Baixe o app para aproveitar ainda mais
Prévia do material em texto
Brazilian Journal of Development ISSN: 2525-8761 115476 Brazilian Journal of Development, Curitiba, v.7, n.12, p. 115476-115481 dec. 2021 Bloqueio atrioventricular total em paciente jovem sem antecedentes cardiovasculares Total atrioventricular block in a young patient without cardiovascular history DOI:10.34117/bjdv7n12-353 Recebimento dos originais: 12/11/2021 Aceitação para publicação: 01/12/2021 Thaissa Carvalho Viaggi Médica Residente Clínica Médica Hospital Agamenon Magalhães Rua Guimarães Peixoto, 148. E-mail: thaissaviaggi@gmail.com Alaíde Fernandes Santos Pinto Médica Residente Oftalmologia Hospital Augusto de Oliveira Camargo Rua Onze de Julho, 340. E-mail:alaide_pinto@hotmail.com Isabelle Araujo de Oliveira Santana Médica Universidade Tiradentes Endereço: Rua Capitão Joaquim Martins, 324. E-mail; isabellearaujoos@gmail.com Flávio José Araújo de Brito Filho Médico Universidade Tiradentes Av Beira Mar, 3538. E-mail: flaviobritofilho@gmail.com Ursula Maria Moreira Costa Burgos Doutorado e Mestrado em Ciências da Saúde Universidade Tiradentes Endereço: Av Murilo Dantas, 300. E-mail: ursulacostab@gmail.com RESUMO Introdução: O Bloqueio Atrioventricular (BAV) é um defeito de condução do estímulo elétrico que ocorre no feixe de his, podendo ser classificado de 1º ao 3º grau, sendo este considerado o bloqueio atrioventricular total (BAVT). A maior parte dos bloqueios são adquiridos e acometem mais homens com idade avançada. Na população jovem as duas principais causas de bloqueio atrioventricular são os bloqueios congênitos e pós- cirúrgicos. Objetivo: relatar caso de paciente jovem com BAVT sem antecedentes cardiovasculares. Método: as informações foram obtidas por meio de revisão do prontuário, entrevista com o paciente, registro fotográfico dos métodos diagnósticos aos quais o paciente foi submetido e revisão da literatura. Relato do caso: paciente do sexo masculino, 19 anos, natural e procedente de Aracaju-SE, sem antecedentes prévios de patologias cardíacas, relata pico hipertensivo há 1 ano, quando começou Brazilian Journal of Development ISSN: 2525-8761 115477 Brazilian Journal of Development, Curitiba, v.7, n.12, p. 115476-115481 dec. 2021 acompanhamento cardiológico, realizando exames, inclusive teste ergométrico, que foram normais. Há cerca de 6 meses cursou com episódio de síncope após esforço físico, realizou novo teste ergométrico que evidenciou BAVT de 2º e 3º grau, seguido de Holter 24 horas, com diagnóstico de BAVT e pausas de até 4,6 segundos. Foi submetido a implante de marca passo definitivo. Discussão: o caso relatado traz à luz a discussão sobre um paciente com BAVT que difere do habitualmente descrito para sua etiologia e epidemiologia considerando a faixa etária, ausência de sintomas durante a infância e a adolescência, ausência de alterações de exame físico e histórico de cirurgias prévias, bem como exames negativos para possíveis patologias relacionadas. Tardiamente, aos 19 anos, o paciente apresentou um pico hipertensivo e um episódio de síncope, com diagnóstico de BAVT. Diante disso faz-se presente a hipótese diagnóstica de BAVT congênito, cuja apresentação tardia foi incomum. Considerações finais: O BAVT congênito pode ter um curso benigno ao longo da vida, manifestando-se tardiamente. Palavras chaves: Bloqueio atrio-ventricular, marcapasso, síncope ABSTRACT Introduction: Atrioventricular block (AVB) is a conduction defect of the electrical stimulus that occurs in the His bundle, and can be classified from 1st to 3rd degree, the latter being considered the total atrioventricular block (TIAB). Most of the blocks are acquired and affect more men with advanced age. In the young population, the two main causes of atrioventricular block are congenital and post-surgical blocks. Objective: To report the case of a young patient with CHB with no cardiovascular history. Method: The information was obtained through medical record review, patient interview, photographic record of diagnostic methods to which the patient was submitted and literature review. Case report: male patient, 19 years old, born and coming from Aracaju-SE, with no previous history of cardiac pathologies, reports hypertensive peak 1 year ago, when he started cardiologic follow-up, performing exams, including ergometric test, which were normal. About 6 months ago, he had an episode of syncope after physical exertion, and underwent a new exercise test that showed a 2nd and 3rd degree CHB, followed by a 24- hour Holter with a diagnosis of CHB and pauses of up to 4.6 seconds. He underwent definitive pacemaker implantation. Discussion: The reported case brings to light the discussion about a patient with CHB that differs from what is usually described for its etiology and epidemiology considering the age range, absence of symptoms during childhood and adolescence, absence of changes in physical examination and history of previous surgeries, as well as negative tests for possible related pathologies. Later, at the age of 19, the patient presented a hypertensive peak and an episode of syncope, with a diagnosis of CHB. Therefore, we present the diagnostic hypothesis of congenital CHB, whose late presentation was unusual. Final considerations: Congenital CHB may have a benign course throughout life, manifesting late in life. Keywords: atrio-ventricular block, pacemaker, syncope 1 INTRODUÇÃO Os distúrbios de condução atrioventriculares (AV) ocorrem devido a dificuldades na passagem do estímulo elétrico através dos ramos do feixe de His, ou de suas divisões, seja por bloqueio do estímulo atrial, ou por lentificação causada por alguma patologia Brazilian Journal of Development ISSN: 2525-8761 115478 Brazilian Journal of Development, Curitiba, v.7, n.12, p. 115476-115481 dec. 2021 (SOUZA, 2009). Considera-se mais prevalente, quando adquirido, no sexo masculino e idade avançada (MORAES et al., 2016). Já nos indivíduos jovens as duas principais causas de bloqueio atrioventricular são os bloqueios congênitos e pós-cirúrgicos (CORCIA, 2016). O bloqueio atrioventricular (BAV) de segundo grau pode ser dividido em dois subtipos: Mobitz 1 ou Mobitz 2. No primeiro ocorre uma lentificação progressiva da condução atrioventricular e aumento do intervalo PR até que a condução AV fique bloqueada. No segundo, ocorre uma claudicação súbita da condução AV, notando-se condução AV 1:1 com intervalo PR fixo e, repentinamente, uma onda P bloqueada, seguida por nova condução AV 1:1 com PR sem alterações. Pode ocorrer também o BAV de terceiro grau ou Bloqueio Atrioventricular Total (BAVT), que consiste em interrupção completa dos estímulos elétricos de origem atrial para os ventrículos, impedindo sua despolarização, e tornando o foco abaixo do bloqueio responsável pelo ritmo ventricular. Tal quadro é traduzido no ECG como ondas P não relacionadas ao complexo QRS, que pode ser de caráter intermitente ou permanente. Os casos de BAVT congênito mais frequentemente tem diagnóstico ao nascimento, tendo uma apresentação variada, mas com mortalidade aumentada neste período, seguido de baixa taxa de complicações durante infância e adolescência, com posterior risco, na vida adulta, de síncope relacionada ao BAVT (síndrome de Stoke-Adams) (BODANESE, 2015). 2 CASO CLÍNICO Paciente do sexo masculino, 20 anos, com queixas de que há cerca de 1 ano apresentou quadro de cefaleia de início súbito, associada a níveis tensionais elevados. Foi iniciado esquema anti-hipertensivo com Captopril 50 mg ao dia e solicitado teste ergométrico. O exame físico não mostrou alterações. O teste ergométrico foi normal, inclusive com pressão arterial basal normal e de comportamento fisiológico. Após melhora dos sintomas, em menos de 1 semana, a medicação foi suspensapor prescrição médica. Como acompanhamento desse episódio hipertensivo, foi solicitado um novo teste ergométrico após 1 ano, que foi submáximo sem sintomas e evidenciou BAV de 2º e 3º graus. Ainda permanecendo assintomático, porém tendo relatado um episódio de síncope há 6 meses, após atividade física, foi solicitado Holter 24 horas, o qual detectou extrassistolia supraventricular infrequente, extrassistolia ventricular monomórfica rara, taquicardia atrial paroxística não sustentada e 18 pausas maiores que 2 segundos (máximo Brazilian Journal of Development ISSN: 2525-8761 115479 Brazilian Journal of Development, Curitiba, v.7, n.12, p. 115476-115481 dec. 2021 de 4,7s), todas associadas a BAV de Grau 2, bloqueio atrioventricular 2:1 e bloqueio atrioventricular avançado e por causa disso. Diante do quadro o paciente foi internado para implante de marcapasso definitivo. Como antecedentes pessoais trata-se de paciente portador de asma brônquica, sedentário, que nega outras patologias e tabagismo, e que relata roncopatia expressiva, além de história familiar de hipertensão arterial sistêmica (HAS), diabetes mellitus (DM) e câncer de intestino e de tireóide. Foram realizados exames laboratoriais e de imagem a fim de descartar doença de chagas, difteria, alterações autoimunes e processos inflamatórios, os resultados foram compatíveis com a normalidade. No hospital, no dia da implantação, o paciente realizou outro Holter, cujo resultado mostrou ritmo sinusal com 11 pausas (descritas como BAV avançado), a mais longa com 4,6s, 84 episódios de BAV de 2º grau tipo I com períodos de BAV avançado, intervalo PR normal durante o resto do registro, complexos QRS normais, ectopia ventricular esporádica na forma isolada, sem alteração significativa da repolarização ventricular em relação aos traçados iniciais do exame. O procedimento foi realizado sem intercorrências. No pós-operatório o paciente encontrava-se hemodinamicamente estável, ritmo cardíaco regular em 2 tempos com bulhas normofonéticas, pressão arterial: 130 x 80 mmHg, murmúrios vesiculares presentes sem ruídos adventícios, Saturação de O2 - 99%. 3 DISCUSSÃO O bloqueio atrioventricular total (BAVT) é definido como a inabilidade de um impulso atrial propagar-se aos ventrículos utilizando o sistema de condução normal (LIMA,1993). As etiologias podem ser de três tipos: (1) idiopática, (2) adquirida e (3) imunomediada (NIU, 2016). As causas são reflexo vagotônico excessivo (BAVT nodal), cirurgia, distúrbios eletrolíticos, miocardites, doença de Chagas, doenças autoimune, processos infiltrativos, estenose aórtica calcificada (BODANESE, 2015), mas pode ser congênito. Na população jovem as duas principais causas de bloqueio atrioventricular são os bloqueios congênitos e pós-cirúrgicos (CORCIA, 2016). O BAVT congênito caracteriza-se por baixa frequência cardíaca presente ao nascimento ou em idade precoce na ausência de história de difteria, miocardite, doença cardíaca isquêmica, miocardiopatia, cirurgia cardíaca prévia ou doença de Chagas (LIMA, 1993), sendo uma doença rara (incidência de 1:22000 nascidos vivos) e sua forma isolada correspondendo a mais de 70% dos casos de diagnóstico após o período neonatal, Brazilian Journal of Development ISSN: 2525-8761 115480 Brazilian Journal of Development, Curitiba, v.7, n.12, p. 115476-115481 dec. 2021 com o restante podendo estar associado a defeitos cardíacos congênitos. Para os recém- nascidos diagnosticados precocemente, e até mesmo na vida intrauterina, o mais comum é estar associado a cardiopatia estrutural, acompanhado de morbimortalidade aumentada. (JÚNIOR, 2014). No presente caso, descartadas as causas secundárias, o paciente se enquadra no diagnóstico de BAVT congênito na sua forma isolada. Nos pacientes com BAVT congênito após o período neonatal uma grande gama de apresentações clínicas pode ser observada, desde a evolução completamente assintomática, com o diagnóstico feito em exames de rotina, até o desenvolvimento de quadros graves de insuficiência cardíaca, síncope ou morte cardíaca súbita. Estes pacientes têm mortalidade aumentada no período neonatal, com baixa taxa de complicações durante infância e adolescência e posterior risco, na vida adulta, de síncope relacionada ao BAVT (síndrome de Stoke-Adams) (BODANESE, 2015). É descrito na literatura que mais de 94% das crianças portadoras de bloqueio AV congênito são submetidas ao implante de marca-passo antes de completar 15 anos de vida (JÚNIOR, 2014), sendo portanto incomum a apresentação descrita neste relato de caso. Pacientes como o do presente relato, com diagnóstico tardio do seu presumível BAVT congênito, em geral não apresentam cardiopatia estrutural e tendem a ter um prognóstico bom após implante de marcapasso definitivo. Entretanto, é preciso lembrar que podem se apresentar com eventos graves e parecem ter um risco tardio de desenvolver dilatação ventricular e insuficiência mitral (Friedman, 2003). 4 CONCLUSÃO Considerando-se que o paciente do caso relatado não apresentava nenhuma das patologias supracitadas como fator etiológico para o BAVT, ganha notória importância diagnóstica o BAVT congênito. Sua peculiaridade encontra-se no fato de o paciente chegar aos 19 anos de idade sem ter apresentado manifestações clínicas durante o período neonatal e infanto-juvenil. Mais que isso; exames realizados previamente não revelaram alterações, mostrando que o BAVT congênito pode realmente cursar com manifestação tardia. Brazilian Journal of Development ISSN: 2525-8761 115481 Brazilian Journal of Development, Curitiba, v.7, n.12, p. 115476-115481 dec. 2021 REFERÊNCIAS Lima, G. G. D., Meyer, G. B., Schellemberger, R., & Halperin, C. (1993). Bloqueio atrioventricular total congênito: uma revisäo. Rev. bras. marcapasso arritmia, 6(1), 44-9. Corcia, M. C. G., Saint Remy, L., Marchandise, S., & Moniotte, S. (2016). Exercise performance in young patients with complete atrioventricular block: the relevance of synchronous atrioventricular pacing. Cardiology in the Young, 26(6), 1066-1071. Bodanese, L. C. . FISIOLOGIA DO SISTEMA DE CONDUÇÃO CARDÍACO. [S.l.: s.n.], 2015. 7 p. Niu, M. C., Morris, S. A., Krenek, M., Caridad, M., Pedroza, C., Miyake, C. Y., ... & Valdés, S. O. (2016). Reassessing Risk Factors in Pediatric Patients With Pacemakers Implanted for Atrioventricular Block: The Impact of Nonsustained Ventricular Tachycardia. Journal of cardiovascular electrophysiology, 27(4), 471-479. Júnior, R.. Avaliação da estimulação ventricular direita crônica em crianças e adultos jovens com bloqueio atrioventricular congênito isolado. 2014. 14-15 f. (Medicina)- Universidade de São Paulo , São Paulo, 2014. Nelson, W. P. (2016). Diagnostic and Prognostic Implications of Surface Recordings from Patients with Atrioventricular Block. Cardiac electrophysiology clinics, 8(1), 25- 35. SOCIEDADE BRASILEIRA DE CARDIOLOGIA . Diretrizes da Sociedade Brasileira de Cardiologia sobre Análise e Emissão de Laudos Eletrocardiográficos . 2009. 7-8 p. De Souza, W. de O. ; Dias, A. G. M. ; Borghossian, S. H. C. Arritmias ventriculares e bloqueios cardíacos na unidade cardiointensiva: como eu trato. 2009. p. Artigos de revisão (Medicina) - Revista Hospital Universitário Pedro Ernesto, UERJ, [S.l.], 2009. 8. Moraes, E. R. F. L. De et al. Prevalência de bloqueios atrioventriculares em pacientes da Atenção Básica de Saúde: análise por telemedicina : Revista Latino-Americana de Marcapasso e Arritmia. São Paulo: [s.n.], 2016. p. v. 20. Friedman, D.M., Duncanson, L.J., Glickstein, J., Buyon, J.P. A review of congenital heart block. Images in Paediatric Cardiology. 2003, 5(3):36-48.
Compartilhar