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Espaços Livres de Uso Público na Cidade Contemporânea - 1 Organizadoras Norma Regina Truppel Constantino Karla Garcia Biernath Karina Andrade Mattos Espaços Livres de Uso Público na Cidade Contemporânea 1ª Edição ANAP Tupã - SP 2016 2 EDITORA ANAP - Associação Amigos da Natureza da Alta Paulista Pessoa de Direito Privado Sem Fins Lucrativos, fundada em 14 de setembro de 2003. Rua Bolívia, nº 88, Jardim América, Cidade de Tupã, São Paulo. CEP 17.605-310. Contato: (14) 3441-4945 www.editoraanap.org.br www.amigosdanatureza.org.br editora@amigosdanatureza.org.br Revisão Ortográfica: Joselilian Lopes Miralha Ficha Catalográfica Índice para catálogo sistemático Brasil: Planejamento urbano e paisagismo C758e Espaços livres de uso público na cidade contemporânea / Norma Regina Truppel Constantino, Karla Garcia Biernath e Karina Andrade Mattos (orgs) – Tupã: ANAP, 2016. 124 p; il. Color. 14,5 cm ISBN 978-85-68242-44-5 1. Paisagem 2. Projetos de Intervenções 3. Sustentabilidade I. Título. CDD: 710 CDU: 710/49 Espaços Livres de Uso Público na Cidade Contemporânea - 3 CONSELHO DE PARECERISTAS Profª Drª Alba Regina Azevedo Arana – UNOESTE Prof. Dr. André de Souza Silva - UNISINOS Profª Drª Angélica Góis Morales – FCE/UNESP Prof. Dr. Antônio Cezar Leal – FCT/UNESP Prof. Dr. Antonio Fábio Sabbá Guimarães Vieira – UFAM Prof. Dr. Antonio Fluminhan Jr. – UNOESTE Prof. Dr. Arnaldo Yoso Sakamoto – UFMS Prof. Dr. Daniel Dantas Moreira Gomes – UPE – Campus de Garanhuns Profª Drª Daniela de Souza Onça – UDESC Prof. Dr. Edson Luís Piroli – UNESP – Campus de Ourinhos Profª Drª Eloisa Carvalho de Araujo - UFF Prof. Dr. Erich Kellner – UFSCar Profª Drª Flávia Akemi Ikuta – UFMS Profª Drª Isabel Cristina Moroz Caccia Gouveia– FCT/UNESP Prof. Dr. João Cândido André da Silva Neto – UEA / CEST Prof. Dr. Joao Osvaldo Rodrigues Nunes– FCT/UNESP Prof. Dr. José Carlos Ugeda Júnior – UFMS Prof. Dr. Junior Ruiz Garcia – UFPR Profª Drª Jureth Couto Lemos – UFU Profª Drª Kênia Rezende – UFU Prof. Dr. Luciano da Fonseca Lins – UPE – Campus de Garanhuns Profª Drª Maira Celeiro Caple – Universidade de Havana – Cuba Profª Drª Marcia Eliane Silva Carvalho – UFS Prof. Dr. Marcos Reigota – Universidade de Sorocaba Profª Drª Maria Betânia Moreira Amador – UPE – Campus de Garanhuns Profª Drª Maria Helena Pereira Mirante – UNOESTE Profª Drª Martha Priscila Bezerra Pereira – UFCG Profª Drª Natacha Cíntia Regina Aleixo – UEA Prof. Dr. Paulo Cesar Rocha – FCT/UNESP Prof. Dr. Pedro Fernando Cataneo – FCE/UNESP Prof. Dr. Rafael Montanhini Soares de Oliveira – UTFPR Profª Drª Regina Célia de Castro Pereira – UEMA Profª Drª Renata Ribeiro de Araújo – FCT/UNESP 4 Prof. Dr. Ricardo Augusto Felício – USP Prof. Dr. Ricardo de Sampaio Dagnino – UNICAMP Profª Drª Roberta Medeiros de Souza – UFRPE – Campus Garanhuns Prof. Dr. Roberto Rodrigues de Souza – UFS Prof. Dr. Rodrigo José Pisani – Unifal Prof. Dr. Rodrigo Simão Camacho – UFGD Prof. Dr. Ronaldo Rodrigues Araújo – UFMA Profª Drª Rosa Maria Barilli Nogueira – UNOESTE Profª Drª Simone Valaski – Universidade Federal do Paraná Profª Drª Silvia Cantoia – UFMT – Campus Cuiabá Profª Drª Sônia Maria Marchiorato Carneiro – UFPR Espaços Livres de Uso Público na Cidade Contemporânea - 5 SUMÁRIO APRESENTAÇÃO ........................................................................ Norma Regina Truppel Constantino Karla Garcia Biernath Karina Andrade Mattos 07 Capítulo 1 ................................................................................... OS PADRÕES URBANÍSTICOS DE PRODUÇÃO E GESTÃO DAS CIDADES E SUAS (DES)CONEXÕES COM OS ESPAÇOS LIVRES URBANOS Karina Andrade Mattos Norma Regina Truppel Constantino 11 Capítulo 2 ................................................................................... O CARÁTER MULTIFUNCIONAL DAS CIDADES VERDES: QUESTÕES PARA UM DEBATE Eloisa Carvalho de Araujo Natália Fernandes Ribeiro 33 Capítulo 3 ................................................................................... ESTUDOS DE TRANSFORMAÇÕES DA PAISAGEM E SEUS IMPACTOS NAS ÁGUAS URBANAS Fernanda Moço Foloni Norma R. T. Constantino 53 6 Capítulo 4 ................................................................................... CONTRIBUIÇÃO DAS TRANSFORMAÇÕES DE ESPAÇOS PÚBLICOS NO DESENVOLVIMENTO SUSTENTÁVEL DAS CIDADES: O CASO DO PARQUE POTYCABANA, EM TERESINA PIAUÍ Lara Citó Lopes Wilza Gomes Reis Lopes Letícia Soares Daniel Diego Ribeiro Fontenele 77 Capítulo 5 ................................................................................... PARQUE DO POVO: LEVANTAMENTO QUANTIQUALITATIVO DA INFRAESTRUTURA E LAZER Talita Batista dos Santos Milena de Moura Regis Ana Paula do Nascimento Lamano Ferreira 97 Capítulo 6 ................................................................................... AVALIAÇÃO DAS INFRAESTRUTURAS DAS PRAÇAS CENTRAIS DA CIDADE DE CAMPO MOURÃO – PR Tatiane Monteiro Re Marcos Clair Bovo 111 Espaços Livres de Uso Público na Cidade Contemporânea - 7 APRESENTAÇÃO Os trabalhos apresentados neste livro oferecem um panorama acerca dos espaços livres públicos e sua relação com a cidade e o meio ambiente. No primeiro capítulo, Karina Andrade Mattos e Norma Regina Truppel Constantino, analisam a produção e a gestão dos espaços livres públicos na atualidade, apresentando diversos modelos de produção adotados em alguns centros urbanos brasileiros e elencando a importância destes espaços na vida das cidades. São locais que atendem demandas de circulação, recreação, lazer, relaxamento, conservação ambiental, assim como, possibilitam manifestações políticas e proporcionam memórias afetivas. Com diversas funções, estes espaços tornam-se cada vez mais importantes para a vida cotidiana das cidades, mas que infelizmente em muitos casos, devido às descontinuidades das políticas públicas, falta de planejamento ou até mesmo falta de investimentos, geram espaços sem qualidade para a população. Este trabalho, chama a atenção para que sejam tomadas novas posturas administrativas e projetuais por parte dos gestores públicos, que exige estudos, conhecimentos e sensibilidade, levando em conta as relações entre o homem e a natureza, assim como as especificidades econômicas, climáticas, históricas e culturais de cada local. Em relação às cidades verdes, Eloisa Carvalho de Araujo e Natália Fernandes Ribeiro apresentam um panorama das ações estratégicas de infraestrutura verde promovidas em âmbito nacional. Nesse contexto, destaca-se a cidade de Curitiba, que possui um alto desempenho exercido no tocante às questões ambientais. Adotou-se a Ecologia da paisagem, como metodologia de trabalho, como uma visão integradora da paisagem que envolve unidades interativas. A área do presente estudo tem como recorte espacial a cidade do Rio 8 de Janeiro, especialmente a zona oeste, e reflete a importância de promover a qualidade dos rios urbanos e a implantação de corredores verdes. O trabalho gera a reflexão sobre a importância do planejamento urbano ambiental das cidades assim como a valorização da infraestrutura verde incorporando valores culturais, sociais e ambientais. No tocante à águas urbanas, Fernanda Moço Foloni e Norma Regina Truppel Constantino analisam diversos estudos de caso sobre revitalização de rios urbanos e ocorrências de enchentes em diversas cidades brasileiras. Estes estudos foram relacionados pelas autoras, destacando seus problemas, bem como as respectivas soluções apresentadas em cadafederal a definição de Áreas Verdes Urbanas é instituída pelo novo Código Florestal, Lei nº 12.651/2012. Esse código vem por definir em seu Artigo 3º que o significado de áreas verdes urbanas abarca o mesmo que “espaços, públicos ou privados, com predomínio de vegetação, preferencialmente nativa, natural ou recuperada”. Esta definição, incorporada aos instrumentos jurídico- urbanísticos do município, apresenta estas áreas em um contexto de sua indisponibilidade à construção de moradias. Mas por outro lado, destinadas, como ressalta a lei, ao propósito de “recreação, lazer, melhoria da qualidade ambiental urbana, proteção dos recursos hídricos, manutenção ou melhoria paisagística, proteção de bens e manifestações culturais”. A mesma legislação, quando trata das Áreas de Preservação Permanente - APPs20 urbanas, nos instiga a investigar conflitos relacionados às faixas marginais de proteção de cursos d’água, com potencial para a preservação de corredores ecológicos. Nesse sentido, os resultados da pesquisa em curso, ainda que parciais, sugerem práticas de requalificação ambiental urbana, sob a ótica de políticas socioambientais. Programas ambientais de plantio de mudas, por exemplo, podem melhorar a quantidade e qualidade das águas que são captadas para tratamento e distribuição, como é o caso dos rios que contribuem para a Bacia do Rio Guandu, responsável pelo abastecimento da cidade do Rio de Janeiro. 20 As Áreas de Preservação Permanente - APPs são definida pelo novo Código Florestal, Lei 12.651/2012 “como áreas protegida, coberta ou não por vegetação nativa, com a função ambiental de preservar os recursos hídricos, a paisagem, a estabilidade geológica e a biodiversidade”, mas também apresentam-se no mesmo Código, como áreas que visam “facilitar o fluxo gênico de fauna e flora, proteger o solo e assegurar o bem-estar das populações humanas”. 48 4 CONCLUSÃO Novos sentidos para a relação homem natureza na cidade precisam ser materializados, exigindo reflexões quanto à degradação natural e física e sua relação com a degradação social das áreas periféricas. A partir das reflexões frente aos autores analisados e, das perspectivas que envolvem a área de estudo, questiona-se sobre a melhoria da qualidade dos rios urbanos e o uso dos corredores verdes como proteção ecológica e de bem estar social. A pesquisa demonstra, até o presente momento, a necessidade de compreender o quanto a relação do rio com o espaço urbano, seja por variáveis estéticas, hidráulicas e políticas de gestão do território, deve ser favorável à preservação dos cursos d’água. A investigação, no âmbito da área de estudo, vem por considerar o rio como elemento da paisagem urbana da cidade, e como tal, com possibilidade de valorização de percursos que venham a contribuir para o redesenho da paisagem que ressalte cenário atual e potencial. No caso de áreas periféricas, em especial no município do Rio de Janeiro, o trabalho empírico, em desenvolvimento, nos inquieta quanto à necessidade de acesso às informações e estudos disponíveis, assim como, quanto à articulação com políticas públicas, organizações sociais e movimentos ativistas. Nesse sentido, as reflexões, ora apresentadas no presente artigo, pretendem ressaltar a importância do planejamento urbano ambiental para as cidades e sua repercussão na qualidade ambiental urbana, a partir de uma visão integradora da paisagem, assim como, valorizar o papel do desenho da infraestrutura verde na cidade contemporânea, ao incorporar seus valores ambientais, sociais e culturais. Esse entendimento nos direciona a designar às Cidades Verdes um caráter multifuncional baseado em paisagens que sugerem Espaços Livres de Uso Público na Cidade Contemporânea - 49 estruturas constituídas por sistemas diversos que estabelecem relações, fluxos e processos a partir de atividades também diversas, na perspectiva de aproximação dos ecossistemas naturais. REFERÊNCIAS ARAUJO, Eloisa C. Relatório de Pesquisa Institucional Infraestrutura e Cidade: relação entre espaço e meio ambiente, FAPERJ, 2014. BARBOSA, Valter Luís. NASCIMENTO JR, Antônio Fernandes. Paisagem, Ecologia Urbana e Planejamento Ambiental. Revista de Geografia (Londrina) v. 18, n. 2, 2009. Ver em: http://www.uel.br/revistas/uel/index.php/geografia/. Acesso em 10 de maio de 2015. BERNALDEZ, Fernando Gonzalez. Ecologia y Paisaje. Madri: Blume, 1981. CONDER, Companhia de Desenvolvimento Urbano do Estado da Bahia. Projeto de Requalificação Urbana e Ambiental da Bacia do Cobre. 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Acesso em 08 de maio de 2015. 52 Espaços Livres de Uso Público na Cidade Contemporânea - 53 Capítulo 3 ESTUDOS DE TRANSFORMAÇÕES DA PAISAGEM E SEUS IMPACTOS NAS ÁGUAS URBANAS Fernanda Moço Foloni21 Norma R. T. Constantino22 INTRODUÇÃO O acelerado crescimento das cidades nos últimos tempos tem resultado em graves complicações ao meio ambiente, sendo cada vez mais perceptível as suas consequências no cotidiano da população. Um exemplo claro é o estado de muitos rios urbanos: antes fundamentais para a formação dos primeiros povoados, são atualmente tidos como insalubres, desnecessários e a causa de inundações. Entretanto, graças ao crescimento da consciência ambiental, muitas organizações têm se empenhado em pesquisar maneiras de revitalizá-los, requalificando a paisagem urbana. Normalmente, os projetos de revitalização de rios urbanos mais divulgados são aqueles internacionais, como o Rio Cheonggyecheon em Seul ou o Rio Tamisa em Londres. Contudo, os modelos estrangeiros nem sempre são as únicas fontes de pesquisa para se utilizar de exemplos. Existem disponíveis diversos estudos de casos nacionais, executados com sucesso até mesmo publicados no exterior. 21 Mestranda, UNESP, Brasil. E-mail: fe_foloni@hotmail.com 22 Professora Doutora, UNESP, Brasil. E-mail: nconst@faac.unesp.br 54 Ao buscarmos estudos de casos brasileiros nos deparamos com alternativas sustentáveis mais adequadas ao clima e à morfologia desejados, para as cidades modernas com problemas urbanos relacionados à degradação do meio ambiente e da paisagem, e às causas e consequências do abandono dos rios. Para isso, foram levantados a partir de revisão literária, estudos de caso relacionados aos rios urbanos e à ocorrência de enchentes nas cidades. Serão destacadas, neste capítulo, as semelhanças entre estes estudos, assim como as problemáticas que descrevem e as respostas apresentadas para reintegração dos rios à sociedade. Todos estes princípios obtidos nas soluções são conceitos de Infraestrutura Verde. DA PAISAGEM NATURAL À URBANIZAÇÃO Antes de entender quais as dificuldades que as cidades vêm enfrentando e como estas podem ser superadas é fundamental compreender, primeiramente, o que é a paisagem urbana, para então estudarmos como intervenções inadequadas feitas pelo homem resultaram nos problemas atuais. A paisagem é um espaço (ASSUNTO, 2011, p.341-344), mas, por ser um objeto de experiência estética e, portanto, tema de um juízo estético, não deve ser tratado como um espaço vazio. Corajoud (2011, p.214) a caracteriza dizendo não se tratar da representação do infinito, entretanto, esta se abre a ele (o céu), ou seja: a paisagem é o lugar onde o céu e a terra se tocam, na linha do horizonte. Para o autor a paisagem urbana “tem todas as qualidades aparentes de uma paisagem, [...] mas é uma montagem cuja unidade é apenas artefato” (CORAJOUD, 2011, p. 219), o que reflete a importância da presença de pessoas na definição de paisagem urbana, pois ela não teria significado qualquer se o homem não tivesse agido sobre ela. Pode ainda existir uma relação com a paisagem natural quando esta se Espaços Livres de Uso Público na Cidade Contemporânea - 55 abre à cidade, como quando um rio adentra nela (CORAJOUD, 2011, p. 220). Um rio, ao entrar na cidade, se torna parte da paisagem urbana e, quando a cidade invade as águas, as águas invadem a cidade. Com essa afirmação Costa (2006, p.10) simplifica a relação atual entre o meio urbano e seus rios nas últimas décadas. Ao mesmo tempo em que os rios oferecem a possibilidade de convívio e interação entre as pessoas, são também corredores biológicos capazes de permitir a presença da fauna e da flora na cidade, além de alimento, lazer e transporte. Entretanto, essa íntima relação com a cidade desde as formações coloniais vem sendo abalada por crescentes expansões urbanas, decorrentes de ocupações irregulares em áreas de várzeas e transformação dos córregos em coletores de lixo e esgoto. Isto resulta desde grandes inundações até o desaparecimento total de cursos d’água da paisagem urbana. De um ponto de vista histórico, Marx (1980, p.31) trata dessa relação de degradação como um alerta para os efeitos do crescimento acelerado das cidades, da mudança do modelo de vida urbanizada e da alteração rápida do quadro social: mais pessoas partiam do campo para morar na cidade. Existe uma relação direta entre a crescente ocupação desorganizada nos fundos de vale e as enchentes urbanas. As primeiras retificações de cursos d’água nas cidades brasileiras ocorreram entre meados do século XIX e a década de 1920, período este conhecido como “fase higienista” (OSEKI; ESTEVAM, 2006, p.84- 85). As vilas já próximas ao leito do rio precisavam expandir seu entorno para acomodar o crescimento populacional, passando a ocupar as duas margens. Logo, surgiram as vilas operárias que aglomeraram ainda mais as pessoas em pequenos espaços insalubres, resultando em surtos epidêmicos. Sem saneamento, o esgoto era despejado direto no rio, o que fazia com que a 56 propagação das doenças se agravasse nos períodos de cheia. Isto levou à primeira medida tomada como necessária: a retificação dos rios, que corriam sinuosos, para direcionar as águas pluviais e o esgoto para longe. Consequentemente, surgia por todo país a necessidade de “uma mudança radical na filosofia das soluções estruturais em drenagem urbana” (CANHOLI, 2005), e a solução encontrada após a retificação, em meados do século XX, foi a canalização dos cursos d’água. Desta forma acelerava-se o escoamento para fora do centro urbano e ainda era possível ocupar o terreno pantanoso drenado. O progresso trouxe também a necessidade de novas avenidas, que poderiam ser construídas sobre os rios canalizados. Entretanto, a canalização provou sua ineficiência ao longo do tempo, pois além de levar o mau cheiro que escapava pelos bueiros e bocas de lobo por todo seu curso, nas épocas de chuva intensa o rio receptor passou a sofrer sobrecarga e transbordar mais do que normalmente ocorria em épocas de cheia, alagando as residências que ocupavam os fundos de vale do antigo leito natural do rio. Segundo Sheaffer e Wright (1982), o plano de drenagemdeve delinear alguns objetivos. Entre eles: manter as regiões ribeirinhas ainda não urbanizadas em condições que minimizem as interferências com a capacidade de escoamento e armazenamento do talvegue; reduzir gradativamente o risco de inundações a que estão expostas pessoas e propriedades; reduzir o nível existente de danos por enchentes; assegurar que os projetos de prevenção e correção sejam consistentes com os objetivos gerais do planejamento urbano; minimizar problemas de erosões e assoreamentos; controlar a poluição difusa; e incentivar a utilização alternativa de aguas de chuvas coletadas, para uso industrial, irrigação e abastecimento. (CANHOLI, 2005, p.24). Com o passar do tempo, passou-se a buscar medidas de controle para minimizar os danos das inundações. No início tratavam- se principalmente de medidas estruturais, que são majoritariamente obras capazes de acelerar o escoamento, como a elaboração de Espaços Livres de Uso Público na Cidade Contemporânea - 57 túneis e canalizações, restaurações de calhas naturais e construção de reservatórios. Aos poucos, foram sendo implementadas também algumas medidas não estruturais, de menor custo, que são as que envolvem criações de sistemas de alerta e previsão de enchentes, de leis e instrumentos para regulamentação de ocupação do solo, de desapropriação para construção de áreas permeáveis e educação ambiental. É importante ressaltar que o melhor aproveitamento dessas medidas está no seu uso em conjunto, como na formulação de Planos Diretores com foco em gerenciamento das bacias hidrográficas, conservação ambiental e macrodrenagem (CANHOLI, 2005, p.25-27). O estudo dessas medidas e outras formas sustentáveis de adequar a relação entre a natureza e o meio urbano é definido pelo conceito de Infraestrutura Verde: Denomina-se infraestrutura verde (tradução do termo inglês green infraestructure) uma rede de espaços abertos e áreas vegetadas (corredores verdes, alagados, parques, florestas preservadas ou plantadas com espécies nativas) e contando, na microescala, com jardins de infiltração, biovaleta e outras medidas de infiltração das águas pluviais, visando a intervenções urbanas de baixo impacto e incorporando práticas sustentáveis de manejo das águas, que incluem medidas não estruturais e estruturais não convencionais, de baixo custo e mais efetivas a médio prazo (GORSKI, 2015, p.223). A Infraestrutura Verde destaca a importância da vegetação, na natureza e na cidade, pois é capaz de proteger as margens dos corpos d’água, ocupar vazios urbanos e trazer conforto térmico para os bairros, conectando estes elementos por toda a extensão do território. 58 METODOLOGIA Com a intenção de aprofundamento nos estudos sobre rios urbanos, esta pesquisa investiga as principais dificuldades que as cidades brasileiras vêm enfrentando, decorrentes do processo de urbanização desordenado desde a colonização. Ao tratar de pesquisas a respeito da paisagem da cidade e rios urbanos, é comum encontrarmos abordagens crítico-analíticas e crítico-propositivas. A partir da segunda abordagem, foram levantados 19 estudos de caso descritos em diferentes bibliografias. Então, foram destacados os problemas e as propostas de soluções apresentados pelos autores a respeito de suas respectivas cidades e bacias hidrográficas. Em seguida, foram elaborados três gráficos: o primeiro com os problemas urbanos mais frequentes entre os estudos de caso; o segundo com as medidas mais indicadas entre os mesmos; e o terceiro, a partir do segundo, a classificação de quantas das propostas apresentadas são medidas estruturais e não estruturais. Dessa forma, foi possível observar com mais clareza a relação entre a formação das cidades brasileiras, as consequências atuais para a população e a importância de estudos sobre a Infraestrutura Verde na busca de cidades sustentáveis. ESTUDOS DE CASO PROPOSTAS AINDA NÃO EXECUTADAS Rio de Janeiro/RJ: Bacia do rio Acari (Parque Unidos de Acari)23 Análise geral: inundações; dificuldade de escoamento das águas; despejo de efluentes nas galerias fluviais; assoreamentos; comprometimento da qualidade das águas; 23 BRITTO; SILVA, 2006, p. 17-32. Espaços Livres de Uso Público na Cidade Contemporânea - 59 erosões; ocupação irregular das margens do rio; acúmulo de resíduos sólidos; problemas de saneamento e doenças. Medidas indicadas: Construção de redes de esgoto previstas no Plano Diretor; dragagem do rio; criação de pôlderes para armazenamento de água das enchentes; delimitação de logradouros públicos nas margens do rio; aumento da largura do canal; uso de pavimentação permeável; reassentamento da população residente em áreas de risco de inundação; implantação de equipamentos e tratamento paisagístico; política de proteção da faixa marginal e recuperação dos recursos hídricos; criação de parques lineares e áreas de lazer nas margens liberadas; implantação de um programa de coleta de lixo adequado; recuperação das áreas de mangue e da mata ciliar. Rio de Janeiro/RJ: Rio Cabeça24 Análise geral: Córregos canalizados; adensamento de ocupação urbana no trecho canalizado; dejetos de esgoto ligados indevidamente à rede pluvial. Medidas indicadas: Projeto urbano voltado para a valorização do rio no Horto Florestal: tombamento da área antiga de uma chácara para criação de um parque voltado para contemplação e preservação do rio, para cidade do Rio de Janeiro e acessível à população; desapropriação das quadras de tênis particulares existentes próximas ao rio para garantir a preservação da margem nesse trecho; cobrança de ingresso por uma organização responsável (ONG) pela preservação da memória do rio e manutenção do espaço. 24 ESCARLATE, 2006 60 Novo Horizonte/SP: Córrego da Estiva25 Análise geral: contaminação da água; erosão do solo; terrenos abandonados com despejo irregular de resíduos sólidos; vegetação natural em regeneração. Medidas indicadas: Projeto de parque linear do córrego da Estiva: controle de erosão e restauração do principal canal de drenagem; novas vias de circulação; criação de atividades de recreação com programa de educação ambiental para os jovens; paisagismo urbano. São Paulo/SP: Bacia do Rio Cabuçu de Baixo26 Análise geral: Córrego canalizado; desmatamento da mata ciliar; inundações; ocupação desordenada; riscos à saúde pública; intenso processo de urbanização; instabilidade e contaminação do solo; contaminação das águas da bacia. Medidas indicadas: Controle de cheias: uso e ocupação do solo; realocação da população; recuperação de áreas de várzea; sistema de alerta; piscinões; gabião; parques lineares; valetas verdes, caixas de infiltração, jardins de chuva, pisos drenantes. Preservação e recuperação ambiental: criação de caminhos verdes para sub-bacia do Bananal; reflorestamento de encostas; alagados construídos; programa de educação ambiental. Controle de poluição difusa e saneamento básico: jardins de absorção de chuvas; bacias de detenção secas e alagadas; pisos drenantes; uso de jardins dentro dos lotes particulares; controle de sedimentos de construção; controle das ligações clandestinas de esgoto. 25 FRISCHENBRUDER; PELLEGRINO, 2006 26 GORSKI, 2010 Espaços Livres de Uso Público na Cidade Contemporânea - 61 Blumenau/SC: Rio Itajaí-Açu27 Análise geral: Aumento da impermeabilização urbana; desmatamento; ocupação das áreas de várzea; enchentes urbanas. Medidas indicadas: Gerenciamento de rios urbanos a partir de bacias hidrográficas e equipes interdisciplinares; legislação amplamente fiscalizada e divulgada; inserção de vegetação nativae preservação da mata ciliar; dragagem; evitar crescimento da área impermeabilizada nas margens do rio; construção de pontes para valorização e visibilidade do rio; respeitar a Área de Proteção Permanente em fundos de vale; construções voltadas para os rios ao invés de trata-los como local de despejos e fundo de lote; criação de parques nas áreas de várzeas para conter enchentes; apenas equipamentos de lazer e recreação nas margens; tratamento de efluentes por toda bacia hidrográfica; incentivo ao turismo fluvial e a navegabilidade. Rio das Ostras/RJ: Rio das Ostras28 Análise geral: ocupação irregular da várzea do rio; contaminação do lençol freático por meio de uso de fossas e sumidouros; drenagem inadequada; erosão e assoreamento das margens; enchentes; despejo de efluentes in natura; deslizamentos; mau destino do lixo. Medidas indicadas: controle do uso do solo por meio de execução do Plano Diretor; gestão por ecossistemas ao invés de limite territorial; criação de corredores verdes, ecológicos, de transição, e cicláveis. 27 PORATH; AFONSO, 2006, p. 163-176 28 RIBEIRO, 2013 62 São Paulo/SP: Sub-bacia do córrego do Saracura Pequeno (Grota do Bexiga)29 Análise geral: córregos canalizados; enchentes à jusante da bacia; erosão; verticalização intensa da área central da cidade no espigão da bacia ocupação do fundo do vale; alta taxa de impermeabilização do solo; aumento da emissão de calor e da poluição; desconformo térmico; cobertura vegetal escassa; pequena quantidade de áreas verdes e livres. Medidas indicadas: plantio de árvores; criação de parque arborizado em regiões de fundo de vale e nascentes; combater a impermeabilização do solo; arborização das ruas e alargamento das calçadas; utilização de mecanismos de retenção da água da chuva para retardamento e reuso; economia de água e energia; introdução de espelhos d’água; novos espaços de lazer e caminhos de pedestres; utilizar a calçada como ambiente de estar e de passeio. Nova Friburgo/RJ: Bacia ambiental do Córrego D'Antas30 Análise geral: Ocupação de áreas de risco pela população de baixa renda; lançamento de esgoto in natura, ausência de rede de drenagem; acúmulo de lixo nas margens dos corpos d’água; inundações e enxurradas. Medidas indicadas: Direcionar a vocação da área para o ecoturismo; estimular a criação e o cultivo com incentivo à produção sustentável; conter e monitorar a expansão urbana; dar um tratamento e um controle para as zonas de transição; alterar o zoneamento urbano do Plano Diretor, aumentando as Zonas de Especial Interesse Ambiental (ZEIA), criando de Zonas de Especial Interesse de Recuperação 29 SCHUTZER, 2012 30 VASCONCELLOS, 2015 Espaços Livres de Uso Público na Cidade Contemporânea - 63 Ambiental (ZEIRAS) e revisando as Zonas de Especial Interesse Social (ZEIS). PROPOSTAS EXECUTADAS OU EM ANDAMENTO Belo Horizonte/MG: Ribeirão do Arrudas31 Análise geral: áreas de risco ocupadas; rio canalizado; problemas de saneamento; alta taxa de impermeabilização do solo. Medidas indicadas: projeto de Requalificação Urbana Ambiental do Ribeirão do Arrudas – PAC Arrudas: prevê obras de drenagem; tratamento de fundo de vale; implantação de parque linear; instalação de equipamentos públicos de lazer e convivência; criação de novas unidades habitacionais; educação ambiental; saneamento e revitalização do rio. Campinas/SP: Ribeirão das Pedras32 Análise geral: deposição inadequada e irregular de resíduos sólidos; assoreamento do rio; inundação; poluição; ocupação irregular em áreas de inundação; desmoronamento das margens; processos erosivos em áreas desmatadas; quase inexistência de mata ciliar. Medidas indicadas: Parque Linear do Ribeirão das Pedras: recuperação das matas ciliares; criação de um corredor ecológico, com lagoas e ciclovia; construção de uma ETE para recuperação da qualidade da água; mudanças nas travessias viárias; criação de bacias de retenção detenção; criação de dispositivos no processo de licenciamento ambiental, no qual os grandes empreendimentos se comprometem a implementar o parque no seu trecho de influência do rio. 31 ARAUJO, 2016, p. 165-180 32 COSTA, 2011 64 Campinas/SP: Ribeirão das Anhumas33 Análise geral: cursos d'água em diferentes níveis de degradação, com pouca mata ciliar em seu entorno urbano. Medidas indicadas: Plano de Conservação Natural do Ribeirão das Anhumas: restauração do ecossistema e conservação dos rios; inventário de áreas em potencial para criação de corredores verdes que possam ligar espaços abertos urbanos com os principais remanescentes de florestas regionais, oferecendo aos moradores da cidade a possibilidade de acessar um espaço natural aberto das áreas mais densas através de áreas ambientalmente sensíveis. Curitiba/PA: Rio Iguaçu34 Análise geral: enchentes e inundações urbanas; segregação social; propagação de doenças; falta de saneamento básico; acúmulo de resíduos sólidos; poluição; despejo de efluentes in natura. Medidas indicadas: criação de um programa para controle de enchente; limpeza do rio e reforma de pontes; construção de um canal lateral para bloquear a pressão pública de invasão de áreas de proteção permanente (APP); criação de um parque interno como área de amortecimento e de lazer; elaboração do Plano Diretor da Região Metropolitana de Curitiba. 33 FRISCHENBRUDER; PELLEGRINO, 2006 34 PARKINSON, at. al, 2003 Espaços Livres de Uso Público na Cidade Contemporânea - 65 Esteio/RS: Arroio Sapucaia35 Análise geral: impactos causados pela urbanização; despejo de efluentes industriais e esgoto; ocupação irregular; alagamentos. Medidas indicadas: recuperação da mata ciliar; revitalização do rio; criação do projeto de Renaturalização do Arroio Sapucaia; reassentamento de moradores em área de proteção permanente; realização de reformas viárias; implantação de parques lineares; criação de reservatórios para amortecimento de cheias; adequação de canais para redução da velocidade de escoamento; construção de um dique e uma ETE no município; sistemas de drenagem por infiltração; recuperação de várzea e renaturalização de curso de água. Guarapiranga/SP: Rio Embu Mirim36 Análise geral: contaminação das águas decorrentes da invasão industrial urbana e de aterros sanitários periféricos à várzea. Medidas indicadas: estudo de proteção da várzea do rio Embu Mirim: Conservação das várzeas existentes e tomada de sua capacidade de depuração da água como um recurso para a bacia; sistema de circulação proposto como uma barreira para usos urbanos ao longo das várzeas, criando um parque público de escala regional. Piracicaba/SP: Rio Piracicaba37 Análise geral: rio retificado, tubulado e canalizado; despejo de esgoto e depreciação das margens do corpo d’água, 35 COSTA, 2011 36 FRISCHENBRUDER; PELLEGRINO, 2006 37 GORSKI, 2010 66 tornando-o insalubre e degradando sua paisagem; perturbação na cadeia ecológica e, por conta da poluição hídrica, prejuízo no abastecimento dos aquíferos. Medidas indicadas: redução do escoamento de resíduos sólidos para o leito do rio; plantio de árvores; implantação de coletor tronco; utilização de pisos drenantes; criação de Áreas de Proteção Ambiental (APAs); instalação de comportas ao lado do rio para controle das enchentes; aumento das áreas públicas; melhoria da acessibilidade; melhoria dos caminhos de pedestres, da infraestrutura e do mobiliário urbano; valorização da paisagem da cidade do ponto de vista do eixo do rio;uso da margem pelo pescador; instalação de deques; criação de passarelas para pedestres e trilha junto ao leito. Rio Grande/RS: Arroio Vieira38 Análise geral: alto nível de degradação; canalização do rio; contaminação difusa pela rede de drenagem pluvial; recebimento de efluentes in natura; aprovação para construção de residências sobre a APP do leito original do Arroio; hiperparcelamento do solo na Área Funcional de Interesse Ambiental. Medidas indicadas: projeto Pró-Vieira: proposta da renaturalização e criação do Parque do Arroio Vieira; reconfiguração estrutural do espaço (heterogeneidade ecossistêmica e retorno da fauna e flora); renaturalização do curso d’água; proposição de um uso socioambiental, com criação de equipamentos para comunidade. 38 COSTA, 2011 Espaços Livres de Uso Público na Cidade Contemporânea - 67 Santo André/SP: Mananciais39 Análise geral: enchentes e inundações urbanas; segregação social; doenças; falta de saneamento básico; poluição; acúmulo de resíduos sólidos; despejo de efluentes in natura. Medidas indicadas: criação de uma autarquia de Saneamento Ambiental (SEMASA) e transferência do sistema de drenagem, da gestão ambiental, do gerenciamento de resíduos sólidos e da defesa civil para a autarquia; manutenção do sistema de drenagem; gestão integrada do saneamento ambiental; educação ambiental; criação e utilização de um Plano Diretor de Drenagem; sistema de controle e supervisão da drenagem; gerenciamento por bacias hidrográficas; mapeamento dos pontos de inundação; uso de sistema de alerta; inversão do fluxo de algumas canalizações e uso de válvulas para evitar o retorno da água para os bairros. São Paulo/SP: Sub-bacia do córrego Bananal40 Análise geral: enchentes urbanas; processo desordenado de urbanização no entorno do córrego até o sul da bacia; ocupação irregular ao longo das margens; a sub-bacia do córrego Bananal possuía cerca de 50% de urbanização e 50% de vegetação em 2006. Medidas indicadas: plano de Bacia Urbana: criação de um programa de recuperação ambiental e sustentabilidade socioambiental com um sistema de parques e áreas verdes associado ao tratamento das águas e ao sistema de drenagem e em um trecho da bacia; o foco é a melhoria da qualidade do espaço urbano aberto ao público e restauração e preservação do ambiente natural; abertura dos fundos de 39 PARKINSON, at. al, 2003 40 PELLEGRINO, et. al, 2006, p. 57-76 68 vale para conexão com a Serra da Cantareira e criação de espaços livres para recuperação e integração dos espaços naturais urbanizados. Tupã/SP: Bacia do rio do Peixe e bacia do Aguapeí41 Análise geral: ocupação dá área de nascentes, desmatamento da mata ciliar, ocupação dos fundos de vales, emissão de efluentes domiciliares, industriais, comerciais; despejo de resíduos sólidos, erosão, inexistência ou subdimensionamento de galerias, enchentes e inundações urbanas, invasão de Áreas de Preservação Permanente (APP). Medidas indicadas: convênio com o Governo Federal por meio do Programa de Aceleração do Crescimento (PAC); realização de estudos de macrodrenagem urbana, com diretrizes para o controle de águas pluviais; controle de erosão; aumento da permeabilidade do solo; implantação de áreas verdes e equipamentos urbanos; recuperação dos córregos; implantação de parques lineares; controle do processo de urbanização; demarcação dos canais de drenagem no Zoneamento Urbano; fiscalização de depósito de resíduos irregulares e desmatamento; reflorestamento; execução de reservatórios de detenção; contenção e estabilização de encostas gabião; implantação de um Parque Ecológico; criação de corredores verdes para proteção de nascentes e retenção de água. ANÁLISE E DISCUSSÃO Foram elaborados gráficos42 para classificar as semelhanças encontradas entre as dificuldades e as soluções apresentadas para os 41 BENINI, 2015 Espaços Livres de Uso Público na Cidade Contemporânea - 69 problemas que as cidades enfrentam com as irregularidades dos rios urbanos, baseados nos estudos aqui apresentados. A partir destes dados percebe-se uma relação entre a ocupação da área de várzea, as margens dos rios e córregos, com a presença de enchentes, inundações e alagamentos. A presença comum de despejo de efluentes (domésticos e industriais) reflete não só sua relação direta com a ocorrência de inundações, mas também alerta o ainda presente descaso com o meio ambiente, herança dos costumes de séculos passados (Figura 1). Figura 1: Problemas urbanos mais frequentes entre os estudos de caso É necessário ressaltar que alguns dos problemas apresentados são consequências de outros. A poluição, despejo de efluentes e resíduos sólidos estão diretamente relacionados ao comprometimento da qualidade da água, problemas de saneamento e propagação de doenças. O desmatamento da mata ciliar e a ocupação da área de várzea estão ligados alta taxa de 42 Os valores apresentados nos gráficos são os números de estudos de caso, um total de 19. 70 impermeabilização, erosões e assoreamento. Por sua vez, enchentes43, inundações e alagamentos é consequência de todos esses fatores, individualmente ou em sua totalidade, dependendo da intensidade de cada caso. Apesar de apresentarem um índice menor, por tratar-se de situações específicas da morfologia de cada cidade, os problemas menos relatados pelos estudos de caso também contribuem bastante para as dificuldades urbanas, possuindo as soluções propostas mais significantes na Figura 244. Figura 2 - Medidas mais indicadas entre os estudos de caso 43 A enchente é um processo natural do rio, é a ocupação irregular do seu leito maior, preenchido em época de cheias, que torna a enchente um problema para a cidade. 44 O gráfico apresenta um total de 104 medidas distribuídas entre 15 colunas conforme a descrição dos 19 estudos de caso. Espaços Livres de Uso Público na Cidade Contemporânea - 71 O desmatamento da mata ciliar que foi relatado em apenas 6 estudos de caso (Figura 1) é visto como um importante fator a ser reparado (Figura 2): 13 exemplos sugerem a recuperação da mata ciliar, além de reflorestamento de outras áreas e/ou criação de corredores verdes. Algumas medidas mais populares são principalmente estruturais, visto a eficiência que apresentam em curto prazo, como a criação de parques lineares (para combater a impermeabilização, ocupação das margens dos corpos d’água e ausência de áreas verdes) e formas de captação/armazenamento de água de enchente e de chuva. As duas se respostas diretas às maiores dificuldades discutidas na Figura 1 (ocupação de área de várzea e enchentes). É importante destacar que a criação e fiscalização de leis ambientais, o uso e ocupação do solo e principalmente o Plano Diretor são considerados de grande importância, especialmente ao buscar medidas eficientes em longo prazo que não sejam estruturais, soluções estas presentes em dez estudos de caso analisados. A Figura 3 traz a classificação, entre as 104 medidas apresentadas (Figura 2), da porcentagem de medidas estruturais e não estruturais. Figura 3: Classificação da Infraestrutura Verde entre as propostas apresentadas 72 Apesar da maioria das medidas serem estruturais, precisamente pela efetividade em curto prazo discutida acima, há apenas uma diferença de 14% na quantidade de não estruturais. Isto permite concluir que ambas são relevantes na procura por melhorias da qualidadede vida urbana. A Infraestrutura Verde não é composta apenas de soluções práticas e grandes obras urbanas não são sinônimos de eficiência e progresso. A cidade precisa ser pensada por profissionais, políticos e contar com participação popular para que as soluções se apresentem no âmbito econômico, estrutural, legislativo, morfológico e ambiental do município. Desse modo os problemas não serão apenas remediados, mas evitados. CONCLUSÃO A formação das primeiras vilas próximas a cursos d’água foi uma estratégia recorrente em diversos lugares ao redor do mundo e, a expansão urbana, um processo inevitável. No Brasil é comum encontrarmos cidades cujas vilas se expandiram para ambas as margens do rio, desrespeitando seu espaço de várzea e retirando a vegetação que o protegia. Por isso é possível encontrar semelhanças entre essas cidades, não apenas no modo de ocupação e urbanização, mas também nas dificuldades que a população sofre atualmente, como é possível perceber nos estudos de casos levantados: enchentes, erosão, poluição, propagação de doenças e contaminação da água. Da mesma forma, essa semelhança se repete ao analisarmos quais são as propostas indicadas para recuperação das águas urbanas nestes mesmos estudos de caso: todas contam com medidas encontradas no conceito de Infraestrutura Verde. Sua maior importância encontra-se no fato de apresentar propostas de recuperação do meio ambiente nas cidades buscando a sustentabilidade e bem estar da população, visto que a paisagem Espaços Livres de Uso Público na Cidade Contemporânea - 73 urbana é composta pela vegetação, córregos, construções e seus habitantes. A utilização de medidas em curto prazo (estruturais) e em longo prazo (não estruturais) precisam ser utilizadas em conjunto, ressaltando a importância de planejamento urbano que vise tanto novas expansões urbanas como a qualidade de vida da população. Para isso, a preocupação com o meio ambiente não é apenas uma necessidade ecológica, é também fundamental para o bom funcionamento da cidade, já que essa relação simbiótica existente desde o início entre ela e o rio é testemunha da importância de se perceber que ambos são partes dessa paisagem, planejar um sem considerar o outro apenas trará de volta à situação problemática em que já nos encontramos. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS ARAUJO, E. C. Requalificação ambiental urbana na cidade Metropolitana: reflexões para um debate. In: BENINI, S. M.; ROSIN, J. A. R. G. (Org.) Estudos urbanos: uma abordagem interdisciplinar da cidade contemporânea. 2. ed. Tupã: ANAP, 2016. p. 165-180. ASSUNTO, R. A paisagem e a estética. In: SERRÃO, A. V. (Coord.). 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Espaços Livres de Uso Público na Cidade Contemporânea - 75 VASCONCELLOS, A. A. Infraestrutura verde aplicada ao planejamento da ocupação urbana. Curitiba: Appris, 2015. 76 Espaços Livres de Uso Público na Cidade Contemporânea - 77 Capítulo 4 CONTRIBUIÇÃO DAS TRANSFORMAÇÕES DE ESPAÇOS PÚBLICOS NO DESENVOLVIMENTO SUSTENTÁVEL DAS CIDADES: O CASO DO PARQUE POTYCABANA, EM TERESINA PIAUÍ Lara Citó Lopes45 Wilza Gomes Reis Lopes46 Letícia Soares Daniel47 Diego Ribeiro Fontenele48 INTRODUÇÃO É característica marcante no processo de expansão urbana das cidades brasileiras a falta de articulação entre as esferas econômicas, ambientais e sociais, provocando um crescimento desordenado, o que contribui para reduzir o nível de qualidade de vida de seus habitantes. Nota-se nesse processo a valorização do alcance dos interesses econômicos, fruto do capitalismo instalado no país. Com o passar dos anos os problemas oriundos desse modelo de expansão urbana foram surgindo, assim como, alternativas para minimizá-los. 45 Mestre em Arquitetura e Urbanismo pela Universidade Presbiteriana Mackenzie. Professora em Arquitetura e Urbanismo do Centro Universitário Uninovafapi. laracito@gmail.com 46 Arquiteta, Professora Doutora do curso de Arquitetura e Urbanismo e do Mestrado e Doutorado em Desenvolvimento e Meio Ambiente da Universidade Federal do Piauí. izalopes@uol.com.br 47 Mestre em Arquitetura e Urbanismo pela Universidade Presbiteriana Mackenzie. Professora em Arquitetura e Urbanismo da Faculdade Estácio/CEUT. leticiadaniel17@hotmail.com 48 Graduado em Arquitetura e Urbanismo pelo Instituto Camillo Filho. dirifo@gmail.com 78 Atualmente, vários são os planejadores e pesquisadores que propõem uma nova estratégia para o planejamento urbano como Richard Rogers, Jan Gehl, Jaime Lerner, dentre outros. É de comum acordo entre estes a necessidade da participação social na elaboração do planejamento urbano das cidades. Nada mais justo do que contar com tal participação nesse planejamento, uma vez que a cidade é de todos, portanto deve estar adequada a toda população, satisfazendo-ana maioria dos aspectos necessários para a vida em sociedade. Para Rogers (2015, p. 16), a cidadania estimula a vitalidade e humanidade, e os cidadãos “devem sentir que o espaço público é responsabilidade e propriedade da comunidade”, afirmando, ainda, que “o sucesso de uma cidade depende de seus habitantes e do poder público, da prioridade que ambos dão à criação e manutenção de um ambiente urbano e humano”. Apesar de cada região apresentar sua especificidade, o padrão de urbanização, de acordo com Grostein (2001), apresenta componentes de ‘insustentabilidade’ e geram baixa qualidade de vida urbana a parcelas significativas da população, sendo a população de baixa renda a primeira e a mais afetada. Esse cenário é fruto da forte presença e atuação do mercado imobiliário no processo de urbanização. Este gerou cidades com funções social e cultural limitadas, onde segundo Gehl (2015, p. 3), a área pública com função de “local de encontro e fórum social para os moradores foi reduzida, ameaçada ou progressivamente descartada”. O desenvolvimento sustentável das cidades aparece como caminho para minimização desse quadro. Tal desenvolvimento relaciona-se com a disponibilidade de insumos, o destino dos resíduos, a oferta e o atendimento da população de infraestrutura, como moradia, equipamentos sociais e serviços; a forma de ocupar o território; a qualidade do transporte público; e a qualidade dos espaços públicos. Estes, quando bem ordenados, aparecem como Espaços Livres de Uso Público na Cidade Contemporânea - 79 fomentadores da qualidade de vida das cidades, promovendo a revitalização das mesmas (GROSTEIN, 2001). No entanto, nota-se que a configuração da maioria desses espaços é precária e insuficiente. Nesse contexto, em relação ao espaço público, Matos (2010, p.19) afirma que a sua problemática [...] também resulta de uma transformação das práticas urbanas e dos usos e estatutos dos diversos espaços metropolitanos. A distinção entre público/privado, exterior/interior, colectivo/individual, é reajustada pela desagregação social e funcional dos bairros, pelo aparecimento de novas centralidades, pelas novas sociabilidades, pelo desenvolvimento dos transportes rápidos, de novas formas de comunicação, pela concessão de vários tipos de obras e serviços públicos, pela utilização quase generalizada do automóvel. Observa-se que, essas práticas urbanas prejudicando os espaços públicos interferem na vida urbana estando relacionada ao conceito de urbanidade. De acordo com Aguiar (2012, p. 7), enquanto vitalidade é definida “como a presença maior ou menor ali de pessoas”, a urbanidade diz respeito ao modo como se materializa a relação espaço/corpo, ou seja, a qualidade em que a cidade se apresenta para as pessoas devendo ser cômodo, gentil, agradável. Dessa forma, reforça a ideia de Gehl (2015), de que o comportamento humano é influenciado pelo espaço físico. A cidade precisa ser atrativa para estimular as atividades opcionais de seus cidadãos como caminhar, apreciar a paisagem, promovendo trocas sociais que a torna viva e ativa (GEHL, 2015). Assim como Matos e Aguiar (2012) colocam o automóvel como influência negativa para a urbanidade, apontando como a principal causa para a hostilidade da maioria dos espaços públicos. Pode-se inferir, portanto, que a falta de urbanidade propicia a falta de vitalidade desses locais. Para Rogers (2015, p. 10), “à medida que a vitalidade dos espaços públicos diminui, perdemos o hábito de 80 participar da vida urbana da rua”, dessa forma, o cidadão se distancia mais dos problemas da cidade e intervém menos em sua gestão pública. Assim, os parques urbanos, enquadrados como espaços públicos, quando de qualidade influenciam positivamente o espaço urbano na promoção do desenvolvimento sustentável. É no final do século XVIII, na Inglaterra, que surgem os primeiros parques urbanos. Estes se apresentam como resposta à destruição de florestas, consequência da revolução industrial e crescimento das cidades. Nessa época, em virtude do caos urbano instalado com o crescimento dos subúrbios, de regiões habitadas sem a infraestrutura necessária, a natureza passa a ser vista como lugar ideal, pois apresentava uma fuga desse cenário urbanizado conturbado. Foi nesse contexto que surgiram os jardins ingleses, com base oposta aos jardins que, até então, eram produzidos, como os franceses, caracterizados pela perfeita simetria. Os jardins ingleses apresentavam formas orgânicas e davam preferências a terrenos com topografia irregular para parecer o mais natural possível. Esses locais apresentavam caminhos para que as pessoas pudessem circular e apreciar a natureza obtendo uma sensação de bem-estar (EMÍDIO, 2006). Segundo Bovo e Conrado (2012), é na Inglaterra, após a revolução industrial, que os parques passam a apresentar função de lazer, surgindo a discussão dos parques como ferramenta de melhoria da qualidade de vida na cidade. De acordo com Bovo e Conrado (2012), no século seguinte o desenvolvimento de parques urbanos ganha mais destaque com os planos urbanísticos, para Paris, na Europa, desenvolvidos por Haussmann, iniciados em 1857 e finalizados em 1927. Nessa mesma época, se destaca nos EUA o arquiteto Frederick Law Olmsted, considerado pai do paisagismo e líder do movimento “Park Movment”, defendendo além da ideia de recreação como função dos parques urbanos, a de preservação dos recursos naturais. Espaços Livres de Uso Público na Cidade Contemporânea - 81 Nos anos de 1930, foi revisado o modo de projetar o ambiente urbano (SCALISE, 2002). A partir de 1940, os parques passam a atender a população com novas formas de lazer como playgrounds, quadras esportivas e lanchonetes (KALLAS, 2005). Na década seguinte os parques passam a realçar as características cênicas das áreas verdes, gerando ambientes que despertam o interesse e a fantasia do usuário. Na década seguinte os parques se proliferaram em várias cidades do mundo (SCALISE, 2002). Os parques dentro da zona urbana apresentam-se como um local de contato com a natureza, os quais, quando presentes no espaço urbano, apresentam inúmeros benefícios para a cidade. O uso de elementos verdes na composição da cidade contribui com valor estético da paisagem urbana. No entanto, este não é sua principal contribuição, já que, por meio da arborização, é possível amenizar os efeitos da alta temperatura e aumento da drenagem de águas pluviais. Nota-se, também, o valor social apresentado com a vegetação na cidade e, principalmente, quando utilizada em espaços planejados com outras funções além da função estética. Dessa maneira, permite-se um maior contato entre homem e natureza, com a criação de locais de troca social, práticas esportivas, dentre outros. Observa-se, assim, que as cidades demandam, cada vez mais, esses locais em virtude dos impactos negativos gerados pelo adensamento urbano, sob a ótica do meio ambiente natural (BENFATTI; SILVA, 2013) Com base na importância apresentada pelos parques urbanos para as cidades, o presente capítulo apresenta como objeto de estudo o Parque Potycabana, situado na cidade de Teresina, capital do Estado do Piauí. Este parque criado há mais de vinte anos, ficou fechado por cinco anos, sendo reinaugurado em 2013. Pretende-se analisar se o parque, após sua reinauguração, favorece a urbanidade de Teresina, cumprindo com sua função social e, consequentemente, tendo influência no que diz respeito ao 82 desenvolvimento sustentável. Para isso foi observada a existência das relações sociais estabelecidas no local, procurando compreender se tais relações sofreram interferência pela modificação do espaço público, observando, para isso, seus usos pela população. MATERIAIS E MÉTODOS Para o alcance dos objetivos propostos pela pesquisa, fez-se necessáriaa pesquisa bibliográfica, por meio de fontes secundárias, enfocando aspectos relacionados ao tema de planejamento urbano, desenvolvimento sustentável, espaços públicos, paisagem ambiental, assim como, buscando pesquisas que trazem como objeto de estudo o parque Potycabana. Realizou-se, também, pesquisa de campo para verificação do uso do parque pela população. Na pesquisa, além da observação da existência de pessoas utilizando o parque e dos equipamentos existentes disponibilizados para estas, fez-se o registro fotográfico do local, a fim de comprovar tal observação, em duas datas distintas no ano de 2016, a primeira delas no dia 18 de junho, e a segunda no dia 12 de outubro. Além disso, foram realizadas entrevistas com dois funcionários do local, na primeira visita, para se conhecer o funcionamento do parque, que foram gravadas e fotografadas, com uso de telefone celular. Nas entrevistas, procurou-se saber sobre a existência ou não de atividades desvinculadas da Gestão Estadual realizadas no parque, identificando qual o horário e dia mais visitado, qual a predominância de idade e sexo, qual a área do parque mais utilizada pelos visitantes, qual o seu horário de funcionamento e, ainda, questões relacionadas à manutenção e coleta de lixo (em que horários é feita a limpeza do parque, se houver e se há coleta seletiva do lixo). RESULTADOS Espaços Livres de Uso Público na Cidade Contemporânea - 83 Em relação aos parques urbanos de Teresina, o Parque Zoobotânico foi o primeiro parque criado na cidade, legalizado com a Lei 1.479, de julho de 1972, e concebido seguindo uma linha contemporânea de lazer ativo e contemplativo (PORTELA; BRITO, 2009). Após 10 anos de sua criação é que outro parque vai ser criado, tratando-se, no caso, do Parque da Cidade, com intuito de manter, preservar e criar áreas verdes. Posteriormente surgiram mais parques, totalizando, 31 parques existentes, dentre os quais, de acordo com Kallas (2005), apenas quatro realmente correspondem, segundo a concepção contemporânea, a parques urbanos. Os demais estão, apenas, delimitados em Lei, estando relacionados a áreas livres, criadas com a denominação de parque, visando à proteção ambiental, mas que não apresentam as funções necessárias para tal finalidade. Dentre os parques da capital, encontra-se o parque Potycabana, criado em 1990, pelo então governador Alberto Silva. Situa-se na zona urbana de Teresina, com acesso pela principal pela Avenida Raul Lopes, que liga os dois shoppings centers da cidade, identificados na figura 01, e está localizado nas margens direita do Rio Poti. 84 Figura 01 - O Parque Potycabana e seu entorno Fonte: Google maps, 2016, editado pelos autores. Esta proximidade com o rio, segundo Afonso e Saraiva (2011), sobre estudo arquitetônico da obra do parque propiciou inúmeros impactos ambientais após sua implantação, por se tratar de uma região, atualmente caracterizada como Área de Preservação Permanente. Somado a isto, a presença do parque no local, contribui com a valorização da região e sua urbanização, por conta da importância que passou a apresentar para a cidade, tratando-se de um dos primeiros e mais importantes espaços públicos de lazer. O parque Potycabana encontra-se em local de grande fluxo, por conta de sua proximidade com os três shoppings centers. Esta tipologia, característica do século XX, em que a iniciativa privada, segundo Gehl (2015), vê na falta de espaços públicos de qualidade, Espaços Livres de Uso Público na Cidade Contemporânea - 85 juntamente com a necessidade da população, a oportunidade de se ter uma nova fonte de rendimento, a partir da criação de espaços que promovam o encontro social, Além destes locais, deve-se salientar a proximidade do parque com outros espaços públicos, como o Rio Poty, como já mencionado, e a Floresta Fóssil, os quais apresentam demanda de revitalização pelo atual estado de degradação em que se encontram. O Parque Potycabana foi projetado no final dos anos de 1980, inaugurado em 1990, construído pelo governo do Estado e administrado pela empresa Comércio de Bebidas Ltda (COBEL), distribuidora de bebidas Antártica. O projeto do parque, apresentando na figura 02, correspondia 80 mil metros quadrados, sendo bastante utilizado pela população após sua inauguração, em 1990 (MARCULINO, et al. ,2010). Figura 02 - Projeto original da Potycabana Fonte: REDAÇÃO, 2013. Analisando o projeto, é possível observar que o parque apresentava vários equipamentos de lazer para o público tornando-o bastante atrativo. No entanto, com o passar do tempo o local deixou 86 de ser um atrativo para a comunidade teresinense. Tal fato pode ser justificado por suas várias administrações e nenhuma manutenção, sendo utilizado apenas para feiras, e eventos de folguedos. Após a falência da COBEL, em 2001, o parque passou para o sistema Fecomércio/Sesc/Senac. No entanto, pelo fato desse processo não ter sido tramitado na Assembleia Legislativa Estadual, o mesmo foi anulado em 2006, voltando a ser administrado pelo estado. Em 2008, houve a destinação de verba do Estado para a recuperação do local. No ano seguinte, 2009, deram a previsão de entrega do parque em 180 dias, a princípio essa obra seria de recuperação do local e sua função continuaria a mesma (AFONSO, 2010). Assim, o parque com o passar dos anos, perdeu seus visitantes e consequentemente sua função, sendo abandonado (Figura 03), sendo necessária, então, a atenção dos gestores públicos para o local e sua revitalização. Figura 03 - As condições do Parque Potycabana após seu desuso Fonte: REDAÇÃO, 2013. Espaços Livres de Uso Público na Cidade Contemporânea - 87 Observam-se pela figura 03, que seus equipamentos permaneceram, porém encontravam-se em péssimas condições, após seu desuso e abandono. Fez-se necessário, portanto, um projeto de revitalização para este parque que, por muito tempo, se apresentou como espaço de lazer e de encontro para a população, sendo usado por alguns anos. A reinauguração do parque veio a acontecer no dia 16 de maio de 2013, com a presença do governador do estado desta época, todos os secretários estaduais e o prefeito de Teresina. No local teve apresentação de uma banda baiana para todas as pessoas presentes (RIBEIRO, 2012). Compreende-se nesse sentido que as intervenções em áreas públicas já consolidadas aparecem como estratégias capazes de proporcionar ambientes mais adequados à população, principalmente, quando se encontram fechados, como era o caso do parque Potycabana, tratando-se do objeto de estudo do presente capítulo. Portanto, o parque urbano, como forma de espaço público, tem um importante papel no cenário da sustentabilidade urbana e das relações sociais, devendo atender à sua função. Assim, fez-se necessário uma nova leitura do parque Potycabana e de suas condições, como se observa na figura 04, para que o mesmo voltasse a ser um atrativo para a população, fazendo parte de seu dia-a-dia. 88 Figura 04 - Proposta inicial de reforma do Parque Potycabana da Secretaria de Infraestrutura do Estado do Piauí Fonte: NEIVA, 2011, legendas ampliadas pelos autores. Esta proposta inicial de reforma do parque, no momento da construção sofreu algumas mudanças, embora a ideia base e a maioria dos equipamentos foram mantidas. Uma dessas modificações refere-se à retirada da piscina, a disposição diferente de alguns equipamentos, como o playground que na imagem está próximo ao Setor Esportivo 2, e na realidade encontra-se próximo ao Setor Esportivo 1, e outros que seguiram a idéia inicial. A retirada da piscina pode ser considerada como benéfica, já que o parque objetiva atender a um público numeroso, apresentandogrande fluxo de pessoas, logo sua manutenção e salubridade seriam de difícil controle. A proposta de reforma do parque foi divulgada em 2011, pela Secretaria Estadual da Infraestrutura (SEINFRA), descartando o parque aquático, principal função desde sua fundação, e incentivando práticas esportivas com a instalação das pistas de skate, quadras de vôlei, de tênis, campo de futebol, pista de caminhada, dentre outros equipamentos. Assim, o estímulo à prática de esportes Espaços Livres de Uso Público na Cidade Contemporânea - 89 é o principal aspecto que diferencia o novo projeto do projeto anterior. O parque Potycabana após sua reforma passou a ser um destino diário da população local. A população dispõe no parque de atividades físicas gratuitas com assistência de um profissional, como aulas de dança, aeróbica, jump, entre outras (Assessoria de imprensa, Capital Teresina, 2014). Em visita de campo realizada ao parque, foi identificada a estrutura disponibilizada para a população, como se observa na figura 05. A respeito de seus equipamentos, tem-se de acordo com o Regulamento do Parque Potycabana (2013), que se encontra dividido em Setor A e Setor B. O primeiro setor diz respeito aos equipamentos que correspondem às atividades de práticas esportivas e culturais. O Setor B corresponde à prática de atividades culturais e recreativas de baixo impacto, sendo representado pelos palcos e estacionamento. Figura 05 - Alguns equipamentos do parque disponíveis ao público Fonte: arquivo pessoal LOPES, 2016. De acordo com a figura 05, é possível visualizar alguns dos equipamentos do parque como o palco, duas quadras poliesportivas, 90 uma destas com arquibancada, duas pistas de skates, lanchonetes, brinquedos infantis, além de uma pista para pedestre e outra para ciclistas e patinadores, ambas distribuídas ao longo de todo o parque. Além desses equipamentos, o parque conta ainda com um campo de futebol, uma quadra de areia, três quadras de tênis. Por se tratar de um local na margem do rio e devido ao seu horário de funcionamento, o parque é todo cercado com três entradas de acesso, tendo um ponto de parada de ônibus, em frente ao parque, o que facilitaria o acesso dos usuários de várias partes da cidade. A grade se apresenta como um ponto negativo e reforça a cultura brasileira de isolamento dos ambientes, inclusive por se tratar de um espaço público, pois como o nome já diz, deveria ser acessível às pessoas a qualquer momento. No entanto, as grades tem se mostrado como fundamentais para sua preservação, uma vez que, restringe seu uso em horários que existe vigilância do local, evitando atos de depredação, muito comum no país, principalmente em locais como este. Trata-se da realidade cultural brasileira, tendo como exemplo o parque Floresta Fóssil, localizado nas imediações do Parque Potycabana, que apresenta sinais de vandalismo em seus fósseis. Sob essa ótica, reforça-se a necessidade de educação da população, para que se aprenda a cuidar de seus bens públicos. Nas entrevistas realizadas com os funcionários do parque foram obtidas várias informações, sobre os frequentadores, funcionamento e manejo do local. O primeiro entrevistado da pesquisa, Sr. Nascimento, afirmou que dentre os frequentadores do parque não há predominância de sexo, sendo estes em sua maioria jovens, apesar de muitas famílias também frequentarem bastante. Os locais mais disputados do parque são as pistas de skates e as quadras Espaços Livres de Uso Público na Cidade Contemporânea - 91 de futsal, sendo o dia de sábado o mais movimentado (informação verbal)49. Ele informou que o parque funciona no horário de 05:00 h às 22:00 h todos os dias, sendo mais utilizado a partir das 18:00 h. Por conta disso, neste horário é realizada revista de bolsas e de pessoas com detector de metais. Com relação à realização de eventos, é necessário um agendamento, e o parque permanece aberto para qualquer visitante, ficando apenas os palcos sob-responsabilidade de quem o solicitou. Esses eventos normalmente são de cunho religioso. A limpeza do mesmo é realizada a cada 30 minutos, o que faz com que ele encontre-se sempre bem cuidado, atraindo ainda mais a população. De acordo com Sr. Silva, outro funcionário entrevistado, o parque possui pontos de coleta seletiva de lixo com lixeiras separadas, de acordo com o tipo de lixo, que, no entanto, não vai para a reciclagem, pois no próprio parque o mesmo é misturado com os demais quando recolhidos pelos funcionários, e são levados juntos pelo caminhão da prefeitura (informação verbal). A partir da visita, foram verificadas as mais variadas atividades no parque. Em vários locais, havia pessoas sentadas em círculos na grama, alguns em rodas de músicas religiosas, outros reunidos para confraternização, além ainda, de encontros em família, em que ficam conversando ou passeando com carrinhos de bebê. O parque apresenta-se, também, como um local de contato com a natureza, como citado, pela presença de vegetação. Sob esse aspecto, acredita-se que poderia ser melhorado, com melhor distribuição da vegetação do local, uma vez que, o espaço é bastante impermeabilizado e poderia contar com mais espécies vegetais. Foi observado, ainda, durante a visita, que a espécie predominante é a palmeira, o que não traz tantos benefícios de sombreamento, quanto às demais espécies, por possuir copa 49 Dados fornecidos por C. Silva, em entrevista feita no parque Potycabana, em Teresina, no dia 20 de junho de 2016. 92 pequena. Partindo desse ponto, nota-se, principalmente, que por se tratar de uma cidade com temperatura média elevada durante todo o ano, poderia haver uma melhora da qualidade do conforto do local, em consequência da arborização, se fossem adotadas árvores de grande porte, com copas altas e de grande circunferência, dando preferência às não frutíferas, para evitar acidentes com os usuários do espaço. Destaca-se como uma de suas principais funções alcançada, o fato de ser um local de interação social, levando ao uso do espaço público de forma diversificada, pela população em geral. Tal função até sua reinauguração, não era observada nos demais espaços existentes, destacando-se como um dos seus principais objetivos alcançados. Percebe-se assim, que o parque já faz parte da identidade da cidade, e tornou-se essencial ao seu bom funcionamento. Além do uso diário pela população, observa-se que no final de semana aumenta o número de crianças que vão ao parque levadas pelos pais para usufruírem do espaço. Ou ainda em dias de feriados, que aumenta seu uso, como por exemplo, o dia 12 de outubro, que coincide com o dia das crianças, ocasião que muitas delas vão se divertir no local. Nestas datas o parque oferece apresentações teatrais para seus usuários, como pode se observar na figura 06 que mostra um dos palcos sendo utilizado. Espaços Livres de Uso Público na Cidade Contemporânea - 93 Figura 06: A utilização do parque em datas comemorativas Fonte: arquivo pessoal LOPES, 2016. Apesar de ser uma região localizada na margem do rio, em que, atualmente, pela legislação, seria proibido esse tipo de construção, com a reforma o parque pode reduzir seus impactos ambientais no local, principalmente pela retirada das piscinas, sendo trocadas por práticas esportivas consideradas de baixo impacto ambiental. Faz-se necessário, no entanto, a revisão de alguns aspectos em seu uso e manutenção, para que priorizem a sustentabilidade urbana, como a questão do lixo, que apesar de não ser um impacto direto do local, prejudica toda a cidade. Mais um aspecto a ser considerado, que depende da gestão municipal, por exemplo, seria um transporte público de melhor qualidade para que as pessoas não necessitemde carro para chegar ao local, uma vez que, o estacionamento existente não é suficiente para todos, e que o uso de transporte público é uma das bases da sustentabilidade. 94 CONCLUSÃO Com base na pesquisa realizada observa-se que o parque, apesar de todo o tempo que permaneceu inacessível à população, conseguiu, até o momento, atingir sua meta com função social. O parque passou a ser um espaço de destino da população de toda a cidade, que carecia de um local como tais características, fato provado pela frequência de seus visitantes. O parque Potycabana, diferente dos demais espaços da cidade, é um local de troca e contato entre as pessoas de diferentes camadas da sociedade, sexo e idade. Trata-se, também, de espaço de incentivo a prática de esportes, essencial para que o ser humano tenha uma boa qualidade de vida, e favoreça sua saúde física e mental. No entanto, nota-se, ainda que o local poderia ser palco de ações voltadas para a conscientização de alguns aspectos da sustentabilidade urbana, pois são os espaços públicos, os maiores e melhores locais para servirem de exemplo para a população sobre esse tema. Assim, a coleta de lixo deveria ser realizada, assim como o uso de energia sustentável, reuso de água, além da disposição de maior área permeável e maior variedade de espécies arbóreas. REFERÊNCIAS AGUIAR, D. Urbanidade e a qualidade da cidade. Arquitextos, São Paulo, ano 12, n.141.08, Vitruvius, mar. 2012. Disponível em: . Acesso em 01 out. 2016. AFONSO, A. A. Parque Potycabana. Estudo arquitetônico da obra e sua intervenção na cidade: 1990-2010. [s.l.] 29 de ago. 2010. Disponível em: . Acesso em: 28 jun 2016 AFONSO, A. A.; SARAIVA, S. V. 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Acesso em 01 jul 2016. http://www.meionorte.com/efremribeiro/potycabana-e-inaugurada-e-ganhara-passarela-ligando-avenidas-marechal-a-cajuina-251737.html http://www.meionorte.com/efremribeiro/potycabana-e-inaugurada-e-ganhara-passarela-ligando-avenidas-marechal-a-cajuina-251737.html Espaços Livres de Uso Público na Cidade Contemporânea - 97 Capítulo 5 PARQUE DO POVO: LEVANTAMENTO QUANTIQUALITATIVO DA INFRAESTRUTURA E LAZER Talita Batista dos Santos50 Milena de Moura Regis51 Ana Paula do Nascimento Lamano Ferreira52 1 INTRODUÇÃO O avanço no processo de urbanização e crescimento de cidades está transformando a paisagem em ritmo acelerado, pressionando e consequentemente causando grandes problemas ao ambiente. O desenvolvimento urbano não planejado afeta o espaço físico das cidades, contribuindo para o desequilíbrio ambiental e na qualidade de vida de seus habitantes. Essas transformações nas cidades conduzem a uma preocupação com o planejamento e gestão pública, a partir da compreensão da diversidade dos aspectos do espaço urbano com a dimensão socioambiental (BARGOS; MATIAS, 2011). Nas últimas décadas, tem-se discutido com mais ênfase os problemas ambientais, tornando-se uma temática obrigatória para o cotidiano. As áreas verdes tornaram-se então um dos principais ícones de defesa do meio ambiente, por conta de sua degradação e 50 Graduanda, Ciências Biológicas na Universidade Nove de Julho - UNINOVE, talitaasants@gmail.com 51 Professora Mestre, Departamento de Saúde II da Universidade Nove de Julho - UNINOVE, milenaregis@hotmail.com 52 Professora Doutora, Programa de Mestrado Profissional em Gestão Ambiental e Sustentabilidade na Universidade Nove de Julho- UNINOVE, ana_paula@uni9.pro.br 98 pelo seu pequeno espaço que lhes é destinado em centros urbanos tanto em relação a espaços públicos (LOBODA; DE ANGELIS, 2005), como privados (LAMANO-FERREIRA et al., 2016). Segundo Feiber (2004), as áreascidade e suas bacias hidrográficas. Assim, com os dados organizados foram apresentadas as maiores ocorrências em relação aos problemas urbanos; as medidas mais indicadas para sanar as ocorrências; além da classificação acerca das propostas apresentadas: quantas correspondem às medidas estruturais (como tratamento de efluentes, pavimentação permeável e renaturalização de corpos d'água) e às medidas não estruturais (como reassentamentos, desapropriação de várzeas, programas de educação ambiental e legislação tais como planos diretores e leis de uso e ocupação de solo). Em relação aos problemas mais recorrentes estão as enchentes, ocupação da área de várzea e despejo de efluentes. E em relação às medidas saneadoras, destacam-se a criação de áreas de lazer e parques lineares, captação de água de enchentes/pluvial, recuperação de mata ciliar, reflorestamento e implantação de corredores verdes. As autoras destacam que na maioria dos casos as medidas apontadas para recuperação das águas urbanas apoiam-se no conceito de Infraestrutura Verde através de propostas que objetivam a recuperação do meio ambiente e a busca pela sustentabilidade das cidades e bem-estar da população. Salienta-se também, a utilização em conjunto de medidas estruturais Espaços Livres de Uso Público na Cidade Contemporânea - 9 e não-estruturais, determinante para as novas expansões urbanas como garantia da qualidade de vida da população. O quarto trabalho, de autoria de Lara Citó Lopes, Wilza Gomes Reis Lopes, Letícia Soares Daniel e Diego Ribeiro Fontenele, apresenta como objeto de estudo o Parque Potycabana em Teresina- PI. Criado há mais de 20 anos, ficou fechado por 5 anos, sendo reinaugurado em 2013. Os autores observaram os usos da população e a ocorrência de interferências destes usos após a modificação do espaço, analisando também, se após a reinauguração, o parque contribuiu para a urbanidade da cidade, cumprindo sua função social, influenciado pelo desenvolvimento sustentável. Após a observação dos usos locais, os autores destacaram que o parque, embora necessite de algumas ações voltadas ao aspecto da sustentabilidade urbana, como coleta de lixo, reuso de água, uso de energia sustentável, maior disposição de áreas permeáveis e maior variedade de espécies arbóreas, cumpre sua função social, uma vez que é frequentemente utilizado pela população, que necessitava deste tipo de espaço, além de fazer parte da identidade da cidade. Ainda em relação aos parques públicos, Talita Batista dos Santos, Milena de Moura Regis e Ana Paula do Nascimento Lamano Ferreira, realizaram o levantamento da infraestrutura do Parque Mario Pimenta Camargo, popularmente conhecido como Parque do Povo, de grande importância socioambiental para a cidade de São Paulo. As autoras destacam a importância do planejamento dos espaços públicos, visto que o desenvolvimento urbano não planejado contribui para o desequilíbrio ambiental e afeta a qualidade de vida de seus habitantes. Ao identificar os equipamentos presentes no local, as autoras apontam que o parque possui quantidade e qualidade referente à iluminação, quadras poliesportivas com marcação especial para esportes paraolímpicos, campo gramado para futebol, pista de skate, pista para caminhada/corrida, playgrounds, 10 academias ao ar livre e bebedouros adaptados para deficientes e animais. A praça é um dos principais elementos que compõe o espaço público. Nesse sentido, os autores Tatiane Monteiro Re e Marcos Clair Bovo buscam entender a praça como um elemento estruturador do espaço urbano, devido à diversidade de suas funções: estética, ecológica, paisagística, climática, psicológica e recreativa. Escolhidas como objeto de estudo, destacam-se duas praças da área central da cidade de Campo Mourão – PR, a Praça São José e a Praça Getúlio Vargas, administradas por entidades religiosas e pelo Poder Público Municipal que atuam na sua manutenção e conservação. Os autores apontam que ambas as praças desempenham as funções estética, ambiental e social, visto que as estruturas presentes possibilitam o convívio e a integração de pessoas de níveis sociais, culturais, econômicos e idades diferentes. Por fim, os autores sugerem a instalação de parque infantil, uma vez que não foram encontradas atividades de lazer gratuitas na cidade, assim como a instalação de um módulo policial e alguns pontos de água (bebedouros) para os usuários. Neste sentido, esperamos contribuir para que novos estudos e pesquisas sejam elaborados sobre os espaços livres de uso público no intuito de que, quanto melhor possa ser apropriado, reconhecendo o potencial do lugar, maior será sua aceitação social e por mais tempo será mantida sua identidade na cidade contemporânea. Boa Leitura! Norma Regina Truppel Constantino Karla Garcia Biernath Karina Andrade Mattos Espaços Livres de Uso Público na Cidade Contemporânea - 11 Capítulo 1 OS PADRÕES URBANÍSTICOS DE PRODUÇÃO E GESTÃO DAS CIDADES E SUAS (DES)CONEXÕES COM OS ESPAÇOS LIVRES URBANOS Karina Andrade Mattos1 Norma Regina Truppel Constantino2 1 INTRODUÇÃO Muitos são os benefícios ambientais e socioculturais associados à criação e manutenção de espaços livres urbanos. Constituídos por ruas, praças, parques, pátios, quintais, jardins, lotes vagos, estacionamentos descobertos, áreas verdes, orlas, rios e represas, os espaços livres formam um importante sistema urbano, que junto com outros sistemas, tecem relações de conectividade e complementaridade fundamentais a vida pública. Elemento da forma urbana, os espaços livres exercem – em função de sua forma, volume, distribuição e tamanho – inúmeras influências sobre o funcionamento das cidades e o comportamento humano, pois garantem áreas de preservação ambiental, de lazer e convívio social, além de atender as necessidades básicas urbanas de circulação, drenagem, conforto e segurança. 1 Mestranda e bolsista Capes/PROPG UNESP, Universidade Estadual Paulista – PPGARQ Unesp - Bauru. E-mail: karina_amattos@hotmail.com 2 Professora Doutora, Universidade Estadual Paulista – PPGARQ Unesp - Bauru. E-mail: nconst@faac.unesp.br 12 Contudo, o que se vê atualmente em algumas cidades brasileiras é um conjunto de espaços livres precários e desconectados de seu entorno edificado – as calçadas são estreitas e, na maioria das vezes, estão em péssimo estado de conservação; nas ruas e avenidas, carros e caminhões formam congestionamentos quilométricos, levando caos e desordem para as principais vias da cidade; os parques e praças sem manutenção se tornam locais hostis e perigosos; a arborização urbana é deficiente em praticamente todos os pontos da cidade; terrenos vazios e abandonados tornam os locais insalubres e propensos a doenças e contaminações. O sistema de espaços livres sofre com as descontinuidades políticas e a má distribuição de terra e de renda. Dessa forma, discutir os padrões urbanísticos de produção e gestão das cidades torna-se, em primeira instância, imprescindível para o entendimento e a análise dos espaços livres, principalmente em função das questões culturais, econômicas e urbanísticas que regem as relações entre o Estado e o mercado imobiliário. Elemento indutor dos projetos urbanos, o sistema de espaços livres públicos deve anteceder a formação das construções urbanas por meio de uma prévia definição conceitual e formal, considerando, sobretudo, as especificidades socioambientais de cada local, diferente do que ocorre em grande parte das cidades atualmente. Hoje, as novas dinâmicas de produção do espaço urbano baseiam-se, principalmente, em ações de cunho econômico e político. Assim, na tentativa de mudar tal conjuntura, acredita-se que as formulações conceituais da paisagemverdes possuem importância funcional no metabolismo da cidade. Estas atuam no conjunto de fenômenos físicos e químicos necessários a vida, como a redução da poluição e a ciclagem de nutrientes (FERREIRA et al., 2014). Além disso, os espaços verdes das cidades garantem a conservação e abrigo a fauna existente, papel importante na prestação de serviços ecossistêmicos (LAMANO-FERREIRA et al. 2016). Chiesura (2004) relata sobre a importância de áreas verdes urbanas para a qualidade de vida humana, agindo simultaneamente sobre o lado físico e mental do homem, tornando-se imprescindível para o bem-estar da população. O estudo de França et al. (2016) sobre conhecimentos ecológicos, mostra que os entrevistados mencionam que as plantas são importantes para a cidade e estão relacionadas com redução de poluentes atmosféricos. Entretanto, os entrevistados mencionam que em parques públicos consideram importantes: lixeiras, iluminação, gramado, ornamentação e por última pavimentação. Os inúmeros benefícios que as áreas verdes urbanas proporcionam à sociedade são disponibilizados principalmente pelos parques públicos. O Ministério do Meio Ambiente (MMA) considera os parques urbanos como “áreas verdes de domínio público com função ecológica, estética e de lazer”. Esses espaços estão relacionados à gestão ambiental e a qualidade de vida das populações que habitam os centros urbanos, por meio dos serviços ambientais que são prestados, como a preservação de recursos naturais, a socialização e o aprendizado (CARDOSO et al., 2015). O planejamento, a conservação e a manutenção de espaços verdes urbanos, como os parques, interferem em seu desempenho funcional para alcançar a maior eficiência possível, influenciando Espaços Livres de Uso Público na Cidade Contemporânea - 99 diretamente na qualidade de vida da população. Bem como, amenizando as consequências negativas que o avanço acelerado da urbanização provoca ao meio ambiente (BARGOS; MATIAS; OTHERS, 2012). De acordo com Benini et al. (2016), as cidades brasileiras têm carência de espaços públicos destinados ao lazer e recreação. Nesse contexto, o presente capítulo teve como objetivo realizar o levantamento da infraestrutura do Parque Mario Pimenta Camargo, localizado na capital paulista, popularmente conhecido como Parque do Povo, com o intuito de informar quais equipamentos o parque urbano pode oferecer aos frequentadores. O Parque do Povo foi escolhido como área de estudo devido à importância socioambiental que representa para a região onde está implantado. O Parque foi inaugurado em 28 de setembro de 2008 e tornando-se um importante espaço para a avaliação da conservação e manutenção de áreas verdes urbanas da cidade de São Paulo. Pois seu planejamento, gerenciamento e fiscalização, são mantidos por meio de políticas públicas entre gestores municipais e representantes da sociedade civil. 2 MATERIAIS E MÉTODOS 2.1 ÁREA DE ESTUDO O presente estudo foi realizado no Parque do Povo, localizado no bairro Itaim Bibi, na zona Sul do Município de São Paulo, próximo às Avenidas Cidade Jardim, Henrique Schaumann e Nações Unidas (Figura 1). O Parque foi instalado numa área que pertencia a Caixa Econômica Federal (CEF) e ao Instituto Nacional de Seguro Social (INSS). Durante duas décadas, diversas agremiações esportivas ocuparam o local, até que em 2006 a Prefeitura conseguiu a concessão do espaço. Sua área é de 133.547 m2 e atualmente o 100 espaço é propriedade da Construtora WTORRE Empreendimentos e da Prefeitura Municipal de São Paulo. Figura 1 - Vista superior da área do Parque Mario Pimenta Camargo (Parque do Povo) e seus arredores. Fonte: Google Earth, 29.04.2016 O Parque do Povo está localizado em uma área nobre na região oeste da cidade de São Paulo. Possui fácil acesso a diversos estabelecimentos comerciais, centros empresariais e residenciais. Além de, no entorno do parque serem encontrados pontos de táxi e de ônibus, bem como a estação Cidade Jardim da CPTM (Companhia Paulista de Trens Metropolitanos). O parque funciona diariamente das 6h00 às 22h00, e sua infraestrutura possui complexos esportivos, como: quadras poliesportivas; campo de futebol gramado; ciclovia; pista de caminhada; aparelhos de ginástica para a terceira idade e atividades permanentes, por exemplo, o grupo de caminhada e o de Tai Chi Pai Lin. Além disso, o parque também dispõe de roteiros botânicos, como: o Jardim dos Sentidos, no qual os frequentadores podem apalpar, morder e sentir o aroma das folhas de espécies vegetais. Segundo a Secretaria Municipal do Verde e do Meio Ambiente da Prefeitura de São Paulo, foram registradas no Parque 32 espécies Espaços Livres de Uso Público na Cidade Contemporânea - 101 de plantas, dentre elas 2 espécies ameaçadas de extinção, a Grumixama (Eugenia brasiliensis) e o Pau-Brasil (Caesalpinia echinata), além de 37 espécies de aves típicas de ambientes abertos, como o tico-tico, quero-quero, asa-branca, beija-flor-tesoura, rolinha, pica-pau-do-campo, suiriri-cavaleiro, sabiá-do-campo, maracanã- nobre, tuim, sanhaçu-do-coqueiro, ferreirinho-relógio, alegrinho, pitiguari e avoante. 2.2 COLETA E ANÁLISE DE DADOS Para o desenvolvimento desta pesquisa, os dados coletados foram baseados em fichas propostas por De Angelis et al. (2004). As fichas foram preenchidas durante as visitas ao parque, as quais ocorreram nos dias 05 de março de 2016 e 16 de abril de 2016. O parque foi categorizado a partir do levantamento quantiqualitativo, adaptado ao Parque do Povo a partir de trabalhos realizados com praças na cidade de São Paulo (OLIVEIRA, 2014). Foi observada a estrutura existente no local, assinalando a presença ou ausência de equipamentos e estruturas. Ainda sob o método dos autores, foi levantada a quantidade de cada estrutura existente, além de avaliar suas condições no ambiente. As fichas foram preenchidas de acordo com a observação do pesquisador. 3 RESULTADOS E DISCUSSÃO Os resultados obtidos, a partir do levantamento qualitativo e quantitativo dos equipamentos e estruturas existentes no Parque do Povo, demonstram que o Parque possui boa iluminação, alternando entre pontos altos, localizados nos gramados centrais do parque e nas quadras poliesportivas, e pontos baixos, rodeando as pistas de caminhada e ciclovias, conforme tabela 1. 102 Tabela 1. Levantamento qualitativo e quantitativo dos equipamentos e estruturas existentes no Parque do Povo. EQUIPAMENTOS/ESTRUTURAS QUANTIDADE QUALIDADE 1. Bancos – material: madeira e concreto 97 BOM 2. Iluminação alta e baixa 156 BOM 3. Lixeiras 72 ÓTIMO 4. Sanitários 4 ÓTIMO 5. Bebedouros 6 ÓTIMO 6. Caminhos – material: concreto 3 BOM 7. Obra de arte: 2 BOM 8. Ponto de ônibus 2 BOM 9. Ponto de táxi 1 BOM 10. Quadra esportiva 3 ÓTIMO 11. Para prática de exercícios físicos 2 ÓTIMO 12. Para terceira idade 2 ÓTIMO 13. Parque infantil 1 ÓTIMO 14. Identificação 2 BOM 15. Edificação institucional 2 ÓTIMO Fonte: O autor, 2016 O Parque dispõe de bancos de madeira e de concreto (figura 2) distribuídos em toda a sua extensão. Estes se localizam principalmente nos arredores das pistas de caminhada, ciclovias, playgrounds e quadras e estão bem conservados, atendendo sua funcionalidade. Rodeados pelos bancos em lugares estratégicos, foram localizados 9 bituqueiras, que são aparatos destinados ao descarte de bitucas de cigarro. Assim como os bancos e a iluminação, as lixeiras estão distribuídas em toda a extensão do Parque, a maioria delas apresenta um bom estado de conservação. Cabe ressaltar que foram localizados três tipos de recipientes: destinadas ao descarte de dejetos de animais; com segmentos sugerindo o descarte de resíduo reciclável e não reciclável, e com segmentação de materiais recicláveis, taiscomo: papel; plástico; metais; vidro e orgânico. Na figura 3 é possível Espaços Livres de Uso Público na Cidade Contemporânea - 103 observar os recipientes de diferentes segmentos (figura 3. a e d), além de equipamentos de iluminação e bebedouros de água (figura 3. b e c). Figura 2. Bancos do Parque do Povo: a – banco de madeira; b – banco de concreto Fonte: O autor, 2016 Conforme mencionado anteriormente, lixeiras e iluminação são prioridades dentre frequentadores de parques públicos (FRANÇA et al., 2016). No entanto, frequentadores percebem estes espaços como locais para convivência e interação social, o qual proporciona aos moradores da cidade o contato com a natureza (DORIGO; LAMANO-FERREIRA, 2015). 104 Figura 3. Equipamentos do Parque do Povo: a – lixeiras recicláveis; b - iluminação baixa, lixeira e banco; c – bebedouro; d – lixeira. Fonte: O autor, 2016 Os equipamentos de atividades físicas para idosos, denominados como academia da terceira idade, estão em bom estado. Possuem informativos com orientações sobre a forma de uso, como se alongar e quais benefícios cada equipamento proporcionam ao frequentador. Aparelhos similares aos de idosos também foram localizados no parque, com funcionalidade similar, destinados ao público mais jovem. Há no parque um playground, dividido em três aglomerados, com estruturas de madeiras e de ferro. Este local de lazer infantil é constituído por vários brinquedos, atraindo as crianças pela criatividade das brincadeiras, conforme figura 4. Espaços Livres de Uso Público na Cidade Contemporânea - 105 Figura 4. Infraestrutura do Parque do Povo: a – aparelho de ginástica; b – aparelho de ginástica para a terceira idade; c – administração; d – playground Fonte: O autor, 2016 No complexo esportivo do Parque do Povo as quadras poliesportivas possuem marcação especial para esportes paraolímpicos, e um campo de futebol gramado. Estão em bom estado, possuem iluminação alta e seu piso está pintado e bem conservado. Próximos a esse complexo e nos demais arredores do Parque, foram localizados bebedouros, todos em funcionamento. Cabe ressaltar que os bebedouros são adaptados para cadeirantes e também para os animais. O Parque possui pista de skate e patins, de caminhada/corrida e ciclovias. Seu piso é impermeável e o material constituinte é o concreto reaproveitado do entulho de construção civil das edificações que existiam no local. A pista de caminhada/corrida está localizada em todo perímetro do parque, esta é margeada por vegetação, porém com um baixo sombreamento, devido à diminuta área vegetativa no parque. A pista de skate e patins está localizada 106 próximo ao complexo esportivo do parque, e a ciclovia no entorno geral do local, com duas entradas e saídas, que dão acesso a ciclovias externas das avenidas próximas ao parque. Ao redor do parque, foram localizados dois pontos de ônibus e um ponto de taxi, facilitando o acesso ao local. A possibilidade de acessar o Parque do Povo utilizando transporte público se faz importante porque o Parque não possui estacionamento. O parque possui dois prédios de apoio à administração, onde estão localizados os banheiros e a sede administrativa do local. Sua construção possui ventilação natural e prioriza a luz do dia, reduzindo o uso de energia elétrica. No entorno dos prédios observa-se murais com informativos gerais sobre as normas do parque, horários de atendimento, contato com a administração e atividades culturais e esportivas. Em dois pontos do Parque foram localizadas duas esculturas esculpidas em bronze fundido e patinado. A escultura “Homem na Chuva” de Christina Motta (São Paulo, 1944) e uma peça de Florian Raiss denominada como “Os Quadrúpedes”. Na figura 5 é possível visualizar as esculturas em questão. Em toda a área do Parque são encontradas placas informativas identificando as espécies de plantas, os equipamentos e infraestrutura do local (pistas, banheiros, bebedouros, quadras, administração, entre outros), além de informativos sobre as normas de cada ambiente do parque. Cabe informar que o parque não possui pontos de venda de alimentos, telefones públicos e estacionamento. Também é importante mencionar que o Parque do povo apresenta poucos espaços com sombreamento para os frequentadores, uma vez que as árvores ainda são jovens. Espaços Livres de Uso Público na Cidade Contemporânea - 107 Figura 5. Obras de arte do Parque do Povo: a – Homem na Chuva; b – Os Quadrúpedes Fonte: O autor, 2016 Por fim, cabe sinalizar que não foram localizados no Parque do Povo: telefones públicos, palcos, chafariz e nascentes, bancas de revistas e jornais para venda, quiosques de alimentação e templos religiosos. Apesar da diversidade de espécies de árvores exóticas, nativas frutíferas, madeiras nobres e trepadeiras, foi observado pouca área arbórea densa, o que torna este espaço uma área aberta e com pouca sombra. 108 4 CONCLUSÃO O Parque do Povo possui quantidade e qualidade ao que se refere à infraestrutura para a população, com ótima estrutura e equipamentos esportivos. Desse modo, infere-se que o Parque foi planejado visando o público que busca praticar atividades físicas, como: futebol; ginástica/CrossFit; corridas/caminhadas; yoga; massagem; artes marciais; dentre outras práticas. Além disso, foi observada a presença de frequentadores com crianças que fazem uso de playgrounds, idosos utilizando as academias voltadas à terceira idade, visitantes passeando com animais de estimação, bem como, frequentadores utilizando os espaços mais sombreados para prática de piquenique e descanso. Sugere-se conhecer a percepção dos frequentadores deste parque, assim como estes utilizam o espaço. Essas informações podem auxiliar o gestor nas tomadas de decisão e contribuir para a manutenção do mesmo. REFERÊNCIAS BARGOS, D. C.; MATIAS, L. F. Áreas verdes urbanas: um estudo de revisão e proposta conceitual. Revista da Sociedade Brasileira de Arborização Urbana, v. 6, n. 3, p. 172– 188, 2011. BARGOS, D. C.; MATIAS, L. F.; OTHERS. 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Periódico Técnico e Científico Cidades Verdes, v.2, n.2, p. 59-73, 2014. 110 Espaços Livres de Uso Público na Cidade Contemporânea - 111 Capítulo 6 AVALIAÇÃO DAS INFRAESTRUTURAS DAS PRAÇAS CENTRAIS DA CIDADE DE CAMPO MOURÃO – PR Tatiane Monteiro Re53 Marcos Clair Bovo54 O aumento da população urbana de forma desordenada, principalmente a partir da década de 1970, trouxe consigo o aumento dos problemas econômicos e socioambientais e, consequentemente, a diminuição da qualidade de vida da população. É nesse sentido que temas relacionados ao desenvolvimento urbano sustentável vêm sendo debatidos por pesquisadores nos níveis técnicos e científicos, porque se tornaram questões cada vez mais presentes para o planejamento e para a gestão urbana. Assim, nesta pesquisa, buscamos entender a praça enquanto um elemento estruturador do espaço urbano, pois atende a várias funções, dentre elas destacamos: a social, a estética, a ecológica, a paisagística, a climática, a psicológica e a recreativa. Dessa forma, a praça pública é utilizada pela população como espaço de lazer, de descanso, de circulação de pessoas, de embelezamento ou apenas desfruta-se de sua paisagem por proporcionar um contato mais próximo com a natureza no meio urbano. Dada a importância da praça para a população citadina, a presente pesquisa tem como 53 Mestranda do Programa de Pós-graduação Interdisciplinar Sociedade e Desenvolvimento da Universidade Estadual do Paraná – Campus Campo Mourão. tatiane@utfpr.edu.br 54 Professor Adjunto do Colegiado de Geografia e do Programa de Pós-graduação Interdisciplinar Sociedade e Desenvolvimento da Universidade Estadual do Paraná – Campus Campo Mourão. mcbovo69@gmail.com 112 objetivo/intenção caracterizar e analisar a Praça São José e a Praça Getúlio Vargas na cidade de Campo Mourão (PR), destacando-se os aspectos paisagísticos e as infraestruturas existentes de forma a propor medidas que auxiliem no planejamento e gerenciamento destes logradouros. A PRAÇA ENQUANTO ESPAÇO PÚBLICO A praça é um dos principais elementos que compõem uma cidade. Na história da humanidade, encontramos praças desde tempos mais antigos. A Ágora, na Grécia antiga, e o Fórum romano eram os espaços públicos de uso coletivos mais importantes na cidade, servindo como ponto de encontro, comércio e circulação de pessoas. Na Idade Média, as praças assumem funções específicas: praça da igreja, praça de mercado, praça de entrada da cidade, praça do centro da cidade, entre outras. No Renascimento, além dos valores funcionais, elas ganham valores estéticos e passam a ornamentar a cidade. Segundo De Angelis et al. (2005), é nesse período histórico que a praça se converte em um dos principais elementos urbanísticos para a transformação e embelezamento das cidades. No Brasil, as praças coloniais surgiram a partir das igrejas, como observamos em Marx (1980, p. 222): “logradouro público por excelência, a praça deve sua existência, sobretudo, aos adros das nossas igrejas”. A partir da igreja e da praça surgia a cidade com os principais prédios públicos e melhores moradias, sendo, portanto, os espaços mais nobres da cidade. Nas palavras de Robba e Macedo (2002, p. 22), “era ali que a população colonial manifestava sua territorialidade, os fiéis demonstravam sua fé, os poderosos, seus poderes, e os pobres, sua pobreza”. Apesar de terem sido, por muito tempo, símbolo do poder religioso, as praças brasileiras também representavam as funções cívicas e militares. Espaços Livres de Uso Público na Cidade Contemporânea - 113 Com o aumento da população e o crescimento desordenado das cidades brasileiras, os espaços livres passaram a ser cada vez mais valorizados tanto para recreação como para embelezamento da cidade. Tal fato altera a função das praças brasileiras e marca o surgimento das praças ajardinadas na história dos espaços livres urbanos no país. Para estudar as praças brasileiras, precisamos considerar o desenvolvimento do paisagismo no país. Segundo De Angelis (2000), o paisagismo brasileiro se define no século XIX a partir da consolidação de uma rede de cidades, situadas principalmente ao longo do litoral e sob forte influência urbanística europeia (francesa e inglesa), que contribuiu para a criação de espaços públicos (parques, praças e boulevards). Macedo (1998, p.15), por meio do Projeto Quapa, destaca o paisagismo brasileiro em três períodos distintos: o ecletismo, o moderno e o contemporâneo: Ecletismo: Recebeu forte influência europeia. Marcado pelo surgimento dos primeiros parques públicos, praças ajardinadas, jardins dos barões do café. Moderno: Marcado pelo uso de vegetação nativa e rompimento com escola clássica. Destaque para os trabalhos de Roberto Burle Marx em Recife e Rio de Janeiro. Contemporâneo: Recebeu influência paisagística japonesa, americana e francesa utilizando estruturas construídas e vegetação. Desenvolveu-se a partir dos anos 1980 e 1990. A incorporação da vegetação no espaço público brasileiro mostra a necessidade do contato do homem urbano com a natureza, fato marcado pelo surgimento de hábitos de jardinagens, pela abertura dos jardins botânicos para a população e pela arborização das ruas e praças públicas. 114 Em síntese, os imensos espaços abertos e sem vegetação, que serviam apenas como local de encontro começam a ser planejados para atender às novas funções que surgem nas cidades brasileiras. A inserção de arborização, inclusive a nativa que antes era desvalorizada, colabora para que o espaço urbano seja pensado tanto em nível estético como em nível funcional. Hoje, essa valorização passa a constituir em um dos indicadores de qualidade dos espaços livres públicos, pois além de servir como um fator de embelezamento da cidade permite uma ruptura na paisagem constituída por edificações, proporcionando tanto espaços de passagem, embelezamento e ordenamento urbano quanto espaço de sociabilidade da população. Porém, apesar do empenho das administrações municipais em equipar e manter as praças públicas brasileiras percebe-se um abandono desses espaços por parte da população, principalmente nos grandes centros, que apresentam outros atrativos de consumo e lazer como shoppings e televisão. Vários pesquisadores, dentre eles Marx (1980), Ferrara (1993), Segawa (1996), Robba e Macedo (2002), Sun Alex (2008), Serpa (2011) têm discutido em seus trabalhos a importância das praças públicas na sociedade brasileira. Para Robba e Macedo (2002), estudos sobre praça devem considerar seu uso e sua acessibilidade. No primeiro caso, por ser espaço público urbano destinado ao lazer e ao convívio da população, e acessibilidade por ser espaço livre de veículos e acessível ao cidadão. Outro autor que discute a questão da acessibilidade é Sun Alex (2008), para o qual “a praça não é apenas um espaço físico aberto, mas também um centro social integrado ao tecido urbano.Sua importância refere-se a seu valor histórico, bem como a sua participação contínua na vida da cidade” (2008, p. 23). Destaca que a acessibilidade é um dos fatores fundamentais para o uso e Espaços Livres de Uso Público na Cidade Contemporânea - 115 apropriação do espaço público. O acesso a esse espaço pode ser físico (com barreiras físicas que impeçam o acesso), visual (ameaça visual de que o lugar não é seguro) e simbólico ou social (sinais que sugerem quem não é bem vindo ao local); eles podem ser combinados tornando o local mais ou menos convidativo ao uso (2008, p. 25). Como dito anteriormente, as praças são elementos de grande importância para a população à medida que atendem às várias funções: estética (embelezamento), ambiental (qualidade do ambiente), social (convivência entre pessoas de faixa etária diversa) e simbólica (lazer, descanso). A questão da acessibilidade, portanto, é primordial para garantir o uso e a permanência das pessoas nos espaços públicos. Sun Alex (2008) alerta que: O desuso das praças acarreta a perda de oportunidades de sociabilização e de fortalecimento da cidadania, contribuindo para o aumento da dependência de espaços privados para a prática da vida pública e, consequentemente, das desigualdades sociais e da exclusão. Garantir o acesso público e o uso coletivo – condições essenciais para promover a vida pública nas praças – é um desafio e uma responsabilidade para a cidade e para o paisagismo. (ALEX, 2008, p. 279). O espaço público é compreendido por Serpa (2011, p. 9) como espaço da ação política, ele o analisa enquanto mercadoria para consumo de poucos segundo a lógica do sistema capitalista. Para tanto, aborda os conceitos de: cidadania, política e acessibilidade. A acessibilidade física (sem barreiras que impeçam o acesso) e também a acessibilidade simbólica (à medida que a apropriação espacial seleciona ou limita o acesso ao espaço público). Para Serpa (2011), as transformações urbanas têm sofrido influência do consumo e do lazer da classe média, multiplicando, assim, a valorização do solo. Aponta que há uma tendência em se investir em espaços públicos “visíveis”, aqueles com maior destaque na cidade. 116 METODOLOGIA Para a realização deste capítulo, adotamos os seguintes procedimentos metodológicos: pesquisa bibliográfica sobre praças públicas, áreas verdes urbanas e espaço público; trabalho de campo para levantamento das estruturas e mobiliários presentes nas Praças São José e Getúlio Vargas da cidade de Campo Mourão e registro fotográfico dessas estruturas. Para avaliar de forma qualitativa e quantitativa as estruturas e mobiliários, utilizaremos a metodologia desenvolvida por De Angelis (2000), que estabelece parâmetros fixos de avaliação das estruturas existentes nas praças: bancos, iluminação, sanitários, lixeiras entre outras. Com o estabelecimento de parâmetros fixos, buscamos evitar que o mesmo equipamento seja avaliado de forma diferente. O registro fotográfico permitirá apresentar em forma de mosaico a qualidade das estruturas e mobiliários presentes nas Praças São José e Getúlio Vargas. ANÁLISE DOS RESULTADOS O presente objeto teve como recorte espacial as Praças São José e Getúlio Vargas (Figura 1) do município de Campo Mourão, que está localizado na Mesorregião Centro Ocidental Paranaense. Segundo o IBGE (2014), possui população total de 87.194 habitantes, sendo 4.518 habitantes residentes na área rural e 82.676 na área urbana. Conforme o Instituto Paranaense de Desenvolvimento Econômico e Social (IPARDES, 2015), esse município possui uma área de 763,637 km², está a 447,18 km distante da capital do estado e o Índice de Desenvolvimento Humano (IDH), em 2010, era de 0,757, ligeiramente acima do índice do estado que é de 0,749. As praças São José e Getúlio Vargas estão localizadas na área central da cidade de Campo Mourão. Na década de 1940, Espaços Livres de Uso Público na Cidade Contemporânea - 117 compunham um único espaço no entorno da igreja São José, destinado às comemorações religiosas. Figura 1 – Praças Centrais de Campo Mourão Fonte: Museu Municipal Deolindo Mendes Pereira, 2015. Com o mapeamento e demarcação dos primeiros quarteirões para formação do núcleo urbano de Campo Mourão, a praça foi fragmentada em dois espaços: um deles continuou destinado às atividades religiosas e o outro ao lazer da população. A Praça Getúlio Vargas foi oficializada no final da década de 1950, e a Praça São José na segunda metade da década de 1960. Na década de 1980, foi construído, no lugar da igreja São José, a nova Catedral da cidade. Nessa época, o poder público municipal fechou a Rua Brasil e construiu um calçadão entre as duas praças, passando a falsa impressão da existência de apenas uma praça. A partir da década de 1990, outros grupos passaram a frequentar esses espaços, como andarilhos, prostitutas, etc. Na tentativa de resgatar tais logradouros, em 2004 o poder público 118 municipal revitalizou-os e reabriu a Rua Brasil; porém, devido à proximidade e à padronização dos mobiliários, a impressão de uma única praça permanece. A pesquisa in loco proporcionou apresentar uma análise detalhada de todos os equipamentos existentes nas duas praças. Logo, por serem semelhantes, apresentaremos uma análise integrada das principais estruturas e mobiliários presentes nestas praças, conforme apresentamos nos mosaicos das Figuras 2 e 3. Quanto aos caminhos, são pavimentados por bloquetes que facilitam o acesso e a circulação de transeuntes em diferentes áreas da praça, inclusive em dias de chuva. A pavimentação encontra-se em ótimo estado de conservação, o traçado é adequado do ponto de vista funcional e estético e tem uma largura adequada para a circulação. Outro mobiliário de grande relevância são os bancos, pois permitem que as pessoas permaneçam na praça para descansar, contemplar a natureza, ler ou encontrar com amigos. Os bancos possuem os pés ornamentados, de ferro, com encosto e assento em madeira, e estão bem conservados e distribuídos por toda a praça, proporcionando o uso e a permanência das pessoas. Localizamos lixeiras de plástico sobre estrutura de metal em bom estado de conservação; porém, insuficientes para atender de forma satisfatória. Observamos apenas um ponto de água em cada praça, utilizados para limpeza e irrigação das plantas, não sendo possível saciar a sede dos usuários. Em relação à iluminação, encontramos postes baixos espalhados pelas duas praças. À noite, alguns pontos como chafariz, estátuas e espaço para eventos recebem iluminação de destaque contribuindo para a iluminação geral. Espaços Livres de Uso Público na Cidade Contemporânea - 119 Figura 2 - Mosaico das estruturas e mobiliários da Praça São José 1- Estátua; 2- Catedral São José; 3- Quiosque de alimentação; 4- Estátua em homenagem a São José; 5- Banco; 6- Gramado; 7- Pavimentação; 8- Pátio para realização de eventos; 9- Palco; 10- Lixeira; 11- Estacionamento e 12- Ponto de água. Foto: Tatiane Monteiro Ré, 2015. 120 Figura 3 - Mosaico das estruturas e mobiliários da Praça Getúlio Vargas 1- Pavimentação; 2- Banco; 3- Poste de luz; 4- Ponto de água; 5- Biblioteca Municipal; 6- Poste de luz; 7- Ponto de táxi; 8- Coreto; 9- Lixeira; 10- Chafariz; 11- Gramado; 12- Placa de identificação das duas Praças: Getúlio Vargas e São José. Fotos: Tatiane Monteiro Ré, 2015. Espaços Livres de Uso Público na Cidade Contemporânea - 121 Além dessas estruturas, encontramos outros elementos que compõem a forma das praças. Na São José, o elemento mais importante é a Catedral São José, que dá o nome a praça. Outros elementos religiosos foram encontrados: duas estátuas, uma em homenagem a São José e outra em homenagem ao centenário natalício de DomEliseu Simões Mendes, primeiro bispo de Campo Mourão (1915 – 2015). Há, também, dois quiosques de alimentação em bom estado de conservação que atendem ao público no período diurno. Na Praça São José há um palco e um amplo espaço de onde acontecem eventos, religiosos ou não. Na foto, podemos observar estruturas metálicas de um evento dos comerciantes locais que havia ocorrido no final de semana. A Catedral utiliza uma parte do seu entorno como estacionamento particular, atendendo a falta de estacionamento do centro da cidade. O destaque da Praça Getúlio Vargas é o chafariz que atrai a atenção de crianças e adultos por sua beleza; à noite ele possui iluminação própria. Nessa praça, encontramos um prédio institucional, a Biblioteca Pública Municipal, que atende toda a população. Encontramos uma placa de identificação com referência às duas praças, mas em péssimo estado de conservação, não sendo possível identificar o seu conteúdo. Há um coreto que está fechado atualmente e um ponto de táxi. As Praças São José e Getúlio Vargas formam um espaço público fundamental para o desenvolvimento da cidadania, pois proporcionam a integração de usuários de diferentes níveis sociais e econômicos. Nota-se que há investimento por parte do poder público e religioso para que as praças tenham a configuração atual e possa atender às funções delas esperadas. No entorno das praças encontramos o centro comercial da cidade com lojas de vestuário, lojas de produtos agrícolas, sapatarias, relojoarias, livrarias, farmácias, hotéis, restaurantes, agência dos 122 correios, Prefeitura Municipal de Campo Mourão, Câmara Municipal de Campo Mourão, Colégio Vicentino Santa Cruz entre outros. CONSIDERAÇÕES FINAIS Com a análise dos resultados obtidos no levantamento dos aspectos quantitativos e qualitativos dos equipamentos e estruturas existentes nas Praças São José e Getúlio Vargas foi possível concluir que ambas desempenham as funções estética, ambiental e social. A mais evidente é a social, pois as estruturas presentes possibilitam o convívio e a integração de pessoas de níveis sociais, culturais, econômicos e idades diferentes. O poder público municipal e as entidades religiosas, enquanto gestores desses espaços públicos estão atuando na manutenção e conservação da praça. No entanto, com intuito de contribuir com as futuras implementações ou reformas, deixamos algumas sugestões pensando no conforto dos usuários das praças. A instalação de parque infantil seria uma opção de lazer para a população, pois não encontramos atividades de lazer gratuitas na cidade. Para que seja, efetivamente, um elemento integrador, necessita estar em boa qualidade de uso e adequado à capacidade psicomotora dos usuários, que tenha cores e modelos variados e em quantidade suficiente para atender o público. A instalação de um módulo policial seria uma opção para aumentar a segurança dos usuários. A instalação de alguns pontos de água (bebedouros) contribuiria com o conforto dos usuários. REFERÊNCIAS ALEX, Sun. Projeto da praça: convívio e exclusão no espaço público. 2. Ed. São Paulo: Editora Senac, 2008. Espaços Livres de Uso Público na Cidade Contemporânea - 123 DE ANGELIS, Bruno Luís Domingos de. A Praça no Contexto das Cidades: o caso de Maringá-PR. Tese de (Doutorado em Geografia). Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas – Universidade de São Paulo. São Paulo, 2000. FERRARA, Lucrecia D´Alesio. As Máscaras da Cidade. In: Olhar Periférico: informação, linguagem, percepção ambiental. São Paulo: Edusp/Fapesp. 1993. IBGE. Censos Demográficos. 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Os intensos e acelerados processos de urbanização das últimas décadas fez com que os espaços livres recebessem ações e intervenções temporárias ou emergenciais, sem uma proposta urbanística de fato. A falta de planejamento continua a contribuir até hoje para que os espaços livres permaneçam desqualificados e pouco Espaços Livres de Uso Público na Cidade Contemporânea - 13 valorizados. Embora sejam muitas as ações voltadas à tentativa de qualificação de tais espaços, a desarticulação e a sobreposição de funções públicas ainda dificultam a produção e a gestão dessas ações. A qualidade de vida urbana e social está diretamente atrelada aos fatores reunidos na infraestrutura e no desenvolvimento sociocultural, econômico e ambiental. Portanto, é preciso responder positivamente às necessidades dos cidadãos por meio de políticas públicas integradas, que garantam projetos e medidas de qualidade. O objetivo deste artigo é apresentar e analisar, por meio de um levantamento bibliográfico, algumas das formas vigentes de produção e gestão dos espaços livres urbanos e a relação de tais espaços com a cidade. É fundamental entender os sistemas de espaços livres, seus padrões espaciais e seu papel na estruturação e transformação da paisagem, apreender as ações administrativas e enfatizar a importância de novas medidas, a fim de se nortear futuras intervenções e promover a articulação entre pesquisadores, políticos, projetistas e usuários. 2. REVISÃO DE LITERATURA 2.1 CONCEITOS, FORMAS E FUNÇÕES DOS ESPAÇOS LIVRES As formulações conceituais da paisagem constituem uma base referencial fundamental para a contextualização das funções, das formas e da distribuição dos espaços livres. Resultante de processos socioculturais e naturais do homem sobre um território, a morfologia da paisagem se dá em função da integração entre os sistemas geológicos, climáticos e antropológicos (LEITE, 1996; MACEDO, 2012; MAGNOLI, 2006) (Figura 1). Processo histórico de representação das relações, tais sistemas atribuem sobre a paisagem dimensões morfológicas, funcionais, espaciais e simbólicas (SCHLEE et al., 2009) 14 que contribuem e afetam diretamente o processo de construção e desenvolvimento das cidades. Os conceitos contemporâneos da paisagem partem diretamente do referencial Homem e Natureza, assim, são poucas as paisagens que não tem, nos dias atuais, a intervenção do homem, ainda que a forma e a representação de tal ação sejam diversas. Segundo Magalhães (2007, p. 106), “a essência do objecto deixou de ser ele próprio, mas aquilo que ele revela a quem o souber interpretar, o que exige uma descodificação de sinais para que, aquilo que não é visível, seja identificado”. Nessa acepção, Seel (2011, p. 407) interpreta a paisagem como “a realidade de vida do homem modelada pela natureza estética”. Portanto, compreender as apropriações, as representações e os conflitos entre o homem e a natureza, enquanto constituição de uma paisagem torna-se fundamental para a análise de qualquer elemento da forma urbana da atualidade. Entender a cidade através da lógica das referências da paisagem que apontam os elementos e os espaços que a conformam, seria também uma maneira de legitimar um conceito de cidade mais baseada nas próprias diretrizes paisagísticas que a estruturam, através de seus marcos urbanos e territoriais, e que constituem a principal estética de sua própria paisagem. (SEGUÍ, 1996, p. 61, tradução nossa). Espaços Livres de Uso Público na Cidade Contemporânea - 15 Figura 1 - A integração de sistemas geológicos, climáticos e antropológicos na paisagem de Bauru, SP Fonte: CONSTANTINO, 2016. Dentro da paisagem urbana, as ações físicas do homem se moldam por meio dos espaços edificados e espaços não edificados. Segundo Magnoli (2006, p.179), “o espaço livre é todo espaço não ocupado por um volume edificado”. Para Macedo (2012), a paisagem urbana apresenta elementos característicos que se articulam, dando forma, dessa maneira, às cidades (Figura 2). Assim, a base de toda essa estrutura se dá pelo “suporte físico”, representado principalmente pelos elementos naturais, como relevo e água. As características físicas de cada local são conformadas pelos “volumes urbanos” constituídos pelos elementos construídos, como prédios, e elementos plantados, como árvores e arbustos. Representados por parques, praças, ruas, quintais, terrenos vazios, entre outros, os “espaços livres de edificação” constituem-se nos espaços abertos, 16 livres de edificações ou coberturas, nos quais as ações urbanas acontecem. Figura 2 - A paisagem urbana de Bauru – SP e seus elementos característicos Fonte: CONSTANTINO, 2016. Geralmente associados à função de lazer, por meio das praças, parques e jardins, os espaços livres das cidades devem ser compreendidos de acordo com suas diversas funções, além das ações e das necessidades do homem urbano (MAZZEI; COLESANTI; SANTOS, 2007). Com funções ambientais, ecológicas, estéticas, sociais, culturais, de lazer, de mobilidade, dentre outras, o conjunto organizado destes espaços, de domínio público ou privado, distribuídos qualiquantitativamente no tecido urbano, constitui um sistema de espaços livres urbanos (Figura 3). Segundo Loboda e De Angelis (2005) os espaços verdes são os espaços livres dotados predominantemente de vegetação. Dessa forma, pode-se afirmar que as áreas verdes constituem um subsistema do sistema de espaços livres. Espaços Livres de Uso Público na Cidade Contemporânea - 17 Figura 3: Sistema de espaços livres urbanos e suas diversas funções em Curitiba, PR Fonte: MATTOS, 2014. Fundamental ao desempenho da vida cotidiana e a constituição da esfera de vida pública e privada, o sistema de espaços livres está em constante processo de transformação e adequação às novas exigências urbanas e sociais. Apreender os aspectos e as funções que caracterizam os espaços livres é imprescindível para o entendimento da relação entre esses locais e a cidade. O usar, o ver e o sentir do indivíduo sobre o espaço tornam-se fundamentais para a tomada de consciência de cada local. Segundo Holanda (2007, p. 117), é importante entender as “implicações dos lugares enquanto arquitetura, como ela nos afeta de várias maneiras” e qual a sua pluralidade de desempenhos. Cada aspecto, segundo o autor, implica em uma estrutura de relações entre os atributos da forma-espaço e as expectativas humanas. Dado isso, pode-se afirmar que o espaço livre urbano, assim como a arquitetura, “é lugar usufruído como meio de satisfação de expectativas funcionais, bioclimáticas, econômicas, sociológicas, topoceptivas, afetivas, simbólicas e estéticas, em função de valores 18 que podem ser universais, grupais ou individuais.” (HOLANDA, 2007, p. 117-118). Quanto à configuração física e material das áreas livres, pode- se afirmar que a forma, embora vaga e variável, está diretamente associada à distribuição dos edifícios e dos espaços livres já existentes, e segue, preferencialmente, os interesses políticos e econômicos vinculados diretamente ao setor imobiliário em detrimento as necessidades ambientais e ecológicas do meio. O espaço livre na metrópole brasileira é comumente predeterminado a partir do processo de loteamento quando são especificadas e destinadas as áreas para as ruas e demais espaços públicos. A composição dos elementos edificados pode definir as características formais do espaço livre; no entanto, sua qualificação também deverá ser dada pelo seu desenho/projeto e pela manutenção adequada. (QUEIROGA, 2011, p. 29) A (des)qualificação do meio urbano está diretamente relacionada às configurações físicas do espaço livre. Portanto, compreenderas (des)conexões de tais espaços com a cidade e seus elementos, bem como sua multifuncionalidade e inter-relações, torna-se fundamental para o desenvolvimento de ações bem planejadas. 2.2 O SISTEMA DE ESPAÇOS LIVRES E A CIDADE As discussões sobre os sistemas de espaços livres públicos vem se tornando, desde as últimas décadas do século XX, temática obrigatória tanto nos meios acadêmicos, quanto nas áreas de planejamento e gestão urbana. Processados e apropriados pela sociedade, os espaços livres urbanos, planejados ou não, formam um tecido que representa uma grande porcentagem do solo das cidades brasileiras (Figura 4). Espaços Livres de Uso Público na Cidade Contemporânea - 19 Figura 4 - Os espaços livres urbanos de Ouro Preto, MG Fonte: MATTOS, 2010. Elemento de conexão e onde ocorre a maioria das ações cotidianas da sociedade, os espaços livres urbanos ainda são vistos como “estruturas independentes do seu entorno edificado, bolsões de alívio dos males da urbanização ou, o que é ainda mais frequente, como territórios perigosos e hostis ao desenvolvimento de diversas e desejáveis formas de sociabilidade (...)” (LEITE, 2011, p. 159). A falta de segurança e de atuação do poder público em ações de participação popular fez com que a renúncia aos espaços livres públicos pelas camadas sociais só aumentasse, principalmente durante as últimas décadas do século XX. A paisagem fragmentada e desorganizada fez com que fossem mais valorizados os espaços privados, enquanto os espaços públicos tornaram-se cada vez mais abandonados e deteriorados, apesar da mudança de pensamento que começa a se instaurar sobre a população em relação a esses espaços. É nos espaços livres que a vida pública tem sua maior estrutura, constituídos por locais de acessibilidade, diversidade e pluralidade (QUEIROGA, 2011). 20 Para Leite (2011), a visão social de que os espaços públicos deveriam promovem a socialização e o encontro das pessoas, assim como as áreas verdes deveriam contribuir para sua estruturação, não foi capaz de alterar a organização física deficiente e o descaso pelos espaços coletivos. A forma de perceber, interpretar e intervir na paisagem, entre moradores e poder público ainda revela-se oposta. Segundo Leite (1996, p. 11), enquanto os moradores utilizam-se de uma percepção e interpretação baseada na realidade cotidiana e suas características de natureza cultural e simbólica, o poder público apoia-se em uma visão de planejamento urbano baseado em uma operação padrão que trata o espaço como um local “vazio”, “autoreprodutível” e “monofuncional”. O trabalho de profissionais que atuam na arquitetura e no paisagismo também tem se limitado aos espaços que, pelos códigos e leis, são definidos como espaços necessários e obrigatórios, como os recuos de frente, lateral e de fundo das edificações. Além disso, planejadores e gestores têm trabalhado na escala pontual de seus projetos, sem considerar e mensurar os impactos e as consequências do mesmo sobre o entorno, a cidade e a população (SPIRN, 1995). A distribuição, a apropriação e o tratamento dos espaços livres urbanos, bem como sua relação com os elementos construídos, estão diretamente relacionados, segundo Schlee et al. (2009), aos conflitos e contradições provenientes das imparcialidades presentes na distribuição de terra e de renda, tanto no meio urbano quanto no rural (Figura 5 e Figura 6). A diversidade cultural da sociedade brasileira reflete diretamente na diversidade paisagística das cidades. Nesse contexto, os espaços livres expressam os diversos aspectos culturais e sociais, sejam eles regionais ou locais. Portanto, compreender as características regionais torna-se fundamental para a produção e organização de mudanças no planejamento dessas áreas livres. Espaços Livres de Uso Público na Cidade Contemporânea - 21 Figura 5 - A apropriação e o tratamento de um espaço livre em Botucatu, SP Fonte: CONSTANTINO, 2013. Figura 6 - A apropriação e o tratamento de um espaço livre em Belém, PA Fonte: CONSTANTINO, 2014. 22 A cidade é um conjunto de elementos, sistemas e funções que se associam. Dessa maneira, além de compreender as diversidades sociais, o sistema de espaços livres urbanos apresenta uma complexa inter-relação com outros sistemas urbanos, que juntos, podem compor relações de conectividade e complementaridade com a “preservação, a conservação e a requalificação ambientais, a circulação e a drenagem urbana, as atividades de lazer, o imaginário, a memória e o convívio” (LEITE, 2011, p. 159) (Figura 7). Figura 7- A inter-relação de sistemas no Parque Barigui em Curitiba, PR Fonte: MATTOS, 2011. Tal interconectividade permite inúmeras práticas de relevância cultural e social associadas ao sistema de espaços livres e voltadas para o uso da população. A realização de festas populares, o uso para manifestações políticas e sociais, assim como a presença de elementos culturais destaca a diversidade desses elementos urbanos. De acordo com Queiroga (2011, p. 28), “não há um tipo único ou ideal de sistema, pois cada lugar urbano possui características específicas de formação histórica, características socioeconômicas e Espaços Livres de Uso Público na Cidade Contemporânea - 23 de relacionamento com o suporte biofísico”. Dessa forma, uma abordagem integrada entre projeto, política social e gestão torna-se fundamental tanto para a criação, quanto para a manutenção de espaços livres públicos de sucesso. Como se observa, são inúmeras as ações e conexões dos espaços livres urbanos com a cidade e seus elementos. Contudo, espera-se muito de um elemento que pouca atenção recebe de seus usuários e gestores, como afirma Magnoli (2006, p. 181): No desenho urbano os espaços são aqueles definidos pelo sistema viário e por uma reserva de outro espaço livre, devidamente classificado em ‘de recreação’ ou ‘área verde’ que se define por uma porcentagem. Nas principais avenidas se espera estar entre ‘boulevards copados’ desde que as árvores se plantadas e mantidas cresçam sobre um solo composto de tubulações diversas da infraestrutura. É preciso que se saiba o que realmente se quer e se pode ter. Exige-se a criação de topoclimas em locais de maior uso, a diminuição de índices de ruído, a correção de erros de intervenção no relevo, a garantia de limpeza das águas, a capacidade de atuarem como focos de promoção social; o atendimento a níveis e graus de recreação os mais diversos. A um equipamento raríssimo se fazem exigências funcionais intensas e extensas independente de desacertos no uso do solo e de qualquer política de espaços livres. (MAGNOLI, 2006, p.181). 2.3 A PRODUÇÃO E A GESTÃO DOS ESPAÇOS LIVRES URBANOS Apesar do crescimento das ações voltadas para os espaços livres urbanos nos últimos anos, ao analisar esses espaços em algumas cidades brasileiras, é possível observar e compreender um amplo quadro de problemas relacionados à produção e a gestão pública de tais locais, como a descontinuidade administrativa e a falta de inserção em planejamentos mais integrados. O não desenvolvimento de uma prática de projetos para espaços livres deve-se, prioritariamente, à permanência de um pensamento de gestão centrada nas características socioeconômicas das cidades, 24 postergando a dependência desses elementos urbanos a segundo plano - ainda que tais espaços sejam fundamentais para preservação de desastres ambientais, como alagamentos e deslizamentos, e para a qualidade de vida do meio e de seus usuários. Para Pellegrino et al. (2006), estes espaços devem ser entendidos como parte da infraestrutura urbana e não considerados apenas em função de seus valores estéticos. As áreas livres urbanas podem exercer várias outras funções,como conectar fragmentos de vegetação; oferecer melhorias microclimáticas; garantir suporte social por meio de usos relacionados à moradia, trabalho, educação e lazer, além de acomodar as funções de outras infraestruturas urbanas. Torna-se necessário, nos trabalhos de planejamento ambiental, considerar seus aspectos teóricos e metodológicos. A sucessão de cortes administrativos, dentro dessa concepção, tem consolidado, principalmente, as práticas de recreação e lazer do conjunto de espaços livres, buscando, eventualmente, a preservação de recursos e a qualificação do ambiente urbano. Segundo Leite (2011), Da mesma maneira que o viário avança sobre os espaços públicos da cidade, a expansão urbana avança sobre sua zona de proteção ambiental, fazendo que se percam recursos preciosos e importantes para a manutenção do equilíbrio cidade/natureza, daí decorrendo todo tipo de catástrofe. (LEITE, 2011, p. 172). A grande quantidade de produtores e gestores dos espaços, bem como a desarticulação e sobreposição de funções públicas, dificulta a administração e a execução de projetos urbanos qualificados. Entre os inúmeros problemas presentes nos espaços livres públicos urbanos observa-se que as calçadas são estreitas e encontram-se, na maioria das vezes, em péssimo estado de conservação, além da presença de terrenos vazios e abandonados (Figura 8) e praças e parques sem manutenção (Figura 9). A Espaços Livres de Uso Público na Cidade Contemporânea - 25 arborização urbana é deficiente, ou praticamente ausente, na maioria do tecido urbano e são raros os tratamentos paisagísticos encontrados nos espaços públicos, cada vez mais pavimentados. Também se observa inúmeros conflitos entre projeto e legislação, que atrasam ou impedem a execução e/ou manutenção dos espaços. A falta de saneamento e a má conservação de seu sistema contamina grande parte dos rios urbanos. Figura 8 - Terreno abandonado e sem administração pública na favela de Heliópolis, SP Fonte: MATTOS, 2011. 26 Figura 9 - Parque sem manutenção em São Manuel, SP Fonte: MATTOS, 2015. São muitos os desafios e as barreiras relacionados à produção e a gestão dos espaços livres para que se possam desenvolver novos locais atrativos e de qualidade. De acordo com Queiroga (2011), para isso são necessárias novas medidas de planejamento e gestão, dentre as quais se incluem a criação de uma legislação urbanística-ambiental apropriada às necessidades ambientais urbanas; saneamento ambiental; revisão de paradigmas urbanísticos atuais, como a priorização de automóveis em detrimento ao pedestre e a produção imobiliária voltada ao mercado financeiro; o estabelecimento de planos atuais e eficientes para o sistema de espaços livres que considerem as características particulares de cada lugar urbano; assim como a articulação de políticas públicas e a criação de quadros técnicos capazes de planejar, projetar, executar e manter os espaços livres. Espaços Livres de Uso Público na Cidade Contemporânea - 27 As especificidades geográficas, climáticas, econômicas, históricas e culturais de cada local, bem como as diversas formas de apropriação do espaço livre pela população, anulam a criação de qualquer modelo ou manual de orientação para a criação e manutenção dos espaços livres. O levantamento e a interpretação dos inúmeros problemas das cidades são semelhantes, mas as medidas desenvolvidas pelo poder público e por planejadores devem estar diretamente relacionadas às necessidades e especificidades de cada espaço urbano e dos usuários. Por meio de análises locais, é possível estabelecer diretrizes de projeto eficientes. A apropriação do espaço por diferentes grupos sociais, bem como a prática de diferentes atividades em um mesmo espaço mostram a diversidade desses locais (Figura 10). Assim, recomenda-se a criação de um sistema de espaços livres com diferentes espaços multifuncionais, em detrimento aos rígidos cenários criados pelos planejadores (GOMES, 2013) e aos locais de uso exclusivo. A especificidade funcional ao espaço livre é, às vezes, exigida para algumas atividades; ela é, porém, frequentemente atribuída (ou imposta) desnecessariamente (ou quiçá porque) por desenho (um gramado pode propiciar muito mais do que uma ‘pelada’; contudo se desenha uma “quadra”, devidamente cercada, com tela, portão e piso devidamente igual em toda a periferia, (sempre com 2 metros de largura!)). Saudavelmente, os arquitetos estão descobrindo que ‘vamos ter que aprender daqui para frente, a trabalhar com aberturas e com espaços ‘em branco de significados’... ’ sejam saudavelmente abertos e saudavelmente ambíguos, para que permitam uma criação ampla de significados. (Magnoli, 2006, p.181- 182) 28 Figura 10 - Apropriação do espaço livre por diferentes grupos sociais em São Manuel, SP Fonte: MATTOS, 2016. Atender e suprir as carências presentes nas cidades brasileiras por meio da integração de políticas públicas torna-se, assim, fundamental para a produção e gestão de projetos com uma nova abordagem, focados no usuário e na multifuncionalidade. O desenvolvimento de espaços livres efetivamente integrados entre si e com os demais elementos urbanos garantem a formação de um grande e único sistema, responsável tanto pela qualidade ambiental, quanto pela qualidade de vida da população. A requalificação da cidade só é possível por meio da harmônica integração entre o subsistema natural e o subsistema artificial (MOISSET, 2006). 3 CONCLUSÃO Componente básico na constituição da paisagem urbana e da vida citadina, os espaços livres urbanos públicos atendem as demandas de circulação de pedestres e veículos, de recreação e contemplação da paisagem, de lazer e esportes, de relaxamento, de Espaços Livres de Uso Público na Cidade Contemporânea - 29 conservação ambiental, além de possibilitar manifestações políticas e sociais e proporcionar memórias afetivas. Em constante processo de transformação, tal sistema adequa-se frequentemente às novas demandas da sociedade, embora sejam a disponibilidade de recursos, bem como as ações políticas, os fatores responsáveis por definirem os processos de qualificação ou desqualificação de tais sistemas. Nos dias atuais, o planejamento desses espaços parte de recursos residuais procedentes de outras atividades, consideradas prioritárias, e geralmente advindas de pastas políticas, econômicas e estratégicas. Os baixos investimentos contrastam diretamente com o aumento das necessidades reais criadas pela expansão urbana. Seguindo por tal premissa, pode-se afirmar que considerar os espaços livres de forma prioritária e integrada a outros sistemas urbanos torna-se básico para a criação de espaços de qualidade, adequados às necessidades sociais, públicas e ambientais. É fundamental compreender a importância e a possibilidade de contato com outras pessoas nos lugares públicos, conhecidos como verdadeiros espaços de exposição; que a saúde pública está diretamente relacionada à qualidade de vida urbana, possibilitada pela existência de espaços livres bem planejados; assim como a saúde e o bem-estar da população está relacionada diretamente às atividades de lazer, de contemplação e de esporte desenvolvidas nos espaços urbanos não edificados; que a conservação dos espaços verdes urbanos e áreas ambientais em conjunto com os elementos naturais são primordiais para a qualidade bioclimática, para a conservação de ecossistemas e para a prevenção de desastres ambientais, como enchentes e deslizamentos de terra. Como se pode observar, a presença dos espaços livres na conformação das cidades contemporâneas tem se mostrado imprescindível, principalmente em função de suas inúmeras e determinantes funções. Portanto, planejar esses espaços vai muito 30além de abrir ruas, implantar canteiros e construir praças e parques com áreas de recreação. Planejar esses espaços exige o conhecimento e a aplicação de tais funções desde a concepção de projeto dos assentamentos urbanos, de forma a considerar principalmente a relação entre o Homem e a Natureza. Para isso, uma nova postura administrativa e projetual precisa se firmar dentro da gestão pública. REFERÊNCIAS GOMES, P.C. da C. O lugar do olhar: elementos para uma geografia da visibilidade. Rio de Janeiro: Bertrand Brasil, 2013. HOLANDA, F. Arquitetura Sociológica. Revista Brasileira de Estudos Urbanos e Regionais, Rio de Janeiro, v. 7, n. 1, p.115-129, 2007. LEITE, M. A. F. P. Projeto e uso dos espaços públicos, o código e a interpretação. In: III CONGRESSO DA BRASILIAN STUDIES ASSOCIATION, 1996, Cambridge. Mesa Redonda Representações da Cidade: Imagens Cruzadas entre Brasil e Europa. Cambridge, Reino Unido, 1996, p. 01-15. _________. 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O presente artigo desenvolve-se a partir do enfoque de impactos gerados por ações impressas a partir de intervenções urbanísticas, no campo da requalificação e transformação de ambientes urbanos e possíveis impactos na qualidade de vida da população. 3 Capítulo elaborado a partir do texto apresentado no II Encontro Técnico e Científico para Construção de Cidades Verdes, 2015 “Cidades Verdes: contribuições para um debate sobre rios urbanos e corredores verdes”. 4 Doutora em Urbanismo, pelo PROURB/FAU/UFRJ. Mestre em Geografia, pela UFRJ. Arquiteta e Urbanista. Professora da Escola de Arquitetura e Urbanismo da Universidade Federal Fluminense e do Programa de Pós-graduação em Arquitetura e Urbanismo – PPGAU/UFF. eloisa.araujo@gmail.com 5 Arquiteta e Urbanista. Mestranda do Programa de Pós-graduação em Arquitetura e Urbanismo – PPGAU/UFF. 34 A investigação inicial tomou como base o estudo da Economist Intelligence Unit (EIU)6, patrocinado pela Siemens, ressalta que a América Latina é a região mais urbanizada do mundo em desenvolvimento. O percentual de população que vive em cidades latino-americanas, atualmente no patamar de 81%, deverá crescer mais ainda, o que é preocupante. O referido estudo aponta que até 2030, deverá chegar a 86%. Este vertiginoso crescimento acaba por gerar efeitos econômicos, políticos, sociais e ambientais e por exigir o enfrentamento dos problemas consequentes. A pressão exercida pela expansão urbana, invariavelmente causa impacto na infraestrutura existente, com implicações para as edificações, transporte público, sistema viário, quanto aos serviços de abastecimento de água, drenagem urbana, coleta de resíduos e esgotamento sanitário. Nessa perspectiva a cidade de Curitiba apresenta, no estudo acima referenciado, alto desempenho, por naturalmente ter exercido a capacidade de enfrentar, de forma holística a temática do meio ambiente. Ainda segundo a pesquisa, na década de 1980, o plano urbano desta cidade buscou envolver iniciativas integradas visando tratar, sobretudo, temas relacionados à criação de áreas verdes, gestão de resíduos e saneamento básico, além de questões relacionadas aos transportes públicos, com repercussão, de forma positiva, na qualidade do ar. Este planejamento integrado permitiu um bom desempenho, da referida cidade, na área ambiental. 6 Trata-se do Índice de Cidades Verdes da América Latina, desenvolvido pelo Economist Intelligence Unit (EIU), patrocinado pela Siemens, que busca medir e avaliar o desempenho ambiental das 17 maiores cidades latino-americanas. Este estudo, para além de medir o desempenho ambiental em oito categorias (energia e CO2, uso do solo e prédios, transporte, resíduos sólidos, água, saneamento básico, qualidade do ar e governança ambiental) visa dar um peso igual a cada uma delas. O estudo, tem na perspectiva da criação desse índice, a avaliação de políticas públicas visando verificar o compromisso das cidades na redução de impactos ambientais. Tal estudo está disponível em: http://www.siemens.com/entry/cc/features/greencityindex_international/br/pt/pdf/report_lat am_pt_new.pdf. Acesso em: 07 de outubro de 2015. Espaços Livres de Uso Público na Cidade Contemporânea - 35 Entretanto, a capital paranaense conta hoje com a companhia de outras cidades em busca de um ambiente mais equilibrado, limpo e agradável.JUBÉ RIBEIRO (2010), ao promover o debate sobre a produção do espaço urbano a partir de duas vertentes, como as condições biofísicas do território e a sociedade, focaliza em Goiânia, por exemplo, uma cidade apoiada no planejamento, na leitura de uma paisagem referenciada nas questões ambientais, em projetos e nas pessoas em sua vivência cotidiana. Para a autora, na maioria das cidades latino-americanas verifica-se o desequilíbrio entre concentração humana e a capacidade de oferecer serviços minimamente adequados, gerando pressão indiscriminada sobre terras periféricas, sem planejamento, colocando em risco recursos naturais e paisagens, agravando os problemas ambientais. É a partir dos anos 2000, que ações estratégicas de infraestrutura verde vêm sendo promovidas. E, segundo a autora, trata-se de uma nova postura de projeto para o meio urbano frente aos problemas ambientais, objetivando o equilíbrio entre as condições biofísicas e a sociedade, tendo como foco os espaços abertos em escala regional. Em 2005, deparamo-nos no Rio de Janeiro com o 1º Seminário Nacional sobre Regeneração Ambiental das Cidades7. O referido seminário teve como tema principal as águas urbanas e teve, dentre muitos assuntos, as discussões em torno da temática das áreas verdes nas cidades, a proteção das margens de rios e o incentivo a projetos, pesquisas e estudos no âmbito dos corredores ecológicos. Já o 2º. Seminário sobre o mesmo tema, realizado na cidade de Londrina8, buscou, sobretudo, frente à troca 7 O I Seminário Nacional sobre Regeneração Ambiental de Cidades: Águas Urbanas, foi realizado na cidade do Rio de Janeiro em dezembro de 2005, no Fórum de Ciência e Cultura do campus Praia Vermelha da UFRJ. Teve como foco inicial a temática das Águas Urbanas tratada sob o viés dos Ambientes Urbanos que se apresentam às Margens de Corpos d’Água. Ver em: http://www.vitruvius.com.br/revistas/read/arquitextos/06.068/386. Acesso em 20 de maio de 2015. 8 II Seminário Nacional sobre Regeneração Ambiental de Cidades: Águas Urbanas II, realizado na cidade de Londrina, Paraná, em 2007. Disponível em: 36 de experiências, metodologias e procedimentos, direcionar seus resultados à qualificação de ambientes urbanos, com ênfase em processos de regeneração e recuperação, com ênfase na temática das águas urbanas. O III Seminário Nacional sobre o Tratamento de Áreas de Preservação Permanente em Meio Urbano e Restrições Ambientais ao Parcelamento do Solo, ocorrido em 2014, conhecido como APPURBANA9 pretendeu discutir, em um contexto nacional, iniciativas de planejamento, intervenções e modalidades de gestão continuada sobre as áreas urbanas, à luz da sua dimensão ambiental. Também o 1º Fórum Latino-Americano de Infraestrutura Verde e Urbana10 buscou salientar que países desse eixo possuem muitas necessidades em comum, onde o desenvolvimento e o incentivo às tecnologias verdes devem estar associados às políticas públicas, sinalizando que a revolução sustentável deve se iniciar pelas cidades. Já Cidades Verdes, em um contexto nacional, podem ser fundamentadas no direito às cidades sustentáveis, apregoado pela Lei n 10.257, denominada de Estatuto da Cidade, de 10 de julho de 200111. Reforçado pela ideia sobre a necessidade de reconhecimento http://www.uel.br/eventos/aguasurbanas/ensalamento_todos.php. Acesso em 09 de outubro de 2016 9 O evento APPURBANA 2014, idealizado por entidades acadêmicas e profissionais de diversas regiões do país, teve como foco a dimensão ambiental da cidade. Destaque foi dado ao relacionamento de corpos d’água que atravessam as cidades, as massas vegetais e morros com o espaço urbano. Disponível em: http://www.observatoriodasmetropoles.net/index.php?option=com_k2&view=item&id=778:ap purbana-2014&Itemid=163&lang=pt. Acesso em: 10 de setembro de 2016. 10 Quanto ao evento 1º Fórum Latino-Americano de Infraestrutura Verde Urbana, realizado em São Paulo, por ocasião da realização da TeCobI Expo 2014, o mesmo teve na infraestrutura verde e potenciais ações no campo dos telhados seu tema central. Foi realizado pela Associação Tecnologia Verde Brasil (ATVerdeBrasil), em parceria com a Fundação Konrad Adenauer, entre outras, em maio de 2014. Disponível em: http://easyts.com/eventos-traducao/1o-forum-latino- americano-de-infraestrutura-verde-urbana-telhados-verdes-revolucao-sustentavel-das-cidades- comeca-por-eles/. Acesso em 03 de outubro de 2016. 11 Tal aspecto, conforme fica evidenciado, é tratado neste dispositivo legal no seu Capítulo I, Art. 2o – sobre a Política Urbana, que dentre suas diversas diretrizes, merece ser destacada a seguinte diretriz: “– garantia do direito a cidades sustentáveis, entendido como o direito à terra urbana, à moradia, ao saneamento ambiental, à infraestrutura urbana, ao transporte e aos serviços públicos, ao trabalho e ao lazer, para as presentes e futuras gerações”. Disponível em: Espaços Livres de Uso Público na Cidade Contemporânea - 37 do papel do planejamento e do desenho urbano no trato das questões ambientais, articuladas a aspectos socioeconômicos, culturais e de saúde, para benefício de todos12. Em um contexto internacional, tem entre seus objetivos reduzir o consumo doméstico de água, aumentar as áreas verdes, eliminar sacolas plásticas, melhorar o sistema de transporte e seus efeitos sobre as emissões de CO2 e de gases do efeito estufa. Mas dentre todos esses aspectos, o que pretendemos tratar neste artigo refere-se aos cuidados, em especial resultante da ocupação desordenada do espaço urbano sobre os cursos de água, assim como, a criação de corredores verdes com estreita relação com políticas públicas, práticas sociais e hábitos cotidianos. Atualmente, estudos, pesquisas e práticas recentes13 mobilizam interesses pautados nas mudanças ambientais e na dinâmica evolutiva. Discorrem também sobre as transformações vivenciadas pelos sistemas ambientais, ao longo dos últimos séculos, tendo também como foco a qualidade ambiental urbana como importante subsídio ao planejamento das cidades. http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/LEIS_2001/L10257.htm. Acesso em: 03 de outubro de 2016. 12 Aspectos tratados como “Metas de Sustentabilidade para Municípios Brasileiros (indicadores e referências), em um contexto do Programa Cidades Sustentáveis. http://www.cidadessustentaveis.org.br/downloads/publicacoes/publicacao-metas-de- sustentabilidade-municipios-brasileiros.pdf. Acesso em 04 de outubro de 2016 13 Sob esse viés podemos ressaltar os estudos de autores como FERREIRA, J. C.; MACHADO, J. R. no artigo “Infraestruturas verdes para um futuro urbano sustentável. O contributo da estrutura ecológica e dos corredores verdes”. Disponível em: http://www.revistas.usp.br/revistalabverde/article/viewFile/61279/64214. Acesso em 07 de maio de 2016; E também a contribuição de RIBEIRO FRANCO, M. A. no seu artigo “Infraestrutura Verde em São Paulo: o caso do Corredor Verde Ibirapuera-Villa Lobos”. Disponível em: http://www.revistas.usp.br/revistalabverde/article/viewFile/61284/64219. Acesso em 08 de maio de 2016; Assim como os estudos de MINAKI, C.. AMORIM, M.C.T., presente no artigo “Espaços Urbanos e Qualidade Ambiental – um enfoque da paisagem”, o qual integra a Revista Formação, nº14 volume, 2007; Além de apresentar também o projeto de “Requalificação Urbana e Ambiental da Bacia do Cobre”, conduzido pela empresa CONDER/Governo do Estado da Bahia. Ver em: http://www.abc.habitacao.org.br/wp- content/uploads/2012/10/SEDUR-BA-BACIA-DO-COBRE.pdf. Acesso em 28 de maio de 2016. 38 Com esse entendimento o presenteartigo objetiva gerar reflexões sobre questões associadas a rios urbanos e corredores verdes em faixas marginais num contexto de regiões periféricas, a partir do recorte espacial privilegiado no estudo. Também, sob a perspectiva de estabelecer diálogo entre os temas de requalificação ambiental urbana e infraestrutura verde, amparados pelas relações entre qualidade de vida e ambiente, pretende sensibilizar os leitores quanto à idealização e desenvolvimento de iniciativas no campo da recuperação de áreas degradadas, as quais valorizem a atividade paisagística, reveladas por seu caráter multifuncional. Tais ações, a nosso ver, podem ser consideradas como diretriz de sustentabilidade, articuladora de políticas públicas, de saneamento ambiental, educação e cultura, em um contexto de interdisciplinar visando o redesenho da paisagem a partir das dimensões ambiental, urbana, econômica, social e institucional. 2 MÉTODOS A proposta em desenvolvimento, decorrente de uma revisão bibliográfica, condicionada ao processo investigativo, apoia-se na exposição de contribuições de autores que abordam temas associados à requalificação ambiental urbana, assim como, a infraestrutura verde, na perspectiva das práticas nas cidades contemporâneas. Em um segundo momento, o trabalho passa a ser desenvolvido, sob o método da Ecologia da Paisagem14, por 14 Adotamos, no presente artigo, conceito de Ecologia da Paisagem trabalhado por METZGER (2010). A definição do autor revela-se como uma visão integradora de paisagem, com caráter de um mosaico heterogêneo, consubstanciado na sua formação por unidades interativas. Tal heterogeneidade, segundo o autor, pode se revelar, pelo menos a partir de um fator, que se evidencia segundo um observador e segundo uma determinada escala de observação. Isto é, centrada, por um lado, nas interações do homem com seu ambiente, e, por outro, preocupada em como a heterogeneidade se expressa espacialmente. Espaços Livres de Uso Público na Cidade Contemporânea - 39 entendermos que este favorece a identificação das interações entre os fatores no ecossistema de uma dada paisagem. Esse método de análise pretende, ao valorizar o trabalho empírico, identificar e classificar as áreas de estudo, quanto às unidades de paisagem, problemas e potencialidades, a partir de um recorte espacial e temporal a serem privilegiados no estudo. Com essa abordagem, compreendida por seu espectro amplo e flexível, que ressalta a importância da heterogeneidade no espaço e no tempo, além das múltiplas escalas a considerar, valores e atributos passam a ser considerados no entendimento dos processos ecológicos na atualidade. Desse método, deriva, segundo HERZOG & ROSA (2010) o conceito de infraestrutura verde15. Para as autoras trata-se de um conceito emergente baseado nos princípios da ecologia da paisagem, valorizando elementos como estrutura, função e mudança, conformando a paisagem como um mosaico. Por outro, MADUREIRA (2012), o delimita como um conceito agregador de outras abordagens16, com uma ampla trajetória e antecedentes. De certo, o designando não como um novo conceito e sim como uma nova visão sobre a questão ambiental e as áreas verdes nas cidades17. Essa abordagem, a nosso ver, propiciará, a partir do olhar do observador, análises em microescalas ou macro escalas. Desafios se colocam seja pelo viés da adaptação desse método ao contexto urbano, em especial às faixas marginais de rios, em um contexto de 15 Para as autoras a definição de infraestrutura verde caracteriza-se por intervenções de baixo impacto na paisagem e alto desempenho, com espaços multifuncionais e flexíveis. Tais aspectos, ainda segundo as autoras, ressaltam o exercício de diferentes funções ao longo do tempo, de preferência, adaptáveis às necessidades futuras, com expectativa de aplicação na escala local, capazes de serem monitoradas visando possíveis correções ao longo do tempo. 16 Tal abordagem, tratada pela autora, fica evidenciada em seu artigo denominado “Infraestrutura verde na paisagem urbana contemporânea: o desafio da conectividade e a oportunidade da multifuncionalidade”, que integra a Revista da Faculdade de Letras – Geografia – Universidade do Porto. III série, vol. I, 2012, pp. 33-43. Disponível em: http://ler.letras.up.pt/uploads/ficheiros/10555.pdf. Acesso em 10 de outubro de 2016. 17 BENEDICT, M.; MCMAHON, E. (2002). “Green Infrastructure: Smart Conservation for the 21st Century”. Renewable Resources Journal 20(3):12-17 40 regiões periféricas, seja ao considerar esse tratamento enquanto valor ecológico, capaz de agregar e articular as diferentes partes de um todo. 3 DISCUSSÃO E RESULTADOS Há algum tempo a incorporação da infraestrutura verde ao planejamento das cidades vem sendo enfrentada na ótica do bom desempenho dos serviços ambientais. E, nesse aspecto, investigações orientadas com o sentido de buscar oportunidades a partir do conhecimento e percepção da paisagem e do meio ambiente urbano vêm sendo conduzidas por práticas e pela produção científica. Para HERZOG (2011) há de se considerar a necessária adaptação das cidades às mudanças climáticas, para que as mesmas se tornem resilientes aos impactos que já estão ocorrendo em todo o planeta. Nessa perspectiva MASCARÓ (2013) apresenta a infraestrutura verde como um conjunto de redes multifuncionais de fragmentos permeáveis e vegetados. Tal conjunto deve se configurar a partir da utilização de arborização viária, da distribuição equilibrada de áreas verdes, com controle da impermeabilização do solo e drenagem pluvial. Emergindo de tal consideração o fato de parques arborizados poderem ser articulados a corredores ecológicos formados por ruas, largos e praças. Segundo HERZOG (2011), muitas cidades, regiões e países já estão vivenciando a experiência de trilhar caminhos inovadores. Para a autora, iniciativas de planejamento e implantação de projetos que consideram fatores abióticos, bióticos e antrópicos, em diversas escalas são fundamentais. Na sequência, a autora, ressalta que a infraestrutura verde já pode ser vista como uma realidade, como por exemplo, (Figura 01), o corredor verde na cidade de Freiburg, na Alemanha, exercendo múltiplas funções, como a ecológica em Espaços Livres de Uso Público na Cidade Contemporânea - 41 manter a mata ciliar e a qualidade das águas e a social em criar ciclovias e passeios como espaço de lazer, dentre outros benefícios, a partir de uma abordagem sistêmica, abrangente e transdisciplinar. No tocante as águas urbanas, uma preocupação do presente artigo diz respeito aos rios canalizados. Para HERZOG (2013) os rios que foram canalizados, em diversos países, estão sendo renaturalizados em face da impossibilidade de se controlar a natureza e suas forças, resultando na necessidade de conviver com elas. Figura 01 - Corredor verde multifuncional em Freiburgo (Alemanha) Fonte: Herzog; Rosa, 2010. Créditos: Cecília Herzog Para Barbosa & Nascimento Jr. (2009), a visão ecológica, muitas vezes, não leva em conta o enfoque sistêmico em que se concentram as interações entre os elementos, da dinâmica e integração dos componentes com o seu ambiente, pondo em risco a compreensão e esforço no entendimento da ecologia da paisagem urbana, precisando, no campo da cidade, ser redesenhada. 42 Outro aspecto muito valorizado nos estudos sobre a temática abordada é a interação das escalas, onde contribuições teóricas e conceituais apoiam-se nos campos da arquitetura da paisagem, da ecologia da paisagem, do planejamento e do desenho ambiental (GOUVEIA, 2008; McHARG, 1992; BERNÁLDEZ, 1981; RIBEIRO FRANCO, 1997; FORMAN;GODRON, 1986) apontam no sentido da sensibilização, percepção e compreensão do ambiente. Mas segundo Sandeville Jr. (2005), é a escala do lugar, que se revela, com base na ideia de uma paisagem, cuja experiência demonstra-se como socialmente construída. Para os autores, os estudos de campo devem ser valorizados, à medida que se apresentem associados a processos estruturais do espaço social. Isto é, na perspectiva de evidenciar a capacidade de percepção da realidade vivenciada. O que segundo os mesmo autores, pode se apresentar como a percepção de um ambiente poluído, por exemplo, que necessita fugir das ameaças da degradação, exigindo por esta razão soluções que podem reforçar a necessidade de assumir o tema e o problema como meta de projeto. No debate das cidades verdes e seu caráter multifuncional é necessário ressaltar a combinação entre as políticas, a educação pública e os projetos locais, que incorporam, desde funções naturais na infraestrutura existente, o aprimoramento e o fortalecimento de bacias hidrográficas, como também a criação de espaços livres atrativos para a vida social nos bairros urbanos, entre outros tantos aspectos. Das iniciativas brasileiras quanto às intervenções em cursos d’água, remonta ao início do século XX a regularização do Rio Tietê, pelo engenheiro sanitarista Francisco Rodrigues Saturnino de Brito. O projeto referenciado, segundo ROSA (2013), embora não tenha se tornado realidade, incluía desde lagos e canais, os quais dariam conta de escoar as águas, como também, a proposta de um parque linear configurando a ocupação das várzeas do rio. Espaços Livres de Uso Público na Cidade Contemporânea - 43 Figura 02 - Projeto da Comissão de melhoramentos do Rio Tietê. Fonte: Artigo denominado “Do outro lado do rio: retificações, canalizações e projetos abandonados dos rios de São Paulo”, por Giovanni Santa Rosa, http://gizmodo.uol.com.br/do- outro-lado-do-rio-segunda-parte/. Acesso em 10 de maio de 2015. No período mais recente, iniciativas em países europeus vêm se pautando por ações de recuperação de rios a partir da recriação de antigos canais e meandros e, pela revitalização de suas margens. Embora existam limites para essas ações, repercussões a partir destas visões tendem a obter significativa dimensão territorial destinada à agricultura, assim como, áreas direcionadas à urbanização visando minimizar os efeitos locais provocados pelas enchentes. No entanto, as experiências em curso vêm demonstrando ser fundamental conscientizar profissionais a respeito dos problemas e soluções ambientais, na perspectiva de um viés interdisciplinar. Soluções integradas, que incorporem a valorização ecológica vêm movendo grande parte dos empreendimentos atuais. Estas soluções apoiam-se, geralmente, na revitalização de rios, visando aumentar não só a capacidade de recuperação ecológica, mas 44 também a atratividade que tais elementos da paisagem exercem junto às atividades de recreação e lazer. Esse olhar, no entanto, não caracteriza a determinação pela volta a uma paisagem genuína e original, não tocada pelo homem, mas direciona a repercussão das ações aos compromissos com o desenvolvimento sustentável dos rios e da paisagem, na perspectiva de atendimento das necessidades e conhecimentos contemporâneos. No Brasil, a trajetória para recuperar a qualidade ambiental dos cursos de água urbanos envolve, sobretudo, a associação de políticas urbanas e investimentos. Segundo Moretti (2000), “renaturalização ou revitalização”, não seria somente o processo de trazer de volta as condições mais naturais e originais possíveis, dos rios, mas também a necessidade de promover a integração de distintos setores da administração pública que precisam atuar de forma integrada no enfrentamento dos problemas relacionados. Os resultados no âmbito da área de estudo e as discussões sobre a temática que envolve o presente artigo, nos instiga no sentido de valorizar a investigação em curso. Essa investigação é tratada no âmbito da cidade do Rio de Janeiro, tendo em especial sua zona oeste, como recorte espacial. A cidade cresceu e se desenvolveu a base de projetos e planos de embelezamento e melhoramento da região central com descaso para os bairros suburbanos. Todavia, podemos observar que o projeto ferroviário foi o que permitiu o deslocamento da população das zonas periféricas do município e sua integração com o centro da cidade, propiciando o crescimento dos bairros mais afastados. Os bairros da Zona Oeste começaram a ser povoados com a finalização do ramal ferroviário Santa Cruz no final do século XIX. Mas o incremento populacional veio associado ao prolongamento da Avenida Brasil até o bairro Bangu, no final da década de 1950. Posteriormente, na década de 1990, com a construção do projeto da Linha Amarela - via expressa que liga a região da Zona Norte do Espaços Livres de Uso Público na Cidade Contemporânea - 45 município com a Barra da Tijuca, a tendência demográfica foi de crescimento18. Este crescimento teve como resultado recente, obras realizadas para os jogos Pan Americanos e atualmente para os jogos Olímpicos, implicando em momento de grande especulação imobiliária. Mas a região em que se insere o recorte espacial de estudo se refere à área de planejamento AP519, do Plano Diretor (Figura 03). Figura 03 - Área de Estudo – Áreas de Proteção Fonte: Elaboração própria a partir de imagem na plataforma google 18 Segundo dados do IBGE, a região da Zona Oeste do Rio revela uma taxa de crescimento de 150% do seu contingente populacional no período dos anos 2000 a 2010. Ainda segundo esta mesma base de informação, dos dez bairros cariocas mais populosos em 2010, sete ficam na zona oeste, como Campo Grande (328,3 mil), Bangu (243,1 mil), Santa Cruz (217,3 mil), Realengo (180,1 mil), Jacarepaguá (157,3 mil), Barra da Tijuca (135,9mil) e Guaratiba (110 mil). Ver em: http://g1.globo.com/brasil/noticia/2011/07/ibge-bairros-na-zona-oeste-do-rio- crescem-ate-150.html. Acesso em 27 de maio de 2016. 19 De acordo com Plano Diretor de Desenvolvimento Urbano Sustentável do Rio de Janeiro, aprovado pela Lei complementar Nº 111 de 2011, a Área de Planejamento denominada AP5, na cidade do Rio de Janeiro, é composta por cinco Regiões Administrativas, como Bangu (RA XVII), Realengo (RA XXXIII), Campo Grande (RA XXVIII), Guaratiba (RA XXVI) e Santa Cruz (RA XIX). Disponível em: http://www.rio.rj.gov.br/dlstatic/10112/3372233/DLFE- 262093.pdf/LEICOMPLEMENTARN1.1.1.DE0.1.DEDEZEMBRODE2.0.1.1..pdf. Acesso em : 24 de maio de 2016. 46 Cercada pelos Maciços da Pedra Branca - Parque Estadual Maciço da Pedra Branca e do Mendanha - Parque Natural Municipal do Mendanha, é uma área que também compreende grande parte da bacia hidrográfica do Rio Guandu, região RJ1 no Comitê Guandu de Bacias Hidrográficas do Rio de Janeiro. Onde se verifica um híbrido de áreas verdes e de vegetação mais densa e selvagem, culminando em um ambiente de natureza preservada. Se por um lado podemos ressaltar as características físicas e a hidrologia da região. Por outro, a existência de grande quantidade de rios, a maioria já canalizados ou modificados em valões a céu aberto (Figura04), convive com a presença de lixo e esgoto nas águas urbanas. Nesse aspecto HERZOG (2009), a partir de experiência na região, em especial no bairro de Guaratiba, ressalta a valorização da relação da população local com a paisagem, no sentido de evitar a degradação dos ecossistemas naturais. Figura 04 - Rio em Campo Grande, Estrada do Campinho Fonte: Google. Google Street View Imagem 2014.Acesso em 22 de maio 2015. Espaços Livres de Uso Público na Cidade Contemporânea - 47 No âmbito de um quadro legal/institucional vale observar que na legislação