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<p>1</p><p>JUSTIÇA RESTAURATIVA: PREMISSAS BÁSICAS E PRESSUPOSTOS</p><p>ESTRUTURANTES1</p><p>Célia Passos2</p><p>As polarizações estão presentes em todas as áreas da vida e, no âmbito da</p><p>Justiça Restaurativa e de suas práticas, não é diferente.</p><p>Observando este fenômeno algumas vezes, em ambientes comprometidos</p><p>com a Cultura de Paz, passei a estudar os temas em que se situam fortes</p><p>polarizações e, minha primeira iniciativa, foi compreender o campo das religiões,</p><p>cujos objetivos e finalidades deveriam ultimar: tornar as pessoas melhores.</p><p>A experiência ultrapassou os contornos da referida disciplina, promovendo</p><p>poderosas premissas para uma melhor compreensão da Justiça e das Práticas</p><p>Restaurativas, as quais passo a descrever a seguir.</p><p>Do Curso Religious Literacy (Alfabetização Religiosa), em que mergulhei nas</p><p>mais variadas religiões e suas escrituras, encontrei três afirmações, premissas ou</p><p>princípios que me pareceram deveras apropriadas à melhor compreensão da Justiça</p><p>Restaurativa, sendo, na minha opinião, bons pontos de partida para dissidências,</p><p>polarizações e conflitos nesta área.</p><p>1. A primeira premissa reza que “As religiões são internamente</p><p>diversas” e sua equivalente na Justiça Restaurativa pode ser: a Justiça</p><p>Restaurativa e suas práticas são internamente diversas.</p><p>Não temos unanimidade em nenhuma escola, metodologia (caminho), método</p><p>(modo, ações específicas). No Brasil temos coisas nominadas como iguais</p><p>diferentes entre si. Coisas tidas por iguais com diferentes interpretações e,</p><p>consequentemente, compreensões. Em decorrência há uma variedade de tons e</p><p>matizes para os discursos e as práticas. Nem todos entendem da mesma maneira e</p><p>as falas generalizantes não representam a todos dentro de uma categoria.</p><p>2. A segunda premissa sustenta que “As religiões evoluem e mudam” e</p><p>sua equivalente na Justiça Restaurativa corresponde a pensar a Justiça</p><p>Restaurativa como algo vivo e pulsante que se transforma – evolui e se</p><p>desenvolve ao longo do tempo.</p><p>A Justiça Restaurativa hoje difere muito do que foi pensado e cogitado anos</p><p>atrás. Ela ganha, a cada momento, a cada experiência, a cada vivência social, novas</p><p>cores, novos matizes, novos desafios, novas percepções, abordagens e aplicações.</p><p>Se antes a JR estava restrita a ampliação dos repertórios de resposta aos atos</p><p>danosos, hoje ela é instada a um modo de ser, estar e conviver no mundo. É mais</p><p>extensa. Ganhou maior alcance. É influenciada, influencia e interfere nas questões</p><p>(leiam-se violências culturais/simbólicas/ideológicas e estruturais), demandando,</p><p>portanto, uma abertura maior por parte daqueles que a ela se dedicam e, acima de</p><p>tudo, exigindo congruência de todos no pensar e no agir.</p><p>1 Disponível em:</p><p>https://www.academia.edu/89201085/JUSTI%C3%87A_RESTAURATIVA_PREMISSAS_B%C3%81SICAS_E_PRESS</p><p>UPOSTOS_ESTRUTURANTES?email_work_card=view-paper.</p><p>2 Advogada com PhD, Mediadora, Facilitadora e fundadora do ISA-ADRS, Mediação e Processos Negociais. Conta com</p><p>formação ampla em Direito e Psicanalítica, em Terapia de Exposição Narrativa (NET). É doutora em Psicologia Social pela</p><p>Univerdade do Estado do Rio de Janeiro e Centro de Estudos Sociais da Faculdade de Economia da Universidade de</p><p>Coimbra. Mestre em Direito e Socociologia pela Universidade Federal Fluminense. Mestre em Estudos Avançados em</p><p>Mediação e Diploma Universitário em Mediação pel Institut Universitaire Kurt Bosch, Suíça de Argentina. MBA Empresarial</p><p>pela Fundação Dom Cabral e Post MBA pela FDC-Kellog School of Managment, Chicado.</p><p>2</p><p>3. A terceira premissa orienta para o fato de que “As influências</p><p>religiosas estão embebidas de todos os aspectos da experiência humana e sua</p><p>equivalente na Justiça Restaurativa conduz ao reconhecimento de que a</p><p>Justiça Restaurativa está embebida de todos os aspectos da experiência</p><p>humana.</p><p>Inspirada em Donna Haraway e na definição dela do ser humano como</p><p>alguém situado "situatedness" (o ser humano é situado, contextualizado) parece</p><p>importante reconhecer que somos forjados pelos nossos contextos culturais. O lugar</p><p>histórico, bem como aspectos culturais, sociais e políticos são pontos de partida para</p><p>a afirmação do conhecimento. São estes aspectos que moldam a perspectiva de</p><p>cada pessoa. São as nossas interações e experiências que moldam o nosso caráter</p><p>e as nossas percepções. Sofremos influências e influenciamos os contextos,</p><p>conforme as nossas concepções, logo, respondemos às questões da vida de acordo</p><p>com a nossa história de vida.</p><p>As premissas impelem a pensar que não por outra razão somos</p><p>constantemente convidados a revisitar os nossos antecedentes, nossos contextos,</p><p>para pôr em xeque as nossas convicções, tornando-se necessário verificar, com</p><p>frequência, com quais filtros nos conectarmos (ou não), com as demais pessoas.</p><p>Parece muito importante aceitar o convite à reflexão cotidiana sobre “como os</p><p>princípios e valores da JR se articulam com minha visão de mundo e postura na</p><p>vida?” Algumas surpresas podem aparecer. Algumas incongruências podem se</p><p>manifestar. Essas reflexões nos ajudam a incorporar algumas percepções tais como:</p><p>há coisas em mim que eu não enxergo e os outros enxergam, e há coisas em mim</p><p>que os outros não enxergam e eu enxergo, e isso acontece com todas as pessoas.</p><p>Sendo assim, é absolutamente imperiosa a necessidade do diálogo, da abertura, do</p><p>estabelecimento de relações respeitosas, atentas e inclusivas, que não demandem</p><p>resistências para eu manter a minha identidade.</p><p>David Bohn (2005), ensina em seu livro Diálogo – comunicação e redes de</p><p>convivência, que o diálogo é um processo multifacetado que ultrapassa em muito as</p><p>noções teóricas do linguajar e do intercâmbio coloquiais. Para ele, o diálogo é um</p><p>modo (método) que examina um âmbito extraordinariamente amplo da experiência</p><p>humana: nossos valores, mais intimamente arraigados, “a natureza e a intensidade”</p><p>de nossas emoções, o padrão dos nossos processos de pensamento; a função da</p><p>memória (e aqui é interessante compreender que a memória é, também, seletiva), a</p><p>importância dos mitos culturais que passam de geração a geração, entre outros</p><p>aspectos.</p><p>Na perspectiva de Bohn, diálogo significa (dia) através e (logos) palavra ou</p><p>significado da palavra, sugerindo uma “corrente de significados” que flui entre as e</p><p>através das pessoas. E, como todos temos pressupostos básicos (opiniões)</p><p>construídos conforme visto acima, um bom diálogo pressupõe penetrar no processo</p><p>do pensamento e não apenas no conteúdo. As opiniões, ainda sob a perspectiva de</p><p>Bohn, são o resultado de pensamentos passados, ou seja, é o resultado da</p><p>experiência humana. Opiniões são, por serem tão embricadas com a experiência de</p><p>vida da pessoa, experienciadas como verdades com as quais as pessoas são</p><p>identificadas. Por conseguinte, tais ideias ou opiniões tendem a ser defendidas, pois</p><p>os ataques são, na percepção da pessoa, ataques à sua própria pessoa, à sua</p><p>identidade.</p><p>Nos grupos é comum encontrarmos diferentes pressupostos e opiniões</p><p>distintas das dos demais, pois são pautadas em culturas (e subculturas) que diferem</p><p>umas das outras, já que cada qual tem e vem de diferentes situações econômicas,</p><p>3</p><p>sociais, culturais, religiosas etc., conforme visto anteriormente. A defesa</p><p>inconscientemente do processo de formação do pensamento, base para as opiniões</p><p>e pressupostos básicos (pensamento estruturante), não produz espaço para o</p><p>diálogo e nem propicia mudanças.</p><p>Em um diálogo há um movimento coerente de pensamento e comunicação e,</p><p>quando se consegue suspender as ideias prévias (suspensão dos pressupostos</p><p>básicos e pensamentos estruturantes) abre-se a possibilidade da divergência, da</p><p>apreciação dos pressupostos de cada um, do processo do pensamento – e, alguns</p><p>insights conduzirão à liberdade. A liberdade possibilita, por sua vez, a liberação, a</p><p>possibilidade de fazer novas escolhas, de definir novas ordens.</p><p>Só se altera um padrão pelo esforço pessoal continuado que, em nosso caso</p><p>pode ser traduzido como muito e persistente exercício</p><p>dialógico. As mudanças</p><p>verdadeiras são construções estruturantes, para além dos confrontos de ideias. Por</p><p>essa razão, as tentativas de convencimentos, essas insistências na mudança de</p><p>pensamento a partir do conteúdo (e não do processo de construção do pensamento)</p><p>criam, em regra, mais barreiras e ainda maiores resistências. Parece que, somente</p><p>quando compreendemos para além dos conteúdos dos pensamentos, quando nos</p><p>fortalecemos e cultivamos a nossa presença podemos manter a nossa firmeza e</p><p>exercer a nossa sensibilidade, mesmo nos ambientes mais confusos.</p><p>Essas parecem ser algumas das condições para transformações conscientes</p><p>na geometria dos relacionamentos humanos. Não basta, portanto, a comunicação, é</p><p>necessária a capacidade de deixar o diálogo fluir “entre” as pessoas a cada “átimo”.</p><p>E, por ser no “entre” que a vida acontece, é, certamente, no “entre” que as</p><p>transformações se tornam uma realidade.</p><p>Referências</p><p>BOHN, David. Diálogo – comunicação e redes de convivência. São Paulo. Palas Athena,</p><p>2005.</p><p>PASSOS. Celia. Justiça Restaurativa: seus movimentos e suas ondas. ISA-ADRS. Rio de</p><p>Janeiro, 2020.</p><p>MOORE, Diane L. Religious Literacy: Traditions and Scriptures. Harvard edX, exposição oral.</p><p>26 de agosto de 2020.</p>

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