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Anais da Academia Pernambucana de Ciência Agronômica, Recife, vol. 3, p.180-199, 2006. PRINCIPAIS DOENÇAS DO INHAME-DA-COSTA NO NORDESTE DO BRASIL ROMERO MARINHO DE MOURA Academia Pernambucana de Ciência Agronômica, Recife, Pernambuco. _______________ RESUMO PRINCIPAIS DOENÇAS DO INHAME-DA-COSTA NO NORDESTE DO BRASIL A presente revisão cuida das principais doenças do inhame da costa ocorrentes no Nordeste do Brasil. Após a apresentação da cultura, as doenças são descritas em seções de vírus, fungos nematóides e doenças abióticas. Cada doença é analisada do ponto vista da importância econômica, etiologia, distribuição geográfica e controle. Termos para indexação: Dioscorea cayennensis, doenças fúngicas do inhame, doenças do inhame causadas por nematóides, doenças abióticas do inhame. ABSTRACT PRINCIPALS DISEASES OF YAM IN THE NORTHEAST OF BRAZIL This review deals with the main white yam diseases occurring in the northeast of Brazil. After the description of the crop the diseases are described in sections of virus, fungi, nematodes and abiotic diseases. Each disease is analyzed on the point of view of economic importance, etiology, geographic distribution and control. Index terms: Dioscorea cayennensis, fungi diseases of the yam, nematodes diseases of yam, abiotic diseases of yam. 181 Anais da Academia Pernambucana de Ciência Agronômica, vol. 3, p.180-199, 2006. R.M. MOURA Ao Prof. Álvaro Alves da Silva (1908-1975) In memoriam Engenheiro Agrônomo, Álvaro Alves da Silva foi o grande pioneiro das pesquisas com inhame-da-costa (Dioscorea cayennensis Lam.) no Brasil. Suas ações tiveram início na antiga Escola Superior de Agricultura do Estado de Pernambuco, onde ocupou a Cátedra de Agricultura Especial, e no Instituto de Pesquisas Agronômicas (IPA), na qualidade de Pesquisador. Ambas instituições estão localizadas no Recife. Sempre contando com a participação de agricultores, as pesquisas do Dr. Álvaro proporcionaram, em 1960, a excelente publicação “Observações fenológicas em Dioscorea cayennensis Lam.”, nos Arquivos do Instituto de Pesquisas Agronômicas, S.A.I.C / PE, volume 5:117-199, que se transformou em fonte de consulta até os dias de hoje. Nele, o autor caracterizou as três fases de desenvolvimento da cultura, apresentou dados inéditos de antogenia e o relacionamento entre desenvolvimento da túbera e a formação da parte aérea, fato que em muito facilitou a colheita racional. Ainda na publicação, foram incluídas, ordenadamente, as informações fundamentais sobre a tecnologia geral de condução da cultura. Devido à demanda por exemplares, o Banco do Nordeste, principal responsável pelos financiamentos a produtores de inhame, reeditou a obra em forma de Boletim Técnico, em 1971. A atuação profissional desse cientista que, além do inhame, trabalhou com outras culturas, especialmente a batata-doce, o fez merecedor de posição de destaque no 182 Anais da Academia Pernambucana de Ciência Agronômica, vol. 3, p.180-199, 2006. PRINCIPAIS DOENÇAS DO INHAME-DA-COSTA... cenário que contempla aqueles que efetivamente contribuíram para o desenvolvimento das Ciências Agrárias no Brasil. 1. CONSIDERAÇÕES SOBRE A CULTURA DO INHAME O inhame (Dioscorea spp.), pertencente à família Dioscoreaceae, é alimento básico das populações de muitos países tropicais do oeste da África, especialmente Nigéria e Costa do Marfim, que produzem dois terços dos 20 milhões de toneladas anuais, que totaliza a produção mundial, obtida com produtividade potencial de 25 toneladas por hectare, em culturas bem conduzidas. No nordeste do Brasil, especialmente nos Estados da Paraíba, Pernambuco e Bahia, principais produtores nacionais de inhame para alimentação humana, são cultivadas as espécies D. cayennensis Lam. e D. alata L., com alta predominância da primeira (Santos, 1996). Camara Filho et al. (1967), no Estado de Pernambuco, foi pioneiro nas pesquisas do aproveitamento da farinha do inhame-da-costa na panificação. O Estado da Paraíba apresenta-se como o maior produtor nacional, com uma área de 7,5 mil hectares/ano e produção em torno de 89 mil toneladas. Dioscorea cayennensis possui uma única variedade de valor comercial no Brasil, conhecida vulgarmente por cará-da-costa, inhame-da-costa ou simplesmente inhame. Dioscorea alata possui duas: cará São Tomé e cará nambu, estas pouco cultivadas no Nordeste devido a alta susceptibilidade à doença requeima, epidêmica e de etiologia ainda desconhecida. São Paulo, Minas Gerais, Rio de Janeiro e Espírito Santo, são grandes cultivadores de São Tomé, onde é conhecida por cará, utilizado para consumo direto e industrializado (Alves, 2000). Segundo Mesquita (2001) e Camargo Filho et al. (2001), em 1990, a área de plantio naqueles estados era de 1.600 ha e a produção de aproximadamente 22 mil toneladas ano. Em 1999, a área plantada foi de 25 mil hectares com uma produtividade média de 9,729 kg/ha, verificando-se uma expansão de aproximadamente 1.000% naquele período. A produção continua crescente (Mascarenhas & Resende, 2002). A maior parte da produção de inhame-da-costa do Nordeste é encaminhada para o comércio interno e a outra parte, a de melhor qualidade comercial, para exportação, sendo os Estados Unidos, Reino Unido, Países Baixos, Canadá e França os principais importadores (Mesquita, 2002). Nas regiões Norte, Sul, Centro Sul, Oeste e Sudeste do Brasil, existem outras espécies de Dioscorea, quase todas utilizadas na farmacologia, por possuírem taninos, 183 Anais da Academia Pernambucana de Ciência Agronômica, vol. 3, p.180-199, 2006. R.M. MOURA alcalóides, substância alergênica, mucilagem e diosgenina, matéria-prima para síntese de esteróides Essas espécies, no entanto, não servem para alimentação humana (Pedralli, 1988). Nas regiões Sul e Centro-Sul do Brasil a espécie Colacasia esculenta (L.) Schott, família Araceae, que possui significativo valor comercial, também é denominada inhame ou taro e não deve ser confundida com as dioscoreaceas. A palavra inhame parece ser a vulgarização na língua portuguesa dos termos “yam” ou “igname”, usados originalmente nas colônias inglesas e francesas da África, respectivamente, enquanto cará, pela leitura de documentos portugueses do século XVII, mostra-se de origem tupi-guarani (ká-rá). No Nordeste há uma tendência para que o termo inhame seja aplicado as túberas do inhame-da-costa e cará as de D. alata. Por ocasião do I Congresso Nacional Sobre as Culturas do Inhame e Cará, em 2001, ficou estabelecido o uso da denominação inhame para todas as espécies de Dioscorea e taro para C. esculenta (Pedralli, 2002). As variedades comuns de cará, a exemplo do cará-moela, cará-doze-horas etc passaram a ser consideradas variedades de inhame. Nesta publicação será obedecida essa designação. Uma planta de inhame-da-costa pode produzir dois tipos de túberas: as comerciais, colhidas sete meses a partir do plantio, e as sementes conhecidas entre os agricultores do Nordeste por mamas, obtidas dois meses após a colheita das túberas-comerciais. Para produção de túberas-sementes, as comerciais são colhidas precocemente, aos quatro ou cinco meses de idade (Silva, 1971). Esse período varia em função do preço de mercado na época da colheita. O inhame-da-costa é um produto agrícola de alto valor comercial para os mercados interno e externo, sendo alimento rico em carboidratos e vitaminas do complexo B (Silva, 1971; Santos, 1996). As túberas-sementes são produzidas por número limitado de agricultores e poucos comandam a comercialização regional desse produto. Os problemas fitossanitários do inhame no Nordeste são os principais fatores limitantes da cultura, por diminuírem produtividade, ocasionarem perdas por deterioração biológica das túberas durante transporte e armazenamento, por reduzirem valor unitário no comércio interno e provocarem exclusões nas exportações. No Nordeste, a maioria dos plantadores de inhame são também produtores de cana- de-açúcar e na prática, após cada dois anos de plantio de inhame no mesmo local, ocorre sempresignificativa queda de produtividade. Como conseqüência, as áreas de inhame são substituídas por cana, em processo de rotação, passando o inhame para uma nova área, em geral anteriormente cultivada com cana. Os plantios de inhame no Nordeste ocupam pequenas áreas, nunca superiores a cinco hectares. 184 Anais da Academia Pernambucana de Ciência Agronômica, vol. 3, p.180-199, 2006. PRINCIPAIS DOENÇAS DO INHAME-DA-COSTA... 2. DOENÇA CAUSADA POR VÍRUS 2.1. Mosaico do inhame - yam mosaic virus (YMV) A bibliografia especializada relata a ocorrência do YMV, gênero Potyvirus, família Potyviridae, causando mosaico severo em espécies de Dioscorea, especialmente em D. cayennensis e D. rotundata, em países da África e Porto Rico, Thouvenel & Fauquet (1979), Adsuar( 1955). No Brasil, com freqüência, plantas de inhame-da-costa são vistas em áreas de produção com sintomas típicos de mosaico, sempre em folhas jovens, sem aparente interferência no desenvolvimento da planta. Esses sintomas não são visíveis após a maturação das folhas, quando assumem coloração verde- escura. No Brasil, estudos etiológicos desenvolvidos em plantas de Dioscorea spp., variedades Gibóia e Maresby (Ávila et al., 1982), portadoras de sintomas de mosaico, e em plantas de D. cayennensis var. da costa, pertencentes ao banco de germoplasna da EMBRAPA, mostraram presença de partículas do tipo potyvirus, indutores de mosaico. Exames rotineiros feitos por A.A. lima e colaboradores na Universidade Federal do Ceará também mostraram esses sinais da doença. Em trabalhos isolados, E. W. Kitajima, em 1995, á época virologista da Universidade de Brasília, analisando preparações para microscopia eletrônica e com a técnica de leaf dip, a partir de material coletado no Estado de Pernambuco, observou as mesmas inclusões lamelares citoplasmáticas, em secções ultrafinas (Kitajima, comunicação pessoal). Do ponto de vista epidemiológica, observações de Moura e colaboradores (dados não publicados) sobre severidade do mosaico em condições de campo no Nordeste permitiram concluir que o YMV não é o mesmo que ocorre na África, descrito originalmente na Costa do Marfim. Devido à baixa severidade que a doença tem apresentado, pôde-se admitir que no Nordeste ocorre uma estirpe de baixa virulência do patógeno, que não chega a afetar significativamente a produtividade. Pelas características do patógeno, que tem o poder de mutação, pode-se considerar o mosaico do inhame uma doença potencialmente importante. 185 Anais da Academia Pernambucana de Ciência Agronômica, vol. 3, p.180-199, 2006. R.M. MOURA 3. DOENÇAS CAUSADAS POR FUNGOS 3.1. Queima-das-folhas - Curvularia eragrostidis (P. Henn) Meyer A queima-das-folhas do inhame, também conhecida por queima, pinta-preta ou mesmo varíola, é uma doença de alta incidência e severidade em todas as áreas de produção de inhame-da-costa no Nordeste do Brasil. Trata-se de uma doença que provoca altas perdas em plantios irrigados e nos das águas, atingindo as mais altas severidades quando a doença incide sobre plantas jovens. Como conseqüência o controle preventivo é obrigatório em todos os sistemas de plantio, das águas e irrigado, e durante todo o ciclo da planta. Existe uma doença que limita o cultivo do inhame São Tomé no Nordeste, denominada requeima, de etiologia ainda desconhecida e sintomatologia típica, que não afeta o inhame-da-costa. A requeima se caracteriza por uma queima súbita de toda a planta, sem necroses isoladas. A queima das folhas e a requeima são doenças que não devem ser confundidas. Sintomas - O sintoma primário da queima-das-folhas é uma mancha necrótica, de coloração marrom-escuro, freqüentemente circundada por um halo amarelo. Essas manchas, que tendem para um formato circular, atingem, em média, 2 a 3 cm de diâmetro, sendo limitadas parcialmente pelas nervuras do limbo foliar. É comum coalescência de manchas, formando-se grandes áreas necrosadas. Em menor freqüência, ocorrem lesões nos pecíolos e nos ramos. Incidindo sobre plantas jovens, que possuem folhas em desenvolvimento, o crescimento da hospedeira é significativamente afetado e a presença de folhas necrosadas e retorcidas que se formam em seguida constituem um quadro típico de crestamento com nanismo. As perdas, nesses casos, são sempre elevadas. O sintoma secundário ou reflexo é o pequeno tamanho das túberas comerciais e das sementes. Em casos extremos de incidência e severidade, formam-se grandes áreas de plantas queimadas e mortas, com índices de perda que podem a atingir 100%. Etiologia – Os primeiros estudos sobre a etiologia da queima das folhas dos inhame-da-costa no Nordeste foram feitos por Medeiros & Nascimento (1964), quando descreveram no Estado de Pernambuco uma nova variedade do patógeno (Curvularia maculans, var. macrospora). Entretanto, após os estudos de Ellis (1966) o agente etiológico da queima-das-folhas passou à nova denominação Curvularia eragrostidis. Este organismo pode ser observado a partir de tecidos foliares necrosados, submetidos à câmara-úmida, quando, após 24-48 horas, forma-se grande quantidade de conidióforos com conídios. Em meio de cultura batata-dextrose-ágar, cresce 186 Anais da Academia Pernambucana de Ciência Agronômica, vol. 3, p.180-199, 2006. PRINCIPAIS DOENÇAS DO INHAME-DA-COSTA... vigorosamente, formando colônias circulares de aspecto cotonoso, de coloração negra. Nessas condições, os conidióforos possuem em média 521 por 6 µm de comprimento e largura, respectivamente (Ellis, 1966). Os conídios, que se dispersam com auxílio de ventos para o contato planta-planta e água de irrigação ou chuva, principalmente, para contato folha-folha, são ovóides, apresentando três septos, com um tipicamente mediano, quatro células, sendo as centrais de coloração marrom-escuro e as da extremidade mais claras. As dimensões variam de 26,3 + 1,0 mm por 16,3 + 0,7 ìm. Com freqüência, observam-se acérvulos do fungo Colletotrichum gloeosporioides Penz. associados às lesões de C. eragrostidis. Muito embora ocorra antracnose em D. alata no Brasil, e em outras espécies de Dioscorea em países da África, no Brasil, a patogenicidade de C. gloeosporioides em D. cayennensis nunca foi comprovada, o que leva a crer que se trata de um agente secundário em lesões provocadas por C. eragrostidis. Controle - Em todas as áreas de produção, independentemente da época do ano, tipo de cultivo e idade da planta, medidas preventivas contra a queima do inhame devem ser tomadas. Essas medidas, que devem ser iniciadas ao surgimento das primeiras lesões, são as práticas de pulverizações semanais com fungicidas, que podem ser quinzenais, em épocas secas (Moura et al. 1975). Nas áreas destinadas à produção de túberas-sementes, as pulverizações devem continuar por mais dois meses, após a colheita das túberas-comerciais. São indicados fungicidas à base de maneb, mancozeb e iprodione, em formulações de 0,2 a 0,3% dos produtos comerciais que contenham 80% de princípio ativo, sendo recomendado o uso de espalhante adesivo para aumentar tenacidade ou aderência do produto. A alternância de princípios ativos é importante para ser evitado surgimento de resistência do patógeno ao fungicida. 3.2. Podridão-verde - Penicillium sclerotigenum Yamamoto A podridão-verde do inhame é uma importante doença fúngica que ocorre durante armazenamento e transporte de túberas de D. cayennensis e D. alata, sendo a segunda mais resistente (Oliveira et al., 2005). O fungo penetra sempre através de ferimentos (Moura et. al, 1976), produzidos por ocasião da colheita e limpeza das túberas e também por lesões resultantes do parasitismo pelos fitonematóides. A doença é favorecida pelas condições de armazenamento que proporcionam altas temperaturas e umidade do ar, pouca ventilação e baixa luminosidade. Nas exportações, as perdas, muitas vezes, são elevadas, pois a umidade nos porões dos navios, associada às embalagens das túberas com papel e acondicionadas em caixas de papelão, criam 187 Anais da Academia Pernambucana de Ciência Agronômica, vol. 3, p.180-199,2006. R.M. MOURA condições de câmara-úmida que em muito favorecem as incidências e severidade da doença. Sintomas - O sintoma inicial da doença é uma mancha de aspecto úmido, superficial, de formato e dimensões variados, sempre associada a uma lesão da túbera. Aproximadamente dez dias após a penetração do patógeno, observam-se, sobre as lesões infectadas, sinais da doença, caracterizados pela presença de uma colônia fúngica, de coloração verde-escura, constituída por conidióforos e conídios do fungo. Cortando-se transversalmente a região afetada, nota-se, internamente, uma grande área necrosada, úmida, profunda, de coloração marrom-claro, que progride rapidamente e que destrói a túbera em poucos dias. Escarificando-se os tecidos necrosados, principalmente os já mumificados, encontra-se grande quantidade de pequenos escleródios esféricos ou sub esféricos. O plantio de túberas-sementes infectadas ocasiona estiolamento de pré ou pós-emergência, devido à destruição dos tecidos de reserva pelo fungo, antes da formação de um sistema radicular funcional. Esse replantio é feito 45 dias após o plantio, época em que o estiolamento é notado. O replantio irá ocasionar colheita de túberas-comercias imaturas, de sabor amargo e má cocção. Etiologia - A podridão-verde do inhame é causada pelo fungo Penicillium sclerotigenum havendo registro na África (Adeniji, 1969) da ocorrência da espécie P. oxalicum Currie & Thom associado à doença, fato ainda não constatado no Brasil (Oliveira et al., 2006). Observações de Oliveira (2005) com isolados do patógeno de diversas regiões do Brasil, em culturas puras, mostraram, em meio de czapek-ágar, colônias de crescimento rápido, micélio densamente entrelaçado, produzindo abundantes escleródios. O micélio é inicialmente esverdeado e depois cinéreo-oliváceo, com área alva sub marginal, sem exsudato, odor indistinto, difundindo pigmento no meio. Os conidióforos são frouxos ou densamente cespitosos, oriundos de micélio aéreo, que é septado e hialino. Os conídios apresentam-se em cadeias, com formato elipsóide e coloração amarelo-esverdeado ou pálido. Os escleródios são densamente gregários, globosos e sub globosos (Oliveira, 2005). O parasitismo de P. sclerotigenum em inhame ganha em importância por ser sabido que esse fungo é produtor das micotoxinas gregatinas, esclerotigenina e roquefortina tipos C e D e, in vitro, de patulina, muito tóxica ao homem, porém ainda não registrada no patossistema P. sclerotigenum-inhame (Frisvad & Samson, 2004). Esse fato merece maiores estudos, tendo em vista a alta variabilidade morfológica e fisiológica encontrada em isolados brasileiros (Oliveira, 2005). Em estudos de patogenicidade, P. sclerotigenum mostrou 188 Anais da Academia Pernambucana de Ciência Agronômica, vol. 3, p.180-199, 2006. PRINCIPAIS DOENÇAS DO INHAME-DA-COSTA... possuir poucos hospedeiros susceptíveis, entre os quais, além dos inhames da Costa, São Tomé e nanbu, a pêra, maçã, banana. O taro, batata-inglesa, berinjela e beterraba foram considerados moderadamente susceptíveis (Oliveira et al., 2006). Controle - Para o controle da doença deve-se evitar o principal fator de predisposição; os ferimentos das túberas. Essa condição pode ser obtida com técnicas mais adequadas de colheita e de limpeza, associadas ao controle dos fitonematóides. É recomendado também o tratamento químico, por imersão das túberas-comerciais e das sementes em solução fungicida à base de benomyl ou similar (Moura, 1985) ou thiabendazol, seguido de secagem ao ar, antes do armazenamento.Visando a redução do uso de fungicidas, estudos de controle biológico têm sido freqüentemente publicados, a exemplo de Okigbo & Ikediugwu (2000). Durante períodos chuvosos, não havendo disponibilidade de equipamento de secagem, esse tratamento deve ser evitado, pois o excesso de umidade proporciona amolecimento rápido das túberas, provavelmente pela hidrolise do amido, geralmente acompanhada pela desintegração da epiderme, surgindo infecções secundárias. Para a estocagem, o interior dos armazéns deve ser bem ventilado, com suficiente luminosidade, de modo a formar um ambiente de baixa umidade relativa do ar e temperaturas próximas a 25°C. O piso dos armazéns deve ser cimentado ou forrado com plástico. As túberas não devem ser empilhadas diretamente sobre o solo natural. Devem ser agrupadas em blocos isolados, permitindo-se circulação do ar entre os blocos e entre as túberas. Após cada período de colheita, o interior dos armazéns deve ser limpo com água sanitária (hipoclorito de sódio a 5%) e caiado. No preparo das túberas-sementes para plantio, devem-se eliminar totalmente os tecidos necrosados, mantendo-se o peso mínimo de 250 a 300 gramas (Silva, 1060). Uma segunda imersão por 1 minuto em solução de benomyl ou equivalente, momentos antes do plantio, é recomendada para redução de estiolamentos. A constatação da podridão-verde é feita com facilidade em armazéns, Centrais de Abastecimentos (CEASAS), supermercados e feiras-livres, durante o período de maio a agosto, quando ocorre maior umidade relativa do ar. Nos outros meses a ocorrência é baixa ou ausente. 3.3. Podridão-aquosa - Rhizopus oryzae Went & Prinsen Geerl. As áreas de produção de inhame-da-costa no Nordeste do Brasil localizam-se, preferencialmente, em solos de Tabuleiros Costeiros, nas vizinhanças das matas. São solos arenosos, com baixo teor de matéria orgânica e de fácil drenagem. Devido à presença freqüente de altos índices populacionais de fitonematóides nesses 189 Anais da Academia Pernambucana de Ciência Agronômica, vol. 3, p.180-199, 2006. R.M. MOURA agrossistemas, os produtores têm migrado para áreas de solos argilosos, desfavoráveis aos nematóides, porém de difícil drenagem. Túberas-comerciais no solo, submetidas a ambiente saturado de água, passam a apresentar uma podridão úmida, principalmente quando a colheita é retardada, formando-se túberas muito maduras, em épocas chuvosas. Nessas circunstâncias as perdas são sempre altas (Moura, 1987). Sintomas - O principal sintoma da doença é a podridão úmida que motivou a denominação da doença podridão-aquosa. Os sintomas são de dimensões variadas, observados especialmente em túberas-comerciais maduras, com mais de cinco meses, colhidas em solos com umidade acima ao da capacidade de campo. Como sintoma primário, a túbera doente, internamente, mostra tecidos afetados com a podridão- aquosa, profunda, de coloração rósea clara, típica da doença. Durante o armazenamento os sintomas progridem rapidamente, as túberas ficam amolecidas e úmidas e passam a exibir sinais da doença, constituídos por tufos de micélio alvo- cinério, acompanhados de abundante quantidade de esporângios com esporos. Etiologia - A podridão-aquosa do inhame é causada pelo fungo Rhizopus oryzae. Em meio de cultura batata-dextrose-ágar, esse fungo apresenta esporangióforos medindo 1225,70 ± 336,48 mm de comprimento e 14,90 ± 2,28 mm de largura, desenvolvidos sobre rizóides. Os esporângios medem 113,90 ± 30,95 mm de diâmetro e columela de 77,0 ± 15,87 mm. Existem diferenças morfométricas entre estruturas de R. oryzae obtidas diretamente de túberas daquelas obtidas em meios de cultura. Controle - O controle da podridão-aquosa do inhame é preventivo. Túberas infectadas não reagem ao tratamento químico por imersão, nem à seca ao ar. A incidência é minimizada por meio da colheita em época certa, evitando-se excesso de maturação, associando-se técnicas de drenagem. 3.4. Podridões fúngicas superficiais Túberas-comerciais de inhame portadoras de lesões são parasitadas por diversos fungos oportunistas, mas as lesões não se aprofundam ao modo das duas anteriores. Geralmente são vistos em lesões amplas, com abundante frutificações e conídios. Fazendo-se um corte abaixo das lesões, nota-se que as mesmas não vão além de 2- 5 centímetros de profundidade, e não possuem tonalidade característica que possa ser associada à presença de um determinado agente causal. Essa observação tem sido comprovada em testes de inoculação (Moura e colaboradores,resultados não publicados). Trata-se de podridões fúngicas superficiais que mesmo não induzindo 190 Anais da Academia Pernambucana de Ciência Agronômica, vol. 3, p.180-199, 2006. PRINCIPAIS DOENÇAS DO INHAME-DA-COSTA... perdas significativa de tecidos devem ser consideradas em estudos de micotoxinas. Diagnósticos errados podem ser obtidos quando nessas lesões encontra-se associado ao organismo oportunista o fungo P. sclerotigenum, agente da podridão-verde, que, às vezes, não chega a produzir conídios por antibiose, e, portanto, não pode ser notado, a não ser por isolamento. As recomendações feitas para controle da podridão-verde protegem as túberas contra as podridões fúngicas superficiais. Os fungos oportunistas mais comumente encontrados em lesões de inhame-da- costa, (MOURA, dados não publicados) são apresentados abaixo por ordem de freqüência: - Aspergillus niger Van Tiegh, - Botriodiplodia theobromae, Pat. - Rhizopus stolonifer (Enrenb.) Lind - Fusarium moliliforme Wollen & Reink - Fusarium sp. Muito embora esses fungos possam ser observados com facilidade em condições naturais, a constatação pode ser feita com mais facilidade quando fragmentos de túberas infectadas são colocados em câmara-úmida. Igualmente à podridão-verde, essas podridões podem ser encontradas em armazéns, CEASAS, super mercados, especialmente nos meses de maio a agosto, quando a umidade relativa do ar é alta. Nos demais meses as ocorrências tornam-se raras. 4. DOENÇAS CAUSADAS POR NEMATÓIDES 4.1. Casca-preta - Scutellonema bradys (Steiner & LeHew) Andrássy e Pratylenchus coffeae (Zimmermann) Filipjev & Stekhoven Referida na literatura inglesa como dry rot of yams, a casca-preta é, atualmente, o mais importante problema fitossanitário da cultura do inhame no Brasil, incidindo sobre túberas-comerciais e túberas-sementes. A importância desta doença é justificada pela constante disseminação do patógeno, proporcionada pela permanente comercialização de túberas-sementes contaminadas, pela pouca resistência das túberas infectadas ao transporte e armazenamento, e, principalmente, pelas dificuldades inerentes ao controle. Durante o armazenamento, túberas portadoras de sintomas de casca-preta perdem água rapidamente, murcham e ficam predispostas ao ataque de P. sclerotigenum causador da podridão-verde e dos microrganismos oportunistas, causadores de podridões superficiais. Quanto à comercialização, túberas portadoras 191 Anais da Academia Pernambucana de Ciência Agronômica, vol. 3, p.180-199, 2006. R.M. MOURA de sintomas são excluídas nas seleções para exportação e rejeitadas no comércio interno. Os altos índices populacionais do nematóide no solo, que se formam a cada três anos consecutivos de cultivo, numa mesma área, obrigam os agricultores a mudarem os locais de plantio. Parasitando também raízes de alimentação, os nematóides causadores da casca-preta induzem significativas reduções nas dimensões e conseqüentemente no peso das túberas. Sintomas. Nas túberas comerciais, durante os quatro primeiros meses de desenvolvimento, os sintomas externos da doença são discretos e de difícil observação. Nessa fase, notam-se, apenas, internamente, abaixo da cutícula, pequenos pontos de coloração amarela na periferia interna, ainda muito alva. Nesses nichos, encontram- se os fitonematóides em todos os estádios evolutivos, não havendo ainda necrose de tecidos. É provável que nessa fase de desenvolvimento, a túbera possua substância que retardam a invasão dos tecidos pelo patógeno. Muitos produtores aproveitam-se desse fato para colherem prematuramente as túberas-comerciais, as quais, entretanto, apresentam sabor amargo. A doença agrava-se após a colheita, no armazenamento, quando efetivamente se inicia a patogênese. Os nematóides invadem rapidamente os tecidos, momento em que, as túberas-comerciais passam a apresentar rachaduras e, internamente, áreas enegrecidas e secas, que se projetam de 2 a 4 cm de profundidade, agravando-se ao longo do período de armazenamento. Examinando- se esses tecidos necrosados, com auxílio de um micoscópio estereoscópico, constata- se sempre a presença de organismos secundários, tais como ácaros micófagos, fungos saprófitos, larvas de insetos e às vezes nematóides de vida livre, especialmente micófagos, todos associados a uma grande quantidade do fitonematóide causador da doença, em todas as fases de desenvolvimento; adultos, juvenis e ovos. Etiologia: A casca-preta do inhame no Brasil tem como agentes etiológicos o nematóide Pratylenchus coffeae e Scutellonema bradys (Moura et al., 1978; Moura & Monteiro, 1995), ambos endoparasitos migradores. As duas espécies induzem o mesmo grau de severidade à doença e praticamente a mesma sintomatologia. Não há registros de populações mistas e atualmente P. coffeae é a espécie prevalente (Moura et al., 2001). Pratylenchus brachyurus, considerado patogênico ao inhame na África, foi relatado associado à casca-preta do inhame-da-costa no Estado da Paraíba (Moura & Moura, 1989), não havendo novos assinalamentos. Scutellonema bradys possui reprodução sexuada, com machos e fêmeas ativos no parasitismo. Em média, os machos medem 0,9 mm de comprimento e as fêmeas 1,2. O estilete em ambos os sexos mede em média 23 ìm (Moura & Teixeira, 1980). Esta 192 Anais da Academia Pernambucana de Ciência Agronômica, vol. 3, p.180-199, 2006. PRINCIPAIS DOENÇAS DO INHAME-DA-COSTA... espécie possui poucos hospedeiros e na literatura inglesa é conhecido como the yam nematode. No Brasil S. bradys foi assinalado no inhame-da-costa e recentemente em D. alata, nesse caso no Estado de São Paulo (Moura, 2006). Pratylenchus coffeae é comparativamente bem menor do que S. bradys. Os machos medem em média 0,54 mm e as fêmeas 0,65 mm de comprimento. O estilete dos machos mede 17 ìm e das fêmeas 19. Esta espécie é mais polífaga do que S. bradys tendo sido assinalada em diversos hospedeiros no Brasil (Costa Manso et al., 1994; Moura, 2006). Controle - O controle da casca-preta fundamenta-se em técnicas de exclusão. O uso de túberas-sementes sadias, em solos livres de nematóides, é a solução. Essa prática, entretanto, está se tornando pouco viável pelas dificuldades na obtenção de túberas-sementes sadias. Atualmente, o emprego dos nematicidas fumigantes e sistêmicos não é recomendado para a cultura no Brasil por razões toxicológicas e econômicas. A desinfestação de áreas de plantio de inhame pode ser feita, por outro lado, pelo uso de plantas leguminosas antagônicas aos nematóides, tais como Crotalaria juncea L., por um período aproximado de dois anos, com incorporação. Alternância de C. juncea com mucuna-preta [Stizolobium aterrimum (Piper & Tracy) Holland], cada três meses, é o mais indicado. Além de melhorar significativamente a fertilidade do solo (Ambrosiano et al., 1997; Macedo & Botelho, 1995) essas plantas atraem os nematóides para suas raízes matando-os devido a presença de glicosídeos tóxicos. O cultivo dessa leguminosa deve ser feito com controle, pois as sementes e partes aéreas são reconhecidamente tóxicas às aves e ao gado em geral. A espécies Crotalaria spectabilis Roth, é a mais indicada para controle de nematóides, porém, nos experimentos, não se desenvolveu satisfatoriamente no nordeste brasileiro, existindo indicações de novas linhagens dessa antagônica que pode ser cultivada no Nordeste (Piraí Sementes, Piracicaba, informação pessoal). Rotação de culturas com plantas alimentícias ainda não se aplica ao caso devido a falta de informações sobre hospedeiras de S. bradys e P. coffeae na Região. Scutellonema bradys é importante parasito do feijão-de-corda, associação ainda não registrada no Brasil, e P. coffeae foi assinalado no Nordeste, além do inhame, em cafeeiro e gravioleira, causando significativas perdas (Moura, 2005). 193 Anais da Academia Pernambucana de Ciência Agronômica, vol. 3, p.180-199, 2006. R.M. MOURA 4.2. Meloidoginose - Meloidogyne incognita (Kofoid & White) Chitwood, Meloidogyne javanica (Treub) Chitwood, Meloidogyne arenaria (Neal) ChitwoodTúberas-comerciais, túberas-sementes e raízes de alimentação do inhame-da- costa são parasitadas por nematóides do gênero Meloidogyne Göeldi, referidos na literatura inglesa por root-knot nematode e na portuguesa nematóide das galhas de raízes. Em solos infestados, essa doença, quase sempre, induz significativas reduções na produtividade e no valor unitário das túberas-comerciais. Incidindo sobre muitas culturas, inclusive o inhame-da-costa, Meloidogyne spp. provocam a doença conhecida por meloidoginose, a qual, no nordeste do Brasil, é conhecida entre os agricultores por inhame bolbado, existindo a crença popular de que túberas portadoras dos tumores, que são típicos sintomas da doença, são maléficas à saúde humana e dos animais domésticos, o que não é verdade. No comércio interno, túberas parasitadas por Meloidogyne spp. têm o valor unitário reduzido em 50%, em média, e são excluídas nas seleções para exportação. É comum a ocorrência conjunta de meloidoginose com casca-preta, resultando efeitos aditivos severos, com altas reduções da produtividade. Esses organismos parasitam também as raízes de alimentação, reduzindo absorção de nutrientes, resultando em túberas-comerciais pequenas, consideradas refugo. Outras causas também podem responder pela produção de refugos. Sintomas - A meloidoginose do inhame apresenta sintomas típicos. Em primeiro lugar, observa-se acentuada produção de raízes superficiais sobre as túberas, muitas das quais portadoras de galhas. Quando sadias, túberas não possuem raízes superficiais. Retirando-se as raízes, o que é feito pelos agricultores, evidenciam-se, grandes tumores, de dimensões variadas, onde se localizam fêmeas adultas, massas de ovos, formas juvenis e poucos machos. Por meio de uma análise histopatológica de tumores, observa-se que a região anterior do corpo das fêmeas adultas, que são sedentárias, é sempre rodeada por um grupo de células diferenciadas, de grandes dimensões em relação às normais, contendo muitos núcleos. Essas células, que acumulam açúcares, proteínas, ácidos orgânicos e fatores de crescimento, são as fontes de alimento do nematóide e são chamadas de células gigantes. Também, no mesmo tipo de exame, constata-se a presença de tecidos corticosos envolvendo os corpos das fêmeas e das massas de ovos. Esses tecidos formam-se em resposta à infecção e as túberas passam a apresentar consistência fibrosa, ruim para alimentação (Moura & Freitas, 1983). Os machos têm vida efêmera, não copulam, não se alimentam 194 Anais da Academia Pernambucana de Ciência Agronômica, vol. 3, p.180-199, 2006. PRINCIPAIS DOENÇAS DO INHAME-DA-COSTA... e a maioria migra para o solo, onde morrem. As espécies ocorrentes no Nordeste associadas ao inhame têm reprodução assexuada, por partenogênese. Etiologia - A meloidoginose do inhame tem como agente etiológico o nematóide endoparasito sedentário pertencente ao gênero Meloidogyne. No Brasil já foram assinaladas em D. cayennensis as espécies M. incognita, M. javanica e M. arenaria, com grande predominância das duas primeiras. A identificação das espécies do gênero Meloidogyne fundamenta-se no modelo da configuração perineal de fêmeas adultas e padrões de isoenzimas, obtidos por eletroforese. Mesmo apresentando machos e fêmeas, essas espécies reproduzem-se por partenogênese. O gênero Meloidogyne possui acentuado dimorfismo sexual, com fêmeas sedentárias piriformes e machos e juvenis migrantes vermiformes. As fêmeas apresentam em média 400 x 700 mm, os machos 1.400 x 30 mm e as formas juvenis 400 x 15 mm de comprimento e largura, respectivamente. Controle Ingualmente à casca-preta, o uso de túberas-sementes sadias, plantadas em solos isentos do nematóide, é a técnica ideal de controle. Para solos infestados, indica-se o uso de culturas antagônicas, no mesmo sistema indicado para controle da casca-preta. Não há cultivares de D. cayennensis no Brasil resistentes ao nematóide das galhas e o uso de nematicidas não é recomendado por razões toxicológicas e econômicas. A rotação de culturas é prejudicada nas áreas onde ocorrem mais de uma espécie do nematóide, por se tornar difícil a escolha de um vegetal imune ou resistente a duas espécies ocorrentes num mesmo local. No Brasil, a meloidoginose ainda não foi assinalada em D. alata. 4.3. Outros nematóides encontrados associados ao inhame Levantamento recente (Moura, 2006) revelou que outros fitonematóides patogênicos a outras culturas encontram-se associados à cultura do inhame-da-costa no Estado de Pernambuco, especialmente alguns que estão presentes em campos de cultura da cana-de-açúcar. A rotatividade envolvendo áreas de inhame com cana fazem com que esses organismos permaneçam no campo parasitando ambas culturas, que são igualmente hospedeiras (Moura, 2006). No momento não há uma avaliação da importância desses organismos para o inhame-da-costa no Nordeste, muito embora dados da literatura internacional mostrem que o nematóide reniforme pode causar sérios danos à cultura (Acosta & Ayala, 1975). Os nematóides encontrados foram os seguintes: - Rotylenchulus reniformis Linford & Oliveira – nematóide reniforme 195 Anais da Academia Pernambucana de Ciência Agronômica, vol. 3, p.180-199, 2006. R.M. MOURA - Helicotylenchus dihystera (Cobb) Sher - nematóide espiralado - Criconemella ornata (Raski) De Grisse & Loof – nematóide anelado. 5. DOENÇAS ABIÓTICAS Por ocasião da colheita do inhame-da-costa, são encontradas com freqüência túberas-comerciais anormais, sendo comuns três tipos: túbera em forma de pés, tubéras gigantes, com 5 a 8 ou mais quilos e túbera oca. Nos dois primeiros casos, as túberas não são comercializadas por possuírem sabor amargo. A ocorrência de até 3% da colheita com essas formações são considerados normais pelos agricultores. Não se sabe ao certo a causa dessas anomalias. Existem teorias e crendices sobre os inhames em forma de pés, que pode estar associado à textura do solo e o gigantismo ao desequilíbrio nutricional entre micro nutrientes. Nunca foram registradas ocorrências significativas dessas formações em plantios comerciais. A anomalia conhecida pelos agricultores por de inhame oco, ou coração oco, também não tem causa determinada experimentalmente. Acredita-se que a passagem de um estádio de muita umidade do solo para uma de muita secura possa ocasionalmente provocar esse fenômeno, caracterizado, por uma grande cavidade interna, revestida por uma camada de tecidos corticosos. Aparentemente, as túberas parecem normais e por isso são comercializadas. Em casa, o consumidor não consegue consumi-la. A última doença abiótica que afeta túberas-comerciais é aquela que os agricultores denominam ombro-verde, ou seja, a coloração verde, cor de folha, na parte basal da túbera, abaixo da epiderme. A causa dessa anomalia é o acúmulo de clorofila pela exposição da parte basal da túbera aos raios solares, quando ainda em desenvolvimento, devido ao que os agricultores chamam cova-rasa. O problema pode ser evitado juntando-se terra ao pé das plantas. Possuidoras desse sintoma, as túberas mostram-se com forte sabor amargo, muito embora possam parecer em boas condições para o consumo e por isso são comercializadas. Não foram encontradas referências bibliográficas sobre este assunto. Existe uma enfermidade que afeta o inhame-da-costa, que induz sintomatologia típica, lembrando virose, conhecida por folhagem miúda. Trata-se de uma patologia de ocorrência esporádica. As plantas crescem desordenadamente, com folhas muito miúdas, semelhante à enxerto-de-passarinho, doença causada por um fanerógamo parasito de algumas plantas superiores. Esse problema não possui causa determinada, 196 Anais da Academia Pernambucana de Ciência Agronômica, vol. 3, p.180-199, 2006. PRINCIPAIS DOENÇAS DO INHAME-DA-COSTA... sendo de ocorrência esporádica. Nunca foi encontrado um microrganismo ou vírus em associação constante com esta síndrome. 6. AGRADECIMENTOS Sou reconhecidamente grato a diversas pessoas e instituições que foram de grande importância ao longo dos muitos anosem que minhas pesquisas com inhame desenvolveram-se. Inicialmente, ao Eng. Agrônomo Álvaro Alves da Silva, primeiro a me mostrar um campo de produção de inhame, pedindo na ocasião para que me dedicasse ao estudo das doenças da cultura, à época praticamente desconhecidas. Suas lições foram preciosas. Ao Eng. Agro. Rivaldo das Chagas Mafra, com o qual muito aprendi. Foi companheiro de trabalhos e pesquisas com o inhame em condições de campo. Poucos conhecem as técnicas de cultivo dessa dioscoreaceae igual a ele. A diversos alunos do Programa de Pós-Graduação em Fitossanidade que fizeram dissertação com inhame-da-costa sob minha orientação, trazendo sempre novas informações. Ao competente e fiel amigo, Laboratorista Maurício Estolano Alves de Macedo, cujo apoio foi imprescindível. Aos destacados produtores de inhame-da- costa Eng. Agrônomos Luiz Gonzaga Xavier e Hidelbrado Xavier, que, com freqüência, cederam áreas infestadas por patógenos para pesquisas de controle, dando também hospitalidade, material de campo e trabalhadores em sua propriedade Engenho Várzea Grande, em Condado, Pernambuco. Finalmente ao Conselho Nacional de Pesquisa (CNPq) por diversas formas de apoio financeiro extensivo à Universidade Federal Rural de Pernambuco (UFRPE) onde trabalhei. 7. REFERÊNCIAS BIBLIOGRAFIAS ALVES, R. M. Caracterização de ingredientes obtidos de cará (Dioscorea alata), por moagem úmida e seca, e proposta de aplicações na indústria de alimentos. Londrina. Tese de doutorado, em Ciências de Alimentos. Universidade Estadual de Londrina. 2000. ACOSTA, N.A. & AYALA, A. Pathogenicity of Pratylenchus coffeae, Scutellonema bradys, Meloidogyne incognita and Rotylenchulus reniformis on Dioscorea rotundata. J. Nematol. 7: 1-15. 1975. ADENIJI, M.O. Fungi associated with storage decay of yam in Nigeria. 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