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<p>Planejamento da produção de</p><p>cana-de-açúcar no contexto</p><p>das mudanças climáticas</p><p>globais</p><p>Jurandir Zullo Junior</p><p>André Tosi Furtado</p><p>Claudia Castellanos Pfeiffer</p><p>(orgs.)</p><p>SciELO Books / SciELO Livros / SciELO Libros</p><p>ZULLO JUNIOR, J., FURTADO, A.T., and PFEIFFER, C.C., eds.</p><p>Planejamento da produção de cana-de-açúcar no contexto das</p><p>mudanças climáticas globais [online]. Campinas, SP: Editora da</p><p>Unicamp, 2016. ISBN: 978-85-268-1499-8.</p><p>https://doi.org/10.7476/9788526814998.</p><p>https://doi.org/10.7476/9788526814998</p><p>UNIVERSIDADE ESTADUAL DE CAMPINAS</p><p>Reitor</p><p>JOSÉ TADEU JORGE</p><p>Coordenador Geral da Universidade</p><p>ALVARO PENTEADO CRÓSTA</p><p>Conselho Editorial</p><p>Presidente</p><p>EDUARDO GUIMARÃES</p><p>ELINTON ADAMI CHAIM – ESDRAS RODRIGUES SILVA</p><p>GUITA GRIN DEBERT – JULIO CESAR HADLER NETO</p><p>LUIZ FRANCISCO DIAS – MARCO AURÉLIO CREMASCO</p><p>RICARDO ANTUNES – SEDI HIRANO</p><p>UNICAMP ANO 50</p><p>Comissão Editorial</p><p>ITALA M. LOFFREDO D’OTTAVIANO</p><p>EDUARDO GUIMARÃES</p><p>Jurandir Zullo Junior</p><p>André Tosi Furtado</p><p>Claudia Castellanos Pfeiffer</p><p>(Orgs.)</p><p>Planejamento da produção de</p><p>cana-de-açúcar no contexto</p><p>das mudanças climáticas</p><p>globais</p><p>Grafia atualizada segundo o Acordo Ortográfico da Língua</p><p>Portuguesa de 1990. Em vigor no Brasil a partir de 2009.</p><p>FICHA CATALOGRÁFICA ELABORADA PELO SISTEMA DE</p><p>BIBLIOTECAS DA UNICAMP DIRETORIA DE TRATAMENTO DA</p><p>INFORMAÇÃO</p><p>Bibliotecária: Maria Lúcia Nery Dutra de Castro – CRB-8a / 1724</p><p>P693</p><p>Planejamento da produção de cana-de-açúcar no</p><p>contexto das mudanças climáticas globais [livro</p><p>eletrônico]/ organização: Jurandir Zullo Junior,</p><p>André Tosi Furtado, Claudia Castellanos Pfeiffer. –</p><p>Campinas, sp: Editora da Unicamp, 2016.</p><p>16229 Kb; ePUB</p><p>1. Mudanças climáticas. 2. Cana-de-açúcar –</p><p>Produção. 3. Políticas públicas. I. Zullo Junior,</p><p>Jurandir. II. Furtado, André Tosi. III. Pfeiffer, Claudia</p><p>Castellanos. IV. Título.</p><p>CDD -551.6</p><p>- 633.61</p><p>- 352</p><p>ISBN 978-85-268-1499-8</p><p>Copyright © by organizadores</p><p>Copyright © 2016 by Editora da Unicamp</p><p>Direitos reservados e protegidos pela lei 9.610 de 19.2.1998. É</p><p>proibida a reprodução total ou parcial sem autorização, por escrito,</p><p>dos detentores dos direitos.</p><p>Printed in Brazil.</p><p>Foi feito o depósito legal.</p><p>Direitos reservados à</p><p>Editora da Unicamp</p><p>Rua Caio Graco Prado, 50 – Campus Unicamp</p><p>CEP 13083-892 – Campinas – SP – Brasil</p><p>Tel./Fax: (19) 3521-7718/7728</p><p>www.editoraunicamp.com.br – vendas@editora.unicamp.br</p><p>Versão digital: setembro de 2019</p><p>http://www.editoraunicamp.com.br/</p><p>mailto:vendas@editora.unicamp.br</p><p>Table of Contents / Sumário /</p><p>Tabla de Contenido</p><p>Front Matter / Elementos Pré-textuais / Páginas Iniciales</p><p>Prefácio</p><p>Apresentação</p><p>Parte 1 - Divulgação científica na área de mudanças climáticas</p><p>e construção de tecnologias científicas e sociais</p><p>Introdução</p><p>1. Informações meteorológicas customizadas para uso na</p><p>agricultura: análise do sistema de monitoramento</p><p>agrometeorológico agritempo</p><p>2. Idealização do website de divulgação científica do</p><p>projeto alcscens</p><p>3. Por outros universos sensíveis… vida e tempo</p><p>proliferam (em) rasgos</p><p>4. As mudanças climáticas divulgadas – instrumentos</p><p>políticos de circulação da ciência</p><p>Parte 2 - Impactos das mudanças climáticas na agricultura e os</p><p>sistemas de previsão de safras da cultura da cana-de-açúcar</p><p>Introdução</p><p>5. Sensoriamento remoto aplicado à previsão e</p><p>monitoramento de safras da cana-de-açúcar</p><p>6. Modelos climáticos: uma revisão da modelagem</p><p>numérica</p><p>7. Climatologia das projeções do modelo eta/cptec de</p><p>mudanças climáticas para o estado de são paulo</p><p>Parte 3 - Conjuntura recente do setor sucroenergético</p><p>brasileiro: crise, expansão da produção, dinâmica demográfica</p><p>e perspectivas da cana-de-açúcar frente às mudanças</p><p>climáticas</p><p>Introdução</p><p>8. Situação e perspectivas do setor sucroenergético</p><p>paulista frente aos cenários macroeconômicos e de</p><p>mudanças climáticas</p><p>9. Uma análise sobre a expansão recente e a ocupação</p><p>de novas áreas pela produção de cana-de-açúcar no</p><p>centro-oeste</p><p>10. Panorama sociodemográfico das regiões</p><p>sucroalcooleiras do estado de são paulo a partir de 1990</p><p>11. Um mar de cana: expansão regional e migração em</p><p>são paulo</p><p>Parte 4 - Impactos da inovação para o atendimento das</p><p>demandas futuras do etanol e na adaptação setorial às</p><p>mudanças climáticas</p><p>Introdução</p><p>12. Geração e difusão de tecnologias para a produção de</p><p>cana-de-açúcar no brasil: uma análise dos programas de</p><p>melhoramento genético</p><p>13. Compreensão da estrutura genética e genômica da</p><p>cana-de-açúcar e seu impacto no melhoramento da</p><p>espécie</p><p>14. Desafios para a adaptação da produção de cana-de-</p><p>açúcar no brasil às mudanças climáticas globais</p><p>Parte 5 - Geração de cenários de impactos de mudanças</p><p>climáticas no setor sucroenergético</p><p>Introdução</p><p>15. Riscos climáticos e a importância do planejamento no</p><p>setor sucroenergético em um contexto de mudanças</p><p>climáticas</p><p>16. Cenários de disponibilidade de terras para expansão</p><p>canavieira na região centro-sul brasileira em condições de</p><p>mudanças climáticas</p><p>17. Comportamento transnivelar de forças promotoras de</p><p>mudanças climáticas da paisagem: um monitoramento</p><p>sobre o sistema socioecológico complexo cana-cerrado</p><p>Posfácio – Breves apontamentos para políticas públicas</p><p>Prefácio</p><p>Eduardo Delgado Assad</p><p>Pesquisador da Embrapa</p><p>O livro Planejamento da produção de cana-de-açúcar no contexto</p><p>das mudanças climáticas globais mostra claramente que é possível</p><p>contextualizar esse complexo tema em associação com diferentes</p><p>disciplinas. Alguns anos atrás, numa discussão com um colega com</p><p>posições céticas a respeito do aquecimento global, ele me disse que</p><p>em pouco tempo esse assunto estaria em “desuso e fora de moda”,</p><p>sendo esquecido por todos. Concordei em parte com relação à</p><p>visibilidade que o tema tinha tomado e disse que talvez pudesse ser</p><p>esquecido, porque seria tão importante para a sobrevivência</p><p>humana que não se falaria mais no assunto, e sim, procuraríamos</p><p>uma maneira de deixá-lo completamente incorporado nas nossas</p><p>vidas, buscando formas e soluções para minimizar os graves</p><p>impactos que as mudanças climáticas podem trazer para a vida</p><p>humana.</p><p>O Brasil viveu momentos como esse na sua história, quando da</p><p>existência da febre amarela. Hoje não se discute mais. Combate-se</p><p>a febre amarela. Os brasileiros são os mais preocupados com o</p><p>clima entre populações de 40 países; é o que mostra a pesquisa de</p><p>opinião realizada com 45 mil pessoas em todos os continentes: 86%</p><p>da população nacional acredita que a mudança climática “é um</p><p>problema muito sério”. Muito acima da média global, de 54%, e</p><p>superior à preocupação dos dois países que mais poluem no</p><p>mundo: Estados Unidos (45%) e China (18%, o pior percentual da</p><p>pesquisa), acima de nações desenvolvidas, como Reino Unido</p><p>(41%), Alemanha (55%) e Japão (45%).</p><p>Nesta década o Brasil sofreu e continua sendo afetado por</p><p>extremos climáticos classificados como “eventos do século”, com</p><p>grandes impactos na economia e nos ecossistemas. Somente</p><p>considerando a Seca do Nordeste do Brasil de 2014-2015, a</p><p>Munich-Re, a mais antiga companhia de resseguros da Alemanha,</p><p>avaliou que essa seca é o quinto desastre natural mais custoso no</p><p>mundo em 2014, com perdas estimadas em 5 bilhões de dólares</p><p>americanos. O Brasil é vulnerável aos extremos da variabilidade do</p><p>clima no presente, e a situação pode piorar no futuro, devido ao</p><p>aquecimento global, que tem impactos regionalmente diferentes.</p><p>Questões como saúde humana, segurança alimentar, segurança</p><p>hídrica, impactos nas cidades são discutidas cada vez mais</p><p>detalhadamente. É impressionante o avanço científico ocorrido nas</p><p>ciências atmosféricas e nos estudos climatológicos em todo o globo.</p><p>A situação exigida é que esses temas deixem de ser discutidos com</p><p>a linguagem árida da ciência e cheguem à população. A questão</p><p>principal não é mais saber se o planeta está aquecendo ou não. No</p><p>momento em que todos os países do mundo assinam um acordo</p><p>para tentar reduzir as emissões de gases de efeito estufa na CPO21</p><p>em Paris, as quais têm relação direta com o aquecimento global,</p><p>não é preciso provar se o fenômeno está acontecendo ou não. O</p><p>importante agora é saber como conviver com as mudanças</p><p>atuando no setor agropecuário, através de um processo de</p><p>transformação de dados em informação meteorológica confiável,</p><p>com cobertura para todo o território nacional, apresentada na forma</p><p>de mapas e tabelas. O lançamento de uma nova versão, com</p><p>plataforma mais atualizada e adaptada ao contexto atual da web,</p><p>vem completar esse processo de customização de informações</p><p>agrometeorológicas para o setor agrícola.</p><p>Referências bibliográficas</p><p>AGRITEMPO, 2014. Sistema de Monitoramento Agrometeorológico.</p><p>Disponível em: <http://www.agritempo.gov.br>, acesso em:</p><p>22/8/2014.</p><p>AMATO, G. C. & BAMBINI, M. D. “Análise das visitas ao sistema</p><p>Agritempo entre os anos de 2007 e 2012 e perfil de busca por</p><p>informações agrometeorológicas”. In: IX Mostra de Estagiários e</p><p>Bolsistas da Embrapa Informática Agropecuária, de 19 a 22 de</p><p>novembro de 2013, Campinas. Resumos… Brasília, Embrapa, 2013,</p><p>pp. 58-61.</p><p>ASSAD. E. D. “O zoneamento agrícola e os riscos climáticos”.</p><p>Agroanalysis, São Paulo (Fundação Getúlio Vargas), n. 4, abr. 2004,</p><p>pp. E17-E18.</p><p>BAMBINI, M. D. Inovação tecnológica e organizacional em</p><p>agrometeorologia: Estudo da dinâmica da rede mobilizada pelo</p><p>sistema Agritempo. Campinas, Instituto de Geociências,</p><p>Universidade Estadual de Campinas, 2011 (Tese de Doutorado).</p><p>BARBOZA, C. H. da M. Tempo bom, meteoros no fim do período –</p><p>Uma história da Meteorologia em meados do século XIX através das</p><p>obras de Emmanuel Liais. São Paulo, Faculdade de Filosofia, Letras</p><p>e Ciências Humanas (Departamento de História), Universidade de</p><p>São Paulo, 2002 (Tese de Doutorado).</p><p>CPTEC – Centro de Previsão de Tempo e Estudos Climáticos –</p><p>Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais. Disponível em:</p><p><http://tempo.cptec.inpe.br/boletimtecnico/pt>; acesso em:</p><p>22/08/2014.</p><p>CUNHA, G. & ASSAD, E. D. “Uma visão geral do número especial da</p><p>RBA sobre zoneamento agrícola no Brasil”. Revista Brasileira de</p><p>http://www.agritempo.gov.br/</p><p>http://tempo.cptec.inpe.br/boletimtecnico/pt</p><p>Agrometeorologia, Passo Fundo, vol. 9, n. 3 (Número Especial:</p><p>Zoneamento Agrícola), 2001, pp. 377-385.</p><p>DORAISWAMY, P. C. et al. “Techniques for Methods of Collection,</p><p>Database Management and Distribution of Agrometeorological data”.</p><p>Agricultural and Forest Meteorology, n. 103, 2000, pp. 83-97.</p><p>FIGUEIREDO, P. N. “Pesquisa empírica sobre aprendizagem</p><p>tecnológica e inovação industrial: Alguns aspectos práticos de</p><p>desenho e implementação”. In: VIEIRA, M. M. F. & ZOUAIN, D. M.</p><p>Pesquisa qualitativa em administração. Rio de Janeiro, Editora FGV,</p><p>2006, pp. 201-223.</p><p>FLEMING, J. R. Historical Perspectives on Climate Change. New</p><p>York, Oxford University Press, 1998.</p><p>HARPER, K. et al. “50Th Anniversary of Operational Numerical</p><p>Weather Prediction”. Forum American Meteorological Society. Maio</p><p>2007, pp. 639-650.</p><p>IPCC. Climate Change 2007: Synthesis Report. Contribution of</p><p>Working Groups I, II and III to the Fourth Assessment. Report of the</p><p>Intergovernmental Panel on Climate Change [Core Writing Team,</p><p>Pachauri, R. K and Reisinger, A. (eds.)]. Genebra, IPCC, 2007.</p><p>Disponível em:</p><p><Https://www.ipcc.ch/publications_and_data/publications_ipcc_fourth</p><p>_assessment_report_synthesis_report.htm>; acesso em: 30/4/2015.</p><p>MAPA – Ministério da Agricultura Pecuária e Abastecimento.</p><p>Disponível em: <http://www.agricultura.gov.br/ministerio>; acesso em:</p><p>22/8/2014.</p><p>MAVI, H. S., TUPPER, G. J. Agrometeorology. Principles and</p><p>Aplications of Climate Studies in Agriculture. New</p><p>York/London/Oxford, The Haworth Press Inc., 2004.</p><p>MIDDLETON, W. E. K. Invention of the Meteorological Instruments.</p><p>Baltimore, The John Hopkins Press, 1969.</p><p>http://www.ipcc.ch/publications_and_data/publications_ipcc_fourth_assessment_report_synthesis_report.htm</p><p>http://www.agricultura.gov.br/ministerio</p><p>MOLGAN, M. Agricultural Meteorology: Outline of Agrometeorological</p><p>Problems, Part 2. Wash, DC, Nat. Sci. Foundation, 1962.</p><p>MONTEIRO, J. E. B. A. (org.). Agrometeorologia dos cultivos. O fator</p><p>meteorológico na produção agrícola. Brasília, INMET, 2009.</p><p>PAVITT, K. The Process of Innovation. SEWPS: SPRU Electronic</p><p>Working Paper Series. Brighton, UK, SPRU, 2003.</p><p>PEREIRA. A. R.; ANGELOCCI, L. R. & SENTELHAS, P. C.</p><p>Agrometeorologia: Fundamentos e aplicações práticas. Guaíba,</p><p>Agropecuária, 2002.</p><p>ROSSETTI, L. A. “Seguridade e zoneamento agrícola no Brasil.</p><p>Novos Rumos”. In: I Simpósio Internacional de Securidade e</p><p>Zoneamento Agrícola no Mercosul. Anais… Brasília, março 1998, pp.</p><p>1-9.</p><p>______. “Zoneamento agrícola em aplicações de crédito e</p><p>securidade rural no Brasil: aspectos atuariais e de política agrícola”.</p><p>Revista Brasileira de Agrometeorologia, vol. 9, n. 3, (Número</p><p>Especial: Zoneamento agrícola), 2001, pp. 386-399.</p><p>SENTELHAS, P. C. & MONTEIRO, J. E. B. A. “Agrometeorologia dos</p><p>cultivos. Informações para uma agricultura sustentável”. In:</p><p>MONTEIRO, J. E. B. A. (org.). Agrometeorologia dos cultivos. O fator</p><p>meteorológico na produção agrícola. Brasília, INMET, 2009, pp. 3-12.</p><p>SMITH, L. P. Weather and Animal Diseases. World Meteorological</p><p>Organization, Technical Note 113. Genebra, WMO publication 268,</p><p>1970.</p><p>2. Idealização do website de</p><p>divulgação científica do projeto</p><p>Alcscens</p><p>Marcos Rogério Pereira, Vera Regina Toledo Camargo</p><p>Processo Fapesp 2008/58160-5</p><p>2.1 Contexto e objetivo</p><p>Este trabalho foi construído a partir de um conjunto de três versões</p><p>de websites (descritas a seguir), que teve como objetivo criar um</p><p>instrumento de divulgação científica em cujas páginas foram</p><p>registradas não só artigos científicos e acadêmicos, mas também</p><p>notícias, vídeos, arquivos de áudio, fotos e resultados da pesquisa</p><p>em andamento do projeto AlcScens, além de informações de eventos</p><p>relacionados à produção científica e tecnológica no país e do perfil</p><p>dos pesquisadores integrantes do projeto.</p><p>Durante esse processo, foram estudados diversos artigos, livros e</p><p>páginas disponíveis na internet sobre a construção de websites</p><p>acessíveis, produção de conteúdo, disseminação e preservação da</p><p>produção científica em ambiente digital, o que permitiu determinar as</p><p>conclusões e comparar os resultados obtidos.</p><p>O objetivo, de todo modo, era identificar as principais</p><p>características de um site de divulgação científica quando</p><p>confrontado com situações reais de produção e publicação de</p><p>conteúdo científico e tecnológico, uma vez que centros produtores de</p><p>pesquisa no país não contemplam a divulgação científica dos seus</p><p>projetos ou mesmo não dispõem de profissionais e recursos para as</p><p>atividades envolvidas nesse processo1.</p><p>Para atingir o objetivo proposto, foi elaborado um website</p><p>acessível e que proporciona navegação simples, rápida e intuitiva,</p><p>além de permitir acesso por dispositivos móveis. Essa técnica é</p><p>denominada “design responsivo” e pressupõe fornecer fácil leitura e</p><p>navegação tanto a partir de monitores de computadores quanto de</p><p>telefones celulares.</p><p>No que se refere à primeira versão do site do projeto2, lançada em</p><p>dezembro de 2010, buscou-se tornar disponíveis as informações</p><p>técnicas e institucionais do projeto científico. Essa versão já estava</p><p>pronta quando se começou a planejar e organizar um novo site de</p><p>divulgação. Era uma página web comumente relacionada às</p><p>homepages dos anos 1990. Possuía uma diagramação minimalista,</p><p>e o conteúdo disponível era estático, em inglês e os recursos</p><p>resumiam-se a links internos para a relação da equipe científica,</p><p>sumário executivo, problema científico, justificativa e fundamentação,</p><p>objetivos específicos, resultados esperados, desafios científicos,</p><p>cronograma de execução, divulgação, avaliação e impactos</p><p>principais. Ou seja, informações predominantemente técnicas sobre</p><p>o tema científico tratado pelo projeto, requerendo conhecimentos e</p><p>competência específicos para seu entendimento. Na Figura 2.1, é</p><p>possível visualizar um trecho da página inicial da primeira versão do</p><p>site do projeto.</p><p>Figura 2.1 – Trecho da primeira versão da página do projeto</p><p>AlcScens, 2010.</p><p>Fonte: Elaboração dos autores; captura da tela do site:</p><p><http://www.cpa.unicamp.br/sugarcane_fapesp>.</p><p>Mesmo assim, possuir um conteúdo estático – como o</p><p>apresentado na</p><p>primeira versão – tanto pode ser importante, quando</p><p>bem escrito, como pode restringir novos acessos, já que não há</p><p>atualizações, recursos e uso de elementos para navegar entre as</p><p>informações disponíveis, além de possuir pouca ou nenhuma</p><p>informação sobre o tema científico voltado para o público leigo.</p><p>Entretanto, ainda é um site – embora sem muito o que explorar.</p><p>http://www.cpa.unicamp.br/sugarcane_fapesp</p><p>Se na primeira versão o conteúdo era estático e sem muitos</p><p>recursos, a partir da segunda, porém – versão que mais tempo ficou</p><p>no ar –, a proposta foi construir um site essencialmente dinâmico e</p><p>que favorecesse a integração com as redes sociais.</p><p>As informações foram organizadas a partir de sete seções</p><p>principais, divididas em categorias: projeto, perfil dos pesquisadores,</p><p>publicações acadêmicas, notícias, eventos, links externos e recursos</p><p>multimídia com fotos, imagens, vídeos e arquivos de áudio. O site foi</p><p>idealizado para compartilhar as informações científicas geradas</p><p>pelos pesquisadores, possuindo uma série de recursos para que as</p><p>páginas funcionassem como uma fonte de consulta e auxílio às</p><p>atividades do projeto. Na Figura 2.2, é possível visualizar um trecho</p><p>do design da página inicial da segunda versão do site do projeto.</p><p>Figura 2.2 – Trecho da segunda versão do site do projeto, 2012-</p><p>2013.</p><p>Fonte: Elaboração dos autores; captura da tela do site:</p><p><http://www.cpa.unicamp.br/alcscens/versao2>.</p><p>Parecia que tudo estava funcionando bem, pois era um site com</p><p>inúmeras páginas de conteúdo, entretanto, revendo o trabalho,</p><p>http://www.cpa.unicamp.br/alcscens/versao2</p><p>notou-se que havia excesso de informação com textos, publicações,</p><p>notícias, vídeos e imagens que disputavam o mesmo espaço.</p><p>Embora resultados mostrem que não foi algo impeditivo para</p><p>publicar e compartilhar informações na rede, não foram incorporados</p><p>recursos técnicos de acessibilidade, usabilidade e design responsivo.</p><p>A ausência desses recursos, contudo, impôs uma série de barreiras</p><p>tecnológicas, impedindo o acesso a suas páginas por pessoas com</p><p>deficiência e por meio dos dispositivos móveis. De certa forma, essa</p><p>experiência direcionou o projeto para novos desafios e levou a uma</p><p>análise de como o uso desses recursos poderia ajudar no trabalho</p><p>de divulgação científica. Além de explorar técnicas, métodos e</p><p>recursos tecnológicos usados para a construção do website, tanto do</p><p>ponto de vista da acessibilidade quanto do ponto de vista da</p><p>usabilidade, essa nova proposta também foi prevista no terceiro</p><p>relatório científico do Projeto AlcScens, o que promoveu mudanças</p><p>significativas nesse estudo, cujo direcionamento é o breve texto aqui</p><p>apresentado.</p><p>Assim, mais de dois anos depois do lançamento da segunda</p><p>versão, o site foi novamente refeito e adaptado para incorporar</p><p>recursos de acessibilidade, usabilidade e design responsivo,</p><p>baseados em padrões de desenvolvimento web – o que significa</p><p>facilitar e promover o acesso às informações por qualquer pessoa,</p><p>qualquer que seja o suporte ou formato por ela usado.</p><p>Apesar de não ter atingido o estado definitivo, pois estamos</p><p>cientes do fato de que nem todos os recursos tecnológicos foram</p><p>explorados no seu potencial máximo, a proposta de construir um site</p><p>acessível, objetivo e fácil de usar atingiu seu objetivo. Ou seja,</p><p>entendendo o site como um instrumento de divulgação científica,</p><p>procurou-se ampliar o repertório de possibilidades para tornar as</p><p>informações disponíveis para uso pelo máximo de pessoas possível</p><p>(quer tenham alguma deficiência ou não), no sentido de facilitar o</p><p>acesso ao conhecimento produzido, favorecendo a popularização da</p><p>ciência, o compartilhamento de informações e as atividades de</p><p>pesquisa acadêmica e científica dos pesquisadores do projeto</p><p>AlcScens.</p><p>A Figura 2.3 mostra um trecho do novo design da página inicial da</p><p>terceira versão apresentando um visual mais limpo, fontes maiores e</p><p>reposicionamento das informações.</p><p>Figura 2.3 – Trecho da terceira versão do site do projeto AlcScens,</p><p>2014.</p><p>Fonte: Elaboração dos autores; captura da tela do site:</p><p><http://www.cpa.unicamp.br/alcscens>.</p><p>http://www.cpa.unicamp.br/alcscens</p><p>2.2 Referencial teórico: Acessibilidade</p><p>e usabilidade</p><p>O principal referencial teórico utilizado nesse trabalho é o Modelo</p><p>de Acessibilidade em Governo Eletrônico, que estabelece definições</p><p>e procedimentos para que a implementação da acessibilidade digital</p><p>seja conduzida de forma fácil e padronizada, coerente com as</p><p>necessidades brasileiras e em conformidade com os padrões</p><p>internacionais.</p><p>O documento compreende um conjunto de 45 recomendações ou</p><p>diretrizes, chamado e-MAG3, que pode ser utilizado para</p><p>entendimento, criação e uso de sites acessíveis para orientar</p><p>profissionais que tenham contato com publicação de informações ou</p><p>serviços na internet. O objetivo é tornar o conteúdo web acessível ao</p><p>maior número de pessoas, independentemente das condições</p><p>físicas, dos meios técnicos ou dispositivos utilizados.</p><p>O e-MAG conta com três passos principais, que são sugeridos no</p><p>processo para desenvolver um site acessível:</p><p>Primeiro passo: padrões web, que padroniza o conteúdo web de</p><p>acordo com os padrões de desenvolvimento de páginas web do</p><p>consórcio W3C;</p><p>Segundo passo: diretrizes ou recomendações de acessibilidade,</p><p>que torna o conteúdo web acessível a todas as pessoas;</p><p>Terceiro passo: avaliação de acessibilidade, que valida os</p><p>padrões de desenvolvimento web e as recomendações de</p><p>acessibilidade.</p><p>Porém, nem sempre é fácil identificar todos os padrões de</p><p>acessibilidade de um site, sobretudo pelo excesso de termos</p><p>técnicos e documentos que são utilizados para elaborar normas,</p><p>diretrizes e recomendações de acessibilidade para a web.</p><p>Nesse trabalho, no entanto, o processo que ajudou a tornar o site</p><p>do AlcScens mais acessível e socializante para o público, ainda que</p><p>necessariamente limitado a uma parte do conjunto de</p><p>recomendações definido nesse referencial teórico (por não</p><p>contemplar ainda todas as diretrizes de multimídia que fornecem</p><p>alternativa textual para vídeo e áudio), correspondeu a um total de 40</p><p>recomendações, conforme demonstrado na Tabela, sugeridas pelo e-</p><p>MAG.</p><p>Tabela 1 – Recomendações de Acessibilidade usadas</p><p>nesse Projeto, 2014</p><p>Seções Recomendações</p><p>Marcação Respeitar os padrões de</p><p>desenvolvimento web;</p><p>Organizar o código HTML de forma</p><p>lógica e semântica;</p><p>Utilizar corretamente os níveis de</p><p>cabeçalho;</p><p>Ordenar de forma lógica e intuitiva a</p><p>leitura e tabulação;</p><p>Disponibilizar todas as funções da</p><p>página via teclado;</p><p>Fornecer âncoras para ir direto a um</p><p>bloco de conteúdo;</p><p>Não utilizar tabelas para</p><p>diagramação;</p><p>Separar links adjacentes;</p><p>Não abrir novas instâncias sem a</p><p>solicitação do usuário;</p><p>Comportamento Garantir que os objetos</p><p>programáveis sejam acessíveis;</p><p>Não criar páginas com atualização</p><p>automática;</p><p>Não utilizar redirecionamento</p><p>automático de páginas;</p><p>Fornecer alternativa para modificar</p><p>limite de tempo;</p><p>Não incluir situações com</p><p>intermitência de tela;</p><p>Assegurar o controle do usuário</p><p>sobre as alterações temporais do</p><p>conteúdo;</p><p>Seções Recomendações</p><p>Conteúdo Identificar o idioma principal da</p><p>página;</p><p>Oferecer um título descritivo e</p><p>informativo à página;</p><p>Disponibilizar informação sobre a</p><p>localização do usuário na página;</p><p>Descrever links clara e</p><p>sucintamente;</p><p>Fornecer alternativa em texto para</p><p>as imagens do site;</p><p>Fornecer alternativa em texto para</p><p>as zonas ativas de mapa da imagem;</p><p>Disponibilizar documentos em</p><p>formatos acessíveis;</p><p>Em tabelas, utilizar títulos e resumos</p><p>de forma apropriada;</p><p>Associar células de dados às células</p><p>de cabeçalho em uma tabela;</p><p>Garantir a leitura e compreensão das</p><p>informações;</p><p>Disponibilizar uma explicação para</p><p>siglas, abreviaturas e palavras</p><p>incomuns;</p><p>Informar mudança de idioma no</p><p>conteúdo;</p><p>Seções Recomendações</p><p>Design Oferecer contraste mínimo entre</p><p>plano de fundo e primeiro plano;</p><p>Não utilizar apenas cor ou outras</p><p>características sensoriais para</p><p>diferenciar elementos;</p><p>Permitir redimensionamento de texto</p><p>sem perda de funcionalidade;</p><p>Dividir as áreas de informação;</p><p>Possibilitar que o elemento com foco</p><p>seja visualmente evidente;</p><p>Formulários Fornecer alternativa em texto para</p><p>os botões de imagem de formulários;</p><p>Associar etiquetas aos seus campos;</p><p>Estabelecer uma ordem lógica de</p><p>navegação;</p><p>Não provocar automaticamente</p><p>alteração no contexto;</p><p>Fornecer instruções para entrada de</p><p>dados;</p><p>Identificar e descrever erros de</p><p>entrada de dados;</p><p>Agrupar campos de formulário;</p><p>Fornecer Captcha* humano.</p><p>* Captcha é um acrônimo da expressão “Completely Automated</p><p>Public Turing test to tell Computers and Humans Apart” (teste de</p><p>Turing público completamente automatizado para diferenciação entre</p><p>computadores e humanos): um teste de desafio cognitivo, utilizado</p><p>como ferramenta anti-spam, desenvolvido pioneiramente na</p><p>universidade de Carnegie-Mellon. Como esse teste é administrado</p><p>por um computador – em contraste ao teste de Turing padrão, que é</p><p>administrado por um ser humano –, ele é na realidade corretamente</p><p>descrito como um teste de Turing reverso. Disponível em:</p><p><http://pt.wikipedia.org/wiki/CAPTCHA>; acesso em: 25/4/2014.</p><p>Fonte: Adaptado pelos autores a partir do Modelo de</p><p>Acessibilidade em Governo Eletrônico4.</p><p>http://pt.wikipedia.org/wiki/CAPTCHA</p><p>2.3 Considerações finais</p><p>Uma página web acessível e inclusiva significa tornar disponível</p><p>seu conteúdo também para quase 46 milhões de brasileiros, ou 24%</p><p>da população total, que possuem algum tipo de deficiência (mental,</p><p>motora, visual e auditiva). Desses, aproximadamente 9,7 milhões são</p><p>deficientes auditivos e 35,2 milhões são deficientes visuais, segundo</p><p>o Censo de 2010 do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística</p><p>(IBGE)5. O Brasil possuía em 2010, também segundo o censo do</p><p>IBGE, aproximadamente 9 milhões de idosos com mais de 60 anos,</p><p>correspondendo a cerca de 4,8% da população. Segundo o estudo</p><p>“Panorama do Brasil na internet”6, 4,8 milhões dos acessos à internet</p><p>são realizados por pessoas com mais de 55 anos. A pesquisa</p><p>realizada com 2.362 pessoas apontou que 28% dos brasileiros com</p><p>idade entre 45 e 59 anos costumam navegar na internet,</p><p>porcentagem que chega a 12%, considerando apenas os brasileiros</p><p>com 60 anos ou mais.</p><p>O estudo indicou ainda que a idade não é a principal barreira de</p><p>acesso à rede, mas sim a classe social e a escolaridade do</p><p>internauta. Ao filtrar o acesso dos brasileiros com mais de 45 anos</p><p>pelo grupo social e grau de escolaridade, a pesquisa identificou que</p><p>o número de internautas sobe drasticamente. Considerando apenas</p><p>os brasileiros da classe A/B com 45 anos ou mais, 55% deles são</p><p>internautas. Ao considerar somente brasileiros com ensino superior e</p><p>45 anos ou mais, verificou-se que 78% são internautas.</p><p>Dessa forma, essa nova construção buscou contemplar tanto os</p><p>recursos de usabilidade, como maior facilidade de uso, padrões de</p><p>cores e tipografia, e texto de fácil leitura, títulos e tópicos claros e em</p><p>destaque, navegação simples e intuitiva com acesso às informações</p><p>em três cliques ou menos, bem como recursos técnicos de</p><p>acessibilidade, como o uso de tabelas para tabular dados e não para</p><p>o layout ou design, títulos hierárquicos e posições adequadas,</p><p>navegação lógica, textos alternativos para imagens, navegação pelo</p><p>teclado ou navegação com outras tecnologias de apoio, estrutura</p><p>lógica do conteúdo, esquema de cores e contraste para ajudar na</p><p>legibilidade.</p><p>Referências bibliográficas</p><p>BRASIL. e-MAG – Modelo de Acessibilidade em Governo Eletrônico</p><p>(on-line). S.d. Disponível em: <http://emag.governoeletronico.gov.br;</p><p>acesso em 1/10/2014.</p><p>______. Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). Censo</p><p>de 2010. 2010. Disponível em:</p><p><http://censo2010.ibge.gov.br/noticias-censo?</p><p>id=1&idnoticia=2170&view=noticia>; e em:</p><p><http://www.oab.org.br/util/print/24943?print=Noticia>; acessos em:</p><p>28/2/2014.</p><p>BUENO, W. C. Jornalismo científico no Brasil: Compromissos de</p><p>uma prática dependente. São Paulo, Escola de Comunicações e</p><p>Artes da Universidade de São Paulo, 1984 (Tese de Doutorado).</p><p>CASTELLS, M. A sociedade em rede. A era da informação:</p><p>Economia, sociedade e cultura, vol. 1. São Paulo, Paz e Terra, 1999.</p><p>CHARTIER, R. Inscrever e apagar – Cultura, escrita e literatura. São</p><p>Paulo, Unesp, 2007.</p><p>EPSTEIN, I. Divulgação científica. 96 verbetes. Campinas, Pontes,</p><p>2002.</p><p>F/NAZCA e Instituto Datafolha. “Panorama do Brasil na internet”. 13.</p><p>ed. Outubro de 2013. Disponível em: <http://www.fnazca.com.br/wp-</p><p>content/uploads/2013/12/fradar-13_publicasite-novo.pdf>; acesso</p><p>em: 14/1/2014.</p><p>KOUPER, I. “Science Blogs and Public Engagement with Science:</p><p>Practices, Challenges, and Opportunities”. JCOM Journal of Science</p><p>Communication, vol. 9, mar. 2010, pp. 1-10. Disponível em:</p><p><http://jcom.sissa.it/sites/default/files/documents/Jcom0901%282010</p><p>%29A02.pdf>.</p><p>http://emag.governoeletronico.gov.br/</p><p>http://censo2010.ibge.gov.br/noticias-censo?id=1&idnoticia=2170&view=noticia</p><p>http://www.oab.org.br/util/print/24943?print=Noticia</p><p>http://www.fnazca.com.br/wp-content/uploads/2013/12/fradar-13_publicasite-novo.pdf</p><p>http://jcom.sissa.it/sites/default/files/documents/Jcom0901%282010%29A02.pdf</p><p>NIELSEN, J. Projetando websites. Rio de Janeiro, Campus, 2000.</p><p>______. Usabilidade para web. Rio de Janeiro, Elsevier, 2007.</p><p>VELOSO, R. Tecnologias da informação e comunicação – Desafios e</p><p>perspectivas. São Paulo, Saraiva, 2011.</p><p>WILLIAMS, R. Design para quem não é designer. Noções básicas de</p><p>planejamento visual. São Paulo, Callis, 1995.</p><p>3. Por outros universos</p><p>sensíveis… vida e tempo</p><p>proliferam (em) rasgos</p><p>Tainá Luccas, Michele Gonçalves, Fernanda Pestana, Susana</p><p>Dias</p><p>Processo Fapesp 2008/58160-5</p><p>Escolhemos pensar na criação de imagens, palavras e sons com</p><p>as mudanças climáticas. Criação que aposta em experimentações</p><p>por entre artes, ciências, filosofias e comunicações e que envolve a</p><p>problematização dos curtos-circuitos já dados pelas e nas imagens</p><p>de divulgação das mudanças climáticas nas mais diversas mídias.</p><p>Circuitos que não nos sensibilizam mais. Narrativas cujas forças</p><p>foram desgastadas. E em resposta a esse cenário, investidas na</p><p>comunicação cada vez mais intensa em imagens críveis,</p><p>totalizantes e espetaculares. Como restituir as forças políticas e</p><p>estéticas do ver, do dizer, do escrever, do pensar? Desde o começo</p><p>de nossas investigações encontramos apostas que investem numa</p><p>reiteração de certas significações e formas de expressão em jornais,</p><p>revistas, homepages, blogs, livros didáticos e documentários.</p><p>Reiterações que dão a ver como as imagens estão presas a clichês,</p><p>colocadas como cartas marcadas de um jogo em que os dizeres</p><p>com o clima, o tempo, a vida encontram-se sitiados por oposições e</p><p>equivalências, cercados pelo tempo cronológico. Imagens, palavras</p><p>e sons expõem padrões representacionais que querem capturar</p><p>passado e futuro em reconstituições e previsões que se fecham em</p><p>uma direção única: a do desastre e do fim dos tempos.</p><p>Como movimentar outros pensamentos e sensações diante de</p><p>tais fixações de significados, sentidos e funcionamentos? O que</p><p>podem as imagens de divulgação das mudanças climáticas quando</p><p>a oposição, a equivalência e a linearidade são suspensas, quando</p><p>imagens, palavras e sons são desconectados do tempo cronológico</p><p>e abrem-se à experimentação de tempos aberrantes? O que pode a</p><p>divulgação científica e cultural quando as próprias imagens, seus</p><p>processos de criação e seus modos de nos afetar tornam-se</p><p>problemas de pesquisa e criação?</p><p>Arriscamo-nos no grupo de pesquisa “multiTÃO – Prolifer-artes</p><p>subvertendo ciências, educações e comunicações”1 (CNPq) – nas</p><p>ações que realizamos no projeto “Geração de cenários de produção</p><p>de álcool como apoio para a formulação de políticas públicas</p><p>aplicadas à adaptação do setor sucroalcooleiro nacional às</p><p>mudanças climáticas” (AlcScens) – por outras possibilidades para</p><p>dizer sobre o clima e as mudanças. Inspirados por alguns conceitos</p><p>entre Deleuze, Guattari e Rancière, aventuramo-nos a</p><p>pesquisar/experimentar as relações e intensidades que as imagens</p><p>poderiam movimentar e proliferar, por meio de criações com elas,</p><p>por entre arte, ciência e filosofia.</p><p>O conceito de clichê, como trabalhado pelo filósofo Gilles</p><p>Deleuze,</p><p>foi um dos primeiros que nos interessou. Um diagnóstico</p><p>inicial de como as imagens circulavam nos mais diversos espaços-</p><p>tempos nos levou a problematizar o fato de que acionar a expressão</p><p>“mudanças climáticas” na comunicação da ciência consistia em</p><p>convocar um certo conjunto de imagens, tais como: fotografias e</p><p>vídeos de desastres os mais diversos (inundações, deslizamentos</p><p>de terras, terremotos, fábricas poluidoras, lixões, rios poluídos,</p><p>cidades intransitáveis, deslocamentos de populações etc.), de</p><p>ambientes “preservados” e/ou “intocados” (florestas, rios, mares,</p><p>desertos etc.), de animais, plantas e povos em extinção (o urso no</p><p>bloco de gelo tornou-se um dos maiores ícones, bem como imagens</p><p>dos povos indígenas e populações tradicionais), de elementos da</p><p>natureza (nuvens, gelo, água, fogo, terra, vento etc.), de práticas</p><p>científicas (retratos de cientistas, de equipamentos, de</p><p>supercomputadores, de reuniões, de laboratórios, plantações etc.);</p><p>além de gráficos e mapas (com dados que organizam dos mais</p><p>diversos modos esses diversos seres, elementos e fenômenos).</p><p>Não apenas tais imagens eram convocadas insistentemente, mas</p><p>certas relações com as palavras e sons também o eram, reiterando</p><p>certos funcionamentos das imagens marcados por oposição-</p><p>exclusão: como registros fiéis ou traidores do real, como provas</p><p>legítimas ou ilegítimas dos fatos, como documentos/imagens do</p><p>passado ou previsões/imagens do futuro, como representações</p><p>verdadeiras ou falsas, como reais ou sensacionalistas, como certas</p><p>ou erradas, como boas ou más para a divulgação científica.</p><p>Imagens, palavras e sons cujos funcionamentos, sintaxes e</p><p>lógicas querem-se acordos visuais e consensos políticos, desejam</p><p>afetar o público transmitindo mensagens de ordem, dando modelos</p><p>ou oferecendo contramodelos, querem nos ensinar a ver a verdade</p><p>por trás das aparências que recusamos, desejam nos conscientizar.</p><p>Imagens, palavras e sons repletos de quereres e desejos que,</p><p>entretanto, dizem-nos de um fracasso e uma impotência da</p><p>comunicação das mudanças climáticas, de um impossível das</p><p>palavras, imagens e sons.</p><p>Se no início do projeto percebíamos nas imagens os clichês, as</p><p>próprias imagens se colocavam como imagens-clichês, as</p><p>experimentações com o subprojeto “Vida e tempo em proliferação:</p><p>Experimentos com imagens de mudanças climáticas”</p><p>(Unicamp/Faepex) e os estudos com Gilles Deleuze nos fizeram</p><p>pensar que os clichês consistiam não nas imagens, mas nas</p><p>fixações de significados, sentidos e funcionamentos com as</p><p>imagens, palavras e sons. Se não eram as imagens que eram</p><p>clichês, mas seus modos de funcionar, de operar, de intervir, de</p><p>afetar, a saída não parecia ser a eliminação de tais imagens, sua</p><p>troca por outras, mas passava por inventar movimentos distintos,</p><p>aberrantes, (des)funcionamentos. Era preciso tornar visíveis os</p><p>funcionamentos dominantes, abrir imagens, palavras e sons para</p><p>outras possibilidades e lógicas, na busca por criar rasgos que</p><p>exibissem tensões/desequilíbrios, para que outras potencialidades</p><p>pudessem emergir desde dentro dos clichês. Para sairmos dos</p><p>clichês, precisávamos permanecer com eles, ao invés de travar uma</p><p>luta contra eles. Fazer uma luta com os clichês, perfurando-os,</p><p>apropriando-se de suas forças, inventando modos vários de montar</p><p>e desmontar os jogos já dados, criando possibilidades de vazar</p><p>outros universos sensíveis.</p><p>Pretendíamos, assim, convidar essas imagens a outros encontros</p><p>que pudessem ser estabelecidos fora dos territórios delimitados por</p><p>legendas e guiados por descrições textuais dadas. As imagens</p><p>teriam força para escapar dos textos que direcionam seus</p><p>significados e fixam seus sentidos? Que vida e tempo pulsam</p><p>nessas imagens? Perguntas que nos levavam a pensar e</p><p>experimentar com as imagens do clima; não buscávamos respostas</p><p>precisas, mas sim espaços abertos de pensamentos, reticências,</p><p>suspensões, deslizes… Intensidades “que se deixam esgotar pela</p><p>vida ao invés de desejar esgotá-la”2.</p><p>Primeiramente, apostamos na criação de um jogo de cartas</p><p>(Figura 3.1) com imagens que foram recortadas de matérias de</p><p>divulgação científica sobre as mudanças do clima. Para compor as</p><p>cartas do jogo, deslocamos essas fotografias dos seus territórios de</p><p>origem (jornais, revistas, internet) para libertá-las das legendas e</p><p>textos que explicavam e direcionavam seus significados dentro das</p><p>notícias e reportagens sobre as mudanças climáticas. Jogar com</p><p>essas cartas (des)marcadas para tornar perceptível o que pode</p><p>pulsar lá dentro – que vidas e tempos? O jogo foi experimentado</p><p>com alunos e professores em várias ações do grupo multiTÃO, em</p><p>escolas e no Centro Cultural Casarão do Barão, localizado no</p><p>município de Campinas.</p><p>Figura 3.1 – Baralho de mudanças climáticas criado pelo grupo de</p><p>pesquisa multiTÃO.</p><p>Fonte: Elaboração dos autores.</p><p>Do jogo de cartas com imagens criamos uma instalação artística e</p><p>itinerante chamada “Furacão: Vida e tempo em proliferação” (Figura</p><p>3.2). Do “furacão” desejávamos extrair a potência de uma força que</p><p>poderia movimentar e desestabilizar as oposições, as equivalências,</p><p>as certezas, lançando-nos a um turbilhão de ideias e sensações, a</p><p>um caos criativo que pudesse desestabilizar as territorializações das</p><p>imagens, palavras e sons e lançá-las a encontros inesperados: “Um</p><p>tempo em que as palavras não capturam as imagens, em que as</p><p>imagens não capturam as palavras, submetidas que estão a uma</p><p>ventania devastadora. Um tempo esvaziado de narrativas,</p><p>ilustrações, explicações. Que vida pulsa desse furacão de palavras-</p><p>imagens?”3.</p><p>Figura 3.2 – Instalação “Furacão: Vida e tempo em proliferação”,</p><p>criada pelo grupo de pesquisa multiTÃO.</p><p>Fonte: Elaboração dos autores.</p><p>Buscávamos a invenção de um ambiente aberto a múltiplas</p><p>conexões sensoriais, que permitisse a imersão do público em</p><p>lógicas e jogos distintos, propostos em vídeos, trilhas sonoras e</p><p>projeções interativas. Nossa intenção era tencionar os dispositivos</p><p>de funcionamento das imagens, palavras e sons, e convidar o</p><p>público a participar dessas experimentações, compondo outras</p><p>possibilidades de escritas. Tais escritas compuseram as montagens</p><p>das instalações seguintes, incorporando outras forças, lançando-nos</p><p>em outras experimentações.</p><p>Num segundo momento, após a circulação dessa instalação por</p><p>vários espaços, seu contato com vários públicos, passamos a</p><p>investir em oficinas de produção de imagens com os professores,</p><p>pesquisadores, alunos e artistas do grupo de pesquisa multiTÃO.</p><p>Procuramos por outras possibilidades junto aos clichês,</p><p>intensidades que escapassem por meio e entre eles, lançando-os a</p><p>movimentos outros. Forças que jogassem com os sentidos dados e</p><p>determinados para experimentar encontros que ainda estariam por</p><p>vir. Forças de dissenso4 num mundo de imagens cujo</p><p>funcionamento é marcado pelo consensual.</p><p>Escolhemos, para trabalhar nas oficinas, algumas das imagens</p><p>que consideramos presas a clichês e significações dadas, em</p><p>especial aquelas em que a noção de desastre parece querer</p><p>produzir um efeito de sensibilização no público, sensibilização</p><p>pensada como conscientização. Escolhemos também imagens de</p><p>produções agrícolas em que podemos observar nas plantações</p><p>linhas que direcionam para um ponto de convergência único, dando</p><p>a ver a noção de um progresso a ser alcançado pelo</p><p>desenvolvimento das ciências e tecnologias. Selecionamos, ainda,</p><p>imagens de gráficos e mapas, que servem tanto como registro do</p><p>estado atual das pesquisas na área, quanto como desenho de</p><p>cenários futuros para corresponder às expectativas da produção</p><p>agrícola no país.</p><p>As imagens em experimentação acolheram os mais diversos</p><p>processos. A partir de impressões e reproduções dessas imagens,</p><p>por vezes refotografadas ou escaneadas, encontramos, em algumas</p><p>ações como rasgar, cortar, colar, dobrar, amassar, montar e</p><p>desmontar, potencialidades de fazer essas imagens, desde dentro</p><p>de seus clichês, escaparem às lógicas de representação e de</p><p>correspondência com as previsões que são dadas em relação ao</p><p>futuro, ao humano, à ciência e à tecnologia.</p><p>Nesse processo de experimentação,</p><p>a imagem da inundação</p><p>(Figura 3.3) foi recortada como se a própria enchente vazasse não</p><p>apenas pelas cidades e pelos corpos, mas pelos vãos que podem</p><p>nos lançar para outros entendimentos e sensações. Da</p><p>conscientização para outra possibilidade que não nos culpa, nem</p><p>nos faz vítima, apenas abre outro caminho que pode ou não ser</p><p>percorrido. A imagem foi também amassada, e aquilo que parecia</p><p>rígido e edificado se dissolve pelos desenhos das dobras, o papel</p><p>escorre em mistura com a água: “Eis que vem aí a inundação, eis</p><p>que vêm aí os líquidos, os líquidos em grande quantidade, que</p><p>ameaçam o estado sólido, que parecia eterno”5. Abrem-se</p><p>correntezas nas imagens que não estão dadas nas fotografias, e</p><p>sim na ação de dobrar, redobrar, desdobrar (amassar) as imagens.</p><p>E refotografar, fixar na superfície plana o volume da dobra, gerando</p><p>uma nova testemunha, entre o fazer e o fato.</p><p>Figura 3.3 – Inundação. Imagem criada nos workshops do grupo</p><p>multiTÃO, como parte do processo de experimentação com imagens</p><p>retiradas das mídias.</p><p>Fonte: Elaboração dos autores.</p><p>A experimentação também é contaminada com outro</p><p>procedimento: o de rasgar as imagens (Figura 3.4). Rasgos de</p><p>deserto e de nuvem. Céu aberto para um tempo por vir (azulado ou</p><p>nublado): o rasgo cria passagens nas linearidades narrativas</p><p>encontradas nas imagens. O rasgar pode fazer das imagens</p><p>pedacinhos numa composição heterogênea entre fotografias.</p><p>Travessias são desenhadas entre os fragmentos colados na</p><p>composição, pelas quais uma mistura de climas e tempos pode</p><p>acontecer. Registros imprecisos em que as previsões são</p><p>deslocadas para o terreno da dúvida e da incerteza. O tempo e a</p><p>comunicação atravessados no deserto. A correspondência</p><p>interrompida, perdida pelas areias áridas e nuvens que fazem uma</p><p>mistura de tempo, entre presente, passado e futuro.</p><p>Figura 3.4 – Rasgos. Imagem criada nos workshops do grupo</p><p>multiTÃO, como parte do processo de experimentação com imagens</p><p>retiradas das mídias.</p><p>Fonte: Elaboração dos autores.</p><p>Uma vontade de rasgar também a convergência, desdobrar o</p><p>ponto que se quer alcançar por algo inesperado, algo que rompe</p><p>com a linearidade proposta na imagem (Figura 3.5). O ponto de</p><p>convergência é rasgado na imagem, abre-se uma fenda. Outra</p><p>imagem é colocada, numa composição em que a interação de cores</p><p>salta ao olhar: o verde e o vermelho convivendo numa mesma</p><p>superfície, deixando vestígios de mapa, gráfico, agricultura e</p><p>perspectiva, no movimento entre as cores e o rasgo. Desatar a</p><p>convergência, talvez, por um emaranhado a se perder, embaralhar</p><p>os corredores das plantações que querem cair num futuro</p><p>progressivo sustentado pela economia, ciência e tecnologia.</p><p>Figura 3.5 – Perspectivas. Imagem criada nos workshops do</p><p>grupo multiTÃO, como parte do processo de experimentação com</p><p>imagens retiradas das mídias.</p><p>Fonte: Elaboração dos autores.</p><p>As inquietações e perguntas que surgiram a partir desses dois</p><p>momentos – a criação do jogo de cartas e as oficinas – nos</p><p>movimentaram a novas experimentações, com materiais de</p><p>divulgação científica das mudanças climáticas. Criamos uma</p><p>instalação – Estação experimental divulgação científica e mudanças</p><p>climáticas – que foi exposta no Museu de Imagem e Som (MIS) de</p><p>Campinas.</p><p>Uma estação na qual o público foi convidado a rasgar, amassar,</p><p>raspar, costurar, colar, fotografar, filmar, escrever, ler… Um cenário</p><p>repleto de clichês que compõem as mudanças climáticas nos papéis</p><p>(jornal-revista-TV-cinema-literatura). Camadas e camadas de</p><p>gráficos, índices, fotografias, propagandas, legendas, dados, títulos</p><p>espalhados, sobrepostos e amontoados em uma só tela.</p><p>Compusemos, assim, um ambiente que se expandia e retraía,</p><p>sempre movimentado pelos olhares curiosos do público,</p><p>estranhamentos, suspensões, intervenções… Mãos que tocavam as</p><p>imagens dos jornais e revistas, amassavam, dobravam, cortavam,</p><p>colavam outros pedaços; novas possíveis e diferentes ramificações</p><p>junto às múltiplas possibilidades de aproximações. Chegaram</p><p>também vozes que, em diferentes intensidades e volumes,</p><p>ressoavam poemas; fragmentos de textos, filosofia e literatura eram</p><p>invocados a entrarem nessa estação. Fios e linhas cruzavam a</p><p>estação experimental, emaranhando novos objetos, conectando</p><p>pontos distintos e criando proliferações não imaginadas; uma rede</p><p>que se transformava em contato com os corpos/objetos/</p><p>intensidades.</p><p>A Estação experimental nos convidava a criações com imagens</p><p>distintas, e nos lançamos a um novo desafio: a produção coletiva de</p><p>um vídeo. Arriscamo-nos pela criação audiovisual como aposta na</p><p>invenção de novas possibilidades de encontros, pesquisa e</p><p>experimentações. Junto com o vídeo criamos novos passeios por</p><p>entre imagens, sons, sensações, cortes, ruídos, sussurros, falas,</p><p>luzes… Um emaranhado de intensidades que foram,</p><p>cuidadosamente, tecidas à narrativa do vídeo.</p><p>Inspirados na leitura de Deleuze6, em Imagem-tempo, pensamos</p><p>na concepção do vídeo junto à ideia da construção de narrativas</p><p>audiovisuais que explorassem a não linearidade na relação entre as</p><p>imagens e seu encadeamento fílmico. A montagem (edição) fílmica</p><p>tensiona a linearidade baseada em acontecimentos com início, meio</p><p>e fim demarcados, e provoca outras possibilidades de</p><p>aproximações, com inversões, cruzamentos e atravessamentos</p><p>imagético-temporais. Há uma reconexão entre as imagens, em que</p><p>a força do fragmento ganha potência e as partes reconfiguram o</p><p>todo no processo de composição da narrativa audiovisual.</p><p>Em nossas criações com o vídeo procuramos estabelecer</p><p>possibilidades de associações distintas entre as imagens, dando</p><p>força aos elementos singulares; à potencialidade do instante, do</p><p>inesperado, dos acontecimentos independentes e não associativos</p><p>que se aproximavam. Atentamo-nos às sutilezas das imagens que</p><p>se modificam com a passagem da luz, aos movimentos entre o foco</p><p>e desfoco desequilibrados por entre mãos, notícias, rasgos, ruídos</p><p>inesperados; junções não imaginadas que aconteciam a todo</p><p>instante: “[…] no equilíbrio do rochedo, da margem, diferentemente</p><p>do hábito que se exerce em um mundo determinado e</p><p>supostamente determinístico”; “[…] o que conta, ao contrário é o</p><p>devir… é uma certa relação com o devir, que está aí em jogo”7.</p><p>Apostamos em outras lógicas e modos de funcionamento das</p><p>imagens em relação com as palavras, sons e interações com os</p><p>diferentes materiais presentes na Estação experimental. Inspiramo-</p><p>nos na criação de narrativas sensoriais, procurando por “novos</p><p>processos de subjetivação, outros modos de ser e de estar que se</p><p>conectam a experiências cujo intuito não é mais dominar ou</p><p>interpretar o mundo, mas experimentá-lo”8.</p><p>São outras forças que se afirmam, novos modos de explorar as potências do</p><p>tempo e da imagem. Não apenas o prazer ou a dor derivados do storytelling,</p><p>mas outras experiências, formas diversas de pensamento e percepção</p><p>ligadas ao campo do sensível, a um domínio onde opera também um jogo de</p><p>forças (instáveis, em devir) – de atmosferas e vibrações, de pequenas ou</p><p>micropercepções – e não apenas de formas (estáveis, simbólicas,</p><p>representativas)9.</p><p>Essas novas narrativas foram também inspiradas pelo conceito de</p><p>dissenso do filósofo Jacques Ranciére, na medida em que</p><p>tentamos, através da construção do vídeo e também da própria</p><p>instalação, romper com o consenso da visão e das</p><p>problematizações das mudanças climáticas nas diferentes mídias.</p><p>[…] o consenso significa o acordo entre sentido e sentido, ou seja, entre um</p><p>modo de apresentação sensível e um regime de interpretação de seus dados</p><p>[…] O dissenso não é o conflito de ideias ou sentimentos. É o conflito de</p><p>vários regimes de sensorialidade10.</p><p>A tentativa de produzir o dissenso nas imagens tem a ver com a</p><p>aposta de reconfigurar a experiência sensível da arte enquanto</p><p>política, como diz Ranciére11.</p><p>[…] A arte, no regime de separação estética, acaba por tocar na política.</p><p>Pois o dissenso está no cerne da política […] A política é a atividade que</p><p>reconfigura os âmbitos sensíveis nos quais se definem os objetos comuns.</p><p>Ela rompe a evidência sensível da ordem “natural”</p><p>que destina os indivíduos</p><p>e os grupos ao comando ou à obediência, voltando-se sobretudo a certa</p><p>maneira de ser, ver e dizer.</p><p>Se a política começa onde há a ruptura do dissenso, a qual</p><p>desestabiliza as noções comuns de estética e significado, ela é</p><p>também a prática que rompe com as ordenações já dadas,</p><p>redesenhando espaços e reconfigurando as relações entre imagens,</p><p>palavras e som. Essa foi a tentativa durante toda a concepção da</p><p>instalação e da produção do vídeo.</p><p>Em nossas experimentações, a instalação Estação experimental</p><p>virou vídeo e revirou instalação em outros lugares por onde passou,</p><p>estabeleceu novos emaranhados criativos, convidando públicos</p><p>distintos a outras possibilidades de intervenções, de geração de</p><p>sentidos e sensações com as ciências e tecnologias e com as</p><p>mudanças climáticas. “Experimento que cria meios e condições para</p><p>outros modos de engajamento, percepção, existência… outras</p><p>maneiras de se pensar a relação entre os corpos e a natureza”12.</p><p>Procuramos, a todo momento, pela “arte de dizer sim à vida”13;</p><p>uma vida própria que as imagens, as palavras, os sons, os materiais</p><p>podem proliferar por entre novas criações com o público em seus</p><p>diversos percursos; emaranhando novas junções e movimentando</p><p>nossos pensamentos e pesquisas com as mudanças climáticas.</p><p>As imagens e pensamentos estiveram, pois, em suspensão</p><p>durante nossas produções. Essa foi a aposta de todos os trabalhos</p><p>realizados ao longo do projeto, e é o foco do grupo multiTÃO.</p><p>Imagens submetidas ao esgotamento e à fúria; expostas a cortes,</p><p>rasuras, dobras, costuras; destituídas de seus territórios sensíveis</p><p>comuns, roubadas dos significados dados por lógicas das legendas</p><p>dominantes. Imagens expostas, procedimentos que propuseram, a</p><p>partir dos conceitos de dissenso e consenso sugeridos por Jacques</p><p>Ranciére, prestá-las ao desacordo.</p><p>Sofridas, interferidas, deslocadas, rasuradas, machucadas,</p><p>manipuladas, delegadas à solidão do texto, as imagens foram</p><p>forçadas a fugir de lógicas explicativas ou reveladoras da verdade.</p><p>Não serviam mais para capturar a realidade, nem traduzi-la. Ficaram</p><p>abaladas. E, a partir daí, puderam convidar a uma dança sem</p><p>passos marcados. Dança de embaralhamentos, que abre à</p><p>desestabilização dos territórios dados pelas matérias de expressão</p><p>que as constituem. Escrita-pensamento que inventa territórios</p><p>impossíveis, mas existentes.</p><p>Imagens intencionalmente postas em trânsito, numa tentativa de</p><p>recusar as distâncias e separações engendradas pela política</p><p>representacional, que se propõe a aumentar a proximidade do real</p><p>ou abolir tal separação e distância; de propor um intenso</p><p>entrelaçamento entre estética e política, em que os papéis e</p><p>posições definidas de real e ficção, obra e espectador, ciência e arte</p><p>são embaralhados; abalar o consenso, desfazendo o acordo de</p><p>correspondências entre sentido e sentido: o sentido próprio delas</p><p>mesmas e o sentido sensível, do sentir que propõe convocar. Uma</p><p>aposta num regime outro, estético, de descontinuidades: uma</p><p>política de dissenso. Uma divagação e, ao mesmo tempo, um</p><p>manifesto por outros universos sensíveis que a escrita-pesquisa em</p><p>divulgação científica pode criar.</p><p>Referências bibliográficas</p><p>DELEUZE, G. A imagem-tempo. Trad. Eloisa de Araujo Ribeiro. São</p><p>Paulo, Brasiliense, 2005.</p><p>______. Francis Bacon: Lógica da sensação. Rio de Janeiro, Jorge</p><p>Zahar, 2007.</p><p>DIAS, S. Instalação furacão. Coletivo multiTÃO. I Exposição</p><p>multiTÃO: Experimentações, limites, disjunções, artes e ciências.</p><p>Universidade Estadual de Campinas, 2011. (Mimeo.).</p><p>______& RODRIGUES, C. “E se fôssemos descendentes das</p><p>aranhas?”. Textura Canoas, n. 30, jan.- -abr./2014, pp. 137-155.</p><p>Disponível em:</p><p><http://www.periodicos.ulbra.br/index.php/txra/article/viewFile/1131/8</p><p>78>; acesso em: 1/10/2014.</p><p>ESTAÇÃO EXPERIMENTAL: Divulgação científica e mudanças</p><p>climáticas. Produção: Grupo multiTÃO. São Paulo,</p><p>Labjor/Nudecri/Unicamp e REDE CLIMA, 2014. DVD.</p><p>GONÇALVES, O. (org.). Narrativas sensoriais. Rio de Janeiro,</p><p>Circuito, 2012.</p><p>PELBART, P. P. O avesso do niilismo: Cartografias do esgotamento.</p><p>São Paulo, N-1 Edições, 2014.</p><p>PESTANA, F.; LUCCAS, T. & DIAS, S. “Imagens e palavras tramam</p><p>tempos, culturas e mudanças”. In: II Seminário Internacional</p><p>Empírika – Comunicação, Divulgação e Percepção Pública da</p><p>Ciência e Tecnologia. Anais… Campinas, 2013, pp. 1-8.</p><p>RANCIÈRE, J. O espectador emancipado. São Paulo, WMF Martins</p><p>Fontes, 2012.</p><p>http://www.periodicos.ulbra.br/index.php/txra/article/viewFile/1131/878</p><p>TAVARES, G. O senhor Eliot e as conferências. Rio de Janeiro,</p><p>Casa da Palavra, 2012.</p><p>4. As mudanças climáticas</p><p>divulgadas – instrumentos</p><p>políticos de circulação da</p><p>ciência</p><p>Claudia Castellanos Pfeiffer</p><p>Labeurb/Nudecri-Unicamp</p><p>Processo Fapesp 2008/58160-5</p><p>4.1 Introdução</p><p>Temos nos proposto trabalhar sobre a relação entre ciência e</p><p>políticas públicas, pensando especificamente no modo de circulação</p><p>da ciência apropriado pelo Estado ou pela sociedade civil, temos</p><p>procurado compreender o modo de circulação de questões relativas</p><p>ou associadas às mudanças climáticas em diferentes instrumentos</p><p>como cartilhas, brochuras institucionais, propagandas e a rede</p><p>eletrônica. Nosso objeto de pesquisa, de modo mais preciso, é o</p><p>funcionamento dos diferentes discursos de transmissão dos</p><p>conhecimentos científicos na sociedade, refletindo, particularmente,</p><p>sobre o modo como se produz um tipo de subjetividade e de</p><p>sociabilidade pelas relações que se estabelecem entre ciência e</p><p>ideologia, produzindo sentidos estabilizados e naturalizados com os</p><p>quais a sociedade lida de maneira quase sempre transparente.</p><p>Para tanto, trabalhamos com o referencial teórico e metodológico</p><p>da Análise de Discurso (AD), uma teoria que se constrói pela</p><p>articulação de três campos disciplinares: o da Linguística, o do</p><p>Materialismo Histórico e o da Psicanálise, o que implica o</p><p>deslocamento da noção de transparência da língua, da história e do</p><p>sujeito. Nossa unidade de análise é o texto, no qual observamos</p><p>(descrição/interpretação) sua relação com outros textos –</p><p>intertextualidade – e, igualmente, a relação do dito com o não-dito, e</p><p>também com um já-dito – interdiscurso: uma memória discursiva de</p><p>ordem não cronológica e inconsciente. Nossa tarefa é a de explicitar</p><p>os processos de significação presentes em um texto, buscando</p><p>compreender como eles se constituem, explicitando como o texto</p><p>organiza as interpretações, deixando pistas e vestígios. Ao analista</p><p>cabe formular questões para desencadear a análise, mobilizar</p><p>conceitos do dispositivo teórico, constituir um corpus e fazer a</p><p>descrição e análise de gestos de interpretação que sustentam o</p><p>texto.</p><p>Trabalhamos com o caráter material do sentido em sua</p><p>dependência constitutiva das formações ideológicas, dependência</p><p>essa especificada por Pêcheux1 da seguinte forma:</p><p>[…] o sentido de uma palavra, de uma expressão, de uma proposição, etc.,</p><p>não existe “em si mesmo” (isto é, em sua relação transparente com a</p><p>literalidade do significante), mas, ao contrário, é determinado pelas posições</p><p>ideológicas que estão em jogo no processo sócio-histórico no qual as</p><p>palavras, expressões e proposições são produzidas (isto é, reproduzidas).</p><p>Poderíamos resumir essa tese dizendo: as palavras, expressões,</p><p>proposições, etc., mudam de sentido segundo as posições sustentadas por</p><p>aqueles que as empregam, o que quer dizer que elas adquirem seu sentido</p><p>em referência a essas posições, isto é, em referência às formações</p><p>ideológicas (no sentido definido mais acima) nas quais essas posições se</p><p>inscrevem. Chamaremos, então, formação discursiva aquilo que, numa</p><p>formação ideológica dada, isto é, a partir de uma posição dada numa</p><p>conjuntura dada, determinada pelo estado da luta de classes, determina o</p><p>que pode e deve ser dito (articulado sob a forma de uma arenga, de um</p><p>sermão, de um panfleto, de uma exposição, de um programa, etc.).</p><p>Ainda do ponto de vista teórico, para que nossas análises sejam</p><p>realizadas, pressupomos a noção de polissemia2, uma noção que</p><p>traz condições para se compreender a multiplicidade de sentidos que</p><p>se apresenta</p><p>na elaboração de diferentes textos que têm como</p><p>objeto a divulgação das mudanças climáticas ou sua consideração</p><p>para que políticas públicas sejam efetivadas ou discutidas. Conforme</p><p>Orlandi3, polissemia “são diferentes movimentos de sentidos no</p><p>mesmo objeto simbólico”. Levamos também em consideração o</p><p>silêncio nas palavras, tal como formulado por Orlandi4, para quem o</p><p>silêncio (enquanto “horizonte de significação”) atravessa as palavras,</p><p>condicionando o jogo entre a paráfrase e a polissemia.</p><p>Por fim, é preciso lembrar que hoje temos uma demanda crescente</p><p>que articula o processo de produção de conhecimentos à exigência</p><p>de sua transmissão em diferentes espaços. Nossas análises5 têm</p><p>demonstrando que essa transmissão vem sendo feita, sobretudo, por</p><p>meio de um discurso pedagógico que didatiza os conhecimentos.</p><p>Nesse processo, o discurso da divulgação científica, que tem nos</p><p>suportes da mídia um espaço de circulação próprio e cada vez mais</p><p>intenso, irá, em articulação com o discurso pedagógico, produzir</p><p>efeitos. É o que observaremos mais adiante.</p><p>Na organização mais ampla de nosso trabalho, constituímos o</p><p>seguinte corpus de análise:</p><p>Textos de políticas públicas</p><p>– Brasil. Comitê Interministerial sobre Mudança do</p><p>Clima (Decreto n. 6.263, de 21 de novembro de 2007),</p><p>Plano Nacional sobre Mudança do Clima – PNMC –</p><p>Brasil. Brasília, dezembro de 2008.</p><p>– Brasil. Ministério da Educação. Coordenação de</p><p>Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior –</p><p>Capes. Contribuição da pós-graduação brasileira para</p><p>o desenvolvimento sustentável: Capes na Rio+20 /</p><p>Brasília, Capes, 2012. - Brasil. MMA/MEC. Programa</p><p>Nacional de Educação Ambiental. 3. Ed. 2005.</p><p>Divulgação científica/escola – Política pública</p><p>– INPE. Cartilha ilustrada sobre economia verde,</p><p>desenvolvimento sustentável e erradicação da</p><p>pobreza. 2012.</p><p>Textos intergovernamentais</p><p>– Documento Zero – Organização das Nações Unidas</p><p>– O futuro que queremos. (Apresentado pelos</p><p>copresidentes em nome do Departamento de acordo</p><p>com a decisão tomada na Prepcom 2 para</p><p>apresentação do esboço inicial do documento de</p><p>resultados para análises por parte dos Estados-</p><p>Membros e outros stakeholders, no máximo até o</p><p>início de janeiro de 2012).</p><p>Divulgação científica/jornais – Jornalismo</p><p>especializado</p><p>– Jornais da Unicamp e da Fapesp</p><p>Imagens da internet</p><p>Apresentaremos a seguir algumas das regularidades importantes</p><p>compreendidas em nosso percurso de pesquisa.</p><p>4.2 As mudanças climáticas em cena –</p><p>Ou na contracena de um discurso</p><p>ambiental</p><p>Tomando como ancoragem analítica a forma material mudanças</p><p>climáticas, que tem em sua configuração discursiva uma relação de</p><p>filiação, de deriva e de silenciamento com a forma material</p><p>aquecimento global, procuramos compreender um pouco da rede</p><p>discursiva que sustenta na contemporaneidade um discurso</p><p>ambientalista. Ao pensar nos diversos caminhos de significação das</p><p>palavras, nosso investimento tem sido o de procurar abrir condições</p><p>para dar visibilidade aos percursos dos sentidos na forma material</p><p>mudanças climáticas, em um mesmo espaço-tempo, forma essa</p><p>pressuposta polissêmica, em função da teoria com a qual</p><p>trabalhamos. Dito de outro modo, procuramos mostrar que nessa</p><p>forma material podem trabalhar diferentes direções, que um sentido</p><p>pode se configurar pelo trabalho do político. Interessa, pois, formular</p><p>na direção de abrir espaço para a polissemia, compreendendo os</p><p>diferentes processos de significação que estão na base da</p><p>divulgação das mudanças climáticas.</p><p>4.2.1 No embate com o material</p><p>Apresentaremos recortes de nosso material de análise para que os</p><p>processos polissêmicos e parafrásticos sejam salientados e</p><p>compreendidos de modo sistêmico e articulado. Todos os grifos são</p><p>nossos.</p><p>4.2.1.1 As ONGs</p><p>Trazemos este recorte de modo emblemático para apontar a</p><p>presença regular da forma material “aquecimento global” nos textos</p><p>de divulgação de campanhas ambientalistas elaboradas por ONGs.</p><p>Isso é interessante, pois se opõe à presença substantiva, nos textos</p><p>governamentais e da mídia jornalística, da forma material “mudanças</p><p>climáticas” ou “mudanças climáticas globais”. Outro ponto a ser</p><p>observado é a presença regular de estruturas verbais que marcam</p><p>causas e consequências – regularidade presente em todos os tipos</p><p>de textos analisados em nosso corpus: X provoca Y; Z é a causa de</p><p>X. Ou ainda estruturas que configuram X como objeto de desafio.</p><p>Finalmente cabe observar que a ênfase nesse tipo de discursividade</p><p>é dada à fauna ou à flora; quando o homem entra, está em segundo</p><p>plano, marcando uma relação hierárquica entre fauna/flora e o</p><p>homem, o que faz significar o homem fora da natureza. O homem é o</p><p>agente causador dos danos da natureza, mas não faz parte dela.</p><p>São textos curtos com estruturas explicativas claras e transparentes,</p><p>sem espaço para incerteza, complexidade, contradição na</p><p>explanação dessa temática que é construída como fato dado. Do</p><p>ponto de vista de efeito-leitor, estamos diante de textos</p><p>convocatórios, militantes, que focalizam as mudanças climáticas</p><p>como uma causa a ser defendida, ou melhor, uma consequência a</p><p>ser evitada, por meio do combate às suas causas, sem se preocupar</p><p>com o desenredar das complexidades presentes na problemática.</p><p>Arte e protesto pelo</p><p>Ártico (Notícia de</p><p>17/8/2013)</p><p>Greenpeace protesta</p><p>no centro da capital</p><p>paulista integrando</p><p>mobilização global</p><p>contra a exploração de</p><p>petróleo no Ártico</p><p>Manhã de sábado no</p><p>centro da capital</p><p>paulista. Um caricato</p><p>milionário em cima de</p><p>uma bomba de</p><p>gasolina banha um</p><p>urso polar com</p><p>petróleo, em pleno</p><p>Viaduto do Chá. Pode</p><p>parecer cenário</p><p>artístico e é isso</p><p>mesmo. Ativistas do</p><p>Greenpeace</p><p>realizaram uma</p><p>intervenção para</p><p>mostrar que as</p><p>ameaças ao Ártico são</p><p>um problema global e</p><p>suas consequências</p><p>estão muito mais</p><p>próximas do que se</p><p>imagina.</p><p>“O aquecimento global</p><p>provoca o</p><p>derretimento do gelo</p><p>nos polos e vem</p><p>desafiando a</p><p>sobrevivência da</p><p>fauna e das</p><p>comunidades locais”,</p><p>afirma Cristine Rosa,</p><p>coordenadora da</p><p>campanha de Clima e</p><p>Energia. Nos últimos</p><p>30 anos, foram</p><p>perdidas 75% das</p><p>calotas de gelo</p><p>flutuantes. Em um</p><p>ciclo vicioso, a</p><p>exploração de petróleo</p><p>é uma das causas</p><p>desse aquecimento e</p><p>grandes corporações,</p><p>como a Shell, têm</p><p>interesse em explorar</p><p>a região. Apesar de ter</p><p>suspendido suas</p><p>atividades na área</p><p>esse ano, a empresa</p><p>ainda possui planos</p><p>para reiniciar as</p><p>tentativas de</p><p>exploração em 2014.</p><p>Fonte: Site do Greenpeace. Disponível em:</p><p><http://www.greenpeace.org/brasil/pt/Noticias/Arte-e-protesto-pelo-</p><p>Artico/> (grifos nossos).</p><p>4.2.1.2 Documentos ministeriais</p><p>O que observaremos nos próximos recortes são regularidades</p><p>distintas, em parte, daquelas já destacadas na análise dos textos de</p><p>divulgação elaborados do lugar discursivo das Organizações Não</p><p>Governamentais, sobretudo por duas razões.</p><p>A primeira será o trabalho de textualizar o homem, suas relações</p><p>sociais e econômicas, portanto históricas e políticas, como fazendo</p><p>http://www.greenpeace.org/brasil/pt/Noticias/Arte-e-protesto-pelo-Artico/</p><p>parte do ambiente e não como sendo externo ao ambiente e algoz de</p><p>seus problemas. Isso, por si só, complexifica substantivamente a</p><p>questão daquilo que será nomeado como “mudança global do clima”,</p><p>ou “mudança do clima”; ou ainda, quando a questão é mais geral, o</p><p>problema é nomeado enquanto “manutenção da vida”.</p><p>A segunda é a indicação de diferentes fatores complexos e</p><p>imbricados que fazem parte do problema, algumas vezes mantendo</p><p>a regularidade de uma relação binária entre causas e consequências</p><p>da mesma ordem vista na textualidade da divulgação de ONGs, e,</p><p>outras vezes, saindo desse espaço binário de relações, apontando</p><p>para a imbricação complexa como a razão principal da dificuldade e</p><p>da necessidade de ações conjuntas do ponto de vista da gestão e do</p><p>conhecimento, evitando assim soluções pontuais e isoladas. Outra</p><p>regularidade importante de ser destacada é a construção da</p><p>educação como solução dos problemas, seja uma educação</p><p>especializada – com ensino em nível de pós-graduação e formação</p><p>de recursos humanos técnico-científicos específicos para a reflexão</p><p>dessa problemática –, seja uma</p><p>formação geral da sociedade que se</p><p>torne ciente, ou muitas vezes consciente.</p><p>Quando essa educação está voltada para a conscientização, ela</p><p>acaba por construir um efeito de solução das contradições</p><p>complexas que marcam as relações, individualizando as práticas</p><p>sociais, econômicas e políticas, tomando-as como ações pontuais</p><p>participantes de soluções pragmáticas e resolutivas. Essa forma</p><p>pedagogizada de simplificar as práticas complexas e contraditórias e</p><p>colocá-las no lugar da solução das contradições se materializa nas</p><p>cartilhas que também foram objeto de nossa pesquisa e que foram</p><p>exploradas analiticamente em Pfeiffer & Silva6.</p><p>Plano Nacional sobre Mudança do Clima – PNMC –</p><p>Brasil. Brasília, dezembro de 2008.</p><p>Apresentação</p><p>A mudança global do clima é tema que ganha a cada</p><p>dia maior relevância na agenda de governos, das</p><p>empresas e da sociedade como um todo. Embora</p><p>ainda seja marcado por muita polêmica, o</p><p>aquecimento do planeta fruto da atividade humana é,</p><p>hoje, reconhecido pela comunidade científica</p><p>internacional e demanda grande disposição política</p><p>para sua mitigação.</p><p>O Brasil muito tem feito para o enfrentamento do</p><p>problema, tornando-se uma das principais referências</p><p>mundiais quanto à conquista de soluções adequadas</p><p>perante esse gigantesco desafio – a exemplo de nossa</p><p>matriz energética – e estamos engajados em fazer</p><p>ainda mais, no âmbito de um esforço verdadeiramente</p><p>global de combate à mudança do clima.</p><p>Brasil. Ministério da Educação. Contribuição da pós-</p><p>graduação brasileira para o desenvolvimento</p><p>sustentável: Capes na Rio+20 / Brasília: Capes, 2012.</p><p>194 p.</p><p>Apresentação</p><p>O Brasil, em sua fase atual de desenvolvimento</p><p>socioeconômico, deve enfrentar o desafio de educar</p><p>sua população e formar recursos humanos altamente</p><p>qualificados para consolidar uma política de ciência,</p><p>educação e tecnologia, comprometida com a</p><p>permanente construção de bases científicas,</p><p>tecnológicas e de inovação requeridas à</p><p>sustentabilidade social, ambiental, econômica,</p><p>espacial, política e cultural. […]</p><p>Este documento apresenta uma versão sintetizada das</p><p>realizações das instituições brasileiras, em especial a</p><p>Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível</p><p>Superior (Capes), vinculada ao Ministério da Educação</p><p>(MEC), dentro do Sistema Nacional de Pós-Graduação</p><p>(SNPG), no sentido de identificar recursos,</p><p>potencialidades e estratégias a serem trabalhados</p><p>conjuntamente visando a um padrão de</p><p>desenvolvimento condizente com os princípios da</p><p>sustentabilidade.</p><p>O texto registra a evolução da pós-graduação</p><p>brasileira no enfoque do desenvolvimento sustentável</p><p>e seus marcos históricos, além do quadro atual e</p><p>desafios da pós-graduação relacionados aos temas da</p><p>Rio+20.</p><p>Programa Nacional de Educação Ambiental – ProNEA</p><p>– Brasil. Brasília, 2005.</p><p>Justificativa</p><p>Os últimos 40 anos foram</p><p>pródigos em encontros,</p><p>conferências, seminários,</p><p>tratados e convenções</p><p>voltados à temática ambiental</p><p>e, no entanto, nunca se</p><p>comprometeu tanto a</p><p>capacidade de manutenção</p><p>da vida, o que indica a</p><p>necessidade de ações</p><p>educacionais que contribuam</p><p>para a construção de</p><p>sociedades sustentáveis.</p><p>No Brasil, a ameaça à</p><p>biodiversidade está presente</p><p>em todos os biomas, em</p><p>decorrência, principalmente,</p><p>do desenvolvimento</p><p>desordenado de atividades</p><p>produtivas. A degradação do</p><p>solo, a poluição atmosférica e</p><p>a contaminação dos recursos</p><p>hídricos são alguns dos</p><p>efeitos nocivos observados.</p><p>Na maioria dos centros</p><p>urbanos, os resíduos sólidos</p><p>ainda são depositados em</p><p>lixões, a céu aberto.</p><p>Associa-se a isso um quadro</p><p>de exclusão social e elevado</p><p>nível de pobreza da</p><p>população. Muitas pessoas</p><p>vivem em áreas de risco,</p><p>como encostas, margens de</p><p>rios e periferias indutriais. É</p><p>preciso também considerar</p><p>que uma parcela dos</p><p>brasileiros tem uma</p><p>percepção “naturalizada” do</p><p>meio ambiente, excluindo</p><p>homens, mulheres, cidades e</p><p>favelas desse conceito.</p><p>Dessa forma, assim como as</p><p>medidas políticas, jurídicas,</p><p>técnico-científicas,</p><p>institucionais e econômicas</p><p>voltadas à proteção,</p><p>recuperação e melhoria</p><p>socioambiental(1), despontam</p><p>também as atividades no</p><p>âmbito educativo.</p><p>Nota 1: Embora</p><p>reconheçamos o caráter</p><p>multidimensional da questão</p><p>ambiental, entendemos ser</p><p>necessário enfatizar a</p><p>articulação entre a dimensão</p><p>social e a dimensão</p><p>ambiental, motivo pelo qual</p><p>apresentamos neste</p><p>documento a formulação</p><p>“socioambiental” em vez de</p><p>simplesmente “ambiental”.</p><p>Fonte: Site do Pronea (grifos nossos). Disponível em:</p><p><http://portal.mec.gov.br/secad/arquivos/pdf/educacaoambiental/pron</p><p>ea3.pdf>.</p><p>Observe-se que, enquanto efeito-leitor, a construção discursiva</p><p>aponta para as mudanças climáticas como um desafio</p><p>multidimensional que precisa ser trabalhado também nessa</p><p>http://portal.mec.gov.br/secad/arquivos/pdf/educacaoambiental/pronea3.pdf</p><p>multidimensionalidade e de forma articulada, o que aumenta</p><p>consideravelmente a complexidade do problema que é social,</p><p>político, histórico, e não da natureza por si só. No entanto, não</p><p>vemos esse efeito presente em outras discursividades que ganham</p><p>espaço nas mídias e nas ruas. Percebemos que essa discursividade</p><p>fica presa a um interlocutor muito específico, não ganhando espaço</p><p>amplo de divulgação, o que deveria ser um dos empreendimentos do</p><p>poder público. Contudo, evitando entrar no discurso da publicidade</p><p>ou da mídia de uma forma geral, nos quais há simplificação,</p><p>didatização, resoluções disjuntivas, é preciso construir um modo de</p><p>dizer em que o leitor entenda e com o qual se engaje na</p><p>problemática dentro de sua complexidade, e não de maneira</p><p>superficial ou voluntariosa.</p><p>4.2.1.3 Documentos intergovernamentais</p><p>Mantendo certo paralelismo com a discursividade presente nos</p><p>textos governamentais, chamamos a atenção para três diferenças</p><p>presentes na textualidade intergovernamental.</p><p>A principal delas é o fato de que o sentido político das articulações</p><p>e das complexas relações que se estabelecem entre os homens em</p><p>suas práticas sociais, econômicas e políticas é desterritorializado nas</p><p>formas materiais planeta e povos. Não há uma relação que passe</p><p>por estados-nacionais, com diferentes presenças e ações na</p><p>complexa geopolítica contemporânea, assim como não há uma</p><p>indicação das relações históricas que configurem o estado atual</p><p>dessas práticas desiguais de ocupação e exploração dos espaços.</p><p>A outra diferença é o fato de que, apesar de o homem ser o foco</p><p>da problemática levantada por esses documentos, problemática</p><p>materializada em erradicação da pobreza, economia verde,</p><p>desenvolvimento sustentável e desenvolvimento humano, o referente</p><p>discursivo de “verde” e “sustentável”, construído nessa textualidade,</p><p>é o sistema de suporte à vida, parafraseado ainda como lar comum e</p><p>planeta compartilhado. Isso nos indica a presença da regularidade</p><p>encontrada na discursividade das ONGs, na qual separa-se o</p><p>homem da natureza, com o acréscimo de que, nesses textos</p><p>intergovernamentais, natureza e homem são desterritorializados,</p><p>apagando-se os limites nacionais e, como já dissemos, as</p><p>desigualdades dessas relações entre distintos países na história.</p><p>A última diferença a ser comentada é a inexistência de uma</p><p>estruturação sintática que indique uma relação de causas e</p><p>consequências, mantendo, no entanto, a presença de verbos como</p><p>“proteger” e “preservar”, presentes nas textualidades analisadas de</p><p>modo geral. Assim, apesar de apontar para uma problemática</p><p>centrada no homem, as ações são materializadas por meio de</p><p>verbos que indicam intenções, mas não modos de atuação. Além</p><p>disso, a intenção está voltada para algo externo ao homem:</p><p>preservar e proteger têm como objeto de suas ações o planeta e</p><p>suas paráfrases, o que reforça a separação entre homem e</p><p>natureza..</p><p>Documento Zero – Organização das Nações Unidas –</p><p>O futuro que queremos.</p><p>I. Preâmbulo/Preparação</p><p>1. Nós, os Chefes de Estado e Governo, após nos</p><p>reunirmos no Rio de Janeiro, Brasil, de 20 a 22 de</p><p>junho de 2012, decidimos trabalhar com conjunto em</p><p>busca de um futuro próspero, seguro e sustentável</p><p>para nossos povos e nosso planeta.</p><p>4. Nós também estamos comprometidos em reforçar a</p><p>cooperação e abordar as questões atuais e</p><p>emergentes</p><p>de forma a melhorar as oportunidades</p><p>para todos, centradas no desenvolvimento humano e</p><p>ao mesmo tempo preservando e protegendo o sistema</p><p>de suporte à vida de nosso lar comum, o planeta que</p><p>compartilhamos.</p><p>5. Nós urgimos uma ação ousada e decisiva sobre o</p><p>objetivo e temas da conferência. Nós renovamos</p><p>nosso compromisso com o desenvolvimento</p><p>sustentável e expressamos nossa determinação em</p><p>buscar uma economia verde no contexto do</p><p>desenvolvimento sustentável e da erradicação da</p><p>pobreza. Nós reiteramos nossa determinação em</p><p>fortalecer a estrutura institucional para o</p><p>desenvolvimento sustentável. Juntas, nossas ações</p><p>devem cobrir as lacunas de implementação e obter</p><p>uma maior integração entre os três pilares de</p><p>desenvolvimento sustentável – o econômico, o social e</p><p>o ambiental.</p><p>Como efeito-leitor, encontramos a construção de um tom profético,</p><p>apaziguador, que apaga as tensões políticas, econômicas e</p><p>históricas das nações, em um gesto messiânico de salvação da</p><p>Terra. Nesse sentido, aquilo que é construído como suporte à vida</p><p>(fauna e flora, sem homens) é equiparado discursivamente àquele</p><p>que deve ter sua pobreza erradicada: parte dos homens. Essa</p><p>parcela faz jus, assim, a um olhar messiânico, objetos arrebanhados</p><p>ordenadamente: fauna, flora, pobres.</p><p>4.2.1.4 Textos de divulgação científica</p><p>Nossas análises dos textos de divulgação científica possibilitaram</p><p>que compreendêssemos uma ênfase grande no aspecto econômico</p><p>envolvido em problemáticas em torno das mudanças climáticas, um</p><p>tom alarmista e a separação do homem da natureza, enfatizando</p><p>consequências na fauna ou na flora, retirando o homem de dentro</p><p>das consequências, salvo as econômicas. Quando as consequências</p><p>sobre o homem estão presentes (saúde, por exemplo), elas se</p><p>encontram muito frequentemente sob a forma do discurso relatado,</p><p>no qual é a voz do cientista que diz sobre as consequências, e não a</p><p>do jornalista. Isso nos permitiu perceber que, nessa discursividade, o</p><p>homem comparece muito mais como algoz, responsável por más</p><p>atitudes que implicam a natureza da qual ele não faz parte. Além</p><p>disso, é do lugar do jornalismo que o tom alarmista é construído, por</p><p>meio de introduções aos discursos relatados provenientes dos</p><p>cientistas realizadas com formas verbais como “alertar” e</p><p>adjetivações como “trágico”, “catástrofe”.</p><p>Apesar de a voz do cientista comparecer, a estrutura discursiva</p><p>predominante, na voz do jornalista, aponta para relações de causas</p><p>e consequências lineares do tipo se X, temos Y; se Z, temos W,</p><p>enquanto que a dos cientistas aponta para estruturas mais</p><p>complexas e menos lineares. No entanto, como é a voz do jornalista</p><p>que produz o efeito de fecho, de síntese, muitas vezes é a lógica</p><p>linear que fica mais presente.</p><p>Outro funcionamento interessante de ser observado,</p><p>diferentemente das outras discursividades até aqui analisadas, é a</p><p>presença de verbos que indicam previsões. Isso é muito importante,</p><p>pois o jornalismo não especializado tem como característica</p><p>estruturante trabalhar na direção da certeza, e não na da incerteza,</p><p>portanto, um discurso que se constrói em torno de projeções, mas</p><p>não de afirmações categóricas, é de fundamental importância para a</p><p>construção de um leitor de ciência que suporte a incerteza.</p><p>Dizemos isso pelo fato de que no jornalismo, conforme Silva7, o</p><p>“leitor/ espectador/ouvinte-aluno” recebe informações e respostas já</p><p>prontas e acabadas, em termos de verdades pré-estabelecidas fora</p><p>de um debate que é sincrônico e diacrônico. A mídia, como nos fala</p><p>Mariani8, além de estar no movimento da história, produz também o</p><p>próprio processo histórico em seu duplo papel de produzir uma</p><p>coerência e unidade social e de formar a opinião pública, tornando-</p><p>se a única narradora da história. Cabe à imprensa, pois, em um</p><p>papel ético condizente, desestabilizar essa história, trazendo a</p><p>incerteza e o processo de trabalho do conhecimento, e não seus</p><p>produtos aplanados. Além disso, desfazer o tom alarmista e de</p><p>urgência permitiria que seus leitores construíssem lugares de</p><p>compreensão dos fatos narrados e não lugares de apreensão, que</p><p>não abrem espaço para a reflexão, somente para o desespero ou</p><p>desesperança.</p><p>Jornal da Unicamp</p><p>5 a 11 de agosto de 2013</p><p>Degelo custará mais caro para o hemisfério sul</p><p>Muitos países vêm encarando o degelo da região</p><p>ártica do planeta, causado pela mudança climática,</p><p>como uma oportunidade: não só a chamada</p><p>Passagem de Noroeste, uma rota marítima ligando a</p><p>Ásia à América do Norte, agora passa cada vez mais</p><p>tempo aberta, facilitando e barateando o transporte de</p><p>carga, como já surgem disputas de soberania</p><p>envolvendo os recursos naturais que poderão vir a ser</p><p>explorados na região, como o petróleo. Em 2007, um</p><p>submarino russo plantou uma bandeira do país no leito</p><p>oceânico por baixo do Polo Norte, e o governo</p><p>canadense não viu graça nenhuma na proeza. O</p><p>degelo pode ter consequências trágicas para a fauna</p><p>local, e a exploração de petróleo nas águas do Ártico</p><p>traz o risco de vazamentos e outras catástrofes</p><p>ecológicas. Mas, a despeito dos alertas de</p><p>ambientalistas, a visão predominante ainda parece ser</p><p>a de que as oportunidades superam, em muito, os</p><p>perigos.</p><p>Um comentário publicado na revista Nature de 25 de</p><p>julho, no entanto, busca lançar uma dose de</p><p>sobriedade em toda a euforia: de acordo com seus</p><p>autores – pesquisadores da Universidade Erasmus, da</p><p>Holanda, e de Cambridge, no Reino Unido – o custo</p><p>do degelo pode superar os US$ 60 trilhões. Pondo o</p><p>valor em perspectiva, os autores lembram que o PIB</p><p>global em 2012 ficou em US$ 70 trilhões.</p><p>“Muito do custo recairá sobre países em</p><p>desenvolvimento, que enfrentarão eventos climáticos</p><p>extremos, saúde pior e perda na produção agrícola, à</p><p>medida que o aquecimento do Ártico afeta o clima”,</p><p>escrevem os autores. “Todas as nações serão</p><p>afetadas, não apenas as do norte”.</p><p>De acordo com Gail Whiteman (Universidade</p><p>Erasmus), Chris Hope e Peter Wadhams (Cambridge),</p><p>o principal motor da mudança climática global causada</p><p>pelo degelo do Ártico será a liberação do metano – um</p><p>poderoso gás causador do efeito estufa – aprisionado</p><p>no fundo do oceano.</p><p>AGÊNCIA FAPESP</p><p>12/09/2013 – Especiais</p><p>Seca no semiárido deve se agravar nos próximos</p><p>anos</p><p>Pesquisadores alertam para necessidade de executar</p><p>ações urgentes de adaptação e mitigação aos</p><p>impactos das mudanças climáticas previstos na região.</p><p>Agência FAPESP – Os problemas de seca prolongada</p><p>registrados atualmente no semiárido brasileiro devem</p><p>se agravar ainda mais nos próximos anos por causa</p><p>das mudanças climáticas globais. Por isso, é preciso</p><p>executar ações urgentes de adaptação e mitigação</p><p>desses impactos e repensar os tipos de atividades</p><p>econômicas que podem ser desenvolvidas na região.</p><p>A avaliação foi feita por pesquisadores que</p><p>participaram das discussões sobre desenvolvimento</p><p>regional e desastres naturais, realizadas no dia 10 de</p><p>setembro durante a 1ª Conferência Nacional de</p><p>Mudanças Climáticas Globais (Conclima).</p><p>Organizado pela Fapesp e promovido em parceria com</p><p>a Rede Brasileira de Pesquisa e Mudanças Climáticas</p><p>Globais (Rede Clima) e o Instituto Nacional de Ciência</p><p>e Tecnologia para Mudanças Climáticas (INCT-MC), o</p><p>evento ocorre até a próxima sexta-feira (13/09), no</p><p>Espaço Apas, em São Paulo.</p><p>AGÊNCIA FAPESP</p><p>12/09/2013 – Especiais</p><p>De acordo com dados do Centro Nacional de</p><p>Gerenciamento de Riscos e Desastres (Cenad), só</p><p>nos últimos dois anos foram registrados 1.466 alertas</p><p>de municípios no semiárido que entraram em estado</p><p>de emergência ou de calamidade pública em razão de</p><p>seca e estiagem – os desastres naturais mais</p><p>recorrentes no Brasil, segundo o órgão.</p><p>O Primeiro Relatório de Avaliação Nacional do Painel</p><p>Brasileiro de Mudanças Climáticas (PBMC) – cujo</p><p>sumário executivo foi divulgado no dia de abertura da</p><p>Conclima – estima que esses eventos extremos</p><p>aumentem principalmente nos biomas Amazônia,</p><p>Cerrado e Caatinga e que as mudanças devem se</p><p>acentuar a partir da metade e até o fim do século 21.</p><p>Dessa forma, o semiárido sofrerá ainda mais no futuro</p><p>com o problema da escassez de água que enfrenta</p><p>hoje, alertaram os pesquisadores.</p><p>“Se hoje já vemos que a situação é grave, os modelos</p><p>de cenários futuros das mudanças climáticas no Brasil</p><p>indicam que o problema será ainda pior. Por isso,</p><p>todas as ações de adaptação e mitigação pensadas</p><p>para ser desenvolvidas ao longo dos próximos anos,</p><p>na verdade, têm de ser realizadas agora”, disse</p><p>Marcos Airton de Sousa Freitas, especialista em</p><p>recursos hídricos e técnico da Agência Nacional de</p><p>Águas (ANA).</p><p>Enquanto efeito-leitor, temos um princípio de construção de uma</p><p>leitura polêmica, mas ainda um tanto administrada por estruturas</p><p>causais mais simples do que aquelas que de fato constituem a</p><p>problemática das mudanças climáticas.</p><p>4.3 As mudanças climáticas em</p><p>imagens – Uma rede discursiva</p><p>Há um conjunto de imagens que circulam com uma intensidade e</p><p>quantidade substantivas, que povoam sites e propagandas</p><p>reivindicatórias, sobretudo aquelas de ONGs envolvidas em</p><p>temáticas ambientais. Nossa proposta aqui é de, a partir do</p><p>“equívoco do associativo e da metáfora”9, analisar essas imagens.</p><p>Imagens que evocam associações – não ditas, presentes no</p><p>silêncio – com uma “mesma” imagem que funcionaria enquanto</p><p>metáfora de uma outra rede de significação. O encontro/desencontro</p><p>dessas redes inscritas em imagens, que condensam uma direção de</p><p>sentidos, provoca nosso olhar para o equívoco do associativo e da</p><p>metáfora10, por meio de um encadeamento imagético que se</p><p>condensa na materialidade da imagem que ressoa11, evoca, faz</p><p>vibrar o “desconhecimento/reconhecimento” de algo ao mesmo</p><p>tempo estranho e familiar12.</p><p>Remetemo-nos aqui a Mariani13, quando nos fala de um</p><p>“encadeamento acústico incessante” que permite o deslocamento</p><p>dos sentidos, “pressionando o dito, com as inúmeras possibilidades</p><p>do por dizer”, trazendo uma fina compreensão do funcionamento da</p><p>metáfora e do silêncio. E também nos remetemos a Lagazzi14, que</p><p>nos apresenta sua compreensão de um funcionamento constitutivo e</p><p>de mútua determinação, dos processos metafóricos e metonímicos</p><p>da linguagem. Ambas pensando em Pêcheux, na relação de</p><p>filiações, aproximações, distanciamentos com Saussure, Jakobson,</p><p>Freud, Lacan, Althusser.</p><p>Lagazzi15 nos traz Ducrot e Todorov, quando afirmam que Lacan</p><p>propõe que “a condensação é uma metáfora”, e ainda “a metáfora diz</p><p>para o sujeito o sentido recalcado de seu objeto”. Em sua leitura de</p><p>Ducrot e Todorov sobre Lacan, Lagazzi16 nos apresentará a metáfora</p><p>enquanto um processo que nos faz pensar a alteridade e o processo</p><p>metonímico, afirmando a falta constitutiva da cadeia significante. A</p><p>autora ainda irá propor que nesse processo mútuo de determinação,</p><p>o familiar e o estranho se entrelaçam nos efeitos metafóricos e</p><p>metonímicos17.</p><p>Queremos aqui ressaltar essa alteridade salientada pela autora,</p><p>trazendo o que Ducrot e Todorov nos apresentam sobre a metáfora,</p><p>a partir de Lacan:</p><p>[…] o aparecimento numa cadeia significante dada de um significante vindo</p><p>de outra cadeia, tendo este significante ultrapassado a barra (“resistente”) do</p><p>algoritmo para perturbar, com sua “disrupção”, o significado da primeira</p><p>cadeia, onde produz um efeito de não-sentido: testemunhando que é “antes</p><p>do sujeito” que surge o sentido18.</p><p>Como, para a Análise de Discurso, assim como não há uma</p><p>anterioridade do sujeito, também não há uma do sentido19, é preciso</p><p>reafirmarmos que não há um sentido primeiro, mas processos de</p><p>filiação de sentidos inscritos em Formações Discursivas que</p><p>estabelecem entre si relações tensas e contraditórias. Assim,</p><p>interessa-nos particularmente compreender essa relação de</p><p>alteridade que, muitas vezes, pode comparecer como uma evocação</p><p>dissonante que aponta filiações de sentidos no “desafino”.</p><p>É nesse sentido que apresentamos algumas dessas imagens que</p><p>povoam o discurso sobre as mudanças climáticas, no</p><p>entrecruzamento com um discurso ambientalista.</p><p>Veremos, nas duas primeiras sequências de imagens,</p><p>regularidades marcantes nas discursividades anteriormente</p><p>analisadas: “ausência” do Homem, demarcando uma separação</p><p>entre homem e natureza; presença do Homem, indicando uma</p><p>relação de culpabilidade individual significada como predadorismo;</p><p>universalização do “suporte da vida” – o planeta, metonimicamente</p><p>referido pelas florestas, por exemplo.</p><p>4.3.1 As imagens analisadas</p><p>Figura 4.1 – Fonte: Elaborado pela autora com imagens dos sites:</p><p><http://www.naturezaeconservacao.eco.br/2016/01/5-evidencias-que-</p><p>as-mudancas-climaticas.html>;</p><p><http://somostodosum.ig.com.br/conteudo/c.asp?id=4379>;</p><p><http://www.lookfordiagnosis.com/mesh_info.php?</p><p>term=mudan%C3%A7a+clim%C3%A1tica&lang=3>;</p><p><http://meioambiente.culturamix.com/natureza/degelo-na-</p><p>groenlandia-e-antartida>;</p><p><http://chapadeli.blogspot.com.br/2010/05/matriz-energetica-</p><p>baseada-no-uso-dos.html>;</p><p><http://entretenimento.uol.com.br/album/bbc/coolclimateart_2010_alb</p><p>um.htm>.</p><p>Guardemos esse efeito regular de ausência do homem já</p><p>comentado em nossas análises das outras discursividades</p><p>observadas, para melhor compreender de que modo o homem entra</p><p>quando está presente. Observemos, especificamente, a imagem</p><p>abaixo:</p><p>http://www.naturezaeconservacao.eco.br/2016/01/5-evidencias-que-as-mudancas-climaticas.html</p><p>http://somostodosum.ig.com.br/conteudo/c.asp?id=4379</p><p>http://www.lookfordiagnosis.com/mesh_info.php?term=mudan%C3%A7a+clim%C3%A1tica&lang=3</p><p>http://meioambiente.culturamix.com/natureza/degelo-na-groenlandia-e-antartida</p><p>http://chapadeli.blogspot.com.br/2010/05/matriz-energetica-baseada-no-uso-dos.html</p><p>http://entretenimento.uol.com.br/album/bbc/coolclimateart_2010_album.htm</p><p>Figura 4.2 – Fonte: <https://issuu.com/sancle.digital/docs/azul6?</p><p>e=10077352/5844772>.</p><p>Aparentemente, o homem também não estaria presente. Mas</p><p>encontra-se na materialidade do verbo reflexivo procura-se. X</p><p>procura Y, sendo a onça-pintada o objeto de procura, e o homem, o</p><p>agente, o sujeito deste verbo. É nesse sentido que afirmamos a</p><p>aparente ausência do homem. Essa ausência aparente se desfaz na</p><p>continuação da propaganda de dupla página:</p><p>O homem é quem procura e é também o responsável pelo tráfico</p><p>de animais, seja como traficante, seja como comprador. Observe-se</p><p>ainda o pronome possessivo na primeira pessoa do plural, marcando</p><p>a indistinção e universalização da posse das florestas – nossas</p><p>florestas: ela é de todos.</p><p>http://https//issuu.com/sancle.digital/docs/azul6?e=10077352/5844772</p><p>Figura 4.3 – Fonte: <https://issuu.com/sancle.digital/docs/azul6?</p><p>e=10077352/5844772>.</p><p>A imagem da primeira página da propaganda promove uma</p><p>evocação, estranhamente familiar, de filmes de bangue-bangue, os</p><p>faroestes:</p><p>http://https//issuu.com/sancle.digital/docs/azul6?e=10077352/5844772</p><p>Figura 4.4 – Fonte:</p><p><https://br.pinterest.com/pin/472103973410654755/>.</p><p>Na relação com esta evocação, a onça seria procurada para ser</p><p>presa – mantida a relação “mocinho X bandido”. Mas isso desafina,</p><p>pois ela está aí para ser salva de um bandido.</p><p>No desafino, evoca-se algo mais confortante e mais</p><p>contemporâneo: a procura de animais perdidos.</p><p>http://https//br.pinterest.com/pin/472103973410654755/</p><p>Figura 4.5 – Fonte:</p><p><https://amigadebicho.wordpress.com/2010/11/01/cao-desaparecido-</p><p>em-ribeirao-preto/>.</p><p>Que, por sua vez, traz à cena a seguinte imagem:</p><p>http://https//amigadebicho.wordpress.com/2010/11/01/cao-desaparecido-em-ribeirao-preto/</p><p>Figura 4.6 – Fonte:</p><p><https://amamosamobilia.wordpress.com/2009/04/02/procura-se-</p><p>taimak/>.</p><p>Essa imagem quebra algo, ao mesmo tempo em que parece como</p><p>que colar na da onça. O que quebra, o que parece colar? São papéis</p><p>intercambiáveis: onça e homem? Ou haveria determinados homens</p><p>que poderiam se intercambiar com onças, com animais?</p><p>Uma palavra por outra, nos ensina Pêcheux. O que, nessa rede,</p><p>vai produzindo a condensação e o deslizamento? Estamos aqui</p><p>pensando no que afirma Pêcheux ser o efeito metafórico: “[…] o</p><p>fenômeno semântico produzido por uma substituição contextual para</p><p>lembrar que esse deslizamento de sentido entre x e y é constitutivo</p><p>do ‘sentido’ designado por x e y”20.</p><p>Percebemos funcionar aí, na espessura dessas condensações</p><p>postas em relação de reconhecimento/desconhecimento, uma</p><p>palavra</p><p>climáticas e como devemos nos adaptar. Ou se é possível</p><p>transformar esse imenso desafio em boas oportunidades.</p><p>Aí é que está o diferencial deste livro, por se preocupar com a</p><p>disseminação da informação, adaptar a linguagem em sistemas</p><p>modernos de comunicação e difusão de tecnologias e trabalhar a</p><p>importância das mudanças climáticas na definição de políticas</p><p>públicas, passando pelos impactos na agricultura e, principalmente,</p><p>por seus efeitos na segurança alimentar. Há uma linha de</p><p>pensamento indicando as conexões entre todos os temas, desde as</p><p>relações humanas até a definição de políticas e impactos na</p><p>bioenergia, via cana-de-açúcar.</p><p>Livros como este, em que os editores conseguiram mostrar várias</p><p>relações interdisciplinares, é que provam que o aquecimento global,</p><p>ainda hoje (e continuará sendo), é um tema importante, visível e</p><p>complexo, estando longe de ficar em desuso e esquecido. De</p><p>maneira bem clara o livro mostra a importância de integrar os</p><p>estudos referentes à segurança hídrica, alimentar e energética. No</p><p>futuro, para o qual os editores anteciparam as preocupações que</p><p>circulam nos meios científicos, todos os estudos serão integrados e</p><p>a questão principal não será o clima per si, mas o homem inserido</p><p>nesse contexto das mudanças ambientais que estão cada vez mais</p><p>rápidas e, em vários casos, perigosas para a sobrevivência do</p><p>homem.</p><p>Apresentação</p><p>Jurandir Zullo Junior</p><p>O setor sucroenergético brasileiro se depara com inúmeros</p><p>desafios para pro-porcionar com solidez uma matriz energética</p><p>baseada em fontes renováveis para o país. Nesse contexto, em um</p><p>“Encontro sobre Mudanças Globais da Unicamp”, organizado pela</p><p>Pró-Reitoria de Pesquisa dessa Universidade, em 18 de junho de</p><p>2004, após uma série de indagações sobre os desafios dos</p><p>combustíveis renováveis e a indústria sucroalcooleira, em paralelo</p><p>com as possíveis mudanças climáticas, surgiu a ideia de realizar um</p><p>projeto multi e interdisciplinar entre os centros e núcleos</p><p>interdisciplinares de pesquisa e as faculdades e institutos que</p><p>compõem a Unicamp.</p><p>Após uma série de encontros entre pesquisadores da Unicamp</p><p>envolvidos com esse tema, o projeto foi materializado em 2008,</p><p>tendo sido aprovado pela Fapesp em 2010 na categoria de temático</p><p>dentro do Programa Fapesp de Pesquisas em Mudanças Climáticas</p><p>Globais (PFPMCG). Desse modo surgiu o AlcScens, sigla para</p><p>designar o projeto temático intitulado “Geração de cenários de</p><p>produção de álcool como apoio para a formulação de políticas</p><p>públicas aplicadas à adaptação do setor sucroalcooleiro nacional às</p><p>mudanças climáticas”, vigente de 2010 a 2014.</p><p>O desenvolvimento do Projeto AlcScens fundamentou-se em uma</p><p>rede de pesquisas interdisciplinar, composta por 19 especialistas de</p><p>várias áreas do conhecimento, da Unicamp e de instituições</p><p>parceiras nacionais (como o Inpe, a Embrapa, a USP, a UFScar e a</p><p>Unesp), tendo contado também com o apoio de pesquisadores de</p><p>instituições estrangeiras. O AlcScens, com sua abordagem multi e</p><p>interdisciplinar, tornou-se mais do que um projeto, constituindo-se</p><p>em uma rede muito forte de integração entre pesquisadores,</p><p>docentes e alunos de graduação e pós-graduação, que ultrapassou</p><p>as fronteiras institucionais, tanto nacionais quanto internacionais, de</p><p>modo a criar condições para continuar articulada e desenvolver</p><p>novos projetos de pesquisa na área de mudanças climáticas globais</p><p>e seus impactos, envolvendo profissionais de diversas</p><p>especialidades, tais como matemáticos, economistas, sociólogos,</p><p>divulgadores científicos, linguistas, biólogos, geneticistas, geógrafos,</p><p>demógrafos, meteorologistas e agrônomos.</p><p>Nesta obra, o leitor terá acesso a uma avaliação de especialistas</p><p>dos mais variados temas sobre a sustentabilidade atual e futura do</p><p>setor sucroenergético, considerando os desafios e as</p><p>potencialidades desse setor tanto para a atualidade como para</p><p>cenários futuros de mudanças climáticas. São apresentadas</p><p>análises acerca de temas como o desmatamento, a saúde humana,</p><p>as demandas de inovação científica (como o desenvolvimento de</p><p>novas variedades de cana-de-açúcar pela engenharia genética), a</p><p>dinâmica de populações nas regiões produtoras, os modelos</p><p>climáticos globais e regionais, a previsão e o monitoramento das</p><p>safras de cana-de-açúcar, as análises econômicas em diferentes</p><p>escalas, a logística das usinas de açúcar e álcool, a tecnificação do</p><p>setor e as análises de riscos climáticos para as principais</p><p>commodities brasileiras.</p><p>Ressalta-se que a divulgação científica foi de grande importância</p><p>para integrar toda a rede de pesquisa do AlcScens. Os conceitos</p><p>utilizados na elaboração do portal do projeto1 na internet foram</p><p>essenciais para disponibilizar um ambiente de integração para o</p><p>grupo de pesquisa, assim como uma conexão com o público externo</p><p>a ele, viabilizando um diálogo com a comunidade interessada no</p><p>setor sucroenergético.</p><p>Sem dúvida, além de conter resultados relevantes destinados ao</p><p>planejamento e desenvolvimento do setor sucroenergético nacional,</p><p>o livro é um exemplo de como pode ser organizada uma rede de</p><p>pesquisas multi e interdisciplinar em torno de um tema de grande</p><p>relevância e interesse social e nacional, capaz de gerar</p><p>conhecimento inovador, formar recursos humanos de alta qualidade</p><p>e relacionar-se com a sociedade. A organização institucional da</p><p>Unicamp, especialmente a existência do Sistema de Centros e</p><p>Núcleos Interdisciplinares de Pesquisa, a qualidade do seu corpo</p><p>técnico e administrativo, e a constante preocupação com os</p><p>interesses da sociedade, desde a sua fundação em outubro de</p><p>1966, foram atores fundamentais para alcançar os resultados</p><p>obtidos com o desenvolvimento do Projeto AlcScens.</p><p>Parte 1 - Divulgação científica</p><p>na área de mudanças</p><p>climáticas e construção de</p><p>tecnologias científicas e sociais</p><p>Introdução</p><p>Claudia Castellanos Pfeiffer</p><p>Mudanças climáticas é um tema que se tornou muito recorrente</p><p>no cotidiano da sociedade, sobretudo em razão de comparecer com</p><p>muita frequência e ênfase nos diferentes meios midiáticos, seja</p><p>como notícia, seja como objeto de propaganda, filmes, fotos,</p><p>campanhas. Mudanças climáticas é também um objeto de políticas</p><p>públicas – municipais, estaduais, nacionais e internacionais.</p><p>Finalmente, podemos observar que mudanças climáticas é, ainda,</p><p>um objeto científico estudado por diferentes subáreas das Ciências</p><p>Exatas, das Ciências Biológicas, das Engenharias, das Ciências da</p><p>Saúde, das Ciências Agrárias, das Ciências Sociais Aplicadas, das</p><p>Ciências Humanas, da Linguística, de Letras e das Artes, das</p><p>Ciências Ambientais, da Divulgação Científica, dentre outras.</p><p>É possível dizer, assim, que há, pelo menos, três espaços</p><p>discursivos em que as mudanças climáticas são referidas e,</p><p>portanto, significadas: o dos meios midiáticos, o da política pública e</p><p>o científico. As formas de significação das mudanças climáticas são</p><p>heterogêneas entre esses espaços e dentro deles, além de se</p><p>encontrarem em relação de sustentação, de articulação e de</p><p>negação. Ou seja, os modos de significação desses três espaços</p><p>estão em relação, por meio de citações, por meio de comentários,</p><p>por meio de confrontações. Em meio a tudo isso, os sujeitos que</p><p>compõem a sociedade, de modo também heterogêneo, significam</p><p>as mudanças climáticas de acordo com as posições que assumem</p><p>nas relações sociais cotidianas. Desse modo, os três espaços</p><p>discursivos – ciência, mídia, Estado (políticas públicas) – fazem</p><p>parte da rede de significação daqueles que vivem cotidianamente</p><p>nos espaços citadinos – urbanos, rurais, cibernéticos.</p><p>É dever da ciência proporcionar meios de circulação daquilo que</p><p>produz, publicizando a ciência. É um campo para a ciência, olhar</p><p>para esses meios pelos quais ela se faz ver pública e socialmente –</p><p>a publicização da ciência – e observar seus efeitos de sentido.</p><p>Também é um campo da ciência observar como a mídia faz circular</p><p>sentidos, assim como observar de que modo o Estado, por meio das</p><p>políticas públicas, faz intervirem determinados sentidos sobre os</p><p>objetos/sujeitos de suas políticas. É nesse entremeio que a ciência</p><p>pode e deve produzir</p><p>por outra, um “elemento imagético” por outro: de bandido</p><p>procurado para algo perdido procurado, para algo desaparecido</p><p>procurado, para algo extinto procurado, todos eles sofrendo, nessa</p><p>discursividade, ações de bandidos, o que escreveríamos da seguinte</p><p>forma:</p><p>http://https//amamosamobilia.wordpress.com/2009/04/02/procura-se-taimak/</p><p>Bandido ► perdido ► desaparecido ► extinto ◄ bandido</p><p>Na espessura do objeto de extinção há um bandido, causador do</p><p>problema (e que é presentificado no texto que se relaciona com a</p><p>imagem da primeira propaganda analisada).</p><p>Se na espessura do objeto de extinção há um bandido, e na do</p><p>objeto de desaparecimento? Ressoa o tráfico de gente, o</p><p>assassinato de gente, mas que, no entanto, não é marcado como</p><p>algo com consequências “desastrosas”, “catastróficas” que implicam</p><p>o suporte da vida: a fauna e a flora.</p><p>Interessa guardar as ressonâncias entre as presenças e</p><p>ausências, entre o que se mostra e o que não se mostra, mas</p><p>presente está, uma presença que desafina, provoca ruído: há um</p><p>ressoar de crime, de abandono, de perdição (nele há o que foi</p><p>perdido e aquele que se perde), de desaparecimento e de extinção,</p><p>que retorna para o de crime. São camadas imagéticas em que se</p><p>embaralham sentidos muito bem organizados.</p><p>Nessas evocações o homem está e não está, ora como sujeito, ora</p><p>como objeto da ação, e nessas substituições, sobreposições,</p><p>deslocamentos, condensações, vamos nos deparando com</p><p>equivalências incômodas que ressoam em outras imagens que</p><p>povoam esse lugar de inscrição, nas quais encontramos a dicotomia</p><p>homem/natureza; o animismo e a prosopopeia; a indistinção</p><p>homem/natureza e o humor cinicamente perverso. Os dois primeiros</p><p>funcionamentos foram extensamente tratados em Pfeiffer e Silva21.</p><p>Traremos aqui os dois últimos.</p><p>Como exemplo de uma pretensa indistinção homem/natureza, que</p><p>faz da natureza algo de dentro do homem e não do homem algo de</p><p>dentro da natureza, diferença fundamental, apresentamos a seguinte</p><p>imagem:</p><p>Figura 4.7 – Fonte: <https://www.sosma.org.br/>.</p><p>Ou ainda, como exemplo de um humor de cinismo absurdo, que</p><p>povoa nossas propagandas, no qual, invariavelmente, apaga-se a</p><p>história, a opressão, a desigualdade, o político das relações</p><p>desiguais de sentido, tudo tomado no lugar do riso, da comédia e da</p><p>criatividade, apagando a presença do homem hoje, na contradição,</p><p>vejamos as seguintes imagens:</p><p>http://www.sosma.org.br/</p><p>Figura 4.8 – Fonte:</p><p><http://www.coloribus.com/adsarchive/prints/tam-mr-cabral-</p><p>3550155/>.</p><p>http://www.coloribus.com/adsarchive/prints/tam-mr-cabral-3550155/</p><p>Figura 4.9 – Fonte: <http://www.putasacada.com.br/sbp-dm9ddb/>.</p><p>Essas imagens que povoam a internet e a paisagem urbana</p><p>configuram um efeito-leitor que vai se acostumando com essas</p><p>equivalências, banalizando as contradições e tensões que delineiam</p><p>as relações sociais, políticas, históricas. Esses sentidos, tomados</p><p>como notícia ou propaganda na mídia, passam a ser naturalizados: o</p><p>escândalo é festim, o que resta é o costume. O fato torna-se</p><p>próximo, contumaz, e, portanto, sem valor.</p><p>http://www.putasacada.com.br/sbp-dm9ddb/</p><p>4.4 Considerações finais</p><p>Procuramos trazer, neste percurso analítico, diferentes lugares do</p><p>dizer em que se imbrica a problemática das mudanças climáticas.</p><p>Nossas análises apontam para a necessidade de que haja um</p><p>investimento grande, em termos de política pública, na publicização</p><p>dessa problemática de modo a que forme leitores que suportem a</p><p>incerteza, a incompletude, a polêmica, a contradição, as relações</p><p>complexas que não têm resolução, mas sim progressão de</p><p>articulações que fazem parte da história, com todas as contradições</p><p>aí presentes. Isso significa construir modos de fazer presente – no</p><p>espaço público das ruas, das redes, da escola – sentidos de</p><p>mudanças climáticas que não a tomem como um resultado</p><p>moralmente condenável de uma má ação individual do homem sobre</p><p>a natureza e que, portanto, retirem-lhe das complexas articulações</p><p>políticas que se fazem no meio ambiente do qual ele faz parte,</p><p>inexoravelmente. De nosso ponto de vista, isso permitiria que</p><p>pressões reais e comprometidas tivessem espaço para acontecer,</p><p>tendo no homem, na sua pluralidade de modos de existir, o foco da</p><p>atenção, do cuidado, da [r]existência.</p><p>Referências bibliográficas</p><p>HENRY, P. “A história não existe?”. In: ORLANDI, E. P. et al. (orgs.).</p><p>Gestos de leitura: Da história no discurso. Trad. Bethânia Mariani et</p><p>al. Campinas, Editora da Unicamp, 1994, pp. 29-54.</p><p>LAGAZZI, S. “Delimitações, inversões, deslocamentos em torno do</p><p>Anexo 3”. In: LAGAZZI, S.; TASSO, I. & ROMUALDO, E. (orgs.).</p><p>Estudos do texto e do discurso. São Carlos, P&J Editores, 2013.</p><p>MARIANI, B. Imprensa de 1930 e memória histórica: Uma questão</p><p>para a análise do discurso. Campinas, Instituto de Estudos</p><p>Linguísticos, Unicamp, 1988 (Dissertação de Mestrado).</p><p>______. “Silêncio e metáfora, algo para se pensar”. Anais… II SEAD,</p><p>2005, pp. 1-16.</p><p>ORLANDI, E. P. Discurso e leitura. São Paulo/Campinas,</p><p>Cortez/Editora da Unicamp, 1988.</p><p>______. As formas do silêncio: No movimento dos sentidos.</p><p>Campinas, Editora da Unicamp, 1992.</p><p>ORLANDI, E. P. Para uma enciclopédia da cidade. Campinas,</p><p>Pontes, 2003.</p><p>PÊCHEUX, M. Semântica e discurso: Uma crítica à afirmação do</p><p>óbvio. Trad. Eni P. Orlandi et al. Campinas, Editora da Unicamp,</p><p>1988.</p><p>______. O discurso: Estrutura ou acontecimento. Campinas, Pontes,</p><p>1990.</p><p>______. A língua inatingível; O discurso na história da linguística.</p><p>Campinas, Pontes, 2004. PFEIFFER, C. C. & SILVA, M. V. da.</p><p>“Pedagogização do espaço urbano”. RUA (on-line), número especial</p><p>20 anos, vol. 2, 2014.</p><p>SILVA, T. D. da. “O leitor brasileiro e a imprensa”. In: Eni P. Orlandi</p><p>(org.). A leitura e os leitores. Campinas, Pontes, 1998, pp. 171-187.</p><p>______. Televisão brasileira: A comunicação institucionalizada.</p><p>Campinas, Instituto de Estudos Linguísticos, Unicamp, 2002 (Tese de</p><p>Doutorado).</p><p>Parte 2 - Impactos das</p><p>mudanças climáticas na</p><p>agricultura e os sistemas de</p><p>previsão de safras da cultura</p><p>da cana-de-açúcar</p><p>Introdução</p><p>Renata Ribeiro do Valle Gonçalves</p><p>A produção de cana-de-açúcar no Brasil tem crescido nos últimos</p><p>anos, sendo que os maiores índices de aumento da área plantada</p><p>são encontrados em São Paulo, Mato Grosso do Sul, Goiás e Mato</p><p>Grosso. O estado de São Paulo é o maior produtor da cultura, com a</p><p>existência de safras alternadas para manter a presença do país no</p><p>mercado mundial ao longo do ano. As culturas destinadas à</p><p>produção de açúcar, como a cana-de-açúcar, são exigentes em</p><p>relação às condições climáticas, precisando de condições ideais de</p><p>temperatura e umidade para o seu desenvolvimento. Esse fato</p><p>ilustra a importância da cultura para o país e evidencia a</p><p>necessidade da existência de sistemas de monitoramento e</p><p>previsão de safras que auxiliem o planejamento envolvido na</p><p>produção e comercialização de produtos estratégicos para os</p><p>mercados interno e externo, como são o açúcar e o etanol.</p><p>A utilização de dados de sensoriamento remoto e de modelagem</p><p>numérica é importante, nesse contexto, tanto na estimativa da área</p><p>plantada, quanto na da produtividade das culturas agrícolas, que,</p><p>atualmente, é feita predominantemente por meio de levantamentos</p><p>estatísticos com produtores e setores do agronegócio. As</p><p>informações obtidas a partir das imagens de satélites, associadas a</p><p>informações meteorológicas e climáticas, podem indicar e antecipar</p><p>a ocorrência de fenômenos que já aconteceram no passado e</p><p>levaram a uma boa safra ou a uma quebra na produção.</p><p>Esta parte do livro discute métodos de previsão e monitoramento</p><p>de safras de cana-de-açúcar utilizando séries temporais de imagens</p><p>de satélite e modelos numéricos climáticos, tal como o modelo</p><p>regional de mudanças climáticas Eta/CPTEC para o estado de São</p><p>Paulo. Os capítulos desta parte se apresentam, na sequência:</p><p>O uso do sensoriamento remoto e, principalmente, a utilização</p><p>de séries temporais de imagens de satélites, juntos da</p><p>modelagem agrometeorológica e técnicas de mineração de</p><p>dados, podem ser de grande utilidade no desenvolvimento de</p><p>métodos de previsão</p><p>e acompanhamento de safras, pois são</p><p>baseados na detecção de mudanças do comportamento</p><p>espaço-temporal das áreas agrícolas e dos dosséis vegetais. A</p><p>utilização dessas técnicas e informações auxilia a detecção de</p><p>padrões e a geração de conhecimento, a fim de aprimorar o</p><p>monitoramento, e tem a finalidade principal de aumentar a</p><p>objetividade, a precisão e a antecipação da previsão de safra</p><p>da cana-de-açúcar, que já é estratégica para o país e será</p><p>ainda mais na adaptação do setor às mudanças climáticas;</p><p>Uma das ferramentas para o estudo do monitoramento e</p><p>adaptação climática da cana-de-açúcar, levando em</p><p>consideração as projeções futuras de mudanças climáticas, é a</p><p>modelagem numérica, que se baseia em equações de dinâmica</p><p>de fluido da superfície terrestre e da atmosfera. Os modelos</p><p>climáticos oriundos da modelagem numérica são projetados</p><p>considerando a variabilidade climática e a interferência</p><p>antrópica, que altera a emissão de gases de efeito estufa na</p><p>atmosfera;</p><p>Um exemplo de modelo climático abordado neste capítulo é o</p><p>modelo regional de mudanças climáticas Eta/CPTEC, que tem</p><p>boa representatividade para simular o clima presente na</p><p>América do Sul. O modelo regional Eta/CPTEC pode ser</p><p>considerado o início para a compreensão dos impactos das</p><p>mudanças climáticas, pois muitas vezes pode ocorrer</p><p>variabilidade climática regional devido a diferentes distribuições</p><p>geográficas dos impactos climáticos no país. Dessa maneira,</p><p>este estudo fornece informações úteis para a avaliação da</p><p>vulnerabilidade e concepção de medidas estratégicas para a</p><p>adaptação da cana-de-açúcar de acordo com as mudanças</p><p>climáticas.</p><p>5. Sensoriamento remoto</p><p>aplicado à previsão e</p><p>monitoramento de safras da</p><p>cana-de-açúcar</p><p>Renata Ribeiro do Valle Gonçalves, Jurandir Zullo Junior,</p><p>Luciana Alvim Santos Romani</p><p>Processo Fapesp 2008/58160-5</p><p>As safras no Brasil são estimadas, predominantemente, por meio</p><p>de formulários e entrevistas realizadas com agricultores,</p><p>cooperativas e agroindústria. As estimativas são feitas,</p><p>normalmente, seis vezes por ano em várias regiões agrícolas</p><p>brasileiras, sendo realizadas mais frequentemente por um inventário</p><p>das culturas1. Além disso, dados completos sobre as culturas</p><p>agrícolas podem ser estratégicos para monitorar uma safra. No</p><p>entanto, esses inventários periódicos são difíceis de serem</p><p>realizados devido à grande extensão do território brasileiro. Para</p><p>evolução do monitoramento e previsão de safras da cana-de-açúcar</p><p>no país é necessário conhecer a região de plantio, a fenologia da</p><p>cultura e o clima, pois a cultura é influenciada pela variação das</p><p>condições meteorológicas durante um ano inteiro. Uma das formas</p><p>de avaliar o impacto do clima na produção vegetal pode ser por</p><p>meio do cálculo do balanço hídrico dos climas atual e futuro. Dessa</p><p>maneira, o aumento da temperatura causa um aumento da</p><p>evapotranspiração e, consequentemente, um aumento na demanda</p><p>hídrica, com reflexo direto no risco climático para a cultura.</p><p>A previsão e o acompanhamento de safras agrícolas têm</p><p>progredido gradativamente através da utilização de métodos e</p><p>técnicas provenientes de várias áreas do conhecimento, tais como</p><p>estatística, modelagem matemática, agronomia, agrometeorologia,</p><p>climatologia, geoprocessamento e sensoriamento remoto, entre</p><p>outras. O avanço tecnológico nas últimas décadas tem levado a um</p><p>aumento rápido no volume de dados captados, gerados e</p><p>armazenados por diferentes instituições. Em sensoriamento remoto,</p><p>esse volume de dados tem crescido em tamanho e complexidade de</p><p>forma exponencial, excedendo a capacidade humana de análise e</p><p>extração de informações de forma manual. Por outro lado, a</p><p>possibilidade de lidar com uma grande quantidade de dados e</p><p>extrair novos conhecimentos tem motivado especialistas em todo o</p><p>mundo. Dessa forma, esses novos desafios em pesquisa na área de</p><p>sensoriamento remoto têm incentivado cada vez mais a formação</p><p>de grupos multi e interdisciplinares.</p><p>A utilização de séries temporais de imagens de satélites,</p><p>modelagem agrometeorológica e técnicas de mineração de dados</p><p>pode ser de grande utilidade no desenvolvimento de métodos de</p><p>previsão e acompanhamento de safras da cana-de-açúcar no país,</p><p>pois são baseadas na detecção de mudanças do comportamento</p><p>espaço-temporal das áreas agrícolas e dos dosséis vegetais. A</p><p>utilização de métodos computacionais auxilia na detecção de</p><p>padrões e na geração de conhecimento a fim de aprimorar o</p><p>monitoramento agrometeorológico, assim como na obtenção de</p><p>modelos que sejam aplicáveis, simultaneamente, a vários</p><p>municípios produtores de cana-de-açúcar, e tem a finalidade</p><p>principal de aumentar a objetividade, a precisão e a antecipação da</p><p>previsão de safra da cana-de-açúcar, que já é estratégica para o</p><p>país e será ainda mais na adaptação do setor às mudanças</p><p>climáticas.</p><p>O desenvolvimento contínuo e a utilização de várias técnicas de</p><p>previsão deverão ser a forma encontrada para estimar safras</p><p>agrícolas com a precisão e a antecipação necessárias para o</p><p>planejamento das produções de cana-de-açúcar e etanol. Dessa</p><p>maneira, destaca-se, neste capítulo, o sensoriamento remoto, e,</p><p>principalmente, a utilização de séries temporais de imagens de</p><p>satélites como sendo uma das principais fontes de dados e</p><p>informações para o monitoramento e previsão de safras da cultura.</p><p>5.1 O que é sensoriamento remoto?</p><p>Uma definição ampla de sensoriamento remoto pode ser dada</p><p>como sendo a aquisição de informações sobre um objeto sem que</p><p>se entre em contato físico com ele2. Existem palavras-chave que</p><p>definem sensoriamento remoto, tais como, distância, informação e</p><p>contato físico, sendo aplicadas em diferentes escalas de trabalho,</p><p>como na superfície terrestre, na atmosfera e no espaço3.</p><p>Na tecnologia espacial, o sensoriamento remoto pode ser definido</p><p>como a utilização conjunta de sensores, equipamentos para</p><p>processamento de dados, equipamentos de transmissão de dados</p><p>coletados a bordo de aeronaves, espaçonaves ou outras</p><p>plataformas, com o objetivo de estudar eventos, fenômenos e</p><p>processos que ocorrem na superfície do planeta Terra a partir do</p><p>registro e da análise das interações entre a radiação</p><p>eletromagnética (REM) e as substâncias que o compõem em suas</p><p>diversas manifestações4.</p><p>Nesse contexto, os sensores remotos orbitais são sistemas que</p><p>transformam a radiação eletromagnética em um sinal elétrico com</p><p>informações sobre o ambiente visado. Esses sensores podem ser</p><p>ativos – que produzem a própria radiação, como o radar, por</p><p>exemplo – ou passivos – que dependem de fonte externa, que é</p><p>comumente a radiação solar, tais como os satélites. O produto</p><p>adquirido pelos sensores remotos ativos e passivos nos processos</p><p>de interação entre a radiação eletromagnética e a superfície</p><p>terrestre é uma imagem de radar ou satélite, que fornece</p><p>informações sobre os recursos naturais terrestres, tais como água,</p><p>solo, rochas e vegetação.</p><p>5.2 Características das imagens de</p><p>satélites</p><p>Imagem de satélite é uma função bidimensional de intensidade da</p><p>radiação eletromagnética em qualquer ponto (x,y) da superfície</p><p>terrestre. Uma imagem digital é uma imagem que foi discretizada</p><p>tanto nas coordenadas espaciais (x,y) (amostragem através de</p><p>digitalização espacial) quanto no brilho f (x,y) (quantização através</p><p>de digitalização de amplitude), sendo comumente representada por</p><p>uma matriz cujas linhas e colunas identificam a localização do ponto</p><p>na imagem, e a célula da matriz (denominada de pixel, que é a</p><p>contração de Picture Element) contém o nível de cinza (valor do</p><p>brilho discretizado). As características das imagens de satélite são</p><p>apresentadas de acordo com os sistemas sensores de cada satélite</p><p>em órbita. Existem inúmeros satélites comerciais de observação da</p><p>Terra em órbitas de interesse urbano, ambiental e agrícola, com</p><p>diferentes características de resolução e periodicidade.</p><p>A resolução é a capacidade que um sistema sensor tem de</p><p>distinguir entre respostas que são semelhantes ou próximas em</p><p>termos espaciais, espectrais, radiométricos ou temporais.</p><p>A resolução espacial representa o menor objeto passível de</p><p>detecção pelo</p><p>sistema sensor. Um objeto somente pode ser</p><p>detectado quando o tamanho dele é, no mínimo, igual (ao) ou maior</p><p>do que o tamanho do elemento de resolução no terreno, ou seja, do</p><p>pixel. Um sensor que tem uma resolução espacial de 30 metros</p><p>corresponde a um pixel com uma área imageada de 30 x 30 metros.</p><p>A resolução espectral é uma medida da largura das faixas</p><p>espectrais e da sensibilidade do sistema sensor em distinguir entre</p><p>dois níveis de intensidade do sinal de retorno. Por exemplo, um</p><p>sistema sensor que opera na faixa de 0,4 a 0,5µm tem uma</p><p>resolução espectral maior do que um sensor que opera na faixa de</p><p>0,4 a 0,6µm e será capaz de registrar pequenas variações no</p><p>comportamento espectral em regiões mais estreitas do espectro</p><p>eletromagnético5.</p><p>A resolução radiométrica é a distinção das variações no nível de</p><p>energia refletida, emitida ou retroespalhada que deixa a superfície</p><p>do alvo. Quanto maior for a capacidade do sensor de distinguir</p><p>diferenças de intensidade do sinal, maior será a resolução</p><p>radiométrica6. A quantização do sinal é medida pelo intervalo de</p><p>número de valores digitais usados para expressar os valores de</p><p>radiância medidos pelo detector. A quantização é normalmente</p><p>expressa em termos de números de dígitos binários (bits). Quanto</p><p>maior a quantização, maior será a qualidade visual da imagem. Uma</p><p>imagem de 8 bits (28=256) tem detalhes visuais melhores que as</p><p>imagens de menores resoluções radiométricas, de 6, 4 e 2 bits7.</p><p>A resolução temporal refere-se à frequência com que o sensor</p><p>revisita uma área e obtém imagens periódicas ao longo de sua vida</p><p>útil. A resolução temporal do imageamento é diferente (5 minutos,</p><p>30 minutos, 1 dia, 16 dias ou 26 dias) para cada sistema sensor,</p><p>pois cada sensor faz varredura de faixas no terreno de larguras</p><p>diferentes8.</p><p>Dentre alguns sistemas sensores, destacam-se os de alta</p><p>resolução espacial (Ikonos, Quick-Bird, Geoeye e Rapideye), os de</p><p>média resolução espacial (Landsat, Spot e CBERS) e os de baixa</p><p>resolução espacial, mas com alta periodicidade temporal</p><p>(AVHRR/NOAA, MODIS e CBERS/WFI).</p><p>5.3 Processamento das imagens</p><p>O pré-processamento das imagens de satélite refere-se ao</p><p>conjunto de tratamentos que permitem a transformação de dados</p><p>digitais brutos em dados corrigidos, radiométrica e</p><p>geometricamente, isto é, visa preparar os dados brutos recebidos</p><p>nas estações em produtos confiáveis e de qualidade para sua</p><p>utilização posterior nas mais diversas aplicações (Figura 5.1).</p><p>Figura 5.1 – Pré-processamento de imagens de satélite,</p><p>calibração radiométrica, correção atmosférica e geométrica.</p><p>Fonte: Elaboração dos autores.</p><p>A relação entre os valores digitais das imagens de satélite e a</p><p>refletância ou a radiância das superfícies observadas é afetada</p><p>pelas perturbações próprias do sensor, incluindo a resolução</p><p>radiométrica e dinâmica dos dados, pelos efeitos devidos à</p><p>presença da atmosfera e, também, pelo perfil do relevo terrestre. O</p><p>conhecimento desses fatores é relevante para que seja possível</p><p>distinguir as variações relacionadas com a captura dos dados pelos</p><p>satélites, das variações referentes às próprias grandezas medidas, e</p><p>que realmente interessam às diversas aplicações de interesse. As</p><p>etapas do pré-processamento das imagens são: calibração</p><p>radiométrica e correções atmosférica e geométrica.</p><p>A etapa da calibração radiométrica corresponde à conversão dos</p><p>valores digitais da imagem em refletância ou unidades de radiância</p><p>aparente medidas no satélite. Os coeficientes de calibração</p><p>utilizados nesse caso determinam a resolução radiométrica e</p><p>dinâmica dos dados obtidos a partir das imagens, sendo que a sua</p><p>variação temporal é de grande importância no tratamento de</p><p>imagens multitemporais.</p><p>A radiância medida por um sistema de sensoriamento remoto</p><p>para um dado alvo é influenciada por fatores como: mudanças de</p><p>iluminação da cena, condições atmosféricas, geometria de visada e</p><p>características de resposta dos sensores9. Para comparar dados de</p><p>uma mesma cena que tenham sido gerados pelo mesmo sensor, em</p><p>momentos distintos, é necessário remover os erros possíveis</p><p>relacionados a diferenças entre esses fatores. Para remover esses</p><p>erros, os sensores multiespectrais passam por uma calibração antes</p><p>mesmo de serem lançados, que é a calibração de pré-lançamento,</p><p>feita em laboratório, na qual é possível obter os coeficientes de</p><p>calibração. E também passam pela calibração pós-lançamento, na</p><p>qual as técnicas de obtenção dos coeficientes de calibração de pós-</p><p>lançamento envolvem a análise de superfícies de referência</p><p>radiometricamente estáveis. O objetivo aqui é calcular a radiância</p><p>desses alvos no topo da atmosfera e compará-la aos valores digitais</p><p>medidos pelo sensor sobre as áreas de referência10.</p><p>A correção atmosférica é realizada para reduzir o efeito da</p><p>atmosfera sobre os valores de nível de cinza registrados em uma</p><p>imagem11. A radiância captada pelos sensores orbitais é</p><p>proveniente do alvo imageado e da atmosfera, pois as partículas e</p><p>gases presentes na atmosfera afetam os sinais recebidos por eles.</p><p>Os principais efeitos observados nas imagens de satélite, devido à</p><p>presença real da atmosfera entre o satélite e a superfície terrestre,</p><p>são a diminuição da faixa de valores digitais possíveis registrados</p><p>pelo sensor, a diminuição do contraste entre superfícies adjacentes</p><p>e a alteração do brilho de cada ponto da imagem. Os gases</p><p>(principalmente vapor d’água, oxigênio, ozônio e dióxido de</p><p>carbono) e os aerossóis (pequenas partículas materiais, distintas da</p><p>água e do gelo, em suspensão, com raio variando de 0,1µm a</p><p>10µm) absorvem e espalham a radiação solar desde quando ela</p><p>atinge a atmosfera até deixá-la, depois de refletida pelo solo12.</p><p>Por fim, as imagens geradas por sensores remotos estão sujeitas</p><p>a uma série de distorções espaciais, não possuindo, portanto,</p><p>precisão cartográfica quanto ao posicionamento dos objetos,</p><p>superfícies ou fenômenos nelas representados. Para que a precisão</p><p>cartográfica seja considerada em imagens de sensoriamento</p><p>remoto, é necessário que elas sejam corrigidas segundo um sistema</p><p>de coordenadas13. A correção geométrica de imagens, ou</p><p>georreferenciamento, é definida como um processo que transforma</p><p>a imagem de satélite em uma projeção cartográfica conhecida14.</p><p>5.4 Séries temporais de imagens de</p><p>satélites</p><p>Como já mencionado, os avanços tecnológicos nos últimos anos</p><p>têm melhorado a qualidade dos sensores orbitais, levando a um</p><p>aumento na quantidade de imagens captadas e disponíveis. Dessa</p><p>forma, esse conjunto de dados de observação da Terra tem crescido</p><p>não só em tamanho, mas também em resolução, número de bandas</p><p>espectrais e frequência de aquisição, permitindo novos estudos,</p><p>bem como motivando o desenvolvimento de novos métodos e</p><p>técnicas de análises de dados/imagens. Nesse cenário, ao se</p><p>obterem dados temporais na mesma região geográfica, é possível</p><p>construir uma série temporal de imagens de satélites (SITS, do</p><p>inglês Satellite Image Time Series). Consultando bases de dados</p><p>digitais como o Institute of Electric and Electronic Engineers (IEEE)</p><p>e a Association for Computing Machinery (ACM), obtêm-se ainda</p><p>poucos artigos científicos como resultados para o termo de busca</p><p>SITS, sendo 37 e 6 respectivamente. Os primeiros artigos datam de</p><p>2006, o que mostra como essa área de estudo é bastante recente.</p><p>As SITS têm sido cada vez mais utilizadas, pois possuem</p><p>informação agregada de tempo e espaço sobre a cena observada.</p><p>Dessa forma, essas séries tornam-se recursos preciosos para</p><p>estudos sobre a superfície da Terra, com aplicações em várias</p><p>áreas, tais como, por exemplo, agricultura e uso e cobertura da</p><p>terra. As séries disponíveis atualmente podem ser de alta resolução</p><p>temporal (AVHRR-NOAA, Spot Vegetation, MODIS) ou de alta</p><p>resolução espacial (Landsat). De acordo com Petitjean et al.15,</p><p>alguns aspectos, no entanto, devem ser observados:</p><p>Dados de referência: Não é possível garantir que dados de</p><p>referência (amostras de treino para algoritmos ou verdades</p><p>terrestres) estarão disponíveis e prontos para uso todos os dias</p><p>ou semanas. É preciso, portanto,</p><p>usar ou desenvolver métodos</p><p>capazes de operar de forma não supervisionada ou avaliar a</p><p>possibilidade de uso de dados de referência de anos anteriores;</p><p>Amostragem irregular: a irregularidade na frequência de</p><p>amostragem temporal das imagens pode prejudicar mais a</p><p>análise por determinados métodos quando se trata de uma</p><p>série de imagens com intervalo temporal menor, como por</p><p>exemplo imagens diárias ou mensais. Ao passo que, se o</p><p>conjunto de dados é composto por uma imagem-composição</p><p>para cada estação do ano, a falta de uma imagem diária ou</p><p>semanal pode impactar pouco. De qualquer forma, aqueles</p><p>métodos que lidam com amostragem temporal irregular são</p><p>mais adequados para explorar plenamente as aquisições</p><p>disponíveis;</p><p>Fenômenos sazonais: muitos parâmetros, como, por exemplo,</p><p>índices de vegetação, possuem um comportamento periódico</p><p>que pode se alterar de acordo com outras medidas físicas,</p><p>como as condições meteorológicas, por exemplo. Sendo assim,</p><p>não é o sensor, mas o objeto observado que tem um</p><p>comportamento temporal irregular. Nesse caso, os métodos que</p><p>têm algum tipo de invariância para alongamento ou dilatação</p><p>temporal são os mais indicados.</p><p>As SITS são dados estruturados tanto temporal quanto</p><p>espacialmente. A estrutura espacial do dado é geralmente utilizada</p><p>como base para a comparação entre valores diferentes, ou seja, as</p><p>coordenadas (x, y) do pixel nas imagens identificam cada área</p><p>imageada ao longo do tempo. A dimensão temporal pode impactar a</p><p>estruturação dos dados, dependendo de como essa informação é</p><p>utilizada. Em algumas análises, o tempo pode ser utilizado apenas</p><p>como um atributo sem ser como forma de ordenação das imagens.</p><p>Nesse caso, imagens diferentes podem ser concatenadas em uma</p><p>única imagem com vários atributos, sendo que o tempo passa a ser</p><p>um novo atributo identificador. A dimensão temporal também pode</p><p>ser utilizada para estruturar pares de imagens ou estruturar séries</p><p>de imagens.</p><p>Métodos distintos têm sido utilizados a fim de analisar as SITS,</p><p>contribuindo para a pesquisa científica em várias áreas do</p><p>conhecimento. Métodos estatísticos, como a Análise de</p><p>Componentes Principais e o Fator de Auto Correlação Máximo, são</p><p>técnicas que permitem a transformação linear dos dados. Esses</p><p>métodos são simples de usar e geralmente geram resultados úteis</p><p>na prática. Exemplos da aplicação dessas técnicas podem ser</p><p>encontrados na literatura em Nielsen et al.16 e Howarth et al.17.</p><p>Métodos de agrupamento em que nenhuma informação adicional,</p><p>além do próprio conjunto de dados, é necessária para separar os</p><p>dados em grupos têm sido aplicados às SITS. O método K-Means é</p><p>o mais utilizado com propósitos diferentes, como, por exemplo, para</p><p>auxiliar no acompanhamento de safras agrícolas a partir de séries</p><p>de imagens AVHRR/NOAA18. A combinação de resultados de</p><p>diferentes métodos de agrupamento aplicados a imagens de satélite</p><p>com o objetivo de encontrar grupos de padrões que sejam comuns a</p><p>todos os agrupamentos foi proposta por Kyrgyzov et al.19. Mais</p><p>recentemente, conjuntos de dados multidimensionais, ou seja, SITS</p><p>compostas por imagens originadas a partir de índices diferentes</p><p>estão sendo submetidos a algoritmos de agrupamento a fim de</p><p>melhorar a qualidade dos resultados, gerando grupos com objetos</p><p>mais similares entre si no próprio grupo e mais distintos entre</p><p>grupos diferentes20.</p><p>A classificação das SITS baseada em pixels ou regiões traz</p><p>resultados importantes para diversas áreas de aplicação, como</p><p>agricultura, dinâmica do uso do solo e desertificação, dentre outros.</p><p>Métodos clássicos, como árvores de decisão, support vector</p><p>machine, k-means, expectation maximization e K-nn, dentre outros,</p><p>e novas proposições têm sido utilizados com resultados</p><p>satisfatórios21. Além disso, existem métodos que classificam</p><p>independentemente todas as imagens e depois as combinam ou</p><p>fundem para produzir uma classificação simples. A vantagem</p><p>desses métodos é que eles não requerem a comparação de níveis</p><p>radiométricos entre imagens, existindo exemplos com quatro</p><p>imagens22 ou mais23. Nesse caso, a dimensão temporal não tem</p><p>efeito sobre o resultado. Algoritmos de classificação</p><p>semissupervisionada baseados em grafos também têm sido</p><p>aplicados às SITS com o objetivo de classificar áreas agrícolas24.</p><p>Alguns métodos de análise de SITS utilizam informação temporal</p><p>para gerar uma ordenação parcial das imagens, geralmente pares</p><p>de imagens. Nesse caso, esses métodos pressupõem que os</p><p>valores entre as imagens sejam comparáveis. Por meio de</p><p>operadores de combinação simples, como subtração, divisão ou</p><p>mesmo outros mais complexos, os valores das imagens num tempo</p><p>t são combinados com os do tempo t-1 a fim de revelar a estrutura</p><p>temporal intrínseca do dado. A imagem combinada resultante pode</p><p>ser classificada para mapear, por exemplo, áreas de mudança.</p><p>Esses métodos são limitados e podem ser aplicados a duas</p><p>imagens ao mesmo tempo. No caso das SITS, esses métodos têm</p><p>sido aplicados várias vezes, o que leva a resultados de difícil</p><p>análise25.</p><p>O método de regressão linear que considera o valor do pixel num</p><p>tempo t linearmente correlacionado ao valor do pixel no tempo t-1</p><p>também tem sido muito utilizado26.</p><p>Outra classe de métodos considera a sequência de imagens</p><p>ordenadas pela informação temporal para estudar a evolução de</p><p>uma área. Essas técnicas compreendem o uso de filtros, como a</p><p>técnica transformada de Fourier ou Wavelets, por serem capazes de</p><p>lidar com séries temporais, auxiliando na preparação dos dados</p><p>antes da análise por outros métodos de classificação, como, por</p><p>exemplo, pelos métodos de Andres et al.27 e Celik e Ma28. Também</p><p>é possível utilizar técnicas para detecção de padrões sequenciais</p><p>que pressupõem um passo anterior de discretização dos dados para</p><p>reduzir o espaço de busca29.</p><p>5.5 Exemplos de aplicação para cana-</p><p>de-açúcar</p><p>Aplicações de uso do sensoriamento remoto para</p><p>acompanhamento do desenvolvimento da cana-de-açúcar têm sido</p><p>realizadas para os estados de São Paulo, Mato Grosso do Sul, Mato</p><p>Grosso e Goiás, que se caracterizam por apresentar áreas</p><p>plantadas de grandes dimensões espaciais, em terreno de relevo</p><p>plano e suavemente ondulado. O estado de São Paulo está situado</p><p>entre as coordenadas geográficas 54° e 43°30’ de longitude oeste e</p><p>25°30’ e 19°30’ de latitude sul e os estados de Mato Grosso do Sul,</p><p>Mato Grosso e Goiás, entre as coordenadas 62° e 45° de longitude</p><p>Oeste e 7° e 26° de latitude Sul. A Figura 5.2 ilustra a área de</p><p>interesse e as aplicações para a cana-de-açúcar que serão</p><p>descritas a seguir.</p><p>Figura 5.2 – Área de plantio de cana-de-açúcar e aplicações</p><p>utilizando sensoriamento remoto para monitoramento e</p><p>mapeamento da cultura.</p><p>Fonte: Elaboração dos autores.</p><p>Para a execução dos estudos de monitoramento da cultura da</p><p>cana-de-açúcar, utilizou-se o banco de imagens do satélite</p><p>AVHRR/NOAA do Centro de Pesquisas Meteorológicas e Climáticas</p><p>Aplicadas à Agricultura, da Universidade Estadual de Campinas</p><p>(Cepagri/Unicamp), que possui um acervo digital com dados desde</p><p>abril de 1995 com mais de 54.000 imagens.</p><p>O sistema SatImagExplorer tem sido utilizado normalmente no</p><p>processamento das séries de imagens, pois o sistema permite que o</p><p>especialista interaja com as imagens e especifique regiões de</p><p>interesse (ROI), utilizando como base de entrada uma imagem da</p><p>série30. A seguir, o SatImagExplorer extrapola a indicação de região</p><p>para todas as imagens da sequência, gerando séries temporais das</p><p>ROIs correspondentes à indicada para todas as imagens</p><p>disponíveis31.</p><p>A relação existente entre dados climáticos e produtividade da</p><p>cana-de-açúcar, expressa por meio de índices estimados com dados</p><p>de satélites, foi estudada por Gonçalves et al.32, que utilizaram o</p><p>índice de vegetação (EVI) e os dados do Tropical Rainfall Measuring</p><p>Mission (TRMM), na região Centro-Sul do Brasil, para o período</p><p>2001-2011, e propuseram uma equação para estimar o EVI a partir</p><p>de dados do TRMM. O interesse na utilização dos dados do TRMM</p><p>é amplamente justificado pela dificuldade frequente em obter dados</p><p>das estações meteorológicas de superfície</p><p>no Brasil. Ressalta-se</p><p>que as relações encontradas para os estados de São Paulo e Mato</p><p>Grosso foram melhores que as de Goiás e Mato Grosso do Sul,</p><p>sendo que todas as equações propostas podem ser utilizadas na</p><p>prática para monitorar e acompanhar o desenvolvimento da cana-</p><p>de-açúcar na região Centro-Sul do Brasil. Esses resultados foram</p><p>confirmados por Gonçalves et al.33 utilizando o índice EVI2 para os</p><p>estados de Goiás, Mato Grosso e Mato Grosso do Sul.</p><p>Um algoritmo, denominado CLEARMiner (sigla de Climate and</p><p>rEmote sensing Association patteRns Miner) foi proposto por</p><p>Romani et al.34 para mineração de padrões de associação em séries</p><p>temporais heterogêneas de dados climáticos e de sensoriamento</p><p>remoto, integrados em um sistema de informações desenvolvido</p><p>para melhorar o monitoramento de plantios de cana-de-açúcar. Esse</p><p>sistema, denominado RemoteAgri, é constituído de um grande</p><p>banco de dados climáticos e de imagens de satélite de baixa</p><p>resolução espacial, um módulo de pré-processamento de imagens,</p><p>um módulo de extração de séries temporais de dados e métodos de</p><p>mineração de séries temporais. O módulo de pré-processamento foi</p><p>projetado para fazer a correção geométrica precisa das imagens,</p><p>que é imprescindível em aplicações baseadas na utilização de</p><p>séries de imagens de satélites. A extração de séries temporais é</p><p>feita através de uma interface gráfica que facilita a interação com os</p><p>usuários. Os métodos de mineração de séries temporais</p><p>transformam séries em representações simbólicas para identificar</p><p>padrões e associá-los com outros tipos de dados em uma janela</p><p>deslizante. O processo de validação foi realizado com dados</p><p>agroclimáticos e séries de imagens do AVHRR/NOAA em plantios</p><p>de cana-de-açúcar. As regras geradas pelo algoritmo CLEARMiner</p><p>mostram padrões de associação entre os dados agroclimáticos e os</p><p>de sensoriamento remoto, em diferentes períodos de tempo em</p><p>cada série, indicando uma diferença temporal entre eles.</p><p>Essa diferença de resposta entre séries temporais também foi</p><p>obtida por Gonçalves et al.35, ao avaliar a correlação existente entre</p><p>dados do índice agroclimático ISNA (Índice de Satisfação das</p><p>Necessidades de Água) com a resposta espectral de plantios de</p><p>cana-de-açúcar registrada nas imagens do AVHRR/ NOAA. Também</p><p>foi possível obter equações de estimativa de uma variável em</p><p>relação à outra utilizada, sendo que a previsibilidade do NDVI</p><p>mostrou ser maior que a do ISNA.</p><p>Métodos de classificação semissupervisionada para análise de</p><p>séries multitemporais de imagens de satélite foram utilizados para</p><p>classificar a área do estado de São Paulo em: área florestal, água</p><p>ou área urbana, cana-de-açúcar, pasto, área agrícola e cultura</p><p>perene (café, citros ou outra). De forma geral, o potencial dessa</p><p>análise pode ser destacado pelo uso de imagens de baixa resolução</p><p>espacial, pois, apesar da perda de informação na captura das</p><p>imagens, as técnicas aplicadas permitem a extração de</p><p>conhecimento relevante, com bons resultados, como apontam os</p><p>especialistas que avaliaram os resultados36. Gonçalves et al.37</p><p>ainda propuseram utilizar técnicas de mineração de agrupamento</p><p>em séries temporais multidimensionais de imagens NDVI, albedo e</p><p>temperatura de superfície do satélite AVHRR/NOAA para mapear a</p><p>variabilidade de uso da terra no estado de São Paulo, destacando,</p><p>principalmente, a cultura de cana-de-açúcar.</p><p>Embora as séries do MODIS/TERRA também sejam utilizadas em</p><p>aplicações agrícolas como as do sensor AVHRR/NOAA, é</p><p>importante avaliar se o monitoramento de culturas cultivadas em</p><p>grandes áreas, como a da cana-de-açúcar, pode ser realizado por</p><p>sensores de resolução mais baixa. De forma complementar, a</p><p>durabilidade da série do sensor AVHRR está garantida devido ao</p><p>lançamento do sensor no satélite METOP, o que não é possível</p><p>garantir em relação ao MODIS. Nesse contexto, Gonçalves et al.38</p><p>propuseram a utilização de métodos de mineração de séries</p><p>temporais associados a imagens de sensores orbitais</p><p>(AVHRR/NOAA e MODIS/TERRA) de baixa resolução espacial</p><p>como uma alternativa de acompanhamento das culturas cultivadas</p><p>em grandes áreas, embora a mistura espectral possa ocorrer. Os</p><p>dois sensores apresentaram resultados satisfatórios.</p><p>Essas aplicações práticas apresentaram uma abordagem para</p><p>avaliar o monitoramento e o mapeamento da expansão da cana-de-</p><p>açúcar, por meio de técnicas de mineração de dados e de séries</p><p>temporais de dados agroclimáticos e espectrais de baixa resolução</p><p>temporal. Ao utilizar satélites de baixa resolução espacial, é mais</p><p>difícil evidenciar a diferença entre os estádios de desenvolvimento</p><p>da cana-de-açúcar, mas com a técnica de agrupamento de séries</p><p>temporais de dados e imagens, mesmo ocorrendo mistura espectral,</p><p>foi possível acompanhar a evolução da cultura ao longo das safras,</p><p>identificando regiões com padrões semelhantes. Dessa maneira,</p><p>técnicas de mineração de dados e de séries temporais de dados</p><p>agroclimáticos e espectrais auxiliam a compreensão do</p><p>desenvolvimento da cana-de-açúcar e sua expansão para outras</p><p>regiões do país.</p><p>Referências bibliográficas</p><p>AMARAL, B. F. et al. “Análise e mineração de dados de sensores</p><p>orbitais para acompanhamento de safras de cana-de-açúcar”. 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As variáveis temperatura, umidade, vento,</p><p>pressão e água são denominadas variáveis de estado, pois</p><p>descrevem o estado da atmosfera.</p><p>Efeitos como transporte horizontal e vertical de propriedades como</p><p>temperatura ou umidade do ar, ou efeito da rotação da terra, são</p><p>representados pela componente da dinâmica do modelo. Processos,</p><p>como por exemplo, formação de nuvens, produção de chuvas,</p><p>radiação solar e terrestre na atmosfera, trocas de energia e água</p><p>entre solo, vegetação e atmosfera, e turbulência atmosférica, são</p><p>representados pela física do modelo. Esses processos têm efeito</p><p>sobre as variáveis de estado do modelo. Por exemplo, as nuvens são</p><p>produzidas pelo excedente da saturação do ar.</p><p>6.1 Classe de modelos</p><p>Os modelos podem ser classificados, quanto à metodologia de</p><p>resolver as equações da dinâmica, em modelos em ponto de grade e</p><p>modelos espectrais. No modelo em ponto de grade, o espaço é</p><p>dividido em grades horizontais e camadas verticais. Cada ponto de</p><p>grade representa o valor médio de cada caixa da grade; dessa</p><p>forma, cada ponto de grade pode ter o valor da temperatura,</p><p>umidade, direção e velocidade do vento, pressão atmosférica etc.</p><p>Esse valor no ponto de grade é homogêneo dentro de cada caixa do</p><p>modelo (Figura 6.1).</p><p>Figura 6.1 – Exemplo de grade de modelo Dx e Dy são as</p><p>resoluções nas direções x e y, respectivamente; m e n são os índices</p><p>do ponto central da grade.</p><p>Fonte: Elaboração dos autores.</p><p>Os modelos espectrais são geralmente empregados para modelos</p><p>globais. Esses modelos utilizam séries de funções, por exemplo,</p><p>séries de funções de Fourier. Devido à esfericidade da terra, as</p><p>funções geralmente utilizadas são os harmônicos esféricos.</p><p>Cada variável do sistema de equações é representada pela</p><p>somatória da série de funções. As operações de multiplicação, soma,</p><p>derivadas etc. são aplicadas nas séries. Matematicamente, essas</p><p>séries possuem número infinito de termos, mas, pela limitação do</p><p>poder computacional, os cálculos são truncados em um número finito</p><p>de termos. Quanto maior o número de termos no truncamento da</p><p>série, melhor a representação espectral e, consequentemente, mais</p><p>alta a resolução espacial, entretanto, computacionalmente o modelo</p><p>numérico vai se tornando mais custoso.</p><p>6.2 Hierarquia dos modelos</p><p>Os modelos globais geralmente operam em resolução</p><p>relativamente baixa para poder resolver as equações sobre todo o</p><p>globo em tempo útil para uso dos resultados ou previsões no dia a</p><p>dia. Entretanto, em geral, há uma região de maior interesse onde é</p><p>desejável maior detalhamento. Os modelos regionais têm o papel de</p><p>proporcionar maior detalhamento a partir das condições do modelo</p><p>global. Essas condições são provenientes do instante inicial da</p><p>integração, isto é, das condições iniciais e das condições das bordas</p><p>laterais do modelo regional. Portanto, diz-se que o modelo regional</p><p>está aninhado ao modelo global.</p><p>Um segundo aninhamento pode ser realizado de um modelo</p><p>regional em outro modelo regional, de grade ainda mais refinada;</p><p>nesse caso ocorre o segundo aninhamento, e assim por diante.</p><p>Quando o tamanho da grade alcança escalas menores do que</p><p>aproximadamente 50 km, os modelos são geralmente</p><p>chamados de</p><p>modelos de mesoescala. Portanto, em geral, há uma hierarquia entre</p><p>os modelos: a qualidade das previsões do modelo de grade mais fina</p><p>depende das informações e da qualidade das condições do modelo</p><p>de grade mediana, que depende por sua vez das informações e</p><p>qualidade das condições do modelo mais grosseiro, que pode ser o</p><p>modelo global.</p><p>Para perceber as mudanças nas condições oceânicas,</p><p>principalmente na temperatura da superfície do mar, os modelos</p><p>atmosféricos são acoplados aos modelos oceânicos. Esse tipo de</p><p>sistema acoplado é adequado para estudos de clima, devido à</p><p>forçante de variabilidade lenta proporcionada pela temperatura da</p><p>superfície do mar. Sobre o continente, o modelo é acoplado a um</p><p>modelo de biosfera, que distingue tipos de vegetação e de solo, e</p><p>representa processos hidrológicos de forma simplificada para</p><p>proporcionar a troca de energia entre a superfície continental e a</p><p>atmosfera.</p><p>Figura 6.2 – Hierarquia de modelos: o modelo global fornece</p><p>informações ao modelo regional (área delimitada em vermelho), que</p><p>por sua vez fornece informações ao modelo de mesoescala (área em</p><p>azul).</p><p>Fonte: Elaboração dos autores.</p><p>6.3 Geração das condições iniciais</p><p>(assimilação de dados</p><p>observacionais)</p><p>As observações meteorológicas são utilizadas para a geração das</p><p>condições iniciais das previsões numéricas, bem como para a</p><p>avaliação do desempenho do modelo. As observações</p><p>meteorológicas podem ser provenientes de diferentes fontes e</p><p>sensores, por exemplo de estação agrometeorológica, satélites,</p><p>sondagens, navios, aviões etc. As observações passam,</p><p>inicialmente, por diferentes níveis de controle de qualidade e, depois,</p><p>são submetidas a um esquema de análise objetiva para serem</p><p>distribuídas em uma grade regular. A análise dos dados resulta de</p><p>uma combinação dos dados observacionais com dados de previsões</p><p>válidas para o mesmo horário das observações. As previsões</p><p>recebem pesos de forma a incorporar com maior importância as</p><p>previsões em regiões de baixa densidade observacional ou de baixa</p><p>qualidade nos dados observacionais. Da mesma forma, o peso da</p><p>observação é maior quanto melhor for a sua qualidade.</p><p>6.4 Dependência da qualidade das</p><p>previsões</p><p>A qualidade das previsões numéricas depende fortemente:</p><p>a. Da qualidade das condições iniciais, que por sua vez depende</p><p>da qualidade das observações, da densidade da rede</p><p>observacional e da metodologia de geração das condições</p><p>iniciais;</p><p>b. Da região onde se deseja produzir a previsão numérica. No</p><p>hemisfério norte, por haver mais continentes e, portanto, mais</p><p>medições, as previsões são geralmente melhores que no</p><p>hemisfério sul. Na região tropical, os processos físicos são</p><p>dominantes em relação aos dinâmicos e, portanto, há mais</p><p>processos resolvidos de forma empírica nos modelos numéricos,</p><p>o que faz com que a qualidade dessa previsão seja geralmente</p><p>inferior, quando comparada com as previsões de latitudes</p><p>extratropicais;</p><p>c. Do regime meteorológico. Durante o verão, semelhante à</p><p>dificuldade da previsão na região tropical, a formação de nuvens</p><p>e chuvas, os processos radiativos e outros processos físicos</p><p>atuam mais intensamente, o que causa dificuldades para a</p><p>previsão numérica;</p><p>d. Do desempenho do modelo. O desenvolvimento do modelo</p><p>numérico depende em parte da interação entre os usuários e a</p><p>equipe de desenvolvimento do modelo. Os usuários podem</p><p>retroalimentar os modeladores com as informações sobre as</p><p>falhas e sucessos do modelo, e, dessa forma, orientar os</p><p>esforços para obtenção de melhor desempenho do modelo;</p><p>e. Da complexidade da superfície para a descrição de tipo de</p><p>vegetação, topografia, superfícies de água etc. Regiões de</p><p>topografia com forte inclinação acarretam erros numéricos nos</p><p>modelos. Da mesma forma, regiões com cobertura vegetal</p><p>heterogênea produzem fluxos de calor sensível, evaporação etc.</p><p>6.5 Previsibilidade</p><p>A atmosfera é um sistema caótico1. Os sistemas caóticos utilizam</p><p>equações determinísticas para evoluir temporalmente. Essa evolução</p><p>pode ser em forma não previsível e aparentemente aleatória. O caos</p><p>ocorre quando essas equações não lineares são “instáveis” a uma</p><p>pequena perturbação, isto é, geram resultados que se distanciam</p><p>entre si conforme evoluem no tempo (Figura 6.3).</p><p>Figura 6.3 – Evolução de soluções iniciadas com valores</p><p>ligeiramente diferentes. A curva mais grossa é a solução não</p><p>perturbada; há quatro perturbações positivas e quatro perturbações</p><p>negativas, que evoluem seguindo as curvas mais finas. Ao final, três</p><p>em nove soluções se agrupam em valores maiores, enquanto que</p><p>seis em nove soluções se agrupam em valores menores.</p><p>Fonte: Elaboração dos autores.</p><p>Assim se comporta a atmosfera, ou o sistema terrestre. Erros ou</p><p>variações na estimativa do estado da atmosfera podem crescer com</p><p>o tempo e, consequentemente, afetar a previsão.</p><p>Diz-se que há “previsibilidade” na escala de tempo, pois a previsão</p><p>numérica tem relativa capacidade para indicar o dia, a parte do dia</p><p>ou, às vezes, até a hora em que um evento pode ocorrer; por</p><p>exemplo, a passagem de uma frente fria por uma cidade, queda de</p><p>temperaturas, intensificação de ventos etc. Deve-se esclarecer que,</p><p>na terminologia da meteorologia, previsibilidade não se refere à</p><p>qualidade da previsão, mas à capacidade de prever um determinado</p><p>fenômeno meteorológico.</p><p>Devido à baixa densidade e/ou qualidade das observações, há</p><p>incertezas na estimativa do estado inicial da atmosfera, o que limita a</p><p>previsibilidade ao prazo de cerca de duas semanas. Quando os</p><p>resultados se distanciam bastante entre si, diz que há “baixa”</p><p>previsibilidade, pois há soluções divergentes. Por outro lado, quando</p><p>os resultados se aproximam, diz-se que um certo fenômeno</p><p>apresenta “alta” previsibilidade. O número de soluções pode ser</p><p>traduzido em uma distribuição de probabilidade. Algumas soluções</p><p>apresentam maior probabilidade de ocorrência, enquanto outras</p><p>podem apresentar baixa probabilidade. Dessa forma as previsões</p><p>são produzidas em forma de conjunto, isto é, para cada previsão</p><p>produz-se mais de uma realização para, assim, poder gerar uma</p><p>distribuição de probabilidades. A previsão por conjunto é adequada,</p><p>porque leva em consideração o caráter caótico da atmosfera e</p><p>permite gerar uma informação adicional: a previsão da probabilidade</p><p>de um evento.</p><p>As diferentes formas de gerar os membros da previsão por</p><p>conjunto podem ser: 1. Modificando ligeiramente a condição inicial,</p><p>considerando os erros das observações; 2. Utilizando diferentes</p><p>modelos numéricos, considerando as incertezas em resolver a</p><p>dinâmica da atmosfera; 3. Modificando ligeiramente alguns</p><p>parâmetros das equações que representam alguns processos físicos</p><p>do modelo, considerando as incertezas na solução numérica</p><p>daqueles processos.</p><p>6.6 Escalas temporais de previsão</p><p>Em meteorologia se considera uma previsão de escala de “tempo”</p><p>quando o prazo é de poucos dias, até cerca de 15 dias; diz-se</p><p>“subsazonal” ou “intrasazonal” para cerca de 30 a 60 dias e, a partir</p><p>de uma estação, três meses ou anos, de escala “climática”.</p><p>6.6.1 Previsão de tempo</p><p>Na escala de tempo, buscam-se informações, como temperatura</p><p>do ar próxima à superfície, umidade relativa, chuva, ventos ao longo</p><p>do dia, por alguns dias. A Figura 6.4a mostra um exemplo de</p><p>previsão de chuva acumulada em 24 horas, com antecedência de</p><p>cinco dias, sobre uma área de interesse, enquanto que a Figura 6.4b</p><p>mostra o valor horário da chuva para uma determinada localidade.</p><p>Figura 6.4 – Previsão de chuva com antecedência de cinco dias</p><p>(120 horas) (a). Previsão horária de chuva (mm/h), temperatura do ar</p><p>(oC), da umidade relativa (%), vento a 10 metros (m/s), pressão ao</p><p>nível médio do mar (hPa), cobertura de nuvens baixa, média e alta</p><p>(0,1) para localidade de Campinas para até 11 dias de antecedência</p><p>(b).</p><p>Fonte: Elaboração dos autores com dados do CPTEC/INPE.</p><p>Um exemplo de previsão por conjunto (Figura 6.5) mostra as</p><p>regiões onde as previsões de chuvas acima de 10 mm/dia e acima</p><p>de 50 mm/dia têm alta probabilidade de ocorrer.</p><p>Figura 6.5 – Previsão de probabilidade, em %, para um prazo</p><p>de</p><p>72 horas de antecedência. Áreas com probabilidade acima de 65%</p><p>de previsão de chuvas acima de 10mm/dia (a) e de chuvas acima de</p><p>50 mm/dia (b) são indicadas em vermelho.</p><p>Fonte: Elaboração dos autores com dados do CPTEC/INPE.</p><p>6.6.2 Previsão climática sazonal</p><p>O mesmo modelo numérico para produzir previsão de tempo é</p><p>utilizado para produzir a previsão climática. Então surge a questão:</p><p>se não há desempenho do modelo para previsões determinísticas no</p><p>prazo de até cerca de duas semanas, como se pode utilizar o mesmo</p><p>modelo para previsões climáticas? Espera-se que em longos prazos</p><p>de integração o modelo climático retenha a informação estatística do</p><p>clima.</p><p>As regiões Sudeste e Centro-Oeste do Brasil apresentam baixa</p><p>previsibilidade climática quando se usa um modelo atmosférico e</p><p>condições de Temperatura da Superfície do Mar observadas2.</p><p>Entretanto, nota-se que há momentos de forte sinal de modos de</p><p>variabilidade climática que afetam as previsões de forma a ajudar na</p><p>convergência dos membros da previsão por conjunto. Esses modos</p><p>de variabilidade, quando se estabelecem, podem representar janelas</p><p>de oportunidade para aumentar a qualidade da previsão climática. O</p><p>fenômeno El Niño é um exemplo de modo de variabilidade. A</p><p>temperatura da superfície do mar tem papel crucial na configuração</p><p>do clima, principalmente em regiões tropicais3. Portanto, uma</p><p>previsão acurada da temperatura da superfície do mar favorece a</p><p>melhor qualidade de uma previsão climática, o que torna</p><p>determinante o papel dos modelos globais acoplados oceano-</p><p>atmosfera na previsão climática.</p><p>As informações extraídas das previsões de longo prazo são as</p><p>anomalias climáticas, isto é, informa-se que a estação a ser prevista</p><p>estará, em média, mais quente ou mais fria que a normal, mais</p><p>chuvosa ou mais seca, por exemplo. Para extrair a anomalia da</p><p>previsão do modelo climático, é necessário gerar a climatologia do</p><p>modelo. Essa climatologia é construída gerando previsões climáticas</p><p>para um período passado de pelo menos 10 anos, ou</p><p>preferencialmente de 30 anos. Por exemplo, a climatologia do</p><p>modelo Eta4 para as previsões de chuva da estação de janeiro-</p><p>fevereiro-março é obtida a partir da média das chuvas previstas pelo</p><p>modelo na estação de janeiro-fevereiro-março do período de 2001 a</p><p>2010. Dessa forma a previsão de anomalia de chuva é obtida</p><p>extraindo a climatologia modelo da previsão corrente, como mostra a</p><p>Figura 6.6.</p><p>Figura 6.6 – Previsão climática sazonal. (a) Previsão de anomalia</p><p>de precipitação do modelo Eta para a estação de janeiro-fevereiro-</p><p>março (JFM) 2014 (mm/três meses), (b) previsão de precipitação</p><p>(mm/três meses) do modelo Eta para a estação de JFM 2014, (c)</p><p>média da previsão de precipitação do modelo Eta para uma série</p><p>histórica de JFM, de 2001 a 2010, média de cinco membros (mm/três</p><p>meses).</p><p>Fonte: Elaboração dos autores com dados do CPTEC/INPE.</p><p>A climatologia do modelo deve ser construída a partir da mesma</p><p>versão do modelo que produz a previsão corrente, dessa forma os</p><p>erros sistemáticos do modelo, que estão contidos na previsão</p><p>corrente e na climatologia do modelo, são removidos ou reduzidos na</p><p>previsão da anomalia.</p><p>Devido ao crescimento das incertezas, as previsões climáticas são</p><p>necessariamente produzidas por conjuntos. Os membros da previsão</p><p>por conjunto podem ser produzidos iniciando-se em datas diferentes,</p><p>por exemplo a previsão da estação de dezembro-janeiro-fevereiro</p><p>(DJF) pode ser produzida a partir de integrações iniciadas nos dias</p><p>13, 14, 15, 16 e 17 de novembro, totalizando cinco realizações</p><p>individuais para a mesma previsão.</p><p>6.7 Projeções de mudanças climáticas</p><p>Em estudos de mudanças climáticas, os modelos climáticos geram</p><p>projeções ao invés de previsões. O termo projeções é adotado</p><p>porque as mudanças climáticas podem ser produzidas não somente</p><p>pela variabilidade climática, mas também por interferência antrópica,</p><p>por ações resultantes de políticas de governos, que alteram a</p><p>emissão de gases de efeito estufa na atmosfera.</p><p>Os cenários de emissão de gases de efeito estufa5 elaborados</p><p>para o 4º Relatório do IPCC (AR4)6 se basearam em uma linha de</p><p>história de desenvolvimento para o século 21, sejam histórias com</p><p>ênfase na economia (A1, A2), ou com ênfase na sustentabilidade</p><p>ambiental (B1, B2), desenvolvimento por igual globalmente (A1, B1)</p><p>ou de forma regionalizada (A2, B2). Além disso, a linha de história do</p><p>A1 possuía uma família: A1FI, A1T e A1B, cujos membros se</p><p>distinguiam pela tecnologia empregada nas fontes de energia. Por</p><p>exemplo, A1B se refere a um cenário globalizado, com distribuição</p><p>equilibrada entre fontes de energia fóssil e não fóssil. As</p><p>concentrações dos gases de efeito estufa na atmosfera foram</p><p>fornecidas por modelos do tipo econômico, chamados de modelo de</p><p>avaliação integrada (“integrated assessment model”), que incluíram</p><p>as histórias traçadas. Esses modelos econômicos consideram</p><p>crescimento demográfico, tipo de energia utilizada e podem incluir o</p><p>uso da terra etc.</p><p>Os cenários elaborados para o 5º Relatório do IPCC7 se basearam</p><p>na forçante radiativa resultante das mudanças climáticas. Denomina-</p><p>se forçante radiativa à diferença entre o equilíbrio radiativo terrestre</p><p>do clima futuro e o equilíbrio radiativo do clima atual, e é expressa</p><p>em unidades de W/m2. Os cenários denominados “Representative</p><p>Concentration Pathway” (RCP) consistiram em forçantes radiativas</p><p>de 8.5, 6.0, 4.5 e 2.6 W/m2. As emissões e concentrações dos gases</p><p>de efeito estufa (GEE) ao longo do século 21 foram fornecidas pelos</p><p>modelos de avaliação integrada (“integrated assessment models”).</p><p>As concentrações de GEE são utilizadas como dado de entrada para</p><p>os modelos climáticos simularem o clima futuro.</p><p>O estudo de mudanças climáticas tem impulsionado o</p><p>desenvolvimento dos modelos numéricos com a inclusão de</p><p>processos relevantes, como, por exemplo, o ciclo de carbono, os</p><p>aerossóis, a vegetação dinâmica, química da atmosfera etc. No AR4</p><p>a maioria dos modelos eram do tipo acoplado oceano-atmosfera. No</p><p>AR5, os modelos passaram a incluir mais processos físicos e</p><p>passaram para a categoria denominada de modelos do sistema</p><p>terrestre (“Earth System Model”). Em geral, a avaliação dos modelos</p><p>globais climáticos mostrou que os modelos do AR5 apresentaram</p><p>melhor desempenho que os do AR48.</p><p>6.7.1 Redução de escala (Downscaling)</p><p>Para simular o clima global de décadas e séculos, os modelos</p><p>globais utilizam resolução espacial de cerca de 100 a 300 km. Essa</p><p>resolução espacial dos modelos globais é considerada baixa e</p><p>inadequada para estudos dos impactos das mudanças climáticas em</p><p>escalas locais. O emprego de modelos regionais aninhados aos</p><p>modelos globais é uma das estratégias adotadas para detalhar as</p><p>simulações de mudanças climáticas para a região de interesse de</p><p>estudo.</p><p>Os impactos das mudanças climáticas nos diversos setores</p><p>socioeconômicos têm caráter local. Por exemplo, a disponibilidade</p><p>hídrica de uma bacia hidrográfica ou a produtividade de determinada</p><p>cultura agrícola podem ocupar uma área bem menor que 300 km x</p><p>300 km. Portanto, o aumento de resolução com inclusão dos</p><p>processos físicos relevantes para simular o clima é desejável para</p><p>permitir uma avaliação mais detalhada dos impactos das mudanças</p><p>climáticas.</p><p>A redução de escala (downscaling) das projeções de mudanças</p><p>climáticas produzidas pelos modelos globais requer a incorporação</p><p>de informações locais e é particularmente importante para áreas de</p><p>topografia complexa, ilhas e regiões costeiras, ou ainda para áreas</p><p>com cobertura do solo/uso da terra extremamente heterogêneos.</p><p>Algumas tentativas de autores brasileiros em estender o prazo de</p><p>previsão de modelo regional sobre a América do Sul para escalas</p><p>mensal e sazonal9 demonstraram a utilidade da técnica de</p><p>downscaling dinâmico para melhorar a qualidade da previsão de</p><p>precipitação do modelo global utilizado como forçante lateral.</p><p>Simulações de mudanças climáticas em maior resolução sobre a</p><p>América do Sul foram iniciadas a partir do projeto CREAS (Cenários</p><p>Regionais de Mudança de Clima para América do Sul)10. O programa</p><p>europeu 7th Framework Programme financiou um estudo de impactos</p><p>e vulnerabilidade em cenário futuro de mudanças climáticas na Bacia</p><p>do Rio da Prata. É um trabalho importante devido ao emprego de</p><p>vários modelos regionais para reproduzir o clima da América do Sul,</p><p>como por exemplo: MM511, RegCM312, RCA13, REMO14,</p><p>PROMES15, Eta16 e LMDZ17. Apesar do foco sobre a Bacia do Rio</p><p>da Prata, o domínio utilizado pelos modelos cobria toda a América do</p><p>Sul.</p><p>Chou et al.18 avaliaram as simulações climáticas sobre a América</p><p>do Sul geradas pelo modelo regional Eta aninhado a quatro</p><p>condições de contorno fornecidas pelo modelo global inglês</p><p>HadCM3. Os quatro membros foram utilizados com o objetivo de</p><p>incorporar as incertezas em relação ao conjunto das simulações do</p><p>modelo global utilizadas nas condições de contorno lateral. Nesse</p><p>estudo foi observada uma boa concordância nos padrões de</p><p>temperatura e precipitação simulados pelo modelo regional em</p><p>relação aos dados observados do Climate Research Unit (CRU)19.</p><p>Marengo et al.20 investigaram os impactos das projeções de</p><p>mudanças climáticas geradas pelo modelo Eta aninhado aos quatro</p><p>membros do modelo HadCM3, cenário de emissão A1B. Os autores</p><p>encontraram redução das chuvas sobre as bacias do rio Amazonas e</p><p>São Francisco e aumento na bacia do rio Paraná.</p><p>Simulações regionalizadas de mudanças climáticas empregando</p><p>os cenários de emissão RCP 8.5 e 4.5 do AR5 para a América do Sul</p><p>foram produzidas por Chou et al.21 e Chou et al.22. Essas simulações</p><p>mostraram redução das chuvas no período chuvoso das regiões</p><p>Centro-Oeste e Sudeste brasileiros e aumento das temperaturas</p><p>nessas mesmas regiões.</p><p>6.8 Impactos das mudanças climáticas</p><p>sobre a cana-de-açúcar</p><p>As mudanças climáticas afetam diretamente a produção agrícola.</p><p>Entretanto, os efeitos variam de cultura para cultura, pois cada uma</p><p>tem necessidades distintas de chuva, radiação, temperatura ou</p><p>umidade. O aumento da temperatura é decorrente do aumento na</p><p>concentração de CO2 ao longo do século 21. A mudança na</p><p>quantidade de chuva e de radiação solar não é tão evidente.</p><p>Trabalhos que avaliam as mudanças de produtividade da cana-de-</p><p>açúcar em cenários de mudanças climáticas têm mostrado o</p><p>aumento da produtividade. Uma estimativa inicial indicou aumento</p><p>das áreas potenciais de cultivo da cana no Brasil23. A cana-de-</p><p>açúcar (Saccharum spp), pertencente à família Poaceae, é uma</p><p>gramínea do tipo C4. Seu mecanismo de fixação de CO2 permite a</p><p>esse tipo de planta fechar parcialmente os estômatos, reduzindo a</p><p>transpiração e a condutância estomática, quando expostas a</p><p>elevadas concentrações de CO2. Existem ainda poucas evidências</p><p>para interações de CO2 e temperatura em condições de campo. O</p><p>aumento da temperatura implica aumento da demanda por água,</p><p>mas níveis elevados de concentração de CO2 levam à redução da</p><p>abertura dos estômatos e, assim, à redução das exigências de água</p><p>pelas plantas. Isso gera uma maior eficiência no uso da água24.</p><p>Com base na mesma metodologia utilizada no Zoneamento de</p><p>Riscos Climáticos, Pinto & Assad25 e Assad et al.26 avaliaram o</p><p>impacto das mudanças climáticas no setor agrícola do Brasil. Foram</p><p>simulados os cenários agrícolas do Brasil para os anos de 2010,</p><p>2020, 2050 e 2070 a partir das projeções A2 e B2 divulgadas no</p><p>quarto relatório (AR4) do IPCC. Segundo ele, as regiões</p><p>potencialmente aptas para o desenvolvimento da cana-de-açúcar</p><p>devem aumentar. Áreas localizadas nas maiores latitudes, que</p><p>atualmente apresentam restrições devido ao alto risco de geadas,</p><p>perdem essa característica e se transformam em regiões de</p><p>potencial produtivo dentro de 10 a 20 anos.</p><p>Outros autores, como Gouveia et al.27 e Santos & Sentelhas28,</p><p>aplicaram modelo de zoneamento climático com as condições</p><p>climáticas médias do cenário A1B para regiões no estado de São</p><p>Paulo e obtiveram aumento da produtividade potencial e da</p><p>produtividade real. Os trabalhos consideraram o desenvolvimento</p><p>tecnológico no período. Um exemplo de trabalho que utilizou modelo</p><p>de cultura da cana-de-açúcar, modelo Canegro, para estimar</p><p>produtividade é o realizado por Singels et al.29. Nesse trabalho as</p><p>condições climáticas foram provenientes de três modelos globais do</p><p>AR4 (HadCM3, ECHAM5 e MIROC3) em cenário de emissão A2. Os</p><p>resultados indicaram que, se o aumento da temperatura acelerou o</p><p>desenvolvimento da folhagem e aumentou a evaporação, por outro</p><p>lado, a redução das chuvas causou maior estresse hídrico.</p><p>De forma geral, os estudos apontam a redução das chuvas como</p><p>fator limitante à expansão e ao aumento da produtividade da cana-</p><p>de-açúcar diante das mudanças climáticas. A precipitação é um dos</p><p>elementos meteorológicos que apresentam maiores incertezas nas</p><p>saídas dos modelos que simulam os cenários futuros do clima.</p><p>Referências bibliográficas</p><p>ASSAD, E. D. et al. 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Climatologia das projeções</p><p>do modelo eta/cptec de</p><p>mudanças climáticas para o</p><p>estado de são paulo</p><p>Vania R. Pereira, Ana Maria H. de Ávila, Tobias Mantelatto,</p><p>Jurandir Zullo Junior</p><p>Processo Fapesp 2008/58160-5</p><p>7.1 Introdução</p><p>Este trabalho busca dar subsídios para os estudos de adaptação</p><p>do setor sucroenergético frente às possíveis mudanças climáticas. A</p><p>contribuição deste trabalho é dada a partir da avaliação da</p><p>habilidade de um modelo climático regional em simular dados</p><p>agroclimáticos no estado de São Paulo – o maior produtor de cana-</p><p>de-açúcar do país e um dos principais do mundo.</p><p>No contexto de prevenção e sustentabilidade frente às mudanças</p><p>climáticas globais, a comunidade acadêmica tem juntado esforços</p><p>para modelar as condições de passado, presente e futuro das</p><p>interações dos processos terrestres como estratégia principal de</p><p>adaptação. No entanto, existe ainda o desafio de conectar e refinar</p><p>as informações aplicadas e geradas nas diferentes escalas</p><p>espaciais de análise – global, regional e local. Além do desafio em</p><p>relação à escala de análise, também existem as incertezas em</p><p>representar a atmosfera com exatidão por meio dos modelos</p><p>matemáticos globais.</p><p>Uma das considerações acerca das mudanças climáticas –</p><p>baseada nos princípios da termodinâmica – é a de que o aumento</p><p>das temperaturas do planeta aumentaria o vapor de água na</p><p>atmosfera. Consequentemente, o aumento das temperaturas</p><p>causaria o efeito do “rico ficar mais rico”, ou seja, regiões úmidas</p><p>tendem a ficar mais úmidas e as secas mais secas. Devido à</p><p>complexidade das forçantes do clima, essa relação direta entre</p><p>aquecimento e aumento no vapor de água na atmosfera não</p><p>abrange as particularidades dos diversos mecanismos climáticos e,</p><p>portanto, não é representativa para todas as regiões do globo. Nas</p><p>zonas de convergência tropicais, por exemplo, foram identificados</p><p>ao menos dois mecanismos para justificar as anomalias de</p><p>precipitação em função do aquecimento global.</p><p>Alguns estudos consideram o mecanismo baseado no aumento</p><p>de umidade na troposfera que desestabiliza a atmosfera e aumenta</p><p>a velocidade vertical, formando o fenômeno de convecção tropical.</p><p>Nesse mecanismo, as áreas úmidas tendem a ficar mais úmidas e</p><p>as secas, mais secas1. Estudos recentes têm demonstrado que as</p><p>regiões que correspondem a esse mecanismo apresentam a mesma</p><p>relação para as estações do ano, ou seja, as estações úmidas</p><p>tendem a ficar mais úmidas e as secas, mais secas2.</p><p>Em contrapartida, existe também o mecanismo utilizado para</p><p>justificar as anomalias ocorrentes na Amazônia. A Amazônia é</p><p>considerada uma região úmida, entretanto, os cenários previstos</p><p>pelos modelos globais regionalizados (downscaling) para a América</p><p>do Sul indicam uma Amazônia mais seca. Nesse caso, o</p><p>mecanismo que determina as condições para uma Amazônia mais</p><p>seca seria o aumento do gradiente de temperatura entre o</p><p>continente sul americano e o oceano atlântico (sul), que</p><p>consequentemente acresce a pressão do nível do mar e modifica as</p><p>condições de transporte de umidade e chuva para o continente3.</p><p>A existência de diferentes mecanismos para justificar as</p><p>anomalias de precipitação somada à variedade dos modelos de</p><p>circulação global e dos cenários de mudanças previstas gera uma</p><p>sequência de incertezas nas projeções dos impactos advindos das</p><p>mudanças climáticas. Em relação aos cenários, existem ainda as</p><p>projeções que consideram configurações diferentes das relações</p><p>entre modelos econômicos, de emissões de gases de efeito estufa e</p><p>de radiação, entre outros.</p><p>Além dessa variedade de cenários e modelos, existem ainda as</p><p>incertezas em relação às técnicas de regionalização dos modelos</p><p>globais, pois nesse processo de downscaling ocorre uma série de</p><p>efeitos que se devem especialmente às condições iniciais4 das</p><p>forçantes consideradas nos diversos modelos globais5. Sendo</p><p>assim, fica claro que o tema das mudanças climáticas e os cenários</p><p>futuros de emissões de gases de efeito estufa ainda carecem de</p><p>informações que conectem os fatos nas diferentes escalas de</p><p>análise, da global à local.</p><p>Os erros apresentados nas dinâmicas da precipitação estão</p><p>relacionados às condições de representação da física interna dos</p><p>modelos, tais como os esquemas de convecção, de superfície e de</p><p>topografia. E, no caso dos modelos climáticos regionais, a dinâmica</p><p>de formação dos processos envolvidos na precipitação sofre</p><p>influência das condições de contorno do modelo de circulação global</p><p>utilizado. Nesse sentido, são de suma importância os trabalhos de</p><p>análise e aplicação dos resultados gerados pelos modelos</p><p>climáticos regionalizados numa escala de detalhe.</p><p>A análise da performance das saídas desses modelos numa</p><p>escala de detalhe, com dados observados de superfície, contribui</p><p>para identificar as causas possíveis das incoerências dos cenários</p><p>gerados. Além disso, a avaliação da performance dos modelos de</p><p>mudanças climáticas (MMC) e a identificação de erros sistemáticos</p><p>podem ser utilizadas para correções futuras e refinamento dos</p><p>processos físicos e químicos dos Modelos Climáticos Globais</p><p>(MCGs) e dos Modelos Climáticos Regionais (MCRs).</p><p>Assim, a partir da avaliação da performance dos MMCs é possível</p><p>uma interpretação mais próxima da realidade nos estudos aplicados.</p><p>Por exemplo, a utilização de saídas de MMCs na escala regional a</p><p>fim de simular o zoneamento de riscos climáticos em relação ao</p><p>clima futuro para estudos de adaptação6.</p><p>Sendo assim, diante da necessidade de inserir a produção do</p><p>biocombustível brasileiro no contexto da adaptação, este trabalho</p><p>contribui em avaliar a confiabilidade dos cenários de mudanças</p><p>climáticas no maior estado produtor de cana-de-açúcar do país.</p><p>7.2 A avaliação do modelo Eta</p><p>O modelo climático</p><p>conhecimento e disponibilizá-lo, enquanto</p><p>ferramenta de diferentes naturezas, para a sociedade. É nesse</p><p>entremeio também que a ciência pode e deve refletir sobre suas</p><p>formas de intervir socialmente, analisando o que já faz e</p><p>proporcionando outras formas de fazer sua divulgação.</p><p>É nesse sentido que a primeira parte deste livro se dedica a fazer</p><p>duas análises sobre os modos de circulação da questão das</p><p>mudanças climáticas na sociedade, na relação com a ciência, com</p><p>as políticas públicas e com a mídia, e a apresentar duas</p><p>ferramentas: o portal de divulgação do projeto AlcScens, que</p><p>permitiu as pesquisas aqui explanadas; e o Agritempo, um sistema</p><p>de monitoramento agrometeorológico.</p><p>Assim, os capítulos desta primeira parte têm por objetivo:</p><p>Apresentar o website do Sistema de Monitoramento</p><p>Agrometeorológico – Agritempo, que tem como estratégia</p><p>ações de transferência da tecnologia, buscando atingir o</p><p>produtor rural de forma indireta, por intermédio de ações de</p><p>capacitação de multiplicadores. O desenvolvimento do sistema</p><p>Agritempo mobilizou uma rede de cerca de 40 organizações e</p><p>mais de 1.400 estações meteorológicas, configurando-se como</p><p>um arranjo de alta complexidade para proporcionar</p><p>monitoramento climatológico e atender a vários usuários (como</p><p>técnicos do governo federal, agrônomos, técnicos da rede de</p><p>extensão rural, produtores e associações, empresas privadas,</p><p>universidades e pesquisadores). O Agritempo se caracteriza,</p><p>assim, como uma inovação organizacional estruturada por uma</p><p>rede com três dimensões: uma rede física de equipamentos de</p><p>coleta e computadores, uma rede de comunicações e uma</p><p>complexa rede interorganizacional. Essas três instâncias de</p><p>rede permitiram o estabelecimento de relacionamentos entre</p><p>diversos atores para compartilhar dados, informação e</p><p>competências a fim de gerar novas tecnologias e criar novos</p><p>conhecimentos em agrometeorologia;</p><p>Apresentar um conjunto de três versões de websites, que teve o</p><p>objetivo de criar um instrumento de divulgação científica do</p><p>projeto AlcScens: o portal AlcScens. Este portal teve três</p><p>objetivos principais: dar visibilidade ao Projeto; constituir-se em</p><p>um banco de dados de diferentes ações, documentos,</p><p>propostas, eventos e instrumentos em torno das discussões</p><p>sobre as mudanças climáticas; estabelecer uma relação</p><p>refletida entre a sociedade e a universidade ao colocar, em</p><p>circulação, dados, análises, produtos, acontecimentos relativos</p><p>ao AlcScens e a outros projetos de pesquisa nacionais e</p><p>internacionais, buscando fazer do portal um espaço real de</p><p>trabalho em divulgação científica. Suas principais ações foram:</p><p>aproximação de pesquisadores e público por meio de</p><p>compartilhamento de informações, fotos, imagens, vídeos e</p><p>arquivos de áudio nos sites Facebook, Google+, Twitter,</p><p>Youtube, Flickr, Tumblr e Slideshare; implantação do Podcast;</p><p>produção de programas de rádio com uma linguagem mais</p><p>descontraída e de livretos e revistas eletrônicas, para trabalhar</p><p>com temas específicos;</p><p>Apresentar o Grupo MultiTÃO, que alia linguagem, arte e</p><p>ciência, na sua observação das formulações e reformulações</p><p>de questões que constroem e reconstroem problemas,</p><p>enraizando os conhecimentos em um terreno histórico, social e</p><p>político. Essa observação se deu de duas formas: pela análise</p><p>de como as mudanças climáticas circulam pelas imagens de</p><p>revistas e jornais; pelo estudo e pesquisa de experimentações</p><p>realizadas por artistas com o tema das mudanças climáticas. O</p><p>ponto principal da análise foi o de compreender que os clichês</p><p>apelam fortemente para oposições e moralidades como modo</p><p>de sensibilização e de conscientização do público e que um dos</p><p>efeitos disso, contraditoriamente, é a ausência de</p><p>sensibilização, pelo desgaste, pelo esvaziamento de sentidos.</p><p>Nessa direção é proposta uma intervenção com produção de</p><p>séries de imagens que exploram procedimentos diversos de</p><p>interferência nas sintaxes predominantes da divulgação</p><p>científica, de modo a convocar perturbações nessas lógicas e</p><p>gerar possibilidades de sensibilidades e narrativas distintas</p><p>relacionadas à temática das mudanças climáticas;</p><p>Apresentar uma análise ancorada em diferentes lugares do</p><p>dizer nos quais se imbrica a problemática das mudanças</p><p>climáticas, de modo a refletir sobre a forma de circulação da</p><p>ciência apropriada pelo Estado ou pela sociedade civil,</p><p>observando o funcionamento dos diferentes discursos de</p><p>transmissão dos conhecimentos científicos na sociedade e</p><p>refletindo, particularmente, sobre o modo como se produz um</p><p>tipo de subjetividade e de sociabilidade pelas relações que se</p><p>estabelecem entre ciência e ideologia, produzindo sentidos</p><p>estabilizados e naturalizados com os quais a sociedade lida de</p><p>maneira quase sempre transparente. Essa análise se debruçou</p><p>em diferentes materialidades como cartilhas, brochuras</p><p>institucionais, propagandas e a rede eletrônica, procurando</p><p>observar os diversos caminhos de significação das palavras</p><p>relativas às mudanças climáticas, abrindo condições para dar</p><p>visibilidade aos percursos dos sentidos polissêmicos da palavra</p><p>mudanças climáticas e de seus correlatos, seja em</p><p>materialidades verbais, seja em imagens.</p><p>1. Informações meteorológicas</p><p>customizadas para uso na</p><p>agricultura: análise do sistema</p><p>de monitoramento</p><p>agrometeorológico agritempo</p><p>Martha Delphino Bambini, Priscila Pereira Coltri, Luciana Alvim</p><p>Santos Romani</p><p>Processo Fapesp 2008/58160-5</p><p>1.1 Preâmbulo</p><p>O projeto “Geração de cenários de produção de álcool como apoio</p><p>para a formulação de políticas públicas aplicadas à adaptação do</p><p>setor sucroalcooleiro nacional às mudanças climáticas” (AlcScens)</p><p>foi estruturado a partir de nove núcleos temáticos, a saber:</p><p>Agricultura, Geotecnologia, Engenharia Genética, Segurança</p><p>Alimentar, Demografia, Climatologia, Políticas Públicas, Saúde</p><p>Humana, Modelagem e Divulgação Científica.</p><p>O objetivo principal das atividades do Núcleo Temático de</p><p>Divulgação Científica foi analisar a prática da divulgação científica</p><p>buscando compreender: o modo de circulação de questões e</p><p>informações associadas às mudanças climáticas em diferentes</p><p>meios e veículos (como cartilhas, brochuras institucionais,</p><p>propagandas, matérias jornalísticas e redes sociais); e o</p><p>funcionamento das imagens no discurso sobre mudanças climáticas.</p><p>O estudo e a reflexão sobre instrumentos de divulgação científica</p><p>buscaram analisar os instrumentos e ferramentas de divulgação</p><p>científica atuando no sentido de sustentar uma posição associada à</p><p>temática. Adicionalmente, buscou-se entender e promover a</p><p>divulgação científica sobre mudanças climáticas por intermédio de</p><p>alguns mecanismos como websites e instalações artísticas.</p><p>O website do Sistema de Monitoramento Agrometeorológico</p><p>(Agritempo) foi analisado como um caso de estudo de oferecimento</p><p>de informações agrometeorológicas gratuitas por intermédio de</p><p>ferramentas de Tecnologia de Informação e Comunicação (TIC).</p><p>A tecnologia e a rede que a originou foram analisadas no âmbito</p><p>de uma dissertação de mestrado1 e também por uma intervenção</p><p>específica visando à quantificação, análise e qualificação das visitas</p><p>e acessos de internautas ao sistema entre os anos de 2007 e 20122.</p><p>1.2 Introdução</p><p>A agricultura é uma das atividades econômicas mais dependentes</p><p>das condições meteorológicas e climáticas.</p><p>A Meteorologia é o ramo da ciência que se ocupa dos fenômenos</p><p>físicos da atmosfera, abrangendo o estudo das condições</p><p>atmosféricas em um dado instante, o que chamamos de “tempo”3. A</p><p>Climatologia, por sua vez, trabalha com valores estatísticos, médios,</p><p>para uma descrição do ritmo anual mais provável de ocorrência dos</p><p>fenômenos atmosféricos.</p><p>A maioria das práticas agrícolas, como o preparo do solo, a</p><p>semeadura, a adubação, a irrigação, as pulverizações, a colheita e</p><p>as medidas contra eventos adversos, dependem diretamente das</p><p>condições de tempo vigentes e do acesso a informações sobre</p><p>previsão do tempo para que possam ser executadas de forma</p><p>eficiente. Da mesma forma, clima e tempo afetam a relação das</p><p>plantas com os micro-organismos, os insetos, os fungos e as</p><p>bactérias, favorecendo ou não</p><p>regional Eta/CPTEC7 foi escolhido por ter boa</p><p>representatividade em simular o clima presente na América do Sul.</p><p>A coordenada vertical do modelo Eta considera níveis diferentes de</p><p>pressão do ar e altitude numa resolução horizontal. O detalhe da</p><p>coordenada vertical do Eta permite uma boa simulação do clima</p><p>orográfico presente em áreas montanhosas como a Cordilheira dos</p><p>Andes.</p><p>Assim, o Eta/CPTEC vem sendo aplicado em estudos de</p><p>simulação do clima presente na América do Sul desde a década de</p><p>19908. Seus resultados indicaram boa representatividade dos</p><p>principais mecanismos e variações das condições atmosféricas que</p><p>são utilizados para os estudos de previsão do tempo.</p><p>Dentre a representatividade do Eta/CPTEC em relação aos</p><p>mecanismos climáticos destacam-se as condições termais e de</p><p>circulação dos ventos. O Chaco paraguaio, as áreas do centro de</p><p>alta pressão nos oceanos Atlântico e Pacífico – porção subtropical,</p><p>o posicionamento e a intensidade da circulação da Alta da Bolívia</p><p>(AB), os jatos subtropicais e sua variação sazonal, entre outros</p><p>fenômenos atmosféricos, foram bem representados pelo Eta9.</p><p>No entanto, tais avaliações do Eta/CPTEC foram realizadas num</p><p>contexto continental, de larga escala, com dados do CRU (Climate</p><p>Research Unit – West Anglia), que possuem resolução espacial de</p><p>2,5 por 3,75 graus10. Isso significa que os dados do CRU têm</p><p>informações de precipitação e outras variáveis climáticas a cada 300</p><p>km, em média. As diversas versões do Eta/CPTEC não foram</p><p>avaliadas, até então, com dados de superfície de resolução espacial</p><p>mais compatível com sua grade de 40x40km.</p><p>Para avaliar a performance do modelo Eta/CPTEC em simular o</p><p>clima presente (baseline), na escala compatível com sua resolução</p><p>espacial, foi realizado o cálculo do viés mensal entre dois conjuntos</p><p>de 30 anos de dados de chuva e temperatura observados e</p><p>simulados.</p><p>Os dados simulados utilizados foram as saídas do modelo</p><p>Eta/CPTEC sob condição de contorno do modelo HadCM3 para os</p><p>anos de 1961-1990 (baseline)11.</p><p>Os dados observados de precipitação consistiram nas séries</p><p>históricas de chuva de 210 postos pluviométricos localizados no</p><p>estado de São Paulo, disponibilizados pelo DAEE (Departamento de</p><p>Água e Energia Elétrica do estado de São Paulo).</p><p>Os dados de temperatura utilizados foram as séries históricas de</p><p>11 estações distribuídas no estado de São Paulo no período de</p><p>1961-1990 e mais estações com períodos menores – dentro do</p><p>intervalo avaliado – disponíveis para a área de interesse.</p><p>Para aumentar a densidade dos pontos dos dados de</p><p>temperatura, foram utilizadas mais 10 estações de apoio com séries</p><p>completas, embora fossem de períodos menores do que 30 anos.</p><p>As estações de apoio que foram selecionadas apresentavam, em</p><p>média, 15 a 20 anos de dados de temperatura para o período 1961-</p><p>1990.</p><p>O processamento para gerar as séries históricas espacialmente</p><p>correspondentes consistiu em aplicar uma máscara no quadrante da</p><p>resolução espacial do modelo Eta/CPTEC para cada município do</p><p>estado, com os respectivos postos de observação de chuva e</p><p>temperatura.</p><p>As coordenadas de cada estação meteorológica e o centro de</p><p>cada quadrante foram associados de forma automática, por um</p><p>programa em linguagem C, desenvolvido especificamente para essa</p><p>finalidade.</p><p>Após a extração das séries temporais correspondentes, a</p><p>performance do modelo Eta foi avaliada a partir da diferença relativa</p><p>entre as séries simuladas e observadas, de acordo com a Equação</p><p>1.</p><p>Com o resultado da Equação 1, tem-se a porcentagem em valores</p><p>negativos (subestimativas) e positivos (superestimativas) referentes</p><p>à simulação do modelo.</p><p>Para verificar a precisão do modelo no espaço, os valores da</p><p>diferença relativa calculada para os 12 meses do ano foram</p><p>interpolados pelo método da krigagem, gerando um mapa para cada</p><p>mês do ano para a área do estado de São Paulo.</p><p>7.3 A simulação do modelo Eta para o</p><p>clima presente</p><p>As Figuras 7.1 e 7.2 indicam a performance do modelo</p><p>Eta/CPTEC via diferença relativa para a temperatura máxima</p><p>(TMAX) e temperatura mínima (TMIN).</p><p>Figura 7.1 – Viés em porcentagem para a média das temperaturas</p><p>mensais.</p><p>Fonte: Elaboração dos autores.</p><p>Figura 7.2 – Viés em porcentagem para a média das temperaturas</p><p>mínimas mensais.</p><p>Fonte: Elaboração dos autores.</p><p>De forma geral, o modelo Eta/CPTEC simulou bem as</p><p>temperaturas médias na escala mensal no estado de São Paulo. O</p><p>Eta/CPTEC subestimou e/ ou superestimou as temperaturas em</p><p>torno de ±15%, erro considerado baixo nesse tipo de simulação. O</p><p>modelo tem uma tendência em subestimar a TMAX e superestimar a</p><p>TMIN.</p><p>Os meses com melhor desempenho para a TMAX foram os</p><p>meses quentes, entre outubro e dezembro. Nesses meses, o</p><p>modelo subestima os valores médios de TMAX em menos de 10%.</p><p>Os meses de janeiro a março apresentaram os maiores erros com</p><p>subestimativa de 20%. Os meses mais frios, entre junho, julho e</p><p>agosto, indicaram boa performance do Eta/CPTEC, com</p><p>subestimativas abaixo de 20%.</p><p>Os meses com melhor desempenho para a TMIN foram os meses</p><p>quentes, entre janeiro e abril. Nesses meses, o modelo subestima</p><p>os valores médios de TMIN. Os meses mais frios, entre junho, julho</p><p>e agosto, apresentaram os maiores erros, mas, ainda assim, abaixo</p><p>de ± 20%. Nessa época do ano, o Eta/ CPTEC tende a superestimar</p><p>os valores de TMIN.</p><p>Em relação à chuva, o Eta/CPTEC apresentou maior variabilidade</p><p>(Figura 7.3). De forma geral, o modelo tende a superestimar as</p><p>chuvas no estado de São Paulo. Em comparação aos resultados de</p><p>TMAX e TMIN, a chuva apresentou maiores desvios em relação à</p><p>média, chegando a superestimativas de 40% ou mais, em algumas</p><p>regiões nos meses secos, entre junho, julho e agosto.</p><p>Figura 7.3 – Viés em porcentagem das chuvas médias mensais.</p><p>Fonte: Elaboração dos autores.</p><p>O Eta/CPTEC apresentou menores desvios em relação à média</p><p>para as chuvas na região oeste do estado, durante os meses mais</p><p>úmidos. Os meses de fevereiro, março, setembro, novembro e</p><p>dezembro se destacaram, apresentando desvios entre 0 e ±20%,</p><p>indicando uma boa simulação para eles.</p><p>7.4 Análise do modelo Eta em</p><p>diferentes escalas</p><p>Os resultados indicaram coerência com estudos anteriores que</p><p>utilizaram o CRU para avaliar a climatologia do Eta/CPTEC12. De</p><p>forma geral, o Eta/ CPTEC simulou bem o clima presente.</p><p>Este trabalho indicou uma tendência do Eta em superestimar a</p><p>chuva no verão. Os resultados revelam a importância em avaliar os</p><p>modelos regionais numa escala mais refinada, com informações</p><p>mais precisas, como os postos pluviométricos utilizados neste</p><p>trabalho, cujas distâncias entre os pontos não ultrapassa 50 km.</p><p>É importante destacar a boa performance do modelo para a</p><p>precipitação mensal durante o período úmido (entre novembro e</p><p>março) na região oeste do estado de São Paulo. Essa região</p><p>corresponde à área de expansão da cana-de-açúcar, cujo clima,</p><p>especialmente o regime de chuvas do verão, é influenciado pela</p><p>Zona de Convergência do Atlântico Sul (ZCAS).</p><p>A ZCAS é definida como uma banda de nebulosidade que se</p><p>forma em condições específicas de umidade e estende-se desde o</p><p>sul da região Amazônica até o centro do Atlântico Sul. A ZCAS é</p><p>considerada um dos mais importantes fenômenos na escala</p><p>intrasazonal para definir as chuvas que ocorrem durante o verão na</p><p>América do Sul.</p><p>O processo pelo qual se forma a ZCAS ainda não é um consenso</p><p>entre os especialistas de clima, pois sofre influência de fatores</p><p>remotos e locais13. Mas a ZCAS só aparece quando duas condições</p><p>de grande escala são satisfeitas14. A primeira condição é a</p><p>ocorrência do escoamento de ar quente e úmido, em baixos níveis,</p><p>em direção às altas latitudes. A segunda é a ocorrência de um jato</p><p>subtropical em altos níveis, fluindo em altitudes tropicais.</p><p>Os resultados indicam que o Eta/CPTEC representou de forma</p><p>coerente os mecanismos formadores de precipitação no estado de</p><p>São Paulo, ou seja, as Zonas de Convergência Intertropical.</p><p>Em relação à simulação das temperaturas, o Eta/CPTEC simulou</p><p>dados coerentes com os dados observados para as TMIN nas</p><p>regiões montanhosas para</p><p>o continente sul-americano15, com</p><p>tendência em subestimá-las. Neste trabalho, as TMIN nos meses</p><p>mais frios do ano (junho/julho/agosto – JJA) também foram</p><p>coerentes com os dados observados (desvios menores que 20%),</p><p>mas foram superestimadas.</p><p>7.5 Considerações finais</p><p>Este trabalho apresentou uma análise do modelo Eta/CPTEC com</p><p>informações detalhadas de postos de monitoramento de chuva e</p><p>temperatura para o estado de São Paulo. Os resultados indicaram</p><p>uma boa performance do modelo em simular os dados na escala</p><p>mensal. Algumas particularidades do modelo se destacaram, em</p><p>especial, a boa simulação de chuva para todos os meses na região</p><p>oeste do estado de São Paulo. O modelo apresentou um</p><p>comportamento mais úmido para todo o estado, ou seja, tem uma</p><p>tendência de superestimar os valores de chuva para a região no</p><p>período chuvoso.</p><p>Os resultados apresentados indicam a importância em concentrar</p><p>esforços para que a comunidade científica aprimore cada vez mais a</p><p>resolução espacial dos dados utilizados como referência para</p><p>avaliar os modelos climáticos. Os trabalhos que envolvem variáveis</p><p>climáticas como chuva e temperatura carecem de informações de</p><p>superfície com boa distribuição de pontos e dados consistidos.</p><p>O modelo indicou boa performance para simulações de chuva e</p><p>temperatura para o oeste do estado, região que se destaca pela</p><p>expansão da cana-de-açúcar nos últimos anos.</p><p>Os resultados indicaram a confiabilidade de previsão dos cenários</p><p>futuros do modelo Eta/CPTEC para a região oeste do estado, área</p><p>de interesse do projeto AlcScens. Esse resultado é extremamente</p><p>relevante para as interpretações do Zoneamento Agrícola de Riscos</p><p>Climáticos (ZARC) utilizando os cenários futuros simulados pelo</p><p>Eta/CPTEC.</p><p>Referências bibliográficas</p><p>AMBRIZZI, T. et al. “Cenários regionalizados de clima no Brasil e</p><p>América do Sul para o Século XXI: Projeções de clima futuro usando</p><p>três modelos regionais”. Relatório n. 3, Ministério do Meio Ambiente</p><p>– MMA / Secretaria de Biodiversidade e Florestas – SBF / Diretoria</p><p>de Conservação da Biodiversidade (DCBio). 2007. Disponível em:</p><p><http://www.grec.iag.usp.br/outros/ambrizzi/relatorio3.pdf>.</p><p>CASARIN, D. P. & KOUSKY, V. E. “Anomalias de precipitação no sul</p><p>do Brasil e variações da circulação atmosférica”. Revista Brasileira</p><p>de Meteorologia, n. 1, 1986, pp. 83-90.</p><p>CHOU, S. C.; BUSTAMANTE, J. F. & GOMES, J. L. “Evaluation of</p><p>Eta Model seasonal precipitation forecasts over South America”.</p><p>Nonlinear Processes in Geophysics, vol. 12, 2005, pp. 537-555.</p><p>Disponível em: <http://www.nonlin-processes-</p><p>geophys.net/12/537/2005/npg-12-537-2005.pdf>.</p><p>CHOU, C. et al. “Evaluating the ‘Rich-Get-Richer’ Mechanism in</p><p>Tropical Precipitation Change under Global Warming”. Journal of</p><p>Climate, vol. 22, n. 8, 2009, pp. 1.982-2.005.</p><p>______. “Downscaling of South America Present Climate Driven by</p><p>4-member HadCM3 Runs”. Climate Dynamics, vol. 38, n. 3-4, 2012,</p><p>pp. 635-653.</p><p>______. “Increase in the range between wet and dry season</p><p>precipitation”. Nature Geoscience, 2013. Disponível em:</p><p><http://www.nature.com/ngeo/journal/vaop/ncurrent/full/ngeo1744.ht</p><p>ml>.</p><p>KALNAY, E.; MO, K. C. & PAEGLE, J. “Large-amplitude, Short-scale</p><p>Stationary Rossby Waves in the Southern Hemisphere:</p><p>http://www.grec.iag.usp.br/outros/ambrizzi/relatorio3.pdf</p><p>http://www.nonlin-processes-geophys.net/12/537/2005/npg-12-537-2005.pdf</p><p>http://www.nature.com/ngeo/journal/vaop/ncurrent/full/ngeo1744.html</p><p>Observations and Mechanistic Experiments to Determine their</p><p>Origin”. Journal of Atmospheric Science, n. 43, 1986, pp. 252-275.</p><p>KODAMA, Y.-M. “Large-scale Common Features of Sub-tropical</p><p>Precipitation Zones (the Baiu Frontal Zone, the SPCZ, and the</p><p>SACZ). Part II: Conditions of the Circulations for Generating the</p><p>STCZs”. Journal of the Meteorological Society of Japan, n. 71, 1993,</p><p>pp. 581-610.</p><p>MARENGO, J. A. et al. “The Drought of Amazonia in 2005”. Journal</p><p>Of Climate, vol. 21, n. 3, 2008, pp. 495-516.</p><p>______. “Development of Regional Future Climate Change</p><p>Scenarios in South America Using the Eta CPTEC/HadCM3 Climate</p><p>Change Projections: Climatology and Regional Analyses for the</p><p>Amazon, São Francisco and the Paraná River Basins”. Climate</p><p>Dynamics, vol. 38, n. 9-10, 2012, pp. 1.829-1.848.</p><p>MESINGER, F. “An Upgraded Version of the Eta Model”.</p><p>Meteorology and Atmospheric Physics, vol. 116, n. 3-4, 2012, pp.</p><p>63-79. Disponível em:</p><p><http://link.springer.com/article/10.1007/s00703-012-0182-</p><p>z/fulltext.html>.</p><p>PESQUERO, J. F. et al. “Climate Downscaling over South America</p><p>for 1961-1970 Using the Eta Model”. Theoretical and Applied</p><p>Climatology, vol. 99, n. 1-2, 2010, pp. 75-93. Disponível em:</p><p><http://link.springer.com/article/10.1007/s00704-009-0123-</p><p>z/fulltext.html>.</p><p>PILOTTO, I. L.; CHOU, S. C. & NOBRE, P. “Seasonal Climate</p><p>Hindcasts with Eta Model Nested in CPTEC Coupled Ocean-</p><p>atmosphere General Circulation Model”. Theoretical and Applied</p><p>Climatology, vol. 110, n. 3, 2012, pp. 437-456. Disponível em:</p><p><http://link.springer.com/article/10.1007/s00704-012-0633-</p><p>y/fulltext.html>.</p><p>http://link.springer.com/article/10.1007/s00703-012-0182-z/fulltext.html</p><p>http://link.springer.com/article/10.1007/s00704-009-0123-z/fulltext.html</p><p>http://link.springer.com/article/10.1007/s00704-012-0633-y/fulltext.html</p><p>ROJAS, M. & SETH, A. “Simulation and Sensitivity in a Nested</p><p>Modeling System for South America. Part II: GCM Boundary</p><p>Forcing”. Journal Of Climate, vol. 16, n. 15, 2003, pp. 2.437-2.453.</p><p>Disponível em: <http://journals.ametsoc.org/doi/abs/10.1175/1520-</p><p>0442(2003)016<2437: SASIAN>2.0.CO;2>.</p><p>http://journals.ametsoc.org/doi/abs/10.1175/1520-0442(2003)016</p><p>Parte 3 - Conjuntura recente do</p><p>setor sucroenergético</p><p>brasileiro: crise, expansão da</p><p>produção, dinâmica</p><p>demográfica e perspectivas da</p><p>cana-de-açúcar frente às</p><p>mudanças climáticas</p><p>Introdução</p><p>Luiz Gustavo Antonio de Souza</p><p>O fenômeno das mudanças climáticas, aliado aos incentivos ao</p><p>uso das energias renováveis, em específico o etanol, tem</p><p>parcialmente influenciado a expansão da produção da cana-de-</p><p>açúcar no Brasil. De fato, a dinâmica setorial da expansão da cana-</p><p>de-açúcar ocorreu e ocorre de forma mais complexa, apresentando</p><p>ciclos virtuosos com rápido crescimento, euforia e acumulação de</p><p>capital na indústria, ou ciclos depressivos, influenciados por fatores</p><p>climáticos atípicos ou mudanças de conjuntura com acelerada</p><p>retração da produção e declínio dos investimentos.</p><p>A conjuntura recente do setor sucroenergético brasileiro reflete</p><p>especificamente a crise deflagrada em 2008, que encerrou mais um</p><p>ciclo de expansão e que, desde então, tem influenciado as decisões</p><p>de produção no setor agrícola e industrial. A última fase de</p><p>crescimento teve o seu início na virada da década de 2000,</p><p>momento no qual o setor contava com um preço elevado para o</p><p>açúcar, com boas perspectivas para exportação de etanol para os</p><p>Estados Unidos e com as perspectivas proporcionadas pelos novos</p><p>produtos em desenvolvimento, tais como a produção do etanol de</p><p>segunda geração (lignocelulósico).</p><p>O último ciclo de crescimento teve influência direta na expansão</p><p>do cultivo da cana-de-açúcar no estado de São Paulo, tradicional</p><p>produtor, mas também, em novas áreas rumo ao Centro-Oeste. Em</p><p>resposta a essa expansão, surgem novas indagações que remetem</p><p>a alguns fatores, tais como: sustentabilidade, vulnerabilidade</p><p>socioeconômica das regiões, dinâmica demográfica, segurança</p><p>alimentar e outros elementos que se relacionam à opinião pública</p><p>quanto à adoção do etanol de cana-de-açúcar frente às mudanças</p><p>climáticas. No Brasil, as evidências mostram que o avanço em São</p><p>Paulo e no Centro-Oeste tem ocorrido principalmente em áreas de</p><p>pastagem, isto é, não há concorrência direta em relação a áreas</p><p>com plantações pré-existentes, em específico, de gênero</p><p>alimentício. Entretanto, ao deslocar a pecuária para outras regiões,</p><p>como o Norte brasileiro, problemas em relação à sustentabilidade</p><p>podem emergir. Não obstante, as regiões que introduziram cana-de-</p><p>açúcar em detrimento da pecuária terão sua dinâmica</p><p>socioeconômica e migratória alteradas com impactos</p><p>positivos ou</p><p>negativos.</p><p>Nesta seção do livro, portanto, discute-se principalmente a atual</p><p>conjuntura da economia brasileira voltada ao setor sucroenergético,</p><p>especificamente os fatores relevantes que antecedem a crise que o</p><p>setor tem procurado transpor; a dinâmica da expansão do cultivo da</p><p>cana-de-açúcar no estado de São Paulo e rumo ao Centro-Oeste;</p><p>os fluxos migratórios advindos da expansão da cana-de-açúcar e as</p><p>principais perspectivas para o setor.</p><p>Os capítulos desta parte apresentam-se na seguinte sequência de</p><p>assuntos tratados:</p><p>Situação e perspectivas do setor sucroenergético paulista frente</p><p>aos cenários macroeconômicos e de mudanças climáticas, nos</p><p>quais são salientadas questões como a sucroenergia e a</p><p>(in)definição da matriz energética brasileira, a influência do</p><p>mercado internacional de açúcar e as exportações de álcool, a</p><p>oscilação no mercado de trabalho, as mudanças climáticas e os</p><p>riscos para o setor e as perspectivas tecnológicas, com</p><p>destaque para o etanol de segunda geração;</p><p>Análise da expansão recente e da ocupação de novas áreas</p><p>pela produção de cana-de-açúcar no Centro-Oeste brasileiro,</p><p>região essa que se configura na nova fronteira agrícola</p><p>sucroalcooleira. Não obstante, são analisados os efeitos</p><p>ambientais de desmatamento que o padrão de crescimento</p><p>dessas produções, via incorporação de novas áreas, tem</p><p>causado aos biomas da região;</p><p>Panorama sociodemográfico das regiões sucroalcooleiras do</p><p>estado de São Paulo a partir de 1990. Neste capítulo também</p><p>são apresentadas análises para as microrregiões do estado de</p><p>São Paulo de forma a identificar onde, e quando, as atividades</p><p>do Complexo Agroindustrial (CAI) canavieiro possam ter</p><p>repercussões relevantes na economia, dinâmica social e</p><p>demográfica locais; e</p><p>Dinâmica socioespacial da expansão da cana-de-açúcar no</p><p>estado de São Paulo. Isto é, verifica-se que as novas</p><p>espacialidades desenhadas pela expansão do plantio da cana</p><p>revelam a importância dos contextos regionais para a</p><p>articulação de sua cadeia produtiva no âmbito local, regional,</p><p>nacional e global.</p><p>8. Situação e perspectivas do</p><p>setor sucroenergético paulista</p><p>frente aos cenários</p><p>macroeconômicos e de</p><p>mudanças climáticas</p><p>Walter Belik, Luiz G. A. de Souza, Sérgio R. F. Figueira, Andrea</p><p>Koga-Vicente, Jurandir Zullo Junior</p><p>Processo Fapesp 2008/58160-5</p><p>8.1 Introdução</p><p>A conjuntura marcada pela redução de investimentos e a</p><p>desativação de 66 unidades de produção a partir de 2008 assinala o</p><p>encerramento de mais um ciclo de expansão do setor</p><p>sucroenergético. Essa fase de crescimento teve o seu início na</p><p>virada da década de 20001, momento no qual o setor contava com</p><p>um preço elevado para o açúcar, com boas perspectivas para</p><p>exportação de etanol para os Estados Unidos, diante dos programas</p><p>de substituição do aditivo MTBE2, utilizado na gasolina, e também</p><p>com as perspectivas proporcionadas pelos novos produtos em</p><p>desenvolvimento, tais como a produção do etanol de segunda</p><p>geração (lignocelulósico).</p><p>O setor continuou aproveitando os aspectos favoráveis</p><p>proporcionados pelo governo do presidente Lula durante os dois</p><p>períodos consecutivos (2003 a 2012), que refletiram em um</p><p>crescimento dos recursos destinados aos investimentos no setor e</p><p>que foram disponibilizados tanto pelo Banco Nacional de</p><p>Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES), como por repasses</p><p>desse aos bancos comerciais. Nesse cenário, a euforia já instalada</p><p>no setor sucroenergético permitiu o ingresso de novos capitais</p><p>(nacionais e estrangeiros) e, também, investimentos em novas</p><p>unidades de produção, mais modernas e aliadas a uma gestão mais</p><p>profissional.</p><p>Embora o cenário atual seja favorável com a manutenção, até o</p><p>presente momento, do patamar elevado do preço do açúcar no</p><p>mercado internacional e das perspectivas positivas para essa</p><p>commodity para os próximos dez anos3, as companhias reduziram o</p><p>ritmo de crescimento da oferta desse produto. Consonante a essa</p><p>redução da oferta de açúcar, o mercado de bioenergia enfrenta um</p><p>movimento semelhante, tanto no âmbito internacional, com a</p><p>redução dos objetivos de substituição de combustíveis nos Estados</p><p>Unidos e na Europa, quanto nacional, com a redução na prioridade</p><p>para o uso de etanol anidro na mistura com a gasolina, iniciado em</p><p>2011.</p><p>Ressalta-se que o mês de janeiro de 2011 apresentou o pico</p><p>histórico dos preços do açúcar no mercado internacional (US$ 29,74</p><p>/ libra peso) e fevereiro de 2011 foi o mês em que ocorreu a</p><p>ultrapassagem da barreira dos US$ 100 / barril do petróleo tipo</p><p>Brent. Em outras palavras, após a crise econômica mundial de</p><p>20084, iniciou-se um processo de mudança conjuntural dos</p><p>mercados internacionais de alimentos e de energia, o qual, em</p><p>função de defasagens, tornou-se evidente apenas em 2011. Embora</p><p>os governos tenham desencadeado medidas anticíclicas,</p><p>generalizou-se a crise na economia mundial, levando à redução de</p><p>gastos públicos e privados de grandes companhias sem</p><p>investimentos futuros e também a uma “guerra cambial” com</p><p>desvalorização das principais moedas mundiais. No âmbito das</p><p>empresas privadas, ocorreu um fenômeno conhecido como</p><p>“recentragem”, isto é, a repatriação do capital investido, com as</p><p>empresas transnacionais desmobilizando o capital investido nos</p><p>países em desenvolvimento para garantir a “saúde” econômica da</p><p>matriz.</p><p>No que se refere ao mercado de energia, os altos preços do</p><p>petróleo passam a viabilizar economicamente a extração do óleo e</p><p>do gás de xisto a partir de uma nova tecnologia – nos Estados</p><p>Unidos e Canadá, principalmente – sem considerar os impactos</p><p>diretos desse procedimento, seja ambiental ou econômico. A</p><p>introdução do gás e do óleo de xisto colocou em uma situação</p><p>adversa não apenas os atuais e potenciais exportadores de etanol</p><p>de cana-de-açúcar brasileiros, mas também os produtores norte-</p><p>americanos de etanol de milho. De modo geral, esse cenário de pós-</p><p>crise econômica mundial impactou negativamente os programas do</p><p>setor de bioenergia e de utilização de outras fontes renováveis em</p><p>meio à mitigação dos efeitos das mudanças climáticas já no</p><p>curtíssimo prazo. No Brasil, a tônica da política energética da nova</p><p>administração federal (governo Dilma) colocou o etanol hidratado e a</p><p>bioeletricidade a partir do bagaço de cana em segundo plano,</p><p>deslocando suas prioridades na exploração do petróleo da camada</p><p>do pré-sal e na construção de novas refinarias para a produção de</p><p>gasolina e usinas hidroelétricas.</p><p>Somados aos fatores conjunturais estabelecidos pela política</p><p>econômica e pela crise internacional, surgiram também problemas</p><p>climáticos com duas quebras de safras consecutivas. Esses fatores</p><p>terminaram por produzir elevação de custos e incertezas no setor,</p><p>situação agravada pelo baixo empenho governamental em autorizar</p><p>aumentos de preços ao consumidor dos derivados de petróleo –</p><p>concorrente direto do etanol. Muito embora o governo federal tenha</p><p>sinalizado com medidas conciliatórias e compensatórias, tais como o</p><p>aumento do percentual de etanol anidro na mistura da gasolina,</p><p>socorro financeiro e renegociação de dívidas das empresas junto ao</p><p>BNDES5, elas não foram suficientes para conter a desativação de</p><p>diversas unidades produtivas.</p><p>Assim, muito embora o mercado de combustíveis seja livre no</p><p>Brasil, a falta de uma definição mais assertiva sobre a política</p><p>pública para o setor energético fez com que a crise no setor se</p><p>aprofundasse e muitas unidades fossem desativadas.</p><p>Duas questões emergem como reflexo do desempenho recente do</p><p>setor e necessitam de um maior aprofundamento, a saber:</p><p>a. Ainda que o setor tenha conquistado certa autonomia a partir da</p><p>desregulamentação, ocorrida no início dos anos 1990, observa-</p><p>se ainda uma grande dependência em relação aos</p><p>determinantes da política pública, visto que, no curto prazo, o</p><p>cenário para exportação de etanol não se mostra promissor. Da</p><p>mesma maneira, a possibilidade de produção do etanol de</p><p>segunda geração em escala comercial será realidade apenas</p><p>para poucas usinas nessa década e, dessa forma, o mercado</p><p>convencional de etanol anidro e hidratado e o de</p><p>comercialização de bioeletricidade</p><p>são ambos percebidos pelas</p><p>associações privadas representativas do setor como alternativa</p><p>potencial para a redução da crise no curto prazo; e</p><p>b. Essa dependência em relação ao governo federal torna o setor</p><p>vulnerável, quando não há uma política clara e uma definição</p><p>objetiva do papel real do etanol e de outros derivados da cana-</p><p>de-açúcar na Matriz Energética Brasileira.</p><p>O presente capítulo se desenvolve em torno dessas duas</p><p>questões, levando-se em conta o cenário competitivo atual e as</p><p>demandas tecnológicas colocadas visando a aumentos de</p><p>produtividade agrícola e industrial, ao mercado de trabalho, à</p><p>expansão dos investimentos e aos riscos colocados pela mudança</p><p>climática.</p><p>8.2 Sucroenergia e a matriz energética</p><p>Desde o lançamento do Proálcool em 1975, o setor canavieiro</p><p>percorreu um longo caminho, que levou a cana-de-açúcar a se</p><p>estabelecer como matéria-prima de importância no conjunto das</p><p>fontes de energia brasileiras. No início do programa, a participação</p><p>do etanol na matriz energética cresceu pelo aumento de sua mistura</p><p>com a gasolina. Tratava-se de aproveitar a capacidade ociosa que</p><p>havia sido implementada ainda nos anos 1960 e que transformou o</p><p>Brasil em um grande exportador mundial de etanol. Como se sabe, o</p><p>processo de produção de açúcar gera uma quantidade de álcool</p><p>residual que não tinha utilização diante dos baixos níveis de mistura</p><p>praticados na época. Ao estabelecer uma paridade conveniente</p><p>entre o valor do álcool anidro e o da saca de açúcar, o governo</p><p>federal viabilizou o mercado para o álcool que, caso contrário, seria</p><p>reprocessado, transformando-se em mais açúcar.</p><p>Ao final da década de 1970, e diante de uma nova alta nos preços</p><p>do petróleo, o governo federal decidiu financiar um grande programa</p><p>de instalação de destilarias autônomas para produção exclusiva de</p><p>álcool, que passou a ser ofertado para uso direto na incipiente e</p><p>ineficiente frota de automóveis (álcool hidratado) que existia. O</p><p>programa cresceu em tamanho e importância até uma nova crise,</p><p>que aconteceu dessa vez pelo lado da oferta, em 1989. A falta do</p><p>produto, motivada pelo elevado preço do açúcar no mercado</p><p>internacional, provocou uma enorme insatisfação na opinião pública,</p><p>com reflexos na indústria automobilística, que vinha produzindo</p><p>quase 80% de automóveis com motores movidos exclusivamente a</p><p>álcool.</p><p>Há outras interpretações para a crise de 1989, com troca de</p><p>acusações entre os produtores, Petrobrás e indústria</p><p>automobilística6. O fato é que, com a entrada do Governo Collor, em</p><p>1990, decide-se extinguir o antigo Instituto do Açúcar e do Álcool</p><p>(IAA) e desregulamentar quase por completo as atividades de</p><p>instalação de unidades produtoras, venda no mercado interno e</p><p>exportação de produtos e subprodutos da agroindústria canavieira.</p><p>De acordo com Vian7:</p><p>Até o início dos anos 90 o Complexo Canavieiro era marcado pelo</p><p>isomorfismo institucional imposto pela regulamentação e planejamento</p><p>estatal. As empresas do setor possuíam estruturas produtivas, mix de</p><p>produtos (indiferenciados) e formas de inserção no mercado bastante</p><p>semelhantes. Com a desregulamentação nos anos 90, o setor adquiriu uma</p><p>nova dinâmica concorrencial que fez com que as estruturas das empresas, o</p><p>tipo e o mix do produto se alterassem significativamente.</p><p>A diversificação de estratégias permitiu ao setor “ganhar tempo” e</p><p>recuperar a credibilidade perdida junto ao consumidor, que acabou</p><p>se rendendo ao álcool hidratado com a disseminação de veículos</p><p>“total flex” no mercado nacional a partir de 2003.</p><p>Com isso, o setor entrou na nova década em clima de otimismo,</p><p>dadas as perspectivas de exportações para o programa de</p><p>biocombustíveis norte-americano, preços do açúcar em alta e</p><p>mercado interno restabelecido com as vendas de veículos flex. Para</p><p>ilustrar o clima de euforia, basta mostrar que a moagem de cana-de-</p><p>açúcar no Brasil saltou de um patamar de 200 mil para 300 mil</p><p>toneladas em uma década.</p><p>Durante a década de 2000, com a entrada de novos grupos</p><p>empresariais e com a estratégia agressiva de expansão dos grupos</p><p>nacionais mais capitalizados, ocorreu uma mudança radical no</p><p>panorama da produção. Entre os grupos estrangeiros, merecem</p><p>destaque as aquisições feitas pelas empresas Louis Dreyfus (Usina</p><p>Cresciumal, 2000; Usina Luciânia, 2001; Usina São Carlos, 2004;</p><p>quatro usinas do Grupo Tavares de Melo, 2006; Usina Santelisa</p><p>Vale, 2009); Bunge (três usinas do Grupo Moema, 2009; além de</p><p>outras cinco novas usinas inauguradas a partir de 2007); Cargill</p><p>(Usina Cevasa, 2006; Usina Itapagipe, 2006; duas novas usinas em</p><p>Goiás e sociedade com a Copersucar, 2014); e Archer Daniel</p><p>Midland (ADM), na construção de uma usina no Triângulo Mineiro e</p><p>outra em Goiás (2006). Atualmente, a Louis Dreyfus é o segundo</p><p>grupo do setor, considerando o volume de cana moída por safra8.</p><p>Os quatro grupos empresariais estrangeiros são conhecidos pelo</p><p>acrônimo ABCD e são considerados os quatro maiores tradings</p><p>globais, controlando perto de 50% do esmagamento de soja no</p><p>Brasil9 e 90% do comércio internacional de grãos10. Some-se a isso</p><p>a entrada de outros grupos estrangeiros importantes, como o indiano</p><p>Renuka (Usina Vale do Ivaí, 2009 e Usina Equipav, 2011); o britânico</p><p>British Petroleum (Tropical, 2008); o francês Tereos (Ipaussu, 2000;</p><p>Univalen, 2001; Santo Antonio, 2001; e Destivale, com o grupo</p><p>Cosan, 2005); o inglês Evergreen (Destilaria Cridasa, 2006); o grupo</p><p>chinês Noble (Usinas Catanduva, 2006; Noroeste Paulista, 2008;</p><p>Potirendaba, 2010; e Meridiano, 2010); e o espanhol Abengoa</p><p>(aquisição do grupo Dedini, 2007). Torna-se importante destacar a</p><p>presença de fundos de investimento internacionais, como o japonês</p><p>Sojitz (participação na ETH, do grupo Odebrecht, 2007), os fundos</p><p>do investidor George Soros (Usina Monte Alegre, 2006); Infinity,</p><p>(Cridasa, Disa, Alcana Paraíso, Usinavi, Ibirálcool, Cepar e Agromar,</p><p>2006 e 2007); Clean Energy Brazil (Destilaria Alcoolvale); entre</p><p>outros. As empresas de energia e as grandes construtoras também</p><p>participaram dos investimentos. Além da British Petroleum (BP),</p><p>destacada anteriormente, a Shell (em parceria com a Cosan) e a</p><p>Petrobrás compõem o quadro das energéticas, ao mesmo tempo em</p><p>que a Odebrecht (proprietária de nove usinas) e a Camargo Corrêa</p><p>(alcoolduto) caracterizam a entrada do setor de construção pesada</p><p>no agronegócio.</p><p>O ritmo de crescimento do grupo Cosan é bastante significativo da</p><p>euforia vivida pelo setor nos últimos anos. Atualmente, esse grupo é</p><p>o principal no setor canavieiro no país, com ramificações no</p><p>comércio de combustíveis (postos Shell e Comgás) e no ramo de</p><p>transporte e logística (Rumo e ALL). A Raízen, braço de produção</p><p>de açúcar e álcool do grupo Cosan, administra 24 unidades, obteve</p><p>US$3.380,8 em vendas no ano de 2013 e é o maior produtor de</p><p>etanol do país11.</p><p>Por meio desses dados, pode-se constatar a profunda</p><p>transformação vivida pelo setor na última década, o que levou</p><p>também a mudanças importantes na área de pesquisa, assistência</p><p>técnica, crédito e comercialização de açúcar nos mercados interno e</p><p>externo. Enfim, a entrada de capitais externos e de grupos nacionais</p><p>de fora do setor deu-lhe uma nova face, atraindo novos profissionais</p><p>e alterando, em parte, a relação de dependência que as empresas</p><p>mantinham com o Estado.</p><p>Muito embora a expansão do setor tenha sido interrompida com a</p><p>crise internacional e apesar de ter havido dois anos com problemas</p><p>climáticos, a produção de açúcar e álcool (agora rebatizado de</p><p>etanol) cresceu desde a safra 2007/2008. A oferta de açúcar cresceu</p><p>14,6% e de álcool anidro e hidratado, 26,7%. No comparativo entre</p><p>os anos 2007 e 2013, as exportações de açúcar cresceram 10</p><p>milhões de toneladas (48,9%). Já as exportações de álcool, que</p><p>vinham subindo, tiveram uma queda brusca nos três últimos anos.</p><p>Em 2008, ano de maior exportação, o Brasil colocou 5,1 bilhões de</p><p>litros no mercado externo. Em 2013, essa exportação se reduziu e</p><p>não passou de 2,9 bilhões de litros.</p><p>Discute-se, na imprensa e nos meios acadêmicos, qual seria o</p><p>espaço da bioenergia derivada da cana-de-açúcar na Matriz</p><p>Energética Brasileira. O Gráfico 8.1 apresenta a evolução da</p><p>produção doméstica de petróleo e gás, produção de bioenergia a</p><p>partir da cana e a taxa de dependência do país em relação a fontes</p><p>importadas. Observa-se, por esse gráfico, que há uma forte</p><p>correlação negativa entre o aumento na oferta de energia do</p><p>petróleo (atingindo 133 milhões de Toneladas Equivalentes de</p><p>Petróleo – TEP – em 2013) e da cana-de-açúcar (atingindo 50</p><p>milhões de TEP em 2013) com a taxa de dependência (eixo vertical</p><p>do lado direito).</p><p>Gráfico 8.1 – Brasil: Produção de petróleo, gás, bioenergiada</p><p>cana-de-açúcar e taxa de dependência</p><p>Fonte: Elaboração dos autores com dados do MME – BEN12.</p><p>A dependência do país em relação às fontes importadas chegou a</p><p>45,4% em 1979, reduzindo-se a 3,9% em 2009, ano em que a</p><p>dependência voltou a subir, devido ao aquecimento na demanda, ou</p><p>porque a produção de energéticos não conseguiu acompanhar o</p><p>ritmo da demanda.</p><p>No Gráfico 8.2, é apresentada a distribuição da oferta de energia</p><p>primária desde 1970. Observa-se claramente que durante todo esse</p><p>período a participação do petróleo, mais tarde acompanhado pelo</p><p>gás natural, manteve-se em torno de 50%. O que teve um</p><p>crescimento significativo no período foram os derivados da cana-de-</p><p>açúcar, a energia eólica e outras fontes alternativas.</p><p>Gráfico 8.2 – Brasil: Distribuição da Oferta Interna de Energia</p><p>Primária (em TEP)</p><p>Fonte: Elaboração dos autores com dados do MME – BEN13.</p><p>Os derivados de cana participaram com 16,1% na oferta de</p><p>energia (em 2013), configurando-se, assim, a segunda matéria-</p><p>prima mais importante na Matriz Energética Brasileira. A energia</p><p>eólica contou com 4,2% na oferta primária de energia, demonstrando</p><p>que tem potencial e pode deixar de ser uma fonte simplesmente</p><p>alternativa.</p><p>O maior ponto de preocupação colocado pelo Gráfico 8.2 é o</p><p>crescimento do uso de carvão mineral e coque, que vem se</p><p>reduzindo ao longo dos anos, mas ainda representou 5,6% da oferta</p><p>de energia no Brasil em 2013. O uso do carvão como fonte primária</p><p>de energia se intensifica nos meses secos em função da redução na</p><p>oferta de hidroeletricidade. Nesse período, são acionadas as usinas</p><p>termoelétricas movidas a carvão, que colocam energia na rede a</p><p>custos muito mais elevados do que a energia gerada pelas fontes</p><p>hídricas, mas com preços reduzidos em relação às termoelétricas,</p><p>que utilizam bagaço de cana-de-açúcar. Estima-se que, com a</p><p>conclusão do conjunto de usinas hidroelétricas no Norte (Rios</p><p>Madeira, Xingu e Tapajós) e com a interligação total do sistema, será</p><p>possível suprir a demanda o ano todo com a hidroeletricidade.</p><p>Seja para suprir essa demanda potencial ou no período futuro,</p><p>observa-se que o uso do bagaço de cana ainda não conseguiu</p><p>ocupar um espaço maior na Matriz. Vale mencionar que, com a</p><p>entrada em operação de equipamentos mais modernos nas</p><p>unidades sucroalcooleiras, as sobras de bagaço têm crescido, e</p><p>esse excesso se dá justamente no período de maior demanda por</p><p>termoeletricidade. Essa afirmação pode ser comprovada pela análise</p><p>do Gráfico 8.3.</p><p>Gráfico 8.3 – Produção e consumo de bagaço de cana-de-açúcar</p><p>Fonte: Elaboração dos autores com dados do MME – BEM15.</p><p>Verifica-se pelo Gráfico 8.3 que, desde o início dos anos 2000,</p><p>houve um aumento significativo no volume de bagaço não</p><p>consumido pela queima para cogeração de energia elétrica e para</p><p>usos industriais. Esse bagaço não está sendo aproveitado devido</p><p>aos preços não remuneradores obtidos no mercado livre de energia.</p><p>Com efeito, uma vez que a compra de energia elétrica é realizada</p><p>através de leilões14, a energia elétrica gerada pelo bagaço de cana</p><p>deve concorrer com as termoelétricas movidas a carvão mineral,</p><p>cujo custo de operação é mais baixo, e com a energia eólica que,</p><p>uma vez amortizados os investimentos iniciais, deverá ter também</p><p>um custo competitivo.</p><p>8.3 Mercado internacional</p><p>Após a desregulamentação do setor sucroenergético, em meados</p><p>da década de 1990, criou-se um ambiente favorável ao aumento da</p><p>oferta de açúcar e etanol, interna e externamente. Na virada da</p><p>década de 2000, o setor sucroenergético contava com um elevado</p><p>preço internacional do açúcar e com boas perspectivas para a</p><p>exportação de etanol para os Estados Unidos, diante dos programas</p><p>de substituição do aditivo MTBE, utilizado na gasolina. Soma-se a</p><p>esses fatos a introdução dos veículos flex16 a partir de 2003, que</p><p>impulsionou o mercado interno e estimulou o aumento da produção</p><p>de etanol.</p><p>Constatou-se crescimento acelerado nas exportações de etanol a</p><p>partir de 2003, que perdurou até meados de 2006 (Gráfico 8.4).</p><p>Gráfico 8.4 – Evolução da exportação brasileira mensal de álcool</p><p>etílico17 entre janeiro de 2000 a dezembro de 2013</p><p>Fonte: Elaboração dos autores com dados do MDIC18.</p><p>Após um período de crescimento acelerado, seguiu-se um breve</p><p>período de estagnação, entre 2007 e meados de 2008, que</p><p>assinalaria os primeiros sinais da crise do setor. A partir de 2009, as</p><p>exportações tornaram-se oscilantes, isto é, com períodos de breve</p><p>crescimento seguidos por declínios abruptos.</p><p>Entre os diversos fatores que explicariam a crise nas exportações</p><p>segue-se diretamente a redução da oferta da cana-de-açúcar</p><p>motivada não somente pelos problemas climáticos como também</p><p>pelas perdas de produtividade decorrentes da falta de investimentos</p><p>para a renovação dos canaviais.</p><p>Verificou-se, a partir de 2010, uma escassez de etanol no mercado</p><p>interno, o que prejudicou a política de abastecimento, e o Brasil</p><p>passou a importar o produto episodicamente, garantindo os níveis de</p><p>mistura. Ou seja, o descompasso de uma demanda crescente por</p><p>etanol e uma oferta decrescente refletindo perdas agrícolas salientou</p><p>a necessidade de importação, principalmente de etanol de milho dos</p><p>Estados Unidos. Entretanto, outro fator, interno às empresas, pode</p><p>ter agravado a crise no mercado interno de etanol. O Gráfico 8.5</p><p>apresenta a evolução das exportações de açúcar entre 2000 e 2013.</p><p>Verifica-se que a média-móvel das exportações (linha pontilhada)</p><p>pode ser considerada crescente com a presença de estagnação e</p><p>declínio a partir de 2011.</p><p>Gráfico 8.5 – Evolução da exportação brasileira mensal de</p><p>açúcar20 entre janeiro de 2000 a dezembro de 2013</p><p>Fonte: Elaboração dos autores com dados do MDIC21.</p><p>Ou seja, fatos como a desregulamentação setorial, a ausência de</p><p>uma política de abastecimento efetiva e as políticas energéticas</p><p>favoreceram a gasolina em detrimento do etanol e permitiram que,</p><p>através de uma decisão simples de maximização de lucros, as</p><p>empresas direcionassem sua produção para o produto mais rentável</p><p>no curto prazo, isto é, o açúcar. É interessante observar que, sempre</p><p>que há possibilidade de quebra de safra na região Centro-Sul do</p><p>Brasil, ocorre uma alteração correspondente nos preços do açúcar</p><p>na Bolsa de Nova Iorque. No início da presente década, ou seja,</p><p>apenas no auge da crise de abastecimento de etanol, houve uma</p><p>certa movimentação, com aumento na produção nacional de etanol,</p><p>refletindo a queda da exportação de açúcar em pontos específicos</p><p>da série (ver Gráfico 8.5).</p><p>Segundo a Agência Estado19, a reversão da tendência de</p><p>crescimento das exportações de açúcar, iniciada em meados de</p><p>2011, decorre do declínio da perda de atratividade da remuneração</p><p>do açúcar, deixando o etanol anidro como primeira opção, seguido</p><p>do etanol hidratado e, finalmente, do açúcar. Para as usinas,</p><p>contudo, com o arrocho do crédito e a situação delicada que</p><p>enfrentam, há uma priorização do etanol hidratado para “gerar</p><p>caixa”, uma vez que o etanol tem maior liquidez que o açúcar.</p><p>8.4 Mercado de trabalho</p><p>O mercado de trabalho do setor sucroenergético envolve</p><p>principalmente três atividades: cultivo de cana-de-açúcar, produção</p><p>de açúcar e produção de etanol. A atividade de cultivo de cana-de-</p><p>açúcar possui como característica marcante a sazonalidade –</p><p>presente em todas as atividades agrícolas –, e a informalidade no</p><p>emprego da mão de obra. Entretanto, Moraes22 ressalta que a</p><p>proibição da queima da cana-de-açúcar como método de despalha,</p><p>com a consequente adoção</p><p>da mecanização da colheita da cana-de-</p><p>açúcar, tende a reduzir a demanda por mão de obra.</p><p>A mecanização da colheita cria oportunidades para tratoristas,</p><p>motoristas, mecânicos, condutores de colheitadeiras, técnicos em</p><p>eletrônica, dentre outros, e reduz, em maior proporção, a demanda</p><p>dos empregados de baixa escolaridade (grande parte dos</p><p>trabalhadores da lavoura canavieira têm poucos anos de estudo),</p><p>expulsando-os da atividade. Esse fato implica a necessidade de</p><p>alfabetização, qualificação e treinamento dessa mão de obra, para</p><p>estar apta a atividades que exijam maior escolaridade. Nesse âmbito</p><p>a iniciativa privada e pública têm de caminhar juntas para a criação</p><p>de programas de requalificação para atuar nas próprias usinas ou</p><p>em outras atividades.</p><p>Entretanto, o presidente da Federação dos Trabalhadores Rurais</p><p>do Estado de São Paulo (Fetaesp) destaca que, apesar de a</p><p>requalificação já ter abrangido um grande número de trabalhadores,</p><p>há uma parcela de ex-cortadores que é analfabeta ou</p><p>semianalfabeta, o que dificulta a qualificação e a reinserção no</p><p>mercado de trabalho23.</p><p>Além desse fato, muitos dos trabalhadores que estavam na</p><p>lavoura não eram do estado de São Paulo e as atividades correlatas</p><p>têm empregado cada vez menos pessoas. Apesar de o setor de</p><p>construção civil ter atraído muitos ex-cortadores através da</p><p>recolocação, há um ritmo de desaceleração da contratação motivada</p><p>pelo baixo crescimento econômico que o país enfrenta24.</p><p>O cumprimento das normas trabalhistas nos anos recentes, com</p><p>destaque para a NR31 – Norma Regulamentadora de Segurança e</p><p>Saúde nos Trabalhos em Espaços Confinados –, impõe uma série</p><p>de exigências aos empregadores agrícolas, elevando o custo de</p><p>oportunidade na produção da cana25.</p><p>Segundo o diretor-técnico da União da Indústria da Cana-de-</p><p>açúcar (UNICA), cada máquina substitui aproximadamente 80</p><p>cortadores de cana. Enquanto uma máquina colhe 600 toneladas de</p><p>matéria-prima por dia, um cortador de cana colhe 8 toneladas</p><p>diárias26.</p><p>O Gráfico 8.6 apresenta a evolução dos empregos formais no</p><p>estado de São Paulo nas três atividades descritas, que compõem o</p><p>setor sucroenergético. Verifica-se que o impulso positivo que o setor</p><p>recebeu no início da década passada levou a um aumento no</p><p>número de empregados na atividade de cultivo de cana, isto é, foi</p><p>superior ao decréscimo correspondente à substituição homem por</p><p>máquina. Ressalta-se que a declividade de grande parte do território</p><p>paulista é adequada para a adoção da mecanização.</p><p>Gráfico 8.6 – Evolução do número de empregos formais no setor</p><p>sucroenergético paulista e nas respectivas atividades entre 2000 e</p><p>2013</p><p>Fonte: Elaboração dos autores com dados da Relação Anual de</p><p>Informações Sociais – RAIS27.</p><p>A atividade de produção de açúcar e etanol mostra um</p><p>crescimento mais acelerado até 2008, momento no qual há um</p><p>breve período de estagnação no número de empregos, após um</p><p>pico de crescimento em 2011 motivado pelas novas perspectivas</p><p>pós-crise e pelo declínio em reflexo aos problemas financeiros das</p><p>unidades industriais, que se tornaram mais evidentes. O total de</p><p>empregos do setor sucroenergético teve um crescimento até</p><p>momentos antes da crise de 2008, quando passou a declinar. Nesse</p><p>período, a atividade mais impactada foi a de cultivo de cana, com</p><p>uma maior aceleração da substituição da mão de obra.</p><p>Na safra 2013/2014, a mecanização atingiu 83% da colheita. O</p><p>aumento da mecanização teve influência do Protocolo</p><p>Agroambiental do Setor Sucroenergético, firmado entre o setor</p><p>privado e o governo do estado de São Paulo, que previu a</p><p>antecipação voluntária dos prazos legais para o fim da queima</p><p>controlada da palha da cana nos canaviais paulistas. As signatárias</p><p>do Protocolo são responsáveis por aproximadamente 94% da</p><p>produção paulista e 48% da produção nacional de etanol28.</p><p>Essa relação fica mais evidente se considerado o número de</p><p>estabelecimentos de cada atividade do setor sucroenergético. O</p><p>Gráfico 8.7 apresenta o número de estabelecimento formais no</p><p>estado de São Paulo no setor sucroenergético, considerando as</p><p>atividades de cultivo e fabricação de açúcar e etanol.</p><p>Gráfico 8.7 – Evolução do número de estabelecimentos no setor</p><p>sucroenergético paulista e nas respectivas atividades entre 2000 e</p><p>2013</p><p>Fonte: Elaboração dos autores com dados da RAIS29.</p><p>Verifica-se, no período sob análise, um crescimento do número de</p><p>estabelecimentos até 2006 e posterior estabilização em um patamar</p><p>acima de 6.000. Ou seja, a relação emprego/estabelecimento é</p><p>declinante, isto é, menos pessoas estão sendo empregadas</p><p>anualmente por empresa. Uma vez que as atividades de açúcar e</p><p>etanol são mais intensivas em capital, há uma evidente discrepância</p><p>entre o número absoluto de estabelecimentos em comparação ao</p><p>cultivo da cana.</p><p>O Gráfico 8.8 apresenta apenas a série temporal de</p><p>estabelecimentos voltados à produção de açúcar e álcool. Verifica-se</p><p>que em 2008 há um declínio no número de estabelecimentos nessas</p><p>atividades, e, novamente, o esforço do setor para a retomada dos</p><p>níveis pré-crise são vistos em 2011, à semelhança da geração de</p><p>empregos vista no Gráfico 8.6. Entretanto, com os sucessivos</p><p>problemas destacados ao longo deste texto, muitas empresas</p><p>sucumbiram, reflexo este apresentado pelos dados do Gráfico 8.8,</p><p>que, após 2011, mostra uma queda ano a ano do número de</p><p>unidades produtivas nas atividades analisadas.</p><p>Gráfico 8.8 – Evolução do número de estabelecimentos de</p><p>produção de açúcar e etanol no estado de São Paulo entre 2000 e</p><p>2013</p><p>Fonte: Elaboração dos autores com dados da RAIS30.</p><p>8.5 Mudanças climáticas e os riscos</p><p>para o setor sucroenergético:</p><p>Produção canavieira e usinas</p><p>Como foi mencionado, parte expressiva dos investimentos em</p><p>novas plantas sucroenergéticas ocorreu na região oeste do estado</p><p>de São Paulo, devido à necessidade de ampliação de área plantada</p><p>e à nova regulamentação relativa à queimada na colheita. Embora a</p><p>composição dos solos não seja a ideal, em muitos locais dessas</p><p>regiões a cana se adaptou a solos arenosos e menos férteis31.</p><p>As condições climáticas são favoráveis, compondo ambientes de</p><p>produção adequados para a cultura. Contudo, alterações</p><p>relacionadas às mudanças climáticas podem modificar a atual</p><p>favorabilidade e aumentar o risco de quebras de safra em algumas</p><p>localidades.</p><p>As evidências científicas do aquecimento global têm se tornado</p><p>cada vez mais robustas e, no 5º Relatório (AR5) do Painel</p><p>Intergovernamental sobre Mudanças Climáticas (IPCC, na sigla em</p><p>inglês), afirma-se que “o aquecimento no sistema climático é</p><p>inequívoco”32, sendo que também foram observadas tendências de</p><p>aumento da frequência e intensidade na ocorrência de eventos</p><p>extremos em algumas regiões, como chuvas intensas e estiagens</p><p>prolongadas33. Dessa forma, emerge a necessidade de um</p><p>planejamento para os próximos anos que considere cenários de</p><p>mudanças climáticas, de forma a prevenir potenciais impactos</p><p>negativos e promover ações de adaptação para setor.</p><p>A metodologia do Zoneamento Agrícola de Riscos Climáticos é um</p><p>dos instrumentos que vem sendo utilizado para gerar cenários de</p><p>risco para as culturas em condições de mudanças climáticas34.</p><p>Trata-se de uma ferramenta de política agrícola e gestão de riscos</p><p>na agricultura35, baseada em análises dos dados históricos de</p><p>precipitação e temperatura e em necessidades agrícolas das</p><p>plantas36, indicando o nível de risco para a cultura em áreas com</p><p>baixo e alto risco climático, o que pode ajudar a aumentar a</p><p>produtividade da agricultura nacional37.</p><p>O estado de São Paulo apresenta extensa área favorável e com</p><p>baixo risco climático para o cultivo da cana-de-açúcar nas condições</p><p>climáticas atuais (Mapa 8.1a), o que coincide com a posição de</p><p>maior produtor canavieiro do país.</p><p>Mapa 8.1 – São Paulo: Cenários de Zoneamento de Riscos</p><p>Climáticos em a) condições atuais; b) condições simuladas para</p><p>2020; c) raio de atuação das usinas localizadas na área de alto</p><p>risco.</p><p>Fonte: Elaboração dos autores.</p><p>Apenas a área de planalto da porção leste e o extremo noroeste</p><p>do território paulista apresentam atualmente</p><p>condições de alto risco,</p><p>por restrições térmicas e hídricas, respectivamente. Porém, essas</p><p>condições podem se alterar significativamente em um cenário futuro.</p><p>A simulação do zoneamento utilizando anomalias de chuvas e</p><p>temperaturas previstas para 2020, modelo HadCM338 (Mapa 8.1b),</p><p>aponta que, entre as 14 Regiões de Governo que seriam afetadas,</p><p>estão inclusas importantes regiões produtoras e de expansão, como</p><p>Araçatuba, Barretos, Catanduva, São Joaquim da Barra, São José</p><p>do Rio Preto, Andradina, Franca e Catanduva39.</p><p>Considerando o raio ótimo de 30 km para o transporte de cana</p><p>(Mapa 8.1c), é possível observar que realmente não haveria matéria-</p><p>prima em uma distância economicamente viável para o</p><p>processamento. Esse cenário tem como principal vantagem a</p><p>possibilidade de se pensarem em medidas de adaptação para</p><p>contornar os possíveis impactos.</p><p>Cabe ressaltar que, nessa simulação, apenas as condições</p><p>climáticas foram alteradas em relação às condições atuais. As</p><p>demais variáveis, tais como as variedades plantadas e a estrutura do</p><p>sistema de transporte entre a frente de colheita e as usinas, foram</p><p>mantidas como “business as usual”, justamente para que sejam</p><p>planejadas ações adaptativas.</p><p>8.6 Etanol de segunda geração e as</p><p>perspectivas tecnológicas</p><p>As projeções de elevação da demanda por bioenergia, em meio às</p><p>ações de mitigação dos efeitos das mudanças climáticas (pela</p><p>redução das emissões de gases de efeito estufa) e devido ao</p><p>esgotamento de estoques de energia intensivas em carbono, entre</p><p>outros fatores, colocam o setor sucroenergético40 brasileiro em</p><p>posição de destaque como alternativa a esses requerimentos</p><p>através da produção do etanol lignocelulósico – considerado etanol</p><p>de segunda geração (E2G)41, e das capacidades produtivas e</p><p>institucionais para etanol de primeira geração (E1G)42.</p><p>A meta de consumo de biocombustíveis nos Estados Unidos até</p><p>2022 é de 36 bilhões de galões. Entretanto, parte dessa demanda</p><p>(21 bilhões de galões) não poderá ser atendida pelo etanol de milho,</p><p>cujo teto de produção é de 15 bilhões, já a partir de 201543. A</p><p>diferença deverá ser atendida pelos combustíveis considerados</p><p>avançados – etanol de segunda geração produzido a partir de</p><p>material lignocelulósico e o etanol de primeira geração feito a partir</p><p>da cana-de-açúcar44. Ressalta-se, no entanto, que o congresso</p><p>americano deverá votar ainda em 2014 por uma alteração dessa</p><p>meta otimista de consumo45.</p><p>O E2G é visto pelos mercados globais como uma alternativa</p><p>importante para o atendimento dessa demanda, já que ele se</p><p>configura como um novo procedimento de obtenção de etanol</p><p>através do processo de hidrólise da lignocelulose baseado em</p><p>biomassa na forma de bagaço, palha ou pontas de cana-de-</p><p>açúcar46.</p><p>Esses materiais hoje são descartados do processo produtivo do</p><p>etanol de cana-de-açúcar, ou são utilizados para a cogeração de</p><p>energia elétrica. Ao final do processo para segunda geração, a</p><p>indústria de etanol passará a obter maior produtividade com as</p><p>mesmas características físico-químicas e comerciais do etanol</p><p>produzido atualmente (E1G) e sem expansão de áreas de cultivo,</p><p>uma vez que os resíduos de biomassa são agora insumos para a</p><p>parte industrial47.</p><p>Com três usinas respondendo pela produção em escala comercial</p><p>(Gran-Bio/Alagoas, Raízen/São Paulo e Nova Fronteira/Goiás), e</p><p>outras duas em estágio de demonstração, o Brasil será capaz de</p><p>produzir 168 milhões de litros de etanol de segunda geração (E2G)</p><p>em 2015, segundo a expectativa do Departamento de Agricultura</p><p>dos Estados Unidos (USDA)48. Essas quantidades são ainda</p><p>modestas diante do tamanho do mercado para esse biocombustível,</p><p>contudo trata-se de um avanço significativo, colocando essa</p><p>empresa na dianteira no aproveitamento integral dos resíduos</p><p>agrícolas para a produção de energéticos.</p><p>Entretanto, Souza49 destaca o fato de não haver um padrão</p><p>tecnológico definido, isto é, não há definição sobre qual rota a ser</p><p>seguida, o que leva as empresas a decidirem individualmente o</p><p>modelo de produção a ser adotado. Considera-se também que o</p><p>Brasil não está na fronteira tecnológica da conversão do material</p><p>lignocelulósico em E2G. No país a produção de E2G inicia-se a</p><p>partir da formação de joint-ventures com grupos estrangeiros e apoio</p><p>maciço do BNDES. Entretanto, tais conformações empresariais</p><p>poderão ter reflexos negativos no longo prazo, caso as tecnologias</p><p>desenvolvidas sejam apropriadas de forma indevida por grupos</p><p>estrangeiros.</p><p>A produção do E2G também enfrenta alguns desafios já que a</p><p>matéria-prima utilizada é o bagaço e a palha da cana. Uma vez que</p><p>esse material já é utilizado como comburente na produção de</p><p>bioenergia, necessita-se de uma oferta maior de cana e, por</p><p>conseguinte, de bagaço e palha para a bioconversão.</p><p>Como foi destacado, os cenários climáticos atentam para uma</p><p>escassez de áreas propícias ao cultivo da cana em condições</p><p>regulares, isto é, ausência de irrigação e outros métodos não usuais.</p><p>Assim, o desenvolvimento de uma nova variedade com maior teor de</p><p>celulose e hemicelulose (cana energia) deverá ser apresentado com</p><p>a maior urgência. Contudo, até o momento, não há uma definição de</p><p>quem irá optar por cultivar a cana energia em detrimento da cana</p><p>convencional.</p><p>Novas opções também poderão incrementar a cadeia</p><p>sucroenergética, como a produção do farneseno, isto é, diesel obtido</p><p>a partir do bagaço e da palha da cana-de-açúcar. Esse</p><p>hidrocarboneto já é produzido e comercializado pela empresa norte-</p><p>americana Amyris, que obtém o diesel a partir da utilização de uma</p><p>modificação genética da Saccharomyces cerevisiae (levedura</p><p>utilizada na fermentação alcoólica). Tal combustível poderá ser</p><p>utilizado diretamente nos veículos movidos a diesel e, caso seja</p><p>refinado, como substituto ao querosene de aviação50.</p><p>Outro ganho possível de produtividade para o setor poderá ser</p><p>proveniente de novas tecnologias para o plantio da cana.</p><p>Atualmente um dos gargalos de produtividade do setor é derivado da</p><p>prática tradicional de plantio que obriga as usinas a fazerem mudas</p><p>com a cana que poderia estar sendo processada na fábrica.</p><p>Segundo o Centro Tecnologia Canavieira (CTC), a indústria precisa</p><p>destinar pelo menos 5% da área para essa finalidade. Por ano, cerca</p><p>de 1,5 milhão de hectares de cana-de-açúcar são cultivados no</p><p>Centro-Sul devido à necessidade de renovação – 17% da área total</p><p>de cana51.</p><p>Uma das soluções apresentadas ao mercado foi o produto de</p><p>marca Plene, da empresa Syngenta, lançado em 2010, e cuja</p><p>tecnologia consistia em toletes de 5 cm de cana, contra 40 cm no</p><p>método tradicional, e que poderiam ser plantados diretamente. A</p><p>expectativa, à época de seu lançamento, era de um ganho de</p><p>produtividade de 5% a 10% aos canaviais. A primeira tentativa da</p><p>Syngenta falhou. Entretanto, tal fato foi acompanhado diretamente</p><p>pela BASF, que em junho de 2013 acabou por lançar a sua versão</p><p>da tecnologia de mudas pré-brotadas (MPB), denominada de</p><p>AgMusa, e que já rendeu sete patentes à matriz. No seu portfólio de</p><p>parcerias, a BASF realizou um acordo com o grupo Odebrecht</p><p>Agroindustrial que gerencia uma área própria de 400 mil hectares de</p><p>cana-de-açúcar52.</p><p>Atualmente a Syngenta tenta introduzir uma nova versão de seu</p><p>produto, o novo Plene, através de tecnologia realizada com a</p><p>canadense New Energy Farms. Em seu portfólio constam ainda o</p><p>Plene Evolve e o PB, ambos destinados à formação de viveiros e o</p><p>último também direcionado ao preenchimento de falhas nos</p><p>canaviais53. Na busca pelo aumento da produtividade através de</p><p>novas técnicas de plantio, o CTC, busca oferecer uma alternativa</p><p>que pode no futuro ser a versão mais factível economicamente. A</p><p>busca ambiciosa dos pesquisadores do centro é oferecer uma</p><p>semente de cana-de-açúcar, com perspectivas de lançamento</p><p>comercial entre 2017 e 2018, cujo processo de desenvolvimento</p><p>encontra-se sob segredo industrial. Segundo o diretor do CTC,</p><p>atualmente uma usina leva 3 meses para fazer o plantio de sua área</p><p>anual. Com o desenvolvimento da semente, esse trabalho seria</p><p>realizado em 20 dias54.</p><p>8.7 Considerações finais</p><p>O texto procurou</p><p>demonstrar que o recente ciclo de crescimento</p><p>do setor sucroalcooleiro sofreu uma séria reversão a partir da crise</p><p>financeira internacional de 2008. A situação foi agravada não</p><p>somente pelos problemas dos mercados internacionais, mas</p><p>também pela falta de definições governamentais quanto ao papel do</p><p>etanol na Matriz Energética Nacional. A rapidez com que o setor</p><p>passou de euforia para crise, com desativação de dezenas de</p><p>empresas nos últimos anos, demonstra também a falta de uma</p><p>estratégia setorial de longo prazo. Esses problemas se refletiram</p><p>diretamente no mercado de trabalho com a redução de postos na</p><p>área agrícola, que já vinha em uma tendência de queda devido à</p><p>redução do corte manual, e também na área industrial.</p><p>A vulnerabilidade climática também chama a atenção, tendo em</p><p>vista os impactos negativos de climas adversos em duas safras</p><p>recentes e a expansão da cana-de-açúcar para áreas com solos</p><p>arenosos e menos férteis. Essa vulnerabilidade sinaliza para a</p><p>necessidade urgente de colocar no mercado novas variedades de</p><p>cana-de-açúcar com maior resistência à deficiência hídrica. A área</p><p>de tecnologia agronômica também está sendo chamada a introduzir</p><p>rapidamente variedades e práticas agrícolas que possam aumentar</p><p>rapidamente o rendimento da cana-de-açúcar e, ao mesmo tempo,</p><p>produzir maior quantidade de palha visando à geração de energia</p><p>elétrica ou mesmo à sua conversão em etanol.</p><p>Nesse particular, observam-se inúmeras oportunidades para o</p><p>setor sucroenergético provenientes de novas tecnologias de</p><p>conversão do material lignocelulósico, seja em E2G, seja em</p><p>farneseno. O adensamento da cadeia produtiva do setor</p><p>sucroenergético prossegue também com o desenvolvimento das</p><p>biorrefinarias, que irão incrementar a receita das empresas com</p><p>produtos similares aos da petroquímica. Entretanto, a crise setorial</p><p>impede que investimentos de médio e longo prazo sejam realizados,</p><p>o que poderá beneficiar outros países que já estão na fronteira</p><p>tecnológica.</p><p>Referências bibliográficas</p><p>AMARAL, E. F. A aptidão dos solos do Acre para cultivo de cana-de-</p><p>açúcar (Saccharum officinarum L.) no estado do Acre. Rio Branco,</p><p>Embrapa – Comunicado Técnico, n. 143, dez. 2001, pp. 1-6.</p><p>“AMYRIS reduz custo de produção, mas valor ainda está US$ 1,00</p><p>acima da meta”. novaCana.com, Curitiba, 11 nov. 2013. Disponível</p><p>em: <http://www.novacana.com/n/etanol/2-geracaocelulose/amyris-</p><p>reduz-custo-producao-valor-ainda-acima-meta-111113/>; acesso em:</p><p>28/8/2014.</p><p>BATISTA, F. “São Paulo atinge mecanização de 83% da colheita da</p><p>cana”. Valor Econômico, São Paulo, 18 mai. 2014a. Disponível em:</p><p><http://www.valor.com.br/agro/3553340/sao-paulo-atinge-</p><p>mecanizacao-de-83-da-colheita-da-cana-em-</p><p>201314#ixzz3BfBuB8pQ>; acesso em: 28/8/2014.</p><p>______. “Fim do corte manual extinguiu 87 mil vagas”. Valor</p><p>Econômico, São Paulo, 18 set. 2014b. Disponível em:</p><p><http://www.valor.com.br/agro/3700618/fim-do-corte-manual-</p><p>extinguiu-87--mil-vagas>; acesso em: 18/9/2014.</p><p>BATISTA, F. & CAETANO, M. “CTC na dianteira das pesquisas de</p><p>uma semente para a cultura”. Valor Econômico, São Paulo, 26 ago.</p><p>2014a. Disponível em: <http://www.valor.com.br/agro/3667334/ctc-</p><p>na-dianteira-das-pesquisas-de-uma-semente-para-cultura>; acesso</p><p>em: 26/8/2014.</p><p>______. “Novas tecnologias buscam modernizar o plantio de cana”.</p><p>Valor Econômico, São Paulo, 26 ago. 2014b. Disponível em:</p><p><http://www.valor.com.br/agro/3667332/novas-tecnologias-buscam-</p><p>modernizar-o-plantio-de-cana>; acesso em: 26/8/2014.</p><p>BRASIL. MME – Ministério de Minas e Energia. NR 31. “Norma</p><p>regulamentadora de segurança e saúde no trabalho na Agricultura,</p><p>http://novacana.com/</p><p>http://www.novacana.com/n/etanol/2-geracaocelulose/amyris-reduz-custo-producao-valor-ainda-acima-meta-111113/</p><p>http://www.valor.com.br/agro/3553340/sao-paulo-atinge-mecanizacao-de-83-da-colheita-da-cana-em-201314#ixzz3BfBuB8pQ</p><p>http://www.valor.com.br/agro/3700618/fim-do-corte-manual-extinguiu-87--mil-vagas</p><p>http://www.valor.com.br/agro/3667334/ctc-na-dianteira-das-pesquisas-de-uma-semente-para-cultura</p><p>http://www.valor.com.br/agro/3667332/novas-tecnologias-buscam-modernizar-o-plantio-de-cana</p><p>pecuária silvicultura, exploração florestal e Aquicultura”. Portaria n.</p><p>86, de 03/03/05 – Diário Oficial da União (DOU) de 04 de mar. de</p><p>2005.</p><p>______. Balanço energético nacional. Brasília, 2013. Disponível em:</p><p><https://ben.epe.gov.br/downloads/Relatorio_Final_BEN_2013.pdf>.</p><p>COPERSUCAR. Recomendação de adubação para a cultura de</p><p>cana-de-açúcar. Piracicaba, CTC, 1988.</p><p>IPCC. “Managing the Risks of Extreme Events and Disasters to</p><p>Advance Climate Change Adaptation”. In: A Special Report of</p><p>Working Groups I and II of the Intergovernmental Panel on Climate</p><p>Change. [FIELD, C. B. et al. (eds.)]. Cambridge and New York,</p><p>Cambridge University Press, 2012.</p><p>IPCC. “Summary for Policymakers”. In: Climate Change 2013: The</p><p>Physical Science Basis. Contribution of Working Group I to the Fifth</p><p>Assessment Report of the Intergovernmental Panel on Climate</p><p>Change. [STOCKER, T. F. et al. (eds.)]. Cambridge and New York,</p><p>Cambridge University Press, 2013.</p><p>MACEDO JÚNIOR, C. Agrupamento de modelos de mudanças</p><p>climáticas e geração de cenários de impactos na agricultura.</p><p>Campinas, Faculdade de Engenharia Agrícola, Unicamp, 2011</p><p>(Dissertação de Mestrado).</p><p>MORAES, M. A. F. 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Disponível</p><p>em: <http://www.teses.usp.br/teses/disponiveis/11/11132/tde-</p><p>26082013-135850/>; acesso em: 28/8/2014.</p><p>SOUZA, L. G. A. et al. “Inserção brasileira na rede de colaboração</p><p>científica internacional em etanol lignocelulósico”. Revista Brasileira</p><p>de Inovação, 2014 (em processo de submissão).</p><p>VIAN, C. E. F. Complexo Agroindustrial Canavieiro – Análise do</p><p>Processo de evolução e consolidação tecnológica de 1930 a 2000:</p><p>Implicações para a estruturação e dinâmica dos Campos</p><p>Organizacionais no Complexo Agroindustrial Canavieiro. Série</p><p>Pesquisa, n. 58. Departamento de Economia, Administração e</p><p>Sociologia. Piracicaba, Esalq/USP, 2006.</p><p>http://www.teses.usp.br/teses/disponiveis/11/11132/tde-26082013-135850/</p><p>WESZ JÚNIOR, V. J. Dinâmicas e estratégias das agroindústrias de</p><p>soja no Brasil. Rio de Janeiro, E-papers, 2011.</p><p>WORLD BANK. Commodity Markets Outlook – Global Economic</p><p>Prospects. Report. July 2014. Disponível em:</p><p><http://www.worldbank.org/content/dam/Worldbank/GEP/GEPcommo</p><p>dities/commodity_markets_outlook_2014_july.pdf>.</p><p>ZULLO JUNIOR, J.; PINTO, H. S. & ASSAD, E. D. “Impact</p><p>Assessment Study of Climate Change on Agricultural Zoning”.</p><p>Meteorological Applications, vol. 13, 2006, pp.69-80.</p><p>http://www.worldbank.org/content/dam/Worldbank/GEP/GEPcommodities/commodity_markets_outlook_2014_july.pdf</p><p>9. Uma análise sobre a expansão recente e a</p><p>ocupação de novas áreas pela produção de</p><p>cana-de-açúcar no centro-oeste1</p><p>Vivian Helena Capacle Correa, Walter Belik</p><p>Processo Fapesp 2008/58160-5</p><p>9.1 Introdução</p><p>No movimento historicamente conhecido por “Marcha para o Oeste” dos anos 1970, a região</p><p>Centro-Oeste do país se constituiu em um caso típico de região de fronteira, recebendo e</p><p>consolidando uma produção agroindustrial que foi impulsionada pela atuação do Estado na</p><p>implantação de políticas para a agricultura. Em razão dos estímulos governamentais e do baixo</p><p>preço das terras, várias produções avançaram para essa região, como a soja, a pecuária bovina</p><p>e, mais recentemente, a cana-de-açúcar.</p><p>Ao longo dos anos, tem-se observado que o sucesso do crescimento do setor agropecuário</p><p>nessa região se deve à forma extensiva de produção e de ocupação de novas áreas, e esse</p><p>padrão tem contribuído muito mais para o crescimento das produções agrícolas do que para os</p><p>ganhos de rendimento. A produção de cana-de-açúcar também tem avançado para o Centro-</p><p>Oeste, principalmente nos estados de Mato Grosso do Sul e Goiás, limítrofes ao estado de São</p><p>Paulo, tradicional na cultura canavieira, mantendo o mesmo padrão de crescimento que se</p><p>observa nas outras culturas agropecuárias. Ainda assim, essa cultura avança para essa região</p><p>mantendo intrínseca em seu crescimento a incorporação de novas terras, na forma de</p><p>acumulação de propriedades em que é possível a perpetuação das estruturas produtivas e do</p><p>poder, o que mantém a marca da história brasileira: a modernização conservadora.</p><p>O ponto observado neste trabalho é que o padrão expansivo e itinerante da produção</p><p>agropecuária no Centro-Oeste causou e tem causado danos aos ecossistemas presentes na</p><p>região, como o Cerrado, o Pantanal e uma parte da floresta Amazônica. Isso porque as</p><p>monoculturas dominantes crescem pela ocupação de novas áreas e empurram outras culturas</p><p>para áreas mais remotas e mais baratas.</p><p>Assim sendo, a expansão da cana-de-açúcar no Centro-Oeste também está interligada à</p><p>ocupação de novas áreas pelas produções de soja e pecuária bovina, pois no movimento de</p><p>expansão essa produção ocupa áreas que antes eram destinadas aos pastos e às outras culturas,</p><p>muitas das quais, são eliminadas da esfera de produção. Ao ocupar áreas de pasto, por exemplo,</p><p>a produção de cana-de-açúcar empurra a atividade pecuarista para áreas mais ao norte do país,</p><p>onde ser observam desmatamentos e pouca atenção à questão ambiental.</p><p>De modo geral, este capítulo analisa a expansão da produção canavieira no Centro-Oeste do</p><p>país, o qual se configura na nova fronteira agrícola sucroalcooleira. Destaca-se que essa análise</p><p>faz parte de um estudo mais abrangente que analisou também o crescimento e a dinâmica</p><p>expansiva de ocupação de novas áreas das produções de soja e pecuária bovina no Centro-</p><p>Oeste. Assim, parte das constatações sobre essas culturas são apresentadas neste capítulo. O</p><p>estudo também analisou os efeitos ambientais de desmatamento que o padrão de crescimento</p><p>dessas produções, via a incorporação de novas áreas, tem causado aos biomas da região.</p><p>As análises e conclusões apresentadas neste capítulo, no que se refere à produção de cana-</p><p>de-açúcar, estão relacionadas aos trabalhos realizados pelo Projeto AlcSens, que visou ao estudo</p><p>e à adaptação dessa produção às mudanças climáticas.</p><p>9.2 O padrão expansivo da produção agropecuária no</p><p>Centro-Oeste e a evolução da produção de cana-de-</p><p>açúcar</p><p>No Brasil, a agricultura expansiva e itinerante esteve presente na formação da economia desde</p><p>o período colonial, como apresentado por Celso Furtado2. Entretanto, se naquele momento o</p><p>deslocamento da população animal era consequente do regime de águas e da distância dos</p><p>mercados consumidores, hoje ele se deve à valorização das terras agricultáveis e à necessidade</p><p>de ampliar a produção pelo aumento da área.</p><p>Ruy Miller Paiva, em suas discussões dos anos 1950 e 1960 sobre a agricultura brasileira,</p><p>mostra que essa agricultura mantém intacta sua característica itinerante e o seu padrão extensivo,</p><p>mesmo que se possa considerá-la moderna3.</p><p>Entre os anos 1960 e 1970, a agricultura brasileira era itinerante e caracterizava-se pela</p><p>retirada de matas para o uso da fertilidade natural dos solos até o seu esgotamento, quando</p><p>então era substituída por pasto para posterior abandono e busca por terras virgens. O limite dessa</p><p>agricultura estava na indisponibilidade de novas frentes para a expansão e não se dispunha de</p><p>terras novas e férteis mesmo nas áreas limítrofes ao estado de São Paulo.</p><p>Embora modernizada, a agropecuária brasileira manteve sua característica de atividade</p><p>itinerante, visto que, enquanto houve queda de áreas de lavouras no Sul, Nordeste e Sudeste do</p><p>país, a recuperação no triênio 1995-1997 esteve centrada na ocupação de terras do Cerrado em</p><p>substituição às culturas das decadentes áreas antigas. Nesse contexto, muitos produtores</p><p>(gaúchos, catarinenses e paranaenses) migraram para o Centro-Oeste por causa de atrativos à</p><p>ocupação com base na produção pecuária e de grãos.</p><p>Ainda hoje, passados mais de 40 anos, a agropecuária brasileira no Centro-Oeste mantém o</p><p>mesmo padrão de produção, pois continua presente o modelo extensivo e expansivo. A pecuária</p><p>bovina, ao ser substituída pelas monoculturas dominantes, soja, cana-de-açúcar e milho, avança</p><p>para áreas mais ao norte do país.</p><p>As políticas públicas de desenvolvimento e de ocupação das regiões Centro-Norte do país</p><p>promoveram o movimento de expansão da fronteira agrícola, que esteve centrado na ocupação</p><p>de novas áreas através do desmatamento e na figura dos complexos produtivos empresariais.</p><p>Assim, se a expansão da produção na área de fronteira agrícola foi estimulada por políticas</p><p>públicas, a ocupação de áreas através do desmatamento esteve inserida nesse contexto. Naquele</p><p>momento, ou se desconheciam as causas da ocupação expansiva e itinerante sobre os</p><p>ecossistemas ou foram relegadas em função do projeto maior de ocupação do território nacional.</p><p>Nesse contexto, mais recentemente, quando se analisa a evolução da área colhida dos</p><p>principais grãos, do algodão e da cana-de-açúcar na região Centro-Oeste do país, verifica-se que</p><p>a cultura canavieira foi a que mais se expandiu em área ao longo do período de 1985 a 2006. A</p><p>taxa de crescimento anual da área colhida com essa cultura foi de 7,47% ao ano, enquanto o</p><p>crescimento do rendimento foi de apenas de 1,04%, como mostra a Tabela 9.1.</p><p>Tabela 9.1 – Taxa anual da área colhida (ha) e rendimento (t/ha) dos principais grãos, algodão e</p><p>cana-de-açúcar na região Centro-Oeste e seus estados, 1985 e 2006</p><p>Culturas Brasil Centro-Oeste</p><p>1985 2006 Taxa 1985 2006 Taxa</p><p>Área Rtos Área Rtos Área Rtos Área Rtos Área Rtos Área Rtos</p><p>Algodão 2.048.772 1,06 859.042 2,9 -4,1 4,9 119.280 1,68 529.688 2,93 7,4 2,7</p><p>Arroz 5.173.330 0,17 2.417.664 4,01 -3,6 16,2 1.367.687 1,19 213.625 2,49 -8,5 3,6</p><p>Cana-</p><p>de-</p><p>açúcar</p><p>3.798.117 60,53 5.682.376 71,71 1,9 0,8 139.827 57,1 634.936 70,98 7,5 1,0</p><p>Feijão 5.928.033 0,38 2.189.850 1,41 -4,6 6,4 352.354 0,42 13.500 13,34 -14,4 17,9</p><p>Milho 12.040.441 1,48 11.604.043 3,57 -0,2 4,3 1.064.704 1,89 2.387.243 3,92 3,9 3,5</p><p>Soja 9.434.686 1,77 17.883.318 2,58 3,1 1,8 2.418.001 1,92 7.730.388 2,75 5,7 1,7</p><p>Trigo 2.518.086 1,52 1.298.422 1,72 -3,1 0,6 154.364 1,55 31.897 2,03 -7,2 1,3</p><p>Culturas Mato Grosso Mato Grosso do Sul</p><p>1985 2006 Taxa 1985 2006 Taxa</p><p>Área Rtos Área Rtos Área Rtos Área Rtos Área Rtos Área Rtos</p><p>Algodão 11.978 1,00 448.120 2,94 18,8 5,3 90.479 1,00 24.308 2,82 -6,1 5,1</p><p>Arroz 446.846 1,36 143.008 2,27 -5,3 2,5 219.533 1,07 20.794 4,54 -10,6 7,1</p><p>Cana-</p><p>de-</p><p>açúcar</p><p>19.051 57,02 215.864 68,11 12,3 0,8 43.246 56,75 155.399 72,42 6,3 1,2</p><p>Feijão 42.051 0,53 5.478 5,07 -9,2 11,4 42.841 0,57 1.381 10,29</p><p>-15,1 14,8</p><p>Milho 157.444 1,52 1.123.926 3,67 9,8 4,3 159.985 1,59 620.126 3,51 6,7 3,8</p><p>Soja 822.821 1,96 4.186.477 2,81 8,1 1,7 958.568 1,89 1.464.397 2,64 2,0 1,6</p><p>Trigo 197 1,83 255 2,45 1,2 1,4 153.661 1,55 25.906 1,66 -8,1 0,3</p><p>Culturas Goiás</p><p>1985 2006 Taxa</p><p>Área Rtos Área Rtos Área Rtos</p><p>Algodão 98.002 1,00 55.539 2,90 -2,7 5,2</p><p>Arroz 693.105 1,11 49.661 2,25 -11,8 3,4</p><p>Cana-de-açúcar 77.196 57,5 263.342 72,54 6,0 1,1</p><p>Feijão 265.727 0,38 5.526 19,77 -16,8 20,7</p><p>Milho 741.840 2,03 623.156 4,73 -0,8 4,1</p><p>Soja 599.555 1,93 2.037.566 2,71 6,0 1,6</p><p>Trigo 395 1,08 5.004 3,44 12,9 5,7</p><p>Fonte: Elaboração dos autores com dados do Censo Agropecuário. 4</p><p>Dentre os três estados da região Centro-Oeste, Mato Grosso foi o que apresentou as maiores</p><p>taxas anuais de crescimento da área colhida com as culturas de cana-de-açúcar, algodão, milho e</p><p>soja. Essas três últimas culturas se intercalam entre as safras e isso explica o crescimento de</p><p>área colhida para todas elas no mesmo período. Em contrapartida, a cana-de-açúcar foi a cultura</p><p>que apresentou a menor taxa anual de crescimento do rendimento, que foi de 0,85% seguida pela</p><p>de soja que foi de 1,73%, o que evidencia o crescimento via a incorporação de áreas.</p><p>As culturas de arroz, feijão e trigo tiveram redução da área plantada ao longo dos anos e</p><p>apresentaram crescimento do rendimento, o que indica uma intensificação da produção em razão</p><p>da perda de área, em favor das culturas em expansão: cana-de-açúcar e soja. Nos três estados</p><p>do Centro-Oeste houve aumento da taxa anual de rendimento para as culturas de arroz e feijão e</p><p>uma queda significativa da área colhida, que chegou acima dos 10% nos estados de Mato Grosso</p><p>do Sul e Goiás. Enquanto que no ano de 1985 a área colhida com arroz e feijão em Mato Grosso</p><p>do Sul foi de, respectivamente, 219.533 hectares e de 42.841 hectares, no ano de 2006 a área</p><p>caiu para 20.794 e para apenas 1.381 hectares, respectivamente.</p><p>Tem se observado, portanto, através dos dados da Tabela 9.1, que as culturas de cana-de-</p><p>açúcar e soja têm apresentado uma taxa anual de crescimento da área colhida significativa nos</p><p>estados do Centro-Oeste. Apesar de terem apresentado uma evolução positiva do rendimento no</p><p>período analisado, essa evolução foi pouco significativa se comparada com a evolução da taxa de</p><p>crescimento da área colhida.</p><p>Enquanto as culturas em expansão na fronteira agrícola tiveram crescimento da área colhida</p><p>entre os anos analisados, as culturas de arroz e feijão, por exemplo, apresentaram queda</p><p>expressiva nesse indicador o que demonstra, portanto, a dinâmica expansiva em área, das</p><p>monoculturas dominantes, em substituição às culturas tradicionais.</p><p>Na análise dos Censos Agropecuários, Gasques et al.5 revelam que o traço mais relevante da</p><p>utilização das terras pela agropecuária brasileira é o peso da proporção do uso das pastagens</p><p>sobre as áreas dos estabelecimentos, a qual tem se mantido entre 40% e 50% ao longo dos anos.</p><p>Em segundo lugar, está o uso de áreas de matas que representaram cerca de 30% da área</p><p>utilizada no país no ano de 2006. Os números mostram que as áreas de pasto e de mata têm se</p><p>destacado, quando se analisa a utilização da terra nos estabelecimentos agropecuários, o que</p><p>demonstra o caminho do crescimento do setor pela via da expansão em áreas.</p><p>A fim de aperfeiçoar a constatação de redução de áreas de pastagens e de matas na Região,</p><p>bem como visualizar a alteração total da área agricultável de uma determinada atividade,</p><p>utilizaram-se os modelos Efeito Escala (EE) e Efeito-Substituição (ES), a partir de dados de área</p><p>plantada dos Censos Agropecuários de 1995 e 20066.</p><p>Para o cálculo através do modelo EE e ES, supõem-se que ATo e ATt sejam as áreas totais</p><p>ocupadas com as n atividades agropecuárias de uma região nos anos 0 e t, respectivamente. A</p><p>relação entre esses valores é chamada de ∂T</p><p>t, que representa o coeficiente de modificação do</p><p>tamanho do conjunto das atividades agropecuárias, portanto, para o cálculo do Efeito-Escala (EE)</p><p>e o Efeito-Substituição (ES), tem-se que:</p><p>Onde: Ai0 é a área da cultura i no ano inicial;</p><p>Ait é a área da cultura i no ano final.</p><p>Pelos resultados obtidos (Tabela 9.2), observa-se que, entre os anos de 1995 e 2006, algumas</p><p>culturas na região Centro-Oeste apresentaram ganhos de área, que foi captado pelo EE. Esse</p><p>indicador mostra a variação na área de uma atividade apenas pela alteração do tamanho do</p><p>sistema, mantendo inalterada sua participação dentro dele. Através do ES foi possível observar a</p><p>variação da participação relativa de cada atividade dentro do sistema, pois um ES positivo indica</p><p>que a atividade apresentou uma expansão da área, substituindo outra atividade, e um ES</p><p>negativo indica que houve substituição dessa atividade por outra.</p><p>Tabela 9.2 – Efeito Escala e Efeito Substituição das principais atividades</p><p>agropecuárias no Centro-Oeste no período de 1995-2006</p><p>Atividade Centro-Oeste 1995-2006</p><p>Efeito Escala Efeito Substituição</p><p>Algodão Herbáceo 8.108 279.247</p><p>Alho 61 - 396</p><p>Pastagem Natural 695.138 - 4.407.589</p><p>Pastagem Plantada 1.806.036 - 2.339.281</p><p>Arroz 31.316 - 369.895</p><p>Cana 11.539 291.926</p><p>Feijão 8.681 - 6.808</p><p>Girassol - 46.307</p><p>Milho 73.790 538.298</p><p>Soja 181.481 5.543.067</p><p>Sorgo 2.180 355.456</p><p>Tomate 210 4.911</p><p>Borracha 840 4.382</p><p>Palmito - 2.107</p><p>Outras 8.515 58.267</p><p>Fonte: Elaboração dos autores com dados do IBGE – Produção Agrícola Municipal7 e Censo</p><p>Agropecuário8.</p><p>A cultura de soja foi a atividade que mais área substituiu no Centro-Oeste, seguida pela cultura</p><p>de milho, arroz, sorgo e cana-de-açúcar. Essas atividades que expandiram relativamente suas</p><p>áreas substituíram, numa mesma proporção, aquelas atividades que foram substituídas, com</p><p>destaque para pastagem natural, cujo resultado foi de – 4.407.589 hectares.</p><p>Ainda assim, as culturas de arroz e feijão, além das áreas de pastagem natural e plantada,</p><p>tiveram suas áreas substituídas. Entre os anos de 1995 e 2006, cerca de 370 mil hectares que</p><p>eram cultivados com arroz foram substituídos por outra cultura, e o feijão deixou de ser produzido</p><p>em cerca de 7 mil hectares.</p><p>É possível observar a partir dessa análise que a expansão ou a retração de algumas atividades</p><p>agropecuárias no Centro-Oeste reconfigurou o espaço e a dinâmica da produção na região.</p><p>Quando se analisam os dados agregados, observa-se que a produção agropecuária no Centro-</p><p>Oeste mantém elevados índices de rendimento e de produtividade. A cana-de-açúcar, assim</p><p>como a produção de soja, está presente no país e na nova fronteira agrícola com altos índices de</p><p>produtividade, mas com o predomínio da incorporação crescente de novas áreas9.</p><p>Os avanços tecnológicos que visavam à alteração de um sistema extensivo para intensivo,</p><p>possibilitaram muitas mudanças no sistema agropecuário brasileiro, mas, no caso da cana-de-</p><p>açúcar, por exemplo, não se tem observado alteração do modo de produção, pois ainda há um</p><p>predomínio da incorporação de novas áreas e de um sistema extensivo de produção.</p><p>As análises de Contribuição de Área (CA) e Contribuição do Rendimento (CR) para o aumento</p><p>da produção, conforme apresentado por Vera Filho e Tollini10, mostram que na Região Centro-</p><p>Oeste o crescimento da produção de cana-de-açúcar tem se apoiado em área e não em</p><p>rendimento, como mostra a Tabela 9.3.</p><p>Tabela 9.3 – Contribuição percentual da área e do rendimento para o aumento</p><p>da produção de cana-de-açúcar na região Centro-Oeste e estados, 1990-2009</p><p>Contribuição de área Contribuição de rendimento</p><p>Brasil 65,98 34,02</p><p>Centro-Oeste 77,36 22,64</p><p>Mato Grosso do Sul 67,99 32,01</p><p>Mato Grosso 81,35 18,65</p><p>Goiás 81,41 18,59</p><p>Fonte: Elaboração dos autores com dados do IBGE – Produção Agrícola Municipal11.</p><p>Essas análises podem ser calculadas a partir do seguinte modelo:</p><p>CA = (At - A0) R0 (Pt - P0)-1 100 e CR = 100 - CA; Onde:</p><p>At = média anual da área plantada nos quatro últimos anos da série; A0 = média anual da área</p><p>plantada nos quatro primeiros anos da série; R0 = rendimento médio durante os quatro primeiros</p><p>anos da série; Pt = produção média nos quatro últimos anos da série; P0 = produção média</p><p>a ocorrência de pragas ou doenças e</p><p>demandando medidas de controle adequadas.</p><p>O oferecimento de informações meteorológicas confiáveis,</p><p>customizadas às necessidades da agricultura, possibilita ajustes de</p><p>curto prazo em operações do dia a dia de forma a minimizar perdas,</p><p>aumentar o rendimento da produção e a qualidade dos produtos</p><p>finais4. Informações meteorológicas customizadas apoiam também o</p><p>planejamento de longo prazo, orientando a tomada de decisões</p><p>relativas a aspectos sazonais da produção, à seleção de cultivares</p><p>mais adequadas às características climáticas de uma dada região,</p><p>bem como à definição de políticas agrícolas.</p><p>A Agrometeorologia é um ramo aplicado da meteorologia que</p><p>relaciona as condições atmosféricas e suas consequências para o</p><p>ambiente rural5.</p><p>Algumas aplicações da agrometeorologia envolvem a melhoria de</p><p>técnicas relacionadas à interpretação de conhecimento</p><p>meteorológico, como o desenvolvimento de modelos</p><p>agrometeorológicos que possibilitem um eficiente planejamento do</p><p>uso da terra. Algumas áreas de estudo que vêm sendo</p><p>desenvolvidas nesse campo são: quantificação das relações entre</p><p>produção e condições do clima; estudos relacionados a balanço de</p><p>energia e evapotranspiração; estudos biológicos em condições</p><p>controladas de clima, modelagem da resposta de animais e plantas</p><p>ao clima; sensoriamento remoto aplicado ao ambiente e à vegetação;</p><p>criação de séries históricas relacionadas a rendimentos de safra,</p><p>mudanças climáticas e seus impactos; e, finalmente, a aplicação de</p><p>informações meteorológicas à agricultura6.</p><p>O desenvolvimento de bases de dados meteorológicos</p><p>organizadas e confiáveis é essencial para o desenvolvimento de</p><p>estudos e pesquisas em agrometeorologia, visando aumentar a base</p><p>de conhecimento disponível com o intuito de prover soluções para os</p><p>problemas enfrentados pela agricultura.</p><p>Muitos países, assim como o Brasil, vêm desenvolvendo</p><p>programas para apoiar o desenvolvimento de serviços</p><p>agrometeorológicos. As principais dificuldades desses programas</p><p>são: 1) coordenação entre as atividades de diversas agências que</p><p>atuam na área de meteorologia em cada país e 2) a possibilidade de</p><p>oferecer um serviço que possa ser acessado diretamente pelos</p><p>produtores agrícolas7.</p><p>Esse cenário não é diferente no Brasil, onde dados meteorológicos</p><p>são coletados por diferentes órgãos governamentais ligados ao</p><p>Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento (Mapa), ao</p><p>Ministério da Ciência, Tecnologia e Inovação (MCTI), à Aeronáutica e</p><p>à Marinha, entre outros órgãos. Tendo em vista a relevância em</p><p>oferecer informações antecipadas sobre condições do tempo e clima</p><p>tanto aos produtores quanto aos gestores públicos brasileiros, uma</p><p>ação de coordenação entre diferentes atores foi desenvolvida para</p><p>criar uma base de dados meteorológicos com cobertura para todo o</p><p>território nacional.</p><p>A aplicação desse conjunto de dados meteorológicos, associada</p><p>às informações sobre os requerimentos hídricos e de temperatura de</p><p>cada cultivo, e o desenvolvimento de estudos agrometeorológicos</p><p>utilizando modelos matemáticos e probabilísticos permitiram a</p><p>implantação da política agrícola “Zoneamento Agrícola de Risco</p><p>Climático” (ZARC).</p><p>Essa política indica o que, onde e quando plantar considerando</p><p>uma exposição reduzida aos riscos climáticos, visando atingir 80%</p><p>de chance de sucesso no plantio. As recomendações do ZARC</p><p>visam reduzir perdas e aumentar a produtividade8. Além disso, o</p><p>ZARC vem atuando de forma associada ao programa público de</p><p>seguro rural, tornando-o viável e sustentável do ponto de vista</p><p>financeiro.</p><p>Tendo em vista que a elaboração do ZARC requer valores de</p><p>séries históricas de dados climáticos o mais completa possível (com</p><p>pelo menos 30 anos), passou a existir uma demanda por manter e</p><p>atualizar uma base de dados meteorológicos confiável e completa.</p><p>Dessa forma, o Agritempo teve e tem um importante papel no</p><p>sentido de organizar e fortalecer uma base de dados climáticos com</p><p>o maior número possível de estações meteorológicas em todo o</p><p>território nacional. Além dos dados meteorológicos de chuva,</p><p>temperatura e umidade, estão armazenados nesse sistema os dados</p><p>provenientes de cálculos de métodos agrometeorológicos que são</p><p>usados para geração de mapas, gráficos e boletins. O sistema gera,</p><p>diariamente, mapas referentes a variáveis como estiagem,</p><p>evapotranspiração, dias com chuva para todo o país, entre outras.</p><p>Este capítulo apresenta um estudo descritivo e analítico do</p><p>Sistema de Monitoramento Agrometeorológico (Agritempo),</p><p>descrevendo as estratégias desenvolvidas por este sistema no</p><p>sentido de organizar dados e apresentar informações meteorológicas</p><p>para uso do setor agrícola.</p><p>O capítulo se organiza em quatro seções. A primeira delas</p><p>apresenta conceitos básicos sobre meteorologia e inovações nesse</p><p>campo, buscando proporcionar ao leitor a compreensão e</p><p>entendimento de importantes conceitos que serão encontrados ao</p><p>longo desta obra; a segunda seção descreve a metodologia</p><p>empregada no estudo; a terceira apresenta a experiência de</p><p>desenvolvimento do sistema web Agritempo e os resultados obtidos</p><p>através dessa ação; a última seção apresenta as conclusões e</p><p>considerações finais.</p><p>1.3 Revisão de literatura</p><p>1.3.1 Conceitos básicos: Meteorologia &</p><p>agricultura</p><p>A meteorologia é uma ciência interdisciplinar que envolve a</p><p>observação das condições atmosféricas (temperatura, precipitação,</p><p>radiação, vento e outros) em um determinado instante e local. Essas</p><p>observações instantâneas são denominadas “tempo”. A previsão do</p><p>tempo é uma das aplicações da meteorologia, que possibilita</p><p>predizer a probabilidade de ocorrência do tempo atmosférico futuro e</p><p>obteve um grande avanço nas últimas décadas, principalmente com</p><p>o desenvolvimento tecnológico envolvendo a invenção e aplicação</p><p>de radares, satélites e supercomputadores.</p><p>No estudo da atmosfera, a meteorologia pode ser dividida em</p><p>diversas áreas de estudo, e uma delas, muito utilizada na agricultura,</p><p>é a climatologia. O clima se refere a um estudo sistêmico que define</p><p>o comportamento médio do tempo em uma dada região ao longo dos</p><p>meses do ano, baseado em uma análise estatística dos valores</p><p>médios e da variabilidade das condições atmosféricas no local9. A</p><p>World Meteorological Organization (WMO) recomenda que um</p><p>estudo climatológico analise dados referentes a um período mínimo</p><p>de 30 anos. As variáveis estudadas são, em geral, temperatura,</p><p>precipitação e velocidade dos ventos10.</p><p>A meteorologia, além de se relacionar ao planejamento da vida</p><p>diária dos indivíduos, oferece informações de interesse especial para</p><p>vários setores específicos de aplicação, como a área militar, o setor</p><p>de produção de energia, o setor de transportes, vendas, agricultura,</p><p>construção civil, entre outros. Da interação entre as ciências</p><p>agrícolas e a meteorologia, surgiu o campo da “meteorologia</p><p>agrícola” ou “agrometeorologia”.</p><p>A agrometeorologia tem um papel fundamental no planejamento e</p><p>na tomada de decisões agrícolas. Pode ser definida como a ciência</p><p>que investiga as condições meteorológicas, climatológicas e</p><p>hidrológicas essenciais à agricultura, a partir de sua interação com</p><p>os objetos e processos da produção agrícola11.</p><p>Caracterizando-se como uma ciência multidisciplinar por definição,</p><p>a agrometeorologia reúne uma série de conhecimentos necessários</p><p>à análise e ao entendimento das relações entre o ambiente físico e</p><p>as atividades agrícolas, bem como ao direcionamento de condições</p><p>de manejo adequadas12. Em suas várias formas, a agrometeorologia</p><p>vem apoiando o uso sustentável da terra, a fim de aumentar a</p><p>produção de alimentos e evitar o uso irreversível e abusivo dos</p><p>recursos ambientais13.</p><p>O desenvolvimento de estudos e pesquisas em agrometeorologia</p><p>depende do acesso a: bases de dados meteorológicos confiáveis;</p><p>conhecimentos sobre fenologia das plantas; características dos solos</p><p>das diferentes localidades estudadas; entre outras informações</p><p>agronômicas. De posse desses elementos, é possível desenvolver:</p><p>atividades operacionais; pesquisas relacionadas a modelos</p><p>agrometeorológicos; atividades</p><p>nos</p><p>quatro primeiros anos da série.</p><p>No estado de Goiás, por exemplo, maior produtor de cana-de-açúcar na região, a contribuição</p><p>da área para o crescimento da produção foi de 81% e o rendimento contribuiu com apenas</p><p>18,59%.</p><p>Isso mostra, portanto, que é pela incorporação de novas áreas que ocorre a expansão da cana-</p><p>de-açúcar na região, sendo baixos os índices da contribuição de rendimento, o que indica que a</p><p>eficiência na produção ainda se mantém baixa12.</p><p>Atualmente, a produção canavieira está em expansão no país e os estados de Goiás, Mato</p><p>Grosso do Sul e Minas Gerais são as novas fronteiras dessa produção. O estado de Goiás tem</p><p>apresentado a maior participação em área plantada no Centro-Oeste, pois no ano de 2009 a área</p><p>plantada com essa cultura foi de 524 mil hectares, seguido pelos estados de Mato Grosso do Sul</p><p>e Mato Grosso, que apresentaram 286 e 242 mil hectares plantados, respectivamente.</p><p>Em relação ao ecossistema da região, a cultura de cana-de-açúcar não considerou os fatores</p><p>essenciais para o seu desenvolvimento sustentável, pois a preocupação foi sempre aumentar a</p><p>produção a partir da expansão para novas áreas de plantio. Não sendo propícia a produção de</p><p>cana-de-açúcar na região da floresta, o argumento da crítica internacional à produção de etanol</p><p>brasileiro é que a expansão da produção canavieira empurra o gado para a Amazônia, sendo</p><p>essa a sua relação com o desmatamento nesse bioma.</p><p>Além de os estados de Goiás e Mato Grosso do Sul apresentarem grandes extensões de terras</p><p>favoráveis ao cultivo da cana-de-açúcar com preços mais baixos, eles são limítrofes ao estado de</p><p>São Paulo, principal produtor nacional, o que favorece ainda mais a expansão para essas novas</p><p>áreas. Em visita a uma das unidades do Grupo São Martinho, com a maior capacidade de</p><p>moagem de cana-de-açúcar do Brasil e do mundo, a usina Iracema no município de Iracemápolis-</p><p>SP, constatou-se que a instalação de usinas no estado de Goiás, a nova fronteira agrícola da</p><p>cana-de-açúcar, deve-se à necessidade de expansão da produção. Isso porque o estado de São</p><p>Paulo se encontra saturado e com áreas limitadas ao plantio, onde a especulação imobiliária tem</p><p>elevado demasiadamente o preço das terras, o que tem tornado irracional a manutenção de</p><p>grandes extensões para essa cultura. Já no estado de Goiás, além da vantagem do preço menor</p><p>das terras, é comum também o arrendamento de áreas de pequenas e médias propriedades,</p><p>antes destinadas às pastagens e produção de grãos13.</p><p>Nesse processo, pode-se observar que a posse de terras pelas usinas e grupos atuantes no</p><p>segmento de açúcar e etanol, para o cultivo da cana-de-açúcar, configura-se como reserva de</p><p>valor que alimenta o mercado de terras e a especulação imobiliária. Pode-se dizer, contudo, que é</p><p>inerente ao complexo canavieiro do país a expansão da produção pela incorporação de novas</p><p>áreas.</p><p>Nessa dinâmica, a produção canavieira na nova fronteira agrícola tem ocupado áreas, em</p><p>muitos casos, que antes eram destinadas à pecuária bovina. Assim sendo, a pecuária bovina não</p><p>é eliminada da esfera produtiva, pois está intrínseco também em sua dinâmica o movimento</p><p>itinerante de expansão. De acordo com um estudo realizado pelo Núcleo de Altos Estudos</p><p>Amazônicos da Universidade Federal do Pará14, a pecuária avança para áreas de floresta, sendo</p><p>seguida pela cultura da soja, e a correlação da pecuária com o desmatamento é de 80%.</p><p>Através da análise de dados do IBGE15 e do Mapa16, observa-se um deslocamento da pecuária</p><p>bovina para o Norte do país, pois, de 1990 a 2009, a expansão da atividade na região Norte</p><p>cresceu 204%. Enquanto em 1990 essa Região detinha 13 milhões de cabeças, em 2009 passou</p><p>a deter mais de 40 milhões de cabeças bovinas. Essa expansão pode estar relacionada à maior</p><p>dinâmica produtiva da agricultura na região Centro-Oeste, de expansão da fronteira agrícola que</p><p>empurrou a pecuária para outras áreas, bem como em razão de a região Norte exercer a</p><p>atividade pecuarista, pelo menos, desde os anos 1970, beneficiada pelos programas de</p><p>desenvolvimento regional, especialmente através do estabelecimento de pastagens cultivadas de</p><p>colonião e braquiária, como mostra o trabalho de Arruda17.</p><p>Destaca-se que a dinâmica da expansão das culturas dominantes do Centro-Oeste pode</p><p>explicar, em parte, o deslocamento da pecuária do estado de Mato Grosso para novas áreas,</p><p>principalmente, para o Norte do país. Isso porque essa atividade foi substituída pelas culturas de</p><p>soja e cana-de-açúcar ou houve degradação dos pastos nos estabelecimentos agropecuários, em</p><p>razão da ausência de um manejo sustentável dos solos.</p><p>Como demonstrado pela análise do Efeito Escala e Efeito Substituição, na Região Centro-Oeste</p><p>as áreas com pastagens plantada e natural têm sido substituídas por outras culturas. Portanto,</p><p>conclui-se que, com exceção do estado de Mato Grosso, que demanda áreas de pasto para o</p><p>crescimento da bovinocultura, nos estados de Goiás e Mato Grosso do Sul essas áreas de</p><p>pastagem estão sendo ocupadas pelas culturas em expansão, como é o caso da cultura de cana-</p><p>de-açúcar.</p><p>9.3 As causas ambientais de desmatamento</p><p>provocadas pela expansão das produções dominantes</p><p>no Centro-Oeste</p><p>Com atenção voltada às potencialidades do mercado nacional e internacional, o modelo</p><p>produtivo da agropecuária na região Centro-Oeste do país é baseado na ocupação do espaço de</p><p>forma a favorecer a produção em larga escala. Portanto, a exploração agrícola através da</p><p>remoção da vegetação natural e de áreas de floresta, tende a esgotar rapidamente a fertilidade</p><p>dos solos e, assim, levar a uma queda dos níveis de produção18. Há, dessa forma, um movimento</p><p>de busca por novas áreas pelo produtor e o abandono da área degradada por ser difícil e onerosa</p><p>a sua recuperação.</p><p>A remoção de áreas de floresta constituída pelo bioma Amazônia, presente na região, afeta a</p><p>função da floresta de regular o ciclo hidrológico por manter a distribuição relativamente</p><p>homogênea das chuvas e conferir estabilidade à vazão dos rios. Baer19 aponta que na região</p><p>Amazônica, onde está o norte do estado de Mato Grosso e o Pará, no ano de 1985, o total da</p><p>área desmatada foi de cerca de 304 mil km2, o que significa que até esse ano o desmatamento</p><p>para fins agrícolas na região foi responsável por 71% do total desmatado.</p><p>Ao contrário da Amazônia, a maior parte da biomassa do Cerrado é subterrânea e, assim, por</p><p>possuir uma vegetação menos exuberante, o seu potencial de biodiversidade é subestimado</p><p>pelas políticas públicas, a exemplo do Código Florestal, que determina que a área de reserva</p><p>legal em propriedades rurais no Cerrado deve ser de 35%, enquanto que na Amazônia é de 80%.</p><p>Apesar de ser um dos principais ecossistemas do país, o Cerrado brasileiro é a área que mais</p><p>sofre impactos com a expansão agropecuária e que tem sido considerada uma área que substitui</p><p>o desmatamento de extensões da floresta Amazônica. De acordo com Klink e Machado20, cerca</p><p>da metade dos 2 milhões de km2 originais do Cerrado são ocupados com pastagens plantadas,</p><p>culturas e outros usos, sendo que somente as pastagens ocupam mais de 40% do total da área,</p><p>enquanto que a agricultura ocupa 11,35%. Um estudo elaborado em 2002 através de imagens de</p><p>satélite apontou que 55% do Cerrado já foram desmatados ou transformados em outros usos.</p><p>No estado de Goiás, onde se observa a expansão da produção canavieira, muitos pecuaristas</p><p>migraram dali para terras mais baratas nos estados de Mato Grosso e Pará, sob o domínio do</p><p>bioma Amazônia, em favor da nova cultura em expansão. Assim sendo, a pecuária bovina se</p><p>desloca para o Norte do país, abrindo áreas para dar lugar à lucrativa expansão da cultura da</p><p>cana-de-açúcar, as quais futuramente poderão ser ocupadas pela monocultura da soja e outros</p><p>grãos.</p><p>De outro modo, muitos pecuaristas arrendam suas áreas de pasto degradado às lavouras com</p><p>vistas à recuperação dos solos, dado o elevado custo para recuperação desse pasto, conforme</p><p>apontou Luciano Vacari21, Superintendente da Associação dos Criadores de Mato Grosso</p><p>(Acrimat). Assim, muitas áreas propícias</p><p>à expansão da cultura de cana-de-açúcar no Centro-</p><p>Oeste são áreas de pasto degradado.</p><p>De modo geral, observa-se que a produção de cana-de-açúcar vai avançando para novas áreas</p><p>e empurra as outras culturas para áreas mais remotas e mais baratas, ao custo de constantes</p><p>supressões de vegetações e ecossistemas.</p><p>O desmatamento não atinge apenas áreas da Floresta Amazônica, pois é um elemento que</p><p>também afeta o Cerrado e o Pantanal. Isso porque, apesar da extensa biodiversidade que o</p><p>bioma Cerrado apresenta, apenas 2,2% de sua cobertura estão protegidas, de um total de</p><p>2.116.000 km2.</p><p>Destaca-se que os municípios responsáveis por 1/3 do desmatamento do Cerrado dos estados</p><p>de Goiás e Mato Grosso do Sul não estão entre os principais produtores de cana-de-açúcar, em</p><p>termos de área plantada. Entretanto, a área desmatada pode ter relação com a expansão da</p><p>lavoura e da pecuária bovina, por estar em municípios limítrofes aos principais produtores de</p><p>cana-de-açúcar, a qual, em sua dinâmica de expansão, tem empurrado diversas culturas para</p><p>outras áreas.</p><p>O bioma Pantanal, que totaliza 151.313 km2, apresentou uma área desmatada de 4.279 Km2 no</p><p>período 2002-2008, último ano com dados apresentados22. De todos os municípios no bioma</p><p>Pantanal, o que apresentou a maior área desmatada no período analisado foi Corumbá, seguido</p><p>por Aquidauana, em Mato Grosso do Sul, e Cáceres, no estado de Mato Grosso, o qual está entre</p><p>aqueles com maior efetivo bovino no estado. Ainda assim, entre os municípios do estado de Mato</p><p>Grosso do Sul que mais sofreram desmatamento no Pantanal no período 2002-2008, destaca-se</p><p>Sonora, que está entre os maiores produtores de cana-de-açúcar e cuja área desmatada foi de</p><p>22%.</p><p>Na análise sobre as áreas antropizadas dos municípios no bioma Pantanal que mais sofreram</p><p>desmatamento, não foram identificados tipologias e detalhamentos quanto ao uso dos solos e,</p><p>portanto, não se sabe exatamente qual é a atividade ou a ação que causou a supressão da</p><p>vegetação. Entretanto, ao considerar que a maior parte desses municípios são produtores de</p><p>cana-de-açúcar e de pecuária bovina e que a atividade agropecuária como um todo responde</p><p>também pela supressão da vegetação original do bioma, pode-se supor que parte do</p><p>desmatamento foi causada pela dinâmica expansiva e de ocupação de novas áreas dessas</p><p>produções.</p><p>Em relação ao bioma Amazônia, que está presente na área mais ao norte do estado de Mato</p><p>Grosso, da área total de 4.239.000 km2, apenas 5,7% estão em unidades de proteção.</p><p>O ponto a destacar é que parte do problema da não preservação dos recursos naturais deve-se</p><p>ao desconhecimento e às dificuldades em mensurar o valor dos recursos ambientais. Nas</p><p>propriedades agropecuárias, a terra florestada é entendida como um ativo e a decisão sobre o</p><p>seu uso está subordinada à opção que garante a maior lucratividade por hectare. Quando a</p><p>ocupação de novas áreas de floresta não é controlada e os direitos de propriedade não são</p><p>definidos, torna-se vantajoso desmatar essas áreas, já que a terra se converte em um ativo que</p><p>pode ser reposto ao portfólio com baixos custos.</p><p>É por isso que, para muitos produtores agrícolas e proprietários de terra para lavoura, as áreas</p><p>de reserva legal e de reserva indígena são vistas como um empecilho ao crescimento das</p><p>produções, pois são uma parte do ativo em que não é permitida a alteração de seu uso.</p><p>Nesse sentido, os programas de planejamento e ordenamento territorial, a exemplo dos</p><p>Zoneamentos Econômico-Ecológicos (ZEE), podem contribuir para a preservação dos biomas do</p><p>Centro-Oeste, já que são instrumentos públicos com o objetivo de estabelecer normas técnicas e</p><p>legais para o adequado uso e ocupação do território de forma sustentável.</p><p>No estado de Mato Grosso, a Comissão Coordenadora do Zoneamento Ecológico-Econômico</p><p>do Território Nacional, formada por membros de 14 ministérios, deu parecer contrário à Lei n.</p><p>9.523/2011, em 29 de março de 2012.</p><p>O estado de Goiás ainda não possui uma legislação sobre o ZEE e, em visita desse estado23,24,</p><p>constatou-se que o governo estadual e os governos municipais não têm qualquer preocupação</p><p>com a degradação ambiental que a expansão da cana-de-açúcar tem causado. Nesse estado</p><p>tem-se observado que não há qualquer planejamento sobre a expansão canavieira, apenas boas</p><p>intenções em gerar renda e crescimento econômico de imediato25.</p><p>Pode-se observar que, no município de Quirinópolis, em Goiás – o qual abriga aquela que será</p><p>a maior usina de etanol do mundo, a usina Nova Fronteira, joint venture com a Petrobrás e a</p><p>usina Boa Vista do Grupo São Martinho –, não há qualquer preocupação quanto à expansão da</p><p>produção de cana-de-açúcar, à ocupação de novas áreas e à substituição de culturas. Tampouco</p><p>o estado de Goiás apresenta qualquer discussão a respeito de um projeto de lei sobre o ZEE que</p><p>possa delimitar a área de expansão dessa produção com vistas à sustentabilidade. Apenas o</p><p>estado de Mato Grosso do Sul é que possui legislação própria sobre o ZEE/MS (Lei n.</p><p>3.839/2009).</p><p>Portanto, dada a não efetividade dos ZEE estaduais para preservação da vegetação natural da</p><p>região, uma das soluções imediatas seria a articulação de iniciativas de políticas governamentais</p><p>relacionadas à preservação dos ecossistemas, a exemplo de incentivos fiscais e financeiros para</p><p>ações que favoreçam a sustentabilidade, incentivos financeiros para a adoção de manejos de</p><p>pasto, adoção de estrutura para sistemas integrados de lavoura-pecuária, entre outros.</p><p>O problema existente nessa dinâmica da produção agropecuária no Centro-Oeste consiste em</p><p>como equacionar o dilema entre o crescimento da produção agropecuária e o desenvolvimento e</p><p>a preservação dos biomas. Parece consenso que parte dessa discussão está resolvida pela</p><p>legislação ambiental, através dos dispositivos do Código Florestal pela fixação dos limites</p><p>mínimos de reserva legal e pela Lei de Crimes Ambientais.</p><p>9.4 Considerações finais</p><p>As análises apresentadas neste capítulo permitem concluir que o crescimento da produção de</p><p>cana-de-açúcar na nova fronteira agrícola ainda ocorre pela ocupação de novas áreas. Os</p><p>avanços tecnológicos alcançados pela chamada Revolução Verde26 proporcionaram aumento do</p><p>rendimento e da qualidade das produções, mas é ainda o padrão itinerante de incorporação de</p><p>novas áreas que prevalece nesse setor. Nessa dinâmica expansiva, os estados de Goiás e Mato</p><p>Grosso do Sul se configuram como a nova fronteira agrícola da produção canavieira.</p><p>Observou-se ainda que a itinerância da pecuária bovina na Região se deve à substituição pelas</p><p>culturas de soja e cana-de-açúcar. Ao arrendar as áreas de pasto para a lavoura canavieira, a</p><p>pecuária migra para áreas mais ao norte do país, onde a renda provinda da terra arrendada</p><p>permite a multiplicação do portfólio original constituído por terra-pasto-cabeça animal. Nos últimos</p><p>anos houve um aumento de mais de 100% no número de cabeças bovinas na região Norte do</p><p>país, o que demonstra, portanto, que a pecuária extrapola os limites estaduais e regionais e tem</p><p>se deslocado para áreas do Pará e Tocantins.</p><p>Embora haja produções e estabelecimentos agropecuários que adotem sistemas sustentáveis</p><p>de produção, onde há manejo adequado dos pastos e dos solos e preservação das áreas de</p><p>reserva legal, conclui-se que é inerente ao sistema produtivo da agropecuária no Centro-Oeste, e</p><p>assim à produção de cana-de-açúcar, o modelo expansivo de ocupação de novas áreas. Esse</p><p>modelo se caracteriza pela substituição de produções com degradação dos solos e</p><p>desflorestamento em alguma direção, seja pela característica intrínseca e histórica do modelo de</p><p>ocupação dos cerrados, seja pela racionalidade econômica dos agentes, ou pela ausência de</p><p>programas e políticas públicas que incentivam a mudança de paradigma e a recuperação das</p><p>áreas degradadas.</p><p>O resultado desse modelo já é sentido pelas sociedades locais, pela fauna e flora, em favor dos</p><p>ganhos e crescimento econômico imediatos e privados, sem qualquer preocupação com relação</p><p>ao desenvolvimento econômico e social da região.</p><p>Referências</p><p>bibliográficas</p><p>ARRUDA, Z. J. Regionalização da pecuária bovina no Brasil. Série Documentos, n. 58. Brasília,</p><p>Embrapa-CNPGC/SPI, 1994.</p><p>BAER, W. A economia brasileira. Trad. Edite Sciulli. 2. ed. São Paulo, Nobel, 2002.</p><p>BRASIL. Censo Agropecuário. 1985. Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística. Disponível em:</p><p><http://www.ibge.gov.br>; acesso em: 1/2011.</p><p>______. Censo Agropecuário. 1995. Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística. Disponível em:</p><p><http://www.ibge.gov.br>; acesso em: 1/2011.</p><p>______. Censo Agropecuário. 2006. Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística. Disponível em:</p><p><http://www.ibge.gov.br>; acesso em: 1/2011.</p><p>______. IBGE. Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística. Banco de Dados Agregados.</p><p>Produção Agrícola e Pecuária Municipal. Disponível em:</p><p><http://www.sidra.ibge.gov.br/bda/agric/default.asp?z=t&o=11&i=P>; acessos em: 3/4/2011.</p><p>CAMARGO, A. M. M. P. et al. “Dinâmica e tendência da expansão da cana-de-açúcar sobre as</p><p>demais atividades agropecuárias no estado de São Paulo, 2001-2006”. Informações Econômicas,</p><p>São Paulo, vol. 38, n. 3, mar. 2008, p. 47-66.</p><p>FURTADO, C. Análise do “modelo” brasileiro. Rio de Janeiro, Civilização Brasileira, 1972.</p><p>GASQUES, J. G. et al. “Produtividade total dos fatores e transformações da agricultura brasileira:</p><p>Análise dos dados dos censos agropecuários”. In: 48º Encontro da Sociedade Brasileira de</p><p>Economia, Administração e Sociologia Rural (SOBER), Anais… Campo Grande-MS, 25 a 28 de</p><p>julho de 2010, pp. 1-19.</p><p>______. “Produtividade da agricultura brasileira e os efeitos de algumas políticas”. In: Revista de</p><p>Política Agrícola, ano XXI, n. 3, jul./ago./set. 2012. Brasília, Secretaria Nacional de Política</p><p>Agrícola, Companhia Nacional de Abastecimento, 2012, pp. 83-92.</p><p>GONÇALVES, S. J. & SOUZA, S. A. M. “Modernização da produção agropecuária brasileira e o</p><p>velho dilema da superação da agricultura itinerante”. Informações Econômicas, vol. 28, n. 4, abr.</p><p>1998, pp. 1-13.</p><p>IGREJA, A. C. M. O uso da terra para finalidades agrícolas no Brasil no período recente.</p><p>Campinas, Instituto de Economia, Universidade Estadual de Campinas, 2000 (Tese de</p><p>Doutorado).</p><p>KLINK, C. A. & MACHADO, R. B. “A conservação do Cerrado brasileiro”. Megadiversidade, vol. 1,</p><p>n. 1, julho de 2005, pp. 147-155.</p><p>http://www.ibge.gov.br/</p><p>http://www.ibge.gov.br/</p><p>http://www.ibge.gov.br/</p><p>http://www.sidra.ibge.gov.br/bda/agric/default.asp?z=t&o=11&i=P</p><p>OLIVETTE, M. P. A.; CASER, D. V. & CAMARGO, A. M. M. P. “Distribuição da Área Agrícola: As</p><p>grandes regiões do Brasil na década de 90. Agricultura em São Paulo”. Revista de Economia</p><p>Agrícola, São Paulo, vol. 49, n. 1, 2002, pp. 95-125.</p><p>MAPA. Cadeia produtiva de carne bovina, vol. 8. Brasília: IICA, 2007. Disponível em:</p><p><http://www.iica.org.br/docs/cadeiasprodutivas/cadeia%20produtiva%20da%20carne%20bovina%</p><p>20c%20capa.pdf>.</p><p>PFEIFER, M. O. “As artérias de uma nova Amazônia”. In: Valor Econômico, Especial “Caminhos</p><p>da Amazônia”, jul. 2011.</p><p>RAMOS, P. Agroindústria canavieira e propriedade fundiária no Brasil. São Paulo, Hucitec, 1999.</p><p>VERA FILHO, F. & TOLLINI, H. “Progresso tecnológico e desenvolvimento agrícola”. In: VEIGA, A.</p><p>(coord.). Ensaios sobre política agrícola brasileira. São Paulo: Secretaria da Agricultura, 1979, pp.</p><p>87-136.</p><p>http://www.iica.org.br/docs/cadeiasprodutivas/cadeia%20produtiva%20da%20carne%20bovina%20c%20capa.pdf</p><p>10. Panorama sociodemográfico das</p><p>regiões sucroalcooleiras do estado</p><p>de são paulo a partir de 1990</p><p>Tirza Aidar</p><p>Processo Fapesp 2008/58160-5</p><p>10.1 Introdução</p><p>A produção da indústria sucroalcooleira cresceu muito no estado de São Paulo</p><p>nas últimas décadas, chegando à marca de 7,7 bilhões de litros de álcool por</p><p>ano, mais de 75% da oferta nacional de etanol. O crescimento da produção foi</p><p>acompanhado pelo expressivo aumento da área plantada e colhida de cana-de-</p><p>açúcar, que praticamente triplicou entre 1990 e 2012, passando de algo em torno</p><p>de 1,8 milhões de hectares para aproximadamente 5,2 milhões.</p><p>Tal expansão e suas consequências não são, obviamente, homogenias entre</p><p>os diferentes espaços agrícolas, econômicos e administrativos do estado,</p><p>estando atreladas à vocação e ao zoneamento agrícola, assim como aos</p><p>contextos econômicos e sociodemográficos locais que, por sua vez, se articulam</p><p>com a cadeia produtiva no âmbito regional, nacional e internacional.</p><p>A partir dessa premissa, o objetivo deste capítulo é apresentar análises de um</p><p>conjunto de informações para as microrregiões do estado de São Paulo de forma</p><p>a identificar onde, e quando, as atividades do Complexo Agroindustrial (CAI)</p><p>canavieiro podem ter repercussões relevantes na economia e dinâmicas social e</p><p>demográfica locais.</p><p>10.2 Evolução da produção de cana-de-</p><p>açúcar no estado</p><p>Embora o incremento da área plantada com cana-de-açúcar no estado de São</p><p>Paulo tenha sido impressionante nos últimos vinte anos, as taxas de crescimento</p><p>não foram constantes, apresentando alternância entre períodos de certa</p><p>estabilidade, de crescimento moderado e outros de incremento bastante</p><p>expressivo (Gráfico 10.1).</p><p>Gráfico 10.1 – Área colhida com cana-de-açúcar em hectares e crescimento</p><p>geométrico anual (r) em períodos selecionados. Estado de São Paulo, 1990 a</p><p>2012</p><p>Fonte: Elaboração da autora com dados da Fundação Seade.</p><p>Entre 1993 e 1996 a área colhida cresceu quase 200 mil hectares ao ano,</p><p>velocidade que perde somente para o período de maior expansão, entre 2005 a</p><p>2009, quando a área colhida aumentou nada menos que 473 mil hectares</p><p>anualmente, passando de aproximadamente 3 para 5 milhões de hectares em</p><p>apenas 4 anos. Após esse período há arrefecimento da tendência de</p><p>crescimento.</p><p>Como bem descrito por Belik et al.1, a expansão das áreas plantadas durante</p><p>esse período encontra explicações nos diferentes contextos históricos da política</p><p>de crédito agrícola, da política pública para o setor energético, no mercado de</p><p>commodities e de capital financeiro internacional, entre outros.</p><p>Após 10 anos de fortes incentivos governamentais, com a implantação e</p><p>fortalecimento do Proálcool2 entre 1975 e 1985, o setor para de crescer em</p><p>consequência da queda de preços internacionais do petróleo e do fim de</p><p>subsídios governamentais. Entre 1986 e 1994, o Brasil enfrenta forte crise</p><p>econômica e a impossibilidade de rolar a dívida externa, de onde vinha grande</p><p>parte dos recursos para investimento no setor. Além disso, há no período</p><p>abertura ao mercado de automóveis e a indústria nacional passa a optar por</p><p>motores padronizados mundialmente, incluindo modelos populares de 1.000</p><p>cilindradas, movidos à gasolina. Mas, por outro lado, é justamente nos anos</p><p>1990 que se intensifica mundialmente o reconhecimento das vantagens</p><p>ambientais do uso do álcool como combustível alternativo3.</p><p>Assim, no mesmo contexto de baixa de crédito direto e abertura ao mercado</p><p>externo, cresce no Brasil o incentivo para uso de motores movidos a álcool em</p><p>carros oficiais e em táxis, e se estabelecem mecanismos de transferência de</p><p>recursos do mercado da gasolina, diesel e lubrificantes para compensar os</p><p>custos de produção do álcool.</p><p>Mas é somente a partir de 2003 que o setor vive nova expansão, impulsionada</p><p>dessa vez também pela iniciativa privada com a injeção de recursos</p><p>internacionais, além de empréstimos do BNDES4. Nesse período, o país, em</p><p>especial o estado de São Paulo e parte da região Centro-Oeste, experimenta</p><p>significativo crescimento dos canaviais e modernização da indústria</p><p>sucroalcooleira, ocorridos visando à produção do combustível alternativo em</p><p>larga escala.</p><p>A partir de 2008 o setor sofre mais um revés, dessa vez enfrentando</p><p>mudanças do mercado externo e a crise internacional de 2008/2009,</p><p>apresentando novo período de estagnação. Ou seja, a fase de forte crescimento</p><p>generalizado dura cinco anos, de 2003 a 2008, quando:</p><p>[…] as empresas contaram com créditos privados em dólar e, principalmente, com</p><p>empréstimos do BNDES. O setor também utilizava mecanismos financeiros, como</p><p>derivativos cambiais, para compor seus lucros. […] Muitas usinas faliram, o que aprofundou</p><p>o processo</p><p>de aquisições e fusões com empresas multinacionais. A crise se refletiu na</p><p>queda da produção de cana-de-açúcar na safra 2011/2012. […] O principal argumento das</p><p>usinas para justificar a queda na produtividade foi a incapacidade de investir na renovação</p><p>de canaviais, em adubação e tratos culturais. […] Apesar da crise, o BNDES continuou a</p><p>financiar as usinas e, no início de 2012, disponibilizou uma linha de crédito subsidiado para</p><p>a renovação de canaviais no montante de R$4 bilhões5.</p><p>Portanto, nesse processo, muitas usinas encerraram suas atividades, ou</p><p>mesmo se uniram como estratégias para tentar manter seu funcionamento. As</p><p>fusões e mudanças de razão social para viabilizar outros créditos garantem a</p><p>manutenção do funcionamento, mas gera acúmulo de dívidas. De acordo com</p><p>Belik et al.6, além das questões internacionais, a reversão do crescimento do</p><p>setor foi agravada</p><p>[…] pela falta de definições governamentais quanto ao papel do etanol na Matriz</p><p>Energética Nacional. […] Esses problemas se refletiram diretamente no mercado de</p><p>trabalho com a redução de postos na área agrícola, que já vinha em uma tendência de</p><p>queda devido à redução do corte manual, e também na área industrial.</p><p>As mudanças econômicas e as políticas agrícolas e industriais para o setor</p><p>sucroalcooleiro e energético dos últimos 25 anos impactaram de forma</p><p>diferenciada as diversas microrregiões do estado de São Paulo. Esse</p><p>reconhecimento e essa identificação das especificidades regionais são de suma</p><p>importância para subsidiar políticas públicas ligadas ao setor, e, em geral,</p><p>aquelas com vistas à sustentabilidade das dinâmicas econômicas e</p><p>sociodemográficas locais, com foco nas condições de vida das populações</p><p>envolvidas.</p><p>É com essa perspectiva que se construíram as análises apresentadas a</p><p>seguir, baseadas em informações sobre as 63 microrregiões (MR) do estado de</p><p>São Paulo, identificadas segundo sete agrupamentos a partir das informações</p><p>anuais sobre área colhida com cana-de-açúcar no período de 1990 a 2012</p><p>(Mapa 10.1 e Tabela 10.1)7.</p><p>Mapa 10.1 – Microrregiões do estado de São Paulo, segundo agrupamento</p><p>com base na expansão do cultivo da cana-de-açúcar, entre 1991 e 2010</p><p>Fonte: Elaboração da autora com dados da Tabela 10.1. Base cartográfica do</p><p>IBGE.</p><p>Tabela 10.1 – Informações sobre o cultivo de cana-de-açúcar, por microrregiões</p><p>do estado de São Paulo, de 1990 a 2012</p><p>Agrupamento</p><p>das</p><p>microrregiões</p><p>(Código e</p><p>Nome)</p><p>Número de</p><p>municípios</p><p>Área colhida (ha) Var%</p><p>1991</p><p>a</p><p>2012</p><p>% Colheita</p><p>no Estado</p><p>% Colheita</p><p>mecanizada</p><p>(2010) 1990 2012 a.a. 1990 2012 2006 2011</p><p>645 1.811.980 5.172.611 4,9 100,0 100,0 32,9 64,4</p><p>GRUPO 1 93 907.420 1.435.822 2,1 50,1 27,8 35,3 60,9</p><p>14 Ribeirão</p><p>Preto</p><p>16 241.412 300.677 1,0 13,3 5,8 39,4 63,3</p><p>24 Araraquara 15 107.479 272.934 4,3 5,9 5,3 42,3 72,9</p><p>13 Jaboticabal 17 129.063 257.840 3,2 7,1 5,0 29,5 62,7</p><p>21 Jaú 12 167.016 225.369 1,4 9,2 4,4 15,3 45,8</p><p>28 Piracicaba 12 118.500 156.908 1,3 6,5 3,0 51,4 51,6</p><p>5 Catanduva 13 63.339 133.932 3,5 3,5 2,6 38,8 61,7</p><p>27 Limeira 8 80.611 88.162 0,4 4,4 1,7 39,9 62,4</p><p>GRUPO 2 86 277.525 1.270.727 7,2 15,3 24,6 28,5 69,3</p><p>4 São José do</p><p>Rio Preto</p><p>29 43.211 391.182 10,5 2,4 7,6 38,7 72,9</p><p>10 São</p><p>Joaquim da</p><p>Barra</p><p>9 86.492 334.237 6,3 4,8 6,5 31,6 75,0</p><p>36 Presidente</p><p>Prudente</p><p>30 51.659 313.559 8,5 2,9 6,1 20,7 68,6</p><p>39 Assis 18 96.163 231.749 4,1 5,3 4,5 27,7 62,3</p><p>GRUPO 3 46 132.555 506.371 6,3 7,3 9,8 32,5 64,2</p><p>17 Araçatuba 7 48.390 199.993 6,7 2,7 3,9 23,4 65,4</p><p>18 Birigui 18 36.463 170.031 7,2 2,0 3,3 49,3 57,1</p><p>20 Bauru 21 47.702 136.347 4,9 2,6 2,6 40,2 65,9</p><p>GRUPO 4 91 218.110 1.043.973 7,4 12,0 20,2 31,0 64,9</p><p>16 Andradina 11 8.469 186.007 15,1 0,5 3,6 32,1 77,6</p><p>9 Barretos 3 4.595 119.732 16,0 0,3 2,3 18,1 79,7</p><p>11 Ituverava 5 24.442 118.728 7,4 1,3 2,3 15,2 55,5</p><p>25 São Carlos 6 33.750 104.511 5,3 1,9 2,0 29,6 57,6</p><p>Agrupamento</p><p>das</p><p>microrregiões</p><p>(Código e</p><p>Nome)</p><p>Número de</p><p>municípios</p><p>Área colhida (ha) Var%</p><p>1991</p><p>a</p><p>2012</p><p>% Colheita</p><p>no Estado</p><p>% Colheita</p><p>mecanizada</p><p>(2010) 1990 2012 a.a. 1990 2012 2006 2011</p><p>8 Novo</p><p>Horizonte</p><p>6 16.480 103.182 8,7 0,9 2,0 47,2 59,1</p><p>40 Ourinhos 18 41.064 101.842 4,2 2,3 2,0 42,5 61,9</p><p>30 São João</p><p>da Boa Vista</p><p>14 30.151 100.835 5,6 1,7 1,9 39,2 71,0</p><p>15 Batatais 6 23.750 91.822 6,3 1,3 1,8 26,3 58,3</p><p>35</p><p>Adamantina</p><p>14 14.821 87.998 8,4 0,8 1,7 26,6 43,2</p><p>19 Lins 8 20.588 29.316 1,6 1,1 0,6 75,9 75,9</p><p>GRUPO 5 126 54.067 607.166 11,6 3,0 11,7 29,4 68,2</p><p>34 Dracena 10 3.869 95.124 15,7 0,2 1,8 10,4 70,6</p><p>7 Nhandeara 9 4.344 77.876 14,0 0,2 1,5 42,6 50,1</p><p>12 Franca 10 436 64.910 25,5 0,0 1,3 26,9 67,9</p><p>3</p><p>Votuporanga</p><p>9 450 61.737 25,1 0,0 1,2 23,7 79,7</p><p>22 Avaré 8 16.230 57.500 5,9 0,9 1,1 26,6 60,4</p><p>6 Auriflama 9 5.120 57.080 11,6 0,3 1,1 26,7 57,3</p><p>37 Tupã 7 2.378 45.820 14,4 0,1 0,9 49,8 77,5</p><p>2</p><p>Fernandópolis</p><p>11 5.765 44.590 9,7 0,3 0,9 27,5 85,1</p><p>1 Jales 23 806 41.569 19,6 0,0 0,8 9,4 83,9</p><p>38 Marília 13 9.580 26.250 4,7 0,5 0,5 49,4 78,4</p><p>42</p><p>Itapetininga</p><p>5 3.189 22.070 9,2 0,2 0,4 26,9 44,4</p><p>41 Itapeva 12 1.900 12.640 9,0 0,1 0,2 16,9 55,3</p><p>GRUPO 6 64 218.295 303.589 1,5 12,0 5,9 38,4 60,5</p><p>23 Botucatu 7 32.494 66.834 3,3 1,8 1,3 47,0 63,9</p><p>26 Rio Claro 6 29.692 60.480 3,3 1,6 1,2 40,3 60,6</p><p>29</p><p>Pirassununga</p><p>4 19.807 57.545 5,0 1,1 1,1 27,2 67,7</p><p>32 Campinas 16 54.427 50.151 -0,4 3,0 1,0 39,8 60,1</p><p>Agrupamento</p><p>das</p><p>microrregiões</p><p>(Código e</p><p>Nome)</p><p>Número de</p><p>municípios</p><p>Área colhida (ha) Var%</p><p>1991</p><p>a</p><p>2012</p><p>% Colheita</p><p>no Estado</p><p>% Colheita</p><p>mecanizada</p><p>(2010) 1990 2012 a.a. 1990 2012 2006 2011</p><p>31 Moji Mirim 7 33.600 34.255 0,1 1,9 0,7 36,1 54,7</p><p>46 Sorocaba 15 18.795 17.462 -0,3 1,0 0,3 31,7 51,7</p><p>43 Tatuí 9 29.480 16.862 -2,5 1,6 0,3 43,0 56,0</p><p>GRUPO 7 139 4.008 4.963 1,0 0,2 0,1 10,8 36,0</p><p>Fonte: Elaboração da autora com dados da Fundação Seade/Informações dos</p><p>municípios paulistas (Inpe/Canasat).</p><p>10.3 A expansão do cultivo da cana nas</p><p>microrregiões do estado de São Paulo</p><p>As análises subsequentes focalizam cinco grupos que apresentaram volume</p><p>ou expansão importante na produção de cana-de-açúcar no período</p><p>considerado8.</p><p>Com exceção das microrregiões de Limeira e Catanduva, o primeiro grupo é</p><p>composto por microrregiões tradicionais e com forte produção já no início do</p><p>período analisado, mas com expansão abaixo da média estadual em geral.</p><p>Como resultado, em seu conjunto, tais áreas perdem representatividade da</p><p>produção de cana-de-açúcar do estado, passando de 50% em 1990 para 27,8%</p><p>em 2012 (Gráfico 10.2). Nesse grupo encontra-se Ribeirão Preto, a microrregião</p><p>de maior produção e tradição no setor, e Piracicaba, também tradicional no</p><p>cultivo da cana-de-açúcar. Araraquara e Jaboticabal, com 10,3% da área colhida</p><p>no estado em 2012, assim como a microrregião de Catanduva, apresentaram</p><p>crescimento da safra em torno de 4% ao ano entre 1990 e 2012.</p><p>Gráfico 10.2 – Evolução da área colhida (ha) com cana-de-açúcar, para dois</p><p>grupos de microrregiões com alta produção – estado de São Paulo, de 1990 a</p><p>2012</p><p>Fonte: Elaboração da autora com dados da Fundação Seade.</p><p>O segundo grupo é composto por microrregiões que apresentavam produção</p><p>moderada no início do período, mas bastante alta em 2012, aproximando-se de</p><p>quase um quarto da área colhida do estado (Gráfico 10.2). Tal expansão foi</p><p>observada durante praticamente todo o período, especialmente a partir de 2004,</p><p>quando a produção chegou a quadruplicar.</p><p>Numa escala menor, o Gráfico 10.3 dispõe as séries observadas para o</p><p>terceiro, quarto e quinto agrupamentos, contendo MR com baixa produção no</p><p>início dos anos 1990, mas importante expansão até 2012.</p><p>Gráfico 10.3 – Evolução da área colhida (ha), para quatro grupos de</p><p>microrregiões com baixa produção em 1990 e expansão no período – estado de</p><p>São Paulo, de 1990 a 2012</p><p>Fonte: Elaboração da autora com dados da Fundação Seade.</p><p>As microrregiões de Araçatuba, Birigui e Bauru compõem o terceiro</p><p>agrupamento, cuja principal característica é a de baixa produção em 1990,</p><p>suave crescimento até meados da primeira década dos anos 2000 e crescimento</p><p>bastante expressivo entre 2005 e 2009, de 17,5% anualmente (Gráfico 10.3). No</p><p>quarto estão por dez microrregiões</p><p>sem produção em 1990, mas com forte</p><p>crescimento em todo o período, com destaque entre 2005 e 2009. Chama a</p><p>atenção o crescimento de mais de 15% ao ano em Andradina e Barretos, onde</p><p>as pastagens eram preponderantes até início dos anos 1990.</p><p>Andradina é a única MR do quarto grupo que parece não ter sido afetada pela</p><p>crise mais recente do setor. Nesse sentido, vale destacar a MR de Lins, que em</p><p>2012 não chega a atingir a marca de 30 mil hectares de área colhida, tendo</p><p>perdido o espetacular crescimento observado anteriormente, quando em 2010</p><p>alcançou aproximadamente 90 mil hectares, três vezes mais do que o início e o</p><p>final do período analisado.</p><p>Finalmente, as MR do quinto agrupamento se caracterizam por entrarem em</p><p>cena no setor somente a partir de 2005. São raras as exceções, como Franca,</p><p>onde o crescimento da área colhida se inicia em 1998. Embora ainda com pouca</p><p>representatividade na colheita do total do estado, nesse grupo vale destacar a</p><p>evolução observada nas regiões de Dracena, Auriflama, Tupã, Jales e Avaré,</p><p>com continuidade de aumento da safra mesmo após a crise iniciada em 2009.</p><p>Tal heterogeneidade instiga e pode orientar investigações sobre como a</p><p>dinâmica demográfica, socioeconômica e ambiental interage com as</p><p>transformações e revezes do setor sucroalcooleiro. A partir dessa perspectiva, a</p><p>seguir são analisados outros indicadores para as microrregiões buscando</p><p>identificar possíveis regularidades intragrupos e diferenciais entre eles, que</p><p>possam ser atribuídas, pelo menos em hipótese, à dinâmica do setor nas últimas</p><p>décadas.</p><p>10.4 População convivendo com os</p><p>canaviais paulistas</p><p>Dentre os cerca de 40 milhões de paulistas recenseados em 2010, quase 7</p><p>milhões (16,8%) residiam em municípios ou microrregiões que experimentaram</p><p>forte expansão dos canaviais em suas áreas cultiváveis. Quando agregado às</p><p>regiões já tradicionais em relação ao cultivo, esse contingente sobe para 10,6</p><p>milhões de pessoas, cerca de um quarto da população do estado (Tabela 10.2).</p><p>Tabela 10.2 – Informações populacionais e do mercado de trabalho, por</p><p>microrregiões do estado de São Paulo, de 1991 a 2010</p><p>Agumpamento</p><p>das</p><p>microrregiões</p><p>(Código e</p><p>Nome)</p><p>População</p><p>2010</p><p>Taxa</p><p>Crescimento</p><p>a.a. (%)</p><p>Saldo</p><p>Migratório</p><p>por pop.</p><p>no meio</p><p>do</p><p>período</p><p>(X1000)</p><p>Empregos</p><p>Formais</p><p>por Pop</p><p>de 15 a 59</p><p>anos (%)</p><p>Empregos</p><p>Formais na</p><p>Agricultura</p><p>(%)</p><p>n % 1991/</p><p>2000</p><p>2000/</p><p>2010</p><p>1991/</p><p>2000</p><p>2000/</p><p>2010</p><p>1991 2010 1991 2010</p><p>41.262.199 100 1,8 1,1 8,9 4,9 39,2 46,6 1,7 2,6</p><p>GRUPO 1 3.645.382 8,8 1,8 1,3 7,4 6,0 33,5 42,7 7,7 5,5</p><p>14 Ribeirão</p><p>Preto</p><p>1.032.547 2,5 2,0 1,8 8,0 9,3 35,2 44,9 9,7 3,2</p><p>24 Araraquara 502.149 1,2 1,7 1,2 7,1 5,7 33,5 42,3 12,4 10,4</p><p>13 Jaboticabal 408.199 1,0 1,2 0,6 3,4 3,3 29,1 35,9 7,2 11,0</p><p>21 Jaú 346.342 0,8 1,7 1,1 7,1 6,4 35,2 42,6 14,0 6,6</p><p>28 Piracicaba 556.085 1,3 2,0 1,2 9,0 4,2 33,9 46,7 2,5 2,1</p><p>5 Catanduva 221.465 0,5 1,5 0,9 6,8 4,1 22,9 37,8 8,2 9,9</p><p>27 Limeira 578.595 1,4 2,1 1,3 8,4 4,6 36,9 41,7 1,6 3,8</p><p>GRUPO 2 1.886.226 4,6 1,7 0,9 8,6 5,2 23,8 36,1 5,7 9,7</p><p>4 São José do</p><p>Rio Preto</p><p>763.534 1,9 2,2 1,3 13,8 7,1 26,1 39,5 3,3 5,5</p><p>10 São</p><p>Joaquim da</p><p>Barra</p><p>211.389 0,5 1,5 1,0 3,6 2,2 20,5 36,4 2,6 18,7</p><p>36 Presidente</p><p>Prudente</p><p>573.368 1,4 1,2 0,5 4,1 4,9 23,1 32,6 4,2 6,3</p><p>39 Assis 337.935 0,8 1,7 0,8 8,8 3,6 22,2 33,9 16,8 20,2</p><p>GRUPO 3 1.075.796 2,6 1,5 1,0 7,2 4,2 29,1 40,4 6,4 6,8</p><p>17 Araçatuba 256.560 0,6 1,0 0,9 2,7 4,0 25,8 35,4 6,6 7,8</p><p>18 Birigui 257.531 0,6 1,6 1,2 8,8 6,1 27,3 38,5 3,8 6,8</p><p>20 Bauru 561.705 1,4 1,7 0,9 8,7 3,4 31,5 43,6 7,4 6,4</p><p>GRUPO 4 1.925.344 4,7 1,2 0,7 5,6 4,1 24,1 36,5 9,1 12,7</p><p>16 Andradina 181.710 0,4 0,5 0,4 5,8 5,4 20,9 31,6 17,4 9,9</p><p>9 Barretos 135.466 0,3 0,9 0,7 2,0 2,8 26,0 42,6 9,0 12,4</p><p>11 Ituverava 59.812 0,1 1,4 0,8 5,3 1,2 20,0 31,8 10,0 10,6</p><p>25 São Carlos 308.777 0,7 2,2 1,3 11,2 5,6 36,7 42,5 8,7 6,1</p><p>8 Novo</p><p>Horizonte</p><p>139.118 0,3 1,2 0,3 2,3 3,8 21,0 30,6 4,3 13,8</p><p>40 Ourinhos 323.402 0,8 1,5 0,6 5,8 4,4 20,9 34,5 10,0 13,8</p><p>30 São João</p><p>da Boa Vista</p><p>351.887 0,9 1,0 0,5 2,8 3,4 25,4 35,2 6,8 18,7</p><p>15 Batatais 106.345 0,3 1,4 0,8 3,8 3,7 18,3 34,2 7,9 15,7</p><p>35</p><p>Adamantina</p><p>158.607 0,4 -0,1 0,5 10,0 4,4 17,6 32,8 7,4 13,6</p><p>19 Lins 160.220 0,4 1,2 0,9 4,5 3,1 23,7 43,4 9,9 13,6</p><p>GRUPO 5 2.058.412 5,0 1,3 0,8 8,5 4,6 21,0 33,6 4,8 11,6</p><p>34 Dracena 116.149 0,3 0,0 0,7 10,6 4,1 15,4 32,8 0,8 9,5</p><p>7 Nhandeara 65.337 0,2 0,4 1,0 4,3 7,8 11,9 41,1 2,5 18,5</p><p>12 Franca 386.704 0,9 2,2 1,0 8,0 0,8 28,3 36,5 1,1 5,8</p><p>3 Votuporanga 139.475 0,3 1,2 1,0 11,7 7,3 16,0 34,2 2,2 5,4</p><p>22 Avaré 178.434 0,4 2,2 1,2 10,2 3,8 19,9 34,5 10,2 23,4</p><p>6 Auriflama 46.367 0,1 0,0 0,5 10,7 4,5 11,2 23,3 10,2 14,6</p><p>37 Tupã 109.773 0,3 0,7 0,1 3,6 5,8 22,7 33,2 3,8 17,1</p><p>2</p><p>Fernandópolis</p><p>104.623 0,3 0,6 0,4 6,5 3,9 14,8 33,3 1,6 7,4</p><p>1 Jales 149.197 0,4 0,5 0,2 8,6 5,3 12,2 27,2 2,2 8,9</p><p>38 Marília 330.285 0,8 1,5 0,6 10,6 3,7 28,1 38,1 3,6 6,0</p><p>42</p><p>Itapetininga</p><p>191.603 0,5 2,2 1,6 7,8 5,8 26,8 32,0 14,3 20,2</p><p>41 Itapeva 240.465 0,6 1,2 0,3 6,9 8,0 16,3 27,0 8,9 19,5</p><p>GRUPO 6 5.228.485 12,7 2,5 1,6 12,8 7,8 35,3 44,9 2,2 2,9</p><p>23 Botucatu 207.410 0,5 2,0 1,4 8,2 7,0 36,0 41,2 11,3 10,4</p><p>26 Rio Claro 242.577 0,6 2,3 1,1 14,2 5,3 32,0 46,5 5,1 6,4</p><p>29</p><p>Pirassununga</p><p>183.561 0,4 1,9 1,0 7,5 2,3 31,9 39,6 3,0 13,3</p><p>32 Campinas 2.296.011 5,6 2,9 1,7 11,4 8,1 40,4 48,2 1,0 1,0</p><p>31 Moji Mirim 439.619 1,1 2,8 1,7 14,8 7,7 34,6 43,8 1,9 6,4</p><p>46 Sorocaba 1.440.831 3,5 2,1 1,6 14,7 7,8 28,2 41,2 2,5 2,3</p><p>43 Tatuí 418.476 1,0 2,3 1,9 15,5 11,0 37,2 43,3 2,5 3,1</p><p>GRUPO 7 25.442.554 61,7 1,7 1,0 8,7 4,2 45,0 50,3 0,3 0,6</p><p>Fonte: Elaboração da autora com dados da Fundação Seade/Informações dos</p><p>municípios paulistas (Inpe/Canasat).</p><p>Os resultados indicam que a expansão ou entrada da cultura da cana teve</p><p>papel relevante no crescimento da oferta de empregos formais em relação à</p><p>população em idade ativa (PIA)9 entre 1991 e 2010, assim como no crescimento</p><p>da participação das vagas na agricultura nesse total. Justamente para a maioria</p><p>das microrregiões dos grupos 2 a 5, o crescimento da razão entre empregos</p><p>formais e a PIA se apresenta bem acima da média estadual, simultaneamente</p><p>ao crescimento do peso dos empregos na agricultura (Tabela 10.2). Nesse</p><p>sentido chamam a atenção as microrregiões de São Joaquim da Barra, do</p><p>segundo agrupamento; Birigui, do terceiro; Batatais, Adamantina e Lins, do</p><p>quarto; e Dracena, Nhandeara, Avaré, Fernandópolis e Jales, do quinto</p><p>agrupamento. Enquanto o estado experimentou variação de 39,2 a 46,6 de</p><p>empregos formais para cada 100 habitantes em idade produtiva entre 1991 e</p><p>2010, e ligeiro aumento do percentual de empregos na agricultura, de 1,7% a</p><p>2,6% no mesmo período, na microrregião de Nhandeara, por exemplo, os</p><p>mesmos indicadores saltaram de 11,9 para 41,1 empregos formais por 100</p><p>habitantes em idade ativa, sendo que a participação da agricultura no total</p><p>passou de 2,5% para 18,5%. Vale notar que, nessa mesma microrregião ao</p><p>noroeste do estado, próxima a Auriflama, a mecanização da colheita se manteve</p><p>bem abaixo da média estadual ao final dos anos 2000, não ultrapassando 50%,</p><p>mais um fator para crescimento da demanda por mão de obra para o setor.</p><p>Embora mais alto, o rendimento médio mensal nos empregos formais na</p><p>agricultura (EFAG) não acompanhou o aumento de 271% do salário mínimo</p><p>estadual entre 2000 e 2010 – de R$151,00 para R$560,00. Segundo dados da</p><p>RAIS (Relação Anual de Informações Sociais)10, disponibilizados pela Fundação</p><p>Seade, o rendimento médio mensal dos EFAG variou de R$382,28 a</p><p>R$1.131,09, ou seja, 196% no mesmo período (Tabela 10.3). A expansão dos</p><p>canaviais parece ter tido também alguma importância para a valorização dessa</p><p>mão de obra em algumas regiões específicas, tais como Araraquara, Assis,</p><p>Birigui, Lins, São João da Boa Vista, Ourinhos, Jales, Nhandeara e Dracena,</p><p>onde o crescimento dos canaviais foi acompanhado de maior valorização salarial</p><p>na agricultura, se comparado à média estadual.</p><p>Tabela 10.3 – Taxas de internações por doenças respiratórias,</p><p>renda média mensal dos empregos formais na agricultura, por</p><p>microrregiões, e variação observada no período – estado</p><p>de São</p><p>Paulo, de 2000 e 2010</p><p>Agrupamento</p><p>das</p><p>microrregiões</p><p>(Código e Nome)</p><p>Estado de SP</p><p>Taxa</p><p>Internações</p><p>por 1000</p><p>hab. de 65 a</p><p>69 anos</p><p>Renda média</p><p>dos empregos</p><p>na agricultura</p><p>(R$)</p><p>Razão</p><p>Rendas</p><p>médias</p><p>Taxas</p><p>Int.</p><p>2000 2010 2000 2010 2010/</p><p>2000</p><p>2000/</p><p>2010</p><p>15,1 10,4 382,28 1.131,09 3,0 1,4</p><p>GRUPO 1 19,9 13,2 427,24 1.301,20 3,0 1,5</p><p>14 Ribeirão</p><p>Preto</p><p>15,4 12,3 592,64 1.612,72 2,7 1,2</p><p>24 Araraquara 20,9 12,8 312,26 1.194,61 3,8 1,6</p><p>13 Jaboticabal 22,3 22,9 372,36 1.129,43 3,0 1,0</p><p>21 Jaú 31,4 13,1 444,19 1.215,02 2,7 2,4</p><p>28 Piracicaba 13,7 14,3 342,54 1.008,65 2,9 1,0</p><p>5 Catanduva 34,2 16,7 516,65 1.721,37 3,3 2,0</p><p>27 Limeira 15,8 4,7 447,23 1.236,52 2,8 3,3</p><p>GRUPO 2 28,3 20,6 421,12 1.407,75 3,3 1,4</p><p>4 Sã o José do</p><p>Rio Preto</p><p>28,2 14,8 429,11 1.344,76 3,1 1,9</p><p>10 São Joaquim</p><p>da Barra</p><p>32,6 14,2 505,04 1.554,58 3,1 2,3</p><p>36 Presidente</p><p>Prudente</p><p>28,7 25,9 312,91 986,18 3,2 1,1</p><p>39 Assis 25,5 28,4 421,15 1.573,75 3,7 0,9</p><p>GRUPO 3 16,9 14,6 369,89 1.175,80 3,2 1,2</p><p>17 Araçatuba 11,9 8,5 428,09 1.271,11 3,0 1,4</p><p>18 Birigui 21,4 17,9 371,50 1.272,04 3,4 1,2</p><p>20 Bauru 17,1 15,9 338,11 1.090,55 3,2 1,1</p><p>GRUPO 4 28,1 21,6 331,33 1.041,37 3,1 1,3</p><p>16 Andradina 26,2 26,4 349,74 1.053,79 3,0 1,0</p><p>9 Barretos 27,5 14,8 367,78 978,32 2,7 1,9</p><p>11 Ituverava 23,2 5,7 295,53 843,61 2,9 4,0</p><p>25 São Carlos 17,7 23,6 367,41 1.035,33 2,8 0,8</p><p>8 Novo</p><p>Horizonte</p><p>36,3 33,9 307,82 959,09 3,1 1,1</p><p>40 Ourinhos 29,6 20,4 275,43 967,45 3,5 1,5</p><p>30 São João da</p><p>Boa Vista</p><p>28,1 15,2 329,31 1.104,23 3,4 1,8</p><p>15 Batatais 27,0 22,3 348,95 956,71 2,7 1,2</p><p>35 Adamantina 44,6 34,3 319,37 966,40 3,0 1,3</p><p>19 Lins 19,9 15,0 378,31 1.253,37 3,3 1,3</p><p>GRUPO 5 27,5 20,1 300,28 976,23 3,3 1,4</p><p>34 Dracena 26,8 18,2 251,88 1.120,41 4,4 1,5</p><p>7 Nhandeara 51,1 38,4 323,64 1.443,65 4,5 1,3</p><p>12 Franca 17,5 7,7 263,54 812,70 3,1 2,3</p><p>3 Votuporanga 27,3 21,6 352,25 968,97 2,8 1,3</p><p>22 Avaré 22,6 16,1 341,30 1.032,63 3,0 1,4</p><p>6 Auriflama 29,9 44,0 362,25 974,43 2,7 0,7</p><p>37 Tupã 40,0 23,0 284,61 877,11 3,1 1,7</p><p>2 Fernandópolis 31,6 7,6 322,45 914,14 2,8 4,2</p><p>1 Jales 40,3 25,0 276,21 1.016,95 3,7 1,6</p><p>38 Marília 15,9 7,8 270,88 847,43 3,1 2,0</p><p>42 Itapetininga 22,7 67,9 295,01 965,28 3,3 0,3</p><p>41 Itapeva 36,4 14,2 343,00 931,65 2,7 2,6</p><p>GRUPO 6 15,6 7,3 389,99 1.099,44 2,8 2,1</p><p>23 Botucatu 22,6 13,5 337,77 878,03 2,6 1,7</p><p>26 Rio Claro 9,6 6,3 446,76 1.163,90 2,6 1,5</p><p>29</p><p>Pirassununga</p><p>21,3 12,3 410,54 1.338,71 3,3 1,7</p><p>32 Campinas 13,2 3,4 433,26 1.293,40 3,0 3,9</p><p>31 Moji Mirim 14,3 10,6 359,22 939,20 2,6 1,4</p><p>46 Soroca BA 16,1 9,2 376,96 1.063,39 2,8 1,8</p><p>43 Tatuí 25,7 13,9 358,04 1.024,89 2,9 1,9</p><p>GRUPO 7 10,1 7,5 392,68 978,02 2,5 1,3</p><p>Fonte: Elaboração da autora com dados da Fundação Seade/Informações dos</p><p>municípios paulistas.</p><p>As informações agregadas por microrregiões corroboram com os resultados</p><p>de estudos que encontram associação entre a colheita manual e a saúde</p><p>respiratória das populações que residem próximas aos canaviais, em especial</p><p>das crianças e idosos11. As taxas de internações por problemas no aparelho</p><p>respiratório para cada mil idosos de 65 a 69 anos em 2010 são bem maiores</p><p>justamente para algumas regiões do quarto e quinto agrupamento, que</p><p>apresentaram menor proporção de área mecanizada do estado, quais sejam:</p><p>Novo Horizonte; Batatais; São Carlos; Adamantina; Auriflama; Nhandeara;</p><p>Itapetininga e Avaré; com destaque novamente para Nhandeara e Auriflama,</p><p>cujas taxas de internações superaram em cerca de 4 vezes a média estadual em</p><p>2010, quando a colheita manual ainda cobria cerca de metade da área cultivada</p><p>(Tabela 10.3).</p><p>Além das altas taxas de internações dos idosos por problemas respiratórios,</p><p>algumas microrregiões chamam a atenção por não acompanharem os ganhos</p><p>estaduais observados na primeira década dos anos 2000; são elas: Jaboticabal;</p><p>Piracicaba; Presidente Prudente; Assis; Birigui; Novo Horizonte; Batatais;</p><p>Andradina; São Carlos; Adamantina; Auriflama e Itapetininga; a maioria dessas</p><p>microrregiões são mais importantes quanto à quantidade ou expansão das áreas</p><p>colhidas no período analisado.</p><p>Quanto ao crescimento demográfico e intensidade migratória, os dados não</p><p>indicam relação com as tendências de expansão do setor sucroalcooleiro entre</p><p>crescimento demográfico e saldos migratórios no período entre 1991 e 2010,</p><p>pelo menos na escala e recorte temporal considerado (Tabela 10.2). As maiores</p><p>taxas de crescimento populacional e respectivo impacto dos saldos migratórios</p><p>se concentram justamente nas microrregiões para as quais o crescimento do</p><p>setor não foi importante no período e muito menos a participação da agricultura</p><p>na composição da oferta de empregos formais, com destaque para</p><p>microrregiões em torno dos grandes centros urbanos com importância nas</p><p>atividades industriais e de serviços, tais como Ribeirão Preto, Campinas, Região</p><p>Metropolitana de São Paulo e Sorocaba.</p><p>10.5 Considerações finais</p><p>As análises desenvolvidas neste capítulo deixam evidente a necessidade de</p><p>se considerarem diferentes escalas político-administrativas e espaciais, quando</p><p>o objetivo é entender as conexões entre dinâmica sociodemográfica e as</p><p>tendências do setor sucroalcooleiro, em especial frente ao avanço do cultivo da</p><p>cana em direção aos limites do estado de São Paulo com Minas Gerais, Mato</p><p>Grosso do Sul e Paraná.</p><p>Os diferenciais observados entre as microrregiões do estado, juntamente com</p><p>os demais aspectos trabalhados neste volume, devem subsidiar estudos de</p><p>acompanhamento do que ocorre no setor, assim como o desenvolvimento de</p><p>políticas sociais e econômicas visando, por um lado, mitigar problemas</p><p>referentes às oscilações do mercado de trabalho, da disponibilidade de terras</p><p>para a agricultura familiar, de produção de alimentos, de absorção de mão de</p><p>obra regional e, por outro lado, aproveitar as potencialidades do setor quanto ao</p><p>desenvolvimento econômico e social da população local.</p><p>No campo acadêmico, as análises sugerem o desenvolvimento de pesquisas</p><p>que busquem maior aprofundamento em casos e questões específicas, como os</p><p>dos estudos sobre as duas cidades de Goiás, Quirinópolis e Santa Helena,</p><p>elaborados por Cameli12 e Limas13. Em ambos os casos são identificadas</p><p>externalidades negativas para as populações envolvidas, quando toda e</p><p>qualquer vocação produtiva foi substituída por atividades sucroalcooleiras no</p><p>período de forte expansão, sem uma manutenção mínima de alternativas em</p><p>outros setores para enfrentamento das crises iniciadas a partir de 2008. Tais</p><p>cenários podem orientar a identificação de municípios, regiões e grupos</p><p>populacionais mais vulneráveis frente às fortes oscilações no setor.</p><p>Desse ponto de vista, são identificadas microrregiões que, após um longo</p><p>período de forte expansão de seus canaviais, apresentaram tendência de</p><p>estagnação ou retração a partir de 2008/2009, quais sejam: São Joaquim da</p><p>Barra e Assis, do segundo agrupamento; e a grande maioria das microrregiões</p><p>do quarto e quinto agrupamento. Algumas exceções quanto ao reflexo da crise</p><p>foram também observadas, como é o caso das microrregiões de Araraquara,</p><p>São José do Rio Preto, Presidente Prudente, Andradina, São João da Boa Vista,</p><p>Dracena, Avaré e Auriflama, que experimentaram crescimento da área colhida</p><p>até 2012. Nos dois casos será muito bem vinda a continuidade e ampliação de</p><p>pesquisas sobre as tendências do setor e suas conexões com as dinâmicas</p><p>sociodemográficas e econômicas nacionais, estaduais e locais.</p><p>Referências bibliográficas</p><p>AIDAR, T. & DONALISIO, M. R. “Saúde nas regiões canavieiras do estado de</p><p>São Paulo em tempos recentes de expansão da indústria sucroalcooleira”. In:</p><p>BAENINGER, R. et al. (orgs.). Por centro do estado de São Paulo – Regiões</p><p>Canavieiras, vol. 6, 1. ed. Campinas, NEPO/Unicamp, 2013, pp. 105-118.</p><p>CAMELINI, J. H. Regiões competitivas do etanol e vulnerabilidade territorial no</p><p>Brasil: O caso emblemático de Quirinópolis, GO. Campinas, Instituto de</p><p>Geociências, Universidade Estadual de Campinas, 2011 (Dissertação de</p><p>Mestrado).</p><p>LIMA, D. A. L. L. & GARCIA, J. R. “A evolução da produção de cana-de-açúcar e</p><p>o impacto no uso do solo no estado de Goiás”. Estud. Soc. e Agric.,</p><p>Rio de</p><p>Janeiro, vol. 19, n. 2, 2011, pp. 374-403.</p><p>MENDONÇA, M. L.; PITTA, F. T. & XAVIER, C. V. “A agroindústria canavieira e a</p><p>crise econômica mundial”. Relatório da Rede Social de Justiça e Direitos</p><p>Humanos. São Paulo, Rede Social de Justiça e Direitos Humanos, 2012, pp. 1-</p><p>40.</p><p>MENEGHIM, J. C.; AIDAR, T. & LING, Z. Y. “Problemas respiratórios em duas</p><p>regiões canavieiras do estado de São Paulo”. In: XVIII Encontro Nacional de</p><p>Estudos Populacionais, ABEP, Anais… Águas de Lindoia/SP, de 20 a 24 de</p><p>novembro de 2012, pp. 1-13.</p><p>PEROSA, B. B.; BELIK, W. & FREDO, C. E. “Dinâmica econômica e emprego</p><p>nas regiões canavieiras do estado de São Paulo”. In: BAENINGER, R. et al.</p><p>(orgs.). Por dentro do estado de São Paulo – Regiões canavieiras, vol. 6, 1. ed.</p><p>Campinas, NEPO/Unicamp, 2013, pp. 41-62.</p><p>PEROSA, B. B. & SAIANI, C. C. S. “Protocolo agroambiental: Impacto da</p><p>mecanização da colheita da cana-de-açúcar sobre a saúde respiratória nos</p><p>municípios paulistas”. In: 52º Congresso da Sociedade Brasileira de Economia,</p><p>Administração e Sociologia Rural, Anais… Goiânia, 2014, pp. 1-20.</p><p>“PROÁLCOOL – Programa Brasileiro de Álcool”. Biodieselbr (on-line). 29 de</p><p>janeiro de 2006. Disponível em: <http://www.biodieselbr.com/proalcool/pro-</p><p>alcool/programa-etanol.htm>; acesso em: 10/11/2014.</p><p>http://www.biodieselbr.com/proalcool/pro-alcool/programa-etanol.htm</p><p>RIBEIRO, H. “Queimadas de cana-de-açúcar no Brasil: Efeitos à saúde</p><p>respiratória”. Revista Saúde Pública, vol. 42, n. 2, 2008, pp. 370-376.</p><p>SEADE – Fundação Sistema Estadual de Análise de Dados. Portal de</p><p>Estatísticas do Estado de São Paulo. Disponível em: <http://www.seade.gov.br/>.</p><p>http://www.seade.gov.br/</p><p>11. um mar de cana: expansão</p><p>regional e migração em são</p><p>paulo</p><p>Natália Belmonte Demétrio, Rosana Baeninger, Roberta</p><p>Guimarães Peres</p><p>Processo Fapesp 2008/58160-5</p><p>11.1 Introdução</p><p>A dinâmica econômica da agricultura no interior paulista no século</p><p>21 é marcada pela produção agrícola de commodities, como o caso</p><p>do cultivo e produção da cana-de-açúcar.</p><p>As novas espacialidades desenhadas pela expansão do plantio da</p><p>cana revelam a importância dos contextos regionais para a</p><p>articulação de sua cadeia produtiva no âmbito local, regional,</p><p>nacional e global.</p><p>Nesse contexto, a histórica rede urbana paulista reservou às</p><p>regiões fora do eixo da desconcentração industrial essa etapa</p><p>recente de expansão da cana-de-açúcar no estado, expandindo</p><p>concomitantemente os espaços da migração de trabalhadores rurais</p><p>na mesma direção.</p><p>11.2 Dinâmica socioespacial da</p><p>expansão da cana em São Paulo</p><p>O processo de reestruturação produtiva em âmbito internacional</p><p>tem contribuído, em nível nacional, regional e local, para a</p><p>configuração de espaços rurais e urbanos, cujas transformações</p><p>refletem fatores econômicos, políticos e sociais em um esforço de</p><p>inserção nessa dinâmica global.</p><p>Cano1 considera que a nova ordem econômica internacional, ao</p><p>forçar a abertura comercial e consolidar o papel do Brasil no</p><p>mercado global como grande produtor de bens primários, levou não</p><p>só a uma reestruturação interna de nosso parque produtivo, como</p><p>também a uma surpreendente expansão do agronegócio.</p><p>Nesse contexto, Baeninger2 chama atenção para o fato de ambos</p><p>os fenômenos implicarem, em nível local, uma reorganização da</p><p>produção, cuja análise é central ao entendimento de parte das</p><p>migrações internas na contemporaneidade.</p><p>É também nesse contexto que os espaços selecionados pela</p><p>reestruturação produtiva incorporam fortemente as áreas e a</p><p>produção rural no país, principalmente através da produção de</p><p>commodities primárias, inserindo regiões e cidades na nova</p><p>dinâmica econômica internacional.</p><p>As novas regiões da expansão da cana-de-açúcar em São Paulo</p><p>apresentam, portanto, uma dinâmica inserida em outro tempo e</p><p>outro espaço, sob os marcos da acumulação flexível e da</p><p>financeirização da produção3, com “mecanismos de desencaixe”4</p><p>por meio dos quais a produção se volta para a produção e dinâmica</p><p>do mercado externo.</p><p>O crescente processo de desruralização, termo adotado por</p><p>Camarano e Abramovay5 em lugar do conceito de urbanização,</p><p>resulta do aprofundamento contínuo na divisão socioespacial do</p><p>trabalho entre os próprios núcleos urbanos, e não apenas entre</p><p>campo e cidade6. De acordo com Corrêa7 “nas sociedades de base</p><p>urbana-industrial, as relações entre campo e cidade tornam-se</p><p>relações entre cidade e região, sendo a rede de cidades o fenômeno</p><p>que traduz esse relacionamento”.</p><p>Brandão8 ressalta que as múltiplas escalas da divisão do trabalho</p><p>– passando do local ao regional, nacional e global – reforçam a</p><p>dimensão espacial do conceito de rede urbana. Nesse sentido, os</p><p>espaços rurais também compõem a rede urbana que se expande e</p><p>se espalha no território paulista.</p><p>As condições históricas pretéritas da rede urbana paulista9</p><p>articularam, nas distintas etapas de desenvolvimento econômico do</p><p>país, as áreas rurais às áreas urbanas. A rede de cidades resultante</p><p>deu sustentação a economias apoiadas em recursos igualmente</p><p>diferenciados, com distintos pesos da indústria na determinação do</p><p>crescimento urbano10. Como resultado, o estado de São Paulo</p><p>apresenta importante heterogeneidade regional sobre a qual se</p><p>conformam as atuais relações campo/cidade.</p><p>O processo de interiorização do desenvolvimento em São Paulo,</p><p>a partir dos anos 1970 e 1980, e a modernização da agricultura</p><p>selecionaram as regiões industrializadas e agrícolas do estado,</p><p>fortalecendo a região centro-leste paulista. Os anos 1990 e 2000</p><p>trouxeram uma nova dinâmica mundial de reestruturação da</p><p>produção em moldes flexíveis na indústria11; no caso brasileiro,</p><p>Cano12 acrescenta a adoção na exportação de commodities</p><p>agrícolas.</p><p>Para Caiado e Santos13, as novas espacialidades da rede urbana</p><p>paulista refletem o caráter contraditório de nosso dinamismo</p><p>econômico que, embora tenha produzido uma região formada</p><p>principalmente por grandes cidades onde se concentram a indústria</p><p>e os serviços mais complexos, repercutiu na formação de espaços</p><p>às margens desses processos, nos quais se verifica a presença</p><p>majoritária de pequenos municípios de atividade industrial e</p><p>mercado urbano reduzidos.</p><p>Essas são as áreas onde a penetração do plantio e produção da</p><p>cana-de-açúcar tem se intensificado no estado de São Paulo em</p><p>anos recentes, como indicado no Mapa 11.1, onde se pode verificar</p><p>a importância das porções nordeste, norte e noroeste paulistas</p><p>nesse processo de expansão regional.</p><p>Mapa 11.1 – Produção de cana-de-açúcar por toneladas – estado</p><p>de São Paulo, 2006.</p><p>Fonte: Elaboração dos autores com dados da Fundação Seade.</p><p>Oliveira14, comparando a expansão da cana nas regiões de</p><p>Ribeirão Preto e Presidente Prudente, aponta a importância da</p><p>estruturação, da densidade de relações e articulações que a</p><p>dinâmica regional exerce no Complexo Agroindustrial (CAI)</p><p>canavieiro.</p><p>Distinguindo-se pela maior centralidade regional e conexões com escalas</p><p>espaciais mais amplas, Ribeirão Preto expressa uma maior relevância em</p><p>termos de seu papel nas redes urbanas estadual e nacional, assim como em</p><p>suas articulações com redes globais. A importância do CAI canavieiro se</p><p>vincula a essa relevância, estabelecendo conexões mais coesas entre os</p><p>centros urbanos constituintes dessa rede regional, o que se diferencia na</p><p>região de Presidente Prudente […] O complexo conjunto de articulações</p><p>materializado nas dinâmicas regionais e locais do CAI canavieiro expressa</p><p>as relações entre processos ocorridos nestas escalas e o que ocorre</p><p>nacional e globalmente15.</p><p>Desse modo, a dinâmica socioespacial da expansão das áreas de</p><p>plantio e produção da cana no interior paulista revela, de um lado,</p><p>elementos da histórica configuração da rede urbana estadual16, com</p><p>o avanço tardio do processo de urbanização em direção à porção</p><p>centro-oeste do estado17; de outro lado, o papel da dinâmica</p><p>regional atual como articuladora do CAI canavieiro em diferentes</p><p>escalas, do local ao global18.</p><p>11.3 População Economicamente</p><p>Ativa no cultivo da cana</p><p>A população economicamente ativa (PEA) inserida no cultivo da</p><p>cana em São</p><p>Paulo representava, em 2010, 70.199 pessoas, o que</p><p>correspondia a apenas 0,38% do total da população</p><p>economicamente ativa do estado (Tabela 11.1).</p><p>Tabela 11.1 – População Economicamente Ativa</p><p>(população de 10-64 anos de idade) Total e População</p><p>Economicamente Ativa no cultivo da cana.</p><p>Mesorregião, estado de São Paulo, 2010</p><p>Mesorregião PEA</p><p>TOTAL</p><p>PEA no</p><p>cultivo da</p><p>cana</p><p>Distribuição</p><p>PEA Cana%</p><p>São José do Rio</p><p>Preto</p><p>754.096 14.303 20,37</p><p>Ribeirão Preto 1.121.652 15.714 22,38</p><p>Araçatuba 314.975 5.947 8,47</p><p>Bauru 662.655 6.759 9,63</p><p>Araraquara 380.292 5.192 7,40</p><p>Piracicaba 646.685 4.849 6,91</p><p>Campinas 1.785.194 3.183 4,53</p><p>Presidente</p><p>Prudente</p><p>355.031 5.682 8,09</p><p>Marília 196.788 432 0,62</p><p>Assis 239.954 5.805 8,27</p><p>Itapetininga 338.486 1.238 1,76</p><p>Macro</p><p>Metropolitana</p><p>Paulista</p><p>1.208.942 475 0,68</p><p>Vale do Paraíba</p><p>Paulista</p><p>994.700 339 0,48</p><p>Litoral Sul</p><p>Paulista</p><p>171.246 17 0,02</p><p>Metropolitana de</p><p>São Paulo</p><p>9.457.776 264 0,38</p><p>Estado de São</p><p>Paulo</p><p>18.628.471 70.199 100,00</p><p>Fonte: Elaboração dos autores com dados da FIBGE, Censo</p><p>Demográfico 2010. Observatório das Migrações em São Paulo.</p><p>As mesorregiões de Ribeirão Preto e São José do Rio Preto</p><p>concentravam 22,4% e 20,4% do total da PEA no cultivo da cana no</p><p>estado de São Paulo em 2010, seguidas das mesorregiões de</p><p>Bauru, Araçatuba, Assis e Presidente Prudente, com cerca de 8%</p><p>dessa PEA em cada região.</p><p>Nota-se, portanto, a interiorização crescente da PEA no cultivo da</p><p>cana, fazendo despontarem regiões como Assis (com 5.805</p><p>pessoas na PEA no cultivo da cana) e superando regiões mais</p><p>tradicionais como Piracicaba (com 4.849).</p><p>Essa interiorização longínqua da expansão da cana também pode</p><p>ser verificada quando é comparada com a distribuição da PEA total</p><p>por região, pois se nota que a concentração da PEA, em termos de</p><p>volume, está nas regiões metropolitanas. Essas regiões, juntamente</p><p>com o Litoral e Vale do Paraíba, apresentam baixa inserção da PEA</p><p>no cultivo da cana-de-açúcar.</p><p>Considerando a proporção da PEA no cultivo da cana-de-açúcar</p><p>(Tabela 11.2), de acordo com os dados do Censo Demográfico de</p><p>2010, é a Mesorregião de Assis aquela que apresenta a maior</p><p>participação da PEA nesse cultivo. Representando 2,41% do total</p><p>da PEA dessa mesorregião, ela superou as regiões de São José do</p><p>Rio Preto, com 1,89% de sua PEA no cultivo da cana, de Araçatuba,</p><p>com 1,88%, e de Ribeirão Preto, com 1,4%.</p><p>Tabela 11.2 – Proporção da PEA no cultivo da cana-</p><p>de-açúcar no total da PEA. Mesorregiões, estado de</p><p>São Paulo, 2010</p><p>Mesorregião PEA</p><p>TOTAL</p><p>PEA no</p><p>cultivo da</p><p>cana</p><p>Proporção da</p><p>PEA Cana no</p><p>total (%)</p><p>São José do</p><p>Rio Preto</p><p>754.096 14.303 1,89</p><p>Ribeirão Preto 1.121.652 15.714 1,40</p><p>Araçatuba 314.975 5.947 1,88</p><p>Bauru 662.655 6.759 1,02</p><p>Araraquara 380.292 5.192 1,36</p><p>Piracicaba 646.685 4.849 0,75</p><p>Campinas 1.785.194 3.183 0,17</p><p>Presidente</p><p>Prudente</p><p>355.031 5.682 1,60</p><p>Marília 196.788 432 0,21</p><p>Assis 239.954 5.805 2,41</p><p>Itapetininga 338.486 1.238 0,36</p><p>Macro</p><p>Metropolitana</p><p>Paulista</p><p>1.208.942 475 0,039</p><p>Vale do</p><p>Paraíba</p><p>Paulista</p><p>994.700 339 0,034</p><p>Litoral Sul</p><p>Paulista</p><p>171.246 17 0,01</p><p>Metropolitana</p><p>de São Paulo</p><p>9.457.776 264 0,0028</p><p>Estado de</p><p>São Paulo</p><p>18.628.471 70.199 0,377</p><p>Fonte: Elaboração dos autores com dados da FIBGE, Censo</p><p>Demográfico 2010. Observatório das Migrações em São Paulo.</p><p>A mesorregião de Assis é composta por 35 municípios,</p><p>destacando-se nessa mesorregião o município de Paraguaçu</p><p>Paulista, que apresenta a quarta maior área de cultivo de cana-de-</p><p>açúcar do estado de São Paulo, segundo dados da Fundação</p><p>Seade19.</p><p>Além das mesorregiões de São José do Rio Preto, Ribeirão Preto,</p><p>Araçatuba e Presidente Prudente, as regiões de Araraquara e Bauru</p><p>também apresentavam, em 2010, proporção importante da PEA no</p><p>cultivo da cana-de-açúcar (1,36% e 1,02%, respectivamente) e</p><p>passaram a se configurar como importantes espaços da produção</p><p>da cana no estado de São Paulo em períodos recentes.</p><p>11.4 População Migrante</p><p>Economicamente Ativa no cultivo da</p><p>cana</p><p>A partir das informações do Censo Demográfico de 2010 é</p><p>possível identificar a entrada de migrantes que permaneceram nas</p><p>regiões e estavam no cultivo da cana-de-açúcar em 2010 (Tabela</p><p>11.3). Do total da PEA estadual no cultivo da cana no estado de São</p><p>Paulo (70.199 pessoas), cerca de 24%</p><p>Tabela 11.3 – População migrante (menos de 5 anos de</p><p>residência no município) Economicamente Ativa e</p><p>População Não Migrante Economicamente Ativa no</p><p>cultivo da cana, mesorregiões do estado de São Paulo,</p><p>2010</p><p>Mesorregião PEA</p><p>no</p><p>cultivo</p><p>da</p><p>cana</p><p>PEA no</p><p>cultivo da</p><p>cana,</p><p>residente</p><p>no</p><p>município</p><p>há menos</p><p>de 5 anos</p><p>(migrantes)</p><p>Proporção</p><p>de</p><p>migrantes</p><p>na PEA</p><p>Cana (%)</p><p>PEA no</p><p>cultivo</p><p>da cana</p><p>residente</p><p>há mais</p><p>de 5</p><p>anos e</p><p>naturais</p><p>São José do</p><p>Rio Preto</p><p>14.303 4.212 29,45 10.091</p><p>Ribeirão</p><p>Preto</p><p>15.714 4.314 27,45 11.399</p><p>Araçatuba 5.947 1.841 30,96 4.105</p><p>Bauru 6.759 999 14,78 5.759</p><p>Araraquara 5.192 972 18,72 4.221</p><p>Piracicaba 4.849 1.182 24,38 3.667</p><p>Campinas 3.183 993 31,20 2.191</p><p>Presidente</p><p>Prudente</p><p>5.682 1.073 18,88 4.609</p><p>Marília 432 134 31,02 298</p><p>Assis 5.805 852 14,68 4.954</p><p>Itapetininga 1.238 146 11,79 1.092</p><p>Macro</p><p>Metropolitana</p><p>Paulista</p><p>475 45 9,47 429</p><p>Mesorregião PEA</p><p>no</p><p>cultivo</p><p>da</p><p>cana</p><p>PEA no</p><p>cultivo da</p><p>cana,</p><p>residente</p><p>no</p><p>município</p><p>há menos</p><p>de 5 anos</p><p>(migrantes)</p><p>Proporção</p><p>de</p><p>migrantes</p><p>na PEA</p><p>Cana (%)</p><p>PEA no</p><p>cultivo</p><p>da cana</p><p>residente</p><p>há mais</p><p>de 5</p><p>anos e</p><p>naturais</p><p>Vale do</p><p>Paraíba</p><p>Paulista</p><p>339 49 14,45 290</p><p>Litoral Sul</p><p>Paulista</p><p>17 -- -- 17</p><p>Metropolitana</p><p>de São Paulo</p><p>264 77 29,17 187</p><p>Estado de</p><p>São Paulo</p><p>70.199 16.889 24,06 53.310</p><p>Fonte: Elaboração dos autores com dados da FIBGE, Censo</p><p>Demográfico 2010. Observatório das Migrações em São Paulo.</p><p>(16.889 pessoas) migraram no período 2005-2010 para os</p><p>municípios das me sorregiões.</p><p>As mesorregiões que apresentaram maior peso de migrantes</p><p>recentes ocupados no cultivo de cana-de-açúcar, em 2010, foram:</p><p>Campinas com 31,2% de migrantes no total de sua PEA no cultivo</p><p>da cana e que chegaram entre 2005-2010; Marília, com 31,0% de</p><p>migrantes na PEA na cana; Araçatuba, com 30,9%; e São José do</p><p>Rio Preto, com 29,4% de migrantes em sua PEA na cana. Porém,</p><p>verifica-se que em todas as mesorregiões há importante</p><p>participação de migrantes recentes na PEA no cultivo da cana-de-</p><p>açúcar.</p><p>A PEA não migrante e migrante há mais de 5 anos no município e</p><p>inserida no cultivo da cana totalizava, em 2010, 53.310 pessoas,</p><p>denotando, de um lado, a permanência de migrantes no município e</p><p>inseridos no cultivo da cana e, de outro lado, a participação de</p><p>naturais inseridos no cultivo da cana.</p><p>Essa dinâmica da presença recente do imigrante ou ainda</p><p>daqueles residentes há mais de cinco anos ou naturais do município</p><p>pode apontar para novos espaços da produção paulista, bem como</p><p>novas formas de organização de toda a cadeia produtiva e de</p><p>circulação de trabalhadores.</p><p>De fato, regiões como a de Araçatuba, que sofreu com o êxodo</p><p>rural nas décadas de 1950 e 1960, experimenta uma recuperação</p><p>desse esvaziamento populacional, em função da abertura de novos</p><p>espaços econômicos rurais, impulsionada pelo avanço das</p><p>atividades agrícolas e pecuárias20. Não por acaso, a mesorregião de</p><p>Araçatuba está entre as que apresentam maior peso de migrantes</p><p>recentes ocupados no cultivo da cana-de-açúcar no estado de São</p><p>Paulo.</p><p>11.5 Migração de trabalhadores rurais</p><p>para o corte da cana</p><p>As recentes transformações na estrutura produtiva têm</p><p>colaborado para a constituição de uma força de trabalho excedente</p><p>móvel, que ora se emprega nos serviços urbanos, ora nas</p><p>atividades agrícolas, compondo um movimento de circularidade</p><p>migratória21.</p><p>Os trabalhadores rurais migrantes para o corte da cana ilustram</p><p>essa força de trabalho, que se mobiliza em função das dificuldades</p><p>de inserção ocupacional na origem e se dirige às áreas de</p><p>penetração do capital internacional no meio agrícola22.</p><p>Desse modo, as mudanças na cartografia migratória23 explicam a</p><p>intensa circularidade dos trabalhadores rurais na cana. A migração</p><p>sazonal de trabalhadores rurais da região Nordeste aos canaviais de</p><p>São Paulo tem se apresentado como importante</p><p>fluxo migratório na</p><p>cartografia migratória paulista.</p><p>Novaes24 aponta que esses migrantes, em sua maioria jovens e</p><p>pertencentes ao sexo masculino, deslocam-se anualmente,</p><p>permanecendo cerca de nove meses nos canaviais paulistas, ao fim</p><p>dos quais retornam às regiões de origem25.</p><p>As redes migratórias, através de seus vários agentes26, conectam</p><p>demandas dos empresários e interesses dos trabalhadores,</p><p>arregimentando mão de obra e dando suporte ao deslocamento</p><p>para as áreas produtoras e ao estabelecimento no destino27.</p><p>De acordo com Oliveira28,</p><p>[…] a circulação de capitais que beneficia o CAI canavieiro, amplia áreas</p><p>produtoras, quantidades produzidas e, consequentemente, a demanda por</p><p>trabalhadores. Conectam-se áreas de origem e áreas de destino, as</p><p>primeiras como “fontes” de mão de obra e as últimas como lócus de</p><p>investimentos em atividades que as demandam. Como as dinâmicas do CAI</p><p>canavieiro são caracterizadas por este conjunto de articulações entre</p><p>processos multiescalares, a mobilidade espacial de trabalhadores agrícolas</p><p>também se vincula a estas.</p><p>No movimento sazonal do corte da cana, as idas e vindas de</p><p>trabalhadores rurais migrantes se expressam tanto pela</p><p>formalização do trabalho quanto pelos desligamentos dos</p><p>trabalhadores ao final da safra. Oliveira29 aponta que cerca de 65%</p><p>dos trabalhadores rurais são desligados ao final da safra.</p><p>Nas entrevistas realizadas com trabalhadores rurais migrantes no</p><p>corte da cana em Barrinha, SP, foi possível observar as trajetórias</p><p>de migração oriundas de áreas rurais, com movimentos migratórios</p><p>e inserções ocupacionais que oscilam entre atividades agrícolas</p><p>sazonais e atividades no setor terciário e agrícola na origem</p><p>migratória. Maciel e Favoretto30 constatam que os trabalhos</p><p>relacionados à agroindústria da cana passam a ordenar o</p><p>movimento e organização interna de famílias migrantes, localizadas</p><p>nas periferias dos municípios.</p><p>Assim, o cenário das commodities agrícolas tenderá a demandar</p><p>a continuidade dessa força de trabalho móvel para São Paulo,</p><p>representada pelos trabalhadores migrantes no corte da cana. Os</p><p>espaços da migração se ampliam e se expandem, marcados por um</p><p>mar de cana na paisagem do interior paulista.</p><p>11.6 Considerações finais</p><p>A nova fase de acumulação capitalista, ao pressupor uma intensa</p><p>mobilidade do capital e da força de trabalho, desencadeia uma nova</p><p>configuração dos processos internos de redistribuição populacional,</p><p>em que a migração de trabalhadores rurais para o corte da cana é</p><p>um dos componentes da dinâmica da produção de commodities</p><p>agrícolas.</p><p>Assim, a necessidade/demanda por força de trabalho dependerá</p><p>da ligação dos espaços da produção na economia globalizada31. O</p><p>modo como cada região é conectada ao mercado mundial empresta</p><p>novas e diferentes características aos movimentos migratórios,</p><p>incluindo os sazonais.</p><p>As regiões do interior paulista desenhadas como áreas para a</p><p>expansão do cultivo da cana se inserem na nova ordem econômica,</p><p>que tem ocorrido por meio da expansão de uma agricultura pautada</p><p>na produção de commodities e orientada por investimentos</p><p>estrangeiros32.</p><p>Considera-se que essa peculiar forma de internacionalização</p><p>econômica tem desdobramentos igualmente específicos na</p><p>configuração migratória das regiões, com a fluidez da força de</p><p>trabalho. As transformações na estrutura produtiva desencadeada</p><p>pela expansão das commodities têm levado à formação de um</p><p>excedente populacional de origem rural que – seja no mercado</p><p>formal ou informal, nos espaços urbanos ou rurais – apresenta</p><p>intensa mobilidade espacial.</p><p>Referências bibliográficas</p><p>ALVES, F. “Migração de trabalhadores rurais do Maranhão e Piauí</p><p>para o corte de cana em São Paulo. Será este um fenômeno casual</p><p>ou recorrente da estratégia empresarial do Complexo Agroindustrial</p><p>Canavieiro?”. In: NOVAES, J. R. & ALVES, F. (orgs.). Migrantes.</p><p>Trabalho e trabalhadores no Complexo Agroindustrial Canavieiro (os</p><p>heróis do agronegócio brasileiro). São Carlos, EdUfscar, 2007, pp.</p><p>21-54.</p><p>BAENINGER, R. Fases e faces da migração em São Paulo.</p><p>Campinas, Núcleo de Estudos de População – NEPO/Unicamp,</p><p>2012.</p><p>CAIADO, A. S. C. & SANTOS, S. M. M. “Urbano ou rural? Um olhar</p><p>sobre processos socioespaciais em curso no estado e São Paulo”.</p><p>In: XIV Encontro Nacional de Estudos Populacionais. Anais…</p><p>Caxambu, 20 a 24 de setembro de 2004, pp. 1-9.</p><p>______. “Ocupações urbanas em áreas rurais: Estudo sobre</p><p>processos socioespaciais em curso no estado de São Paulo”. In: XV</p><p>Encontro Nacional de Estudos Populacionais. Anais… Caxambu, 18</p><p>a 22 de setembro de 2006, pp. 1-17.</p><p>CANO, W. “Novas determinações sobre as questões regional e</p><p>urbana após 1980”. Texto para Discussão, Campinas, IE/Unicamp,</p><p>n. 193, julho 2011, pp. 1-36.</p><p>CORRÊA, R. L. Estudos sobre a rede urbana. Rio de Janeiro,</p><p>Bertrand Brasil, 2006.</p><p>DEDECCA, C. S. & MENDES, M. M. B. “O sistema de justiça, a</p><p>regulação pública e a formalização do trabalho no complexo</p><p>sucroalcooleiro”. Revista do Tribunal Regional do Trabalho, 3ª</p><p>Região, Belo Horizonte, vol. 50, n. 80, 2009, pp. 207-225.</p><p>DEMETRIO, N. B. População e dinâmica econômica na região de</p><p>governo de Jales: O outro rural do oeste paulista. Campinas,</p><p>Instituto de Filosofia e Ciências Humanas – IFCH, Unicamp, 2013</p><p>(Dissertação de Mestrado).</p><p>FAVARETO, A. da S. “A longa evolução da relação rural-urbano:</p><p>Para além de uma abordagem normativa do desenvolvimento rural”.</p><p>Ruris, vol. 1, n. 1, 2007a, pp.157-190.</p><p>______. Paradigmas do desenvolvimento rural em questão. São</p><p>Paulo, Iglu/Fapesp, 2007b.</p><p>GONÇALVES, M. F. As engrenagens da locomotiva: Ensaio sobre a</p><p>formação urbana paulista. Campinas, Instituto de Filosofia e</p><p>Ciências Humanas – IFCH, Unicamp, 1998 (Tese de Doutorado).</p><p>HARVEY, D. Condição pós-moderna: Uma pesquisa sobre as</p><p>origens da mudança cultural. São Paulo, Edições Loyola, 1992.</p><p>MACIEL, L. & FAVORETTO, T. Migração e pendularidade entre</p><p>famílias de trabalhadores rurais no interior de São Paulo. Campinas,</p><p>NEPO/Unicamp-Fapesp/CNPq, 2013. (Coleção por Dentro do</p><p>Estado de São Paulo, vol. 10)</p><p>MARTINE, G. & McGRANAHAN, G. “A transição urbana brasileira:</p><p>Trajetória, dificuldades e lições aprendidas”. In: BAENINGER, R.</p><p>(org.). População e cidades: Subsídios para o planejamento e para</p><p>as políticas sociais. Campinas/Brasília, Núcleo de Estudos de</p><p>População-Nepo-Unicamp/Unfpa, 2010.</p><p>MENEZES, M. A. Redes e enredos nas trilhas dos migrantes: Um</p><p>estudo de famílias de camponeses-migrantes. Rio de Janeiro/João</p><p>Pessoa, Relume Dumará/Ed. UFPB, 2002.</p><p>MENEZES, M. A. & SATURNINO, M. “As migrações sazonais do</p><p>sertão paraibano para as usinas canavieiras de São Paulo”. In:</p><p>NOVAES, J. R. & ALVES, F. (orgs.). Migrantes. Trabalho e</p><p>trabalhadores no Complexo Agroindustrial Canavieiro (os heróis do</p><p>agronegócio brasileiro). São Carlos, EdUfscar, 2007, pp. 233-256.</p><p>MORAES, M. A. F. D. “O mercado de trabalho da agroindústria</p><p>canavieira: Desafios e oportunidades”. Economia Aplicada, vol. 11,</p><p>n. 4, 2007, pp. 605-619.</p><p>MORAES, M. A. F. D.; FIGUEIREDO, M. G. & OLIVEIRA, F. C. B.</p><p>“Migração de trabalhadores na lavoura canavieira paulista: Uma</p><p>investigação dos impactos socioeconômicos nas cidades de Pedra</p><p>Branca, estado do Ceará, e de Leme, estado de São Paulo”. Revista</p><p>de Economia Agrícola, vol. 56, n. 2, 2009, pp. 21-35.</p><p>NEGRI, B.; GONÇALVES, M. F. & CANO, W. “O processo de</p><p>interiorização do desenvolvimento e da urbanização no estado de</p><p>São Paulo (1920-1980)”. In: CANO, W. (org.). A interiorização do</p><p>desenvolvimento econômico no estado de São Paulo (1920-1980).</p><p>São Paulo, Seade, 1988, pp. 5-93.</p><p>NOVAES, J. R. P. “Idas e vindas: Disparidades e conexões</p><p>regionais. Um estudo sobre o trabalho temporário de nordestinos na</p><p>safra da cana paulista”. In: NOVAES, J. R. & ALVES, F. (orgs.).</p><p>Migrantes. Trabalho e trabalhadores no Complexo Agroindustrial</p><p>Canavieiro (os heróis do agronegócio brasileiro). São Carlos,</p><p>EdUfscar, 2007, pp. 87-117.</p><p>NOVAES, J. R. P. “Trabalho nos canaviais. Os jovens entre a</p><p>enxada e o facão”. Ruris, vol. 3, n. 1, 2009, pp. 105-127.</p><p>OLIVEIRA, R. A. D. de. Mobilidade circular de cortadores</p><p>de cana e</p><p>divisão espacial do trabalho: Expressões regionais na década de</p><p>2000. Campinas, Instituto de Filosofia e Ciências Humanas – IFCH,</p><p>Unicamp, 2012 (Tese de Doutorado).</p><p>RAMOS, P. “O futuro da ocupação na agroindústria canavieira do</p><p>Brasil: Uma discussão dos trabalhos disponíveis e um exercício de</p><p>estimação”. Informações Econômicas, vol. 37, n. 11, nov. 2007, pp.</p><p>69-75.</p><p>SEADE – Fundação Sistema Estadual de Análise de Dados. Portal</p><p>de Estatísticas do Estado de São Paulo. Disponível em:</p><p><http://www.seade.gov.br/>.</p><p>SILVA, M. A. M. Errantes do fim do século. São Paulo, Editora</p><p>Unesp, 1998.</p><p>______. “Trabalho e trabalhadores na região do ‘mar de cana e do</p><p>rio de álcool’”. In: NOVAES, J. R. & ALVES, F. (orgs.). Migrantes.</p><p>Trabalho e trabalhadores no Complexo Agroindustrial Canavieiro (os</p><p>heróis do agronegócio brasileiro). São Carlos, EdUfscar, 2007, pp.</p><p>55-86.</p><p>SINGER, P. “Migrações internas: Considerações teóricas sobre o</p><p>seu estudo”. In: MOURA, H. (org.). Migração interna: Textos</p><p>selecionados. Fortaleza, Banco do Nordeste do Brasil S. A., 1980.</p><p>TARTAGLIA, J. C. & OLIVEIRA, O. L. “Agricultura paulista e sua</p><p>dinâmica regional (1920-1980)”. In: CANO, W. (org.). A</p><p>interiorização do desenvolvimento econômico no estado de São</p><p>Paulo (1920-1980). São Paulo, Seade, 1988, pp. 5-93.</p><p>TORQUATO, S. A. & BINI, D. L. C. “Crise na cana?”. Análise e</p><p>indicadores do agronegócio, vol. 4, n. 2, 2009, pp. 1-5.</p><p>VEIGA FILHO, A. A. & RAMOS, P. “Proálcool e evidências de</p><p>concentração na produção e processamento de cana-de-açúcar”.</p><p>Informações Econômicas, vol. 36, n. 7, 2006, pp. 48-61.</p><p>WANDERLEY, M. N. B. “A emergência de uma nova ruralidade nas</p><p>sociedades modernas avançadas – O rural como espaço singular e</p><p>ator coletivo”. Estudos Sociedade e Agricultura, n. 15, 2000, pp. 87-</p><p>145.</p><p>______. Um saber necessário: Os estudos rurais no Brasil.</p><p>Campinas, Editora da Unicamp, 2011.</p><p>http://www.seade.gov.br/</p><p>Parte 4 - Impactos da inovação</p><p>para o atendimento das</p><p>demandas futuras do etanol e</p><p>na adaptação setorial às</p><p>mudanças climáticas</p><p>Introdução</p><p>Silvia Angélica Domingues de Carvalho</p><p>O dinamismo do sistema setorial de inovação constituído em torno</p><p>da agroindústria do açúcar e do álcool é decisivo para garantir as</p><p>metas de expansão da produção de etanol dentro de um contexto</p><p>de adaptação às mudanças climáticas. Como sistema de inovação</p><p>setorial entende-se a interação estreita entre usinas, fornecedores</p><p>de bens de capital, plantadores de cana-de-açúcar, centros de</p><p>pesquisa, universidades e órgãos federais e estaduais. Entre os</p><p>grandes desafios colocados para esse sistema de inovação está a</p><p>questão do deslocamento da cultura da cana para as regiões</p><p>Central e Norte do país. A adaptação da agricultura às novas</p><p>condições climáticas será vital para que o Brasil possa manter sua</p><p>posição atual de grande produtor e exportador de produtos agrícolas</p><p>e, no caso específico do etanol, atender às demandas projetadas</p><p>para o futuro.</p><p>A adaptação representa os ajustes para melhorar a viabilidade</p><p>das atividades econômicas e sociais e reduzir sua vulnerabilidade</p><p>às mudanças climáticas, incluindo a variabilidade dessas mudanças</p><p>e os eventos extremos, bem como aqueles ajustes que deverão</p><p>ocorrer no longo prazo. A adaptação, portanto, está refletida nos</p><p>ajustes nos sistemas socioeconômico e ambiental, que ocorrem em</p><p>resposta a um estímulo climático atual ou esperado, incluindo seus</p><p>efeitos e impactos. A intensidade com que os sistemas naturais, a</p><p>oferta de alimentos e o desenvolvimento sustentável serão afetados</p><p>dependerá, em parte, da magnitude, velocidade e natureza da</p><p>mudança do clima, mas também da capacidade de os sistemas</p><p>afetados se adaptarem. Nesse caso, estudar a capacidade de</p><p>adaptação do setor sucroenergético nacional envolve avaliar a</p><p>vulnerabilidade e a sensibilidade desse setor à variabilidade</p><p>climática esperada a curto e a longo prazos.</p><p>Esta seção do livro, portanto, discute as condições para a</p><p>adaptação do setor sucroenergético brasileiro às mudanças</p><p>climáticas globais, tendo como foco o melhoramento genético da</p><p>cana-de-açúcar. A análise da capacitação tecnológica e dos</p><p>esforços para inovação dos programas de melhoramento genético,</p><p>bem como dos avanços na tecnologia e no conhecimento na área</p><p>de engenharia genética e em áreas relacionadas ao</p><p>desenvolvimento genético da cultura são elementos fundamentais</p><p>ao crescimento produtivo da cana-de-açúcar num quadro de maior</p><p>incerteza e hostilidade climática.</p><p>O desenvolvimento tecnológico também atua no apoio às políticas</p><p>que deverão ser empreendidas desde logo para garantir os</p><p>resultados almejados em termos de produtividade da cana-de-</p><p>açúcar, importando avaliar como a tecnologia e a inovação podem</p><p>contribuir para a adaptação da agricultura brasileira ao novo</p><p>contexto climático que se afigura no século presente.</p><p>A concentração atual da produção brasileira de cana-de-açúcar</p><p>em duas macrorregiões principais, Sudeste e Nordeste,</p><p>principalmente no estado de São Paulo, faz com que os sistemas de</p><p>produção utilizados (variedades, maquinaria e tratos culturais, por</p><p>exemplo) sejam adequados às condições existentes nelas. A</p><p>expansão da cana-de-açúcar para outras regiões do Brasil</p><p>requererá uma adaptação das variedades utilizadas atualmente,</p><p>além de ser necessário desenvolver novas variedades para as</p><p>regiões atualmente produtoras, dependendo do impacto das</p><p>mudanças climáticas sobre o desenvolvimento e a produtividade</p><p>delas. O potencial de geração de etanol celulósico em nível</p><p>industrial também deverá representar um ganho de produtividade</p><p>sem aumento de área.</p><p>Os capítulos desta parte apresentam, na sequência:</p><p>Uma caracterização do melhoramento genético da cana-de-</p><p>açúcar no Brasil e a análise de seu papel no desenvolvimento</p><p>tecnológico do setor, salientando os esforços tecnológicos</p><p>empreendidos pelos principais programas de melhoramento</p><p>genético de cana no país, e como eles podem auxiliar no</p><p>processo de adaptação do setor às mudanças climáticas;</p><p>As estratégias genéticas e genômicas disponíveis na</p><p>biotecnologia, visando compreender e desvendar o complexo</p><p>genoma da cana-de-açúcar, o que torna possível a aplicação</p><p>dessas ferramentas no melhoramento genético da espécie.</p><p>Entre essas ferramentas da biologia molecular destacam-se: i)</p><p>Os marcadores moleculares; ii) As bibliotecas de BAC (Bacterial</p><p>Artificial Chromosome); e iii) O transcriptoma. A utilização</p><p>desses recursos permite, entre outros, a identificação de</p><p>possíveis genes associados à resposta ao estresse hídrico e/ou</p><p>às variações de temperatura, podendo auxiliar programas de</p><p>melhoramento no desenvolvimento de variedades adaptadas a</p><p>essas novas condições climáticas;</p><p>Uma discussão das relações entre a inovação, desenvolvimento</p><p>tecnológico e adaptação, buscando ampliar o debate teórico e</p><p>oferecendo subsídios para a formulação de políticas para o</p><p>setor de etanol. Especialmente no que se refere à agricultura e,</p><p>mais especificamente, à produção de cana-de-açúcar, o</p><p>capítulo faz uma análise sobre o desenvolvimento tecnológico e</p><p>as possibilidades políticas para diminuir e/ou evitar os prejuízos</p><p>causados pelas mudanças climáticas, ou seja, sobre a</p><p>promoção de medidas de adaptação.</p><p>12. Geração e difusão de</p><p>tecnologias para a produção de</p><p>cana-de-açúcar no brasil: uma</p><p>análise dos programas de</p><p>melhoramento genético</p><p>Silvia Angélica Domingues de Carvalho, André Tosi Furtado</p><p>Processo Fapesp 2008/58160-5</p><p>12.1 Introdução</p><p>O objetivo deste capítulo é caracterizar o melhoramento genético</p><p>da cana-de-açúcar no Brasil, analisar as variedades cultivadas na</p><p>última década e os esforços tecnológicos empreendidos pelos</p><p>programas no desenvolvimento recente de variedades. Vislumbra-se</p><p>que a necessidade de expansão da área produtiva de cana-de-</p><p>açúcar no país esteja diretamente relacionada à capacidade de o</p><p>sistema de inovação setorial desenvolver variedades de cana-de-</p><p>açúcar mais produtivas e adaptadas às novas condições de solo e</p><p>clima.</p><p>A base desta análise é o projeto “Pesquisa e Desenvolvimento em</p><p>Produção de Álcool e as Mudanças Climáticas Globais”, que</p><p>de gestão ambiental; estudos de</p><p>impactos de mudanças climáticas globais; e promover ações de</p><p>manejo visando evitar ou controlar a ação de pragas e doenças de</p><p>plantas com base em sua relação com o clima.</p><p>Dessa forma, pode-se afirmar que a disponibilidade de uma ampla</p><p>base de dados meteorológica precisa, completa e confiável é uma</p><p>ferramenta essencial ao estudo e gestão de processos agrícolas,</p><p>pecuários e florestais.</p><p>1.3.2 Inovação & meteorologia: Instrumentos,</p><p>colaboração e práticas</p><p>O processo de inovação tecnológica assume características</p><p>particulares de acordo com o setor econômico e o campo científico</p><p>envolvido em um estudo14. Dessa forma, cabe, neste trabalho,</p><p>abordar e descrever as condições específicas em que se dá o</p><p>processo inovador na meteorologia.</p><p>A inovação tecnológica em meteorologia e agrometeorologia está</p><p>intimamente associada às transformações que se iniciaram nos</p><p>séculos XVII e XVIII envolvendo a evolução dos instrumentos de</p><p>medição e coleta de dados, dos mecanismos de comunicação e das</p><p>tecnologias para armazenamento e processamento dos dados</p><p>coletados.</p><p>A invenção e aplicação de numerosos equipamentos de medição</p><p>de dados atmosféricos, tais como barômetro e termômetro,</p><p>intensificou-se a partir do século XVII15. Nesse período, as</p><p>sociedades científicas da Europa promoveram a coleta de dados</p><p>meteorológicos para extensas áreas. Há relatos de observações</p><p>sistemáticas na Alemanha, Rússia e Estados Unidos no século XVIII.</p><p>A existência de ações tecnológicas colaborativas na meteorologia</p><p>é relatada desde o século XVIII, com o registro de iniciativas</p><p>empreendidas na Europa, como o projeto Societas Meteorologia</p><p>Palatina, implementado na Alemanha em 1781, com o objetivo de</p><p>compreender a influência do tempo na agricultura e na saúde16.</p><p>No século XIX, a invenção e disseminação do uso do telégrafo (em</p><p>1850) tornou possível a transmissão dos dados e de informações de</p><p>previsão do tempo entre os membros de redes de observação</p><p>meteorológicas que estavam sendo formadas em vários países</p><p>europeus17. A disseminação de dados e informações através da rede</p><p>de comunicação dos Correios levou a um acúmulo de grandes</p><p>quantidades de dados de áreas geográficas mais amplas e permitiu a</p><p>geração de novos conhecimentos em meteorologia.</p><p>Destaca-se a importância da criação e consenso sobre padrões de</p><p>unidades de medida e procedimentos de coleta de dados no campo</p><p>para o desenvolvimento da meteorologia enquanto ciência.</p><p>Barboza18 descreve o caráter institucional do movimento de criação</p><p>de redes de observação meteorológica, ocorrido no início da década</p><p>de 1850, envolvendo iniciativas de vários estados nacionais para</p><p>estimular e patrocinar o desenvolvimento desses arranjos técnico-</p><p>científicos, visando melhorar práticas agrícolas, responder a</p><p>questões relativas à saúde, gerar alertas públicos sobre tempestades</p><p>e atender a necessidades militares19.</p><p>Naquela época, os meteorologistas perceberam que, para</p><p>entender o comportamento das condições meteorológicas,</p><p>precisavam não apenas de registros das condições atmosféricas em</p><p>um dado momento e local, mas também de observações simultâneas</p><p>feitas em intervalos regulares que seriam transferidas para um</p><p>escritório central, o que chamavam de observações sinópticas. E,</p><p>com base nessas medidas empíricas de pressão atmosférica,</p><p>começaram a ser calculadas e divulgadas as previsões sinópticas do</p><p>tempo. Mesmo que não fossem ainda muito acuradas e se</p><p>baseassem integralmente em dados empíricos, as previsões</p><p>sinópticas aumentaram a visibilidade da meteorologia enquanto</p><p>campo científico, bem como a de suas aplicações práticas.</p><p>Pode-se dizer, assim, que o emprego da infraestrutura de</p><p>comunicação do telégrafo e o movimento de institucionalização do</p><p>campo da Meteorologia, ocorrido a partir do século XIX, com o</p><p>patrocínio de muitos estados nacionais ao setor, criaram as bases</p><p>para a evolução das redes meteorológicas em várias partes do</p><p>mundo.</p><p>A Era Moderna da meteorologia, que se inicia no século XX,</p><p>caracteriza-se pela aproximação da meteorologia com as ciências</p><p>exatas e com teorias derivadas da matemática, da física e da</p><p>química. Esse período é marcado pelo desenvolvimento de modelos</p><p>numéricos de previsão do tempo, fundamentados na resolução de</p><p>equações que representam a dinâmica atmosférica e formam um</p><p>sistema não linear.</p><p>A invenção do primeiro computador (no final da década de 1940)</p><p>permitiu o cálculo da primeira previsão numérica do tempo, utilizando</p><p>os dados de observações do tempo recolhidos numa dada região. É</p><p>importante ressaltar que o desenvolvimento de modelos de previsão</p><p>numérica do tempo foi um empreendimento coletivo, envolvendo a</p><p>colaboração de várias instituições de diferentes setores e países, e a</p><p>partilha de recursos financeiros, humanos e administrativos20.</p><p>Os primeiros cálculos da previsão numérica do tempo foram</p><p>possíveis devido à convergência de vários fatores, como: a</p><p>disponibilidade de dados meteorológicos, o desenvolvimento de</p><p>equações de predição, a capacidade de processamento existente, a</p><p>experiência internacional, os recursos financeiros e o apoio de várias</p><p>instituições.</p><p>A evolução da microeletrônica gerou, na década de 1990,</p><p>computadores capazes de armazenar os dados transmitidos a partir</p><p>de estações localizadas em vários lugares e também de processá-los</p><p>e gerar previsões meteorológicas ou outros produtos meteorológicos.</p><p>Mesmo que ainda exista uma assimetria em relação ao acesso a</p><p>dados e informações disponíveis na internet, seja por razões de</p><p>infraestrutura (dados não disponíveis em regiões menos favorecidas)</p><p>ou econômicos (possibilidade de custeio destes dados e</p><p>equipamentos), essa nova realidade informacional possibilitou uma</p><p>ampla disseminação de dados e produtos meteorológicos em escala</p><p>nunca antes vista.</p><p>Edwards21 descreve a meteorologia como um sistema tecnológico</p><p>complexo que envolve: a transmissão de dados a partir de uma rede</p><p>de estações de observação em terra, mar, ar e espaço; a assimilação</p><p>desses dados por centros de processamento informatizado em</p><p>tempo real e sua redistribuição para outros serviços meteorológicos</p><p>localizados ao redor do mundo.</p><p>No século XX, novas formas de coletar dados foram</p><p>desenvolvidas, no âmbito do sistema tecnológico da meteorologia,</p><p>tais como radares, sensores e satélites, levando ao desenvolvimento</p><p>de estudos relacionados ao sensoriamento remoto. O</p><p>aperfeiçoamento dos instrumentos meteorológicos aumentou a</p><p>precisão dos dados e a facilidade de sua transmissão aos centros de</p><p>processamento, multiplicando os tipos de dados disponíveis para</p><p>análise e para os cálculos de previsão.</p><p>O desenvolvimento da tecnologia da informação e da capacidade</p><p>de processamento e armazenamento, em paralelo com o</p><p>desenvolvimento de instrumentos de medição, permitiu o uso de</p><p>novas técnicas de tratamento e também a construção de bases de</p><p>dados robustas e confiáveis. Um resultado importante de toda essa</p><p>inovação é a confiabilidade da previsão do tempo, que hoje é de</p><p>cerca de 98% no prazo de dois dias (48 horas).</p><p>Previsões numéricas são hoje utilizadas para evitar desastres</p><p>climáticos, para planejar empreendimentos militares e para a tomada</p><p>de decisão no setor agrícola, entre outras áreas. A aplicação da</p><p>meteorologia na agricultura é essencial, uma vez que todas as</p><p>facetas da atividade agrícola dependem do clima. Condições</p><p>climáticas adversas representam cerca de 80% da variabilidade que</p><p>ocorre na produção agrícola, o que faz da agricultura a atividade</p><p>econômica mais dependente das condições meteorológicas.</p><p>1.4 Metodologia</p><p>O Agritempo é um sistema web que oferece gratuitamente, desde</p><p>2003, dados e informações agrometeorológicas na internet para</p><p>acesso e uso de várias categorias de usuários como técnicos do</p><p>Governo Federal, secretarias de governo estaduais, produtores,</p><p>associações, cooperativas, instituições de pesquisa, universidades,</p><p>empresas privadas, dentre outras.</p><p>A pesquisa desenvolvida é de natureza qualitativa e foi conduzida</p><p>por intermédio de um estudo de caso22 que teve como unidade de</p><p>análise a rede de organizações mobilizada</p><p>integra</p><p>uma das grandes áreas de pesquisa do Projeto AlcScens. O foco</p><p>principal dessa grande área é avaliar o impacto das políticas de</p><p>inovação para o atendimento das demandas futuras do etanol e para</p><p>a adaptação da agricultura brasileira às mudanças climáticas.</p><p>Entende-se que o dinamismo do sistema setorial de inovação,</p><p>constituído em torno da agroindústria do açúcar e do álcool, será</p><p>decisivo para garantir as metas de expansão da produção de etanol</p><p>dentro de um contexto de adaptação às mudanças climáticas</p><p>globais. Entre os desafios colocados neste estudo está a expansão</p><p>da cultura da cana para as regiões Central e Norte do país, onde as</p><p>condições de solo e clima são totalmente diferentes das áreas</p><p>tradicionais de produção e, nesse sentido, políticas deverão ser</p><p>empreendidas para garantir os resultados almejados em</p><p>produtividade.</p><p>A capacitação que o Brasil possui na área de produção de cana-</p><p>de-açúcar pode ser demonstrada através do crescimento da</p><p>produção e da produtividade da cultura nos últimos 30 anos. No</p><p>entanto, quedas importantes na produção e na produtividade nas</p><p>últimas safras representam um alerta, pois ocorreram não somente</p><p>nas novas fronteiras produtivas do Centro-Oeste, mas também nas</p><p>áreas tradicionais de cultivo no Sudeste.</p><p>Este capítulo foi estruturado de forma a apresentar a metodologia</p><p>da pesquisa na seção dois, a evolução histórica e a expansão</p><p>recente da produção de cana-de-açúcar no Brasil na seção três, os</p><p>esforços tecnológicos e de inovação do melhoramento genético de</p><p>cana no país na quarta seção e, ao final, as considerações sobre o</p><p>trabalho.</p><p>12.2 Metodologia</p><p>Os meios para o desenvolvimento deste trabalho envolveram a</p><p>agregação de dados primários, por meio de visitas aos programas de</p><p>melhoramento, entrevistas com perguntas abertas aos</p><p>pesquisadores responsáveis pelos programas e a aplicação de</p><p>questionários com questões quantitativas sobre as atividades de</p><p>esforço tecnológico realizadas.</p><p>A construção dos indicadores setoriais também envolveu o</p><p>levantamento de dados secundários, obtidos por meio de</p><p>publicações técnicas das instituições de melhoramento, boletins de</p><p>cooperativas e associações de produtores e consultorias, como a</p><p>União dos Produtores de Bioenergia (UDOP), a União das Indústrias</p><p>de Cana-de-açúcar (UNICA), o Grupo Idea e o Portal nova-Cana.</p><p>Assim como foram utilizados dados setoriais das bases do Ministério</p><p>da Agricultura, Abastecimento e Pecuária (Mapa), do Instituto</p><p>Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), da Companhia Nacional</p><p>de Abastecimento (Conab), entre outras instituições. Informações</p><p>que foram complementadas com a participação em eventos, como o</p><p>Grande Encontro sobre Variedades de Cana-de-açúcar, em 2012 e</p><p>em 2014, e a reunião técnica de apresentação de novas variedades</p><p>ocorrida no Centro de Tecnologia Canavieira.</p><p>A revisão bibliográfica envolveu a literatura sobre mudanças</p><p>climáticas, adaptação e desenvolvimento tecnológico, referências na</p><p>área agronômica sobre solo, clima, fisiologia e melhoramento</p><p>genético de plantas, e uma ampla bibliografia setorial.</p><p>O estudo focou os três principais programas de melhoramento</p><p>genético de cana-de-açúcar no Brasil, brevemente descritos abaixo:</p><p>A Rede Interuniversitária para o Desenvolvimento do Setor</p><p>Sucroenergético (Ridesa), uma rede integrada por dez</p><p>universidades federais que herdou, em 1991, a estrutura da</p><p>extinta Planalsucar;</p><p>O Centro de Cana, do Instituto Agronômico de Campinas (IAC),</p><p>o mais antigo e tradicional programa de melhoramento de cana-</p><p>de-açúcar brasileiro;</p><p>O Centro de Tecnologia Canavieira (CTC), também com tradição</p><p>no melhoramento de cana, sofreu uma importante</p><p>reestruturação de suas atividades e tornou-se o segundo maior</p><p>programa brasileiro.</p><p>Atualmente, a Ridesa possui a maior participação de variedades</p><p>em área de produção de cana-de-açúcar, 62%; o CTC (sigla CTC e</p><p>SP, variedades da antiga Copersucar) possui a segunda maior área,</p><p>cerca de 33%; seguido do IAC com, aproximadamente, 1% de área</p><p>plantada com suas variedades. Esses programas representam 99%</p><p>de toda a área cultivada com cana-de-açúcar no país, como aponta a</p><p>Tabela 12.1.</p><p>Tabela 12.1 – Variedades de cana-de-açúcar mais</p><p>plantadas e cultivadas no Brasil, safra 2012</p><p>Variedades/Sigla Área %</p><p>RB – Ridesa 3.970.657 62,0</p><p>SP – Copersucar, hoje CTC 1.836.713 28,7</p><p>CTC 330.559 5,2</p><p>IAC 56.222 0,9</p><p>CV – CanaVialis (Monsanto) 778 0,0</p><p>PO – Cosan 23.283 0,4</p><p>Outras 187.931 2,9</p><p>Total 6.406.143 100,0</p><p>Área cultivada (ha) 8.485.000</p><p>Área amostrada (%) 75,5</p><p>Fonte: Censo Varietal da Ridesa1.</p><p>Os entrevistados para a pesquisa foram: o coordenador geral da</p><p>Ridesa, o coordenador da área de melhoramento genético de cana</p><p>do IAC, o gerente comercial de variedades e o gerente de</p><p>biotecnologia do CTC. Considerando as dez universidades federais</p><p>que compõem a Ridesa (que, embora ligadas em rede, possuem</p><p>independência no desenvolvimento das pesquisas), o programa do</p><p>IAC e o programa do CTC, os participantes da pesquisa abrangem</p><p>12 instituições de melhoramento genético. Dessas instituições, sete</p><p>coordenadores (representando 58% delas) responderam ao</p><p>questionário quantitativo com perguntas sobre os esforços e as</p><p>atividades de inovação realizadas por cada programa. Deve-se</p><p>observar o caráter eminentemente público da pesquisa genética de</p><p>cana no país.</p><p>12.3 A produção de cana-de-açúcar no</p><p>Brasil: Evolução histórica e expansão</p><p>recente</p><p>A capacitação tecnológica que o Brasil possui na produção de</p><p>cana-de-açúcar, e também no melhoramento genético da cultura, foi</p><p>construída ao longo da história da cana-de-açúcar no país. O quadro</p><p>12.1 resume os acontecimentos que marcaram essa trajetória.</p><p>Quadro 12.1 – Trajetória do melhoramento genético de</p><p>cana-de-açúcar no Brasil</p><p>Ano ou</p><p>período</p><p>Fatos históricos</p><p>1887 D. Pedro II criou o Instituto Agronômico de</p><p>Campinas (IAC), o primeiro estabelecimento</p><p>de pesquisas e desenvolvimento agrícola do</p><p>país, com o objetivo de fomentar a agricultura</p><p>em bases modernas para a época.</p><p>1901 Criação da Escola Superior de Agricultura</p><p>Luiz de Queiróz (Esalq), importante instituição</p><p>na área de pesquisa agronômica e formação</p><p>de recursos humanos.</p><p>1930 Oficializada a criação da Estação</p><p>Experimental de Cana, foram realizados os</p><p>primeiros experimentos para definir o</p><p>comportamento de aclimação das variedades</p><p>de procedência estrangeira.</p><p>1933 Criação do Instituto do Açúcar e do Álcool</p><p>(IAA), que na mesma década instituiu a</p><p>mistura do álcool à gasolina, aumentando a</p><p>demanda por cana-de-açúcar e dando um</p><p>novo fôlego ao setor em crise por causa da</p><p>queda da demanda externa pelo açúcar.</p><p>1940 Foi criada a seção de cana-de-açúcar do IAC</p><p>e iniciaram-se as pesquisas sobre o</p><p>melhoramento genético da cana. Outros</p><p>projetos como estudo dos solos, fertilidade,</p><p>adubação e métodos de cultivo e produção</p><p>foram também desenvolvidos. Também foram</p><p>avaliados os primeiros genótipos que</p><p>resultaram nas primeiras variedades criadas</p><p>no Brasil: CB41-76, CB45-3, CB40-69,</p><p>juntamente com as variedades IAC48-65,</p><p>IAC50-134, IAC51-205 e IAC52-150.</p><p>1960 Criação da Copersucar, Cooperativa de</p><p>Produtores de Cana-de-açúcar, Açúcar e</p><p>Álcool do Estado de São Paulo, com o</p><p>objetivo de buscar a modernização do setor.</p><p>Na área federal, o IAA estabeleceu o</p><p>Planalsucar – Programa Nacional de</p><p>Melhoramento da Cana-de-açúcar e o</p><p>Programa de Racionalização da Agroindústria</p><p>Açucareira.</p><p>1969 O Centro de Tecnologia Canavieira (CTC) foi</p><p>criado pela Copersucar, com foco no</p><p>melhoramento genético de variedades e</p><p>desenvolvimento de tecnologias agrícolas</p><p>voltadas à cultura de cana-de-açúcar.</p><p>Década</p><p>de 1970</p><p>Firmado um convênio entre a Copersucar e o</p><p>IAC, que possibilitou a introdução, no Brasil,</p><p>de 678 genótipos de cana de vários países, o</p><p>que contribuiu para que o CTC se tornasse</p><p>proprietário de um dos maiores bancos de</p><p>germoplasma do mundo.</p><p>1975 Com a queda nos preços do açúcar e a crise</p><p>do Petróleo, em 1973, o governo federal</p><p>lançou, em 1975, o Programa Nacional do</p><p>Álcool, Proálcool, iniciando um ciclo</p><p>importante de investimentos no setor. Com o</p><p>segundo choque do Petróleo, em 1979, e</p><p>em torno do sistema</p><p>Agritempo, formada por cerca de 40 parceiros23.</p><p>O estudo foi conduzido entre os anos de 2009 e 2014 e envolveu a</p><p>análise das formas de interação, colaboração e os intercâmbios entre</p><p>os atores heterogêneos associados ao sistema Agritempo, tais como</p><p>instituições públicas de pesquisa, universidades, empresas, órgãos</p><p>governamentais e usuários. A pesquisa buscou descrever, clarificar e</p><p>explicar o caso selecionado24, captando atitudes, comportamentos e</p><p>estratégias a fim de explicar como e por que ocorrem alguns</p><p>fenômenos, como a geração de inovações em agrometeorologia.</p><p>Foram conduzidas 15 entrevistas presenciais, 12 entrevistas por</p><p>telefone e recebidos 3 questionários escritos, totalizando 30 sujeitos</p><p>consultados.</p><p>Em 2013, foi conduzido um estudo relacionado às visitas recebidas</p><p>pelo website do sistema Agritempo durante o período de 2007 a</p><p>2012 (com exceção do ano de 2010, cujos dados estavam</p><p>incompletos). Nesse período foram recuperados, analisados e</p><p>contabilizados os arquivos dos logs de acesso ao sistema Agritempo.</p><p>Como ferramenta para a análise dos acessos dos logs foi utilizado o</p><p>software livre Webalizer25, programa de computador que analisa os</p><p>registros de log e gera relatórios de estatísticas dos conteúdos</p><p>acessados em formato HTML, que podem ser visualizados via</p><p>browser.</p><p>Uma nova versão do sistema Agritempo foi disponibilizada na</p><p>internet em abril de 2014.</p><p>1.5 Resultados e discussão</p><p>1.5.1 Motivação para o desenvolvimento do</p><p>sistema Agritempo</p><p>Tendo em vista a enorme quantidade de dados meteorológicos</p><p>utilizados no desenvolvimento das recomendações do Zoneamento</p><p>Agrícola de Riscos Climáticos (ZARC), tornou-se necessário</p><p>desenvolver um software que possibilitasse o armazenamento e</p><p>processamento de dados, visando à modelagem de dados climáticos</p><p>e meteorológicos.</p><p>Dessa forma, após o desenvolvimento da metodologia do ZARC,</p><p>evidenciou-se uma demanda do Mapa à equipe de pesquisadores</p><p>envolvida nessa ação, para a construção de uma base de dados</p><p>informatizada para armazenar dados meteorológicos e acompanhar</p><p>as condições meteorológicas, especialmente em relação às</p><p>solicitações de coberturas de seguro rural (uma iniciativa paralela ao</p><p>ZARC).</p><p>Inicialmente, pensou-se em interligar os websites dos serviços</p><p>meteorológicos estaduais ou regionais, disponíveis na internet.</p><p>Entretanto, uma análise técnica indicou ser mais adequado construir</p><p>um sistema de informações mais robusto, utilizando-se de</p><p>tecnologias e ferramentas mais atuais, adequadas à internet. Com</p><p>isso, a demanda do Mapa foi atendida por intermédio de um projeto</p><p>de pesquisa financiado principalmente pela Embrapa.</p><p>Dessa forma, o sistema Agritempo, desenvolvido em 2002, alguns</p><p>anos após a iniciativa do projeto “Redução dos Riscos Climáticos na</p><p>Agricultura”, de 1995, veio a oferecer as condições necessárias para</p><p>gerenciamento de dados agrometeorológicos para o território</p><p>nacional.</p><p>A demanda do Mapa foi a principal motivação inicial para a</p><p>construção de uma ampla rede interorganizacional a fim de ampliar a</p><p>cobertura da base de dados meteorológicos do sistema Agritempo. O</p><p>processo de articulação de parceiros formou uma rede envolvendo</p><p>mais de 40 instituições que passaram a enviar os dados de suas</p><p>estações de observação para a base do sistema.</p><p>Criou-se, assim, um intenso fluxo de dados e informações,</p><p>recebidos de uma rede de observação composta por cerca de 1.400</p><p>estações meteorológicas ativas.</p><p>Os dados meteorológicos utilizados e armazenados no sistema</p><p>Agritempo são continuamente fornecidos pelas instituições</p><p>integrantes da rede de parceiros e necessitam ser armazenados em</p><p>uma base de dados apropriada, por meio de processos</p><p>automatizados de conversão a partir de diversas mídias,</p><p>equipamentos e sistemas vinculados à rede de parceiros.</p><p>1.5.2 Sistema Agritempo como inovação em</p><p>meteorologia</p><p>O processo inovador assume particularidades específicas em</p><p>função do setor econômico e científico envolvido26. Assim, a análise</p><p>das trajetórias tecnológicas seguidas pelo campo da meteorologia,</p><p>associada ao estudo da sua evolução institucional e organizacional,</p><p>permitiu compreender o processo inovador relacionado ao campo de</p><p>estudo da Agrometeorologia.</p><p>A evolução científica e tecnológica do setor agrometeorológico,</p><p>que norteia os processos inovadores a ele ligados, está intimamente</p><p>associada ao desenvolvimento e aprimoramento dos instrumentos de</p><p>medição e coleta de dados, dos mecanismos de comunicação e das</p><p>tecnologias para armazenamento e processamento dos dados e</p><p>informações coletadas, que vem ocorrendo desde os séculos XVIII e</p><p>XIX.</p><p>No século XX, o rápido avanço da microeletrônica, dos</p><p>computadores e das telecomunicações permitiu a circulação e o</p><p>processamento de grandes quantidades de dados com a utilização</p><p>de modernas técnicas estatísticas e modelos matemáticos.</p><p>Da mesma forma, a evolução das equações e modelos</p><p>matemáticos utilizados para efetuar previsões numéricas, associada</p><p>ao aumento da capacidade computacional, possibilitou o aumento da</p><p>precisão das previsões geradas, levando a uma maior confiabilidade</p><p>dos usuários em relação às informações produzidas.</p><p>A disponibilidade de bases consistentes de dados meteorológicos</p><p>e agrometeorológicos é um dos principais pré-requisitos para o</p><p>estudo e gerenciamento de processos agrícolas e florestais. O</p><p>processo de construção desse tipo de base de dados envolve a</p><p>coleta de dados, sua transmissão a um centro de armazenamento,</p><p>seu processamento, atividades de controle de qualidade,</p><p>armazenamento dos produtos gerados, interface de acesso e</p><p>gerenciamento dos dados.</p><p>A execução de todas essas etapas torna a informação gerada</p><p>bastante valiosa por sua utilidade e pela facilidade de acesso,</p><p>permitindo sua utilização pelos usuários finais, como agricultores e</p><p>associações, serviços governamentais, empresas privadas e vários</p><p>setores do agronegócio27.</p><p>Os autores apontam que a construção e gerenciamento da base</p><p>de dados e as atividades de processamento são críticas para o</p><p>sucesso desse tipo de tecnologia. Um sistema de informações</p><p>agrometeorológicas recebe dados em vários formatos (como valores</p><p>numéricos ou arquivos de imagens, por exemplo) e envolve</p><p>requisitos relativos à consistência e precisão de dados. Além disso,</p><p>necessita de uma infraestrutura de comunicações para interligar</p><p>estações de observação, centros de coleta de dados, servidores do</p><p>sistema e os usuários, processo que se tornou exequível depois da</p><p>revolução das tecnologias de informação.</p><p>Essa revolução, chamada também de “revolução informacional”</p><p>por Lévy28, além de contribuir para o processamento dos dados</p><p>agrometeorológicos, possibilitou uma transformação radical nas</p><p>formas de comunicação e de troca de informações entre pessoas e</p><p>entre organizações, aumentando a velocidade do processo inovador</p><p>e de criação e difusão de novos conhecimentos.</p><p>Nesse sentido, o Agritempo foi desenvolvido com o propósito de</p><p>lidar com as características desse novo contexto informacional</p><p>relacionado à agrometeorologia. O sistema se utilizou de uma</p><p>infraestrutura física formada por uma rede tecnológica, usufruindo da</p><p>internet e das possibilidades de comunicação por ela oferecidas.</p><p>Novas técnicas de processamento e visualização de dados foram</p><p>aplicadas em sua construção, permitindo a automatização de todo o</p><p>processo de coleta, armazenamento, transformação e</p><p>disponibilização de dados. Com a organização dessa grande</p><p>quantidade de dados em uma base robusta, considerando seus</p><p>diferentes formatos, tornou-se possível aumentar a precisão dos</p><p>trabalhos de geração de informações agrometeorológicas e de</p><p>previsão numérica do tempo.</p><p>Dessa forma, pode-se dizer que o sistema Agritempo apresenta-se</p><p>como uma importante inovação de produto, oferecendo informações</p><p>meteorológicas específicas para o setor agrícola com cobertura para</p><p>todo o território brasileiro, bem como uma importante inovação de</p><p>processo relacionada com a automatização de tarefas, antes</p><p>realizadas manualmente, de forma a contribuir para o aumento da</p><p>precisão e da confiabilidade dos produtos gerados.</p><p>Estruturado com base em uma complexa rede de organizações, o</p><p>sistema Agritempo caracteriza-se também como uma inovação</p><p>organizacional, envolvendo uma ação colaborativa em rede que</p><p>incluiu várias unidades de pesquisa da Embrapa, universidades,</p><p>institutos públicos de pesquisa e empresas privadas na área de</p><p>meteorologia. Foi formado um arranjo coordenado de organizações</p><p>com os objetivos de compartilhar dados próprios, acessar os dados</p><p>disponibilizados por outras organizações, utilizar a base de dados do</p><p>sistema para estudos e pesquisas próprias, gerar produtos</p><p>específicos em colaboração com outras instituições e utilizar-se de</p><p>produtos de monitoramento e previsão para atividades operacionais</p><p>(como os serviços governamentais).</p><p>1.5.3 Agritempo: Customização da informação</p><p>meteorológica para a área agrícola</p><p>O Agritempo permitiu um grande avanço no que se refere à</p><p>facilidade de acesso às informações meteorológicas e</p><p>agrometeorológicas de diversos estados e municípios brasileiros29. O</p><p>sistema foi o primeiro a oferecer, em 2003, acesso gratuito a dados e</p><p>informações meteorológicas para todo o território brasileiro.</p><p>O projeto “Desenvolvimento e evolução de um sistema de</p><p>monitoramento agroclimatológico para o estado de São Paulo”, que</p><p>se iniciou em 2002, culminou com a publicação do sistema</p><p>Agritempo na internet em 2003, atendendo inicialmente ao estado de</p><p>São Paulo. Seu escopo foi posteriormente ampliado, de forma a</p><p>abranger todos os estados brasileiros.</p><p>Esse projeto foi liderado pela Embrapa Informática Agropecuária,</p><p>unidade descentralizada de pesquisa da Empresa Brasileira de</p><p>Pesquisa Agropecuária (Embrapa) e pelo Centro de Pesquisas</p><p>Meteorológicas e Climáticas Aplicadas à Agricultura (Cepagri),</p><p>vinculado à Universidade Estadual de Campinas (Unicamp). O</p><p>Cepagri/Unicamp é um centro que atua em atividades de pesquisa e</p><p>extensão, e também no ensino de graduação e pós-graduação. Em</p><p>termos operacionais, o Cepagri responde às necessidades da</p><p>população fornecendo informações e dados meteorológicos para</p><p>atender os setores de turismo, defesa civil e transportes, e também</p><p>atendendo instituições oficiais e imprensa.</p><p>É importante ressaltar a experiência do Cepagri/Unicamp no</p><p>oferecimento on-line de informações meteorológicas desde os anos</p><p>1990. No website desse Centro eram publicadas informações</p><p>meteorológicas para o estado de São Paulo desde 1995.</p><p>O sistema Agritempo é um produto virtual de alta performance</p><p>marcado pelo desenvolvimento de novos processos e tecnologias</p><p>para transmitir, receber, armazenar e traduzir dados meteorológicos</p><p>(como temperatura, chuva, umidade, vento, insolação e radiação).</p><p>Todos esses dados são transformados de forma automatizada pelo</p><p>sistema Agritempo em informações e produtos agrometeorológicos,</p><p>como mapas ou tabelas, customizados para o uso de diferentes</p><p>segmentos de usuários (agricultores, empresas de alimentos,</p><p>institutos de pesquisa, departamentos governamentais).</p><p>1.5.4 O Agritempo e sua rede de parceiros</p><p>Para ampliar a cobertura de dados e oferecer informações</p><p>agrometeorológicas para todo o território brasileiro, foi necessário</p><p>articular uma rede de instituições parceiras formada por cerca de 40</p><p>instituições, situadas em diversos estados brasileiros, envolvendo</p><p>mais de 1.400 estações meteorológicas ativas.</p><p>Além dos dados em si, para o desenvolvimento e estruturação de</p><p>um banco de dados abrangente com cobertura para todo o território</p><p>nacional, foi necessário mobilizar e compartilhar também</p><p>conhecimento, informações, competências das equipes, recursos</p><p>computacionais, estações meteorológicas e outros equipamentos e</p><p>recursos financeiros. Adicionalmente, foi necessário coordenar e</p><p>promover a interação de todos esses atores heterogêneos</p><p>(instituições públicas de pesquisa, universidades, empresas,</p><p>agências governamentais e usuários finais).</p><p>As categorias de organizações que fazem parte da rede estão</p><p>listadas a seguir:</p><p>12 unidades descentralizadas de pesquisa da Embrapa:</p><p>Embrapa Informática Agropecuária (Campinas/SP); Embrapa</p><p>Agroindústria Tropical (Fortaleza/CE); Embrapa Agropecuária</p><p>Oeste (Dourados/MS); Embrapa Algodão (Campina Grande/PB);</p><p>Embrapa Arroz e Feijão (Santo Antônio de Goiás/GO); Embrapa</p><p>Cerrados (Planaltina/DF); Embrapa Clima Temperado</p><p>(Pelotas/RS); Embrapa Milho e Sorgo (Sete Lagoas/MG);</p><p>Embrapa Soja (Londrina/PR); Embrapa Solos (Rio de</p><p>Janeiro/RJ); Embrapa Tabuleiros Costeiros (Aracaju/SE);</p><p>Embrapa Trigo (Passo Fundo/RS);</p><p>Institutos e secretarias ligadas ao governo federal na área de</p><p>recursos hídricos, meteorologia e técnicos de ministérios;</p><p>Secretarias de governos estaduais vinculadas à área ambiental,</p><p>de recursos hídricos ou meteorologia;</p><p>Universidades públicas, como a Universidade Estadual de</p><p>Campinas (Unicamp), Universidade de São Paulo (USP) e</p><p>Universidade Estadual Paulista “Júlio de Mesquita Filho”</p><p>(Unesp);</p><p>Empresas privadas, como a Somar Meteorologia;</p><p>Cooperativas e produtores.</p><p>Dessa forma, além de uma plataforma baseada em tecnologia de</p><p>informação e uma rede de estações meteorológicas, desenvolveu-se,</p><p>em torno do Agritempo, uma rede interorganizacional relativamente</p><p>complexa formada por intermédio de parcerias e contratos de</p><p>cooperação técnica.</p><p>Os relacionamentos estabelecidos possibilitaram o fortalecimento</p><p>da base de dados do sistema, a fim de atender o território nacional,</p><p>embasando o desenvolvimento de várias ações de pesquisa</p><p>relacionadas a novas metodologias para zoneamento agrícola e</p><p>envolvendo estudos de novas culturas e também o estudo dos</p><p>impactos das mudanças climáticas globais para a agricultura.</p><p>1.5.5 Processos de geração de informação</p><p>agrometeorológica</p><p>A disponibilidade de uma base de dados meteorológicos e</p><p>agrometeorológicos consistente é um dos principais pré-requisitos</p><p>para o estudo e gerenciamento de processos agrícolas e florestais. O</p><p>processo de construção desse tipo de base de dados envolve a</p><p>coleta de dados, sua transmissão a um centro de armazenamento,</p><p>seu processamento, atividades de controle de qualidade,</p><p>armazenamento dos produtos gerados, interface de acesso e</p><p>gerenciamento dos dados.</p><p>A Figura 1.1 descreve, de forma esquemática, o processo de</p><p>transformação de dados meteorológicos em informação</p><p>meteorológica customizada ao setor agrícola.</p><p>Figura 1.1 – Conversão de dados meteorológicos em produtos</p><p>disponíveis na web.</p><p>Fonte: Elaboração dos autores.</p><p>Doraiswamy et al.30 apontam que a construção e gerenciamento</p><p>da base de dados e as atividades de processamento são críticas</p><p>para o sucesso de um sistema de informações agrometeorológicas.</p><p>O sistema recebe dados em vários formatos (como valores</p><p>numéricos ou arquivos de imagens, por exemplo) e envolve</p><p>requisitos relativos à integração, consistência e precisão de dados.</p><p>Além disso, o Agritempo necessitou de uma infraestrutura de</p><p>comunicações para interligar estações de observação, centros de</p><p>coleta de dados, servidores do sistema e usuários. Esse processo só</p><p>se tornou exequível depois da revolução das tecnologias de</p><p>informação, que possibilitou o processamento dos dados</p><p>agrometeorológicos e também uma transformação radical nas formas</p><p>de comunicação e de troca de informações, aumentando a</p><p>velocidade do processo inovador e de criação e difusão de novos</p><p>conhecimentos.</p><p>O Agritempo foi desenvolvido com o propósito de lidar com as</p><p>características desse novo contexto informacional relacionado à</p><p>Agrometeorologia. O sistema se utilizou de uma infraestrutura física</p><p>formada por uma rede tecnológica, usufruindo da internet e das</p><p>possibilidades de comunicação por ela oferecidas.</p><p>Adicionalmente, novas técnicas de processamento e visualização</p><p>de dados foram aplicadas em sua construção, permitindo a</p><p>automatização de todo o processo de coleta, armazenamento,</p><p>transformação e disponibilização de dados.</p><p>A disponibilidade de grande quantidade de dados, em diferentes</p><p>formatos, também permitiu aumentar a precisão dos trabalhos de</p><p>previsão numérica do tempo.</p><p>1.5.6 Funcionalidades do sistema Agritempo</p><p>O sistema Agritempo disponibiliza as seguintes funcionalidades</p><p>para todos os estados do</p><p>Brasil:</p><p>Mapas de monitoramento e previsão;</p><p>Previsão do tempo para a capital de cada estado;</p><p>Mapas de índice de seca;</p><p>Séries históricas de dados de chuva;</p><p>Mapas de probabilidade de chuva;</p><p>Mapas de produção para várias culturas;</p><p>Boletins agrometeorológicos regionais para cada região do país.</p><p>Os mapas de monitoramento, gerados a cada 12 horas,</p><p>apresentam as informações sobre: estiagem, estiagem agrícola,</p><p>água disponível no solo, necessidade de reposição por chuva,</p><p>precipitação e precipitação acumulada.</p><p>Os mapas de previsão, também gerados a cada 12 horas,</p><p>oferecem as seguintes informações: tratamento fitossanitário,</p><p>necessidade de irrigação, evapotranspiração, temperaturas (média,</p><p>mínima média, máxima média, mínima e máxima absoluta),</p><p>condições para manejo do solo, condições para colheita, previsões</p><p>de temperatura mínima e média, previsão de precipitação.</p><p>Outros produtos disponibilizados são:</p><p>Boletins agrometeorológicos para as diversas regiões do país;</p><p>Boletim regional histórico, que apresenta um quadro indicativo</p><p>das disponibilidades de água no solo, pesquisa de dados por</p><p>estado/estação meteorológica (na forma de tabela);</p><p>Sumário, envolvendo a análise de dados agrupados por meses</p><p>ou anos, oferecendo informações sobre temperatura máxima e</p><p>mínima, precipitação e disponibilidade de água no solo e</p><p>gráficos, gerados em função da seleção de uma cidade/estação</p><p>meteorológica, oferecendo informações sobre temperatura,</p><p>precipitação e disponibilidade de água no solo.</p><p>Em relação às séries históricas de dados, dois produtos são</p><p>oferecidos:</p><p>Sumário de séries históricas (tabela descritiva dos dados</p><p>registrados das estações pluviométricas de um determinado</p><p>estado, em um determinado período de tempo);</p><p>Mapas de séries históricas que permitem a visualização de</p><p>dados históricos de chuva na forma de mapas.</p><p>O sistema disponibiliza também mapas de probabilidade de</p><p>chuvas e mapas de Índice de Seca (Standardized Precipitation Index</p><p>– SPI), que quantificam o déficit ou excesso de precipitação em</p><p>função de diferentes escalas de tempo (de 5 a 30 dias e de 1 a 6</p><p>meses).</p><p>No website do sistema Agritempo podem ser encontrados mapas</p><p>contemplando as recomendações do Zoneamento Agrícola referente</p><p>a cada estado, na forma de tabelas.</p><p>O Agritempo disponibiliza gratuitamente imagens e produtos</p><p>desenvolvidos a partir das imagens de satélite National Oceanic</p><p>Atmospheric Administration (NOAA) captadas por intermédio do</p><p>sensor Advanced Very High Resolution Radiometer (AVHRR), por</p><p>intermédio de uma antena de posse do Cepagri/Unicamp.</p><p>Em abril de 2014, foi lançada a segunda versão do sistema</p><p>Agritempo, a partir da atualização da plataforma computacional, com</p><p>interface mais interativa e novas funcionalidades, conforme</p><p>apresentado na Figura 1.2.</p><p>Figura 1.2 – Interface do sistema Agritempo 2.0.</p><p>Fonte: Captura de tela do site Agritempo:</p><p><https://www.agritempo.gov.br/agritempo/index.jsp?lang=pt_br>.</p><p>Essa nova versão foi desenvolvida a fim de permitir uma melhor</p><p>visualização do sistema em tablets e smartphones, e possui versões</p><p>em inglês e espanhol para atender à demanda de acesso por</p><p>usuários internacionais.</p><p>Dentre os recursos tecnológicos disponíveis na nova versão,</p><p>destaca-se a ferramenta WebGIS (Geographic Information Systems),</p><p>que permite a consulta a diferentes tipos de mapas e informações</p><p>georreferenciadas, para todo o Brasil. Por meio de diferentes níveis</p><p>(camadas), que podem ser adicionados e removidos de acordo com</p><p>a necessidade da pesquisa, é possível ainda obter informações</p><p>detalhadas por ponto (localização no mapa) e realizar medições</p><p>(comprimento e área no mapa).</p><p>http://www.agritempo.gov.br/agritempo/index.jsp?lang=pt_br</p><p>Além disso, os mapas foram aprimorados e são gerados por</p><p>software, com cálculo de métodos de interpolação com mais</p><p>precisão. Além dos mapas estaduais, a nova versão apresenta os</p><p>mapas de monitoramento e previsão para todo o Brasil.</p><p>Foi incluído também um acesso à base de imagens do satélite</p><p>Modis, organizadas seguindo a base estadual brasileira, contendo 26</p><p>recortes. No banco de produtos Modis, organizado pela Embrapa</p><p>Informática Agropecuária, estão disponíveis a série completa dos</p><p>índices de vegetação NDVI e EVI, além da imagem “Pixel Reliability”,</p><p>que possibilita o mascaramento dos pixels considerados impróprios</p><p>para análise e que estão contidos nos produtos MOD13Q1 e</p><p>MYD13Q1.</p><p>Imagens de satélite e dados derivados de sensoriamento remoto</p><p>podem prover os seguintes dados e informações: indicações do</p><p>regime de radiação, temperatura de superfície e estimativa da</p><p>temperatura do ar, movimentos de vento e massas de ar, estimativas</p><p>do período e área de ocorrência de chuvas, secas ou enchentes.</p><p>Essas informações são, em geral, combinadas com outros produtos,</p><p>como umidade do solo, cobertura de vegetação (NDVI) e indicação</p><p>de pestes e doenças.</p><p>1.5.7 Perfil de utilização do sistema Agritempo</p><p>Foi efetuado, em 2013, um estudo de monitoramento das visitas31</p><p>e acessos32 ao website do sistema Agritempo a partir de 2007. O</p><p>intuito dessa análise foi quantificar e qualificar as categorias de</p><p>informação mais procuradas pelos usuários do sistema em períodos</p><p>com anomalias climáticas em comparação com épocas em que não</p><p>se observou nenhum fenômeno meteorológico específico. Buscou-se</p><p>ainda analisar os padrões observados em períodos sem anomalias</p><p>climáticas33.</p><p>A ferramenta utilizada para monitoramento foi o software</p><p>Webalizer, um programa livre de análise de arquivos de log34 web</p><p>que produz estatísticas de utilização em formato HTML para</p><p>visualização em um navegador. Os resultados são apresentados em</p><p>formato de tabela e gráfico, o que facilita a interpretação. Para a</p><p>análise do sistema, foram utilizados os dados de 2007 a 2012, com</p><p>exceção do ano de 2010 (nesse ano uma parte dos dados foi perdida</p><p>pelo sistema, tornando sua análise não confiável).</p><p>Mesmo não tendo sido encontrados padrões relacionados ao</p><p>número de visitas mensais de cada ano e de cada período do ano,</p><p>as informações monitoradas permitiram identificar picos de visitas em</p><p>períodos nos quais ocorreram fenômenos climáticos atípicos.</p><p>Os resultados dessa análise evidenciaram uma tendência positiva</p><p>de aumento da busca de informações agrometeorológicas em</p><p>períodos de ocorrência de anomalias climáticas. Essa tendência está</p><p>representada no aumento de visitas ao website do sistema</p><p>Agritempo e no aumento dos acessos a informações como os</p><p>boletins agrometeorológicos regionais.</p><p>O estudo dos boletins técnicos gerados pelo Centro de Previsão</p><p>de Tempo e Estudos Climáticos35 permitiu identificar os períodos de</p><p>anomalias climáticas entre os anos de 2008 e 2012, relacionados ao</p><p>fenômeno El Niño Oscilação Sul (ENOS) – El Niño e La Niña. Esse</p><p>fenômeno, por provocar alterações significativas nos regimes de</p><p>chuvas e nas médias de temperatura, influencia fortemente os</p><p>resultados do agronegócio no Brasil, afetando épocas de plantio e de</p><p>colheita de diversas culturas e colocando em risco a produção</p><p>agrícola.</p><p>O El Niño é caracterizado por temperaturas anormalmente quentes</p><p>do oceano no Pacífico Equatorial, ao contrário de La Niña, que se</p><p>caracteriza por temperaturas anormalmente frias. O El Niño é uma</p><p>oscilação do sistema oceano-atmosfera no Pacífico Tropical e</p><p>provoca consequências importantes no tempo atmosférico em todo o</p><p>globo36. Admite-se que existem cerca de vinte regiões do mundo</p><p>cujo clima é afetado pelas fases do El Niño e La Niña Oscilação Sul</p><p>(ENOS). No Brasil, o setor norte da região Nordeste, a parte leste da</p><p>região Amazônica (na faixa tropical) e a região Sul do Brasil são as</p><p>mais afetadas por essa anomalia.</p><p>As informações acessadas no sistema Agritempo se referem,</p><p>principalmente, às regiões Centro-Oeste, Sul e Sudeste.</p><p>Considerando as informações e dados históricos gerados pelos</p><p>boletins do CPTEC sobre os fenômenos meteorológicos acima</p><p>descritos, identificou-se picos de visitas ao website do Agritempo em</p><p>períodos de ocorrência deles.</p><p>Os picos de visitas, evidenciados na Figura 1.3, ocorreram em: –</p><p>1° pico = junho, julho e agosto de 2007;</p><p>2° pico =</p><p>março, abril e maio de 2008;</p><p>3° pico = setembro, outubro e novembro de 2009;</p><p>4° pico = janeiro, fevereiro e março de 2011;</p><p>5° pico = março, abril e maio de 2012.</p><p>Figura 1.3 – Visitas mensais ao website do sistema Agritempo</p><p>(2007 a 2012).</p><p>Fonte: Elaboração dos autores.</p><p>Considerando a coincidência entre os períodos de aumento de</p><p>visitas e de ocorrência de fenômenos meteorológicos, foram</p><p>analisadas as páginas e informações mais acessadas nesses</p><p>períodos nos anos de 2007 e 2008.</p><p>Entre os meses de maio, junho e julho de 2007 (1o pico), houve o</p><p>início das condições oceânicas e atmosféricas que evidenciaram o</p><p>fenômeno La Niña. As regiões afetadas foram: Sul, Norte, Centro-</p><p>Oeste e Sudeste. No Sul o período foi de intensa entrada de massas</p><p>de ar frio, provocando quedas acentuadas de temperatura em toda a</p><p>região, incluindo episódios de neve e geadas. A passagem dos</p><p>sistemas frontais também provocou temporais, queda de granizo e</p><p>descargas elétricas que causaram inclusive perdas humanas em</p><p>localidades do Rio Grande do Sul. Na região Norte do país, houve</p><p>chuvas acima da média e frentes que provocaram episódios de</p><p>friagem no Acre e Rondônia. No Centro-Oeste e Sudeste, as chuvas</p><p>foram normais, porém as temperaturas ficaram acima da média para</p><p>o período.</p><p>As informações mais buscadas nesses períodos foram: boletins</p><p>agrometeorológicos da região Sudeste, ZARC da região Sudeste e</p><p>mapas de previsão do tempo para o estado de São Paulo. Em julho</p><p>de 2007, a incursão de dois sistemas frontais, provocou anomalias</p><p>de temperatura e precipitação recordes no Brasil. No estado de São</p><p>Paulo, as precipitações pluviométricas, em apenas um dia,</p><p>ultrapassaram o dobro do total esperado para o mês. No mês de</p><p>agosto, a região Sudeste estava sendo influenciada ao norte por uma</p><p>forte massa de ar quente e seco, que elevou as temperaturas e</p><p>deixou o clima seco, e ao sul estava sendo influenciada por sistemas</p><p>frontais e a configuração de ciclones extratropicais que</p><p>proporcionaram fortes rajadas de ventos.</p><p>Considera-se que a manifestação desses fenômenos foi um fator</p><p>que influenciou positivamente a consulta por informações</p><p>agrometeorológicas para a região Sudeste e o estado de São Paulo.</p><p>O segundo pico analisado, relativo aos meses de março, abril e</p><p>maio de 2008, foi marcado pelo enfraquecimento do fenômeno La</p><p>Niña, embora ainda com manifestações dele. Nesse período o Brasil</p><p>ainda estava sofrendo essa influência, principalmente a região Sul,</p><p>que enfrentava uma forte estiagem.</p><p>No mês de maio de 2008, foi identificada uma busca mais intensa</p><p>das seguintes informações do Agritempo: mapas de previsão para o</p><p>estado de São Paulo; mapas de previsão para o estado do Paraná;</p><p>boletins agrometeorológicos das regiões Sul e Sudeste; zoneamento</p><p>das regiões Sul e Sudeste.</p><p>Considera-se que o aumento da busca de informações</p><p>meteorológicas com esse perfil é decorrente da influência das</p><p>condições e fenômenos meteorológicos considerados.</p><p>A análise detalhada está descrita em Amato e Bambini37.</p><p>1.5.8 Estratégias de divulgação e uso do sistema</p><p>O sistema Agritempo foi, desde 2003, apresentado em feiras</p><p>agropecuárias em todas as regiões do país. Utilizando-se de material</p><p>impresso, vídeos e slides, técnicos da Embrapa apresentaram as</p><p>principais funcionalidades do sistema no estande da Embrapa em</p><p>cada feira. O sistema também foi apresentado em congressos e</p><p>seminários, por intermédio de trabalhos científicos, e também em</p><p>palestras sob demanda em instituições parceiras ou na Embrapa</p><p>Informática Agropecuária.</p><p>A estratégia de divulgação da versão 2.0 do sistema Agritempo</p><p>previu a elaboração de um plano de comunicação e marketing,</p><p>visando disseminar notícias por intermédio de mídia falada, impressa</p><p>e virtual em associação com as unidades da Embrapa parceiras do</p><p>projeto, nas diferentes regiões brasileiras. Dessa forma, foram</p><p>incluídas mensagens no Twitter e Facebook da Embrapa, além de</p><p>banner na página principal da Empresa. O lançamento da nova</p><p>versão do sistema foi realizado no período de 28/04 a 02/05/2014, na</p><p>21ª Feira Agrishow, que ocorre anualmente em Ribeirão Preto.</p><p>Palestras e cursos também foram realizados em outras feiras no</p><p>país, além da apresentação do produto no estande da Embrapa.</p><p>Matérias jornalísticas foram produzidas e divulgadas em websites,</p><p>jornais e revistas com abrangência nacional. Além disso, entrevistas</p><p>para rádio e TV também foram utilizadas para divulgação do sistema.</p><p>Vídeos sobre essa tecnologia foram produzidos e são divulgados em</p><p>feiras, eventos e na web no canal da Embrapa no Youtube.</p><p>Em relação à estratégia de ações de transferência da tecnologia,</p><p>busca-se atingir o produtor rural de forma indireta, por intermédio de</p><p>ações de capacitação de multiplicadores, como os atores da rede de</p><p>extensão rural e assistência técnica, os técnicos de empresas</p><p>estaduais de pesquisa agropecuária, os representantes de</p><p>associações e cooperativas e os técnicos agrícolas, entre outros.</p><p>Esses atores estão sendo capacitados a fim de que possam orientar</p><p>os produtores em relação ao uso de dados e informações</p><p>agrometeorológicas nas várias decisões de gerenciamento da</p><p>propriedade, visando reduzir os riscos associados às condições do</p><p>tempo e do clima e garantir a renda do produtor. Para isso, cinco</p><p>cursos de capacitação foram programados, sendo um para cada</p><p>região do país, com o objetivo de capacitar os multiplicadores da</p><p>tecnologia.</p><p>1.6 Conclusões e considerações finais</p><p>A revolução das tecnologias de informação foi um divisor de águas</p><p>entre as redes meteorológicas do século XIX e as atuais, uma vez</p><p>que permitiu a difusão do método numérico de previsão do tempo, o</p><p>processamento e armazenamento de grandes quantidades de dados,</p><p>e a promoção de intensas comunicações e transferências de dados</p><p>entre organizações – muitas vezes em tempo real. A difusão das</p><p>Tecnologias de Informação e Comunicação (TICs) foi essencial para</p><p>que se pudesse desenvolver um sistema informatizado de</p><p>agrometeorologia, como o Agritempo em 2002.</p><p>O desenvolvimento do sistema Agritempo e o fortalecimento de</p><p>sua base de dados envolveram a formação de uma ampla rede de</p><p>observação meteorológica, a fim de aumentar a cobertura dos dados</p><p>do sistema visando abrangência nacional. E isso possibilitou um</p><p>aumento na precisão dos produtos e previsões gerados pelo</p><p>Agritempo.</p><p>Em relação às ações em rede na agrometeorologia, destaca-se a</p><p>iniciativa do ZARC como uma ação em rede iniciada na década de</p><p>1990 para minimizar os riscos climáticos e evitar perdas na</p><p>agricultura – beneficiando não só os produtores, mas também os</p><p>setores de seguro rural e crédito, que tiveram perdas minimizadas.</p><p>O desenvolvimento do sistema Agritempo, como estratégia de</p><p>ação decorrente do ZARC, mobilizou uma rede de cerca de 40</p><p>organizações e mais de 1.400 estações meteorológicas,</p><p>configurando-se como um arranjo de alta complexidade para</p><p>proporcionar monitoramento climatológico e atender a vários</p><p>usuários (como técnicos do governo federal, agrônomos, técnicos da</p><p>rede de extensão rural, produtores e associações, empresas</p><p>privadas, universidades e pesquisadores).</p><p>Assim, além de ser uma inovação de produto e de processo, o</p><p>Agritempo se caracteriza como uma inovação organizacional</p><p>estruturada por uma rede com três dimensões: uma rede física de</p><p>equipamentos de coleta e computadores, uma rede de</p><p>comunicações e uma complexa rede interorganizacional. Essas três</p><p>instâncias de rede permitiram o estabelecimento de relacionamentos</p><p>entre diversos atores para compartilhar dados, informação e</p><p>competências a fim de gerar novas tecnologias e criar novos</p><p>conhecimentos em agrometeorologia.</p><p>Apesar de todo o histórico de formação de redes de observação</p><p>meteorológicas iniciado no século XVII, verifica-se uma significativa</p><p>dificuldade em coordenar os dados e sistemas meteorológicos</p><p>existentes no Brasil, dispersos em vários órgãos públicos (como o</p><p>Mapa, o MCT e a Marinha, principalmente) e alguns organismos</p><p>privados.</p><p>Considera-se que o Agritempo obteve sucesso em customizar</p><p>dados e informações meteorológicas para atender a diversos</p><p>públicos</p>