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Introdução ao Direito Constitucional | Introdução ao Direito Constitucional www.cenes.com.br | 1 DISCIPLINA INTRODUÇÃO AO DIREITO CONSTITUCIONAL CONTEÚDO Conceitos Introdutórios e Poder Constituinte Introdução ao Direito Constitucional | Introdução ao Direito Constitucional www.cenes.com.br | 2 A Faculdade Focus se responsabiliza pelos vícios do produto no que concerne à sua edição (apresentação a fim de possibilitar ao consumidor bem manuseá-lo e lê-lo). A instituição, nem os autores, assumem qualquer responsabilidade por eventuais danos ou perdas a pessoa ou bens, decorrentes do uso da presente obra. É proibida a reprodução total ou parcial de qualquer forma ou por qualquer meio, eletrônico ou mecânico, inclusive através de processos xerográficos, fotocópia e gravação, sem permissão por escrito do autor e do editor. 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Na mesma direção, é definido por Jose Afonso da Silva (2014) “como ramo do Direito Público que expõe, interpreta e sistematiza os princípios e normas fundamentais do Estado, os quais compõem o conteúdo das constituições”. A Constituição, por sua vez, pode ser definida como “o conjunto de normas fundamentais e supremas, que podem ser escritas ou não, responsáveis pela criação, estruturação e organização político-jurídica de um Estado”, trata-se de um documento essencial que prevê os elementos organizadores, a forma de exercício delimitado de poder, que assegura os direitos e as garantias fundamentais do homem e consequentemente faz possível a existência de um Estado. De todo o conjunto de normas vigentes dentro de um espaço territorial, a Constituição é a norma primeira e serve de fundamentação para todas as outras. Neste sentido, e tendo em vista que a Constituição rege a estruturação e organização do Estado, faz-se necessário primeiramente estudarmos os fundamentos do Estado, seus elementos constitutivos e seus poderes. É sobre isso que trataremos nos capítulos seguintes. 1.1 Da Definição de Estado O Estado pode ser definido como uma sociedade organizada política e juridicamente que ocupa um território definido, onde a lei máxima normalmente é uma Constituição escrita e dirigida por um Governo que possui soberania reconhecida, tanto interna quanto externamente. O conceito de Estado e Nação distintos e inconfundíveis. Conforme Sahid Maluf (2019), “A Nação é uma realidade sociológica; o Estado, uma realidade jurídica. O conceito de Nação é essencialmente de ordem subjetiva, enquanto o conceito de Introdução ao Direito Constitucional | Introdução ao Direito Constitucional www.cenes.com.br | 5 Estado é necessariamente objetivo”. Neste sentido, diz-se que a Nação é anterior ao estado, é definida como a “substância humana do Estado”, pois se trata de um “conjunto homogêneo de pessoas ligadas entre si por vínculos permanentes de sangue, idioma, religião, cultura e ideais”, de modo que um Estado pode comportar pessoas de diversas nações, assim como uma única nação pode se dividir em diversos Estado. 1.2 Da Responsabilidade do Estado O Estado é responsável pela organização e pelo controle social, pois detém o direitode soberania (ius imperii), ou o chamado poder extroverso do Estado. Mediante uma analogia, podemos pensar no Estado como um grande “fantasma”, cujo poder pesa como uma mão invisível sobre o povo. Ele é uma criação por nós reconhecida, com forma própria, concebida e conceituada como uma pessoa jurídica no direito brasileiro. O Estado nasceu para organizar um povo, uma nação, para convencer esse povo a viver sob o manto de uma ordem, sob certas regras, dogmas, direitos e deveres. Conforme explica Sahid Maluf (2019), o Estado é “criação da vontade humana”, não possui “autoridade nem finalidade próprias, mas é uma síntese dos ideais da comunhão que ele representa [...]: O Estado é o órgão executor da soberania nacional”. 1.3 Da finalidade do Estado Em consonância com o entendimento compartilhado por diversos doutrinadores, podemos dizer que a finalidade do Estado é assegurar a vida humana em coletividade, torná-la possível e viável, regulando, quando necessário, as relações Introdução ao Direito Constitucional | Elementos Constitutivos do Estado www.cenes.com.br | 6 públicas e privadas. Além disso, o Estado é responsável por garantir a ordem interna e assegurar a soberania na ordem internacional. Neste sentido, o governo deve ser um ente que demonstra poder internamente, sendo reconhecido por seu povo e, ao mesmo tempo, represente esse povo para além das suas fronteiras, fazendo-se reconhecido e respeitado. O Estado deve ser visto como soberano. Por fim, o Estado deve elaborar as regras de conduta e distribuir a justiça, ou seja, organizar e manter o homem em sociedade. Em outras palavras, determinar e normatizar os direitos e deveres englobados pelo amplo arcabouço jurídico do direito civil, penal, tributário, empresarial etc. 2 Elementos Constitutivos do Estado O Estado soberano é sintetizado pela máxima “um governo, um povo, um território”. Essa máxima remete à teoria tripartite de governo, segundo a qual, em havendo um povo dentro de um território com um governo soberano passível de ser identificado, haverá um Estado. Para analisarmos pormenorizadamente cada um desses elementos, devemos considerar as causas constitutivas do Estado, que nos levam ao entendimento científico de como o Estado se constitui. Para tanto, recorremos a Acquaviva (2010), observando as três causas por ele expostas: as causas materiais, as causas formais e a causa final. Para o autor: São causas materiais do Estado o povo, ou o elemento humano, e o território, ou base física, área material ou ideal em que o Estado faz valer seu Direito positivo. Quanto às causas formais, vale dizer, aquelas que identificam o Estado quanto à sua forma jurídica ou constituição política, graças à qual um Estado não se confunde com outros - daí, a importância de conhecer o Estado por sua constituição! - são a ordem jurídica e o poder político, exercido pelos governantes (do grego kubernetes, piloto de embarcação) que o encarnam em dado momento histórico. Quanto à causa final do Estado, vale lembrar que cada sociedade tem, conforme sua natureza, uma causa final específica. [...] Quanto ao Estado, tem por causa final o bem com um de todas as sociedades menores que atuam em seu território (ACQUAVIVA, 2010, p. 24). Na sequência, vamos detalhar cada uma destas causas. Introdução ao Direito Constitucional | Elementos Constitutivos do Estado www.cenes.com.br | 7 Figura 1 - Elementos constitutivos do Estado Fonte: Núcleo editorial Focus 2.1 Povo O povo é o elemento humano formado pelo conjunto de pessoas submetidas à ordem jurídica estatal. É o grupo de pessoas que possuem as mesmas características, que falam a mesma língua, que seguem as mesmas tradições e são unidas por diversos elos de ligações. Conforme aponta, Marcus Claudio Acquaviva, Ao Direito, em especial o direito constitucional, interessam os sentidos jurídico e político. Povo, no sentido jurídico, é o conjunto de indivíduos qualificados pela nacionalidade. Nele não se incluem, já se vê, estrangeiros e apátridas. Todavia, o sentido político é ainda mais restrito, pois exclui não só estrangeiros e apátridas, como também os menores de 16 anos (CF, art. 14, §§ I o, II, c, e 2o), estando o povo político, tido como o conjunto dos cidadãos do Estado, vinculado à ideia de cidadania (ACQUAVIVA, 2010, p. 25). Neste sentido, o conceito não deve ser confundido com o de população, esta é uma medida definida pelo conjunto de indivíduos da mesma espécie que vivem na mesma região em determinado período. Por exemplo, o povo baiano é o povo que nasceu na Bahia, que fala a mesma variedade linguística, tem práticas religiosas próprias da região, entre outras características que os une. Mas, em época de carnaval, a população da Bahia pode ser triplicada em virtude dos turistas que se alocam na região. Este fato, contudo, não altera as características do povo Baiano, somente a população, porque esta é definida pelo conjunto de pessoas na mesma área por determinado espaço de tempo, (os cinco dias de carnaval). Introdução ao Direito Constitucional | Elementos Constitutivos do Estado www.cenes.com.br | 8 2.2 Território O território é o elemento material (espacial ou físico) do Estado, é a base geográfica que compreende a superfície do solo que o Estado ocupa, seu mar territorial e o espaço aéreo. É todo e qualquer espaço físico ou ideal delimitado e dominado pelo Estado, no qual exerce seu poder com exclusividade. Segundo Acquaviva (2010), quanto à etimologia da palavra, “Não provém, conforme se poderia pensar, de nada ligado à terra, espaço geográfico, mas do verbo latino terreo, territo, isto é, intimido, causo medo, receio, mesmo porque o Estado exerce o seu poder antevendo a possibilidade de, a qualquer momento, utilizar a força (coerção) para ver suas determinações cumpridas pelos súditos. Diga-se o mesmo no âmbito externo, quando o Estado, para manter a soberania íntegra, procura, na força das armas, impor respeito às demais sociedades políticas”. 2.3 Governo O governo é a organização necessária para o exercício do poder político e é composto por pessoas escolhidas nas diretrizes da Carta Política que rege o Estado. Embora a conceituação varie a depender do viés doutrinário, “exprime sempre o exercício do poder soberano”, dado que a soberania é a “foça geradora e justificadora do elemento governo (MALUF, 2018). Existem várias formas e modelos de governo, tais como a monarquia parlamentarista, o presidencialismo, o parlamentarismo puro, entre outros. Cada constituição, cada Estado determina como seu governo será organizado. O importante é que o governo seja reconhecido e soberano, que seja respeitado pelo povo internamente e que tenha poderes para representar o povo externamente. Além disso, é o governo que define o futuro político da sociedade, discutindo assuntos sensíveis ao povo, políticas públicas, políticas econômicas e monetárias, assuntos sensíveis de segurança nacional, entre outros. Introdução ao Direito Constitucional | Organização do Estado www.cenes.com.br | 9 Para que esse governo exista, contudo, ele precisa ter governabilidade e governança, pois não basta ele ser legalmente eleito pela população e reconhecido pelo ordenamento jurídico brasileiro, ele precisa ser capaz de implementar políticas públicas. Neste sentido, a governança, para além de seguir as leis de acordo com a Constituição, representa o poder de criar e aplicar políticas públicas, de ter condições de impor essas políticas, colocá-las em prática e governar o povo. Figura 2 - Governabilidade e governança Fonte: Núcleo editorial Focus É oportuno destacar que tratamos aqui da divisão tripartite clássica da teoria geral do Estado (povo, território e governo), que prevê três elementos basilares para constituição do Estado. Contudo, existem outrasvisões que aprofundam esse tema com outros elementos, tais como a doutrina moderna de Pedro Lenza e Vicente Paulo Marcelo Alexandrino. Para estes autores e para parte da doutrina moderna, são quatro os elementos constitutivos do Estado: soberania, finalidade, povo e território. No entanto, no mesmo viés de Sahid Maluf, entendemos que a soberania está compreendida no conceito de Estado, pois um Estado não soberano ou semissoberano não caracterizaria de fato um Estado. 3 Organização do Estado Conforme descreve Sahid Maluf (2018), as variações dos elementos que constituem o Estado caracterizado como um fato social (povo, território e governo) ensejam diversas classificações de Estado. Por exemplo, quanto ao povo, ele pode ser nacional ou plurinacional; quanto ao território, central ou marítimo. Introdução ao Direito Constitucional | Organização do Estado www.cenes.com.br | 10 Neste sentido, em que pese a estrutura material do Estado (e não a sua organização política), Maluf afirma que ele pode ser: a) perfeito ou imperfeito ou b) simples e composto, sendo tipos característicos de Estado composto a união pessoal, a união real, a união incorporada e a confederação. Ao passo que Acquaviva classifica as formas do Estado em: união pessoal; união real; Estado unitário; e Estado federal. No entanto, Flavia Bahia (2017) afirma que hoje existem apenas duas formas principais de Estado, que são: a) Estado Unitário ou Simples – no qual o Poder Central concentra o poder político, não havendo divisão geográfica deste poder. Ou seja, existe apenas um núcleo de comando, que é no âmbito nacional, estendendo-se uniformemente sobre todo o seu território. Exemplo: França, Bélgica, Itália, Portugal e Uruguai. b) Estado Federado ou Composto – no qual ocorre a divisão geográfica do poder político. Isto é, a Federação é formada por vários Estados-membros, são vários núcleos de comando, cada um com sua autonomia política, bens próprios, renda e responsabilidades entregues pela Carta política. Exemplo: Alemanha, Suíça, Brasil e EUA. O que difere um Estado Unitário de um Federado é que neste último existem outros entes com autonomia política. É claro que os Estados Unitários, como a França e o Uruguai possuem uma forma descentralizada de organização, porém essa descentralização não é política. Por outro lado, em um Estado Federado, como o Brasil, delega-se aos estados-membros competências políticas e não meramente administrativas. O Estado unitário pode ser descentralizado, facilitando a administração por parte do governo central, mas isso não o torna um Estado Federado. Por fim, vale salientar que o Estado, em suas relações internacionais, possui soberania, enquanto a União, os Estados, o Distrito Federal e os Municípios, nas suas relações internas, possuem apenas autonomia. Em outros termos, dizemos que a União, Estados, Distrito Federal e Municípios que compõem a organização administrativa da nossa República possuem apenas autonomia, ao passo que a República Federativa do Brasil possui total soberania. Introdução ao Direito Constitucional | Poderes do Estado www.cenes.com.br | 11 4 Poderes do Estado Esse “espírito superior” chamado Estado precisa de poderes para se impor perante o particular, pois a ele é dado o ius imperii, para que possa organizar e aplicar as normas preestabelecidas na sociedade, inclusive com punição para aqueles que as desobedecem. De acordo com o art. 2º da Constituição Federal de 1988, são Poderes da União, independentes e harmônicos entre si, o Legislativo, o Executivo e o Judiciário. A título de elucidação, a primeira Constituição Imperial de 1824 previa um quarto poder, o Poder Moderador, que era o poder do Imperador. Este, contudo foi removido da Constituição desde sua primeira versão Republicana, em 1891. Assim, o Estado se impõe à sociedade, já que cabe a ele organizá-la, por meio dos três poderes – um poder administra, o outro faz leis e normas, e o outro distribui a justiça para o povo. Cada um desses Poderes do Estado exerce predominantemente uma função estatal específica, porém não há uma separação absoluta de funções, uma vez que essa teoria dos três poderes não é absoluta. Dessa forma, em não havendo separação absoluta de funções, assegura-se a aplicação da teoria do sistema de freios e contrapesos, de acordo com a qual um poder pode controlar o outro para garantir que o Estado progrida, conforme expôs Dalmo de Abreu Dallari no excerto extraído da obra Elementos da Teoria Geral do Estado: “O sistema de separação dos poderes, consagrado nas Constituições de quase todo o mundo, foi associado à ideia de Estado Democrático e deu origem a uma engenhosa construção doutrinária, conhecida como sistema de freios e contrapesos. Segundo essa teoria os atos que o Estado pratica podem ser de duas espécies: ou são atos gerais ou são especiais. Os atos gerais, que só podem ser praticados pelo poder legislativo, consistem na emissão de regras gerais e abstratas, não se sabendo, no momento de serem emitidas, a quem elas irão atingir. Dessa forma, o poder legislativo, que só pratica atos gerais, não atua concretamente na vida social, não tendo meios para cometer abusos de poder nem para beneficiar ou prejudicar uma pessoa ou um grupo em particular. Só depois de emitida a norma geral é que se abre a possibilidade de atuação do poder executivo, por meio de atos especiais. O executivo dispõe de meios concretos para agir, mas está igualmente impossibilitado de atuar discricionariamente, porque todos os seus atos estão limitados pelos atos gerais praticados pelo legislativo. E se houver exorbitância de qualquer dos poderes surge a ação fiscalizadora do poder judiciário, obrigando cada Introdução ao Direito Constitucional | Poderes do Estado www.cenes.com.br | 12 um a permanecer nos limites de sua respectiva espera de competências” (DALLARI, 2010, p. 216). Isto posto, resumimos as funções típicas dos poderes da seguinte maneira: Poder Legislativo É aquele que tem como principal função a de legislar (fazer leis), ou seja, inovar o ordenamento jurídico, estabelecendo regras gerais e abstratas, criando comandos a todos os cidadãos, visto que ninguém será obrigado a fazer ou deixar de fazer alguma coisa senão em virtude de lei. No Brasil, o Legislativo tem ainda como função típica a de fiscalizar a Administração Pública, sendo o único poder do Estado a ter duas funções típicas previstas na Constituição. Poder Executivo É aquele que tem como principal função executar e administrar a coisa pública com a finalidade de atender o interesse público, dentro dos limites impostos pela lei em sentido amplo. Poder Judiciário É aquele que tem como principal função julgar, solucionar conflitos de interesses entre as partes, fazer direito e aplicar a lei nos casos concretos. Tal poder não se acha em todas as esferas, como os anteriores, dado que os municípios não possuem Poder Judiciário próprio. Retomando o conteúdo, o Estado surge com a junção de um povo dentro de um certo território, onde se tem, reconhecidamente, um governo soberano, o qual pauta-se em essência na governabilidade e governança, sendo que sem um ou o outro não é possível manter o governo. Ora, não há como manter um governo sem governabilidade eleito de forma ilegal ou imposto, assim como não há como manter um governo que, no decorrer da sua existência, não consiga impor as suas políticas públicas. Foi precisamente isso que ocorreu no exemplo mais recente que temos do governo da ex-presidente Dilma Rousseff. Ela possuía governabilidade, pois foi eleita pelo povo brasileiro, porém perdeu sua governança ao longo do mandato, uma vez que não conseguiu implementar as suas políticas públicas. Quando analisamos conceito de governo passamos a entender como ele trabalha para Introdução aoDireito Constitucional | Poder Constituinte www.cenes.com.br | 13 administrar o Estado e percebemos emergir desse conceito outro, o de Administração Pública. Este, por sua vez, divide-se em dois vieses, o viés objetivo e o viés subjetivo. No sentido objetivo, buscamos compreender o que a Administração Pública faz, portanto falamos sobre fomento, serviço público, poder de polícia e outras funções de sua responsabilidade. Já no sentido subjetivo, buscamos compreender quem faz a administração, quem é o governo, quem é responsável por fazer a administração pública, ou seja, buscamos compreender o agente público. 5 Poder Constituinte Poder Constituinte é o nome dado ao poder que pertence ao povo para organizar juridicamente a política e o Estado ou, conforme cita Sahid Maluf, “é uma função da soberania nacional. É o poder de constituir e reconstituir ou reformular a ordem jurídica estatal”. Sua titularidade é dada ao povo através de seus legitimados, que, em razão da complexidade do Estado moderno, representam seus interesses. Por óbvio, esse poder pode não se aplicar a regimes de governo que não sejam democráticos. Nas teocracias, por exemplo, o poder pertence a um conjunto de normas religiosa; em uma autocracia, o poder pertence a um detentor soberano. Mas, em um regime democrático, o poder constituinte pertence ao povo e é a partir deste poder que nasce a Constituição que organiza o Estado-nação. Este poder “tanto pode se exercido para a organização originária de um agrupamento nacional ou popular quanto para constituir, reconstituir ou reformular a ordem jurídica de um Estado já formado” (MALUF, 2019) Podemos classificar o Poder Constituinte de várias formas. A forma mais tradicional o classifica em Poder Constituinte Originário e Poder Constituinte Derivado. Hoje, contudo, existem outras espécies de Poder Constituinte, dentre as quais destacam-se o Poder Constituinte Supranacional e o Poder Constituinte Difuso. Assim, nesta aula, falaremos sobre essas quatro classificações. É importante salientar que o Poder Supranacional e o Poder Difuso não são ramificações do Poder Constituinte Derivado, pois, como veremos mais adiante, o Introdução ao Direito Constitucional | Poder Constituinte www.cenes.com.br | 14 Poder Derivado possui somente três vertentes: derivado decorrente, derivado reformador e derivado revisor. Figura 3 - Classificações do poder constituinte Fonte: Núcleo editorial Focus 5.1 Poder Constituinte Originário O Poder Constituinte Originário (também chamado de poder inicial, fundacional, inaugural, genuíno, primário ou de primeiro grau) é o que sustenta a criação de uma nova constituição, que estabelece uma nova ordem jurídica, rompendo com a precedente. De acordo com Nathalia Masson, O poder constituinte é a energia (ou força) política que se funda em si mesma, a expressão sublime da vontade de um povo em estabelecer e disciplinar as bases organizacionais da comunidade política. Autoridade suprema do ordenamento jurídico, exatamente por ser anterior a qualquer normatização jurídica, o poder é o responsável pela elaboração da Constituição, esta norma jurídica superior que inicia a ordem jurídica e lhe confere fundamento de validade (MASSON, 2018). Sua existência precede a compreensão teórica da Constituição, remetendo às primeiras organizações políticas, pois, conforme cita Luís Roberto Barroso, “Onde quer que exista um grupo social e poder político efetivo, haverá uma força ou energia inicial Introdução ao Direito Constitucional | Poder Constituinte www.cenes.com.br | 15 que funda esse poder, dando-lhe forma e substância, normas e instituições” (BARROSO, 2020). Quanto a sua natureza, pode ser considerado como um “poder de fato, detentor de natureza essencialmente política, ou um poder de direito, possuidor de natureza jurídica” (MASSON, 2018). Caracteriza-se por ser político, inicial, autônomo, incondicionado, juridicamente ilimitado, inalienável e permanente, e é de titularidade do povo. Figura 4 - Poder constituinte originário Fonte: Núcleo editorial Focus 5.1.1 Limitações do Poder Constituinte Originário Em relação à existência ou não de limitações ao Poder Constituinte Originário, a corrente jusnaturalista afirma que este poder possui freios, portanto, possui limitações. Contudo, pela teoria positivista, este poder se caracteriza como sendo ilimitado. Para a corrente jusnaturalista, as limitações materiais deste poder são abordadas em três categorias. ➢ Limitações transcendentes: envolvem os direitos fundamentais da sociedade e proibição do retrocesso. Introdução ao Direito Constitucional | Poder Constituinte www.cenes.com.br | 16 ➢ Limitações permanentes: estão relacionadas à soberania e à forma do Estado. ➢ Limitações heterônomos: são impostas pelas obrigações internacionais, pelos direitos internacionais e direitos humanos. Novamente, essas limitações são contempladas na teoria jusnaturalista, e esta é apenas uma das correntes de pensamento. Se analisadas pelo viés da teoria positivista, que se volta mais para aquilo que está propriamente escrito no texto jurídico, este poder será ilimitado. 5.2 Poder Constituinte Derivado O Poder Constituinte Derivado, como o próprio nome já diz, é aquele que deriva do poder originário. Não é um poder inicial, mas sim de segunda mão, e por essa razão é também chamado de poder instituído, constituído ou de segundo grau. São características principais desse poder ser derivado, limitado e condicionado às determinações do poder originário, devendo sempre respeitar a lei da Constituição Federal. Este poder se subdivide em três categorias, são elas: ▪ Poder Constituinte Derivado Decorrente: pode ser subdividido em dois: o inicial e o reformador. O poder decorrente inicial foi entregue aos estados-membros para formularem cada qual sua própria Constituição. Assim, as constituições estaduais são constituídas a partir do poder decorrente inicial e reformuladas a partir do poder decorrente reformador. ▪ Poder Constituinte Derivado Reformador: envolve a alteração, a reforma da Constituição Federal de 1988 via emenda constitucional (difere-se do poder decorrente reformador). ▪ Poder Constituinte Derivado Revisor: remete às emendas constitucionais de revisão da Constituição Federal de 1988. 5.2.1 Poder Constituinte Derivado Decorrente O poder constituinte derivado decorrente surge para os Estados-membros e Distrito Federal criarem uma constituição, a fim de se adaptar à nova realidade. O poder responsável pela auto-organização dos Estados-membros costuma ser classificado em duas espécies. Introdução ao Direito Constitucional | Poder Constituinte www.cenes.com.br | 17 a) Poder Constituinte Derivado Decorrente Inicial, o qual é responsável pela criação das constituições estaduais. b) Poder Constituinte Derivado Decorrente Reformador, o qual tem a função de fazer alterações no texto das constituições estaduais. 5.2.2 Poder Constituinte Derivado Reformador O Poder Constituinte Derivado Reformador é o poder que garante a possibilidade de reforma e modificação da Constituição por meio de emenda, restringindo-se às limitações impostas pelo texto constitucional, tais como: as limitações materiais, as chamadas clausuras pétreas; as limitações formais, que remetem aos procedimentos para emendar a constituição; as limitações circunstanciais, que dizem respeito a circunstâncias ou períodos em que a constituição não pode ser alterada; e as temporais. 5.2.2.1 Limitações Materiais As limitações impostas pela constituição estão em sua grande maioria no art. 60, § 4º da CF/88. Este dispõe sobre as clausuras pétreas, ou seja, sobre as clausuras que não podem ser retiradas da Constituição Federal. De acordo com o posicionamento do STF, as clausuraspétreas podem até ser objeto de emenda, porém essa emenda não pode ser tendente a abolir o assunto que está previsto no § 4º do art. 60, que prevê o seguinte. Art. 60, § 4º Não será objeto de deliberação a proposta de emenda tendente a abolir: I - a forma federativa de Estado; II - o voto direto, secreto, universal e periódico; Introdução ao Direito Constitucional | Poder Constituinte www.cenes.com.br | 18 III - a separação dos Poderes; IV - os direitos e garantias individuais. 5.2.2.2 Limitações Circunstanciais A limitação circunstancial está prevista no art. 60, § 1º da CF/88, segundo o qual a Constituição não poderá ser emendada na vigência de intervenção federal, de estado de defesa ou de estado de sítio. Ora, a Constituição Federal é a maior lei que nós temos, por isso ela deve ser preservada, e uma das formas de fazer isso é não a alterando em tempos e circunstâncias que estão fora da situação de normalidade, como ocorre nesses casos. 5.2.2.3 Limitações Formais As limitações formais se referem à forma e ao procedimento de tramitação e aprovação de uma Proposta de Emenda Constitucional – PEC. A nossa CF/88 é uma constituição rígida, portanto o procedimento para sua alteração é muito mais rigoroso. 5.2.2.4 Limitações Temporais A limitação temporal consiste na proibição de alteração do texto constitucional durante certo período de tempo após ser promulgada uma nova constituição. Esta limitação, no entanto, não foi adotada pela atual Carta Magna. Lembre-se que embora o poder constituinte reformador não tenha essa limitação, o poder constituinte revisor tem. 5.2.3 Poder Constituinte Derivado Revisor O poder constituinte derivado revisor é usado para revisar e alterar a Constituição, é diferente do derivado reformador tendo em vista que sustenta a total revisão e reformulação da Constituição havendo decorrido certo prazo a contar da sua promulgação. A CF/88 previu que após um lapso temporal de cinco anos haveria uma revisão constitucional e essa revisão já ocorreu, dessa forma não é mais possível aplicar à nossa constituição o poder constituinte derivado revisor, ele se exauriu em Introdução ao Direito Constitucional | Poder Constituinte www.cenes.com.br | 19 uma única revisão feita em junho de 1994, da qual surgiram seis emendas constitucionais de revisão, as chamadas ECRs. Art. 3º ADCT. A revisão constitucional será realizada após cinco anos, contados da promulgação da Constituição, pelo voto da maioria absoluta dos membros do Congresso Nacional, em sessão unicameral. Conforme esclarece Nathalia Masson, no entanto, há quem defenda na doutrina a “a viabilidade de uma emenda constitucional que altere o art. 3° do ADCT, propiciando uma nova revisão. Essa alteração, porém, só se legitimaria se grandiosas e substanciais mudanças fossem percebidas na sociedade, de modo que necessária se tornaria uma revisão global do texto, com o fito de adequar a Constituição a (nova) realidade a ser normatizada”, desde que haja uma “manifestação popular direta favorável a realização da nova revisão”. Para a autora, isso caracterizaria, todavia, uma tentativa de ferir a vontade do poder originário, portanto advoga em sentido oposto a tal entendimento. Observe o quadro sinóptico extraído do Manual de Direito Constitucional (2020), de Nathalia Masson, com as principais diferenças entre o poder derivado revisor e o reformador. Tabela 1 - Principais diferenças entre os poderes derivados revisor e reformador. MECANISMOS FORMAIS DE ALTERAÇÃO DO TEXTO CONSTITUCIONAL REFORMA (art. 60, CF/88) REVISÃO (art. 3º, ADCT) POSSIBILIDADE DE MODIFICAR O TEXTO CONSTITUCIONAL VIA REGULAR E PERENE MEIO EXCEPCIONAL E PRECÁRIO LIMITAÇÕES TEMPORAIS INEXISTEM NO ATUAL TEXTO CONSTITUCIONAL 5 ANOS LIMITAÇÕES MATERIAIS ▪ EXPRESSAS (constantes do art. 60, § 4º, CF/88): a) a forma federativa de Estado; b) o voto direto, secreto, universal e periódico; c) a separação de poderes; APLICA-SE A MESMA PREVISÃO VÁLIDA PARA O PROCEDIMENTO DE REFORMA Introdução ao Direito Constitucional | Poder Constituinte www.cenes.com.br | 20 d) os direitos e as garantias individuais. ▪ IMPLÍCITAS: a) imutabilidade do art. 60, CF/88; b) titularidade do poder constituinte originário e do poder derivado de reforma; c) impossibilidade de supressão dos fundamentos da República Federativa do Brasil. LIMITAÇÕES CIRCUNSTANCIAIS A constituição não poderá ser emendada na vigência de (art. 60, § 1º, CF/88): a) INTERVENÇÃO FEDERAL; b) ESTADO DE DEFESA; c) ESTADO DE SÍTIO. APLICA-SE A MESMA PREVISÃO VÁLIDA PARA O PROCEDIMENTO DE REFORMA LIMITAÇÕES FORMAIS Art. 60, caput, I, II, III, §§ 2º e 5º, CF/88: ▪ A Constituição poderá ser emendada mediante proposta: a) de um terço, no mínimo, dos membros da Câmara dos Deputados ou do Senado Federal; b) do Presidente da República; c) de mais da metade das Assembleias Legislativas das unidades da Federação, manifestando-se, cada uma delas, pela maioria relativa de seus membros. ▪ A proposta será discutida e cotada em Casa do Congresso Nacional, em dois turnos, considerando-se aprovada se obtiver, em ambos, três quintos dos votos dos respectivos membros. ▪ A matéria constante de proposta de emenda rejeitada ou havida por prejudicada não pode ser objeto de nova proposta na mesma sessão legislativa. ▪ VOTO DA MAIORIA ABSOLUTA DOS MEMBROS DO CONGRESSO NACIONAL ▪ SESSÃO UNICAMERAL Fonte: Nathalia Masson (2018, p. 182) Introdução ao Direito Constitucional | Poder Constituinte www.cenes.com.br | 21 5.3 Poder Constituinte Supranacional O poder constituinte supranacional nasceu a partir da Emenda Constitucional 45/04 e foi incluído no art. 5º da CF/88, na forma do § 3º, prevendo o seguinte: CF, Art. 5º, § 3º - Os tratados e convenções internacionais sobre direitos humanos que forem aprovados, em cada Casa do Congresso Nacional, em dois turnos, por três quintos dos votos dos respectivos membros, serão equivalentes às emendas constitucionais. (Incluído pela Emenda Constitucional nº 45, de 2004) Esse poder é baseado na teoria da interconstitucionalidade e no transconstitucionalismo. Segundo Masson (2018), “A partir dos ideais de cidadania universal, pluralismo, integração e soberania remodelada, que surge o (ainda incipiente) conceito de poder constituinte supranacional, destinado a equacionar uma Constituição supranacional legítima, com aptidão para vincular toda a comunidade de Estados sujeita à sua ação normatizadora”. Além disso, a ideia de se ter um poder como este, voltado para equivaler tratados e convenções internacionais a emendas constitucionais, remete à ideia de cidadania universal, ou monismo jurídico (um único ordenamento jurídico mundial), que representam, por sua vez, o constitucionalismo global. Figura 5 - Poder constituinte supranacional Fonte: Núcleo editorial Focus Introdução ao Direito Constitucional | Poder Constituinte www.cenes.com.br | 22 O poder constituinte supranacional é utilizado quando se autoriza, no mesmo procedimento da PEC, a homologação de tratados internacionais e de direito humanos. Com isso, um tratado assinado fora do Brasil, que não pertence ao texto constitucional, é reconhecido e ganha um status constitucional. 5.4 Poder Constituinte Difuso O poder constituinte difuso diz respeito às novas interpretações dadas pelo Supremo Tribunal Federal ao texto da Constituição que consolidam a mutação constitucional. É definido por Pedro Lenza (2021) como “um poder de fato e que serve de fundamento para os mecanismos de atuação da mutação constitucional”. É importante lembrar que o poder constituinte difuso não trabalha com alterações materiais, mas sim com novas interpretações. Ou seja, não há PEC no processo, não háalteração material ou formais, trata-se apenas de um poder entregue aos Ministros do Supremo Tribunal Federal para darem uma nova interpretação ao texto da Constituição Federal, por isso dizemos que esse poder permite somente a mutação constitucional. Conforme explica Lenza (2021), Se por um lado a mudança implementada pelo poder constituinte derivado reformador se verifica de modo formal, palpável, por intermédio das emendas à Constituição, a modificação produzida pelo poder constituinte difuso se instrumentaliza de modo informal e espontâneo, como verdadeiro poder de fato, e que decorre dos fatores sociais, políticos e econômicos, encontrando-se em estado de latência. Trata-se de processo informal de mudança da Constituição, alterando-se o seu sentido interpretativo, e não o seu texto, que permanece intacto e com a mesma literalidade (LENZA, 2021, grifo do autor). No decorrer do nosso curso, conforme formos adentrando no estudo da Constituição, nos depararemos com vários exemplos de mutações constitucionais. O art. 5º, por exemplo, é repleto delas. Introdução ao Direito Constitucional | Fenômenos que Surgem com Uma Nova Constituição www.cenes.com.br | 23 Figura 6 - Poder constituinte difuso Fonte: Núcleo editorial Focus 6 Fenômenos que Surgem com Uma Nova Constituição Em regra, quando surge uma nova Constituição ela revoga a anterior, podendo apenas recepcionar normas infraconstitucionais, feitas de acordo com a Constituição anterior, desde que estas não contrariem materialmente os direitos estabelecidos pela nova. Em outras palavras, quando surge uma nova Constituição, a anterior é “jogada fora”, as leis da velha Constituição que estiverem de acordo com a nova Constituição serão recepcionadas, ou seja, “reutilizadas”, e as leis que não estiverem de acordo com a nova Constituição serão “jogadas fora” junto com a velha constituição. Introdução ao Direito Constitucional | Fenômenos que Surgem com Uma Nova Constituição www.cenes.com.br | 24 Além do fenômeno da recepção, existem outros dois fenômenos, que, no entanto, não são admitidos no atual ordenamento jurídico. São eles: ▪ DESCONSTITUCIONALIZAÇÃO: ocorre quando a nova Constituição recebe a Constituição anterior como norma infraconstitucional. Esse fenômeno não é admitido no atual ordenamento jurídico, portanto não é adotado. ▪ REPRISTINAÇÃO: ocorre quando a nova Constituição revigora as normas infraconstitucionais que a Constituição anterior havia revogado. Ocorre, por exemplo, quando uma lei A é revogada por uma segunda lei B, que por sua vez é revogada por uma terceira lei C. Uma vez que a lei C revogou a lei B, que havia revogado a lei A, ocorre a repristinação da lei A, ou seja, a lei A volta a vigorar. Este é um fenômeno que ocorre no âmbito das leis, por isso dizemos que ele existe no plano infraconstitucional. No entanto, não existe no plano de normas de caráter constitucional. REGRA: A nova CF REVOGA a CF anterior RECEPÇÃO: a nova CF recepciona as normas infraconstitucionais feitas de acordo com a CF anterior desde que não contrariem materialmente os direitos estabelecidos pela nova CF. ATENÇÃO: As normas infraconstitucionais anteriores não podem contrariar materialmente, mas podem contrariar formalmente a nova CF. Exemplo: CP de 1940 foi criado via Decreto Lei (espécie normativa inexistente no ordenamento jurídico atual); outro exemplo é o CNT, que foi feito por Lei Ordinária, mas foi recepcionado pela CF/88 como Lei Complementar, assim como parte do Código Eleitoral de 1965. Introdução ao Direito Constitucional | Conclusão www.cenes.com.br | 25 Figura 7 - Fenômenos que surgem com uma nova Constituição Fonte: Núcleo editorial Focus 7 Conclusão Neste material vimos que o Estado se constitui a partir da existência um povo dentro de um território em que há, reconhecidamente, um governo soberano que se pauta essencialmente na governabilidade e na governança, sendo que sem um ou o outro não se mantém. Na sequência estudamos os poderes constituintes do Estado, o poder originário, responsável pela formação da Constituição, que remete às primeiras organizações políticas e se caracteriza por ser uma força política que se funda em si mesma, existindo “onde quer que exista um grupo social e poder político efetivo”, e seus poderes derivados (o poder decorrente, o reformador e o revisor). Vimos, ainda, que podem resultar alguns fenômenos do surgimento de uma nova Constituição; o primeiro, aplicável ao nosso sistema, é a revogação da Constituição anterior, recepcionando apenas as normas que não contrariam materialmente os direitos estabelecidos pela nova Constituição; o segundo é a desconstitucionalização, não adotado pelo nosso sistema jurídico, e o terceiro é a repristinação, o qual existe apenas no âmbito das normas infraconstitucional, não sendo adotado no plano das normas de caráter constitucional. Por fim, entendemos que o estudo da parte do Direito Constitucional que se caracteriza como a teoria geral do Estado é de suma importância para compreendermos a finalidade do Estado de assegurar a vida humana em coletividade, regulando as relações públicas e privadas por meio de regras de conduta e normatização de direitos e deveres englobados pelo amplo arcabouço jurídico do direito em todas as suas vertentes. Introdução ao Direito Constitucional | Referências Bibliográficas www.cenes.com.br | 26 8 Referências Bibliográficas ACQUAVIVA, Marcus Cláudio. Teoria geral do Estado. -3. ed. Barueri, SP: Manole, 2010. BARROSO, Luís Roberto. Curso de Direito Constitucional Contemporâneo: os conceitos fundamentais e a construção do novo modelo. – 9. ed. São Paulo: Saraiva Educação, 2020. LENZA, Pedro. Direito Constitucional. – 25. ed. São Paulo: Saraiva Educação, 2021. MALUF, Sahid. Teoria Geral do Estado. Atualizado por prof. Miguel Alfredo Malufe Neto. -35. ed. São Paulo: Saraiva Educação, 2019. MASSON, Nathalia. Manual de Direito Constitucional. -8. ed. Salvador: JusPODVM, 2020. SILVA, José Afonsa da. Curso de Direito Constitucional Positivo. -37. ed. São Paulo: Malheiros Editores, 2014. Introdução ao Direito Constitucional | Referências Bibliográficas www.cenes.com.br | 27 Introdução ao Direito Constitucional | Introdução www.cenes.com.br | 1 DISCIPLINA INTRODUÇÃO AO DIREITO CONSTITUCIONAL CONTEÚDO Concepções e Classificações das Constituições Introdução ao Direito Constitucional | Introdução www.cenes.com.br | 2 A Faculdade Focus se responsabiliza pelos vícios do produto no que concerne à sua edição (apresentação a fim de possibilitar ao consumidor bem manuseá-lo e lê-lo). A instituição, nem os autores, assumem qualquer responsabilidade por eventuais danos ou perdas a pessoa ou bens, decorrentes do uso da presente obra. É proibida a reprodução total ou parcial de qualquer forma ou por qualquer meio, eletrônico ou mecânico, inclusive através de processos xerográficos, fotocópia e gravação, sem permissão por escrito do autor e do editor. O titular cuja obra seja fraudulentamente reproduzida, divulgada ou de qualquer forma utilizada poderá requerer a apreensão dos exemplares reproduzidos ou a suspensão da divulgação, sem prejuízo da indenização cabível (art. 102 da Lei n. 9.610, de 19.02.1998). Atualizações e erratas: este material é disponibilizado na forma como se apresenta na data de publicação. Atualizações são definidas a critério exclusivo da Faculdade Focus, sob análise da direção pedagógica e de revisão técnica, sendo as erratas disponibilizadas na área do aluno do site www.faculdadefocus.com.br. É missão desta instituição oferecer ao acadêmico uma obra sem a incidência de erros técnicos ou disparidades de conteúdo. Caso ocorra alguma incorreção, solicitamos que, atenciosamente, colabore enviando críticas e sugestões,por meio do setor de atendimento através do e-mail secretaria@faculdadefocus.com.br. © 2021, by Faculdade Focus Rua Maranhão, 924 - Ed. Coliseo - Centro Cascavel - PR, 85801-050 Tel: (45) 3040-1010 www.faculdadefocus.com.br Este documento possui recursos de interatividade através da navegação por marcadores. Acesse a barra de marcadores do seu leitor de PDF e navegue de maneira RÁPIDA e DESCOMPLICADA pelo conteúdo. http://www.faculdadefocus.com.br/ mailto:secretaria@faculdadefocus.com.br. http://www.faculdadefocus.com.br/ Introdução ao Direito Constitucional | Introdução www.cenes.com.br | 3 Sumário Sumário ------------------------------------------------------------------------------------------------------------- 3 1 Introdução --------------------------------------------------------------------------------------------------- 4 2 Concepções de Constituição ---------------------------------------------------------------------------- 4 2.1 A Concepção Sociológica ----------------------------------------------------------------------------------------------- 5 2.2 Concepção Política ------------------------------------------------------------------------------------------------------- 6 2.3 Concepção Jurídica ------------------------------------------------------------------------------------------------------ 7 3 Concepção Moderna da Constituição ---------------------------------------------------------------- 9 3.1 O Constitucionalismo de Konrad Hesse ---------------------------------------------------------------------------- 9 3.2 Constituição em Sentido Cultural---------------------------------------------------------------------------------- 10 4 Tipologia das Constituições ---------------------------------------------------------------------------- 11 4.1 Quanto ao Conteúdo -------------------------------------------------------------------------------------------------- 11 4.2 Quanto à Forma -------------------------------------------------------------------------------------------------------- 12 4.3 Quanto à Elaboração -------------------------------------------------------------------------------------------------- 14 4.4 Quanto à Origem ------------------------------------------------------------------------------------------------------- 14 4.5 Quanto à Estabilidade ------------------------------------------------------------------------------------------------ 15 4.6 Quanto à Finalidade --------------------------------------------------------------------------------------------------- 16 4.7 Quanto à Extensão ---------------------------------------------------------------------------------------------------- 17 4.8 Quanto ao Critério ontológico -------------------------------------------------------------------------------------- 18 5 Conclusão --------------------------------------------------------------------------------------------------- 19 6 Referências Bibliográficas ------------------------------------------------------------------------------ 19 Introdução ao Direito Constitucional | Introdução www.cenes.com.br | 4 1 Introdução A palavra constituição, em sentido amplo, normalmente denota o modo como está formado ou estruturado determinado conjunto de coisas ou seres vivos; em sentido estrito, remete ao conjunto de normas que regulamentam e que compõe a grande lei que fundamenta o Estado. Por esse prisma, a Constituição é, para nós, a lei maior, a norma de ordem superior que dispõe sobre a organização do Estado, garantias, direitos e deveres individuais do cidadão e outros temas considerados de maior relevância no contexto da sociedade em que é elaborada. Nathalia Masson explica, no entanto, que as Constituições também são “organismos vivos, documentos receptivos aos influxos da passagem do tempo, em constante diálogo com a dinâmica social”, e tendo em vista seu caráter aberto e comunicativo com outros sistemas, sempre haverá certa dificuldade na conceituação, pois existe uma “pluralidade de concepções que fornecem noções acerca do assunto” (MASSON, 2020). Assim, neste material, falaremos a respeito das quatro concepções de constituição mais estudadas pela doutrina – a sociológica, a política, a jurídica e a moderna –, além dos critérios utilizados para classificação. 2 Concepções de Constituição Nathalia Masson (2020) define Constituição como “o conjunto de normas fundamentais e supremas, que podem ser escritas ou não, responsáveis pela criação, estruturação e organização político-jurídica de um Estado”. Assim, a Constituição não só descreve a organização do Estado, como também se consolida como um alicerce para todas as demais normais. Ao longo do tempo, contudo, a doutrina pensou sobre a natureza, o sentido e o papel da Constituição, produzindo diversas concepções acerca da forma como elas devem ser entendidas. Dentre estas, as que tiveram maior repercussão foram a concepção sociológica, a jurídica e a positivista. Introdução ao Direito Constitucional | Concepções de Constituição www.cenes.com.br | 5 2.1 A Concepção Sociológica A concepção sociológica foi desenvolvida pelo alemão Ferdinand Lassalle na obra “A essência da Constituição”, na qual pensou a constituição sob o aspecto da relação entre os fatos sociais dentro do Estado. Para ele, “a constituição de uma país é, em essência, a soma dos fatores reais do poder que regem nesse país. Esta seria a constituição real e efetiva, ao passo que a constituição escrita não passaria de uma “folha de papel”. Na explicação de Luis Roberto Barroso (2020), a Constituição real e efetiva do Estado é um conjunto de forças políticas, econômicas e sociais, que atuam dialeticamente, estabelecendo uma realidade e um sistema de poder. Neste sentido, “a Constituição jurídica, mera ‘folha de papel’, limita-se a converter esses fatores reais do poder em instituições jurídicas, em Direito”. Essa soma de fatores reais do poder que regem o país pode, ou não, coincidir com a constituição escrita, que, no entanto, sucumbiria caso fosse contrária à constituição real, devendo, por esse motivo, coadunar-se com ela. Segundo Nathalia Masson (2020), “como num eventual embate entre o texto escrito e os fatores reais de poder estes últimos sempre prevalecerão, deverá a Constituição escrita sempre se manter em consonância com a realidade, pois, do contrário, será esmagada (como uma simples "folha de papel") pela sua incompatibilidade com o que vige na sociedade”. É importante compreender que Lassalle pensou a constituição a partir do prisma sociológico em uma época em que havia muitas Constituições oriundas de poderes monárquicos, imperiais e autocratas, e que, muitas vezes, não correspondiam aos anseios da sociedade. Para ele, só seria eficaz a constituição que correspondesse aos valores presentes na sociedade, e nesta concepção a situação ideal é aquela em que a constituição real e a escrita são inequivocamente correspondente (MASSON, 2020). Introdução ao Direito Constitucional | Concepções de Constituição www.cenes.com.br | 6 Figura 1 - Concepção sociológica da Constituição Fonte: Núcleo Editorial Focus 2.2 Concepção Política A concepção política da constituição foi pensada por Carl Schmitt na obra “Teoria da Constituição”, segundo a qual a Constituição é vista como “decisão política fundamental, decisão concreta de conjunto sobre o modo e forma de existência da unidade política” (SILVA, 2014). Neste sentido, Nathalia Masson aponta que A Constituição corresponde à decisão política fundamental que o Poder Constituinte reconhece e pronúncia ao impor uma nova existência política. [...] Sob o prisma político, portanto, pouco interessa se a Constituição corresponde ou não a fatores reais de poder, o importante é que ela se apresente enquanto o produto de uma decisão de vontade que seimpõe, que ela resulte de uma decisão política fundamental oriunda de um Poder Constituinte capaz de criar uma existência política concreta, tendo por base uma normatividade escolhida (MASSON, 2020). Dessa forma, Carl Schmitt faz uma distinção entre constituição e leis constitucionais, defendendo que a constituição “só se refere à decisão política fundamental (estrutura e órgãos do Estado, direitos individuais, vida democrática etc.); e as leis constitucionais são os demais dispositivos inscritos no texto do documento constitucional, que não contenham matéria de decisão política fundamental” (SILVA, 2014). Em suma: ▪ Constituição: é aquilo que traz as normas materiais, ou seja, as normas que Introdução ao Direito Constitucional | Concepções de Constituição www.cenes.com.br | 7 decorrem da decisão política fundamental, as normas estruturantes do Estado, tais como: forma de estado; forma de governo; regime político; composição e competência dos entes; divisão dos poderes; direitos e garantias fundamentais. As normas estruturantes do Estado são aquelas que que regem e devem obrigatoriamente estar presentes em qualquer constituição. ▪ Lei Constitucional: é tudo o que está no texto escrito, mas não é decisão fundamental do Estado, e mesmo assim possui hierarquia constitucional. É tudo aquilo que não é norma estruturante do Estado, tudo aquilo que, embora esteja no texto constitucional, não precisaria estar, pois poderia simplesmente ser regulamentado em forma de Lei Complementar. Figura 2 - Concepção política da Constituição Fonte: Núcleo Editorial Focus 2.3 Concepção Jurídica A concepção jurídica da constituição foi preconizada por Hans Kelsen na obra “Teoria Pura do Direito”, segundo a qual a Constituição é puro dever-ser, é fruto da vontade racional do homem, e não das leis naturais. Conforme explica Barroso, Em busca de um tratamento científico que conferisse “objetividade e exatidão” ao Direito, Kelsen desenvolveu sua teoria pura, na qual procurava depurar seu objeto de elementos de outras ciências (como a sociologia, a filosofia), bem como da política e, em certa medida, até Introdução ao Direito Constitucional | Concepções de Constituição www.cenes.com.br | 8 da própria realidade. Direito é norma; o mundo normativo é o do dever-ser, e não o do ser. Nessa dissociação das outras ciências, da política e do mundo dos fatos, Kelsen concebeu a Constituição (e o próprio Direito) como uma estrutura formal, cuja nota era o caráter normativo, a prescrição de um dever-ser, independentemente da legitimidade ou justiça de seu conteúdo e da realidade política subjacente. A ordem jurídica é um sistema escalonado de normas, em cujo topo está a Constituição, fundamento de validade de todas as demais normas que o integram (BARROSO, 2020). Por esse viés, a palavra constituição pode ser entendida em dois sentidos, no sentido lógico-jurídico e no sentido jurídico-positivo. “De acordo com o primeiro, a constituição significa norma fundamental hipotética, cuja função é servir de fundamento lógico transcendental da validade da constituição jurídico-positiva que equivale à norma positiva suprema, conjunto de normas que regula a criação de outras normas, lei nacional no seu mais alto grau” (SILVA, 2014). Em outras palavras, para Kelsen, não é necessário que constituição se limite àquilo que corresponde aos anseios reais do povo, tampouco às normas estruturantes do Estado, mas sim, que seja tudo aquilo que nela está escrito. Desse modo, o autor dá à constituição um sentido jurídico, desconsiderando o clamor do povo e do poder constituinte, e considerando somente aquilo que está escrito no texto. Figura 3 - Concepção jurídica da Constituição Fonte: Núcleo Editorial Focus Introdução ao Direito Constitucional | Concepção Moderna da Constituição www.cenes.com.br | 9 Em resumo, estas são as teorias clássicas que fundamentam a constituição: Figura 4 - Concepções da Constituição Fonte: Núcleo Editorial Focus 3 Concepção Moderna da Constituição José Afonso da Silva descreve, em seu Curso de Direito Constitucional Positivo (2014), como as três concepções abordadas anteriormente pecam pela unilateralidade dos conceitos apresentados, o que justificaria a busca de vários autores em formular um conceito unitário de constituição, que a conceba em “sentido que revele conexão de suas normas com a totalidade da vida coletiva, na unidade de uma ordenação fundamental e suprema”. Assim, neste capítulo veremos duas das concepções que derivaram dessas três teorias clássicas. 3.1 O Constitucionalismo de Konrad Hesse Ao analisar a essência da Constituição no pensamento de Lassalle e de Konrad Hesse, a Professora Iacyr de Aguilar Vieira discorre sobre como o pensamento de Konrad Introdução ao Direito Constitucional | Concepção Moderna da Constituição www.cenes.com.br | 10 Hesse se contrapõe às reflexões desenvolvidas por Ferdinand Lassalle de modo a completá-las e trazê-las a uma nova realidade, realçando o caráter normativo da Constituição. De forma bem sintetizada, para ele, a Constituição possuiria uma força normativa capaz de modificar a realidade e obrigar as pessoas, de tal forma que nem sempre ela poderia vir a ceder em face dos fatores reais de poder. Ou seja, tanto pode a Constituição escrita sucumbir, quanto prevalecer, modificando a sociedade. Na concepção de Hesse, a realização da Constituição importa na capacidade de operar na vida política, nas circunstâncias da situação histórica e, especialmente, na vontade de Constituição, que procede de três fatores: da consciência da necessidade e do valor específico de uma ordem objetiva e normativa que afaste o arbítrio; da convicção de que esta ordem constituída é mais do que uma ordem legitimada pelos fatos e que necessita estar em constante processo de legitimação, e da consciência de que se trata de uma ordem que não logra ser eficaz sem o concurso da vontade humana, principalmente das pessoas envolvidas no processo constitucional, isto é, de todos os partícipes da vida constitucional (VIEIRA, 1998). Para Konrad Hesse, não é o povo que decide se a Constituição se tornará somente “uma folha de papel”, mas é a constituição que decidirá sobre o povo, o qual deverá se adequar ao que diz o texto constitucional. 3.2 Constituição em Sentido Cultural Na concepção culturalista, a constituição é entendida como um produto da cultura, um fato cultural. Conforme aponta Bernardo Gonçalves Fernandes (2020), essa concepção desenvolve a lógica de que “a Constituição possui fundamentos diversos arraigados em fatores de poder, decisões políticas do povo e normas jurídicas de dever ser vinculantes. Surge daí a ideia de uma constituição total, com a junção dos aspectos econômicos, sociológicos, políticos, jurídicos-normativos, filosóficos e morais a fim de construir uma unidade para a Constituição. Nesse sentido, a Constituição se coloca como um conjunto de normas fundamentais condicionadas pela cultura total e, ao mesmo tempo, condicionante, numa perspectiva eminentemente dialética”. Segundo essa teoria, a constituição deve ser percebida como realidade social, decisão política fundamental e norma suprema positivada, dessa forma, ela abarca todas as teorias anteriores. Seus propulsores, no Brasil, foram Konrad Hesse, Peter Häberle e Introdução ao Direito Constitucional | Tipologia das Constituições www.cenes.com.br | 11 Paulo Bonavides. 4 Tipologia das Constituições Além das diversas formas de conceber as constituições, existem formas de classificá- las de acordo com os mais variados critérios e perspectivas. De acordo com Nathalia Masson, em seu Manual de Direito Constitucional (2020), as constituições podem ser classificadas em: Figura 5 - Classificação das Constituições Fonte: Adaptado de MASSON (2020)Na sequência, sem dispensar a necessidade de estudo das demais perspectivas existentes, enfatizaremos as classificações tradicionais apresentadas pela maioria dos manuais de Direito Constitucional. 4.1 Quanto ao Conteúdo Quanto ao conteúdo, as constituições podem ser classificadas em materiais e formais. Introdução ao Direito Constitucional | Tipologia das Constituições www.cenes.com.br | 12 ▪ Constituição Material: É aquela que, escrita ou não em documento constitucional, traz as normas fundamentais e estruturantes do Estado, como a divisão dos poderes e das competências dos entes, bem como dos princípios e dos direitos fundamentais. “Ou seja, são as normas fundantes (basilares) que fazem parte do “núcleo ideológico” constitutivo do Estado e da sociedade” (FERNANDES, 2020). Nessa classificação, somente matéria essencialmente constitucional possui status constitucional, as demais, mesmo que integrem o corpo da constituição, não são tidas como constitucionais (ex.: Constituição Imperial de 1824). ▪ Constituição Formal: É aquela que elege como principal critério de existência de suas normas o processo de sua formação, e não seu conteúdo. Nesta classificação, todo o texto constitucional é de fato constitucional, pois o que importa na Constituição Formal não é o texto ou a norma, mas sim o processo. Ou seja, os textos que passaram pelo mesmo processo são considerados constitucionais, mesmo que não sejam normas estruturantes do Estado (ex.: Constituição Federal de 1988). Em relação à Constituição Formal, Bernardo Gonçalves Fernandes (2020) aponta que é “dotada de supralegalidade (supremacia), estando sempre acima de todas as outras normas do ordenamento jurídico de um determinado país. Nesse sentido, “só pode ser modificada por procedimentos especiais que ela no seu corpo prevê, na medida em que as normas ordinárias não a modificam [...], a Constituição formal, sem dúvida, quanto a estabilidade, será rígida. 4.2 Quanto à Forma Quanto à forma, as constituições podem ser instrumental (escritas) ou costumeiras (não escritas). ▪ Constituição Instrumental ou Escrita: é aquela codificada e sistematizada em um texto único, isto é, escrita em documento solene e uniforme, o qual possui as normas fundamentais do Estado. Como explica André Ramos Tavares (2020), “Constituições escritas são fruto do processo de codificação do Direito Público, Introdução ao Direito Constitucional | Tipologia das Constituições www.cenes.com.br | 13 ocorrendo onde o Direito Constitucional se encontra sistematizado em um único corpo textual” (ex.: Constituição Federal de 1988). ▪ Constituição Costumeira ou não escrita: é aquela cujas normas constitucionais não constam em um documento único e solene, baseando-se nos costumes, na jurisprudência e convenções. A mutação dessa constituição se dá de acordo com a evolução da sociedade e do seu ordenamento jurídico, “as normas costumeiras têm como característica fundamental o surgimento informal, desligado de solenidades”, elas originam da sociedade, “e não de uma entidade especificamente designada para isso” (TAVARES, 2020). Atualmente inexistem constituições totalmente costumeiras, que foram predominantes até o fim do século XVIII. Até mesmo a constituição inglesa, que é o maior símbolo de constituição costumeira, possui princípios constitucionais em textos escritos. Conforme cita Tavares, “o ordenamento jurídico inglês compõe-se do denominado Direito estatutário e das convenções constitucionais, ao lado da jurisprudência e dos costumes (especialmente parlamentares)”. ▪ Constituição Legal (também denominada Constituição não formal): As constituições escritas podem tanto estar sistematizadas em um único corpo de lei (constituições codificadas) ou dispersas em diversos documentos, sendo estas denominadas Constituições Legais. Estas estão “integradas por documentos diversos, vale dizer, fisicamente distintos, que se reagrupam sob o epíteto de perfazerem a Constituição de determinado país” (TAVARES, 2020). Atualmente, nossa Constituição é classificada como formal (quanto ao conteúdo) e escrita (quanto à forma), uma vez que está codificada e sintetizada em um documento único. Porém, com a redação dada pela Emenda Constitucional n. 45/04, passou-se a reconhecer também como norma constitucional outras que não estão escritas na nossa Constituição (art. 5º, § 3º: Os tratados e convenções internacionais sobre direitos humanos que forem aprovados, em cada Casa do Congresso Nacional, em dois turnos, por três quintos dos votos dos respectivos membros, serão equivalentes às emendas constitucionais). Com isso, a doutrina concluiu que a nossa Constituição, quando à forma, não pode ser classificada como instrumental ou meramente escrita, uma vez que a partir do Introdução ao Direito Constitucional | Tipologia das Constituições www.cenes.com.br | 14 implemento do art. 5º, § 3º, nós adotamos uma outra deia de constituição, a de constituição legal, uma que admite normas escritas em outros documentos. 4.3 Quanto à Elaboração Quanto à elaboração, a constituição pode ser sistemática (dogmática) ou histórica (costumeira). ▪ Constituição Sistemática ou Dogmática: sempre escrita, é aquela elaborada por um órgão constituinte que sistematiza os dogmas ou ideias fundamentais da teoria política do direito dominante naquele momento. Parte de teorias preconcebidas, sistemas prévios e institutos já consagrados na teoria, na doutrina e em dogmas políticos, e é feita em prazos certos e determinados. Este modelo permite quebrar dogmas, pois faz olhar para trás, analisar o que está certo ou errado e, com base nessas reflexões, escrever aquilo que se tomará por certo ou errado a partir daquele momento (ex.: Constituição Federa de 1988). ▪ Constituição Histórica ou Costumeira: não escrita, é aquela resultante de lenta formação histórica, do lento evoluir das tradições, dos fatos sócio-políticos que se cristalizam como normas fundamentais da organização de determinado Estado ou, como explica Tavares (2020), “da gradativa sedimentação jurídica de um povo, por meio de suas tradições” (ex.: Constituição Inglesa). 4.4 Quanto à Origem Quanto à origem, as constituições podem ser classificadas em quatro tipos. ▪ Constituição Votada, Popular, Democrática ou Promulgada: são aquelas que derivam do trabalho de um órgão constituinte composto de representantes eleitos pelo povo para esse fim, a chamada Assembleia Nacional Constituinte (ex.: Constituições Brasileiras de 1891, 1934, 1946 e 1988). ▪ Constituição Imposta ou Outorgada: são aquelas impostas pelos Introdução ao Direito Constitucional | Tipologia das Constituições www.cenes.com.br | 15 governantes, sem a participação do povo e independentes do sistema ou forma de governo. Alguns doutrinadores não reconhecem essa forma de constituição, dando a esse tipo de constituição imposta ou outorgada o nome de cartas constitucionais (ex.: Constituições Brasileiras de 1824 e 1937). ▪ Constituição Bonapartista ou Cesarista: são aquelas elaboradas por um Imperador ou Ditador e submetida a plebiscito ou a referendo popular para mera ratificação da vontade do detentor do poder (ex.: plebiscitos Napoleônicos e o plebiscito de Pinochet, no Chile). ▪ Constituição Dualista ou Pactuada: origina-se de um compromisso entre duas classes políticas antagônicas; o poder constituinte originário se encontra nas mãos de mais de um titular. O equilíbrio é precário ou camuflado (ex.: Magna Carta de 1215 e a Constituição Francesa de 1791). 4.5 Quanto à Estabilidade Quanto à classificação das constituições em relação à estabilidade, ou alterabilidade, é importante lembrar, em primeiro lugar, que não existe no mundo uma classificação para constituição imutável, porque todas as constituições são mutáveis. Por isso,as constituições são classificadas somente em relação ao nível de complexidade para realização de alterações. ▪ Constituição Rígida: é aquela que para ser alterada exige um procedimento especial solene e mais rigoroso que os de formação das leis ordinárias ou complementares (ex. Constituição Federal de 1988). “Na Constituição rígida, para todas as normas constitucionais se exige, na eventualidade de sua alteração, um processo legislativo mais trabalhoso, mais dificultoso do que comumente é exigível. Geralmente, e principalmente no caso brasileiro, esse processo mais trabalhoso se resume a uma iniciativa mais reduzida, a um quorum de aprovação maior e, por fim, à não participação do Poder Executivo (por meio da exclusão do veto ou da sanção)” (TAVARES, 2020). Introdução ao Direito Constitucional | Tipologia das Constituições www.cenes.com.br | 16 ▪ Constituição Flexível: é aquela que pode ser modificada pelo legislador segundo o mesmo procedimento utilizado para as leis ordinárias ou complementares (ex.: Itália/1848). Segundo Tavares (2020), “as constituições flexíveis são as primeiras formas de estruturação que aparecem nas sociedades políticas organizadas”. ▪ Constituição Semirrígida ou Semiflexível: é aquela que contém uma parte rígida e outra flexível, exigindo, normalmente, um quórum de alterações distinto e um poder limitado, mas para algumas normas o processo é o mesmo que o de lei ordinária (ex.: Constituição do Império de 1824). ▪ Constituição Super-rígida: é aquela que se caracteriza pela impossibilidade de alteração, ou “pretensão de eternidade”, conforme expõe Tavares (2020). É aquela que, além de rígida, possui cláusulas que não podem ser alteradas – as denominadas cláusulas pétreas. No entendimento de Alexandre de Moraes, a Constituição de 1988 seria super-rígida, haja vista possuir normas imutáveis (cláusulas pétreas constantes no art. 60, § 4º, CF/88). Conforme aponta Nathalia Masson, contudo, este não é “o entendimento da doutrina majoritária, que compreende a Constituição de 1988 enquanto rígida, sob a justificativa de que o que caracteriza a rigidez é exatamente o procedimento diferenciado de alteração — marcado por quorum de votação qualificado, rejeição ao turno único, ampliação das discussões — e não a existência de um núcleo insuperável, insuscetível à ação restritiva ou abolitiva do poder reformador, que pode existir ou não nos documentos rígidos”. 4.6 Quanto à Finalidade Existem três classificações quanto à finalidade de uma constituição. ▪ Constituição Garantia, Abstencionista ou Negativa: é aquela que busca garantir a liberdade e os direitos pessoais, delimitando o Poder Estatal (ex.: Constituição Norte-Americana). De acordo com Fernandes (2020), “ela tem um Introdução ao Direito Constitucional | Tipologia das Constituições www.cenes.com.br | 17 viés no passado, visando garantir direitos assegurados contra possíveis ataques do Poder público. Trata-se de Constituição típica de Estado liberal que se caracteriza pelo seu abstencionismo e sua atuação negativa (de não interferência ou ingerência na sociedade)”. ▪ Constituição Balanço: é aquela que se limita a demonstrar a ordem existente, que visa o presente. É típica dos regimes socialistas, “essa constituição propõe- se a explicitar as características da atual sociedade, trazendo parâmetros que devem ser observados à luz da realidade econômica, política e social já existente” (FERNANDES, 2020) (ex.: Constituição soviética de 1924, 1936 e 1977). ▪ Constituição Dirigente: é aquela que não se limita a organizar o poder, mas determinar a atuação do governo, impondo verdadeiras diretrizes políticas permanentes. É a constituição do “dever ser” (ex. Constituição Federal de 1988). Segundo Fernandes (2020), é uma constituição típica de Estado social e de seu pano de fundo pragmático (democracias-sociais, sobretudo do pós- Segunda Guerra Mundial). Constituições dirigentes são planificadoras e visam predefinir uma pauta de vida para a sociedade e estabelecer uma ordem concreta de valores para o Estado e para a sociedade, ou seja, programas e fins para serem cumpridos pelo Estado e também pela sociedade”. 4.7 Quanto à Extensão Quanto à extensão, uma constituição pode ser classificada como concisa ou prolixa. ▪ Constituição Concisa ou Sintética: é aquela que possui texto enxuto, curto, tratando apenas de regras básicas de organização do sistema político-jurídico do Estado, deixando para a legislação infraconstitucionais as demais matérias (ex.: Constituição Norte-Americana, com apenas 10 emendas originais e outras 17 acrescentadas posteriormente, desde 1791). ▪ Constituição Prolixa ou Analítica: é aquela com conteúdo extenso (formato amplo), minucioso e que contempla regras programáticas e normas Introdução ao Direito Constitucional | Tipologia das Constituições www.cenes.com.br | 18 formalmente constitucionais. Este modelo de constituição, explica Fernandes (2020) “acaba por regulamentar outros assuntos que entenda relevantes num dado contexto, estabelecendo princípios e regras, e não apenas princípios” (ex.: Constituição Federal de 1988, com 250 artigos originais mais 106 emendas até o momento). 4.8 Quanto ao Critério ontológico Quanto à ontologia, isto é, ao nível de correspondência com a realidade, as constituições são classificadas em normativa, nominalista e semântica. ▪ Normativa: é aquela que está integrada na sociedade, refletindo os anseios da sociedade, e todos a cumprem lealmente, inclusive os agentes de poder. Há uma correspondência com a realidade. Na explicação de Nathalia Masson (2020), neste tipo de Constituição, “há perfeita sintonia entre o texto constitucional e a conjuntura política e social do Estado, de forma que a limitação ao poder dos governantes e a previsão de direitos à população sejam estritamente observadas e cumpridas. O texto constitucional é de tal forma eficaz e seguido à risca que, na prática, vê-se claramente a harmonia entre o que se estabeleceu no plano normativo e o que se efetiva no mundo fático” (ex.: Constituição Americana de 1787). ▪ Nominativa: é meramente educativa e insuficiente em concretização constitucional, não se alcança a verdadeira normatização do processo real do poder. Para Masson (2020), “esta já não é capaz de reproduzir com exata congruência a realidade política e social do Estado, mas anseia chegar a este estágio. Seus dispositivos não são, ainda, dotados de força normativa capaz de reger os processos de poder na plenitude, mas almeja-se um dia alcançar a perfeita sintonia entre o texto (Constituição) e o contexto (realidade)” (ex.: Constituições brasileiras de 1934 e 1946). ▪ Semântica: é aquela que, apesar de aplicada, revela somente o interesse exclusivo dos detentores do poder, buscando legitimá-los. Em outras palavras, é aquela que é imposta. “É a Constituição que nunca pretendeu conquistar uma Introdução ao Direito Constitucional | Conclusão www.cenes.com.br | 19 coerência apurada entre o texto e a realidade, mas apenas garantir a situação de dominação estável por parte do poder autoritário. Típica de estados ditatoriais, sua função única é legitimar o poder usurpado do povo, estabilizando a intervenção dos ilegítimos dominadores de fato do poder político (MASSON, 2020).” (ex.: Constituições Federais de 1937 e 1967). 5 Conclusão Nesta aula abordamos as principais concepções de constituição tradicionalmente trabalhadas pela doutrina – a concepção sociológica, política e jurídica –, além da concepção culturalista, entendendo que, fundamentalmente, a Constituição concebe o conjunto de normas supremas, responsáveis pela constituição e organização político-jurídica de um Estado. Falamos, por fim, sobre o constitucionalismo difundido por Konrad Hesse e as principais tipologias das constituiçõesclassificadas quanto ao conteúdo, forma, elaboração, origem, estabilidade, finalidade, extensão e correspondência com a realidade. 6 Referências Bibliográficas BARROSO, Luís Roberto. Curso de direito constitucional contemporâneo: os conceitos fundamentais e a construção do novo modelo. – 9. ed. São Paulo: Saraiva Educação, 2020. FERNANDES, Bernardo Gonçalves. Curso de Direito Constitucional. – 12 ed. Salvador: Ed. JusPodivm, 2020. MASSON, Nathalia. Manual de direito constitucional. -8. ed. Salvador: Ed. JusPodvm, 2020. SILVA, José Afonsa da. Curso de Direito Constitucional Positivo. -37. ed. São Paulo: Malheiros Editores, 2014. TAVARES, André Ramos. Curso de Direito Constitucional. – 18 ed. São Paulo: Saraiva Educação, 2020. VIEIRA, Iacyr de Aguilar. A essência da Constituição no pensamento de Lassalle e de Konrad Hesse. In: Revista de informação legislativa, v. 35, n. 139, 1998. Disponível em: <http://www2.senado.leg.br/bdsf/handle/id/388>. Acesso em: set. 2021. Introdução ao Direito Constitucional | Referências Bibliográficas www.cenes.com.br | 20 Introdução ao Direito Constitucional | Introdução www.cenes.com.br | 1 DISCIPLINA INTRODUÇÃO AO DIREITO CONSTITUCIONAL CONTEÚDO Aplicação das Normas Constitucionais Introdução ao Direito Constitucional | Introdução www.cenes.com.br | 2 A Faculdade Focus se responsabiliza pelos vícios do produto no que concerne à sua edição (apresentação a fim de possibilitar ao consumidor bem manuseá-lo e lê-lo). A instituição, nem os autores, assumem qualquer responsabilidade por eventuais danos ou perdas a pessoa ou bens, decorrentes do uso da presente obra. É proibida a reprodução total ou parcial de qualquer forma ou por qualquer meio, eletrônico ou mecânico, inclusive através de processos xerográficos, fotocópia e gravação, sem permissão por escrito do autor e do editor. O titular cuja obra seja fraudulentamente reproduzida, divulgada ou de qualquer forma utilizada poderá requerer a apreensão dos exemplares reproduzidos ou a suspensão da divulgação, sem prejuízo da indenização cabível (art. 102 da Lei n. 9.610, de 19.02.1998). Atualizações e erratas: este material é disponibilizado na forma como se apresenta na data de publicação. Atualizações são definidas a critério exclusivo da Faculdade Focus, sob análise da direção pedagógica e de revisão técnica, sendo as erratas disponibilizadas na área do aluno do site www.faculdadefocus.com.br. É missão desta instituição oferecer ao acadêmico uma obra sem a incidência de erros técnicos ou disparidades de conteúdo. Caso ocorra alguma incorreção, solicitamos que, atenciosamente, colabore enviando críticas e sugestões, por meio do setor de atendimento através do e-mail secretaria@faculdadefocus.com.br. © 2021, by Faculdade Focus Rua Maranhão, 924 - Ed. Coliseo - Centro Cascavel - PR, 85801-050 Tel: (45) 3040-1010 www.faculdadefocus.com.br Este documento possui recursos de interatividade através da navegação por marcadores. 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Atualmente, ele é considerado um dos expoentes na Teoria Geral da Constituição em razão da sua proposta de classificação tripartida das normas, dividindo-as em normas de eficácia plena, de eficácia contida e de eficácia limitada. Neste material, iremos estudar a aplicabilidade, isto é, a capacidade de produção de efeitos jurídicos das normas que compõem nossa Constituição. Veremos qual “a potencialidade de realização normativa dos dispositivos constitucionais” (MASSON, 220), atentando-nos, entretanto, ao que pontua André Ramos Tavares (2020) sobre a necessidade de se “ter como parâmetro que determinado critério classificatório só se presta quando útil for ao fim perseguido. Fora dessa situação, as classificações são totalmente impensáveis”. 2 Aplicabilidade das Normas Constitucionais Especializado em Direito Constitucional, o Professor José Afonso da Silva defende a premissa de que não há norma constitucional destituída de eficácia, uma vez que todas produzem, pelo menos, dois efeitos, um positivo, que é a “capacidade que toda norma constitucional detém de impedir a recepção das normas anteriores à sua vigência que com ela não guardem compatibilidade” e o outro negativo, que diz respeito à capacidade que toda norma constitucional possui de “vedar, ainda que implicitamente, ao legislador ordinário, a edição de normas que a contrariem”. Neste sentido, podemos afirmar que todas as normas constitucionais têm aplicabilidade e eficácia no plano abstrato (plano jurídico), mesmo aquelas conceituadas com normas de eficácia limitada. Para o autor, a eficácia da norma remonta à capacidade da norma de atingir os objetivos e metas taxados pelo legislador, ou seja de produzir efeitos jurídicos ao regular as situações, relações e comportamentos de que cogita. A eficácia remete, portanto, “à aplicabilidade, exigibilidade ou executoriedade da norma, como possibilidade de sua aplicação jurídica”. O alcance dos objetivos da norma, por sua vez, constitui a efetividade. “Esta é, portanto, a medida da extensão em que o objetivo Introdução ao Direito Constitucional | Espécies de Normas Constitucionais www.cenes.com.br | 5 é alcançado, relacionando-se ao produto final”. Em contraponto, embora em sentido conexo, a eficácia social “designa uma efetiva conduta acorde com a prevista pela norma; refere-se ao fato de que a norma é realmente obedecida e aplicada”, sendo este conceito equivalente ao de efetividade da norma. Conforme explica Luis Roberto Barroso (2020), A ideia de efetividade expressa o cumprimento da norma, o fato real de ela ser aplicada e observada, de uma conduta humana se verificar na conformidade de seu conteúdo. Efetividade, em suma, significa a realização do Direito, o desempenho concreto de sua função social. Ela representa a materialização, no mundo dos fatos, dos preceitos legais e simboliza a aproximação, tão íntima quanto possível, entre o dever-ser normativo e o ser da realidade social. No entanto, nem sempre a norma possuirá eficácia jurídica e social ao mesmo tempo, ela pode, por exemplo ter efeito jurídico, como, por exemplo, revogar uma norma anterior, mas não ser cumprida no plano social (SILVA,1982). Quanto à aplicabilidade, José Afonso da Silva afirma que embora sejam aspectos do mesmo fenômeno encarados por enfoques diferentes, a eficácia seria entendida como a potencialidade, ao passo que a aplicabilidade seria entendida como a realizabilidade ou praticidade. “Se a norma não dispõe de todos os requisitos para sua aplicação aos casos concretos, falta-lhe eficácia, não dispõe de aplicabilidade. Esta se revela, assim, como a possibilidade de aplicação. Para que haja esta possibilidade, a norma há que ser capaz de produzir efeitos jurídicos”. Assim, toda norma eficaz será também aplicável, um não se destitui do outro, mas isso não significa dizer que toda norma aplicável será de fato aplicada, mesmo porque, por vezes, a forma como se dará sua aplicação carece de regulamentação. Dessa forma, a depender da norma, a aplicabilidade pode se dar de forma plena, contida ou limitada. 3 Espécies de Normas Constitucionais Segundo José Afonso da Silva, conforme o grau de eficácia, podem existir três espécies de normas constitucionais: normas de eficácia plena, normas de eficácia contida e Introdução ao Direito Constitucional | Espécies de Normas Constitucionais www.cenes.com.br | 6 normas de eficácia limitada. Na definição apresentada por Bernardo Gonçalves Fernandes (2020), temos o seguinte: ▪ Normas de aplicabilidade plena: têm aplicabilidade direta, imediata ou integral, “reúnem todos os elementos necessários para a produção de todos os efeitos jurídicos imediatos. São dotadas de uma aplicabilidade imediata, direta”, ou seja não carecem de complementação. ▪ Normas de aplicabilidade contida: “nascem com eficácia plena, reúnem todos os elementos necessários para a produção de todos os efeitos jurídicos imediatos, mas terão seu âmbito de eficácia restringido, reduzido ou contido pelo legislador infraconstitucional”. Ou seja, têm aplicabilidade direta e imediata, porém não integral e podem ser reduzidas por lei posterior. ▪ Normas de aplicabilidade limitada: têm aplicabilidade indireta, mediata e são reduzida, ou seja, requerem uma lei que a complemente, pois não são bastantes em si. “Nesses termos, elas não reúnem todos os elementos necessários para a produção de todos os efeitos jurídicos. São normas que têm aplicabilidade apenas indireta ou mediata”. Para produção de efeitos jurídicos, requerem regulamentação e complementação infraconstitucional. Estas normas se dividem em: a) limitadas de princípios institutivos, que são normas de organização e estruturação de órgãos do Estado; e b) limitadas de princípios programáticos, que “traçam tarefas, fins e programas, para cumprimento por parte dos Poderes Públicos e atualmente pela própria sociedade”. A norma de eficácia contida e a norma de eficácia limitada têm um fator em comum: ambas contam com complementação legal. A diferença é que, se a lei vem para a norma de aplicabilidade contida, é para limitar ou restringi-la. Em contrapartida, quando vem para a norma de aplicabilidade limitada, é para que essa norma seja expandida. Nesta última, a Lei é imperativa para que a norma possa valer. Introdução ao Direito Constitucional | Espécies de Normas Constitucionais www.cenes.com.br | 7 Figura 1 - A classificação de José Afonso da Silva Fonte: Adaptado de MASSON (2020) 3.1 Normas de Eficácia Plena De acordo com José Afonso da Silva, as normas constitucionais de eficácia plena são “aquelas que, desde a entrada em vigor da Constituição, produzem, ou têm possibilidade de produzir, todos os efeitos essenciais, relativamente aos interesses, comportamentos e situações, que o legislador constituinte, direta e normativamente, quis regular”, tais como os remédios constitucionais. É oportuno atentarmos à observação feita por Nathalia Masson quanto à aplicabilidade das normas definidoras de direitos e garantias fundamentais. Segundo a autora, “de fato, como regra, a Constituição Federal estabelece que as normas definidoras de direitos e garantias fundamentais têm aplicação imediata (art. 5°, g 1°, CF/88). Porém, afirmar que uma norma constitucional é dotada de aplicabilidade imediata não significa dizer que ela dispensa a atuação positiva por parte dos poderes públicos. Significa dizer, apenas, que o direito nela previsto poderá ser exigido pelo seu destinatário de imediato, sem necessidade de regulamentação por lei” (MASSON, 2020). Dessa forma, as normas de aplicabilidade plena: ▪ não dependem de regulamentação; ▪ são normas de aplicabilidade direta, imediata e integral; ▪ são independentes e absolutas; ▪ via de regra, o verbo da norma é o “ser” no presente do indicativo. Introdução ao Direito Constitucional | Espécies de Normas Constitucionais www.cenes.com.br | 8 Em geral, normas PLENAS: São responsáveis ▪ pela criação de órgãos; ▪ pela atribuição de competência aos entes federativos (Títulos III e IV da CF/88); Estabelecem ▪ proibições (art. 145, § 2º); ▪ vedações (art. 19); ▪ isenções (art. 184, §5ºI); ▪ imunidades (arts. 53 e 150, I a VI) ▪ prerrogativas (art. 128, § 5º, I). 3.2 Normas de Eficácia Contida São normas de eficácia redutível/restringível. São aquelas em que “o legislador constituinte regulou suficientemente os interesses relativos a determinada matéria, mas deixou margem à atuação restritiva por parte da competência discricionária do poder público, nos termos que a lei estabelecer ou nos termos de conceitos gerais enunciados”. Dessa forma, as normas de aplicabilidade contida: ▪ não dependem de regulamentação, mas a CF/88 autoriza ao legislador reduzir o direito previsto nela; ▪ são normas de aplicabilidade direta, imediata e não integral; ▪ via de regra, o verbo da norma é o “ser” no presente do indicativo, aparecendo expressões que envolvem ressalvas vinculadas à “lei”; Em geral, normas CONTIDAS: Tratam de direitos individuais ou de entidades públicas ou privadas, que são passíveis de limitação por uma lei futura como: ▪ direito de greve (art. 9º), restringido pela Lei da Greve Privada; ▪ o sigilo das comunicações (art. 5º, XII), restringido pela lei 9.296/96; ▪ o exercício da profissão (art. 5º, XIII), restringido pelos Estatutos da OAB e do CRC. Introdução ao Direito Constitucional | Espécies de Normas Constitucionais www.cenes.com.br | 9 3.3 Norma Limitada As normas de eficácia limitada dependem de regulamentação futura, “na qual o legislador infraconstitucional vai dar eficácia à vontade do constituinte. Não produzem, com a simples entrada em vigor da Constituição, consoante o autor, todos os efeitos essenciais, porque o legislador constituinte, por qualquer motivo, não estabeleceu sobre a matéria uma normatividade para isso bastante, deixando essa tarefa ao legislador ordinário ou a outro órgão do Estado” (TAVARES, 2020). Nestas normas, a CF/88 apenas prevê o direito, que será exercido se, e somente se, o legislador infraconstitucional o regular, porque somente incide totalmente sobre esses interesses após uma normatividade ulterior que lhes desenvolva a aplicabilidade. Assim, as normas de aplicabilidade limitada: ▪ são limitadas programáticas quando estabelecem programas a serem desenvolvidos ou direitos a serem criados; ▪ são limitadas instrutivas quando estabelecem a criação de órgãos e entidades; ▪ são normas indiretas, mediadas e reduzidas; ▪ em regra, o verbo da norma é voltado para o futuro, aparecendo expressões como “de acordo com a lei”, “definidos em lei” etc. São exemplos de normas LIMITADAS: ▪ Art. 18, § 2º; ▪ Art. 22, parágrafo único; ▪ Art. 25, § 3º; ▪ Arts. 33 e 37, XI; ▪ Arts. 88 e 90, § 2º; ▪ Art. 91, § 2º; ▪ Art. 93; ▪ Art. 102, § 1º; ▪ Art. 107, § 1º; ▪ Art. 109, VI e § 3º; ▪ Arts. 113; 121 e 125, § 3º; ▪ Art. 128, § 5º; ▪ Arts. 131 e 146; ▪ Arts. 161, I; 163; 192 e 224. Introduçãoao Direito Constitucional | Conclusão www.cenes.com.br | 10 Outras vezes, essas normas veiculam programas a serem implementados pelo Estado, visando a realização de fins sociais como: → Direito à alimentação (art. 6º); → Direito à saúde (art. 106); → Direito à educação (art. 205). 4 Conclusão Neste material falamos sobre a classificação tripartida das normas, proposta por José Afonso da Silva, e suas principais características. Concordamos com o entendimento de Andre Ramos Tavares ao afirmar que a “proposta classificatória é importante na medida em que nela se baseiam os operadores do Direito para reconhecer que nem todas as normas constitucionais possuem idêntico grau de eficácia, de capacidade de incidência plena automática e independente de outro texto normativo”. 5 Referências Bibliográficas BARROSO, Luís Roberto. Curso de direito constitucional contemporâneo: os conceitos fundamentais e a construção do novo modelo. – 9. ed. São Paulo: Saraiva Educação, 2020. FERNANDES, Bernardo Gonçalves. Curso de Direito Constitucional. – 12 ed. Salvador: Ed. JusPodivm, 2020. MASSON, Nathalia. Manual de direito constitucional. -8. ed. Salvador: Ed. JusPodvm, 2020. SILVA, José Afonso da. Aplicabilidade das Normas Constitucionais. – 2 ed. São Paulo: Malheiros Editores, 1982. SILVA, José Afonsa da. Curso de Direito Constitucional Positivo. -37. ed. São Paulo: Malheiros Editores, 2014. TAVARES, André Ramos. Curso de Direito Constitucional. – 18 ed. São Paulo: Saraiva Educação, 2020. Introdução ao Direito Constitucional | Referências Bibliográficas www.cenes.com.br | 11 Introdução ao Direito Constitucional | Introdução www.cenes.com.br | 1 DISCIPLINA INTRODUÇÃO AO DIREITO CONSTITUCIONAL CONTEÚDO A Estrutura do Estado Introdução ao Direito Constitucional | Introdução www.cenes.com.br | 2 A Faculdade Focus se responsabiliza pelos vícios do produto no que concerne à sua edição (apresentação a fim de possibilitar ao consumidor bem manuseá-lo e lê-lo). A instituição, nem os autores, assumem qualquer responsabilidade por eventuais danos ou perdas a pessoa ou bens, decorrentes do uso da presente obra. É proibida a reprodução total ou parcial de qualquer forma ou por qualquer meio, eletrônico ou mecânico, inclusive através de processos xerográficos, fotocópia e gravação, sem permissão por escrito do autor e do editor. O titular cuja obra seja fraudulentamente reproduzida, divulgada ou de qualquer forma utilizada poderá requerer a apreensão dos exemplares reproduzidos ou a suspensão da divulgação, sem prejuízo da indenização cabível (art. 102 da Lei n. 9.610, de 19.02.1998). Atualizações e erratas: este material é disponibilizado na forma como se apresenta na data de publicação. Atualizações são definidas a critério exclusivo da Faculdade Focus, sob análise da direção pedagógica e de revisão técnica, sendo as erratas disponibilizadas na área do aluno do site www.faculdadefocus.com.br. 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Historicamente, houve um tempo em que os blocos de Estados se constituíam sobre a necessidade de demonstrar supremacia bélica em relação aos demais, como os Estados de caráter continental (ou regional), e outros se constituíam a partir de elementos religiosos. Estas formas de constituição de Estado, contudo, se mostraram falhas ao longo do tempo e só mais adiante o fenômeno da economia tornou viável o agrupamento de Estados, que agora possuíam um objetivo comum. É dessa forma que “a crescente inviabilidade econômica de os Estados menores sobreviverem no mundo torna os fenômenos de integração uma realidade desejável e possível. O fator econômico guia essa transformação, tornando-a juridicamente factível”. O autor empresta as palavras de Dalmo Dallari para esclarecer que essa realidade viabilizou a formação de duas ideias fundamentais que decidiriam o tema: “ou se daria a redução do número de Estados por sua concentração em blocos políticos, ou seriam constituídas algumas grandes federações”. Conforme aponta, “a integração em blocos políticos era uma ideia forjada sob o conceito de soberania, que se manteria pela mera criação de alianças entre os diversos Estados. Essa teoria foi incrivelmente desenvolvida na época da divisão bipolar do mundo, marcado pela superioridade militar de dois Estados, alinhando-se os demais ou a um ou ao outro, o que se considerava inevitável. Contudo, logo os Estados mais fracos notaram que o seu alinhamento a uma das potências interessava mais a esta do que a si mesmos. Desenhou-se, então, uma situação diversa no cenário mundial, com o não alinhamento a esse dualismo do que se denominou países de Terceiro Mundo, muitos deles fundados em ditaduras ou em sistemas que não chegavam a ser puramentecapitalistas, sem, por isso, apresentar cunho socialista”. Introdução ao Direito Constitucional | Estrutura Básica do Estado www.cenes.com.br | 5 Assim, a ideia de unir vários Estados em um único de caráter supranacional, “inclusive com a criação de uma única Constituição, com objetivos econômicos e políticos, e com base de cultura comum” é considerada bastante recente. O mais próximo que temos dessa constituição é o que se vê na Europa. Para que se possa criar essa organização política suprema, com uma Constituição comum, primeiramente os Estados precisam ser unificados de alguma forma, processo este que resultaria na perda de soberania como atributo jurídico no campo internacional para alguns Estados que decidam se submeter a autoridades comuns para constituir um novo Estado soberano. Neste sentido, o autor aponta para duas formas teóricas clássicas existentes utilizadas para entrelaçar diversos Estados, que se traduzem no modelo dos Estados confederados, e no modelo federal. “Na confederação cada Estado integrante da união mantém íntegra sua soberania. Dessa forma, não há como pensar numa Constituição como o documento supremo da confederação. Os Estados, neste modelo, organizam-se em torno de tratados, celebrados entre as partes envolvidas, numa espécie de cooperação. Tudo se passa de maneira diversa na federação. Aqui, os Estados se agrupam em torno de um documento comum, a Constituição, atuando cada qual de maneira integrada, e não por meio de mera cooperação intergovernamental”. Uma lógica parecida pode ser aplicada quando analisamos o Estado-nação e os Estados-membros. Neste material falaremos sobre as formas de estado, voltando nossa atenção mais especificamente às características e classificações das federações. 2 Estrutura Básica do Estado Sabemos que o Estado é uma instituição complexa e dinâmica, em constante evolução. Historicamente já assumiu diversas formas, tais como a do Estado grego, Estado romano, Estado medieval, entre outras e, mesmo o Estado moderno também consta com várias ramificações, podendo ser democrático, social, liberal etc. Introdução ao Direito Constitucional | Forma de Estado www.cenes.com.br | 6 De todo modo, existem algumas características ou elementos constitutivos que caracterizam um Estado como tal. Se conceituado pelo critério dos elementos que o constituem, o Estado é “a formação política na modernidade, e é composto pelo POVO, seu elemento subjetivo, pelo TERRITÓRIO, que representa a sua porção física, pelo GOVERNO, que instrumentaliza a sua vontade e pela SOBERANIA, que é o reconhecimento perante a comunidade jurídica internacional” (BAHIA, 2017, p. 253). 3 Forma de Estado Conforme Nathalia Masson (2020), a forma de Estado diz respeito à “distribuição do exercício do poder político em razão de um território, de forma que a existência (ou não) de descentralização dará o tom da opção feita pelo poder originário ao estruturar o Estado”. Assim, alguns Estado serão organizados a partir de um único centro de poder, que emanará os comandos decisórios, e outros terão a descentralização como característica, distribuindo o exercício do poder. Na sequência, falaremos brevemente sobre as duas principais formas de Estado, destacando as principais características. 3.1 Estado Unitário Tavares define o Estado unitário como aquele no qual o poder “encontra-se enraizado em um único ente interestatal”. Por ser a forma de Estado na qual o poder fica concentrado nas mãos de uma única pessoa ou órgão, foi aquela adotada originariamente por governos autoritários. Basicamente, o Estado unitário é formado por um único Estado não descentralizado politicamente e, embora possa até mostrar uma descentralização administrativa, por meio da divisão interna, “deve estar presente, contudo, a subordinação ao poder central de qualquer entidade, órgão ou departamento criado para exercer parcela de atribuições”. Ou seja, as unidades internas não são dotadas de competência política, pois não são autônomas. Conforme aponta Tavares: Todas as entidades inferiores encontram-se dependentes da vontade central. Na estrutura do Estado unitário não há lugar para a vontade dos entes desconcentrados impor-se sobre a vontade do poder central. [...] As entidades desconcentradas encontram-se, na realidade, na Introdução ao Direito Constitucional | Forma de Estado www.cenes.com.br | 7 própria estrutura central, não constituindo um segmento separado ou autônomo (TAVARES, 2020). Na mesma linha, Nathalia Masson (2020) afirma que “é importante que o Estado promova divisões administrativas (não divisões políticas) para alcançar a governabilidade”. Neste sentido, criou-se a tipologia denominada “Estado unitário descentralizado administrativamente”, que é adotada por muitos países na atualidade. São exemplos de Estados unitários a Itália, Bélgica e Uruguai. 3.2 Estado Federado O Estado Federado é aquele no qual existe descentralização no exercício do poder político, estando este pulverizado em mais de uma entidade política, todas funcionando como centros emanadores de comando normativos e decisórios” (MASSON, 2020). Assim, o Estado federado é formado pela união entre estados, entre entes que conservam autonomia política, sendo que a soberania é transferida para o Estado Federal, embora os entes sejam dotados de capacidade política, sua unidade é fundamental para a manutenção do Estado Federado. O Brasil, que já foi um Estado unitário no período Brasil-Império, assumiu a forma federada desde a Proclamação da República como forma de Governo (Decreto n. 01). “Todas as Constituições que sucederam referido decreto, a começar pela primeira republicana (a de 1891) mantiveram referida escolha”. Nathalia Masson pontua as características da estrutura política que é assumida quando se opta pela forma federada de Estado. Em resumo, são elas: ▪ Descentralização no exercício do poder político, da qual deriva a aptidão para realização de três capacidades: auto-organização; autogoverno; e autoadministração. ▪ Indissolubilidade do vínculo federativo; ▪ Rigidez constitucional, associada a imutabilidade da forma federativa; ▪ Existência de um Tribunal Constitucional; ▪ Previsão de um órgão legislativo que represente os poderes regionais (princípio Introdução ao Direito Constitucional | Forma de Estado www.cenes.com.br | 8 da participação) Figura 1 - Características da estrutura política da forma federada de Estado Fonte: Adaptado de MASSON (2020) 3.3 Outras Classificações Outras formas de Estado apontadas pela doutrina que se apresentam no direito comparado são: ▪ Estado Regional: “assemelha-se ao unitário na medida em que não possui descentralização administrativa”. Ex.: Itália. ▪ Estado Autonômico: “é marcado ela inexistência de descentralização política e existência de descentralização administrativa e legislativa”, mas constitui-se de “baixo para cima”. Ex.: Espanha. ▪ Confederação: “formada pela reunião de Estados soberanos, é usualmente criada por meio de tratados, podendo, eventualmente, até mesmo adotar um documento comum intitulado “Constituição” – mas a natureza desse texto, independentemente da questão terminológica, será de tratado ou acordo, haja vista não haver qualquer alienação da soberania dos entes componentes ao Estado Confederado. Na confederação, ao contrário da federação, as entidades componentes são Estados Nacionais, que não deixam de ser soberanos e podem se separar a qualquer momento, já que o direito à secessão, ou seja, a Introdução ao Direito Constitucional | Classificações das Federações www.cenes.com.br | 9 dissolubilidade do vínculo entre eles, é nota marcante”. Figura 2 - Formas de Estado Fonte: Adaptado de MASSON (2020) 4 Classificações das Federações Os Estadosfederados não são todos homogêneos, cada federação possui características próprias e pode ser classificada de forma distinta. Essas classificações são dadas de acordo com a formação, a concentração de poder e a repartição de competências, quanto ao equacionamento das desigualdades e quanto às esferas integrantes da federação. Introdução ao Direito Constitucional | Classificações das Federações www.cenes.com.br | 10 Figura 3 - Classificação das federações Fonte: Núcleo Editorial Focus 4.1.1 Quanto à Formação/Origem de uma Federação De acordo com Masson (2020), uma federação pode ser originada de duas formas, por agregação, que é “o resultado da reunião/junção de alguns Estados Nacionais, até então soberanos, que decidem se reunir em um vínculo federativo. Para tanto, cedem sua soberania para o conjunto (o Estado Federal) e se tornam parte da federação, como entidades meramente autônomas”. Esta forma ocorre em um movimento centrípeto (de fora para dentro), uma vez que se forma “a partir de um deslocamento de poder que se dá da periferia para o centro”. Ainda, uma federação pode ser originada por segregação, resultado do “desfazimento de um Estado unitário (marcado pela centralização do poder em um único polo emanador de comandos decisórios) que pretende se tornar federado”. Este é denominado o movimento centrífugo, “em que o deslocamento do poder se dá do Introdução ao Direito Constitucional | Classificações das Federações www.cenes.com.br | 11 centro para a periferia”. 4.1.2 Quanto à Concentração do Poder de uma Federação A concentração do poder de um Estado também pode revelar se ele é centrípeto (centralizador) ou centrífugo (descentralizador). Quando a concentração do poder é mais rígida, mais centralizadora, no plano federal, temos um Estado federado centrípeto; quando a concentração do poder é mais flexível, descentralizada, e as competências das entidades regionais são abundantes, temos um Estado federado centrífugo. 4.1.3 Quanto à Repartição de Competências de uma Federação Quanto à repartição de competência entre os Poderes de uma Federação, destacamos duas formas, a Federação Dual, em que há uma divisão um pouco mais brusca da Federação, uma divisão de competências mais latentes e nítidas, e a Federação Cooperativa, em que existe uma competência comum, concorrente; consequentemente, a descentralização dessas competências é menos rígida e mais branda. Ou seja, há maior cooperação entre os entes. O Brasil é um exemplo de Federação Cooperativa, tal como podemos constatar nos arts. 23 e 24 da CF/88, que falam sobre a competência comum da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios. 4.1.4 Quanto ao equacionamento das desigualdades Quanto ao equacionamento das desigualdades, as federações podem ser simétricas ou assimétricas. Na federação simétrica, a “distribuição de competências e receitas é feita de modo equânime entre as entidades, sem disparidades ou diferenças”, já na federação assimétrica, existe um desequilíbrio no tratamento dos entes, principalmente em razão de desigualdades regionais bastante latentes ou de Introdução ao Direito Constitucional | Classificações das Federações www.cenes.com.br | 12 diferenças culturais muito marcantes. Conforme aponta Masson (2020), “no Brasil, por possuirmos alguns momentos constitucionais de assimetria (todos tendentes à reversão da situação de desigual entre os entes, como observamos nos seguintes dispositivos: art. 3º, III; art. 43; art. 151, I; art. 159, I, “c”, todos da CF/88), alguns autores identificam nossa federação como assimétrica”. Contudo, a autora a considera simétrica, uma vez que “todas as entidades federativas que estejam no mesmo grau possuem a mesma gama de atribuições”. 4.1.5 Quanto às esferas integrantes da federação Quanto às esferas integrantes da federação, existem duas: o federalismo de segundo grau e o de terceiro grau. No Federalismo de segundo grau (ou bidimensional), o Estado se constitui a partir de uma ordem jurídica central (primeiro grau) e das ordens jurídicas regionais (segundo grau). Em contrapartida, no Federalismo de terceiro grau soma-se a essas duas ordens existentes uma terceira ordem, que é a local (os Municípios), logo temos a União representando a ordem central, os Estados-membros representando a segunda ordem, e os Municípios representando a terceira ordem. Nathalia Masson (2020) classifica a forma de federação do Estado brasileiro da seguinte maneira: Figura 4 - Classificação da Federação Brasil Fonte: adaptado de Masson (2020) Introdução ao Direito Constitucional | Conclusão www.cenes.com.br | 13 5 Conclusão Nesta aula falamos sobre duas possíveis formas de Estado, a forma unitária, caracterizada pela centralização política e a concentração de poder, e a forma federada, por sua vez caracterizada pela descentralização no exercício do poder político. Além disso, vimos que existem diferentes tipos de federações, que são classificadas quanto à forma, quanto à concentração de poder, quanto à repartição de competências, quanto ao equacionamento das desigualdades e quanto às esferas integrantes da federação e que, diante dessa classificação, o Brasil pode ser entendido como um federação formada a partir da segregação, com concentração centrípeta de poder, cuja repartição de competências é feita de modo cooperativo, simétrica em termos de equacionamento, e classificada como uma federação de terceiro grau. 6 Referências Bibliográficas BAHIA, Flavia. Direito Constitucional. Recife: Armador, 2017. MASSON, Nathalia. Manual de direito constitucional. -8. ed. Salvador: Ed. JusPodvm, 2020. TAVARES, André Ramos. Curso de Direito Constitucional. – 18 ed. São Paulo: Saraiva Educação, 2020. Introdução ao Direito Constitucional | Referências Bibliográficas www.cenes.com.br | 14 Introdução ao Direito Constitucional | Introdução www.cenes.com.br | 1 DISCIPLINA INTRODUÇÃO AO DIREITO CONSTITUCIONAL CONTEÚDO Estado e Pensamento Político Introdução ao Direito Constitucional | Introdução www.cenes.com.br | 2 A Faculdade Focus se responsabiliza pelos vícios do produto no que concerne à sua edição (apresentação a fim de possibilitar ao consumidor bem manuseá-lo e lê-lo). A instituição, nem os autores, assumem qualquer responsabilidade por eventuais danos ou perdas a pessoa ou bens, decorrentes do uso da presente obra. É proibida a reprodução total ou parcial de qualquer forma ou por qualquer meio, eletrônico ou mecânico, inclusive através de processos xerográficos, fotocópia e gravação, sem permissão por escrito do autor e do editor. O titular cuja obra seja fraudulentamente reproduzida, divulgada ou de qualquer forma utilizada poderá requerer a apreensão dos exemplares reproduzidos ou a suspensão da divulgação, sem prejuízo da indenização cabível (art. 102 da Lei n. 9.610, de 19.02.1998). Atualizações e erratas: este material é disponibilizado na forma como se apresenta na data de publicação. Atualizações são definidas a critério exclusivo da Faculdade Focus, sob análise da direção pedagógica e de revisão técnica, sendo as erratas disponibilizadas na área do aluno do site www.faculdadefocus.com.br. É missão desta instituição oferecer ao acadêmico uma obra sem a incidência de erros técnicos ou disparidades de conteúdo. Caso ocorra alguma incorreção, solicitamos que, atenciosamente, colabore enviando críticas e sugestões, por meio do setor de atendimento através do e-mail secretaria@faculdadefocus.com.br. © 2021, by Faculdade Focus Rua Maranhão, 924 - Ed. 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Acesse a barra de marcadoresdo seu leitor de PDF e navegue de maneira RÁPIDA e DESCOMPLICADA pelo conteúdo. http://www.faculdadefocus.com.br/ mailto:secretaria@faculdadefocus.com.br. http://www.faculdadefocus.com.br/ Introdução ao Direito Constitucional | Introdução www.cenes.com.br | 3 Sumário Sumário ------------------------------------------------------------------------------------------------------------- 3 1 Introdução --------------------------------------------------------------------------------------------------- 4 2 Formação do pensamento político ------------------------------------------------------------------- 4 2.1 Pensamento político na Grécia Antiga ----------------------------------------------------------------------------- 5 2.1.1 Platão ----------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------- 5 2.1.2 Aristóteles ----------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------- 7 2.2 Percepção de Estado Durante a Idade Média -------------------------------------------------------------------- 9 2.2.1 Santo Agostinho ------------------------------------------------------------------------------------------------------------------- 10 2.2.2 São Tomás de Aquino ------------------------------------------------------------------------------------------------------------ 12 3 Pilares do Estado Moderno ---------------------------------------------------------------------------- 13 3.1 Nicolau Maquiavel ----------------------------------------------------------------------------------------------------- 13 3.1.1 O Príncipe ---------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------- 14 3.1.2 Discurso sobre a primeira década de Tito Lívio --------------------------------------------------------------------------- 15 4 Os contratualistas e o Estado Moderno ------------------------------------------------------------ 16 4.1 Thomas Hobbes -------------------------------------------------------------------------------------------------------- 17 4.2 Jean-Jacques Rousseau ----------------------------------------------------------------------------------------------- 19 4.3 John Locke --------------------------------------------------------------------------------------------------------------- 21 5 Formação do pensamento político contemporâneo -------------------------------------------- 23 5.1 Immanuel Kant --------------------------------------------------------------------------------------------------------- 23 5.2 Karl Marx ----------------------------------------------------------------------------------------------------------------- 25 5.3 Friedrich Nietzsche ---------------------------------------------------------------------------------------------------- 27 5.4 Max Weber -------------------------------------------------------------------------------------------------------------- 28 6 Concluindo -------------------------------------------------------------------------------------------------- 30 7 Referências Bibliográficas ------------------------------------------------------------------------------ 30 Introdução ao Direito Constitucional | Introdução www.cenes.com.br | 4 1 Introdução O Estado é o principal elemento nos estudos a respeito da Teoria Política, desta forma, o estudo acerca do seu surgimento e, principalmente, de suas origens se faz muito importante para compreendermos a sociedade em que vivemos atualmente. Diante disso, podemos destacar grandes contribuições à época, de filósofos clássicos como Platão, Aristóteles, Hobbes, Locke e Rousseau, bem como de filósofos contemporâneos, como Kant, Marx, Nietzsche e Weber. Nesse momento, muitos autores do pensamento clássico se questionavam sobre os pilares que serviram como bases para a construção do Estado, da mesma forma que buscavam definir os limites de sua intervenção na vida privada das pessoas. Um exemplo disso foi Rousseau que, na sua obra “O Contrato Social”, definiu o porquê de o homem nascer livre e ter sua vida privada limitada pelo poder estatal. Esses são aspectos fundamentais que devem ser trabalhados para que o estudante possa compreender o movimento realizado pelos Estados atuais. 2 Formação do pensamento político Inicialmente, para que seja possível analisarmos de forma coerente a formação do pensamento político e as contribuições feitas ao longo dos séculos, precisamos partir do início. Com a evolução da sociedade humana surgiram diversos pensamentos, dogmas, teorias, correntes filosóficas e sociológicas que contribuíram significativamente para o desenvolvimento na época e, até hoje, são considerados essenciais para o estudo do pensamento político. Neste sentido, merece um papel de destaque o pensamento político grego, representado pelos pensadores Sócrates, Platão e Aristóteles, pois, assim como em outras áreas, esses três filósofos foram imprescindíveis para a formação dos pilares da política na sociedade. Conforme destacam Ramos, Melo e Frateschi (2012, p. 17), “tanto a ética quanto a política, tal como as concebemos hoje, nasceram nas cidades gregas, entre os séculos VI e IV antes da era corrente. Não é por acaso que ainda as designamos com palavras Introdução ao Direito Constitucional | Formação do pensamento político www.cenes.com.br | 5 gregas: ética vem do grego ethos (algo como “costumes”) e política de polis (algo como “cidade”)”. Na sequência, falaremos melhor sobre cada um desses autores, examinando a perspectiva de cada um. 2.1 Pensamento político na Grécia Antiga Inicialmente, precisamos lembrar que a noção de política que temos hoje na sociedade surgiu como uma forma de crítica radical à democracia e ao movimento dos sofistas que a defendiam. Desta forma, podemos dizer que a ideia de política já era muito suscitada na antiguidade. No entanto, durante a época, os pensamentos eram simplesmente falados e as poucas coisas escritas acabavam se perdendo com facilidade. 2.1.1 Platão O primeiro grande filósofo que apresentou inúmeras contribuições nesta área foi Sócrates, porém seus ensinamentos são passados através de terceiros, mais precisamente através de seu discípulo Platão, uma vez que o filósofo não deixou nenhuma obra escrita. SÓCRATES foi um grande filósofo, os registros datam seu nascimento em aproximadamente 470 a.C, na cidade de Atenas, na Grécia Antiga. Devido a sua inteligência e sagacidade, durante os anos de 406 e 405 a.C, integrou o conselho legislativo de Atenas, mas, no ano seguinte, arriscou a própria vida quando se negou a colaborar com as manobras políticas idealizadas pela dinastia dos Trinta Tiranos, que governavam a na época cidade. Depois desse período, o filósofo ocupava seu tempo meditando e auxiliando seus discípulos na busca pela verdade, uma vez que as discussões da época giravam em torno do que é a verdade, o que é o bem e o que é a justiça. Introdução ao Direito Constitucional | Formação do pensamento político www.cenes.com.br | 6 Figura 01 – Sócrates Fonte: Revista Esfinge. Disponível em: https://www.revistaesfinge.com.br/2018/09/01/socrates/. Acesso em: 18 mar. 21. No ano de 399 a.C, o filósofo foi acusado de cometer o crime de “impiedade”, também chamado de heresia, por negligenciar a adoração dos deuses e, consequentemente, corromper os jovens. Sócrates foi condenado e sentenciado à morte, devendo ingerir veneno. De acordo com Dalmo de Abreu Dallari (2011, p. 72), “no estado Grego o indivíduo tem uma posição peculiar. Há uma elite, que compõe a classe política, com intensa participação nas decisões do Estado, a respeito dos assuntos de caráter público. Entretanto, nas relações de caráter privado a autonomia da vontade individual é bastante restrita”.Assim, seguindo os passos de seu mentor, Platão não acreditava que a contagem de votos na assembleia, na polis (cidade), poderia ser capaz de determinar a verdade sobre os fatos que lhes eram suscitados. A principal questão para o filosofo era determinar o que seria uma polis totalmente justa. Durante este período, enquanto tentava solucionar tal questão, Platão escreveu a obra “A República”, que trata basicamente sobre a administração da cidade, em forma de diálogos. Geralmente, os diálogos apresentados por Platão não apresentavam respostas, pois o filósofo acreditava que o ser humano se tornava mais sábio pelo simples fato de Introdução ao Direito Constitucional | Formação do pensamento político www.cenes.com.br | 7 reconhecer sua ignorância. No entanto, como escreveu a obra com o intuito de apresentar seu ponto de vista sobre o que achava ser uma cidade justa, destacam Ramos, Flamarion e Frateschi (2012, p. 24) que “Platão propõe uma mudança de perspectiva: que se deixe de considerar este ou aquele homem justo, esta ou aquela lei ou constituição justas (sempre pessoas e coisas particulares) e se passe a pensar no que seria a Cidade justa em geral. Será a partir da perspectiva da Cidade justa, ideal, que se poderá definir a justiça e distinguir o que é justo do que apenas parece justo”. Por óbvio, o modelo de cidade ideal apresentado pelo filósofo nunca foi colocado em prática, mas também não se trata de um modelo totalmente fantasioso. Atualmente, as cidades tentam seguir o modelo de justiça, contudo a sociedade, perdida nos conceitos de bem e justiça, muda constantemente de opinião. Assim, considerando os ensinamentos passados por Platão, os homens só serão bons e justos quando realmente conhecerem o bem e a justiça. No mais, dentre os grandes feitos de Platão, é válido destacar que, aos 40 anos de idade, o filósofo fundou uma instituição destinada à investigação filosófica, intitulada como “Academia”. Durante os anos em que lecionou na Academia, Platão orientou diversos discípulos, mas um deles merece destaque especial, Aristóteles iniciou seus estudos na Academia com 17 anos de idade e, embora discordasse de seu mentor em alguns aspectos, foi muito influenciado por ele. 2.1.2 Aristóteles Aristóteles nasceu em 384 a.C, na cidade de Estagira, na Macedônia. Com 17 anos de idade partiu para Atenas em busca de conhecimento, chegando lá iniciou seus estudos na Academia de Platão e, devido a sua notória inteligência, logo caiu nas graças de seu mentor. No entanto, talvez pelo fato de não compartilhar a visão platônica sobre a República, divergia do filósofo Platão em alguns aspectos, uma vez que Aristóteles não buscava um rei filosófico que, por meio da ciência política, fosse capaz de solucionar todos os problemas do Estado. Para Aristóteles, não bastava apenas o conhecimento teórico sobre determinado Introdução ao Direito Constitucional | Formação do pensamento político www.cenes.com.br | 8 assunto, o filósofo defendia que, para realmente aplicar os princípios gerais às circunstâncias, era necessário algum tipo de conhecimento prático, pois algumas situações, quando implementadas no mundo prático, apresentam algumas variáveis e contingentes não previstas, esse pensamento era chamado, sabiamente, pelo autor de “prudência”. Assim, a partir deste pensamento, Aristóteles desenvolveu um corpo de pesquisa muito mais empírico do que seu mentor sobre a política, uma vez que além de reunir material sobre o assunto, teceu comentários a respeito, expondo seu pensamento, por exemplo, sobre as constituições das cidades bárbaras e gregas. Conforme alegam Ramos, Melo e Frateschi (2012, p. 28-29), “conhecimento e qualidade moral não estão necessariamente unidos, já afirmava Aristóteles contra seu mestre Platão e o mestre deste, Sócrates”. Os autores complementam dizendo que, seguindo a filosofia defendida por Aristóteles, “o caráter de uma pessoa não é bom porque ela simplesmente conhece o que é a justiça ou a coragem, mas porque ela quer ou deseja agir em conformidade com o que seja justiça ou coragem”. De acordo com a filosofia aristotélica, o caminho natural do homem é a política, uma vez que ele já nasceu inserido nesse contexto, sendo que nenhuma pessoa humana seria capaz de viver sozinho, isolado da polis ou da civilização. Assim, considerando a natureza humana, o indivíduo deve ser entendido como uma pessoa patriota, social ou integrado por natureza, uma vez que a polis é o propósito que une todos os indivíduos à sociedade. Por fim, é importante mencionar que, para o filosofo, não há ruptura entre ética e política, pois ambas estão associadas às “ciências das coisas humanas”. Lembrando que a visão doutrinária da política aristotélica é caracterizada por tentar equilibrar tanto os abusos democráticos (o despotismo) quanto os abusos da Introdução ao Direito Constitucional | Formação do pensamento político www.cenes.com.br | 9 oligarquia, ambos muito presentes na época. 2.2 Percepção de Estado Durante a Idade Média O momento da história conhecido como Idade Média é o período de tempo compreendido entre os anos de 476 e 1453. De acordo com Dalmo de Abreu Dallari (2011, p. 73), nesta época, “no plano do Estado não há dúvida de que se trata de um dos períodos mais difíceis, tremendamente instável e heterogêneo, não sendo tarefa das mais simples a busca das características de um Estado Medieval. Portanto, não nos alongaremos muito neste ponto. Conforme destacam Lenio Streck e José Luiz Bonzan (2014), três elementos foram essenciais durante o estado medievo e contribuíram significativamente para a construção de sua forma estatal, culminando, posteriormente, no Estado Moderno. O CRISTIANISMO Neste período, o cristianismo vinha ganhando cada vez mais visibilidade e aceitação na sociedade, logo não demorou muito para que surgisse a ideia de universalidade, ou seja, de que todos os povos se tornassem cristãos. Nem precisamos dizer que a tentativa foi falha, pois, embora tenha ocorrido uma grande disseminação do ideal cristão, dois fatores o influenciaram, quais sejam: 1º) os centros de poder foram multiplicados e 2º) o Imperador não aceitou com facilidade a ideia de se submeter às autoridades da igreja e se recusava ficar sujeito a elas. AS INVASÕES BÁRBARAS O termo “bárbaro”, surgiu na Grécia Antiga e inicialmente era utilizado para diferenciar os povos que possuíam uma cultura ou idioma diferentes daqueles cultuados pelos gregos. Com o passar do tempo, o termo era utilizado para se referir a povos que mantinham um comportamento primitivo e violento, atribuindo suas conquistas à força física e não ao intelecto. Os bárbaros não podiam ser descritos como um único grupo de pessoas, geralmente referia-se aos povos vindos do norte, do oeste e do centro da Europa. Assim, de acordo com Streck e Bonzan (2014), as invasões realizadas pelos povos bárbaros geraram grandes transformações na época, uma vez que “os povos Introdução ao Direito Constitucional | Formação do pensamento político www.cenes.com.br | 10 invasores estimularam as regiões invadidas a se afirmarem como unidades políticas independentes. Percebe-se, pois, que, no Medievo, a ordem era bastante precária, pelo abandono de padrões tradicionais, constante situação de guerra, indefinição de fronteiras políticas, etc.”. O FEUDALISMO Devido a crescente busca por riquezas e territórios, as sociedades que se formavam na época foram obrigadas a desenvolver um sistema que garantisse a proteção de seu povo e de suas posses, foi então que surgiram os chamados feudos. Neste sentido, Streck e Bonzan (2014) afirmam que o sistema feudal cresce baseado em três institutos: a vassalagem, de modo que os proprietários de terras menos poderosos viviam a serviço do senhor feudal em troca de proteção; o benefício,que era uma espécie de contrato firmado entre o senhor feudal e o chefe de família que não tivesse patrimônio, o qual estabelecia que o servo deveria receber uma porção de terras para cultivo e seria tratado como parte inseparável da gleba; por fim, a imunidade, que garantia a isenção de tributos às terras sujeitas ao benefício. Foram esses fatores que, de forma conjunta, definiram os aspectos mais importantes na formação do pensamento político na era medieval. Assim, podemos citar como principais características deste período a constante instabilidade política, econômica e social, o conflito entre os poderes temporal e espiritual, o desmembramento do poder centralizado em vários pequenos polos, o sistema jurídico baseado nos costumes e nas regalias nobiliárquicas e, por fim, nas relações de dependência devido à hierarquia de privilégios. Além disso, devido à influência do cristianismo na época, quando a própria igreja católica, mesmo que na intenção de preservar a ascensão da cristandade, incentivava a formação do império como uma unidade política, os pensadores que ganharam destaque no âmbito político, na era medieval, foram Santo Agostinho e Santo Tomás de Aquino. 2.2.1 Santo Agostinho Também conhecido como Agostinho de Hipona, Santo Agostinho nasceu no ano de 354 em Tagaste, no norte da África, foi um grande filósofo, escritor, bispo e teólogo Introdução ao Direito Constitucional | Formação do pensamento político www.cenes.com.br | 11 cristão na idade média, falava principalmente sobre as relações entre fé e razão e entre a igreja e o Estado, ambos muito influentes na época. De acordo com Leo Strauss e Joseph Cropsey (2013, p. 161), “Santo Agostinho é o primeiro autor a lidar, de forma mais ou menos abrangente, com o tema da sociedade civil à luz da nova conjuntura gerada pelo surgimento da religião revelada e seu embate com a filosofia no mundo greco-romano”. Embora não se considere um filósofo por completo, Santo Agostinho defende que a filosofia complementa as questões religiosas e fornece conhecimento, assim, apesar de escrever primeiramente como um teólogo, publicou diversas obras com um viés político e filosófico. O ponto principal dos ideais defendidos por Santo Agostinho são as considerações feitas sobre a virtude, pois os ensinamentos do teólogo passam tanto pela filosofia quanto pela tradição bíblica trazida pelo catolicismo. Conforme ressaltam Leo Strauss e Joseph Cropsey (2013, p. 161), Santo Agostinho acreditava que A virtude que caracteriza o cidadão como cidadão e comanda todos os cidadãos para a meta ou bem comum da cidade é a justiça. A justiça é a pedra angular da sociedade civil. É dela que dependem a unidade e a nobreza de qualquer sociedade humana. Ao regular as relações entre os homens, preserva a paz, o bem comum intrínseco à sociedade e a precondição para todos os outros benefícios que a sociedade proporciona. Sem paz, a “tranquilidade na ordem”, nenhuma sociedade pode prosperar nem mesmo sobreviver. Citando Cícero com aprovação, Agostinho define a sociedade civil ou nação como “um conjunto (de homens), associado por um reconhecimento comum do direito e por uma comunidade de interesses”." Explica “direito” como “justiça” ao invés de “lei”, e insiste em que nenhuma nação pode ser administrada sem justiça, pois onde não há justiça não há direito e vice-versa (STRAUSS; CROPSEY, p. 165). Assim, para definir o que é justiça, Santo Agostinho se vale do entendimento de um dos maiores teóricos do direito romano, Cícero. Neste sentido, afirmam Ramos, Melo e Frateschi (2012, p. 53) que, “segundo essas definições, o direito (ius) não pode ser separado da justiça (iustitia), uma vez que a “concordância no direito”, núcleo da definição de povo, pressupõe que “a república não possa ser gerida sem justiça”: onde não há verdadeira justiça, não pode haver direito”. No mais, com relação ao conceito de justiça, considerando os argumentos de Cícero, Introdução ao Direito Constitucional | Formação do pensamento político www.cenes.com.br | 12 Santo Agostinho afirma que o direito e a justiça caminham juntos e não podem ser separados. Assim, uma república não pode ser governada sem justiça, uma vez que, onde não houver justiça, não haverá direito, logo também não haverá povo e tampouco uma república. Desta forma, conclui Santo Agostinho que a justiça nada mais é do que a virtude que oferece a cada um o que é seu. 2.2.2 São Tomás de Aquino Assim como Santo Agostinho, São Tomás de Aquino foi um grande teólogo e filósofo que contribuiu significativamente para o desenvolvimento do pensamento político na Idade Média. Nascido em 1225, em Sicília, na Itália, São Tomás de Aquino foi um frei católico da Ordem Dominicana na Idade Média e autor da obra “Suma Teológica”, que aborda questões entre a ciência, razão, filosofia, fé e teologia. São Tomás de Aquino foi um grande apreciador da filosofia pregada por Aristóteles e considera o filósofo como a principal autoridade filosófica do Ocidente cristão. Durante sua vida, Aquino se esforçou para reinterpretar as obras de Aristóteles através de uma ótica cristã. Neste sentido, ressaltam Leo Strauss e Joseph Cropsey (2013, p. 226) que, “nas obras de Aquino, é a teologia que precisa de justificação diante do tribunal da razão ou da filosofia. O primeiro artigo de sua obra mais conhecida, a Summa Theologiae, não pergunta se o estudo da filosofia é admissível e desejável, mas se, além das disciplinas filosóficas, é necessária outra ciência, ou seja, a doutrina sagrada”. Além disso, de acordo com Ramos, Melo e Frateschi (2012, p. 61), São Tomás de Aquino acredita que “a política é o resultado de um ajuste promovido entre a natureza, o intelecto e a vontade humana: seu objeto é o estudo racional da cidade, o tipo ideal de todas as comunidades humanas”. Assim, “Aquino propõe uma versão da política cuja face religiosa parece obrigada a ter peso já nesta vida: o bom governo deve auxiliar o homem a alcançar não apenas aquele que é seu fim natural, o bem comum, mas deve auxiliá-lo a alcançar aquele que é também seu fim último: o sumo bem ou a fruição de Deus”. Introdução ao Direito Constitucional | Pilares do Estado Moderno www.cenes.com.br | 13 3 Pilares do Estado Moderno Conforme vimos a pouco, a Idade Média perdurou entre os anos de 476 e 1453, momento em que o cristianismo era disseminado por todo o mundo, fato que contribuiu com a formação dos principais filósofos da época – Santo Agostinho e São Tomás de Aquino –, mas, posterior a isso, adentramos na era chamada Idade Moderna. O sistema feudal implementado na época contribuiu para a formação de um novo modelo estatal, o Estado Moderno. Esse período foi decisivo para a formação do pensamento político filosófico, com as contribuições de pensadores como Nicolau Maquiavel, Thomas Hobbes e Jean-Jacques Rousseau. Na sequência, trabalharemos melhor a ideia apresentada por cada um deles, procurando compreender as influências do pensamento político clássico. 3.1 Nicolau Maquiavel Nicolau Maquiavel nasceu em 1469, na cidade de Florença, na Itália. Foi um grande filósofo político, historiador, escritor e diplomata italiano, foi autor de grandes obras, dentre elas, “O Príncipe” e o “Discursos sobre a primeira década de Tito Lívio”. Desde muito novo, incentivado pela família, Nicolau se interessava pelas questões vivenciadas na época e, com 29 anos, durante o governo de Piero Soderim, assume o cargo de Secretário da Segunda Chancelaria na República Florentina. De acordo com Leo Strauss e Joseph Cropsey (2013, p. 268), Maquiavel é o único pensador político cujo nome está em uso corrente para designar um tipo de política, que existe e continuará existindo, independentemente de sua influência, uma política guiada com exclusividade por questões de conveniência, queusa todos os meios, legais ou ilegais, ferro ou veneno, para atingir sua meta - sendo esta o engrandecimento de um país ou pátria -, mas também usando a pátria a serviço do autoengrandecimento do político, ou estadista, ou partido de cada um (STRAUSS e CROPSEY, 2013, p. 268). O trabalho apresentado por Maquiavel representa um aspecto muito importante na Introdução ao Direito Constitucional | Pilares do Estado Moderno www.cenes.com.br | 14 construção do pensamento político, uma vez que ele marca o fim do agostinismo político vivenciado até aquele momento. Além disso, é importante ressaltar que, pelo fato de ter atuado desde muito novo em cargos do governo, era um excelente conhecedor das complexidades do poder, pois a função de diplomata permitia que visse de perto diversas formas de governo. No entanto, depois de servir o governo por 14 anos, quando os Médici assumiram o governo de Florença e derrubaram a república, Maquiavel foi afastado de suas funções públicas e redesignado ao novo poder, mas, logo em seguida, foi preso e acusado de conspirar contra o novo regime imposto. Não muito tempo depois, o filósofo foi solto e decidiu se exilar em uma propriedade rural localizada em San Casciano, próximo de Florença. É durante o período de afastamento que Maquiavel se dedica a suas obras, como O Príncipe, Discursos sobre a Primeira Década de Tito Lívio, O Diário em Torno de Nossa Língua e A Arte da Guerra. Assim, podemos dizer que o filósofo submetia a virtude à política, de modo que a primeira só era útil quando relacionada aos aspectos políticos. Resgatando os pensamentos de Aristóteles e adaptando para o contexto vivenciado na época, Maquiavel defende a existência de uma ordem de direito, recusando a possibilidade de uma meta natural do homem. Na sequência, vamos falar um pouco mais sobre duas das principais obras de Maquiavel, abordando alguns pontos importantes que influenciaram na construção do pensamento político na época. 3.1.1 O Príncipe A obra intitulada como “O Príncipe” é fruto de uma reflexão feita por Maquiavel em uma carta enviada a Francesco Vettori. Na ocasião, o filósofo analisava as diferentes formas de principado, como eles eram conquistados, quais fatores faziam com que continuassem no poder e, acima de tudo, quais elementos eram responsáveis por sua queda. Introdução ao Direito Constitucional | Pilares do Estado Moderno www.cenes.com.br | 15 Assim como destacam Ramos, Melo e Frateschi (2012, p. 90), um dos elementos mais importantes do livro é a forma como Maquiavel acreditava que o príncipe deveria se portar. De acordo com o filósofo, mesmo que não seja mau, o príncipe deve aprender a usar da força quando for preciso, fazendo-se temer, pois esse é um sentimento, diferente do amor, que não se abandona jamais. Segundo Maquiavel, aquele que governa deve recorrer não apenas às leis, próprias do ser humano, mas também à força, que é maneira de combater dos animais, empregando as qualidades da raposa, para conhecer as armadilhas, e do leão, para aterrorizar os oponentes. (RAMOS; MELO; FRATESCHI, 2012, p. 90) Desta forma, quando o príncipe precisar escolher entre ser amado ou temido, uma vez que é difícil ser os dois ao mesmo tempo, deve optar por ser temido, pois essa posição pode ser alcançada com mérito próprio, sem ajuda de terceiros. Lembrando que o príncipe deve fazer o máximo para não ser odiado pelo reino, mesmo que isso implique ficar longe das mulheres e, principalmente, do patrimônio de seus súditos. 3.1.2 Discurso sobre a primeira década de Tito Lívio Neste livro, diferentemente de “O Príncipe”, que abordava questões relativas ao principado como forma de governo, Maquiavel traz à tona alguns aspectos relacionados ao sistema republicano. Conforme destacam Leo Strauss e Joseph Cropsey (2013, p. 274), “nos Discursos, Maquiavel trata, em certa medida, do conjunto da história romana, tal como abarcada pela obra de Tito Lívio: o livro de Tito Lívio é composto de 142 livros, e os Discursos consistem em 142 capítulos. A obra de Tito Lívio conduz até a época do imperador Augusto, isto é, os primórdios do cristianismo”. Assim, de acordo com Ramos, Melo e Frateschi (2012, p. 92), “a preocupação de Maquiavel parece ser, na esteira dos humanistas, com a crise que envolvia os fundamentos constitucionais das repúblicas italianas de seu tempo, em particular Florença, e suas possibilidades de sobreviver como comunidades livres num mundo reconfigurado pelas grandes potências territoriais”. Introdução ao Direito Constitucional | Os contratualistas e o Estado Moderno www.cenes.com.br | 16 Nos primeiros capítulos da obra, Maquiavel se ocupa em demonstrar a origem e o desenvolvimento político na antiga Roma, ressaltando a mudança do regime monárquico para o republicano, bem como a criação de instituições que tinham o intuito de preservar a liberdade conquistada com o sistema. Em um segundo momento, o filósofo evidencia como a crescente expansão de Roma, aliada ao seu poderio militar, foi determinante para manter a liberdade conquistada pelo novo sistema. Por fim, na terceira parte do livro, Maquiavel examina quais comportamentos os cidadãos de Roma mantêm, em prol de preservar a liberdade da república. Em consonância, Ramos, Melo e Frateschi (2012, p. 94) complementam dizendo que, seguindo os pontos centrais do sistema desenvolvido na antiga Roma e adaptando- os a realidade em que vive, Maquiavel determina a diferença entre as repúblicas capazes de expansão e as projetadas apenas à conservação. Ele sustenta que somente aquelas que optaram pela expansão, buscando a potência, como Roma, garantiram ao longo do tempo a manutenção da liberdade. A República romana foi capaz de conservar sua liberdade, porque se manteve aberta aos acontecimentos, enfrentando os contínuos desafios da contingência das coisas humanas. Como a liberdade não é garantida por uma forma constitucional estável, como o governo misto, mas pela criação contínua das condições de potência, Roma era o melhor modelo a ser seguido pelas repúblicas contemporâneas (RAMOS; MELO; FRATESCHI, 2012, p. 94). Assim, Maquiavel considera que as repúblicas são superiores e mais bem preparadas do que os principados, uma vez que elas têm mais facilidade em se adaptar às mudanças trazidas com o tempo, em função da variedade e da diversidade dos cidadãos. Além disso, ela se mostra muito mais resistente com relação aos outros modelos de governo, pois a habilidade de muitos homens se mostra mais valiosa do que a de apenas um. 4 Os contratualistas e o Estado Moderno Depois de falarmos sobre o republicano Nicolau Maquiavel, direcionamos nossos estudos aos contratualistas Thomas Hobbes, Jean-Jacques Rousseau e ao liberalista John Locke. A era do contratualismo vivenciada por esses pensadores, como o próprio Introdução ao Direito Constitucional | Os contratualistas e o Estado Moderno www.cenes.com.br | 17 nome já diz, pressupõe que tanto a sociedade quanto o poder político se originaram a partir de um contrato entre as pessoas que estão no poder e aqueles que estariam sujeitos a ele. Nas palavras de Ramos, Melo e Frateschi (2012, p. 109), A tese de que a origem da sociedade política está num contrato implica que a sociedade política é um artifício, isto é, uma forma de associação a que os homens não são conduzidos pelo movimento natural de suas paixões e na qual não estão desde sempre inseridos de maneira espontânea ou irrefletida (como a família, por exemplo), mas uma comunidade que os homens resolvem instituir voluntariamente, na medida em que têm razões e motivos para isso (RAMOS; MELO; FRATESCHI, 2012, p. 109). Em seguida, vamos falar um pouco mais a respeito desses pensadores, pontuando e destacando as principais características do pensamento de cada um. 4.1 Thomas HobbesO contratualista Thomas Hobbes nasceu em 1588, na cidade de Westport na Inglaterra, foi um grande teórico político, filósofo e matemático inglês. Acredita-se que Hobbes foi o precursor do contratualismo político, pois formulou a tese sobre o contrato social e a desenvolveu a partir da relação com status civil e autoridade soberana. De acordo com Leo Strauss e Joseph Cropsey (2013, p. 355), “pode-se conceber que as intenções de Hobbes tenham sido duplas: (1) assentar, pela primeira vez, a filosofia moral e política sobre uma base científica; e (2) contribuir para a concretização da paz cívica e da amizade e para a criação de uma disposição, na humanidade, para o cumprimento de seus deveres cívicos”. Assim, podemos dizer que Hobbes acreditava que um governo civil faria com que as pessoas voltassem ao estado de natureza, tornando presente e manifesta a tensão de conflitos, sendo a função do poder soberano proporcionar a paz para seus súditos. Introdução ao Direito Constitucional | Os contratualistas e o Estado Moderno www.cenes.com.br | 18 Ao passo que, segundo o pensamento defendido por Hobbes, no estado de natureza a única lei que impera é a Lei Natural, uma vez que as pessoas têm direito a tudo aquilo que pode ser conquistado através da força bruta. Durante esse estado, as pessoas viveriam constantemente em conflitos e, nem as propriedades nem as pessoas se manteriam seguras. O princípio que moveria a sociedade é o da autopreservação, devido ao medo. Conforme destacam Leo Strauss e Joseph Cropsey (2013, p. 361), “não há recurso à justiça no estado de natureza; nada ali pode ser injusto, pois a justiça e a injustiça existem tão somente em termos de uma lei anterior e não há lei fora da sociedade civil. Em suma, o homem não é social por natureza; ao contrário, a natureza dissocia o homem”. Na concepção de Hobbes, “o homem é o lobo do homem”. Todavia, embora inicialmente as sociedades tenham se formado desta forma, a situação acaba se tornando insustentável a longo prazo, uma vez que nenhuma sociedade é capaz de sobreviver à sombra de tanto medo e insegurança. Assim, os indivíduos abandonam a Lei Natural junto com o estado de natureza a fim de obter garantias mínimas de paz, firmando uma espécie de contrato social. No contrato social ocorre uma troca entre o soberano e seu povo, na qual, basicamente, os indivíduos cedem poderes à figura de um soberano, que, por sua vez, é responsável por garantir o cumprimento da lei e manter a ordem dentro de um novo estado civil. Para Hobbes, o poder do monarca deveria ser absoluto, a fim de garantir a estabilidade ou a impossibilidade de conflitos entre membros da sociedade civil, uma vez que o poder soberano governa de maneira absoluta, denominado por ele como o Leviatã. Introdução ao Direito Constitucional | Os contratualistas e o Estado Moderno www.cenes.com.br | 19 Neste sentido, Ramos, Melo e Frateschi (2012, p. 114-115) complementam dizendo que o contratualista pretende fazer da política uma ciência racional e do corpo político um construto da razão, o que quer dizer que tanto o conhecimento quanto a ação política dependem da percepção de certas relações necessárias e universais entre as ideias, pois é nisso o que consiste a razão, segundo o modelo matemático a partir do qual foi pensada nos quadros do racionalismo cartesiano, com o qual a filosofia de Hobbes manteve estreitas relações (RAMOS; MELO; FRATESCHI, 2012, p. 114-115). Desta forma, podemos dizer que o ponto central do sistema estabelecido pelo contrato social era fundamentado na transição do estado da natureza para o estado civil. Assim, as pessoas deveriam obedecer e seguir a figura do soberano, pois ele seria o responsável por preservar os bens dos indivíduos e manter a paz na sociedade. Por fim, é importante mencionar que não adianta de nada o soberano possuir o dever de zelar pelas pessoas adeptas do contrato, se não dispõe de meios para tanto. Pensando nisso, Hobbes defende que aliado ao dever de proteger, o soberano adquire alguns direitos, como o direito de punir, de exercer poder de polícia, o direito de não ser punido, o direito de decretar guerra ou paz, de cobrar impostos. Além disso, é passado ao soberano os poderes legislativo, da espada e o judiciário. Assim, o poder do soberano, nada mais é do que absoluto na sociedade que governa. 4.2 Jean-Jacques Rousseau Jean-Jacques Rousseau nasceu em 1712, na cidade de Genebra, na Suíça. Foi um grande filósofo social, teórico político, escritor e fez grandes contribuições para a construção do pensamento político durante o Estado Moderno. Rousseau é considerado o um dos principais filósofos do período iluminista, além de ser um dos precursores do romantismo. Apresenta uma alternativa ao absolutismo político defendido por Hobbes, uma vez que a ideia central do seu pensamento é totalmente o oposto daquilo que o filósofo acredita. Introdução ao Direito Constitucional | Os contratualistas e o Estado Moderno www.cenes.com.br | 20 Na concepção de Rousseau, quando o homem consegue se livrar de todas as amarras da sociedade civil para viver em um estado de natureza, podemos perceber que o indivíduo é bom em sua essência. Ao contrário do que Hobbes dizia, Rousseau defende que o homem não é lobo do homem, muito pelo contrário, o homem é bom por natureza, mas a sociedade o corrompe, uma vez que vive preso diante de tanta hipocrisia e aparências. De acordo com Leo Strauss e Joseph Cropsey (2013, p. 500), o filósofo defendia que “a sociedade civil acorrenta o homem e fez dele um escravo da lei ou de outros homens ao passo que ele, como homem, nasceu para a liberdade, para o direito de se comportar como lhe aprouver. Além disso, a sociedade civil, tal como é hoje constituída, não tem direito a invocar a adesão moral de seus súditos: é injusta”. Neste sentido, afirmam Ramos, Melo e Frateschi (2012, p. 111) que Rousseau lança mão da ideia de contrato e conceitua a política a partir dela, ao mesmo tempo que faz uso de todo o seu talento literário para mostrar que as instituições políticas do seu tempo e as relações de poder historicamente constituídas não se ajustam a esse conceito. Ao pensar a política a partir do contrato, Rousseau a pensa do ponto de vista de como ela deveria ser, não de como ela é. Seu ponto de vista é normativo, não descritivo. (RAMOS; MELO; FRATESCHI, 2012, p. 111) A visão da filosofia sustentada por Rousseau remonta ao fundamento da soberania política no contexto do contrato social que estava em evidência na época. O filósofo defendia que enquanto o homem vivia sob a égide da lei natural não precisava se associar politicamente, porém com a mudança para a sociedade civil, associada à escassez de recursos, acabou por se sentir obrigado a firmar um contrato social. Assim, conforme destacam Leo Strauss e Joseph Cropsey (2013, p. 509), Rousseau acreditava que A liberdade do homem, que parece ser independente e oposta ao governo da moral, é a única fonte de moralidade. Com esta descoberta, Rousseau completa a ruptura com os Introdução ao Direito Constitucional | Os contratualistas e o Estado Moderno www.cenes.com.br | 21 ensinamentos políticos da Antiguidade clássica iniciada por Maquiavel e Hobbes. Seus predecessores imediatos mantiveram a noção de lei natural que limitava a liberdade humana que eles próprios ensinavam. (STRAUSS e CORPSEY, 2013, p. 509) Desta forma, segundo a doutrina política rousseauniana, o contrato social nada mais é do que uma espécie de acordo, firmado com o objetivo de constituir uma sociedade civil, bem como de estabelecer uma figura de autoridade, no caso, o soberano. De acordo com Rousseau, toda a dificuldade política representa a relação existente entre a vontade particular e a vontade geral. Isto é, segundo o contrato sociale a Filosofia Política a ele subjacente, não haveria um esquema de leis mais eficiente, uma vez que o contrato constituiria a sociedade anterior ao governo, que, independentemente das alterações governamentais, seria mantida. 4.3 John Locke O contratualista John Locke nasceu em 1632, em Wrington, na Inglaterra. Ele foi um importante filósofo inglês e um dos principais representantes do empirismo, além de ser considerado o pai do liberalismo político. Seus ideais defendiam a liberdade individual e o igualitarismo. De acordo com Leo Strauss e Joseph Cropsey (2013, p. 437), “os ensinamentos políticos de Locke podem ser expressos em termos opostos, com similar brevidade, desta forma: Todo governo é limitado em seus poderes e existe somente pelo consentimento dos governados. A fundação sobre a qual ergue seu pensamento é esta: Todos os homens nascem livres”. A partir desse pensamento, Locke questionava o que seria de fato o poder político e a sociedade política, concluiu que não passavam de uma invenção, fruto da criação Introdução ao Direito Constitucional | Os contratualistas e o Estado Moderno www.cenes.com.br | 22 humana. Contudo, embora seja artificial, fruto da criação humana, uma vez que a sociedade política é criada, teria natureza própria, logo seria aplicável uma lei natural. Desta forma, para o liberalista, a sociedade civil apenas perseveraria se o governo fosse firmado de uma única vez, situação em que a sociedade política necessitaria do governo. Além disso, é importante mencionar que os ideais defendidos pelos contratualistas Locke e Hobbes são distintos, embora ambos falem sobre a lei natural, o primeiro defende-a como não sendo apenas um preceito da razão, mas um mandamento de Deus, que obriga os indivíduos e deve ser respeitada. Ao passo que Hobbes defende a lei natural como sendo um conjunto de preceitos da razão, mas que, em momento algum, obrigam propriamente o indivíduo, e sim os aconselham a adotar determinada conduta. Conforme destacam, Locke “se esforça por mostrar que as leis de natureza que determinam a constituição da propriedade é um mandamento de Deus, o que para ele é uma forma de mostrar que elas constituem obrigação e que há, portanto, contrariamente ao que diz Hobbes, obrigações naturais e pré-contratuais”. Ainda, no que diz respeito à função do contrato político, a opinião de Locke e Hobbes é divergente. De acordo com Ramos, Melo e Frateschi (2012, p. 125), para o liberalista Locke, o contrato político possui a função de evitar que esses laços, existentes no âmbito da natureza, deixem de ser aqueles pelos quais os homens se pautam em suas relações recíprocas, o que ocorre quando o estado de natureza se degenera num estado de guerra, quando as relações entre os homens deixam de ser relações de direito e dever, pautadas pela lei natural, para se tornarem relações de puro poder (RAMOS; MELO; FRATESCHI, 2012, p. 125). Sendo assim, podemos dizer que, segundo a visão de Locke, a liberdade não existe onde não há lei, uma vez que, considerando a condição natural do indivíduo, não existe uma lei preestabelecida. Logo, consoante a filosofia sustentada pelo liberalista Locke, os homens só seriam realmente livres se fossem legisladores. Introdução ao Direito Constitucional | Formação do pensamento político contemporâneo www.cenes.com.br | 23 Se você tem interesse pela formação do pensamento político no Estado Moderno e pretende aprofundar seus estudos, indicamos a leitura na íntegra das obras publicadas pelos contratualistas modernos, como: → De Cive (1642) – Thomas Hobbes; → Leviatã (1651) – Thomas Hobbes; → Do Contrato Social (1762) – Rousseau; → Ensaio Sobre o Conhecimento Humano (1689) – John Locke → Dois tratados sobre o governo (1689) – John Locke 5 Formação do pensamento político contemporâneo Superadas nossas considerações sobre a construção do pensamento político no Estado Moderno e, principalmente, a respeito dos contratualistas da época, passamos à análise da formação do pensamento político contemporâneo. Grandes pensadores contribuíram para a formação do pensamento político na era contemporânea. No entanto, os mais importantes foram Immanuel Kant, Karl Marx, Friedrich Nietzsche e Max Weber. 5.1 Immanuel Kant Immanuel Kant nasceu em 1724, na antiga Prússia Oriental, foi um grande filósofo alemão, conhecido por fundar a chamada filosofia crítica, por meio da qual procurava estabelecer os limites da razão humana. Neste sentido, também é importante ressaltar que a filosofia de Kant recebe esse nome devido ao título de suas três principais obras: a Crítica da razão pura (1781), a Crítica da razão prática (1788) e a Crítica do juízo (1790). Introdução ao Direito Constitucional | Formação do pensamento político contemporâneo www.cenes.com.br | 24 Com relação ao pensamento político, Kant não desenvolveu seus ideais de forma isolada como os outros filósofos, mas sim de forma conjunta, aliada a outros campos do conhecimento, essa fusão dá origem a uma verdadeira revolução teórica comparada ao pensamento da época. Segundo a doutrina sustentada por Kant, a república seria a única constituição política legítima do Estado, uma vez que o sistema político deve ser representativo, refletindo os anseios da sociedade. Isto é, ao contrário dos sistemas absolutistas, os governantes republicanos estão vinculados à vontade popular, logo devem prestar contas aos cidadãos. Ainda, no sistema republicano não há necessidade de o poder estar concentrado na mão de apenas uma pessoa, é preciso que suas funções estejam fragmentadas em várias esferas a fim de conter eventuais abusos e despotismos políticos. De acordo com Leo Strauss e Joseph Cropsey (2013, p. 520), Os ensinamentos políticos de Kant podem ser resumidos em uma frase: governo republicano e organização internacional. Em termos mais caracteristicamente kantianos, trata-se de uma doutrina do estado com base no direito (Rechtstaat) e da paz eterna. De fato, em cada uma dessas formulações, ambos os termos expressam a mesma ideia: a da constituição legal ou “paz através da lei”. Dentro e entre os estados, trata-se de uma questão de passar do estado de natureza, que é um estado de guerra, para o estado de direito, que é um estado de paz. [...] Kant realiza sua tarefe inspirando-se em suas concepções de moralidade e de história, mostrando como a paz depende da lei, e o direito, da razão, e o impulso na natureza das coisas em direção a um estado livre e racional e, portanto, pacífico (STRAUSS e CROPSEY, 2013, p. 520). Assim, Kant acreditava basicamente que o contrato social era uma espécie de condição da possibilidade teórica que representava o consentimento das pessoas com relação ao governo, dado que, por viverem em um estado natural, semelhante àquele citado por Hobbes, as partes estariam enfrentando grandes conflitos e não poderiam recorrer a um órgão superior para resolvê-los. Neste sentido, divergindo da ideia comum de liberdade, segundo a qual ser livre é fazer o que quiser, quando quiser e onde quiser, sem precisar seguir nenhuma regra, Introdução ao Direito Constitucional | Formação do pensamento político contemporâneo www.cenes.com.br | 25 afirmam Ramos, Melo e Frateschi (2012, p. 167-168) que “a concepção kantiana aponta no sentido contrário da concepção do senso comum: liberdade não é agir sem nenhuma regra, mas ser capaz de seguir uma regra livremente imposta pela própria razão”. Assim, o filósofo defende que é totalmente possível garantir a paz entre os Estados, ao passo que as pessoas se comprometem em cumprir uma série de regras que vinculam a todos de forma igualitária, garantindo o respeito à integridade territorial, à publicidade de decisões ou à proibição de guerras e agressão. Por fim, conforme salientam Leo Strauss e Joseph Cropsey(2013, p. 522), “Kant tem importância capital não só para a filosofia, mas para a consciência política, exatamente devido às consequências políticas de seus ensinamentos morais e à dimensão moral de seus ensinamentos político”. Isto é, o filósofo atribui um viés político a determinados temas morais e uma concepção moral a alguns temas políticos. 5.2 Karl Marx Nascido em 1818, Karl Marx foi um importante filósofo e revolucionário socialista alemão. Discípulo da filosofia de Georg Wilhelm Friedrich Hegel, buscou, de todas as formas, demonstrar que a realização da ordem de direito é um subproduto necessário do conflito dialético, das cegas paixões egoístas no processo da história. Marx iniciou sua carreira política em meio ao caos de dois reinos, o da Prússia e da Áustria, que, posteriormente, em 1871, iriam se unificar e formar a Alemanha. Após a eclosão da Revolução Francesa, responsável por abolir diversos privilégios feudais, os alemães também acreditavam que o movimento pudesse interferir no governo absolutista da Prússia, instaurando no país uma Constituição Liberal que garantisse aos cidadãos os direitos políticos de representação e os direitos civis de liberdade de expressão. Marx seguia os ensinamentos transmitidos por seu professor Hegel, que criticou o formalismo moral definido por Kant, uma vez que para ele os ideais transmitidos pelo Introdução ao Direito Constitucional | Formação do pensamento político contemporâneo www.cenes.com.br | 26 filósofo contrastavam com uma filosofia da História, segundo a qual o motivo se torna consciente de si, nunca de maneira individual e unilateral, mas seguindo uma evolução coletiva de grandes momentos e tempos. Na concepção de Hegel, a história avança dialeticamente e a razão é incorporada nos interesses do Estado. Portanto, não é possível iniciar a filosofia política seguindo apenas os princípios abstratos da razão, uma vez que, antes disso, deveriam ser entendidas as concreções e as dinâmicas históricas de cada um. Isto é, na visão de Hegel, a missão da Filosofia seria compreender a racionalidade do real. No entanto, quando Marx tenta aplicar e expandir o conceito filosófico de alienação para além das fronteiras da filosofia da religião, seguindo o estudo da filosofia política de Hegel, “descobre que todos os jovens hegelianos caem no mesmo equívoco que a teologia e a filosofia hegeliana da religião cometeram, invertendo a essência e a aparência” (RAMOS; MELO; FRATESCHI, 2012, p. 201). Além disso, os autores destacam que, de acordo com Marx, o Estado não seria considerado “uma esfera independente e superior, que ao se tornar racional resolveria todos os problemas da sociedade, mas, sim, dependente e subordinada com relação à sociedade civil, isto é, das relações sociais capitalistas”. Ou seja, Marx acredita que a filosofia hegeliana do Estado racional não consegue perceber a verdade do movimento social vivenciado pela sociedade moderna. Para o filósofo, o único regime capaz de superar o absolutismo alemão seria o socialismo, e não o liberalismo como todos acreditavam. Karl Marx foi o responsável por criar a dialética marxista, também conhecida como materialismo dialético, prática que recorre à dialética – a arte do diálogo, poder de persuasão, convencimento da verdade por meio de um discurso – para entender as lutas de classes sociais. Introdução ao Direito Constitucional | Formação do pensamento político contemporâneo www.cenes.com.br | 27 5.3 Friedrich Nietzsche O filósofo alemão Friedrich Nietzsche nasceu em 1844, na cidade de Röcken. Além da filosofia, Nietzsche também se dedicava à escrita e era um excelente crítico. De acordo com Leo Strauss e Joseph Cropsey (2013, p. 742), os pensamentos de Nietzsche destoavam da época “porque visam ser contrários a seu tempo, mas, no entanto, a serem uma influência sobre este tempo para o bem de um tempo futuro. O ensaio é uma crítica de uma “falha e defeito” específicos do tempo, o historicismo, ao qual Nietzsche denomina o movimento histórico [...]”. Ao contrário do dogma cristão, o filósofo afirma que não existia qualquer relação entre Deus e o Estado. Além de criticar a cultura e a religião, o filósofo contemporâneo Nietzsche tecia duras críticas a respeito da relação existente entre o Estado e os sistemas de educação. Ele defende que a criação do Estado foi uma das piores perversões já inventadas pelo homem, dado que, além de representar algo abstrato, trata os indivíduos de forma indiscriminada, transformando a sociedade em meros escravos. Neste sentido, Leo Strauss e Joseph Cropsey (2013, p. 749) complementam dizendo que, segundo Nietzsche, “o Estado é apenas uma superestrutura com base nas qualidades únicas de um povo, mas que distorce a singularidade: o Estado prega doutrinas universais, como os direitos do homem. Seu universalismo superficial destrói a criatividade dos indivíduos; sua máquina impessoal despersonaliza o homem”. Portanto, de acordo com o filósofo, a partir do momento em que o Estado deixasse de existir, a verdadeira face do homem viria à tona, e não uma massa que compartilha seus interesses com os do Estado. No entanto, o objetivo de Nietzsche não era exterminar a política, mas sim dizer que ela era totalmente possível, desde que conduzida à reconstrução do povo e, para que isso acontecesse, deveria ser resgatada do estado catastrófico no qual se encontraria devido a ação do igualitarismo democrático enaltecido pela modernidade, uma vez que o povo era, em sua essência, político. Introdução ao Direito Constitucional | Formação do pensamento político contemporâneo www.cenes.com.br | 28 5.4 Max Weber Max Weber nasceu em 1864, na cidade de Erfurt, em Turíngia na Alemanha. Foi um importante sociólogo, jurista e destacado economista alemão. Dedicou grande parte de sua trajetória à vida acadêmica, escreveu diversas obras e contribuiu significativamente para a construção do pensamento político contemporâneo. Em seu livro “A política como vocação”, conferência transcrita e datada de 1919, Weber formula uma importante tese que se constitui na base do pensamento político ocidental, definindo o Estado como aquele que é caracterizado pelo exercício do monopólio legítimo da violência em um determinado território, em que o uso da força física é característico na sua atuação. Portanto, a política se traduziria na construção de uma entidade em que homens dominam homens por meio da violência legitimada. De acordo com Weber, a atuação ativa do parlamento na estrutura política é muito importante, pois o sociólogo entende-o como uma estrutura capaz de: ✓ limitar a atuação das burocracias estatais; ✓ fiscalizar a ação do poder executivo; ✓ selecionar líderes pela competência, com participação popular parcial, realizada apenas em períodos espaçados. Assim, Weber salienta que a estrutura e a atuação política podem ser classificadas através de dois preceitos éticos, quais sejam: ÉTICA DA RESPONSABILIDADE A consciência do governante, diante do bem-estar de toda a nação e da ponderação dos mais variados interesses formados na sociedade, é um dos elementos que deve espelhar a disputa parlamentar. Introdução ao Direito Constitucional | Formação do pensamento político contemporâneo www.cenes.com.br | 29 ÉTICA DA CONVICÇÃO NA AÇÃO POLÍTICA Nada mais é do que o conjunto de preceitos ideológicos e morais que formam os líderes políticos, os quais devem ser perseguidos independentemente dos resultados ou das consequências. Por fim, Ramos, Melo e Frateschi (2012, p. 234) complementam dizendo que, na visão de Weber, O bom funcionamento do sistema político depende, segundo ele, de algumas variáveis: 1. o apoio para aqueles que exercem o poder; 2. os privilégios a que têm acesso; 3. a legitimidade conferida às posições dos detentoresdo poder; e 4. a lealdade que a população demonstra para com as instituições políticas que fazem parte da sociedade a qual pertencem (RAMOS; MELO; FRATESCHI, 2012, p. 234). Encaminhando-nos para o fim do material, elaboramos uma tabela para que você consiga compreender com clareza as principais ideias apresentadas pelos pensadores contemporâneos. Immanuel Kant • Governantes sujeitos à vontade popular; • Poder centralizado. Karl Marx • Socialista, crítico ao capitalismo; • Criador do materialismo dialético. Friedrich Nietzsche • Estado é perverso; • Política deve existir para reconstrução do povo. Introdução ao Direito Constitucional | Concluindo www.cenes.com.br | 30 Max Weber • Estado como detentor do monopólio da violência; • Participação popular parcial, seleção de líderes pelo parlamento. 6 Concluindo O conteúdo aqui desenvolvido possibilita ao estudante comparar os principais destaques dos pensadores que influenciaram a formação do Estado, os quais, na primeira impressão desses filósofos, iriam resolver os problemas existentes do homem vivendo em sociedade, que, naquela época, já apresentava sinais de que seria necessário o seu estudo. Desse modo, os pensadores clássicos se voltaram mais para o contexto de formação do Estado e para a necessidade de proteção e regulação do ser humano em seu estado natural. Nessa perspectiva, surgiram as primeiras teorias de proteção estatal, bem comum, estado de direito e democracia. Esperamos que tenha gostado deste conteúdo. Continue avançando. 7 Referências Bibliográficas ARISTÓTELES. Ética a Nicômaco. Tradução de Leonel Vallandro e Gerd Bornheim da versão inglesa de W. D. Ross In: Os Pensadores. São Paulo: Nova Cultural, 1973, v.4. DALLARI, D. A. Elementos de Teoria Geral do Estado. 30 ed. São Paulo: Saraiva, 2011. HEGEL, G. W. F. A fenomenologia do espírito. Tradução de P. Meneses. Petrópolis, RJ: Vozes, 1999. HOBBES, T. Leviatã. Tradução: João Paulo Monteiro e Maria Beatriz Nizza da Silva. São Paulo: Martins Fontes, 2003. KANT, E. Fundamentação da Metafísica dos costumes. Tradução de Guido Antônio de Almeida. São Paulo: Barcarolla, 2009. LOCKE, J. Dois tratados sobre o governo civil. São Paulo, Martins Fontes, 2001. MAQUIAVEL, N. Discursos sobre a primeira década de Tito Lívio. Tradução MF. São Paulo: Martins Fontes, 2007. Introdução ao Direito Constitucional | Referências Bibliográficas www.cenes.com.br | 31 MAQUIAVEL, N.. O Príncipe. Tradução de Maria Lucia Cumo. Rio de Janeiro: Editora Paz e Terra, 1996. MARX, K. O Capital. Vol. 2. 3ª edição, São Paulo, Nova Cultural, 1988. NIETZSCHE, F. Genealogia da Moral. Tradução de Paulo César de Souza. São Paulo: Companhia das Letras, 2009. PLATÃO. República. Tradução Maria Helena da Rocha Pereira. 9. ed. Lisboa: Fundação Calouste Gulbbenkian, 2001. RAMOS, F. C.; MELO, R.; FRATESCHI, Y. Manual de filosofia política: para os cursos de teoria do Estado, e ciência política, filosofia e ciências sociais. São Paulo: Saraiva, 2012. ROUSSEAU, J. Do contrato social. Tradução de Lourdes Santos Machado. 2. ed. São Paulo: Abril Cultural, 1978. STRECK, L. L.; MORAIS, J. L. B. Ciência Política e Teoria do Estado. 8 ed. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2014. STRAUSS, L.; CROPSEY, J. História da Filosofia Política. 1 ed. Rio de Janeiro: Forense, 2013. Introdução ao Direito Constitucional | Referências Bibliográficas www.cenes.com.br | 32 Neoconstitucionalismo | Construção histórica www.cenes.com.br | 1 DISCIPLINA INTRODUÇÃO AO DIREITO CONSTITUCIONAL CONTEÚDO Neoconstitucionalismo Neoconstitucionalismo | Construção histórica www.cenes.com.br | 2 Direitos Autorais A Faculdade Focus se responsabiliza pelos vícios do produto no que concerne à sua edição (apresentação a fim de possibilitar ao consumidor bem manuseá-lo e lê-lo). Nem a instituição nem os autores assumem qualquer responsabilidade por eventuais danos ou perdas a pessoa ou bens, decorrentes do uso da presente obra. É proibida a reprodução total ou parcial de qualquer forma ou por qualquer meio, eletrônico ou mecânico, inclusive através de processos xerográficos, fotocópia e gravação, sem permissão por escrito do autor e do editor. O titular cuja obra seja fraudulentamente reproduzida, divulgada ou de qualquer forma utilizada poderá requerer a apreensão dos exemplares reproduzidos ou a suspensão da divulgação, sem prejuízo da indenização cabível (art. 102 da Lei n. 9.610, de 19.02.1998). Atualizações e erratas: este material é disponibilizado na forma como se apresenta na data de publicação. Atualizações são definidas a critério exclusivo da Faculdade Focus, sob análise da direção pedagógica e de revisão técnica, sendo as erratas disponibilizadas na área do aluno do site www.cenes.com.br. É missão desta instituição oferecer ao acadêmico uma obra sem a incidência de erros técnicos ou disparidades de conteúdo. Caso ocorra alguma incorreção, solicitamos que, atenciosamente, colabore enviando críticas e sugestões, por meio do setor de atendimento através do e-mail tutor@cenes.com.br. © 2021, by Faculdade Focus Rua Maranhão, 924 - Ed. Coliseo - Centro Cascavel - PR, 85801-050 Tel: (45) 3040-1010 www.faculdadefocus.com.br Este documento possui recursos de interatividade através da navegação por marcadores. Acesse a barra de marcadores do seu leitor de PDF e navegue de maneira RÁPIDA e DESCOMPLICADA pelo conteúdo. http://www.cenes.com.br/ mailto:tutor@cenes.com.br. http://www.faculdadefocus.com.br/ Neoconstitucionalismo | Construção histórica www.cenes.com.br | 3 Apresentação Prezado Acadêmico! É um privilégio tê-lo como nosso aluno e, desde já, dou as boas-vindas a nossa unidade, aqui no CENES. Nesta aula, aprenderemos que a doutrina constitucionalista, a partir do século XX, passou a desenvolver uma nova perspectiva do constitucionalismo. Veremos que o chamado pós-positivismo busca, para além da ideia de limitação do poder estatal, a eficácia da Constituição; que o texto maior deixou de ter um caráter meramente teórico para ser mais efetivo, buscando diretamente a concretização dos direitos fundamentais. Perceberemos que a Constituição passará a ocupar a posição de dentro do ordenamento jurídico, sendo dotada de imperatividade e superioridade. Por fim, veremos que essa nova fase do constitucionalismo buscará, sobretudo, a proteção da proteção da dignidade humana. Neoconstitucionalismo | Construção histórica www.cenes.com.br | 4 Sumário Apresentação ----------------------------------------------------------------------------------------------------- 3 Sumário ------------------------------------------------------------------------------------------------------------- 4 1 Construção histórica -------------------------------------------------------------------------------------- 5 2 Neoconstitucionalismo ----------------------------------------------------------------------------------- 7 2.1 Influências da Primeira e Segunda Guerra Mundial no Neoconstitucionalismo ------------------------ 9 2.2 Princípio da Dignidade da Pessoa Humana --------------------------------------------------------------------- 11 3 Movimento neoconstitucionalista no Brasil ------------------------------------------------------- 14 4 Neoconstitucionalismo e a centralidade da Constituição ------------------------------------- 15 4.1 Teoria Pura do Direito ------------------------------------------------------------------------------------------------ 15 4.2 Competência Legislativa --------------------------------------------------------------------------------------------- 18 5 Nova interpretação da Constituição ---------------------------------------------------------------- 20 6 Conclusão ---------------------------------------------------------------------------------------------------22 7 Referências Bibliográficas ------------------------------------------------------------------------------ 23 Neoconstitucionalismo | Construção histórica www.cenes.com.br | 5 1 Construção histórica Inicialmente, antes de direcionar nossos estudos no chamado “neoconstitucionalismo”, ou novo constitucionalismo, você precisa compreender as origens desse termo. A compreensão do constitucionalismo pode ser estabelecida a partir do momento histórico em que o movimento ocorreu, durante as revoluções liberais norte- americana e francesa, que ocorreram, respectivamente, em 1787 e 1791. No entanto, alguns doutrinadores defendem que a ideia do constitucionalismo como limitação do poder estatal tenha surgido muito antes desses movimentos, datando suas origens a partir da idade média. Conforme exemplifica Nathalia Masson (2020), existem quatro formas de constitucionalismo ao longo da história, o antigo, o medieval, o moderno e o contemporâneo (neoconstitucionalismo), além de uma previsão do constitucionalismo futuro. De forma sucinta, essas modalidades podem ser definidas da seguinte forma: a) Constitucionalismo antigo: o constitucionalismo antigo tem sua origem nos tempos primórdios, durante a sociedade Hebraica, onde o Estado era organizado de forma teocrática através da Torah ou do Pentateuco, de modo que o poder do monarca já era limitado pelos dogmas religiosos. Durante este período, a Grécia também teve muita influência no campo da democracia. b) Constitucionalismo medieval: durante a idade média, enquanto perdurava a ideia do feudalismo com os senhores feudais, o desenvolvimento do mercantismo através dos burgos e a implementação do absolutismo monárquico modificaram o cenário da época. A realeza passou a reivindicar uma certa liberdade perante as decisões imprevisíveis dos governantes absolutos. Assim, diante da pressão dos nobres e dos burgueses, o constitucionalismo medieval acabou ganhando força e, posteriormente, durante o reinado de João Sem-Terra na Inglaterra, originou-se a Magna Carta de 1215, a qual impunha certos limites ao monarca. Contudo, é válido mencionar que, embora represente um grande passo para o constitucionalismo, durante este período os privilégios conquistados através da Magna Carta ainda eram restritos à nobreza, deixando o resto da população à margem do absolutismo; Neoconstitucionalismo | Construção histórica www.cenes.com.br | 6 c) Constitucionalismo moderno: o termo constitucionalismo moderno surgiu durante as grandes revoluções liberais desencadeadas entre os séculos XVIII, XIX e XX, na França e nos EUA, que culminaram nas Constituições pós-guerra. Grande parte da doutrina considera que foi somente a partir desse momento que o constitucionalismo conhecido atualmente surgiu. Assim, as revoluções ocorridas na época acabaram por influenciar, mesmo que indiretamente, a instituição de um novo modelo de Estado, conhecido como liberal, através das novas Constituições escritas que, diferente da Magna Carta de 1215, limitaram o poder dos governantes e asseguraram alguns direitos políticos e individuais a todos os cidadãos. Como bem menciona Nathalia Masson (2020, p. 34) “o constitucionalismo do período, intitulado de liberal, ficou marcado pelo enaltecimento do indivíduo, pelo surgimento das primeiras constituições escritas e rígidas, pela consagração de direitos civis e políticos e pelo distanciamento do Estado que, numa postura nitidamente absenteísta, pouco atuava”. d) Constitucionalismo contemporâneo: o constitucionalismo contemporâneo, também conhecido como neoconstitucionalismo, surge depois da Segunda Grande Guerra e tem como princípio norteador a dignidade da pessoa humana. Embora represente um grande avanço para a sociedade, o neoconstitucionalismo só foi possível devido a todas as barbáries que ocorreram antes dele. À vista disso, junto com o movimento surgiram os direitos fundamentais de 3ª, 4ª e 5ª dimensão; e) Constitucionalismo do futuro: diferente dos outros movimentos, o constitucionalismo do futuro é uma projeção. Apesar de alguns doutrinadores já defenderem que a transição do constitucionalismo contemporâneo para o constitucionalismo vindouro ou do porvir já pode ser identificada. O constitucionalismo futuro deve estar relacionado com sete valores diferentes, quais sejam: • Verdade; Neoconstitucionalismo | Neoconstitucionalismo www.cenes.com.br | 7 • Solidariedade; • Consenso; • Continuidade; • Participação; • Integração; • Universalidade. Agora que você já tem uma noção dos aspectos iniciais e introdutórios a respeito do constitucionalismo, vamos dar continuidade ao nosso estudo, focando no objeto principal do material, o neoconstitucionalismo. 2 Neoconstitucionalismo A denominação do movimento moderno constitucional do Neoconstitucionalismo gera discussão e controvérsia entre os estudiosos da matéria. Alguns doutrinadores brasileiros, a exemplo de Ferreira Filho (2011), fazem críticas a esse neologismo, entendendo que, o que se chama de Neoconstitucionalismo, na verdade, já se observava desde os primórdios do Constitucionalismo no século XVIII. No mesmo sentido, em sua obra sobre o Neoconstitucionalismo, Cunha Júnior (2012), Neoconstitucionalismo | Neoconstitucionalismo www.cenes.com.br | 8 assevera: O Neoconstitucionalismo representa o constitucionalismo atual, contemporâneo, que emergiu como uma reação às atrocidades cometidas na segunda guerra mundial, e tem ensejado um conjunto de transformações responsável pela definição de um novo direito constitucional, fundado na dignidade da pessoa humana. O Neoconstitucionalismo destaca-se, nesse contexto, como uma nova teoria jurídica a justificar a mudança de paradigma, de Estado Legislativo de Direito, para Estado Constitucional de Direito, consolidando a passagem da Lei e do Princípio da Legalidade para a periferia do sistema jurídico e o trânsito da Constituição e do Princípio da Constitucionalidade para o centro de todo o sistema, em face do reconhecimento da força normativa da Constituição, com eficácia jurídica vinculante e obrigatória dotada de supremacia material e intensa carga valorativa (CUNHA JÚNIOR, 2012, p. 29). Contudo, Luís Roberto Barroso (2018, p. 280) explica que o direito constitucional passou por muitas transformações ao longo dos anos, e “é possível reconstituir essa trajetória, objetivamente, levando em conta três marcos fundamentais: o histórico, o filosófico e o teórico. Neles estão contidas as ideias e as mudanças de paradigma que mobilizaram a doutrina e a jurisprudência nesse período, criando uma nova percepção da Constituição e de seu papel na interpretação jurídica em geral”. Assim, podemos afirmar que o contemporâneo surge após a Segunda Guerra Mundial, com o intuito de garantir a dignidade da pessoa humana à população, que tanto sofreu com as atrocidades da época. À vista disso, os três marcos fundamentais do direito constitucional – histórico, filosófico e teórico –, suscitados por Barroso (2018), podem ser definidos, basicamente, como: • MARCO HISTÓRICO: no marco histórico devemos analisar os eventos que ocorriam na época e influenciaram o movimento. No século XX, após passar por diversas revoluções e duas Grandes Guerras, a Europa encontrava-se arrasada e buscava uma recuperação, principalmente a Alemanha e a Itália, que sofreram mais com o conflito. Por outro lado, no Brasil, o marco histórico do neoconstitucionalismo é a Constituição Federal de 1988, juntamente com o processo de redemocratização proporcionado por ela; • MARCO FILOSÓFICO: na questão filosófica, o ponto principal é o pós- positivismo, que apresenta a ideia de união entre o jusnaturalismo e o Neoconstitucionalismo | Neoconstitucionalismo www.cenes.com.br | 9 positivismo; • MARCO TEÓRICO:com relação ao marco teórico, podemos citar três eventos importantes que contribuíram para a ascensão do neoconstitucionalismo, quais sejam: a) a força normativa da Constituição Federal passa a ser reconhecida por todos; b) há um crescimento significativo da jurisdição constitucional; c) ocorre a evolução de um novo pensamento, e a Constituição é analisada por outra ótica. 2.1 Influências da Primeira e Segunda Guerra Mundial no Neoconstitucionalismo O neoconstitucionalismo, assim como os outros movimentos, não surgiu do dia para a noite, é uma construção baseada em diversos acontecimentos históricos que culminaram na implementação de um novo pensamento. Portanto, considerando a perspectiva mundial, as duas Grandes Guerras foram peças fundamentais para essa evolução. A Primeira Guerra Mundial, desencadeada nos anos de 1914 a 1918, foi influenciada principalmente pelos processos de imperialismo e neocolonialismo. A batalha foi marcada pela disputa da Tríplice Aliança, composta pela Alemanha, Império Austro-Húngaro e Itália, contra a Tríplice Entente, inicialmente encabeçada pela França, Inglaterra e Rússia, com a posterior aliança dos EUA, presença decisiva para o fim do conflito, movidos pelo forte sentimento nacionalista e pelo desejo incessante de expansão de territórios. As batalhas travadas nesta época eram extremamente violentas e, diante do potencial bélico das superpotências, o armamento utilizado durante o conflito foi se aperfeiçoando, com o uso de tanques de guerra e aviões de combate, a vida de milhares de soldados foi ceifada. Além disso, a população não tinha praticamente nenhum amparo constitucional, uma vez que os direitos conquistados durante o constitucionalismo moderno protegiam, quase que exclusivamente, os nobres e os burgueses. O conflito encerrou-se com a assinatura do Tratado de Versalhes, consolidando a Neoconstitucionalismo | Neoconstitucionalismo www.cenes.com.br | 10 vitória da Tríplice Entente. Países saíram economicamente devastados do confronto, além de terem reduzido sua força militar a quase zero. O saldo de mortes, na época, foi de aproximadamente 8 milhões de soldados, dos quais 1.800.000 eram apenas alemães. Ainda, neste contexto, é importante ressaltar que a Alemanha, dentre os perdedores, foi a mais impactada, pois teve que arcar com os custos da guerra, sendo obrigada a ceder territórios já conquistados e a reorganizar sua economia para ressarcir os danos causados, principalmente à França. Esse fato é muito importante e teve grande influência na Segunda Grande Guerra. Passados 20 anos do primeiro conflito, uma nova batalha é travada pelos chamados Aliados (Reino Unido, França, EUA, URSS etc.) contra o Eixo (Itália, Alemanha, Japão etc.). A Segunda Guerra Mundial ocorreu entre os anos de 1939 a 1945 e foi motivada pela expansão dos regimes totalitários na Europa, pelo expansionismo germânico e, principalmente, pelo sentimento de humilhação que tomou conta da Alemanha depois da derrota da Primeira Grande Guerra, culminando em uma grande crise econômica que assolou o País por muito tempo. O período da Segunda Guerra foi marcado pela ascensão dos nazistas comandados por Adolf Hitler na Alemanha, que, através de um governo totalitário, buscavam reascender a economia do País, bem como o poder bélico e militar. Como era de se esperar, a segunda batalha foi muito mais violenta que a primeira, levando a vida de aproximadamente 60 milhões de pessoas, mortas na linha de frente e nos campos de concentração utilizados pelos nazistas. Além das bombas atômicas, lançadas sobre Hiroshima e Nagasaki, em 1945, que concedeu às superpotências um altíssimo poder de destruição. A Segunda Guerra Mundial chegou ao fim em 1945, quando os Aliados invadiram o território Alemão, conquistando a capital Berlim. Depois da invasão, o líder do partido nazista, Adolf Hitler, cometeu suicídio, pondo fim à batalha. Neoconstitucionalismo | Neoconstitucionalismo www.cenes.com.br | 11 Após esse período obscuro da história, quando a população tomou conhecimento sobre o horror que era implementado nos campos de concentração, foi que o discurso sobre os Direitos Humanos começou a ganhar força no cenário internacional, junto com os direitos fundamentais de 3ª, 4ª e 5ª dimensão. 2.2 Princípio da Dignidade da Pessoa Humana Superado esses aspectos iniciais a respeito do Neoconstitucionalismo, passamos à análise do princípio da dignidade da pessoa humana, preceito fundamental para esse movimento pós-guerras. De acordo com Luís Roberto Barroso (2018, p. 152) “o constitucionalismo democrático tem por fundamento e objetivo a dignidade da pessoa humana. Após a Segunda Grande Guerra, a dignidade tornou-se um dos grandes consensos éticos do mundo ocidental, materializado em declarações de direitos, convenções internacionais e constituições”. Em consonância com José Afonso da Silva (2014, p. 107), a “dignidade da pessoa humana é um valor supremo que atrai o conteúdo de todos os direitos fundamentais do homem, desde o direito à vida”, e desse valor decorrem outros princípios, os quais a ordem econômica deve preservar. Ainda, Vicente Paulo e Marcelo Alexandrino (2017, p. 90) complementam dizendo que “a dignidade da pessoa humana como fundamento da República Federativa do Brasil consagra, desde logo, nosso Estado como uma organização centrada no ser humano, e não em qualquer outro referencial”. Além disso, os autores defendem que o princípio pode ser analisado sob duas ópticas. “De um lado, apresenta-se como um direito de proteção individual, não só em relação ao Estado, mas, também, frente aos demais indivíduos. De outro, constitui dever fundamental de tratamento igualitário dos próprios semelhantes”. Além disso, Luís Roberto Barroso (2014, p. 14) é categórico em afirmar que “a dignidade humana, como atualmente compreendida, se assenta sobre o pressuposto Neoconstitucionalismo | Neoconstitucionalismo www.cenes.com.br | 12 de que cada ser humano possui um valor intrínseco e desfruta de uma posição especial no universo”. Dessa forma, podemos concluir que o princípio da dignidade da pessoa humana é o elemento base da nossa sociedade, servindo como fonte do direito constitucional contemporâneo. Se você tem interesse em aprofundar seu conhecimento acerca do princípio da dignidade da pessoa humana, recomendamos a leitura das obras “A Crítica da Razão Pura” e a “Crítica da Razão Prática” do estudioso Immanuel Kant. Outro estudioso que trata do assunto com maestria é Giovanni Pico della Mirandola, ambos os autores fizeram grandes contribuições a respeito do tema Dignidade da Pessoa Humana. Além disso, autores brasileiros, como o Min. Luís Roberto Barroso, na obra “A dignidade da pessoa humana no direito constitucional contemporâneo”, e Daniel Sarmento, no livro “Dignidade da Pessoa Humana - conteúdo, trajetória e metodologia”, falam sobre o princípio com maestria, relacionando os aspectos históricos com o cenário atual. No plano filosófico, valor intrínseco é o elemento ontológico da dignidade ligado à natureza do ser. Trata-se da afirmação da posição especial da pessoa humana no mundo que a distingue dos outros seres vivos e das coisas. As coisas têm preço, mas as pessoas têm dignidade, um valor que não tem preço (KANT, 1998). Além disso, o autor apresenta um valor social, visto que se preocupa com os impactos das escolhas individuais na sociedade. A inteligência, a sensibilidade e a capacidade de comunicação (pela palavra, pela arte, por gestos, pelo olhar ou por expressões fisionômicas) são atributos únicos que servem para lhes dar essa condição singular. No plano jurídico, o valor intrínseco está na origem de uma série de direitos fundamentais, que incluem: direito à vida, à igualdade, à integridade física, à integridade moral oupsíquica (BARROSO, 2017). Neoconstitucionalismo | Neoconstitucionalismo www.cenes.com.br | 13 Nesse sentido, sobre o referido princípio, Ferreira Filho (2011) assevera que: A dignidade é o fundamento dos direitos humanos. O problema é que essa dignidade é concebida de modo diferente pelas filosofias, religiões e culturas, o que põe em risco a objetividade da interpretação. Muitas vezes já tem servido abusivamente de “chave falsa” (perdoe-me a imagem) para que o intérprete arbitrariamente faça prevalecer a sua concepção ideológica contra legem ou praeterlegem. Isto “sem uma justificação política substantiva”, como reclama Sunstein. (FERREIRA FILHO, 2011, p. 231) Falando um pouco mais sobre a Declaração Universal dos Direitos Humanos, para você que tem interesse nessa área, trazemos alguns aspectos relevantes sobre esse assunto. A D.U.D.H. é um documento adotado e proclamado pela Assembleia Geral das Nações Unidas, em Paris, através da resolução 217 A III, no dia 10 de dezembro de 1948, que tem por objetivo assegurar a proteção universal dos direitos humanos. Assim, logo no seu 1º artigo, a Declaração firma um de seus princípios basilares: “todos os seres humanos nascem livres e iguais em dignidade e direitos. São dotados de razão e consciência e devem agir em relação uns aos outros com espírito de fraternidade”. Note que o pacto foi firmado três anos após o fim da Segunda Guerra Mundial, e os Países membros fizeram questão de mencionar no preâmbulo o seguinte: “considerando que o desprezo e o desrespeito pelos direitos humanos resultaram em atos bárbaros que ultrajaram a consciência da humanidade e que o advento de um mundo em que mulheres e homens gozem de liberdade de palavra, de crença e da liberdade de viverem a salvo do temor e da necessidade foi proclamado como a mais alta aspiração do ser humano comum [...]”. A Declaração Universal dos Direitos do Homem surge como um reflexo às atrocidades cometidas durante as duas Grandes Guerras, servindo como base para a elaboração de diversas constituições. Neoconstitucionalismo | Movimento neoconstitucionalista no Brasil www.cenes.com.br | 14 Por fim, se a sua intenção é se aprofundar mais nessa área, indicamos alguns documentários que falam a respeito e podem ser úteis: → 20 anos da Conferência de Viena Link: https://www.youtube.com/watch?v=I4bTmVyAXDg → Para todos em todo lugar: o ‘making of’ da Declaração Universal dos Direitos Humanos Link: https://www.youtube.com/watch?v=D4p3aJvFq3A&feature=emb_title → 70 anos da Declaração Universal dos Direitos Humanos, de 1948 Link: https://www.youtube.com/watch?v=SJy1M4iYiMo 3 Movimento neoconstitucionalista no Brasil No cenário brasileiro, o movimento neoconstitucionalista foi consolidado com a Constituição Federal de 1988, também conhecida como a Constituição Cidadã, que foi pautada na Declaração Universal dos Direitos Humanos e garantiu aos brasileiros inúmeros direitos. De acordo com Luís Roberto Barroso (2018, p. 280), “a Constituição promoveu uma transição democrática bem-sucedida e assegurou ao país estabilidade institucional, mesmo em momentos de crise aguda. Sob a Constituição de 1988, o direito constitucional passou da desimportância ao apogeu em menos de uma geração”. Ainda, é importante ressaltar que, na opinião de José Afonso da Silva (2014, p. 90), assim como no cenário mundial, a luta pela democracia no Brasil se intensificou durante períodos de muita repressão, de modo que: A luta pela normalização democrática e pela conquista do Estado Democrático de Direito começara assim que se instalou o golpe de 1964 e especialmente após o AIS, que foi o instrumento mais autoritário da história política do Brasil. Tomara, porém, as ruas, a partir da eleição dos Governadores em 1982. Intensificara-se, quando, no início de 1984, as multidões acorreram entusiásticas e ordeiras aos comícios em prol da eleição direta do Presidente da Neoconstitucionalismo | Neoconstitucionalismo e a centralidade da Constituição www.cenes.com.br | 15 República, interpretando o sentimento da Nação, em busca do reequilíbrio da vida nacional, que só poderia consubstanciar-se numa nova ordem constitucional que refizesse o pacto político-social (SILVA, 2014, p. 90). Dessa forma, com a promulgação da Constituição Federal de 1988, o Brasil finalmente consolidou sua transição democrática, elevando o indivíduo a um grau máximo de importância na sociedade. 4 Neoconstitucionalismo e a centralidade da Constituição Como bem destaca Luís Roberto Barroso (2018, p. 286), a principal característica do Constitucionalismo contemporâneo é “a centralidade da Constituição, que, além de reger o processo de produção das leis, impõe limites ao seu conteúdo e institui deveres de atuação para o Estado”. Assim, considerando que o marco inicial do neoconstitucionalismo na Europa foi com a reconstitucionalização da Alemanha e da Itália, ao final da década de 40, no território brasileiro não foi diferente, uma vez que o neoconstitucionalismo no Brasil foi marcado pela redemocratização que se operou sobre a Constituição de 1988, após a ditadura militar. Esse novo movimento constitucional que surgiu em meados do século XX na Europa visou reconhecer a supremacia material e axiológica da Constituição, cujo conteúdo passou a ser dotado de força normativa. No entanto, para compreendermos melhor esse aspecto, precisamos relembrar alguns conceitos básicos que veremos adiante. 4.1 Teoria Pura do Direito Hans Kelsen foi um jurista e filósofo austríaco que fez grandes contribuições para o mundo do Direito, como quando fundou a teoria pura do direito, também conhecida como a pirâmide de Kelsen. De acordo com Nathalia Masson (2020, p. 39): Neoconstitucionalismo | Neoconstitucionalismo e a centralidade da Constituição www.cenes.com.br | 16 Kelsen estruturou o ordenamento de forma estritamente jurídica, baseando-se na constatação de que toda norma retira sua validade de outra que lhe é imediatamente superior. Segundo o autor, no mundo das normas jurídicas uma norma só pode receber validade de outra, de modo que a ordem jurídica sempre se apresente estruturada em normas superiores fundantes —que regulam a criação das normas inferiores — e normas inferiores fundadas — aquelas que tiveram a criação regulada por uma norma superior (MASSON, 2020, p. 39). Observe, a seguir, a representação da teoria, na forma de pirâmide, apresentada pelo autor: Para tornar mais didática essa questão, podemos utilizar o exemplo da Lei 8.666/1993, lei federal que regulamenta os contratos administrativos e licitações no âmbito da administração pública. Por ser uma lei federal, todos deverão observar estes parâmetros, estando ela acima na “pirâmide das normas”. Além disso, é importante destacar que, até a Segunda Guerra Mundial, a teoria jurídica centrava-se na influência do Estado Legislativo de Direito, tendo por fonte única do Direito a lei. Dessa forma, uma norma jurídica tinha sua validade, eficácia e vigência vinculadas à autoridade que a editou, e não ao seu valor de justiça. Sob o fundamento de observância da lei, barbáries foram cometidas no mundo, a exemplo do genocídio Neoconstitucionalismo | Neoconstitucionalismo e a centralidade da Constituição www.cenes.com.br | 17 cometido pelo governo nacional-socialista alemão quando judeus foram exterminados pelos nazistas no período de 1939 a 1945. Esse acontecimento fez o mundo repensar esse Estado Legislativo de Direito, formulando um sistema jurídico que tivesse seus fundamentos no respeito aos direitos fundamentais. Instalou- se, então, a constitucionalização do Direito, evidenciando, a supremacia da Carta Magna. Essa constitucionalização do Direito é um processo de transformação de um ordenamento jurídico, ao fim do qual a ordem jurídica emquestão resulta totalmente impregnada pelas normas constitucionais, que passam a condicionar tanto a legislação como a jurisprudência, a doutrina, as ações dos atores políticos e as relações sociais (GUASTINI, 2009). No entanto, após esse período, a Constituição tornou-se o centro do sistema jurídico, devendo toda interpretação jurídica ser feita em consonância com os valores e princípios constitucionais. Além disso, a supremacia da Constituição impõe deveres negativos e positivos ao legislador quando da elaboração de leis, e impõe ao julgador, quando este decide casos resultantes de conflitos de interesses decorrentes da lei, respeitar e observar os fins estabelecidos pela Constituição. O processo de constitucionalização é uma característica essencial da própria jurisdição constitucional, que permite possibilidades interpretativas fundamentadas nessa supremacia, como o controle de constitucionalidade, possibilitando a revogação de leis inconstitucionais e a interpretação conforme a Constituição. Essa reconstitucionalização, observada após a Segunda Guerra Mundial, também fez surgir um patriotismo constitucional, o qual, segundo Habermas (1998): [...] produziu de forma reflexiva uma identidade política coletiva conciliada com uma perspectiva universalista comprometida com os princípios do Estado Democrático de Direito. Isto é, o patriotismo constitucional foi defendido como uma maneira de conformação de uma identidade coletiva baseada em compromissos com princípios constitucionais democráticos e liberais capazes de garantir a integração e assegurar a solidariedade, com o fim de superar o conhecido problema do nacionalismo étnico, que por muito tempo opôs culturas e povos (HABERMAS, 1998, p. 55). Por fim, é importante lembrar que, embora a teoria de Hans Kelsen tenha sido baseada na hierarquia das normas, quando elas estão no mesmo plano, esse critério não é considerado, pois não há hierarquia entre as leis federais ou estaduais, por exemplo. Neoconstitucionalismo | Neoconstitucionalismo e a centralidade da Constituição www.cenes.com.br | 18 Dessa forma, além da teoria pura do direito, existem outras variáveis que devem ser consideradas diante de um eventual conflito de normas, como o critério da competência. 4.2 Competência Legislativa Antes de falarmos especificamente sobre a competência legislativa, precisamos compreender alguns aspectos relativos à nossa Magna Carta. A Constituição Federal que conhecemos hoje foi promulgada no dia 05 de outubro de 1988 e instituída pelo chamado Poder Constituinte Originário, o qual, por meio de uma Assembleia Nacional Constituinte, firmou as normas constitucionais originárias. No entanto, assim como a sociedade, o direito deve estar em constante evolução para que seja capaz de solucionar, de forma eficiente, os conflitos que lhe são apresentados. Dessa forma, quando o texto constitucional carece de mudanças, o Poder Constituinte Derivado, representado pelo Congresso Nacional, propõe sua alteração através de Emendas Constitucionais. Todavia, nesse ponto é importante lembrar que não existe hierarquia entre normas do mesmo plano. Assim, conforme explica Nathalia Masson (2020, p. 32) “se houver um conflito entre essas leis, a solução não será dada por critério hierárquico. Teremos que verificar qual ente da federação (União, Estados-membros ou Municípios) possui a competência para legislar sobre o tema. Se, por exemplo, a competência para legislar é dos Estados, a lei estadual vai prevalecer; se é dos Municípios, a lei municipal prevalecerá”. Assim, por mais que alguns doutrinadores organizem a estrutura do ordenamento jurídico em forma de pirâmide, de modo a situar as normas federais acima das estaduais, e estas acima das municipais, o pacto federativo pressupõe a autonomia de suas partes. Portanto, o mais correto seria dizer que todas as normas devem obedecer aos parâmetros estabelecidos pela Constituição Federal e, por menor que seja um município, apenas ele poderá legislar a respeito de alguns assuntos, sem qualquer interferência ou usurpação de competência por parte dos outros entes. Neoconstitucionalismo | Neoconstitucionalismo e a centralidade da Constituição www.cenes.com.br | 19 Nesse sentido, Luís Roberto Barroso (2018, p. 285-286) complementa dizendo que “nas democracias contemporâneas, as Constituições desempenham duas funções principais: a) a de veicular os consensos mínimos e essenciais da sociedade, que se expressam nos valores, instituições e direitos fundamentais; e b) assegurar o funcionamento adequado dos mecanismos democráticos, com a participação livre e igualitária dos cidadãos, o governo da maioria e a alternância do poder”. Assim, a Constituição determina a competência para legislar sobre determinados assuntos, se será privativa ou concorrente entre os entes federativos. Um exemplo que reflete essa situação é o art. 30 da CF, que fixa a competência legislativa dos municípios. Além disso, no que diz respeito à competência concorrente, o art. 24 da Constituição Federal reconhece a possibilidade de que a União, os Estados e o Distrito Federal - os municípios são contemplados, no que couber, pelo art. 30, II, CF - legislem a respeito de temas comuns, mas cada um exercerá essa atribuição em relação a um conteúdo ou especificidade própria, sem que haja uma sobreposição de normas. Imagine a seguinte situação: um dos assuntos que é de COMPETÊNCIA LEGISLATIVA concorrente entre os entes federativos é a saúde (art. 24, XII, CF). Recentemente (15/04/2020), no julgamento da medida cautelar na ADI 6341, o STF afirmou, uma vez mais, que NÃO É POSSÍVEL compreender que as normas federais a respeito da matéria prevalecem, por força hierárquica, em relação às normas dos Estados e Municípios, devendo-se atentar sempre às competências organizadas no âmbito do pacto federativo (art. 24, §1º ao 4º, CF). Veja que interessante, a Constituição Federal concede competência concorrente, ou seja, ambos podem legislar e, nesse sentido, os Estados e Municípios podem sim criar suas normas sobre a saúde. Tudo porque é competência concorrente, e não privativa. Se na Constituição estivesse expresso como competência privativa da União, teríamos prevalência da lei federal, mas neste caso isso não ocorre. Neoconstitucionalismo | Nova interpretação da Constituição www.cenes.com.br | 20 No mais, outro ponto que deve ser observado são os limites estabelecidos pela Magna Carta. A Constituição Federal permite que os Estados tenham Constituição própria, mas, para tanto, devem OBSERVAR ALGUNS PRECEITOS (cláusulas de simetria), que são previstos pela CF e que não podem ser modificados na organização dos Estados. De modo semelhante, os Municípios também podem ter as suas Leis Orgânicas, mas precisam observar os preceitos/princípios (limites e obrigações) previstos na Constituição Federal e Estadual. Esse é o entendimento manifestado no art. 29, CF: Art. 29. O Município reger-se-á por lei orgânica, votada em dois turnos, com o interstício mínimo de dez dias, e aprovada por dois terços dos membros da Câmara Municipal, que a promulgará, atendidos os princípios estabelecidos nesta Constituição, na Constituição do respectivo Estado e os seguintes preceitos. Sendo assim, devemos considerar a Constituição Federal como norma máxima e superior a todas as demais, uma vez que tem a função de estabelecer as diretrizes fundamentais que servirão como base para as normas inferiores. Entretanto, considerando que adotamos a forma federativa, dividindo o território brasileiro em União, Estados, Distrito Federal e Municípios, devemos observar o critério da competência legislativa, pois em determinados casos, a hierarquia será colocada em segundo plano e a competência prevalecerá. 5 Nova interpretação da Constituição Seguindo para a finalizaçãodos apontamento acerca do conteúdo, faremos uma análise da nova interpretação da Constituição Federal, realizada através do constitucionalismo contemporâneo. Nas palavras de Luís Roberto Barroso (2010), onde havia unidade, passou a existir uma pluralidade. A recente interpretação incorporou um conjunto de novas categorias, destinadas a lidar com as situações mais complexas e plurais referidas anteriormente. Dentre elas, a normatividade dos princípios (como dignidade da pessoa humana, solidariedade e segurança jurídica), as colisões de normas constitucionais, a Neoconstitucionalismo | Nova interpretação da Constituição www.cenes.com.br | 21 ponderação e a argumentação jurídica. Além disso, Barroso (2010) comenta ainda que [Passa], por fim, a ideia de casos difíceis. Casos fáceis são aqueles para os quais existe uma solução pré-pronta no direito positivo. Por exemplo: a) a Constituição prevê que aos 70 anos o servidor público deve passar para a inatividade. Se um juiz, ao completar a idade limite, ajuizar uma ação pretendendo permanecer em atividade, a solução será dada de maneira relativamente singela: pela mera subsunção do fato relevante – implementação da idade – na norma expressa, que determina a aposentadoria; b) a Constituição estabelece que o Presidente da República somente possa se candidatar a uma reeleição. Se o Presidente Lula, por exemplo, tivesse pretendido concorrer a um terceiro mandato, a Justiça Eleitoral teria indeferido o registro de sua candidatura, por simples e singela aplicação de uma norma expressa. A verdade, porém, é que para bem e para mal, a vida nem sempre é fácil assim. Há muitas situações em que não existe uma solução pré-pronta no Direito. A solução terá de ser construída argumentativamente, à luz dos elementos do caso concreto, dos parâmetros fixados na norma e de elementos externos ao Direito (BARROSO, 2010, p. 13). Por outro lado, Lênio Streck (2011) tece algumas críticas a respeito do que chama positivismo normativista pós-kelseniano. Isto é, ao positivismo que admite discricionariedades (ou decisionismos e protagonismos judiciais). Para o jurista, esse ativismo possui uma origem solipsista; passando, dessa forma, a democracia e os avanços a dependerem de posições individuais da Suprema Corte. O autor considera que, no âmbito destas reflexões, está superado [...] o velho positivismo exegético. Ou seja, não é (mais) necessário dizer que o “juiz não é a boca da lei” etc.; enfim, podemos ser poupados, nessa quadra da história, dessas “descobertas polvolares”. Essa “descoberta” não pode implicar um império de decisões solipsistas, das quais são exemplos as posturas caudatárias da Jurisprudência dos Valores (que foi “importada” de forma equivocada da Alemanha), os diversos axiologismos, o realismo jurídico (que não passa de um “positivismo fático”), a ponderação de valores (pela qual o juiz literalmente escolhe um dos princípios que ele mesmo elege prima facie) etc. (STRECK, 2011, p. 31). Contudo, não restam dúvidas de que o Neoconstitucionalismo trouxe uma mudança de postura na elaboração das Constituições contemporâneas. Se no surgimento do movimento constitucionalista, no final do século XVIII, as Constituições limitavam-se a estabelecer regras atinentes à organização do Estado e do Poder, após a Segunda Neoconstitucionalismo | Conclusão www.cenes.com.br | 22 Guerra Mundial as Constituições inovaram com a inserção em seus textos de valores (dignidade da pessoa humana e direitos fundamentais). Esse fenômeno aprofundou a forma de se realizar a interpretação constitucional, fundamental para soluções de casos jurídicos decorrentes da complexidade da vida contemporânea, especialmente os já mencionados casos difíceis (situações para as quais não há soluções pré-prontas no ordenamento jurídico, exigindo a atuação criativa de juízes e tribunais). Assim, conforme exemplifica Luís Roberto Barroso, embora o modelo do constitucionalismo democrático tenha chegado com um certo atraso ao território brasileiro, não é tarde demais. O autor comente que: “As últimas três décadas representam não a vitória de uma Constituição específica, concreta, mas de uma ideia, de uma atitude diante da vida. O Estado constitucional democrático, que se consolidou entre nós, traduz não apenas um modo de ver o Estado e o Direito, mas de desejar o mundo, em busca de um tempo de justiça, liberdade e igualdade ampla” (BARROSO, 2018, p.283). Portanto, percebe-se que o ativismo judicial tem se manifestado como forma para atender as questões sociais não enfrentadas pelo processo legislativo, sobretudo as que envolvem assuntos de forte impacto religioso e moral. 6 Conclusão Nesta aula, compreendemos que o movimento constitucionalista pode ser dividido em várias etapas, de acordo com sua origem e fases, e que o chamado Neoconstitucionalismo é um movimento que tem origem na Europa, no contexto de pós-Segunda Guerra Mundial. Além disso, vimos que esse movimento busca concretizar a supremacia material e formal da Constituição, a partir da observação do princípio da dignidade humana, e percebemos que, além do critério hierárquico, esse movimento estabelece a Neoconstitucionalismo | Referências Bibliográficas www.cenes.com.br | 23 concretização material dos direitos fundamentais. Compreendemos também que uma parcela da doutrina constitucionalista faz críticas a essa nomenclatura – Neoconstitucionalismo –, afirmando que pode ser chamado, entre outros, de pós- positivismo. Para concluir, refletimos sobre a forma desregulada da utilização do princípio da dignidade humana para justificar a ampliação de direitos e o exercício de interpretação do judiciário. 7 Referências Bibliográficas BARROSO, L. R. Curso de direito constitucional contemporâneo: os conceitos fundamentais e a construção do novo modelo. 7 ed. São Paulo: Saraiva Educação, 2018. _______. Curso de direito constitucional contemporâneo. 2 ed. 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