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Capítulo 10 AULA E MEDIAÇÃO PEDAGÓGICA A justificativa de um capítulo para se refletir sobre a mediação pedagó- gica do docente em um livro que trata da aula no ensino superior se justifica pela consideração de que técnicas e estratégias são instrumentos para incentivar o processo de aprendizagem e, como tais, dependem muito do su- jeito que as usa e emprega, de sua concepção de aprendizagem e da percepção de seu papel nesse processo. Nós entendemos que o papel do professor em uma aula é de mediação peda- gógica e, da forma como ele desempenhar este papel de mediador, o emprego de técnicas pode ter maior ou menor sucesso para a aprendizagem dos alunos. Mas, o que podemos entender como mediação pedagógica em uma aula? Por mediação pedagógica entendemos a atitude, o comportamento do professor que se coloca como um facilitador e incentivador ou motivador da aprendizagem, que se apresenta com a disposição de ser uma ponte entre o aprendiz e sua aprendizagem. É o professor entendido como profissional da educação capaz de organizar situações de aprendizagem, de fazer a gestão das condições de aprendizagem e das relações entre o grupo de aprendizes. A interação professor-aluno, tanto individualmente quanto em grupo, se destaca como fundamental no processo de aprendizagem e se manifesta na atitude de mediação pedagógica por parte do professor, na atitude de parceria e corresponsabilidade pelo processo de aprendizagem entre aluno e professor e na aceitação de uma relação entre adultos assumida por ambos.176 PROFESSOR NA HORA DA VERDADE Capítulo 10 Aula e mediação pedagógica 177 Pérez e Castillo (1999), assim se ex- objetivos; dá também um novo colorido ao papel do professor e aos novos mate- pressam: "A mediação pedagógica riais e elementos com que ele deverá trabalhar para crescer e se desenvolver. coloca em evidência o pa- A atitude de parceria e corresponsabilidade entre professor e aluno visando A mediação pedagógica busca abrir um pel de sujeito do aprendiz caminho a novas relações do estudante: desenvolver o processo de aprendizagem se estabelece e se fortifica mediante e o fortalece como ator de com os materiais, com o próprio contex- atividades que lhe permi- atitudes e comportamentos que os colocam juntos, lado a lado trabalhando to, com outros textos, com seus compa- tirão aprender e alcançar pelos mesmos objetivos, como equipe de trabalho. de aprendizagem, incluído o pro- seus objetivos." A atitude de parceria e corresponsabilidade se inicia com um pacto entre fessor, consigo mesmo e com seu futuro. alunos e professor para juntos buscarem aprendizagem (desenvolvimento pes- (PÉREZ; CASTILLO, 1999, p. 10). soal e profissional, como já vimos). São características da mediação pedagógica: E para que haja um compromisso, o primeiro passo é abrir uma discussão dialogar permanentemente de acordo com o que acontece no momento; sobre a razão de nos encontrarmos naquela situação de professores e alunos e trocar experiências; o que vamos juntos buscar. Dialogar sobre a situação de sermos um grupo e, debater dúvidas, questões ou problemas; como tal, termos de nos conhecer (quem somos, o que fazemos ali...) e definir apresentar perguntas orientadoras; alguns interesses comuns que nos una. auxiliar nas carências e dificuldades técnicas ou de conhecimento É o momento de envolver a classe na discussão de programação dos traba- quando o aprendiz não consegue se conduzir sozinho; lhos que se realizar. Ouvir as expectativas e as necessidades dos alunos garantir a dinâmica do processo de aprendizagem; quanto ao que poderiam aprender naquela disciplina, conhecer seus interesses. propor situações-problemas e desafios; Identificar a falta de motivação, demonstrar a relação da disciplina com outras desencadear e incentivar do curso e com a vida profissional. criar intercâmbio entre a aprendizagem e a sociedade real em que nos Responder às dúvidas e outras questões que os alunos possam ter, saber se encontramos, nos mais diferentes aspectos; já ouviram falar do conteúdo da disciplina, que tópicos conhecem e de qual colaborar para estabelecer conexões entre o conhecimento adquirido e fonte obtiveram essas informações, comentar como membro do grupo quais os novos conceitos, fazendo a ponte com outras situações análogas; os assuntos que precisam ser estudados naquela disciplina e por quê. colocar o aprendiz frente a frente com questões éticas, sociais, profis- É também o momento de organizar junto com a classe o conteúdo da dis- sionais, conflituosas; por vezes, colaborar para desenvolver crítica com relação à quantidade ciplina relacionando os vários tópicos com a realidade profissional dos alunos, e validade das informações obtidas; procurando trazer o dia a dia para a sala de aula, propiciando que os alunos rea- lizem ou levantem aplicações práticas do assunto, organizando-os por grandes cooperar para que o aprendiz use e comande as novas tecnologias para aprendizagem e não seja comandado por elas ou por quem as tenha temas que integrem o maior número de informações e permitindo assim que o programado; aluno desenvolva a aprendizagem de conhecimentos integrados. colaborar para que se aprenda a comunicar conhecimentos, seja por Pode-se também dialogar com os alunos sobre quais técnicas vamos utili- intermédio de meios convencionais, seja mediante novas tecnologias. zar nas aulas. Mostrar-lhes a importância de estarmos aproveitando o período A mediação pedagógica coloca em evidência o papel de sujeito do aprendiz de aulas para estudar, ler, debater, resolver casos, fazer exercícios, discutir casos e o fortalece como ator de atividades que lhe permitirão aprender e alcançar seus clínicos, participar de aulas expositivas etc.178 Capítulo 10 Aula e mediação pedagógica 179 PROFESSOR NA HORA DA VERDADE Ajudar os alunos a perceberem que o espaço de aula não é apenas para o também acontece conosco, professores. Mas a perseverança em continuar com professor falar e o aluno ouvir, mas um tempo de ambos trabalharem para que o processo é fundamental. a aprendizagem ocorra e, para tanto, será necessária uma preparação de leitura Espera-se, por parte do aluno, que ele estabeleça com o professor e com e estudo fora do período de aula. As aulas, então, serão desenvolvidas com téc- os colegas um pacto, um compromisso de se empenhar para levar à frente o nicas que motivem os alunos, diversificando a forma de aprender, incentivem plano de trabalho numa ação cooperativa, respondendo por sua parte tanto a participação, propiciem a integração do grupo, explorem a possibilidade da no momento em que realiza as atividades programadas como nos momentos interaprendizagem. em que deixa de cumprir o combinado, o que então o levará a discutir com o A revisão do processo de avaliação colabora eficazmente para uma atitude professor e com os colegas o modo de recuperar os conteúdos. de parceria e corresponsabilidade. Ela deve ser vista como uma contínua in- O que proponho é que a relação entre professor e aluno parta da conside- formação ao aluno e ao professor sobre o desempenho do primeiro, de modo ração de que ambos são capazes de assumir um processo de aprendizagem, que a saber se ele está aprendendo ou não, o que deverá ser feito caso esteja com o aluno está apto a trabalhar. dificuldades e como superá-las. Chegamos a um ponto crucial. O professor que se a ser um mediador pedagógico desenvolverá Fazer da avaliação um processo sem tensão, voltado mais para identificar o que o aluno aprendeu e motivá-lo a aprender o que ainda não foi capaz, é um algumas características: Voltar-se para a aprendizagem do aluno, assumindo que o aprendiz é meio de se solidificar a coparticipação. o centro deste em função dele e de seu desenvolvimento é Avaliar o desempenho do professor e a adequação do programa que se que precisaremos definir e planejar as está desenvolvendo é uma forma de se demonstrar que os vários elementos Esta concepção de aprendizagem há que ser vivida e praticada. Não de um processo de aprendizagem são corresponsáveis por ela, e não apenas os basta o professor apenas ter ouvido algumas conferências sobre o tema. alunos. Trata-se de uma ação contínua sua e de seus alunos, sabendo esperar, Desenvolver, por parte do professor e do aluno, uma relação entre adultos compartilhar, construir juntos. Entender e viver a aprendizagem como pode parecer algo utópico, uma vez que, na percepção de muitos professores, interaprendizagem. não existe por parte do aluno tal condição: ainda são jovens, quase adoles- Professor e aluno se constituem como célula básica do desenvolvi- centes, e como tais, um tanto irresponsáveis. Creio que este seja um grande mento da aprendizagem, por meio de uma ação conjunta ou de ações desafio, como consideramos em outro capítulo. conjuntas em direção à aprendizagem; de relações de empatia para se Não defendo que os alunos no ensino superior demonstram a mesma ma- colocar no lugar do outro, seja nos momentos de incertezas, dúvidas, turidade que nós, professores. Estou afirmando que o aluno do ensino supe- erros, seja nos momentos de avanço e de sucesso, vivenciando um cli- rior, desde seu primeiro ano de faculdade, é capaz de iniciar e desenvolver um ma de confiança no aprendiz. relacionamento adulto com seus professores, o qual se caracteriza por assumir Corresponsabilidade e parcerias são atitudes básicas, incluindo o pla- com responsabilidade o processo de aprendizagem. nejamento das atividades, sua realização e suas avaliações, conforme já É importante lembrar que o desenvolvimento de um comportamento adul- vimos. to sempre é um processo e, por conseguinte, contará com momentos e atitudes Consideração do aluno como um adulto, quando nos encontramos de maturidade e outros em que o aspecto adulto deixa a desejar, aliás, o que no ensino superior. Criar um clima de mútuo respeito para com todos180 o PROFESSOR NA HORA DA VERDADE Capítulo 10 Aula e mediação pedagógica 181 os participantes, dar ênfase em es- Subjetividade e individualidade. O professor que está atuando é um tratégias cooperativas de aprendi- "Incentivar a pesquisa en- ser humano, ou seja, é alguém possuidor de condições pessoais, sen- zagem, estabelecer uma atmosfera tre os alunos e ajudá-los a timentos, compromissos, momentos de indisposição para dialogar; é desenvolver uma metodolo- de mútua confiança, envolver os gia científica adequada será uma pessoa que, em decorrência da situação pela qual possa estar pas- aprendizes num planejamento em uma das grandes preocupa- sando, às vezes pode usar uma linguagem mais dura, outras vezes mais conjunto de métodos e direções ções do professor." carinhosa. Já o aluno também é um indivíduo. Cada um tem algo de curriculares a partir do diagnósti- próprio que o professor deverá levar em conta quando se comunicar CO de suas próprias necessidades. com ele. A reação dos alunos às minhas manifestações serão diferentes Planejar as técnicas como situações de aprendizagem, selecionando e, a partir dessas diferenças, o diálogo tomará um significado próprio. aquelas que favoreçam a aprendizagem individual e colaborativa, a No uso das técnicas que envolvam computação e atividades não pre- participação e a integração da classe; planejar um processo de avaliação e escolher técnicas avaliativas que funcionem como feedback e motiva- senciais há que se cuidar, de modo especial, da princi- ção da aprendizagem. palmente quando só pudermos usar a escrita sem imagem e som. Domínio profundo em sua área de conhecimento, demonstrando O professor deverá cuidar muito de sua expressão e comunicação para competência atualizada quanto às informações e aos assuntos afetos que elas sempre estejam em condições de ajudar a aprendizagem e a essa área, para que não se valorize apenas uma perspectiva metodoló- incentivar o aprendiz em seu trabalho. gica a ser empregada ou uma atitude que venha a cair no vazio. A construção do conhecimento é o eixo da articulação da prática edu- SUGESTÕES BIBLIOGRÁFICAS PARA o TEMA DO CAPÍTULO cativa e ela não pode faltar. Esta construção do conhecimento não se fará sem estudo, reflexão, investigação, intercâmbio de experiências. ABUD, Maria José Milharezzi. Professores de ensino superior: características de qualidade. Incentivar a pesquisa entre os alunos e ajudá-los a desenvolver uma Cabral, 2001. metodologia científica adequada será uma das grandes preocupações ALMEIDA, Laurinda Ramalho de; PLACCO, Vera Maria Nigro de Souza (Org.). As do professor. relações interpessoais na formação de professores. São Paulo: Loyola, 2002. Criatividade, enquanto uma atitude alerta para buscar com o aluno ARROYO, Miguel G. de mestre. Petrópolis: Vozes, 2002. soluções para situações novas e inesperadas, e ter presente que cada aluno é diferente do COWAN, John. Como ser um professor universitário inovador: reflexão na ação. Porto Disponibilidade para o diálogo. Com as novas tecnologias este se Alegre: Artmed, 2002. tornará muito mais frequente e contínuo, com outra dimensão de FELDMANN, Marina Graziela (Org.). Formação de professores e escola na contemporanei- espaço e tempo (não só o encontro semanal com os alunos, durante dade. São Paulo: Senac, 2009. as aulas). HELDE, Ann; STILBORNE, Linda. Guia do professor para a internet. Porto Alegre: Art- A qualquer momento e de qualquer lugar os aprendizes poderão acessar med, 2000. o professor, esperando uma resposta o quanto antes, e não só no próxi- KULLOK, Maisa Gomes Relação professor-aluno: contribuições à prática peda- mo encontro presencial. Para tanto, a disponibilidade é fundamental. Maceió: Edufal, 2002.