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MORFOLOGIA URBANA E CONFORTO TÉRMICO-6

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MORFOLOGIA URBANA E CONFORTO TÉRMICO 
Rosangela Maria dos Santos 
 
O clima urbano e as modificações introduzidas pela 
urbanização 
 
Dentre as transformações ambientais, provocadas pelo processo de 
urbanização, destacamos aqui as alterações nas condições climáticas, 
com ênfase no aumento da temperatura do ar e modificação no 
regime de ventos. 
 
A modificação substancial na paisagem natural, a grande 
concentração de áreas construídas, parques industriais, adensamento 
populacional, pavimentação asfáltica, associados à concentração de 
poluentes, criam nas cidades um clima com especificidades tais que 
nos permite falar em clima urbano. 
 
O processo de urbanização modifica o comportamento dos elementos 
do clima (temperatura, umidade, vento e precipitações), alterando 
com isso as condições de conforto térmico nas cidades. 
 
Em decorrência do acréscimo de carga térmica, a temperaturas nas 
cidades é maior que na área rural circundante, ocorrendo o que se 
convencionou chamar “ilha de calor”. 
 
Varias pesquisas demonstram que a ilha de calor urbana, dentre 
outros fatores, tem uma forte relação com a morfologia urbana, esta 
entendida como a combinação das formas construídas com o relevo e 
a paisagem natural (geomorfologia), ou com a forma resultante da 
ocupação urbana (Villas Boas, 1986). 
 
O aumento de temperatura nas cidades provoca uma redução da 
umidade relativa do ar. Isto se explica pelo aumento da pressão de 
vapor saturado, visto que, para maiores temperaturas o ponto de 
saturação é mais alto, diminuindo assim a umidade relativa. 
 
A velocidade de deslocamento das massas de ar sobre a cidade 
também é menor do que sobre a área rural. Isto se dá em função do 
incremento da rugosidade do solo, que modifica o movimento e a 
velocidade dos ventos, dando-lhes características próprias. Formada 
pela superfície das massas edificadas, a rugosidade nas cidades 
altera significativamente a forma de deslocamento das massas de ar, 
mudando o seu movimento natural – laminar (em lâmina), para um 
movimento turbilhonar, que se caracteriza por uma serie de fluxos 
ascendentes e descendentes, rotacionais ou não rotacionais que, se 
corretamente utilizado, se introduz no interior da massa edificada, 
aumentando as perdas de calor por convecção das superfícies da 
massa edificada com a atmosfera (Figuras 1 e 2). 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 Figura 1 – Efeito da 
rugosidade sobre o 
perfil de velocidade 
dos ventos 
 
 
 
 
 
 
 
Figura 2 - Modelo de fluxo de calor sobre edifícios (Fonte: Wise et alli in: Villas Boas, 1983) 
 
A radiação solar no meio urbano é menor que no meio rural. Segundo 
Oliveira (1988:24), “os componentes da massa edificada atuam como 
horizontes “fabricados” que modificam a duração da exposição do sol 
desses espaços microclimaticos pela justaposição dos edifícios, os 
quais mascaram o sol em determinados períodos do dia ou do ano, 
provocando sombreamento no solo, sobre si mesmo, ou em outros 
edifícios”. Isto afetará sobretudo a duração de brilho do sol, de 5 a 
15% menos no meio urbano em comparação com o entorno rural. 
 
As radiações ultravioleta têm uma redução de 30% no inverno e 5% 
no verão em relação ao entorno rural. Isto se dá em função da maior 
quantidade de nuvens e nevoeiros presentes na atmosfera urbana, 
dificultando a penetração desses raios de menor comprimento de 
onda. 
 
A quantidade de radiação solar absorvida pela cidade é que vai 
determinar o seu efeito sobre o clima urbano. Esta depende da 
capacidade de absorção e retenção dos materiais das edificações e 
dos tipos de revestimento do solo e da duração da exposição do sol 
(Oliveira, 1988:33). 
 
A radiação proveniente da ação antropogênica (atividades industriais, 
o trânsito, o próprio calor metabólico do homem, os sistemas de 
condicionamento mecânico, a queima de combustível etc.) é um dado 
importante a ser considerado na presença da radiação térmica do 
clima urbano. “A radiação térmica produzida por atividades 
antropogênicas ultrapassa o balanço médio de radiação” Oliveira 
(1988:32). 
 
Nas cidades as altas temperaturas alcançadas pelas superfícies mais 
absorventes dão lugar ao movimento de ar ascendente, que junto ao 
aumento de poluentes, provoca um aumento de precipitações. 
 
Essas precipitações, em contato com os poluentes aéreos, poderão 
gerar chuvas ácidas sobre a cidade, corroendo os materiais 
constitutivos da massa edificada, fazendo mal à vida ali existente, 
poluindo os cursos d’água a serem canalizados. 
 
As chuvas violentas estão associadas aos efeitos provocados pela 
impermeabilização de superfície do solo urbano, junto aos efeitos 
provocados pela rede de drenagem e escoamento das águas pluviais. 
 
Na busca de instrumentos que minimizem os efeitos da urbanização 
sobre os principais elementos do clima, e consequentemente, sobre a 
qualidade térmica dos espaços, várias pesquisas vêm sendo 
conduzidas no Brasil. Apesar de ainda escasso, nota-se um maior 
interesse pelo assunto nos últimos anos, com um número maior de 
pesquisas. 
 
Monteiro (1976), buscando avaliar o papel da urbanização na criação 
de um ambiente climático diferenciado daquele regional, elabora um 
modelo teórico para a investigação do clima urbano. Em seu modelo 
teórico, Monteiro desenvolve uma metodologia de análise em 
que considera o clima urbano como um sistema (Sistema Clima 
Urbano - S.C.U.), composto de subsistemas, que se articulam 
segundo canais de percepção. 
 
Villas Boas (1979), com base em pesquisa experimental em túnel de 
vento ambiental, desenvolveu princípios de desenho para a obtenção 
de condições de conforto térmico e de qualidade do ar nos espaços 
exteriores urbanos, a partir de critérios de ventilação. 
 
Lombardo (1988), utilizando-se de imagens de satélite, 
infravermelhas, levantamentos de campo e técnicas para análise do 
uso do solo, realizou estudos sobre a ilha de calor na grande São 
Paulo, constatando uma estreita correlação entre o uso do solo e a 
distribuição das temperaturas dentro das estruturas urbanas, 
configurando a ilha de calor com suas diferentes intensidades. 
 
Oliveira (1988), com base em critérios gerais de conforto e 
salubridade para climas quente-úmido, quente-seco e frio, elaborou 
uma série de recomendações para o planejamento e o desenho 
urbano, a partir das características da forma urbana condicionantes 
do clima urbano, identificadas como sendo a rugosidade, porosidade, 
densidade de construção, tamanho-dimensão vertical e horizontal das 
edificações, ocupação do solo, orientação ao sol e aos ventos, 
permeabilidade do solo e propriedades termodinâmicas dos materiais 
constituintes, e que atuam associadas ás características do 
solo/paisagem (geomorfologia do solo). 
 
Num estudo que objetiva o entendimento da origem das chuvas e 
seus impactos físico ambientais na cidade de Belo Horizonte, Ferreira 
(1996) evidencia o processo de aquecimento na atmosfera da cidade, 
com a elevação da temperatura média - até 1950 era inferior a 220 C 
e na década de 90 já supera os 230C - e o crescimento da 
concentração de poluentes. 
 
Vidal (1991), em Natal, Nascimento (1995), em Belém, Assis (1990) 
e Santos (1999), em Belo Horizonte, analisaram a influência da 
morfologia urbana na distribuição espacial da temperatura no centro 
urbano. 
 
Silva (1999), buscando uma metodologia que permita observar as 
condições de ventilação natural urbana, tanto externas, quanto 
internas às edificações, desenvolveu estudos em túnel de vento 
ambiental para avaliar as ações do vento em uma área urbana de 
João Pessoa, na Paraíba, região nordeste do Brasil, caracterizada pelo 
clima quente e úmido. 
 
Assis (2000), desenvolveu um método de simulação física em modelo 
reduzido de áreas urbanas com boa capacidade de representar o 
fenômeno de troca térmica ligado à ocorrênciada ilha de calor, que 
possa ser utilizado no planejamento e projetos urbanos. Usando uma 
área urbana da cidade de Belo Horizonte, MG, como estudo de caso, 
aplicou os conceitos de “envelope solar” e “envelope de iluminação” 
para o controle da densidade de ocupação do solo urbano e 
volumetria das edificações, com o intuito de preservar as condições 
de acessibilidade aos recursos de insolação e iluminação natural. 
 
 
Morfologia urbana e “ilhas de calor urbana”: 
 Os estudos sobre a ilha de calor nas cidades e sua intensidade 
verificam que esta não apresenta uma forma muito simples. As 
consideráveis variações intraurbanas fazem com que os elementos do 
clima tenham um comportamento bastante diferenciado no interior 
de suas estruturas, caracterizando a cidade como uma coleção de 
microclimas. Assim, os dados climáticos se apresentam de forma 
bastante variada dentro da própria malha urbana, de acordo com as 
diversas formas de uso e ocupação do solo, ou melhor, de acordo 
com os atributos da morfologia urbana. Estes atributos correspondem 
tanto a forma urbana como um todo, quanto a arranjos morfológicos, 
além das características termodinâmicas dos materiais constituintes 
dessas morfologias. 
 
Uma importante distinção nas escalas de investigação do clima 
urbano tem sido dada por Oke (1976, in Lee, s/ data), que define 
para a zona das camadas inferiores da atmosfera, tipicamente abaixo 
dos 300m (em que o homem desenvolve as suas construções), 
a “camada de cobertura urbana” (urban canopy layer) e a “camada 
limite urbana” (urban boundary layer). Essa distinção permite fazer 
uma diferenciação entre os processos que ocorrem na microescala, 
que se estende desde o solo até aproximadamente o nível médio das 
coberturas das edificações, que corresponde à Camada de Cobertura 
Urbana, e aqueles na mesoescala, que corresponde à Camada Limite 
Urbana, geralmente acima da altura das edificações, sendo que as 
características da malha urbana são fundamentais na determinação 
destas. (Figura 3) 
 
 
ig 
Figura 3- Camada 
Limite Urbana e 
Camada de Cobertura 
Urbana (Fonte: Lowry, 
1988, in: Vidal,1991)) 
 
Oke (1981, in: Assis, 1990; Vidal, 1991; Monteiro, 1990; Lee, s/ 
data), destaca, dentro da Camada de Cobertura Urbana, o que vem 
sendo designado como “Fator de Visão do céu” (Sky View Factor), 
importante na entrada de energia (insolação) no sistema, e que é 
definido pela fração do hemisfério ocupado pelo céu, correspondendo 
ao ângulo formado por duas retas procedentes do centro da rua em 
direção ao ponto mais alto das paredes dos edifícios adjacentes. As 
figuras 4 e 5 ilustram essa relação. 
 
 
 
Segundo Oke (1981, in: Assis 1990), a intensidade da radiação de 
onda longa e a capacidade de armazenamento de calor nas 
superfícies são efetivamente as variáveis que determinam as 
diferenças no balanço de energia e nas taxas de resfriamento entre 
os meios urbano e rural. Dentro deste contexto, Assis (1990) conclui 
que, “a geometria da malha urbana, avaliada pelo “Fator de Visão do 
Céu” (Sky View Factor), e as propriedades térmicas das superfícies, 
vão aparecer como as propriedades mais relevantes”. 
 
 
 
 
 
 
Figura 4 – Fator de 
Visão do Céu (Sky 
View Factor) Fonte: 
Lowry, 1988, in: Vidal, 
1991 
 
 
 
 
 
 
 
Figura 5 – Fator de visão do céu – Praça Sete - Belo Horizonte - MG. Utilizando 
uma maquina fotográfica com lente especial (olho de peixe), voltada verticalmente 
para o céu exatamente sobre o ponto de mensuração, é possível registrar num 
circulo a expressão visual do céu acima do ponto, definindo o índice de “obstrução 
do céu”, que vem sendo designado como “Sky View Factor”, (Santos, 1999). 
 
 
 
Características da forma urbana condicionantes do clima 
urbano 
 
As características morfológicas (características do solo/paisagem) do 
sítio já o predispõe a um determinado desempenho térmico. 
Pequenas diferenças de conformação no terreno podem criar 
modificações notoriamente grandes no microclima. Ocupações de 
fundo de vale, encosta, planície etc. são condicionantes climáticas 
que acarretam diferentes alterações nas variáveis do clima. 
 
Sobre as encostas inclinadas que conformam o vale se apresentam 
uma série de pequenas circulações de ar que mescladas com o ar 
quente vizinho causam condições de temperatura intermediária. 
Como conseqüência, as temperaturas do fundo do vale serão mais 
baixas, enquanto que os lados das encostas, na parte superior, 
permanecerão mais quentes (Olgyay, 1968). 
 
As demais condicionantes que alteram as características do clima de 
uma dada região são as relações concernentes ao ambiente 
construído. Oliveira (1988), com base em critérios gerais de conforto 
e salubridade, analisou as alterações climáticas a partir das 
características da forma urbana, identificadas pela conformação 
espacial, rugosidade, porosidade, densidade de construção, o 
tamanho, o uso e ocupação do solo, a orientação, a permeabilidade 
do solo urbano, as propriedades termodinâmicas dos materiais e as 
áreas verdes. 
 
A Conformação Espacial é representada pelo espaçamento, 
disposição, altura, largura, e profundidade da massa edificada, 
acrescidos dos aspectos geomorfológicos (solo e paisagem natural). 
 
A Orientação refere-se ao posicionamento apropriado da forma urbana frente 
aos caminhos aparentes do sol, aos ventos e a elementos naturais ou não, 
contudo significativos – o mar, uma encosta de montanha, um grande rochedo, 
um lago artificial etc. - seja para expor-se ou para abrigar-se, periódica ou 
permanentemente, aos e dos efeitos produzidos por esses elementos” 
(Oliveira,1988). 
 
A rugosidade e a porosidade são características morfológicas que 
determinam o desempenho da estrutura urbana em relação a um 
maior ou menor aproveitamento dos ventos. 
 
A rugosidade é relação que combina a porosidade com variação nas 
alturas das edificações. “Quanto mais próximos os elementos da 
massa edificada, maiores os obstáculos à penetração dos ventos. 
Quanto maiores os contrastes entre as alturas dos elementos da 
massa edificada, maior o turbilhonamento dos ventos; melhor 
ventilação se combinada com porosidade; maior a velocidade dos 
ventos em parte da massa edificada próxima dos volumes mais altos; 
e maiores as trocas térmicas com o ambiente atmosférico, 
ocasionando menores ganhos térmicos, consequentemente, menores 
temperaturas do ar” (Oliveira,1988). 
 
Enquanto o espaçamento e as alturas relativas da massa edificada é 
uma relação concernente à rugosidade, sendo caracterizado a partir 
do volume e geometria da massa urbana, a porosidade, que é 
representada pela maior ou menor permeabilidade de uma estrutura 
urbana à passagem dos ventos e expressa através da relação entre 
espaços abertos e espaços confinados, é definida a partir da 
estrutura de parcelamento, índice de ocupação, existência de espaços 
vazios e largura das vias. 
 
A Densidade de Construção é representada pelo índice de ocupação. 
Às mais altas densidades correspondem as mais altas temperaturas. 
É o que verificou Lombardo (1985) em sua pesquisa em São Paulo, 
onde observou que os mais altos valores de temperatura estão 
relacionados às mais altas densidades de população, onde se 
encontram mais de trezentos habitantes por hectare. É nas áreas do 
centro da cidade, em áreas industriais e bairros operários com alto 
coeficiente de ocupação dos lotes na grande São Paulo onde 
Lombardo verificou os maiores gradientes de temperatura. 
 
Com relação à Ocupação do Solo, Lombardo (1985) constatou uma 
estreita correlação entre uso do solo e a distribuição das 
temperaturas dentro das estruturas urbanas. A localização de 
atividades, tais como, indústrias, comércio e serviços, 
normalmente significa a concentração de edificações e pessoas. 
 
A Permeabilidade do Solo Urbano é representada pela relação 
entre as áreas construídase pavimentadas com áreas livres 
de construção. Tanto a impermeabilização do solo, como a 
drenagem e escoamento das águas pluviais através de 
sistemas de esgotos, vias pavimentadas e telhados provocam 
a redução da umidade do ar e da evaporação, em virtude da 
baixa absorção das águas pluviais pelo solo e da pouca 
vegetação; a radiação térmica acumulada, não dispersa pela 
evaporação, aumenta o aquecimento dos espaços , massas 
edificadas e pessoas; as altas temperaturas alcançadas pelas 
áreas mais impermeabilizadas provocam baixa pressão 
atmosférica, gerando a concentração de massas úmidas 
(provenientes da região atmosférica do entorno urbano) e 
carreando precipitações sobre estas áreas, inundações e 
desabamentos nas áreas mais impermeabilizadas, quando 
das chuvas mais intensas, com os conseqüentes prejuízos 
sociais (Lombardo,1995:33). 
As Propriedades termodinâmicas dos materiais se relacionam 
principalmente à capacidade de absorção e reflexão dos diversos 
materiais em relação à luz e ao calor e dependem diretamente de 
suas propriedades físicas, como densidade, textura e cor. As mais 
altas temperaturas no meio urbano ocorrem onde é maior a 
incidência do concreto, cimento e pavimentação asfáltica, o que 
coincide com as áreas mais densamente construídas. 
 
As massas edificadas e as superfícies pavimentadas da estrutura 
urbana contribuem para o aumento das temperaturas no meio 
urbano, através das propriedades físicas dos materiais de superfície, 
as quais são expressas pelo albedo, absorção e emissividade, calor 
especifico, capacidade térmica e condutividade térmica. O 
albedo representa a relação entre a radiação de ondas curtas 
refletida e a radiação incidente, constituindo-se numa propriedade 
importante, uma vez que determina a taxa relativa de calor na 
superfície quando exposta à insolação . 
 
Os coeficientes de emissão e absorção dos materiais, para um dado 
comprimento de onda e uma dada temperatura são quase sempre os 
mesmos, o que eqüivale dizer que para um mesmo comprimento de 
onda, todo corpo com boa capacidade de absorção é bom radiador. 
 
Observando o fluxo de calor próximo à superfície do solo para 
diferentes tipos de pavimentos (asfalto, concreto e solo nu), Asaeda 
et alli (1993) demonstraram a importância da pavimentação do solo 
na alteração da temperatura do ar. Baseando-se em modelo de 
camadas paralelas na atmosfera e indicando a maior radiação 
infravermelha absorvida entre os limites de 200m da camada 
atmosférica, a análise demonstra que os pavimentos em concreto 
estocam substancial calor durante o dia, conservando a temperatura 
na superfície alta durante toda a noite, contribuindo para o 
aquecimento da atmosfera, sendo essa contribuição efetivamente 
menor que a proporcionada pela superfície de asfalto e mais que a 
observada em uma superfície de solo nu. 
Apesar de uma grande porção da radiação solar incidente no solo nu 
ser absorvida, sua superfície é menos aquecida que as de concreto, e 
bem menos que as superfícies de asfalto durante o período de 
aquecimento. Segundo os autores, isto pode ser explicado pelo fato 
que uma grande porção da radiação solar absorvida pelo solo nu é 
usada na evaporação da água estocada neste. Durante o período de 
aquecimento o calor estocado na superfície do solo nu é próximo ao 
calor estocado na superfície de concreto. Entretanto a temperatura na 
superfície do solo nu decresce mais rapidamente que em uma 
superfície de concreto durante o período de resfriamento, 
principalmente nos primeiros momentos de redução da radiação 
solar, resfriando o ar ambiente. Isso pode ser explicado pela baixa 
condutividade térmica do solo nu, impedindo que suas camadas mais 
profundas sejam aquecidas. Além disso, a evaporação acontece não 
somente na superfície do solo, mas ainda no interior deste, que ao 
ser transferida das camadas mais profundas até a superfície, libera 
vapor d’água na atmosfera, realizando com esta troca de calor 
sensível e latente. 
 
A importância das áreas verdes tem sido demonstrada em várias 
pesquisas. Em estudo que visa observar o efeito potencial da 
vegetação no ambiente térmico urbano, e utilizando modelo de 
simulação, Avissar (1994) demonstra que a vegetação pode afetar 
substancialmente o comportamento dos ventos, temperatura, 
umidade e o regime de precipitações nas áreas urbanas, podendo, 
quando utilizada no planejamento urbano, minimizar alguns dos 
efeitos antropogênicos gerados pelo desenvolvimento destas áreas. 
 
Lombardo (1985), confirmando o que outras pesquisas já haviam 
verificado anteriormente, mostrou que “nas regiões com maior 
concentração de espaços livres, com vegetação e nas proximidades 
ou junto aos reservatórios d’água, as temperaturas sofrem declínios 
acentuados”. 
 
Além do sombreamento das superfícies, auxiliando no controle da 
radiação solar, a vegetação contribui de forma significativa ao 
estabelecimento dos microclimas. “O próprio processo de fotossintese 
auxilia na umidificação do ar através do vapor d’água que libera” 
(Romero, 1988:97). 
 
Izard & Guyot (1980) afirmam que um hectare de bosque (10.000 
m2) pode produzir por evapotranspiração cerca de 5.000 toneladas de 
água por ano. O autor ressalta ainda que, no meio urbano, o 
consumo de calor latente para a evapotranspiração permite obter 
também um decréscimo significativo da temperatura ambiente. 
 
 
Os ventos e a forma urbana 
 
A busca pelo controle pelo controle do meio físico e a criação de 
condições favoráveis ao desenvolvimento dos objetivos e atividades 
humanas é tão antigo quanto o próprio homem (Olgyay, 1968). As 
preocupações ligadas aos efeitos do vento sobre os edifícios, por 
exemplo, há muito são levadas em conta, como pode ser visto em 
plantas de antigas cidades no antigo Egito. (Figura 6) 
 
Leonardo Da Vinci (1452-1519) chegou a representar, fig. 7, com 
alguma realidade física, o escoamento em torno de obstáculo 
claramente associável a um edifício alto e isolado (Saraiva, 1994 in: 
Silva, 1999). 
 
 
 
 
 Figura 6- (a) Esboço 
do layout de casas em 
Kahun, Egito, por volta 
de 2000 a.C.; 
 (b) Esboço 
de um plano de cidade 
espanhol para Buenos 
Aires nos tempos 
coloniais 
 
 
 
 
Figura 7 – Formação 
de vórtices em zonas 
de separação, segundo 
Leonardo da Vinci 
(Fonte: Silva,1999) 
 
 
Nos anos 60 e 70 vários autores preocuparam-se em evidenciar a 
questão bioclimatica ligada à produção do habitat. Por esta época, 
um número significativo de experimentos em túnel de vento procurou 
estudar a circulação dos ventos em torno dos edifícios, e observou 
que o tamanho, forma e dimensões dos edifícios, tipo e caimento do 
telhado e platibanda interferem no comportamento destes. Estes 
estudos são encontrados em Evans, 1972; Penwarden, 1973; Givoni, 
1968 e 1969; Villas Boas, 1979, Robins et alli, 1977. Uma melhor 
descrição destes estudos é encontrada em Villas Boas, 1983. 
 
 Limitando-se às edificações isoladas ou grupos de edifícios, estes 
estudos traduzem, basicamente, as inter-relações entre o vento e as 
construções (os efeitos dos ventos em torno dos edifícios). Nas 
cidades os obstáculos ao fluxo de vento são formas mais complexas 
(edifícios, arvores, arbustos, etc.) e o vento sopra em pulsações com 
variações constantes de direção. O modelo de deslocamento das 
massas de ar pelo efeito do vento no interior do tecido urbano é, 
pois, uma combinação de uma serie de fluxos ascendentes e 
descendentes, rotacionais e não rotacionais, de difícil explicação e 
reprodução. O simples conhecimento deste modelo em determinada 
porção da cidade é insuficiente para sua generalização para o 
território urbano e, além do mais, o seu levantamento e descrição é 
extremamente oneroso. 
 
A importância dos ventos e seus efeitos sobre as condições de 
conforto térmico e qualidade do ar se diferencia de acordo com as 
condiçõesclimáticas. Nas regiões de clima quente-úmido, além de 
importante para a qualidade do ar, os ventos são determinantes para 
os níveis de conforto térmico, acelerando as trocas térmicas por 
convecção e a perda de calor por evaporação, prevenindo o 
desconforto da pele úmida. A ventilação, principalmente a noturna, é 
a estratégia mais efetiva de resfriamento da massa construída. Se 
corretamente utilizada, se introduz no interior no interior da massa 
edificada, aumentando as perdas de calor por convecção da massa 
edificada com a atmosfera. 
 
Nos climas ou frias e os quente-árido, com temperatura acima de 
380 C, os ventos, embora necessários e importantes para a renovação 
e dispersão dos poluentes, são indesejáveis do ponto de vista do 
conforto térmico. Nesses casos, a maior preocupação está na 
concentração de poluentes e nas grandes pressões de vento, 
principalmente nos centros das grandes cidades, onde se encontram, 
nas proximidades de edifícios altos, velocidades de rajada que 
causam desconforto e até mesmo segurança para os transeuntes. 
 
Villas Boas (1979), a partir de estudos com modelos em túnel de 
vento ambiental, com o propósito de analisar as condições de 
conforto térmico e diluição de poluentes nas proximidades e dentro 
de um conjunto de modelos, demonstrou que: “(1) os espaços 
limitados por estruturas porosas estão sujeitos a melhores condições 
de conforto térmico (para regiões quentes) e qualidade do ar do que 
quando estão limitados por estruturas opacas (não porosas), se as 
fontes de poluição, a nível baixo, estão localizadas dentro dos 
espaços, sendo que o inverso é verdadeiro quando os poluentes são 
liberados fora dos espaços; (2) as estruturas porosas são muito mais 
efetivas do que as estruturas opacas no sentido de favorecer a 
ventilação cruzada nas estruturas a sotavento, quando elas têm a 
mesma altura, e estão distantes umas das outras em até 6 vezes 
suas alturas e (3) um aumento na altura das estruturas que formam 
um espaço fechado pode aumentar a acumulação de poluentes ao 
nível do solo quando as fontes se situam dentro do espaço e os tetos 
têm a mesma altura, ao passo que a presença de volumes mais altos 
a sotavento pode desviar o fluxo de vento para baixo e melhorar as 
condições de conforto térmico e de qualidade do ar” (Figura 8). 
 
 
 
 
Figura 8 – Condições desejáveis para a obtenção de conforto térmico e qualidade do ar 
(Fonte: Villas Boas, 1978) 
 
A colaboração e a integração de diferentes áreas do conhecimento, 
como a geografia física e climatologia urbana, assim como o 
desenvolvimento de ferramentas computacionais contribuiu para uma 
melhor compreensão do ambiente atmosférico urbano. Desenvolvidos 
em paises de média latitude, de clima temperado, ou em regiões de 
clima quente-seco, a maioria das pesquisas atuais buscam o 
conhecimento do padrão do fluxo de ar nos canyons urbanos. (Figura 
9) 
 
 
 
 
 
 
 
Figura 9 - Um canyon urbano é uma forma de disposição espacial das 
edificações quando estas estão enfileiradas ao longo de ambos os 
lados de uma rua. Trata-se de um conjunto de superfícies que 
determinam um volume de ar em seu interior, sendo limitado pelas 
paredes das edificações e pelo solo e aberto nas extremidades 
laterais e superior. Tais superfícies se repetem dentro da cidade e em 
alguns locais (em geral na área central) podem mesmo ser 
predominantes 
 
Silva (1999), em pesquisa realizada na cidade de João Pessoa, 
observou, utilizando o tunel aerodinâmico como instrumento de 
avaliação, as modificações nos padrões de vento local, decorrentes da 
inserção de edificações. Partindo de uma ocupação atual do solo, o 
autor foi inserindo e escalonando as edificações, de acordo com o 
permitido pela lei de uso (figura 10). Conclui, de uma maneira geral, 
que as massas, resultantes do conjunto de edificações, “constituem-
se numa variável determinante, não só do grau de armazenamento 
térmico resultante das horas de insolação recebidas pelas superfícies 
por elas criadas, da obstrução ou possibilidades de visão da nova 
paisagem, da distribuição das densidades, da qualidade e do 
equilíbrio estético do conjunto mas, principalmente dos padrões de 
escoamentos e de ventilação externa e interna dos edifícios. 
 
Para a área estudada, Silva observou a fragilidade de seu 
planejamento em termos de vento e conclui que “a decisão por um 
padrão de ocupação do solo implica não somente a consideração de 
vários sistemas que nele interferem, mas inclui, nomeada e 
necessariamente, por cada caso determinar exigências e tratamentos 
diferenciados, o conhecimento dos padrões de escoamentos locais. 
 
 
 
 
 (a) 
 
 
 
(a) 
 (b) 
 
 
Figura 10 – Perspectiva e desenho das figuras de erosão realizado por 
Silva (1999) em túnel aerodinâmico. A figura (a) corresponde ao 
ensaio dois, que considerou a ocupação atual da área. A figura (b) 
corresponde ao ensaio dez, onde foram feitas alterações na área, 
considerando as exigências do código de obras local. 
 
 
 Conclusão 
 
 
Ainda que as edificações isoladas e agrupadas dentro dos 
assentamentos humanos datem de épocas mais primitivas, pode-se 
atribuir ao movimento moderno a contribuição ativa da 
fundamentação teórica desta visão, na qual, ao estimular o 
estabelecimento de uma justaposição entre volumes construídos e 
espaços livres lhe deu uma particular interpretação das formas 
ótimas de conseguir esse balanço, segundo o qual os edifícios 
deveriam ficar o mais distanciados entre si. 
 
Nascida em climas temperados, a nova formulação teórica se 
estendeu aos climas quentes e úmidos sem uma avaliação mais 
profunda, nem tampouco estas idéias tem sido cuidadosamente 
comparadas com os esquemas compactos que viriam substituir, 
esquemas estes que, em seus planos urbanísticos e loteamentos 
ignoram quaisquer dos princípios que conduzem à uma boa 
orientação. Isto tem levado muitas vezes a uma impossibilidade na 
obtenção de certas qualidades dos edifícios, independente de uma 
correta orientação. 
 
O desenho físico, da escala do edifício à metrópole, pode ter fortes 
repercussões nas condições climáticas locais, sendo, portanto, da 
maior importância para a minimização de tais repercussões, a 
configuração geométrica dos edifícios, as propriedades dos materiais 
de construção, as cores das superfícies exteriores, a extensão e a 
densidade da área construída; as condições de sombra nas ruas e 
estacionamentos e a distribuição das áreas verdes. 
 
A orientação e disposição dos edifícios nas cidades estão 
subordinadas ao traçado urbano. Este traçado, resultado de múltiplas 
condicionantes, deverá considerar os aspectos climáticos, para que 
não comprometa a arquitetura da cidade ou mesmo a saúde e bem 
estar de seus ocupantes. Daí a grande importância do planejamento 
das cidades no estabelecimento de parâmetros adequados de 
verticalização e ocupação do solo, assim como distribuição adequada 
das áreas verdes e adequado uso dos materiais. 
 
 
 
 
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