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Redes Sociais e Historiografia

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BRUNA CAROLINA MARINO RODRIGUES 
 
 
 
 
NAVEGANDO PELO PASSADO: AS REDES SOCIAIS E OS 
PROBLEMAS DA HISTORIOGRAFIA NA ERA DIGITAL 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
Londrina 
2019 
 
 
BRUNA CAROLINA MARINO RODRIGUES 
 
 
 
 
 
NAVEGANDO PELO PASSADO: AS REDES SOCIAIS E OS 
PROBLEMAS DA HISTORIOGRAFIA NA ERA DIGITAL 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
Dissertação apresentada ao Programa de Pós-
Graduação em História Social do 
Departamento de História da Universidade 
Estadual de Londrina, como requisito à 
obtenção do título de mestre em História 
Social. 
 
 
Orientadora: Maria Renata da Cruz Duran 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
Londrina 
2019 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
Ficha de identificação da obra elaborada pelo autor, através do Programa de 
Geração Automática do Sistema de Bibliotecas da UEL 
 
 
 
Rodrigues, Bruna Carolina Marino. 
NAVEGANDO PELO PASSADO: REDES SOCIAIS E OS PROBLEMAS DA 
HISTORIOGRAFIA NA ERA DIGITAL / Bruna Carolina Marino Rodrigues. - Londrina, 
2019. 
244 f.: il. 
 
Orientador: Maria Renata da Cruz Duran. 
Dissertação (Mestrado em História Social) - Universidade Estadual de Londrina, Centro 
de Letras e Ciências Humanas, 2019. 
Inclui bibliografia. 
1. História - Tese. 2. Redes Sociais - Tese. 3. História Digital - Tese. 4. Historiografia - 
Tese. I. Duran, Maria Renata da Cruz. II. Universidade Estadual de Londrina. Centro de 
Letras e Ciências Humanas. III. Título. 
 
 
BRUNA CAROLINA MARINO RODRIGUES 
 
 
 
 
 
NAVEGANDO PELO PASSADO: AS REDES SOCIAIS E OS 
PROBLEMAS DA HISTORIOGRAFIA NA ERA DIGITAL 
 
BANCA EXAMINADORA 
 
____________________________________ 
Orientador: Prof. Drª Maria Renata da Cruz 
Duran 
Universidade Estadual de Londrina - UEL 
 
 
____________________________________ 
Prof. Drª Márcia Elisa Teté Ramos 
Universidade Estadual de Maringá- UEM 
 
 
 
____________________________________ 
Prof. Drº Sérgio Amadeu da Silveira 
Universidade Federal do ABC– UFABC 
 
 
 
 
Londrina, 9 de agosto de 2019. 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
Dedico esta dissertação a Fábio Tuani, Marta 
Lúcia, José Luiz e Rafael. 
 
 
 
AGRADECIMENTOS 
 
 
Agradeço a minha orientadora Maria Renata da Cruz Duran pelo incentivo, pelas 
trocas de ideias e pela confiança que depositou no meu trabalho. Por isso, meu muito 
obrigada por estar comigo nesses anos enriquecendo meus conhecimentos com sua 
experiência e pela dedicação que sempre teve comigo. Agradeço também a Bruno Leal 
Pastor de Carvalho pelas trocas de ideias que foram inspiradoras e contribuíram muito 
para realização dessa pesquisa. À Marcia Teté Ramos e Francisco Ferraz pelas 
sugestões que contribuíram para o amadurecimento e enriquecimento do trabalho. E a 
Sérgio Amadeu da Silveira pelas discussões e sugestões inspiradoras para essa 
dissertação que certamente contribuirão para a sua continuação. Agradeço também a 
cada um dos docentes(a) do curso de História da Universidade Estadual de Londrina 
que me acompanharam na graduação e no mestrado, sem vocês eu não seria a 
pesquisadora que sou hoje. Muito Obrigada. 
 A minha família meu pai José e minha mãe Marta por terem acreditado no meu 
sonho de cursar a graduação e o mestrado em História em uma universidade pública e 
por terem investido nesse sonho. - Eu sei que não foi fácil para vocês, mas mesmo com 
dificuldades acreditaram no meu potencial me apoiando em todos os momentos. 
Agradeço especialmente minha mãe Marta Lúcia que me ensinou que o conhecimento 
nos liberta das amarras que a vida nos impõe e me ensinou que na vida vamos travar 
muitas batalhas, sobretudo porque ser mulher nesse mundo é lutar duas vezes mais. Ao 
meu irmão Rafael Marino que com sua curiosidade de criança me motiva todos os dias e 
claro que estudar tecnologia sem ele não teria a mesma graça e motivação, é muito 
inspirador aprender com ele, pois a vida é uma aprendizado constante! 
A minha vó Chica (in memorian) e o vô Lando ( in memorian) por terem 
cativado desde criança o meu gosto pela leitura . E por fim, agradeço a meu amor Fábio 
Tuani por ter estado ao meu lado nessa caminhada de angústias e de anseios do universo 
acadêmico e por acreditar nos meus ideais. E também a todos que desacreditaram, vocês 
também foram importantes nessa jornada ! 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
No final do século XX, neste nosso tempo, um 
tempo mítico, somos todos quimeras, híbridos 
– teóricos e fabricados – de máquina e 
organismo; somos, em suma, ciborgues 
(Donna Haraway, 1985). 
 
 
RODRIGUES, Bruna Carolina Marino. Navegando pelo passado: as Redes Sociais e 
os problemas da Historiografia na Era Digital. 2019. Dissertação (Mestrado em 
História Social) – Universidade Estadual de Londrina, LONDRINA, 2019. 
 
 
RESUMO 
 
 
Esta pesquisa tem por objetivo investigar as transformações que estão se processando 
no campo da História com o impacto da “virada digital” na primeira metade do século 
XXI. Contudo, o relacionamento entre História e tecnologia não nos remente apenas ao 
tempo presente e às transformações da cultura digital no ofício dos historiadores, mas 
também está articulada as mudanças de paradigma que estão se processando na cultura 
ocidental. Por isso, apresentamos um debate teórico sobre o conceito de tecnologia 
como um problema histórico no campo das ciências humanas. Assim, guiados pelas 
reflexões desses teóricos, veremos como questões relacionadas as práticas sociais no 
trabalho, nas sociabilidades, na cultura de massas ao entretenimento e na transmissão e 
recepção do conhecimento na sociedade foram sendo ressignificadas a partir das 
tecnologias digitais e do advento da internet. Por sua vez, como constatamos, a História 
foi impactada pela “virada digital” e a tecnologia não será vista somente como 
ferramenta de pesquisa, mas como categoria analítica que modifica o conhecimento e 
produz a cultura digital transformando a História e a sociedade. Dessa forma, 
discorremos sobre as modificações que as mídias e redes sociais estão provocando na 
cultura contemporânea, a fim de compreender como essas transformações se projetam 
nos modos de emissão e recepção da História através da internet na web e na 
configuração de novas práticas sociais. Com isso, analisaremos como o ofício dos 
historiadores foi impactado a partir do caso da rede social criada no âmbito da internet 
brasileira intitulada Café História (2008-2017), que atualmente transformou-se em um 
Portal de divulgação da História e não se encontra mais online, estando disponível 
apenas através de um arquivo da web, intitulado The Internet Archive (1996). De todo 
modo, essa pesquisa só foi possível pelo arquivo da web, The Internet Archive (1996), 
que recuperou e preservou o passado digital da rede social pela interferência de agentes 
não humanos na produção da evidência histórica. Consoante, foi necessário empreender 
uma discussão que demonstrasse como a tecnologia ou social machines têm interferido 
nas relações dos historiadores digitais e de suas fontes digitais. Sendo assim, 
investigaremos as novas práticas sociais que surgiram da cultura digital e que foram 
materializadas na rede social Café História (2008-2017) por historiadores e pelo público 
não especialista. Nesta análise buscamos compreender como essas novas práticas 
transformaram a produção e divulgação do conhecimento histórico na cultura 
contemporânea, criando novas sociabilidades e práticas de pesquisa digitais no contexto 
brasileiro. 
 
 
 
RODRIGUES, Bruna Carolina Marino. Surfing through the past: Social Networks 
and the issues of Historiography in the Digital Era. 2019. Thesis (Master’s degree in 
Social History) – Universidade Estadual de Londrina, LONDRINA, 2019. 
 
 
ABSTRACT 
 
 
This research aims at investigatingthe changes that are being processed in the field of 
History given the impact of the “digital turn” in the first half of the 21st century. 
However, the relationship between history and technology not only brings us back to 
the present time and the transformations of digital culture in the craft of historians, but 
also articulates the paradigm shifts that are taking place in Western culture. Therefore, 
we present a theoretical debate on the concept of technology as a historical problem in 
the field of human sciences. Thus, guided by the reflections of these theorists, we will 
see how issues related to social practices at work, sociability, mass culture to 
entertainment and the transmission and reception of knowledge in society have been 
resignified from digital technologies and the advent of the internet. In turn, as we have 
seen, history has been impacted by the “digital turn” and technology will not only be 
seen as a research tool, but as an analytical category that modifies knowledge and 
produces digital culture transforming history and society. Accordingly, we shall address 
the changes that social media and networks are causing in contemporary culture in order 
to understand how these transformations are projected in the means for conveying and 
receiving History through the Internet on the Web, as well as in the molding of new 
social practices. From there, we shall analyze how the work of historians was impacted 
from the perspective of the social networking website, created in the scope of the 
Brazilian Web, named Café História [History Coffeehouse] (2008-2017), which is 
currently a Web Portal for disseminating History and is no longer online, and it is only 
available through a Web archive, named The Internet Archive (1997). Anyway, this 
research was only possible due to the Web archive The Internet Archive (1996), which 
retrieved and maintained the digital records of the social networking website through 
interference of non-human agents in the production of historical evidence. Accordingly, 
it was necessary to promote a discussion that would demonstrate how technology or 
social machines have been interfering in the relationships of digital historians and their 
digital sources. Hence, we investigated the new social practices that emerged from the 
digital culture and that were materialized on the social networking Café História (2008-
2017) by historians and by the non-specialist general public. Through this analysis we 
seek to understand how these new practices have transformed the production and 
dissemination of historical knowledge in contemporary culture, creating new 
sociabilities and digital research practices within the Brazilian context. 
 
 
 
 
 
LISTA DE FIGURAS 
 
 
Figura 1 -Página inicial The Internet Archive ........................................................................ 157 
Figura 2 - Sede do The Internet Archive. Biblioteca Alexandrina. São Francisco, Califórnia .. 158 
Figura 3- Hardware do The Internet Archive exposto na sede ................................................ 160 
Figura 4 - Espaço onde se guarda o Hardware com 35 petabytes de dados ............................. 161 
Figura 5- Wabac Machine ..................................................................................................... 162 
Figura 6 - Pesquisa preliminar rede social Café História........................................................ 163 
Figura 7 -Calendário de Snapshots Café História .................................................................. 164 
Figura 8 -Arquivo da web e perfil da autora Brunacmr .......................................................... 166 
Figura 9 - Site buscador Cadê? .............................................................................................. 175 
Figura 10 Canal mIRC #RioPreto .......................................................................................... 177 
Figura 11- Primeiro Design da rede social Café História ....................................................... 184 
Figura 12 - Página da rede social Café História, The Internet Archive. .................................. 185 
Figura 13- Página da rede social Café História ...................................................................... 188 
Figura 14 - Página principal do Café História........................................................................ 190 
Figura 15 - Página do Café História em 2010 ........................................................................ 191 
Figura 16 - Página inicial Café História, 2013 ....................................................................... 192 
Figura 17 - Página inicial, 2013 ............................................................................................. 194 
Figura 18- Registrando seu perfil na rede .............................................................................. 198 
Figura 19 - Perfil usuário - blog ............................................................................................ 199 
Figura 20 -Página 1 Fórum “Como era construído a imagem da mulher no Brasil Colônia ..... 202 
Figura 21 - Página 2 Fórum “Como era construído a imagem da mulher no Brasil Colônia” .. 202 
Figura 22- Perfil do historiador Jurandir Malerba .................................................................. 206 
Figura 23 Perfil de José D’ Assunção Barros ......................................................................... 207 
Figura 24 Portal Café História, 2017. .................................................................................... 217 
Figura 25- Representação de um grafo de relações da rede social Café História, onde os nós 
(esfera azul) são as pessoas e as arestas significam os laços sociais que as unem ................... 219 
file:///D:/Dissertação/Dissertação%20Bruna%20C%20M%20Rodrigues.doc%23_Toc18162696
file:///D:/Dissertação/Dissertação%20Bruna%20C%20M%20Rodrigues.doc%23_Toc18162696
 
 
 
LISTA DE QUADROS 
 
 
 
Quadro 1 - Crítica hermenêutica da fonte digital.................................................................... 150 
Quadro 2 - Procedimentos para a análise de um documento da web ....................................... 153 
Quadro 3 - Tipo de laços e interações no Café História ......................................................... 204 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
LISTA DE GRÁFICOS 
 
 
Gráfico 1 - Crescimento dos usuários da rede (2008-2017) ........................................ 200 
Gráfico 2 – Crescimento das Páginas arquivadas pela Wayback Machine .................. 214 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
LISTA SIGLAS E ABREVIATURAS 
 
 
 
Bit Net Because It’s Time Network 
BNCC Base Nacional Comum Curricular 
CETIC Centro Regional de Estudos para o Desenvolvimento da Sociedade da 
Informação 
CNPq Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico 
EaD Educação à Distância 
Embratel Empresas Brasileiras de Telecomunicações 
FAPESP Fundação do Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo 
IBOPE Instituto Brasileiro de Opinião Pública 
LNCC Laborátorio de Ciência e Computação 
Rea Recursos Educacionais Abertos 
ONU Organização das Nações Unidas 
OCDE Organizações para Cooperação do Desenvolvimento Econômico 
TICs Tecnologias da Informação e Comunicação 
USP Universidade de São Paulo 
UFRJ Universidade Federal do Rio de Janeiro 
UFJF Universidade Federal de Juiz de Fora 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
SUMÁRIO 
INTRODUÇÃO .........................................................................................................17 
CAPÍTULO 1: TECNOLOGIA: UM PROBLEMA HISTÓRICO? ...................... 23 
1.1 HISTÓRIA E TECNOLOGIA: MODOS DE PRODUÇÃO, TRABALHO E CIÊNCIA .................. 25 
1.1.2. TECNOLOGIA E INDÚSTRIA CULTURAL: A MISTIFICAÇÃO DAS MASSAS ........................ 31 
1.1.3. MUDANÇA TECNOLÓGICA E CIENTÍFICA: CAPITALISMO E TRABALHO NO SÉCULO XX . 41 
1.1.4. MODERNIDADE/ MODERNISMO E PÓS-MODERNIDADE/ PÓS-MODERNISMOS ................. 53 
1.1.5 DA SOCIEDADE PÓS-INDUSTRIAL À SOCIEDADE EM REDE ............................................. 66 
1.2 TECNOLOGIA, HISTÓRIA E CULTURA .............................................................................. 75 
1.2.1 MEIOS DE COMUNICAÇÃO, TECNOLOGIA E HISTÓRIA ................................................... 77 
1.2.2 TECNOLOGIA E CIBERCULTURA: A REALIDADE CONSTRUÍDA EM AMBIENTES DIGITAIS . 88 
1.2.3 DAS PRÁTICAS ESCRITAS ÀS DIGITAIS: A TEXTUALIDADE ELETRÔNICA E A HISTÓRIA. 102 
CAPÍTULO 2: Redes Sociais: uma nova historiografia ? ..................................... 123 
2.1 AS MÍDIAS SOCIAIS NA CULTURA CONTEMPORÂNEA ..................................................... 125 
2.1.2 REDES SOCIAIS ONLINE E A CULTURA DE MASSAS ...................................................... 131 
2.1.3 O PÚBLICO/ PRIVADO NAS REDES SOCIAIS.................................................................. 134 
2.1.4 SOCIABILIDADES DIGITAIS: A EMERGÊNCIA DE NOVAS PRÁTICAS SOCIAIS ONLINE ..... 137 
2.1.5 A MEMÓRIA ONLINE NAS REDES SOCIAIS ................................................................... 140 
2.1.6 REDES SOCIAIS: ESPAÇOS DE DIVULGAÇÃO DO CONHECIMENTO E DA CIÊNCIA ONLINE
 ......................................................................................................................................... 143 
2.2 RUMO A UM NOVO HISTORICISMO DIGITAL? ................................................................. 148 
CAPÍTULO 3: MEMÓRIA DA REDE X MEMÓRIA NA REDE: DO THE 
INTERNET ARCHIVE AO CAFÉ HISTÓRIA ..................................................... 156 
3.1 THE INTERNET ARCHIVE COMO FERRAMENTA DE PESQUISA HISTÓRICA: RECUPERANDO E 
RECRIANDO O PASSADO DIGITAL ....................................................................................... 156 
3.2 A REDE SOCIAL CAFÉ HISTÓRIA: DO ONLINE PARA O PASSADO DIGITAL ...................... 167 
3.2.1 CULTURA DIGITAL NO BRASIL .................................................................................. 170 
3.2.2 AS INTERFACES DA REDE SOCIAL CAFÉ HISTÓRIA ..................................................... 183 
 
 
3.2.3 OS USUÁRIOS E AS DINÂMICAS NA REDE SOCIAL CAFÉ HISTÓRIA............................... 197 
3.2.4 A ESFERA PÚBLICA NA REDE SOCIAL CAFÉ HISTÓRIA ................................................ 208 
3.2.5 A DESATIVAÇÃO DA REDE SOCIAL CAFÉ HISTÓRIA: DE REDE SOCIAL PARA PORTAL DE 
DIVULGAÇÃO DA HISTÓRIA ................................................................................................ 212 
2.3.6 A REDE SOCIAL CAFÉ HISTÓRIA: REDES DE SOCIABILIDADE E PRÁTICAS DIGITAIS ENTRE 
OS HISTORIADORES BRASILEIROS ONLINE .......................................................................... 217 
CONCLUSÃO ......................................................................................................... 225 
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS ................................................................... 231 
FONTES .................................................................................................................. 242 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
17 
 
INTRODUÇÃO 
 
Marc Bloch no livro Apologia da História: ou ofício do historiador (1949) 
buscou definir o trabalho do historiador como um ofício, mas também investigar suas 
práticas e seus objetivos científicos para além da ciência, preocupando-se em questionar 
o fazer histórico e quanto ao método, aos objetos e a documentação histórica, refutando 
à ideia de história objetiva construída no século XIX pelos historiadores1. 
Bloch demonstrou que os objetos históricos só têm movimento nas sociedades 
humanas pelas significações que os homens lhes atribuem, isto é, para Bloch são as 
questões que condicionam os objetos e não o oposto. Com isso, “a história é busca, 
portanto escolha. Seu objeto não é o passado: a própria noção segundo a qual o passado 
enquanto tal possa ser objeto de ciência é absurda. Seu objeto é o homem, ou melhor, os 
homens, e mais precisamente homens no tempo” (BLOCH, 1949, p.54). Para o autor, 
que renovou a historiografia com seus trabalhos, a busca por novos objetos a partir de 
questões contemporâneas seria essencial para a atualização, se não para a legitimação, 
da História como campo de saber. Não por acaso, o tempo de Bloch não era tão 
diferente do nosso e a busca por uma historiografia reflexiva, bem como a crítica aos 
métodos e às práticas do seu ofício se encontram tão vivas no presente como em sua 
época. 
Mediante movimentos sucessivos, mas nem sempre lineares, a historiografia 
contemporânea tem se renovado constantemente ampliando seus objetos de estudos e 
trazendo para seu campo de pesquisa métodos e abordagens interdisciplinares aliadas a 
outras ciências humanas, a saber: sociologia, antropologia, filosofia, linguística, 
comunicação etc. (LE GOFF, 1990). Todavia, na medida em que a historiografia 
adquiria uma “consciência” histórica de sua historicidade e relatividade, a descrença nas 
utopias criadas pela modernidade, que acompanhadas das catástrofes políticas e sociais 
geradas por duas grandes guerras no século XX instauraram uma crise da razão e das 
certezas que se afirmavam na produção da História durante as décadas de 1970 a 1980. 
Crise está que incidiu na descrença dos modelos explicativos teleológicos, das 
 
1 Não é raro classificar esses historiadores como positivistas. Nesse sentido, há duas distinções correntes 
para o uso do conceito História. Primeiramente o termo história significa a experiência da passagem do 
tempo de homens e mulheres no mundo e que se relaciona com a sociedade e a natureza criando modos 
de viver. Já a segunda remete a História enquanto campo do conhecimento e de pesquisa e de 
interpretação desenvolvida pelo historiador (MALADIAN, 2018). De todo modo, queremos explicitar 
que, neste texto, quando utilizamos o termo História nos referimos a um campo do conhecimento 
científico que compreende métodos e práticas de pesquisa. 
18 
 
metanarrativas, da perda de historicidade, fragmentação do tempo e da história e do 
modelo de análise serial e quantitativo dos Annales. Por sua vez, a crise também esteve 
associada a uma crise mais geral e que para além das ciências humanas esteve 
relacionada a uma crise do conhecimento científico na sociedade, onde as utopias 
científicas não davam conta de estabelecer a harmonia e o progresso dela esperados em 
um mundo em colapso (BARROS, 2010). 
De todo modo, a crise que se vislumbrava no mundo no final do século XX 
também desenhava o começo de um novo mundo social, cultural e econômico, que 
devido aos avanços científicos e tecnológicos engendrava a formação de redes 
informacionais de comunicação, reconfigurando as estruturas sociais a partir de um 
novo modo de produção, de relações de trabalho, comunicação e sociabilidades. A 
tecnologia e seus avanços através da internet e das tecnologias digitais possibilitaram, 
portanto, o surgimento da cultura digital2 no tempo presente empreendendo uma 
transformação na cultura ocidental. 
 Nesses termos, a tecnologia se tornou uma dimensão essencial no mundo 
contemporâneo estendendo suas influências em todas as esferas da vida social, de tal 
forma que o modus operandi desse novo mundo que surge é orquestrado pelas 
tecnologias digitais e pela virtualização da realidade. Essa mudança tecnológica gerou 
um novo universo de significados e uma nova ordem do realque desestabilizou as 
antigas formas de comunicação, de trabalho e de relações sociais. Essas modificações se 
tornaram mais evidentes quando se trata da circulação da informação e produção do 
conhecimento, que a partir da ruptura com os antigos formatos de transmissão do 
conhecimento, dos suportes de escrita, das práticas de leitura estão produzindo uma 
“revolução cultural” na cultura escrita e nas práticas de leitura, bem como no modo de 
recepção desse conhecimento na sociedade contemporânea (CHARTIER, 2010). 
Por conseguinte, como assinalado por José D´Assunção Barros (2010) no artigo 
As crises recentes na historiografia (2010) se a crise da História nos anos de 1980 
decorria das rupturas que advinham do final do século, com a constatação do 
surgimento de um novo mundo social, a História também foi impactada, na medida em 
 
2 Não há consenso na literatura sobre a definição do conceito de cultura digital, porém, compartilhamos 
da visão de Manuel Castells (2008) no qual demonstra que a cultura digital é caracterizada pela 
globalização e digitalização das informações e do conhecimento por meio da microeletrônica digitalizada, 
bases de dados e redes informáticas criando um universo interconectado por redes de comunicação e 
interações virtuais. 
 
19 
 
que a natureza do conjunto de suas práticas e representações estava sendo transformado 
por esse novo mundo social e cultural, que ao mesmo tempo em que provocava uma 
crise no sistema de pensamento ocidental, também modificava as condições de 
produção do conhecimento com o advento da internet e das tecnologias digitais. 
Neste contexto, a fonte que é a base material de produção do conhecimento 
histórico tem se transformando de modo decisivo na era digital. Com os novos suportes 
de armazenamento da informação as fontes foram alienadas de sua materialidade e 
transfiguradas para o ambiente da web. A fonte digitalizada no arquivo digital rompeu 
com a materialidade do documento impactando as práticas de pesquisa dos 
historiadores, tais como: autenticidade, manipulação dos dados e crítica da fonte na era 
digital. Para Elizabeth Roudinesco (2001), os arquivos onde se guardam as fontes são a 
essência da escrita da História e das práticas de pesquisa, pois nesses espaços se 
encontram materializadas as tensões vividas na escrita da história e a fantasia do 
arquivo total, que transformado em saber absoluto anularia a história como criação ou 
do arquivo vazio que por sua vez não forneceria as fontes primárias para o historiador, o 
que não garantiria uma história confiável sendo pura projeção do historiador. Portanto, 
nos termos de Roudinesco o arquivo é a condição da História e tendo essa condição se 
transformando, a História também o teria. 
Para o historiador Andreas Fickers (2012) a “virada digital” tem impactado a 
produção do conhecimento de tal forma que estamos nos aproximando de uma nova 
forma de crítica de fonte em um novo historicismo, o digital. O “desejo arquivístico” do 
historicismo do século XIX foi caracterizado pela ambivalente missão de criar coleções 
de fontes editadas cientificamente, como evidência visível de uma abordagem 
profissional do historiador às fontes históricas, que seriam utilizadas para a escrita da 
história e matéria prima para a prática da História profissional e científica. Por sua vez, 
para Fickers, um silêncio entre os historiadores em relação à digitalização das fontes, 
sua transmissão e crítica se tornou problemático. Para o autor, estamos em uma crise da 
prática histórica. Por isso, Fickers evidencia que um novo historicismo digital poderá 
auxiliar os historiadores na hermenêutica da crítica das fontes online e digital, o que 
engendraria, portanto, uma nova prática histórica que deverá lidar com o problema da 
abundância e da falta de informação contextual no futuro. 
Segundo Aleida Assmann (2013) o arquivo não é somente repositório para 
documentos do passado, mas também um lugar onde o passado é construído e 
produzido. Essa construção não depende apenas dos interesses sociais, políticos e 
20 
 
culturais, mas é essencialmente co-determinada pelos meios de comunicação e pelas 
tecnologias de registro. Para Roudinesco (2001) estamos em um momento que o sujeito 
desprovido de sentido histórico tende a “arquivar tudo”, a fim de preservar sua história 
em um passado sem futuro. Nessa cultura obcecada pela memória e pelo esquecimento, 
o arquivo tem se transformado e já não se restringe aos lugares de armazenamento do 
passado, mas ampliando-se como espaços de criação e de redescoberta do passado, a 
partir de novas formas de se representar o relacionamento entre indivíduo, sociedade e o 
passado (SILVEIRA, 2016). 
Se o modo como pesquisamos está se transformando a partir de novos suportes 
de armazenamento a escrita da História também se adaptou a esse universo digital. 
Segundo Serge Noiret (2015), quase todas as problemáticas tradicionais do ofício dos 
historiadores, tais como a delimitação das hipóteses de pesquisa, o acesso e a gestão das 
fontes históricas, a construção da narrativa e a comunicação dos resultados da pesquisa 
passam em grande parte pela tela do computador. Além disso, a internet configurou um 
novo espaço de divulgação do conhecimento histórico, que mais acessível as 
populações têm reconfigurado não apenas os modos de se chegar até a História, mas a 
relação entre público e a comunidade de historiadores. Por outro lado, se a 
acessibilidade torna a História mais acessível ao público, a questão dos repositórios e 
arquivos digitais fechados suscitam ainda questionamentos acerca do monopólio da 
informação, do conhecimento e da própria História na sociedade. 
Isto posto, nossa intenção é compreender como a tecnologia têm transformado o 
conhecimento histórico manifesto nas práticas e representações do ofício dos 
historiadores brasileiros no tempo presente através da rede social Café História (2008-
2017). Pretende-se assim investigar os modos como a cultura digital modificou a 
operação historiográfica a partir de um novo universo de significados que, engedrados 
pela cibercultura, reconfiguraram as práticas de pesquisa impactando no modo como, 
pesquisamos, ensinamos e divulgamos a História. 
Essas mutações se inserem em um período de curta duração no tempo presente, 
o que coloca o problema de se saber como o presente é construído no tempo 
investigando o passado incorporado no presente (FERREIRA, 2000). Assim, a história 
do tempo presente não seria apenas mais um período da história contemporânea, mas 
uma nova forma de se compreender a operação historiográfica no presente (DOSSE, 
2012). 
21 
 
Segundo Philippe Tétart (2000) a midiatização do século XX trouxe 
consequências que complicaram a trama histórica para os pesquisadores do tempo 
presente, haja vista que eles devem refletir sobre o seu papel na escrita de uma história 
ainda recente. O historiador deve reconhecer a subjetividade que o acompanha e o lugar 
de sua fala, bem como o momento em que está inserida sua prática de pesquisa 
(CERTEAU apud DOSSE, 2012). Assim, como foi evidenciado por François Dosse, a 
história do tempo presente “deve ser guiada por uma pesquisa no sentido de não ser 
mais um Telos, mas um Kairos, não mais um sentido preestabelecido, mas um sentido 
que emerge do fato que lhe da origem” (DOSSE, 2012, p.20). 
De acordo com Hartog (2015), a história recente marcada pela queda do muro de 
Berlim em 1989 e a expansão dos meios de comunicação estremeceram nossas relações 
com o tempo configurando um novo regime de historicidade. Esse novo regime de 
historicidade é caracterizado pelo presentismo de uma mobilidade valorizada da 
permanência do transitório em desaceleração, reconfigurando nosso espaço de 
experiência e horizonte de expectativas (KOSELLECK, 1979). Portanto, investigar as 
práticas e representaçõesque surgiram com a cultura digital no ofício dos historiadores 
nos permitiu também tecer questionamentos sobre as condições de nossa prática de 
pesquisa possibilitando a realização de uma crítica historiografica sobre a utilização do 
digital no percurso de nossa análise. 
No primeiro capítulo trataremos da tecnologia enquanto geradora de 
problemáticas para o campo das Ciências Humanas e, especialmente da História 
investigando como alguns autores buscaram historicizar a tecnologia circunscrevendo-a 
em seus campos de pesquisa. Desse modo, ao analisar como a tecnologia foi pensada 
pelo mundo intelectual, no contexto da cultura ocidental identificaremos os enunciados 
que constituíram as representações sobre a tecnologia e as concepções de cultura digital 
e internet no tempo presente. Neste sentido, ao tratar da tecnologia na cultura ocidental 
estaremos também fundamentando nosso objeto de pesquisa nos domínios teóricos em 
que a relação entre tecnologia e conhecimento histórico deram corpo ao movimento da 
História Digital e História Pública no Brasil recentemente. 
No segundo capítulo trataremos da análise das mídias sociais e das redes sociais 
no contexto da cibercultura e cultura digital visando compreender o modo como essas 
novas mídias têm configurado novos espaços de memória, sociabilidades e práticas 
sociais impactando nas formas de emissão e recepção do conhecimento histórico na 
sociedade e transformando o ofício dos historiadores com o que foi denominado “virada 
22 
 
digital”. As redes sociais na web tem se configurado como espaços de formação da 
opinião pública e de novas práticas sociais tornando-se uma importante fonte para 
pesquisa histórica e social. Com isso, é de suma relevância para os historiadores 
compreenderem como o passado digital na web está sendo recuperado e armazenado por 
agentes automatizados através dos arquivos da internet, de modo que na última década a 
produção da História que nasce/renasce digital se cruza com os sistemas e processos 
sociotécnicos próprios da cultura digital. Portanto, a web tem história! 
No terceiro capítulo analisaremos especificamente o caso da rede social criada 
no âmbito da internet brasileira intitulada Café História (2008-2017). Para efetivar essa 
análise foi necessário recorrer a um arquivo da web conhecido como The Internet 
Archive (1996), isso porque a rede social já não se encontrava mais online quando 
iniciamos nosso estudo. Desse modo investigaremos as novas práticas sociais que 
surgiram da cultura digital e que foram materializadas na rede social Café História 
(2008-2017) por historiadores e não historiadores. Nesta análise buscaremos 
compreender como essas práticas digitais transformaram a produção e divulgação do 
conhecimento histórico na cultura contemporânea e o ofício dos historiadores brasileiros 
pelas memórias registradas na web. 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
23 
 
CAPÍTULO 1: TECNOLOGIA: UM PROBLEMA HISTÓRICO? 
 
Na cultura ocidental contemporânea a tecnologia3 e a ciência se tornaram formas 
de conhecimento inter-relacionadas e que sofrem influências mútuas, uma vez que o 
discurso tecnológico foi legitimado na sociedade através da ciência. A definição de 
tecnologia, portanto, aparece na literatura acadêmica e na sociedade representada pela 
aplicação do conhecimento científico materializada em objetos ou em práticas 
científicas que repercutem de maneira positiva ou não na sociedade. 
A etimologia da palavra tecnologia remonta ao mundo antigo, especificamente 
ao sistema de pensamento da cultura grega em que a palavra techné significava “artes” 
ou “ofício” e logia, que remontava a logos como conhecimento pela razão4. Ofício ou 
arte do conhecimento pela razão, a tecnologia renasce como prática de saber no início 
da época moderna, quando o amálgama entre o antigo e o coetâneo gerou a 
modernidade (BURKE, 2012). Na modernidade, a sistematização metodológica do 
saber propiciou o cálculo da novidade e aplicabilidade das ideias, situando nesses 
gradientes, inovação e aplicação prática e a indexação da qualidade da ciência 
(RODRIGUES, 2001). 
No entanto, como demonstrou Simon Schwartzman (1980) empregar esses 
conceitos de maneira que os torne sinônimos é problemático porque as suas fronteiras 
variam de uma cultura para outra e de um período histórico para outro. Não há etapas 
que determinem a relação entre desenvolvimento tecnológico e científico, pois, ao 
mesmo tempo em que o conhecimento prático (tecnológico) pode se desenvolver a 
partir do conhecimento científico ele também pode ser constituído sem a ciência. Como 
no caso da máquina a vapor de James Watt que foi desenvolvida em 1769, mas 
explicada pelas leis da termodinâmica somente com Rudolph Clausius e Maxwell 
depois de 1850. 
A partir do que foi explicitado definiremos o conceito de tecnologia como forma 
de conhecimento que gera práticas e objetos que possibilitam que os seres humanos 
intervenham no seu mundo material e simbólico (KRANZBERG; DAVENPORT, 
 
3 Para Simon Schwartzman (1980) o que é ciência e o que é tecnologia e como esses saberes se 
influenciam são problemas conceituais, já que a maioria dos cientistas não se importam em utilizar estes 
termos de maneira ampla para cobrir o campo do conhecimento técnico e suas aplicações imediatas, por 
exemplo, para os economistas a ciência é uma dimensão preliminar da tecnologia. Dessa forma, estas 
significações demonstram a complexidade do emprego desses conceitos, como também nos revelam 
muitos aspectos da realidade da ciência e tecnologia na contemporaneidade. 
4A palavra referida foi mencionada a partir do Dicionário online Aurélio (https://dicionariodoaurelio.com) 
e do Oxford Dictionaries (https://www.oxforddictionaries.com/ ). Acesso em 2 /4/ 2018. 
https://dicionariodoaurelio.com/
https://www.oxforddictionaries.com/
24 
 
1975). Para Melvin Kranzberg e Willian Davenport (1975) a tecnologia não seria 
somente a história dos objetos técnicos e de processos tecnológicos, isto porque, ela está 
relacionada aos elementos da cultura e da sociedade, pois, ela é em si uma das 
capacidades mais distintas e significativas produzidas pelos seres humanos para 
transformar a si mesmos e seu mundo. 
Nas últimas décadas podemos constatar que a tecnologia foi sendo cada vez 
mais incorporada ao discurso das ciências humanas fazendo com que as novas 
aplicações tecnológicas reconfigurassem as práticas disciplinares nesses campos5. Essas 
transformações proporcionaram o surgimento de campos como o das humanidades 
digitais que buscam na interdisciplinaridade dos saberes humanísticos as ferramentas 
heurísticas/hermenêuticas para se compreender as transformações do conhecimento 
através da cultura digital. 
A História também tem se apropriado da tecnologia produzindo novas formas de 
discurso e de transmissão do conhecimento histórico para a sociedade, a partir da 
conformação de áreas dos estudos como a História Digital e História Pública. No 
entanto, o relacionamento entre História e tecnologia não nos remente apenas ao tempo 
presente e às transformações da cultura digital no ofício dos historiadores, mas está 
também articulada as mudanças de paradigma6 que estão se processando na cultura 
ocidental7. 
 
5 Assim, quando mencionamos a história do conhecimento científico e dos sistemas de pensamento nos 
embasaremos nos estudos de Michel Foucault (1971) partindo de sua noção de episteme para identificar 
as singularidades nos enunciados discursivos que definem a cientificidade da ciência histórica na 
contemporaneidade. Para Foucault “a episteme é um dispositivo estratégico que permite escolher entre 
todos os enunciados possíveis, aqueles que poderão ser aceitáveis no interior, não digo de uma teoria 
científica, mas de um campo de cientificidade” (FOUCAULT,1979, p.247). Segundo Eduardo Bento 
(2016) a episteme abrange muito mais do que uma estrutura do campo científico de uma única teoria, pois 
ela configura a rede em que a totalidade do saber se fundamenta, a qual é determinada e qualificada pela 
epistemologia e pela cultura em certo período. 
6 Desse modo, quando falamos de paradigma estamos tratando do conceito formulado por Thomas Kuhn 
no livro “A estrutura das revoluções científicas” (1975) e que compreende as mudanças de paradigma 
como consequências de uma série de decisões promovidas pela comunidade científica a partir das 
anomalias presentes em um paradigma vigente, a fim de resolver outra série de questões quando há uma 
espécie de crise na ciência (BENTO, 2016). Neste contexto, a noção de paradigma de Thomas Kuhn pode 
ser definida como “as realizações científicas universalmente reconhecidas que, durante algum tempo, 
fornecem problemas e soluções modulares para a comunidade de praticantes de uma ciência” (KUHN, 
1975, p.13). Queremos ressaltar que sabemos que as análises de Thomas Kuhn acerca da noção de 
paradigma se encontram no âmbito das ciências naturais, no entanto, não nos impossibilita de utilizar essa 
noção adaptada as necessidades do nosso objeto de pesquisa. Para saber mais ver: BARROS, José D’ 
Assunção. Sobre a noção de Paradigma e o seu uso nas ciências humanas (2010). 
7 O estudo sobre as interfaces entre História e tecnologia, bem como das novas práticas que surgem no 
universo de pesquisa dos historiadores nos leva a percorrer uma abordagem cultural dessas relações e que 
se inserem nos estudos da nova história cultural. De todo modo, ao investigar as práticas culturais 
advindas da cultura digital e do ciberespaço que buscam compreender o impacto dessas práticas na 
produção do conhecimento histórico nos circunscreve nos domínios de uma História da leitura e da 
25 
 
Segundo Melvin Kranzberg e Willian Davenport (1975) o mundo da erudição 
concentrou sua atenção nas humanidades clássicas, deixando de relacionar a cultura e à 
sociedade à tecnologia. As humanidades tendiam a degenerar a tecnologia qualificando-
a como destruidora da vida metafísica e da natureza. Em tais circunstâncias, os estudos 
da tecnologia se aproximavam das ciências naturais e exatas. Não obstante, foi no 
campo das ciências sociais que a tecnologia se tornou elemento de estudos para as 
ciências humanas. 
A partir dos estudos de Karl Marx (1818-1883) e Friedrich Engels (1820-1895) a 
tecnologia e seus artefatos não poderiam mais ser pensados separados da economia 
capitalista e dos modos de produção. A concepção materialista também produziu efeitos 
nas análises sobre os meios de comunicação, que ao adentrar do século XX produziram 
estudos importantes sobre a cultura de massas e a indústria cultural. Por outro lado, os 
estudos culturais ligados à semiótica, filosofia, antropologia e comunicação, bem como 
os da historiografia da arte e da arquitetura da cultura moderna fizeram com que a 
tecnologia não fosse mais apartada da cultura, mas sim em suas relações. Destarte, é na 
análise das ideias de alguns pensadores da cultura ocidental que situaremos a tecnologia 
nesse debate e na sua relação com os estudos históricos, desde quando a tecnologia 
deixou de ser encarada apenas como ferramenta, mas sim como categoria analítica que 
modifica o conhecimento e produz a cultura digital transformando a História e a 
sociedade. 
1.1 HISTÓRIA E TECNOLOGIA: MODOS DE PRODUÇÃO, TRABALHO E CIÊNCIA 
 
No campo da História a tecnologia foi ganhando espaço no ramo da história do 
trabalho e dos modos de produção, uma vez que o materialismo histórico introduziu 
novos paradigmas para a ciência da História. Karl Marx (1818-1883) e Friedrich 
Engels8(1820-1895) foram os principais expoentes do materialismo histórico, como 
 
cultura escrita, caminho esse que percorrermos ao longo dessa pesquisa. Todavia, a relação entre História 
e tecnologia no Brasil ja foi destrinchada por diversos autores, que no campo da história da ciência e 
tecnologia produziram pesquisas tomando como ponto de partida o entrelaçamento entre economia, 
ciência e desenvolvimento tecnológico na sociedade brasileira. Para consultar a bibliográfia sobre a 
relação entre ciência, tecnologia e economia no Brasil ver: VARGAS, Milton. História da Técnica e da 
Tecnologia no Brasil (1995) e MOTOYAMA, Shozo. Prelúdio para uma História da Ciência e 
Tecnologia no Brasil (2004). 
8 Karl Marx nasceu na Alemanha na cidade de Trévis em 1818 e faleceu em Londres em 1883. A 
contribuição de Marx à história do pensamento ocidental é difícil de mensurar, pois, além de ser 
considerado economista, sociólogo, historiador e filósofo, Marx foi um ativista político preocupado com 
as causas dos trabalhadores, o que levou a teoria marxista à revolução proletária. Já Friedrich Engels 
26 
 
método de compreensão histórica sua repercussão nas ciências humanas provocou 
mudanças de paradigmas não apenas nas correntes historiográficas, que se apropriaram 
do seu repertório teórico, mas também transformou a visão da teoria econômica, política 
e, sobretudo da sociologia (BARROS, 2013). Vejamos, pois, como esse pensamento se 
liga ao conceito de tecnologia e dos estudos históricos. 
Segundo Barros (2013) a teoria elaborada por Marx tem no conceito de modo de 
produção uma das ferramentas analíticas para se compreender a materialidade de 
determinada formação social. Por isso, ao considerar o modo de produção como ponto 
de partida para análise histórica, Marx utilizou o conceito de dialética, como princípio 
norteador da compreensão do movimento da história, para então examinar a 
historicidade que determina cada período histórico e os seus modos de produção. A 
práxis social também aparece como conceito para se analisar a formação de uma 
sociedade, já que coloca o trabalho como categoria central do materialismo, sendo a 
unidade dialética da práxis que agrega teoria e prática (pensamento e ação) 
possibilitando que o homem transforme seu mundo pelo trabalho. 
Para compreender como o homem modifica o seu meio pelo trabalho Marx 
opera a partir da noção de natureza em si, isto é, a relação homem e natureza acontece 
por meio da materialização da realidade por processos tecnicamente possíveis. O 
trabalho, por sua vez, é uma categoria de mediação entre a natureza objetiva e da 
natureza subjetiva que se torna o mecanismo de desenvolvimento da espécie humana. 
Ao mesmo tempo em que o homem transforma a sua relação com a natureza por meio 
do trabalho, ele, dialeticamente, transforma a si mesmo na (re)produção das relações 
sociais (HABERMAS, 2014). 
A tecnologia transitou nos escritos de Marx a partir da concepção de 
transformação do trabalho pelas categorias de modo de produção, forças de produção e 
de relações de produção de certa formação social. Assim, nas forças de produção 
encontram-se os meios materiais e a tecnologia necessária para que se provoquem 
modificações nos meios materiais da sociedade, isto é, nos instrumentos e as técnicas 
para a apropriação da natureza pelo homem e na otimização do trabalho que podem 
gerar ou não transformações no modo de produção. Para Marx, o desenvolvimento 
técnico varia de acordo com os modos de produção que podem se desenvolver em ritmo 
 
nasceu na Alemanha em 1829 na cidade de Wuppertal e faleceu em 1895 em Londres. Ao lado de Marx 
Engels se consagrou como um dos principais teóricos do marxismo tendo escrito inúmeros textos sobre 
economia, política e sobre a situação do proletariado nas fábricas inglesas (BARROS, 2013, p.19-20). 
27mais lento ou acelerado alterando assim as relações de produção que se reproduzem nas 
relações sociais. 
Por conseguinte, Karl Marx (1818-1893) e Friedrich Engels (1820-1895) 
desvelaram em suas análises sobre a formação do capitalismo uma dimensão particular 
da industrialização da sociedade no século XIX: a relação intrínseca entre 
desenvolvimento tecnológico e progresso científico. Na obra O Capital (1867), que é 
um livro de crítica à economia política e às relações de produção, Marx e Engels 
apresentaram a tecnologia como fator preponderante para a mecanização da indústria e 
das transformações das relações de trabalho sendo a força motriz para o 
desenvolvimento capitalista. Diferentemente do que acontecia no sistema de 
manufatura, quando o trabalhador detinha os meios de produção, na grande indústria ele 
perdia esse meio para as máquinas, que criam as bases técnicas para o desenvolvimento 
do modo de produção capitalista. Como apontado por Marx, a relação entre homem e 
máquina acontece, sobretudo no âmbito do trabalho: 
Como maquinaria, o meio de trabalho adquire um modo de existência 
material que condiciona a substituição da força humana por forças 
naturais e da rotina baseada na experiência pela aplicação consciente 
da ciência natural. Na manufatura, a articulação do processo social de 
trabalho é puramente subjetiva, combinação de trabalhadores parciais; 
no sistema da Maquinaria, a grande indústria é dotada de um 
organismo de produção inteiramente objetivo, que o trabalhador 
encontra já dado como condição material da produção (MARX, 2013, 
p.566). 
 
 
A mecanização da indústria provocou uma revolução tecnológica nos processos 
produtivos acarretando efeitos imediatos sobre o trabalhador, ou seja, na medida em que 
a máquina substituiu a força muscular à força de trabalho, essa se desvalorizou e ficou 
submetida ao capital. A introdução da máquina barateou a força de trabalho deixando 
os trabalhadores cada vez mais alienados aos processos produtivos. Com a degradação 
das condições de trabalho o antagonismo entre as classes sociais se exacerbou. A 
atividade produtiva se transformou em mercadoria acarretando o fetichismo das relações 
sociais e uma maior divisão entre as classes. Para Marx e Engels esse antagonismo entre 
as classes só seria superado a partir da luta de classes e da revolução proletária. 
Portanto, a revolução no modo de produção industrial com a introdução das máquinas 
provocou mudanças significativas nas condições do processo de produção do social 
(MARX, 2013, p.562). 
28 
 
O capitalismo provocou a aceleração do tempo histórico a partir da mecanização 
da produção nas fábricas que fizeram com que o tempo se diluísse no tempo de serviço 
em que o trabalhador emprega sua força de trabalho submetendo-se a um tempo 
regulado e mediado pelo tempo de produção. Marx (1867/2013) demonstrou que o 
tempo de produção imposto pelo modo de produção capitalista e pelo desenvolvimento 
tecnológico transformou a própria noção de tempo na sociedade, haja vista que o tempo 
exerceu um papel de dominação e domesticação dos homens incidindo nas relações 
sociais. O tempo no início da Revolução Industrial começava a se submeter à lógica do 
capital e um novo modo de vida social surgia com o capitalismo a partir de uma nova 
concepção de tempo que agora era investida pela racionalização, medição e regulação. 
Portanto, o tempo do trabalho possibilitou o desenvolvimento do capitalismo na medida 
em que por meio da reprodução das relações sociais o tempo se diluía nas relações de 
produção a partir do trabalho (MARX, 1867/2013). 
Neste contexto, para Marx a tecnologia está associada aos modos de produção 
que incidem sobre a determinação da ordem socioeconômica em cada período histórico. 
Marx (1867/2013) também demonstrou que a forças sociais tiveram um papel no 
avanço da tecnologia, pois, a ascensão do modo de produção capitalista dependeu de um 
mercado organizado a partir da iniciativa privada estimulando a tecnologia industrial 
entre os séculos XVIII e XIX. De todo modo, para Marx (1867/2013) há uma relação 
marcante entre a ascensão e consolidação do capitalismo como modo de produção e o 
desenvolvimento e crescimento da atividade científica em toda a Europa. 
A expansão da investigação científica dedicada à exploração da natureza e seu 
controle para utilização na vida material estimulou cada vez mais o avanço tecnológico 
no século XIX. A ciência converteu-se em força histórica primordial e condição prévia 
para o desenvolvimento da tecnologia. A tecnologia adquiriu um significado especial no 
contexto do capitalismo, já que os progressos técnicos e sua difusão na sociedade 
assumiram características de um processo autônomo (HEILBRONER, 1975, p.39). A 
tecnologia é para Marx um dos fatores determinantes do sistema capitalista porque a 
partir da mecanização dos processos produtivos o capital avançou e se legitimou na 
sociedade. Todavia, Marx e Engels revelaram sua visão positiva da tecnologia ao 
demonstrarem que o proletariado poderia fazer uma revolução ao se apropriarem dos 
meios de produção e assim dominar o poder que emana do desenvolvimento 
tecnológico. 
29 
 
A visão marxista acerca da tecnologia teve um papel importante no pensamento 
de alguns expoentes do materialismo histórico, por exemplo, Georg Lukács (1885-
1971). Segundo Barros (2013) no livro História e Consciência de Classe (1923), 
especificamente no capítulo a “Reificação e a Consciência do Proletariado”, Lukács 
empreendeu sua análise a partir do conceito de modo de produção, visando 
compreender o funcionamento da sociedade capitalista e a dimensão subjetiva da 
realidade humana. Neste sentido, o pensamento de Lukács foi influenciado pelo 
reportório teórico de Marx, sendo que a noção de fetiche da mercadoria é um dos 
conceitos norteadores de sua pesquisa e que demonstram como a organização do 
capitalismo afetou os indivíduos dando origem ao fenômeno da reificação e sua 
manifestação em todas as esferas da sociedade (LUKÁCS, 1989, p.97). 
Segundo Lukács (1923/1989) o fenômeno da reificação foi inaugurado no 
âmbito das relações sociais quando o modo de produção capitalista transformou as 
relações entre as pessoas em objetividade ilusória coisificada. Dessa forma, o fetichismo 
da mercadoria revelava a forma como a reificação se manifestava na consciência do 
proletariado. Assim, a partir das relações dos homens com os processos produtivos as 
características reificadas do seu trabalho se evidenciavam. A relação entre trabalho e 
processo produtivo rompeu com a relação entre os homens e seu trabalho criando então 
uma relação mediada por objetos a serviço do capital. Por este motivo, os produtos do 
trabalho tornaram-se mercadorias, já que com a industrialização o processo de trabalho 
foi retalhado em operações parciais e abstratamente racionais numa proporção que 
destruiu a relação entre o trabalhador e o produto como totalidade, reduzindo seu 
trabalho a uma função alienante que se repete mecanicamente. 
Para Lukács (1923/1989) a subordinação do homem à máquina criou um estado 
em que eles se “apagam” diante do trabalho reificando sua consciência, isto é, sua 
subjetividade opera agora a partir das relações de produção capitalista impossibilitando-
os de agir em favor da superação dessas relações. Assim, a sociedade capitalista 
produziu uma estrutura unificada por meio da economia e do desenvolvimento 
tecnológico. Neste sentido, percebemos que o conceito de tecnologia atribuído por 
Lukács no entendimento da sociedade capitalista se conecta ao pensamento de Marx e 
Engels. O determinismo tecnológico sob a sociedade e suas relações permanecem, mas 
agora Lukács o amplia tendo o fator da reificação da consciência de classe pelo trabalho 
como ponto de partida para a análise do capitalismo. O pensamento de Lukács 
30 
 
influenciou as teorias dos estudiosos da Escola deFrankfurt9 e toda uma corrente de 
pensamento marxista ao longo do século XX. 
Na esteira da teoria social marxista temos a contribuição do pensador brasileiro, 
o filósofo Álvaro Vieira Pinto (1909-1983), que discorreu em seu livro O conceito de 
tecnologia (1973) sobre a relação entre homem e tecnologia. A análise de Vieira Pinto, 
assim como na de Marx, Engels e Lukács, compreende uma visão totalizadora no qual a 
relação entre tecnologia e sociedade foi investigada como meio no qual os seres 
humanos dão sentido e constroem o seu mundo, todavia, a tecnologia para Vieira Pinto 
também seria uma forma de dominação sob os homens a partir das relações econômicas. 
Entretanto, apesar de Vieira Pinto tratar das condições de um capitalismo tardio, que 
será melhor abordado com os pensadores da Escola de Frankfurt, ao discorrermos sobre 
sua visão neste tópico, pretendemos demonstrar que a tecnologia a partir do trabalho foi 
analisada por meio uma visão que a enxerga enquanto condição primordial para a 
mediação das relações entre homem e natureza. 
Para Vieira Pinto (1973/2005) o senso comum tende a confundir esses conceitos 
como sinônimos, todavia, a técnica e a tecnologia apresentam características diferentes. 
Para esse autor, a técnica seria imanente à espécie humana por estar relacionada ao 
processo de autocriação do homem. Por sua vez, a tecnologia seria a ciência da técnica, 
que surgiu como uma necessidade da sociedade industrial em ordenar os conhecimentos 
técnicos (CORONEL; SILVA, 2010). 
Segundo Vieira Pinto (1973/2005) a relação homem e tecnologia deveria ser 
pensada a partir do seu caráter de encantamento e de dominação. O encantamento 
acontece porque a tecnologia oferece ao homem a possibilidade de transformar a 
natureza e seu mundo, em um processo de “ideologização da técnica” em que são 
atribuídos à tecnologia e aos seus objetos técnicos o poder de salvaguardar o futuro da 
humanidade. Além disso, Vieira Pinto (1975/2005) teceu inúmeras críticas às posições 
maniqueístas como a de Heidegger10, pois para Viera Pinto a tecnologia não é boa, nem 
tampouco má, já que se configura como ferramenta que possibilita ao homem 
transformar a si mesmo e seu meio. Vieira Pinto, foi um crítico do sistema capitalista e 
dos modos de dominação técnica exercido pelos países “desenvolvidos” aos países 
 
9 Para saber mais consultar: Max Horkheimer (1895-1973) Materialismo e Moral (1933) e Eclipse da 
Razão (1947). 
10O filósofo Martin Heidegger (1889-1976) em A questão da técnica (1953) buscou compreender a 
tecnologia a partir uma manifestação da nossa existência, todavia, a técnica para esse autor levaria a 
humanidade a sua própria destruição. Neste contexto, o filósofo brasileiro propõe um diálogo com 
Heidegger pela filosofia da técnica. 
31 
 
atrasados tecnologicamente. Neste caso, Viera Pinto tinha preocupação da dependência 
tecnológica dos países da América Latina em relação aos países da Europa e dos 
Estados Unidos. 
Na análise de Vieira Pinto, assim como na de Marx, Engels e Lukács a 
tecnologia foi tomada enquanto mediadora das relações entre homem e natureza. Para 
esses autores, toda tecnologia estabelece relações sociais pelos seus objetos técnicos 
conformando os modos de produzir a vida. Como forma de mediação entre os homens, 
a técnica e a tecnologia podem modificar as condições de relação e de existência dos 
homens no mundo (CARVALHO, 2017). Por fim, assim como para Marx, Engels e 
Lukács, Vieira Pinto acredita que se os homens se tornarem possuidores do poder da 
tecnologia poderão utilizá-la em favor de suas necessidades, isto é, ainda está presente 
na concepção desses autores uma visão romântica do que é a tecnologia em si. Neste 
sentido, vejamos como alguns pensadores da Escola de Frankfurt analisaram as 
transformações tecnológicas e seu impacto na cultura no capitalismo moderno. 
1.1.2. TECNOLOGIA E INDÚSTRIA CULTURAL: A MISTIFICAÇÃO DAS MASSAS 
 
No rumo da imaterialidade e da volatilidade impressa ao capitalismo pela 
tecnologia, esforçaram-se, ainda, aqueles autores que procuraram entender a tecnologia 
no contexto da comunicação. Os pensadores da Escola de Frankfurt, expoentes do 
materialismo histórico11, reuniam pesquisas de diversas áreas do conhecimento como da 
psicologia, sociologia, crítica da arte, crítica literária, filosofia e psicanálise. 
 Durante os anos de 1930, Theodor Adorno (1903-1969), Max Horkheimer 
(1895-1973), Eric From (1900-1980), Jürgen Habermas (1929) e Walter Benjamin 
(1892-1940) produziram importantes reflexões filosóficas e sobre a teoria social. Em 
suas reflexões buscaram construir uma teoria crítica da sociedade para emancipação 
humana que os unisse pela concepção teórica e não por uma unidade doutrinária, seu 
programa de pesquisa estava baseado no materialismo interdisciplinar. Para os 
pensadores da teoria crítica a nova situação da sociedade capitalista moderna fez com 
que algumas das teses da teoria crítica de Marx se tornassem ultrapassadas, sendo 
necessário atualizar a sua crítica da economia política sob um viés interdisciplinar entre 
as ciências humanas. Todavia, eles não negaram a teoria marxista, mas a atualizaram e 
 
11 A teoria crítica da Escola de Frankfurt também está embasada na teoria de Kant, Hegel, Max Weber e 
Freud. Dessa forma, queremos ressaltar a importância desses pensadores para a teoria social e para a 
filosofia, no entanto, nos concentraremos somente nas reflexões acerca do materialismo histórico. 
32 
 
tomaram como objeto de investigação a questão entre a relação da vida econômica e da 
sociedade, da evolução psíquica dos indivíduos e das transformações nos diversos 
âmbitos da cultura, como ciência, arte, costumes, opinião pública, modos de 
divertimento e os meios de comunicação (REPA, 2008, p.11). 
No que tange aos rumos da padronização da cultura e dos mecanismos de 
controle operados a partir da indústria do entretenimento e forjados nas novas 
características do capitalismo no século XX, Theodor Adorno (1903-1969) e Max 
Horkheimer (1895-1973) escreveram A indústria cultural: o esclarecimento como 
mistificação das massas (1947). Neste ensaio, eles buscaram compreender o alcance da 
produção e consumo de produtos culturais em larga escala relacionando esses 
fenômenos com os mecanismos de funcionamento do modo de produção capitalista. 
Adorno e Horkheimer perceberam então que esses fenômenos não poderiam 
mais ser identificados apenas no contexto da cultura de massas e do entretenimento 
como uma expressão da arte popular e cunharam o termo indústria cultural12 (GATTI, 
2008, p.26). Assim, a indústria cultural passou a definir um novo fenômeno do 
capitalismo monopolista que surgia nas primeiras décadas do século XX: a 
racionalização da cultura pelo capitalismo, a mistificação das massas pelos meios de 
comunicação e a reificação de sua consciência. 
Nesse sentido, a tecnologia propiciou que a cultura se racionalizasse pela 
produção e divulgação de bens de consumo de entretenimento. Neste caso, a introdução 
das máquinas no processo de trabalho gerou um conflito entre artistas e os detentores do 
poder do capital, a obra de arte agora dependia, mas do que nunca do mercado. A 
racionalização da produção também criou o recurso ao planejamento e à antecipação das 
regras de produção da obra, característica inerente ao caráter fetichista da mercadoria. 
Por fim, o termo indústria cultural remete à racionalização das técnicas de divulgação 
dessa mercadoria pelo rádio, cinema, televisão e imprensa, o que demonstra a relação 
intrínseca entre mercado econômico e indústria cultural (GATTI, 2008, p.26). 
Para Adorno e Horkheimer, a indústria cultural impossibilita a emancipação 
humana na medida em que integra as massas ao sistema capitalista pelo consumo debens culturais, neste caso: 
 
12 O conceito indústria cultural compreende a produção de produtos culturais com o intuito de adaptar e 
integrar seus consumidores a ordem socioeconômica, diferente do que acontece com as formas 
tradicionais de entretenimento e lazer, a indústria cultural centraliza a disseminação dos produtos 
culturais por meio dos meios de comunicação. O termo cultura empregado por esses autores remonta a 
duas questões a autonomia da arte e o estilo artístico (GATTI, 2008). 
33 
 
A violência da sociedade industrial opera nos homens de uma vez por 
todas. Os produtos da indústria cultural podem estar certos de serem 
jovialmente consumidos, mesmo em estado de distração. Mas cada um 
destes é um modelo do gigantesco mecanismo econômico que desde o 
início mantém tudo sob pressão tanto no trabalho quanto no lazer que 
lhe é semelhante. De cada filme sonoro, de cada transmissão 
radiofônica, pode-se deduzir aquilo que não se poderia atribuir como 
efeito de cada um em particular, mas só de todos em conjunto na 
sociedade. Infalivelmente, cada manifestação particular da indústria 
cultural reproduz os homens como aquilo que foi já produzido por 
toda a indústria cultural (ADORNO; HORKHEIMER, 2011, p.6). 
 
Nesse contexto, a indústria cultural atua na consciência dos indivíduos a partir 
do mecanismo da reificação das relações sociais como proposto por Lukács. Desse 
modo, os produtos da indústria cultural retiraram dos indivíduos o poder de criticidade 
incidindo nas suas escolhas/preferências sob determinados bens de consumo. Por sua 
vez, a mistificação das massas não está no fato da indústria cultural manipular as 
distrações, mas sim no modo que ela estraga o prazer da novidade e do diferente, 
permanecendo voluntariamente ligada aos clichês ideológicos da cultura em vias de 
liquidação (ADORNO; HORKHEIMER, 1947/2011). 
Para Adorno e Horkheimer a técnica adquiriu uma característica particular na 
sociedade, a saber: o poder encarnado nas classes economicamente dominantes. O 
desenvolvimento tecnológico possibilitou a configuração do modo de produção 
capitalista monopolista, a tecnologia ganhou maior notoriedade na sociedade 
transformando não apenas as relações de produção, mas também as relações sociais por 
meio da cultura. 
 A racionalidade técnica hoje é a racionalidade da própria dominação, 
é o caráter repressivo da sociedade que se auto-aliena. Automóveis, 
bombas e filmes mantêm o todo até que seu elemento nivelador 
repercuta sobre a própria injustiça a que servia. Por hora a técnica da 
indústria cultural só chegou à estandardização e à produção em série, 
sacrificando aquilo pelo qual a lógica da obra se distinguia da lógica 
do sistema social. Mas isso não deve ser atribuído a uma lei de 
desenvolvimento da técnica enquanto tal, mas à sua função na 
economia contemporânea. A necessidade, que talvez pudesse fugir ao 
controle central, já está reprimida pelo controle da consciência 
individual (ADORNO; HORKHEIMER, 2011, p.6). 
 
34 
 
Segundo Adorno e Horkheimer (1947/2011), as conquistas da ciência e do 
progresso técnico não possibilitaram o esclarecimento13 da humanidade, mas sim 
desencadearam o processo de um novo estado de barbárie, uma vez que o conhecimento 
científico dominou a natureza pela técnica e a técnica dominou a vida humana pelos 
processos de racionalização da vida através do trabalho e da indústria cultural. Neste 
sentido, temos a configuração de uma economia planejada pela burocracia das empresas 
e do Estado, por sua vez, o poder que emana da tecnologia se concentra nas mãos de 
poucos possibilitando a criação de novas ideologias e métodos de controle social 
conformando sociedades tecnocráticas.14 
Neste sentido, Herbert Marcuse (1898-1979) escreveu o livro A ideologia da 
sociedade industrial: o homem unidimensional (1964) elaborando uma teoria crítica 
para superação das formas de dominação na sociedade. Para Marcuse (1964) o 
desenvolvimento tecnológico criou todo um sistema de dominação e coordenação das 
formas de vida apaziguando as forças que se opõem ao sistema. Nesse tipo de 
sociedade, a tecnologia produz formas eficazes e agradáveis de controle e coesão social. 
Assim, o sistema produtivo tende a impor um modo de produção guiado pelo progresso 
técnico e que determina as relações de trabalho e do sistema econômico imposto aos 
indivíduos. 
Na sociedade tecnológica a cultura, a política e a economia se fundem dando 
origem ao que Marcuse chamou de “Homem unidimensional”. Nesse sistema, os 
homens internalizam as formas de dominação pelo trabalho e pelo lazer a partir de 
sistemas de controle que administram suas habilidades, atitudes e aspirações 
individuais. Segundo Marcuse temos a formação de uma sociedade totalitária construída 
por uma racionalidade tecnológica, que impõe sobre os corpos e as mentes dos 
indivíduos valores e verdades padronizadas, disseminadas através de instituições 
políticas, ensino e meios de comunicação de massa que determinam as relações sociais. 
Com isso, o consumismo em massa promove uma falsa satisfação das necessidades 
humanas que se sentem realizadas com a variedade de produtos e serviços que tem a seu 
dispor. Assim, da irracionalidade da sociedade racional que controla e domestica os 
 
13 O programa do esclarecimento era o desencantamento do mundo. Sua meta era dissolver os mitos e 
substituir a imaginação pelo saber contribuindo para a emancipação humana (ADORNO; 
HORKHEIMER, 1985). 
14 Esse debate sobre a sociedade tecnocrática pode ser encontrado no texto de Marcuse A Ideologia da 
Sociedade Industrial (1964) e de Habermas Técnica e Ciência como Ideologia (1968). 
 
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homens pela uniformização do pensamento advém do processo característico de 
funcionamento das máquinas. 
Desse modo, há uma razão instrumental, imposta a todos, que constitui a 
ideologia da sociedade tecnológica. Essa ideologia controla a natureza, o corpo e a 
mente humana suprimindo as liberdades individuais (GABRIEL, 2003). Para Marcuse a 
tecnologia produziu efeitos psíquicos sob a vida dos seres humanos, na medida em que 
estabeleceu um modo de vida unidimensional não transcendendo a racionalidade 
tecnológica em uma racionalidade crítica. Portanto, o progresso tecnológico seria o 
responsável pelo sistema de dominação da natureza e da consciência humana que se 
impõe na sociedade industrial. 
Ao tratar da relação entre tecnologia e cultura não poderíamos deixar de 
mencionar, Walter Benjamin, um dos intelectuais mais significativos para a teoria 
crítica da Escola de Frankfurt. Walter Benjamim vivenciou uma época de muitos 
dilemas da sociedade moderna como a ascensão do fascismo/nazismo e a crise política e 
social do começo do século XX. Para Benjamin o século XIX tinha sido marcado pela 
promessa do progresso da sociedade e do avanço tecnológico configurando assim um 
período de sonho para a modernidade, todavia, já nas primeiras décadas do século XX, 
o sonho transformou-se em pesadelo, sendo que a experiência autêntica da vida tinha 
cedido lugar a um modo empobrecido da vida. Neste sentido, Benjamin buscou 
compreender a modernidade e as contradições de sua época pela cultura no âmbito das 
artes visuais tendo como repertório teórico o materialismo histórico e as teorias de 
Freud (PALHARES, 2006). 
Como crítica às condições de produção e reprodução artísticas nas primeiras 
décadas do século XX, Walter Benjamin escreveu o ensaio A obra de arte na era de sua 
reprodutibilidade técnica (1936). Neste ensaio Walter Benjamin elaborou sua teoria 
materialista das artes e crítica da cultura com vistas a analisar as condições de percepção 
dos seres humanos em relação a sua vida partir do desenvolvimento técnico e dos meios 
de comunicação. Para Benjamin (1936/2000), o processo de reprodução técnicaaconteceu ao longo da história: 
A obra de arte, por princípio, foi sempre suscetível de reprodução. O 
que alguns homens fizeram podia ser refeito por outros. Assistiu-se, 
em todos os tempos, a discípulos copiarem obras de arte, a título de 
exercício, os mestres reproduzirem-nas a fim de garantir sua difusão e 
os falsários imitá-las com o fim de extrair proveito material. As 
técnicas de reprodução são, todavia, um fenômeno novo, de fato, que 
nasceu e se desenvolveu no curso da história, mediante saltos 
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sucessivos, separados por longos intervalos, mas num ritmo cada vez 
mais rápido (BENJAMIN, 2000, p.11). 
 
Neste contexto, os gregos realizavam a fundição e a cunhagem como processos 
técnicos de reprodução em série. As moedas, os bronzes e as terracotas foram as obras 
de artes que os gregos reproduziram em série, já que as outras obras de artes só tinham 
um único exemplar. A gravura em madeira pela primeira vez conseguiu a reprodução de 
um desenho, muito antes da reprodução da escrita pela imprensa. Na Idade Média foi a 
técnica de combinar água-forte, para cobrir a madeira ou o bronze que possibilitaram a 
reprodução da xilogravura e gravuras impressas em papel. A tipografia, por sua vez, 
permitiu a reprodução técnica da literatura possibilitando a disseminação da cultura 
escrita na Europa Moderna. (BENJAMIN, 2000, p.11-12). 
No início do século XIX a litografia permitiu o progresso das técnicas de 
reprodução possibilitando a reprodução em série de desenhos e a criação de novas obras 
de arte, graças a nova técnica de submeter o desenho a pedra calcária, ao invés de 
entalhá-la. A fotografia no século XIX surgiu provocando rupturas em todas as formas 
de reprodução e disseminação das artes até então inventadas. A reprodução fotográfica 
possibilitou uma rápida reprodução de imagens, as mãos que antes executavam as 
tarefas artísticas, foram reconfiguradas para o olho fixo aos objetos, de tal modo que a 
técnica de captação e reprodução fotográfica permitiu o surgimento das técnicas de 
reprodução de sons e imagens dando origem ao cinema no século XX (BENJAMIN, 
2000, p.11-12). 
De todo modo, para Benjamin (1936/2000) foi no século XX que o 
desenvolvimento técnico modificou os meios de produção artísticos interferindo não 
apenas nas artes tradicionais, mas criando agora um modo de experiência entre artes e 
sociedade. 
Com o advento do século XX, as técnicas de reprodução atingiram a 
tal nível, em decorrência, ficaram em condições de não apenas se 
dedicar a todas as obras de arte do passado e de modificar de modo 
bem profundo os seus meios de influência, mas elas próprias de se 
imporem, como formas de artes originais (BENJAMIN, 2000, p. 12). 
 
A reprodutibilidade técnica da arte representou um dos aspectos mais 
característicos da vida moderna, sendo mais um elemento da reificação das relações 
sociais e da vivência alienante dos homens em sociedade. Dessa forma, a arte produzida 
37 
 
em série e distribuída na sociedade segundo as leis do mercado gerou um 
empobrecimento da recepção da arte pelo público, isto é, as antigas relações que 
estabeleciam os modos de percepção do público para com a obra de arte e com o artista 
se modificaram. Neste caso, para denominar essa nova relação, Benjamin (1936/2000) 
criou o conceito de “aura”, que seria uma experiência temporal e espacial que 
caracteriza a recepção das obras de arte tradicionais pelo público. Essa forma de 
percepção foi denominada por Benjamin de contemplação, como ato de significação no 
qual o espectador emprega sua criatividade contemplando a obra de arte no seu sentido 
místico e ritualístico (PALHARES, 2006). Consoante, o que ocorreu na modernidade 
com a reprodução técnica das artes visuais foi a perda da dita aura, na medida em que 
esse processo significou a separação do objeto produzido da sua tradição, pela 
reprodutibilidade tecnológica, ou seja: 
Pode ser que as novas condições criadas pelas técnicas de reprodução, 
em paralelo, deixem intacto o conteúdo da obra de arte; mas, de 
qualquer maneira, desvalorizam seu hic et nunc. Acontece o mesmo, 
sem dúvida, com outras coisas além da obra de arte, por exemplo, com 
a paisagem representada pela película cinematográfica; porém, quando 
se trata da obra de arte, tal desvalorização atinge-a no ponto mais 
sensível, onde ela é vulnerável como não o são os objetos naturais: em 
sua autenticidade. O que caracteriza a autenticidade de uma coisa é 
tudo aquilo que ela contém e é originalmente transmissível, desde sua 
duração material até seu poder de testemunho histórico. Como este 
próprio testemunho baseia-se naquela duração, na hipótese de 
reprodução, onde o primeiro elemento (duração) escapa aos homens, o 
segundo – o testemunho histórico da coisa fica – fica identicamente 
abalado. Nada demais certamente, mas o que fica assim abalado é a 
própria autoridade da coisa (BENJAMIN, 2000, p.13-14) 
 
 A mecanização dos processos artísticos fizeram com que a obra de arte se 
transformasse em mercadoria perdendo sua singularidade e autenticidade alterando seu 
valor de culto, por exemplo, a fotografia e o cinema retiraram a experiência de 
originalidade e autenticidade que sustentava a recepção contemplativa, como na 
escultura e pintura, a arte perdeu sua razão de ser. No cinema não há diferença entre a 
cópia e o original, assim como a fotografia pode reproduzir em imagem uma obra de 
arte sem distinção, a função de arte ficou subvertida fundamentando-se sobre outra 
prática, a política. Para Benjamin, essa nova situação foi vista de maneira positiva, 
vindo a se tornar promissora na sociedade a partir de uma nova atitude do espectador 
diante das artes. Essa nova atitude poderia levar a uma maior conscientização e crítica 
dos espectadores, na medida em que a reprodução técnica substitui o olhar histórico 
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sobre os conjuntos de bens culturais do passado para o olhar político, essa nova 
percepção pode ser observada na obra de poetas surrealistas e na consagração do cinema 
mudo pelas massas (PALHARES, 2006). 
A multiplicação das cópias, da reprodução radiofônica e cinematográfica dos 
objetos culturais a reprodução técnica transformou o evento produzido pela vivência de 
uma obra de arte em um fenômeno de massas. A reprodução técnica permitiu uma 
atualidade permanente conduzindo a uma ruptura da realidade transmitida com a 
tradição caracterizando a crise da modernidade. (BENJAMIN, 2000, p.14). A ruptura da 
herança cultural de uma época a partir da crise da modernidade provocou a “perda da 
aura” dos homens em suas relações na vida moderna. 
Por isso, Walter Benjamim ao analisar o hic et nun (o tempo do agora) a partir 
da atualidade permanente da obra de arte, demonstrou também as transformações que 
ocorreram na concepção de tempo. Neste sentido, ao analisar a relação dialética entre o 
Então e o Agora ou entre o contínuo e o momentâneo, Benjamin assinalou que o 
presente histórico seria o agora reconhecível. Assim, a partir desse contexto, surge a 
noção de tempo histórico em Benjamin, que está ligada à concepção de Baudelaire 
sobre um tempo que leva a efemeridade descontínua, de modo que a experiência 
instantânea não permanece no passado, ela é sempre replicada na forma de uma imagem 
do agora, como assinalado na ruptura com a tradição da obra de arte na era da 
reprodutibilidade técnica (KANG, 2009). Portanto, o tempo do agora de Benjamin é a 
atualidade do tempo vivido, diferente do tempo linear do continuum em História, o 
tempo se transformou na conformação de um mosaico de imagens em que o passado 
inunda o presente e o presente inunda o passado (CROMBERG, 2002) 
Segundo Jaeho Kang (2009) as análises de Walter Benjamin sobre a cultura 
refletem as condições de transformação pelas quais o espetáculo se transformou em um 
fenômeno de massas. A cultura crítica de Benjamin anunciou as tensões e conflitos 
entre o potencial revolucionário

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