Buscar

A reconstrução do aprender

Prévia do material em texto

A reconstrução do aprender: impactos da pandemia da COVID-19 na Alfabetização com o olhar da Residência Pedagógica
Marina Souza Reis
Universidade Federal de São João del-Rei
Resumo: O relato de experiência descreve o diagnóstico de leitura realizado na Escola Estadual Aureliano Pimentel, em São João del-Rei, Minas Gerais, durante os meses de fevereiro e março de 2024. Com o objetivo de avaliar o nível de alfabetização, foram utilizados textos como "A cigarra e a formiga", "A Polegarzinha" e "A lenda do lobo" com turmas de 3º, 4º e 5º anos do Ensino Fundamental I. Os resultados revelaram um desempenho insatisfatório de muitas crianças, sugerindo impactos negativos da pandemia da COVID-19, especialmente em escolas públicas. A falta de acesso a recursos tecnológicos adequados, a interrupção das aulas presenciais e a ausência de interações sociais foram apontadas como possíveis causas para as dificuldades enfrentadas no processo de alfabetização. A colaboração entre residentes, preceptora e equipe pedagógica destacou-se como fundamental para a análise dos resultados e compartilhamento de estratégias. A experiência ressalta a importância da Residência Pedagógica como espaço de reflexão e formação, preparando o residente para enfrentar os desafios da educação com comprometimento e empatia. 
Palavras-chaves: Pandemia da COVID-19; Alfabetização em contexto escolar; Residência Pedagógica
Introdução 
A história da humanidade é marcada por desafios que exigiram adaptação e resiliência. A pandemia da COVID-19 emergiu como um desses desafios globais, transformando radicalmente a forma como vivemos, trabalhamos e, crucialmente, como aprendemos. Entre as diversas áreas afetadas, a educação foi profundamente impactada, e dentro dela, a alfabetização emergiu como uma preocupação central.
É sabido que, durante a Pandemia da COVID-19, houve um grande déficit na alfabetização do Brasil, ocorrendo um aumento de 66,3% o número de crianças que não sabiam ler e escrever, dentre estas, 47,4% são crianças pretas e pardas (Todos Pela Educação, 2022). 
Neste contexto, a Residência Pedagógica se destaca como um espaço de reflexão, formação e prática, onde futuros educadores são desafiados a repensar suas abordagens diante das demandas contemporâneas. 
Esta experiência de imersão no universo educacional oferece uma oportunidade única para explorar os desdobramentos da pandemia na alfabetização, permitindo uma análise profunda dos seus impactos e a identificação de estratégias resilientes de reconstrução do aprender.
Como afirmou Paulo Freire (1996), “a educação sozinha não transforma a sociedade, sem ela tampouco a sociedade muda”. Neste sentido, este relato de experiência busca analisar criticamente como a pandemia da COVID-19 influenciou os processos de alfabetização, através da perspectiva da Residência Pedagógica. 
Por meio de reflexões embasadas em teorias pedagógicas e práticas observadas em campo, pretendemos não apenas descrever os desafios enfrentados, mas também destacar as oportunidades e soluções encontradas para promover uma reconstrução do aprender em tempos de crise.
 Para tanto, este relato se apoiará em autores como Vygotsky (1984), que enfatizam a importância do contexto sociocultural na aprendizagem, e em pesquisadores contemporâneos que têm analisado os impactos da pandemia na educação. 
Ao final, almejamos contribuir para um debate enriquecido sobre o papel da educação na construção de um futuro mais inclusivo e resiliente, onde a reconstrução do aprender se apresenta como um desafio coletivo e urgente.
Desenvolvimento 
A experiência a ser relatada foi realizada na Escola Estadual Aureliano Pimentel, situada na Avenida Leite de Castro, número 89, Fábricas, no município de São João del-Rei, Minas Gerais, nas terças-feiras durante os meses de fevereiro e março de 2024, nas turmas de 3º, 4º e 5º anos do Ensino Fundamental I.
No início do ano letivo, a pedido da preceptora Cynara Cristina Lopes e Silva, eu e as demais residentes da escola fizemos um trabalho coletivo de diagnóstico de leitura com as salas do período matutino, sendo uma turma de 3º ano, quatro turmas de 4º ano e quatro turmas de 5º ano. Para cada série um texto era utilizado; no 3º ano o texto lido foi A cigarra e a formiga (letra bastão e de imprensa), nos 4º anos A Polegarzinha (letra de imprensa) e nos 5º anos A lenda do lobo (letra de imprensa). Um dia da semana foi selecionado para cada turma para que pudéssemos realizar o trabalho. 
O objetivo de realizar a leitura individual dos estudantes era observar em qual nível de alfabetização ele estava. Para isso, nos foi dado uma tabela com os seguintes cabeçalhos: Se recusou a ler/Não conseguiu ler; apresentou dificuldades na leitura; leu com fluência; leu com fluência e entonação. 
De acordo com a leitura do aluno, marcávamos com um “X” em qual aspecto ele se encontrava e, caso necessário, escrevíamos uma observação sobre. Ao final da leitura de cada turma, os resultados eram passados para a professora regente e para a coordenação da escola. 
A experiência relatada oferece uma oportunidade valiosa para reflexão sobre os desafios enfrentados no processo de alfabetização durante a pandemia da COVID-19, sob a perspectiva da Residência Pedagógica. A abordagem adotada, baseada em um diagnóstico coletivo de leitura com diferentes turmas do ensino fundamental, revela uma preocupação genuína com a compreensão individual dos estudantes em relação ao processo de alfabetização.
Nesse sentido, a teoria de Lev Vygotsky (1984) sobre a Zona de Desenvolvimento Proximal (ZDP) se mostra pertinente. Vygotsky (1984) enfatiza a importância do contexto social e das interações entre pares e com o professor no processo de aprendizagem. 
Ao realizar o diagnóstico de leitura de forma coletiva e com o apoio da preceptora, as residentes não apenas observaram as habilidades de leitura dos alunos, mas também identificaram possíveis lacunas de aprendizagem e áreas onde intervenções específicas poderiam ser necessárias para promover o desenvolvimento cognitivo dos estudantes.
A utilização de diferentes textos e a observação do desempenho dos alunos em relação à fluência e entonação da leitura refletem uma abordagem diferenciada, que reconhece a diversidade de habilidades e necessidades dos alunos em diferentes estágios de alfabetização. Como destacado por Vygotsky (1984), o aprendizado é um processo contínuo e dinâmico, onde a interação entre o sujeito e o ambiente desempenha um papel fundamental.
Ao utilizar os textos “A cigarra e a formiga”, “A polegarzinha” e a “A lenda do Lobo”, as residentes e a preceptora buscaram não apenas avaliar a habilidade de decodificação dos alunos, mas também promover uma compreensão mais profunda do texto e das mensagens transmitidas. Isso remete à ideia de Vygotsky (1984) sobre a importância da compreensão para o desenvolvimento da leitura, indo além da simples identificação das palavras.
No entanto, a transição para o ensino remoto durante a pandemia pode ter representado um obstáculo significativo para esse processo. Goodman (1996) e Smith (1997) ressaltam a importância do contato direto com o texto e das interações sociais para o desenvolvimento da leitura. O distanciamento social pode ter limitado essas interações, impactando negativamente o progresso dos alunos no 3º ano em relação à alfabetização.
Além disso, a colaboração entre as residentes, a preceptora e a equipe pedagógica da escola demonstram a importância do trabalho em equipe e da troca de experiências no contexto da formação docente. 
Através dessa colaboração, foi possível não apenas realizar o diagnóstico de forma mais abrangente, mas também compartilhar conhecimentos e estratégias entre os diferentes agentes envolvidos no processo educacional.
No entanto, é importante ressaltar que a experiência também revelou desafios significativos, especialmente em relação às dificuldades enfrentadas pelos alunos no processo de alfabetização durante o período de distanciamento social e ensino remoto. Autores como Goodman (1996) e Smith(1997), ao discutirem a abordagem construtivista da alfabetização, destacam a importância do contato direto com o texto e das interações sociais para o desenvolvimento da leitura e escrita. 
A transição para o ensino remoto pode ter impactado negativamente esses aspectos, exigindo adaptações e estratégias específicas para garantir a continuidade do processo de alfabetização.
Em suma, a experiência relatada destaca a importância da Residência Pedagógica como um espaço privilegiado para a reflexão e ação no campo da educação, especialmente em tempos de crise como a pandemia da COVID-19. 
Ao integrar teoria e prática, e ao promover a colaboração entre os diversos agentes educacionais, a Residência Pedagógica desempenha um papel fundamental na reconstrução do aprender em contextos desafiadores, como os enfrentados durante a pandemia.
Resultados
	Durante o diagnóstico de leitura realizado com as crianças dos anos escolares do 3º, 4º e 5º ano podemos indicar que uma parcela significativa das crianças enfrentou dificuldades ao realizar a leitura dos textos, indicando um desempenho insatisfatório.
	Esses resultados refletem um desafio significativo no desenvolvimento da habilidade de leitura em ambos os anos escolares. Além disso, observou-se que muitos alunos se recusaram a ler ou demonstraram dificuldades significativas na decodificação das palavras.
	Essa situação pode ser atribuída a diversos fatores, sendo a pandemia da COVID-19 um dos principais. Durante o período de ensino remoto, muitas crianças enfrentaram dificuldades em relação ao acesso à educação de qualidade, especialmente aquelas que estudam em escolas públicas. 
	A falta de recursos tecnológicos adequados, a ausência de suporte pedagógico e a falta de acompanhamento familiar foram algumas das causas que contribuíram para o baixo desempenho no processo de alfabetização.
Além disso, a interrupção das aulas presenciais e a adoção de metodologias de ensino remoto podem ter limitado as oportunidades de interação social e prática da leitura, impactando negativamente o desenvolvimento das habilidades de leitura e compreensão.
	Portanto, os resultados obtidos durante o diagnóstico de leitura indicam a urgência de intervenções específicas para promover a alfabetização das crianças, especialmente aquelas que foram mais afetadas pela pandemia. 
	A análise desses resultados oferece insights valiosos para a formulação de estratégias pedagógicas mais eficazes e para o desenvolvimento de políticas educacionais que visem mitigar os impactos da crise sanitária na aprendizagem das crianças em idade escolar.
Conclusão 
	A experiência vivenciada na Escola Estadual Aureliano Pimentel, situada em São João del-Rei, Minas Gerais, durante o diagnóstico de leitura com as turmas de 3º, 4º e 5º anos do Ensino Fundamental I, ofereceu uma profunda reflexão sobre os desafios enfrentados no processo de alfabetização, especialmente em tempos de pandemia da COVID-19. 
A abordagem adotada, baseada em um diagnóstico coletivo de leitura, revelou um desempenho insatisfatório de muitas crianças em relação à compreensão e fluência na leitura dos textos propostos.
	Os resultados obtidos indicam que uma parcela significativa dos alunos enfrentou dificuldades na realização da leitura, refletindo um desafio substancial no desenvolvimento das habilidades de alfabetização. 
Essa realidade é especialmente preocupante considerando o contexto de ensino remoto imposto pela pandemia, que afetou de forma mais significativa as crianças que estudam em escolas públicas, como evidenciado pelos dados obtidos durante o diagnóstico.
	As causas para esse cenário desafiador são multifacetadas, incluindo a falta de acesso adequado a recursos tecnológicos, a ausência de suporte pedagógico durante o ensino remoto e a interrupção das interações sociais e práticas de leitura. A colaboração entre as residentes, a preceptora e a equipe pedagógica da escola desempenharam um papel crucial ao permitir uma análise abrangente dos resultados e ao promover o compartilhamento de conhecimentos e estratégias para enfrentar os desafios identificados.
	Diante desse contexto, a experiência durante o diagnóstico de leitura se mostra essencial para a futura prática profissional do residente. Ao integrar teoria e prática, e ao enfrentar os desafios reais da educação em um momento de crise, o residente desenvolve habilidades e competências fundamentais para atuar como educador comprometido com o aprendizado e o desenvolvimento integral dos alunos. 
A análise crítica dos resultados obtidos e a busca por estratégias pedagógicas mais eficazes são aspectos essenciais que contribuem para a formação de um profissional mais preparado e consciente dos desafios enfrentados no campo da educação.
	Portanto, a experiência na Escola Estadual Aureliano Pimentel durante o diagnóstico de leitura não apenas ofereceu insights valiosos sobre os desafios específicos enfrentados no processo de alfabetização, mas também contribuiu significativamente para o desenvolvimento pessoal e profissional do residente, preparando-o para enfrentar os desafios futuros com comprometimento, criatividade e empatia.
Referências bibliográficas
Freire, P. (1996). Pedagogia da Autonomia: Saberes necessários à prática educativa.
Ferreiro, E., & Teberosky, A. (1985). Los sistemas de escritura en el desarrollo del niño. Siglo XXI. 
Goodman, K. S. (1996). On reading. Routledge.
Instituto Todos Pela Educação. (2022). Nota Técnica: Alfabetização – Propostas para uma Política Nacional [PDF]. Recuperado de https://todospelaeducacao.org.br/wordpress/wp-content/uploads/2022/02/digital-nota-tecnica-alfabetizacao-1.pdf
Smith, F. (1997). Reading without nonsense. Teachers College Press.
Vygotsky, L. S. (1984). Mind in Society: The Development of Higher Psychological Processes.

Continue navegando