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327Relações de dominação e resistência na sociedade medieval européia: camponeses, artesãos, mulheres, hereges e doentes
História
os portadores de doenças da pele, inclusive a hanseníase) ou hospitais 
(que funcionavam mais como estalagens). Mesmo quando resistiam 
à imposição de viver nos arredores e retornavam às cidades ou vilas, 
para esmolar, eram perseguidos por sinos ou tambores e apedrejados. 
 A hanseníase 
A hanseníase (popularmente chamada de lepra) é uma 
doença reconhecida desde as civilizações da antiguidade. 
Existem relatos bíblicos, que datam de 2.000 a.C., descrevendo 
sua ocorrência. 
Mas o que é realmente este mal? É uma doença infecciosa 
causada pelo Mycobacterium leprae, uma bactéria que afeta a 
pele e os nervos. É conhecida também como mal de Hansen, 
do nome de Gerhard Henrick Armauer Hansen (1841-1912), cientista 
norueguês que, em 1874, identificou o agente causador da doença. 
Normalmente manifesta-se por manchas na pele, mas não provocam 
dor, pois a bactéria afeta os neurotransmissores desta função. Apresenta-
se em quatro formas clínicas: indeterminada, tuberculóide, 
dimorfa e virchowiana. Estas duas últimas formas clínicas 
são as contagiantes, embora o contágio possa se manifestar 
entre 02 a 20 anos. Estima-se, segundo recentes pesquisas 
da Organização Mundial de Saúde (OMS), que mais de 
10 milhões de pessoas no mundo sejam portadoras da 
hanseníase.
 Esta doença foi trazida ao Brasil pelos colonizadores 
portugueses, no século XVI. Seu tratamento e erradicação 
tornaram-se nas décadas de 1990 e 2000, uma prioridade 
para a saúde pública, pois nosso país está em 4º lugar 
na incidência dos casos. O tratamento é a base de anti-
bióticos numa poliquimioterapia. A prevenção, para 
algumas formas, se faz por meio da vacina BCG. 
A hanseníase deixou como conseqüência, em vários 
momentos da História da humanidade, a exclusão do 
convívio social, separando os doentes dos saudáveis. Veja 
as considerações de um historiador sobre esta doença na 
Idade Média:
Texto 4
Chamava-se lepra a muitas 
doenças. Toda erupção pustulenta, 
a escarlatina, por exemplo, qualquer 
afecção cutânea passava por lepra. 
Ora, havia, com relação à lepra, um 
terror sagrado: os homens daque-
le tempo estavam persuadidos de 
que no corpo reflete-se a podridão 
da alma. O leproso era, só por sua 
aparência corporal, um pecador. 
Desagradara a Deus e seu peca-
do purgava através dos poros. To-
dos acreditavam, também, que os 
leprosos eram devorados pelo ardor 
sexual. Era preciso isolar esses bo-
des. 
(DUBY, 1999, p. 91).
Sintoma da hanseníase. JEAN LOUIS ALIBERTI (1768-
1837) Lepra nigrans, Clinique de l’Hospital Saint-
Louis, 1833. Http://easyweb.easynet.co.uk/~ian.
mccormick/alibert1833b.jpg Acesso em: 03 dez. 
2005.
n
Documento 11
 A peste negra
Já a peste negra, em 1348, foi responsável pela morte de um 
terço da população européia. A doença pode ter sido trazida por 
comerciantes vindos do oriente e por corpos contaminados jogados 
no Mar Mediterrâneo.
328 Relações culturais
Ensino Médio
Doktor Schnabel em Roma - 
1656. Gravura. Médico com fato 
“protetor” anti-peste em época de 
peste negra.
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A estrutura de saneamento urbano – muito precária nas cidades 
européias que inchavam com o renascimento urbano, por volta 
do século XIV – e os celeiros que guardavam cereais nos campos 
colaboraram para a proliferação de ratos e a disseminação da doença. 
As pulgas dos ratos carregam o bacilo Yersinia pestis, causador da 
peste, e estes, quando contaminados por meio das suas fezes, saliva ou 
urina, são os vetores, ou seja, os condutores que transmitem a doença, 
podendo causar uma epidemia. 
Ainda hoje, apesar da descoberta de tratamento, existem focos da 
doença em regiões de pouca estrutura e falta de tratamento do lixo 
urbano. No Brasil, nunca ocorreu uma epidemia de peste negra, mas 
ela foi detectada, especialmente em 1899, nas cidades portuárias do 
país. O médico e cientista brasileiro Adolfo Lutz (1855-1940), no início 
do século XX, conseguiu controlar a doença na cidade de Santos, 
combatendo a população de ratos. Atualmente, os focos da doença 
concentram-se nas regiões nordestinas. 
Os homens medievais que presenciaram a peste detectavam-na 
pelas infecções pulmonares (peste pneumônica), ínguas ou bubões 
(peste bubônica) próximos aos gânglios e manchas vermelhas ou 
feridas na pele. Entre os principais sintomas, identificavam febre alta 
e paralisação de alguns órgãos, especialmente os rins. O contágio 
poderia ocorrer em algumas situações de contato com os roedores ou 
com outras pessoas já contaminadas. Isto permitiu o surgimento de 
algumas medidas, que acreditavam poder controlar a doença: aspersão 
do dinheiro ou de cartas com vinagre, desinfecção de roupas e casas 
com enxofre ou perfume forte, colocação de balcões entre vendedores 
e compradores, uso de espátulas para distribuir a comunhão nas missas, 
uso de luvas e capas pelos médicos, entre outras que mantinham a 
distância e isolamento de pessoas.
Um dos maiores relatos da peste em Florença, na Itália, no ano de 
1348, está no livro Decameron, escrito em 1353 pelo escritor italiano 
Giovanni Boccaccio (1313-1375). É uma obra importante na literatura 
medieval, porque seu estilo em prosa testemunha o teocentrismo 
da época e acena para as primeiras mudanças renascentistas que 
valorizariam o antropocentrismo. Nesta obra, personagens narram a 
ocorrência e as conseqüências da peste negra em Florença com realismo 
e licenciosidade. Isto trouxe a Boccaccio a censura da Igreja Católica. 
Leia um fragmento da obra Decameron:
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Documento 13
O desastre lançara tanto pavor no coração dos homens e das mulheres que o irmão abandonava o 
irmão, o tio o sobrinho, a irmã o irmão, amiúde mesmo a mulher o marido. E o que é mais forte e qua-
se inacreditável: os pais e as mães, como se seus filhos não mais lhes pertencessem, evitavam vê-los 
e ajudá-los. 
(BOCCACCIO apud WOLFF, 1988, p. 26).
Giovanni Boccaccio - 
(1313-1375). In: Bibliothek des 
allgemeinen und praktischen 
Wissens. Bd. 5 (1905).
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Documento 12

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