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<p>SUMÁRIO</p><p>1. Introdução .................................................................... 3</p><p>2. Epidemiologia e ciclos epidemiológicos ............ 4</p><p>3. Agente etiológico ....................................................... 7</p><p>4. Quadro Clínico .........................................................12</p><p>5. Diagnóstico ...............................................................15</p><p>6. Diagnóstico diferencial ..........................................17</p><p>7. Tratamento .................................................................17</p><p>8. Profilaxia pré e pós exposição ............................19</p><p>Referências Bibliograficas .........................................26</p><p>3RAIVA</p><p>1. INTRODUÇÃO</p><p>A raiva é uma antropozoonose que</p><p>acomete o sistema nervoso central</p><p>(SNC), cujo agente etiológico é um</p><p>vírus que pertence à família Rhabdo-</p><p>viridae e ao gênero Lyssavirus. Sua</p><p>transmissão ocorre por secreções in-</p><p>fectadas, usualmente saliva, as quais</p><p>atingem o organismo através da</p><p>mordedura animal ou da ferida aber-</p><p>ta. Raramente a inalação de aeros-</p><p>sóis contendo vírus, a ingestão ou o</p><p>transplante de tecidos infectados são</p><p>capazes de transmitir a entidade no-</p><p>sológica. Sua importância deriva do</p><p>fato de ser letal em aproximadamen-</p><p>te 100% dos casos.</p><p>SAIBA MAIS!</p><p>Figura 1. Gravura medieval de um cão rábico Fonte: Dobson, Mary J. (2008) Disease, Englewood Cliffs, N.J: Quercus, p. 157</p><p>A raiva humana também conhecida como hidrofobia é temida desde a Antiguidade devido</p><p>sua forma de transmissão, ao quadro clínico e sua evolução. Acreditavam os antigos que</p><p>era causada por motivos sobrenaturais, pois cães e lobos pareciam estar possuídos por</p><p>entidades malignas. Também é a doença de registro mais antigo.</p><p>A Organização Mundial de Saúde</p><p>(OMS) estima que, por ano, 55.000</p><p>pessoas evoluam para o óbito devido</p><p>à doença. Uma vez clinicamente apre-</p><p>sentada, as possibilidades de cura são</p><p>remotas, restringindo-se a uns parcos</p><p>relatos de casos. Assim, faz se neces-</p><p>sária a adoção de medidas profiláticas</p><p>específicas, visando a proteção contra o</p><p>adoecimento.</p><p>Em 2008 foi notificado o primeiro caso</p><p>brasileiro, e o segundo relato no mundo,</p><p>de cura da raiva humana em ambiente</p><p>de terapia intensiva, no Hospital Uni-</p><p>versitário Oswaldo Cruz, da Universida-</p><p>de Federal de Pernambuco, em Recife,</p><p>4RAIVA</p><p>no qual um jovem de 15 anos, infec-</p><p>tado pela mordedura de um morcego</p><p>hematófago, apresentou recuperação.</p><p>O procedimento terapêutico aplicado e</p><p>conduta empregada foram reunidos no</p><p>primeiro protocolo brasileiro de trata-</p><p>mento para raiva (o Protocolo de Recife).</p><p>2. EPIDEMIOLOGIA E</p><p>CICLOS EPIDEMIOLÓGICOS</p><p>A distribuição da raiva é universal, des-</p><p>tacando-se apenas algumas regiões</p><p>insulares como o Japão e o Havaí, nas</p><p>quais não existe a circulação do vírus,</p><p>mesmo entre as espécies silvestres,</p><p>consideradas os reservatórios naturais.</p><p>O único continente habitado e conside-</p><p>rado sem a presença do vírus da raiva</p><p>era a Oceania, mas o encontro de um</p><p>Lyssavirus, fez com que essa situação</p><p>esteja sendo revista. No Brasil, 576 ca-</p><p>sos de raiva humana foram registrados</p><p>de 1990 a 2010. A região Nordeste</p><p>mostra-se especialmente endêmica</p><p>para a entidade nosológica – respon-</p><p>dendo por 57% dos casos notificados</p><p>no período - seguida da região Norte,</p><p>com 25%; Sudeste, com 10% e Cen-</p><p>tro-Oeste, com 8%. Desde 1987 não</p><p>há registro de casos de raiva humana</p><p>nos estados do Sul, sendo o último caso</p><p>no Paraná, cuja fonte de infecção foi um</p><p>morcego hematófago.</p><p>Em 2010, três casos de raiva huma-</p><p>na foram notificados, todos na região</p><p>Nordeste. Nos anos de 2004 e 2005,</p><p>o morcego passou a ser o principal</p><p>responsável pelas ocorrências de rai-</p><p>va humana, correspondendo a 86,5%</p><p>dos casos nesses dois anos. Um exem-</p><p>plo disto foi ocorrência de surtos de</p><p>raiva humana nos estados do Pará e</p><p>Maranhão.</p><p>A forma mais frequente de transmis-</p><p>são da moléstia nos países em desen-</p><p>volvimento é a mordedura por cães. Na</p><p>Europa ocidental e nos Estados Unidos</p><p>da América (EUA), as origens mais co-</p><p>muns são os guaxinins, as raposas, os</p><p>morcegos e os coiotes (dentre os ani-</p><p>mais selvagens) e cães e gatos, dentre</p><p>os mamíferos domésticos. A natureza</p><p>da agressão deve ser determinada,</p><p>pois animais raivosos geralmente ata-</p><p>cam sem provocação prévia.</p><p>Vale ressaltar que há dois picos de in-</p><p>cidência da doença humana, na faixa</p><p>etária por volta dos 5 e, também, por</p><p>volta dos 14 anos, devido a maior ex-</p><p>posição deste grupo etário ao contato</p><p>com animais. Casos raros foram relata-</p><p>dos de inalação de partícula virais eli-</p><p>minadas pelos morcegos. A transmis-</p><p>são de humano para humano também</p><p>foi documentada em alguns pacientes</p><p>após transplante de córnea e de rim.</p><p>Com a intensificação das ações de</p><p>vigilância e controle da raiva canina</p><p>e felina nos últimos 30 anos, o Brasil</p><p>alcançou significativa redução nas ta-</p><p>xas de mortalidade por raiva humana,</p><p>com o predomínio de casos em ca-</p><p>ráter esporádicos e acidentais, como</p><p>mostra a figura abaixo.</p><p>5RAIVA</p><p>Figura 2. Taxa de mortalidade de raiva humana por tipo de animal agressor (1986 – 2017). Fonte: SVS/MS.</p><p>No período de 2010 a 2017, foram</p><p>registrados 25 casos de raiva huma-</p><p>na, sendo que em 2014, não houve</p><p>casos. Desses casos, nove tiveram o</p><p>cão como animal agressor, oito por</p><p>morcegos, quatro por primatas não</p><p>humanos, três por felinos e em um</p><p>deles não foi possível identificar o</p><p>animal agressor.</p><p>Em 2015, os dois casos de raiva hu-</p><p>mana no Brasil, ocorreram na Para-</p><p>íba, transmitido por gato e o outro</p><p>no Mato Grosso do Sul por cachor-</p><p>ro. Esse caso no Mato Grosso do Sul,</p><p>ocorreu em razão da epizootia canina</p><p>nos municípios de Corumbá e Ladá-</p><p>rio, a partir da introdução de animal</p><p>positivo pela fronteira com a Bolí-</p><p>via. Em 2016 foram notificados dois</p><p>casos de raiva humana, um em Boa</p><p>Vista/RR, transmitido por felino infec-</p><p>tado por transmissão secundária e</p><p>um caso em Iracema/CE por morcego</p><p>(Desmodus rotundus).</p><p>Em 2017, foram registrados seis casos</p><p>de raiva humana, todos por morcegos</p><p>hematófagos (Desmodus rotundus),</p><p>sendo que cinco deles em razão de</p><p>agressões diretas por morcegos - três</p><p>deles ocorreram em adolescentes de</p><p>uma mesma família, residentes em</p><p>uma reserva extrativista no município</p><p>de Barcelos, estado do Amazonas, os</p><p>outros dois casos ocorreram na Bahia</p><p>e Tocantins. O sexto caso ocorreu em</p><p>Pernambuco, após agressão de um</p><p>gato de rua infectado.</p><p>As campanhas anuais de vacinação</p><p>de cães e gatos no Brasil associadas</p><p>as demais medidas de controle, como</p><p>a profilaxia antirrábica humana para</p><p>pessoas expostas ao risco de contrair</p><p>raiva, resultaram em significativa re-</p><p>dução de casos de raiva humana. Em</p><p>cães, consequentemente, também</p><p>ocorreu redução de casos com inter-</p><p>rupção na circulação do vírus da rai-</p><p>va, consideradas de maior potencial</p><p>6RAIVA</p><p>de disseminação entres cães e gatos</p><p>nas áreas urbanas. Nesta série histó-</p><p>rica, no ano de 2008 não houve casos</p><p>de raiva humana transmitida por cão.</p><p>O resultado das ações de vacinação</p><p>antirrábica canina e felina resulta-</p><p>ram num grande ganho para a saúde</p><p>pública, permitindo que o país saís-</p><p>se de um cenário de mais de 1.200</p><p>cães positivos para raiva e uma taxa</p><p>de mortalidade de raiva humana por</p><p>cães de 0,014/100 mil habitantes em</p><p>1999, para um cenário de 13 casos</p><p>de raiva canina e nenhum caso de rai-</p><p>va humana por cães em 2017.</p><p>Figura 3. Taxa de mortalidade da raiva humana transmitida por cão/ nº de casos de raiva canina (1999 a 2017) Fonte: SVS/MS.</p><p>Cabe, ainda, dentro de epidemiologia</p><p>ressaltar os ciclos epidemiológicos</p><p>da doença. Considerava-se, até al-</p><p>guns anos, que a raiva possuía três</p><p>ciclos: urbano, rural e silvestre. Mais</p><p>recentemente inclui-se outro, envol-</p><p>vendo os morcegos (espécies hema-</p><p>tófagas ou não), denominado ciclo</p><p>silvestre aéreo. A raiva urbana é ca-</p><p>racterizada pela presença da doença</p><p>em animais domésticos de estimação</p><p>(cães e gatos).</p><p>O morcego hematófago (Desmodus</p><p>rotundus) é o principal transmis-</p><p>sor da doença aos herbívoros do-</p><p>mésticos, como bovídeos, equídeos,</p><p>caprinos, ovinos e suínos, pois estes</p><p>são a fonte alimentar mais frequente,</p><p>constituindo o ciclo rural. Os herbívo-</p><p>ros domésticos podem também se in-</p><p>fectar pela agressão de cães, gatos e</p><p>mamíferos silvestres raivosos. O ciclo</p><p>aéreo é importante na manutenção</p><p>do vírus entre as várias espécies de</p><p>morcegos, os quais disseminam esse</p><p>agente viral, pois transpõem barreiras</p><p>geográficas, na medida em que são</p><p>os únicos mamíferos que voam.</p><p>Todas as espécies de morcegos, he-</p><p>matófagas ou não, são suscetíveis ao</p><p>vírus da raiva, podendo transmitir a</p><p>condição mórbida e apresentar seus</p><p>7RAIVA</p><p>sinais, adoecendo e evoluindo para a</p><p>morte, por conseguinte, não se trata</p><p>de portadores “assintomáticos” como</p><p>se acreditava anteriormente. Esse</p><p>entrelaçamento dos ciclos foi com-</p><p>provado, cientificamente, por meio de</p><p>técnicas modernas de tipificação an-</p><p>tigênica e sequenciamento genético</p><p>do vírus</p><p>Figura 4. Ciclos epidemiológicos da Raiva Fonte: retirado de www.dive.sc.gov.br</p><p>3. AGENTE ETIOLÓGICO</p><p>O agente da raiva é um vírus RNA</p><p>da ordem Mononegavirales, família</p><p>Rhabdoviridae, gênero Lyssavirus e</p><p>espécie Rabies vírus (RA BV) com</p><p>genoma de RNA simples de senti-</p><p>do negativo. O vírion desse vírus que</p><p>se assemelha morfologicamente a</p><p>um projétil de arma de fogo é forma-</p><p>do por um nucleocapsídeo helicoidal</p><p>envelopado por uma bicamada lipo-</p><p>proteica medindo cerca de 170 na-</p><p>nômetros de comprimento por 70</p><p>nanômetros de largura (11 a 15 kb).</p><p>Seu genoma é constituído por uma</p><p>molécula linear de ácido ribonucléico</p><p>(RNA) fita simples (ssRNA+), o qual</p><p>codifica cinco proteínas denominadas</p><p>N, M, L, G e NS, todas com proprieda-</p><p>des antigênicas.</p><p>SE LIGA! A glicoproteína G – constituin-</p><p>te do envelope viral – tem a capacida-</p><p>de de ligação aos receptores da acetil-</p><p>colina, fato este que contribui para sua</p><p>neurovirulência</p><p>O vírus da raiva é muito sensível aos</p><p>agentes externos, tanto físicos quanto</p><p>químicos, como detergentes, ácidos e</p><p>8RAIVA</p><p>bases fortes, formol, água e sabão a</p><p>20,0%, além da luz solar, do calor (é</p><p>inativado a 60º C) e da luz ultravioleta.</p><p>O agente permanece infectante por</p><p>dias a 4º C; a -70º C ou liofilizado (4º</p><p>C), se mantém durante anos.</p><p>Figura 5. Ilustração e microscopia eletrônica do Rhabdovirus. Fonte: retirado de https://www.researchgate.net/</p><p>9RAIVA</p><p>Figura 6. Patogênese da infecção pelo vírus da raiva. As etapas numeradas descrevem a sequência de eventos.</p><p>Fonte: MURRAY et al., 2017.</p><p>10RAIVA</p><p>A infecção pelo vírus da raiva se ini-</p><p>cia através da introdução do mesmo</p><p>na pele ou nas membranas mucosas.</p><p>Após isso, ocorre replicação no mús-</p><p>culo estriado esquelético adjacente</p><p>ao local da inoculação e subsequente</p><p>exposição do sistema nervoso peri-</p><p>férico, principalmente as terminações</p><p>nervosas livres desmielinizadas dos</p><p>fusos neurotendíneos e neuromuscu-</p><p>lares. O agente etiológico se dissemi-</p><p>na ao longo dos nervos periféricos,</p><p>em direção ao sistema nervoso cen-</p><p>tral (SNC), aproveitando-se do fluxo</p><p>axoplasmático retrógrado, célula a</p><p>célula, através das junções sinápticas,</p><p>em geral a uma ‘velocidade’ constan-</p><p>te de 8-20 mm/dia, podendo atingir,</p><p>eventualmente, uma velocidade de</p><p>até 100mm/dia.</p><p>Um novo evento de replicação viral</p><p>pode ocorrer nos cornos anteriores da</p><p>medula espinal, bem como na raiz dos</p><p>gânglios dorsais. Nesses locais, as</p><p>partículas virais podem ser reconhe-</p><p>cidas por células efetoras do sistema</p><p>imunológico, o que propicia o apare-</p><p>cimento de um quadro de ganglio-</p><p>neurite. Uma vez instalado no SNC,</p><p>a multiplicação viral ocorre, preferen-</p><p>cialmente, nas regiões do hipocampo,</p><p>tálamo, hipotálamo, tronco cerebral,</p><p>medula e cerebelo. O vírus rábico se</p><p>dissemina de maneira centrífuga pe-</p><p>los nervos periféricos e autônomos,</p><p>alcançando medula adrenal, rins, pul-</p><p>mões, fígado, músculos esqueléticos,</p><p>pele, coração e glândulas salivares,</p><p>sendo que esse último sítio possui,</p><p>por grama de tecido, maior quantida-</p><p>de de vírus que o SNC.</p><p>SE LIGA! O neurotropismo por trans-</p><p>porte axonal é o tropismo clássico do</p><p>vírus da raiva.</p><p>Do ponto de vista fisiopatológico, a</p><p>entidade mórbida ocorre devido à</p><p>disfunção neuronal, anormalidades</p><p>na neurotransmissão envolvendo o</p><p>ácido gama aminobutírico (GABA), e</p><p>não pela morte celular. A observação</p><p>da formação de inclusões citoplasmá-</p><p>ticas eosinofílicas, chamadas corpús-</p><p>culos de Negri, constituiu o principal</p><p>achado histopatológico da raiva, sen-</p><p>do considerado patognomônico da</p><p>condição. Destaque-se, todavia, que</p><p>em cerca de 20% dos pacientes, os</p><p>mesmos podem estar ausentes.</p><p>11RAIVA</p><p>Figura 7. Micrografia com numerosos vírus da raiva (pequenas partículas arredondadas em tom cinza escuro) e cor-</p><p>púsculos de Negri.</p><p>Figura 8. Exame histopatológico do tecido do SNC da autópsia mostrando inclusões citoplasmáticas neuronais (cor-</p><p>pos de Negri) após coloração com hematoxilina e eosina (esquerda) e antígeno do vírus da raiva (vermelho) após colo-</p><p>ração imuno-histoquímica (direita). Fonte: Centers for Disease Control and Prevention’s Public Health Image Library.</p><p>12RAIVA</p><p>4. QUADRO CLÍNICO</p><p>O período de incubação varia de dias</p><p>a anos, encontrando-se geralmente</p><p>entre quatro a oito semanas. Esta va-</p><p>riação dependerá da distância entre o</p><p>ferimento no qual foi inoculado o ví-</p><p>rus rábico e o SNC, da quantidade de</p><p>tecido envolvido na inoculação, dos</p><p>mecanismos de resposta do hospe-</p><p>deiro e da carga viral inoculada. Cabe</p><p>ressaltar que as lesões próximas da</p><p>cabeça e aquelas em crianças costu-</p><p>mam ter o período de incubação mais</p><p>curto.</p><p>Fase prodrômica: Usualmente é ca-</p><p>racterizada por queixas inespecíficas,</p><p>como febre, cefaleia, indisposição,</p><p>mialgias, anorexia e tosse não pro-</p><p>dutiva. Em 50% a 80% dos casos,</p><p>acompanha-se de parestesias e/ou</p><p>fasciculações musculares ao redor</p><p>do local da inoculação do agente vi-</p><p>ral. Acredita-se que tais manifesta-</p><p>ções sejam decorrentes da disfun-</p><p>ção dos nervos periféricos devido à</p><p>reação imunológica dirigida ao vírus</p><p>rábico em replicação no gânglio sen-</p><p>sitivo (ganglioneuronite). Com a evo-</p><p>lução do quadro, começam a surgir</p><p>sinais indicativos de encefalite, tais</p><p>como diminuição da acuidade auditi-</p><p>va ou surdez, diplopia, visão turva e</p><p>estrabismo.</p><p>Fase neural aguda: É subdividida em</p><p>duas formas clássicas da entidade</p><p>nosológica: furiosa, relacionada prin-</p><p>cipalmente com o vírus transmitidos</p><p>por canídeos, e a paralítica, associa-</p><p>da, geralmente, ao vírus transmitidos</p><p>por morcegos.</p><p>• Forma furiosa: após dois a 10 dias</p><p>da primeira fase emergem ansie-</p><p>dade grave, excitação e agitação</p><p>psicomotora. Convulsões genera-</p><p>lizadas, meningismo e espasmos</p><p>musculares involuntários podem</p><p>fazer parte do contexto clínico, as-</p><p>sim como, períodos de confusão</p><p>mental, intercalados por momen-</p><p>tos de lucidez, disartria, hipereste-</p><p>sias, sensibilidade à luz (fotofobia),</p><p>sensibilidade a ruídos intensos ou</p><p>brisas leves (aerofobia). A disfagia</p><p>associada à salivação excessiva</p><p>integra o quadro tradicionalmente</p><p>denominado “espumar pela boca”.</p><p>Em metade dos enfermos, é pos-</p><p>sível observar espasmos da mus-</p><p>culatura da orofaringe, da laringe e</p><p>diafragmática, geralmente incita-</p><p>das por tentativas de ingestão de</p><p>água, ou raramente, pela simples</p><p>visão dela, caracterizando a hidro-</p><p>fobia. O paciente evolui paulatina-</p><p>mente para o coma, com o êxito</p><p>letal acontecendo em quatro a 10</p><p>dias, geralmente durante convul-</p><p>são ou ocorrência de apneia.</p><p>• Forma paralítica: esta modalidade</p><p>pode ser decorrente da afecção ra-</p><p>quimedular, acompanhando ou se-</p><p>guindo a excitação, assemelhan-</p><p>do-se, muitas vezes, à síndrome</p><p>13RAIVA</p><p>de Guillain-Barré, o que pode difi-</p><p>cultar o diagnóstico sobremaneira.</p><p>Este fato salienta a necessidade da</p><p>inclusão de testes específicos para</p><p>a detecção de raiva em serviços</p><p>de transplante de órgãos, particu-</p><p>larmente em doadores com sinais</p><p>de comprometimento neurológico.</p><p>Habitualmente, a forma paralítica</p><p>associa-se à mordedura de morce-</p><p>gos. Deve ser comentado que na</p><p>região da mordedura ocorre, com</p><p>alguma frequência, parestesia, dor</p><p>e prurido,</p><p>contexto clínico que evo-</p><p>lui para paralisia muscular flácida</p><p>precoce, preservando, geralmente,</p><p>a sensibilidade. É marcante a ocor-</p><p>rência de febre, geralmente alta e</p><p>intermitente. O quadro de parali-</p><p>sia pode determinar, igualmente,</p><p>alterações cardiorrespiratórias, re-</p><p>tenção urinária aguda e obstrução</p><p>intestinal funcional. Apesar de se</p><p>observarem-se espasmos mus-</p><p>culares, os achados clínicos não</p><p>se alinham aqueles da hidrofobia,</p><p>destacando-se que a consciência</p><p>se mantém preservada na maioria</p><p>dos casos.</p><p>HORA DA REVISÃO!</p><p>A síndrome de Guillain-Barré é um distúrbio autoimune que acomete parte do siste-</p><p>ma nervoso, a mielina em específico. É geralmente provocado por um processo infec-</p><p>cioso anterior e manifesta fraqueza muscular, com redução ou ausência de reflexos.</p><p>Várias infecções têm sido associadas à Síndrome de Guillain-Barré, sendo a infecção</p><p>por Campylobacter, que causa diarreia, a mais comum. A incidência anual é de 1-4</p><p>casos por 100.000 habitantes e pico entre 20 e 40 anos de idade.</p><p>Os sinais de disautonomia são ob-</p><p>servados nas duas formas da do-</p><p>ença e incluem pupilas irregulares e</p><p>dilatadas, lacrimejamento, salivação,</p><p>sudorese, hipotensão arterial pos-</p><p>tural/ hipertensão arterial sistêmica,</p><p>bradicardia, bradiarritmia, taquicardia</p><p>e insuficiência respiratória (principais</p><p>causa de morte).</p><p>14RAIVA</p><p>+</p><p>+</p><p>2 a 10 dias</p><p>FORMA PARALÍTICA</p><p>4 a 10 dias</p><p>COMA</p><p>ANSIEDADE</p><p>GRAVE</p><p>AGITAÇÃO</p><p>PSICOMOTORA</p><p>HIDROFOBIA</p><p>HIPERESTESIA</p><p>DISARTRIA</p><p>SINAIS DE</p><p>DISAUTONOMIA</p><p>FOTOBIA</p><p>CONFUSÃO</p><p>MENTAL</p><p>PARESTESIA</p><p>DOR</p><p>AFECÇÃO</p><p>RAQUIMEDULAR</p><p>PARALISIA</p><p>MUSCULAR FLÁCIDA</p><p>CONSCIÊNCIA</p><p>PRESERVADA</p><p>SINAIS DE</p><p>DISAUTONOMIA</p><p>Queixas inespecíficas</p><p>INOCULAÇÃO</p><p>DO VÍRUS</p><p>PERÍODO DE INCUBAÇÃO</p><p>FASE PRODRÔMICA</p><p>Dias a anos (média: 4 a 8 semanas)</p><p>Fatores que alteram</p><p>esse período:</p><p>Localização do ferimento</p><p>Mecanismos de resposta do hospedeiro</p><p>Quantidade de tecido envolvido</p><p>Carga viral inoculada</p><p>CEFALEIA</p><p>MIALGIA</p><p>FEBRE</p><p>TOSSE</p><p>ANOREXIA</p><p>Parestesia e/ou</p><p>fasciculação ao redor</p><p>do local da inoculação</p><p>Evolução do quadro:</p><p>início da encefalite</p><p>SURDEZ</p><p>DIPLOPIA</p><p>ESTRABISMO</p><p>FASE NEURAL AGUDA</p><p>FORMA FURIOSA</p><p>FORMA PARALÍTICA</p><p>MAPA MENTAL - QUADRO CLÍNICO E FASES DA RAIVA HUMANA</p><p>15RAIVA</p><p>5. DIAGNÓSTICO</p><p>A história epidemiológica compatí-</p><p>vel (lesão por animais), associada aos</p><p>achados clínicos já citados, compõe</p><p>a base da suspeição diagnóstica. A</p><p>detecção do vírus rábico é essencial</p><p>para o diagnóstico ante-mortem es-</p><p>pecífico. Com este intuito, podem-se</p><p>empregar métodos de identificação</p><p>do antígeno rábico, pela técnica de</p><p>imunofluorescência direta (IFD) em</p><p>decalques de células da córnea (cor-</p><p>nea test), biópsia de pele de couro ca-</p><p>beludo da região occipital (nesta re-</p><p>gião os folículos pilosos são bastante</p><p>inervados), amostra de saliva ou líqui-</p><p>do cefalorraquidiano (LCR). A pesqui-</p><p>sa dos anticorpos no LCR dirigidos ao</p><p>vírus da raiva deve ser realizada após</p><p>dez dias de instaladas as manifesta-</p><p>ções clínicas, sendo feita através dos</p><p>métodos de ensaio imunoenzimático</p><p>(ELISA) e imunofluorescência.</p><p>Nos casos nos quais não há histórico</p><p>de vacinação, a pesquisa de anticor-</p><p>pos no soro, através da soroneutra-</p><p>lização (RIFFT), pode contribuir para</p><p>o diagnóstico. Embora com mínima</p><p>participação na rotina de diagnósti-</p><p>co laboratorial da raiva, técnicas de</p><p>biologia molecular, como o RT-PCR</p><p>e o semi-nested PT-PCR, têm sido</p><p>padronizados para a detecção do ví-</p><p>rus. Tais ensaios aliam rapidez, sen-</p><p>sibilidade e especificidade, além de</p><p>permitir a identificação da cepa vi-</p><p>ral envolvida. No entanto, nenhuma</p><p>das técnicas, isoladamente, oferece</p><p>100% de sensibilidade, necessitando</p><p>de um conjunto de achados para au-</p><p>mentar a probabilidade.</p><p>Ressalte-se que o resultado positivo</p><p>é diagnóstico para a infecção, porém</p><p>o negativo não a exclui. PCR pode ser</p><p>utilizado, contudo não é especifico.</p><p>16RAIVA</p><p>Ao avaliar um caso suspeito de rai-</p><p>va humana, o profissional deverá co-</p><p>municar imediatamente a Secretaria</p><p>Estadual de Saúde (mais especifica-</p><p>mente ao Serviço de Vigilância Epi-</p><p>demiológica), a qual deverá fornecer</p><p>condições para a coleta de espécimes</p><p>biológicos, bem como o encaminha-</p><p>mento aos laboratórios. As primeiras</p><p>amostras obtidas deverão ser fracio-</p><p>nadas, duas amostras de cada mate-</p><p>rial e direcionadas ao Laboratório de</p><p>Diagnóstico do Estado ou Laboratório</p><p>Central de Saúde Pública (LACEN).</p><p>Os resultados laboratoriais são emi-</p><p>tidos, usualmente, em até 72h após</p><p>o recebimento das amostras. Sem o</p><p>diagnóstico específico, quando não</p><p>houver positividade nos materiais</p><p>biológicos examinados pelos labora-</p><p>tórios locais e pelo LACEN, o paciente</p><p>deverá ser retirado do protocolo tera-</p><p>pêutico e outro diagnóstico ser exaus-</p><p>tivamente pesquisado. Se o paciente</p><p>evoluir para o óbito, antes ou depois</p><p>do diagnóstico específico, deverá ser</p><p>realizada necropsia, destacando-se</p><p>que o encéfalo deverá ser enviado ao</p><p>laboratório, com a finalidade de escla-</p><p>recer a existência ou não da infecção</p><p>pelo vírus da raiva.</p><p>72 horas</p><p>História de lesão</p><p>por animal</p><p>Biópsia de pele de couro</p><p>cabeludo da região occipital;</p><p>Decalques de células da</p><p>córnea (cornea test);</p><p>Amostra de saliva; ou</p><p>Líquido cefalorraquidiano (LCR).</p><p>Quadro clinico</p><p>compatível</p><p>Suspeita da raiva</p><p>Comunicar o</p><p>Serviço de Vigilância</p><p>Epidemiológica</p><p>Coleta de material</p><p>Imunofluorescência</p><p>direta (IFD)</p><p>Resultado</p><p>Se o paciente</p><p>evoluir para o óbito</p><p>Necropsia</p><p>para o diagnóstico</p><p>post mortem</p><p>MAPA MENTAL - PROCEDIMENTOS PARA O DIAGNÓSTICO ESPECÍFICO DA RAIVA</p><p>17RAIVA</p><p>6. DIAGNÓSTICO</p><p>DIFERENCIAL</p><p>A fase prodrômica inespecífica pode</p><p>ser confundida com uma infinidade</p><p>de distúrbios infecciosos, como uma</p><p>doença viral não específica, mono-</p><p>nucleose, bacteremia ou meningite.</p><p>O diagnóstico diferencial dependerá</p><p>muito do desenvolvimento de raiva</p><p>furiosa ou paralítica.</p><p>Em pacientes com uma constelação</p><p>de sintomas e sinais de encefalite,</p><p>outras infecções mais comuns (por</p><p>exemplo, vírus do herpes simplex,</p><p>vírus do Nilo Ocidental) e outros dis-</p><p>túrbios não infecciosos (por exemplo,</p><p>vasculite do sistema nervoso central,</p><p>encefalopatia tóxica ou metabólica)</p><p>devem ser descartados. Uma série</p><p>que comparou pacientes com raiva</p><p>confirmada com pacientes com ou-</p><p>tras formas de encefalite constatou</p><p>que os casos de raiva eram diferen-</p><p>ciados pela presença de hidrofobia,</p><p>aerofobia, disfagia e dor localizada,</p><p>fraqueza ou parestesia.</p><p>Outras causas de rigidez muscular</p><p>que podem ser observadas na raiva</p><p>incluem tétano, distonia por fenotia-</p><p>zina e envenenamento por estricnina.</p><p>Embora os pacientes com delirium</p><p>tremens possam demonstrar agita-</p><p>ção, apresentar alucinações e tremo-</p><p>res, eles não apresentam hidrofobia</p><p>ou aerofobia.</p><p>A raiva paralítica pode ser confundi-</p><p>da com síndrome de Guillain-Barré,</p><p>poliomielite, vírus do Nilo Ocidental</p><p>e mielite transversa aguda. Pacien-</p><p>tes com poliomielite não apresen-</p><p>tam distúrbios sensoriais e a febre</p><p>geralmente não persiste com o início</p><p>da paralisia. Outras polineuropatias</p><p>agudas, distúrbios da junção neuro-</p><p>muscular e processos que afetam a</p><p>medula espinhal também devem ser</p><p>considerados.</p><p>7. TRATAMENTO</p><p>Não há uma terapia estabelecida</p><p>para pacientes humanos com raiva.</p><p>Uma abordagem ao tratamento da</p><p>raiva humana foi recentemente pu-</p><p>blicada. O artigo recomendou o uso</p><p>de uma combinação de terapias e</p><p>discutiu os prós e contras de se utili-</p><p>zar uma variedade de medicamentos</p><p>específicos.</p><p>Em 2004, uma paciente de 15 anos</p><p>de idade, sem ter sido vacinada pre-</p><p>viamente ao aparecimento dos sin-</p><p>tomas da doença clínica, sobreviveu</p><p>à raiva no Brasil. Ela fora mordida no</p><p>dedo por um morcego e não procu-</p><p>rou atendimento médico ou recebeu</p><p>qualquer tratamento. Por volta de um</p><p>mês após a mordida, a paciente de-</p><p>senvolveu sintomas clínicos de raiva,</p><p>e anticorpos neutralizantes contra o</p><p>vírus da raiva foram detectados em</p><p>seu soro e líquido cefalorraquidiano.</p><p>18RAIVA</p><p>Sua terapia incluiu coma terapêutico</p><p>(induzido) com uso de midazolam in-</p><p>travenoso por sete dias; um padrão</p><p>de supressão foi mantido em seu</p><p>eletroencefalograma, e fenobarbital</p><p>suplementar foi ministrado. Ela tam-</p><p>bém recebeu terapia com ketamina e</p><p>terapia antiviral, incluindo ribavirina e</p><p>amantadina.</p><p>Com sua melhora, a paciente recebeu</p><p>alta do hospital apresentando déficit</p><p>neurológico, porém apresentou me-</p><p>lhora neurológica posteriormente.</p><p>Este caso foi o primeiro registro de</p><p>sobrevivência à raiva sem que o in-</p><p>divíduo tenha sido vacinado antes do</p><p>aparecimento dos sintomas da rai-</p><p>va clínica. Não se sabe se a terapia</p><p>com um ou mais agentes específicos</p><p>exerceu um papel importante para o</p><p>resultado positivo da paciente. En-</p><p>tretanto, daquele momento em dian-</p><p>te, houve o registro de no mínimo 13</p><p>casos nos quais os principais compo-</p><p>nentes desta abordagem (o protoco-</p><p>lo “Milwaukee”) foram utilizados e</p><p>que resultaram em desfechos fatais.</p><p>+Coma induzido</p><p>PROTOCOLO</p><p>“MILWAUKEE”</p><p>Terapia antiviral</p><p>No BrasilCritérios de exclusão</p><p>Principais</p><p>complicações</p><p>Protocolo de Recife• Paciente sem</p><p>história de febre;</p><p>• História de doença</p><p>superior a 14 dias;</p><p>• Sem vínculo epidemiológico</p><p>com a raiva;</p><p>• Com esquema profilático</p><p>de pós-exposição completo</p><p>em tempo oportuno;</p><p>• Com doença associada</p><p>grave ou incurável, ou</p><p>com sequela neurológica</p><p>prévia limitante.</p><p>Infecções</p><p>Hiper/Hiponatremia</p><p>Convulsões</p><p>Vasoespasmo cerebral</p><p>Hipertensão intracraniana</p><p>Disautonomia</p><p>MAPA MENTAL - PROTOCOLO “MILWAUKEE”</p><p>19RAIVA</p><p>A indução ao coma não tem demons-</p><p>trado ser útil para o tratamento de</p><p>doenças infecciosas no sistema ner-</p><p>voso, e não há evidências que deem</p><p>suporte a esta abordagem para o tra-</p><p>tamento da raiva ou outras encefali-</p><p>tes virais. Diante do exposto, o coma</p><p>terapêutico não deve se tornar uma</p><p>terapia de rotina para o tratamento</p><p>da raiva. O desenvolvimento preco-</p><p>ce de anticorpos neutralizantes con-</p><p>tra o vírus da raiva no curso clínico do</p><p>paciente, que provavelmente ocorre</p><p>em menos de 20% de todos os que</p><p>são acometidos pela raiva, provavel-</p><p>mente contribuiu para um desfecho</p><p>favorável. Os vírus da raiva de mor-</p><p>cego podem ser menos neurovirulen-</p><p>tos que as variantes caninas e outras</p><p>responsáveis pela maioria dos casos</p><p>humanos de raiva, e a raiva causada</p><p>pelas variantes caninas do vírus rábi-</p><p>co pode levar a resultados piores que</p><p>a causada por variantes de morcego.</p><p>Finalmente, a maioria dos sobrevi-</p><p>ventes apresentou anticorpos neu-</p><p>tralizantes contra o vírus da raiva</p><p>em soros e líquido cefalorraquidiano,</p><p>porém outros testes laboratoriais de</p><p>diagnóstico normalmente apresen-</p><p>tam resultado negativo para o antíge-</p><p>no do vírus da raiva e para o RNA em</p><p>líquidos e tecidos (tecidos cerebrais</p><p>não foram testados). Isso deve ocor-</p><p>rer devido à eficiente depuração viral.</p><p>8. PROFILAXIA PRÉ E PÓS</p><p>EXPOSIÇÃO</p><p>O controle da raiva humana depende</p><p>de diversas medidas de saúde e de</p><p>educação, abrangendo ações indivi-</p><p>duais e coletivas, incluindo a vacina-</p><p>ção animal, a captura para controle</p><p>de mamíferos silvestres e a profi-</p><p>laxia pré e pós-exposição para os</p><p>humanos, além da vigilância epide-</p><p>miológica efetiva e adequada. Em</p><p>relação à profilaxia pós-exposição, o</p><p>conhecimento das condutas a serem</p><p>adotadas é de extrema relevância</p><p>para o profissional da área da saúde,</p><p>principalmente para aqueles que atu-</p><p>am nos serviços de urgência e emer-</p><p>gência. Os procedimentos visam im-</p><p>pedir que o vírus rábico alcance as</p><p>terminações nervosas adjacentes à</p><p>solução de continuidade, através da</p><p>estimulação da resposta imunológica</p><p>do enfermo e da eliminação das partí-</p><p>culas virais da lesão. Deste modo, im-</p><p>pede-se o processo de adoecimento.</p><p>O primeiro cuidado após a morde-</p><p>dura do animal é a exaustiva limpe-</p><p>za do ferimento com água e sabão,</p><p>fazendo-se, ato contínuo, a antissep-</p><p>sia com álcool iodado, povidine ou</p><p>clorexidina. A sutura da lesão não é</p><p>recomendada rotineiramente, mas,</p><p>nas lesões extensas a aproximação</p><p>das bordas do ferimento pode ser</p><p>realizada, situação na qual a infiltra-</p><p>ção da lesão com soro antirrábico é</p><p>20RAIVA</p><p>preconizada. A profilaxia para o té-</p><p>tano é eventualmente necessária,</p><p>respeitando-se suas indicações con-</p><p>sagradas na literatura e nos protoco-</p><p>los governamentais.</p><p>As mordeduras de cães e gatos nas</p><p>mãos, na face, no pescoço ou nas le-</p><p>sões extensas e profundas, ou ainda</p><p>com comprometimento ósseo e/ou</p><p>articular, devem receber antimicro-</p><p>bianos profiláticos pelo risco de in-</p><p>fecção secundária. Os fármacos su-</p><p>geridos são amoxicilina/clavulanato,</p><p>ou ampicilina/ sulbactam por cinco</p><p>dias, visando os germes mais comu-</p><p>mente isolados, como Staphylococcus</p><p>aureus, Pasteurella multocida (prin-</p><p>cipalmente em gatos), anaeróbios e</p><p>Capnocytophaga canimorsus. Como</p><p>segunda linha podem ser prescritas</p><p>cefalosporinas de segunda geração.</p><p>Nos enfermos com história de hiper-</p><p>sensibilidade à penicilina, mormen-</p><p>te em reações alérgicas graves, uma</p><p>opção é a associação de clindamicina</p><p>e sulfametoxazol/trimetoprim ou clin-</p><p>damicina e fluoroquinolona.</p><p>No que diz respeito às lambeduras de</p><p>pele com lesões superficiais, a lava-</p><p>gem com solução fisiológica a 0,9%</p><p>é eficaz. A lambedura da pele íntegra</p><p>não é habitualmente considerada de</p><p>risco.</p><p>Em relação à vacinação, existem no</p><p>mercado dois tipos de vacinas an-</p><p>tirrábicas: a fuenzalida & palácios</p><p>e a cultivo celular, as quais têm em</p><p>sua composição o vírus inativado. A</p><p>fuenzalida & palácios é preparada</p><p>a partir de encéfalos de camundon-</p><p>gos recém-nascidos contendo uma</p><p>pequena parcela de tecido nervoso,</p><p>representando o imunobiológico com</p><p>maior índice de efeitos colaterais, des-</p><p>tacando-se especialmente os quatro</p><p>grandes grupos. Suas reações ad-</p><p>versas locais são dor, rubor, prurido e</p><p>linfonodomegalia satélite; sistêmicas</p><p>são febre, mal estar, cefaleia, mialgias</p><p>e artralgias e neurológicas ocorrem</p><p>devido à reação desmielinizante da</p><p>vacina, manifestando-se como qua-</p><p>dros neuroparalíticos tipo</p><p>Guillain-Barré, tipo neurítico ou en-</p><p>cefalomielite, via de regra, é bastan-</p><p>te relacionada ao número de doses</p><p>aplicadas e à repetição do esquema</p><p>vacinal.</p><p>A OMS recomenda o uso de vacinas</p><p>de cultivo celular, por esta apresen-</p><p>tar imunogenicidade comprovada,</p><p>maior segurança e menores riscos de</p><p>reações adversas. A vacina produzida</p><p>em cultivo celular, utilizada no Brasil</p><p>desde 2003, é gratuita e encontra-se</p><p>disponível em toda rede do Siste-</p><p>ma Único de Saúde (SUS). Devido à</p><p>elevada letalidade da doença não há</p><p>restrições à vacinação, gravidez, mu-</p><p>lheres lactantes, doenças intercorren-</p><p>tes ou concomitância de outros trata-</p><p>mentos, enfatizando-se que a dose</p><p>de aplicação independe da idade e do</p><p>peso do paciente.</p><p>21RAIVA</p><p>Figura 9. Vacina da raiva (inativada). Fonte: Fiocruz</p><p>A imunização passiva, realizada por</p><p>soro, heterólogo ou homólogo, se dá</p><p>pela infiltração do soro no ferimento,</p><p>respeitando-se a dose recomendada</p><p>a cada enfermo e procurando-se pro-</p><p>ver o maior volume possível de infil-</p><p>tração. Caso a região anatômica não</p><p>permita a introdução de todo o volu-</p><p>me do soro, a quantidade restante, a</p><p>menor possível, deve ser aplicada por</p><p>via intramuscular, preferencialmente</p><p>em regiões sem muito tecido adipo-</p><p>so e em áreas díspares em relação à</p><p>administração da vacina. Ressalta-se</p><p>que o soro antirrábico é do tipo he-</p><p>terólogo, produzido por inoculação do</p><p>vírus rábico em equinos hiper imu-</p><p>nizados. Os soros atualmente pro-</p><p>duzidos são seguros, contendo bai-</p><p>xa concentração de proteína animal,</p><p>todavia, podem causar eventos ad-</p><p>versos como reações de hipersensibi-</p><p>lidade. A dose utilizada é de 40 UI/kg.</p><p>A imunoglobulina humana antirrá-</p><p>bica (HRIG), um produto homólogo,</p><p>tem sua principal indicação quando</p><p>há reações anafiláticas à administra-</p><p>ção do soro heterólogo, sendo indica-</p><p>da na dose de 20 UI/kg. Não há risco</p><p>de transmissão de moléstias infeccio-</p><p>sas, incluindo o vírus da imunodefici-</p><p>ência humana – HIV. Por ser obtida</p><p>a partir do plasma de doadores pre-</p><p>viamente imunizados com o vírus, a</p><p>HRIG possui produção limitada, e, por</p><p>conseguinte, baixa disponibilidade</p><p>e elevado custo. Deve ser comenta-</p><p>do, no entanto, que embora ainda em</p><p>pequena escala a HRIG vem sendo</p><p>22RAIVA</p><p>produzida através de hibridomas se-</p><p>cretores de anticorpos monoclonais,</p><p>estratégia que alia economia, eficácia</p><p>e segurança, permitindo que, em um</p><p>mesmo coquetel antirrábico, sejam</p><p>administrados anticorpos reconhe-</p><p>cedores de diferentes epítopos virais.</p><p>As indicações e abordagem da profi-</p><p>laxia pós-exposição estão apresenta-</p><p>das na tabela abaixo.</p><p>SE LIGA! É importante ressaltar que em</p><p>agressões por morcegos, deve-se pro-</p><p>ceder o soro e vacinação, sendo sempre</p><p>considerado um acidente grave. O soro</p><p>só não é indicado para pacientes que re-</p><p>latem tratamento anterior.]</p><p>Se o mamífero envolvido na exposi-</p><p>ção humana é selvagem ou é suspei-</p><p>to ou sabidamente portador de raiva,</p><p>deve ser eutanasiado e ter sua ca-</p><p>beça enviada para um laboratório da</p><p>vigilância epidemiológica, com o ob-</p><p>jetivo de examinar seu cérebro com</p><p>anticorpos fluorescentes, visando a</p><p>detecção de antígenos virais ou cor-</p><p>púsculos de Negri. Os demais animais</p><p>são observados por 10 dias, período</p><p>no qual, se houver o desenvolvimento</p><p>da moléstia, estará indicado o exame</p><p>do seu cérebro, como já citado. Nos</p><p>casos de mamíferos que escaparam,</p><p>ou que não possam ser observados,</p><p>a profilaxia ativa e passiva deve ser</p><p>assegurada.</p><p>23RAIVA</p><p>Infiltração de 40 UI/kg no ferimentoSORO</p><p>Caso a região anatômica não permita a introdução de todo o</p><p>volume do soro, o restante deve ser aplicado por via intramuscular</p><p>4 doses administradas nos dias 0, 3, 7, 14VACINA</p><p>A vacina de cultivo celular possui menos efeitos colaterais</p><p>que a fuenzalida & palácios e, por isso, é mais usada no Brasil</p><p>PACIENTE COM</p><p>A LESÃO CHEGA</p><p>AO SERVIÇO</p><p>ANIMAL DOMÉSTICO</p><p>(CÃO OU GATO)</p><p>MORCEGO OU</p><p>ANIMAL SILVESTE</p><p>Limpeza do ferimento</p><p>com água e sabão</p><p>Avaliar condição</p><p>do animal</p><p>Profilaxia para tétano</p><p>Avaliar a necessidade</p><p>de terapia com</p><p>antimicrobianos</p><p>profiláticos</p><p>Identificar animal</p><p>agressor</p><p>SORO + VACINA</p><p>RAIVOSO, SUSPEITO,</p><p>DESAPARECIDO</p><p>CLINICAMENTE SADIO</p><p>CONTATO INDIRETO</p><p>CONTATO INDIRETO</p><p>ACIDENTE LEVE</p><p>ACIDENTE LEVE</p><p>ACIDENTE GRAVE</p><p>ACIDENTE GRAVE</p><p>NÃO TRATAR</p><p>NÃO TRATAR</p><p>VACINA</p><p>OBSERVAR O ANIMAL</p><p>SORO + VACINA</p><p>INICIAR VACINA E</p><p>OBSERVAR O ANIMAL</p><p>TORNA-SE RAIVOSO</p><p>MAPA MENTAL - FLUXOGRAMA DA PROFILAXIA PÓS EXPOSIÇÃO DA RAIVA EM HUMANOS</p><p>24RAIVA</p><p>A profilaxia pré-exposição está re-</p><p>comendada para médicos veteriná-</p><p>rios, além de professores, alunos e</p><p>profissionais que trabalham com ani-</p><p>mais potencialmente infectados com</p><p>o vírus da raiva, por exemplo, espe-</p><p>leólogos, laçadores, treinadores de</p><p>cães, tratadores e treinadores de ani-</p><p>mais domésticos e de mamíferos de</p><p>interesse econômico (equídeos, bovi-</p><p>nos, caprinos, ovinos e suínos, dentre</p><p>outros) e profissionais de laboratórios.</p><p>Além do grupo de profissionais, a po-</p><p>pulação também pode estar sujeita à</p><p>exposição em meio às suas ativida-</p><p>des cotidianas e de lazer.</p><p>O tratamento consta de três doses de</p><p>vacina, ministradas nos dias 0, 7 e 28.</p><p>Os anticorpos circulantes devem ser</p><p>testados a partir do 14° dia após a úl-</p><p>tima dose do esquema vacinal. Uma</p><p>dose de reforço é preconizada quan-</p><p>do a titulação se encontrar em níveis</p><p>inferiores a 0,5 UI/ mL5,18. Nos ca-</p><p>sos de reexposição ao vírus rábico,</p><p>duas doses serão aplicadas, nos dias</p><p>0 e 3, exceto nos enfermos que fina-</p><p>lizaram o esquema de vacinação num</p><p>intervalo menor que 90 dias.</p><p>A implantação de Programas de Edu-</p><p>cação Continuada e de Educação em</p><p>Saúde e a mobilização comunitária,</p><p>através da Vigilância Epidemiológi-</p><p>ca, devem ser prioridades nos muni-</p><p>cípios, visando a redução de eventos</p><p>mórbidos com o vírus rábico, através</p><p>do estímulo para a proteção individu-</p><p>al e coletiva. Ademais, devem ser en-</p><p>fatizadas medidas preventivas e de</p><p>controle dos casos transmitidos por</p><p>mamíferos domésticos, em áreas ur-</p><p>banas e rurais, através de alta cober-</p><p>tura vacinal destes, controle do foco, e</p><p>monitoramento da circulação viral.</p><p>25RAIVA</p><p>Viral</p><p>Vacina (3 doses</p><p>nos dias: 0, 7 e 28)</p><p>Pós exposição</p><p>Pré exposição</p><p>Fase prodrômica</p><p>Fase neural aguda</p><p>Protocolo “Milwaukee”</p><p>Profissionais em risco</p><p>RAIVA</p><p>HUMANA</p><p>DEFINIÇÃO</p><p>TRATAMENTO</p><p>SINTOMAS</p><p>TRANSMISSÃO</p><p>PREVENÇÃO</p><p>DIAGNÓSTICO</p><p>Letalidade 100%</p><p>Zoonose</p><p>Acomete SNC</p><p>Rhabdoviridae</p><p>Cefaleia, mal estar</p><p>geral, febre, anorexia,</p><p>indisposição, mialgia</p><p>Espasmos, fotofobia,</p><p>hidrofobia, convulsões,</p><p>delírio, paralisia</p><p>Transmitida de 2-5 dias</p><p>antes dos sintomas</p><p>Saliva de animais</p><p>contaminados</p><p>Óbito do animal em 5-7</p><p>dias após sintomas</p><p>Arranhão,</p><p>mordida, lambida</p><p>Indução de coma + antivirais</p><p>Pouca efetividade</p><p>Necropsia</p><p>Imunofluorescência</p><p>direta (IFD) em</p><p>material coletado</p><p>Leve</p><p>Indireto</p><p>Grave</p><p>Vacina se confirmado</p><p>raiva no animal</p><p>Limpeza com</p><p>água e sabão</p><p>Vacina + soro</p><p>se confirmado</p><p>raiva no animal</p><p>Iniciar vacina e</p><p>observar o animal</p><p>Vacina (4 doses</p><p>nos dias: 0, 3, 7 e 14)</p><p>MAPA MENTAL - CARACTERÍSTICAS GERAIS DA RAIVA HUMANA</p><p>26RAIVA</p><p>REFERÊNCIAS</p><p>BIBLIOGRAFICAS</p><p>Gomes, Andréia Patrícia, et al. “Raiva humana.” Revista Brasileira de Clínica Médica 10.4</p><p>(2012): 334-40.</p><p>Jackson, Alan C. “Atualização sobre a patogênese da raiva.” Revista Pan-amazônica de</p><p>Saúde 1.1 (2010): 167-172.</p><p>Ministério da Saúde (BR). Secretaria de Vigilância em Saúde. Departamento de Vigilância</p><p>Epidemiológica. “Normas técnicas de profilaxia da raiva humana.” (2011).</p><p>Lidiane, Ellen, et al. “Protocolo para Tratamento de Raiva Humana no Brasil (Comentado).”</p><p>Farmacologia Clínica: 71.</p><p>EPIDEMIOLÓGICA, Vigilância. Manual de diagnóstico laboratorial da raiva. Série A.</p><p>MURRAY, Patrick R.; ROSENTHAL, Ken S.; PFALLER, Michael A. Microbiologia médica. 8.</p><p>ed. Rio de Janeiro: Elsevier, 2017.</p><p>27RAIVA</p>

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