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<p>1</p><p>UNIVERSIDADE FEDERAL DE PELOTAS</p><p>Faculdade de Educação</p><p>Programa de Pós-Graduação em Educação</p><p>Tese</p><p>Da escola na zona urbana para a escola do/no campo:</p><p>os professores em foco</p><p>Cátia Simone Becker Vighi</p><p>Pelotas, 2013</p><p>2</p><p>Cátia Simone Becker Vighi</p><p>Da escola na zona urbana para a escola do/no campo:</p><p>os professores em foco</p><p>Tese apresentada ao Programa de Pós-</p><p>Graduação em Educação da Faculdade de</p><p>Educação da Universidade Federal de</p><p>Pelotas, como requisito parcial à obtenção do</p><p>título de Doutor em Ciências da Educação.</p><p>Orientadora: Prof.ª Dr.ª Beatriz Maria Boéssio Atrib Zanchet</p><p>Pelotas, 2013</p><p>3</p><p>Catalogação na publicação:</p><p>Maria Fernanda Monte Borges</p><p>CRB - 10/1011</p><p>V675d Vighi, Cátia Simone Becker</p><p>Da escola na zona urbana para a escola do/no campo: os pro-</p><p>fessores em foco / Cátia Simone Becker Vighi ; orientadora Beatriz</p><p>Maria Boéssio Atrib Zanchet. - Pelotas, 2013.</p><p>128 f. : il.</p><p>Tese (Doutorado em Educação) – Programa de Pós-Graduação</p><p>em Educação. Faculdade de Educação. Universidade Federal de Pe-</p><p>lotas, Pelotas, 201 3.</p><p>1. Educação do campo 2. Adaptação de professores 3. Ensino no</p><p>campo I. Zanchet, Beatriz Maria Boéssio Atrib, orient. II. Título</p><p>CDD 370</p><p>4</p><p>Banca examinadora:</p><p>___________________________________________________________________</p><p>Prof.ª Dr.ª Beatriz Maria Boéssio Atrib Zanchet (Orientadora) – UFPel/ Pelotas</p><p>___________________________________________________________________</p><p>Prof.ª Dr.ª Mari Margarete dos Santos Forster – UNISINOS/ São Leopoldo</p><p>___________________________________________________________________</p><p>Prof.ª Dr.ª Cristina Pureza Duarte Boéssio – UNIPAMPA/ Jaguarão</p><p>___________________________________________________________________</p><p>Prof.ª Dr.ª Maria das Graças Carvalho da Silva Medeiros Gonçalves Pinto – UFPel/</p><p>Pelotas</p><p>___________________________________________________________________</p><p>Prof.ª Dr.ª Lígia Cardoso Carlos – UFPel/ Pelotas</p><p>5</p><p>Dedicatória</p><p>Dedico esse trabalho a todos aqueles que</p><p>acreditam, assim como eu, que a utopia é base</p><p>para os avanços na educação.</p><p>6</p><p>Agradecimentos</p><p>A Deus - porque muitas vezes enxerguei apenas as suas pegadas na areia.</p><p>Ao Paulo, meu marido, amigo que, com amor, cuidado, proteção e paciência, esteve</p><p>presente em todos os momentos para entender minhas angústias, me motivar,</p><p>inspirar e fazer acreditar que não há nada fácil na vida, mas que há compensações</p><p>e, principalmente, por compartilharmos sonhos e realizações.</p><p>A Fernando e Eduardo, meus filhos, pelo carinho, companhia e apoio, e por</p><p>compreenderem a importância de meus estudos.</p><p>A Nelvin e Maria, meus pais, exemplos de vida, por todo cuidado, amor e carinho.</p><p>A Cláudio, Patrícia e Sílvia, meus irmãos, que, embora distantes, souberam me</p><p>proferir palavras de carinho e estímulo.</p><p>A Dona Edwig, minha sogra, pela amizade e compreensão.</p><p>A Daiane, pela paciência e cuidados que dispensou a minha família.</p><p>A Odila, minha tia, pelas colaborações durante a organização da tese e palavras de</p><p>incentivo.</p><p>A Beti, minha tia, com quem sempre partilho sonhos sobre uma escola de qualidade</p><p>e que, abdicando do seu repouso/descanso, não mediu esforços para me auxiliar</p><p>nos momentos finais de escrita da tese.</p><p>Ao Tiago, meu primo, que serviu os mates, e meu tio Rubi, os almoços.</p><p>7</p><p>A Escola que me acolheu, com carinho, a minha pesquisa: equipe diretiva,</p><p>professores e funcionários pelo apoio e amizade, em especial, às interlocutoras que</p><p>gentilmente se dispuseram a colaborar com suas histórias de vida profissional.</p><p>À Zelaine B. Sant'Ana, diretora da Escola Municipal de Ensino Fundamental Bruno</p><p>Chaves, por ter me acolhido carinhosamente, compreendendo minha condição de</p><p>professora/aluna.</p><p>À Viviane S. da Costa e Luciana G. R. Pereira, coordenadoras pedagógicas da E.</p><p>M. E. F. Bruno Chaves, pelo apoio recebido.</p><p>Aos colegas professores, funcionários e alunos da E. M. E. F. Bruno Chaves por</p><p>entenderem minhas "ausências" e incansavelmente demonstrarem seu carinho e</p><p>incentivo.</p><p>Aos professores supervisores da SMED: Rui Carlos Miritz (in memoriam), Nára B.</p><p>C. Norenberg e Perpétua Lacerda pelo fornecimento de dados.</p><p>À Theresinha Scaglioni, que traz em sua memória uma história de vida dedicada</p><p>ao ensino rural, pelas informações.</p><p>À Neridiana Stivanin e Andrisa Zanella, irmãs de coração, pelo companheirismo e</p><p>compartilhamento de ideias em todos os momentos.</p><p>À Bitisa pela amizade, as correções e o inglês.</p><p>Aos demais colegas do curso de doutorado, em especial ao Jair Araújo e Rita</p><p>Webler, pelos debates e trocas de conhecimento.</p><p>À Leidne, Neridiana, Bitisa, Helenara, Gabriela, Nadiane, Cláudia e demais</p><p>bolsistas que, no grupo de pesquisa, trouxeram importantes contribuições devido a</p><p>suas diferentes formações.</p><p>8</p><p>Às Profªs. Drªs. Vânia Thies e Lisiane Manke, pelas contribuições teóricas para a</p><p>pesquisa.</p><p>Ao Prof. Dr. Marcelo A. Conterato, pela amizade e oportunidades de debates sobre</p><p>os temas rural/urbano.</p><p>À Prof.ª Dr.ª Conceição Paludo, por compartilhar seus conhecimentos na área da</p><p>Educação do/no campo.</p><p>À Banca Examinadora, Prof.ª Dr.ª Mari Margarete dos Santos Forster, Prof.ª Dr.ª</p><p>Cristina Pureza Duarte Boéssio, Prof.ª Dr.ª Maria das Graças Carvalho da Silva</p><p>Medeiros Gonçalves Pinto, Prof.ª Dr.ª Lígia Cardoso Carlos, pelas contribuições.</p><p>Ao PPGE pelo acolhimento.</p><p>À minha orientadora, Prof.ª Dr.ª Beatriz Maria Boéssio Atrib Zanchet, que me</p><p>acolheu desde o final do Curso de Especialização em Educação, aceitando o desafio</p><p>de adentrar no mundo da Educação do/no campo. Agradeço a colaboração,</p><p>paciência e seus conhecimentos compartilhados em mais uma etapa de minha</p><p>formação docente.</p><p>Por fim, a todos ausentes/presentes que colaboraram de uma forma ou outra, por</p><p>estarem torcendo por mim e vibrando com as conquistas, minha gratidão.</p><p>9</p><p>Epígrafe</p><p>Gosto de ser gente porque, inacabado, sei que sou um ser</p><p>condicionado mas, consciente do inacabamento, sei que posso</p><p>ir mais além dele. Esta é a diferença profunda entre o ser</p><p>condicionado e o ser determinado.</p><p>Gosto de ser gente porque, mesmo sabendo que as condições</p><p>materiais, econômicas, sociais e políticas, culturais e</p><p>ideológicas em que nos achamos geram quase sempre</p><p>barreiras de difícil superação para o cumprimento de nossa</p><p>tarefa histórica de mudar o mundo, sei também que os</p><p>obstáculos não se eternizam.</p><p>(Paulo Freire, 1996)</p><p>10</p><p>Resumo</p><p>VIGHI, Cátia Simone Becker. Da escola na zona urbana para a escola do/no</p><p>campo: os professores em foco. 2013. 128 f. Tese (Doutorado em Educação) -</p><p>Programa de Pós-Graduação em Educação. Universidade Federal de Pelotas,</p><p>Pelotas.</p><p>Esta tese apresenta um estudo, realizado no período de 2009/2013, que objetivou</p><p>compreender como acontece o processo de adaptação de professores da zona</p><p>urbana em escolas do/no campo, no município de Pelotas/RS. Nossa hipótese era</p><p>que para esses professores que possuem precário conhecimento da realidade</p><p>latifundista empresarial, do assistencialismo, do</p><p>controle político sobre a terra e as pessoas que nela vivem”. A função social da</p><p>escola rural e seus objetivos de ensino estavam permeados por ideias atreladas ao</p><p>atendimento dos interesses da classe dominante e ao agronegócio.</p><p>Em contraposição ao paradigma da Educação rural, Fernandes e Molina</p><p>(2004) e Souza (2006) explicam que, a partir da década de 80, inicia-se um</p><p>processo de questionamento sobre esse paradigma, provocando o surgimento de</p><p>um novo modelo, o da Educação do campo.</p><p>O termo Educação do campo originou-se a partir da abertura que a própria</p><p>legislação brasileira proporcionou – inicialmente com a aprovação da Constituição</p><p>Federal (CF) em 1988 e, na sequência, com o sancionamento da Lei de Diretrizes e</p><p>Bases da Educação (LDB) 9394/96. Tanto a constituição quanto a lei passaram a</p><p>permitir a interferência efetiva de ações empreendidas por órgãos internacionais –</p><p>FMI, UNESCO – e pela luta de movimentos sociais que defendiam direitos para a</p><p>população rural (FERNANDES; MOLINA, 2004; SOUZA, 2006).</p><p>A lógica que perpassa os princípios da Educação do campo está explícita</p><p>nos estudos de Molina (2004). Para a autora, a educação do campo, foi construída</p><p>por diversos grupos sociais e universidades, visando ao rompimento com o modelo</p><p>rural, cuja identificação era com o produtivismo; o campo, lugar da produção de</p><p>mercadorias e não como espaço de vida e lugar da dialetização da cultura, saber e</p><p>formação de identidades.</p><p>Nesse sentido, reitera Souza (2006, p. 80):</p><p>A educação do campo expressa a ideologia e força dos movimentos</p><p>sociais do campo, na busca por uma educação pública que valorize</p><p>a identidade e a cultura dos povos do campo, numa perspectiva de</p><p>formação humana e de desenvolvimento local sustentável.</p><p>43</p><p>Esse olhar sobre o rural provocou a discussão sobre outro perfil de escola</p><p>do campo – não uma educação para os sujeitos do campo e sim uma educação com</p><p>os sujeitos do campo: uma educação que valorize a diversidade existente num</p><p>contexto peculiar habitado por sujeitos que possuem história, cultura, identidade e</p><p>lutas que devem ser respeitadas e legitimadas, a fim de superar o modelo impresso</p><p>pela Educação rural.</p><p>De outro modo, também como dizem teóricos da área da Geografia30, o</p><p>campo traz outro olhar sobre o rural, cujas questões, como a relação campo/cidade,</p><p>estão muito presentes. A intenção é ultrapassar a visão que, durante muito tempo,</p><p>tem prevalecido na sociedade brasileira, a qual "considera o campo como lugar</p><p>atrasado, do inferior, arcaico" e "que projetou o espaço urbano como caminho</p><p>natural único do desenvolvimento, progresso e sucesso econômico, tanto para</p><p>indivíduos como para a sociedade" (ARROYO; CALDART; MOLINA, 2004, p. 11).</p><p>Nessa esteira, Fernandes (2004) corrobora a superação dessa visão ao</p><p>evidenciar a necessidade de compreender o campo como:</p><p>Lugar de vida, onde as pessoas podem morar, trabalhar, estudar</p><p>com dignidade de quem tem o seu lugar, a sua identidade cultural. O</p><p>campo não é só lugar da produção agropecuária e agroindustrial, do</p><p>latifúndio e da grilagem de terras. O campo é espaço e território dos</p><p>camponeses e dos quilombolas. É no campo que estão as florestas,</p><p>onde vivem as diversas nações indígenas[...]; é o lugar da vida e</p><p>sobretudo de educação (FERNANDES, 2004, p. 137).</p><p>No âmbito das políticas públicas, a ideia de superação está atrelada à</p><p>erradicação do analfabetismo e dos baixos índices de escolaridade; à garantia de</p><p>acesso às crianças, jovens e adultos do campo à escola, assim como ao respeito à</p><p>especificidade da Educação do campo e à diversidade de seus sujeitos</p><p>(PRONERA31, 2011).</p><p>Para aprofundar e compreender a diferença no uso dessas duas</p><p>terminologias – Educação rural e Educação do/no campo – recorremos às análises</p><p>30</p><p>A esse respeito, consultar autores com José Eli da Veiga, Ângela Kageyama, Maria de Nazareth</p><p>Baudel Wanderley, Ricardo Abramoway, dentre outros, que discutem aspectos sobre os binômios</p><p>cidade/ campo e/ou urbano/rural.</p><p>31</p><p>O Programa Nacional de Educação na Reforma Agrária é uma política pública de Educação do</p><p>Campo desenvolvida nas áreas de Reforma Agrária, instituída pelo governo brasileiro pelo Decreto nº</p><p>7352/2010. Disponível em:</p><p>Acesso</p><p>15 nov. 2011.</p><p>http://www.incra.gov.br/portal/images/arquivos/manual_pronera_e_portaria_publicados.pdf</p><p>44</p><p>feitas por autores como Romanelli (1991), Calazans (1993), Arroyo e Fernandes</p><p>(1999), Leite (2002), Arroyo, Caldart e Molina (2004), Fernandes e Molina (2004) e</p><p>Souza (2006), dentre outros, as quais seguiremos explorando neste capítulo.</p><p>Cabe explicar que neste trabalho, estamos nos referindo à escola do campo</p><p>conforme dito no parágrafo II do art. 1º do Decreto nº 7352/2010 (MEC – publicado</p><p>no DOU de 5.11.2010): "aquela situada em área rural, conforme definida pela</p><p>Fundação Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística – IBGE, ou aquela situada</p><p>em área urbana, desde que atenda predominantemente a populações do campo".</p><p>4.1.1 Os discursos e os projetos para a Educação rural no Brasil entre as</p><p>décadas de 1920/1970</p><p>A Educação rural surgiu, no Brasil, por volta de 1920, quando o</p><p>deslocamento rural-urbano aumentou demasiadamente e começou a representar</p><p>uma ameaça para a estabilidade social. Frente à crescente migração, os discursos</p><p>políticos anunciavam a necessidade de criar escolas integradas às condições da</p><p>zona rural com o objetivo de promover a fixação do homem ao campo.</p><p>Ao mesmo tempo, o setor industrial, que se sentia ameaçado pelo “inchaço”</p><p>das cidades e se considerava impossibilitado de absorver a mão de obra que</p><p>aumentava, acabou por aderir à corrente dos ruralistas. Destacamos que a mesma</p><p>campanha que anunciava a necessidade de criar escolas na zona rural unia dois</p><p>grupos com interesses opostos: o agrário e o industrial.</p><p>Todavia, embora o discurso anunciasse a necessidade da criação de</p><p>escolas na zona rural, o autoritarismo da política que marcou a década de 20, aliado</p><p>ao desinteresse das oligarquias rurais em difundir o ensino, foi determinante para</p><p>manter as precárias condições de funcionamento das escolas. As verbas destinadas</p><p>à educação eram insuficientes e havia interesse por parte da elite dominante em</p><p>manter aquela situação, como explica Maia (1982).</p><p>O debate sobre Educação rural ressurgiu nos anos de 1930, devido à</p><p>mudança no quadro político dirigente do país e em decorrência da intensificação das</p><p>migrações, agravadas pela queda dos preços mundiais de produtos agrícolas como,</p><p>por exemplo, o café, aliadas ao processo de aceleração e desenvolvimento</p><p>45</p><p>industrial. Assim, a defesa da Educação rural é retomada como tentativa de</p><p>promover a volta ao campo (MAIA, 1982; ROMANELLI, 1991; LEITE, 2002).</p><p>O movimento ruralista desencadeado no período dos anos 30 era</p><p>comprometido com a manutenção do status quo, fato que contribuiu para que a</p><p>contradição cidade/campo fosse entendida como algo natural, ajudando, assim, sua</p><p>perpetuação.</p><p>Naquele contexto, a "missão do professor rural seria a de demonstrar as</p><p>'excelências' da vida no campo, convencendo o homem a permanecer marginalizado</p><p>dos benefícios da civilização urbana" (MAIA,1982, p. 28). Na escola rural, deveriam</p><p>ser ensinados conhecimentos básicos, pois, se o aluno fosse para a cidade, teria as</p><p>habilidades mínimas necessárias para poder competir no mercado de trabalho com</p><p>as pessoas urbanas.</p><p>As ideias do ruralismo pedagógico, vigentes desde a década de 20, ainda</p><p>permaneciam na década de 40, e o discurso continuava com a pretensão de fixar o</p><p>homem do campo à terra. Na perspectiva dos preconizadores desse ideário, a</p><p>escola rural deveria ser “um aparelho educativo organizado em função da produção”,</p><p>como explica</p><p>Calazans (1993, p. 26). A autora expõe que esse modelo enfatizava</p><p>que o ensino</p><p>[...] ruralizasse o rural, através de uma nova escola que, adaptada</p><p>às exigências do campo, prendesse o camponês à terra, formando-o</p><p>convenientemente no amor à Pátria e em função da produção.</p><p>Inestimável seria o alcance social dessa providência, destinada a</p><p>preservar o espaço urbano da ação deletéria das desordens sociais</p><p>(ibidem, p. 27).</p><p>É importante ressaltar que a Educação rural era lembrada nos discursos</p><p>oficiais apenas quando a cidade e sua economia estavam em crise, sem que</p><p>conseguisse absorver a mão de obra fato que poderia provocar o aumento</p><p>populacional das cidades.</p><p>Em consonância com tais características, os projetos educacionais</p><p>elaborados para as áreas rurais eram sempre específicos e diferentes dos projetos</p><p>de educação do homem brasileiro comum, como explica Arroyo (1982). Diz o autor</p><p>que os conteúdos propostos eram “adaptados à especificidade da cultura rural” (p.</p><p>2). Dava-se ênfase à educação ajustada ao meio, ligada à vida, orientada a resolver</p><p>problemas concretos ou conflitos.</p><p>46</p><p>Em nome do ensino prático, adaptado à vida e aos trabalhos a que estavam</p><p>entregues as populações rurais, a escola não aprofundou a cultura intelectual e nem</p><p>cumpriu o mínimo, ou seja, sua finalidade de alfabetização, conforme elucida Arroyo</p><p>(1982). O discurso dominante para a Educação rural, entre as décadas de 40 e 70,</p><p>enfatizava a ideia de homem do campo como aquele que, sendo da roça, não</p><p>necessitaria de qualificação.</p><p>No âmbito das discussões que demonstravam as precárias condições de</p><p>desenvolvimento do ensino de 1º grau, em 1945 foi criado o Fundo Nacional do</p><p>Ensino Primário, que previa apoio financeiro do governo central para os Estados. No</p><p>entanto, mesmo com a criação desse paliativo, em se tratando de zona rural</p><p>perduraram "determinados fatores concorrentes para a baixa produtividade do</p><p>ensino, expressos pela alta taxa de evasão e repetência, pelo nível de qualificação</p><p>dos professores – quase todos leigos – e pela precariedade das instalações</p><p>escolares", conforme Maia (1982, p. 28).</p><p>Por outro lado, como explica Calazans (1993, p. 27), "os 'ideais' do</p><p>'ruralismo pedagógico' estavam introduzidos nos conteúdos dos programas</p><p>propostos por diferentes agências32 para desenvolver o meio rural brasileiro,.</p><p>Segundo a autora, o estudo da estratégia da presença norte-americana no Brasil,</p><p>principalmente em 1950, assim como toda a política educacional brasileira para o</p><p>campo, tornam-se ininteligíveis, se considerados programas per se. Nessa lógica, os</p><p>pacotes, que chegavam prontos e acabados, eram moldados por outras realidades,</p><p>não sendo questionada a adaptabilidade de seus métodos e conteúdos à realidade</p><p>brasileira.</p><p>Percebe-se que tampouco a tradição brasileira de investigação e debate</p><p>sobre questões rurais era chamada a intervir ou, pelo menos, para atuar nas</p><p>mediações indispensáveis à adaptação de tais programas à realidade local. Rocha,</p><p>Passos e Carvalho (2011) resumem:</p><p>A educação para a população do meio rural, nunca tivera políticas</p><p>específicas, o atendimento à educação se deu através de</p><p>campanhas, projetos e\ou políticas compensatórias, sem levar em</p><p>conta as formas de viver e conviver dos povos do campo, que ao</p><p>32</p><p>Na tentativa de impulsionar a educação rural, alguns projetos foram implantados entre as décadas</p><p>de 40 e 50, subsidiados por meio de acordos entre o governo brasileiro e instituições internacionais,</p><p>principalmente norte-americanas (CALAZANS, 1993).</p><p>47</p><p>longo da história foram excluídos enquanto sujeitos do processo</p><p>educativo (p. 2).</p><p>A educação no meio rural, além de ter sido influenciada pela chamada</p><p>modernização no setor rural, transformou os padrões culturais e, consequentemente,</p><p>o modo de vida das pessoas. Os anos 50 e 60, especialmente, foram marcados pela</p><p>chegada de empresas capitalistas no país com a intenção de explorar também as</p><p>atividades rurais, alterando ainda mais o modo de vida das populações.</p><p>Observa-se que havia uma crença na modernização das relações de</p><p>produção e de trabalho na agropecuária brasileira, que traria a necessidade da</p><p>mudança da vida rural e a consequente valorização da escola.</p><p>Arroyo (1982) explica que, na época, a escola rural encontraria remédio,</p><p>desde que passasse a ser uma agência necessária ao processo de remodelação</p><p>capitalista das relações de produção e trabalho no campo. Aponta, ainda, que</p><p>[...] este tipo de diagnóstico vai mais ao fundo do problema e vê o</p><p>atraso do campo e o tradicionalismo do homem rural como a</p><p>explicação para o abandono da escola e para o malogro de tantos</p><p>projetos que, apesar de bem intencionados, teriam fracassado pela</p><p>resistência do tradicionalismo sócio-econômico e cultural</p><p>predominante na sociedade agrária (ARROYO, 1982, p. 4).</p><p>Pontua Calazans (1993, p. 29) que, "depois de 1960, os Estados Unidos</p><p>passaram a se interessar por desenvolver programas de ajuda financeira e</p><p>assistência técnica na América Latina", entretanto sem preocupação com projetos</p><p>educacionais. A autora explica que, em relação à educação, poder-se-ia dizer que</p><p>ela era planejada, estruturada e realizada a partir das necessidades educacionais de</p><p>cada região.</p><p>As exigências de planejamento e efetivação da Educação rural estavam</p><p>correlacionadas à política desenvolvimentista e transformadora das estruturas do</p><p>setor primário como tentativa de superação das desigualdades sociais e culturais, no</p><p>contexto rural.</p><p>No Brasil, nessa mesma década, havia um fluxo migratório exacerbado do</p><p>campo para a cidade, acarretando o crescimento do número de favelados nas</p><p>periferias dos centros urbanos, provocando preocupação da elite brasileira, que via</p><p>ameaçados seus interesses.</p><p>48</p><p>Diante disso, o Estado tomou, como estratégia de contenção desse fluxo, o</p><p>incentivo à Educação rural (SECAD, 2007), assegurado na Lei de Diretrizes e Bases</p><p>da Educação Nacional de 1961. Em seu art. 105, estabeleceu que “os poderes</p><p>públicos instituirão e ampararão serviços e entidades que mantenham na zona rural</p><p>escolas capazes de favorecer a adaptação do homem ao meio e o estímulo de</p><p>vocações profissionais”, o que serviu como aceno para mudança no ensino escolar.</p><p>A partir de então, em “âmbito nacional, as décadas de 60 e 70 foram de</p><p>proliferação assustadora de programas para o meio rural” (CALAZANS, 1993, p. 32).</p><p>Em sua análise sobre documentos datados nesse período, destaca alguns pontos de</p><p>discussão em torno das concepções que influenciaram tais propostas, enfatizando</p><p>que:</p><p>Educação que se propõe a ser fator de desenvolvimento, e que, de</p><p>forma programada, inclui-se numa planificação global, tem de estar</p><p>atenta às solicitações feitas pelas estruturações especificas já</p><p>implantadas, equipando-se para uma capacitação especifica de</p><p>quadros; e também voltada para a criação de uma mentalidade</p><p>tecnológica condizente com a atualização do homem no que diz</p><p>respeito às relações da economia moderna (CALAZANS, 1993, p.</p><p>35).</p><p>Nessa perspectiva, o desenvolvimento rural tornou-se meio para provocar</p><p>mudanças sociais na realidade do campo. Os pressupostos e as estratégias dos</p><p>programas educacionais, a partir da década de 70, ficaram "comprometidos com os</p><p>planos nacionais, que repetiam nas regiões os mesmos esquemas diretivos e</p><p>centralizadores" (CALAZANS, 1993, p. 37).</p><p>Em alguns documentos33 que faziam parte dos planos setoriais para a</p><p>educação, encontravam-se recomendações à escola rural, como, por exemplo, os</p><p>itens seguintes, citados por MAIA (1982, p. 29):</p><p>A escola não pode negar o mundo rural, onde o trabalho constitui um</p><p>valor, e o trabalho infantil, além de ser uma necessidade, é um valor</p><p>social; [...] o ensino ministrado na zona rural tem que ser apropriado</p><p>a essa realidade; [...] a escola da zona rural deve ser uma agência</p><p>de</p><p>mudança.</p><p>33 Plano Setorial de Educação e Cultura (1975 – 1979); Documento elaborado pelo MEC: “Educação</p><p>para o meio rural – ensino de 1º grau – Políticas e Diretrizes de Ação (1979)”.</p><p>49</p><p>Contudo, como alerta Arroyo (1982), as propostas que defendiam a</p><p>especificidade da escola rural e sua adequação cultural na verdade encobriam, sob</p><p>fórmulas culturalistas atraentes, problemas estruturais reais entre cidade/campo e as</p><p>próprias relações excludentes no campo.</p><p>Segundo Maia (1982), algumas constatações, como a formação urbana dos</p><p>professores e a escassez do material didático, sugeriam o desconhecimento da</p><p>situação, a omissão proposital de dados ou uma tentativa de minimizá-los. Enfatiza,</p><p>ainda, que havia a recomendação de que a escola respeitasse a realidade e se</p><p>transformasse em agência de mudança, embora mantivesse o trabalho do menor de</p><p>15 anos, aproveitando-o como mão de obra infanto-juvenil e força de trabalho não-</p><p>assalariado.</p><p>Os menores que viviam no meio rural participavam das atividades</p><p>juntamente com a família ou, em alguns casos, dependendo de algum regime de</p><p>posse de terra (proprietários, parceiros, arrendatários e colonos), eram presença</p><p>notada em todo o tipo de atividade agrícola (ANTUNIASSI, 1983). Vale lembrar que,</p><p>ainda hoje, “o trabalho é presente na vida diária da criança e do jovem rural, pois</p><p>esses moram e vivem muito próximos dos locais de trabalho dos pais” (NETO, 2009,</p><p>p. 32).</p><p>Com a concepção de educação, dependente das necessidades da</p><p>população do entorno, foram implantados estabelecimentos de ensino que não</p><p>continham definição de planejamento adequado para a realidade social da época,</p><p>visto que eram escolas instaladas sob o modelo urbano. Mesmo assim, a população</p><p>rural sempre as desejou.</p><p>É importante evidenciar o que diz Arroyo (1982) quando se refere ao</p><p>tratamento dado à Educação rural:</p><p>Notamos nestes fatos históricos algumas das características da</p><p>escola rural no conjunto da história da educação brasileira. Em</p><p>primeiro lugar, constatamos que há períodos longos de</p><p>esquecimento e momentos curtos em que o problema do homem do</p><p>campo é retomado. Neste sentido, falamos em abandono</p><p>relembrado, pois a escola rural sempre representou um apêndice no</p><p>limitado espaço dos projetos sociais; uma espécie de terra além das</p><p>fronteiras e dos interesses dos centros de poder (ARROYO, 1982, p.</p><p>1).</p><p>50</p><p>Podemos apontar que, quando o homem do campo é mencionado, entra no</p><p>conjunto das chamadas populações desfavorecidas, marginalizadas ou carentes,</p><p>para as quais são projetadas ações especiais, compensatórias e assistenciais, a fim</p><p>de suprir deficiências na saúde, alimentação, educação e integração social.</p><p>Para Arroyo (1982), é importante que se opte</p><p>[...] entre continuar tratando o homem do campo como um carente</p><p>crônico que precisa ser alimentado, curado, informado, integrado,</p><p>educado, ou passar a tratá-lo como um cidadão-trabalhador</p><p>historicamente excluído dos direitos básicos, que vem tomando</p><p>consciência dessa exclusão e se organiza na reivindicação de seus</p><p>direitos (p. 5).</p><p>Os estudos do autor sobre a Educação rural indicam que uma distinção</p><p>entre necessidades ou carências e direitos sócio-políticos básicos mudaria</p><p>qualitativamente o sentido dos programas para a escola rural.</p><p>4.1.2 Os discursos e os projetos para a Educação do/no campo: 1980 até os</p><p>dias atuais</p><p>Um novo momento na conjuntura brasileira se avizinha no final da década de</p><p>70 e início dos anos 80 caracterizado pelo processo de redemocratização do país,</p><p>de expansão, fortalecimento e consolidação da cidadania com a abertura de diálogo</p><p>entre Estado e sociedade.</p><p>Esse processo de mudança reflete a possibilidade de participação da</p><p>sociedade civil organizada por meio dos movimentos sociais, por exemplo, em</p><p>deliberações sobre a construção de políticas públicas (FERNANDES, 2004; GOHN,</p><p>2009), bem como de participação do Estado por meio da elaboração de leis e</p><p>resoluções constitutivas da base legal dispositiva sobre a educação do campo.</p><p>Como consequência dessa nova ordem, foi possível apontar, dentre outras,</p><p>que a ampliação do direito à educação escolar provocou a explosão do crescimento</p><p>da rede pública de ensino.</p><p>Gohn (2009, p. 7) ressalta que “as reformas e propostas educacionais</p><p>brasileiras não são novidades históricas no Brasil do século XX”, porque são</p><p>datadas e fazem relação com “períodos de crise na economia, de redefinição do</p><p>51</p><p>modelo de acumulação vigente e de constituição de novos atores sociais como</p><p>sujeitos da cena política nacional”.</p><p>Vale lembrar que essas políticas sempre aconteceram sob influência de</p><p>órgãos internacionais34, refletindo as concepções de base do modelo neoliberal</p><p>(ROMANELLI, 1991; LEITE, 2002; OLIVEIRA, 2000). Esses reflexos acabaram</p><p>orientando as propostas de reformas para a educação, tidas como mola propulsora</p><p>do desenvolvimento humano e econômico dos países, vislumbrando a redução da</p><p>pobreza a longo prazo.</p><p>Se a educação do ponto de vista econômico era imprescindível para</p><p>o desenvolvimento do país, do ponto de vista social era reclamada</p><p>como possibilidade de acesso das classes populares a melhores</p><p>condições de vida e trabalho. Essa dupla abordagem talvez tenha</p><p>forjado a construção de uma nova orientação para a reforma</p><p>educativa dos anos noventa (OLIVEIRA, 2001, p. 73).</p><p>O artigo 3º da Conferência Mundial sobre Educação para Todos, que</p><p>propunha universalizar o acesso à educação e promover a equidade, em seu item 4</p><p>diz que:</p><p>Um compromisso efetivo para superar as disparidades educacionais</p><p>deve ser assumido. Os grupos excluídos – os pobres; os meninos e</p><p>meninas de rua ou trabalhadores; as populações das periferias</p><p>urbanas e zonas rurais; os nômades e os trabalhadores migrantes;</p><p>os povos indígenas; as minorias étnicas, raciais e lingüísticas; os</p><p>refugiados; os deslocados pela guerra; e os povos submetidos a um</p><p>regime de ocupação – não devem sofrer qualquer tipo de</p><p>discriminação no acesso às oportunidades educacionais (UNESCO,</p><p>1990, p. 4).</p><p>Os investimentos internacionais aliados às mudanças na legislação</p><p>brasileira (CF/1988 e LDB 9394/96) deram suporte aos avanços das propostas</p><p>governamentais relativos à educação e completaram o cenário de desenvolvimento</p><p>nacional, como sugerem Souza (2006) e Gohn (2009).</p><p>Para essas autoras, a partir dos anos 90 as discussões acerca da educação</p><p>brasileira proliferaram impulsionadas pela abertura dada pela CF, que consolidava</p><p>34</p><p>A Conferência Mundial sobre Educação para Todos (UNESCO, UNICEF, PNUD e BM) pode ser</p><p>considerada o grande marco na formulação de políticas governamentais para a educação da última</p><p>década do século XX. Da conferência resultaram posições consensuais que deveriam construir as</p><p>bases dos planos decenais de educação (OLIVEIRA, 2000).</p><p>52</p><p>algumas conquistas, à medida que proclamava a educação como direito de todos e</p><p>dever do Estado e da família, transformando-a em direito público subjetivo. Ao</p><p>propor, no artigo 210, que os “conteúdos mínimos para o ensino fundamental devem</p><p>assegurar formação básica comum e respeito aos valores culturais e artísticos,</p><p>nacionais e regionais”, incluía os cidadãos que residem em áreas rurais, com a</p><p>consequente necessidade de adequação da oferta do ensino a esta realidade.</p><p>Apesar da CF “não se referir direta e especificamente ao ensino rural no</p><p>corpo do texto”, essa condição “possibilitou às Constituições Estaduais35 e à LDB o</p><p>tratamento da Educação rural no âmbito do direito à igualdade e do direito às</p><p>diferenças”, como salienta Soares (2001), nas Diretrizes Operacionais para a</p><p>Educação Básica nas Escolas do Campo.</p><p>A LDB configurou-se como um marco histórico ao instituir o direito à</p><p>igualdade do acesso à educação e o respeito às diferenças,</p><p>quando fixou, no artigo</p><p>1º, um conceito amplo de educação:</p><p>A educação deve abranger os processos formativos que se</p><p>desenvolvem nas instituições de ensino e pesquisa, na vida familiar,</p><p>na convivência humana, no trabalho, nos movimentos sociais e</p><p>organizações da sociedade civil e nas manifestações culturais (LDB</p><p>9394/96, art. 1º).</p><p>Evidenciando no inciso 2º do art. 1º que “a educação escolar deverá</p><p>vincular-se ao mundo do trabalho e à prática social”, essa lei estabelece que o</p><p>ensino escolar deve ser contextualizado ao local onde a escola está inserida,</p><p>abrindo caminhos para a organização de proposta educativa que respeitasse a</p><p>realidade do campo, motivando um processo de desvinculação entre os modelos de</p><p>escola urbana e rural (LEITE, 2002; SOUZA, 2006).</p><p>Essa condição é reforçada pela LDB no artigo 23, inciso 2º, ao dispor sobre</p><p>a adequação do calendário escolar, que “deverá adequar-se às peculiaridades</p><p>locais, inclusive climáticas e econômicas, a critério do respectivo sistema de ensino,</p><p>sem com isso reduzir o número de horas letivas previsto nesta lei”. E, explicitamente,</p><p>35</p><p>De acordo com registro de Soares (2001, p. 11), o Estado do Rio Grande do Sul "é a única unidade</p><p>da federação que inscreve a educação do campo no contexto de um projeto estruturador para o</p><p>conjunto do país.</p><p>53</p><p>no artigo 28, ao indicar a obrigatoriedade de adequar o ensino às peculiaridades da</p><p>vida rural e de cada região, conforme recomendado em seus incisos:</p><p>I – conteúdos curriculares e metodologias apropriadas às reais</p><p>necessidades e interesses dos alunos da zona rural;</p><p>II – organização escolar própria, incluindo adequação do calendário</p><p>escolar às fases do ciclo agrícola e às condições climáticas;</p><p>III – adequação à natureza do trabalho na zona rural (LDB 9394/96</p><p>art 28).</p><p>Assim, considerando-se a sazonalidade do plantio/colheita e outras</p><p>dimensões socioculturais do campo, a educação não se limita ao modelo</p><p>urbano/industrial como vinha sendo até o momento (LEITE, 2002). Com esses</p><p>acenos, tanto da CF como da LDB, abriram-se espaços para a proliferação das</p><p>discussões sobre esse tema, incentivando grupos organizados da sociedade civil a</p><p>pensarem em uma educação ajustada aos interesses do campo.</p><p>Até a década de 80, as políticas educacionais eram estabelecidas de forma</p><p>vertical pelo Estado; posteriormente, a nova tendência considerou as propostas</p><p>advindas dos movimentos de base, contrapondo o modelo anterior da Educação</p><p>rural (FERNANDES, 2004).</p><p>Os movimentos sociais e sindicais36 do campo, juntamente com o</p><p>envolvimento de diferentes entidades e órgãos públicos, utilizando-se de forma mais</p><p>articulada de luta, desencadearam "um processo de mobilização e envolvimento</p><p>social, na busca de fortalecer a construção de políticas públicas que garantam o</p><p>acesso e permanência à Educação de qualidade para os povos do campo”</p><p>(SANTOS; SOBRINHO, 2011, p. 3).</p><p>Igualmente, defendiam a garantia da “universalização do ensino, bem como</p><p>a construção de propostas pedagógicas que respeitassem a realidade, as formas de</p><p>produzir, de lidar com a terra, de viver e conviver dos povos do campo” (ROCHA;</p><p>PASSOS; CARVALHO, 2011, p. 2).</p><p>Conforme resgatam Fernandes e Molina (2004), o surgimento da proposta</p><p>Por uma Educação do Campo nasceu efetivamente em julho de 1997, no I Encontro</p><p>36</p><p>Entende-se por movimentos sociais e sindicais as organizações de trabalhadores rurais,</p><p>representativas dos beneficiários, em âmbito local, estadual e nacional, de acordo com o INCRA</p><p>(MDA/INCRA, 2011, p. 36).</p><p>54</p><p>Nacional de Educadoras e Educadores da Reforma Agrária (ENERA)37. Conforme</p><p>informa Souza (2006), nesse evento ocorreram as primeiras discussões sobre a</p><p>formação do Programa Nacional de Educação na Reforma Agrária (PRONERA).</p><p>A disseminação das discussões desse encontro deu origem a outro que</p><p>aconteceu em julho de 1998 – I Conferência Nacional Por uma Educação Básica do</p><p>Campo. As propostas e deliberações desses dois eventos constituíram as bases do</p><p>Programa Nacional de Educação na Reforma Agrária (PRONERA), “atualmente em</p><p>desenvolvimento no Brasil, através de parcerias entre o governo federal,</p><p>universidades e movimentos sociais” (SOUZA, 2006, p. 34).</p><p>De certa maneira, significa dizer que “a Educação do Campo nasceu das</p><p>demandas dos movimentos camponeses na construção de uma política educacional</p><p>para os assentamentos de reforma agrária” (FERNANDES, 2006, p. 26), e teve</p><p>raízes na trajetória da Educação Popular38 proposta por Paulo Freire, cujos</p><p>pressupostos filosóficos e ideológicos podem ser resumidos em duas ideias básicas:</p><p>a contextualização dos conteúdos e a sua relevância na vivência dos sujeitos,</p><p>valorizando os aspectos sociais e culturais dos povos.</p><p>Reconhecendo os resultados dos movimentos em prol da Educação do</p><p>campo, o Ministério da Educação instituiu, pela Portaria n° 1374 de 03 de junho de</p><p>2003, um Grupo Permanente de Trabalho. Dentre as funções está a atribuição de</p><p>articular as ações39 do Ministério pertinentes à educação, divulgando, debatendo e</p><p>esclarecendo as Diretrizes Operacionais para a Educação Básica nas Escolas do</p><p>Campo, bem como apoiar a realização de seminários nacionais e estaduais para a</p><p>implementação das ações inerentes a essa demanda (RAMOS; MOREIRA;</p><p>SANTOS, 2004).</p><p>As alterações ocorridas nas propostas voltadas para a educação oferecida</p><p>nas escolas da zona rural se definiram pelas políticas públicas desenvolvidas pela</p><p>Secretaria de Educação Continuada, Alfabetização e Diversidade (SECAD) que se</p><p>37</p><p>Encontro promovido pelo MST, em parceria com a UnB, UNICEF, UNESCO e CNBB.</p><p>38</p><p>O movimento de Educação Popular ganhou inúmeros seguidores e rapidamente se espalhou pelo</p><p>país, não só como forma de resistência e/ou contestação ao processo escolar subalternos, mas,</p><p>também, como nova metodologia de alfabetização de adultos. [...] Objetivamente, é uma pedagogia</p><p>que contraria os princípios básicos de uma escola voltada para a submissão e subserviência das</p><p>classes trabalhadoras (ZEN, 2006, p. 65).</p><p>39</p><p>Sobre as ações do MEC para a consolidação da política nacional de Educação do Campo</p><p>consultar, por exemplo, os itens "4. ESTRATÉGIAS PARA O FORTALECIMENTO DA POLÍTICA</p><p>NACIONAL DE EDUCAÇÃO DO CAMPO" e "5. PROGRAMAS, PROJETOS E AÇÕES" no Caderno</p><p>do SECAD 2/2007 (Educação do Campo: diferenças mudando paradigmas), disponível em:</p><p>Acesso em 19 Nov. 2013.</p><p>http://portal.mec.gov.br/secad/arquivos/pdf/educacaocampo.pdf</p><p>55</p><p>estabeleceram a partir da Resolução CNE/CEB nº 1, de 3 de abril de 2002,</p><p>complementadas pela Resolução CNE/CEB nº 2, de 28 de abril de 2008.</p><p>Legalmente, essas duas resoluções refletem outro marco significativo para a</p><p>educação do campo. Elas se constituem, resumidamente, em "um conjunto de</p><p>preocupações conceituais e estruturais presentes historicamente nas reivindicações</p><p>dos movimentos sociais", segundo a SECAD/ MEC (2007, p. 17). Dentre elas</p><p>destaca-se:</p><p>O reconhecimento e valorização da diversidade dos povos do campo,</p><p>a formação diferenciada de professores, a possibilidade de diferentes</p><p>formas de organização da escola, a adequação dos conteúdos às</p><p>peculiaridades locais, o uso de práticas pedagógicas</p><p>contextualizadas, a gestão democrática, a consideração dos tempos</p><p>pedagógicos diferenciados, a promoção, através da escola, do</p><p>desenvolvimento sustentável e do acesso aos bens econômicos,</p><p>sociais e culturais (SECAD/ MEC, 2007, p. 17).</p><p>Tais documentos, ao tratarem das Diretrizes Operacionais para a Educação</p><p>Básica nas Escolas do Campo, referem-se à construção de uma política específica e</p><p>à necessidade de atender à diversidade das populações que residem no meio rural,</p><p>de acordo com suas realidades,</p><p>conforme seu artigo 1º:</p><p>Art. 1º A Educação do Campo compreende a Educação Básica em</p><p>suas etapas de Educação Infantil, Ensino Fundamental, Ensino</p><p>Médio e Educação Profissional Técnica de nível médio integrada com</p><p>o Ensino Médio e destina-se ao atendimento às populações rurais</p><p>em suas mais variadas formas de produção da vida – agricultores</p><p>familiares, extrativistas, pescadores artesanais, ribeirinhos,</p><p>assentados e acampados da Reforma Agrária, quilombolas, caiçaras,</p><p>indígenas e outros (CNE, 2008, p. 1).</p><p>Com essa lógica, o termo campo traz uma concepção que incorpora os</p><p>espaços da floresta, pecuária, minas e agricultura, mas os ultrapassa ao acolher em</p><p>si os espaços pesqueiros, caiçaras, ribeirinhos e extrativistas. É “um campo de</p><p>possibilidades que dinamizam a ligação dos seres humanos com a própria produção</p><p>das condições da existência social e com as realizações de sociedade humana”</p><p>(SOARES, 2001, p. 1).</p><p>Um dos objetivos dessa política é, sob a ótica da democracia, reconhecer a</p><p>escola como local privilegiado para a aquisição do conhecimento, competências e</p><p>habilidades fundamentais para o exercício da cidadania e como espaço de</p><p>56</p><p>participação da comunidade nas ações por ela empreendidas, reconhecendo a</p><p>população do campo como portadores de direitos à igualdade e respeito à diferença.</p><p>Como resume Souza (2006), a intenção é afirmar a identidade sociocultural,</p><p>valorizar as matrizes culturais significativas para os sujeitos e destacar as trajetórias</p><p>sociais como fonte de aprendizagem.</p><p>Aliada a essas concepções, a Educação do campo preconiza uma escola</p><p>vinculada aos princípios dispostos no Decreto nº 7.352, de 4 de novembro de 2010,</p><p>que dispõe sobre a política de Educação do campo e o Programa Nacional de</p><p>Educação na Reforma Agrária – PRONERA, em seu artigo 2º:</p><p>Art. 2º São princípios da educação do campo:</p><p>I - respeito à diversidade do campo em seus aspectos sociais,</p><p>culturais, ambientais, políticos, econômicos, de gênero, geracional e</p><p>de raça e etnia;</p><p>II - incentivo à formulação de projetos político-pedagógicos</p><p>específicos para as escolas do campo, estimulando o</p><p>desenvolvimento das unidades escolares como espaços públicos de</p><p>investigação e articulação de experiências e estudos direcionados</p><p>para o desenvolvimento social, economicamente justo e</p><p>ambientalmente sustentável, em articulação com o mundo do</p><p>trabalho;</p><p>III - desenvolvimento de políticas de formação de profissionais da</p><p>educação para o atendimento da especificidade das escolas do</p><p>campo, considerando-se as condições concretas da produção e</p><p>reprodução social da vida no campo;</p><p>IV - valorização da identidade da escola do campo por meio de</p><p>projetos pedagógicos com conteúdos curriculares e metodologias</p><p>adequadas às reais necessidades dos alunos do campo, bem como</p><p>flexibilidade na organização escolar, incluindo adequação do</p><p>calendário escolar às fases do ciclo agrícola e às condições</p><p>climáticas;</p><p>V - controle social da qualidade da educação escolar, mediante a</p><p>efetiva participação da comunidade e dos movimentos sociais do</p><p>campo (MEC/MDA, 2010, p. 1).</p><p>De acordo com o SECAD/MEC (2007) a implementação da agenda referente</p><p>tanto à oferta da Educação do Campo como à consolidação dos princípios firmados</p><p>pelas Diretrizes Operacionais para Educação Básica nas Escolas do Campo</p><p>viabilizará mudanças significativas "na formação de qualidade, no acesso e na</p><p>permanência, bem como na expansão do sistema no ambiente do campo" (p.25).</p><p>57</p><p>Portanto, estamos diante de um novo paradigma para a educação no</p><p>contexto rural brasileiro, que propõe mudanças no modo de pensar, principalmente,</p><p>quanto a função social da escola. Diante desse panorama, concordamos com</p><p>Arroyo, Caldart e Molina (2004) sobre a defesa da educação e da escola do campo:</p><p>Quanto mais se afirma a especificidade do campo mais se afirma a</p><p>especificidade da educação e da escola do campo. Mais se torna</p><p>urgente um pensamento educacional e uma cultura escolar e</p><p>docente que se alimentem dessa dinâmica formadora. Também mais</p><p>se afirma a necessidade de equacionar a função social da educação</p><p>e da escola em um projeto de inserção do campo no conjunto da</p><p>sociedade (ARROYO; CALDART; MOLINA, 2004, p. 13).</p><p>4.2 Uma instituição chamada escola</p><p>Atualmente, a educação é considerada elemento chave para o</p><p>funcionamento da sociedade, sendo responsável pela produção e reprodução de</p><p>valores sociais “para um desenvolvimento duradouro”, como preconiza a Declaração</p><p>Mundial sobre Educação para Todos (UNESCO, 1990). Ratificada pelo Relatório de</p><p>Monitoramento Global (UNESCO, 2011), a educação ajuda a combater a pobreza e</p><p>capacita as pessoas com o conhecimento, habilidades e confiança dos quais</p><p>carecem para construir um futuro melhor, visando à qualidade de vida. A proposta</p><p>tem um caráter mundial, com prazo até 2015 para atingir suas metas.</p><p>Nessa esteira, Libâneo (1994), ao abordar a importância de prática</p><p>educativa na sociedade, afirma que a educação</p><p>[...] é um fenômeno social e universal, sendo uma atividade humana</p><p>necessária à existência e funcionamento de todas as sociedades. [...]</p><p>Não há sociedade sem prática educativa, nem prática educativa sem</p><p>sociedade. A prática educativa não é apenas uma exigência da vida</p><p>em sociedade, mas também o processo de promover aos indivíduos</p><p>os conhecimentos e experiências culturais que os tornam aptos a</p><p>atuar no meio social e a transformá-lo em função de necessidade</p><p>econômica, social e políticas da coletividade (p. 16-17).</p><p>Considerando-se que uma das finalidades da educação é promover a</p><p>relação entre os conhecimentos científicos e as experiências culturais das pessoas,</p><p>neste estudo vamos nos restringir ao sentido de educação escolarizada, priorizando</p><p>o ensino oferecido nas escolas.</p><p>58</p><p>Como destaca Silva (2011, p. 9), “a escola básica, pública e gratuita</p><p>continua sendo o espaço privilegiado para a aquisição de competências e</p><p>habilidades fundamentais ao exercício da cidadania”. Para essa autora, “o direito de</p><p>cidadania não pode estar desvinculado das questões educativas, como acesso aos</p><p>bens culturais adequados à construção da dignidade humana” (idem).</p><p>Segundo os Parâmetros Curriculares Nacionais (PCNs)40, a escola</p><p>caracteriza-se por ser um dos espaços que priorizam a formação e a informação dos</p><p>sujeitos, com o intuito de desenvolver um processo de ensino e de aprendizagem,</p><p>cujos conteúdos devem “estar em consonância com as questões sociais que</p><p>marcam cada momento histórico”, relacionados ao cotidiano dos alunos. Dessa</p><p>forma, além de possibilitar aos alunos a apropriação dos conteúdos de maneira</p><p>crítica e construtiva, ela precisa valorizar a cultura peculiar do seu contexto,</p><p>favorecendo o exercício de cidadania (MEC/SEF, 1997, p. 45-46).</p><p>4.2.1 A escola: sua origem e representações</p><p>A instituição escola tem origem, na Europa, com os filósofos gregos antigos.</p><p>Concebida como qualquer estabelecimento ou instituição de educação, foi</p><p>responsável por desenvolver os processos de ensinar e de aprender. Apresentava</p><p>como objetivo primordial manter e perpetuar o conhecimento, repassando-o às</p><p>gerações futuras, embora a possibilidade de acesso a ele fosse restrita à pequena</p><p>parte da população.</p><p>A expansão da escola ocorreu entre os séculos XIV e XV, por influência da</p><p>igreja, que detinha o poder sobre a sociedade. Porém, é como fruto das Revoluções</p><p>Liberais do século XVIII (Industrial e Francesa) que, ao consolidar as ideias do</p><p>Iluminismo, nasce a escola moderna.</p><p>Com as exigências da revolução industrial, a sociedade passou a necessitar</p><p>de mão de obra qualificada para o mercado de trabalho. Como refere Pérez Gómez</p><p>(2001), esse modelo de escola tem servido como inspiração até os dias atuais.</p><p>40</p><p>Os Parâmetros Curriculares Nacionais constituem um referencial de qualidade para a educação no</p><p>Ensino Fundamental em todo o País. Sua função é orientar e garantir a coerência dos investimentos</p><p>no sistema educacional, socializando discussões, pesquisas e recomendações, subsidiando a</p><p>participação de técnicos e professores brasileiros, principalmente daqueles que se encontram mais</p><p>isolados, com menor contato com a produção pedagógica atual (MEC/SEF, 1997, p. 13).</p><p>59</p><p>Em se tratando do ensino, esse autor aponta dois elementos que</p><p>caracterizam o modelo da escola moderna: a “delimitação dos conteúdos e valores</p><p>do currículo que refletem a história da ciência e da cultura da própria comunidade” e</p><p>a interpretação “como resultados acabados”, desenvolvidos sob a lógica da</p><p>transmissão de conhecimento repetitiva e mecânica (PÉREZ GÓMEZ, 2001, p. 35).</p><p>Essas ideias contribuíram para que a escola fosse se constituindo como</p><p>espaço fundamentalmente de reprodução e acúmulo de conhecimentos. Sob essa</p><p>lógica, foi-se perpetuando ao longo dos séculos como “um antídoto à ignorância”,</p><p>difundindo a instrução e transmitindo os conhecimentos acumulados pela</p><p>humanidade (SAVIANI, 1997, p. 18).</p><p>É papel da escola proporcionar, através de práticas pedagógicas e</p><p>curriculares, as relações entre o aluno e o conhecimento, a troca entre os saberes</p><p>do senso comum e os saberes escolarizados. Assim,</p><p>[...] o sistema educativo em seu conjunto, e a cultura acadêmica em</p><p>particular, podem ser entendidos como uma instância de mediação</p><p>cultural entre os significados, sentimentos e condutas da comunidade</p><p>social e os significados, sentimentos e comportamentos emergentes</p><p>das novas gerações (PÉREZ GÓMEZ, 2001, p. 261).</p><p>Para esse autor, a escola possui três funções: função socializadora,</p><p>instrutiva e educativa. A primeira função está relacionada aos intercâmbios entres os</p><p>sujeitos envolvidos nos processos de ensinar e de aprender:</p><p>A escola, como instituição social em que se encontram grupos de</p><p>indivíduos que vivem em meios sociais mais amplos, exerce</p><p>poderosos influxos de socialização. [...] Portanto, as contradições</p><p>que encontramos nas demandas divergentes daquela cultura social</p><p>caracterizam também os intercâmbios humanos dentro da escola</p><p>(idem).</p><p>A segunda, a instrutiva, refere-se às ações relacionadas aos processos de</p><p>ensinar e de aprender em seus aspectos políticos e pedagógicos. Essa função</p><p>preocupa-se com o aperfeiçoamento e a formação do capital humano que poderá</p><p>interferir na adaptação do sujeito ao mercado de trabalho:</p><p>A função instrutiva da escola se desenvolve mediante atividade de</p><p>ensino-aprendizagem, sistemática e intencional encaminhada para</p><p>aperfeiçoar o processo de socialização espontânea, compensar suas</p><p>60</p><p>lacunas e deficiências e preparar o capital humano da comunidade</p><p>social. Esta finalidade explícita de enculturação e aperfeiçoamento</p><p>dos processos de socialização se desenvolve através das atividades</p><p>instrutivas, dos processos de ensino-aprendizagem e dos modos de</p><p>organização da convivência e das relações interindividuais (ibidem,</p><p>p. 262).</p><p>A terceira e última função, considerada educativa, está relacionada a uma</p><p>organização social, que representa</p><p>[...] uma comunidade de vida, de participação democrática de busca</p><p>intelectual, de diálogo, de aprendizagem compartilhada, de discussão</p><p>aberta sobre a qualidade e o sentido antropológico dos influxos</p><p>inevitáveis do processo de socialização (ibidem, p. 264).</p><p>Diante disso, entende-se a importância que a escola assume em uma</p><p>comunidade ou grupo socialmente organizados. Nessa esteira, a escola é</p><p>[...] um centro educativo, flexível e aberto em que colaboram os</p><p>membros mais ativos da comunidade para recriar a cultura, na qual</p><p>se aprende porque se vive, porque viver democraticamente significa</p><p>participar, construir de modo cooperativo alternativas para os</p><p>problemas sociais e individuais, fomentar a iniciativa, integrar as</p><p>diferentes propostas e tolerar a discrepância (idem).</p><p>Alguns autores, entre eles Pérez Gómez (2001, p. 265), alertam que</p><p>“conseguir esses objetivos implica a necessidade de colocar o ensino e a escola no</p><p>grande espaço das práticas culturais e sociais que interagem dialeticamente com as</p><p>instituições educativas”, ou seja, há que se refletir profundamente sobre a função</p><p>social da escola (Para quê e para quem?).</p><p>Como prevê, ainda, esse autor, “não podemos esquecer que os grupos</p><p>sociais mais desfavorecidos provavelmente só na escola podem encontrar espaço</p><p>para viver a riqueza da cultura intelectual e dela desfrutar” (p. 263). Considerando-se</p><p>que a população rural, ao longo da história41, encontrou-se à margem da sociedade,</p><p>no grupo dos desfavorecidos socialmente, a escola, nesse contexto, pode servir</p><p>como suporte para o desenvolvimento social, econômico e cultural. Essa expectativa</p><p>é corroborada por Pimentel:</p><p>41</p><p>A esse respeito podem ser consultados estudos de Queiroz (1963), Ianni (1976), Leite (2002),</p><p>Souza (2006).</p><p>61</p><p>para muitas das famílias rurais, a passagem pela escola básica rural</p><p>(ensino fundamental) é a única oportunidade em suas vidas de</p><p>adquirir as competências que lhes permitiriam eliminar as principais</p><p>causas internas do subdesenvolvimento rural (2008, p. 47).</p><p>O fato é que a escola do/no campo precisa se pensar e ser pensada. Como</p><p>resume Fernandes (1999),</p><p>uma escola do campo é a que defende os interesses, a política, a</p><p>cultura e a economia da agricultura camponesa, que construa</p><p>conhecimentos e tecnologias na direção do desenvolvimento social e</p><p>econômico dessa população. A sua localização é secundária, o que</p><p>importa são suas proximidades política e espacial com a realidade</p><p>camponesa (p. 65).</p><p>4.2.2 A escola no contexto rural/do campo</p><p>A instituição escola instalada no contexto rural foi se modificando com o</p><p>propósito de acompanhar as tendências históricas. Alguns autores, como Maia</p><p>(1982), Calazans (1993), Leite (2002) e Arroyo (2004), relacionam essas mudanças</p><p>às demandas sociais de cada época.</p><p>A escola na zona rural brasileira apareceu tardiamente e não era</p><p>institucionalizada pelo Estado. Registros históricos em dados oficiais e relatados por</p><p>teóricos mostram que, inicialmente, ela surgiu no final do Segundo Império,</p><p>entretanto, apenas na primeira metade do século XX foi amplamente implantada</p><p>(RAMOS; MOREIRA; SANTOS, 2004).</p><p>Na zona rural, a escola representava uma saída estratégica para o</p><p>desenvolvimento. Os pais creditavam a ela a oportunidade de ascensão dos seus</p><p>filhos, indiferentemente, se permanecessem ou não na zona rural. O contato com as</p><p>inegáveis transformações resultantes das manifestações explícitas do processo de</p><p>"urbanização do meio rural e da absorção de novos elementos sócio-culturais em</p><p>sua prática produtiva e em seu modo de vida" (LEITE, 2002, p. 82), lhes dava a</p><p>dimensão da importância do papel da escola, ou seja,</p><p>concebendo a escola como condição para a vida política, como</p><p>espaço público para a troca de opiniões e de experiências, o rurícola</p><p>utiliza-se dessa enstituição de modo a adquirir meios de</p><p>aparelhamento de seus pares, para o enfrentamento das classes na</p><p>defesa de seus direito e prerrogativas (ibidem, p. 87).</p><p>62</p><p>Em se tratando das crianças, Arroyo (1982, p. 5) relata que a luta da</p><p>população rural pela escola e para a instrução dos seus filhos, se estabelece no</p><p>campo da defesa "de um direito, ou de um mínimo de igualdade de oprtunidades,</p><p>sendo uma forma de se defender de uma ignorância que percebe estar vinculada à</p><p>situação de exclusão política e econômica". Esse fato reflete o entendimento do</p><p>homem do campo que confia à educação e à escola a possibilidade de enfrentar</p><p>com sucesso os desafios e limitações na vida. Leite (2002, p. 87) confirma esse</p><p>posicionamento ao dizer que "a escola, no mínimo, sempre dá melhores condições</p><p>para seus assistidos".</p><p>No entanto, de acordo com Saviani</p><p>(2004), os grupos escolares, como eram</p><p>chamadas, permaneceram por muito tempo isolados, com classes multisseriadas,</p><p>geralmente com único professor, com orientação política, administrativa e</p><p>pedagógica permeada pelo modelo da escola urbana.</p><p>Embora considerando-se as características que moldaram o quadro que</p><p>representava o modelo da Educação rural, tínhamos uma escola repetidora de</p><p>conhecimentos fragmentados, desconectados da realidade e que compactuava com</p><p>os anseios capitalistas, provocando esfacelamento da escola formal-tradicional</p><p>(LEITE, 2002).</p><p>Outro motivo que contribuiu para o fracasso da escola na zona rural</p><p>decorreu da inexistência de políticas públicas que estivessem em consonância com</p><p>suas peculiaridades, como registram documentos do próprio Estado: "As políticas</p><p>públicas de educação, quando chegaram ao campo, apresentaram-se com conceitos</p><p>urbanocêntricos: a escola rural nada mais foi do que a extensão no campo da escola</p><p>urbana, quanto aos currículos, aos professores, à supervisão" (BRASIL, 2007, p. 2).</p><p>Sobre essa situação, Leite (2002) explica que nem mesmo a legislação</p><p>contemplou as especificidades da educação brasileira no meio rural. Inclusive a</p><p>atual LDB 9394/96, embora preconize flexibilidade curricular e metodológica</p><p>considerando peculiaridades do campo, tem sido implementada lentamente. A</p><p>adequação do calendário escolar às fases do ciclo agrícola, por exemplo, não</p><p>consegue ser efetivada devido à força com que se impôs uma cultura de</p><p>organização do ano letivo e das férias escolares segundo a escola urbana</p><p>(BRANDÃO, 1996).</p><p>63</p><p>Esse exemplo revela a falta de sintonia entre a organização curricular das</p><p>escolas rurais e o meio sociocultural, reforçando a imposição de um modelo</p><p>educativo mais conveniente à cidade do que propriamente às zonas rurais. Como</p><p>caracterizou Brandão (1996), a escola, com raras exceções, “é uma espécie de</p><p>escola urbana mal equipada, com professores leigos e mal pagos, completamente</p><p>desprovida de uma estratégia voltada para o campo [...] é uma escola que não leva</p><p>em conta a realidade na qual está inserida".</p><p>A baixa qualidade do ensino no rural, para o autor, está na descontinuidade</p><p>das políticas públicas voltadas para essa área, pois suas análises registram que</p><p>cada governo federal, estadual ou municipal que assume o poder modifica as</p><p>iniciativas das gestões anteriores.</p><p>No centro das discussões, a escola, que desde a sua criação defendeu a</p><p>difusão do conhecimento, como forma de superação da ignorância, para a formação</p><p>e ascensão dos cidadãos no intuito de diminuir as desigualdades sociais, foi o fiel</p><p>reflexo dos valores e das contradições da cultura moderna.</p><p>Isso significa dizer que os conhecimentos difundidos nela têm sido</p><p>transmitidos aos alunos na verticalidade, priorizando-se no ensino, de modo geral,</p><p>processos, estratégias, formas de ensinar, sem colocar em discussão como o aluno</p><p>aprende e nem a condição de tomá-lo como portador de conhecimentos empíricos.</p><p>Nas escolas do/no campo, esse modelo reflete no grave estado de</p><p>abandono de um projeto educacional que, além de desenvolver um ensino</p><p>transmissivo, desconsidera a realidade das relações sociais, culturais e econômicas,</p><p>que permeiam as comunidades nas quais estão inseridas, em diversos locais do</p><p>país.</p><p>Situações como as apresentadas deixaram como herança, no campo</p><p>educacional,</p><p>um quadro de precariedade no funcionamento da escola do campo:</p><p>em relação aos elementos humanos disponíveis para o trabalho</p><p>pedagógico, a infra-estrutura e os espaços físicos inadequados, as</p><p>escolas mal distribuídas geograficamente, a falta de condições de</p><p>trabalho, salários defasados, ausência de uma formação inicial e</p><p>continuada adequada ao exercício docente no campo e uma</p><p>organização curricular descontextualizada da vida dos povos do</p><p>campo (RAMOS; MOREIRA; SANTOS, 2004, p. 7).</p><p>64</p><p>As autoras justificam que esse quadro decorre da inexistência histórica de</p><p>“formulação de diretrizes políticas e pedagógicas específicas que regulamentassem</p><p>como a escola deveria funcionar e se organizar” e nem sequer priorizou “dotação</p><p>financeira que possibilitasse a institucionalização e manutenção de uma escola em</p><p>todos os níveis com qualidade” (idem).</p><p>Baptista (2003) diz: “[...] fica óbvio que os problemas da escola e</p><p>especialmente da escola rural não são apenas aqueles de móveis, carteiras,</p><p>instalações, ou falta de dinâmicas de grupos” (p. 19). Além do que observaram</p><p>Brandão (1996), Ramos, Moreira e Santos (2004) e Arroyo (2007), a autora também</p><p>constata que o corpo docente é, muitas vezes, alheio àquela cultura porque em</p><p>grande parte advém da zona urbana.</p><p>Outro fator limitante para a população rural reside no acesso à cultura</p><p>intelectual pela dificuldade de contato com os meios e materiais de leitura e de</p><p>pesquisa impressos e/ou informatizados. As bancas de revistas, circulação de</p><p>jornais, bibliotecas públicas, cybers, lan houses, por exemplo, disponibilizados</p><p>mundialmente na sociedade, privilegiam a população urbana e não a rural.</p><p>Embora o acesso à internet tenha avançado, principalmente a partir do ano</p><p>de 2009, quando o governo Lula lançou programa42 que pretendia oferecer esse</p><p>serviço em até cinco anos para a população rural, não alcança, ainda, parte dos</p><p>domicílios. Em alguns lugares, a escola supre essa insuficiência, reforçando o</p><p>compromisso que ela assume perante a comunidade cumprindo, na totalidade, seu</p><p>papel social.</p><p>Ainda sobre as condições em que se encontra a educação brasileira no</p><p>contexto rural, de acordo com os referenciais propostos para uma política nacional</p><p>de Educação do campo, outras observações foram apresentadas em estudo</p><p>realizado pela SECAD/MEC, baseado nos dados divulgados pelo Instituto Nacional</p><p>de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira (INEP) no ano de 2007, que</p><p>servem para ilustrar, conforme o quadro a seguir:</p><p>42</p><p>No governo Lula, o Ministério das Comunicações publicou uma portaria no DOU (24/07/2009) que</p><p>institui o Programa Nacional de Telecomunicações Rurais. Com ele o governo pretende oferecer</p><p>serviço de telefonia e internet banda larga na zona rural.</p><p>65</p><p>Quadro 04: Dados característicos da educação no contexto rural brasileiro</p><p>Quanto ao perfil</p><p>socioeconômico da</p><p>população rural, os</p><p>indicadores mostram que é</p><p>grande a desigualdade</p><p>existente entre a zona rural</p><p>e urbana:</p><p> 30,8 milhões de cidadãos brasileiros viviam</p><p>no campo em franca desvantagem social.</p><p> Apenas 6,6% da população rural</p><p>economicamente ativa apresentava rendimento</p><p>real médio acima de três salários mínimos. Na</p><p>zona urbana, nessa mesma faixa de renda,</p><p>concentrava-se 24,2% da população.</p><p>O desamparo e</p><p>vulnerabilidade da</p><p>população do campo se</p><p>refletem nos altos índices</p><p>de analfabetismo e no baixo</p><p>desempenho escolar:</p><p> 25,8% da população rural adulta (de 15 anos</p><p>ou mais) é analfabeta, enquanto na zona urbana</p><p>essa taxa é de 8,7%.</p><p> A taxa de freqüência de crianças entre 7 e 14</p><p>anos nas escolas do ensino fundamental das</p><p>áreas urbanas foi de 97,5% e de 95,5% para as</p><p>crianças da zona rural.</p><p> Há cerca de 41,4% dos alunos das séries</p><p>iniciais do ensino fundamental com idade superior</p><p>à adequada, na zona rural.</p><p> Esses alunos chegam às séries finais do</p><p>ensino fundamental com uma defasagem de 56%.</p><p>Nas zonas urbanas, essas taxas são de 19,2%</p><p>para as séries iniciais e de 34,8% para séries</p><p>finais.</p><p>No que diz respeito ao</p><p>Ensino Médio, entre os</p><p>jovens de 15 a 17 anos,</p><p>quando considerada a taxa</p><p>de frequência líquida, o</p><p>quadro é muito crítico na</p><p>área rural:</p><p> Pouco mais de um quinto dos jovens nessa</p><p>faixa etária (22,1%) estão frequentando esse nível</p><p>de ensino, contra 49,4% na zona urbana.</p><p>Segundo o tipo de</p><p>organização, temos:</p><p> Os professores da área rural enfrentam as</p><p>consequências da sobrecarga de trabalho, da alta</p><p>rotatividade</p><p>e das dificuldades de acesso e</p><p>locomoção. Além disso, receberem salários</p><p>inferiores aos da zona urbana e estão entre os que</p><p>têm menor nível de escolaridade.</p><p>Fonte: Elaborado pela autora com base nos dados da SECAD/MEC, 2007, p. 18</p><p>O comparativo evidente entre o rural e o urbano aponta para discrepâncias</p><p>latentes. Um dos itens que chama maior atenção refere-se ao segundo item – O</p><p>desamparo e vulnerabilidade da população do campo se refletem nos altos índices</p><p>66</p><p>de analfabetismo e no baixo desempenho escolar. Os dados aparentemente</p><p>apresentam algo contraditório, pois como pode persistir um quadro de</p><p>analfabetismo, evasão escolar e alto índice de repetência se a taxa de freqüência de</p><p>crianças entre 7 e 14 anos nas escolas do ensino fundamental das áreas rurais foi</p><p>de 95,5%?</p><p>Os dados do quadro demonstram que em termos de universalização do</p><p>ensino, as escolas rurais e urbanas estão bastante próximas, ou seja, o acesso está</p><p>garantido pelo estado que defende: "A escola rural requer um tratamento</p><p>diferenciado, pois a oferta de ensino fundamental precisa chegar a todos os recantos</p><p>do País" (SECAD/MEC, 2007, p. 39). Todavia, é notório que há problemas quanto a</p><p>permanência tendo em vista o alto índice de distorção idade-série43 e o baixo índice</p><p>de conclusão do Ensino Fundamental.</p><p>Analisando as informações podemos perceber que estamos diante da</p><p>vulnerabilidade da população do campo. Portanto, mesmo reforçado pelas Diretrizes</p><p>Operacionais para a Educação Básica das Escolas do Campo, o principal desafio</p><p>colocado na I Conferência Nacional por uma Educação do Campo, ainda é o de “[...]</p><p>pensar e fazer uma educação vinculada a estratégias de desenvolvimento [...]</p><p>voltada aos interesses da vida no campo” (1998, p. 23-24), no sentido de oferecer</p><p>ensino que colabore com a formação das crianças, jovens e adultos para o</p><p>desenvolvimento sustentável, estabelecendo, a partir das diretrizes lançadas pelo</p><p>MEC, a política de revalorização do campo. À escola do/no campo “caberá cumprir</p><p>com seus objetivos no sentido de que seja atuante na comunidade, de forma a</p><p>reverter o quadro das ausências e insuficiências imposto pela tradição de políticas</p><p>com ênfase no paradigma urbano” (VIGHI, 2008, p. 78).</p><p>4.3 Os professores: quem são eles e como se fazem</p><p>Autores como Nóvoa (1995, 1997) e Marcelo Garcia (1999), entre outros,</p><p>discutem aspectos referentes ao professor, seu papel e sua condição profissional.</p><p>Para eles é preciso ter um olhar especial voltado ao professor, independente do seu</p><p>43</p><p>Também denominada "Defasagem Idade-Série", é a condição em que se encontra o aluno que está</p><p>cursando uma série com idade superior a que seria recomendada ou prevista. Dentre as causas</p><p>estão três fatores principais: a repetência; a entrada tardia na escola; abandono e retorno do aluno</p><p>evadido (SARAIVA, 2013).</p><p>67</p><p>papel indispensável nos processos de ensinar e de aprender. Deve-se considerar</p><p>que ele desenvolve a docência em um sistema educativo permeado por elementos</p><p>que influenciam a dinâmica escolar e interferem no seu processo de formação</p><p>profissional.</p><p>Interessante é a ressalva feita por Nóvoa (1995) sobre as pesquisas que</p><p>focam o professor. Segundo ele, estudos sobre a formação docente com ênfase na</p><p>pessoa do professor são recentes, e essa inovação teria seu início principalmente</p><p>com a obra de Ada Abraham44.</p><p>Essa obra, segundo as considerações de Nóvoa, seria o marco inicial em</p><p>que “a literatura pedagógica foi invadida por obras e estudos sobre a vida dos</p><p>professores, carreiras e percursos profissionais, biografias e autobiografias docentes</p><p>ou o desenvolvimento pessoal dos professores” (NÓVOA, 1995, p. 15).</p><p>Contudo, no Brasil, a obra intitulada O professor, escrita por Backheuser</p><p>(1946), também pode servir como referência para estudo. Dentre os vieses de</p><p>discussão, ele conceitua o professor e aborda questões sobre a formação, a</p><p>representação social, valores que interpenetram a docência, bem como aponta</p><p>vantagens e recompensas da profissão. Naquela época, defendia a necessidade do</p><p>espírito investigativo na postura do professor, pois, para ele, o professor não era um</p><p>"ser passivo e repetidor de compêndios" (BACKHEUSER, 1946, p. 38).</p><p>Nóvoa (1997) destaca que o papel do professor vem se alterando nas</p><p>últimas décadas, acompanhando as mudanças nas concepções que balizam os</p><p>processos de ensino e de aprendizagem, bem como os processos de formação</p><p>docente.</p><p>Para o autor, nos anos 60 esses profissionais foram frequentemente</p><p>ignorados pelos estudos educacionais, ao contrário da tendência manifestada nos</p><p>anos 70, quando foram alvo de críticas por acreditar-se que contribuíam para a</p><p>perpetuação das desigualdades sociais.</p><p>No limiar da década de 80, as pesquisas educacionais direcionaram-se à</p><p>figura do professor com o objetivo de resgatar sua importância profissional. Essa</p><p>perspectiva culminou, na década de 90, com a discussão dos processos de</p><p>formação como autoformação, concepção fortemente baseada no movimento</p><p>sugerido por por Schön e Zeichner quando refletiram sobre “conhecimento na acção,</p><p>44</p><p>"O professor é uma pessoa", publicada em 1984.</p><p>68</p><p>reflexão na acção e reflexão sobre a acção e sobre a reflexão na acção” (NÓVOA,</p><p>1997, p. 26).</p><p>Ouvir os professores, de maneira geral, pode ser estratégia de estudo com o</p><p>mote para colocá-los no centro dos debates educacionais e possibilidade de</p><p>investigação permeada por diálogos e dados, além de apontar para nova direção em</p><p>relação ao conceito em pesquisas.</p><p>Como defende Goodson: “o ingrediente principal que vem faltando é a voz</p><p>do professor [...] a preocupação com ‘o cantor, e não com a canção’ precisa ser,</p><p>rigorosamente, avaliada nos estudos curriculares e escolares” quando se trata,</p><p>particularmente, do desenvolvimento profissional docente (1995, p. 69). Muitos</p><p>estudos privilegiam a prática docente e o desenvolvimento profissional sem que haja</p><p>preocupação com “a pessoa a quem se destina o desenvolvimento” (idem).</p><p>Dar-lhes a voz para expressar suas concepções, ideias, teorias e crenças</p><p>sobre a docência e seus vieses é, no mínimo, considerar que este sujeito, parte</p><p>integrante do processo educativo, tem algo a dizer.</p><p>Marcelo Garcia (1999) também enfatiza a valorização da voz dos</p><p>professores, ao explicar que não são técnicos que executam instruções e propostas</p><p>elaboradas por especialistas. Ele defende a importância de o docente assumir-se</p><p>como protagonista na construção de alternativas para suas ações, como alguém que</p><p>processa informação, toma decisões, gera conhecimento prático, possui crenças e</p><p>rotinas que influenciam sua atividade profissional. É preciso “considerar-se o</p><p>professor como ‘um sujeito epistemológico’, capaz de gerar e contrastar teorias</p><p>sobre a sua prática” (MARCELO GARCIA, 1999 p. 47).</p><p>Por vezes, o professor é culpabilizado pelos precários resultados dos</p><p>processos de escolarização como se ele fosse o único responsável pela natureza e</p><p>qualidade do processo educativo (THERRIEN; DAMASCENO, 1993; PÉREZ</p><p>GÓMEZ, 1997).</p><p>Embora se presuma que o docente tenha autonomia em sala de aula, é</p><p>preciso compreender que suas ações também dependem do que estabelecem a</p><p>legislação, o projeto pedagógico da escola, a configuração de currículos escolares e</p><p>os materiais que poderão dispor.</p><p>Mas, quem é o professor? Numa visão clássica, resumida por Backheuser</p><p>(1946, p. 11), o vocábulo professor refere-se “àquele que professa”, “àquele que</p><p>69</p><p>declara seus conhecimentos diante de outrem” ou, ainda, “o mestre público de</p><p>alguma ciência ou arte liberal, expondo suas doutrinas como próprias e quase</p><p>sempre ostentando seu saber, oralmente, isto é, como orador”.</p><p>Por sua vez, Pérez Gómez (2001, p. 182) esclarece que essa forma clássica</p><p>de conceber a função</p><p>docente “respondeu às exigências de uma organização</p><p>econômica e social típica da época moderna, dominada pelas economias industriais</p><p>de escala, pela divisão do trabalho e pela especialização de tarefas, próprias do</p><p>modelo fordista45”.</p><p>Esse pensamento definiu a visão de professor como “trabalhadores</p><p>burocráticos no desenvolvimento de um serviço de relevância para o funcionamento</p><p>econômico, político e social da comunidade” (idem). Porém, ao longo do século XX,</p><p>esse modelo foi sofrendo alterações e, com isso, o sentido atribuído ao conceito de</p><p>professor e de profissão docente tem variado ao longo do tempo (BACKHEUSER,</p><p>1946; PÉREZ GÓMEZ, 2001). Contudo, a função principal do professor, desde a sua</p><p>origem, esteve relacionada ao ato de ensinar e se mantém até hoje.</p><p>Atualmente, Pérez Gómez (2001, p. 303) distingue três funções básicas da</p><p>atividade docente, para efetivar a função educativa da escola:</p><p>1ª) porteiro do paraíso do saber: em outras palavras, é função do professor</p><p>possibilitar ao aluno o contato com os conhecimentos legitimados. Sua ação</p><p>pedagógica deve permitir o fluxo plural da diversidade de representações</p><p>ideológicas, culturais e científicas com a máxima honestidade, liberdade e tolerância.</p><p>2ª) facilitador da aprendizagem: o professor deve provocar a reconstrução</p><p>da cultura intuitiva e experiencial de cada estudante, fazendo a relação com as</p><p>contribuições que o conhecimento mais depurado da cultura intelectual oferece. O</p><p>professor é um facilitador nos processos de reflexão e compreensão; a reconstrução</p><p>é tarefa de cada estudante.</p><p>3ª) animador cultural: o professor precisa “criar um clima de vivência e</p><p>recriação cultural na escola". Isso significa dizer que precisa ter domínio do</p><p>conhecimento para poder empolgar os estudantes se quiser “provocar nas gerações</p><p>o amor pelo saber e respeito pela diversidade”, pois, em geral, os professores são</p><p>formadores de opinião.</p><p>45</p><p>Modelo Fordista refere-se ao modelo de produção em massa (sic).</p><p>70</p><p>As relações que se estabelecem na sala de aula entre professores e alunos</p><p>são determinantes para os processos de ensino e de aprendizagem porque o aluno</p><p>aprende tanto quanto participa, interage e intercambia com os demais (PÉREZ</p><p>GÓMEZ, 2001). De acordo com esse autor, talvez essa terceira função seja a maior</p><p>tarefa na profissão docente, tendo em vista o processo de deterioração que a</p><p>profissão sofreu ao longo dos anos.</p><p>Portanto, sendo o professor responsável por fazer o elo entre o</p><p>conhecimento legitimado e o conhecimento experiencial do aluno, numa proposta de</p><p>educação cujo foco principal é o ensino significativo para promover a aprendizagem</p><p>relevante46, cabe a ele identificar as necessidades dos alunos.</p><p>Vale ressaltar que Freire antecipava esse pensamento ao defender o</p><p>partilhamento dos saberes entre educador e educandos para o desenvolvimento de</p><p>um processo formativo significativo. Para ele, ambos aprendem juntos, numa relação</p><p>dialógica e, através dessa partilha, os sujeitos se encontram no verdadeiro momento</p><p>de aprendizagem, diluindo-se as hierarquias, na lógica de “quem ensina aprende ao</p><p>ensinar e quem aprende ensina ao aprender” (FREIRE, 1996, p. 23).</p><p>Como resume Pérez Gómez (2001), é função do professor situar</p><p>mentalmente e com clareza a lógica das diferentes disciplinas, porém, “não tem por</p><p>que definir uma única sequência linear nem de ensino nem de aprendizagem”; deve,</p><p>sim, saber provocar nos alunos a sua participação “ativa e esperançosa nos campos</p><p>do saber, porque vivem um cenário cultural que os impulsiona e estimula” (p. 261).</p><p>Isto requer atender à intervenção conjunta dos elementos que compõem o espaço</p><p>ecológico escolar. E é na sala de aula, como espaço ecológico de vivência cultural,</p><p>que as múltiplas relações acontecem (idem).</p><p>A fim de compreender como o professor se move frente a essas</p><p>considerações sobre os elementos que envolvem a docência, por ser um sujeito com</p><p>tantas responsabilidades no papel que desempenha, é que nosso olhar está focado</p><p>no professor oriundo de uma cultura urbana, para que possamos compreender o</p><p>modo como ele gerencia sua possível inserção em escolas do/no campo.</p><p>46</p><p>Aprendizagem relevante é aquele tipo de aprendizagem significativa que, por sua importância e</p><p>utilidade para o sujeito, provoca a reconstrução de seus esquemas habituais de conhecimento</p><p>(PÉREZ GÓMEZ, 2001, p. 267).</p><p>71</p><p>4.3.1 (In) suficiências da formação dos professores da zona rural</p><p>O resgate sobre a Educação rural, no Brasil, a partir das produções teóricas</p><p>de Arroyo, Caldart e Molina (2004) e Damasceno e Beserra (2006), dentre outros,</p><p>indicam que o tema professor rural foi pouco explorado.</p><p>Os registros assinalam que, historicamente, o professor rural sempre ocupou</p><p>os espaços menos privilegiados na cadeia da valorização profissional. A falta de</p><p>qualificação profissional47, salários inferiores, condições de trabalho, a sobrecarga</p><p>com elevadas jornadas, alta rotatividade e dificuldades de acesso à escola são</p><p>algumas questões que contribuem para essa pouca valorização (RAMOS;</p><p>MOREIRA; SANTOS, 2004; INEP, 2007).</p><p>Somando-se a esses, poderíamos considerar: a falta de cursos específicos</p><p>de aperfeiçoamento para a docência do/no campo, de horário de estudo, pesquisa e</p><p>planejamento, plano de carreira e incentivo à qualificação continuada desses</p><p>profissionais, bem como a sobrecarga de trabalho com as demais atribuições que o</p><p>professor unidocente desempenha: cargo administrativo, funções de limpeza e</p><p>conservação das instalações (VIGHI, 2008).</p><p>Sobrepondo-se a essas condições, é importante olhar o docente como</p><p>sujeito decisivo no processo de progressão e aprendizado dos alunos, em especial</p><p>no meio rural, porque ele representa um dos poucos profissionais que ali circulam e</p><p>pode contribuir com a qualificação da comunidade na qual transita.</p><p>Presume-se que um obstáculo para a prática pedagógica possa residir na</p><p>qualificação desses profissionais para desenvolverem a docência no meio rural.</p><p>Conforme destaca Arroyo (2007, p. 2), o histórico brasileiro mostra a inexistência de</p><p>“uma tradição nem na formulação de políticas públicas, nem no pensamento e na</p><p>prática de formação de profissionais da educação que focalize a Educação do</p><p>campo e a formação de educadores do campo como preocupação legítima” porque</p><p>a educação brasileira teve como base o paradigma urbano.</p><p>Arroyo (2007, p. 158) pondera que os programas de formação são</p><p>estruturados “dentro do modelo de escolarização formal e urbana”, com o principal</p><p>47</p><p>De acordo com os dados levantados no Censo Escolar 2002, na rede de ensino da educação</p><p>básica da área rural, "no ensino fundamental de 1ª a 4ª série, apenas 9% apresenta formação</p><p>superior, enquanto na zona urbana esse contingente representa 38% dos docentes" (RAMOS;</p><p>MOREIRA; SANTOS, 2004, p. 25).</p><p>72</p><p>objetivo de “garantir a reprodução das relações sociais de produção”, valorizando os</p><p>modelos que vêm de fora, em especial aqueles da zona urbana, como se fossem os</p><p>únicos possíveis para serem aderidos.</p><p>Com a expansão do ensino brasileiro, na década de 60, a ampliação do</p><p>número de vagas e a criação de novas escolas fizeram proliferar a contratação de</p><p>docentes; isso assentou-se em políticas governamentais ineficazes, como explicam</p><p>Hashizume e Lopes:</p><p>A expansão das escolas demandava a contratação de novos</p><p>profissionais. As escolas de formação, porém, não acompanharam</p><p>essa demanda, trazendo resultados insatisfatórios para a educação,</p><p>aumentando assim o número de professores leigos. Assim, na</p><p>Segunda República, o magistério começou a ser desvalorizado</p><p>devido ao crescimento quantitativo de escolas, sem que houvesse</p><p>garantia de condições de trabalho (recursos suficientes e</p><p>planejamento</p><p>adequado) (2006, p. 102).</p><p>Essa condição é referendada por Manke (2006), em seu estudo sobre o</p><p>sistema educacional do Rio Grande do Sul. De acordo com essa autora, o Estado</p><p>gaúcho absorvia a totalidade dos professores formados a cada ano e não sobrava</p><p>contingente para as demais redes de ensino (municipal e privada).</p><p>A falta de professores com formação era problema enfrentado na década de</p><p>50, visto que para atender à demanda quanto ao preenchimento das vagas nas</p><p>escolas municipais e dispor de um quadro de pessoal composto por docentes com</p><p>formação pedagógica, alguns municípios se organizavam por intermédio de</p><p>regulamentos próprios, conforme apontou Moreira (1955):</p><p>Alguns municípios, como o de Pelotas e o de Livramento, elaboraram</p><p>regulamentos próprios para seus sistemas educacionais. Em linhas</p><p>gerais, esses regulamentos não se afastam das normas traçadas</p><p>pelo Estado. São, porém, específicos no que diz respeito ao</p><p>recrutamento e admissão de professores, pois, pagando geralmente</p><p>muito menos que o Estado, têm dificuldades de obter normalistas,</p><p>razão pela qual sujeitam os candidatos a exames ou concursos de</p><p>suficiência (p. 80).</p><p>A estratégia utilizada pelo município de Pelotas, quanto à exigência da</p><p>escolaridade mínima dos candidatos ao magistério público, pode ser exemplificada</p><p>pela determinação do artigo 18º da Lei nº 1469/65: “Serão admitidos à inscrição no</p><p>concurso de ingresso no Magistério Público Primário, os professores diplomados</p><p>73</p><p>pelos Institutos de Educação, pelas Escolas Normais, Colégios, Escolas Normais</p><p>Regionais e Ginásios” (PELOTAS, 1965, p. 3).</p><p>Conforme o que a legislação estadual estabelecia, permitindo a admissão de</p><p>pessoas com o Curso Ginasial, "a formação pedagógica não era um pré-requisito</p><p>básico para o ingresso no magistério primário [...] A classificação no concurso era</p><p>obtida através do número de pontos somados pelo candidato, a partir dos títulos</p><p>apresentados", como explica Manke (2006, p. 49).</p><p>Em raros momentos, os planos48 governamentais consideraram as</p><p>diversidades culturais e sociais rurais nos cursos de formação docente. Essa</p><p>constatação encontra guarida em Leite (2002).</p><p>Na década de 70, quando a educação estava atrelada ao movimento</p><p>desenvolvimentista e dada maior ênfase às políticas de educação para o meio rural,</p><p>o Estado criou iniciativas e ampliou seu sistema de ensino (AMARAL, 1991; LEITE,</p><p>2002). O ensino primário de quatro anos passou a ser 1º grau com oito anos. Assim,</p><p>a demanda por professores para esse nível de ensino aumentou, inclusive exigindo</p><p>formação pedagógica, conforme estabelecia a Lei nº 5692/71:</p><p>Art. 30. Exigir-se-á como formação mínima para o exercício do</p><p>magistério:</p><p>a) no ensino de 1º grau, da 1ª à 4ª séries, habilitação específica de</p><p>2º grau;</p><p>b) no ensino de 1º grau, da 1ª à 8ª séries, habilitação específica de</p><p>grau superior, ao nível de graduação, representada por licenciatura</p><p>de 1º grau, obtida em curso de curta duração;</p><p>§ 1º Os professores a que se refere a letra "a" poderão lecionar na 5ª</p><p>e 6ª séries do ensino de 1º grau se a sua habilitação houver sido</p><p>obtida em quatro séries ou, quando em três, mediante estudos</p><p>adicionais correspondentes a um ano letivo que incluirão, quando for</p><p>o caso, formação pedagógica.</p><p>§ 2º Os professores a que se refere a letra "b" poderão alcançar, no</p><p>exercício do magistério, a 2ª série do ensino de 2º grau mediante</p><p>estudos adicionais correspondentes no mínimo a um ano letivo.</p><p>§ 3º Os estudos adicionais referidos aos parágrafos anteriores</p><p>poderão ser objeto de aproveitamento em cursos ulteriores.</p><p>48</p><p>Os planos referidos são: I PND (Plano Nacional de Desenvolvimento) para a educação (1970),</p><p>PSECD (Plano Setorial de Educação, Cultura e Desporto - 1975/79 e 1980/85), Pronasec (Programa</p><p>Nacional de Ações Sócio-Educativas e Culturais), EDURURAL e o MOBRAL. Esses três últimos,</p><p>específicos para beneficiar a população rural.</p><p>74</p><p>Art. 31 As licenciaturas de 1º grau e os estudos adicionais referidos</p><p>no § 2º do artigo anterior serão ministrados nas universidades e</p><p>demais instituições que mantenham cursos de duração plena.</p><p>Parágrafo único. As licenciaturas de 1º grau e os estudos adicionais,</p><p>de preferência nas comunidades menores, poderão também ser</p><p>ministradas em faculdades, centros, escolas, institutos e outros tipos</p><p>de estabelecimentos criados ou adaptados para esse fim, com</p><p>autorização e reconhecimento na forma da Lei (BRASIL, 1971, p. 1).</p><p>A legislação continuava não prevendo formação que contemplasse</p><p>aspectos referentes à Educação rural. Entretanto, num movimento de adequação às</p><p>novas propostas definidas pela LDB 5692/71, quanto à ampliação do Ensino</p><p>Fundamental até a 8ª série, tornou-se necessária a presença de professores</p><p>licenciados nas diversas áreas do conhecimento.</p><p>Por esse motivo, as escolas rurais, à medida que era implantado o Ensino</p><p>Fundamental completo, passaram a receber um contingente de professores oriundos</p><p>dos centros urbanos, tendo em vista que, em geral, as localidades não contavam</p><p>com a presença de profissionais habilitados que pudessem atuar em tais escolas.</p><p>A necessidade era atender à demanda de ensino que obedecia uma grade</p><p>curricular estruturada com base em diversas disciplinas, principalmente para atender</p><p>as quatro séries finais do 1º grau. O trabalho pedagógico devia ser mediado por</p><p>professores, responsáveis pelas disciplinas específicas, enquanto que as quatro</p><p>primeiras séries continuariam a ser atendidas por um único professor, com ou sem</p><p>qualificação em nível superior, mas com formação no magistério (MEC/INEP, 2002).</p><p>Com isso, alargava-se a lacuna entre os professores licenciados, em sua maioria,</p><p>oriundos dos centros urbanos, porém, desconhecedores da realidade rural,</p><p>professores rurais e alunos dessas respectivas escolas.</p><p>Até hoje, professores oriundos da zona urbana encontram dificuldades para</p><p>identificarem-se com o contexto rural, conforme salientou uma das supervisoras das</p><p>escolas do campo da rede pública municipal de Pelotas. Segundo sua fala,</p><p>existe uma resistência por parte de educadores/as que não se</p><p>identificam com o campo. Existem dificuldades, os professores não</p><p>se adaptam. Os professores que vão para o interior se deparam com</p><p>a realidade diferente daquela que eles trabalhavam e isso é</p><p>problema! [...] estamos numa caminhada. A secretaria (SMED) está</p><p>75</p><p>buscando iniciativas para desenvolver a educação do campo</p><p>(informação verbal)49.</p><p>Isso exemplifica, em parte, o que diz Arroyo (2007): “um dos determinantes</p><p>da precariedade da educação do campo é a ausência de um corpo de profissionais</p><p>que vivam junto às comunidades rurais, que sejam oriundos dessas comunidades”,</p><p>porque carregam consigo uma gama de conhecimento da realidade social, cultural,</p><p>político e econômico que certamente servirá como base para o desenvolvimento de</p><p>uma prática pedagógica coerente e responsável.</p><p>O professor oriundo da zona rural tem o domínio do contexto onde está</p><p>inserido, o que facilita o processo de transposição da cultura local para a sala de</p><p>aula e, para o docente urbano, isso pode ser fator limitante. Nesse sentido, o</p><p>desenrolar da docência exige que se assimilem saberes práticos específicos dos</p><p>lugares de trabalho, com suas rotinas, valores, regras, se conheça a realidade da</p><p>comunidade escolar, bem como as demandas específicas da escola.</p><p>De certa maneira, essa condição se apresenta desafiadora para os</p><p>professores, acostumados às marcas culturais do dia a dia dos centros urbanos e</p><p>que não fazem parte do cotidiano rural.</p><p>A I Conferência Nacional por uma Educação Básica do Campo (07/1998) foi</p><p>o marco inicial em defesa da formação específica para educadores do meio rural, a</p><p>partir dos movimentos de lutas sociais. Atualmente, há iniciativas anunciadas pelo</p><p>governo quanto à abertura de vagas em cursos</p><p>rural</p><p>porque não vivem, não pertencem a ela, não estão inseridos nela, esse processo se</p><p>torna mais complexo levando-os apenas a um processo de adaptação à rotina</p><p>escolar rural. Metodologicamente, investimos em pesquisa qualitativa que se baseou</p><p>em entrevistas, observações de aula e respectivas análises. O trabalho contou com</p><p>a participação de sete professoras de uma escola do/no campo. Para o</p><p>embasamento teórico, recorremos a autores que propiciaram o devido suporte.</p><p>Dentre eles, destacamos: Leite (2002), Caldart (2002), Fernandes (1999, 2004),</p><p>Souza (2006), Pérez Gómez (2001), Arroyo (1982, 2004, 2007), Nóvoa (1995, 1997)</p><p>e Freire (1996). Voltar o olhar para esse profissional e seu processo de adaptaçao a</p><p>esse contexto é um exercício que ajuda na construção de novos conhecimentos</p><p>acerca da docência; é uma oportunidade de expor os saberes que esses sujeitos</p><p>urbanos mobilizam ao desempenhar suas atividades docentes e fomentar</p><p>discussões sobre a Educação do Campo e formação de professores. Também se</p><p>constitui em uma possibilidade de valorização do contexto rural tão pouco explorado</p><p>no meio acadêmico e que carece de pesquisas visando à qualificação da educação.</p><p>Notamos que pouca ou nenhuma ênfase é dada à necessidade de</p><p>acompanhamento ao professor recém-chegado para possibilitar/facilitar a adaptação</p><p>desse profissional. Concluímos que a adaptação do professor urbano acontece de</p><p>forma gradual e exige que esse esteja atento à importância de entender a rotina do</p><p>homem rural que determina os hábitos e costumes dos educandos para melhor</p><p>desempenhar a docência. Alterações na estrutura organizacional das escolas e nos</p><p>programas de formação docente são fundamentais para mudanças nesse quadro.</p><p>Palavras-chave: Educação do campo; Adaptação de professores; Ensino no campo</p><p>11</p><p>Abstract</p><p>VIGHI, Cátia Simone Becker. From urban schools to countryside schools:</p><p>teachers in focus. 2013. 128 f. Thesis (Doctorate in Education) – Post-Graduate</p><p>Program in Education. Federal University of Pelotas, Pelotas.</p><p>This work consists of a study carried out between 2009 and 2013, which sought to</p><p>understand how the process of adaptation of teachers from the urban area to rural</p><p>schools occurs in the municipality of Pelotas/RS. The hypothesis was that for those</p><p>teachers, who hardly know the reality of the countryside because they do not live</p><p>there, do not belong there, are not inserted in it, the process would be more complex,</p><p>consisting basically of an adaptation to the routines of a rural school. The</p><p>methodological procedures have been those of qualitative research, based on</p><p>interviews, class observation and their respective analysis . The research has had</p><p>the participation of seven teachers at one countryside school. The theoretical</p><p>framework has been supplied, among others, by Leite (2002), Caldart (2002),</p><p>Fernandes (1999, 2004), Souza (2006), Pérez Gómez (2001), Arroyo (1982, 2004,</p><p>2007), Nóvoa (1995, 1997) and Freire (1996). Turning our eyes to those</p><p>professionals and their process of adaptation to this new context is an exercise that</p><p>helps building a new knowledge about teaching; it is an opportunity of revealing the</p><p>knowledge mobilized by these urban subjects in carrying out their teaching activities;</p><p>it is, as well, an opportunity for stimulating a discussion about Rural Education and</p><p>Teacher Education. It also constitutes a possibility of empowering the rural context,</p><p>which is poorly addressed in academic studies and lacks research for the quality of</p><p>education. We have observed that little if any emphasis is given to the need of</p><p>accompanying the newly-arrived teachers in order to make either possible or easier</p><p>their adaptation. We have concluded that the adaptation of those teachers occurs</p><p>gradually, requiring their attention, so as to better carry out their teaching, to the</p><p>importance of understanding the routines of the countrymen, which will have an</p><p>effect over the habits and routines of the students. In order to achieve changes in this</p><p>picture, changes in the organizational structure of schools and in the programs of</p><p>teacher education are fundamental.</p><p>Key Words: Rural Education; Teacher’s Adaptation; Rural Teaching</p><p>12</p><p>Lista de Quadros</p><p>Quadro 01 Realidade das escolas do campo da rede municipal de Pelotas ..... 28</p><p>Quadro 02 Caracterização das professoras quanto à titulação/formação ......... 36</p><p>Quadro 03. Caracterização das professoras quanto ao tempo de experiência</p><p>profissional e atividades docentes na zona rural ............................. 37</p><p>Quadro 04 Dados característicos da educação no contexto rural brasileiro .... 63</p><p>13</p><p>Lista de Siglas e Abreviaturas</p><p>AEE – Atendimento Educacional Especializado</p><p>AGIR – Artes Gráficas Indústrias Reunidas</p><p>ANPEd – Associação Nacional de Pós-Graduação em Educação</p><p>BM – Banco Mundial</p><p>CAPES – Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior</p><p>CEB – Câmara de Educação Básica</p><p>CF – Constituição Federal</p><p>CNBB – Conferência Nacional dos Bispos do Brasil</p><p>CNE – Conselho Nacional de Educação</p><p>DOU – Diário Oficial da União</p><p>E.M.E.F. – Escola Municipal de Ensino Fundamental</p><p>ENERA – Encontro Nacional de Educadoras e Educadores da Reforma Agrária</p><p>FaE – Faculdade de Educação</p><p>FETAG – Federação dos Trabalhadores na Agricultura do Rio Grande do Sul</p><p>FMI – Fundo Monetário Internacional</p><p>GESTRADO/UFMG – Grupo de Estudos sobre Política Educacional e Trabalho</p><p>Docente da Faculdade de Educação da Universidade Federal de Minas Gerais</p><p>GT – Grupo de Trabalho</p><p>IBGE – Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística</p><p>ICH – Instituto de Ciências Humanas</p><p>IES – Instituições de Ensino Superior</p><p>INCRA – Instituto de Colonização e Reforma Agrária</p><p>INEP – Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira</p><p>LDB – Lei de Diretrizes e Bases</p><p>MEC – Ministério da Educação</p><p>MDA – Ministério de Desenvolvimento Agrário</p><p>MOBRAL – Movimento Brasileiro de Alfabetização</p><p>MST – Movimento dos Trabalhadores sem Terra</p><p>PCN – Parâmetros Curriculares Nacionais</p><p>PPP – Projeto Político Pedagógico</p><p>PNUD – Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento</p><p>14</p><p>PRONASEC – Programa Nacional de Ações Sócio-Educativas e Culturais</p><p>PRONERA – Programa Nacional de Educação na Reforma Agrária</p><p>PSECD – Plano Setorial de Educação, Cultura e Desporto</p><p>RS – Estado do Rio Grande do Sul</p><p>SEB – Secretaria de Educação Básica</p><p>SECAD – Secretaria de Educação Continuada, Alfabetização e Diversidade</p><p>SMED – Secretaria Municipal de Educação e Desporto de Pelotas</p><p>UFPel – Universidade Federal de Pelotas</p><p>UnB – Universidade de Brasília</p><p>UNESCO – Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura</p><p>UNICEF – Fundo das Nações Unidas para a Infância</p><p>UNISINOS – Universidade do Vale do Rio dos Sinos</p><p>15</p><p>Sumário</p><p>1 Introdução .....................................................................................</p><p>15</p><p>2 Rompendo fronteiras do rural: reflexos de uma formação</p><p>continuada ....................................................................................</p><p>18</p><p>3 A escolha metodológica e a questão de pesquisa ................... 21</p><p>3.1 A pesquisa na abordagem qualitativa ........................................ 21</p><p>3.2 O uso das entrevistas semi-estruturadas como procedimento</p><p>metodológico ................................................................................</p><p>22</p><p>3.3 Análise dos dados ....................................................................... 24</p><p>3.4 As etapas do caminho e os procedimentos metodológicos .... 25</p><p>3.5 Descrevendo e caracterizando o lócus onde atuam as</p><p>entrevistadas ................................................................................</p><p>a serem ofertados por algumas</p><p>Instituições de Ensino Superior (IES), com o título de Licenciatura Plena em</p><p>Educação do Campo.</p><p>Essa política faz parte de convênios que o MEC tem assinado desde 2007,</p><p>com algumas universidades, por meio do Programa de Apoio à Formação Superior e</p><p>Licenciatura em Educação no Campo, das Secretarias de Educação Superior e da</p><p>SECAD/MEC (SECAD, 2007), conforme artigo abaixo:</p><p>Art. 5º A formação de professores para a educação do campo</p><p>observará os princípios e objetivos da Política Nacional de Formação</p><p>de Profissionais do Magistério da Educação Básica, conforme</p><p>disposto no Decreto no 6.755, de 29 de janeiro de 2009, e será</p><p>orientada, no que couber, pelas diretrizes estabelecidas pelo</p><p>Conselho Nacional de Educação.</p><p>49</p><p>Informação fornecida por Nára B. C. Nörenberg em comentário proferido no I Seminário de</p><p>Educação do Campo – FETAG/STR, em Pelotas, Rio Grande do Sul (RS), em 12 e 13 de maio de</p><p>2011.</p><p>76</p><p>§ 1º Poderão ser adotadas metodologias de educação a distância</p><p>para garantir a adequada formação de profissionais para a educação</p><p>do campo.</p><p>§ 2º A formação de professores poderá ser feita concomitantemente</p><p>à atuação profissional, de acordo com metodologias adequadas,</p><p>inclusive a pedagogia da alternância, e sem prejuízo de outras que</p><p>atendam às especificidades da educação do campo, e por meio de</p><p>atividades de ensino, pesquisa e extensão.</p><p>§ 3º As instituições públicas de ensino superior deverão incorporar</p><p>nos projetos político-pedagógicos de seus cursos de licenciatura os</p><p>processos de interação entre o campo e a cidade e a organização</p><p>dos espaços e tempos da formação, em consonância com as</p><p>diretrizes estabelecidas pelo Conselho Nacional de Educação</p><p>(MEC/MDA, 2010, p. 1).</p><p>Contudo, mesmo o decreto estando em vigor desde 2007, essa formação</p><p>específica, em nossa região, ou seja, Pelotas, não está disponível em curso</p><p>presencial, somente sob o formato a distância.</p><p>77</p><p>5 Docência na escola do campo: revelando o processo vivido por professoras</p><p>oriundas da zona urbana</p><p>O ser/estar professor é um processo de construção contínuo que acontece</p><p>ao longo da carreira docente, “no contexto de uma socialização profissional, onde é</p><p>incorporado, modificado, adaptado em função dos momentos e das fases de uma</p><p>carreira” (TARDIF, 2002, p. 14) e que, dentre os diferentes lugares da formação, é</p><p>fortemente influenciado pelo lócus em que cada professor se vincula. Estamos,</p><p>assim, destacando o potencial formativo nas situações de trabalho, embora</p><p>reconhecendo os seus limites e condicionantes.</p><p>Essa perspectiva privilegia o aspecto formador do desenvolvimento humano,</p><p>e o próprio professor cumpre um papel de inventor, criador e descobridor porque ele</p><p>é tido como pesquisador e explorador da/na sua prática.</p><p>Essas premissas embasaram a análise dos dados e deles procuramos</p><p>elencar e compreender situações vivenciadas pelas professoras que foram sujeitos</p><p>neste estudo.</p><p>Partimos do pressuposto de que enfrentar as adversidades no local de</p><p>trabalho poderia ser algo prazeroso ou angustiante, dependendo como sentiriam e</p><p>como desenvolveriam as relações no novo espaço. Esse aspecto pode interferir no</p><p>desempenho das atividades, ou não.</p><p>5.1 A troca de contexto de trabalho: do urbano para o rural</p><p>O movimento de mudança das escolas da zona urbana para a escola da</p><p>zona rural vivenciado por nossas entrevistadas foi originado a partir de distintas</p><p>situações. Algumas delas disseram que foram convidadas e também que as</p><p>78</p><p>possibilidades de adequar os horários foi um atrativo para a mudança. No entanto, a</p><p>maioria das professoras relacionou sua opção ao incentivo salarial que receberiam.</p><p>Em geral, esse incentivo estimula os professores a saírem da zona urbana</p><p>para trabalhar no interior de Pelotas. As professoras explicaram que:</p><p>Em primeiro lugar uma das motivações foi o difícil acesso50, porque</p><p>eu precisava de dinheiro, na época, e aumentava o meu salário</p><p>(Professora A).</p><p>O difícil acesso é um ponto. É questão salarial e isso é um ponto que</p><p>deve ser mencionado porque também é importante. [...] é uma</p><p>quantia boba, não é tão significante, mas é uma diferença salarial.</p><p>Isso é fator motivador (Professora E).</p><p>Foi minha opção. Eu trabalhava na zona urbana e a gente ganha</p><p>muito pouco lá, aí eu recebi o convite do F. (diretor) através de uma</p><p>amiga, para vir trabalhar aqui na escola e ganhar o difícil acesso</p><p>(Professora F).</p><p>O difícil acesso que a gente recebe não é muito, mas é (Professora</p><p>G).</p><p>Cabe esclarecer que esse incentivo, medida adotada pelo governo municipal</p><p>de Pelotas, teve como objetivo estimular a ida dos professores da zona urbana para</p><p>a zona rural a fim de suprir a demanda de vagas nas escolas.</p><p>No final da década de 80, a rede pública, acompanhando as mudanças na</p><p>educação nacional, havia passado por uma série de reformulações. Uma delas foi</p><p>abolir a contratação de pessoas sem habilitação para o magistério – chamados de</p><p>professores leigos – recrutados na própria comunidade para atuar nas escolas</p><p>(MAIA, 1982; PILETTI, 1991). Outra foi o início do processo de nuclearização das</p><p>escolas multisseriadas instituindo-se escolas núcleo que ofereciam o ensino</p><p>fundamental completo. Como consequência, sobravam vagas nas escolas porque</p><p>mão de obra qualificada para docência, nas próprias comunidades, sobretudo em</p><p>nível de graduação, era inexistente ou não atendia à demanda.</p><p>50</p><p>O termo "Difícil Acesso" mencionado pelos professores é a denominação, comumente, dada a um</p><p>incentivo financeiro previsto no artigo 32 da Lei Orgânica Municipal de Pelotas, regulamentado pelo</p><p>art. 1º da Lei Municipal nº 3310/90. Tal legislação determina, aos servidores municipais das áreas da</p><p>Saúde e do Magistério, a concessão de uma gratificação especial de cinquenta por cento (50%),</p><p>sobre o vencimento ou salário básico quando prestarem serviço em locais de difícil acesso.</p><p>Disponível em: acesso</p><p>em 21 de abr de 2013.</p><p>http://www.jusbrasil.com.br/legislacao/495032/lei-3310-90-pelotas-0</p><p>79</p><p>Contaram elas que ao optarem pela troca de contexto suas expectativas</p><p>eram de encontrar um ambiente mais calmo e tranquilo em relação ao ambiente</p><p>onde elas atuavam. Imaginavam uma escola isolada e cercada por mato ou com</p><p>poucas residências próximas. As falas apontaram, por unanimidade, que esses</p><p>referenciais estavam relacionados à infância ou a pessoas de sua relação.</p><p>[...] Aqui na zona rural eles estão acostumados só com o campo, o</p><p>mundo deles, a cultura ali no campo, o trabalho. Eles não estão</p><p>ligados no que acontece fora daquele mundo rural, fora dos bichos,</p><p>das plantações. Outra coisa que eu tinha a respeito da zona rural foi</p><p>que eu subestimei os alunos da zona rural [...] (Professora A).</p><p>Minha família foi toda criada na campanha, [...] Eu sempre ouvi falar</p><p>muitas coisas do campo: como são criadas as crianças, como</p><p>funciona as coisas, enfim. Eu tinha um conhecimento muito abstrato,</p><p>eu ouvia falar que era bom trabalhar na zona rural porque os alunos</p><p>eram muito receptivos e educados. [...] (Professora B).</p><p>Eu já imaginava que seria um ambiente mais tranquilo para trabalhar.</p><p>Acho que a maior representação que eu tinha era essa: Escola da</p><p>zona rural, ambiente mais tranquilo! (Professora D)</p><p>Imaginava um lugar muito isolado. Deve ser muito longe e nem</p><p>conhecem a cidade, não devem nem estar acostumados com a</p><p>televisão, com computador. Eu vim mais ou menos pensando assim.</p><p>(Professora E)</p><p>Eu tinha uma ideia de que na zona rural os alunos eram mais</p><p>calmos, a comunidade era mais acessível porque lá na cidade, na</p><p>zona urbana, as coisas são diferentes. [...] (Professora</p><p>F).</p><p>De acordo com Carneiro (2008), essa representação do rural que cada</p><p>professora possuía antes de conhecê-lo, esse olhar característico sobre o contexto</p><p>e o homem rural que, ainda hoje, habita a imaginação de pesquisadores e da</p><p>população genuinamente urbana, está atrelado à figura do agricultor, enfatizando a</p><p>existência da atividade agrícola como definidora dos espaços rurais. A emblemática</p><p>representação social do campo reforça a visão estereotipada</p><p>[...] dos rurais como atrasados, ignorantes, inferiores culturalmente</p><p>frente à elegância e indiscutível superioridade que se pressupôs ao</p><p>habitante citadino como fundamento para legitimar uma dada</p><p>intervenção e um entendimento da modernização do rural, que</p><p>implicava sua necessária desruralização e adequação às pautas do</p><p>mundo urbano-industrial (FROEHLICH, 2002, p. 30).</p><p>80</p><p>Essa visão é resquício do modelo capitalista de modernidade que considera</p><p>o urbano como sinônimo de desenvolvimento, fazendo com que o modo de vida rural</p><p>seja sinônimo de atraso, de arcaico. Por outro lado, marcado pelo olhar nostálgico</p><p>de um local bucólico, habitado por população que se caracteriza pelo modo de vida</p><p>ainda limitado em relação aos avanços tecnológicos, às ofertas de bens e consumo</p><p>propaladas na sociedade globalizada.</p><p>Percebe-se, através da análise das entrevistas, que as professoras</p><p>ingressam na escola do/no campo com essa representação, imaginando que</p><p>encontrariam uma escola isolada na qual estudavam alunos que viviam restritos a</p><p>costumes e hábitos peculiares regionais, “desconectados” da cultural global, com</p><p>perfil diverso daquele com os quais lidavam na zona urbana, quanto ao</p><p>comportamento, modo de viver e relacionamentos.</p><p>No entanto, o contato com os alunos fez com que elas se surpreendessem</p><p>frente a alguns aspectos que encontraram na escola. Disseram que:</p><p>[...] Eles estão antenados em tudo! [...] Mesmo eles não tendo muito</p><p>acesso a essa nova era digital, de computadores, eles são</p><p>excelentes! Eles têm uma imaginação! [...] Tudo que eu proponho</p><p>eles vão e fazem, eles pesquisam, eles participam, eles são rápidos</p><p>no raciocínio! [...] (Professora A).</p><p>Em geral eu acho que aqui os alunos são mais engajados, mais</p><p>interessados, é mais fácil trabalhar os conteúdos dentro do tempo</p><p>estipulado. Eles adoram vir para a escola! Adoram, adoram! [...]</p><p>(Professora B).</p><p>[...] Tu consegues trabalhar, tu consegues dar uma aula, se traças</p><p>um objetivo, tu consegues atingir. [...] são alunos que vêm pra</p><p>escola, querem estudar, têm material escolar e aí eu acho uma coisa</p><p>importante: muitos deles têm um incentivo e até um apoio familiar.</p><p>[...] Eles ainda estão numa condição de vida que a escola é</p><p>importante na vida [...] (Professora D).</p><p>Eu vejo que o aluno da zona rural é mais educado porque eu não</p><p>vejo eles usarem palavrão, eu não vejo eles entrarem aos pontapés</p><p>em sala de aula, eu não vejo eles gritarem com professores, gritarem</p><p>entre eles. Não existe isso aqui (na zona rural)? Claro que existe!</p><p>Existe em todo espaço coletivo, mas numa medida menor que na</p><p>cidade! [...] (Professora E).</p><p>Eu achei bom porque é mais tranquilo de trabalhar. Não tem tanta</p><p>violência, os alunos são educados, eles ainda respeitam a gente,</p><p>aqui. Na zona rural [...] as famílias também acompanham,</p><p>81</p><p>perguntam, ligam. Eu acho bom! Gosto porque eles te valorizam</p><p>também de uma maneira ou de outra (Professora G).</p><p>Aos poucos, as professoras foram construindo outra imagem dos alunos,</p><p>marcada, como diz Leite (2002), por “traços comportamentais baseados em hábitos</p><p>e costumes, tradições, etc são maneirismos, tipos de linguajar e lógicas próprias que</p><p>norteiam e fundamentam as relações” (p. 82).</p><p>Elas perceberam que, no meio rural, ainda é preconizada a valorização da</p><p>família e outros valores51, hábitos e costumes da cultura local, os quais alimentam o</p><p>modo de vida tranquila e saudável, mesmo que, em algumas situações, haja</p><p>influência do modo de vida urbano que possui padrões característicos decorrentes</p><p>do processo de globalização, acesso às mídias e inovações tecnológicas.</p><p>Como referimos anteriormente, a maioria das entrevistadas expressou,</p><p>inicialmente, estar empolgada pelo incentivo salarial. Entretanto, admitiram que após</p><p>conhecerem a realidade rural e encontrar alunos calmos, tranquilos, que gostam de</p><p>estudar e ir à escola, que valorizam o trabalho da professora e refletem convívio</p><p>familiar estruturado resolveram permanecer na escola do campo.</p><p>O modo de falar e suas entonações de voz demonstravam sua satisfação</p><p>com o que estavam vivenciando, principalmente pelo sentimento de valorização do</p><p>ser humano que experimentavam nas relações interpessoais. Expressaram que:</p><p>Eu preferi a escola rural, [...] pelo prazer em trabalhar aqui. [...] os</p><p>alunos têm muito interesse pela educação coisa que infelizmente a</p><p>gente perde um pouco em escolas de periferias, pelos problemas</p><p>sociais. Mas é muito gratificante aqui, o retorno é muito bom</p><p>(Professora B).</p><p>A gente se apaixona, é outro mundo [...] tu te apaixonas pela</p><p>clientela, pelos alunos, pela educação. Eles, aqui, ainda têm muito</p><p>respeito com professor, coisa que na zona urbana é muito difícil e</p><p>cada vez a gente está vendo menos (Professora C).</p><p>Quanto às análises das professoras sobre o comportamento característico</p><p>dos alunos, percebemos que atribuem à condição familiar vivida por eles. Elas</p><p>destacaram que os valores transmitidos pela família, a presença efetiva dos pais na</p><p>51</p><p>O termo, aqui utilizado, está relacionado ao conjunto de valores humanos que contribuem para o</p><p>bom funcionamento da vida em sociedade. Por exemplo: respeito, obediência, caráter, honestidade,</p><p>responsabilidade, solidariedade, etc.</p><p>82</p><p>escola e na vida escolar dos filhos são elementos que favorecem e fazem a</p><p>diferença, inclusive, influenciando os resultados da aprendizagem quando</p><p>comparados aos da zona urbana. Disseram que:</p><p>Aqui tu vês que os pais estão sempre juntos, moram perto, vêm na</p><p>escola, [...] eles participam. [...] Então quer dizer, são famílias, são</p><p>alunos, são pais e mães participativos, porque eles vêm em peso,</p><p>eles valorizam o evento, ser for o caso. [...] (Professora G).</p><p>[...] a comunidade dos pais é bem participativa, sempre vem à escola</p><p>quando convocados para reuniões, sempre estão interessados. A</p><p>gente conversa sempre que dá com eles [...] para que eles</p><p>acompanhem melhor o andamento dos filhos [...] os filhos também</p><p>fazem parte do trabalho dos pais, acompanham, o plantio na lavoura,</p><p>a coleta enfim, são mais próximos e eu acho que talvez isso colabore</p><p>para que não se perca os valores morais, digamos assim (Professora</p><p>B).</p><p>A influência da família na vida dos alunos é destacada nos estudos de Lahire</p><p>(1997) ao dizer que a ação educativa dos pais situa-se, fundamentalmente, na</p><p>dimensão do comportamento moral, que tem primazia sobre qualquer outra, ou seja,</p><p>"a intervenção positiva das famílias, do ponto de vista das práticas escolares, não</p><p>está voltada essencialmente ao domínio escolar, mas a domínios periféricos” (p. 26),</p><p>como por exemplo, o ensino dos valores morais e éticos.</p><p>Ainda, "através de uma presença constante, um apoio moral ou afetivo</p><p>estável a todo instante, a família pode acompanhar a escolaridade da criança de</p><p>alguma forma". Os aspectos envolvendo a preservação dos valores morais refletem</p><p>no comportamento e na educação dos filhos, reforçando que "uma configuração</p><p>familiar relativamente estável, que permita à criança relações sociais frequentes e</p><p>duráveis com os pais, é uma condição necessária à produção de uma relação com o</p><p>mundo adequada ao 'êxito' no curso primário" (LAHIRE, 1997, p. 26).</p><p>Interessante realçar que as professoras explicam que aderiram a escola do</p><p>campo tomando por base os diferentes tipos de alunos que nela encontraram.</p><p>Observamos que não se remeteram à</p><p>instituição, em geral, como uma condição</p><p>para a permanência na zona rural.</p><p>Talvez seja possível dizer que as entrevistadas depositam, apenas sobre os</p><p>alunos, suas expectativas de trabalho em um ambiente diferente ao de sua origem.</p><p>83</p><p>A organização, o PPP, a estrutura e a dinâmica que movem a escola não foram</p><p>elementos/aspectos citados por elas.</p><p>No entanto, vale lembrar que “todo projeto pedagógico da escola é, também,</p><p>um projeto político por estar intimamente articulado ao compromisso sociopolítico</p><p>com os interesses reais e coletivos da populaçao majoritária”, como explica Veiga</p><p>(2004, p. 13). No PPP encontra-se, também, a intencionalidade da escola. Nele</p><p>estão definidas as ações educativas necessárias para cumprir seus propósitos.</p><p>Alguns pontos salientados pelas entrevistadas refletem desafios com os</p><p>quais se depararam quando ingressaram na zona rural, os quais precisam ser</p><p>enfrentados. Por vezes, são barreiras que precisam ser superadas cotidianamente</p><p>para desempenhar as funções da docência. Como disse a professora E:</p><p>Acho que os professores veem a mudança de situação de lá para cá</p><p>como um desafio que começa desde o transporte, passa pela</p><p>alimentação e passa, sem dúvida alguma, por alguma mudança na</p><p>sua prática de sala de aula [...] Acho que isso é desafiante, sim.</p><p>Inicialmente, poderíamos citar a questão da distância geográfica, existente</p><p>entre o centro urbano e a escola, que exige um translado diário que dura, em média</p><p>duas horas, utilizando-se o transporte coletivo municipal. São 72 km de estradas não</p><p>pavimentadas que precisam ser percorridas desde a saída, da cidade, até a</p><p>chegada à escola e vice-versa. Esse deslocamento estabelece uma rotina que inicia</p><p>cedo e encerra tarde e é semelhante para todo o grupo:</p><p>Eu tenho que acordar às 5h da manhã. Vou de ônibus (coletivo)</p><p>urbano até o centro, embarco no ônibus que sai 15 pra sete (do</p><p>centro para a colônia). É obstáculo porque pra vir cá eu saio de</p><p>madrugada e volto de noite e essa, é a maior dificuldade que eu</p><p>estou enfrentando até agora, seja frio, chuva, tudo (Professora A).</p><p>Boa parte do meu dia – quatro horas – eu levo no transporte até eu</p><p>chegar aqui, no trajeto. Eu acordo muito cedo, chego em casa, no</p><p>inverno, é noite. É aquela coisa, no inverno a gente sai noite de casa</p><p>e chega à noite. Eu acho que a única diferença mesmo é esse tempo</p><p>que eu perco para chegar até a escola, no acesso para a escola</p><p>(Professora B).</p><p>É muito cedo que se sai de lá. Quem vai pegar o ônibus 15 para as</p><p>sete, tem que se levantar, no mínimo, antes das 6h para poder pegar</p><p>o ônibus e vir para cá. Viajar duas horas. O retorno também é assim.</p><p>São duas horas de viagem fora os períodos de chuva, ônibus que</p><p>derrapa. Às vezes tu tens que sair do ônibus e meter o pé no barro,</p><p>às vezes tu não chegas à escola (Professora E).</p><p>84</p><p>O maior enfrentamento, o maior problema, que a gente encontra é</p><p>primeiro a viajem, porque a viajem é péssima, nos colocam um</p><p>ônibus péssimo, as passagens são caras. [...] a estrada é horrível,</p><p>quando estraga um ônibus a gente atrasa muito mais. Às vezes,</p><p>temos que trocar de ônibus (Professora F).</p><p>Eu tenho que levantar muito cedo! Levanto-me cinco e quinze pra</p><p>chegar aqui. [...] Se tem uma ponte ou uma estrada que não dá para</p><p>passar a gente já não pode vir (Professora G).</p><p>Sabemos que essa condição de trabalho não é exclusividade desse grupo</p><p>de profissionais, porém, diferentemente do que ocorre com aqueles que se</p><p>deslocam nos meios urbanos e usufruem de maior infra estrutura de transporte</p><p>coletivo, esses têm apenas uma opção de transporte municipal rural, como</p><p>comentou a professora G: às vezes acontece alguma coisa ou um atraso mesmo do</p><p>relógio. Se estou em uma escola da cidade, eu vou atrasada, mas eu vou, aqui se</p><p>eu perco o ônibus eu já não posso vir.</p><p>Cabe salientar que a população do campo e demais trabalhadores que</p><p>prestam serviços nesses locais convivem com certas restrições nesse sentido, pois</p><p>as linhas de ônibus que fazem o percurso interdistrital52 são limitadas porque são</p><p>ofertados em poucos horários durante o dia. O transporte rural tem caráter</p><p>intermitentemente; as empresas de transportes definem suas rotas e disponibilizam</p><p>veículos que circulam no início e final da manhã e tarde. Convém lembrar que</p><p>determinadas regiões sequer são atendidas por esse serviço ou contam com ele</p><p>apenas uma ou duas vezes na semana. Por esse motivo, em diversos casos, os</p><p>professores têm dificuldade para conjugar seu trabalho em duas ou mais escolas.</p><p>Por outro lado, a má conservação das estradas rurais é um problema que</p><p>afeta a rotina dos moradores do campo em todo o país. A falta de manutenção</p><p>prejudica não só a oferta do transporte coletivo de qualidade, o acesso aos serviços</p><p>básicos como educação, saúde, transporte, comércio e lazer encontrados nos</p><p>centros urbanos, como também a economia das localidades, porque interfere no</p><p>momento da comercialização dos produtos das safras (VEIGA, 2002).</p><p>Outra situação comentada pelas professoras envolve a alimentação, pois</p><p>permanecem o dia inteiro na escola. De acordo com depoimentos e com o que</p><p>pudemos averiguar, cada profissional que trabalha na instituição se responsabiliza</p><p>52</p><p>O percurso interdistrital se refere às rotas entre a cidade e a colônia, e vice-versa, realizadas pelo</p><p>serviço de transporte coletivo rural.</p><p>85</p><p>pela sua refeição, necessitando providenciar, com antecedência (em casa), o seu</p><p>alimento para levá-lo ao local de trabalho.</p><p>Explicaram que:</p><p>Aqui, por exemplo, se eu não trouxer meu almoço qual é a opção que</p><p>eu tenho? Eu tenho um lugar para ir para comer? Não tem como! Tu</p><p>és obrigado a comer na escola sendo que não tem almoço na escola.</p><p>[...] (Professora E).</p><p>[...] é inviável voltar para a cidade no horário de almoço, é muito</p><p>longe, o único restaurante existente aqui também é longe, a gente</p><p>depende também do transporte para ir até lá. Tive que me adaptar a</p><p>almoçar na escola [...] (Professora B)!</p><p>Essa situação aponta para um diferencial da zona rural, que não oferece a</p><p>mesma condição encontrada nos centros urbanos, onde existem várias opções de</p><p>alimentação. Além disso, os professores têm oportunidade de retornar às suas</p><p>residências. Quem perfaz dois turnos na escola da zona rural e que vem da cidade,</p><p>necessariamente precisa permanecer no local porque não há outras opções senão</p><p>usufruir do que ele pode oferecer.</p><p>Por outro lado, esse momento vivido pelas professoras favorece as relações</p><p>interpessoais. Observamos que a pausa para o almoço agrega as pessoas dos</p><p>diversos segmentos da escola: alunos, professores, funcionários e equipe diretiva e</p><p>que, durante esse período, ocorrem muita conversa informal, trocas de informações</p><p>e opiniões.</p><p>Outro item arrolado pelas professoras foi o contato com o novo local de</p><p>trabalho e as condições que ele oferece. É sabido que a inserção assim como a</p><p>adaptação de um sujeito, em qualquer ambiente que lhe é desconhecido, é passível</p><p>de gerar tensões. O sentimento de dúvida, de insegurança que é inerente ao</p><p>processo de mudança se evidenciou no receio quanto à adaptação ao meio e aos</p><p>novos relacionamentos.</p><p>No início, eu me senti um "peixe fora d'água" quando eu entrei aqui</p><p>na escola. Eu me senti com vontade de sair e no outro dia não voltar</p><p>mais. [...] No contato diário, fui aprendendo que as pessoas são</p><p>diferentes daquelas com as quais eu estava acostumada há 18 anos</p><p>numa mesma escola. [...] - Não! Eu que estou chegando agora, eu</p><p>que tenho que fazer meu mundo aqui dentro. Como eu trabalho aqui,</p><p>meu mundo vai ser aqui (Professora A).</p><p>86</p><p>Eu acho que é um desafio quando há mudança para algo</p><p>desconhecido que é o nosso caso. Quem não conhece a zona rural,</p><p>quem não conhece essa realidade, não faz parte desse contexto aqui</p><p>e se dispõe a vir pra cá, de uma hora</p><p>para outra e sem conhecer</p><p>nada, eu acho que é uma situação de desafio como um todo [...]</p><p>(Professora E).</p><p>Em se tratando dos desafios e das situações diferenciadas do contexto de</p><p>onde vieram, cabe destacar que as professoras, além da troca do local de trabalho,</p><p>depararam-se com usos, costumes e modo de vida diferente da rotina urbana. Bagli</p><p>(2006) explica que os hábitos citadinos são construídos tendo como base uma lógica</p><p>mais artificial53 que coloca formas e funções próprias, criando múltiplas relações que</p><p>se realizam por condições específicas de trabalho, com um ritmo de vida acelerado,</p><p>em que o cotidiano é tenso e intenso.</p><p>No rural, ao contrário, as relações acontecem obedecendo "uma lógica mais</p><p>próxima da natureza, tendo como suporte a relação intensa com a terra e o que ela</p><p>pode oferecer" (BAGLI, 2006, p. 98). Para compreender o cotidiano rural da</p><p>localidade, elas contam, principalmente, com o relato dos alunos. Os comentários</p><p>sobre suas atividades diárias no ambiente familiar vão informando as docentes e</p><p>favorecendo o conhecimento dessa realidade. Essa condição pode oferecer um</p><p>ambiente de trabalho mais calmo e mais natural em que as relações entre</p><p>professores e alunos, e entre os professores, sejam mais solidárias e intensas.</p><p>Apoiando essa ideia, com base no que tem sido amplamente discutido pela</p><p>bibliografia especializada, Carneiro (2008) descreve como "mais rural" aquilo que</p><p>está mais próximo do "natural", e o "mais urbano", ao que é "mais artificializado",</p><p>mantendo, como fundamento, a oposição entre natureza e cultura, própria ao</p><p>pensamento moderno ocidental (p. 18).</p><p>Numa linguagem figurada, o "natural" pressupõe a relação com o ar puro, o</p><p>silêncio, as paisagens naturais, a água limpa, o contato com animais, as atividades</p><p>agropecuárias e de extração de matérias-primas, atividades surgidas como lazer e</p><p>turismo. E "artificial" reflete as modificações antrópicas na paisagem urbana,</p><p>construções, rotinas inventadas pelo modo de trabalho, barulho excessivo, poluição</p><p>atmosférica, sonora e visual (VEIGA, 2002; BAGLI, 2006).</p><p>53</p><p>Bagli (2006) classifica o urbano como artificial pela cadência do movimento que impõe ritmo de vida</p><p>marcado pelo compasso do relógio e pela lógica capitalista, a relação com a utilização da terra e o</p><p>contato com a natureza, a organização do mundo do trabalho e do consumo.</p><p>87</p><p>Estimuladas a falar sobre as características típicas do local, os depoimentos</p><p>demonstraram diferentes olhares:</p><p>[...] Na zona rural eu já comecei a perceber que eles tinham um</p><p>horário de trabalho seja em casa, ou seja, na lavoura porque</p><p>predomina bastante [...] O tempo na cidade é um tempo diferente do</p><p>tempo da colônia. Até dos próprios professores [...] porque na cidade</p><p>a gente parece mais imediatista [...] (Professora E).</p><p>[...] Foi tudo bem novo [...]. Vi que os alunos eram diferentes, as</p><p>características físicas, muito com a aparência de colonos. Na cultura</p><p>eu vejo o sotaque porque muitos são descendentes de famílias de</p><p>origem pomerana e alguns, que falam alemão [...] os jovens já não</p><p>cultuam tanto quanto os adultos. [...] no restante a cultura deles está</p><p>bem parecida com a urbana, eu não vejo muita diferença (Professora</p><p>B).</p><p>O tempo na zona rural obedece às tarefas específicas54 do campo as quais</p><p>são influenciadas, basicamente, pelo calendário agrícola e mudanças climáticas. O</p><p>contrário acontece na cidade, onde o cotidiano é referendado sobre um tempo</p><p>mecânico (BAGLI, 2006).</p><p>Embora os traços fisionômicos denunciem as agruras do tempo que recaem</p><p>sobre o homem rural, apontando as dificuldades pelos quais passam na realização</p><p>das tarefas, estão perfeitamente integrados com a modernidade no que diz respeito</p><p>às novas invenções tecnológicas, mídias, moda, acontecimentos no mundo.</p><p>As professoras perceberam, nessa comunidade, o resultado das</p><p>transformações que a sociedade rural vem tendo e que as fronteiras entre o rural e o</p><p>urbano, principalmente, no modo de vida da população, vêm se atenuando ao longo</p><p>dos anos, altamente influenciadas pelo acesso às mídias e meios de comunicação,</p><p>bem como nas atividades que envolvem o mundo do trabalho.</p><p>Estudos de Silva (1996; 1997 e 1998) apontam que a população rural</p><p>brasileira tem se ocupado cada vez menos com as atividades agrícolas, porque há</p><p>nova dinâmica derivada da presença crescente dos setores secundários e terciários,</p><p>semelhante ao que ocorre nos meios urbanos, nas vinculadas ao lazer e ao turismo.</p><p>O que está surgindo é o afloramento de uma “nova ruralidade”, sustentando a</p><p>dinâmica recente das populações (migração interna: do homem tipicamente rural</p><p>54</p><p>No rural, as relações cotidianas são construídas sobre um tempo mais ligado a uma lógica territorial</p><p>que se consolida por meio da relação com a natureza, incluindo as mudanças climáticas. As pessoas</p><p>estão imbuídas por temporalidades diferenciadas: do plantio, da colheita, da poda, da entressafra</p><p>(BAGLI, 2006).</p><p>88</p><p>para a cidade e vice-versa), apontando para algo novo diferindo da realidade rural</p><p>anterior à globalização. Seria um fenômeno que muito pouco teria a ver com o rural</p><p>vivido pelas sociedades no passado (VEIGA, 2002; CARNEIRO, 2008). As</p><p>professoras expressaram que:</p><p>As culturas não são tão diferentes, hoje em dia, pelo acesso as</p><p>mídias. Eles gostam das mesmas coisas que as crianças da zona</p><p>urbana. Gostam, por exemplo, dos mesmos programas de televisão,</p><p>curtem as mesmas músicas [...] (Professora B).</p><p>Segunda-feira é sempre dia que eles me contam das festas, mostram</p><p>as fotos porque eles têm celulares agora, alguns postam as fotos no</p><p>facebook [...] (Professora A).</p><p>A gente enxerga que eles não estão tão longe da cidade porque eles</p><p>estão com a TV, eles estão com toda a mídia, eles veem tudo o que</p><p>a gente vê, eles têm as mesmas informações [...] (Professora C.)</p><p>Para García Canclini (1997), a urbanização que predomina nas sociedades</p><p>contemporâneas provoca determinados entrelaçamentos entre as culturas. Por</p><p>exemplo, "como explicar que muitas mudanças de pensamento e gostos da vida</p><p>urbana coincidam com os do meio rural, se não por que as interações comerciais</p><p>deste com as cidades e a recepção da mídia eletrônica nas casas rurais os conecta</p><p>diretamente com as inovações modernas?" (1997, p. 283). Dessa forma, alimenta-</p><p>se a ideia de que, nos centros urbanos, tudo acontece, é o local que tem as maiores</p><p>possibilidades e oportunidades de ascensão social ou qualidade de vida, por</p><p>exemplo, propagandeando uma imagem "porque a mídia o diz e como parece que</p><p>ocorre como a mídia quer" (ibidem, p. 286). Embora a cultura possa não ser decisiva</p><p>nas tomadas de decisões, ela é um elemento que pode influenciar sobremaneira.</p><p>Por outro lado, existem contradições evidencias pelos exemplos resgatados</p><p>pela professora F que trabalha com crianças nos anos iniciais. Ela contou-nos que:</p><p>Eu tive alunos que não sabiam, por exemplo, para que servia o lápis,</p><p>[...].Eu lembro de um aluno que no primeiro dia de aula olhou para</p><p>mim, pegou o lápis na mão e perguntou: "- Para que isso</p><p>professora?".[...] Aqui eles não têm muito contato com materiais de</p><p>letramento, com as letras, com a leitura, com a escrita, na zona</p><p>urbana eles têm mais contato. Aqui eles não têm o hábito, eles</p><p>brincam no campo, eles não têm livrinho (de estórias) em casa, eles</p><p>não têm uma revista, eles não têm um jornal, então eles não têm</p><p>esse contato que é muito importante na alfabetização [...].</p><p>89</p><p>Quando a criança chega à escola, traz consigo conhecimentos construídos a</p><p>partir de suas vivências. No entanto, a professora percebeu que, no contexto rural,</p><p>essa condição apresenta marcas distintas, se comparadas ao centro urbano. Além</p><p>de encontrar crianças que nem sempre possuem o domínio, sequer, de manejar um</p><p>lápis, se deparou</p><p>com um público distante do contato com a leitura e escrita,</p><p>elementos que favorecem a aquisição e desenvolvimento do letramento.</p><p>Essa situação torna-se peculiar porque, diferentemente da cidade que está</p><p>dominada pelas informações impressas em placas sinalizadoras, veículos do</p><p>transporte urbano, casas comerciais, jornais, encartes, cartazes, panfletos, banners,</p><p>outdoors (BAGLI, 2006), esse tipo de informação na zona rural não é comum. Isso</p><p>pode ser um fator que retarda o interesse das crianças por escritas e leituras que</p><p>não estão presentes em suas casas ou que possivelmente só terão contato na</p><p>escola.</p><p>A professora diz trabalhar a alfabetização influenciada pelas concepções da</p><p>construção do conhecimento e da sociolinguística. O contato com diversos</p><p>portadores de texto55 é fator fundamental para o desenvolvimento do processo de</p><p>alfabetização e letramento. Percebendo a condição dos seus alunos, sentiu</p><p>necessidade de pensar estratégias diferentes para ensinar na escola do/no campo.</p><p>Era preciso colocar as crianças em contato frequente com os diversos suportes de</p><p>letramento e mais, cabendo-lhe a responsabilidade em disponibilizar os materiais</p><p>que julgava pertinentes.</p><p>5.2 O ensino: o desenvolvimento da prática docente no contexto rural</p><p>Questionamos e observamos as professoras em relação ao ensino que</p><p>desenvolvem com o objetivo de compreender se a mudança do contexto de trabalho</p><p>havia lhes motivado/provocado ou exigido alteração na forma de planejar suas aulas</p><p>e no modo de ensinar, bem como se haviam percebido essa necessidade para</p><p>qualificarem o processo de ensinar considerando as peculiaridades do campo.</p><p>55</p><p>Teóricos que discutem sobre a alfabetização, FERREIRO; TEBEROSKY, 1987; LEMLE, 1998;</p><p>SOARES, 2009 defendem que o manuseio de diversos tipos de texto é condição sine qua non para o</p><p>sujeito que está no processo de aquisição da leitura e da escrita. Para elas, rótulos, embalagens,</p><p>bulas de medicamento, receitas médicas e de culinária, livros de histórias poesias, jornais, panfletos,</p><p>revistas, parlendas, letras de músicas ou de cantigas, livros didáticos, entre outros, são considerados</p><p>portadores de texto que funcionam como instrumento de informação e de formação do sujeito quanto</p><p>à concepção social da escrita.</p><p>90</p><p>A Professora E expressou algo em relação à necessidade de mudança</p><p>dizendo que em alguma medida, a gente sabe que vai modificar alguma coisa. É</p><p>uma outra realidade é um outro contexto. O professor sabe disso. O professor vem</p><p>sabendo que vai ter mudanças.</p><p>As falas a seguir exemplificam o que estamos referindo:</p><p>O que eu faço aqui, o que eu planejo hoje para cá, com certeza eu</p><p>teria que planejar diferente para a zona urbana, porque as realidades</p><p>são diferentes. Eu tenho que pensar no meu aluno de acordo com a</p><p>realidade dele e a realidade dos alunos da zona urbana é outra,</p><p>então eu teria que adaptar, não que eu não fosse usar o mesmo</p><p>método, posso usar, nada me impede [...] (Professora F).</p><p>Não diria que eu mudei radicalmente as minhas aulas, não! Eu não</p><p>acredito em mudanças bruscas, radicais. [...] Eu acho que tu podes</p><p>adaptar um pouco, fazer modificações e é o que eu faria em qualquer</p><p>contexto independentemente de ser zona rural [...]. As demandas vão</p><p>ser diferentes em certa medida. Tu modificas, tu manténs, mas é um</p><p>certo jogo de cintura de adaptação necessária ao contexto</p><p>(Professora E).</p><p>Eu costumo adequar o meu plano de aula. Pra mim, a principal</p><p>mudança é essa: a mudança na forma de abordar os conteúdos. O</p><p>mesmo conteúdo, mas sendo abordado e colocado para os alunos e</p><p>até discutido com a realidade deles, então de forma muito</p><p>diferenciada [...] (Professora D).</p><p>As transformações que vêm ocorrendo nos últimos tempos em nossa</p><p>sociedade estão exigindo uma reorganização da prática do ensino nas escolas em</p><p>geral. Temas atuais relacionados à economia mundial, desenvolvimento sustentável,</p><p>tecnologias e mídias, entre outros, são, cada vez mais, introduzidos na agenda das</p><p>discussões em salas de aula. Segundo Libâneo, educação é tida como:</p><p>Uma prática social, materializada numa atuação efetiva na formação</p><p>e desenvolvimento de seres humanos, com condições socioculturais</p><p>e institucionais concretas, implicando práticas e procedimentos</p><p>peculiares visando mudanças qualitativas na aprendizagem escolar e</p><p>na personalidade dos alunos (LIBÂNEO, 2012, p. 38).</p><p>Desse modo, o maior desafio do professor é articular essas</p><p>ações/discussões no contexto escolar. Atualmente, não basta somente o</p><p>conhecimento teórico para desempenhar e executar as tarefas que a função lhe</p><p>exige, é preciso conhecer os processos de interação e relacionamento humano. A</p><p>fala da Professora F legitimou essa concepção:</p><p>91</p><p>É completamente diferente! Lá na zona urbana eu vou abordar</p><p>(sobre plantas), [...] quem vai ter que conduzir mais essa aula vai ser</p><p>eu. Eu vou ter que ter mais domínio do conteúdo. Aqui, eu até tenho</p><p>que ter bastante domínio do conteúdo, mas vou ter muito mais a</p><p>participação dos alunos. Vamos comparar: eu vou falar menos do</p><p>que eles porque eles sabem mais sobre a planta, eles sabem mais</p><p>sobre agricultura, eles que vão me ensinar. Eles me ensinam muito</p><p>mais isso do que eu a eles, [...] (Professora F).</p><p>As respostas das professoras mostraram que existe um pequeno movimento</p><p>de mudança no sentido de adequar o conteúdo à realidade rural. Aproximar os</p><p>conteúdos de situações cotidianas do meio rural é o que mais se destacou nas</p><p>respostas. Disseram que:</p><p>[...] Se eu vou trabalhar um conteúdo da História e estou trabalhando</p><p>aqui na zona rural, e eu sei que aqui, por exemplo, a gente teve</p><p>escravidão no Brasil colonial, que a gente tem uma comunidade</p><p>quilombola aqui, eu vou tentar trazer alguma atividade mais</p><p>relacionada a isso! Claro que na cidade, meus alunos de periferia</p><p>também têm sua constituição histórica porque são na maioria negros,</p><p>mas eu já abordo de outra forma. (Professora D).</p><p>Quando tu tens essas oportunidades de discutir questões ambientais</p><p>e, nesse ambiente tu tens a oportunidade não só de discutir, mas de</p><p>mostrar, tu vais agregar uma coisa a outra, tu vais fazer a discussão</p><p>e tu vais colocar isso em prática! Vais poder mostrar isso, vivenciar</p><p>isso no dia a dia. A gente pode fazer isso na cidade? Sem dúvida,</p><p>pode! Podes fazer a discussão, tu discutes tudo, isso é possível, mas</p><p>a vivência disso, não (Professora E)!</p><p>[...] eu estou trabalhando um conteúdo aqui e ao mesmo tempo na</p><p>cidade, eu vou ensinar a mesma coisa, porém contextualizada de</p><p>forma diferente. Enquanto aqui eles vão fazer um desenho de uma</p><p>paisagem do campo, lá eles vão fazer um desenho de uma paisagem</p><p>urbana. É isso que eu consigo fazer. [...] O que eu faço, às vezes, é</p><p>tematizar os trabalhos com assuntos de paisagens, coisas, objetos e</p><p>animais que fazem parte da vida deles [...] (Professora B).</p><p>[...] por exemplo, na alfabetização comecei a usar palavras da zona</p><p>rural. [...] toda família silábica eu tentava passar para o contexto</p><p>deles. Então, árvores, animais, até em Ciências mesmo eu</p><p>contextualizei. Eu não trabalhei o conteúdo de Ciências em si. Eu</p><p>trabalhei animais, peguei os mamíferos aqui da zona, pássaros,</p><p>muitos exemplos que eles me davam. [...]. O que eu faço para eles</p><p>aprenderem no início a matemática? Eu coloco muitos problemas</p><p>com o nome deles com uma situação deles, entendesse? Eu coloco</p><p>assim: Na casa do "Ciclano" tinha 5 pintos...eu vou colocando esse</p><p>problema matemático envolvendo o que eles produzem [...]. Aí, eu</p><p>esqueço aqueles dos livros, eu adapto para as situações do dia-a-dia</p><p>deles [...] no processo de alfabetização, o que eu faço? Eu pego um</p><p>92</p><p>texto lá ou eu mesmo produzo, colocando coisas deles, então eu vou</p><p>falar da árvore, do campo, do rio e depois o que eu faço? Um ditado</p><p>ou até alguma coisa pra eles pesquisarem, tudo englobado, porque é</p><p>o vocabulário</p><p>deles, a batata, o cavalo, aí eles já vão desenhar o</p><p>meio deles. Eu gosto muito de introduzir isso ao meu trabalho,</p><p>principalmente no currículo (Professora A).</p><p>Não é possivel afirmar que esse seja um movimento adequado no sentido de</p><p>uma mudança de um ensino centrado no professor para um ensino centrado no</p><p>aluno. No entanto, ele faz parte do planejamento e das práticas das entrevistadas.</p><p>Analisando as entrevistas, bem como as observações complementares</p><p>realizadas em suas aulas, notamos que o conteúdo é o item mais importante no</p><p>momento do planejamento. Na prática, a forma como ele é desenvolvido indica que</p><p>ocorre apenas uma maneira diferente na abordagem dos temas quando as</p><p>professoras procuram exemplificar fazendo relação com o contexto de vida dos</p><p>alunos como se observa em meus registros a seguir:</p><p>Trabalhando determinado conteúdo a partir de um texto narrativo,</p><p>houve um diálogo sobre o documento de identidade (RG). A</p><p>professora questionou quem dos alunos já o possuía, qual a utilidade</p><p>de tal documento na vida das pessoas e lembrou que em tempos</p><p>passados havia acontecido a "Ronda da cidadania"56 na comunidade.</p><p>Uma aluna, remanescente quilombola, relatou que a associação</p><p>responsável por esse grupo da população local havia promovido uma</p><p>excursão a Pelotas com o intuito de providenciar os documentos de</p><p>registro civil daqueles que não a possuíam. Outro aluno comentou</p><p>que conhecia um morador que não possuía RG até aos 45 anos de</p><p>idade. Para encerrar salientou a importância do mesmo (DIÁRIO DE</p><p>CAMPO, 15/10/12).</p><p>Na resolução de problemas matemáticos percebi a utilização de</p><p>nomes dos próprios alunos e situações de sua rotina. Por exemplo:</p><p>"Fulana tem 12 balas. Ela quer distribuí-las igualmente entre suas 2</p><p>irmãs. Quantas balas receberá cada irmã de Fulana?" (DIÁRIO DE</p><p>CAMPO, 07/11/12).</p><p>Para desenvolver os conteúdos "linhas paralelas", "pintura</p><p>policromática" e "composição figurativa", a professora exemplificou</p><p>desenhando no quadro negro uma paisagem estereotipada com</p><p>elementos do meio rural, denominada por ela de "paisagem bucólica"</p><p>(DIÁRIO DE CAMPO, 08/11/12).</p><p>56</p><p>A Ronda da Cidadania se caracteriza pela prestação gratuita de serviços à comunidade carente.</p><p>Iniciativa da Corregedoria-Geral da Justiça, em parceria com diversas instituições. Disponível em:</p><p>Acesso em 28 Nov. 2013.</p><p>http://www.tjrs.jus.br/site/poder_judiciario/tribunal_de_justica/corregedoria_geral_da_justica/projetos/projetos/ronda_da_cidadania.html</p><p>http://www.tjrs.jus.br/site/poder_judiciario/tribunal_de_justica/corregedoria_geral_da_justica/projetos/projetos/ronda_da_cidadania.html</p><p>93</p><p>No entendimento das professoras, há mudança na forma de trabalhar os</p><p>conteúdos ao vivenciarem a docência nesse formato, pois, quando mudam os</p><p>recursos, acreditam que estão inovando suas práticas.</p><p>Cabe lembrar que os conteúdos programáticos são distribuídos em toda a</p><p>rede municipal de ensino pela SMED, como sugestão de assuntos a serem</p><p>desenvolvidos em cada área para assegurar um núcleo comum de conhecimentos</p><p>universalizados, em consonância com o que prevê a legislação nacional57.</p><p>Contudo, seguir a orientação indicada na lei para os currículos escolares</p><p>pressupõe que todas as crianças, que ingressam na escola, trazem os mesmos</p><p>requisitos indispensáveis ao seu desenvolvimento, nos alerta Candau (2012).</p><p>No caso da escola do/no campo, também, é preciso considerar que as</p><p>crianças possuem especificidades próprias do contexto onde vivem, e a escola pode</p><p>representar a única oportunidade de adquirirem as competências para superar as</p><p>causas do subdesenvolvimento rural (PIMENTEL, 2008).</p><p>Na mesma esteira Pérez Goméz (2001) dizia que cabe à escola desenvolver</p><p>sua função instrutiva, preocupar-se com o aperfeiçoamento e a formação do capital</p><p>humano, pois é preciso considerar que grupos sociais menos favorecidos58 terão</p><p>nela o contato com a cultura intelectual. Com o advento da Revolução Industrial e do</p><p>desenvolvimento das tecnologias da comunicação, o fenômeno globalização pode</p><p>ser benéfico (ensinando a pensar), ou maléfico (apenas a reproduzir); isso está</p><p>intimamente ligado ao fazer pedagógico do professor.</p><p>Em se tratando da escola do/no campo e atendendo ao proposto na CF, na</p><p>LDB 9394/96 em seus artigos 1º, 23 e 28, o ensino deve ser contextualizado ao local</p><p>onde a escola está inserida visto que “a educação escolar deverá vincular-se ao</p><p>mundo do trabalho e à prática social”, o calendário escolar “deverá adequar-se às</p><p>peculiaridades locais, inclusive climáticas e econômicas, a critério do respectivo</p><p>sistema de ensino, sem com isso reduzir o número de horas letivas previsto nesta</p><p>Lei” e prevê a obrigatoriedade de adequar o ensino às peculiaridades da vida rural e</p><p>de cada região.</p><p>57</p><p>Conforme o Art. 9º, parágrafo IV, da LDB 9394/96, a União incumbir-se-á de estabelecer, em</p><p>colaboração com os Estados, o Distrito Federal e os Municípios, competências e diretrizes para a</p><p>educação infantil, o ensino fundamental e o ensino médio, que nortearão os currículos e seus</p><p>conteúdos mínimos, de modo a assegurar formação básica comum.</p><p>58</p><p>Como grupos sociais menos favorecidos consideramos, nessa caso, a população rural.</p><p>94</p><p>De certa maneira, desafios que se apresentam aos professores habituados</p><p>às marcas culturais dos centros urbanos, dificultam o desempenho da docência no</p><p>meio rural quanto a contextualizaçao dos conteúdos, por limitações no conhecimento</p><p>das questões referentes ao campo quando desconhecem, por exemplo, a lógica</p><p>agrícola, a criação de animais, as formas de organização do trabalho.</p><p>Talvez seja oportuno lembrar que as professoras pesquisadas estão</p><p>tentando, nas suas práticas de ensino, atender ao prescrito na legislação. Embora</p><p>sejam pessoas bem envolvidas na tentativa de ajustar os conteúdos, isso não vai</p><p>acontecer de modo fácil inclusive porque não é somente ajustar ou não o conteúdo.</p><p>As mudanças requerem uma compreensão do que é ensinar na escola do/no</p><p>campo, numa totalidade. Isso passa por outros aspectos que não é só a tematização</p><p>dos conteúdos.</p><p>Faltam, entretanto, discussões por parte dos órgãos competentes, inclusive</p><p>de iniciativas nas próprias escolas para fundamentar outras alternativas de</p><p>desenvolvimento dos conteúdos. Para romper com o modelo urbanocêntrico</p><p>instalado nessas instituições de ensino, precisam outras iniciativas que não somente</p><p>as professoras preocuparem-se com os conteúdos, mesmo sendo eles, um ponto</p><p>relevante e fundamental.</p><p>Também é preciso dizer que o pouco contato com a comunidade dificulta o</p><p>desempenho da profissão, tornando-se necessário ouvir relatos dos alunos sobre</p><p>questões que envolvem a cultura local, assim como do seu cotidiano.</p><p>Diferentemente acontece com os professores que residem na comunidade, porque,</p><p>ao encerrar seu expediente de trabalho, permanecem envolvidos com os</p><p>acontecimentos e situações típicas do local, inclusive conhecendo as condições</p><p>familiares de muitos alunos.</p><p>As entrevistas revelaram que elas estão atentas às ações e àquilo que os</p><p>alunos relatam. Os dados sobre a cultura local que têm orientado as práticas advêm</p><p>dos próprios estudantes, dos colegas professores, do diretor, dos funcionários que,</p><p>em sua maioria, são residentes na localidade, e dos pais.</p><p>As professoras, contrariando a concepção tradicional que lhe atribuiria o</p><p>papel privilegiado de detentoras do saber, deixam aflorar as conversas e possibilitam</p><p>os debates, problematizando as discussões. São momentos de interação que se</p><p>instalam através de conversas e trocas de informações, nos quais cada um tem a</p><p>95</p><p>oportunidade de expor e refletir a respeito de suas ideias, compartilhando com o</p><p>grupo.</p><p>Nesse caso, a aula transforma-se num "projeto de construção colaborativa</p><p>entre professor e aluno. Envolve o pensar a docência e o agir, mas também implica</p><p>desvelar o novo e enfrentar o imprevisto", como considera Veiga (2008, p. 8). A</p><p>proposta didática que perpassa essas aulas se ancora nas ideias da autora, quando</p><p>explica que a aula é uma interlocução de sujeitos, porque nela acontece a</p><p>comunicação entre os envolvidos. Estas trocas de conhecimentos entre os alunos,</p><p>alunos e professor, devem ser mediadas com respeito e segurança, dentro de um</p><p>ambiente alegre, harmonioso e amoroso. O estar juntos fisicamente é importante</p><p>para estreitar a relação entre professor e aluno, para: conhecer-se, criar elos,</p><p>desenvolver a amizade, confiança e afeto.</p><p>Freire esclarece que:</p><p>Uma das tarefas mais importantes da prática educativo-crítica é</p><p>propiciar as condições em que os educandos em suas relações uns</p><p>com os outros e todos com o professor ou a professora ensaiam a</p><p>experiência profunda em assumir-se. Assumir-se como ser social e</p><p>histórico, como ser pensante, comunicante, transformador, criador,</p><p>realizador de sonhos, capaz de ter raiva porque capaz de amar.</p><p>Assumir-se como sujeito porque capaz de reconhecer-se como</p><p>objeto (1996, p. 41).</p><p>Ao mesmo tempo que o professor coordena as interações entre os alunos</p><p>quando relatam suas descobertas, socializam suas dúvidas, trazem para a sala de</p><p>aula as suas "novidades", seleciona as informações para compor o seu rol de</p><p>conhecimento acerca do modo de vida da comunidade.</p><p>Quanto mais conhecimento detém sobre seu aluno e reconhece nele uma</p><p>fonte inesgotável de informações, mais subsídios o educador terá para fazer as</p><p>adaptações e relações com o conteúdo que precisa desenvolver, porque, de acordo</p><p>com Freire, é escutando que se aprende a falar com eles (1996). Esse entendimento</p><p>que as professoras possuem demonstram que têm consciência do seu papel como</p><p>ouvinte.</p><p>A busca das professoras por informações sobre a cultura local comprova a</p><p>falta de conhecimento sobre o campo, confirmando o que dizem os autores59 sobre</p><p>59</p><p>A esse respeito podemos consultar estudos de Brandão (1996), Baptista (2003), Ramos; Moreira;</p><p>Santos (2004) e Arroyo (2007).</p><p>96</p><p>os problemas especialmente da escola rural e dos professores que nela atuam.</p><p>Grande parte advém da zona urbana e são alheios àquela cultura.</p><p>A dificuldade de identificar-se com o contexto local também é descrita por</p><p>Pérez Gómez (2001):</p><p>Os docentes não se sentem participantes de um projeto coletivo,</p><p>nem responsáveis, portanto, de seus resultados, suas</p><p>responsabilidades começam e terminam em sua própria sala de aula,</p><p>e nem sequer são assumidas plenamente porque, na sala de aula,</p><p>incidem fatores que lhes são alheios e sobre os quais não têm</p><p>capacidade de decisão (p. 299).</p><p>Embora o autor tenha desenvolvido pesquisas com professores que atuam</p><p>na periferia urbana, esta condição não é diferente para o professor oriundo da zona</p><p>urbana, atuando no contexto rural.</p><p>A forma de pensar deve encaminhar a educação para um fazer coletivo em</p><p>permamente construção, e isso nos remete a uma mudança de paradigmas que</p><p>fundamente a construção de uma nova proposta educacional com vistas ao futuro.</p><p>Não é concebível que o professor contente-se em cumprir, apenas, o ritual</p><p>da vida na escola, abdicando da sua condição essencial que é de ser um educador</p><p>pensante, inovador e compromissado politicamente. Ele deve estar preparado para</p><p>mudanças.</p><p>5.3 O processo de adaptação das professoras no contexto rural</p><p>Comumente costuma-se dizer que o ato da mudança é complexo e exige</p><p>aceitação e adaptação do sujeito frente às possibilidades inerentes à nova</p><p>experiência. Na hora da mudança, o indivíduo carrega consigo muitas expectativas e</p><p>esperanças em relação ao novo.</p><p>O homem, como um ser sociável, ao mudar, adapta-se aos mais diversos</p><p>ambientes, hábitos e culturas. Saber mudar e conseguir se adaptar são exercícios</p><p>que ocupam etapas da vida. A adaptação a um novo contexto configura-se num</p><p>processo contínuo e evolutivo que reescreve o texto da estória de vida. Nesses</p><p>momentos, a criatividade e o bom senso podem ser virtudes aliadas.</p><p>Sobreviver a esse processo prescinde aprender a lidar com inúmeras</p><p>informações e, principalmente, gerenciar as situações decorrentes das mudanças,</p><p>97</p><p>pois, muitas vezes, elas acabam tornando-se um desafio a ser enfrentado. Por terem</p><p>dimensões diferentes, as mudanças são capazes de desencadear processos</p><p>diversos e causar efeitos singulares a cada indivíduo. Para Brunet (1995, p. 132), "o</p><p>ser humano age constantemente de acordo com o seu ambiente, construindo um</p><p>repertório de base que lhe permite equilibrar os seus comportamentos", portanto,</p><p>atingir o equilíbrio é fundamental. Nesse equilíbrio entre adaptação e mudança, o</p><p>sujeito vai se constituindo.</p><p>Teoricamente a palavra "adaptação" é um conceito que pode ser encontrado</p><p>em diversos campos da ciência. Resumidamente, apresentamos três exemplos. No</p><p>âmbito da Sociologia, o vocábulo está relacionado a evolução do homem. Conforme</p><p>definição em Dicionário da Sociologia60, numa visão ampla,</p><p>significa o ajustamento biológico do ser humano ao ambiente físico</p><p>em que vive. Pode também ser aplicada à vida em sociedade, que</p><p>ocasiona o surgimento de certo denominador comum entre os</p><p>componentes de uma sociedade particular, certo grau de adesão e</p><p>conformidade às normas estabelecidas, que varia com a margem de</p><p>liberdade e de autonomia que o meio social permite ao indivíduo</p><p>(DICIONÁRIO DE SOCIOLOGIA).</p><p>Em estudos sobre a construção da inteligência no homem e aprendizagem,</p><p>desde a infância até a fase adulta, Piaget (1991) considera o termo no sentido do</p><p>desenvolvimento biológico do ser humano. Para esse autor "adaptação é um</p><p>processo de transformação desencadeado pelo organismo visando a sua</p><p>conservação no meio em que vive". O autor pondera que o processo de "adaptação</p><p>intelectual é um equilíbrio progressivo" que passa por outros dois processos – de</p><p>assimilação e de acomodação – e ocorre quando há equilíbrio entre eles (p. 13).</p><p>Na perspectiva teórica freiriana existe distinção entre os conceitos de</p><p>adaptação e de inserção: “Adaptação implica o esforço do ser humano em mudar-se</p><p>para viver no mundo como ele é” e “Inserção implica a intervenção de homens e</p><p>mulheres no mundo, para transformá-lo”, sintetiza Vale (2005, p.25). Ambos</p><p>conceitos, no entender de Freire (1967 e 1979), estão atrelados às concepções de</p><p>homem e de mundo. Para ele o homem é "um ser no mundo e com o mundo" (1967,</p><p>p. 124), um indivíduo apto a apreciar o mundo objetivando-o e transcendendo-o</p><p>60</p><p>Disponível em: Acesso em 13 Nov.</p><p>2013.</p><p>98</p><p>através da sua consciência crítica, transformando-se em sujeito - inserido – não</p><p>mantendo sua condição de objeto – adaptado (FREIRE, 1967).</p><p>Para tanto, o homem precisa ultrapassar a posição ingênua, resultante de</p><p>estar no mundo, adaptado, acomodado ou ajustado. Na posição crítica, o homem</p><p>encontra-se integrado com a realidade. Por essa razão a conscientização implica em</p><p>estar à frente da realidade assumindo uma posição epistemológica, como sugere</p><p>Freire (1979):</p><p>Quanto mais conscientização, mais se “desvela” a realidade, mais se</p><p>penetra na essência fenomênica do objeto, frente ao qual nos</p><p>encontramos para analisá-lo. [...] A conscientização não pode existir</p><p>fora da “práxis”, ou melhor, sem o ato ação – reflexão. Esta unidade</p><p>dialética constitui, de maneira permanente, o modo de ser ou de</p><p>transformar o mundo que caracteriza os homens (p. 15).</p><p>No caso dessa pesquisa, entendemos que a instituição escola e professores</p><p>necessitam desenvolver trabalho baseado numa relação que propicie o alcance</p><p>da</p><p>consciência crítica.</p><p>Diz Brunet (1995, p. 133), que "o clima organizacional tem um efeito directo</p><p>e determinante sobre a satisfação e o rendimento dos membros" logo, o ambiente</p><p>escolar deve ser marcado por um clima estimulante e profícuo para o</p><p>desenvolvimento pessoal e profissional, de produção através da realização de</p><p>atividades que beneficiem a todos que ali estabelecem uma rotina. Para esse autor,</p><p>"é óbvio que um clima que permite a uma pessoa expandir-se e desenvolver-se é</p><p>mais susceptível de produzir uma visão positiva da instituição" e, também,</p><p>contribuirá para minimizar os contratempos inerentes ao processo de adaptação.</p><p>Ainda sobre o clima organizacional encontrado nas escolas, Brunet (1995, p.</p><p>128), apoiado em Fox (1973, p. 5-6), descreve o seguinte:</p><p>O clima de uma escola resulta do tipo de programa, dos processos</p><p>utilizados, das condições ambientais que caracterizam a escola como</p><p>uma instituição e como um agrupamento de alunos, dos</p><p>departamentos, do pessoal e dos membros da direcção. Cada escola</p><p>possui o clima próprio. O clima determina a qualidade de vida e a</p><p>produtividade dos docentes e dos alunos. O clima é um factor crítico</p><p>para a saúde e para a eficácia de uma escola. Para os seres</p><p>humanos, o clima pode ser um factor de desenvolvimento.</p><p>99</p><p>Sob essa ótica, o clima de uma organização escolar reproduz uma série de</p><p>características relativamente permanentes que:</p><p>a) diferenciam uma dada organização, podendo considerar-se que</p><p>cada escola é suscetível de possuir uma personalidade própria, um</p><p>clima específico; b) resultam dos comportamentos e das políticas dos</p><p>membros da organização, especificamente da direcção, uma vez que</p><p>o clima é causado pelas variáveis físicas (estrutura) e humana</p><p>(processo); c) são percepcionadas pelos membros da organização;</p><p>d) servem de referência para interpretar uma situação; pois os</p><p>indivíduos respondem às solicitações do meio ambiente de acordo</p><p>com a sua percepção do clima; e) funcionam como um campo de</p><p>força destinado a dirigir as actividades, na medida em que o clima</p><p>determina os comportamentos organizacionais (BRUNET, 1995, p.</p><p>126).</p><p>Sendo assim, as estruturas organizacionais ditam um local de trabalho</p><p>padronizado e singular, pois cada escola possui suas marcas, que vão além das</p><p>características arquitetônicas e dos aspectos sociais e econômicos da comunidade</p><p>escolar, quanto à atmosfera, o clima e a cultura local (BRUNET, 1995). As</p><p>referências recebidas pelo professor sobre o ambiente de trabalho vão refletir na</p><p>impressão inicial sobre a escola, menciona o autor.</p><p>O pensamento da Professora E vai ao encontro do que explica Brunet</p><p>(1995). Disse ela que toda e qualquer instituição deve estar preparada para receber</p><p>o seu professor, o seu funcionário, o seu aluno e orientá-lo sobre aquele espaço por</p><p>conta da educação, da diplomacia, da recepção.</p><p>Em se tratando deste estudo, particularmente, os sujeitos pesquisados</p><p>encontram-se cercados por um grupo de pessoas, com jeitos e culturas diferentes,</p><p>também, diante de um novo ambiente profissional com estrutura organizacional que</p><p>possui alguns aspectos diferentes dos quais está habituado. Adentrar nesse novo</p><p>ambiente e adaptar-se é um enfrentamento inerente ao processo de inserção61 do</p><p>qual estamos versando.</p><p>Caberá, ao ingressante, chegar ao novo ambiente, saber adaptar-se para</p><p>melhor conviver, fazer escolhas que permitam ter um sentimento de segurança,</p><p>realização pessoal e profissional no novo espaço. Naturalmente, crises de</p><p>instabilidade emocional e afetiva poderão fazer parte desse período, mas a maneira</p><p>61</p><p>Utilizamos o termo inserção no sentido literal da palavra, como: "Ação ou resultado de inserir-se)".</p><p>Decorrente do termo inserir cujo significado utilizado é: "Passar a ocupar um lugar estabelecido em;"</p><p>Disponível em: Acesso em 17 ago. 2013.</p><p>http://aulete.uol.com.br/</p><p>100</p><p>como cada um decorar o seu espaço será uma reflexão sobre a sua ação</p><p>profissional.</p><p>O que se tem comprovado é que o domínio do conhecimento acadêmico</p><p>apreendido nas instituições responsáveis pela formação docente não é garantia de</p><p>um desempenho sem dificuldades. Não estamos falando somente sobre os aspectos</p><p>pedagógicos que cercam a docência, mas em outras demandas que vão se</p><p>apresentando no decorrer da profissão, como desempenhar suas funções em</p><p>diferentes contextos, saber lidar com questões burocráticas da escola, conhecer e</p><p>contribuir com os projetos e propostas de cada institução, por exemplo.</p><p>Como sugeriu a Professora E, a equipe diretiva deveria explicar aos</p><p>professores que estão chegando as normas de funcionamento da escola, porque,</p><p>conforme suas palavras: esse acolhimento seria algo importante que a escola</p><p>fizesse para facilitar, de certa forma, o trabalho do professor e o engajamento dele.</p><p>É preciso salientar que a falta de acolhimento pedagógico não ocorre apenas em</p><p>escolas da zona rural. A escola do/no campo possui um público diferenciado, como</p><p>já apontamos anteriormente, e talvez isso exija outro tipo de orientação para os</p><p>professores que nela se inserem.</p><p>Inúmeras vezes, infelizmente, por falta de uma orientação adequada</p><p>acontece que os professores são lançados dentro de uma escola rural ou urbana</p><p>[...]. Nós vamos tateando, observando, percebendo como são as coisas e fazendo</p><p>nosso próprio julgamento a partir disso, salientou a Professora E.</p><p>Em geral, através de conversas informais e das entrevistas, pudemos</p><p>perceber que a forma como foram acolhidas no espaço escolar foi marcada por</p><p>respeito e atenção. Falas como estas retrataram a acolhida: [...] eu cheguei aqui e</p><p>me senti, super bem acolhida, super em casa; [...] fui bem recepcionada, fui levada e</p><p>apresentada às turmas e, prontamente, iniciei meu trabalho, relataram as</p><p>professoras B e D, respectivamente.</p><p>No entanto, é importante considerar que, além da acolhida, o processo de</p><p>inserção exige a presença de um apoio contínuo aos professores. É um suporte</p><p>técnico e pedagógico que contribui para assessorar os profissionais que estão</p><p>chegando num contexto com singularidades específicas e que diferem dos demais</p><p>experimentados pelos professores, em escolas na zona urbana.</p><p>101</p><p>A escola pesquisada conta com uma equipe diretiva composta por diretor e</p><p>coordenadores pedagógicos. São a esses gestores que as entrevistadas recorrem</p><p>na busca do apoio pedagógico. Aqui na escola não tem uma separação entre diretor</p><p>e coordenador pedagógico. Ambos fazem tudo, misturam muito os papéis, disse a</p><p>Professora D.</p><p>O diretor está há mais de duas décadas na escola e atuou em várias</p><p>funções/cargos. O conhecimento que adquiriu ao longo desse período confere certo</p><p>grau de poder e segurança em suas ações/decisões. Porém, as coordenadoras que,</p><p>atualmente ocupam o cargo, são professoras recentemente eleitas e que estão se</p><p>ambientando a essa nova função.</p><p>Além do apoio recebido da equipe diretiva, foi possível perceber que, em</p><p>situações específicas, elas encontram outros suportes de assessoria entre os</p><p>colegas, como expôs a Professora G: [...] eu pergunto para as professoras que já</p><p>moram aqui, como é que é, como é que não é, como é que funciona tal coisa que eu</p><p>quero saber, pra depois colocar no meu planejamento. Há uma troca de informações</p><p>e, também, com a orientação da psicopedagoga que atua na sala de recursos</p><p>multifuncional62, como exemplificou a Professora F: [...] Quando eu tenho uma</p><p>dificuldade na questão pedagógica com a criança, eu divido alguma coisa com a</p><p>professora do AEE [...].</p><p>Uma condição de fragilidade encontrada pelas professoras são as lacunas</p><p>deixadas pelos cursos de formação docente, sobretudo quanto aos conhecimentos</p><p>relativos ao campo. As palavras da Professora D foram que:</p><p>[...] para mim, apoio pra entrar numa escola é ter uma formação para</p><p>o docente.</p><p>É uma coisa que eu não tive. [...] Entrei na sala de aula,</p><p>sem ter alguma coisa que eu acho fundamental: que é um</p><p>conhecimento de realidade do mundo desses alunos [...] Então eu</p><p>não posso te dizer que eu tive alguma formação pedagógica que</p><p>tenha me embasado.</p><p>Lopes63 (2012) reafirma o conteúdo da fala da Professora D em seus</p><p>estudos. A carência teórico-metodológica para trabalhar com os conhecimentos do</p><p>62</p><p>Sala de recursos multifuncionais são espaços físicos localizados nas escolas públicas onde se</p><p>realiza o Atendimento Educacional Especializado - AEE. Disponível em:</p><p>Acesso em 13 set. 2013.</p><p>63</p><p>Em sua dissertação, o autor relata os desafios inerentes à construção da docência em Educação</p><p>Física na zona rural, a partir da reflexão do seu percurso formativo e do processo de construção do</p><p>Projeto Político-Pedagógico das escolas do campo de Ivoti/RS.</p><p>http://www.assistiva.com.br/aee.html</p><p>102</p><p>campo faz com que o professor seja lançado bruscamente num meio desconhecido.</p><p>Assim sendo, há grande probabilidade de que ele reproduza os conteúdos de forma</p><p>descontextualizada, independente do local onde a escola está inserida, como</p><p>referenciou a Professora D.</p><p>Por outro lado, iniciativas dos órgãos competentes pela educação deixam</p><p>lacunas, também, quando não há continuidade dos programas e/ou projetos de</p><p>formação continuada para os professores, como disse a Professora B:</p><p>[...] Nós já participamos dos encontros rurais e a gente sempre</p><p>coloca questionamentos, mas até ter as respostas é outra</p><p>conversa.[...] se há uma maneira de trabalhar que seja melhor para</p><p>eles enquanto alunos de escola rural, eu ainda não obtive essa</p><p>resposta. [...] O anseio que a gente tem é que alguém nos instrua,</p><p>nos guie como trabalhar com essas realidades [...] nunca alguém nos</p><p>falou, nos abriu algum caminho, abriu os olhos para alguma coisa.</p><p>A troca de experiências e a partilha de saberes consolidam espaços de</p><p>formação mútua, nos quais cada professor é chamado a desempenhar,</p><p>simultaneamente, o papel de um formador e de formando, no entanto, em geral,</p><p>essas iniciativas precisam ser efetivas e contínuas.</p><p>Diante do exposto, decorre a necessidade de o educador ter conhecimento</p><p>teórico-metodológico, além de poder apreender acerca da condição de vida do</p><p>público que irá atender. É nesse emaranhado que o professor vai desenvolvendo a</p><p>docência e procurando a sua integração com o meio. Portanto, conhecer a</p><p>realidade, seja ela qual for, é fundamental para o bom desempenho profissional da</p><p>educação, porque o objetivo maior do ensino é alcançar a eficácia da sua ação, ou</p><p>seja, a aprendizagem de seu aluno.</p><p>103</p><p>6 Conclusão</p><p>Partindo da análise das entrevistas dos professores urbanos que atuam no</p><p>contexto rural, creditamos a eles uma contribuição para o entendimento da realidade</p><p>investigada, considerando que essas experiências forneceram subsídios para</p><p>melhor compreendermos o processo que vivem esses profissionais da educação</p><p>quando adentram nas escolas do/no campo.</p><p>Inicialmente, tentaram imprimir dinâmica pedagógica semelhante à qual</p><p>estavam habituadas no contexto urbano. Aos poucos, perceberam o quão complexo</p><p>é entender o modo de vida rural e, ao mesmo tempo, manifestaram preocupação</p><p>com o ensino que desenvolvem. Na oportunidade expressaram o sentimento de que</p><p>lhes falta conhecimento na qualificação da docência para atuar na escola do/no</p><p>campo.</p><p>As entrevistadas deixaram transparecer, também, dúvidas e angústias no</p><p>desenvolvimento das atividades docentes ao se depararem com a nova realidade,</p><p>pois sentem-se despreparadas e com pouco subsídios sobre as peculiaridades do</p><p>campo. Denotam que o trabalho não está sendo desempenhado adequadamente</p><p>como almejam, porque a realidade rural é muito diversa daquela que encontram no</p><p>centro urbano e têm noção de que as orientações da legislação e da teoria</p><p>defendem o ensio adequado ao contexto.</p><p>Isso significa dizer que, quando tratamos sobre o apoio, entendemos que,</p><p>nesse bojo, está incorporado todo tipo de orientação que um recém-chegado</p><p>necessita receber ao adentrar no novo espaço de trabalho, como forma de</p><p>acolhimento, mas também aquelas que fazem parte de um acompanhamento ao</p><p>longo do processo de adaptação. Compete, principalmente, aos coordenadores</p><p>pedagógicos da instituição orientar esse novo professor, instrumentalizando-o.</p><p>104</p><p>Considerando-se que o ensino na zona rural vive desafios históricos no</p><p>sentido de reduzir as intensas desigualdades e precariedade do acesso à educação</p><p>escolar, de ter uma escola vinculada à história, à cultura e às causas sociais e</p><p>humanas dos sujeitos do campo e que não seja mais como um apêndice da escola</p><p>urbana, ainda há mudanças a serem feitas. A escola pesquisada não foge a essa</p><p>regra, tendo em vista que obedece, por exemplo, o mesmo horário, calendário e</p><p>conteúdo que uma escola da cidade.</p><p>Em geral, os conteúdos, assim como o trabalho pedagógico, fazem parte de</p><p>um currículo oficial balizado pelo modelo urbanocêntrico, e as diferenças peculiares</p><p>apresentadas pelo contexto pouco fazem parte do planejamento das professoras,</p><p>resumindo-se a algumas tentativas de tematização dos conteúdos, levando em</p><p>consideração as expressões dos alunos.</p><p>Os indícios apontados para possíveis adequações nesse quadro são</p><p>algumas iniciativas por parte das professoras que valorizam a troca de informações</p><p>com os educandos, possibilitando-lhes conhecer um pouco mais sobre a realidade</p><p>dos discentes, bem como a utilização de temas transversais que contribuem para o</p><p>desenvolvimento de debates.</p><p>No entanto, são atitudes isoladas, colaborando com o estabelecimento de</p><p>uma rotina docente na qual o fazer pedagógico acaba assumindo caráter muitas</p><p>vezes solitário, conforme sua disciplina. Mesmo que em alguns momentos informais</p><p>as professoras dialoguem entre si, esse isolamento acaba dificultando o trabalho</p><p>coletivo e colaborativo.</p><p>A troca entre os pares é imprescindível. Sem ela, não vislumbramos</p><p>possibilidades de efetivação de um projeto de escola do/no campo, pois se as</p><p>diferenças culturais entre professores urbanos e rurais permanecerem, ele se</p><p>fragiliza e não se efetiva. As diferentes culturas precisam conversar entre si,</p><p>considerando-se o envolvimento de toda a comunidade escolar.</p><p>A problemática para concatenar os conteúdos trabalhados aliados aos</p><p>saberes dos alunos e as raízes culturais que cada um carrega são fatores</p><p>intervenientes no desempenho da docência, porque as professoras não têm</p><p>conhecimento da rotina do homem rural e de questões familiares que determinam os</p><p>hábitos e costumes dos educandos.</p><p>105</p><p>As docentes avaliaram que há uma deficiência enraizada na academia, nos</p><p>cursos de formação inicial de professores e, também, nas iniciativas de formação</p><p>continuada, em relação ao trabalho com a educação no meio rural. Essa situação,</p><p>pela ótica das entrevistadas, permite eximirem-se da responsabilidade pelas</p><p>deficiências na docência por acreditarem que estão produzindo o seu melhor.</p><p>Outrossim, entendem que precisam ter conhecimento da localidade e</p><p>também formação específica que as ajude a pensar formas para lidar com o</p><p>inusitado.</p><p>Apesar dos programas de qualificação profissional, lançados pelo governo,</p><p>percebemos que os investimentos são baixos. Acreditamos que, através da</p><p>implantação de proposta que invista na formação continuada dos professores,</p><p>poder-se-á estimular a motivação, o interesse e o envolvimento de professores na</p><p>construção de novos saberes.</p><p>Dentro dessa conjuntura podemos pensar nas possibilidades que a própria</p><p>escola tem de propiciar espaços/tempos de formação, considerando-se que os</p><p>professores que trabalham no campo possam refletir coletivamente sobre sua práxis</p><p>e aspectos da escola, na</p><p>pretensão de fortalecer o processo educativo realizado na</p><p>instituição.</p><p>Notamos que pouca ou nenhuma ênfase é dada à necessidade de</p><p>acompanhamento ao professor recém-chegado para possibilitar/facilitar uma futura</p><p>inserção desse profissional. Para isso, devem ocorrer mudanças significativas na</p><p>estrutura organizacional das escolas. Em geral, quando as professoras são</p><p>recepcionadas, recebem algumas informações limitadas, breves e esparsas,</p><p>demonstrando que a orientação das equipes diretivas parte do pressuposto de que</p><p>os professores têm status de competência, como se fossem autosuficientes para</p><p>atender à demanda, ou seja, entrar em sala de aula e ensinar. De certa maneira,</p><p>essa pressuposição possui coerência, entretanto, é fundamental apresentar-lhes um</p><p>panorama ampliado da nova realidade.</p><p>O estudo também nos faz pensar que, se os princípios que norteiam as</p><p>escolas do/no campo atentarem para a inclusão da população rural na condição de</p><p>protagonistas na construção de uma sociedade participativa e que possua</p><p>compromisso com a vida, a escola será um ambiente apropriado para conservar viva</p><p>a memória dos povos, valorizando saberes e as suas expressões culturais.</p><p>106</p><p>Porém, para que esse projeto se efetive, a escola necessita estar presente</p><p>na vida da comunidade, não como uma instituição fechada em si, mas aberta às</p><p>questões e às causas da sua população, defendendo as demandas locais e</p><p>contribuindo para o exercício da cidadania.</p><p>Portanto, este estudo, ao mesmo tempo que contribui para o nosso</p><p>desenvolvimento pessoal e profissional, serve para ampliar conhecimentos sobre a</p><p>realidade da escola do/no campo. Também afirma que há necessidade de pensar</p><p>estratégias de acolhimento, no âmbito restrito da escola e de formação inicial e</p><p>continuada, que podem acontecer dentro ou fora dela, para os professores que irão</p><p>atuar e/ou atuam no ambiente rural.</p><p>Sem pretendermos esgotar o assunto, é preciso considerar que este estudo</p><p>não se encerra aqui, porque compreendemos que o conhecimento é mutável e</p><p>passível de avanço. Nosso desejo é que esta pesquisa sirva como subsídio para que</p><p>futuros pesquisadores e colegas professores lancem olhares sobre esse foco,</p><p>assumindo caráter de trabalho solidário e encontrando eco entre outros espaços em</p><p>prol da Educação do/no campo e da formação dos professores.</p><p>Em vista disso, uma importante contribuição resultante da pesquisa foi a</p><p>percepção de que a organização escolar deve tomar para si a responsabilidade no</p><p>papel do desenvolvimento do currículo, associado ao acolhimento e à formação no</p><p>exercício da docência, possibilitando o diálogo permanente entre comunidade e</p><p>escola visando a garantia de trabalho adequado no ensino do/no campo. Portanto,</p><p>os gestores da escola devem permanecer alertas à essa demanda.</p><p>Nosso propósito com esta discussão é que sirva como estímulo às</p><p>entrevistadas para que reflitam sobre si e seu protagonismo, tendo em vista que é</p><p>pertinente pensar em alternativas para lidar com o diferente e desenvolver sua</p><p>prática pedagógica de modo a articular os conteúdos escolares com assuntos ou</p><p>experiências do cotidiano dos alunos rurais e não apenas tematizá-los.</p><p>Por fim, notamos, diante das análises deste trabalho, o gosto das</p><p>professoras pela docência o que, claramente, ficava evidenciado nas expressões,</p><p>nas falas, nos gestos e na atitude carismática no espaço escolar. Concluímos,</p><p>então, que a inserção do professor urbano na escola do/no campo não acontece,</p><p>mas, sim, a adaptação a esse meio. Talvez seja difícil, que a inserção aconteça</p><p>107</p><p>porque esse professor sempre será um forasteiro ou um estrangeiro no ambiente</p><p>rural.</p><p>Precisamos dizer, ainda, que, acima de tudo, acreditamos que educar para a</p><p>cidadania é a utopia daqueles que consideram a educação a sua trincheira, embora</p><p>dependa de que ela seja assumida por todos e, assim, consigamos construir um</p><p>projeto de escola do/no campo que valorize o indivíduo e sua dignidade.</p><p>108</p><p>Referências</p><p>ADAPTAÇÃO. In Dicionário de Sociologia. Disponível em:</p><p>Acesso em 13 Nov.</p><p>2013.</p><p>AMARAL, MARIA T. M.. Políticas de habilitação de professores leigos: a</p><p>dissimulação da inocuidade. In: BRASIL, Ministério da Educação, Secretaria</p><p>Nacional de Educação Básica. Professor Leigo: institucionalizar ou erradicar?</p><p>São Paulo: Cortez; Brasília: SENEB; Caderno 3, 1991. p. 37-83.</p><p>ANTUNIASSI, Maria H. R. Trabalhador Infantil e Escolarização no Meio Rural.</p><p>Rio de Janeiro, Zahar Editores S.A. 1983.</p><p>ARROYO, Miguel G.. Escola, Cidadania e Participação no Campo. In: Em Aberto.</p><p>Brasília, Ano 1, nº 9 set-1982.</p><p>__________________. Imagens quebradas: Trajetórias e tempos de alunos e</p><p>mestres. Petrópolis, RJ: Vozes, 2004.</p><p>_________________. Políticas de formação de educadores(as) do campo.</p><p>Campinas: Caderno Cedes, vol. 27, n. 72, p. 157-176, maio/ago. 2007 Disponível</p><p>em Acesso em 30 abr. 2008.</p><p>ARROYO, Miguel G.; CALDART, Roseli S.; MOLINA, Mônica C. (orgs.). Por uma</p><p>Educação do Campo. Petrópolis, RJ: Vozes, 2004.</p><p>ARROYO, Miguel G.; FERNANDES, Bernardo M.. A Educação Básica e o</p><p>Movimento Social no Campo (coleção Por uma Educação Básica do Campo).</p><p>Brasília, DF: Articulação Nacional por uma Educação Básica do Campo, v. 2, 1999.</p><p>BACKHEUSER, Everardo. O professor. Rio de Janeiro: Livraria Artes Gráficas</p><p>Indústrias Reunidas (AGIR) Editora, 1946.</p><p>BAGLI, Priscila. Rural e urbano: harmonia e conflito na cadência da contradição. In:</p><p>SPOSITO, Maria E. B.; WITACKER, Arthur M. (Orgs). Cidade e campo: relações e</p><p>contradições entre urbano e rural. São Paulo: Expressão Popular, 2006.</p><p>BAPTISTA, Francisca M. C. Educação Rural: das experiências à política pública.</p><p>NEAD/ CNDRS/MDA. Brasília: Editorial Abaré, 2003</p><p>BARDIN, Laurence. Análise de conteúdo. Lisboa: Edições 70, 1977.</p><p>BOGDAN, Robert; BIKLEN, Sari. Investigação qualitativa em educação: uma</p><p>introdução à teoria e aos métodos. Porto: Ed. Porto, 1994.</p><p>http://www.cedes.unicamp.br/</p><p>109</p><p>BRANDÃO, Carlos R. A relação entre a cultura do campo e a escola rural. São</p><p>Paulo: FTD, 1996.</p><p>BRASIL. Lei de Diretrizes e Bases para o ensino de 1° e 2º graus. De 11 de</p><p>agosto de 1971.</p><p>______. Lei de Diretrizes e Bases da educação nacional . De 20 de dezembro de</p><p>1996.</p><p>______. Parecer nº 23/2007. Brasília: MEC/SECAD, 2007.</p><p>BRUNET, Luc. Clima de trabalho e eficácia da escola. In: NÓVOA, António (coord.).</p><p>As organizações escolares em análise. 2. ed. Lisboa: Don Quixote, 1995,</p><p>CALAZANS, Maria J. C.. Para compreender a educação do Estado no meio rural –</p><p>traços de uma trajetória. In: THERRIEN, Jacques e DAMASCENO, Maria Nobre</p><p>(coord.). Educação e Escola no Campo. Campinas, Papirus. 1993. p. 15-40.</p><p>CANDAU, Vera M. (org.). Rumo a uma nova didática. 22. ed. Petrópolis, RJ:</p><p>Vozes, 2012.</p><p>CARNEIRO, Maria J. T. “Rural” como categoria de pensamento. Ruris, Vol 2, nº 1,</p><p>Março de 2008. Disponível em</p><p>Acesso em 01</p><p>set. 2013.</p><p>CNE. Resolução CNE/CEB 1/2002. Diário Oficial da União, Brasília, 9 de abril de</p><p>2002. Seção 1, p. 32. Disponível em</p><p>Acesso em 26 set.</p><p>2013.</p><p>___. Resolução CNE/CEB 2/2008. Diário Oficial da União, Brasília, 29 de abril de</p><p>2008. Seção 1, p. 25-26. Disponível em</p><p>Acesso em 26 set.</p><p>2013.</p><p>DAMASCENO, Maria N.; BESERRA, Bernadete. Estudos sobre a educação rural</p><p>no Brasil: estado da arte e perspectivas.</p><p>Acesso em 13 nov. 2006.</p><p>Dicionário online Caldas Aulete. Disponível em</p><p>.</p><p>FERNANDES, Bernardo M..</p><p>27</p><p>3.5.1 A escola campo da pesquisa ...................................................... 31</p><p>3.6 Sujeitos da pesquisa ...................................................................</p><p>36</p><p>4 Fundamentação teórica ............................................................... 39</p><p>4.1 A educação no contexto rural brasileiro: um breve recorrido</p><p>aos períodos que marcaram a Educação rural e a Educação</p><p>do/no campo ................................................................................</p><p>39</p><p>4.1.1 Os discursos e os projetos para a Educação rural no Brasil</p><p>entre as décadas de 1920/1970 ..................................................</p><p>42</p><p>4.1.2 Os discursos e os projetos para a Educação do/no campo:</p><p>1980 até os dias atuais ................................................................</p><p>48</p><p>4.2 Uma instituição chamada escola ................................................ 55</p><p>16</p><p>4.2.1 A escola: sua origem e representações ..................................... 56</p><p>4.2.2 A escola no contexto rural/do campo ........................................ 59</p><p>4.3 Os professores: quem são eles e como se fazem .................... 64</p><p>4.3.1 (In) suficiências da formação dos professores da zona rural ...</p><p>69</p><p>5 Docência na escola do campo: revelando o processo vivido</p><p>por professoras oriundas da zona urbana .................................</p><p>75</p><p>5.1 A troca de contexto de trabalho: do urbano para o rural ......... 75</p><p>5.2 O ensino: o desenvolvimento da prática docente no contexto</p><p>rural ................................................................................................</p><p>87</p><p>5.3 O processo de adaptação das professoras no contexto rural ..</p><p>94</p><p>6 Conclusão .....................................................................................</p><p>101</p><p>Referências ...............................................................................................</p><p>106</p><p>Apêndices ................................................................................................. 114</p><p>Apêndice A Roteiro das entrevistas .................................................. 115</p><p>Apêndice B Pedido de autorização para realização do estudo ...... 118</p><p>Apêndice C Termo de consentimento livre e esclarecido ...............</p><p>119</p><p>Anexos ...................................................................................................... 120</p><p>Anexo A Resolução CNE/CEB 1 de 3 de abril de 2002 ................. 121</p><p>Anexo B Resolução nº 2 de 28 de abril de 2008 ............................ 125</p><p>17</p><p>1 Introdução</p><p>Este estudo procurou dar visibilidade ao processo de adaptação vivido por</p><p>professoras que atuavam em escolas da zona urbana e passaram a atuar em</p><p>escolas do/no campo1.</p><p>No decorrer de 25 anos de docência na zona rural, em escolas da rede</p><p>municipal de ensino em Pelotas (RS), tenho observado alguns movimentos dos</p><p>professores quando se deparam com a realidade da escola do/no campo a partir da</p><p>sua vivência em escolas urbanas. Entender esse movimento e o processo de</p><p>adaptação de professores na escola do/no campo foi o foco do estudo aqui</p><p>apresentado. Esses profissionais manifestaram, por meio de atitudes, comentários,</p><p>encantamentos, expectativas, dúvidas, desafios e angústias, como foram</p><p>construindo suas docências na zona rural.</p><p>Desde a década de 1940, observa-se a expansão do ensino rural no Brasil,</p><p>com o aumento do número de escolas e o consequente aumento do número de</p><p>professores que nelas atuam. Ao longo desse tempo, e acompanhando as</p><p>mudanças impostas pelo novo cenário mundial, várias foram as reformas propostas</p><p>para o ensino na zona rural.</p><p>Atualmente, estamos a assistir a implantação dos preceitos ordenados pela</p><p>Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional, aprovada em 1996, e dos</p><p>documentos dela decorrentes. Nesses documentos, o conceito de campo adquire</p><p>outra conotação, ou seja, passa a ser entendido não mais como a região fora do</p><p>perímetro urbano, mas como uma possibilidade de dinamizar "a ligação dos seres</p><p>1</p><p>A expressão do/no será utilizada para referendar a ideologia rural que está sendo instalada, nos</p><p>últimos anos, no Brasil. A escola está no campo, mas ela precisa pertencer ao campo por isso</p><p>"no/do”. No: o povo tem direito a ser educado no lugar onde vive; Do: o povo tem direito a uma</p><p>educação pensada desde o seu lugar e com a sua participação, vinculada à sua cultura e às suas</p><p>necessidades humanas e sociais (CALDART, 2002).</p><p>18</p><p>humanos com a própria produção das condições da existência social e com as</p><p>realizações da sociedade humana”.</p><p>A centralidade dada à adequação da escola à vida do campo provoca</p><p>reflexões sobre o trabalho desenvolvido pelos professores em sala de aula, pois fica</p><p>sob sua responsabilidade essa adequação através do ensino que ministram. Assim,</p><p>as mudanças pretendidas vinculam-se à prática pedagógica do professor e à</p><p>formação docente.</p><p>Compreendendo que para professores oriundos da zona rural é menos</p><p>complexa a situação de adaptar seu ensino para a realidade que cercam os alunos</p><p>desse contexto, voltamos nosso olhar para aqueles professores que, de certa forma,</p><p>desconhecem a realidade do campo.</p><p>Nesse sentido, houve interesse em compreender, através da pesquisa,</p><p>como ocorre a adaptação de professores que desenvolviam sua docência em</p><p>escolas urbanas e se inserem em escolas do/no campo, para que possamos,</p><p>adiante, compreender como eles poderão adequar seu ensino a essa realidade.</p><p>Assim, desenvolvemos o estudo aqui apresentando que está estruturado em</p><p>capítulos. No primeiro, tratamos sobre a trajetória pessoal e profissional docente</p><p>construída no meio rural. Os caminhos trilhados até aqui justificam a aproximação</p><p>com o objeto de estudo, dando origem para essa tese e outros estudos</p><p>anteriormente desenvolvidos.</p><p>No segundo capítulo, focamos e desenvolvemos as questões que</p><p>constituíram o desenho metodológico da tese. Apresentamos as bases teóricas da</p><p>metodologia da pesquisa qualitativa, os instrumentos utilizados para a coleta dos</p><p>dados, as etapas da pesquisa, a descrição do lócus do estudo e dos sujeitos da</p><p>pesquisa.</p><p>Na sequência, o terceiro capítulo contempla o eixo teórico do trabalho,</p><p>subdividido em 3 subcapítulos com os seguintes temas: 1) A educação no contexto</p><p>rural brasileiro, apresentando breve histórico sobre os discursos e projetos que têm</p><p>orientado as mudanças ocorridas na educação desde a década de 1920; 2) A</p><p>escola, sua origem e representações, com ênfase naquelas localizadas na zona</p><p>rural; 3) Os professores, resgatando sua representação social no contexto das</p><p>pesquisas, suas funções, bem como a formação docente para quem atua em</p><p>escolas rurais.</p><p>19</p><p>Destacamos, no quarto capítulo, a análise dos dados a partir de categorias</p><p>de análise, desvendando os movimentos vividos pelas professoras oriundas da zona</p><p>urbana ao desempenharem suas funções docentes em escola do/no campo.</p><p>Por fim, apresentamos algumas reflexões com base no que a pesquisa</p><p>revelou. Entendemos que, no momento tratamos, como uma conclusão, mas</p><p>reconhecemos a necessidade da continuidade de estudos que contribuam com o</p><p>tema sobre a educação básica nas escolas do/no campo, destacando, em especial,</p><p>a formação e a forma de acolhimento dos docentes que ali venham atuar.</p><p>20</p><p>2 Rompendo fronteiras do rural: reflexos de uma formação continuada</p><p>Estudar e pesquisar a educação nas escolas da zona rural2 faz parte da</p><p>trajetória de minha vida, porque é nessa realidade que nasci, cresci e vivo com a</p><p>família, desenvolvendo atividades como professora e construindo,</p><p>Por uma educação básica do campo. In: ARROYO,</p><p>Miguel G. e FERNANDES, Bernardo M.. A educação básica e o movimento social</p><p>do campo (coleção Por uma Educação Básica do Campo). 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Campinas: Papirus, 2004.</p><p>http://www.contag.org.br/imagens/f299Educacao_do_Campo_e_Desenvolvimento_Sustentavel.pdf</p><p>http://www.contag.org.br/imagens/f299Educacao_do_Campo_e_Desenvolvimento_Sustentavel.pdf</p><p>http://unesdoc.unesco.org/images/0008/000862/086291por.pdf</p><p>http://unesdoc.unesco.org/images/0019/001911/191186POR.pdf</p><p>http://www.dhnet.org.br/direitos/militantes/paulofreire/almanaque_de_paulo_freire.pdf</p><p>http://www.dhnet.org.br/direitos/militantes/paulofreire/almanaque_de_paulo_freire.pdf</p><p>115</p><p>______________________. Aula: gênese, dimensões, princípios e práticas.</p><p>Campinas: Papirus, 2008.</p><p>VEIGA, José E. da. Cidades Imaginárias: o Brasil é menos urbano do que se</p><p>calcula. Campinas: Editora Autores Associados, 2002.</p><p>VIGHI, Cátia S. B.. Professores leigos em escolas rurais: trajetórias de vida</p><p>profissional de um passado (re)visitado. 2008. 133f. Dissertação (Mestrado em</p><p>Educação) – Faculdade de Educação, Universidade Federal de Pelotas, Pelotas.</p><p>ZEN, Elieser. Pedagogia da Terra: a formação do professor sem-terra. 2006.</p><p>Dissertação (Mestrado em Educação) - Universidade Federal do Espírito Santo,</p><p>Vitória. Disponível em</p><p>Acesso em 28 dez. 2011.</p><p>116</p><p>APÊNDICES</p><p>117</p><p>Apêndice A: Roteiro de entrevista</p><p>ROTEIRO DE ENTREVISTA</p><p>Projeto de pesquisa: Inserção de professores em escolas na zona rural:</p><p>expectativas, apoios e desafios.</p><p>Tese: Partimos da premissa de que o processo de inserção dos professores oriundos</p><p>da zona urbana na docência em escola do/no campo é permeado por uma série de</p><p>situações que influenciam nesse processo de mudança de contexto de trabalho. O</p><p>desenvolvimento da docência nesse contexto sócio-cultural diferente daquele ao qual</p><p>estão</p><p>habituados faz com que os professores se deparem com um ambiente desafiador, que</p><p>envolve expectativas, obstáculos, cria impasses, provoca conflitos, causa impacto e exige</p><p>constantes enfrentamentos frente à função social que a escola localizada no contexto rural</p><p>representa na comunidade. Diante do “desconhecimento” da realidade local, esse</p><p>profissional tem menor probabilidade de “dar conta” de um processo de ensino que valorize</p><p>a cultura do aluno.</p><p>Foco: O processo de inserção de professores de escola urbana que passam a atuar</p><p>em escolas na zona rural, deparando-se com um contexto de trabalho diferente do qual</p><p>estão/estavam habituados.</p><p>Sujeitos: Professores que atuavam/atuam em escola urbana e que passam a</p><p>exercer a docência nas escolas na zona rural.</p><p>Entrevistadora: Cátia Simone Becker Vighi</p><p>Instituição de vínculo: Programa de Pós-Graduação em Educação -</p><p>Faculdade de Educação - Universidade Federal De Pelotas</p><p>Data: ............/ ............./ ..............</p><p>PARTE 1:</p><p>1. Dados de identificação e descrição do perfil do entrevistado</p><p>1.1. Nome:</p><p>..............................................................................................................................</p><p>1.2. Endereço:</p><p>..............................................................................................................................</p><p>1.3. Contato:</p><p>..............................................................................................................................</p><p>1.4. Escola:</p><p>..............................................................................................................................</p><p>1.5. Titulação:</p><p>Ensino Médio</p><p>completo. Qual curso?</p><p>Ensino Superior</p><p>completo. Qual curso?</p><p>Pós-Graduação Outra</p><p>E M D</p><p>118</p><p>1.6. Tempo de docência (TD): (número em anos) e Regime de trabalho (RT): (carga</p><p>horária semanal)</p><p>1.7. Atividades que desenvolve na escola:</p><p>Gestão:</p><p>1- direção</p><p>2- coordenação</p><p>pedagógica</p><p>Ensino:</p><p>1- Anos Iniciais do Ens.</p><p>Fundamental</p><p>2- Anos Finais do Ens.</p><p>Fundamental</p><p>Outras</p><p>1.8. Disciplina (s) que desenvolve: (somente para professores que trabalham com</p><p>o ensino)</p><p>( ) Português ( ) História ( ) Geografia ( ) Artes ( ) Ensino Religioso</p><p>( ) Educação Física ( ) Matemática ( ) Ciências</p><p>( ) Língua estrangeira: ( ) Inglês ( ) Francês ( ) Espanhol</p><p>( ) outras.......................</p><p>PARTE 2:</p><p>1) O que te motivou a ingressar em escolas da zona rural?</p><p>2) Tua designação para essa escola em particular foi escolha, convite ou</p><p>nomeação?</p><p>3) Conta-me a experiência que viveste quando assumiste a docência na escola</p><p>rural.</p><p>a) Como tu imaginavas a escola rural? Que representações tinhas do</p><p>mundo e da escola rural? E dos alunos?</p><p>b) Quando começaste a trabalhar na escola da zona rural houve</p><p>alguma(s) forma(s) de apoio que facilitou o teu entrosamento/ ambientação</p><p>nessa escola? Comenta:</p><p>c) Como foi/sentiste a receptividade da comunidade escolar (colegas,</p><p>gestores, alunos e pais) quando começaste a trabalhar nessa escola?</p><p>4) Como é o cotidiano de trabalho na escola da zona rural? Como sentes esse</p><p>cotidiano na tua vida de professora?</p><p>5) Qual é o teu conhecimento da realidade local dessa escola? Há formas ou ações</p><p>organizadas que te favorecem conhecer a realidade do entorno dessa escola, da</p><p>vida social e cultural das famílias dessa comunidade escolar?</p><p>Em zona urbana Em zona rural Observações</p><p>(TD) (RT) (TD) (RT)</p><p>119</p><p>6) A tua participação em eventos como reuniões, festividades, dentre outras,</p><p>interfere ou não no desenvolvimento do teu conhecimento da realidade local</p><p>dessa escola?</p><p>7) Que dizes a respeito da relação entre a escola e a comunidade local? Percebes</p><p>a existência de algum tipo de influência/ interferência da comunidade na escola e</p><p>vice-versa? Que exemplos tu podes citar?</p><p>8) Observas a presença da cultura do cotidiano rural dos alunos na sala de aula?</p><p>Como?</p><p>9) Na tua maneira de planejar, de ensinar, o contexto rural de escola e de alunos</p><p>interfere? O fato de trocares de contexto de trabalho, de ter contato com essa</p><p>realidade provocou (ou motivou) alguma mudança na tua metodologia de ensino?</p><p>De que modo costumas desenvolver os conteúdos?</p><p>10) Explica um pouco se existem e quais são as diferenças entre os dois contextos</p><p>(rural e urbano), em relação às aulas.</p><p>11) Quais elementos ou aspectos sentes necessidade e que poderiam facilitar/</p><p>contribuir para o bom andamento do teu trabalho como professor na escola da</p><p>zona rural? (desde a aquisição de materiais escolares até condições de trabalho</p><p>e questões pedagógicas)</p><p>12) Que formas de apoio ou tipo de suportes utilizas para resolver as situações</p><p>diárias que cercam a docência em escola rural (inserção, ensino, relações)? Tua</p><p>formação pedagógica te ajuda a enfrentar os desafios/conflitos/ impasses da</p><p>docência?</p><p>120</p><p>Apêndice B - Pedido de autorização para a realização do estudo</p><p>121</p><p>Apêndice C - Termo de consentimento livre e esclarecido</p><p>UNIVERSIDADE FEDERAL DE PELOTAS</p><p>FACULDADE DE EDUCAÇÃO</p><p>PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM EDUCAÇÃO</p><p>TERMO DE CONSENTIMENTO LIVRE E ESCLARECIDO</p><p>Você está sendo convidado(a) a participar de uma PESQUISA DE</p><p>DOUTORADO, intitulada Inserção de professores da zona urbana em escolas na zona rural:</p><p>expectativas, apoios e desafios, que possui como objetivo principal investigar a inserção de</p><p>professores oriundos dos centros urbanos em escolas do campo, através do resgate de dados que</p><p>possibilitem mostrar o processo que se desenrola a partir da opção pela docência nessas escolas até</p><p>a “entrada” e o desenvolvimento das atividades pedagógicas.</p><p>O estudo será conduzido pela doutoranda Cátia Simone Becker Vighi, sob a orientação da</p><p>Profª. Drª. Beatriz Maria B. Atrib Zanchet.</p><p>As interações serão gravadas em áudio, e, posteriormente, serão transcritas. Em todas as</p><p>fases da coleta de dados haverá a presença da pesquisadora, que se responsabilizará pelo uso dos</p><p>dados.</p><p>A participação no estudo não acarretará em nenhum tipo de risco ou gasto financeiro. O</p><p>anonimato de todas as pessoas que participarão da pesquisa será preservado, assim como as</p><p>menções a pessoas ou Instituições durante as entrevistas/questionários. A participação nesta</p><p>pesquisa é voluntária, e o afastamento da pesquisa não acarretará qualquer risco ou penalidade.</p><p>Em caso de dúvidas relacionadas ao estudo, o/a participante poderá contatar pelo telefone</p><p>(53) 81337026, ou, ainda, através do e-mail catia.educacao@bol.com.br (PELOTAS).</p><p>Uma via deste documento de consentimento ficará em seu poder. Desde já agradecemos</p><p>por sua colaboração na realização deste estudo.</p><p>Atenciosamente,</p><p>.............................................................................................</p><p>Cátia Simone Becker Vighi / Beatriz Maria B. Atrib Zanchet</p><p>Doutoranda e Orientadora do Projeto</p><p>CONCORDÂNCIA EM PARTICIPAR</p><p>Eu, ________________________________________________________________, concordo em</p><p>participar do estudo descrito.</p><p>Assinatura do/a participante ________________________________________________________.</p><p>Local e Data:______________________________________________________________________.</p><p>mailto:catia.educacao@bol.com.br</p><p>122</p><p>ANEXOS</p><p>123</p><p>Anexo A : Resolução CNE/CEB 1 de 3 de abril de 2002.</p><p>CONSELHO NACIONAL DE EDUCAÇÃO</p><p>CÂMARA DE EDUCAÇÃO BÁSICA</p><p>RESOLUÇÃO CNE/CEB 1, DE 3 DE ABRIL DE 2002. (*)</p><p>Institui Diretrizes Operacionais para a Educação</p><p>Básica nas Escolas do Campo.</p><p>O Presidente da Câmara da</p><p>Educação Básica, reconhecido o modo</p><p>próprio de vida social e o de utilização do espaço do campo como fundamentais, em</p><p>sua diversidade, para a constituição da identidade da população rural e de sua</p><p>inserção cidadã na definição dos rumos da sociedade brasileira, e tendo em vista o</p><p>disposto na Lei nº 9.394, de 20 de dezembro de 1996 -LDB, na Lei nº 9.424, de 24</p><p>de dezembro de 1996, e na Lei nº 10.172, de 9 de janeiro de 2001, que aprova o</p><p>Plano Nacional de Educação, e no Parecer CNE/CEB 36/2001, homologado pelo</p><p>Senhor Ministro de Estado da Educação em 12 de março de 2002, resolve:</p><p>Art. 1º A presente Resolução institui as Diretrizes Operacionais para a</p><p>Educação Básica nas escolas do campo a serem observadas nos projetos das</p><p>instituições que integram os diversos sistemas de ensino.</p><p>Art. 2º Estas Diretrizes, com base na legislação educacional, constituem um</p><p>conjunto de princípios e de procedimentos que visam adequar o projeto institucional</p><p>das escolas do campo às Diretrizes Curriculares Nacionais para a Educação Infantil,</p><p>o Ensino Fundamental e Médio, a Educação de Jovens e Adultos, a Educação</p><p>Especial, a Educação Indígena, a Educação Profissional de Nível Técnico e a</p><p>Formação de Professores em Nível Médio na modalidade Normal.</p><p>Parágrafo único. A identidade da escola do campo é definida pela sua</p><p>vinculação às questões inerentes à sua realidade, ancorando-se na temporalidade e</p><p>saberes próprios dos estudantes, na memória coletiva que sinaliza futuros, na rede</p><p>de ciência e tecnologia disponível na sociedade e nos movimentos sociais em</p><p>defesa de projetos que associem as soluções exigidas por essas questões à</p><p>qualidade social da vida coletiva no país.</p><p>Art. 3º O Poder Público, considerando a magnitude da importância da</p><p>educação escolar para o exercício da cidadania plena e para o desenvolvimento de</p><p>um país cujo paradigma tenha como referências a justiça social, a solidariedade e o</p><p>diálogo entre todos, independente de sua inserção em áreas urbanas ou rurais,</p><p>(*) CNE. Resolução CNE/CEB 1/2002. Diário Oficial da União, Brasília, 9 de abril de 2002. Seção 1,</p><p>p. 32.</p><p>124</p><p>deverá garantir a universalização do acesso da população do campo à</p><p>EducaçãoBásica e à Educação Profissional de Nível Técnico.</p><p>Art. 4° O projeto institucional das escolas do campo, expressão do trabalho</p><p>compartilhado de todos os setores comprometidos com a universalização da</p><p>educação escolar com qualidade social, constituir-se-á num espaço público de</p><p>investigação e articulação de experiências e estudos direcionados para o mundo do</p><p>trabalho, bem como para o desenvolvimento social, economicamente justo e</p><p>ecologicamente sustentável.</p><p>Art. 5º As propostas pedagógicas das escolas do campo, respeitadas as</p><p>diferenças e o direito à igualdade e cumprindo imediata e plenamente o estabelecido</p><p>nos artigos 23, 26 e 28 da Lei 9.394, de 1996, contemplarão a diversidade do campo</p><p>em todos os seus aspectos: sociais, culturais, políticos, econômicos, de gênero,</p><p>geração e etnia.</p><p>Parágrafo único. Para observância do estabelecido neste artigo, as</p><p>propostas pedagógicas das escolas do campo, elaboradas no âmbito da autonomia</p><p>dessas instituições, serão desenvolvidas e avaliadas sob a orientação das Diretrizes</p><p>Curriculares Nacionais para a Educação Básica e a Educação Profissional de Nível</p><p>Técnico.</p><p>Art. 6º O Poder Público, no cumprimento das suas responsabilidades com o</p><p>atendimento escolar e à luz da diretriz legal do regime de colaboração entre a União,</p><p>os Estados, o Distrito Federal e os Municípios, proporcionará Educação Infantil e</p><p>Ensino Fundamental nas comunidades rurais, inclusive para aqueles que não o</p><p>concluíram na idade prevista, cabendo em especial aos Estados garantir as</p><p>condições necessárias para o acesso ao Ensino Médio e à Educação Profissional de</p><p>Nível Técnico.</p><p>Art. 7º É de responsabilidade dos respectivos sistemas de ensino, através de</p><p>seus órgãos normativos, regulamentar as estratégias específicas de atendimento</p><p>escolar do campo e a flexibilização da organização do calendário escolar,</p><p>salvaguardando, nos diversos espaços pedagógicos e tempos de aprendizagem, os</p><p>princípios da política de igualdade.</p><p>§ 1° O ano letivo, observado o disposto nos artigos 23, 24 e 28 da LDB,</p><p>poderá ser estruturado independente do ano civil.</p><p>§ 2° As atividades constantes das propostas pedagógicas das escolas,</p><p>preservadas as finalidades de cada etapa da educação básica e da modalidade de</p><p>ensino prevista, poderão ser organizadas e desenvolvidas em diferentes espaços</p><p>pedagógicos, sempre que o exercício do direito à educação escolar e o</p><p>desenvolvimento da capacidade dos alunos de aprender e de continuar aprendendo</p><p>assim o exigirem.</p><p>Art. 8° As parcerias estabelecidas visando ao desenvolvimento de</p><p>experiências de escolarização básica e de educação profissiona l, sem prejuízo de</p><p>outras exigências que poderão ser acrescidas pelos respectivos sistemas de ensino,</p><p>observarão:</p><p>I - articulação entre a proposta pedagógica da instituição e as Diretrizes</p><p>Curriculares Nacionais para a respectiva etapa da Educação Básica ou Profissional;</p><p>125</p><p>II - direcionamento das atividades curriculares e pedagógicas para um</p><p>projeto de desenvolvimento sustentável;</p><p>III - avaliação institucional da proposta e de seus impactos sobre a qualidade</p><p>da vida individual e coletiva;</p><p>IV - controle social da qualidade da educação escolar, mediante a efetiva</p><p>participação da comunidade do campo.</p><p>Art. 9º As demandas provenientes dos movimentos sociais poderão</p><p>subsidiar os componentes estruturantes das políticas educacionais, respeitado o</p><p>direito à educação escolar, nos termos da legislação vigente.</p><p>Art. 10. O projeto institucional das escolas do campo, considerado o</p><p>estabelecido no artigo 14 da LDB, garantirá a gestão democrática, constituindo</p><p>mecanismos que possibilitem estabelecer relações entre a escola, a comunidade</p><p>local, os movimentos sociais, os órgãos normativos do sistema de ensino e os</p><p>demais setores da sociedade.</p><p>Art. 11. Os mecanismos de gestão democrática, tendo como perspectiva o</p><p>exercício do poder nos termos do disposto no parágrafo 1º do artigo 1º da Carta</p><p>Magna, contribuirão diretamente:</p><p>I - para a consolidação da autonomia das escolas e o fortalecimento dos</p><p>conselhos que propugnam por um projeto de desenvolvimento que torne possível à</p><p>população do campo viver com dignidade;</p><p>II - para a abordagem solidária e coletiva dos problemas do campo,</p><p>estimulando a autogestão no processo de elaboração, desenvolvimento e avaliação</p><p>das propostas pedagógicas das instituições de ensino.</p><p>Art. 12. O exercício da docência na Educação Básica, cumprindo o</p><p>estabelecido nos artigos 12, 13, 61 e 62 da LDB e nas Resoluções 3/1997 e 2/1999,</p><p>da Câmara da Educação Básica, assim como os Pareceres 9/2002, 27/2002 e</p><p>28/2002 e as Resoluções 1/2002 e 2/2002 do Pleno do Conselho Nacional de</p><p>Educação, a respeito da formação de professores em nível superior para a</p><p>Educação Básica, prevê a formação inicial em curso de licenciatura, estabelecendo</p><p>como qualificação mínima, para a docência na Educação Infantil e nos anos iniciais</p><p>do Ensino Fundamental, o curso de formação de professores em Nível Médio, na</p><p>modalidade Normal.</p><p>Parágrafo único. Os sistemas de ensino, de acordo com o artigo 67 da LDB</p><p>desenvolverão políticas de formação inicial e continuada, habilitando todos os</p><p>professores leigos e promovendo o aperfeiçoamento permanente dos docentes.</p><p>Art. 13. Os sistemas de ensino, além dos princípios e diretrizes que orientam</p><p>a Educação Básica no país, observarão, no processo de normatização</p><p>complementar da formação de professores para o exercício da docência nas escolas</p><p>do campo, os seguintes componentes:</p><p>I - estudos a respeito da diversidade e o efetivo protagonismo das crianças,</p><p>dos jovens e dos adultos do campo na construção da qualidade social da vida</p><p>individual e coletiva, da região, do país e do mundo;</p><p>II - propostas pedagógicas que valorizem, na organização do ensino, a</p><p>diversidade cultural e os processos de interação e transformação do campo, a</p><p>gestão democrática, o acesso ao avanço científico e tecnológico e respectivas</p><p>126</p><p>contribuições para a melhoria das condições de vida e a fidelidade aos princípios</p><p>éticos que norteiam a convivência solidária e colaborativa nas sociedades</p><p>democráticas.</p><p>Art. 14. O financiamento da educação nas escolas do campo, tendo em vista</p><p>o que determina a Constituição Federal, no artigo 212 e no artigo 60 dos Atos das</p><p>Disposições Constitucionais Transitórias, a LDB, nos artigos 68, 69, 70 e 71, e a</p><p>regulamentação do Fundo de Manutenção e Desenvolvimento do Ensino</p><p>Fundamental e de Valorização do Magistério - Lei 9.424, de 1996, será assegurado</p><p>mediante cumprimento da legislação a respeito do financiamento da educação</p><p>escolar no Brasil.</p><p>Art. 15. No cumprimento do disposto no § 2º, do art. 2º, da Lei 9.424, de</p><p>1996, que determina a diferenciação do custo-aluno com vistas ao financiamento da</p><p>educação escolar nas escolas do campo, o Poder Público levará em consideração:</p><p>I - as responsabilidades próprias da União, dos Estados, do Distrito Federal</p><p>e dos Municípios com o atendimento escolar em todas as etapas e modalidades da</p><p>Educação Básica, contemplada a variação na densidade demográfica e na relação</p><p>professor/aluno;</p><p>II - as especificidades do campo, observadas no atendimento das exigências</p><p>de materiais didáticos, equipamentos, laboratórios e condições de deslocamento dos</p><p>alunos e professores apenas quando o atendimento escolar não puder ser</p><p>assegurado diretamente nas comunidades rurais;</p><p>III - remuneração digna, inclusão nos planos de carreira e institucionalização</p><p>de programas de formação continuada para os profissionais da educação que</p><p>propiciem, no mínimo, o disposto nos artigos 13, 61, 62 e 67 da LDB.</p><p>Art. 16. Esta Resolução entra em vigor na data de sua publicação, ficando</p><p>revogadas as disposições em contrário.</p><p>FRANCISCO APARECIDO CORDÃO</p><p>Presidente da Câmara de Educação Básica</p><p>127</p><p>Anexo B: Resolução nº 2 de 28 de abril de 2008</p><p>MINISTÉRIO DA EDUCAÇÃO</p><p>CONSELHO NACIONAL DE EDUCAÇÃO</p><p>CÂMARA DE EDUCAÇÃO BÁSICA</p><p>RESOLUÇÃO Nº 2, DE 28 DE ABRIL DE 2008. (*)</p><p>Estabelece diretrizes complementares, normas</p><p>e princípios para o desenvolvimento de</p><p>políticas públicas de atendimento da Educação</p><p>Básica do Campo.</p><p>A Presidenta da Câmara de Educação Básica do Conselho Nacional de</p><p>Educação, no uso de suas atribuições legais e de conformidade com o disposto na</p><p>alínea “c” do § 1º do art. 9º da Lei nº 4.024/1961, com a redação dada pela Lei nº</p><p>9.131/1995, com fundamento no Parecer CNE/CEB nº 23/2007, reexaminado pelo</p><p>Parecer CNE/CEB nº 3/2008, homologado por despacho do Senhor Ministro de</p><p>Estado da Educação, publicado no DOU de 11/4/2008, resolve:</p><p>Art. 1º A Educação do Campo compreende a Educação Básica em suas</p><p>etapas de Educação Infantil, Ensino Fundamental, Ensino Médio e Educação</p><p>Profissional Técnica de nível médio integrada com o Ensino Médio e destina-se ao</p><p>atendimento às populações rurais em suas mais variadas formas de produção da</p><p>vida – agricultores familiares, extrativistas, pescadores artesanais, ribeirinhos,</p><p>assentados e acampados da Reforma Agrária, quilombolas, caiçaras, indígenas e</p><p>outros.</p><p>§ 1º A Educação do Campo, de responsabilidade dos Entes Federados, que</p><p>deverão estabelecer formas de colaboração em seu planejamento e execução, terá</p><p>como objetivos a universalização do acesso, da permanência e do sucesso escolar</p><p>com qualidade em todo o nível da Educação Básica.</p><p>§ 2º A Educação do Campo será regulamentada e oferecida pelos Estados,</p><p>pelo Distrito Federal e pelos Municípios, nos respectivos âmbitos de atuação</p><p>prioritária.</p><p>§ 3º A Educação do Campo será desenvolvida, preferentemente, pelo ensino</p><p>regular.</p><p>§ 4º A Educação do Campo deverá atender, mediante procedimentos</p><p>adequados, na modalidade da Educação de Jovens e Adultos, as populações rurais</p><p>que não tiveram acesso ou não concluíram seus estudos, no Ensino Fundamental</p><p>ou no Ensino Médio, em idade própria.</p><p>(*) Publicada no Dou de 29/4/2008, Seção 1, p. 25-26.</p><p>§ 5º Os sistemas de ensino adotarão providências para que as crianças e os</p><p>jovens portadores de necessidades especiais, objeto da modalidade de Educação</p><p>128</p><p>Especial, residentes no campo, também tenham acesso à Educação Básica,</p><p>preferentemente em escolas comuns da rede de ensino regular.</p><p>Art. 2º Os sistemas de ensino adotarão medidas que assegurem o</p><p>cumprimento do artigo 6º da Resolução CNE/CEB nº 1/2002, quanto aos deveres</p><p>dos Poderes Públicos na oferta de Educação Básica às comunidades rurais.</p><p>Parágrafo único. A garantia a que se refere o caput, sempre que necessário</p><p>e adequado à melhoria da qualidade do ensino, deverá ser feita em regime de</p><p>colaboração entre os Estados e seus Municípios ou mediante consórcios municipais.</p><p>Art. 3º A Educação Infantil e os anos iniciais do Ensino Fundamental serão</p><p>sempre oferecidos nas próprias comunidades rurais, evitando-se os processos de</p><p>nucleação de escolas e de deslocamento das crianças.</p><p>§ 1º Os cincos anos iniciais do Ensino Fundamental, excepcionalmente,</p><p>poderão ser oferecidos em escolas nucleadas, com deslocamento intracampo dos</p><p>alunos, cabendo aos sistemas estaduais e municipais estabelecer o tempo máximo</p><p>dos alunos em deslocamento a</p><p>partir de suas realidades.</p><p>§ 2º Em nenhuma hipótese serão agrupadas em uma mesma turma crianças</p><p>de Educação Infantil com crianças do Ensino Fundamental.</p><p>Art. 4º Quando os anos iniciais do Ensino Fundamental não puderem ser</p><p>oferecidos nas próprias comunidades das crianças, a nucleação rural levará em</p><p>conta a participação das comunidades interessadas na definição do local, bem como</p><p>as possibilidades de percurso a pé pelos alunos na menor distância a ser percorrida.</p><p>Parágrafo único. Quando se fizer necessária a adoção do transporte escolar,</p><p>devem ser considerados o menor tempo possível no percurso residência-escola e a</p><p>garantia de transporte das crianças do campo para o campo.</p><p>Art. 5º Para os anos finais do Ensino Fundamental e para o Ensino Médio,</p><p>integrado ou não à Educação Profissional Técnica, a nucleação rural poderá</p><p>constituir-se em melhor solução, mas deverá considerar o processo de diálogo com</p><p>as comunidades atendidas, respeitados seus valores e sua cultura.</p><p>§ 1º Sempre que possível, o deslocamento dos alunos, como previsto no</p><p>caput, deverá ser feito do campo para o campo, evitando-se, ao máximo, o</p><p>deslocamento do campo para a cidade.</p><p>§ 2º Para que o disposto neste artigo seja cumprido, deverão ser</p><p>estabelecidas regras para o regime de colaboração entre os Estados e seus</p><p>Municípios ou entre Municípios consorciados.</p><p>Art. 6º A oferta de Educação de Jovens e Adultos também deve considerar</p><p>que os deslocamentos sejam feitos nas menores distâncias possíveis, preservado o</p><p>princípio intracampo.</p><p>Art. 7º A Educação do Campo deverá oferecer sempre o indispensável apoio</p><p>pedagógico aos alunos, incluindo condições infra-estruturais adequadas, bem como</p><p>materiais e livros didáticos, equipamentos, laboratórios, biblioteca e áreas de lazer e</p><p>desporto, em conformidade com a realidade local e as diversidades dos povos do</p><p>campo, com atendimento ao art. 5º das Diretrizes Operacionais para a Educação</p><p>Básica nas escolas do campo.</p><p>129</p><p>§ 1º A organização e o funcionamento das escolas do campo respeitarão as</p><p>diferenças entre as populações atendidas quanto à sua atividade econômica, seu</p><p>estilo de vida, sua cultura e suas tradições.</p><p>§ 2º A admissão e a formação inicial e continuada dos professores e do</p><p>pessoal de magistério de apoio ao trabalho docente deverão considerar sempre a</p><p>formação pedagógica apropriada à Educação do Campo e às oportunidades de</p><p>atualização e aperfeiçoamento com os profissionais comprometidos com suas</p><p>especificidades.</p><p>Art. 8º O transporte escolar, quando necessário e indispensável, deverá ser</p><p>cumprido de acordo com as normas do Código Nacional de Trânsito quanto aos</p><p>veículos utilizados.</p><p>§ 1º Os contratos de transporte escolar observarão os artigos 137, 138 e 139</p><p>do referido Código.</p><p>§ 2º O eventual transporte de crianças e jovens portadores de necessidades</p><p>especiais, em suas próprias comunidades ou quando houver necessidade de</p><p>deslocamento para a nucleação, deverá adaptar-se às condições desses alunos,</p><p>conforme leis específicas.</p><p>§ 3º Admitindo o princípio de que a responsabilidade pelo transporte escolar</p><p>de alunos da rede municipal seja dos próprios Municípios e de alunos da rede</p><p>estadual seja dos próprios Estados, o regime de colaboração entre os entes</p><p>federados far-se-á em conformidade com a Lei nº 10.709/2003 e deverá prever que,</p><p>em determinadas circunstâncias de racionalidade e de economicidade, os veículos</p><p>pertencentes ou contratados pelos Municípios também transportem alunos da rede</p><p>estadual e vice-versa.</p><p>Art. 9º A oferta de Educação do Campo com padrões mínimos de qualidade</p><p>estará sempre subordinada ao cumprimento da legislação educacional e das</p><p>Diretrizes Operacionais enumeradas na Resolução CNE/CEB nº 1/2002.</p><p>Art. 10 O planejamento da Educação do Campo, oferecida em escolas da</p><p>comunidade, multisseriadas ou não, e quando a nucleação rural for considerada,</p><p>para os anos do Ensino Fundamental ou para o Ensino Médio ou Educação</p><p>Profissional Técnica de nível médio integrada com o Ensino Médio, considerará</p><p>sempre as distâncias de deslocamento, as condições de estradas e vias, o estado</p><p>de conservação dos veículos utilizados e sua idade de uso, a melhor localização e</p><p>as melhores possibilidades de trabalho pedagógico com padrão de qualidade.</p><p>§ 1º É indispensável que o planejamento de que trata o caput seja feito em</p><p>comum com as comunidades e em regime de colaboração, Estado/Município ou</p><p>Município/Município consorciados.</p><p>§ 2º As escolas multisseriadas, para atingirem o padrão de qualidade</p><p>definido em nível nacional, necessitam de professores com formação pedagógica,</p><p>inicial e continuada, instalações físicas e equipamentos adequados, materiais</p><p>didáticos apropriados e supervisão pedagógica permanente.</p><p>Art. 11 O reconhecimento de que o desenvolvimento rural deve ser</p><p>integrado, constituindo-se a Educação do Campo em seu eixo integrador,</p><p>recomenda que os Entes Federados – União, Estados, Distrito Federal e Municípios</p><p>– trabalhem no sentido de articular as ações de diferentes setores que participam</p><p>130</p><p>desse desenvolvimento, especialmente os Municípios, dada a sua condição de</p><p>estarem mais próximos dos locais em que residem as populações rurais.</p><p>Art. 12 Esta Resolução entra em vigor na data de sua publicação, ficando</p><p>ratificadas as Diretrizes Operacionais instituídas pela Resolução CNE/CEB nº 1/2002</p><p>e revogadas as disposições em contrário.</p><p>CLÉLIA BRANDÃO ALVARENGA CRAVEIRO</p><p>dessa forma, a</p><p>minha história pessoal e profissional.</p><p>Essas condições estimularam a investigação, porque durante minha</p><p>caminhada docente mantenho-me atenta às mudanças ocorridas nesses espaços,</p><p>assim como procuro entender as práticas sociais e econômicas experimentadas no</p><p>cotidiano da população rural.</p><p>Constatar tais mudanças, tentar melhor compreendê-las dentro de um</p><p>estudo mais sistematizado, através da pesquisa, e, ao mesmo tempo, entender a</p><p>educação escolar na zona rural inserida em contexto mais amplo de políticas</p><p>educacionais brasileiras é fundamental para entender o local onde atuo.</p><p>No espaço geográfico rural, vivi a experiência de plantar, colher e</p><p>comercializar produtos. Aprendi as primeiras letras e as primeiras lições de vida</p><p>produzidas no seio de uma família que, em parte, se dedicou, além da agricultura, a</p><p>ensinar/alfabetizar crianças na zona rural, sendo responsável pela fecundação de</p><p>um sonho: o de ser professora.</p><p>Convivendo, principalmente, com professores3 no contexto familiar, a</p><p>escolha dessa profissão pareceu-me natural. Motivada pelas conversas que ouvia,</p><p>percebia despertar meu interesse pelo exercício da docência. Hoje, ao rememorar</p><p>esses fatos, tenho certeza de que fiz a escolha certa.</p><p>2 No Brasil, a distinção adotada pelo IBGE considera como urbana toda sede municipal, e rural o</p><p>espaço existente em torno desse núcleo, onde a população é dispersa ou se concentra em pequenos</p><p>grupos de vizinhança.</p><p>3 Profissão da minha mãe, de meu avô e de tios maternos.</p><p>21</p><p>Com o ingresso no curso de Magistério, na década de 80, pensava encontrar</p><p>receitas para exercer a docência. No entanto, o currículo oferecido pelo sistema</p><p>educacional deixava lacunas. Estava diante de um ensino reprodutor, que formava</p><p>professores transmissores e tecnicistas, e não colaborava para mudanças no</p><p>sistema, embora naquele período já se anunciassem algumas alterações na</p><p>estrutura educacional, com a introdução das teorias críticas na educação brasileira.</p><p>No ano de 1988, ocorreu meu ingresso na rede pública municipal de Pelotas,</p><p>como professora das séries iniciais, época em que as ideias de Paulo Freire</p><p>fervilhavam no meio educacional. Ouvia-se que a intenção era mudar o modelo de</p><p>educação bancária que estávamos desenvolvendo por um modelo de educação</p><p>libertadora.</p><p>Nessa mesma década, no auge dessas discussões, vários estudiosos</p><p>publicavam trabalhos sobre educação; o acesso a esses, porém, me era restrito, por</p><p>dois motivos principais: o fato de viver na zona rural – distante do centro urbano – e</p><p>a precariedade dos meios de comunicação. Além disso, o quadro de pessoal em</p><p>pequeno número não possibilitava o afastamento das atividades docentes, ainda</p><p>que temporário, para cursos ou encontros sequenciais de formação.</p><p>Na época, as reuniões de núcleo4 representavam o canal de comunicação</p><p>no meio educacional. Importante lembrar que a maioria das escolas rurais mantinha</p><p>a mesma forma de organização de anos passados: um professor para atender toda</p><p>a demanda, responsável por questões administrativas, pedagógicas, manutenção do</p><p>espaço físico, integridade física e psicológica dos alunos e pelo serviço de merenda</p><p>escolar.</p><p>Os conhecimentos recebidos no curso de Magistério, aliados aos modelos</p><p>de docência que eu possuía, foram os alicerces para estruturar os primeiros anos da</p><p>carreira.</p><p>Em 1995, por remodelação do sistema de políticas educacionais, foi</p><p>implantado o processo de nuclearização5. A partir desse ano, atuei em escola-</p><p>núcleo, o que facilitou a participação efetiva em reuniões pedagógicas e demais</p><p>eventos complementares, ampliando saberes para fundamentar e atualizar a prática.</p><p>4 Reuniões de núcleo eram encontros mensais organizados pela Secretaria Municipal de Educação</p><p>de Pelotas que objetivavam discussões em torno das mudanças educacionais.</p><p>5 O movimento de nuclearização, a partir da década de 1990, significou o fechamento de escolas</p><p>multisseriadas, a reestruturação de algumas como escolas-núcleo que abarcavam todas as séries do</p><p>Ensino Fundamental ou o transporte dos alunos para uma escola urbana (ROCHA; MARTINS, 2009).</p><p>22</p><p>De 1988 a 2001, realizei a Graduação em Pedagogia (Habilitação em Pré-</p><p>Escola e Séries Iniciais do Ensino Fundamental) e, sequencialmente, cursos de</p><p>pós-graduação em nível de especialização e mestrado, ambos em Educação. Dando</p><p>continuidade a essa trajetória de formação, ingressei no Curso de Doutorado em</p><p>Educação.</p><p>A educação, suas práticas e vivências, bem como a formação de</p><p>professores, são temáticas que venho estudando ao longo da vida acadêmica. Com</p><p>a pesquisa, vinculei minha atividade acadêmica à vida pessoal e profissional.</p><p>Na esteira dos estudos sobre formação docente e Educação do/no campo,</p><p>temáticas que envolvem mitos e desafios, desenvolvi projeto de pesquisa no Curso</p><p>de Doutorado em Educação, na Linha de Pesquisa Formação de Professores,</p><p>Ensino, Processos e Práticas Educativas. Credito aos estudos e discussões</p><p>realizadas nessa linha de pesquisa a possibilidade de qualificação pessoal e</p><p>profissional, com o intuito de contribuir, na área de formação de professores, para</p><p>que se pense sobre a educação oferecida nas escolas do/no campo e sobre o</p><p>profissional que ali atuará.</p><p>23</p><p>3 A escolha metodológica e a questão de pesquisa</p><p>3.1 A pesquisa na abordagem qualitativa</p><p>Para a realização deste estudo, utilizamos procedimentos metodológicos</p><p>que se inserem na perspectiva da pesquisa qualitativa, a partir das concepções de</p><p>Bogdan e Biklen (1994), Minayo (1994) e Lüdke e André (1986), dentre outros.</p><p>Na abordagem qualitativa, a realidade não pode ser quantificada; o mundo</p><p>dos significados das ações e relações humanas não é captável em dados numéricos</p><p>e estatísticos, não havendo, portanto, a preocupação em quantificar (MINAYO, 1994;</p><p>BOGDAN; BIKLEN, 1994). A preocupação dos pesquisadores é "compreender e</p><p>explicar a dinâmica das relações sociais que, por sua vez, são depositárias de</p><p>crenças, valores, atitudes e hábitos", como considera Minayo (1994).</p><p>Diz essa autora que os pesquisadores "trabalham com a vivência, com a</p><p>experiência, com a cotidianidade e também com a compreensão das estruturas e</p><p>instituições como resultados da ação humana objetivada", porque entende que "a</p><p>linguagem, as práticas e as coisas são inseparáveis".</p><p>Esse pensamento justifica a frequência dos investigadores qualitativos nos</p><p>locais de estudo, pois, de acordo com Bogdan e Biklen (1994, p. 48) eles “se</p><p>preocupam com o contexto. Entendem que as ações podem ser melhor</p><p>compreendidas quando são observadas no seu ambiente habitual de ocorrência”.</p><p>Nessa abordagem, o contexto tem papel significativo para o investigador,</p><p>pois todos os detalhes, pormenores e situações aparentemente inusitados são</p><p>elementos importantes para o aclaramento do objeto de estudo. Isso porque as</p><p>posturas, visões de mundo e o comportamento dos sujeitos investigados contribuem</p><p>para o desvendamento da realidade.</p><p>24</p><p>Essa condição exige do olhar do pesquisador e da sua postura</p><p>epistemológica uma vigília constante, porque “[...] exige que o mundo seja</p><p>investigado com a idéia de que nada é trivial, que tudo tem potencial para constituir</p><p>uma pista que nos permita estabelecer uma compreensão mais esclarecedora do</p><p>nosso objeto de estudo” (BOGDAN; BIKLEN, 1994, p. 49).</p><p>O contato prolongado com a situação investigada facilita o processo de</p><p>análise, visto que a natureza da inquirição proposta envolve a obtenção de dados</p><p>descritivos e exige grande atenção do investigador. Suas origens podem ser</p><p>diversas: depoimentos, descrições de pessoas, fatos ou situações, transcrições de</p><p>entrevistas, notas de campo, fotografias, vídeos, documentos pessoais,</p><p>memorandos e outros registros oficiais.</p><p>Como resumem Lüdke e André (1986) e Bogdan e Biklen (1994), a pesquisa</p><p>qualitativa preocupa-se em retratar as perspectivas dos participantes, e sua ênfase</p><p>situa-se mais no processo de construção do conhecimento do que no produto final, e</p><p>o pesquisador é seu principal instrumento.</p><p>Tendo como base as concepções acima explicadas percorremos o caminho</p><p>da pesquisa na tentativa de responder à questão:</p><p>Como se revela o processo vivido por professores urbanos que permutam</p><p>para escolas do/no campo, quando relatam suas vivências e experiências</p><p>profissionais?</p><p>3.2 O uso das entrevistas semi-estruturadas como procedimento metodológico</p><p>Escolhemos a entrevista semi-estruturada como recurso metodológico, pela</p><p>sua pertinência à intenção desta pesquisa. Segundo Triviños (1987), a entrevista é</p><p>um dos principais meios que o investigador tem para realizar a coleta de dados. Ele</p><p>explica que a entrevista semi-estruturada</p><p>[...] parte de certos questionamentos básicos, apoiados em teorias e</p><p>hipóteses, que interessam à pesquisa, e que, em seguida, oferecem</p><p>amplo campo de interrogativas, fruto de novas hipóteses que vão</p><p>surgindo à medida que se recebem as respostas do informante.</p><p>Desta maneira, o informante, seguindo espontaneamente a linha de</p><p>seu pensamento e de suas experiências dentro do foco principal</p><p>colocado pelo investigador, começa a participar na elaboração do</p><p>conteúdo da pesquisa (TRIVIÑOS, 1987, p. 146).</p><p>25</p><p>Na mesma esteira, Lüdke e André (1986) salientam que “a grande vantagem</p><p>da entrevista sobre outras técnicas é que ela permite a captação imediata e coerente</p><p>da informação desejada, praticamente com qualquer tipo de informante e sobre os</p><p>mais variados tópicos” (p. 34).</p><p>Cabe destacar que a entrevista, conforme Triviños (1987, p. 146), “valoriza a</p><p>presença do investigador e também oferece possibilidades para que o informante</p><p>alcance a liberdade e espontaneidade necessárias, enriquecendo a investigação”.</p><p>Para tanto, como ressaltam Bogdan e Biklen (1994, p. 58), o investigador precisa</p><p>interagir com os sujeitos de forma natural, não intrusiva e não ameaçadora a fim de</p><p>minimizar os efeitos de interferência que o contato pessoal e as relações possam</p><p>exercer sobre o modo de resposta do sujeito, ou seja, "quanto menos seu</p><p>testemunho seja moldado pelas perguntas do entrevistador, melhor”, alerta</p><p>Thompson (1992, p. 258).</p><p>Outra característica importante que o investigador deve ter é a sutileza na</p><p>observação para capturar o não-dito pelo entrevistado – aquilo que fica implícito nas</p><p>falas e explícito nos modos de reação por “gestos, expressões, entoações, sinais</p><p>não-verbais, hesitações, alterações de ritmo, enfim, toda a comunicação não-verbal”,</p><p>como alertam Lüdke e André (1986, p. 36).</p><p>As entrevistas semi-estruturadas6 acompanharam um roteiro prévio e foram</p><p>gravadas. O roteiro da entrevista foi organizado em 2 partes: a inicial continha</p><p>questões objetivas que cercavam as características de cada um dos professores:</p><p>dados de identificação, formação, tempo de docência (urbana/rural), atividades que</p><p>desenvolve na escola, disciplina que leciona, entre outras, comprovando se</p><p>atendiam aos critérios pré-definidos:</p><p>a) ser residente na zona urbana;</p><p>b) ter experiência de docência em escolas urbanas;</p><p>c) atuar como docente em escolas do campo.</p><p>Na segunda parte, abordamos vários temas: as justificativas que motivaram</p><p>a escolha da zona rural como local de trabalho; as concepções que os professores</p><p>possuíam sobre a vida rural, escola e ensino; a receptividade e apoio; o</p><p>6</p><p>Apêndice A.</p><p>26</p><p>relacionamento com a comunidade local; a formação específica para o ensino rural;</p><p>enfim, as vivências e experiências construídas a partir da práxis.</p><p>Durante o período em que estivemos na escola realizando as entrevistas foi</p><p>possível acompanhar parte da rotina escolar, observar algumas aulas, consultar</p><p>documentos escritos7 e conversar informalmente com demais profissionais que</p><p>atuam na escola. Tais ações não foram consideradas como recursos metodológicos,</p><p>apenas configuraram-se como produtoras de fontes complementares para as</p><p>informações recolhidas, contribuindo para que o pesquisador tivesse um</p><p>conhecimento mais aprofundado de outros dados, “desvelando aspectos novos de</p><p>um tema ou problemas para completar as informações obtidas por outras técnicas”</p><p>(LÜDKE; ANDRÉ, 1986, p. 38). As anotações foram registradas em um diário de</p><p>campo.</p><p>Entre os documentos oficiais da escola, recorremos ao Regimento Escolar</p><p>(ano 2011) e Projeto Político Pedagógico8 (ano 2006). Destacamos, ainda, outras</p><p>fontes (leis, regulamentos, relatórios, normas, pareceres e mapas) originárias dos</p><p>órgãos mantenedores oficiais9.</p><p>Salientamos, no entanto, que não houve preocupação em proceder-se a</p><p>uma análise documental, como sendo “uma operação ou um conjunto de operações</p><p>visando representar o conteúdo de um documento sob uma forma diferente da</p><p>original, a fim de facilitar num estado ulterior, a sua consulta e referenciação”, como</p><p>explica Bardin (1977, p. 45).</p><p>3.3 Análise dos dados</p><p>O processo de análise dos dados foi baseado no enfoque de Bardin (1977,</p><p>p. 95), que pressupõe três etapas. Resumidamente são:</p><p>1) Pré-análise: constitui o primeiro momento, que se caracteriza pela</p><p>organização do material, de escolha dos documentos a serem analisados, da</p><p>7</p><p>São considerados documentos escritos: leis, regulamentos, normas, pareceres, cartas,</p><p>memorandos, diários pessoais, autobiografias, jornais, discursos, revistas, roteiros de programas de</p><p>rádio e de televisão, até livros, estatísticas e arquivos escolares (LÜDKE; ANDRÉ, 1986, p. 38).</p><p>8</p><p>O PPP da escola foi consultado, porém não apresentou subsídios que propiciassem uma discussão</p><p>de cunho epistemológico e teórico visando o adensamento do aqui descrito por estar desatualizado</p><p>conforme alerta dos pelos gestores.</p><p>9</p><p>Considerem-se aqui as três esferas: federal, estadual e municipal.</p><p>27</p><p>“formulação de hipóteses e dos objetivos e da elaboração de indicadores que</p><p>fundamentem a interpretação final”.</p><p>2) Exploração do material: é o momento da codificação, em que os dados</p><p>brutos são transformados de forma organizada e agregados em categorias de</p><p>análise.</p><p>3) Tratamento dos resultados: etapa marcada pela interpretação dos dados</p><p>que conduzem o investigador às inferências, no sentido de buscar o que se esconde</p><p>sob a aparente realidade; o que significa verdadeiramente o discurso enunciado; o</p><p>que querem dizer, em profundidade, certas afirmações, aparentemente superficiais,</p><p>ou seja, responder de fato ao problema de pesquisa.</p><p>3.4 As etapas do caminho e os procedimentos metodológicos</p><p>Entendemos ser importante apresentar as etapas que auxiliaram a coleta</p><p>dos dados favorecendo a tomada de decisões necessárias durante o percurso.</p><p>1ª etapa: mapeamento das escolas do campo e dos sujeitos.</p><p>O mapeamento teve início em abril de 2009, quando realizamos o primeiro</p><p>contato com a Secretaria Municipal de Educação e Desporto de Pelotas (SMED).</p><p>Nessa oportunidade, através de uma conversa informal com um professor supervisor</p><p>pedagógico explicamos, de forma breve, a intenção de pesquisa, oportunidade em</p><p>que conhecemos a representação cartográfica das escolas do campo pertencentes à</p><p>rede Municipal de Ensino Fundamental. Na ocasião, obtivemos informações básicas</p><p>sobre algumas situações características das escolas: localização, distância, nome</p><p>de diretores e respectivos contatos.</p><p>Posteriormente, fizemos contato com outra professora supervisora</p><p>pedagógica da SMED, responsável pelas escolas do/no campo, para confirmar a</p><p>existência de professores que atendessem aos critérios da pesquisa. Para ter</p><p>acesso às escolas e aos professores, foi protocolado, junto à SMED,</p><p>um pedido10 de</p><p>autorização para a realização do estudo, sendo concedido.</p><p>10</p><p>Apêndice B.</p><p>28</p><p>Participamos, também, como ouvinte, das atividades de formação</p><p>continuada oferecida pela SMED, durante o ano de 2010. Tal atividade constituiu-se</p><p>de encontros pedagógicos, na forma de seminário e/ou palestras, para professores</p><p>que atuassem em escolas do/no campo, através de projeto de extensão11.</p><p>2ª etapa: A escolha da escola, o convite à participação na pesquisa e a</p><p>coleta de dados</p><p>Nessa etapa, ocorreu a inserção no lócus da pesquisa escolhida a partir dos</p><p>critérios:</p><p>a) localização em relação à sede do município;</p><p>b) oferta do Ensino Fundamental completo;</p><p>c) presença de professores oriundos da zona urbana, no quadro de</p><p>pessoal da escola.</p><p>O primeiro contato efetivo, na escola, aconteceu em dezessete (17) de maio</p><p>de 2012. A busca pelo público-alvo que, possivelmente, se enquadraria nos critérios</p><p>preestabelecidos foi via equipe diretiva, no local de trabalho. Imediatamente,</p><p>contatamos com os professores sugeridos, os quais foram informados da natureza</p><p>da pesquisa, objetivos e o porquê da seleção para compor o quadro da amostra.</p><p>Entre os meses de junho e julho aplicamos a primeira etapa das entrevistas, dentro</p><p>da sistemática das atividades do cotidiano escolar, após sua concordância através</p><p>do termo de consentimento12</p><p>A partir do segundo semestre letivo de 2012, iniciamos a aplicação da</p><p>segunda parte das entrevistas, entre os meses de setembro e outubro, no local de</p><p>trabalho, durante os intervalos que cada professor dispunha.</p><p>Até o encerramento do ano letivo, em dezembro, em visita constante à</p><p>escola para acompanhar parte da rotina dos professores participantes, realizamos</p><p>toda a coleta de dados, totalizando vinte (20) visitas que duravam, em geral, todo o</p><p>expediente. Durante as visitas, ouvimos representantes da equipe diretiva e demais</p><p>profissionais que atuam na instituição, com a finalidade de construirmos um</p><p>11</p><p>Projeto de extensão da UFPel em parceria com a SMED, sob a coordenação das professoras</p><p>Conceição Paludo e Rosa Elane Lucas (UFPel) e das supervisoras pedagógicas das escolas do</p><p>campo: Nára Beatriz Clasen Nörenberg e Perpétua Lacerda Pinto (SMED).</p><p>12</p><p>Apêndice C.</p><p>29</p><p>panorama daquele estabelecimento de ensino.</p><p>À medida que recolhíamos as informações, os dados iam sendo degravados</p><p>e devolvidos aos professores para que tivessem a oportunidade de retomar o dito e</p><p>poder fazer as inferências necessárias.</p><p>As observações do trabalho das professoras em suas aulas serviram para</p><p>auxiliar na compreensão dos ditos nas entrevistas, entender a metodologia de</p><p>ensino aplicada e observar sua interação com os alunos, permitindo, como entende</p><p>Goodson, "um fluxo rico em diálogos" (1995, p. 69). Em média, cada professora</p><p>entrevistada foi visitada em cinco momentos, os quais estendiam-se por uma ou</p><p>duas horas/aula/dia e em turmas distintas.</p><p>3ª etapa: Análise dos dados coletados</p><p>Após os retornos das entrevistas, os dados foram agrupados e</p><p>categorizados para posterior análise de acordo com as etapas propostas por Bardin</p><p>(1977).</p><p>4ª etapa: Elaboração do relatório final</p><p>3.5 Descrevendo e caracterizando o lócus onde atuam as entrevistadas</p><p>A escola pesquisada integra a rede municipal de ensino de Pelotas (RS) e</p><p>está inclusa nos dados do quadro 01 que apresenta o panorama da rede em relação</p><p>às escolas do campo em funcionamento, o número de professores que atuam e da</p><p>matrícula discente. Salientamos que esses dados foram extraídos do projeto de</p><p>extensão "Formação continuada para professores das escolas do campo: Ensino</p><p>Fundamental da rede municipal de Pelotas", realizado pela UFPel (FaE e ICH) em</p><p>parceria com a Unipampa/ Jaguarão e SMED, encaminhado à SECAD/ MEC, em</p><p>2009.</p><p>30</p><p>Quadro 01: Realidade das escolas do campo da rede municipal de Pelotas</p><p>Total: 23 escolas do campo13</p><p>13 classes multisseriadas 10 ensino fundamental completo14</p><p>10 oferecem</p><p>1ª a 4ª série</p><p>3 oferecem</p><p>1ª a a 5ª série</p><p>10 oferecem</p><p>1ª a 8ª séries</p><p>Nº de professores: 52 Nº de professores: 328</p><p>Nº de alunos: 527 Nº de alunos: 2508</p><p>Fonte: Quadro organizado pela autora</p><p>A intenção de trazer esses dados foi mostrar alguns aspectos que</p><p>caracterizam a rede municipal quanto à oferta da educação básica no campo.</p><p>Percebemos que há a presença marcante das escolas multisseriadas, e isso nos</p><p>remete a pensar que em determinadas localidades rurais os alunos precisam</p><p>deslocar- se a outros espaços para concluírem seus estudos e contarem com melhor</p><p>infraestrutura de ensino.</p><p>Sabemos que as escolas multisseriadas não possuem os mesmos aparatos</p><p>daquelas que ofertam o ensino fundamental completo. Por outro lado, o município de</p><p>Pelotas atende ao que está proposto no artigo 216 da constituição gaúcha, o qual</p><p>estabelece que, "na área rural, para cada grupo de escolas de ensino fundamen tal</p><p>incompleto, haverá uma escola central de ensino fundamental completo, visando,</p><p>com isto, assegurar o número de vagas suficientes para absorver os alunos da área"</p><p>(SECAD/MEC, 2007, p. 59).</p><p>Outro dado apontado no Projeto de Extensão tratou da formação dos</p><p>professores que atuam nas escolas do/no campo. Com 52% dos questionários</p><p>respondidos, em um universo de 180 professores respondentes, 28 possuem Ensino</p><p>Médio, na maioria Magistério; 70 são graduados e 82, pós-graduados (77</p><p>Especialização, 4 Mestrado e 1 doutorando).</p><p>Quanto aos professores, é possível ver que a rede conta com um grupo de</p><p>profissionais habilitados, inclusive em nível de pós-graduação, contrariando o índice</p><p>nacional divulgado pelo INEP (2007) que aponta um quadro marcado pela</p><p>precariedade na formação de professores que atuam no contexto rural, todavia</p><p>13</p><p>Atualmente são 20 escolas em funcionamento.</p><p>14</p><p>Das 10 escolas, 9 ofertam, também, a Educação Infantil na modalidade pré-escolar.</p><p>31</p><p>ratifica dados15 apontados sobre a região sul do Brasil que apresenta os maiores</p><p>índices de docentes com habilitação em nível superior.</p><p>Localizada na zona rural do município de Pelotas/RS, distante,</p><p>aproximadamente, 72 km do centro urbano, no oitavo distrito, Rincão da Cruz, a</p><p>escola pesquisada está na serra dos Tapes, próxima do morro Quinongongo16.</p><p>Dados do censo demográfico de 2010, realizado pelo IBGE, registram que o</p><p>Rincão do Cruz possui uma população de 1972 habitantes, sendo que 50,96% do</p><p>total de pessoas está na faixa etária entre 15 e 49 anos; 18,46% são crianças e</p><p>jovens entre 0 e 14 anos. Quanto à diferença por sexo, 51,83 % são homens, e</p><p>48,17%, mulheres. Destaca-se o predomínio das colonizações alemã e italiana e a</p><p>presença de remanescentes quilombolas.</p><p>A região possui uma estrutura agrária dividida em pequenas propriedades</p><p>onde se desenvolvem atividades como: produção de leite, cultivo de</p><p>hortifrutigranjeiros e grãos (milho e feijão), fumo e pessegueiro (ambos</p><p>predominantes). O modelo agrícola baseia-se na lavoura de subsistência cuja</p><p>produção de alimentos acontece em pequena escala, mas garante a sobrevivência</p><p>da família, sendo o excedente comercializado. Em se tratando da pecuária,</p><p>encontram-se rebanhos bovinos (maior expressão na região) e caprinos.</p><p>Há presença de maquinários, implementos agrícolas e recursos tecnológicos</p><p>que contribuem para mecanização das lavouras, principalmente na produção de</p><p>fumo e pêssego, porém, percebe-se o uso de ferramentas agrícolas manuais</p><p>marcado pelos métodos tradicionais.</p><p>Entre os trabalhadores rurais, encontram-se três diferentes posições socio-</p><p>econômicas: os proprietários, os arrendatários e os assalariados. Como caracteriza</p><p>Neves (2007):</p><p>Os proprietários rurais são os produtores que detêm a posse dos</p><p>meios de produção; os arrendatários</p><p>e parceiros têm o poder de usar</p><p>os meios de produção que não possuem e, desta forma, pagam pelo</p><p>uso da terra desembolsando uma quantia fixa pela utilização ou uma</p><p>porcentagem da produção, respectivamente; finalmente, os</p><p>assalariados, permanentes ou temporários, que não têm os meios de</p><p>produção e vendem sua força de trabalho (p. 3).</p><p>15</p><p>Dados com base no censo escolar de 2002.</p><p>16</p><p>O Morro Quinongongo é ponto de referência da Geografia pelotense. Com 380m de altitude</p><p>destaca-se entre as demais elevações adjacentes. Também pode ser considerado um importante</p><p>patrimônio histórico e cultural, pois nele se estabeleceu um dos três quilombos da região sul do RS,</p><p>que serviram de esconderijo e moradia para escravos foragidos das charqueadas, na metade do</p><p>século XIX, sendo considerado o maior quilombo entre eles (PERLEBERG, 2009).</p><p>32</p><p>Em geral, a conjugação do trabalho com o estudo faz parte da cultura rural.</p><p>Crianças e jovens colaboram na lida diária ajudando seus pais, seja plantando,</p><p>colhendo ou armazenando os produtos, cuidando dos animais ou realizando as lidas</p><p>domésticas.</p><p>Tais tarefas fazem parte do seu cotidiano porque a demanda de trabalho é</p><p>suprida, basicamente, pelos próprios membros da família. A maioria dos estudantes</p><p>frequenta a escola num turno e auxilia nos afazeres da propriedade no outro.</p><p>Quanto ao lazer, participam de festas comemorativas tradicionais17, jogos de</p><p>futebol, celebrações religiosas e atividades festivas desenvolvidas na escola e na</p><p>família.</p><p>A infraestrutura da região conta com: rede de energia elétrica, telefonia fixa e</p><p>móvel, serviço de transporte rural diário, escola, posto de saúde, estradas de</p><p>acesso, dentre outras.</p><p>Esclarecemos que considerando-se, inicialmente, o mapa da SMED com as</p><p>23 escolas do campo existentes na rede municipal de Pelotas, destacamos todas</p><p>aquelas que atendiam aos três critérios da pesquisa18. Encontramos dez. Tendo em</p><p>vista que o maior definidor da escolha era a localização geográfica julgando que</p><p>quanto mais interiorana fosse a escola maior seria o diferencial na pesquisa, ficamos</p><p>com um universo menor: apenas três para efetuar contato. Mantivemos a primeira</p><p>conversa com os diretores via telefone. De imediato descobrimos que uma das</p><p>instituições era lócus de outra pesquisa acadêmica, e por questões éticas a</p><p>abdicamos. Com uma amostra menor, constando de duas, a definição por aquela</p><p>que seria nosso campo de pesquisa foi intencional dado que durante o período que</p><p>antecedeu a decisão final tivemos vários contatos informais com o diretor que</p><p>sempre mostrou-se receptivo à pesquisa. Além dessa condição essa escola nos</p><p>pareceu apropriada porque apresentava bons requisitos com relação a infraestrutura</p><p>e, ainda, aproximava-se da nossa condição de acesso e locomoção.</p><p>17</p><p>Na região, são consideradas tradicionais as festas que envolvem os sacramentos religiosos, como:</p><p>casamento, batizado e a primeira comunhão, para os católicos, ou confirmação, para os luteranos.</p><p>18</p><p>Ver página 26.</p><p>33</p><p>3.5.1 A escola campo da pesquisa</p><p>A escola tem uma reconhecida tradição no setor educacional na região. Sua</p><p>instalação, em 1939, fui influenciada por pessoas da comunidade que acreditavam</p><p>na importância de ter um lugar para que as crianças estudassem.</p><p>Para a construção do histórico dessa instituição, contamos com a</p><p>contribuição de uma professora aposentada19, cuja família foi uma das responsáveis</p><p>pela fundação da escola naquela comunidade.</p><p>Contou-nos a professora que uma ação desencadeada pela sua avó,</p><p>parteira da localidade e idealizadora da escola foi o primeiro passo dado. Ela</p><p>defendia que em um lugar onde houvesse crianças deveria ter escola e igreja. Sob a</p><p>orientação do padre que atendia a comunidade local, obteve informações</p><p>necessárias e procurou apoio na vizinhança para dar continuidade ao seu projeto.</p><p>Inicialmente, foi organizado o conselho de pais, tendo presidente, vice-</p><p>presidente, secretário e tesoureiro, escolhidos entre eles. Posteriormente,</p><p>construíram um estatuto, e as instalações da escola foram construídas com a ajuda</p><p>e doações das pessoas da comunidade. Cada um dava produtos coloniais como se</p><p>fosse a moeda20. O tesoureiro arrecadava as doações para vender, e o dinheiro era</p><p>repassado para que o conselho comprasse os materiais necessários. Esse</p><p>movimento durou um ano, segundo a professora.</p><p>A entrevistada recorda que, nesse período, sua família se responsabilizou</p><p>pela acolhida e alimentação dos trabalhadores na obra. Inclusive construiu uma casa</p><p>para servir de moradia aos professores que viessem trabalhar na escola.</p><p>[...] eu lembro da minha mãe fazendo pão no forno, fazendo fornadas</p><p>de pão e lavando roupa no arroio para as pessoas que estavam</p><p>trabalhando na construção da escola e da igreja, cuidando dos filhos.</p><p>[...] minha família dava pouso e comida pelo carinho de acolher</p><p>essas pessoas que vinham prestar serviço para a comunidade.</p><p>Nos primeiros anos, escola e igreja funcionaram no mesmo prédio. A escola</p><p>oferecia o ensino fundamental incompleto em caráter particular21. A primeira</p><p>19</p><p>A professora preferiu que seu relato sobre a escola fosse apenas registrado através da escrita;</p><p>uma vez que se sentia inibida com o uso do gravador. Os dados foram anotados no diário de campo.</p><p>20</p><p>Ainda hoje, o escambo é praticado nas comunidades rurais.</p><p>21</p><p>Os pais mantinham um pagamento mensal para sustentar a manutenção da escola, bem como o</p><p>salário da professora.</p><p>34</p><p>professora, escolhida na própria localidade, era filha de um imigrante alemão,</p><p>também professor, e essa condição lhe atribuía certo grau de competência para</p><p>desempenhar a tarefa de ensinar. Cabe lembrar que nessa época, o recrutamento</p><p>de professores para atender as séries iniciais do Ensino Fundamental na zona rural</p><p>geralmente era feito entre os próprios moradores da localidade, em todo o país.</p><p>Esses profissionais eram denominados "leigos"22.</p><p>Com o passar do tempo, nos primeiros anos da década de 40, as famílias</p><p>começaram a ter dificuldade para manter seus pagamentos e arcar com o ônus do</p><p>salário da professora. Temendo o fechamento da escola, o comerciante23 da</p><p>localidade chegou à presença do prefeito e barganhou o pagamento do professor</p><p>para que as crianças pudessem continuar estudando.</p><p>Em meados de 1945, foi preciso substituir a professora e, com a vinda de</p><p>outro, a prefeitura encampou a escola, tornando-a pública e atendendo a toda</p><p>população da localidade.</p><p>O novo professor era oriundo da zona urbana e não se adaptou com a vida</p><p>na comunidade rural, assim como os demais que vieram posteriormente não</p><p>permaneceram por longo período. Quem vinha trabalhar na escola precisava</p><p>permanecer toda a semana, pois na localidade não havia ônibus para ir à cidade.</p><p>Era preciso se deslocar de carroça até o ponto de ônibus mais próximo, para tanto,</p><p>dependiam dos moradores.</p><p>Convém lembrar que, na História da Educação de Pelotas, vivia-se no</p><p>período em que os docentes urbanos eram lotados em escolas na zona rural, como</p><p>se fosse um "teste de aptidão". Manke (2006) recupera as características dessa fase</p><p>de início de carreira dos professores, no período compreendido entre as décadas de</p><p>1960 e 80:</p><p>Obrigadas a iniciarem a carreira profissional na zona rural, as</p><p>professoras oriundas da zona urbana, além de “contarem os dias”</p><p>para serem transferidas para a zona urbana, encaravam aquela</p><p>primeira escola como um “castigo inicial”. Além das dificuldades de</p><p>22</p><p>O uso do termo "leigo" para professores significa considerá-los como sujeitos “que desconhecem</p><p>ou são ignorantes do trabalho que fazem, realizam e, mais especificamente, daqueles professores</p><p>que não possuem uma formação básica para</p><p>lecionarem um determinado nível ou série” (AMARAL,</p><p>1991, p. 43).</p><p>23</p><p>Naquela época, década de 30, foi o primeiro habitante, na localidade, a ter uma venda/armazém e</p><p>um caminhão. Essa condição lhe outorgava certo grau de autoridade local. Era pessoa influente na</p><p>comunidade.</p><p>35</p><p>adaptação, os dois primeiros anos, que correspondiam ao período</p><p>que deveria ser cumprido na zona rural, eram intensamente</p><p>supervisionados pelos órgãos Superiores de Educação. Segundo os</p><p>relatos, eram levadas em consideração, na avaliação das</p><p>professoras, questões referentes à assiduidade, percentagem de</p><p>promoção dos alunos, e ainda, freqüência em cursos e reuniões. (p.</p><p>54)</p><p>Na década de 70, o prédio antigo foi destruído para dar espaço a uma nova</p><p>construção com maior infraestrutura: duas salas de aula grandes, um banheiro</p><p>masculino, um feminino, secretaria e cozinha. Esse empreendimento pode ter sido</p><p>reflexo do movimento lançado pelo governo estadual gaúcho, na década de 60, que</p><p>defendia a multiplicação do número de escolas, juntamente com a mobilização da</p><p>população e apoio das prefeituras24. No Brasil, nesse mesmo período, a educação</p><p>convivia com uma proliferação de programas de investimento nas escolas rurais</p><p>(CALAZANS, 1993).</p><p>Dando continuidade ao processo de investimento na educação, em meados</p><p>da década de 8025 o prefeito pelotense lançou um programa de participação popular</p><p>no processo de discussão do orçamento municipal. Com orientação democrática, o</p><p>programa reunia a população das comunidades ou bairros, em forma de assembléia,</p><p>para que definissem as prioridades locais.</p><p>Esse programa serviu como impulso para a execução de novas obras de</p><p>ampliação do espaço físico da escola. Nessa etapa, o potencial da comunidade</p><p>funcionou, novamente, como elemento de contrapartida à proposta do governo, ou</p><p>seja, a mão de obra da região serviu como recurso utilizado na construção das</p><p>novas dependências da escola. Desde então, a instituição passou a oferecer o</p><p>ensino fundamental completo.</p><p>Nesse momento, o papel do professor26 regente foi de idealizador de um</p><p>anseio da comunidade – implantar o ensino fundamental completo. Conforme narrou</p><p>a entrevistada:</p><p>24</p><p>As prefeituras cediam terreno e transporte, e mão de obra com os mutirões populares, ao passo</p><p>que ao estado cabia o fornecimento dos recursos materiais e financeiros. Isso possibilitou a</p><p>construção de muitas escolas em pouco tempo. Disponível em:</p><p>Acesso em: 10 jun 2013.</p><p>25</p><p>No país vivia-se a efervescência de um projeto popular de educação. Em particular, no município,</p><p>não era diferente. As propostas para a educação estavam fortemente alicerçadas nas ideias de Paulo</p><p>Freire.</p><p>26</p><p>O professor é filho de agricultor e sempre residiu na localidade. Atualmente, é aposentado e figura</p><p>de referência na comunidade.</p><p>http://pt.wikipedia.org/wiki/Governo_Brizola_no_Rio_Grande_do_Sul</p><p>36</p><p>Quando entrou o Bernardo ele fez aquele programa Todo Poder</p><p>Emana do Povo [...] e foi onde surgiu a ideia de fundar o ginásio. Na</p><p>época o professor e regente da escola saía de moto na casa dos pais</p><p>convidando os moradores em idade escolar para voltar aos estudos e</p><p>conseguir formar um grupo de futuros alunos [...]. Então foi fundado</p><p>o ginásio que iniciou com a 6ª série. As aulas eram na igreja e eu era</p><p>professora de Geografia, História e Religião. [...] e neste período</p><p>construíram três salas de aula que serviriam para a sexta, sétima e</p><p>oitava séries.</p><p>Para atender à nova demanda da escola, era necessário contar com número</p><p>maior de docentes. A partir daí, a chegada de professores oriundos da cidade se</p><p>tornou mais frequente. Por um lado, no final dos anos 80, a rede pública municipal</p><p>passou a não contratar professores leigos nas comunidades e, para atender às</p><p>séries finais do ensino fundamental, era exigida mão de obra qualificada, sobretudo</p><p>em nível de graduação, que atendesse às especificidades de cada disciplina. Logo,</p><p>a localidade não dispunha de tantos profissionais habilitados para compor seu</p><p>quadro, assim, como não tem até hoje.</p><p>Atualmente, a educação oferecida nas escolas localizadas na zona rural</p><p>devem seguir orientação específica que encontra guarida nas Diretrizes</p><p>Operacionais das Escolas do/no Campo27. Integrada nesse novo projeto,</p><p>desenvolvido em todo território nacional, a escola pesquisada tenta adequar-se às</p><p>novas orientações e vem conquistando novos investimentos, principalmente,</p><p>contando com o aporte financeiro estatal destinado à qualificação do espaço físico.</p><p>Hoje, a escola possui uma área construída equivalente a 1040,57m²,</p><p>aproximadamente, distribuída em 6 salas de aula, 1 biblioteca, 1 cozinha com</p><p>despensa, 1 refeitório, 4 banheiros diversos (masculino, feminino, adaptado para</p><p>pré-escolar e adaptado para deficiente físico), área de lazer com pracinha para</p><p>recreação, 1 quadra poliesportiva, 1 sala de professores, 1 laboratório de</p><p>informática, 1 laboratório de ciências, 1 sala de recursos para atendimento</p><p>especializado com psicopedagoga, 1 secretaria, 1 sala multiuso que serve para</p><p>trabalho da equipe diretiva, serviço de orientação pedagógica e orientação</p><p>educacional, realização de reuniões e, também, para uso das multimídias com</p><p>alunos.</p><p>27</p><p>Anexos A e B: Resolução CNE/CEB nº 1, de 3 de abril de 2002, complementadas pela Resolução</p><p>CNE/CEB nº 2, de 28 de abril de 2008. Disponíveis, respectivamente, em:</p><p>e</p><p>Acesso em 26 set. 2013.</p><p>http://portal.mec.gov.br/cne/arquivos/pdf/CEB012002.pdf</p><p>http://portal.mec.gov.br/cne/arquivos/pdf/2008/rceb002_08.pdf</p><p>37</p><p>Para atender à execução de atividades como projetos extra classe (dança e</p><p>artesanato), reuniões de pais, palestras, festividades, é utilizado o salão da</p><p>comunidade religiosa o qual funciona como uma extensão do espaço escolar.</p><p>A escola funciona nos dois turnos e oferta duas etapas da educação básica:</p><p>a Educação Infantil, turma única, e o Ensino Fundamental completo, seguindo o</p><p>sistema antigo de seriação de 4ª a 8ª séries, paralelamente, segue orientações para</p><p>implantar o Ensino Fundamental de nove anos. Atualmente, já possui turmas do 1º</p><p>ao 4º ano. A cada período letivo anual uma série é extinguida, sendo implantado</p><p>outro ano, assim sucessivamente.</p><p>Totalizando a matrícula de 234 alunos, anualmente a escola recebe uma</p><p>demanda, em média, de 50 novos estudantes oriundos de escolas que oferecem</p><p>apenas as séries/anos iniciais da região, no intuito de concluir as etapas finais do</p><p>ensino fundamental, tendo como matriz curricular em vigor a mesma utilizada em</p><p>toda rede municipal.</p><p>O quadro funcional é composto, por uma equipe diretiva (1 diretor e 2</p><p>coordenadoras pedagógicas), 22 professores, 1 orientadora educacional e 10</p><p>funcionários entre secretária, monitores, merendeiras e serventes.</p><p>Os professores que atuam na escola podem ser divididos em dois grupos:</p><p>aqueles que são de origem rural (nasceram, cresceram e moram em localidades</p><p>rurais) e aqueles que são de origem urbana.</p><p>O grupo discente são filhos de agricultores/ trabalhadores rurais, diaristas</p><p>(peões), operários, comerciantes, pedreiros, carpinteiros, caminhoneiros, servidores</p><p>públicos e serviços gerais.</p><p>Pelas informações colhidas, concluímos que essa escola foi se moldando e</p><p>ajustando com o passar dos anos, influenciada pelas tendências sociais e políticas</p><p>de cada período histórico. Também, ficou assinalado o empenho da comunidade</p><p>escolar em prol da educação das crianças como um valor fundamental no</p><p>desenvolvimento do ser humano, quando, em diversos momentos batalhou pela</p><p>existência da escola desde a sua fundação e manutenção contribuindo conforme</p><p>suas possibilidades e valorizando</p><p>a instituição como referência de ensino na</p><p>localidade.</p><p>38</p><p>3.6. Sujeitos da pesquisa</p><p>Para Minayo (1993, p. 22), as pessoas envolvidas no processo de pesquisa</p><p>são "[...] sujeitos de estudo, pessoas em determinadas condições sociais,</p><p>pertencentes a determinado grupo social ou classe com suas crenças, valores e</p><p>significados". Portanto, para definir a amostra, consideramos que os sujeitos</p><p>deveriam atender aos critérios de ter experiência docente em escolas urbanas e ser</p><p>residente na zona urbana.</p><p>Trabalhamos com sete professoras28 que atenderam aos critérios</p><p>preestabelecidos e se disponibilizaram participar do estudo. Sendo assim, no</p><p>compromisso ético e técnico que concerne à pesquisa, a identidade de cada uma foi</p><p>preservada e passamos a tratá-las por: Professora A, Professora B, Professora C,</p><p>Professora D, Professora E, Professora F e Professora G.</p><p>Quadro 02. Caracterização das professoras quanto à titulação/formação</p><p>Nome</p><p>Titulação</p><p>Ensino Médio Ensino Superior Pós-Graduação</p><p>Professora A Magistério Lic. em Letras -</p><p>Professora B</p><p>Preparação para</p><p>o Trabalho</p><p>Lic. em Artes Visuais</p><p>(Habilitação em</p><p>Desenho e</p><p>Computação Gráfica)</p><p>Especialização: Gráfica Digital</p><p>– Instituto de Física e</p><p>Metereologia – UFPel</p><p>Professora C Eletrônica</p><p>Lic. em Educação</p><p>Física</p><p>Especialização: Educação</p><p>Professora D</p><p>Técnica em</p><p>agropecuária</p><p>Lic. em História</p><p>Especialização: História do</p><p>Brasil</p><p>Mestrado: História da</p><p>Educação</p><p>Professora E</p><p>Contabilidade Lic. em Letras</p><p>Especialização: Letras –</p><p>Literatura comparada</p><p>Mestrado: Literatura</p><p>comparada (em andamento)</p><p>Professora</p><p>F</p><p>Magistério Pedagogia</p><p>Especialização: Gestão</p><p>escolar</p><p>Professora G Magistério</p><p>Lic. Curta em</p><p>Sociologia</p><p>-</p><p>Fonte: Elaborado pela autora com base nos dados das entrevistas</p><p>28</p><p>Cabe esclarecer que desenvolvemos a pesquisa com um grupo formado, exclusivamente, por</p><p>pessoas do sexo feminino por casualidade tendo em vista que não tivemos nenhum respondente, nas</p><p>entrevistas, do sexo oposto.</p><p>39</p><p>Quanto a titulação/formação observamos que essas professoras são</p><p>profissionais habilitadas, em nível superior, para a docência na educação básica.</p><p>Nota-se, também, que a maioria delas investiu em formação continuada em nível de</p><p>pós-graduação motivadas por interesse particular, conforme seus relatos. No</p><p>entanto, os dados do quadro confirmam a realidade brasileira quanto a falta de</p><p>formação docente específica para atuar em escola do/no campo. As docentes são</p><p>egressas de cursos de formação que não as preparou para atuarem na realidade</p><p>específica do campo. Portanto, não têm formação pedagógica como indica a</p><p>legislação nacional em vigência.</p><p>Quadro 03. Caracterização das professoras quanto a tempo de experiência</p><p>profissional e atividades docentes na zona rural</p><p>Nome</p><p>Tempo de</p><p>Docência</p><p>Regime de</p><p>Trabalho</p><p>Atividades</p><p>na escola</p><p>Disciplina</p><p>Observa-</p><p>ções</p><p>Z</p><p>o</p><p>n</p><p>a</p><p>U</p><p>rb</p><p>a</p><p>n</p><p>a</p><p>Z</p><p>o</p><p>n</p><p>a</p><p>R</p><p>u</p><p>ra</p><p>l</p><p>Z</p><p>o</p><p>n</p><p>a</p><p>R</p><p>u</p><p>ra</p><p>l</p><p>Professora</p><p>A</p><p>23 1 40h</p><p>4º ano</p><p>5ª a 8ª séries</p><p>Português Zona rural</p><p>Professora</p><p>B</p><p>3 8</p><p>40 h + 5 h</p><p>excedentes</p><p>Todas turmas</p><p>Ensino da Arte</p><p>+ Projeto de</p><p>Informática</p><p>Zona rural</p><p>Professora</p><p>C</p><p>15 12 40h</p><p>Pré - escola</p><p>3º ano</p><p>4ª, 5ª e 6ª</p><p>séries</p><p>Educação Física +</p><p>Programa Mais</p><p>Educação</p><p>29</p><p>Zona rural e</p><p>urbana</p><p>Professora</p><p>D</p><p>5 5 40h</p><p>5ª a 8ª séries</p><p>História e Ensino</p><p>Religioso</p><p>+ Biblioteca</p><p>Zona rural</p><p>Professora</p><p>E</p><p>5 8 20 h 5ª a 8ª séries</p><p>Língua Estrangeira –</p><p>Inglês</p><p>Zona rural e</p><p>urbana</p><p>Professora</p><p>F</p><p>10 7 40 h</p><p>3º ano</p><p>Português, Estudos</p><p>Sociais, Matemática,</p><p>Ensino Religioso e</p><p>Ciências +</p><p>Classe de Apoio</p><p>Zona rural.</p><p>Professora</p><p>G</p><p>24 7 20h 4ª série</p><p>Português, Estudos</p><p>Sociais, Matemática,</p><p>Ensino Religioso e</p><p>Ciências</p><p>Zona rural</p><p>Fonte: Elaborado pela autora com base nos dados das entrevistas</p><p>29</p><p>O Programa Mais Educação é uma iniciativa coordenada pela SECAD/MEC, em parceria com a</p><p>Secretaria de Educação Básica (SEB/MEC) e com as Secretarias Estaduais e Municipais de</p><p>Educação. O programa visa a fomentar atividades para melhorar o ambiente escolar, por meio de</p><p>atividades optativas oferecidas, principalmente, para alunos em situação vulnerável.</p><p>40</p><p>Esse panorama demonstra que as entrevistadas possuem tempos diferentes</p><p>de docência em escola do/no campo que varia entre um e doze anos, porém, deram</p><p>início a sua atuação profissional nessa realidade depois de terem adquirido</p><p>experiência em escola urbana, comprovando que todas atenderam a um dos</p><p>critérios para participar da pesquisa.</p><p>Entrevistamos professoras que atendem séries/anos iniciais e finais e essa</p><p>condição mostrou formas diferentes de atuação, pois é natural que a diferença de</p><p>carga horária determine distintos comportamentos e formas de relacionamento, bem</p><p>como o desenvolvimento das aulas. Professores que trabalham com séries/anos</p><p>iniciais permanecem tempo maior em contato com seus alunos o que distingue dos</p><p>colegas que atendem as séries/anos finais.</p><p>Verificamos que todas as professoras possuem sua carga horária</p><p>preenchida com alunos, revelando que não possuem tempo disponível para</p><p>planejamento previsto na legislação. Cada professora está alocada, de acordo com</p><p>a necessidade da escola, conforme habilitação específica e carga horária da</p><p>disciplina, incluindo o desenvolvimento de projetos que complementam a formação</p><p>do aluno enquanto aprendiz.</p><p>Cada vez mais as escolas estão ampliando a oferta de atividades</p><p>complementares ao ensino. São formatos que se estabelecem de acordo com a</p><p>organização operacional de cada instituição. De certo modo, estamos caminhando</p><p>na direção do que tem defendido o Estado brasileiro, ou seja, implantar o</p><p>atendimento em turno integral.</p><p>41</p><p>4 Fundamentação teórica</p><p>4.1 A educação no contexto rural brasileiro: um breve recorrido aos períodos</p><p>que marcaram a Educação rural e a Educação do/no campo</p><p>De acordo com o histórico recuperado por alguns teóricos, a respeito da</p><p>educação em escolas rurais no Brasil, é possível conhecer e compreender o</p><p>movimento decorrente das mudanças sociais, políticas e econômicas com base nos</p><p>modelos vigentes em cada época, que a influenciaram e determinaram as regras de</p><p>estrutura e funcionamento.</p><p>Quando se trata do enfoque da educação para o desenvolvimento integral</p><p>das zonas rurais, podemos encontrar expressões diferenciadas para referir a</p><p>educação para o meio rural, no decorrer dos anos: ruralização do ensino, educação</p><p>rural, escola rural, educação básica nas escolas do campo e educação do/no</p><p>campo, por exemplo, sendo que esta última se tornou consagrada e está em</p><p>vigência nos últimos anos.</p><p>Optamos por utilizar os termos “Educação rural” e “Educação do/no campo”,</p><p>por serem conceitos que estabelecem o marco divisor entre dois períodos históricos</p><p>na educação brasileira, trazendo, em seu bojo, concepções por vezes antagônicas</p><p>que orientaram as políticas educacionais do país.</p><p>Um balanço da história educacional brasileira que reflete os aspectos de</p><p>uma Educação rural reduzida à marginalização é apresentado por Leite (2002). O</p><p>autor destaca o papel do Estado no desenvolvimento da extensão rural e das</p><p>preocupações com o atraso educacional que permeava o meio rural brasileiro no</p><p>início do século XX até os anos 70.</p><p>42</p><p>Apesar disso, as ações governamentais demonstravam a falta de políticas</p><p>adequadas ao homem do campo e às suas peculiaridades. Durante esse período, o</p><p>homem do campo foi concebido como exemplo do atraso, e a política educacional se</p><p>organizava em conformidade com os interesses capitalistas predominantes na</p><p>época.</p><p>Fernandes e Molina (2004, p. 62) explicam que “a origem da educação rural</p><p>está na base do pensamento</p>