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CONHECIMENTO E MÉTODOS DO CUIDAR EM ENFERMAGEM Alexandra Bulgarelli do Nascimento Etapa do processo de enfermagem: investigação Objetivos de aprendizagem Ao final deste texto, você deve apresentar os seguintes aprendizados: Identificar o estado de saúde do paciente por meio da investigação. Reconhecer o processo de coleta, validação e agrupamento dos dados. Descrever as impressões iniciais dos padrões de funcionamento hu- mano, direcionando a investigação. Introdução O processo de trabalho de enfermagem tem o objetivo de organizar as práticas profissionais dos trabalhadores que compõem a equipe de enfermagem — enfermeiros, técnicos e auxiliares. Esse processo é com- posto pelas seguintes etapas: coleta de dados, diagnóstico, planejamento, implementação e avaliação. A primeira etapa, que se refere à coleta de dados, busca oportunizar a investigação das necessidades de saúde do indivíduo, da família, do grupo social ou da coletividade, configurando- -se como uma etapa fundamental para o correto desenvolvimento do processo de trabalho em enfermagem. Neste capítulo, os instrumentos que possibilitam a coleta de dados, visando a uma investigação assertiva, serão os tópicos de discussão, uma vez que o enfermeiro deve dominá-los para que consiga desenvolver um processo de enfermagem coerente com as necessidades em saúde das pessoas que buscam os diferentes cenários assistenciais. Coleta de dados A primeira fase do processo de trabalho de enfermagem se refere à coleta de dados, a qual tem o objetivo de municiar o enfermeiro para investigar as necessidades em saúde, seja no âmbito individual ou no coletivo (DIAGNÓS- TICOS..., 2018; TAYLOR et al., 2014). A coleta de dados deve ocorrer de forma organizada e sistematizada. Para tanto, o enfermeiro se utiliza de instrumentos, como a entrevista com o paciente e/ou família/rede de apoio (anamnese), o exame físico, o prontuário do paciente, os exames complementares, outros profissionais que prestaram assistência ao paciente e a literatura científica. Uma paciente idosa está internada em um hospital devido à infecção do trato urinário. Nesse momento, os cuidados planejados para ela se resumem basicamente aos de higiene e conforto, bem como à administração de antibiótico endovenoso três vezes ao dia durante 10 dias, até o término do tratamento, para que, em seguida, sejam repetidos os exames bioquímicos para verificar a resolução do processo infeccioso. A partir dessa situação, o médico responsável por ela solicitou a transferência da paciente do ambiente hospitalar para o domiciliar, com a garantia da continuidade dos cuidados. Essa solicitação foi possível, pois o plano de saúde contratado pela idosa oferece essa modalidade assistencial. Após o acionamento do plano de saúde da paciente, uma enfermeira da empresa de cuidados domiciliares (home care) foi até o hospital para investigar a condição de saúde da paciente e propor um plano de cuidados para seguimento domiciliário. Para essa investigação, a enfermeira consultou o prontuário da paciente, discutiu o caso dela com a enfermeira responsável pelo plantão e conversou com a paciente e o acompanhante. Ao término desse processo, a enfermeira da empresa de home care identificou os diagnósticos de enfermagem da paciente e propôs um plano de cuidados coerente com o atendimento das necessidades identificadas. Instrumentos para coleta de dados Entrevista A entrevista é um instrumento potente para investigar as necessidades em saúde, que não se referem ao diagnóstico médico — o qual se atém a identifi car o processo patológico presente —, e propor uma intervenção voltada para a cura ou o manejo da doença (TAYLOR et al., 2014). Etapa do processo de enfermagem: investigação2 Quando o enfermeiro se utiliza da entrevista com o paciente, ele busca identificar problemas de saúde reais ou potenciais, pois estes não estão centra- dos única e exclusivamente no manejo dos agravos biológicos e compreendem uma parte da existência humana. Ao entrevistar um paciente que buscou um centro de referência em HIV (vírus da imunodeficiência humana, do inglês human immunodeficiency virus) e aids (síndrome da imunodeficiência adquirida, do inglês acquired immunodeficiency syndrome), o enfermeiro se deparou com o relato de preocupação desse paciente em talvez ter transmitido o vírus HIV para o parceiro sexual e sobre a dificuldade de acesso aos medicamentos para o controle da doença. A partir desse breve relato, fica evidente que as necessidades em saúde desse paciente se referem ao aconselhamento sobre a prática de sexo seguro, ao encaminhamento do seu parceiro para verificar se foi ou não infectado pelo vírus e ao esclarecimento sobre os locais em que pode buscar os medicamentos para o tratamento. Essas ações propostas são o objeto da enfermagem, pois se traduzem em cuidados em saúde, visando a possibilitar formas de viver salutogênicas em detrimento da existência da doença, o que só é possível a partir de uma coleta de dados efetiva, que, nesse caso, ocorreu por meio da entrevista com o paciente. A entrevista com o paciente deve ser direcionada a partir do motivo da busca por atendimento em um serviço de saúde (TAYLOR et al., 2014). Essa preocupação é relevante, desde que a entrevista esteja centrada naquilo que faz sentido para o paciente e para o enfermeiro. Com isso, são evitados ques- tionamentos evasivos, perda de tempo e geração de expectativas que não serão atendidas. Veja a seguir algumas perguntas direcionadoras de uma entrevista que se baseia na queixa do paciente. Quais são os seus sintomas? Quando esses sintomas começaram? Você estava fazendo algo diferente quando os sintomas começaram? O que piora esses sintomas? O que melhora esses sintomas? Você está tomando algum medicamento? 3Etapa do processo de enfermagem: investigação A entrevista é um instrumento fundamental para concretizar a etapa de coleta de dados, pois visa a identificar as necessidades em saúde do paciente. Porém, ela também pode ser utilizada com os familiares ou rede de apoio do paciente, ou com outros profissionais da saúde que estão envolvidos no processo de cuidar. Isto demonstra a relevância do enfermeiro se apropriar da entrevista e utilizá-la na prática cotidiana dos serviços de saúde (TAYLOR et al., 2014). Durante a realização de uma entrevista com um paciente, o enfermeiro irá se deparar com dois tipos de dados: os objetivos e os subjetivos. Objetivos: relacionados aos sinais que o enfermeiro observa no paciente. Exemplo: aferição da pressão arterial, da avaliação do pulso, de lesão cutânea, entre outros. Subjetivos: são os dados referidos pelo paciente por meio da comunicação verbal e não verbal. Exemplo: tipo de mal-estar, início dos sintomas, face de dor, etc. A entrevista é composta por quatro etapas: preparação, apresentação, realização e finalização (TAYLOR et al., 2014). 1. Etapa de preparação: o enfermeiro se prepara para fazer a entrevista com o paciente, o que consiste em ler o prontuário, analisar os exames complementares realizados, discutir o caso com outros membros da equipe de saúde (caso necessário) e cuidar do ambiente em que a en- trevista será realizada, ou seja, ter um cuidado quanto à privacidade, ao conforto e à criação de vínculo com o paciente. 2. Etapa de apresentação: o enfermeiro se aproxima do paciente, faz a sua apresentação e estabelece as regras dessa interação junto a ele. 3. Etapa de realização: o enfermeiro realiza a entrevista e organiza os dados coletados que o subsidiarão para identificar os diagnósticos de enfermagem. 4. Etapa de finalização: o enfermeiro finaliza a entrevista informando isto ao paciente. É nesse momento que se resgata a criação de vínculo. Etapa do processo de enfermagem: investigação4 A observação é uma atividade imprescindível ao se considerar a efetividade do pro- cesso de trabalho de enfermagem, uma vez que ela possibilita ao enfermeiro captaro que acontece na realidade biopsicossocial das pessoas que buscam assistência nos diferentes estabelecimentos de saúde. Durante a entrevista, o enfermeiro irá coletar diferentes dados visando a compor a história de enfermagem, que deve conter o perfil do paciente, o motivo, a cultura, os medicamentos em uso, o histórico do paciente, as necessidades específicas e a rede de apoio (Quadro 2) (DIAGNÓSTICOS..., 2018; TAYLOR et al., 2014). História de enfermagem Perfil Nome, idade sexo, etnia, religião, profissão e escolaridade. Motivo Por que busca atendimento no serviço de saúde? Hábitos e padrão de saúde. Cultura Como é a alimentação, a tomada de decisão e as atividades? Medicamentos em uso Nome do medicamento, dose e aprazamento. Significado do processo saúde-doença para o paciente. Histórico História pregressa do paciente. Necessidades específicas Necessidades educacionais do paciente e dos familiares/acompanhantes. Rede de apoio Envolvimento do paciente e seus familiares/cuidadores no plano de cuidados. Quadro 2. Elementos que devem ser abordados na entrevista com o paciente 5Etapa do processo de enfermagem: investigação Exame físico O exame físico é um instrumento de coleta de dados objetivos. Por meio dele, o enfermeiro analisa a condição clínica do paciente e busca por agravos que demandam intervenções (DIAGNÓSTICOS..., 2018; TAYLOR et al., 2014). Para a realização do exame físico, é mandatório que o enfermeiro tenha antes realizado uma entrevista com o paciente e/ou familiares/acompanhantes. Essa medida busca direcionar a prática investigativa para realizar o exame físico. Para realizar o exame físico, o enfermeiro deve dominar os métodos propedêuticos, que são inspeção, ausculta, percussão e palpação (Figura 1). Figura 1. Os quatro métodos propedêuticos. Inspeção Observação do paciente quanto ao seu nível de consciência, à hidratação cutânea, à coloração das mucosas, ao edema, às lesões, etc. 1 Ausculta Método que se utiliza da interpretação dos sons para determinar a condição de saúde da pessoa, como, por exemplo, durante a ausculta cardíaca, respiratória ou abdominal. 2 Percussão Método que veri�ca a densidade do segmento corpóreo analisado. 3 Palpação Processo de tocar partes especí�cas do corpo do paciente, visando a identi�car massas tumorais, hiperplasias, etc. 4 Para que o processo de investigação ocorra de forma satisfatória, o en- fermeiro deverá dominar os métodos propedêuticos apresentados junto (se necessário) à investigação pormenorizada de outros segmentos corpóreos, como, por exemplo, quando se realiza uma avaliação neurológica, a qual exige do enfermeiro competências específicas quanto ao uso de técnicas para a sua execução. Etapa do processo de enfermagem: investigação6 A enfermeira de um Centro de Terapia Intensiva acabou de assumir o plantão e está se utilizando dos métodos propedêuticos para a avaliação clínica dos três pacientes de alta complexidade sob a sua responsabilidade. Durante a avaliação, ela identificou que um dos pacientes está anúrico há mais de 24 horas, o que fez com que ela discutisse o caso com a equipe médica. Após essa discussão, a equipe médica prescreveu alguns medicamentos e programou a realização de hemodiálise para esse paciente. Essa situação demonstra a relevância da atuação da enfermeira, que identificou o problema de saúde do paciente a partir da coleta e da interpretação dos dados, permitindo, dessa forma, a sua atitude em propor uma ação conjunta com a equipe médica, de modo a contribuir para a melhora da condição clínica desse paciente. Diante do apresentado, fica evidente que o enfermeiro deve dominar a técnica proposta para realizar os diferentes métodos propedêuticos, o que exige dele o desenvolvimento de competências voltadas para o conhecimento do método e a sua correta execução, bem como uma postura profissional adequada para a sua utilização. Um exemplo dessa atuação se dá por meio da aferição dos sinais vitais, compostos pela mensuração da frequência cardíaca, da frequência respiratória, da pressão arterial sistêmica e da temperatura corporal (Figura 2). 7Etapa do processo de enfermagem: investigação Figura 2. Relação dos sinais vitais com os métodos propedêuticos utilizados. Frequência cardíaca: o enfermeiro pode se utilizar da palpação ou da ausculta. Temperatura corpórea: o enfermeiro se utiliza da inspeção. Frequência respiratória: o enfermeiro se utiliza da inspeção. Pressão arterial sistêmica: o enfermeiro se utiliza da palpação e da ausculta. PACIENTE Prontuário do paciente O prontuário é outro instrumento potente para a coleta de dados, pois contém todos os registros dos cuidados realizados com esse paciente (DIAGNÓS- TICOS..., 2018; TAYLOR et al., 2014). Isto signifi ca que o enfermeiro, ao fazer uso do prontuário, terá acesso às anotações dos demais profi ssionais e aos resultados de exames complementares, como a dosagem de potássio e de enzimas cardíacas, os fatores de coagulação, os exames de imagem que auxiliam o diagnóstico médico, entre outros. Etapa do processo de enfermagem: investigação8 O prontuário do paciente, como o próprio nome diz, é do paciente, o que denota que as informações contidas nele devem ser utilizadas com sigilo, sendo que cabe ao estabelecimento de saúde realizar o arquivamento e ao paciente, caso necessite, solicitar uma cópia. O manejo do prontuário do paciente, portanto, implica práticas direcionadas para o atendimento das necessidades em saúde das pessoas, garantindo total sigilo dos dados consultados. No prontuário do paciente, o enfermeiro poderá consultar a história mé- dica, o exame físico, as consultas realizadas e os resultados e os laudos dos exames complementares, bem como as anotações das condutas dos demais profissionais que compõem a equipe multiprofissional. Métodos de coleta de dados Para a coleta de dados, a entrevista, o exame físico e o prontuário do paciente, o enfermeiro deve escolher e direcionar o instrumento para conseguir extrair o máximo de dados para identifi car as necessidades em saúde individuais, familiares e grupais. Um paciente pediátrico de dois anos foi internado devido à insuficiência respiratória aguda. Durante o processo de investigação, a enfermeira realizou a entrevista com a avó da criança, que a está acompanhando durante a internação, uma vez que os pais estão em horário de trabalho. Em seguida, a profissional consultou o prontuário do paciente, a fim de verificar a presença de eventuais alterações no quando clínico do paciente, bem como de exames complementares realizados. Por fim, a criança foi submetida a um exame físico, visando a identificar problemas de saúde. A partir dessa coleta de dados, que se utilizou dos instrumentos de entrevista, da consulta ao prontuário do paciente e do exame físico, a enfermeira identificou as necessidades em saúde, utilizando-se de um referencial teórico que norteou a sua prática profissional. 9Etapa do processo de enfermagem: investigação Em sua totalidade, após a coleta dos dados, é preciso que estes sejam va- lidados. A validação se refere à certeza que o enfermeiro deve ter em relação ao significado das informações coletadas. Isto se dá por meio, por exemplo, do envolvimento do paciente no processo de investigação ao questioná-lo em relação à medida da sua pressão arterial sistêmica ou sobre o seu peso de rotina (DIAGNÓSTICOS..., 2018; TAYLOR et al., 2014). Outra forma de validar os dados coletados acontece quando o enfermeiro se utiliza do conhecimento científico construído acerca do dado coletado (DIAGNÓSTICOS..., 2018; TAYLOR et al., 2014). Um exemplo é quando, diante do resultado alterado de um exame de gasometria arterial, o enfermeiro aciona a equipe médica para ajustar a infusão de eletrólitos ou os padrões da ventilação mecânica. O enfermeiro pode se utilizar de diferentes mecanismos para realizar a validação dos dados coletados,cujo objetivo é reforçar ou refutar o resultado alcançado com a entrevista, o exame físico ou a consulta ao prontuário do paciente (DIAGNÓSTICOS..., 2018). Essa postura profissional oportuniza a interpretação correta e, consequentemente, a identificação acertada das necessidades em saúde (TAYLOR et al., 2014). É fundamental, porém, ter o discernimento de que, para alcançar esse objetivo, o enfermeiro deve coletar os dados e em seguida agrupá-los de forma coerente, a fim de fortalecer determinado evento que necessite de atenção da equipe de saúde e, em última análise, contribuir para a validação e a identificação das necessidades em saúde e o planejamento do plano de cuidados (DIAGNÓSTICOS..., 2018). Etapa do processo de enfermagem: investigação10 NANDA INTERNATIONAL. Diagnósticos de enfermagem da NANDA-I: definições e classificação 2018–2020. 11. ed. Porto Alegre: Artmed, 2018. TAYLOR, C. R. et al. Fundamentos de enfermagem: a arte e a ciência do cuidado de enfermagem. 7. ed. Porto Alegre: Artmed, 2014. Leituras recomendadas MARTINS, B. M.; ARAUJO, T. C. C. F. Comunicação no contexto de reabilitação: o en- contro entre enfermeiro e paciente. Psicologia Argumento, v. 26, n. 53, p. 109–116, 2008. Disponível em: https://periodicos.pucpr.br/index.php/psicologiaargumento/article/ view/19643/18985. Acesso em: 16 jun. 2019. MARTINS, G. F. R. et al. Segurança do paciente e sistematização da assistência de enfer- magem no pós-operatório de transplante cardíaco: uma revisão sistemática. Brazilian Journal of Health Review, v. 2, n. 2, p. 727–741, 2019. Disponível em: http://brjd.com.br/ index.php/BJHR/article/view/1209. Acesso em: 16 jun. 2019. PEREIRA, G. N. et al. Relação entre sistematização da assistência de enfermagem e segu- rança do paciente. Enfermagem em Foco, v. 8, n. 2, p. 21–25, 2017. Disponível em: http:// revista.cofen.gov.br/index.php/enfermagem/article/view/985. Acesso em: 16 jun. 2019. SILVA, J. P.; GARANHANI, M. L.; PERES, A. M. Sistematização da assistência de enfermagem na graduação: um olhar sob o pensamento complexo. Revista Latino-Americana de Enfermagem, v. 23, n. 1, p. 59−66, 2015. Disponível em: http://www.scielo.br/pdf/rlae/ v23n1/pt_0104-1169-rlae-23-01-00059.pdf. Acesso em: 16 jun. 2019. SUSAKI, T. T.; SILVA, M. J. P.; POSSARI, J. F. A identificação das fases do processo de morrer pelos profissionais de Enfermagem. Acta Paulista em Enfermagem, v. 19, n. 2, p. 144–149, 2006. Disponível em: https://www.redalyc.org/html/3070/307023806004/. Acesso em: 16 jun. 2019. VAUGHANS, B. W. Fundamentos de enfermagem desmistificados: um guia de aprendizado. Porto Alegre: AMGH, 2012. 11Etapa do processo de enfermagem: investigação
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