleia geral dos associados é o órgão máximo da cooperativa e dentro dos limites legais e estatutários, tem poderes para decidir os negócios relativos ao objeto da cooperativa e zelar pelo seu desenvolvimento e defesa, sendo que suas deliberações vinculam a todos, ainda que ausentes ou discordantes. Esta característica, de ser a instância máxima de governança, exige que todos os esforços sejam realizados para que haja efetiva participação e representatividade dos associados nas assembleias, ou seja, garantir que os associados estejam presentes e que tenham condições de manifestar sua opinião. Figura 5. Organograma de uma cooperativa Fra nc sic o A tai lo Rod rig ue s d e O liv eir a 9 20 .99 0.3 33 -1 5 Cooperativismo Financeiro no Brasil e no Mundo 30 É na assembleia geral que ocorre a eleição do Conselho de Administração (Consad), o guardião do objeto social e do sistema de governança, o elo entre a propriedade e a gestão. É ele que decide os rumos do negócio, conforme o melhor interesse da organização. É também o responsável por apoiar e supervisionar continuamente a gestão da organização com relação aos negócios, aos riscos e às pessoas. O Consad não deve interferir em assuntos operacionais, mas deve ter a liberdade de solicitar as informações necessárias ao cumprimento de suas funções, inclusive a especialistas externos, quando necessário. Sendo a cooperativa administrada por associados, que são eleitos pelo conjunto de associados, é recomendável a adoção de práticas que garantam que os eleitores de fato se sintam representados por quem tenha sido eleito e que seja garantida a alternância dos conselheiros eleitos, sejam eles conselheiros de administração, fiscal ou presidente e vice-presidente, de forma que seja evitada a permanência no poder de um pequeno grupo de pessoas, por décadas, o que por vezes provoca o afastamento dos associados. Neste sentido, por exigência do Conselho Monetário Nacional (Resolução 4.538/16), as cooperativas devem aprovar em assembleia sua Política de Sucessão, registrando como será feita a identificação, preparação e indicação de pessoas que tenham condições de assumir cargos relevantes na cooperativa. A dificuldade está na implementação desta política, que até o momento ainda está no papel, o que continua provocando o surgimento de chapas contrárias à gestão atual, buscando conter a perpetuidade no poder ou a busca por trazer a cooperativa para mais próximo dos interesses dos associados. Alguns aspectos podem ajudar no processo de governança de uma cooperativa:  A adoção de ferramentas de avaliação de desempenho dos atuais conselheiros, garantindo que a cada eleição sejam reeleitos os melhores conselheiros e que sejam substituídos aqueles cuja contribuição é menos relevante. Este tema é de fundamental importância pois, em muitas situações, existe a dificuldade de embasar os motivos pelos quais um conselheiro será indicado para reeleição e outro não, resultando em indicações baseadas em vínculos de amizade ou companheirismo. Em uma avaliação Fra nc sic o A tai lo Rod rig ue s d e O liv eir a 9 20 .99 0.3 33 -1 5 31 M. Port de desempenho todos os conselheiros, de forma eletrônica e secreta, votam e são votados, sempre sendo comparados entre si, respondendo a uma pergunta básica: qual o conselheiro que mais contribui nas reuniões do conselho?;  A adoção do voto eletrônico e secreto nas assembleias, garantindo que os associados se sintam à vontade para manifestar sua opinião sobre a gestão da cooperativa. Quantos são os associados que se manifestam de forma contrária ou que se abstém em uma assembleia? É difícil de acreditar que em um público de 100, 200 ou mais pessoas presentes em uma assembleia todos pensem de forma igual e, portanto, votem da mesma forma;  A definição de critérios balizadores que ajudem a identificar o momento em que cada associado deveria dar espaço para outro associado, tanto para ocupar cargos de conselheiros como para presidente e vice. Critérios que poderiam ser considerados são: a) a avaliação de desempenho; b) um limite à quantidade de mandatos/ reeleições (3 ou 4, por exemplo); c) um limite de idade para concorrer (65 ou 70 anos, por exemplo). Já com relação à Diretoria Executiva, esta é responsável pela execução das diretrizes fixadas pelo Conselho de Administração (Consad) e deve prestar contas de sua atuação ao Consad, ao Conselho Fiscal (Confis) e às instâncias de auditoria. O Conselho Fiscal deve ser órgão independente da administração da cooperativa, subordinado exclusivamente à Assembleia Geral e com o objetivo de fiscalização como representante dos interesses dos associados. A mais importante competência do Conselho Fiscal é a de fiscalizar os atos dos administradores (Consad e Diretoria Executiva), e verificar o cumprimento de seus deveres legais e estatutários, entendendo como atos dos administradores qualquer ato de gestão praticado, seja pelo administrador ou, por delegação de autoridade, por qualquer colaborador da cooperativa. Fra nc sic o A tai lo Rod rig ue s d e O liv eir a 9 20 .99 0.3 33 -1 5 Cooperativismo Financeiro no Brasil e no Mundo 32 8. Balanço Social Diferente das empresas tradicionais, uma cooperativa não pode ser avaliada simplesmente através de uma análise de balanço. Em uma empresa cooperativa, assim como em um iceberg, existem vários aspectos que devem ser considerados e que não estão visíveis a olho nu. Em uma cooperativa, normalmente, os sócios e a comunidade percebem apenas uma pequena parte do impacto da cooperativa. Como seria determinada cidade ou região caso a cooperativa não existisse? Alguma outra instituição financeira assumiria o papel que a cooperativa desempenha? Haveriam instituições financeiras em pequenos municípios caso não existissem cooperativas? Além destes aspectos que possivelmente são mais fáceis de serem avaliados, é importante buscar avaliar o impacto social que a cooperativa gera, podendo, para tanto, serem avaliados pontos como:  Qual o nível de empreendedorismo que haveria na região caso não existisse uma cooperativa atuando?  Quais os investimentos que a cooperativa faz em forma de mão de obra ou de recursos financeiros em benefício da educação ou de entidades de representação?  Qual a economia gerada para os associados por conta dos preços mais competitivos do que outras instituições financeiras ou pelas sobras distribuídas? Fra nc sic o A tai lo Rod rig ue s d e O liv eir a 9 20 .99 0.3 33 -1 5 33 M. Port Recapitulando!As instituições financeiras cooperativas têm crescido significativamente em importância no Brasil nas últimas duas décadas, tendo atingido um número de 10 milhões de associados em 2018. O crescimento rápido trouxe consigo oportunidades de melhoria na oferta dos produtos e serviços e no modelo de governança. Muitas das cooperativas oferecem a seus membros os mesmos produtos e serviços que são encontrados nos bancos tradicionais, tendo como diferenciais a prática de preços mais justos, a distribuição das sobras, o estímulo ao desenvolvimento local e regional e a gestão realizada por pessoasda própria região. Conhecer adequadamente a forma de funcionamento de uma cooperativa, além dos princípios e valores do cooperativismo, é fundamental para que os associados exerçam de forma adequada seus direitos e deveres. Fra nc sic o A tai lo Rod rig ue s d e O liv eir a 9 20 .99 0.3 33 -1 5 Cooperativismo Financeiro no Brasil e no Mundo 34 9. Referências Fundo Garantidor do Cooperativismo de Crédito [FGCOOP] <http://www.fgcoop.coop.br> Meinen, Ê; Port, M. 2014. Cooperativismo Financeiro: percurso histórico, perspectivas e desafios. Confebras: Brasília, DF, Brasil. Portal do Cooperativismo Financeiro <https://www.cooperativismofinanceiro.coop.br> Sistema Nacional de Crédito Cooperativo [SNCC]. Disponível em: http://www.fgcoop.coop. br/rel-trim-2018 Fra nc sic o A tai lo Rod rig ue s d e O liv eir a 9 20 .99 0.3 33 -1 5 Fra nc sic o A tai lo Rod rig ue s d e O liv eir a 9 20 .99 0.3 33 -1 5 Fra nc sic o A tai lo Rod rig ue s d e O liv eir a 9 20 .99 0.3 33 -1 5
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