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<p>GRAVURA</p><p>INTRODUÇÃO</p><p>Prezado aluno,</p><p>O Grupo Educacional FAVENI, esclarece que o material virtual é semelhante ao da sala de</p><p>aula presencial. Em uma sala de aula, é raro – quase improvável - um aluno se levantar,</p><p>interromper a exposição, dirigir-se ao professor e fazer uma pergunta, para que seja esclarecida</p><p>uma dúvida sobre o tema tratado. O comum é que esse aluno faça a pergunta em voz alta para</p><p>todos ouvirem e todos ouvirão a resposta. No espaço virtual, é a mesma coisa. Não hesite em</p><p>perguntar, as perguntas poderão ser direcionadas ao protocolo de atendimento que serão</p><p>respondidas em tempo hábil.</p><p>Os cursos à distância exigem do aluno tempo e organização. No caso da nossa disciplina é</p><p>preciso ter um horário destinado à leitura do texto base e à execução das avaliações propostas. A</p><p>vantagem é que poderá reservar o dia da semana e a hora que lhe convier para isso.</p><p>A organização é o quesito indispensável, porque há uma sequência a ser seguida e prazos</p><p>definidos para as atividades.</p><p>Bons estudos!</p><p>GRAVURA – HISTÓRIA, TÉCNICAS E RELAÇÕES COM A IMPRESSÃO DE</p><p>PAPEL MOEDA</p><p>A GRAVURA</p><p>1</p><p>– Das Inscrições Sobre Pedras e Grutas Até as Impressões</p><p>Como São Hoje Conhecidas</p><p>As formas de animais foram, sem dúvida, as primeiras imagens que interessaram</p><p>aos homens pré-históricos, não apenas por sua importância como ameaça, mas,</p><p>talvez, por suas possibilidades como recursos alimentares. Cultos eram</p><p>reservados a eles, que muitas vezes eram usados como totens, ou seja, imagens</p><p>sagradas</p><p>2</p><p>. Por um lado, as primeiras inscrições gravadas pelo homem consistiram</p><p>nas marcas deixadas sobre pedras que formavam as paredes de seus abrigos</p><p>(cavernas) e, por outro, derivavam das marcas impressas sobre as mesmas</p><p>paredes com suas mãos, muitas vezes pintadas com sangue dos animais que</p><p>caçavam. Assim, esses dois modos de imprimir determinaram as bases de</p><p>algumas técnicas de gravação usadas até os dias atuais – as gravuras de incisão,</p><p>as de blocos secionados e outras, como as monotipias e os decalques, por</p><p>exemplo.</p><p>Grande parte dessas primeiras imagens foi encontrada na Europa, mais</p><p>precisamente na Espanha, França, Inglaterra, Alemanha, Itália, Áustria e União</p><p>Soviética. É possível encontra-las, também, em alguns locais arqueológicos na</p><p>África, Austrália, América e Ásia. Locais como Altamira, na Espanha, Lescaux, na</p><p>França e Papardallo, na Sicília foram dos mais importantes no sentido das</p><p>descobertas encontradas. As imagens colocadas a seguir retratam algumas</p><p>inscrições feitas pelo homem do Período Paleolítico e localizam-se na França e na</p><p>Itália.</p><p>1</p><p>Gravura é a denominação genérica das técnicas que permitem obter imagens (impressões) por</p><p>meio de matrizes.</p><p>2 Nas sociedades “primitivas”, os totens eram representados por plantas, imagens, pelos, penas</p><p>ou demais objetos que fossem associados a animais com os quais algumas dessas sociedades</p><p>se identificassem, transformando-os em objeto de adoração. N. da A..</p><p>Gravura – História, Técnicas e Relações com a Impressão de Papel Moeda 1</p><p>Figura 1 – Veados e Salmão, encontrada na região dos Altos Pirineus,</p><p>Magdalenian, França, 9 5/8 ", Coleção do Musée des Antiquités, Saint-Germain-en-</p><p>Laye, França</p><p>3</p><p>.</p><p>Figura 2- Figuras Humanas, encontradas na Caverna de Addaura, Monte</p><p>Pellegrino, Sicília. Período Paleolítico, gravura sobre rocha, 6 x 10/8 “.</p><p>3 EICHENBERG, Fritz. The Art of the Print – Masterpieces, History and Techniques. Harry N.</p><p>Abrams, Inc. Publishers, New York. 1976. p. 20.</p><p>Gravura – História, Técnicas e Relações com a Impressão de Papel Moeda 2</p><p>Muitas dessas inscrições eram preenchidas com pigmentos naturais como carvão,</p><p>obtido pela queima de madeiras, e fuligem. O vermelho era obtido com o óxido de</p><p>zinco, o amarelo com o ocre, o branco por meio da pulverização de giz. O sangue,</p><p>o leite e a gordura eram usados como aglutinantes. Os pincéis consistiam em</p><p>penas, tufos de cabelo, asas e pelos de um modo geral. As cores terra eram</p><p>aplicadas por meio de bastões e as tintas líquidas por meio dos pincéis ou</p><p>sopradas sobre as superfícies a serem coloridas</p><p>4</p><p>.</p><p>Com a invenção do ferro, as gravações ficaram mais acessíveis - antes disso, as</p><p>pedras eram usadas como instrumentos; depois, eles começaram a produzir</p><p>ciséis, agulhas e outros artefatos perfurantes.</p><p>O aprimoramento dessas ferramentas permitiu, às civilizações posteriores, maior</p><p>precisão e um número crescente de detalhes nos processos de gravação e</p><p>impressão. Assim, na Mesopotâmia e no Vale do Tigre e Eufrates, no quarto</p><p>milênio a. C., os textos eram muito elaborados e gravados sobre placas de barro e</p><p>bronze, chegando-se muito próximo aos sistemas de impressão como são</p><p>conhecidos hoje. Símbolos religiosos já eram gravados, criando-se os relevos,</p><p>muitos dos quais em miniaturas com medidas aproximadas de duas ou três</p><p>polegadas.</p><p>As inscrições sobre superfícies planas e circulares eram muito comuns, mas elas</p><p>apareciam, também, sobre esculturas, como nos exemplos seguintes. Como é</p><p>possível observar, essas peças apresentavam imagens bem próximas ao realismo,</p><p>evidenciando traços fisionômicos até hoje encontrados em indivíduos originários</p><p>daquelas regiões.</p><p>4 EICHENBERG, Fritz. The Art of the Print – Masterpieces, History and Techniques. Harry N.</p><p>Abrams, Inc. Publishers, New York. 1976. p. 21.</p><p>Gravura – História, Técnicas e Relações com a Impressão de Papel Moeda 3</p><p>Figura 3 – Devoto sumeriano, encontrado no Templo Abu, no Iraque. Começo do</p><p>Segundo Período Dinástico, 2600 a. C.. Gesso aplicado sobre pedra calcaria e</p><p>concha branca, 11 ¾ “. The Metropolitan Museum of Art, New York, USA</p><p>5</p><p>.</p><p>Figura 4 -Cilindro gravado e impressão correspondente, Nippur, Período Ur,</p><p>sudeste do Iraque, 2100 a. C.</p><p>6</p><p>.</p><p>5 HIBBARD, Howard. The Metropolitan Museum of Art. Harrison House, New York, USA. 1980. p.</p><p>54.</p><p>6 Os selos eram usados como assinaturas antes da invenção da escrita e continuaram, a partir</p><p>de então, apenas como assinaturas. Ibid.. p. 53.</p><p>Gravura – História, Técnicas e Relações com a Impressão de Papel Moeda 4</p><p>No Egito os selos também serviam para substituir assinaturas e eram usados</p><p>pelos sacerdotes e estudiosos com o objetivo de conhecer e retratar detalhes de</p><p>anatomia. Havia vários ateliês para a confecção dessas peças. Com a invenção da</p><p>escrita, os pergaminhos e papiros passaram a substituir as pedras e outras</p><p>superfícies usadas para inscrições. Como se pode imaginar, isso adicionou um</p><p>grande impulso ao progresso da humanidade. É certo que a princípio os escritos</p><p>assim produzidos não eram acessíveis a todas as pessoas, mas já faziam muita</p><p>diferença com relação ao desenvolvimento das potencialidades da escrita.</p><p>Com o desenvolvimento da escrita, foram introduzidos os rolos de papiro, sobre os</p><p>quais eram colocados os textos escritos à mão. Os romanos produziram grande</p><p>quantidade desses rolos, que eram copiados por escravos, os quais, por sua vez,</p><p>faziam tráfico desses exemplares. No entanto, as bibliotecas pessoais não eram</p><p>muito comuns na Roma de então, havendo apenas trinta bibliotecas públicas.</p><p>Tyrannio, amigo de Cícero, possuía uma biblioteca com 30.000 volumes desses</p><p>papiros, mas era uma coleção pequena, se comparada com algumas bibliotecas</p><p>públicas daquela época</p><p>7</p><p>.</p><p>No Sc. VI, no Império Romano, era comum o uso de estêncil, aplicado com folhas</p><p>de ouro sobre documentos oficiais. O esgrafito era utilizado no Império Romano</p><p>para escrever sobre as paredes a opinião de algumas pessoas sobre</p><p>determinados assuntos, sendo também comum sua utilização como base de</p><p>desenhos de afrescos.</p><p>Institute é ligado à Universidade de New Mexico e</p><p>é um dos responsáveis pela disseminação da litografia no território norte-</p><p>americano, sobretudo nas escolas de arte e universidades. Lá são formados</p><p>diversos profissionais de alto padrão. Na Europa existem também diversos ateliês</p><p>de litografia, alguns dos quais em funcionamento desde a invenção e utilização</p><p>deste processo de impressão. Note-se a seguir uma imagem referente a uma</p><p>litografia impressa no Tamarind Institute.</p><p>Figura 53 – Charles Mattox, Variations on a Reauleau, 20 x 26 “, 1970. The</p><p>Tamarind Institute</p><p>.64</p><p>64 KNIGIN, Michael e ZMILES, Murray. The Contemporary Lithographic Workshop Around the World.</p><p>Van Nostrand Reinhold Company. New York, Toronto, London, Melbourne, 1974. p.147.</p><p>Gravura – História, Técnicas e Relações com a Impressão de Papel Moeda 58</p><p>A Litografia no Brasil</p><p>Tão logo foi inventada, a litografia se espalhou pela Europa e Portugal foi um dos</p><p>primeiros países a introduzi-la como método de impressão. Assim, como D. João</p><p>VI veio para o Brasil em 1808, criando a Imprensa Régia, dentre outras</p><p>benfeitorias, o processo foi introduzido aqui ainda nas primeiras décadas do Sc.</p><p>XIX. O tratado de litografia de Alois Senefelder foi publicado em 1818 e em 1817 já</p><p>havia chegado ao Brasil o francês Arnaldo Julien Pallieri, o primeiro litógrafo em</p><p>atividade no Brasil. Ele foi contratado para a Academia Militar como professor.</p><p>Depois vieram Johannn Steiman e Charles Rivieri, em 1826 e 1832,</p><p>respectivamente. Mais tarde, no Segundo Império, vieram outros litógrafos, mas</p><p>que tinham sobretudo propósitos comerciais. Alguns se estabeleceram por conta</p><p>própria e imprimiam santos, folhetos, vinhetas e diplomas, dentre outros</p><p>65</p><p>.</p><p>Segue-se uma imagem relativa à primeira litografia impressa no Brasil, de autoria</p><p>de Arnaud Julien Pallieri.</p><p>Figura 54 – S. Sebastião, Arnaud Julien Pallieri, litografia, 1818 66</p><p>.</p><p>65 MARTINS, Itajahy. Gravura – Arte e Técnica.Fundação Nestlé da Cultura e Laserprint</p><p>Editorial, S. Paulo. 1987. p. 186.</p><p>66 Ibid. p. 154.</p><p>Gravura – História, Técnicas e Relações com a Impressão de Papel Moeda 59</p><p>Várias revistas brasileiras editadas nos séculos XIX e XX foram executadas por</p><p>meio de impressões litográficas, destacando-se “O Mosquito”, “O Arlequim”, o</p><p>“Malho”, a “Revista Ilustrada”e outras. A Companhia de Anúncios de Bondes muito</p><p>contribuiu para o desenvolvimento de edições comerciais em litografia. Alguns</p><p>artistas estrangeiros radicados no Brasil, como o austríaco Gehard Ortof, o polonês</p><p>Mircalowski Mirca e o alemão barão de Puttkamer muito auxiliaram na arte da</p><p>litografia e editavam impressos comerciais de importância artística, marcando,</p><p>definitivamente, a qualidade da impressão litográfica no Brasil.</p><p>No entanto, só tardiamente a litografia esteve associada à impressão de obras de</p><p>arte. Seu desenvolvimento se deu sobretudo a partir dos anos 50 e 60 do século</p><p>passado, com o reflorescimento e a valorização da gravura no panorama artístico</p><p>nacional. Mesmo assim, a litografia não foi muito utilizada pelos artistas. Cumpre</p><p>ressaltar que o método não é simples e que, dada a natureza comercial da</p><p>produção de litografias, os melhores profissionais do ramo se encontravam em</p><p>gráficas. Com o desenvolvimento da impressão em off-set, muitas gráficas foram</p><p>desativando e seu material usado para impressão em pedras, mas ainda restavam</p><p>profissionais experientes que passaram a imprimir litografias para os artistas.</p><p>Dessa forma, ateliês como o denominado Imago, em S. Paulo, permaneceram até</p><p>poucos anos atrás imprimindo litografias para os artistas brasileiros. Muitos já se</p><p>encontram fechados nos dias atuais. Raros são os artistas que praticam esse</p><p>processo de impressão. Em Recife, também existe um grupo dedicado a</p><p>impressões em litografia, dirigido pelo pintor João Câmara. Os impressores são</p><p>remanescentes das gráficas especializadas em litografia comercial daquela</p><p>cidade, algumas das quais ainda estavam em funcionamento há cerca de 20 anos</p><p>atrás.</p><p>Dentre os artistas brasileiros que utilizaram a técnica, destacam-se Darel Valença</p><p>Lins, Itajahy Martins, Otávio Araújo, Faiga Ostrower, Maria Bonomi e Renina Katz,</p><p>dentre outros. É de autoria desta artista a litografia reproduzida a seguir.</p><p>Gravura – História, Técnicas e Relações com a Impressão de Papel Moeda 60</p><p>Figura 55 – Maria Bonomi, “Hyboeya”, litografia, 100 x 70 cm. Coleção Júlio</p><p>Bogoricini 67</p><p>.</p><p>67 MORAIS, Frederico. Da Coleção – os caminhos da arte brasileira. Júlio Bogoricin Imóveis e</p><p>Raízes Editora ltda. S. Paulo,. 1986. p.133.</p><p>Gravura – História, Técnicas e Relações com a Impressão de Papel Moeda 61</p><p>A Litografia e o Papel Moeda</p><p>Na medida em que se desenvolvia e apresentava maior facilidade de impressão, a</p><p>litografia foi sendo utilizada na fabricação de notas bancárias. Nos dias atuais a</p><p>litografia não é mais usada com seus métodos originais, mas sim por meio das</p><p>técnicas de off-set. Assim, no Brasil, terminada a arte final de uma nota, está</p><p>segue para a Seção de Fotografia da Casa da Moeda a fim de que sejam</p><p>elaborados os fotolitos. Os fotolitos são folhas de acetato fotosensíveis, sobre as</p><p>quais são reveladas as imagens fotografadas. Depois esses fotolitos são</p><p>transmitidos para uma chapa em cristal, uma vez que esse material não sofre</p><p>distorções com o tempo, o que acontece com as folhas de acetado, por serem</p><p>estas facilmente perecíveis. Finalmente, as imagens são transferidas para uma</p><p>chapa de latão e esta é submetida a operações técnicas de gravação e levada</p><p>para a impressora. Antes disso, no entanto, a chapa sofre um processo de</p><p>cromagem para que não se danifique durante a impressão.</p><p>A impressão em off-set geralmente é aplicada para a colocação das imagens que</p><p>servem de fundo para as notas e é geralmente associada à impressão de imagens</p><p>coloridas. Os relevos que determinam as texturas são feitos e impressos a partir</p><p>de placas gravadas em talho-doce, conforme explicações anteriores.</p><p>Para a impressão de papel moeda, vários outros detalhes são levados em conta.</p><p>O papel deve ser especial e sofrer a aplicação da marca d' água ainda em seu</p><p>processo de moldagem da folha. Além disso ele deve apresentar os fios de</p><p>segurança e fibras luminescentes coloridas. O controle de qualidade é muito</p><p>importante no processo de impressão de notas. Do mesmo modo que as</p><p>impressões em geral, em que a indústria gráfica vem utilizando, cada vez mais,</p><p>equipamentos e técnicas sofisticadas de impressão, a Casa da Moeda e as</p><p>empresas que fabricam dinheiro no mundo todo têm incluído esses equipamentos</p><p>em suas linhas de montagem. No entanto, o talho-doce ou buril, continua a ser</p><p>utilizado, em um processo em que a mão humana continua a ser extremamente</p><p>necessária. A seguir é mostrada a série de passos levados a efeito para a</p><p>Gravura – História, Técnicas e Relações com a Impressão de Papel Moeda 62</p><p>impressão de uma nota de 10 rublos. A nota foi idealizada pelo desenhista Roger</p><p>Pfund e fabricada na Suíça com todas as exigências técnicas necessárias.</p><p>As primeiras imagens evidenciam a frente e o verso da nota, além de um detalhe,</p><p>uma rosa, impressa na frente da nota. A idéia desenvolvida baseou-se na vida de</p><p>obra do escritor russo Alexandre Sergurivitch Pouchkine. Baseado nisso, o artista</p><p>tomou vários temas da vida de Alexander utilizando-os para a criação dos</p><p>desenhos do verso e do anverso. A rosa, por exemplo, é uma alusão a uma de</p><p>suas poesias. O grupo de pessoas carregando o poeta é uma alusão à sua morte</p><p>em duelo. Observem-se os detalhes em talho-doce encontrados no</p><p>verso da nota.</p><p>Os detalhes do verso foram executados em talho doce, sendo que alguns desses</p><p>desenhos foram elaborados com o auxílio do computador.</p><p>Depois são mostrados detalhes do céu, alguns croquis de desenhos a serem</p><p>realizados com o auxílio do computador, alem da sucessão de desenhos do</p><p>cavaleiro de São Petersburgo , personagem de uma novela de Pouchkine.</p><p>A série de impressões coloridas em off-set é mostrada a seguir. Primeiro aparece a</p><p>impressão sucessiva do amarelo e do magenta, a seguir a impressão do azul</p><p>sobre o magenta, mostrando os roxos. A superposição das cores básicas é</p><p>apresentada posteriormente, seguida pela impressão do verde, resultado da</p><p>superposição da impressão do azul sobre a impressão em amarelo. Depois são</p><p>apresentados os desenhos elaborados pelo computador e a seqüência</p><p>determinante das impressões da textura do fundo do verso com suas cores e</p><p>respectivas texturas.</p><p>Finalmente, a impressão em preto, em tamanho original, 130 x 65 cm, feita a buril,</p><p>mostrando também os detalhes da gravação. Note-se a rosa na parte superior à</p><p>direita da nota.</p><p>Gravura – História, Técnicas e Relações com a Impressão de Papel Moeda 63</p><p>Gravura – História, Técnicas e Relações com a Impressão de Papel Moeda 64</p><p>Gravura – História, Técnicas e Relações com a Impressão de Papel Moeda 65</p><p>Gravura – História, Técnicas e Relações com a Impressão de Papel Moeda 66</p><p>Gravura – História, Técnicas e Relações com a Impressão de Papel Moeda 67</p><p>Gravura – História, Técnicas e Relações com a Impressão de Papel Moeda 68</p><p>Figura 56 – Etapas da impressão de uma nota de 10 rublos</p><p>68</p><p>.</p><p>68 MONESTIER, Martin. L’Art du Papier Monnaie. Editions Point Neuf Paris. 1982. p. 34, 35,</p><p>36, 37, 38, 39 e 41.</p><p>Gravura – História, Técnicas e Relações com a Impressão de Papel Moeda 69</p><p>A Serigrafia</p><p>A serigrafia, também conhecida como silk-screen, é um método de impressão que</p><p>remonta à Antigüidade na China. O método consiste em isolar partes que não</p><p>permitem a passagem da tinta por entre os fios da tela preparada para esse fim ou</p><p>por intermédio de papéis perfurados, por onde eram espalhadas tintas por meio de</p><p>pincéis chatos. Esse processo foi utilizado no Ocidente pelos gregos e egípcios.</p><p>Como o nome indica, serigrafia quer dizer desenho na seda (seri – seda, grafia –</p><p>desenho). Os chineses imprimiam padrões nos tecidos usando estêncil de papel,</p><p>para proteger a área que deveria ficar branca ou preservar cores colocadas</p><p>anteriormente. Os japoneses foram mais além, tramando telas com fios de cabelo</p><p>humano ou da caudas dos cavalos que serviam de telas, um formato bem próximo</p><p>das telas usadas nos dias atuais. As impressões com estêncil eram muito</p><p>praticadas no Sc. XVII no Japão, época do apogeu da gravura japonesa e serviam</p><p>muitas vezes para colorir impressões em xilogravura.</p><p>Eles cortavam estênceis de papel bastante detalhados, deixando-os unidos por</p><p>pequenos fios de papel, de modo que preservassem a estrutura inicial do desenho.</p><p>Os estênceis eram pregados ou colados à tela, enquanto a tinta atravessava as</p><p>partes expostas da mesma.</p><p>O termo serigrafia foi inventado por Carl Zigrosser, de modo a distinguir as obras</p><p>de arte impressas em serigrafia, daquelas de uso comercial, que mantinham o</p><p>nome de silk-screen. A técnica foi muito utilizada na Inglaterra e nos USA na</p><p>decoração de papéis de parede e impressão de tecidos. No entanto, este processo</p><p>de impressão custou muito a entrar no mundo da arte.</p><p>No final do Sc. XIX esse processo de impressão era muito usado para executar</p><p>pinturas decorativas em paredes ou para decorar papéis de parede. No Brasil o</p><p>processo foi muito usado no começo do Sc. XX, também para a decoração de</p><p>paredes e papéis decorativos.</p><p>Durante a Segunda Guerra Mundial, havia grande desemprego para os artistas nos</p><p>USA. O governo resolveu, então, convoca-los para trabalhar nas oficinas de</p><p>impressão oficiais, criando cartazes de propaganda da guerra. Assim, foi</p><p>intensamente desenvolvida a técnica naquele país. Até os dias atuais, eles</p><p>Gravura – História, Técnicas e Relações com a Impressão de Papel Moeda 70</p><p>trabalham intensamente com as impressões em serigrafia. Vários ateliês</p><p>especializados se encarregam de edições de arte, em que, algumas vezes, as</p><p>obras são impressas em com 20 ou mais passagens de cores. A técnica permite</p><p>que se use elementos gráficos variados como transparências, texturas diversas,</p><p>sutilezas fotográficas, sombreados, superfícies planas coloridas e assim</p><p>sucessivamente. Não só os USA utilizam a técnica para fins artísticos, mas</p><p>também muitos outros países, dentre os quais o Brasil, que tem bons impressores</p><p>de serigrafia.</p><p>A imagem a seguir é um cartaz impresso em serigrafia nos USA, na época da</p><p>Segunda Guerra Mundial.</p><p>Figura 57 – Laurence Heller, Dadles lo Suyo, 1944. Imagem produzida para uma</p><p>unidade militar</p><p>69</p><p>.</p><p>69 DAWSON, John (editor). Guia Completo del Grabado. H. Blume Ediociones 1982. p.123.</p><p>Gravura – História, Técnicas e Relações com a Impressão de Papel Moeda 71</p><p>O uso comercial da técnica não só persiste nos dias atuais, como é muito intenso</p><p>e diversificado, uma vez que hoje já existem máquinas industrializadas que</p><p>executam a impressão e em virtude de sua simplicidade quando se compara a</p><p>técnica com os resultados obtidos. Por essas razões, a técnica não é utilizada na</p><p>impressão de notas, o que as tornaria muito facilmente falsificadas. O uso</p><p>comercial da serigrafia é muito abrangente, sendo possível utiliza-la sobre diversos</p><p>tipos de suporte, podendo estes ser curvos ou de qualquer outro formato, para o</p><p>que é preciso ter à disposição o equipamento necessário. As facilidades de</p><p>manipulação de processos fotográficas em serigrafia têm sido um fator de grande</p><p>desenvolvimento desta técnica. As imagens seguintes mostram procedimentos</p><p>básicos para o desenvolvimento de uma impressão em serigrafia. Vê-se, na</p><p>primeira delas, um resumo rápido do que vem a ser o processo. Tem-se a tela</p><p>formada por uma moldura de madeira com nylon esticado.</p><p>É importante acrescentar que o nylon substitui a seda neste processo de</p><p>impressão. Olhando-se de cima para baixo, da esquerda para a direita, depois da</p><p>tela vazia, aparece uma tela gravada. Em seguida, aparece a tela com uma folha</p><p>de papel colocada sob ela. Depois, o rodo utilizado para espalhar a tinta</p><p>igualmente por toda a superfície impressa. Finalmente, a impressão da letra F.</p><p>Como se vê, a técnica é muito mais simples do que aquelas descritas</p><p>anteriormente. A outra seqüência de imagens mostra uma tela sendo desenhada</p><p>com bastões e líquidos gordurosos. Depois, a passagem da emulsão protetora da</p><p>tela, que mantém as partes brancas do papel sem receber tinta. Observe-se que</p><p>em serigrafia a tinta de impressão tem que ter solvente diferente daquele usado na</p><p>emulsão protetora. Isso porque, se assim não fosse, a emulsão seria dissolvida</p><p>pela tinta ao longo do processo de impressão. Finalmente, a imagem apresenta</p><p>a</p><p>retirada do material gorduroso aplicado, de modo que fiquem abertas as regiões a</p><p>serem impressas. A última figura mostra o papel impresso.</p><p>Gravura – História, Técnicas e Relações com a Impressão de Papel Moeda 72</p><p>Figura 58 – Etapas de preparo de telas para a impressão em serigrafia</p><p>70</p><p>.</p><p>Diversos artistas têm utilizado a serigrafia para expressar sua arte e é importante</p><p>acrescentar que, como nos demais tipos de gravura, cada cor necessita de uma</p><p>impressão, quando todos os passos e etapas descritos são repetidos ou</p><p>modificados, de acordo com a imagem e a cor a serem acrescentadas, até que se</p><p>70 DAWSON, John (editor). Guia Completo del Grabado. H. Blume Ediociones 1982. p.122, 134 e</p><p>135.</p><p>Gravura – História, Técnicas e Relações com a Impressão de Papel Moeda 73</p><p>chegue à impressão final. São muito divulgadas e conhecidas as serigrafias</p><p>criadas pelo artista norte-americano Andy Wahrol.</p><p>A Serigrafia no Brasil</p><p>No Brasil, a serigrafia teve como tem, até os dias atuais, diversos usos nas</p><p>impressões comerciais. No entanto demorou um pouco até que fosse utilizada em</p><p>grande escala por artistas e impressores dedicados à impressão de obras de arte.</p><p>Muitas vezes essas impressões eram e são encomendadas por firmas comercias</p><p>de grande porte para imprimir gravuras de artistas de renome nacional e dá-las de</p><p>presente a seus clientes durante as festas de fim de ano. Firmas menores, por</p><p>outro lado, contratam serviços de impressores para a reprodução de brindes dos</p><p>mais diversos portes e naturezas.</p><p>O Banco Central possui em seu acervo algumas serigrafias de artistas brasileiros,</p><p>dentre as quais se destaca uma coleção de imagens do artista Cícero Dias. A</p><p>imagem seguinte é uma reprodução de uma das criações do artista. Ele nasceu</p><p>em Pernambuco em 1907, falecendo em Paris em janeiro do corrente ano (2003).</p><p>Ainda jovem foi para o Rio de Janeiro onde se formou na Escola de Belas Artes.</p><p>Cícero Dias manteve estreito contato com os artistas modernistas do Rio e de São</p><p>Paulo e passou por vários movimentos artísticos, tendo iniciado sua carreira de</p><p>pintor com obras figurativas, passando, depois, pelo Surrealismo e pelo</p><p>Abstracionismo. Ele esteve em Paris durante a maior parte de sua vida, tendo</p><p>residência fixa naquela cidade, mas jamais deixou de se ater à suas raízes</p><p>brasileiras. Em Paris participou de grupos de artistas abstratos, tendo mantido</p><p>estreito relacionamento de amizade com Picasso. O artista teve uma vida intensa,</p><p>realizando muitas exposições e criando uma arte muito expressiva não só em</p><p>termos de qualidade, com também em relação ao número de obras produzidas. A</p><p>imagem seguinte é uma serigrafia de sua autoria, enfocado um de seus temas</p><p>favoritos que foi a mulher.</p><p>Gravura – História, Técnicas e Relações com a Impressão de Papel Moeda 74</p><p>Figura 59 – Cícero Dias, Figura de Jovem e Janela, serigrafia, 28,5 x 47 cm.</p><p>Coleção do Acervo do Banco Central do Brasil.</p><p>Uma outra artista brasileira de grande importância foi a pintora, desenhista e</p><p>gravadora Tarsila do Amaral (1890-1973). Ela nasceu em Capivari, São Paulo e</p><p>estudou na Europa, tendo sido aluna do pintor André Lhote. Sua temática, no</p><p>entanto, tinha na Cultura Nacional grande fonte de inspiração. Ela foi uma das mais</p><p>importantes artistas do Movimento Modernista no Brasil e suas obras podem ser</p><p>encontradas em museus e coleções espalhados pelo mundo.</p><p>A obra apresentada a seguir é uma serigrafia que pertence ao acervo do Banco</p><p>Central do Brasil.</p><p>Gravura – História, Técnicas e Relações com a Impressão de Papel Moeda 75</p><p>Figura 60 – Tarsila do Amaral, Louvor à Natureza, serigrafia, 61 x 41 cm. Coleção</p><p>Acervo do Banco Central do Brasil.</p><p>Bibliografia</p><p>BERESINER, Yasha. A Collector’s Guide to Paper Money. André Deutsch Limited,</p><p>Great Britain, 1977.</p><p>BOZANO, SIMONSEN Vol. 1. SPALA Editora Ltda., Rio de Janeiro, RJ, 1981.</p><p>BUCKLAND-WRIGHT, John. Etching and Engraving – Techniques and the Modern</p><p>Trend. DOVER Publications, Inc. New York. 1973.</p><p>BUNKO, Seikadõ. 100 Seikadõ Masterpieces. The Mitsubishi Corporation, Dentsu</p><p>Incorporated e Benrido Co., Ltda.1984.</p><p>DAWSON, John (editor), Guia Completo del Grabado. H. Blume Ediociones, 1982.</p><p>EICHENBERG, Fritz. The Art of the Print – Masterpieces, History and Techniques.</p><p>Harry N. Abrams, Inc. Publishers, New York. 1976.</p><p>Gravura – História, Técnicas e Relações com a Impressão de Papel Moeda 76</p><p>GASPARINI FILHO, Ítalo Sydney (Coordenador). Mvbcb – Museu de Valores do</p><p>Banco Central do Brasil. Banco Safra Editora Melhoramentos – São Paulo, S.</p><p>Paulo.1988.</p><p>GROSS, Anthony. Etching, Engraving, & Intaglio Printing. London Oxford University</p><p>Press, New York, 1970.</p><p>HIBBARD, Howard. The Metropolitan Museum of Art. Harrison House, New York,</p><p>USA. 1980.</p><p>Iconografia de Valores Impressos do Brasil. Banco Central do Brasil. 1976.</p><p>KNIGIN, Michael e ZMILES, Murray. The Contemporary Lithographic Workshop</p><p>Around the World. Van Nostrand Reinhold Company. New York, Toronto, London,</p><p>Melbourne.</p><p>MARTINS, Itajahy. Gravura – Arte e Técnica. Fundação Nestlé da Cultura e</p><p>Laserprint Editorial, S. Paulo. 1987.</p><p>MONESTIER, Martin. L’Art du Papier Monnaie. Editions Point Neuf, Paris. 1982.</p><p>MORAIS, Frederico. Da Coleção – os caminhos da arte brasileira. Júlio Bogoricin</p><p>Imóveis e Raízes Editora ltda., S. Paulo. 1986.</p><p>PETIT, Gaston e ARBORELA, Amadio. Evolving Techniques in Japanese</p><p>Woodblock Printing. Kodansha International Ltd. Tokyo, New York e San</p><p>Francisco.1977.</p><p>SHESTACK, Alan. Fifteenth Century Engravings of Northern Europe From the</p><p>National Gallery of Art, Washington D. C.. National Gallery of Art, Washington D. C.</p><p>, 1967/1968.</p><p>TREVISAN, Rosana (coordenadora). Dicionário Michaelis – Moderno Dicionário da</p><p>Lingua Portuguesa. Editora Melhoramentos, S. Paulo.</p><p>Gravura – História, Técnicas e Relações com a Impressão de Papel Moeda 77</p><p>Portfólio</p><p>ATIVIDADE</p><p>Andy Warhol, (1928-1987) foi um pintor e cineasta norte-americano, um importante artista da Pop</p><p>Art, lembrado por suas pinturas nas latas de sopa Campbell e, principalmente, pela sequência de</p><p>retratos de Marilyn Monroe, ambas realizadas em serigrafia.</p><p>Sua atividade é descrever, de maneira resumida, a arte em serigrafia de Warhol.</p><p>OBS: Para redigir sua resposta, use uma linguagem acadêmica. Faça um texto com</p><p>no mínimo 20 linhas e máximo 25 linhas. Lembre-se de não escrever em primeira</p><p>pessoa do singular, não usar gírias, usar as normas da ABNT: texto com fonte tamanho</p><p>12, fonte arial ou times, espaçamento 1,5 entre linhas, texto justificado.</p><p>Pesquisa</p><p>AUTOESTUDO</p><p>How to Print Like Warhol | Tate</p><p>Acesse https://www.youtube.com/watch?v=O8HB2cQm_Ag</p><p>Assista ao vídeo e descreva como realizar a impressão da mesma maneira que Andy Warhol</p><p>fazia.</p><p>N</p><p>GRAVURA</p><p>AULA 8</p><p>Do mercado ao</p><p>museu: a</p><p>legitimação</p><p>artística da</p><p>gravura popular</p><p>Abertura</p><p>Olá!</p><p>Se todas as categorias de arte passam por variados processos de legitimação, existe uma em</p><p>particular, onde a questão da legitimidade é fundamental, por ser determinante de sua própria</p><p>existência: a arte popular, que só existe realmente, como categoria artística, a partir do</p><p>momento em que é reconhecida</p><p>pelas instâncias oficiais. Acompanhe esta aula e saiba mais</p><p>sobre esse assunto.</p><p>BONS ESTUDOS!</p><p>Referencial Teórico</p><p>Convidamos você a fazer a leitura do texto selecionado como base teórica para esta aula e, ao</p><p>final de seu estudo, você será capaz de:</p><p> Conhecer a história da gravura popular.</p><p> Entender a trajetória histórica da gravura popular.</p><p> Refletir sobre a importância da gravura popular na história da arte.</p><p>BOA LEITURA!</p><p>Do mercado ao museu: a legitimação</p><p>artística da gravura popular</p><p>Everardo Ramos</p><p>Resumo</p><p>Se todas as categorias de arte passam por variados</p><p>processos de legitimação, existe uma, em particular,</p><p>onde a questão da legitimidade é fundamental, por</p><p>ser determinante de sua própria existência: a arte</p><p>popular, que só existe realmente, como categoria</p><p>artística, a partir do momento em que é reconhecida</p><p>pelas instâncias oficiais. O presente trabalho analisa o</p><p>processo de legitimação artística da gravura popular,</p><p>produção que se desenvolve às margens do sistema</p><p>oficial, como ilustração dos folhetos de cordel ven-</p><p>didos em mercados públicos, antes de se tornar uma</p><p>categoria privilegiada da “arte popular”, colecionada e</p><p>exposta em museus nacionais e internacionais.</p><p>Palavras-chave:</p><p>Arte popular, gravura popular,</p><p>folheto de cordel</p><p>Do mercado ao museu: a legitimação artística da gravura popular 39</p><p>Abstract</p><p>Once all artistic categories undergo different pro-</p><p>cesses of legitimacy, there is one in particular, in</p><p>which the issue of legitimacy is fundamental for</p><p>determining its very existence: popular art, which</p><p>only begins to exist as an artistic category from the</p><p>moment it is acknowledged by official instances.</p><p>The current paper analyzes the process of artistic</p><p>legitimacy of popular engraving, whose production</p><p>is developed on the margins of the official system,</p><p>as illustrations in cordel booklets to be sold in</p><p>public markets and then to become a privileged</p><p>category of “popular art”, collected and exhibited in</p><p>both na-tional and international museums.</p><p>Keywords:</p><p>popular art, popular</p><p>engraving, cordel booklet</p><p>40 VISUALIDADES</p><p>Recentemente, uma pesquisa de grande extensão trouxe à tona um</p><p>tema muitas vezes esquecido pela História da Arte: o da legitimação</p><p>artística. Partindo de perguntas como “o que legitima um artista?” ou</p><p>“como se dá e o que representa essa legitimação?”, Clarissa Diniz</p><p>mostrou de que maneira se formam espaços específicamente “ar-</p><p>tísticos” no vasto campo do conhecimento e do fazer humanos, a</p><p>partir de variados processos que vão da autolegitimação à legitima-</p><p>ção por diferentes instâncias (instituições, mercado, especialistas,</p><p>mídia, público, ensino)¹. Revela, portanto, que o conceito de “arte”,</p><p>pelo menos no contexto contemporâneo, é tão dependente da idéia</p><p>de transcendência das obras e dos artistas, quanto de complexas</p><p>relações de ordem social, cultural, política e econômica.</p><p>Todas as categorias de arte estão submissas a essa lógica. No entanto,</p><p>existe uma, em particular, onde a questão da legitimidade tem uma</p><p>importância ainda maior, por ser determinante de sua própria exis-</p><p>tência. Trata-se da arte popular, outro grande tema frequentemente</p><p>esquecido pela História da Arte, que só existe realmente, como cate-</p><p>goria artística, a partir do momento em que passa por um processo</p><p>de legitimação. E, sempre, de legitimação por instâncias oficiais,</p><p>externas ao universo onde as obras são originalmente produzidas e</p><p>consumidas: ao contrário dos artistas estudados por Clarissa Diniz, o</p><p>criador popular nunca se autodenomina “artista” antes de ter sido</p><p>reconhecido como tal, fora do seu meio.</p><p>Mas como se dá o processo de legitimação da arte popular? Quais</p><p>são seus agentes e significados, e que repercussões ela traz para as</p><p>obras e os artistas? O presente trabalho tentará responder a essas</p><p>perguntas a partir do estudo da gravura popular, produção que surge</p><p>e se desenvolve às margens do sistema oficial, como ilustra-ção dos</p><p>folhetos de cordel vendidos em mercados públicos, antes de se</p><p>tornar, a partir de um determinado momento, uma categoria</p><p>privilegiada da “arte popular”, colecionada e exposta em museus</p><p>nacionais e internacionais. Uma análise cuidadosa desse momen-to</p><p>de transição mostrará que a legitimação artística das produções</p><p>populares não passa apenas pela aquisição do estatuto de “obra de</p><p>arte”, envolvendo também questões complexas, como a influência de</p><p>correntes ideológicas no cenário cultural brasileiro.</p><p>A descoberta da gravura popular</p><p>No Brasil, as primeiras manifestações de interesse do mundo “le-</p><p>trado” pela gravura popular acontecem em meados do século XX.</p><p>Em 1949, em um artigo publicado na imprensa de Maceió, o fol-</p><p>1. Cf. Diniz (2008).</p><p>Do mercado ao museu: a legitimação artística da gravura popular</p><p>41</p><p>2. As informações e a citação desse</p><p>parágrafo provêm do álbum Cole-</p><p>ção Théo Brandão. Xilogravuras</p><p>Populares Alagoanas (1973). Se-</p><p>gundo esse texto, o artigo de Théo</p><p>Brandrão, intitulado “As Cheias de</p><p>Alagoas e a Literatura de Cordel”,</p><p>foi publicado no Jornal de Alagoas,</p><p>em junho de 1949.</p><p>3. As informações desse parágrafo</p><p>provêm de Suassuna (1952),</p><p>Machado (1960) e catálogo da ex-</p><p>posição Arts primitifs et modernes</p><p>brésiliens (1955). O álbum editado</p><p>por Aluísio Magalhães, de que não</p><p>encontramos nenhum exemplar, é</p><p>citado no album Xilogravura Popu-</p><p>lar (1965) e em Suassuna (1969).</p><p>4.. Cf. documentos diversos –</p><p>pedidos de reembolso, faturas,</p><p>prestação de contas – relativos</p><p>às viagens feitas por Lívio Xavier</p><p>Júnior e Floriano Teixeira em 1960,</p><p>e conservados nos arquivos do</p><p>Museu de Arte da Universidade do</p><p>Ceará, em Fortaleza, na pasta</p><p>Documentos. Prestação de contas.</p><p>Outras informações foram obtidas</p><p>em entrevistas com Lívio Xavier</p><p>Júnior, em 2000 e 2003.</p><p>clorista Théo Brandão chama a atenção para uma gravura de José</p><p>Martins dos Santos, poeta que se tornou xilógrafo para realizar, de</p><p>maneira improvisada, as ilustrações de seus folhetos de cordel. No</p><p>mesmo ano, os dois homens se conhecem num mercado da cidade,</p><p>ocasião em que Brandão pede autorização para publicar a mesma</p><p>gravura em seu livro Folclore de Alagoas. Três anos depois, em 1952,</p><p>o folclorista consegue “de José Martins dos Santos não somente o</p><p>clichê anteriormente emprestado, mas vários outros de sua autoria,</p><p>que serviam de capa a folhetos seus ou de seus colegas de arte, para</p><p>reproduzi-los em pranchas e expô-los na mostra de arte folclórica</p><p>alagoana”, segundo seu próprio depoimento².</p><p>Em seguida, o movimento se estende ao Recife, onde a gravura</p><p>popular desperta o interesse de um grupo de artistas e intelectuais</p><p>ligados ao Teatro do Estudante de Pernambuco. Em 1952, o jovem</p><p>escritor Ariano Suassuna publica um longo texto sobre a ilustração</p><p>de folhetos de cordel, numa reportagem ilustrada que ocupa toda a</p><p>primeira página do Diário de Pernambuco, o mais tradicional dos</p><p>jornais locais. No ano seguinte, o pintor Aluísio Magalhães “des-</p><p>cobre” a gráfica de João José da Silva, importante editor de cordel, e</p><p>organiza um álbum com gravuras utilizadas em seus folhetos,</p><p>publicando-o com o apoio do Departamento de Documentação e</p><p>Cultura da Cidade do Recife. Dois anos mais tarde, em 1955, o</p><p>colecionador Abelardo Rodrigues envia algumas dessas gravuras ao</p><p>Musée d’Ethnographie de Neuchâtel, na Suíça, para a maior ex-</p><p>posição de arte brasileira até então realizada no exterior³.</p><p>Enfim, no Ceará, o interesse pela gravura popular parte de uma</p><p>instituição pública, a Universidade do Ceará, no momento de</p><p>cria-ção de seu museu de arte regional, em Fortaleza. Em 1960,</p><p>dois funcionários da instituição vão a Juazeiro do Norte, na</p><p>região do Cariri, para obter cópias das ilustrações utilizadas</p><p>por</p><p>José Ber-nardo da Silva, o maior editor de cordel do Estado. Na</p><p>gráfica deste, no entanto, encontram um verdadeiro “tesouro”:</p><p>caixas inteiras contendo antigas xilogravuras que deixaram de ser</p><p>utilizadas nos folhetos, tornando- se obsoletas. Com a anuên-cia</p><p>do editor, os dois funcionários compram todo o material e levam-</p><p>no para Fortaleza, onde passam a fazer parte do acervo do Museu</p><p>de Arte da Universidade do Ceará, constituindo a primeira</p><p>coleção pública no gênero 4.</p><p>Entusiasmada com a compra, a Universidade envia seus funcioná-</p><p>rios à procura de novas obras, desta vez junto aos outros grandes</p><p>editores de cordel da época, Manoel Camilo dos Santos, em Campi-</p><p>42 VISUALIDADES</p><p>na Grande, e João José da Silva, em Recife. Ambos também vendem</p><p>suas xilogravuras, apesar destas ainda serem utilizadas nas reedi-ções</p><p>dos folhetos. Vale ressaltar que essa transação contrasta muito com a</p><p>atitude dos intelectuais de Recife, que sempre tiveram o cui-dado de</p><p>devolver as matrizes tomadas de empréstimo aos editores populares,</p><p>depois de utilizá-las em suas próprias ações, como tinha feito Théo</p><p>Brandão em Maceió. Em uma carta ao organizador da exposição de</p><p>Neuchâtel, por exemplo, Abelardo Rodrigues sugere que seja feita</p><p>uma plaqueta ilustrada com as obras enviadas de Reci-fe, mas</p><p>acrescenta: “Pediria, apenas, a devolução das matrizes, logo após a</p><p>impressão, pois os folhetos populares ilustrados por aquelas</p><p>xilogravuras ainda estão em franca circulação, sendo frequentes as</p><p>pequenas reedições”5. Assim, quando a Universidade do Ceará com-</p><p>pra as matrizes dos editores populares, retirando-as de seu meio na-</p><p>tural, são bastante criticados pelos intelectuais recifenses 6.</p><p>Seja como for, os cearenses começam rapidamente a valorizar sua</p><p>nova coleção, no Brasil e no exterior. Ainda em 1960, enviam uma</p><p>seleção de obras ao Museu de Arte Moderna de São Paulo, para a</p><p>exposição Gravuras Populares do Nordeste, a primeira inteiramen-te</p><p>dedicada ao tema, já que as exposições anteriores – em Maceió (1952)</p><p>e em Neuchâtel (1955) – incluíam outras categorias de obras. A</p><p>iniciativa mais importante, que iria associar definitivamente o nome</p><p>da Universidade do Ceará à promoção da gravura popular brasileira,</p><p>é, no entanto, a exposição que apresenta em diversas cidades da</p><p>Europa e em Minneapolis, nos Estados Unidos, entre 1961 e 1962, em</p><p>instituições tão prestigiosas quanto a Bibliothèque Nationale de Paris,</p><p>o Palacio de la Virreina de Barcelona (Figura 01 e 02), o Museu de Arte</p><p>Contemporáneo de Madri e o Kunstmuseum</p><p>Figura 01</p><p>Cartaz da exposição Gravures</p><p>populaires brésiliennes, Biblio-</p><p>thèque Nationale, Paris, 1961,</p><p>50 x 32,5 cm (Col. Museu de</p><p>Arte da Universidade do</p><p>Ceará, Fortaleza).</p><p>Figura 02.</p><p>Cartaz da exposição Grabados</p><p>populares brasileños, Palacio de</p><p>la Virreina, Barcelona, 1962, 49 x</p><p>34,5 cm (Col. Museu de Arte da</p><p>Universidade do Ceará,</p><p>Fortaleza).</p><p>5. Cf. carta de Aberlardo Rodri-</p><p>gues a Raul Bopp (embaixador do</p><p>Brasil na Suíça e principal</p><p>organizador da exposição em</p><p>Neuchâtel), datada do Recife, em</p><p>26 de julho de 1955, e conservada</p><p>nos arquivos do Museu</p><p>da Imagem e do Som de Per-</p><p>nambuco, no Recife, na</p><p>pasta Abelardo Rodrigues.</p><p>6. Informação de Lívio Xavier</p><p>Júnior, um dos funcionários da</p><p>Universidade do Ceará envol-</p><p>vidos na questão, em entrevista</p><p>realizada em 2000.</p><p>Do mercado ao museu: a legitimação artística da gravura popular 43</p><p>7. Documentos diversos (ca-</p><p>tálogos, convites e cartazes),</p><p>conservados nos arquivos do</p><p>Museu de Arte da Universi-</p><p>dade do Ceará, em Fortaleza,</p><p>indicam as seguintes exposições:</p><p>Gravures populaires brésiliennes</p><p>(Cabinet des estampes de la Bi-</p><p>bliothèque nationale, Paris, 21 de</p><p>setembro-6 de outubro de 1961) ;</p><p>Brasilianische Imagerie Populaire</p><p>(Kunstmuseum, Basiléia, 28 de</p><p>outubro-17 de dezembro de 1961) ;</p><p>Gravuras Populares do Nordeste</p><p>Brasileiro (Sociedade Nacional de</p><p>Belas Artes, Lisboa, dezembro de</p><p>1961) ; Grabados populares</p><p>brasileños (Museo de Arte Con-</p><p>temporáneo, Madri, 2-14 de abril</p><p>de 1962 ; Palacio de la Virreina,</p><p>Barcelona, 27 de abril-5 de maio</p><p>de 1962 ; Facultad de Filosofia y</p><p>Letras, Sevilha, datas ignora-das)</p><p>; Volkstümliche Holzschnit-te</p><p>aus NO. Brasilien (Museum für</p><p>Völkerkunde, Viena, março de</p><p>1962) ; Brazilian Folk Art :</p><p>Yesterday and Today (Walter Art</p><p>Centrer, Minneapolis, 17 de</p><p>março-22 de abril de 1962).</p><p>8. João Cabral de Melo Neto,</p><p>poeta-diplomata que colaborou</p><p>com as exposições realizadas na</p><p>Espanha (inclusive escrevendo o</p><p>texto introdutório do catálogo</p><p>em espanhol), afirma em uma</p><p>carta para um funcionário da</p><p>Universidade do Ceará: “Vão</p><p>junto alguns recortes de jornal</p><p>sobre a exposição. Tratam da de</p><p>Barcelona. O êxito ali foi enor-</p><p>me” – cf. carta datada de 17 de</p><p>maio de 1962, destinada a Lívio</p><p>Xavier Júnior e conservada pelo</p><p>destinatário. Sobre a repercussão</p><p>na imprensa brasileira, veja-se, por</p><p>exemplo: Machado (1960) e o</p><p>artigo anônimo “Arte Brasileira em</p><p>Portugal” (1962).</p><p>44</p><p>da Basiléia (Suíça)7. Tais exposições têm grande repercussão,</p><p>in-clusive no Brasil, consolidando definitivamente a gravura</p><p>popular como uma importante categoria da arte brasileira8.</p><p>Assim, em meados do século XX, a história da gravura popular toma</p><p>um rumo completamente diferente daquele que vinha seguindo an-</p><p>teriormente. Desde os anos 1900, essa gravura nunca tinha muda-do</p><p>de estatuto, destinando-se exclusivamente a ilustrar impressos</p><p>modestos e de grande circulação, como os folhetos de cordel. Com a</p><p>intervenção dos intelectuais, ao contrário, as mudanças se multi-</p><p>plicam. Primeiro, as obras são utilizadas em contextos comple-</p><p>tamente novos: impressas em folhas independentes, para par-</p><p>ticiparem de exposições, ou publicadas em albuns ilustrados. Em</p><p>seguida, as próprias matrizes gravadas são retiradas de seu meio de</p><p>origem – as gráficas populares – para enriquecer o acer-vo de</p><p>museus. Existindo por ela mesma, e não mais em função da</p><p>ilustração dos folhetos de cordel, a gravura popular adquire,</p><p>portanto, o estatuto de “obra de arte” e, mais ainda, de arte cele-</p><p>brada a nível nacional e internacional.</p><p>Daí por diante, sua história não poderia mais ser a mesma.</p><p>(De)Formação de uma categoria artística</p><p>A intervenção do mundo letrado não se limita, porém, a trans-</p><p>formar a gravura popular em categoria artística: ela também</p><p>define esta categoria, pela própria maneira como a estabelece. De</p><p>fato, as diversas ações de promoção e valorização da gravura</p><p>popular – artigos na imprensa, exposições, publicação de álbum e</p><p>constituição de coleção – têm como objeto apenas um tipo de</p><p>obra: a xilogravura dos folhetos de cordel. Técnica e função</p><p>constituem, portanto, noções identificadoras da nova catego-ria</p><p>artística, guiando as atitudes e as reflexões dos intelectuais da</p><p>época. Com o passar do tempo, tais noções iriam inclusive</p><p>cristalizar-se, fazendo com que, nos dias de hoje, a expressão</p><p>“gravura popular” se confunda frequentemente com a palavra</p><p>“xilogravura” e com a categoria “ilustração de folheto de cordel”,</p><p>como se todas fossem sinônimos.</p><p>Confrontando esta definição com o estudo das próprias obras,</p><p>percebe-se, no entanto, que ela não traduz completamente a re-</p><p>alidade dos fatos, tal como eles se apresentavam aos artistas e in-</p><p>telectuais que começaram a se interessar pela gravura popular.</p><p>Se é certo que a gravura popular se desenvolve nos folhetos de</p><p>VISUALIDADES</p><p>cordel da primeira metade do século XX, suas origens se encon-</p><p>tram em outros tipos de impressos, bem mais antigos. De fato,</p><p>como pudemos demonstrar em outros estudos, essa gravura</p><p>surge nos jornais e nas revistas do século XIX, onde já apresen-ta</p><p>muitas características das futuras ilustrações de cordel, seja em</p><p>termos de técnicas, de formas ou de princípios de criação.</p><p>Quando os</p><p>artistas e intelectuais “descobrem” as imagens dos</p><p>folhetos, acreditam, porém, que estão diante de algo completa-</p><p>mente novo, esquecendo de explorar com mais cuidado o que</p><p>poderia ser anterior. Na verdade, para se compreender verda-</p><p>deiramente a gravura popular, é preciso inseri-la na vasta e com-</p><p>plexa história das ilustrações de impressos de grande circulação,</p><p>que começa com os primórdios da imprensa brasileira, na pri-</p><p>meira metade do século XIX 9.</p><p>Figura 03 - Folheto de cordel com zincogravura atribuída a Antônio Avelino da Costa: Ai</p><p>se o passado voltasse, Juazeiro do Norte, Tip. São Francisco, 1954, c. 15 x 11 cm (col.</p><p>Biblioteca Central Zila Mamede-UFRN, Natal).</p><p>Figura 04 - Folheto de cordel com zincogravura atribuída a Antônio Avelino da Costa:</p><p>Peleja de Laurindo Gato com Marcolino Cobra Verde, Juazeiro do Norte, Tip. São</p><p>Francisco, 1951, c. 15 x 11 cm (col. Biblioteca Central Zila Mamede-UFRN, Natal).</p><p>O equívoco da segunda idéia de base, que associa a gravura po-</p><p>pular apenas à técnica da xilogravura, é, porém, mais significa-</p><p>tivo. Através de uma análise exaustiva, pudemos concluir que os</p><p>folhetos publicados no Recife, o maior centro de edição de cordel</p><p>da primeira metade do século XX, são majoritariamen-te</p><p>ilustrados, não por xilogravuras, mas por zincogravuras, que</p><p>reproduzem imagens fotográficas e desenhos de artistas auto-</p><p>didatas. Dentre estes, destaca-se Antônio Avelino da Costa, au-</p><p>tor de quase todas as ilustrações de João Martins de Athayde, o</p><p>principal editor da época (Figura 03 e 04). A zincogravura era,</p><p>inclusive, o tipo de ilustração preferido do público tradicional</p><p>Do mercado ao museu: a legitimação artística da gravura popular</p><p>9. Cf. Ramos (2005a) e outro</p><p>estudo nosso, atualmente no</p><p>prelo: “Origens da Imprensa</p><p>Ilustrada Brasileira (1820-</p><p>1850): Imagens esquecidas,</p><p>Imagens Desprezadas”, a ser</p><p>publicado na Revista Escritos,</p><p>n° 3, pelas Edições Casa de Rui</p><p>Barbosa, no Rio de Janeiro.</p><p>45</p><p>10. Para uma análise</p><p>detalhada das diferentes formas</p><p>de ilustra-ção de cordel, cf.</p><p>Ramos (2005b e 2008b).</p><p>Figura 05</p><p>Folheto de cordel com xilogravura</p><p>anônima: A bunda V8. Margarida,</p><p>Sofia e a moda, Juazeiro do Norte,</p><p>Tip. São Francisco, 1945, c. 15 x 11</p><p>cm (col. Biblioteca Central Zila</p><p>Mamede-UFRN, Natal).</p><p>Figura 06</p><p>Folheto de cordel com xilogravura</p><p>anônima: Peleja de Patricio com</p><p>Inacio da Catingueira, Juazeiro do</p><p>Norte, Tip. São Francisco, 1952, c.</p><p>15 x 11 cm (col. Biblioteca Central</p><p>Zila Mamede-UFRN, Natal).</p><p>de folhetos, contribuindo muito para o enorme sucesso da lite-</p><p>ratura de cordel. Já a xilogravura, era utilizada principalmente</p><p>nas cidades do interior, como Juazeiro do Norte, no Ceará, onde</p><p>gráficas rudimentares não permitiam praticar técnicas mais ela-</p><p>boradas, como era o caso no Recife.10 (Figura 05 e 06)</p><p>Quando os intelectuais começam a se interessar pelas ilustra-</p><p>ções de cordel, a partir do final dos anos 1940, têm diante de si,</p><p>portanto, as duas categorias de obra: xilogravura e zincogravura,</p><p>facilmente encontradas nos folhetos da época. Porque, então,</p><p>privilegiam a primeira, em detrimento da segunda, no processo</p><p>de promoção e valorização da gravura popular?</p><p>A primeira razão dessa preferência diz respeito à técnica empre-</p><p>gada na realização das obras. A xilogravura, como se sabe, corres-</p><p>ponde à maneira mais antiga e simples de se fazer uma imagem</p><p>multiplicável, constituindo um processo completamente manu-</p><p>al, desde a elaboração do desenho até sua gravação na madeira. A</p><p>zincogravura, por sua vez, surge com a Revolução Industrial do</p><p>século XIX, constituindo um processo híbrido: o desenho é feito</p><p>à mão, sobre uma folha de papel, mas a gravação se dá por</p><p>processos fotomecânicos, através de equipamentos especiais.</p><p>Privilegiar a primeira técnica, em detrimento da segunda, reve-la,</p><p>portanto, dois preconceitos surgidos com os folcloristas do século</p><p>XIX: o de associar o “popular” exclusivamente ao que é artesanal</p><p>e o de considerar o artesanal como mais “autêntico” do que os</p><p>produtos da civilização industrial.</p><p>Interessa notar, também, que esse duplo preconceito deformou,</p><p>muitas vezes, a visão da história das ilustrações de cordel. Por</p><p>exemplo, os intelectuais consideravam que a raridade dos folhe-tos</p><p>ilustrados por xilogravura, no Recife, não era algo natural, mas a</p><p>consequência do uso recente e cada vez maior da zincogravura</p><p>(contendo desenho ou fotografia), que se impunha com o avan-ço da</p><p>civilização industrial. Ora, como dissemos anteriormente, isso não é</p><p>absolutamente verdade: no Recife, onde existiam as gráficas mais</p><p>modernas do Nordeste, a zincogravura sempre foi mais importante</p><p>que a xilogravura. A interpretação do jornalista e crítico de arte</p><p>Lourival Gomes Machado, que descobre as ilus-trações de cordel</p><p>juntamente com Aluísio Magalhães, nos mer-cados e gráficas da</p><p>cidade, é, no entanto, exatamente oposta:</p><p>[as xilogravuras] já desapareciam, nos mostruários dos canto-</p><p>res-vendedores, sob o maior número de folhetos capeados por</p><p>46 VISUALIDADES</p><p>péssimas reproduções de fotos tiradas de revistas de cinema,</p><p>ou de oleogravuras sulpicianas (MACHADO, 1960 p.6).</p><p>Os xilógrafos populares já cediam inteiramente seu território</p><p>físico – as capas dos folhetos – à fotografia imbecil dos cartões</p><p>postais, à pobre caricatura das revistas litorâneas, à romântica</p><p>reprodução das cenas de filmes (MACHADO, 1961 p.6).</p><p>O equívoco aumenta quando a Universidade do Ceará compra, em</p><p>Juazeiro do Norte, xilogravuras que – elas sim – tinham sido efeti-</p><p>vamente substituídas pelas zincogravuras compradas por José Ber-</p><p>nardo da Silva a João Martins de Athayde, do Recife, quando este</p><p>decidiu parar de trabalhar, em 1949. Convencidos de que, em toda</p><p>parte, a técnica artesanal da madeira era necessariamente anterior à</p><p>técnica mecânica do zinco, os intelectuais fazem um amálgama de</p><p>situações completamente diferentes, confundindo a história da pro-</p><p>dução gráfica num grande centro como Recife e numa pequena ci-</p><p>dade do interior, como Juazeiro do Norte. Vale notar, por outro lado,</p><p>que essa confusão também serve para legitimar a própria compra das</p><p>matrizes de madeira encontradas nas gráficas populares, con-</p><p>sideradas “em extinção”: quando a Universidade do Ceará inaugura</p><p>essa prática e é bastante criticada, Lourival Gomes Machado toma</p><p>sua defesa, afirmando que “salvou-se, ao menos para a história, uma</p><p>arte em franco processo de desaparição” (MACHADO, 1961 p.6).</p><p>Enfim, os preconceitos e equívocos se consolidam quando a</p><p>gra-vura popular brasileira é comparada à sua congênere</p><p>européia, durante as exposições realizadas pelo Museu de</p><p>Arte da Univer-sidade do Ceará, em diferentes países do</p><p>Velho Mundo. Na Su-íça, por exemplo, Hanspeter Landolt,</p><p>diretor do Kunstmuseum da Basiléia, afirma:</p><p>As xilogravuras [brasileiras], com sua linguagem concisa, de con-</p><p>venção, são autenticamente primitivas, como eram as xilogravu-</p><p>ras do século XV na Europa central. Como estas, aquelas estão,</p><p>por sua espontaneidade, condenadas à morte pelo progresso: en-</p><p>quanto na Europa, a primeira gravura foi eliminada e substituída</p><p>pela gravura artística “acadêmica”, os gravadores brasileiros, por</p><p>causa da visão tecnicista do público e da oferta de revistas colori-</p><p>das de baixo preço, se vêm acossados ao muro. Que esse pedaço</p><p>de arte popular verdadeira tenha conseguido manter-se até hoje</p><p>faz dele um vestígio muito interessante, no nosso mundo que se</p><p>precipita impetuosamente em direção a uma civilização tecnicis-</p><p>ta e uniforme. 11</p><p>11. Cf. catálogo da exposição Bra-</p><p>silianische Imagerie Populaire</p><p>(1961), p. 4. Agradecemos a Jean-</p><p>Pierre Gavignet pela tradução,</p><p>em</p><p>português, do texto original em</p><p>alemão.</p><p>Do mercado ao museu: a legitimação artística da gravura popular 47</p><p>Figura 07</p><p>Santinho: Nossa Senhora do</p><p>Perpétuo Socorro, São Paulo, Pau-</p><p>linas, s. d., 9 x 7 cm (col. Everardo</p><p>Ramos, Natal).</p><p>Assim, projetando no Brasil do século XX uma situação da Eu-</p><p>ropa do século XV, o mundo letrado cristaliza a idéia de que a</p><p>arte popular corresponde exclusivamente à técnica artesanal e</p><p>que, por isso mesmo, constitui uma categoria constantemente</p><p>ameaçada pelo avanço da civilização. Considerada como o</p><p>pre-cioso “vestígio” de uma época remota e idealizada, tendo</p><p>resisti-do bravamente às consequências nefastas do progresso</p><p>material e da industrialização, a xilogravura aparece,</p><p>portanto, como a técnica mais autêntica e representativa, a</p><p>única digna de figu-rar nas coleções, exposições e reflexões</p><p>que legitimam artistica-mente a categoria “gravura popular”.</p><p>Mas a técnica não é a única razão da preferência pela xilogravura,</p><p>em detrimento da zincogravura. Quando analisam as imagens</p><p>que ilustram os folhetos de cordel, os intelectuais sempre</p><p>chamam a atenção para as características estilísticas que, em sua</p><p>opinião, fazem sua originalidade: a composição extremamente</p><p>simples, a representação bidimensional e as formas</p><p>esquemáticas, esti-lizadas. Ora, ao contrário das xilogravuras que</p><p>fundamentam este postulado (Figura 05 e 06), as zincogravuras</p><p>apresentam frequentemente desenhos bastante elaborados,</p><p>representados em três dimensões e com traços “acadêmicos”, no</p><p>estilo das ca-ricaturas (Figura 03 e 04). Assim, as obras gravadas</p><p>em zinco são condenadas, não somente por serem realizadas por</p><p>meios mecânicos, mas também por apresentarem formas que</p><p>Lourival Gomes Machado define, de maneira sumária e</p><p>pejorativa, como “linguagem sub-acadêmica dos menos fortes”</p><p>(MACHADO, 1961 p.6).</p><p>Deve-se acrescentar, porém, que essa apologia das formas estiliza-</p><p>das não exclui apenas a zincogravura, do processo de legitimação da</p><p>“gravura popular”. De fato, uma análise cuidadosa revela que ela</p><p>também exclui um tipo especial de xilogravura, bastante dife-rente</p><p>da xilogravura “primitiva” privilegiada pelos meios letrados:</p><p>enquanto estas apresentam desenhos rústicos, gravados com traços</p><p>grosseiros, aquelas apresentam imagens de tipo “acadêmico”, co-</p><p>piadas de outros suportes e gravadas sobre a madeira com grande</p><p>fineza. Vários ilustradores de cordel realizam esse gênero de gravu-</p><p>ra, destacando-se João Pereira da Silva, o pioneiro da xilogravura de</p><p>cordel em Juazeiro do Norte, que manifesta um grande talento para</p><p>entalhar linhas extremamente finas, complexas e delicadas, que re-</p><p>produzem todos os detalhes dos motivos copiados, inclusive efeitos</p><p>de textura e volume (Figura 07 e 08).</p><p>48 VISUALIDADES</p><p>Figura 08 - Xilogravura de João Pereira da Silva para folheto religioso não identificado,</p><p>8,5 x 6,8 cm (col. Geová Sobreira, Brasília).</p><p>Como os intelectuais e o público letrado encaram essas gravuras?</p><p>As opiniões sobre a obra de João Pereira da Silva, bem como sua</p><p>própria história de vida, são reveladoras de uma condenação que,</p><p>sem ser explícita, é generalizada. No catálogo da exposição</p><p>apresentada no Museu de Arte de São Paulo, em 1960, Antônio</p><p>Martins Filho, Pre-sidente da Universidade do Ceará, explica:</p><p>Trabalho verdadeiramente anônimo e até certo ponto consi-</p><p>derado acessório de pouca ou nenhuma importância para o</p><p>acabamento geral da peça “literária” [ele se refere aos folhetos</p><p>de cordel], [a xilogravura] dispensa a assinatura nos melhores</p><p>exemplares; alguns artistas, talvez exatamente por este</p><p>motivo, não os mais genuínos, dão-se ao requinte erudito de</p><p>uma rubri-ca, tal como o gravador João Pereira da Silva.12</p><p>12. Cf. catálogo da exposição</p><p>Gravuras Populares do</p><p>Nordeste (1960), s. p.</p><p>Do mercado ao museu: a legitimação artística da gravura popular 49</p><p>Dentre os gravadores representados nessa exposição, João</p><p>Pereira da Silva não é, porém, o único a assinar seus trabalhos,</p><p>sendo acom-panhado, nessa prática, por Damásio Paulo,</p><p>Walderêdo Gonçalves e Antônio Batista Silva: porque, então,</p><p>somente o primeiro é consi-derado como “menos genuíno”?</p><p>A discriminação em relação ao trabalho de João Pereira da Silva</p><p>só se manifesta claramente, porém, depois das primeiras expo-</p><p>sições de gravura popular, quando a Universidade do Ceará de-</p><p>cide relançar a produção de xilogravuras em Juazeiro do Norte.</p><p>Para isso, encomenda novas obras aos diversos xilógrafos da ci-</p><p>dade, exceto, justamente, a João Pereira da Silva. Inocêncio da</p><p>Costa Nick (mais conhecido por Mestre Noza), ao contrário, re-</p><p>cebe a encomenda de três grandes séries, sobre os temas da Via</p><p>Crucis, dos Apóstolos e da Vida de Lampião. Ora, essa diferença</p><p>de tratamento só pode ser explicada pela grande diferença de</p><p>estilo entre os dois gravadores: enquanto o primeiro se esforça</p><p>para gravar cuidadosamente todos os detalhes dos motivos re-</p><p>presentados (Figura 07 e 08), com linhas extremamente finas, o</p><p>segundo se contenta em criar imagens extremamente simples,</p><p>bastante “primitivas”, gravadas sem nenhum refinamento, mes-</p><p>mo quando copiadas de fotografias (Figuras 09 e 10).</p><p>Figura 09</p><p>Folheto de cordel com zincogravu-</p><p>ra (fotografia): As grandes aventu-</p><p>ras de Armando e Rosa conhecidos</p><p>por “Côco Verde” e “Melancia”,</p><p>Juazeiro do Norte, Filhas de J.</p><p>Bernardo da Silva, 1976, c. 15 x 11</p><p>cm (col. Idelette Muzart, Paris).</p><p>Figura 10</p><p>Xilogravura de Mestre Noza</p><p>realizada para folheto de amor não</p><p>identificado, 9 x 7 cm (col. Geová</p><p>Sobreira, Brasília).</p><p>Enfim, a própria história de vida dos xilógrafos confirma que a</p><p>arte de Mestre Noza foi efetivamente favorecida, em detrimen-to</p><p>da de João Pereira da Silva. Em 1965, a Via Crucis gravada pelo</p><p>primeiro é publicada na França, em forma de um álbum de</p><p>50 VISUALIDADES</p><p>luxo: esta publicação teria uma enorme repercussão, marcando</p><p>uma nova fase na história da gravura popular e na vida de Mestre</p><p>Noza, que subitamente se torna famoso no Brasil e no exterior.</p><p>Para João Pereira da Silva, no entanto, a situação é exatamente</p><p>contrária. Sem produzir novas obras, ele fica de fora do movi-</p><p>mento de renovação da xilogravura do Ceará, caindo pouco a</p><p>pouco no esquecimento. Não raro, inclusive, seu papel de pio-</p><p>neiro da gravura de cordel em Juazeiro do Norte é omitido, em</p><p>favor justamente de Mestre Noza13. Assim, enquanto este rece-be</p><p>inúmeras homenagens em vida e mesmo depois de morto 14, João</p><p>Pereira da Silva vive seus últimos anos, e morre, no maior e mais</p><p>injusto dos silêncios.</p><p>Olhares folclóricos, visões regionalistas</p><p>Se a apologia da técnica artesanal e das formas rústicas explica o</p><p>sucesso de uma certa categoria de obras (a xilogravura estili-</p><p>zada) e o esquecimento de outras (a zincogravura e a xilogravu-ra</p><p>“naturalista”), é necessário explicar também as razões dessa</p><p>própria apologia, a fim de se compreender o processo de legiti-</p><p>mação artística da gravura popular em toda sua complexidade.</p><p>Para isso, é preciso se colocar numa perspectiva mais ampla e</p><p>analisar o contexto cultural e intelectual do Brasil de meados do</p><p>século XX, quando o mundo letrado começa a se interessar pe-las</p><p>ilustrações de cordel e por outras categorias da arte popular.</p><p>Duas correntes ideológicas se destacam, então. A primeira é a</p><p>eru-dição de tipo folclórico, que vive seus momentos de glória no</p><p>país, com a constituição de um verdadeiro movimento</p><p>organizado, muito vasto e ativo do final dos anos 1940 ao início</p><p>dos anos 1960 15. O primeiro intelectual a se interessar pela</p><p>gravura po-pular é, inclusive, um folclorista bastante implicado</p><p>nesse</p><p>mo-vimento: Théo Brandão, secretário da Comissão</p><p>Alagoana de Folclore, que tem a idéia de imprimir as ilustrações</p><p>de cordel em folhas soltas, para expô-las durante a Semana</p><p>Nacional de Folclore de Maceió, em 1952. Com o apoio dos</p><p>poderes institu-cionais e da mídia, os folcloristas desempenham,</p><p>assim, um pa-pel fundamental, não somente na promoção, mas</p><p>também na “proteção” das artes populares, em conformidade</p><p>com a missão de salvaguarda que eles mesmos se dão.</p><p>Ora, as iniciativas que têm por objeto a gravura popular ma-</p><p>nifestam exatamente o que caracteriza as concepções e as ati-</p><p>tudes de tipo folclórico: a admiração pelas coisas do passado,</p><p>13. Liêdo Maranhão de Souza, no-</p><p>tadamente, em sua obra pioneira</p><p>sobre as ilustrações de cordel,</p><p>indica Mestre Noza como o mais</p><p>antigo xilógrafo de Juazeiro do</p><p>Norte, não fazendo nenhuma</p><p>referência a João Pereira da Silva:</p><p>cf. Souza (1981). Por consequ-ência,</p><p>os pesquisadores que reproduzem</p><p>os dados deste autor cometem a</p><p>mesma omissão: cf. Iglesias (1992)</p><p>e Hata (1999).</p><p>14. Veja-se, por exemplo, as</p><p>comemorações póstumas pelos</p><p>100 anos de Mestre Noza, pela</p><p>Fundação Memorial de Padre</p><p>Cícero, de Juazeiro do Norte,</p><p>que incluiu a publicação de uma</p><p>série de estudos sobre o artista:</p><p>cf. Tavares (1997).</p><p>15. Sobre o movimento</p><p>folclórico brasileiro, a obra de</p><p>referência é Vilhena (1997).</p><p>Do mercado ao museu: a legitimação artística da gravura popular 51</p><p>16. Sobre os significados</p><p>profundos do movimento</p><p>regionalista nordestino,</p><p>aconselhamos a leitura</p><p>de Albuquerque Júnior (1999).</p><p>principalmente pelas técnicas artesanais, cujo desaparecimento</p><p>é frequentemente anunciado, em razão do progresso técnico-</p><p>industrial; a idéia de que o mundo letrado pode – e até deve</p><p>– evitar esse desaparecimento, tirando as obras ameaçadas de</p><p>seu ambiente natural para integrá-las no circuito erudito de</p><p>coleções, exposições e publicações; a preferência dada a certas</p><p>categorias de obras, em detrimento de outras, em função de</p><p>critérios preestabelecidos que sempre associam o “popular” ao</p><p>manual, simples, primitivo, rústico, antinaturalista; a certeza,</p><p>enfim, que o criador popular, sendo autodidata, é necessaria-</p><p>mente ingênuo, e que seu anonimato é um valor positivo, ao</p><p>contrário da afirmação individual expressa numa assinatura.</p><p>A outra corrente ideológica que ajuda a compreender o processo</p><p>de legitimação da gravura popular está diretamente associada ao</p><p>discurso folclorista. A partir dos anos 1920, intelectuais começam</p><p>a exaltar as especificidades socioculturais do Nordeste, explican-</p><p>do-as com argumentos geográficos e históricos, como as secas</p><p>pe-riódicas e o fenômeno do cangaço. Assim, foram definindo</p><p>uma região que teria ficado às margens do progresso, tornando-</p><p>se o reservatório de tradições e costumes muito antigos, que</p><p>remon-tariam à Idade Média. Por exemplo, a grande importância</p><p>dos chefes políticos locais, os coronéis, leva alguns a identificar,</p><p>na sociedade nordestina, uma estrutura de tipo feudal.</p><p>Essas teses servem, principalmente, para se colocar o Nordes-te</p><p>no centro das discussões nacionalistas: com suas tradições</p><p>arcaicas e “primitivas”, esta região é considerada a mais autên-</p><p>tica do Brasil, ao contrário do Sudeste, que teria pago o preço da</p><p>“desnacionalização”, incorporando modelos estrangeiros para</p><p>desenvolver-se econômica e culturalmente. Sociólogos e</p><p>escritores, pintores e políticos, nordestinos ou não, muitos con-</p><p>tribuem, assim, para cristalizar a noção de um Nordeste essen-</p><p>cialmente ligado ao passado e naturalmente avesso aos valores e</p><p>práticas da modernidade. Um Nordeste, portanto, que seria o</p><p>avesso de um grande centro como São Paulo, e isso, em de-</p><p>trimento das diversidades dessas duas zonas geográficas, sem-pre</p><p>negligenciadas em favor de generalizações que passam do arcaico</p><p>ao moderno, do rural ao urbano, do oral ao escrito, do artesanal</p><p>ao industrial, do erudito ao popular 16.</p><p>É nesse contexto que surge, a partir do final dos anos 1940, o in-</p><p>teresse pela arte popular do Nordeste, em particular por aquelas</p><p>categorias que – como a xilogravura rústica – servem para “pro-</p><p>52 VISUALIDADES</p><p>var” os anacronismos de um Nordeste constantemente</p><p>associa-do à Idade Média e, mais ainda, a uma Idade Média</p><p>por si só bastante estereotipada, já que considerada modelo</p><p>de civiliza-ção “pura” e “autêntica”, em oposição à civilização</p><p>“capitalista” e “tecnicista” que surge com a Idade Moderna 17.</p><p>Nesse sentido, é interessante notar a evolução no pensamento</p><p>de um dos ícones da “inteligência” nordestina. Em 1952,</p><p>quando ainda é um jovem escritor em começo de carreira,</p><p>Ariano Su-assuna associa a gravura popular à arte</p><p>contemporânea e, em particular, à obra de artistas como</p><p>Picasso, Gauguin, Chagall, Rousseau e Modigliani 18. Para ele,</p><p>o ponto de contato entre estas produções seria o primitivismo</p><p>inerente à arte popular, e incorporado pela arte erudita do</p><p>século XX, bem como uma “comunidade de intenções” entre</p><p>artistas de culturas diferentes, no momento da criação:</p><p>O impulso artístico, suas soluções, seus caminhos são mais</p><p>semelhantes em cada homem do que se pensa ordinariamen-</p><p>te, assim como o pecado: resolve-se, em última análise, numa</p><p>“vontade de fazer”, anterior à obra, e num “isto é bom”, a ela</p><p>posterior. É aí que se encontram artista erudito e artesão</p><p>popu-lar (SUASSUNA, 1952, p.1).</p><p>A perspectiva muda completamente, no entanto, num texto do</p><p>final dos anos 1960, quando Ariano Suassuna já se tornara um</p><p>escritor famoso, inspirando-se da tradição ibérica e da literatura</p><p>de cordel – também considerada uma “reminiscência medieval” –</p><p>para criar um teatro “tipicamente nordestino”:</p><p>Eu via reproduções de gravuras medievais européias e sentia</p><p>nelas uma pureza, uma limpeza, uma força que faltavam à gra-</p><p>vura da Renascença e à gravura moderna, apesar de muito mais</p><p>elaboradas. [...] na gravura medieval mais primitiva, o que me</p><p>agradava era o real transfigurado pelo poético, o real como mero</p><p>ponto de partida, o achatamento geral da gravura pela ausência</p><p>de profundidade, pela falta de claro- escuro e de perspectiva,</p><p>assim como a predominância do traço limpo e puro e forte con-</p><p>tornando as figuras. Ora, eram mais ou menos essas as caracte-</p><p>rísticas da nossa xilogravura popular (SUASSUNA, 1960, p.2).</p><p>Vê-se, portanto, que Ariano Suassuna muda de objeto de com-</p><p>paração, mas evoca exatamente os mesmos elementos plásticos</p><p>que tinha utilizado em 1952, para associar a gravura popular à</p><p>arte moderna: ausência de perspectiva e profundidade na ima-</p><p>Do mercado ao museu: a legitimação artística da gravura popular</p><p>17. Já há algum tempo que his-</p><p>toriadores, como Georges Duby</p><p>por exemplo, tentam combater os</p><p>lugares-comuns em relação à</p><p>Idade Média. Por outro lado, vale</p><p>notar que a cultura medieval não</p><p>pode ser considerada um bloco</p><p>homogêneo: em outros estudos,</p><p>tivemos a oportunidade de estu-</p><p>dar as relações entre</p><p>arte “erudita” e arte</p><p>“popular” na França do século</p><p>XIII – cf. Ramos (1998).</p><p>18. Para uma análise aprofunda-da</p><p>das ideias de Ariano Suassuna</p><p>sobre a gravura popular, cf.</p><p>Ramos (2008a).</p><p>53</p><p>gem, bem como o não-naturalismo das formas. Por que,</p><p>então, prefere mudar de ponto de vista, passando a relacionar</p><p>esta gra-vura a uma arte como a medieval, comumente</p><p>associada ao ar-caico, ao não moderno?</p><p>Esta questão resume toda a dimensão folclórica e regionalista do</p><p>processo de promoção e legitimação artística da gravura popular.</p><p>A nova atitude de Ariano Suassuna mostra que ele, assim como</p><p>outros intelectuais de sua geração, foi condicionado a encarar a</p><p>obra de arte popular – principalmente a realizada no Nordeste –</p><p>apenas como uma relíquia de uma idade remota, de uma época</p><p>mítica e idealizada, berço de</p><p>uma “pureza original” que teria se</p><p>perdido em seguida, com os progressos da razão, do capital e da</p><p>máquina – com a Modernidade, enfim. Daí a preferência pela xi-</p><p>logravura artesanal, rústica e primitiva, e o desprezo pelas outras</p><p>categorias de ilustração de cordel, a zincogravura e a xilogravura</p><p>refinada, que não se encaixam nas noções estabelecidas para “po-</p><p>pular” e “nordestino”, tanto por questões técnicas como estéticas.</p><p>Conclui-se, assim, que o processo de legitimação da gravura</p><p>popu-lar não significou apenas a criação de uma nova categoria</p><p>artística. Na verdade, ao retirar as obras do mercado, para levá-</p><p>las ao mu-seu, os representantes da cultura acadêmica, oficial,</p><p>fizeram bem mais do que tirar uma produção do anonimato,</p><p>colocando-a no centro do palco da arte brasileira: eles também</p><p>condenaram essa produção a desempenhar um papel bastante</p><p>controverso, numa peça extremamente complexa, sobre a</p><p>questão da identidade de um povo e de uma região.</p><p>Referências bibliográficas</p><p>(s.a.). Arte Brasileira em Portugal. Módulo. Revista de</p><p>Arquitetura e Artes Visuais no Brasil. Rio de Janeiro, ano VIII,</p><p>n° 28, p. 49, março de .</p><p>(s.a.). Xilogravura Popular. Recife: Imprensa Universitária, 1965.</p><p>(s.a.). Xilogravuras Populares Alagoanas (Coleção Theo Brandão).</p><p>Maceió: Imprensa Universitária/UFAL, 1973.</p><p>ALBUQUERQUE JÚNIOR, Durval Muniz de. A Invenção do</p><p>Nor-deste e Outras Artes. Recife/São Paulo: Fundação Joaquim</p><p>Nabu-co/Editora Massangana/Cortez Editora, 1999.</p><p>54 VISUALIDADES</p><p>DINIZ, Clarissa. Crachá: aspectos da legitimação artística (Re-</p><p>cife-Olinda, 1997 a 2000). Recife: Fundação Joaquim Nabuco,</p><p>Editora Massangana, 2008.</p><p>HATA, Luli. O Cordel das Feiras às Galerias. 1999. Dissertação</p><p>(Mestrado em Teoria Literária) – Instituto de Estudos da Lin-</p><p>guagem, Universidade de Campinas-UNICAMP, Campinas.</p><p>IGLESIAS, María Lucía Díaz Iglesias. Xilogravura Popular Bra-</p><p>sileira: Iconografia e Edição. 1992. Dissertação (M em Artes),</p><p>Escola de Comunicação e Artes, Universidade de São Paulo-</p><p>USP, São Paulo.</p><p>MACHADO, Lourival Gomes. Uma História de Leões. O</p><p>Estado de SãoPaulo, São Paulo, 5 de março de 1960.</p><p>Suplemento Lite-rário, p. 6.</p><p>MACHADO, Lourival Gomes. O Leão Viaja. O Estado de São-</p><p>Paulo, São Paulo, 16 de dezembro de 1961. Suplemento Literá-</p><p>rio, p. 6.</p><p>RAMOS, Everardo. Traditions locales et art savant au XIIIe siècle :</p><p>le décor monumentale de l’église de Chissey-sur-Loue. Histoire</p><p>de l’Art. Paris: Association des professeurs d’archéologie et</p><p>d’histoire de l’art des universités-APAHAU, 1998, p. 49-58.</p><p>RAMOS, Everardo. La gravure populaire au Brésil (XIXe-XXe</p><p>siècle) : du marché au marchand. 2005. 2 vol. Tese (Doutorado</p><p>em Estudos Brasileiros) – Université Paris X – Nanterre, Nan-</p><p>terre (França), 2005 (a).</p><p>RAMOS, Everardo. Du marché au marchand. La gravure popu-</p><p>laire brésilienne. Gravelines (França): Musée du dessin et de</p><p>l’estampe originale, 2005 (b).</p><p>RAMOS, Everardo. Ariano Suassuna e a gravura popular bra-</p><p>sileira ou a (de)formação de um pensamento crítico. In: ZAC-</p><p>CARA, Madalena; PEDROSA, Sebastião (orgs.). Artes visuais:</p><p>conversando sobre. Recife: Ed. Universitária da UFPE, 2008</p><p>(a).</p><p>RAMOS, Everardo. Ilustrações de Folhetos de Cordel: o Ro-</p><p>mance dos Esquecidos ou a Peleja do Popular com o Moderno.</p><p>In: NEMER, Sylvia (org.). Recortes contemporâneos sobre o</p><p>cordel. Rio de Janeiro: Edições Casa de Rui Barbosa, 2008 (b).</p><p>Do mercado ao museu: a legitimação artística da gravura popular 55</p><p>SOUZA, Liêdo Maranhão de. O Folheto Popular. Sua Capa e</p><p>seus Ilustradores. Recife: Fundação Joaquim Nabuco, Editora</p><p>Massangana, 1981.</p><p>SUASSUNA, Ariano. A Gravura na Arte Popular. Diário de</p><p>Per-nambuco, Recife, p.1, 15 de junho de 1952.</p><p>SUASSUNA, Ariano. Xilogravura Popular do Nordeste. Jornal</p><p>Universitário, Recife, agosto de 1969.</p><p>TAVARES, Íris (org.). Cem anos de Mestre Noza. Arte que o</p><p>tem-po não sucumbiu. Juazeiro do Norte, Fundação Memorial</p><p>de Padre Cícero, 1997.</p><p>VILHENA, Rodolfo.Projeto e Missão. O Movimento Folclórico</p><p>Brasileiro (1947-1964). Rio de Janeiro: Funarte/Fundação</p><p>Getú-lio Vargas, 1997</p><p>56 VISUALIDADES</p><p>Everardo Ramos</p><p>É historiador da arte, formado pela Université de Franche-Comté</p><p>(França). Possui Mestrado pela mesma universidade e Doutorado</p><p>pela Université Paris X – Nanterre (França), onde defendeu uma</p><p>tese sobre a gravura popular brasileira. É autor de Du marché au</p><p>marchand. La gravure populaire brésilienne, catálogo da exposi-</p><p>ção apresentada no Musée du Dessin et de l’Estampe Originale</p><p>de Gravelines (França, 2005), de que também foi curador. É</p><p>Professor Adjunto e Coordenador do Curso de Artes Visuais da</p><p>Universidade Federal do Rio Grande do Norte, em Natal.</p><p>E-mail: everardoramos@gmail.com</p><p>Os etruscos eram excelentes gravadores, desenvolvendo, entre outras</p><p>habilidades, a arte de gravar sobre o verso de espelhos, com efeitos decorativos</p><p>que retratavam cenas mitológicas. Um exemplar dessas peças é a gravação em</p><p>bronze ilustrada a seguir.</p><p>7 EICHENBERG, Fritz. The Art of the Print – Masterpieces, History and Techniques. Harry N.</p><p>Abrams, Inc. Publishers, New York. 1976. p. 27.</p><p>Gravura – História, Técnicas e Relações com a Impressão de Papel Moeda 5</p><p>Figura 5 - Orpheu tocando sua lira, espelho etrusco, gravado em bronze, Sc. IV a.</p><p>C.. Coleção Museum of Fine Arts, Boston, USA 8.</p><p>Os chineses, no Período Shang, 1200 – 1100 a. C., incrustavam seus caracteres</p><p>sobre conchas, ossos e cascos de tartarugas, muitos dos quais eram destinados à</p><p>prática de adivinhações. Só a partir do Período Han, entre os anos 206 – 220,</p><p>foram criados os caracteres de escrita mantidos quase que sem modificações até</p><p>8 EICHENBERG, Fritz. The Art of the Print – Masterpieces, History and Techniques. Harry N.</p><p>Abrams, Inc. Publishers, New York. 1976. p. 29.</p><p>Gravura – História, Técnicas e Relações com a Impressão de Papel Moeda 6</p><p>os dias atuais. Ainda na China, na época de Confúcio (551 a. C.) e Lao-tsu (604 a.</p><p>C.), os ensinamentos eram gravados sobre pedras e impressos sobre tiras de</p><p>bambu</p><p>9</p><p>.</p><p>A civilização que se desenvolveu no Vale do Hindus, entre os séculos 2500 e 1500</p><p>a. C. também criou impressos a partir de cilindros, como aqueles que eram</p><p>característicos da Região Sumeriana e do território compreendido entre os rios</p><p>Tigre e Eufrates. Suas impressões apresentavam detalhes minuciosos, como pode</p><p>ser visto na ilustração seguinte.</p><p>Figura 6 – Cultura do Vale do Hindus, selo com imagem de um búfalo, gravado</p><p>sobre esteatita, 2500 – 1500 a. C. A imagem foi obtida por intermédio de uma</p><p>impressão a partir de uma xilogravura</p><p>10</p><p>.</p><p>Um fato de extrema importância, tanto para a Civilização Oriental, como para a</p><p>Civilização Ocidental, foi a descoberta do papel pelos chineses, em 105. Depois</p><p>disso, foi muito mais fácil fazer crescerem os níveis de desenvolvimento científico e</p><p>tecnológico, chegando-se ao patamar em que se encontram as culturas nos dias</p><p>atuais. Foi possível, a partir de então, obter impressões em escalas cada vez</p><p>maiores. Os impressos de então eram estreitamente relacionados a assuntos</p><p>religiosos e cada vez se tornavam mais sofisticados e freqüentes. A imagem a</p><p>9 EICHENBERG, Fritz. The Art of the Print – Masterpieces, History and Techniques. Harry N.</p><p>Abrams, Inc. Publishers, New York. 1976. p. 34.</p><p>10 Ibid. p. 29.</p><p>Gravura – História, Técnicas e Relações com a Impressão de Papel Moeda 7</p><p>seguir representa um desses exemplares, datado do Sc. VIII, que foi extraído do</p><p>impresso Buda Sentado, da Gruta dos Mil Budas, Tun-huang, China.</p><p>Figura 7 – Buda Sentado, da Gruta dos Mil Budas, Tun-huang, xilogravura, Sc. VII,</p><p>9 ¼ x 13". Collection Spencer, New York Public Library, Astor, Lenox e Tilden</p><p>Foundation</p><p>11</p><p>.</p><p>O primeiro exemplar de impressão a partir de blocos de madeira (xilogravura) foi</p><p>elaborado em 770. Seu título original é “Os milhões de charmes do Imperador</p><p>Shotoku”. Seu título pode também aparecer como Hyakumanto Darni. A peça</p><p>mostra os muitos “encantamentos”budistas e apresenta-se sob a forma de texto.</p><p>A primeira xilogravura apresentando ilustrações intitula-se Senmen Koshakio,</p><p>apresenta ilustrações religiosas e é datada do Sc. XI. Mais tarde, em 1633,</p><p>11 EICHENBERG, Fritz. The Art of the Print – Masterpieces, History and Techniques. Harry N.</p><p>Abrams, Inc. Publishers, New York. 1976. p. 35.</p><p>Gravura – História, Técnicas e Relações com a Impressão de Papel Moeda 8</p><p>surgem as xilogravuras do estilo uyko-e, com cenas da vida cotidiana. Elas eram</p><p>executadas em preto e branco e, muitas vezes, eram coloridas à mão</p><p>12</p><p>.</p><p>FIGURA 8 – Chõbunsai Eishi, Füryü Nana Komachi, xilogravura no estilo uyko-e,</p><p>Período Edo, Sc. XVIII. Coleção Seikadö, Japão 13</p><p>.</p><p>A Gravura na Europa – A Xilogravura</p><p>As xilogravuras foram introduzidas na Europa na Idade Média, aproximadamente</p><p>em 1418. Naquela época elas eram usadas para a impressão de cartas de baralho</p><p>e, também, na confecção de mementos religiosos</p><p>14</p><p>. Sua introdução na Europa só</p><p>foi possível depois que o continente passou a conhecer e a produzir o papel. As</p><p>gravuras então criadas misturavam caracteres de escrita e imagens.</p><p>12 PETIT, Gaston e ARBORELA, Amadio. Evolving Techniques in Japanese Woodblock</p><p>Printing. Kodansha International Ltd. Tokyo, New York e San Francisco.1977. p. 11.</p><p>13 BUNKO, Seikadõ. 100 Seikado Masterpieces. The Mitsubishi Corporation, Dentsu</p><p>Incorporated e Benrido Co., Ltda.1984. p. 41.</p><p>14 Cada uma das duas preces do cânon da missa. (Memento dos Vivos e Memento dos Mortos).</p><p>TREVISAN, Rosana (coordenadora). Dicionário Michaelis – Moderno Dicionário da Língua</p><p>Portuguesa. Editora Melhoramentos, S. Paulo. p. 1352.</p><p>Gravura – História, Técnicas e Relações com a Impressão de Papel Moeda 9</p><p>Lygia Saboia</p><p>Para tanto, elas eram impressas juntamente com os tipos móveis. Logo após sua</p><p>introdução, além de motivos religiosos e aqueles usados nas cartas de baralho, as</p><p>xilogravuras eram utilizadas para a criação de estampas e ilustração de livros. Sua</p><p>introdução ocorreu na Alemanha, mas logo depois ela se espalhou pela França,</p><p>Itália e Holanda. Esses exemplares, na maioria das vezes, eram repletos de</p><p>detalhes, cortados na madeira com goivas e facas de diversos formatos. Os</p><p>alemães eram exímios nesta técnica, como também o foram os italianos</p><p>15</p><p>.</p><p>Aos poucos, as imagens foram se tornando cada vez mais sofisticadas e os</p><p>ilustradores e artistas passaram a acrescentar grande variedade de traços,</p><p>sombreados e texturas.</p><p>Diversos movimentos artísticos a partir de então tiveram representantes que</p><p>praticaram a xilogravura, sendo importante destacar o pintor, desenhista e gravador</p><p>alemão Albert Dürer. As primeiras xilogravuras européias apresentavam conteúdos</p><p>mais direcionados à ilustração, mas no Renascimento foram notáveis algumas</p><p>obras artísticas criadas a partir dessa técnica.</p><p>Mais tarde, os artistas ligados ao Impressionismo foram muito influenciados pelas</p><p>estampas produzidas no Japão, depois que tiveram contato com as criações dos</p><p>artistas gravadores japoneses, por intermédio de uma exposição apresentada na</p><p>Europa no Sc. XIX.</p><p>Os artistas ligados ao Movimento Expressionista, já no Sc. XX, usaram a</p><p>xilogravura para expressar sua arte, em virtude das possibilidades oferecidas pela</p><p>técnica, que permite criar imagens em que a dramaticidade e a expressão gráfica</p><p>podem se fazer presentes. Os artistas de vários países continuam a praticar a</p><p>xilogravura, bem como as demais técnicas de gravura, apesar das dificuldades que</p><p>as técnicas apresentam e mesmo depois da introdução e circulação crescente das</p><p>imagens digitais e do ferramental tecnológico hoje disponível.</p><p>Algumas imagens colocadas a seguir permitem constatar o uso disseminado da</p><p>xilogravura nos séculos que sucederam sua introdução na Europa. As duas</p><p>primeiras são xilogravuras de artistas desconhecidos, enquanto a segunda é um</p><p>15</p><p>BUCKLAND-WRIGHT, John. Etching and Engraving – Techniques and the Modern Trend.</p><p>DOVER Publications, Inc. New York. 1973. p. 172.</p><p>Gravura – História, Técnicas e Relações com a Impressão de Papel Moeda 10</p><p>exemplar da série produzida por Albert Dürer, intitulada Apocalipse. Dürer criou</p><p>inúmeras gravuras, sendo que suas xilogravuras são muito apreciadas, não só</p><p>pela riqueza de detalhes, como pela expressividade</p><p>e variedade de traços</p><p>apresentados.</p><p>Figura 9 – Xilogravuras de artistas italianos anônimos. O Monge (acima) e Aesop,</p><p>ilustração colocada embaixo</p><p>16</p><p>.</p><p>16</p><p>BUCKLAND-WRIGHT, John. Etching and Engraving – Techniques and the Modern Trend.</p><p>DOVER Publications, Inc. New York. 1973. p. 177.</p><p>Gravura – História, Técnicas e Relações com a Impressão de Papel Moeda 11</p><p>Lygia Saboia</p><p>17</p><p>Figura 10 – Albert Dürer, Apocalipse XVI, xilogravura, 15 x 10 ¾ “ .</p><p>O artista alemão Edward Münch, ligado ao Expressionismo, movimento artístico</p><p>desenvolvido no Sc. XX, também usou a xilogravura para criar sua arte com</p><p>imagens ricas e capazes de evidenciar sua ligação com este movimento artístico.</p><p>Não só Münch, mas diversos outros artistas ligados ao Expressionismo produziram</p><p>xilogravuras.</p><p>17</p><p>BUCKLAND-WRIGHT, John. Etching and Engraving – Techniques and the Modern Trend.</p><p>DOVER Publications, Inc. New York. 1973. p. 178.</p><p>Gravura – História, Técnicas e Relações com a Impressão de Papel Moeda 12</p><p>Figura 11 – Edward Münch, Male Bather, xilogravura a cores. Coleção do Münch</p><p>Museum, Oslo</p><p>18</p><p>.</p><p>18 EICHENBERG, Fritz. The Art of the Print – Masterpieces, History and Techniques. Harry N.</p><p>Abrams, Inc. Publishers, New York. 1976. p. 118.</p><p>Gravura – História, Técnicas e Relações com a Impressão de Papel Moeda 13</p><p>Alguns Artistas Brasileiros e a Xilogravura</p><p>No Brasil, o uso da xilogravura apresenta três vertentes importantes, a xilogravura</p><p>de Cordel, a xilogravura comercial e a xilogravura artística. Assim, além dos vários</p><p>artistas brasileiros que se expressaram por meio da gravura em madeira, devem</p><p>ser citados os artistas populares e a Literatura de Cordel, que vem utilizando a</p><p>técnica de modo muito criativo na ilustração de hábitos, poesia popular e tradição</p><p>da cultura brasileira. Muitas dessas obras estão ligadas à crítica social e política, o</p><p>que lhes confere valor histórico e status de documentação regional. Essas peças</p><p>são produzidas principalmente na Região Nordeste do Brasil. Além disso, diversos</p><p>artistas populares têm encontrado na xilogravura um meio profícuo para sua</p><p>expressão plástica. Introduzida no Brasil por padres missionários no final</p><p>18 EICHENBERG, Fritz. The Art of the Print – Masterpieces, History and Techniques. Harry N.</p><p>Abrams, Inc. Publishers, New York. 1976. p. 118.</p><p>Gravura – História, Técnicas e Relações com a Impressão de Papel Moeda 13</p><p>do Sc. XIX, a xilogravura de Cordel é feita com o uso da madeira denominada</p><p>cajazeira e os gravadores usam apenas canivetes e facas amoladas para talhar a</p><p>madeira. Destacam-se os artistas J. Borges, Enéas Tavares Santos, Zé Caboclo,</p><p>Mestre Noza e outros. Há também artistas que ilustram seus próprios poemas,</p><p>como Dila, Damásio Paulo Valdero, Cirilo e outros. A xilogravura comercial no</p><p>Brasil esteve grandemente associada à criação de rótulos para diversos tipos de</p><p>produtos, bem como associada à tipografia para impressões de ilustrações de</p><p>livros, ex-libris e demais objetos impressos.</p><p>Figura 12 – Stênio, gravura de Cordel</p><p>19</p><p>A xilogravura no Brasil teve impulso na área artística com a vinda de Modesto</p><p>Brocos y Gomes para a Escola de Belas Artes, no final do Sc. XIX. Ele veio para</p><p>coordenar a área de xilogravura da Escola de Belas Artes. Ele teve sua formação</p><p>na Itália e, além de artista, foi ilustrador. Ao que parece, foi ele que deu início ao</p><p>uso da xilogravura pelos artistas com formação em escolas de arte no Brasil.</p><p>O desenvolvimento da xilogravura artística no Brasil se intensificou nas primeiras</p><p>décadas do Sc. XX, com a ida para o Rio de Janeiro do gravador brasileiro</p><p>19 Xilogravura de Cordel de autoria de Stênio, encontrada na Internet. N. da A.</p><p>Gravura – História, Técnicas e Relações com a Impressão de Papel Moeda 14</p><p>Osvaldo Goeldi. Ele foi um mestre para vários dos mais importantes gravadores</p><p>brasileiros, dentre os quais Fayga Ostrower e Edith Bhering. Com ele, Lazar Segall</p><p>e Lívio Abramo inicia-se um dos mais expressivos momentos da arte brasileira que</p><p>foi a moderna gravura brasileira</p><p>20</p><p>.</p><p>O Banco Central possui em seu acervo algumas obras de artistas representativos</p><p>da xilogravura no Brasil. Dentre esses artistas, destacam-se Maria Bonomi e</p><p>Emiliano Di Cavalcanti.</p><p>Di Cavalcanti viveu entre os anos 1897 e 1976, tendo nascido no Rio de Janeiro.</p><p>Ele foi ligado ao Modernismo e sua obra apresenta ligação estreita com as cores e</p><p>a Cultura Brasileira. Um de seus temas prediletos, seja na pintura, na gravura ou</p><p>no desenho, são as mulheres brasileiras.</p><p>Figura 13 – Emiliano Di Cavalcanti, xilogravura a cores, 70 x 51 cm. Acervo do</p><p>Banco Central do Brasil.</p><p>Maria Bonomi nasceu na Itália em 1935, vindo para o Brasil ainda jovem. Ela fez</p><p>estudos no Ateliê de Gravura do MAM (Museu de Are Moderna do Rio de Janeiro) e</p><p>montou, juntamente com Lívio Abramo, o Estúdio de Gravura em São Paulo, em</p><p>1960. Ela inaugurou um novo estilo na xilogravura brasileira, utilizando</p><p>20 MARTINS, Itajahy. Gravura – Arte e Técnica.Fundação Nestlé da Cultura e Laserprint Editorial,</p><p>Gravura – História, Técnicas e Relações com a Impressão de Papel Moeda 15</p><p>impressões a cores com várias placas de madeira, cujas dimensões eram bastante</p><p>avantajadas quando comparadas com aquelas encontradas nas gravuras de um</p><p>modo geral. Ela criou gravuras com cerca de 80 a 100 cm de altura ou</p><p>comprimento e, atualmente, cria painéis de grandes dimensões em madeira e</p><p>demais materiais, que cobrem paredes e demais superfícies.</p><p>Figura 14 – Maria Bonomi, Parede em Construção, xilogravura, 50 x 80 cm.</p><p>Acervo do Banco do Brasil 21</p><p>.</p><p>A Xilogravura – Técnicas</p><p>Existem duas formas básicas de preparar matrizes para impressões em</p><p>xilogravura</p><p>22</p><p>. Uma delas é pela utilização da madeira cortada no sentido</p><p>longitudinal em relação ao tronco, ou seja, na direção de seu comprimento. A outra</p><p>forma é por meio de cortes e incisões sobre fatias da madeira, ou seja,</p><p>S. Paulo. 1987.p. 188.</p><p>21 Banco do Brasil – Relatório Anual 1972. p. 25.</p><p>22 Há variantes desses processos, em que são incluídos relevos, cortes nas matrizes, dentre</p><p>outros. N. da A.</p><p>Gravura – História, Técnicas e Relações com a Impressão de Papel Moeda 16</p><p>pedaços cortados transversalmente, no sentido vertical do tronco da árvore da</p><p>qual ela é extraída.</p><p>De acordo com o corte da madeira, as ferramentas utilizadas para as incisões são</p><p>diferentes. No primeiro caso, são usadas goivas, formões e facas. No segundo, as</p><p>ferramentas utilizadas são os buris de pontas diferenciadas. A ilustração a seguir</p><p>permite comparar os modos diferentes de corte da madeira e os tipos de</p><p>ferramentas utilizadas.</p><p>Figura 15 – Modos diferentes de corte da madeira para xilogravura</p><p>23</p><p>.</p><p>23 MARTINS, Itajahy, Gravura – Arte e Técnica.Fundação Nestlé da Cultura e Laserprint</p><p>Editorial, S. Paulo. 1987.p. 37.</p><p>Gravura – História, Técnicas e Relações com a Impressão de Papel Moeda 17</p><p>Vários são os tipos de madeira próprios para esta técnica de gravura, destacando-</p><p>se a cerejeira, o mogno, cedro e outras madeiras mais moles. A imbuia é também</p><p>bastante adequada, pois embora mais rígida, é dócil ao corte. Outras madeiras</p><p>são também adequadas para o corte a fio, ou seja, no sentido longitudinal da peça,</p><p>quais sejam,</p><p>alguns tipos de jacarandá, canela, jequitibá, dentre outras.</p><p>Dependendo da madeira que se usa, os resultados obtidos serão diferentes, não</p><p>só em temos de corte, como na textura das impressões. As imagens a seguir</p><p>apresentam diferentes cortes, madeiras e ferramentas utilizadas no processo de</p><p>corte a fio em xilogravura.</p><p>Figura 16 – Cortes com goivas e diferentes texturas segundo a madeira utilizada</p><p>24</p><p>.</p><p>24 MARTINS, Itajahy. Gravura – Arte e Técnica.Fundação Nestlé da Cultura e Laserprint</p><p>Editorial, S. Paulo. 1987. p. 39.</p><p>Gravura – História, Técnicas e Relações com a Impressão de Papel Moeda 18</p><p>Com relação à gravação em topo, ou seja, com as madeiras cortadas</p><p>transversalmente em relação ao crescimento do tronco, a madeira mais adequada</p><p>denomina-se buxo e é mais rara no Brasil do que na Europa. Ela é utilizada,</p><p>também, para a fabricação de instrumentos musicais e marchetaria. Este tipo de</p><p>madeira tem cor amarelada, apresentando, algumas vezes, manchas escuras.</p><p>As imagens seguintes evidenciam diferentes possibilidades de uso do buril na</p><p>xilogravura de topo, podendo ser apreciados detalhes que se pode conseguir com</p><p>seus cortes sobre madeira. Vê-se, também, uma gravura executada pelo burilista</p><p>do Sc. XIX, considerado um dos melhores da época, que foi Henri Thitiat.</p><p>Figura 17 – Cortes com buril sobre madeira de topo. Henri Thitiat, Retrato de M.</p><p>Victorien Sardou</p><p>25</p><p>.</p><p>A imagem acima mostra detalhes de cortes da madeira de topo, usando o buril.</p><p>Note-se que há diversos tipos deste instrumento. Enquanto a seqüência de</p><p>imagens a seguir mostra a série de passos necessários à impressão de uma</p><p>25 PETIT, Gaston. Evolving Techniques in Japanese Woodblock Prints. Kodansha, International</p><p>Ltda. Tóquio. 1977. p. 59 e MARTINS, Itajahy. Gravura – Arte e Técnica.Fundação Nestlé da</p><p>Cultura e Laserprint Editorial, S. Paulo. 1987. p . 63.</p><p>Gravura – História, Técnicas e Relações com a Impressão de Papel Moeda 19</p><p>xilogravura de topo. O processo de impressão, no entanto, é o mesmo quando se</p><p>trata de impressão de xilogravuras a fio.</p><p>Figura 18 – Seqüência de passos para a impressão de uma xilogravura de topo</p><p>26</p><p>.</p><p>As impressões seguem, quase sempre, os mesmos passos, sendo alteradas em</p><p>casos específicos ou pelo gosto do impressor. Antes do corte, as madeiras devem</p><p>ser necessariamente preparadas e lixadas. Depois, executam-se os cortes, entinta-</p><p>se a madeira e pressiona-se o papel sobre a peça entintada. A impressão pode ser</p><p>feita com a parte posterior de uma colher de madeira ou metal, com uma prensa ou</p><p>com um instrumento desenvolvido pelos japoneses, intitulado baren. A tinta pode</p><p>ser aplicada com rolos sobre a madeira ou com pincel. Pode ser</p><p>26 PETIT, Gaston. Evolving Techniques in Japanese Woodblock Prints. Kodansha, International</p><p>Ltda. Tóquio. 1977. p. 59, 60 e 61.</p><p>Gravura – História, Técnicas e Relações com a Impressão de Papel Moeda 20</p><p>dissolvida em água ou com querosene. Isso permite concluir que os processos de</p><p>impressão em xilogravura, embora guardem elementos em comum, permitem</p><p>alguma flexibilidade. A série de figuras colocadas a seguir apresenta a seqüência</p><p>dos passos necessários para uma impressão em xilogravura colorida.</p><p>Figura 20 – Etapas de impressão de uma xilogravura colorida em sete estágios</p><p>27</p><p>.</p><p>27 PETIT, Gaston. Evolving Techniques in Japanese Woodblock Prints. Kodansha, International</p><p>Ltda. Tóquio. 1977.Ibid. p. 26 e 27.</p><p>Gravura – História, Técnicas e Relações com a Impressão de Papel Moeda 21</p><p>O Papel Moeda e a Xilogravura</p><p>Levou algum tempo até que o papel moeda, ou seja, as notas impressas em papel</p><p>fossem aceitas universalmente como dinheiro. A princípio, objetos ou metais eram</p><p>considerados elementos de reserva de valor. A circulação de papéis substituindo</p><p>valores aconteceu quando se percebeu que haveria a possibilidade de deixar</p><p>valores em depósito, emitindo recibos que lhe conferissem valor. Na verdade, foi</p><p>a invenção do papel, no ano de 105, por Tsai Lun, ministro da agricultura da</p><p>Dinastia Han na China, que possibilitou a disseminação do papel moeda.</p><p>Muitos desses papéis eram preenchidos à mão, sendo que o couro e o papiro</p><p>foram usados como papel moeda antes mesmo que o papel tivesse sido</p><p>inventado. No entanto, no mundo ocidental, as primeiras notas de banco aceitas</p><p>sem prazo de duração, destinadas a circular entre o grande público, só</p><p>apareceram em 1656, em Estocolmo, Suécia.</p><p>No Oriente isso aconteceu alguns séculos antes. No Sc. XIV, quando Marco Polo</p><p>esteve na China, encontrou e relatou o uso disseminado do papel moeda</p><p>28</p><p>. A</p><p>imagem a seguir apresenta uma dessas notas. O dinheiro de então era</p><p>denominado Kwan e era o tempo da Dinastia Ming. No entanto, desde o Sc. VII,</p><p>eram feitas oferendas aos mortos com papel moeda.</p><p>Figura 21 – Bilhete chinês com a assinatura do Imperador e seus tesoureiros. As</p><p>notas eram impressas em xilogravura</p><p>29</p><p>.</p><p>28 MONESTIER, Martin. L’Art du Papier Monnaie. Editions Point Neuf Paris. 1982. p. 18</p><p>29 Ibid.</p><p>Gravura – História, Técnicas e Relações com a Impressão de Papel Moeda 22</p><p>No Ocidente, com o desenvolvimento de outras técnicas de impressão, dentre as</p><p>quais a gravura em metal, a xilogravura foi perdendo espaço no que concerne à</p><p>impressão de papel moeda, embora também tenha sido usada para essa</p><p>finalidade.</p><p>A Gravura na Europa - A Gravura em Metal</p><p>O uso de objetos pontiagudos para fazer incisões já foi abordado neste texto</p><p>anteriormente, mas é importante reforçar que essas incisões são também as</p><p>origens da gravura em metal. Os povos da Mesopotâmia, os egípcios e os gregos</p><p>executavam gravações em metais, vidros, gemas preciosas e semipreciosas e</p><p>sobre a parte posterior dos espelhos. Não se sabe exatamente quem teve a idéia</p><p>de fazer uma impressão a partir dessas gravações pela primeira vez na História.</p><p>No entanto, a primeira gravura em metal de que se tem notícia é datada de 1446,</p><p>intitulada Christ Crowned with Thorns e apenas uma dessas cópias sobrevive nos</p><p>dias atuais</p><p>30</p><p>. Alguns autores consideravam que o inventor da gravura em metal foi</p><p>o Mestre das Cartas de Baralho, um joalheiro suíço, cujo estilo era semelhante ao</p><p>do pintor Stephan Lochner. No entanto, no começo do Sc. XX, ele foi identificado</p><p>como o famoso pintor de Bassel, Konrad Witz</p><p>31</p><p>.</p><p>As discussões a respeito das primeiras gravuras em metal em relação a seus</p><p>criadores são muito extensas, uma vez que os nomes dos autores dessas</p><p>gravuras não apareciam nas obras impressas e estas eram apenas conhecidas</p><p>como tendo sido criadas pelo Mestre da Paixão, Mestre do Altar Erfut Regler e</p><p>assim sucessivamente. No entanto, sem dúvida, essas gravuras foram iniciadas na</p><p>Alemanha.</p><p>Abaixo está apresentada a gravura intitulada The Crowning with Thorns.</p><p>30 EINCHENBERG, Fritz. The Art of the Print – Masterpieces, History and Techniques. Harry N.</p><p>Abrams, Inc. Publishers, New York. 1976. p. 180.</p><p>31 SHESTACK, Alan. Fifteenth Century Engravings of Northern Europe From the National Gallery</p><p>of Art, Washington D. C.. National Gallery of Art, Washington D. C. , 1967/1968. p. 1</p><p>Gravura – História, Técnicas e Relações com a Impressão de Papel Moeda 23</p><p>Figura 22 – The Crowing with Thorns, 1440-50, 87 x 60 mm, proveniente de</p><p>Gilhofer e Ranschenburg, Lucern Suiça</p><p>32</p><p>.</p><p>Na Itália a gravura em metal se originou das gravações feitas pelo processo</p><p>conhecido como</p><p>nielo. Tais gravações eram feitas sobre objetos do dia a dia e</p><p>peças de joalheria, sobretudo em Florença. Era uso a criação de medalhas com</p><p>relevos esmaltados com uma mistura de prata, chumbo, bórax e enxofre misturado</p><p>ao sal de amoníaco. Quando essas peças eram colocadas no forno, produziam</p><p>relevos. Mazzo Finiguerra teve a idéia de tirar provas de papel a partir dessas</p><p>imagens, usando para isso uma prensa antes que fosse executada a esmaltação.</p><p>Embora haja discordância sobre a primeira gravura produzida, as gravuras</p><p>mencionadas nos parágrafos anteriores, editadas na Alemanha foram, de fato, os</p><p>primeiros exemplares de gravuras em metal</p><p>33</p><p>.</p><p>32 SHESTACK, Alan. Fifteenth Century Engravings of Northern Europe From the National</p><p>Gallery of Art, Washington D. C.. National Gallery of Art, Washington D. C. p. 263.</p><p>33 MARTINS, Itajahy. Gravura – Arte e Técnica.Fundação Nestlé da Cultura e Laserprint</p><p>Editorial, S. Paulo. 1987. p. 102.</p><p>Gravura – História, Técnicas e Relações com a Impressão de Papel Moeda 24</p><p>Gravura em Metal – Técnicas</p><p>Várias são as técnicas utilizadas para as impressões a partir de chapas de metal.</p><p>No entanto, aqui são abordadas aquelas mais utilizadas pelos artistas de um modo</p><p>geral e para a fabricação de moedas e notas.</p><p>A gravura a buril, também conhecida como talho doce, consiste em incisões sobre</p><p>chapas metálicas (cobre, preferencialmente) por intermédio do buril. Essa</p><p>ferramenta pode ter formatos, tamanhos e espessuras variadas, permitindo</p><p>diversos tipos de corte, desde os mais profundos até aqueles mais suaves e</p><p>superficiais. Essa variedade de ferramentas e traços, aliada aos estilos dos artistas</p><p>e à pressão que estes exercem na ferramenta quando executam as incisões,</p><p>permite resultados muito delicados e expressivos, proporcionando texturas e</p><p>sombreados diferenciados. Foram e são muitos os artistas, desde a criação da</p><p>técnica até os dias atuais, que elaboraram gravuras com riqueza de detalhes.</p><p>Dentre eles podem ser destacados os pintores Albert Dürer e Andréa Mantegna.</p><p>As imagens a seguir são exemplares de obras desses dois artistas.</p><p>Figura 23 - Andréa Mantegna, Bacchanale, detalhe, gravura em buril sobre metal,</p><p>13 x 17 ¾”, tamanho da gravura total. Coleção British Museum</p><p>34</p><p>.</p><p>34 GROSS, Anthony. Engraving, & Intaglio Printing. London Oxford University Press, New York,</p><p>1970. p 31.</p><p>Gravura – História, Técnicas e Relações com a Impressão de Papel Moeda 25</p><p>35</p><p>Figura 24 – Albert Dürer, Melancolia, gravura a buril sobre metal, 9 ½ x 7 ½” .</p><p>A gravação a buril é muito delicada e demanda habilidade do gravador. Geralmente</p><p>os traços devem ser executados em uma mesma direção. O buril deve ser retirado</p><p>da chapa quando se quer mudar a direção dos mesmos e, para traçar linhas</p><p>curvas, é necessário que a placa seja colocada sobre um pedaço de tecido ou</p><p>couro, de modo a ser possível mudar a direção da chapa, mantendo o buril sobre</p><p>ela. Caso contrário, dificilmente o gravador tem controle das linhas curvas,</p><p>perdendo a direção iniciada pelo primeiro corte.</p><p>A gravura intitulada “Sudariun de Santa Verônica”, de autoria do artista Claude</p><p>Mellan, é um exemplo do controle preciso que o burilista teve sobre o desenho e a</p><p>ferramenta utilizada.</p><p>35 GROSS, Anthony. Engraving, & Intaglio Printing. London Oxford University Press, New York,</p><p>1970. p. 32.</p><p>Gravura – História, Técnicas e Relações com a Impressão de Papel Moeda 26</p><p>Figura 25 – Claude Mellan, “Sudariun de Santa Verônica“, detalhe, buril sobre</p><p>metal, 16 3/4 x 12 ½, medida da gravura completa. Coleção University College</p><p>London</p><p>36</p><p>.</p><p>Como se pode ser observar, a precisão do traço é básica nesse processo de</p><p>gravação, daí seu uso na fabricação de notas e documentos bancários. A imagem a</p><p>seguir mostra a aplicação da técnica em papel moeda.</p><p>36 GROSS, Anthony. Engraving, & Intaglio Printing. London Oxford University Press, New York,</p><p>1970. p. 38.</p><p>Gravura – História, Técnicas e Relações com a Impressão de Papel Moeda 27</p><p>Figura 26 – Gravura a buril sobre placa de metal para impressão de papel</p><p>moeda</p><p>37</p><p>.</p><p>Nos processos de gravação em metal, a primeira tarefa que deve ser levada a</p><p>efeito é a limpeza da chapa, removendo oxidações e demais imperfeições da</p><p>mesma. As ferramentas devem estar perfeitamente polidas e com bom corte. Pode-</p><p>se fazer o esboço do desenho a ser gravado com papel carbono ou por outro</p><p>método qualquer. Depois de feita a incisão na peça, a rebarba deixada por cada</p><p>traço deve ser removida. Para isso se usa um raspador. Quando toda a gravação</p><p>está completa, a chapa pode ser entintada e impressa. As imagens abaixo</p><p>apresentam o preparo do buril e a gravação de uma chapa de metal por meio desse</p><p>instrumento.</p><p>37 MONESTIER, Martin. L’Art du Papier Monnaie. Editions Point Neuf Paris. 1982. p. 29.</p><p>Gravura – História, Técnicas e Relações com a Impressão de Papel Moeda 28</p><p>Figura 26 – 2 imagens de Abrahan Bosse mostrando o uso do buril, conforme o</p><p>tratado de Abrahan Boose</p><p>38</p><p>.</p><p>Uma outra técnica bastante usada para gravações em placas de metal é a água-</p><p>forte, que consiste na aplicação de uma cera sobre a chapa, na qual são feitos</p><p>traços ou desenhos, removendo-se partes da película aplicada por meio de</p><p>agulhas. Depois disso, a peça é imersa em uma vasilha contendo água e ácido</p><p>(geralmente ácido nítrico), que se encarrega de gravar ou corroer a chapa. Na</p><p>medida em que os traços são devidamente gravados, o artista repõe a cera,</p><p>38 GROSS, Anthony. Etching, Engraving, & Intaglio Printing. London Oxford University Press,</p><p>New York, 1970. p. 46 e 47.</p><p>Gravura – História, Técnicas e Relações com a Impressão de Papel Moeda 29</p><p>abrindo novos sulcos e mergulhando de novo a chapa na solução de ácido e água.</p><p>O processo se repete tantas vezes quantas forem necessárias até que o desenho</p><p>fique completo. Como é possível perceber, a técnica é mais flexível do que a</p><p>anterior, possibilitando ao gravador obter resultados sem as dificuldades</p><p>encontradas na técnica descrita anteriormente. Por essa razão, a água-forte</p><p>facilitou o desenvolvimento da gravura em metal, sendo mais comum, nos dias</p><p>atuais, encontrar gravuras executadas por esse processo do que pelo uso do buril.</p><p>A imagem seguinte retrata os passos acima descritos, mostrando o processo</p><p>utilizado para gravação de uma chapa de metal pelo método da água-forte.</p><p>Figura 27- Etapas para a gravação de uma chapa de metal pelo processo</p><p>conhecido como água-forte</p><p>39</p><p>.</p><p>39 MARTINS, Itajahy. Gravura – Arte e Técnica.Fundação Nestlé da Cultura e Laserprint</p><p>Editorial, S. Paulo. 1987. p. 104.</p><p>Gravura – História, Técnicas e Relações com a Impressão de Papel Moeda 30</p><p>As primeiras gravuras em água-forte de que se tem notícia no Ocidente foram</p><p>feitas por Albert Dürer e Urs Graf no Sc. XV e foram gravadas sobre ferro, metal</p><p>mais utilizado no começo das gravações por meio desse processo. Apesar de ser</p><p>mais prática a utilização da água-forte, as gravuras em buril e nas demais técnicas</p><p>de incisão direta sobre a chapa eram mais comuns nos séculos XV e XVI. Só no</p><p>Sc. XVII é que as águas-fortes começaram a ser mais populares e isso se deve</p><p>aos gravadores holandeses. Destes, destaca-se Rembrandt Van Rijn, que foi</p><p>exímio na técnica e cujas gravuras são exemplos de maestria no que concerne ao</p><p>uso de claro-escuros.</p><p>A imagem seguinte apresenta um detalhe da gravura de autoria de Rembrandt,</p><p>intitulada Cristo com o Doente. Note-se a perfeição dos sombreados obtidos pelo</p><p>artista.</p><p>Figura 28 – Rembrandt Van Rijn, Cristo com o Doente, 11 1/16 x 15 ½ “, 1649.</p><p>National Gallery, Washington D. C. 40</p><p>40 EICHENBERG, Fritz.. The Art of the Print – Masterpieces, History and Techniques. Harry N.</p><p>Abrams, Inc. Publishers, New York. 1976. p. 200.</p><p>Gravura – História, Técnicas e Relações com a Impressão de Papel Moeda 31</p><p>Um outro processo de gravação em chapas de metal é a água-tinta. Esta técnica</p><p>permite impressões em que diversas zonas de claro-escuro são obtidas. A técnica</p><p>possibilita a impressão de degradês e sombreados diversos. A técnica consiste na</p><p>aplicação de pó de breu sobre a chapa, que é levada ao calor para que o breu se</p><p>derrete e adira ao suporte, Com isso, quando a chapa é entintada, a tinta penetra</p><p>nos espaços gravados, evidenciando texturas diminutas correspondentes aos</p><p>diferentes tons. Estes tons podem ir do cinza claro até o negro profundo.</p><p>As imagens seguintes ilustram, respectivamente, as diversas texturas obtidas com</p><p>a água-tinta, a caixa de breu usada para a obtenção de uma retícula regular e a</p><p>“queima”da chapa feita com o propósito de fixar o breu sobre a mesma.</p><p>Depois, tem-se uma gravura de Goya, da série Caprichos, em que se pode</p><p>observar uma gravura em que foram usados os processos de água-tinta e água-</p><p>forte.</p><p>Figura 29 – Processo de gravação de uma chapa em água-tinta</p><p>41</p><p>.</p><p>41 GROSS, Anthony. Etching, Engraving, & Intaglio Printing. London Oxford University Press,</p><p>New York, 1970. p. 85 e 86 e 87.</p><p>Gravura – História, Técnicas e Relações com a Impressão de Papel Moeda 32</p><p>Figura 30 – Francisco Goya, Que se la Llevaran !, água-tinta e água-forte, 13,5 x</p><p>18,5 cm. Coleção Britsh Museum</p><p>42</p><p>.</p><p>O processo de impressão das gravuras em metal apresenta fases distintas – em</p><p>primeiro lugar há que se entintar a chapa. Esta fase consiste na aplicação da tinta</p><p>sobre a chapa, forçando a mesma a aderir a todos os sulcos, marcas ou texturas</p><p>gravadas na placa. Em seguida, o excesso de tinta deve ser removido; depois, uma</p><p>limpeza final é feita com a palma da mão (não é obrigatório), depois de passar um</p><p>pouco de talco na mesma. À esta limpeza com a mão dá-se o nome de “a palmo”.</p><p>Finalmente, coloca-se a placa sobre o berço da prensa, acrescenta-se</p><p>42 GROSS, Anthony. Etching, Engraving, & Intaglio Printing. London Oxford University Press,</p><p>New York, 1970. p. 63.</p><p>Gravura – História, Técnicas e Relações com a Impressão de Papel Moeda 33</p><p>o papel de impressão, cobre-se o mesmo com uma folha de papel mata-borrão,</p><p>coloca-se um feltro por cima e roda-se a prensa - está pronta a gravura. As</p><p>imagens seguintes ilustram o processo de impressão de uma gravura em metal em</p><p>seus vários detalhes.</p><p>Figura 31 – Colocação da tinta sobre a placa de metal com a retirada do excesso</p><p>43</p><p>de tinta e processo de limpeza da chapa denominado “a palmo” .</p><p>43 MARTINS, Itajahy. Gravura – Arte e Técnica.Fundação Nestlé da Cultura e Laserprint</p><p>Editorial, S. Paulo. 1987.p. 129 e 131.</p><p>Gravura – História, Técnicas e Relações com a Impressão de Papel Moeda 34</p><p>Figura 33 – Etapa final da impressão de uma gravura em metal</p><p>44</p><p>.</p><p>44 MARTINS, Itajahy. Gravura – Arte e Técnica.Fundação Nestlé da Cultura e Laserprint</p><p>Editorial, S. Paulo. 1987. p. 133.</p><p>Gravura – História, Técnicas e Relações com a Impressão de Papel Moeda 35</p><p>A Gravura em Metal e Alguns Artistas Brasileiros</p><p>A primeira gravura em metal impressa no Brasil é de autoria do presbítero José</p><p>Joaquim V. de Menezes, que viveu entre 1778 e 1841. Ele estudou em Portugal,</p><p>onde aprendeu a técnica. Trata-se de uma ilustração sobre um texto em</p><p>homenagem ao governador da Capitania de Minas Gerais, Pedro Maria Xavier de</p><p>Athayde e Melo. O poema foi escrito por Diogo Pereira de Vasconcelos. É</p><p>importante citar que José Joaquim de Menezes traduziu e fez imprimir em Portugal</p><p>44 MARTINS, Itajahy. Gravura – Arte e Técnica.Fundação Nestlé da Cultura e Laserprint</p><p>Editorial, S. Paulo. 1987. p. 133.</p><p>Gravura – História, Técnicas e Relações com a Impressão de Papel Moeda 35</p><p>o tratado de gravura de Abrahan Boose, escrito em francês e que é considerado um</p><p>dos mais importantes e pioneiros textos sobre técnicas de gravação em metal. As</p><p>imagens seguintes correspondem respectivamente à primeira página do opúsculo</p><p>calcográfico do padre Viegas de Menezes, de 1807, em Vila Rica, e um detalhe do</p><p>catálogo da mostra Gravura Brasileira – Bienal de São Paulo, 1975, do mesmo</p><p>autor, extraído de uma de suas gravuras.</p><p>Figura 34 – padre José Joaquim V. de Menezes, Primeira Página do Opúsculo,</p><p>1807. Coleção Carlos Rizini e detalhe do catálogo da mostra Gravura Brasileira –</p><p>Bienal de São Paulo – 1975 45</p><p>.</p><p>A gravura em metal no Brasil esteve durante muito tempo ligada a impressões de</p><p>caráter comercial. Sua prática neste país se tornou mais intensa com a vinda de D.</p><p>João VI, que trouxe a Imprensa Régia de Portugal e impulsionou as atividades da</p><p>Casa da Moeda. Ao mesmo tempo, para o Brasil foram trazidos artistas com a</p><p>Missão Francesa, alguns dos quais como Zeferin Ferrez e Simon Pradier eram</p><p>45 MARTINS Itajahy. Gravura – Arte e Técnica.Fundação Nestlé da Cultura e Laserprint Editorial,</p><p>S. Paulo. 1987. p. 185.</p><p>Gravura – História, Técnicas e Relações com a Impressão de Papel Moeda 36</p><p>gravadores e iniciaram a prática da gravura em metal na Escola Real de Belas</p><p>Artes, fundada por D. João VI.</p><p>Alguns artistas no Sc. XIX e começo do Sc. XX elaboraram obras utilizando as</p><p>técnicas de gravura em metal. No entanto, o apogeu da gravura no Brasil se deu</p><p>após o Movimento Modernista de 1922. Este movimento foi um marco para a arte</p><p>brasileira não só para a gravura, como para todas as formas de expressão plástica.</p><p>O Acervo de Obras de Arte do Banco Central é formado por obras de artistas</p><p>brasileiros dos mais importantes. Algumas dessas obras são compostas por</p><p>gravuras em metal. Os artistas Marcelo Grassmann, Maciej Babinski Adelmir</p><p>Martins e Clóvis Gaciano, dentre outros, criaram obras em que utilizaram técnicas</p><p>de gravura em metal. As imagens apresentadas a seguir, selecionadas do acervo</p><p>mencionado, são alguns desses exemplos. A primeira gravura apresentada é do</p><p>artista Clóvis Graciano. Note-se que é uma água-forte. Como pode ser constatado,</p><p>esta técnica permite desenhar curvas e linhas mais livres sobre o verniz, que é</p><p>aplicado sobre o metal, o que não é possível executar quando se usa o buril. Clóvis</p><p>Gaciano nasceu em S. Paulo em 1907, integrando o grupo conhecido como Família</p><p>Artística Paulista 46</p><p>.</p><p>46 BOZANO, SIMONSEN Vol. 1. SPALA Editora Ltda., Rio de Janeiro, RJ, 1981. p. 95.</p><p>Gravura – História, Técnicas e Relações com a Impressão de Papel Moeda 37</p><p>Figura 35 – Clóvis Graciano, Mulher Sentada, água-forte, 24 x 18 cm, 1981.</p><p>Acervo Banco Central do Brasil.</p><p>Marcello Grassmann foi um dos expoentes da gravura no Brasil. Criou várias obras</p><p>nas técnicas de água-forte e água tinta. Ele utilizou com maestria os contrastes</p><p>entre claro e escuro, muitas texturas e áreas de zonas de preto “aveludadas”. O</p><p>artista nasceu em São Simão, S. Paulo, em 1925 e é um dos artistas mais</p><p>expressivos no panorama da</p><p>arte brasileira como desenhista e gravador 47</p><p>.</p><p>47 http://br.news.yahoo.com/02/0607/11/6ho4.html/.</p><p>Gravura – História, Técnicas e Relações com a Impressão de Papel Moeda 38</p><p>A imagem apresentada a seguir é uma gravura em que se pode ver o uso da</p><p>água-forte, evidenciada por meio de texturas e traços, além da técnica conhecida</p><p>como água-tinta, correspondentes às zonas escuras.</p><p>Figura 36 – Marcello Grasmann, sem título, água forte e água tinta. Coleção Acervo</p><p>do Banco do Brasil 48</p><p>.</p><p>O artista brasileiro Adelmir Martins trabalhou com gravuras, desenho e pintura . Ele</p><p>nasceu no Ceará, em 1922 e ligou-se à Sociedade Cearense de Artes Plásticas.</p><p>Adelmir Martins participou de exposições em São Paulo e no Rio de</p><p>48 Banco do Brasil – Relatório Anual 1972. p. 15.</p><p>Gravura – História, Técnicas e Relações com a Impressão de Papel Moeda 39</p><p>Janeiro, estando associado ao Modernismo. Sua obra é figurativa, com tendências</p><p>à síntese e à geometrização da forma. Além de utilizar o desenho, a pintura e a</p><p>gravura para expressar sua obra, o artista criou ilustrações. Ele utiliza grafismos</p><p>para sua expressão plástica, o que fez da gravura em metal um excelente veículo</p><p>para a expressão do artista. A imagem seguinte é uma água-forte de sua autoria.</p><p>Figura 37 – Adelmir Martins, Galo, água-forte e água-tinta, 24 x 24 cm. Acervo do</p><p>Banco Central do Brasil.</p><p>O artista Maciej Babinsiki nasceu na Polônia, em 1931, e teve sua formação como</p><p>artista no Canadá. Ele conheceu o gravador Osvaldo Goeldi no Rio de Janeiro, de</p><p>quem se tornou amigo. Ele é ligado ao Expressionismo como o era Osvaldo Goeldi</p><p>e além de intensa atividade como gravador, expressa sua arte por meio da pintura.</p><p>Ele foi professor do Departamento de Artes Visuais da UnB e atualmente vive na</p><p>cidade de Crato, no Ceará. A imagem seguinte mostra uma das obras de Babinski</p><p>em gravura em metal, sendo possível apreciar o uso da água-forte e água-tinta.</p><p>Note-se as variadas tonalidades de cinza, obtidas pelas diversas imersões da</p><p>chapa em ácido e água, além das linhas, obtidas por meio de riscos</p><p>Gravura – História, Técnicas e Relações com a Impressão de Papel Moeda 40</p><p>no verniz aplicado sobre a chapa e gravadas também por meio de banhos da</p><p>placa em ácido (água-forte).</p><p>Figura 38 – Maciej Babinski, Figura Cavalgando Animal, 1988, 15 x 20,5 cm.</p><p>Coleção Acervo do Banco Central do Brasil.</p><p>O Papel Moeda e a Gravura em Metal</p><p>O uso da gravura em metal para a impressão de papel moeda é muito intenso,</p><p>sendo preservado até os dias atuais, em virtude das possibilidades que esta técnica</p><p>apresenta em termos de sutilezas de traços e, sobretudo, de segurança. Os</p><p>burilistas que gravam as placas a serem utilizadas na impressão de papel moeda</p><p>são, geralmente, profissionais muito hábeis, pois não podem se enganar no traçado</p><p>de detalhes muitas vezes diminutos.</p><p>A fundação da Casa da Moeda do Brasil foi permitida por meio do Alvará de 1</p><p>o</p><p>de</p><p>fevereiro de 1644 com o propósito de cunhar moedas de prata. As pessoas que</p><p>Gravura – História, Técnicas e Relações com a Impressão de Papel Moeda 41</p><p>possuíssem ouro e quisessem fundir moedas poderiam fazê-lo e o padrão</p><p>monetário deveria acompanhar o de Portugal. A licença foi dada para que se</p><p>fundissem moedas de três mil réis. Só em 1694 é que se estabeleceram,</p><p>definitivamente, as Casas da Moeda no Brasil, que eram localizadas em quatro</p><p>cidades brasileiras – Recife, Salvador, Vila Rica e Rio de Janeiro. As atividades</p><p>dessas Casas da Moeda não eram simultâneas, mas alternadas</p><p>49</p><p>.</p><p>No entanto esse projeto não seguiu adiante, sendo que a primeira emissão de</p><p>papéis de valor no Brasil ocorreu em 1843, com a famosa série de selos</p><p>denominada “Olho d Boi”. Estes selos foram impressos em superfícies de aço, por</p><p>meio de buril. O resultado foi uma verdadeira obra de arte e foram feitas tiragens</p><p>de 30, 60 e 90 réis. Mais tarde foram impressos selos “olho de boi”de valores</p><p>diferentes, apresentados unidos, provenientes de uma chapa única. O Brasil foi,</p><p>então, o terceiro país a produzir e usar selos postais, precedido apenas pela</p><p>Inglaterra e Suíça 50</p><p>.</p><p>Figura 30 - Selo “Olho de Boi”</p><p>51</p><p>.</p><p>49 GASPARINI FILHO, Ítalo Sydney (Coordenador). Mvbcb – Museu de Valores do Banco</p><p>Central do Brasil. Banco Safra Editora Melhoramentos – São Paulo, S. Paulo.1988. p. 136.</p><p>50 Iconografia de Valores Impressos no Brasil. Banco Central do Brasil. 1979. p. 278.</p><p>51 Ibid. 282.</p><p>Gravura – História, Técnicas e Relações com a Impressão de Papel Moeda 42</p><p>O primeiro papel de banco a circular no Brasil é datado de 1810 e foi emitido pelo</p><p>Banco do Brasil, fundado em 1808. O bilhete era preenchido à mão e sua</p><p>autenticidade era medida pelos furos encontrados na nota, em comparação com</p><p>aqueles do canhoto correspondente. Um exemplo destes bilhetes é ilustrado a</p><p>seguir.</p><p>Figura 41 – Primeiro bilhete de banco emitido no Brasil 52</p><p>.</p><p>Não foram encontradas informações sobre o modo como foi impresso, mas eles</p><p>eram numerados e a presença de desenhos e estampa decorativa permitem supor</p><p>que foi utilizada a gravura em metal.</p><p>Havia naquela época, no Brasil, a emissão exagerada de moedas de cobre. Assim,</p><p>para minimizar os problemas decorrentes disso, começaram a circular as</p><p>52 GASPARINI FILHO, Ítalo Sydney (Coordenador). Mvbcb – Museu de Valores do Banco</p><p>Central do Brasil. Banco Safra Editora Melhoramentos – São Paulo, S. Paulo.1988. p. 162.</p><p>Gravura – História, Técnicas e Relações com a Impressão de Papel Moeda 43</p><p>denominadas cédulas de troco de cobre. As moedas falsificadas ou em excesso</p><p>em circulação eram recolhidas e trocadas pelos papéis, que eram emitidos pelo</p><p>Tesouro Nacional. Essas cédulas de troco de cobre eram muito falsificadas e</p><p>tornou-se difícil controlar as suas emissões, Assim, a partir de 1835, elas foram</p><p>substituídas por notas e passaram a ser produzidas na Inglaterra. Os exemplos</p><p>ilustrados a seguir foram feitos por meio de impressão em calcogravura (gravura</p><p>em cobre – outra denominação da gravura em metal) e neles é possível notar a</p><p>riqueza de detalhes.</p><p>Figura 42 – Notas de Banco, calcogravura, produzidas na Inglaterra</p><p>53</p><p>.</p><p>53 GASPARINI FILHO, Ítalo Sydney (Coordenador). Mvbcb – Museu de Valores do Banco</p><p>Central do Brasil. Banco Safra Editora Melhoramentos – São Paulo, S. Paulo.1988. p. 186.</p><p>Gravura – História, Técnicas e Relações com a Impressão de Papel Moeda 44</p><p>Lygia Saboia</p><p>As imagens seguintes representam uma nota de 500 mil réis impressa em gravura</p><p>em metal, em que se vê uma paisagem panorâmica do Rio Antigo. Depois aparece</p><p>um detalhe da mesma nota, em que se pode observar os mínimos traços usados na</p><p>gravação para dar maior segurança às notas. Note-se a presença da marca d’água</p><p>na frente e no verso da nota.</p><p>Figura 43 - Nota de 500 mil réis. Calcogravura</p><p>54</p><p>.</p><p>Até os dias atuais são utilizados processos de gravura em metal para a impressão</p><p>de papel moeda. No Brasil, uma vez escolhidos os temas e desenhos a serem</p><p>executados nas notas, estes são gravados pelos burilistas. A seguir, a placa de</p><p>metal é enviada para a seção de Galvanoplastia da Casa da Moeda (as notas e</p><p>moedas brasileiras são inteiramente fabricadas no Brasil). As linhas raiadas a buril</p><p>são transpostas para placas de PVC e transformadas em relevo, utilizando-se</p><p>prensas hidráulicas para este fim. Pulveriza-se</p><p>sobre o PVC uma substância</p><p>condutora de corrente, formando-se o alto-relevo. Outros processos são aplicados</p><p>na seção de galvanização, de modo que se obtenha uma contra-matriz em baixo</p><p>54 GASPARINI FILHO, Ítalo Sydney (Coordenador). Mvbcb – Museu de Valores do Banco</p><p>Central do Brasil. Banco Safra Editora Melhoramentos – São Paulo, S. Paulo.1988. p. 224/225,</p><p>Gravura – História, Técnicas e Relações com a Impressão de Papel Moeda 45</p><p>relevo. Essa chapa é colocada na máquina impressora. O mesmo acontece com</p><p>relação à impressão do verso da nota.</p><p>Tira-se um prova final, que é enviada à Seção de Fotografia para que sejam</p><p>preparados os fotolitos. Os demais passos para a impressão de notas são</p><p>descritos adiante, ao serem apresentados os processos litográficos usados na</p><p>impressão de papel moeda.</p><p>A imagem seguinte mostra um gravador elaborando detalhes sobre um chapa de</p><p>metal, com propósitos de impressão de notas.</p><p>Figura 44 - Detalhes de gravação de uma placa de metal para impressão de papel</p><p>moeda</p><p>55</p><p>.</p><p>Emulsões sensíveis à luz são aplicadas sobre chapas de metal para que possam</p><p>ser gravadas depois de serem expostas à luz com os fotolitos criados para</p><p>reproduzir imagens fotográficas, tais como retratos, paisagens, detalhes da flora,</p><p>fauna e outros. A esse processo dá-se o nome de clicheria. É importante</p><p>acrescentar que essas emulsões podem também ser aplicadas à litografia, à</p><p>55 MONESTIER, Martin. L’Art du Papier Monnaie. Editions Point Neuf Paris. 1982. p. 29.</p><p>Gravura – História, Técnicas e Relações com a Impressão de Papel Moeda 46</p><p>xilogravura e à serigrafia. A imagem seguinte mostra exemplos de clichês</p><p>utilizados na impressão de notas.</p><p>Figura 45 – Protótipos em clicheria</p><p>56</p><p>.</p><p>Atualmente já são utilizadas impressões por meio do computador para criarem</p><p>desenhos detalhados e precisos na preparação de notas. O exemplo seguinte é a</p><p>aplicação de guilhochês (ornamentos simétricos) desenhados por meio de</p><p>máquinas comandadas por computadores. Como se pode ver, cada vez mais estão</p><p>se tornando mecanizados e tecnologicamente mais sofisticados os processos de</p><p>impressão de papel moeda.</p><p>56 MONESTIER, Martin. L’Art du Papier Monnaie. Editions Point Neuf Paris. 1982. p. 31.</p><p>Gravura – História, Técnicas e Relações com a Impressão de Papel Moeda 47</p><p>Figura 46 – Desenho de guilhochês por meio de uma impressora eletrônica 57</p><p>.</p><p>Por outro lado, todo o processo de fabricação de notas tem se tornado cada vez</p><p>mais elaborado e maior número de máquinas cada vez mais precisas tem sido</p><p>incorporado aos processos de gravação e impressão de papel moeda. No entanto,</p><p>procedimentos manuais ligados à gravura em metal convivem com tais avanços.</p><p>57 MONESTIER, Martin. L’Art du Papier Monnaie. Editions Point Neuf Paris, 1982. p. 70.</p><p>Gravura – História, Técnicas e Relações com a Impressão de Papel Moeda 48</p><p>Litografia</p><p>A litografia, como o nome indica (lito – pedra, grafia – desenho), consiste no</p><p>desenho de imagens sobre a pedra que serve de matriz, no processamento</p><p>químico da mesma e nas posteriores impressões tiradas a partir dela. No entanto,</p><p>não é qualquer pedra que se adapta às impressões em litografia. A pedra que é</p><p>utilizada para esse tipo de gravura é formada, sobretudo, de calcário (a maior</p><p>parte) e silício. Dependendo da relação existente entre esses dois minerais, as</p><p>57 MONESTIER, Martin. L’Art du Papier Monnaie. Editions Point Neuf Paris, 1982. p. 70.</p><p>Gravura – História, Técnicas e Relações com a Impressão de Papel Moeda 48</p><p>pedras adquirem colorações diferentes. Quanto mais claras, maior é a proporção</p><p>de calcário nelas existente. Sua coloração vai desde o branco até o cinza,</p><p>passando por diversas tonalidades entre esses dois extremos. As pedras mais</p><p>claras são mais moles e adequadas a trabalhos em que não se exige grande</p><p>precisão de traços. As pedras cinzas, as mais resistentes, são melhores quando</p><p>se pretende elaborar trabalhos com traços e detalhes mais precisos. Isso porque,</p><p>no decorrer do processo de impressão e mesmo nas gravações sobre a pedra, ela</p><p>sofre abrasão, podendo, se for menos resistente, ter os detalhes de desenho</p><p>reduzidos ou mesmo apagados.</p><p>A litografia baseia-se no princípio segundo o qual água e gordura não se misturam.</p><p>O processo consiste em tornar a pedra receptiva à gordura apenas nas</p><p>quantidades necessárias para que o desenho aplicado sobre ela não sofra</p><p>modificações ao longo dos procedimentos de impressão. Por outro lado, é</p><p>necessário que se transforme a parte da pedra que não foi desenhada repelente à</p><p>água, de modo que isso reforce a preservação do desenho original.</p><p>O processo de impressão denominado litografia foi inventado no final do Sc. XVIII,</p><p>por Alois Senefelder, um artista austríaco. O próprio criador da litografia elaborou o</p><p>primeiro livro sobre o novo método de impressão e ele afirmava, em seu texto, que</p><p>a descoberta se deu por acaso, quando ele estava escrevendo uma lista de roupas</p><p>a serem enviadas para lavar. Ele usara um papel que deixou marcas do texto sobre</p><p>a pedra e, por acaso, um pouco de ácido nítrico se espalho pela pedra. A reação do</p><p>ácido, permitindo que o texto ficasse em relevo e não fosse atingido pelo mesmo,</p><p>deu-lhe a idéia de colocar tinta sobre a pedra e retirar cópias a partir da matriz</p><p>criada.</p><p>Muitas pessoas não deram crédito, de imediato, às palavras de Senefelder, pois</p><p>imaginaram que ele já estava tentando utilizar aquelas pedras muito comuns na</p><p>região da Bavária, Alemanha, com o propósito de obter impressões a partir delas.</p><p>Além disso, várias tentativas já tinham sendo feitas por diversas pessoas ligadas à</p><p>área de impressão, mas estas não obtiveram êxito.</p><p>Coube a Alois Senefelder a glória da descoberta de um processo de impressão que</p><p>permite que hoje tenhamos livros, revistas, jornais, cartazes, enfim, diversos</p><p>Gravura – História, Técnicas e Relações com a Impressão de Papel Moeda 49</p><p>meios de difusão de textos, imagens e idéias. Isso porque a litografia é a “mãe” do</p><p>processo de impressão em off-set, uma vez que este último surgiu a partir dos</p><p>métodos e processos de gravação e impressão em litografia. Cabe acrescentar</p><p>que o próprio Senefelder já dizia que seria possível reproduzir o processo</p><p>litográfico em placas metálicas.</p><p>As pedras litográficas necessitam ser preparadas para que possam ser</p><p>desenhadas, gravadas e impressas. O primeiro passo é a granitagem da pedra,</p><p>que consiste na colocação de abrasivos com diversas gramaturas e, por meio de</p><p>uma pedra menor ou outros instrumentos usados para polimento de pedras, faz-se</p><p>movimentos circulares, de modo a formar uma substancia pastosa, fruto do</p><p>resultado da abrasão das duas pedras, da água e do pó utilizado como abrasivo</p><p>(geralmente óxido de alumínio – podem também ser usadas areias de várias</p><p>gramaturas, como acontecia no início da criação do processo).</p><p>As pedras litográficas são sensíveis à gordura. Assim, os lápis e bastões</p><p>litográficos são constituídos de sebo, ceras diversas, pigmento e aglutinantes.</p><p>Depois que a pedra é granitada, é desenhada com as tintas ou bastões e lápis</p><p>litográficos. Várias texturas podem ser conseguidas com esses desenhos, que dão</p><p>resultados semelhantes aos conseguidos com os materiais normais de desenho.</p><p>Os resultados alcançados com os desenhos e pinturas sobre a pedra são muito</p><p>ricos, permitindo texturas e aguadas diversas, traços livres, sombreados,</p><p>procedimentos fotográficos e outros.</p><p>A “queima”ou gravação da pedra é feita com goma arábica natural dissolvida em</p><p>água, ácido nítrico, fosfórico e, eventualmente,</p><p>outros ácidos, como o ácido tânico,</p><p>por exemplo.</p><p>A “queima”da pedra faz com que a parte que não foi desenhada sofra um</p><p>rebaixamento quase invisível a olho nu e que a área coberta com o material graxo</p><p>prossiga receptiva a gorduras. A parte não desenhada da pedra torna-se</p><p>impermeável à gordura e atrativa à água, enquanto a zona gordurosa atrairá</p><p>gorduras depositadas por meio de um rolo entintado. Para empreender o processo</p><p>de gravação ou “queima”, usam-se misturas de água e goma arábica ou goma de</p><p>celulose dissolvidas e misturadas aos ácidos.</p><p>Gravura – História, Técnicas e Relações com a Impressão de Papel Moeda 50</p><p>O processo de impressão é feito por meio de uma prensa plana, sobre a qual é</p><p>colocada a pedra, o papel de impressão e, finalmente, um material resistente que</p><p>protege a pedra e o papel da pressão que será exercida pela prensa, a fim de que</p><p>se conclua o processo de impressão. É importante acrescentar que embora tenha</p><p>facilitado em muito o desenvolvimento da comunicação via imagens, arte,</p><p>impressos e demais objetos de comunicação, os processos de impressão em</p><p>litografia são muito delicados, demandando muita atenção e cuidado por parte dos</p><p>impressores.</p><p>Embora a litografia tenha sido usada por vários artistas desde a sua criação, o</p><p>emprego desta forma de impressão esteve muito mais ligado ao desenvolvimento</p><p>da indústria gráfica e de impressão de um modo geral, inclusive na impressão de</p><p>notas e documentos bancários. Vários cartazes criados no Sc. XIX e começo do</p><p>Sc. XX, bem como estampas e ilustrações de livros, foram impressos em litografia.</p><p>Como exemplo, pode ser apreciada a ilustração a seguir.</p><p>Gravura – História, Técnicas e Relações com a Impressão de Papel Moeda 51</p><p>Figura 47 – Caffè Puerto Pueblo, 37 x 22”, 1910. Stabilimento Litografico L.</p><p>Bulla</p><p>58</p><p>.</p><p>A imagem seguinte apresenta detalhes do processo de granitagem e preparo da</p><p>pedra litográfica e alguns materiais utilizados para o desenho e a impressão. Note-</p><p>se uma pedra desenhada, os lápis, pincéis, tintas e bastões usados em litografia,</p><p>parte dos rolos de impressão, papéis e esponjas de limpeza utilizados no processo</p><p>de tiragem de cópias.</p><p>58 KNIGIN, Michael e ZMILES, Murray. The Contemporary Lithographic Workshop Around the World.</p><p>Van Nostrand Reinhold Company. New York, Toronto, London, Melbourne. p. 189.</p><p>Gravura – História, Técnicas e Relações com a Impressão de Papel Moeda 52</p><p>Figura 48 – Preparo da pedra litográfica e materiais usados no desenho e</p><p>impressão em litografia</p><p>59</p><p>.</p><p>A seguir é apresentada uma imagem que mostra uma pedra litográfica, já</p><p>desenhada, sendo processada ou “queimada”, conforme o jargão utilizado na</p><p>prática da litografia. O processo subentende aplicações de camadas de talco e</p><p>59 DAWSON, John (editor), Guia Completo del Grabado. H. Blume Ediociones1982. p. 107.</p><p>Gravura – História, Técnicas e Relações com a Impressão de Papel Moeda 53</p><p>breu, aplicação de uma mistura de goma arábica e ácidos e limpeza final da pedra,</p><p>quando se deixa um filme quase invisível de goma arábica. Os ácidos mais</p><p>utilizados na queima ou processamento da pedra litográfica são o nítrico e o</p><p>fosfórico, além do ácido tânico.</p><p>Figura 49 – Etapas do processamento de uma pedra litográfica</p><p>60</p><p>.</p><p>60 KNIGIN, Michael e ZMILES, Murray. The Contemporary Lithographic Workshop Around the World.</p><p>Van Nostrand Reinhold Company. New York, Toronto, London, Melbourne, 1974. p.49.</p><p>Gravura – História, Técnicas e Relações com a Impressão de Papel Moeda 54</p><p>As figuras seguintes apresentam, respectivamente, a retirada do material graxo da</p><p>superfície da pedra com o propósito de entinta-la, a entintagem da pedra e a</p><p>impressão de uma cópia. Note-se o uso dos rolos necessários à colocação de um</p><p>filme bem suave de tinta.</p><p>Figura 50 – Limpeza da pedra, entintagem e retirada de uma cópia impressa em</p><p>litografia</p><p>61</p><p>Na medida em que o processo litográfico foi se desenvolvendo, passou-se a usar</p><p>em substituição às pedras, chapas granitadas de zinco e alumínio. Essas chapas</p><p>metálicas também eram preparadas antes de serem desenhadas. Para isso eram</p><p>usadas máquinas que faziam circular, por meio de agitação, bilhas de metal sobre</p><p>as chapas, de modo a produzir os grãos ou texturas sobre as mesmas. O</p><p>processamento e a impressão das chapas permaneceu praticamente igual aos</p><p>61 DAWSON, John (editor), Guia Completo del Grabado. H. Blume Ediociones1982. p. 111 e 113.</p><p>Gravura – História, Técnicas e Relações com a Impressão de Papel Moeda 55</p><p>utilizados na litografia em pedra. Com o desenvolvimento do processo, algumas</p><p>gráficas passaram a utilizar produtos químicos industrializados. ao invés das</p><p>tradicionais gravações com goma e ácido.</p><p>Esse avanço tecnológico permitiu que mais tarde, no final do Sc. XIX, essas</p><p>chapas fossem colocadas em torno de cilindros, que imprimiam as imagens</p><p>gravadas sobre placas de borracha denominadas blanquetas, as quais, por sua</p><p>vez, depositavam a tinta sobre as folhas de papel. Este processo é o que se</p><p>denomina impressão off-set, descoberta na Inglaterra. Com o advento da</p><p>fotografia, as pedras e as chapas passaram, muitas vezes, a ser emulsionadas</p><p>com substâncias fotossensíveis, permitindo a utilização de transparências.</p><p>Os desenhos ou fotografias colocados nessas transparências eram passados para</p><p>as pedras ou chapas por meio de exposições à luz, determinando o que se intitula</p><p>fotolitografia ou fac simile. A partir daí, o processo de impressão se disseminou,</p><p>possibilitando cada vez mais rapidamente a circulação e veiculação de textos e</p><p>imagens de todas as naturezas.</p><p>Processos idênticos ocorreram com relação à gravura em metal, derivando no que</p><p>se chama de clicheria. A clicheria passou a ser integrada aos processos</p><p>litográficos, auxiliando na criação dos fotolitos, e, também, associados à tipografia.</p><p>É importante acrescentar que as máquinas para impressão litográfica em pedra</p><p>geralmente guardam ainda muitas semelhanças com as prensas originais. No</p><p>entanto, hoje já são utilizados, mesmo com a pedra, métodos mais automatizados</p><p>de impressão.</p><p>As máquinas impressoras em off-set também apresentam graus maiores ou</p><p>menores de sofisticação, havendo mesmo prensas movidas a mecanismos</p><p>eletrônicos.</p><p>A série de imagens a seguir mostra a granitagem de chapas de metal e a</p><p>impressão pelo processo denominado off-set.</p><p>Gravura – História, Técnicas e Relações com a Impressão de Papel Moeda 56</p><p>Figura 51 – Granitagem de chapas metálicas para uso em impressões em prensa</p><p>plana ou de off-set</p><p>62</p><p>.</p><p>Figura 52 – Etapas de entintagem e impressão pelo processo off-set, também</p><p>conhecido como processo indireto de impressão</p><p>63</p><p>.</p><p>62 DAWSON, John (editor), Guia Completo del Grabado. H. Blume Ediociones1982. p.108</p><p>63 Ibid. p. 114 e 115.</p><p>Gravura – História, Técnicas e Relações com a Impressão de Papel Moeda 57</p><p>Ainda hoje existem empreendimentos comerciais ou institucionais que mantêm</p><p>ativos seus ateliês de impressão em litografia. Normalmente os trabalhos</p><p>executados nesses ateliês são dirigidos a impressões de artistas ou de imagens</p><p>comerciais de alta qualidade e por encomenda. Um dos mais famosos ateliês</p><p>ativos nos dias atuais é o Tamarind Institute, na cidade de Albuquerque Novo</p><p>México, nos USA. O Tamarind</p>

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