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A VISÃO DA BRUCELOSE BOVINA COMO ANTROPOZOONOSE ARTIGO CIENTÍFICO AMANDA FERNANDES LUCKE CLEBISON PEDRONESI Brucelose é uma antropozoonose, (doença que se transmite dos animais ao homem e não entre os homens) de distribuição mundial, causada por bactérias da espécie Brucella sp. que infectam animais como suínos, caprinos, bovinos e cães, e dessa forma, direta ou indiretamente, os homens. A doença é evitável através de rastreio de rotina e vacinação dos animais. A partir do estudo, constatou-se que a atenção dos sistemas de saúde está voltada para os impactos econômicos e acaba sendo negligenciada como zoonose, sem o conhecimento das causas e sintomas em humanos. Dessa forma deve- se conscientizar e esclarecer os grupos de risco e as formas de infecção para o homem, como forma de prevenção. Palavras-chave: Brucelose; aborto; bovinos. Brucellosis is an anthropozoonosis (a disease that is transmitted from animals to humans and not between humans) with worldwide distribution, caused by bacteria of the species Brucella sp. that infect animals such as pigs, goats, cattle and dogs, and thus, directly or indirectly, men. The disease is preventable through routine screening and vaccination of animals. From the study, it was found that the attention of health systems is focused on economic impacts and ends up being neglected as a zoonosis, without knowledge of the causes and symptoms in humans. Therefore, awareness should be raised and the risk groups and forms of infection for humans should be clarified, as a form of prevention. Keywords: Brucellosis; abortion; cattle. INTRODUÇÃO A brucelose é uma antropozoonose, isto é, uma doença que se transmite dos animais ao homem e não entre os homens, de distribuição mundial, sendo causada por bactérias intracelulares Gram-negativa pertencentes ao gênero Brucella spp, que infectam o sistema mononuclear fagocitário. A importância da brucelose animal varia de um país a outro, dependendo da população animal exposta, da espécie de Brucella envolvida e das medidas tomadas para combatê-las. O grupo com risco de contaminação pela Brucella é composto por veterinários, tratadores e laboratoristas, justamente pelo fato de terem contato direto com os animais infectados (LORENZAO, 2009). Este é o primeiro grupo a ser conscientizado da importância dos cuidados sanitários e dos danos econômicos desta enfermidade, como: restrições comerciais, surtos de aborto, distúrbios reprodutivos, queda na produção leiteira, aumento na taxa de reposição de animais (30%), morte de bezerros e aumento do intervalo entre partos (20 meses). É estimado que a brucelose cause perdas de 20- 25% na produção leiteira, devido aos abortos e aos problemas de fertilidade (BEVILACQUA, 2008). Os prejuízos diretos oriundos da brucelose são descritos principalmente por abortos, baixos índices reprodutivos, aumento do intervalo entre partos, morte de bezerros, queda da produção de leite (10 a 25%) e da conversão alimentar (10 a 15%), interrupção de linhagens genéticas, depreciação dos produtos no mercado e desvalorização da pecuária (PAULIN, 2003; TENÓRIO et al., 2008; CARDOSO, et al., 2012). No Brasil, em 2013, essa perda superou os 800 milhões de reais (SANTOS et al., 2013). Dentre as zoonoses que afetam o homem, a brucelose é uma das mais disseminadas, sendo que acarreta grandes problemas para saúde pública e economia se não for controlada, tendo uma ocorrência mundial, tem sido uma doença em permanente evolução desde sua identificação em 1887 (PESEGUEIRO, 2003). No Brasil, são raros os estudos bem planejados e de grande abrangência sobre a situação da brucelose bovina. O último estudo nacional, que envolveu 19 estados, foi realizado em 1975. Depois disso, apenas cinco estados realizaram trabalhos que envolveram todo o seu território, com uso de diferentes metodologias. Portanto, a situação epidemiológica da brucelose bovina no Brasil não é adequadamente conhecida (POESTER, et al., 2009). No início de 2001, o Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento (MAPA) instituiu o PNCEBT que normatiza as estratégias e ações para o controle de brucelose e tuberculose no país, no intuito de criar propriedades livres e propriedades monitoradas para ambas as doenças. Informações mais aprofundadas sobre tuberculose bovina no país estão contidas em revisões recentes sobre o tema. A partir da implantação e divulgação do PNCEBT os focos e os casos de brucelose aumentaram nos primeiros anos, evidenciando a atuação do serviço de defesa sanitária com relação ao diagnóstico da enfermidade, que provavelmente estariam subestimados nos anos anteriores, assim como uma maior preocupação por parte dos proprietários quanto a sanidade dos seus rebanhos, acarretando o aumento da notificação da doença no início do programa (GUIMARÃES, 2011). Do ponto de vista da Saúde Pública deve ser considerada não só como causa de enfermidade, de incapacidade para o trabalho e de diminuição do rendimento, mas também como fator nocivo para a produção de alimentos, principalmente de proteínas de origem animal que são indispensáveis para a saúde e bem-estar. Este trabalho tem como objetivo descrever e conscientizar sobre a importância do conhecimento dos meios de contaminação, assim como os grupos de risco, buscando proporcionar esclarecimento sobre a brucelose. AGENTE PATOGÊNICO A brucelose, também chamada de mal de Bang ou aborto infeccioso, é uma das doenças mais importantes nos bovinos, nos quais é quase sempre causada por Brucella abortus, que foi reconhecida pela primeira vez em 1897. Trata-se de microrganismo altamente infeccioso, uma bactéria, que normalmente entra no corpo por meio de: ingestão de comida, água e leite contaminado com descargas uterinas, urina ou fezes de um animal infectado; pele lesada ou não lesada ou sêmen de touro infectado. As Brucellas são pequenos bastonetes, chamados de cocobactérias Gram- negativos, aeróbias ou microaerófilas, não capsuladas e não formadoras de esporos, são aeróbias e carboxifílicas, catalase e urease positivas e não produzem ácidos de carboidratos em meio convencional com peptona. Resistem bem à inativação no meio ambiente. Se as condições de pH, temperatura e luz são favoráveis, elas resistem vários meses na água, fetos, restos de placenta, fezes, lã, feno, materiais e vestimentas e, também, em locais secos (pó, solo) e a baixas temperaturas. No leite e produtos lácteos sua sobrevivência depende da quantidade de água, temperatura, pH e presença de outros microorganismos. Quando em baixa concentração, as Brucellas são facilmente destruídas pelo calor (LAGE, 2008). A maioria dos desinfetantes (formol, hipoclorito, fenol, xileno) são ativos contra as Brucellas em soluções aquosas, já os desinfetantes amoniacais não apresentam uma boa atividade para desinfecção. Os raios ultravioletas e ionizantes também destroem essas bactérias (BEVILACQUA, 2008). Os microorganismos deste gênero eram considerados incapazes de se locomover, mas, recentemente a presença de flagelo e de um gene codificador de flagelo foram demonstrados nas espécies (MEGID e MATHIAS, 2016). Estas bactérias podem ser divididas em dois grupos antigenicamente distintos, denominadas lisas ou rugosas, com base nas características de multiplicação em meios de cultura no cultivo primário e na constituição química do lipopolissacarídeo (LPS) de superfície da parede celular, principal antígeno responsável pela indução de anticorpos e virulência de superfície. As colônias lisas possuem como constituinte do LPS, o lipídeo A, o núcleo oligossacarídeo e na porção hidrofílica a cadeia O, sendo por este motivo extremamente virulentas. As colônias rugosas diferem da anterior pela cadeia O ser ausente ou reduzida a poucos resíduos. As espécies B. canis e B. ovis apresentam morfologia de colônia predominantementedo tipo rugosa enquanto que as demais normalmente apresentam morfologia de colônia lisa e quando sofrem mutações para formas rugosas, deixam de ser patogênicas (PAULIN, 2003; SOLA et al., 2014; MEGID e MATHIAS, 2016). Outros antígenos externos, internos e citoplasmáticos, como as proteínas ribossômicas L7 e L12, são reconhecidos pelo sistema imune durante a infecção, ocasionando hipersensibilidade tardia, mas com resposta indutora inferior a encontrada contra o LPS (MEGID e MATHIAS, 2016). A brucelose humana pode ser causada por quatro espécies, sendo elas: Brucella abortus, B. melitensis, B. suis e B. canis. Segundo o Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento (MAPA), a brucelose causada pela Brucella melitensis é considerada a mais virulenta para o homem, entretanto no Brasil esta espécie é exótica (PESSEGUEIRO et al., 2003; BRASIL, 2006; GOMES, 2013). Bovinos e bubalinos são suscetíveis à B. suis e B. melitensis, quando estes estão em contato com suínos, caprinos ou ovinos, mas a espécie que possui a maior distribuição territorial e importância é a B. abortus, responsável pela grande maioria das infecções, sendo este o agente etiológico da brucelose bovina (QUINN et al., 2005; TENÓRIO et al., 2008; MESQUITA FILHO, 2013). As Brucellas spp. não são hospedeiro-específicas e várias espécies domésticas ou silvestres são suscetíveis à infecção por B. abortus, entretanto, são consideradas como hospedeiros finais da infecção, pois não transmitem o agente novamente aos bovinos. Entre as espécies acidentais que possuem importância epidemiológica, podemos citar: a equina, que podem apresentar lesões articulares, principalmente em região de cernelha; a canina, que por carrearem produtos de aborto de um local para outro podem disseminar a doença, além das fêmeas sofrerem aborto pela infecção; e outras como a suína, ovina e caprina (POESTER et al., 2002; BARBOSA, 2009). Apesar de permanecerem por longos períodos em materiais como esterco, água, fetos abortados, solo, carne, leite e produtos lácteos, chegando a se manterem viáveis por seis meses ou mais em alguns destes, as Brucella spp. não se multiplicam nestes ambientes, e são sensíveis a determinados fatores, o que faz com que sua resistência seja variável de acordo com a natureza do substrato, temperatura, luz solar direta, pH, número de organismos presentes, umidade e presença de outros microrganismos contaminantes. Quanto maior a temperatura, exposição solar, menor umidade e pH (4 – 3,5), menos tempo este tipo de microrganismo sobrevive. Desinfetantes como cal hidratada, cloro, soda cáustica, amônia quaternária, formol e fenol, com tempo mínimo de uma hora e em concentrações ideais, podem ser utilizados na desinfecção de instalações, utensílios e ambiente. Geralmente, a remoção dos animais infectados, a limpeza e a desinfecção de locais contaminados (eliminar toda matéria orgânica antes da aplicação dos produtos é essencial para que atinjam sua total eficácia) e o vazio sanitário de no mínimo dois meses são suficientes para evitar a sua transmissão. Submetida à ação de desinfetantes como produtos clorados (2,5% de cloro ativo), soluções de formaldeídos a 2% em temperatura ambiente acima de 15º C ou compostos fenólicos a 2,5%, a brucela é eliminada no prazo máximo de 15 minutos. Álcool 70º destrói prontamente a bactéria. Sob a ação do carbonato de cálcio (1:10), é destruída em 30 minutos. As brucelas entram no organismo hospedeiro pelas mucosas do trato digestivo, genital ou nasal, conjuntiva ocular ou por soluções de continuidade da pele. A principal porta de entrada para os bovinos é a mucosa orofaringeana (BISHOP et al., 1994). Em seguida, são fagocitadas principalmente pelos macrófagos e carreadas até os linfonodos regionais (como pode ser observado na Figura 1), onde se multiplicam e podem permanecer por semanas a meses (BATHKE, 1988; BISHOP et al., 1994). Após esta multiplicação inicial, ganham a corrente sangüínea por meio do duto torácico, dentro dos macrófagos ou livres no plasma. Vários períodos de bacteremia podem ocorrer. A partir da circulação, difundem-se para os tecidos do hospedeiro, colonizando principalmente órgãos ricos em células do sistema mononuclear fagocitário, quais sejam, baço, fígado e linfonodos (principalmente os supra mamários), onde podem acarretar alterações inflamatórias e anátomopatológicas caracterizadas por granulomas difusos levando à esplenomegalia, hepatomegalia e, às vezes, hiperplasia linfoide. Os órgãos de predileção são aqueles em que há maior disponibilidade de elementos necessários para seu metabolismo, como o eritritol (álcool polihídrico de quatro carbonos), que está presente no útero gravídico, tecidos mamários e ósteo articulares e órgãos do sistema reprodutor masculino. A partir do quinto mês de gestação, a concentração do eritritol eleva-se atingindo níveis máximos próximo ao parto, estimulando a multiplicação da bactéria de forma crescente. Na fêmea, a infecção deixa de ser latente geralmente no terço final da gestação, quando o tecido córion- alantoideano está bem desenvolvido e há disponibilidade dos metabólitos. Neste período, a multiplicação da brucela é intensa e as endotoxinas liberadas após sua destruição geram lesões na placenta, principalmente, no tecido córion alantoideano, levando a processo inflamatório dos tecidos e órgãos, causando placentite necrótica dos cotilédones, resultando no seu descolamento pela lise das suas vilosidades. Essas lesões comprometem a circulação materno-fetal, prejudicando sua respiração e alimentação, podendo levá-lo à morte. Nos casos agudos da doença, quanto maior a necrose, maior a chance de ocorrer abortamento, único sintoma aparente na maioria das infecções brucélicas. Por outro lado, quanto menos intensa a necrose maior será a deposição de fibrina e mais tardio o abortamento. Nesse caso, pode ocorrer a retenção de placenta, ou a gestação vir a termo, porém gerando produtos fracos que poderão morrer em alguns dias. O quadro pode evoluir para metrite ou endometrite crônica e consequente subfertilidade, infertilidade ou esterilidade com ou sem presença de corrimento vaginal. PREVENÇÃO Para a brucelose bovina, as estratégias de combate podem ser resumidas em vacinação, certificação de propriedades livres por rotinas de testes indiretos, controle da movimentação de animais e sistema de vigilância específico. Os resultados alcançados pelos países, segundo os programas de controle, variam muito, pois há registros de sucessos e fracassos citados na literatura especializada (POESTER et al., 2009). Ainda segundo Lage (2008) uma das mais poderosas estratégias na estruturação de um programa de controle de brucelose bovina é a vacinação, principalmente a vacinação de fêmeas jovens (3 a 8 meses) com B19. Esta vacinação de animais jovens associada à vacinação estratégica com RB51 em fêmeas com idade superior a oito meses acarreta um aumento da cobertura vacinal, de tal forma que diminui a percentagem de indivíduos susceptíveis da população, diminui a taxa de abortos e, consequentemente, diminui a taxa de infecção. O segundo ponto no controle da doença é a eliminação do rebanho de animais positivos aos testes diagnósticos o mais rápido possível para se evitar que permaneçam como fontes de infecção para os animais susceptíveis. É de grande importância que estes animais sejam separados do rebanho logo após o diagnóstico, evitando-se que eles abortem ou venham a parir junto aos animais negativos. Associadas a estas duas estratégias, a aquisição criteriosa de animais, sempre com exames negativos para brucelose, é uma medida que deve ser adotada para se evitar a entrada de animais infectados na propriedade (LAGE, 2008). MEIOS DE TRANSMISSÃO Embora a brucelose humana chame atenção dos sistemas de saúde em todo o mundo por ser uma doença que apresenta importantesimpactos, desde o ponto de vista ocupacional, problemas sanitários e até prejuízos econômicos, ela ainda é pouco conhecida, de difícil diagnóstico, subnotificada e negligenciada. É um problema de distribuição mundial principalmente em países com baixo investimento na pecuária de leite e carne. Sua incidência causa barreiras sanitárias de exportação de produtos de origem animal (PACHECO, 2008). Os meios de contaminação mais frequentes para o homem são: produtos alimentícios preparados do leite cru de animais infectados; legumes crus contaminados por excrementos de animais infectados; vísceras, medula espinhal e gânglios linfáticos de carnes infectadas, nas quais a Brucella pode permanecer viável por mais de um mês após o abate, e mais tempo ainda se congeladas ou refrigeradas e água de cisternas e poços contaminados por excrementos de animais doentes. A transmissão de Brucella ao homem pela ingestão e/ou manipulação do leite/carne contaminado, e seus derivados, está bem comprovada, e sabe-se que as três espécies principais de Brucella (B. abortus; B. suis e B. melitensis) podem ser transmitidas pelo leite. A capacidade de sobrevivência da brucela em condições naturais é grande se comparada a de outras bactérias patogênicas não esporuladas, principalmente em ambiente úmido ao abrigo da luz solar direta, pH neutro e em ambiente contendo matéria orgânica. SINAIS CLÍNICOS A brucelose tanto pelo número e enfermos que causa, como pelas importantes perdas econômicas que provoca, constitui um grave motivo de preocupação, por ser uma doença de evolução crônica e de caráter granulomatoso típico, que acomete principalmente o sistema reprodutivo e ostearticular de animais domésticos, silvestres e seres humanos (PACHECO, 2008). Em função dos sintomas difusos da brucelose tanto em humanos como em animais, a suspeita clínica inclui sintomas como febre, mal-estar, sudorese, calafrios, fraqueza, cansaço, perda de peso, dores nas articulações, musculares, abdômen e nas costas, e deve ser confirmada por testes sorológicos e de preferência confirmados pelo isolamento e identificação do agente (MARQUES, 2008). Muitas vezes é tratado como outras doenças ou ‘febre de origem desconhecida’, por isso é de extrema importância realizar a investigação epidemiológica e sanitária, para avaliar uma possível vinculação e exposição no ambiente de trabalho do paciente, além do consumo de alimentos lácteos sem tratamento térmico adequado, como a pasteurização e a fervura (MINISTÉRIO DA SAÚDE, 2019). DIAGNÓSTICO O diagnóstico da brucelose bovina é realizado por meio de exames complementares. Entretanto, a associação dos sinais clínicos de cunho reprodutivo (aborto, infertilidade e perdas de bezerros) com os dados epidemiológicos, proporcionam uma indicação da provável presença da enfermidade no rebanho (LAGE et al., 2008). Os testes permitem o monitoramento tanto de propriedades como de regiões inteiras, além de vigiar zonas de onde a doença já foi erradicada. Todos os testes devem ser utilizados respeitando-se as normas técnicas estabelecidas pelos organismos internacionais, com antígenos padronizados e específicos para cada prova. O Programa Nacional de Controle e Erradicação da Brucelose e Tuberculose (PNCEBT) no Brasil, em 10 de janeiro de 2001, preconiza o TAAT (Teste do antígeno acidificado tamponado ) como prova de triagem e, como provas confirmatórias, o 2-ME (Teste do Mercaptoetanol ) e a RFC' (Reação de fixação do complemento). Segue descrição dos principais testes indiretos para o diagnóstico da brucelose bovina são: Teste do antígeno acidificado tamponado (TAAT) O TAAT é uma prova qualitativa rápida, prática e de boa sensibilidade, (ORGANIZACIÓN MUNDIAL DE LA SALUD, 1986). Foi desenvolvido a partir da observação de que a IgG1 bovina é menos ativa em pH 7, mudando de comportamento com a acidificação do meio. Como se trata de um processo físico, é provável que nem todas as IgM tenham sua reatividade reduzida. Ao compararem diferentes provas sorológicas, constataram que o TAAT detectou o maior número de reatores positivos ao cultivo. O TAAT é considerado a melhor alternativa para o diagnóstico massal de rebanhos (ORGANIZACIÓN INTERNACIONAL DE LA SALUD, 2002) Teste do Mercaptoetanol (2-ME) O teste do Mercaptoetanol tem sua especificidade aumentada por inibição da atividade aglutinante da IgM mediante processo químico, que consiste no tratamento do soro com a droga 2-mercaptoetanol. A droga degrada a IgM em cinco sub unidades monoméricas semelhantes não aglutinantes, por redução branda das pontes dissulfídicas desestabilizando o polímero ao degradá-lo em sub unidades que conservam suas características de antigenicidade, mas deixam de compor o anticorpo plurivalente (IgM) e não passam a se comportar como anticorpos univalentes. Ainda que as sub unidades estejam integradas por suas cadeias pesadas e leves, ao combinarem-se com o antígeno não originam complexos suficientemente grandes para provocarem o fenômeno da aglutinação, provavelmente devido a algum impedimento estérico em conseqüência de sua nova conformação espacial. Reação de fixação do complemento (RFC') A RFC' é considerada a melhor prova para a confirmação da brucelose pelo sorodiagnóstico, mostrando a melhor correlação com os isolamentos em animais natural ou experimentalmente infectados. Porém, trata-se de uma prova mais laboriosa e mais cara que as de aglutinação, por isso recomenda-se seu uso como confirmatória para os soros positivos à triagem. A variação da técnica a quente é mais prática, diminui as reações anticomplementares e elimina a IgM, aumentando a especificidade do teste. A RFC' a quente tem sido usada como prova confirmatória em programas de controle e erradicação de muitos países. A técnica detecta precocemente IgG1 no soro, em torno do 14º dia e também é capaz de revelar casos crônicos, onde a IgM já desapareceu e os níveis de IgG1 são baixos, devido ao seu baixo limiar de detecção. Para os resultados da RFC' sejam comparáveis é necessária a adoção de um padrão internacional único. Muitos países possuem um padrão nacional e, na Comunidade Européia, o teste é padronizado pelo Laboratório Central de Veterinária em Weybridge, Reino Unido (MINISTRY OF AGRICULTURE, FISHERIES AND FOOD, 1991). O Código Zoosanitánio Internacional da OIE refere a RFC’ como um importante suporte técnico e exigência do mercado externo e a recomenda como prova confirmatória, triada pela TAAT (ORGANIZACIÓN INTERNACIONAL DE EPIZOOTIES, 2002). Prova do anel em leite (PAL) Revela anticorpos preferencialmente da classe IgA, presentes no leite e aderidos às moléculas de gordura pela sua fração Fc. Geralmente é utilizada em amostras compostas em média por leite de 15 animais e deve ser realizada de três a quatro vezes ao ano, com a finalidade de triar rebanhos infectados a partir das plataformas de usinas de beneficiamento de leite (ORGANIZACIÓN MUNDIAL DE LA SALUD, 1986). A prova é prática, rápida, barata e de alta sensibilidade. Tem grande valor em investigações epidemiológicas como teste presuntivo para a identificação de rebanhos potencialmente infectados em áreas problema. Também é empregado na vigilância epidemiológica para controlar sistematicamente áreas livres. Quando o anticorpo interage com o antígeno corado (hematoxilina ou tetrazólio), forma- se a malha de aglutinação que flutua, junto com a gordura, para a superfície da amostra, revelando o anel colorido. Sêmen plasma aglutinação (SPA) Trata-se o sêmen com azida sódica 1%, centrifugase e retira-se o seu plasma, que será submetido às provas usuais: TAAT, RFC' ou 2-ME. Se o teste for positivo há fortes indícios da doença. Como se trata de prova individual, a possibilidade de reação falso negativa não deve ser afastada. Por isso, o ideal seria utilizá-la junto com o sorodiagnósticoconvencional. Testes imunoenzimáticos (ELISA) Os testes imunoenzimáticos que têm apresentado melhores resultados para brucelose são os ELISA indiretos e competitivos. São muito utilizados na Europa e América do Norte. Possuem boa especificidade e sensibilidade com a vantagem de não ocorrer o fenômeno de zona como ocorre na RFC'. Uma das limitações do ELISA é que requer um laboratório equipado e pessoal treinado para a sua execução. Devido as suas vantagens, alguns países já estão empregando o IELISA e o CELISA nas rotinas sorológicas, em substituição à tradicional combinação do TAAT para triagem e RFC' para confirmação. O IELISA apresenta como vantagens altas sensibilidade e especificidade e a possibilidade de automatização total do processo. Os problemas estão no investimento inicial e na impossibilidade, tal e qual os demais testes, de se distinguir animais vacinados dos infectados, além do tempo para sua realização ser relativamente maior que o TAAT. Porém, em processo automatizado, é possível realizar uma média de 1.000 soros por dia. O CELISA também apresenta altas especificidade e sensibilidade no diagnóstico da brucelose bovina e é tecnicamente menos trabalhoso, além de poder diferenciar animais vacinados dos naturalmente infectados. Além disso, um mesmo conjugado pode ser utilizado para testar soros de diversas espécies animais. Os custos para a realização do ELISA competitivo ou indireto são similares, porém superiores aos do TAAT e, inicialmente, semelhantes aos da RFC' e aos do Teste da polarização da fluorescênci a - FPA. CONCLUSÃO Com a realização desta revisão foi possível concluir que a brucelose bovina é uma doença zoonótica de grande importância no âmbito da Medicina Veterinária e de saúde pública. Acomete bovinos de todas as idades e raças, não tendo tratamento indicado, portanto de notificação obrigatória e abate sanitário dos animais acometidos, com isso podemos compreender importância da vacinação como medida de prevenção correta para maior controle da enfermidade e estabelecimento de propriedades livres. Sob o ponto de vista da saúde pública, podemos concluir que deve haver esclarecimentos dos meios de contaminação para humanos, o que auxiliaria no diagnóstico. E que há a necessidade de medidas que reduzam o risco de infecção, assim como medidas de proteção nas diferentes atividades profissionais (proteção individual ao manipular fetos, produtos de abortos, vacinas vivas) e associadas à higiene alimentar (pasteurização de produtos lácteos). Além disso, o Sistema Único de Saúde (SUS) disponibiliza o tratamento gratuito da brucelose humana aos estados e seus municípios. Os medicamentos da terapia antibacteriana poderão ser receitados após avaliação médica e confirmação do diagnóstico por exames laboratoriais. REFERÊNCIAS AIRES, D. M.; COELHO,K.O.;NETO,O.J.; Brucelose bovina: aspectos gerais e contexo nos programas oficiais de controle. Revista Cientifica de Medicina Veterinária. Janeiro de 2018. BEVILACQUA, M. R. Brucelose em Bovinos. (Monografia). Especialização em Defesa e Vigilância Sanitária. Campo Grande-MS: Universidade Castelo Branco 2008. 28p. BRASIL. Brucelose humana: causas, sintomas, tratamento, diagnóstico e prevenção. Ministério da saúde, 2021. Disponível em https://www.gov.br/saude/pt- br/assuntos/saude-de-a-a-z/b/brucelose-humana. Acesso em 09/10/2024. CARTER, G. R. Fundamentos de bacteriologia e micologia veterinária. São Paulo: Roca, 1988. FREITAS, F.A.D.; CAVALCANTI, M.L.; MARQUES, A.S.C.; MESQUITA, F.P.N.; AMORIM, A.S.; LEITE, A.I. Prevalência de brucelose em bovinos na região do Potengi, estado do Rio Grande do Norte. 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