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1 Arrazoados de Direito Processual Penal PROFESSOR: ADRIANO CONCEIÇÃO ABÍLIO CONCEITO Pode-se, pois, definir o Direito Processual Penal, nos seguintes termos : o conjunto de princípios e normas que regulam a aplicação jurisdicional do Direito Penal objetivo, bem como as atividades persecutórias da Polícia Judiciária, e a estruturação dos órgãos da função jurisdicional e respectivos auxiliares. ( José Frederico Marques ) – citado por Fernando da Costa Tourinho Filho. AUTONOMIA DO DIREITO PROCESSUAL PENAL O Direito Processual Penal é ciência autônoma no campo da Dogmática Jurídica, uma vez que tem objeto e princípios que lhe são próprios. A sua designação científica atual ( Direito Processual Penal ) bem demostra essa sua autonomia, ao revés do que antes sucedia, quando se falava pura e simplesmente em processo penal. ( Francesco Carnelutti ). Em face dessa autonomia, não se pode falar em “Direito adjetivo”. É certo que, até hoje, muitos autores, quando se referem ao Direito Processual, usam expressões como estas: “Direito adjetivo”, “Direito acessório”. Por que “Direito acessório” ? Decerto por existir um Direito principal. Seria o Direito Penal o principal ? Não havendo Direito Penal, o Processo Penal não teria razão de ser. Por outro lado, existindo o Direito Penal, sem o Direito Processual, aquele seria de pouca valia, pois nenhuma pena pode ser imposta senão por meio do due process of law. Difícil, pois, dizer-se qual dos dois é o principal. Ambos são importantes. O que se pode e se deve afirmar é que ambos se completam e nenhum deles é inferior em relação ao outro. Por igual razão não se deve falar em “Direito adjetivo”, emprestando a tal expressão um sentido de inferioridade ou de subordinação. A propósito, o ensinamento de Niceto Alcalà-Zamora Y Castilho: “ adjetivo, sólo se puede aceptar en cuanto exprese contraste frente al Derecho material o substantivo, mas en maneira alguma si se quiere significar que el Derecho procesal sea de rango jurídico inferior ” ( cf. Derecho, cit., v. 1, p.35 ). 2 INSTRUMENTALIDADE DO DIREITO PROCESSUAL Não se pode negar o caráter instrumental do Direito Processual, porquanto constitui ele um meio, o instrumento para fazer atuar o Direito Penal ( material ). No que concerne ao Direito Processual Penal propriamente, mais clara se apresenta tal instrumentalidade, uma vez que não sendo o Direito Penal de coação direta, e uma vez que o Estado autolimitou o seu jus puniendi, não se concebe aplicação de pena sem processo. Os princípios do nulla poena sine judice e nulla poena sine judicio, elevados à categoria de dogma constitucional ( artigo 5º, LIII da CF ), e segundo os quais nenhuma pena poderá ser imposta senão pelo Órgão Jurisdicional e por meio do regular processo, impedem a aplicação da sanctio juris (sanção legal) sem o devido processo. No campo civil é possível um entendimento entre os litigantes, de molde a sair vitorioso o titular do direito lesado, sem que haja necessidade da via processual. Desde que não estejam em jogo interesses indisponíveis ( anulação de casamento, p. ex. ), podem os litigantes, por meio de autocomposição, solucionar seus conflitos. No campo penal, não se pode conceber a aplicação da sanctio juris senão por meio do processo. Nem mesmo naquelas hipóteses de ação penal de iniciativa privada, em que o jus persequendi in judicio (direito de reclamar, de exigir, de reivindicar) foi transferido para o particular, será possível a inflição de pena sem o devido processo. Possível será um acordo entre querelante e querelado no que tange ao ressarcimento do dano ex delicto (por delito, em virtude de delito), nunca, porém, um ajuste no sentido de o autor do fato típico submeter-se a uma pena sem processo. FINALIDADE Sua finalidade, em suma, é a de tornar realidade o Direito Penal. Enquanto este estabelece sanções aos possíveis transgressores das suas normas, é pelo Processo Penal que se aplica a sanctio juris, porquanto toda pena é imposta “processualmente”. Assim, não constitui o Processo Penal nem uma discussão acadêmica para resolver, in abstrato, um ponto controvertido de Direito nem um estudo ético tendente à reprovação da conduta moral de um indivíduo. Seu objetivo é eminentemente prático, atual e jurídico e se limita à declaração de certeza da verdade, em relação ao fato concreto e à aplicação de suas conseqüências jurídicas. 3 EVOLUÇÃO DOUTRINÁRIA De acordo com o seu desenvolvimento científico, os historiadores dividem o Direito Processual Penal em dois períodos : No Primeiro período os doutrinadores identificam as seguintes fases : Dos glosadores – estes limitaram-se a breves notas de interpretação ao Direito Romano Imperial ( Justiniano ). Deve-se ressaltar o mérito de haver iniciado, para o processo penal, o adequado tratamento jurídico, lançando assim os alicerces da doutrina processual penal. Dos Pós-glosadores – estes desenvolveram o sistema de glosas ( criticar, comentar, anotar ), passando aos comentários, ainda com base no direito romano, em estudos conjuntos com o direito processual civil. Dos Práticos – estes passaram à exposição sistemática, ainda com caráter precário, mas numa ordem mais organizada de exposições que se elevavam ao plano das questões gerais. Dos Precursores – estes surgem em meados do século XVIII, onde uma transformação notável se vai operando nas idéias, um espírito de reforma vai procurando harmonizar a legislação criminal com princípios de justiça e humanidade. Prepara-se, desta forma, a renovação estrutural dos princípios políticos informadores da Justiça Penal, que a Revolução Francesa acabaria consagrando. No Segundo período, iniciado após o Código de Processo Criminal, promulgado na França em 1808 ( Código Napoleônico ), surgem os estudos mais completos a respeito do processo penal, possibilitando um novo surto de progresso, ou seja, distanciado do direito material, caracterizando assim, a época do procedimentalismo com estudos descritivos e fragmentados de seus institutos particulares. Anote-se, sobretudo, as obras de Francesco Carrara como elaborador doutrinário. 4 EVOLUÇÃO EM RELAÇÃO AO BRASIL Período Colonial Quando o Brasil foi descoberto estavam em vigor em Portugal as Ordenações Afonsinas, em honra de Afonso V, que foram publicadas em 1446 e vigoraram até 1520. Em 1521, no reinado de D. Manuel, o Venturoso, nova codificação foi empreendida, vigorando assim as Ordenações Manuelinas. O Código Manuelino foi o primeiro Código impresso na Europa e vigorou até 1603, sendo que no seu Livro V estava disciplinado o Direito ( delitos e sanções ) como também o Processo Penal. Havia pouca vida na colônia e, por isso, esse Código foi pouco usado. Com a batalha de Alcácer Quibir, travada entre portugueses e mouros, em Marrocos, morre o rei D. Sebastião, de Portugal, sem deixar descendentes, passando o trono português a ser ocupado, dois anos depois, pelo rei de Castela, Felipe II, que mandou promulgar, em 1603, as Ordenações Filipinas, que vigoraram até 1830, tendo sido muito utilizada. Durante o regime imperial, quem mais contribuiu para o desenvolvimento da doutrina penal foi Pimenta Bueno. Brasil Império As idéias liberais que se propagavam na Europa no século XVIII repercutiram na justiça penal, exigindo várias reformas humanitárias. Além dos movimentos liberais, como o da independência dos Estados Unidos e o da Revolução Francesa, bem como as obras dos escritores do Iluminismo, como Rousseau (O contrato social), Montesquieu (Espírito das Leis), e outros, também influenciaram as reformas ocorridas. Proclamada nossa independência, tratou-se de dotar o País de uma legislação própria; mas, antes que isso ocorresse, D. Pedro I, por Lei de 1823, mandou que secontinuasse aplicando as Ordenações Filipinas. Nossa primeira Constituição, a Constituição Política do Império, de índole liberal para a época, é promulgada em 25 de março de 1824. 5 Só em 1832 é que tivemos o primeiro Código de Processo Criminal, inspirado no Código Napoleônico, sendo previsto o habeas corpus. Em 1841 foi ele modificado, para fortalecer o Governo, alterando o critério de escolha dos juízes e promotores, conferindo, à autoridade policial, atribuições judiciárias para formação de culpa e pronúncia. Só desapareceu em 1871. Período Republicano Proclamada a República, com a promulgação da Constituição de 24 de fevereiro de 1891, tendências inovadoras surgiram, ficando as garantias processuais revigoradas; o habeas corpus transformou-se em garantia constitucional, mas a grande inovação foi a quebra da unidade processual para o território nacional, dando a cada Estado competência para legislar sobre o processo criminal e o civil, instaurando-se a pluralidade processual, porém, nem todos os Estados tiveram o seu processo, sendo que muitos, inclusive o Estado de São Paulo, continuaram regendo-se pelas leis do Império. Com a revolução de 1930, o regime pluralista foi mantido. Todavia, promulgada a Constituição de 16 de julho de 1934, restaurou-se a unidade processual que existia ao tempo do Império, e que vem sendo mantida até hoje. Após a Constituição de 1934 foi nomeada uma Comissão para elaborar um projeto de Código de Processo Penal, o que foi feito em 1935, com Exposição de Motivos do Ministro da Justiça Vicente Ráo, que apresentou, como maior inovação, a supressão do Inquérito Policial e a adoção do Juizado de Instrução, questão esta que tem provocado debates até hoje. 6 Mas, com a Constituição outorgada com o golpe de 10 de novembro de 1937, foi impedida a discussão e aprovação do projeto apresentado, ficando, assim, restabelecido o regime de unidade processual e mantido o inquérito policial, ungindo (marcando*) a elaboração de um Código de Processo Penal. Após o golpe, nova Comissão foi nomeada para apresentar um projeto de Código de Processo para todo o País; dela faziam parte Narcélio de Queirós, Florêncio de Abreu, Cândido Mendes, Vieira Braga, Roberto Lyra e Nélson Hungria. Esse projeto converteu-se no atual Código de Processo Penal, através do Decreto-Lei n. 3.689, de 03 de outubro de 1941, em vigor desde 1º de janeiro de 1942, com algumas alterações, e que até hoje vigora. Durante a República, o maior processualista foi João Mendes de Almeida Júnior, salientando-se ainda os nomes de Galgino Siqueira, Costa Manso, Cândido Mendes, Firmino Whitaker, Florêncio de Abreu, João de Oliveira Filho, Pontes de Miranda. Sobre o Código de Processo Penal, devem ser ressaltados os comentários de Eduardo Espínola Filho, José Frederico Marquês, Hélio Bastos Tornaghi, E. Magalhães Noronha, Fernando da Costa Tourinho Filho, e, Joaquim Canuto Mendes de Almeida. Valiosa também tem sido a colaboração dos novos processualistas brasileiros : Ada Pellegrini Grinover, Rogério Lauria Tucci, Afrânio Silva Jardim, Sérgio Marcos de Moraes Pitombo, José Roberto Barauna, Hermínio Alberto Marques Porto, Paulo Lúcio Nogueira, Vicente Greco Filho, Antonio Scarance Fernandes etc. * Com razão afirmou JAMES GOLDSCHMIDT que a estrutura do processo penal de uma nação indica a força de seus elementos autoritários e liberais. ( Problemas Jurídicos y Políticos del Processo Penal, 1935, página 67 ) 7 FONTES DO DIREITO PROCESSUAL PENAL Sentido da expressão “fontes do direito” No sentido comum, fonte é o lugar donde nasce alguma coisa. No sentido jurídico, é o poder encarregado de fazer leis. ( Paulo Lúcio Nogueira ). A expressão “fontes do direito” designa “os modos de formação da norma jurídica, ou as formas que essas normas revestem” (Guilherme Alves Moreira ). Fontes do Direito, portanto, nada mais são do que as formas pelas quais as regras jurídicas se exteriorizam, se apresentam. São, enfim, “modos de expressão do Direito”. Espécies de Fontes Normativas Giulio Battaglini distingue as fontes em Materiais e Formais: - Materiais (também chamadas de Substanciais ou Fontes de Produção) – são as que constituem a matéria com que é atingido (em que se busca) o conteúdo do preceito jurídico; São aquelas que dizem respeito à constituição e produção do direito. É a fonte que cria o direito, se refere ao órgão criador, que é sempre o ESTADO. (União, artigo 22, I, CF) - Formais (também chamadas de Cognição ou Fontes de Conhecimento) – são os modos de expressão da norma jurídica positiva, isto é, as fontes no único sentido técnico possível. São aquelas que revelam o direito positivo ou a forma que pode assumir a norma em sua manifestação concreta, que constituem a exteriorização do direito, que são as LEIS. Em nosso Ordenamento Jurídico, somente a União possui competência legislativa para criar normas penais (CF, art. 22, I). Note-se que o parágrafo único do dispositivo constitucional citado prevê que a Lei complementar poderá autorizar os Estados a legislar sobre questões específicas acerca de matérias Penais. 8 As Fontes Formais, por sua vez, podem ser divididas em Diretas e Indiretas: - Fontes Diretas (Imediatas) – são as constituídas pelas Leis, ou seja, as fontes que contêm a norma em si mesma. A única Fonte Direta do Direito Penal, diante do Princípio da Reserva Legal, é a Lei. Estas dividem-se em: Fontes processuais penais Principais, abrangendo a Constituição Federal e o Código de Processo Penal; Fontes processuais penais Extravagantes, constituídas, com exceção do Código de Processo Penal, pelas demais leis processuais infraconstitucionais, como a Lei dos Juizados Especiais Criminais, a Lei de Imprensa*, a Lei de Drogas, etc. Tais fontes comportam ainda uma subdivisão em : a) Complementares: são leis aplicáveis a setores que não foram compreendidos pelo Código de Processo Penal e completam normas já existentes; b) Modificativas: são leis que alteram normas anteriormente existentes. Modificam, extinguem ou ampliam normas e preceitos do Código de Processo Penal. Fontes Orgânicas Principais: que são constituídas pelas leis de organização judiciária, e, Fontes Orgânicas Complementares: que são constituídas pelos regimentos internos dos tribunais. - Fontes Indiretas (Supletivas, Subsidiárias ou Mediatas) – são aquelas que, embora não contenham a norma, produzem-na indiretamente. Assim, são considerados como tais: os Costumes (Conjunto de normas de comportamento a que a pessoas obedecem de maneira uniforme e constante pela convicção de sua obrigatoriedade / usos forenses), e, os Princípios Gerais do Direito (Premissas Éticas que são extraídas, mediante indução, do material legislativo / brocardos jurídicos). 9 - Fontes secundárias – emprestando-se à expressão o sentido de fontes que, sem conterem a norma, produzem-na de maneira secundária ou incidental, têm, também, sua importância. (Doutrina) Tem tal qualidade o Direito histórico, o Direito estrangeiro, as construções doutrinárias nacionais ou alienígenas que, inegavelmente, auxiliam a redação das leis, a sua interpretação e, às vezes, a própria aplicação da norma. * Tais Fontes Formais sofrem importante limitação como decorrência do Princípio da Legalidade (CF, artigo 5º, XXXIX, e, CP, artigo 1º). Não se admite que de seu emprego resulte o surgimento de Delitos não previstos em Lei ou, ainda, a agravação da punibilidade de Delitos já existentes. * Os Princípios Gerais do Direito e os Costumes, portanto, somente incidem na seara da Licitude Penal, ampliando-a. Os trotes acadêmicos, por exemplo, traduzem uma prática reconhecida e costumeira, de modo que possíveis infrações, como Injúria (ex.:referir-se ao calouro como “bicho”) ou Constrangimento Ilegal (ex.: obrigar o novato a repetir cânticos satíricos contra a vontade), são considerados permitidas à luz do artigo 23, inciso III, do Código Penal (Exercício Regular de um Direito). Os Costumes, além disso, representam importante recurso interpretativo, sobretudo no tocante aos elementos normativos presentes em alguns Tipos Penais (ex.: a expressão “Ato Obsceno” no artigo 233 do Código Penal). Modernamente se considera como Fontes Formais Diretas / Imediatas: a Lei, a Constituição Federal, os Tratados e Convenções Internacionais de Direitos Humanos, a Jurisprudência, os Princípios, os complementos da Norma Penal em Branco. (Rogério Sanches Cunha) 10 Tratados, convenções e regras de direito internacional Esta mencionado no artigo 1º, I do Código de Processo Penal. Os tratados são acordos assinados entre países em assuntos de natureza política, incluindo-se os da repressão aos ilícitos penais. As convenções, de uma maneira geral, têm natureza privada. Por fim, as regras de direito internacional são princípios induzidos das leis internas dos Estados civilizados ou inferidos de convenções internacionais ou afirmados na doutrina ou proclamados em congressos. ( Hélio Tornaghi ). De acordo com a nova Constituição Federal, verificar os artigos 84, VIII, 49, I, 21, I. Nos termos do artigo 102, do Regulamento da ONU, os tratados estão sujeitos a registro para terem vigência. Como os tratados devem ser submetidos à deliberação do Congresso Nacional para vigirem como norma jurídica interna, a doutrina os tem considerado como fonte secundária do direito. O Código de Processo Penal, porém, lhes dá o mesmo valor que a Lei, afastando esta quando o contraria. O Supremo Tribunal Federal, aliás, tem decidido que, no conflito entre a Lei e o Tratado há prevalência deste. Segundo esta orientação, o Tratado é fonte direta primária do Direito Processual Penal como dos demais ramos do direito. Analogia A analogia é uma forma de auto-integração da Lei. Somente pode ser aplicada na lacuna involuntária desta, não sendo cabível nas hipóteses em que a Lei processual tem caráter inflexível, taxativo, ou seja, na lacuna involuntária da Lei, aplica-se ao fato não regulado expressamente um dispositivo que disciplina hipótese semelhante. ( artigo 4º da LINDB, 126 Código de Processo Civil, e, artigo 3º do Código de Processo Penal ). 11 RELAÇÕES DO DIREITO PROCESSUAL PENAL O Direito Processual Penal, sendo um ramo da “árvore jurídica”, deve ter íntima correlação com os demais ramos do Direito. Essa relação mais se salienta com o Direito Constitucional, que trata da organização e estrutura do Estado, do funcionamento dos poderes e do exercício do direito público dos indivíduos. O Direito Constitucional, aliás, constitui o mais importante alicerce e fundamento da organização estatal, já que traça os princípios fundamentais de todo arcabouço jurídico. Também mantém íntima correlação com os demais ramos das ciências jurídicas como Direito Penal, Direito Processual Civil, Direito Administrativo, Direito Civil, Direito Comercial, e, Direito Internacional Público. Além disso, beneficia-se de ciências extra-jurídicas, que colaboram com os atos de investigação e do processo a fim de que a composição do caso penal se faça da forma mais adequada, inspirada sempre no ideal de Justiça. São as ciências auxiliares do Direito Penal e do Direito Processual Penal como a Medicina Legal, a Psiquiatria Forense, a Psicologia Judiciária, Odontoscopia, Estatística Criminal, e a Polícia Científica ou Criminalística. APLICAÇÃO E INTERPRETAÇÃO DA LEI PROCESSUAL PENAL Não havia, antigamente, problemas de interpretação; as penas tinham aplicação automática. Hoje, toda Lei esta sujeita à interpretação, e os conflitos de Leis no tempo resolvem-se pelos princípios da retroatividade ou da irretroatividade. Em regra, as Leis Penais são irretroativas, salvo quando beneficiarem o Réu (Acusado), é o que dispõe a Constituição (art. 5º, XL). Da mesma forma, o Código Penal prevê que ninguém será punido por fato que a Lei posterior deixa de considerar crime (art. 2º) – Abolitio criminis. 12 Interpretação A Lei processual, como toda Lei, está sujeita a interpretação, que é o processo lógico que busca mostrar a vontade contida na norma jurídica. Interpretar é desvendar o conteúdo desta. ( Magalhães Noronha ). A ciência ou método que se preocupa com a interpretação da Lei é denominado Hermenêutica, cujos príncípios aplicam-se a todos os ramos do direito e, portanto, à Lei Processual Penal. A interpretação se apresenta nos seguintes termos : quanto ao agente ( quanto ao sujeito que realiza a interpretação ) : a) autêntica: (contextual, legislativa) é a que procede da mesma origem que a Lei e tem força obrigatória; vem inserida na própria legislação. Ex.: conceito de casa, de funcionário público ( arts. 150, §§ 4º e 5º e 327, do CP ); A interpretação, porém, pode ser promovida por Lei posterior, elaborada para esclarecer o sentido duvidoso de uma Lei já em vigor. b)doutrinária (doutrinal): que é fruto do comentário dos estudiosos do direito; c)judicial (jurisprudencial) : quando realizada pelos juízes e tribunais. quanto à natureza ( quanto ao meio empregado ) : a) gramatical, literal ou sintático : quando feita em função da letra da Lei. EX. : “denúncia” é a peça inicial da ação penal pública; b) lógica ou teleológica : quando feita em função da finalidade do dispositivo, da ratio legis, buscando a vontade do legislador. 13 quanto à extensão ( quanto ao resultado ) : a) declarativa : quando a eventual dúvida se resolve pela correspondência entre a letra e a vontade da Lei, não se ampliando e nem se restringindo o texto. Ex.: “casa habitada” - artigo 248 do Código de Processo Penal ; b) restritiva : quando a Lei, dizendo mais do que queria, obriga o intérprete a restringir o seu texto, para adequá-lo à sua vontade. Ex.: “propor meios de prova” - artigo 271 do Código de Processo Penal; c) extensiva : quando a Lei, dizendo menos do que queria, obriga o intérprete a ampliar o seu texto, para adequá-lo à sua vontade. Ex.: “documentos” - artigo 479 do Código de Processo Penal. Os doutos costumam fazer referências à interpretação analógica e à interpretação progressiva, que são espécies de interpretação extensiva : - Interpretação analógica: ao lado da interpretação extensiva e mantendo com esta certa similitude, está a interpretação analógica. Não se deve confundir, contudo, interpretação analógica com analogia. A primeira é forma de interpretação; a segunda é integração. É aquela em que, a vontade da norma, é abraçar os casos análogos não previstos singularmente. Ex.: “quaisquer outros elementos” - artigo 6º, IX do Código de Processo Penal. * Não se confunde a interpretação analógica, que é a busca da vontade da norma através da semelhança com fórmulas usadas pelo legislador, com aplicação da analogia, que é forma de auto-integração da Lei com a aplicação a um fato não regulado por esta de uma norma que disciplina ocorrência semelhante. 14 Quando se pode proceder à Interpretação Analógica? Quando a própria Lei a determinar. Algumas vezes, a Lei Penal (a própria lei penal) a permite, e o faz “quando uma cláusula genérica se segue a uma fórmula casuística”, e, nessas hipóteses, “deve entender-se que aquela somente compreende os casos análogos aos destacados por esta, que, do contrário, seria ociosa”. Assim, por exemplo, quando o artigo 61, II, c, do Código Penal fala em “à traição, de emboscada, ou mediante dissimulação, ou outro recurso que dificultou ou tornou impossível a defesa do ofendido”,pergunta-se: que outro recurso poderá ser este? Evidentemente deve ser um “recurso” semelhante, análogo á “emboscada”, à “traição”, à “dissimulação”, em molde a dificultar ou tornar impossível a defesa do ofendido. Não teria sentido que o legislador ali catalogasse todas as hipóteses que guardassem semelhança com a “emboscada”, com a “traição”, com a “dissimulação”. Preferiu, com boa técnica, fazer uso de uma fórmula casuística (à traição, de emboscada, mediante dissimulação) e, em seguida, lançar mão de uma fórmula genérica (ou outro recurso que dificultou ou tornou impossível a defesa do ofendido), entendendo-se, pois, que o recurso de que lança mão o agente, para se emoldurar no artigo 61, II, c, do Código Penal, há de ser semelhante à traição, à emboscada, à dissimulação. E ele o será, evidentemente, se dificultou ou tornou impossível a defesa do ofendido. Na Interpretação Analógica a vontade da norma é abraçar os casos análogos, semelhantes àqueles por ela regulados. (Veja-se, também, e a propósito, o art. 457, § 1º, do CPP.) Analogia é integração. Parte da doutrina entende que existe a plenitude do ordenamento jurídico e, por isso, não se pode cuidar de reintegrá-lo. A maioria, entretanto, entende que o ordenamento jurídico apresenta lacunas, vazios. Tais vazios, tais meatos, devem ser preenchidos, e o processo usado para o preenchimento, para inteirar, para completar, para integrar o ordenamento jurídico, chama-se analogia. Analogia é um Princípio Jurídico segundo o qual a lei estabelecida para determinado fato a outro se aplica, embora por ela não regulado, dada a semelhança em relação ao primeiro. Supõe, como diz Maggiore: a) a falta de uma disposição precisa no caso a decidir; b) a igualdade de essência entre o caso a decidir e o caso já regulado 15 * Como se percebe, nítida é a diferença entre a Interpretação Extensiva e a Analogia. Naquela, o intérprete conclui que a lei contém a disposição para o caso concreto, mas, como a expressão é mais defeituosa, procura-se adaptá-la à mens legis. Já, na Analogia, parte-se do pressuposto de que a lei “não contém a disposição precisa para o caso concreto, mas o legislador cuidou de um caso semelhante ou de uma matéria análoga”. * Nítida é a diferença, também entre Interpretação Analógica e Analogia. Ali, a vontade da lei é abranger os casos análogos àqueles por ela regulados. Aqui, não há essa voluntas legis, não existe essa vontade, mas o intérprete, assim mesmo, preenche o meato, o claro, o vazio. * Por outro lado, como bem adverte Antolisei, para que exista uma real e autêntica analogia, é indispensável que o caso não contemplado tenha em comum com o que se prevê a ratio legis . Distinguem-se, na doutrina, duas espécies de analogia: analogia “legis” e analogia “juris”. A primeira seria o processo de integração da norma com outra norma e a segunda, a integração da norma ou a integração do ordenamento com os Princípios gerais do Direito. Manzini entende ser artificiosa essa divisão e, por isso, prefere falar em analogia simples, quando o processo de integração é feito com a própria lei, e em suplemento analógico, quando a integração se opera com norma heterogênea. Alcalá-Zamora, por seu turno, considera que a analogia e os Princípios gerais do Direito correspondem a critérios distintos de classificação: a analogia é método de integração e os princípios gerais do Direito não passam de fonte de inspiração; por isso, em tema de integração, prefere falar, à maneira de Carnelutti, em auto-integração e heterointegração. Assim, para a Alcalá-Zamora ocorre a auto-integração quando as lacunas se colmatam, se preenchem, com a própria Lei; a heterointegração verifica-se quando as lacunas são preenchidas com matéria distinta, isto é, por normas jurídico-processuais distintas da Lei (sensu stricto), como, por exemplo, um decreto, uma portaria. 16 Não vemos inconveniência em afirmar que a auto-integração ocorre quando se colmam as colunas com normas homogêneas, isto é, do próprio estatuto, e que a heterointegração se verifica quando as lacunas são preenchidas com normas heterogêneas, isto é, de outro estatuto. Desse modo, quando o artigo 368 do Código de Processo Penal dispõe que o réu no estrangeiro, em lugar certo e sabido, deve ser citado mediante rogatória (pouco importando seja o crime inafiançável ou não, ficando contudo suspenso o prazo prescricional), pergunta-se: que deve conter a rogatória ? O Código não diz. Entretanto, no artigo 354, esclarece o que deve conter a precatória. Evidente que a carta precatória e a carta rogatória são peças análogas. O réu residindo fora da comarca do Juízo processante, mas no território nacional, será citado por precatória. Se no exterior mediante rogatória. São peças similares a precatória e a rogatória. Assim, como o artigo 368 não diz qual o conteúdo da rogatória, fazendo-o, entretanto, no que respeita à precatória, no artigo 354, evidente, em face da analogia, que o vazio da norma que se contém no artigo 368 deve ser preenchido com a norma contida no artigo 354, todos do Código de Processo Penal Pátrio Quando, entretanto, o preenchimento da lacuna deva ser feito com norma extraprocessual-penal, vale dizer, com norma heterogênea, pode-se falar em heterointegração. E pomos exemplo: suponha-se que o Juiz penal seja amigo íntimo do filho do réu. Quer abster-se de funcionar no processo. Poderá fazê-lo? Nos termos da Lei Processual Penal, não. O artigo 254, que cuida das causas que podem dar origem à suspeição, não trata da amizade íntima entre Juiz e o filho do réu. Também não admitiu, como causa de suspeição, o “motivo íntimo”. Todavia dispõe o parágrafo único do artigo 135 do Código de Processo Civil que o Juiz pode abster-se de funcionar no processo por motivo íntimo. Diante disso, se ele se sentir realmente constrangido em funcionar no feito, poderá invocar o disposto no art. 135, parágrafo único, do estatuto processual civil. E assim estaria colmado um meato do estatuto processual penal com uma norma do estatuto processual civil. Heterointegração, portanto. Na verdade, não há motivo algum que impeça o Juiz penal de invocar motivo de foro íntimo para se abster de funcionar no processo. Se pode fazê-lo no cível, por que razão charadística não poderá fazê-lo no crime? 17 Por outro lado, pode o intérprete inspirar-se nos chamados Princípios gerais do Direito. Diga-se de passagem que o artigo 3º do Código de Processo Penal dispõe: “A lei processual penal admitirá interpretação extensiva e aplicação analógica, bem como o suplemento dos princípios gerais do Direito”. Mas que são esses Princípios gerais do Direito? Não existe, a respeito, uniformidade conceitual. Há quem os identifique com os Princípios do Direito Natural; outros, com os extraídos do sistema da legislação vigente; outros, com os da eqüidade; outros, com os contidos nas obras dos antigos intérpretes etc. Hugo Alsina identifica-os com aqueles Princípios da legislação estrangeira (apud Alcalá-Zamora). Para Battaglini, os Princípios gerais do Direito espelham aquilo que de mais abstrato contém o ordenamento jurídico em vigor, atestando a unidade fundamental do Direito. Para outros, são aquelas verdades que informam o sistema jurídico (não podem contradizê-lo, pois, então, não seriam fontes subsidiárias) e podem ser buscados na doutrina e na jurisprudência. Todavia parece que a grande maioria se inclina em identificá-los com os aforismos, os brocados jurídicos “que nada mais representam senão condensação de soluções e de noções tradicionais do nosso ordenamento jurídico”. Desse entender são Alcalá-Zamora, De Diego, Giovanni Leone, entre outros. E, como exemplo, podemos citar: ne procedat judex ex officio, res judicata pro veritate habetur, nulla poena sine judicio, o Princípio do contraditório, da indisponibilidade do processo etc.E que falar da analogia no campo penal? Parte da doutrina entende que o processo analógico não tem aplicação no Direito Penal. Muitos, entretanto, defendem o ponto de vista de que o processo analógico não pode ser invocado no que respeita às chamadas normas penais incriminadoras. Realmente, em face do Princípio do nullum crimen, nulla poena sine lege, não é possível. Assim, não se concebe possa ser invocado o processo analógico para “admitir delito que não esteja expressamente previsto em lei”. Com elevado acerto ensina Battaglini, sintetizando toda a doutrina, que, se o fato não constituir delito, de maneira alguma poderá o intérprete considerá-lo como tal. 18 Assim, como exemplifica Hungria, se alguém constrange outrem, mediante violência ou grave ameaça, a celebrar contrato de trabalho, comete crime (CP, art. 198). E se alguém constrange outrem, mediante violência ou grave ameaça, a não celebrar contrato de trabalho? As situações são semelhantes, análogas, entretanto tal fato não se subsume no tipo traçado no artigo 198 do Código Penal. Se, por acaso, no nosso ordenamento houver um tipo ao qual se possa ajustar o fato acima descrito, será ele punível, porque corresponde ao modelo legal; senão, não. Outro exemplo: o Banco, que tem autorização de uma empresa para fazer cobranças, expede o competente “boleto”. Descobre-se que o débito já havia sido pago. Não se pode instaurar processo pelo crime tipificado no artigo 172 do Código Penal, porquanto “boleto” não é fatura e tampouco duplicata simulada... Em algumas legislações, ferindo-se frontalmente o Princípio da reserva legal, admitiu-se a analogia. Assim, o artigo 16 do Código russo de 1926 dispunha: “quando a ação socialmente perigosa ( abstcestvenno – opasnoe deistvie) não for expressamente prevista pelo Código, o fundamento e os limites da respectiva responsabilidade serão deduzidos dos artigos que contemplam os delitos de índole mais análoga”. Também na Alemanha nazista, a Lei de 28-6-1935 dispunha: “Na hipótese de o fato não se enquadrar imediatamente em determinada lei penal, será punido com base na lei cujo conceito fundamental melhor se aplique” (cf. Battaglini). Também o artigo 1º do CP dinamarquês de 1930 admite a analogia. As “advertências preliminares” do CP abissínio de 1931 contêm disposições interessantes. Assim, o art. 11: “È evidente que não faltarão ocasiões em que se apresentam casos não previstos por este Código; será necessário, então, indagar se o mesmo contém casos similares; resolver-se-ão aqueles, aplicando por analogia as disposições que regulamentarem estes”. Art. 12: “Na hipótese de surgir caso novíssimo, jamais ouvido, será o Tribunal Superior o competente para julgá-lo”. Afora essas exceções (e são bem poucas), vigora nas legislações, inclusive na nossa (CP, art. 1º), o Princípio de que não há crime sem lei anterior que o defina, e, como definir um crime é descrever o fato que o constitui, é claro que, se não se puder proceder à perfeita adequação típica, inexistirá fato punível, porquanto, em face do Princípio da “reserva legal”, o fato deve ser conforme ao tipo descrito em lei. 19 Mas, quando se trata se norma não incriminadora, a maioria se inclina por aceitar a aplicação analógica, desde que venha a beneficiar o réu. È chamada analogia in bonam partem. A respeito, já dizia o grande Carrara: “Por analogia não se pode estender a pena de um caso a outro; deve ser estendida de um caso a outro a justificativa por analogia”. Na verdade, quando se trata de norma não incriminadora ou norma não propriamente penal, como a chama Battaglini (e são todas aquelas da Parte Geral do CP), não há inconveniente em que se adote o processo analógico, desde que in bonam partem. Entre nós, Hungria dá-lhe combate, salientando que o nosso Código é profuso em causas de extinção da punibilidade; enumera em termos dúcteis as causas descriminantes e, além disso, ainda deixa grande arbítrio ao Juiz ao aplicar a pena. Assim, pouco lugar haveria para a analogia in bonam partem. Como exemplo de aplicação analógica in bonam partem, cita Noronha o caso do aborto médico à mulher violentada em seu pudor. Realmente. “A lei penal permite o aborto médico à mulher estuprada e, portanto, pergunta-se: se a mulher violentada em seu pudor excepcionalmente engravidar, poderá abortar? Não há norma a respeito, e, assim, a punição será fatal. A não ser pela analogia in bonam partem, aplicar-se-ão soluções diferentes a casos idênticos, o que é iníquo”. O Código consagra, como causa de extinção da punibilidade, nos crimes contra os costumes, o “casamento do agente com a ofendida”. E se, por acaso, fosse a mulher a autora do crime e o homem a vítima? A situação é análoga à prevista pelo legislador. Não fosse a aplicação da analogia in bonam partem e não se decretaria a extinção da punibilidade nesse caso. (Fernando da Costa Tourinho Filho, Processo Penal, Ed. Saraiva, 2002, 24ª Ed., 1º vol., p.158-163) - Interpretação progressiva: é aquela que se faz levando-se em conta as transformações sociais, científicas, jurídicas ou morais, adequando-se a Lei à realidade do fato. Ex.: “chefe de polícia”, “ Tribunal de Apelação”. 20 Normas Penais em Branco São normas que dependem de complemento Normativo. Normas Penais em Branco: são aquelas complementadas por outra norma, que pode ser Lei, decreto, resolução, portaria etc. São como lembrava Karl Binding (Heterogêneas), “como que corpos à procura de alma”. * Norma Penal em Branco: Próprias / Em Sentido Estrito / Heterogênea (Karl Binding) = o complemento é oriundo de fonte legislativa (fonte de produção) diversa daquela que a editou, ou seja, são aquelas que exigem um complemento normativo que emana de outra instância Legislativa (outra instância distinta do legislador). (Portaria, por exemplo, na Lei 11.343/2006 em seus artigos 28 e 33). * Norma Penal em Branco: Impróprias / Em Sentido Amplo / Homogênea (Edmund Mezger) = o complemento é oriundo da mesma fonte legislativa (fonte de produção) daquela que a editou. (Lei completada por Lei). Esta pode ser subdividida em duas espécies: - Homovitelina / Homóloga = é aquela cujo complemento normativo encontra-se no mesmo documento legal. Ex. artigo 312/327 do Código Penal. - Heterovilelina / Heteróloga = é aquela cujo complemento normativo encontra-se em documento legal diverso. Ex. artigo 236 do Código Penal / artigos 1521 e 1522 do Código Civil. 21 Conceito Primário * Normas Penais em Branco (Primariamente Remetidas); Conceito Secundário * Normas Penais em Branco Incompletas ou Imperfeitas (Secundariamente remetidas); Normas Penais em Branco ao Avesso; Ex.: Lei 2.889/56, Crime de Genocídio; Artigo 304 CP. * Repristinação: o fenômeno da Repristinação esta descrito no artigo 2º da LINDB, sendo que a Lei revogada volta a viger quando a Lei revogadora perdeu a vigência, só existe se a Lei nova dispuser nesse sentido ou se, mesmo não o fazendo, da interpretação da nova Lei se conclui que foi essa, implicitamente, sua intenção. Nessas hipóteses revigora-se a Lei primitiva. Aplicação Lei Processual Penal no Tempo Havendo possibilidade de iniciar-se um processo na vigência de determinada Lei e sobrevir Lei nova que o regule, surge o problema de dirimir o aparente conflito entre as duas regras jurídicas, a anterior e a posterior. De acordo com o artigo 2º do CPP vige o princípio tempus regit actum, ou seja, estabeleceu-se na Lei o chamado princípio da imediatidade ( efeito imediato ou aplicação imediata ), do qual derivam dois efeitos : a) os atos processuais realizados sob a égide da Lei anterior se consideram válidos; b) as normas processuais têm aplicação imediata, regulando o desenrolar restante do processo. ( Rogério Lauria Tucci ). 22 * Irretroatividade : A Lei processual penalbrasileira não é retroativa pois se aplica aos fatos processuais ocorridos durante a sua vigência, e, ademais, se tivesse, a retroatividade anularia os atos anteriores , o que não ocorre. A Lei não retroage para prejudicar a validade de atos já praticados sob a vigência da Lei anterior. O acusado do crime não tem o “direito adquirido” de ser julgado pela Lei processual vigente ao tempo em que ele ocorreu mas apenas que a Lei nova respeite as garantias constitucionais do devido processo legal, com os seus corolários explicitados da Carta Magna. Assim, se a nova Lei penal, ainda que não exclua a incriminação, for mais favorável ao agente, deve necessariamente retroagir para beneficiá-lo; Já no Processo Penal é diferente, porque o processo é instrumento de aplicação correta da Lei a fatos concretos, não interferindo no Direito Material do Acusado. Não se pode negar, porém, que existem normas mistas, ou seja, que abrigam naturezas diversas, de caráter penal (que versam sobre o crime, a pena, a medida de segurança, os efeitos da condenação e, de um modo geral, o jus puniendi), e de caráter processual (que regulam o processo desde o seu início até o final da execução ou extinção da punibilidade). Se um preceito legal, embora processual, abriga uma regra penal, de direito material, aplica-se a ela os princípios que regem a Lei penal, de ultratividade e retroatividade da Lei mais benigna. É evidente que uma Lei processual penal pode acarretar maiores gravames para o acusado, mesmo assim, aplica-se o princípio do efeito imediato previsto no artigo 2º do CPP. É verdade que muitas vezes a Lei processual que entra em vigor não pode ter total aplicação, principalmente nos processos em andamento. Por isso, processos que já estejam em andamento não são atingidos pela Lei nova, conforme seu estágio, sob pena de se criar embaraços, tumultos e dificuldades (Paulo Lúcio Nogueira). 23 No que tange à fiança e prisão preventiva, é de se notar que o artigo 2º da LICPP excepciona o princípio da imediatidade, ou seja, a Lei nova é que as regula, pois não passam de medidas cautelares de coação processual. (José Frederico Marques). Lei Processual Penal no Espaço No que diz com a eficácia da Lei penal no espaço existem quatro princípios : a) territorialidade : a Lei penal de um Estado só impera dentro dos seus limites territoriais. Dentro dos limites territoriais do Estado que a promulgou, a Lei penal é aplicável a todos quantos a infringirem, pouco importando ser nacional ou estrangeiro; b) nacionalidade ou personalidade : é aquele segundo o qual o indivíduo, onde quer que esteja, faz-se acompanhar do direito punitivo do seu Estado de origem. De acordo com tal princípio, se um cidadão brasileiro for à Grécia e praticar naquele país um fato punível, a Lei penal aplicável será a brasileira; c) real, proteção ou defesa social : leva-se em consideração a nacionalidade do bem jurídico ofendido ou ameaçado pelo fato punível, sendo de nenhuma importância o lugar onde haja ocorrido o fato e a nacionalidade do seu autor; d) justiça penal universal ou universalidade da Lei penal : aplica-se ao autor do fato punível a Lei penal do país em que se encontre, seja qual for o lugar onde o crime foi cometido, seja qual for sua nacionalidade ou o bem jurídico violado. 24 O problema da aplicação da Lei penal no espaço não pode, entretanto, ser solucionado por qualquer desses princípios, isoladamente. Nos Códigos penais modernos vigora um verdadeiro sistema em que há predominância do princípio da territorialidade e aplicação dos demais princípios. O Direito Processual Penal é eminentemente territorial, uma vez que os órgãos judiciários só aplicam as normas processuais de seu próprio Estado. Vigora, assim, o princípio que Carnelutti enuncia dizendo que o processo está disciplinado pelas normas do Estado a que pertence o órgão judiciário que o dirige ( Niceto Alcalà-Zamora Y Castilho ). O nosso Código Penal adotou um sistema complexo ou misto, com aplicação dominante da Territorialidade (artigo 5º e 7º). Com referência à Lei processual, foi adotado o Princípio da Territorialidade, pois as Leis não ultrapassam os limites do Estado que as promulgou (artigo 1º do CPP). O artigo 1º do Código de Processo Penal Pátrio não firma, apenas, a regra da Territorialidade da Lei processual penal, e sim também o princípio da unidade do direito processual penal em território brasileiro. (Fernando da Costa Tourinho Filho). Ressalvas : Dizendo o artigo 1º do CPP que “o processo reger-se-á em todo o território brasileiro, por esse Código”, dá a entender que todo caso de caráter penal que surgir no território pátrio será solucionada de acordo com as normas do CPP. E assim é. Todavia, por razões várias, foram feitas algumas ressalvas, textualmente previstas no próprio artigo. 25 PRINCÍPIOS PROCESSUAIS Princípios do Processo Penal 1) Princípio do inquisitório ou investigatório do inquérito policial ( CPP, art. 5º ) 2) Princípio da legalidade ( CPP, arts. 5º e 24 ) 3) Princípio da indisponibilidade ( CPP, arts. 42 e 576 ) 4) Princípio da oportunidade ( CPP, arts. 30, 31, 33 e 34 ) 5) Princípio da disponibilidade ( CPP, arts. 49 e s. ) 6) Princípio da iniciativa das partes ( CPP, arts. 24, 29 e 30 ) 7) Princípio da oficialidade ( CPP, art. 6º ) 8) Princípio da publicidade ( CPP, art. 792 ) 9) Princípio do livre convencimento ( CPP, art. 157 ) 10) Princípio da verdade real ( CPP, art. 197 ) 11) Princípio do contraditório e ampla defesa ( CPP, arts. 261 e 263 ) 12) Princípio da imparcialidade do juiz ( CPP, arts. 252 e 424 ) 13) Princípio do “ favor rei ” 14) Princípio da fungibilidade recursal ( CPP, art. 579 ) 15) Princípio da peremptoriedade recursal ( CPP, art. 798 ) 26 Princípios Constitucionais 1) Princípio do devido processo legal ( CF, art. 5º, LIV ) 2) Princípio do juiz natural ( CF, arts. 5º, LIII e XXXVII ) 3) Princípio do promotor natural ( CF, art. 5º, LIII ) 4) Princípio da inocência ( CF, art. 5º, LVII e LXII ) 5) Princípio da legalidade da prisão ( CF, art. 5º, LXVI ) 6) Princípio da amplitude da defesa e do contraditório ou bilateralidade ( CF, art. 5º, LV ) 7) Princípio da individualização da pena ( CF, art. 5º, XLV ) 8) Princípio da publicidade ( CF, art. 5º, LX ) 9) Princípio da inadmissibilidade as provas ilícitas ( CF, art. 5º, LVI ) * O vigente Processo Penal contém ainda outros princípios, que serão vistos há seu tempo, e regras importantes, inclusive, adotou o Princípio da Identidade Física do Juiz ou da Vinculação do Juiz ao Processo (Art. 399, § 2º CPP), que consiste na obrigação do juiz, que iniciar a instrução, ter que dar a sentença, como ocorre no Processo Civil (art. 132*), desde que concluída a instrução, pois o princípio da vinculação de juiz é de suma importância na convicção do julgador, que colhe diretamente a prova na instrução, mormente levando-se em conta o interesse público que domina o processo. 27 SISTEMA DE APLICAÇÃO DA PENA E DA MEDIDA DE SEGURANÇA Sistema do DUPLO BINÁRIO ou Dualista : prevê a aplicação da pena e da medida de segurança cumulativa e sucessivamente para o condenado perigoso; Sistema VICARIANTE ou Unitário : prevê a aplicação da pena para o imputável e da medida de segurança para o inimputável. A Exposição de motivos do Código Penal de 1984 esclarece: “ Extingue o Projeto a medida de segurança para o imputável e institui o sistema Vicariante para os fronteiriços. Não se retomam, com tal método, soluções clássicas. Avança-se, pelo contrário, no sentido da autenticidade do sistema. A medida de segurança, de caráter meramente preventivo e assistencial, ficará reservadaaos inimputáveis. Isso, em resumo, significa : Culpabilidade – pena; Periculosidade – medida de segurança. 28 SISTEMAS PROCESSUAIS Segundo as formas com que se apresentam e os princípios que os informam são três os sistemas processuais utilizados na evolução histórica do Direito: o inquisitivo, o acusatório e misto. Sistema Inquisitivo – não existe o contraditório, inexistem regras de igualdade ou paridade processuais, e, não há liberdades processuais. O processo é normalmente escrito e secreto e se desenvolve em fases por impulso oficial. As funções de acusar, defender e julgar são enfeixadas por uma mesma pessoa ou um mesmo órgão. A confissão é elemento suficiente para a condenação, permitindo-se inclusive a tortura etc; Sistema Acusatório – caracteriza-se pela existência do contraditório ( ou bilateralidade ), como garantia político-jurídica do cidadão, ou seja, supõe completa igualdade das partes. Devem ser conferidas as mesmas oportunidades para a produção de provas, para manifestações a respeito dos elementos probatórios etc. O processo é público, podendo ser oral ou escrito, e, as funções de acusar, defender e julgar são atribuídas a pessoas distintas; Sistema Misto ou francês – também conhecido como sistema acusatório formal. Prevê um processo desenvolvido em três etapas, a saber: a) investigação preliminar; b) instrução preparatória; e c) julgamento. Nas duas primeiras etapas, coincide com o sistema inquisitivo. Inexiste contraditório, deve ser escrito, é sigiloso, e, as três funções são desenvolvidas pela mesma pessoa etc. No julgamento final, passa a ser semelhante ao acusatório. Há contraditório, é público e o julgador não pode ser quem acusa. * No Brasil, a Constituição Federal assegura o Sistema Acusatório no Processo Penal (artigo 5º, LV, LIX, LIII, LX, e artigos 129, I, 126 e 92 ), bem como, no Código de Processo Penal em seu artigo 3º-A (Pacote anticrime), ou seja, o Sistema Acusatório é o contemplado pelo nosso Ordenamento Jurídico.
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