Prévia do material em texto
Título da obra original, em inglês, publicada pela Self-Realization Fellowship, Los Angeles (Califórnia): The Science of Religion ISBN: 978-0-87612-005-7 Copyright © 2011, 2021 Self-Realization Fellowship Todos os direitos desta edição digital de A Ciência da Religião (The Science of Religion) são reservados pela Self-Realization Fellowship. Nota ao leitor A Self-Realization Fellowship tem o prazer de lhe dar a permissão para baixar esta edição para seu uso individual, não comercial, e imprimir, para consulta, quaisquer excertos que possam atender às suas necessidades pessoais. Tenha a bondade de observar, todavia, que ao adquirir esta edição, o leitor concorda em cumprir as leis de direitos autorais nacionais e internacionais aplicáveis e abster-se de distribuir, reproduzir ou transmitir o conteúdo para outros indivíduos ou entidades, por quaisquer meios (mecânico, eletrônico ou outros), sem a autorização prévia, por escrito, da Self-Realization Fellowship. Agradecemos sua consideração em ajudar a preservar a integridade da obra do autor, defendendo esses princípios. Obrigado por apoiar nossos esforços de publicação, sem fins lucrativos, em conexão com o legado de Paramahansa Yogananda. Autorizado pelo Conselho de Publicações Internacionais da SELF-REALIZATION FELLOWSHIP 3880 San Rafael Avenue • Los Angeles, California 90065-3219 USA O nome Self-Realization Fellowship e o emblema (mostrados acima) aparecem em todos os livros, gravações e demais publicações da SRF, sendo, para o leitor, a garantia de que a obra provém da sociedade estabelecida por Paramahansa Yogananda e transmite fielmente seus ensinamentos. Primeira edição, 2011. E-book edição, 2022. ISBN: 978-0-87612-109-2 ISBN: 978-0-87612-990-6 (Kindle edição) ISBN: 978-0-87612-991-3 (ePub edição) A Respeito deste Livro A primeira das obras publicadas de Paramahansa Yogananda, A Ciência da Religião (The Science of Religion) ocupa um lugar especial na biblioteca da Self-Realization Fellowship, junto com seus outros livros e gravações. Este livro é uma ampliação do discurso inaugural de Sri Yogananda na América, a palestra histórica que apresentou pela primeira vez seus ensinamentos ao mundo ocidental. A conferência, feita em 1920 em um congresso internacional de religiosos liberais realizado em Boston, foi recebida com entusiasmo pelos delegados – e também pelo público, para quem se fez disponível em forma de panfleto. Em 1924, Sri Yogananda providenciou para que sua organização publicasse uma edição revisada e ampliada; e desde então o livro tem estado permanentemente impresso. Em 1928, um prefácio de autoria do eminente estadista e filósofo britânico Douglas Grant Duff Ainslie foi acrescentado e incluído em todas as edições subsequentes. O Legado Espiritual de Paramahansa Yogananda (Seus escritos completos, conferências e palestras informais) Paramahansa Yogananda fundou a Self-Realization Fellowship em 1920, para difundir seus ensinamentos em todo o mundo e lhes preservar a pureza e a integridade para as gerações futuras. Prolífico escritor e palestrante desde os seus primeiros anos na América, ele produziu um corpo volumoso e respeitado de trabalhos que abordam a ciência iogue da meditação, a arte da vida equilibrada e a unidade fundamental de todas as grandes religiões. Hoje, esse legado espiritual único e de grande alcance se mantém vivo, inspirando milhões de buscadores da verdade em todo o mundo. Obediente aos desejos expressos do grande mestre, a Self-Realization Fellowship tem prosseguido na tarefa contínua de publicar e manter permanentemente impressas As Obras Completas de Paramahansa Yogananda, as quais incluem não apenas as edições definitivas de todos os livros que ele publicou em vida, mas também numerosos títulos inéditos – trabalhos que não foram publicados até o seu falecimento em 1952, ou que tinham sido publicados em série, mas de forma incompleta, através dos anos, na revista da Self- Realization Fellowship, bem como centenas de conferências e palestras informais, profundamente inspiradoras, que foram transcritas ou gravadas, porém não publicadas antes de sua morte. Paramahansa Yogananda pessoalmente escolheu e instruiu seus discípulos diretos que formaram o Conselho de Publicações da Self-Realization Fellowship e lhes deu diretrizes específicas para a preparação e publicação de seus ensinamentos. Os membros do Conselho de Publicações da SRF (monges e monjas que fizeram votos vitalícios de renúncia e serviço altruísta) zelam por essas diretrizes como uma confiança sagrada para que a mensagem universal desse bem-amado instrutor mundial se mantenha viva com a força e a autenticidade originais. O emblema da Self-Realization Fellowship (que se vê na página anterior) foi desenhado por Paramahansa Yogananda para identificar a organização sem fins lucrativos que ele fundou como a fonte autorizada de seus ensinamentos. O nome e o emblema da SRF aparecem em todas as publicações e gravações da Self-Realization Fellowship, garantindo ao leitor que o trabalho provém da organização fundada por Paramahansa Yogananda e transmite seus ensinamentos do modo que ele próprio idealizou. Self-Realization Fellowship Por sua piedade e generosidade para com muitos movimentos importantes e por seu pioneirismo em patrocinar a fundação de uma escola residencial para meninos da Yogoda Satsanga, em Ranchi (Bihar, Índia), este livro é dedicado com amor ao saudoso e venerável marajá Sri Manindra Chandra Nundy, de Kasimbazar, Bengala. Índice Prefácio Prólogo Introdução A universalidade, necessidade e unidade da religião O objetivo comum da vida Definição universal de religião O que significa ser religioso A religião nos “liga” às leis benevolentes Religião é questão de fundamentos A Religião Universal é pragmaticamente necessária Dor, prazer e Bem-aventurança: suas diferenças A causa fundamental da dor e do sofrimento As causas imediatas da dor O prazer é uma consciência dúplice Confundir os meios com o fim A consciência de Bem-aventurança surge do rompimento da identificação com o corpo Deus como Bem-aventurança O motivo comum de todas as ações Apenas a consciência de Bem-aventurança pode efetivamente apaziguar a excitação Que é Deus? A prova da existência de Deus está dentro de nós A religião só se torna universalmente necessária quando Deus é concebido como Bem-aventurança Em Deus ou consciência de Bem-aventurança nossas aspirações espirituais se realizam A vida: grande peça teatral Quatro métodos fundamentais de realização divina A necessidade de métodos religiosos O “Filho de Deus” e o “filho do homem” A origem do sectarismo Quatro métodos religiosos fundamentais 1. O método do intelecto 2. O método da devoção 3. O método da meditação 4. O método científico ouYoga Explicação fisiológica do método científico A prática do método científico resulta em libertar-se das distrações corporais e mentais A prática continuada do método científico leva à consciência de Bem- aventurança ou Deus O método científico trabalha diretamente com a força vital Os instrumentos do conhecimento e a validez teórica dos métodos religiosos Os três instrumentos do conhecimento 1. Percepção 2. Inferência 3. Intuição Por meio da intuição, Deus pode ser experimentado em todos os Seus aspectos A respeito do autor Paramahansa Yogananda: um iogue na vida e na morte Recursos adicionais aos ensinamentos de Kriya Yoga de Paramahansa Yogananda Lições da Self-Realization Fellowship Objetivos e Ideais da Self-Realization Fellowship Prefácio Douglas Grant Duff Ainslie (1865-1952) (Estadista, poeta e filósofo inglês; delegado do Congresso Internacional de Filosofia, Universidade de Harvard) Este pequeno livro traz a chave do universo. Seu valor não pode ser medido com palavras, porquanto, dentro destas estreitas capas, poderão ser encontrados, postos pela primeira vez ao alcance da multidão, a flor dos Vedas e dos Upanishads, o essencial de Patânjali (o principal expositordualidade – prazer e dor, amor e ódio mesquinhos, etc. – afastava-se de sua mente. Bem-aventurança pura e serenidade brotaram em seu coração, e você experimentou uma tranquilidade imperturbável: Bem-aventurança e contentamento. Embora esse tipo de experiência superior nem sempre ocorra a todos, não pode haver dúvida de que todas as pessoas, uma vez ou outra, durante a oração ou em estado de adoração ou meditação, experimentaram alguns momentos de perfeita paz. Não é essa uma prova da existência de Deus? Que outra prova direta da existência e da natureza de Deus podemos dar, além da existência da Bem- aventurança dentro de nós nos momentos de verdadeira oração ou culto? Há, porém, outras provas da existência de Deus: a prova cosmológica (do efeito elevamo-nos à causa; do mundo, ao Criador do Mundo), a prova teleológica (do telos [plano, adaptação] do mundo elevamo-nos à Inteligência Suprema que criou o plano e a adaptação) e também a prova moral (da consciência e do sentimento de perfeição elevamo-nos ao Ser Perfeito, diante de quem somos responsáveis). Ainda assim, devemos admitir que essas provas são, em certa medida, produtos da inferência. Não podemos ter conhecimento pleno ou direto de Deus por meio das faculdades limitadas do intelecto. O intelecto proporciona apenas uma visão parcial e indireta das coisas. Ver uma coisa intelectualmente não é o mesmo que experimentá-la ao se unificar com ela; é ver uma coisa à distância estando separado dela. A intuição, porém, que mais tarde analisaremos, é a apreensão direta da verdade. É na intuição que a consciência de Bem-aventurança, ou consciência de Deus, é experimentada. Não há sombra de dúvida quanto à identidade absoluta entre a consciência de Bem-aventurança e a consciência de Deus, porque quando temos essa consciência de Bem-aventurança sentimos que nossa estreita individualidade foi transformada e que transcendemos a dualidade do amor e do ódio mesquinhos, do prazer e da dor; alcançamos um nível a partir do qual se torna extremamente óbvio o caráter doloroso e inútil da consciência comum. E também sentimos uma expansão interior e uma compaixão para com todas as coisas. Os tumultos do mundo extinguem-se, as agitações desaparecem e começamos a sentir a consciência de “todos em Um e Um em todos”. Surge uma gloriosa visão de luz. Todas as imperfeições, todas as asperezas reduzem-se a nada. Somos transportados a outra esfera, à origem da perene Bem-aventurança, o ponto de partida de uma interminável continuidade. Não é, pois, a consciência de Bem-aventurança a mesma consciência de Deus, na qual aparecem os estados de percepção acima citados? É evidente, portanto, que Deus não poderá ser mais bem concebido do que como Bem-aventurança se tentarmos trazê-Lo para o âmbito da experiência de tranquilidade de cada um. Deus não continuará sendo então uma hipótese, sujeito à formulação de teorias. Não é essa uma concepção mais nobre de Deus? Ele é percebido manifestando-Se em nossos corações, na forma de Bem- aventurança na meditação – em espírito de oração ou de reverente adoração. A religião só se torna universalmente necessária quando Deus é concebido como Bem-aventurança Se concebemos Deus deste modo, como Bem-aventurança, então (e só então) podemos tornar a religião universalmente necessária. Pois ninguém pode negar que deseja alcançar a Bem-aventurança e, se deseja alcançá-la de maneira apropriada, há de ser religioso ao buscar e sentir Deus, que é descrito como íntimo a seu coração na forma de Bem-aventurança. Essa consciência de Bem-aventurança, ou consciência de Deus, pode permear todas as nossas ações e disposições, basta que o permitamos. Se dela pudermos nos apoderar firmemente, seremos capazes de julgar o valor religioso relativo de todas as ações e motivações humanas neste mundo. Assim que nos convencermos de que a obtenção dessa consciência de Bem- aventurança é a nossa religião, a nossa meta, o nosso fim supremo, então desaparecerão todas as dúvidas a respeito do significado dos múltiplos ensinamentos, injunções e proibições dos diferentes credos do mundo. Tudo será interpretado à luz do estágio de crescimento para o qual eles foram prescritos. A verdade brilhará, o mistério da existência será resolvido e a luz incidirá sobre os detalhes de nossa vida, com suas numerosas ações e motivações. Seremos capazes de extrair a verdade nua que se acha encerrada nos aditamentos exteriores das doutrinas religiosas e perceber a inutilidade das convenções que, com tanta frequência, extraviam as pessoas e criam diferenças entre elas. Além disso, se compreendemos a religião dessa maneira, não há ninguém neste mundo – criança, jovem ou idoso – que não possa praticá-la, qualquer que seja sua profissão – estudante, operário, advogado, médico, carpinteiro, acadêmico ou filantropo. Se religião significa abolir o sentimento de carência e alcançar a Bem-aventurança, quem há que não esteja tentando ser religioso e que não tentará sê-lo em grau maior se os métodos apropriados lhe forem ensinados? Não nos interessa aqui a questão da variedade de religiões – a de Cristo, a de Maomé ou a de Sri Krishna. Todos neste mundo estão inevitavelmente tentando ser religiosos, e poderão sê-lo, de forma ainda mais plena, se adotarem os métodos apropriados. Aqui não há distinção de casta ou credo, seita ou fé, roupa ou clima, idade ou sexo, profissão ou posição. Pois esta religião é universal. Se disséssemos que todas as pessoas do mundo deveriam reconhecer Sri Krishna como seu Salvador, aceitariam isso todos os cristãos e muçulmanos? Se pedíssemos a todos para aceitarem Jesus como seu Senhor, fariam isso todos os hindus e muçulmanos? E se ordenássemos que todos aceitem Maomé como seu Profeta, concordariam com isso cristãos e hindus? Se, porém, dissermos: “Ó meus irmãos cristãos, muçulmanos e hindus: o Senhor nosso Deus é a Existência (Ser) Eternamente Consciente e Bem-aventurada”, não aceitarão eles esta verdade? Poderão acaso rejeitá-la? Não apelarão todos a Ele como o Único que pode acabar com todos os seus sofrimentos? Nem se pode fugir dessa conclusão afirmando que os cristãos, hindus e muçulmanos não concebem Jesus, Krishna e Maomé, respectivamente, como o Próprio Deus, mas os consideram unicamente como mensageiros de Deus, encarnações humanas da divindade. Que importa se alguém pensa assim? Não são os corpos físicos de Jesus, de Krishna e de Maomé o que nos interessa fundamentalmente, nem nos importamos muito com o lugar que ocupam na história. Nem tampouco nos são eles memoráveis apenas por causa de suas maneiras diferentes e interessantes de pregar a verdade. Nós os reverenciamos porque eles conheceram e sentiram Deus. Esse é o fato que nos interessa em sua existência histórica e em suas múltiplas maneiras de expressar a verdade. Acaso todos eles não experimentaram Deus como Bem-aventurança e revelaram a verdadeira beatitude como sendo o autêntico estado divino? Não é esse entre eles um laço de unidade suficiente – deixando de lado outros aspectos da Divindade e da verdade que eles possam ter percebido e expressado? Não deveriam o cristão, o hindu e o muçulmano interessar-se em conhecer os profetas uns dos outros, uma vez que todos eles alcançaram a consciência de Deus? Assim como Deus une todas as religiões, é a experiência Dele como Bem- aventurança que une a consciência dos profetas de todas as religiões.¹ Em Deus ou consciência de Bem-aventurança nossas aspirações espirituais se realizam Ninguém deve pensar que tal concepção de Deus é demasiadamente abstrata, nada tendo a ver com nossas esperanças e aspirações espirituais, as quais requerem uma concepção de Deus como um ser pessoal. Não se trata da concepção de um ser impessoal, como geralmente se compreende, nem de um ser pessoal, estreitamente definido. Deus não é uma pessoa, como nós somos em nossa estreiteza. Nosso ser, consciência, sentimentos, volição têm apenas um vestígio de semelhança com o Ser (Existência), Consciência e Bem-aventurança de Deus. Ele é pessoa no sentido transcendental.Nosso ser, consciência e sentimento são limitados e empíricos; os de Deus são ilimitados e transcendentais. Ele tem um aspecto impessoal e absoluto, mas não devemos pensar que Ele esteja fora do alcance de todas as experiências – inclusive de nossa experiência interior. Deus pode ser percebido por todas as pessoas no estado de tranquilidade. É na consciência de Bem-aventurança que nós O experimentamos. Não pode haver qualquer outra prova direta da Sua existência. É Nele, como Bem-aventurança, que nossas esperanças e aspirações espirituais se realizam – nossa devoção e amor encontram Nele o seu propósito. Não se exige a concepção de um ser pessoal, que vem a ser apenas uma ampliação de nós mesmos. Deus pode ser ou tornar-Se qualquer coisa: pessoal, impessoal, todo-misericordioso, onipotente e assim por diante. Mas não temos que nos preocupar com esses qualificativos. A concepção de Deus como Bem- aventurança atende precisamente aos nossos objetivos, esperanças, aspirações e à nossa perfeição. Nem devemos pensar que tal concepção de Deus nos tornará idealistas sonhadores, rompendo nosso vínculo com as ocupações e responsabilidades, as alegrias e mágoas do mundo concreto. Se Deus é Bem-aventurança e se buscamos a Bem-aventurança para conhecê-Lo, não podemos negligenciar os deveres e as responsabilidades do mundo. No exercício dessas funções podemos ainda sentir a Bem-aventurança, porque esta situa-se para além daquelas, as quais portanto não podem afetá-la. Na Bem-aventurança, transcendemos as alegrias e mágoas do mundo, mas não transcendemos a necessidade de cumprir nossos legítimos deveres no mundo. O homem de Autorrealização sabe que Deus é o Autor de todas as ações; todo poder de agir flui Dele para nós. Quem está centrado no Eu espiritual sente-se como o desapaixonado observador de todas as ações, esteja ele vendo, ouvindo, tocando, cheirando, saboreando ou passando por várias outras experiências no mundo. Imersos na Bem-aventurança, tais homens vivem sua vida de acordo com a vontade de Deus. Quando se cultiva o desapego, o estreito egoísmo desaparece. Sentimos que estamos representando os papéis que nos foram atribuídos no palco do mundo, sem sermos afetados intimamente pelas alegrias e mágoas, amores e ódios que a encenação envolve. A vida: grande peça teatral Na verdade, o mundo, em todos os seus aspectos, pode ser comparado a um palco. O diretor escolhe pessoas para ajudá-lo na encenação de certa peça teatral e atribui papéis específicos a determinados indivíduos. Todos trabalham segundo suas instruções. A um, o diretor atribui o papel de rei, a outro o de ministro; a um, o de servidor, a outro o de herói, e assim por diante. Uma pessoa tem de representar um papel triste; outra, um papel alegre. Se cada um representa sua parte de acordo com as instruções do diretor, então a peça, com todas as suas diversidades de papéis cômicos, sérios e tristes, torna-se um sucesso. Mesmo os papéis insignificantes são indispensáveis na representação. O êxito da peça está na perfeita encenação de cada papel. Cada ator representa seu papel de tristeza ou prazer com realismo e, externamente, parece ser afetado por seu papel; interiormente, porém, ele não é afetado pelo papel nem pelas paixões que retrata: amor, ódio, desejo, malícia, orgulho, humildade. Se um ator, porém, ao encenar seu papel, se identificasse com determinada situação ou sentimento particular expressos na representação e perdesse sua própria individualidade, seria considerado um tolo, para dizer o mínimo. Uma história esclarecerá este último ponto. Uma vez, na casa de um homem rico, foi encenada a peça Ramayana.² Durante a encenação, descobriu-se que o homem que deveria representar o papel de Hanuman (um macaco), amigo e servidor de Rama,³ estava ausente. Desesperado, o diretor apelou para um simplório muito feio, chamado Nilkamal, e pediu-lhe que fizesse o papel de Hanuman. Nilkamal a princípio recusou-se, mas foi forçado a aparecer no palco. Sua aparência feia provocou gargalhadas entre os espectadores, que começaram a gritar, em tom de escárnio: “Hanuman, Hanuman!” Nilkamal não conseguiu suportar isso. Esquecendo-se de que era apenas teatro, exclamou, exasperado: “Senhores, por que me chamam de Hanuman? Por que estão rindo? Eu não sou Hanuman. O diretor me obrigou a aparecer aqui, vestido assim.” Neste mundo complexo, nossas vidas não passam de peças teatrais. Mas – que pena! – identificamo-nos com a peça e, por isso, experimentamos dissabores, tristeza e prazer. Esquecemos a orientação e as instruções do Grande Diretor. No ato de viver a vida – desempenhando nossos papéis – sentimos como se fossem reais todas as nossas mágoas e prazeres, amores e ódios – numa palavra, tornamo-nos apegados, afetados. Esta peça que é o mundo não tem começo nem fim. Todos devem representar o papel que lhes foi atribuído pelo Grande Diretor, sem resmungar, apenas por amor à própria peça. Devem expressar tristeza quando representarem um papel triste, ou prazer quando encenarem um papel prazeroso, porém nunca se identificar com a peça. Também não deve uma pessoa querer representar o papel de outra. Se todos neste mundo representassem o papel de rei, a peça perderia interesse e sentido. Aquele que alcançou a consciência de Bem-aventurança sentirá que o mundo é um palco e representará seu papel da melhor maneira possível, lembrando-se de Deus, o Grande Diretor, assim como conhecendo e sentindo Seu plano e orientação. Paramahansa Yogananda discursando em Denver, Colorado, agosto de 1924. 1 A consciência de Bem-aventurança é também enfatizada nas religiões consideradas ateístas, como o budismo. O Nirvana budista não é, como erradamente supõem os escritores ocidentais, um “apagar da luz”, a extinção da existência. Ao contrário, é o estado em que a estreita individualidade se apaga e em que se alcança a tranquilidade transcendental da universalidade. Isso é exatamente o que ocorre na consciência superior de Bem-aventurança, embora os budistas não associem a ela o nome de Deus. 2 Dramatização baseada na antiga epopeia sânscrita do mesmo nome. (Nota da Editora) 3 Personagem central e sagrada do Ramayana. (Nota da Editora) PARTE 4 Quatro métodos fundamentais de realização divina A necessidade de métodos religiosos Vimos nas Partes 1, 2 e 3 que a identificação do Eu espiritual com o corpo e a mente é a causa fundamental de nossa dor, de nosso sofrimento e de nossas limitações; e que, por causa dessa identificação, sentimos a excitação causada pela dor e prazer, ficando quase cegos para o estado de Bem-aventurança ou consciência de Deus. Vimos também que a religião consiste, essencialmente, em evitar de maneira permanente a dor e obter a pura Bem-aventurança ou Deus. Assim como a verdadeira imagem do sol não pode ser percebida na superfície da água em movimento, também a verdadeira natureza bem-aventurada do Eu espiritual – reflexo do Espírito Universal – não pode ser compreendida, devido às ondas da inquietude que surgem da identificação de si próprio com os estados mutáveis do corpo e da mente. Assim como as águas em movimento distorcem a verdadeira imagem do sol, também a mente, em seu estado inquieto decorrente da identificação, distorce a natureza verdadeira e sempre bem-aventurada do Eu interior. O propósito deste capítulo é analisar os métodos mais fáceis, racionais e fundamentais – práticos para todos – que libertarão o Eu espiritual sempre bem- aventurado de sua perniciosa conexão e identificação com o corpo e a mente transitórios, assim fazendo com que ele evite a dor permanentemente e alcance a Bem-aventurança, o que se constitui em religião. Portanto, os métodos fundamentais a serem considerados aqui são religiosos e compreendem ações religiosas, porque apenas por meio deles pode o Eu espiritual libertar-se da identificação com o corpo e a mente, e consequentemente da dor, e ser capaz de alcançar a permanente Bem- aventurança ou Deus. O “Filho de Deus” e o “filho do homem” Quando Cristo se denominava “Filhode Deus”, referia-se ao Espírito Universal que nele habitava. Em João 10:36, Jesus diz: “Aquele a quem o Pai santificou e enviou ao mundo (…) eu disse: Sou Filho de Deus”. Em outras ocasiões, porém, quando Cristo usou outra expressão – o “filho do homem” – referia-se à forma física, a criatura humana, o corpo que nasce de outro corpo humano. Por exemplo, em Mateus 20:18-19, Jesus diz aos discípulos: “Eis que vamos para Jerusalém, e o filho do homem será entregue aos príncipes dos sacerdotes (…) e eles (…) o entregarão aos gentios para que (…) o crucifiquem.” Em João 3:5-6, Cristo diz: “Aquele que não nascer da água (a vibração oceânica de Om, o Espírito Santo, a Força Invisível que sustenta toda a criação; Deus em Seu aspecto imanente de Criador) e do Espírito, não pode entrar no reino de Deus. O que é nascido da carne é carne, e o que é nascido do Espírito é espírito.” Essas palavras significam que, a menos que possamos transcender o corpo e perceber que somos o Espírito, não poderemos entrar no reino ou no estado desse Espírito Universal. Há um eco desse pensamento em uma quadra sânscrita das escrituras hindus: “Se puderes transcender o corpo e perceber a ti mesmo como Espírito, serás eternamente bem-aventurado e livre de toda dor”. Ora, existem quatro métodos religiosos universais e fundamentais que, se seguidos na vida diária, libertarão em certo tempo o Eu espiritual das limitações de seus veículos mentais e corporais. Nessas quatro classes de métodos religiosos incluo todas as práticas religiosas possíveis que já foram prescritas por qualquer santo, sábio ou profeta de Deus. A origem do sectarismo As práticas religiosas são estabelecidas pelos profetas na forma de doutrinas. Homens de intelecto limitado, não conseguindo interpretar o verdadeiro significado dessas doutrinas, aceitam sua expressão exotérica ou externa e, gradualmente, caem nas formalidades, convenções e práticas rígidas. Essa é a origem do sectarismo. O descanso no dia de sábado foi erroneamente interpretado como a obrigação de evitar todo tipo de trabalho – inclusive o trabalho religioso. Esse é o perigo em que incorrem os homens de entendimento limitado. Devemos recordar que não fomos feitos para o sábado, mas o sábado foi feito para nós; não fomos feitos para as regras, mas as regras foram feitas para nós: elas mudam conforme mudamos. Devemos aderir à essência de uma regra, e não nos aferrar dogmaticamente à sua forma. Para muitos, mudar as formas e os costumes implica mudar de uma religião para outra. Não obstante, o significado mais profundo das doutrinas de todos os diferentes profetas é essencialmente o mesmo. A maioria das pessoas não compreende isso. Há um perigo semelhante no caso daqueles que são dotados de grande capacidade intelectual: eles tentam conhecer a Verdade Suprema apenas pelo exercício do intelecto; mas a Verdade Suprema só pode ser conhecida por experiência direta. A experiência direta é diferente da mera compreensão. Não nos é possível compreender intelectualmente a doçura do açúcar se não o tivermos provado. Do mesmo modo, o conhecimento religioso decorre da experiência mais profunda de nossa própria alma. Frequentemente nos esquecemos disso quando procuramos aprender a respeito de Deus, dos dogmas religiosos e da moralidade. Raramente buscamos conhecer essas coisas através da experiência religiosa interior. É lamentável que homens de grande capacidade intelectual – bem-sucedidos no uso da razão para descobrirem as verdades profundas das ciências naturais e de outros campos do saber – pensem que também serão capazes de compreender intelectualmente as verdades religiosas e morais superiores. É também lamentável que o intelecto ou a razão desses homens, em vez de lhes servir de ajuda, frequentemente constituem barreiras à sua compreensão da Verdade Suprema pelo único meio possível: experimentá-la na própria vida. Vamos analisar os quatro métodos que caracterizam o progresso religioso. QUATRO MÉTODOS RELIGIOSOS FUNDAMENTAIS 1. O método do intelecto O método do intelecto é o método natural comumente adotado e que, no entanto, não produz efeitos rápidos no alcance do objetivo. O desenvolvimento e o progresso intelectual têm sido naturais e portanto comuns a todas as criaturas racionais. É a nossa compreensão autoconsciente que nos diferencia dos animais inferiores, os quais são conscientes porém não autoconscientes. Nas etapas e processos da evolução, vemos que essa consciência gradualmente se converte em autoconsciência – a autoconsciência surge a partir da consciência animal. A consciência procura gradualmente libertar-se e conhecer-se por si mesma; desse modo, ela se converte em autoconsciência. Tal mudança se deve a uma necessidade evolutiva, e o impulso universal para os processos intelectuais também se deve a essa tendência evolutiva. O Eu espiritual, identificado com vários graus e espécies de estados corporais e mentais, tenta de maneira gradativa e natural retornar a si próprio por si mesmo. O desenvolvimento do processo do pensamento consciente é um dos métodos que o Eu espiritual adota para colocar-se acima das limitações do corpo e da mente. O esforço que o Eu espiritual faz, por meio do processo do pensamento, para retornar a si próprio – à sua condição perdida – é um fenômeno natural. É o processo seguido pelo mundo. O Espírito Universal se expressa em graus diferentes de desenvolvimento, desde o mais baixo até o mais elevado. Na pedra e no torrão de terra não há vida ou consciência como podemos concebê-la. Nas árvores há um crescimento vegetativo, uma aproximação da vida. Contudo, não existe aí qualquer manifestação desembaraçada de vida e nenhum processo de pensamento consciente. Nos animais existe vida e também consciência de vida. No homem – o ponto culminante – há vida, consciência de vida e também consciência do Eu (Autoconsciência). Por isso, é natural que o homem se desenvolva por meio do pensamento e do raciocínio, pelo estudo profundo de livros, pelo engenhoso trabalho de pesquisa e pelas laboriosas investigações das causas e dos efeitos no mundo natural. Quanto mais profundamente o homem se ocupa de processos de pensamento, pode-se dizer que mais ele utiliza o “método” pelo qual ele se tornou o que é no curso da evolução do mundo (quer dizer, o método pelo qual a consciência se desenvolveu até tornar-se Autoconsciência) e mais ele se aproxima, consciente ou inconscientemente, do Eu – pois pelo pensamento nós nos colocamos acima do corpo. Seguindo-se deliberadamente esse método, obter-se-ão resultados seguros. O exercício do pensamento por meio do estudo, com o objetivo de adquirir conhecimento em determinado campo, até certo ponto aprimora a Autoconsciência, mas não é tão eficaz nesse sentido quanto o processo intelectivo que tem como único objetivo transcender o corpo e perceber a verdade. Na Índia, o método do intelecto em sua forma mais elevada é chamado Jnana Yoga: o alcance da verdadeira sabedoria por meio da reminiscência e do discernimento, como por exemplo recordar-se constantemente: “Eu não sou o corpo. Meu verdadeiro Eu não pode ser afetado pelo espetáculo passageiro da criação. Eu sou Espírito.” Um dos defeitos deste método intelectual é ser um processo muito vagaroso. Pode demorar muito tempo para que o Eu espiritual possa, dessa maneira, perceber a si mesmo. Enquanto o Eu espiritual começa a perceber a Autoconsciência por esse método, está ainda comprometido com uma série de pensamentos passageiros com os quais não tem qualquer relação. A tranquilidade do Espírito é algo que está para além do pensamento e da sensação corporal; todavia, uma vez alcançada, ela transborda e os inunda. 2. O método da devoção Este método consiste na tentativa de fixar nossa atenção em um objeto de pensamento, em vez de fixá-la em diferentes séries de pensamentos ou em vários objetos (como no método do intelecto). No método da devoção estão incluídas todas as formas de culto, como por exemplo a oração (em cuja prática devemos eliminar todos os pensamentosrelacionados com objetos mundanos). O Eu espiritual deve fixar a atenção de maneira profunda e reverente naquilo que escolheu como foco de sua concentração – seja a ideia de um Deus pessoal, seja a de uma Onipresença impessoal. O ponto-chave é que o devoto se concentre, com suficiente sinceridade, em um único pensamento devocional. Por este processo o Eu espiritual torna-se gradualmente liberto do tumulto de numerosos pensamentos – a segunda série de perturbações – e consegue tempo e oportunidade para pensar em si mesmo. Quando oramos fervorosamente, esquecemos todas as sensações corporais e expulsamos todos os pensamentos intrusos que tentam ocupar nossa atenção. Quanto mais profunda é nossa oração, mais intensa é a satisfação que sentimos, e essa satisfação torna-se o critério com que medimos até que ponto nos aproximamos da Bem-aventurança ou Deus. À medida que as sensações do corpo são deixadas para trás e os pensamentos errantes são controlados, a superioridade do método da devoção sobre o intelectual se evidencia. No entanto, o método da devoção apresenta certos defeitos e dificuldades. Devido ao arraigado hábito que leva o Eu espiritual a manter-se apegado e escravizado ao corpo, ele se esforça em vão para desviar a atenção da esfera das sensações corporais e mentais. Todavia, por mais que a pessoa deseje orar ou unir-se de todo o coração a qualquer forma de culto, a atenção é invadida impiedosamente pelo ataque de sensações corporais e pensamentos velozes trazidos pela memória. Frequentemente, quando oramos, ficamos completamente absorvidos em dar atenção às circunstâncias que são favoráveis à oração, ou sucumbimos facilmente à tentação de buscar alívio ao menor desconforto físico que apareça durante ela. Apesar de todos os nossos esforços conscientes, nosso mau hábito de inquietude – que já se tornou para nós uma segunda natureza – predomina sobre os desejos do Eu. A despeito do desejo de nos concentrarmos, a mente se torna inquieta e, parafraseando, poderíamos dizer: “Onde estiver a nossa mente, ali estará também o nosso coração”. Dizem-nos para orar a Deus de todo o coração. Em vez disso, geralmente nossas mentes e corações são distraídos por impressões sensoriais e pensamentos errantes durante a oração. 3. O método da meditação Este e o método seguinte são puramente científicos, envolvendo um curso prático de treinamento, e são prescritos pelos grandes sábios que experimentaram pessoalmente a verdade em sua própria vida. Eu mesmo aprendi com um desses sábios. Nada existe de misterioso ou potencialmente nocivo nesses métodos; tão logo a pessoa se familiarize com eles de maneira apropriada, são de fácil aplicação. Descobrir-se-á que são universalmente aplicáveis. A melhor prova de sua eficácia e utilidade reside no conhecimento experimentado na prática. Praticando regularmente os métodos de meditação até que se tornem um hábito, podemos produzir para nós próprios o estado de “sono consciente”. Geralmente experimentamos esse estado de tranquilidade e agradável serenidade justamente quando caímos em sono profundo e nos aproximamos do estado de inconsciência, ou quando dele saímos e nos acercamos da consciência. No estado de sono consciente tornamo-nos livres de todos os pensamentos e das sensações externas do corpo, e o Eu tem a oportunidade de pensar em si mesmo. Chega-se a esse estado de bem-aventurança de vez em quando, de acordo com a profundidade e a frequência da prática da meditação. Nesse estado, esquecemos e nos libertamos, temporariamente, de todas as perturbações da mente e do corpo que costumam distrair a atenção do Eu. Por esse processo de meditação, os órgãos externos ou sensoriais são controlados quando se acalmam os nervos voluntários, como acontece no sono. Esse estado de meditação é apenas a primeira e não a última etapa da verdadeira meditação. No sono consciente aprendemos a controlar apenas os órgãos externos ou sensoriais, sendo a única diferença que, no sono comum, os órgãos sensoriais são automaticamente controlados, enquanto que na meditação os órgãos sensoriais são controlados voluntariamente. No entanto, nesse primeiro estágio de meditação o Eu espiritual ainda está sujeito a ser perturbado pelos órgãos internos ou involuntários, tais como os pulmões, o coração e outras partes do corpo que erradamente supomos estarem fora de nosso controle.¹ Precisamos então procurar um método melhor do que o da meditação. Pois enquanto não for capaz de voluntariamente desconectar-se de todas as sensações do corpo – até mesmo as sensações internas, que acarretam o brotar dos pensamentos – mas continuar vulnerável a essas perturbações, o Eu espiritual não poderá ter qualquer esperança de controle nem de tempo ou oportunidade para conhecer a si mesmo. 4. O método científico ou Yoga São Paulo afirmou: “Todo dia morro”.² Com isso ele quis dizer que conhecia o processo de controlar os órgãos internos e que podia, voluntariamente, libertar do corpo e da mente o seu Eu espiritual – uma experiência que as pessoas comuns, destreinadas, sentem apenas no momento final da morte, quando o Eu espiritual liberta-se do corpo esgotado. Ora, é possível ter a experiência de que o Eu está separado do corpo, sem experimentar a morte definitiva, submetendo-se a um curso de treinamento prático e regular neste método científico.³ Darei apenas uma ideia geral do processo e da verdadeira teoria científica em que ele está baseado. Apresentarei o assunto aqui nos termos de minha própria experiência. Verificar-se-á, afirmo, que é universalmente aplicável. E também posso dizer, com plena garantia, que a Bem-aventurança – que é, como indiquei, nosso objetivo final – é sentida em grau intenso durante a prática deste método. Sua prática é em si intensamente bem-aventurada – muito mais bem-aventurança pura do que o maior de todos os prazeres que qualquer de nossos cincos sentidos ou a mente jamais poderão nos oferecer. Não desejo dar a ninguém outra prova de sua verdade que não seja a proporcionada por sua própria experiência. Quanto mais alguém a pratica com paciência e regularidade, tanto mais sente, de maneira intensa e duradoura, que está estabelecido na Bem-aventurança ou Deus. Devido à persistência de maus hábitos, a consciência da existência corporal, com todas as suas lembranças, revive ocasionalmente e combate essa tranquilidade. Se, porém, qualquer um praticar este método regularmente e por períodos prolongados, pode ter a certeza de que, em tempo, encontrar-se-á em elevado estado supramental de Bem-aventurança. Não devemos, todavia, imaginar antecipadamente os resultados possíveis a que este processo conduz e, então, parar de praticá-lo após curta tentativa. Para fazer real progresso, são necessários os seguintes fatores: primeiro, dedicada atenção ao assunto que vai ser aprendido; segundo, o desejo de aprender e um espírito sério de investigação; terceiro, firmeza até o objetivo colimado ser alcançado. Se apenas trabalharmos parcialmente e, após uma prática limitada, a interrompermos, o resultado almejado não virá. Um neófito em práticas espirituais, que tenta prejulgar a experiência dos peritos (os mestres e profetas de todos os tempos) assemelha-se à criança que procura imaginar como serão os cursos de pós-graduação. É uma grande pena que os homens despendam seu tempo e seus melhores esforços em conseguir o que é necessário à sua existência no mundo ou em controvérsias intelectuais acerca de teorias. Parece que raramente pensam valer a pena perceber e pacientemente experimentar na vida as verdades que não só estimulam como também conferem significado à existência. Esforços mal orientados prendem a atenção dessas pessoas durante mais tempo do que as iniciativas bem conduzidas. Eu venho praticando o método mencionado por muitos anos e, quanto mais o pratico, mais sinto a alegria de um estado de Bem-aventurança permanente e infalível. Devemos recordar que o Eu espiritual tem estado no cativeiro do corpo por séculos e séculos que não sabemos. Não se pode libertá-loem um dia, nem a prática curta ou inconstante deste método leva alguém ao supremo estado de Bem-aventurança ou lhe dá controle sobre os órgãos internos. Isso pode requerer uma prática paciente por muito, muito tempo. Pode-se garantir, entretanto, que a observância deste processo trará a grande alegria da consciência pura da Bem-aventurança. Quanto mais o praticamos, mais rapidamente alcançamos essa Bem-aventurança. Desejo que vocês, como buscadores da Bem-aventurança – o que todos nós somos –, tentem experimentar por si mesmos a verdade universal que está em todos e pode ser por todos sentida. Esse estado não é invenção. Já está dentro de nós. Temos apenas que descobri-lo. Até que tenham testado esta verdade, não considerem com indiferença o que estou escrevendo. Vocês podem estar cansados de ouvir muitas teorias, que até agora não tiveram influência direta em sua vida. O que lhes digo não é teoria, mas sim verdade comprovada. Estou tentando lhes dar uma ideia do que pode realmente ser experimentado. Eu tive a felicidade de aprender esta verdade científica sagrada com um grande santo⁴ da Índia, há muitos anos. Vocês podem se perguntar por que os estimulo a praticar este método, por que procuro atrair sua atenção para esses fatores. Estarei acaso movido por algum interesse egoísta? A essa pergunta devo dar uma resposta afirmativa. Quero dar-lhes esta verdade com a esperança de receber em troca a alegria pura de tê-los ajudado a encontrar a felicidade por havê-la praticado e experimentado. Explicação fisiológica do método científico Agora, preciso adentrar-me um pouco em fisiologia, que nos capacitará a compreender este método, pelo menos de maneira geral. Vou-me reportar à função dos centros principais e à corrente elétrica que flui do cérebro, através desses centros, em direção aos órgãos externos (sensoriais) e internos, mantendo-os vibrantes com vida. Existem seis centros principais por meio dos quais a corrente prânica (a corrente de vida ou eletricidade vital)⁵ é distribuída a partir do cérebro para todo o sistema nervoso. São eles: Centro relacionado ao bulbo raquiano Centro cervical Centro dorsal Centro lombar Centro sacro Centro coccígeo O cérebro é o supremo dínamo elétrico (o centro superior). Todos os centros estão conectados uns aos outros e atuam sob a influência do centro supremo (as células cerebrais). As células cerebrais distribuem a corrente ou eletricidade vital através desses centros, os quais, por sua vez, distribuem a eletricidade aos diferentes nervos eferentes e aferentes, que respectivamente transportam impulsos motores e sensações de tato, visão, etc. Esse fluxo elétrico a partir do cérebro é a vida do organismo (de seus órgãos internos e externos), e é através desse agente elétrico que todas as mensagens sensoriais alcançam o cérebro e provocam reações na forma de pensamentos. Se o Eu deseja desconectar, de maneira eficaz, as mensagens perturbadoras das sensações corporais (que estimulam o surgimento dos mais variados pensamentos), ele precisa controlar e concentrar o fluxo elétrico e atraí-lo de volta, desde o sistema nervoso como um todo, para os sete centros principais (inclusive o cérebro), de modo que por esse processo ele possa dar aos órgãos internos e externos um perfeito descanso. Durante o sono, a condutividade elétrica entre o cérebro e os órgãos sensoriais é parcialmente inibida, de modo que as sensações comuns do som, do tato, etc. não alcançam o cérebro. Entretanto, como essa inibição não é completa, um estímulo exterior suficientemente forte restaura essa condutividade elétrica e é transmitido ao cérebro, despertando a pessoa. Todavia, durante o sono, sempre há um fluxo elétrico estável para os órgãos internos – coração, pulmões e demais partes – de modo que eles continuam pulsando e funcionando. A prática do método científico resulta em libertar-se das distrações corporais e mentais O controle da vida não é completo durante o sono, por isso ele é perturbado pelas sensações corporais de desconforto, pela doença ou por fortes estímulos exteriores. No entanto, por meio de um processo de controle científico, que não se pode descrever com detalhes aqui, podemos controlar simultaneamente os órgãos internos e externos do organismo de maneira perfeita. Esse é o resultado final da prática. Mas pode levar anos para se alcançar esse controle perfeito. Assim como, depois do sono (que é descanso), os órgãos externos são revigorados, também depois do descanso que resulta da prática deste método científico os órgãos internos são notavelmente vitalizados e, com o consequente aumento de sua capacidade funcional, a vida é prolongada. Quando vamos dormir, não tememos que os órgãos sensoriais permaneçam inertes; da mesma forma, não devemos temer a prática da morte consciente, isto é, de dar descanso aos órgãos internos. A morte estará então sob nosso controle; pois quando acharmos que esta casa corporal perdeu sua utilidade e encontra-se em mau estado, poderemos abandoná-la à vontade. “O último inimigo a ser destruído é a morte.” Podemos descrever o processo desta maneira: se a central telefônica de uma cidade encontra-se permanentemente conectada, por meio dos respectivos cabos, às diferentes partes da cidade, qualquer pessoa, de qualquer bairro, poderá enviar uma mensagem à agência central – mesmo contra a vontade das autoridades da referida agência – fazendo uso da corrente elétrica que circula através dos cabos telefônicos. Se a central telefônica quiser interromper a comunicação entre as diferentes partes da cidade, basta que desligue o comutador elétrico principal e não haverá fluxo elétrico aos diferentes bairros da cidade. De maneira parecida, o método científico ensina o processo que nos possibilita retirar para a nossa central – a coluna vertebral e o cérebro – a corrente vital distribuída por todos os órgãos e demais partes do corpo. O processo consiste em magnetizar a coluna vertebral e o cérebro, que contêm os sete centros principais; em consequência, a eletricidade vital que se encontra dispersa é devolvida aos centros originais de distribuição e experimentada na forma de luz. Nesse estado, o Eu espiritual pode se libertar conscientemente de suas distrações corporais e mentais. Podemos dizer que o Eu espiritual, mesmo contra sua vontade, está sendo perturbado pelas chamadas telefônicas de dois tipos de pessoas: aristocratas (os pensamentos) e plebeus (as sensações corporais). Para cortar a comunicação com eles e encontrar alívio, basta que o Eu desligue o comutador (por meio da prática do quarto método), retirando para a bateria central a eletricidade que flui através dos cabos telefônicos. A atenção é o supremo fator que dirige e distribui a energia. É a causa ativa da descarga da corrente elétrica vital desde o cérebro para os nervos sensoriais e motores. Por exemplo, nós afugentamos uma mosca importuna descarregando, pelo poder da atenção, uma corrente elétrica através dos nervos motores, assim produzindo o desejado movimento da mão. Cito isso para dar uma ideia do poder pelo qual o fluxo elétrico do organismo pode ser controlado e devolvido a seus sete centros. São esses os sete centros cerebrospinais, semelhantes a estrelas (astrais), a cujo “mistério” se refere a Bíblia, no livro do Apocalipse. São João, abrindo as portas secretas dos sete centros, ascendeu para a verdadeira compreensão de si mesmo como Espírito. “Escreve as coisas que viste (…) o mistério das sete estrelas.”⁷ A prática continuada do método científico leva à consciência de Bem-aventurança ou Deus Para concluir, desejo descrever a natureza dos estados que surgem quando o fluxo elétrico está completamente controlado. No começo, uma sensação muitíssimo atrativa é sentida durante a magnetização da coluna vertebral. A prática contínua e prolongada proporcionará um estado de Bem-aventurança consciente, que neutraliza o estado de excitação produzido por nossa consciência corporal. Esse estado bem-aventurado foi descrito como sendo o nosso objetivo universale a maior de todas as necessidades, pois nele estamos realmente conscientes de Deus ou Bem-aventurança e sentimos a expansão do que verdadeiramente somos. Quanto maior for a frequência com que experimentamos esse estado, tanto mais se enfraquece nossa estreita individualidade e mais cedo alcançamos o estado de universalidade, sendo mais íntima e mais direta nossa comunhão com Deus. Religião é, realmente, nada mais do que a união de nossa individualidade com a universalidade. Portanto, na consciência desse estado de bem-aventurança galgamos os degraus da religião. Abandonamos a atmosfera nociva dos sentidos e pensamentos errantes, chegando a uma região de Bem-aventurança celestial. Aprendemos por este processo o que se verificará ser de caráter universalmente aplicável. Quando, pela prática constante, a consciência desse estado bem- aventurado do Eu espiritual torna-se real, encontramo-nos sempre na santa presença do Deus de bem-aventurança dentro de nós. Cumprimos melhor nossas obrigações, dando mais atenção ao nosso próprio dever do que ao nosso egoísmo e à sua resultante consciência de prazer ou de dor. Podemos, então, resolver o mistério da existência e conferir um significado verdadeiro à vida. Nos ensinamentos de todas as religiões – cristianismo, islamismo, hinduísmo, etc. – uma verdade é posta em destaque: até que o homem se conheça como Espírito, a fonte da Bem-aventurança, ele estará limitado a conceitos mortais e sujeito às leis inexoráveis da natureza. O conhecimento do que ele verdadeiramente é lhe trará liberdade eterna. Só podemos conhecer Deus conhecendo a nós mesmos, pois nossa verdadeira natureza é semelhante à Dele. O homem foi criado à imagem de Deus. Aprendendo os métodos aqui sugeridos e praticando-os com seriedade, você se conhecerá como espírito bem-aventurado e experimentará Deus. Os métodos mencionados neste livro abrangem todos os meios imagináveis, essenciais à realização divina. Não consideramos aqui as mil e uma regras convencionais e práticas menores inculcadas pelas chamadas diferentes religiões, que foram deixadas de lado, porque algumas se relacionam com as diferenças entre as mentalidades individuais, e portanto, embora não sejam absolutamente desnecessárias, também não têm maior importância. E outras aparecem durante a prática desses métodos, por isso não precisam ser discutidas de modo mais completo neste espaço limitado. O método científico trabalha diretamente com a força vital A superioridade deste método sobre os outros está no fato de que ele trabalha com o exato fator que nos amarra à nossa estreita individualidade: a força vital. Na pessoa comum essa força vital, ao invés de ser interiorizada e absorvida na força expansiva autoconsciente do Eu, dirige-se para fora, conservando o corpo e a mente em constante movimento e causando perturbações ao Eu espiritual na forma de sensações corporais e pensamentos transitórios. Enquanto a força vital mover-se para o exterior, sensações e pensamentos perturbarão e deformarão a tranquila imagem do Eu ou Alma. Este método nos ensina a inverter o sentido da força vital, dirigindo-a para o interior. Daí seu efeito direto e imediato. Leva-nos diretamente à consciência do Eu: a Bem- aventurança Divina. Não requer o auxílio de nenhum intermediário. Este método controla e dirige o curso da força vital através do controle e regulação de uma manifestação conhecida da própria força vital e que está diretamente conectada a ela. Outros métodos religiosos utilizam o recurso do intelecto ou de processos mentais para controlar a força vital, com o objetivo de induzir a consciência do Eu em seu aspecto de bem-aventurança e outros aspectos. Deve-se observar que todos os métodos religiosos do mundo, direta ou indiretamente, tácita ou expressamente, implicam o controle, o ajuste e a inversão do curso da força vital, de modo que possamos transcender o corpo e a mente e conhecer o Eu em seu estado original. O quarto método controla diretamente a força vital por si mesma, enquanto os outros métodos controlam a força vital por algum intermediário – o pensamento, a oração, as boas obras, o culto ou o “sono consciente”. A presença da força vital no homem significa existência; sua ausência é a morte. Daí que o método que orienta o poder direto da vida para seu próprio controle deve ser o melhor de todos. Sábios de vários séculos e regiões têm sugerido métodos adaptados à constituição mental e às condições físicas dos povos entre os quais viveram e pregaram. Alguns têm dado ênfase à oração, outros ao sentimento; alguns, às boas obras, outros ao amor; alguns, à razão ou ao pensamento, outros à meditação; porém suas motivações têm sido as mesmas. Todos pretenderam que a consciência corporal fosse transcendida pela inversão do curso da força vital para o interior e que o Eu espiritual fosse percebido, tal como a imagem do sol se reflete na água tranquila, imperturbada. O propósito desses sábios é inculcar precisamente essa interiorização da força vital – que o quarto método ensina de modo direto, sem o auxílio de intermediários. Ao mesmo tempo, deve-se observar que a prática deste método não impede o cultivo do intelecto, o desenvolvimento físico ou a atividade de uma vida social e útil – uma vida com os melhores sentimentos e motivações, dedicada a obras filantrópicas. Para falar a verdade, em vez de retardar, o treinamento em todos os aspectos deve ser receitado a todos, pois auxilia positivamente a prática do referido método. A única coisa necessária é que se mantenha uma perspectiva espiritual. Então, todas as ações, todas as buscas resultarão em benefício da pessoa. O ponto principal com respeito a este processo é compreender completamente o mistério da força vital que sustenta o organismo físico do homem, fazendo-o vibrar com vida e energia. Paramahansa Yogananda em Nova York, 1926. 1 Raras são as pessoas que sabem como fazer descansar esses órgãos internos, processo conhecido pelos grandes santos e sábios. Como supomos estarem esses órgãos fora de nosso controle, eles se tornam sobrecarregados até que param subitamente, interrupção essa que denominamos “morte” ou “grande sono”. 2 I Coríntios 15:31. 3 O método científico referido aqui e em todo o restante do livro é Kriya Yoga, antiga ciência espiritual que inclui certas técnicas iogues de meditação ensinadas por Paramahansa Yogananda nas Lições da Self-Realization Fellowship. (Nota da Editora) 4 Swami Sri Yukteswar, guru de Paramahansa Yogananda. (Nota da Editora) 5 A energia (prana ou força vital) inteligente, mais sutil que a energia atômica, que ativa e sustenta a vida no corpo. (Nota da Editora) 6 I Coríntios 15:26. 7 Apocalipse 1:19, 20. PARTE 5 Os instrumentos do conhecimento e a validez teórica dos métodos religiosos A universalidade e a necessidade do ideal religioso (a Bem-aventurança sempre- existente e sempre-consciente, ou Deus) e os métodos práticos para alcançá-lo já foram analisados nos capítulos anteriores. Agora, queremos discutir a eficácia dos métodos. Os métodos são essencialmente práticos e, se forem seguidos, o ideal será alcançado, quer nos ocupemos das teorias, quer não. Sua eficácia é demonstrada pelo resultado prático em si mesmo, o qual é palpável e real. Compreenda-se que não é realmente necessário demonstrar as bases teóricas dessa eficácia. Todavia, simplesmente para satisfazer as diversas mentalidades, discutiremos a priori a validez das teorias do conhecimento nas quais esses métodos estão baseados, com o objetivo de que essa validez seja compreendida também do ponto de vista teórico. Isso nos lança a uma questão epistemológica: como e até que ponto podemos conhecer o ideal ou a verdade? Para demonstrar como podemos chegar a conhecer o ideal, precisamos estudar de que maneira conhecemos o mundo que nos rodeia. Precisamos investigar o processo que leva ao conhecimento deste mundo. Então, veremos se esse processo é o mesmo que leva ao conhecimento do ideal e se o mundo exterior encontra-se separado do ideal, ou seeste compreende em si mesmo o primeiro – sendo diferentes, neste caso, apenas os processos de conhecer os dois. Antes de prosseguir, vamos discutir os “instrumentos” do conhecimento: o modo pelo qual o conhecimento do mundo se faz possível para nós. Há três instrumentos ou meios de conhecimento: a percepção, a inferência e a intuição. OS TRÊS INSTRUMENTOS DO CONHECIMENTO 1. Percepção Nossos sentidos são como janelas através das quais os estímulos do exterior penetram e alcançam a mente, que recebe passivamente essas impressões. Sem o funcionamento da mente, os estímulos que vêm do exterior através das janelas dos sentidos não podem em absoluto imprimir-se nela. A mente não apenas relaciona entre si os estímulos recebidos através dos diferentes sentidos, mas também armazena suas influências na forma de impressões. Tais impressões, no entanto, não passam de um conjunto confuso, desconexo, até que a faculdade do discernimento (buddhi) intervenha, classificando-as. Essa faculdade estabelece então as relações mais importantes entre cada impressão, assim permitindo reconhecer os detalhes do mundo exterior como tais. Cada impressão é projetada, por assim dizer, no tempo e no espaço, sendo reconhecida e relacionada com o conjunto em termos de quantidade, qualidade, dimensão e significado. Uma casa é então conhecida como tal, e não como um poste. Isso resulta da operação do intelecto (buddhi). Podemos ver um objeto, apalpá-lo e ouvir o som que produz ao ser golpeado. Nossa mente recebe essas impressões e as armazena. Buddhi as interpreta e parece projetá-las no tempo e no espaço, reconhecendo o objeto, por exemplo, como uma casa com diversas qualidades de tamanho, aspecto, forma, cor, estilo, bem como sua relação com outras casas no presente, passado ou futuro. É dessa maneira que surge em nós o conhecimento do mundo. A mente de uma pessoa insana contém impressões armazenadas em seu íntimo, mas elas se encontram em estado caótico; o intelecto não as classificou nem as reuniu claramente em grupos distintos e bem ordenados. Agora surge a seguinte questão: é possível conhecer a Realidade (o ideal, a Bem- aventurança sempre-consciente e sempre-existente ou Deus) por meio desse tipo de percepção? Será o processo de conhecimento deste mundo (o processo da percepção) válido para conhecer a verdade suprema? Sabemos que o intelecto só pode trabalhar com os elementos fornecidos pelos sentidos. É certo que os sentidos nos fornecem apenas impressões de qualidade e variedade. Não só nos proporcionam a variedade, como também o próprio intelecto opera com ela e permanece limitado nessa esfera. Embora lhe seja possível pensar na “unidade em meio à diversidade”, o intelecto não pode se tornar um com essa verdade. E aí reside a sua limitação. A percepção intelectual é incapaz de apreender a verdadeira natureza da única Substância Universal que jaz no fundo de todas as manifestações. Esse é o veredito da própria razão. Quando buddhi se volta sobre si mesmo e procura julgar até que ponto é capaz de conhecer a Realidade mediante a interpretação das impressões dos sentidos, comprova que se encontra impotentemente confinado ao domínio do mundo sensório. Não há fresta alguma pela qual ele possa assomar à esfera suprassensória. Algumas pessoas podem dizer que o motivo pelo qual a razão se recusa a se considerar capaz de ter qualquer conhecimento do mundo suprassensório está em que nós mesmos erguemos uma barreira entre os mundos sensório e suprassensório. Elas dizem que, se considerarmos que o mundo suprassensório manifesta-se no mundo sensório e através dele, conheceremos o primeiro, manifestado como “unidade em meio à diversidade”, por meio do conhecimento intelectual do segundo – com sua conexão (teleologia ou adaptação) e todos os detalhes e variedades. Não obstante, podemos perguntar: qual é a natureza desse “conhecimento”? É um simples conceito mental, ou implica a visão direta, face a face, em primeira mão, da verdade (a unidade em meio à diversidade)? Traz essa forma de conhecer a verdade a mesma convicção que traria o tornar-se um com essa verdade? Seguramente que não, pois esse conhecimento é apenas parcial, deficiente. Assemelha-se a contemplar a realidade através de um vidro colorido. O mundo suprassensório está mais além. Esses são os argumentos a priori que permitem rejeitar a percepção como um instrumento válido para se conhecer a Realidade ou Deus. A experiência de tranquilidade demonstra, também, que não podemos alcançar o estado de Bem-aventurança, que é a Realidade e o ideal em si mesmo (conforme foi mostrado nos capítulos anteriores), enquanto não nos colocarmos, em grau considerável, acima do inquieto estado perceptivo. Quanto mais nos afastarmos das perturbadoras percepções sensoriais e dos pensamentos internos, tanto maior será a possibilidade de surgir em nós a consciência supramental de Bem- aventurança, a Beatitude Divina. Na experiência corrente, a percepção comum e a Bem-aventurança parecem excluir-se mutuamente. Todavia, nenhum desses métodos baseia-se na percepção pura, por isso carece de importância a incapacidade desta última para conhecer a Realidade. 2. Inferência Este é outro meio de obter o conhecimento do mundo. Entretanto, a inferência em si baseia-se na experiência ou percepção, seja ela indutiva ou dedutiva. Em nossa experiência, onde quer que exista fumaça há fogo; logo, toda vez que vemos fumaça deduzimos que há fogo. Essa é uma inferência dedutiva. Só é possível porque nossa experiência anterior, baseada na percepção, indica que a fumaça está associada com o fogo. A inferência indutiva depende, igualmente, da percepção. Observamos que certo tipo de bacilo é a causa do cólera. Descobrimos a relação causal entre a presença desse tipo de bacilo e o cólera e, de imediato, inferimos indutivamente que onde quer que esse bacilo apareça o cólera estará presente. Embora haja aqui um salto dos casos conhecidos de cólera aos casos desconhecidos, esse tipo de inferência não nos leva a qualquer fato novo, ainda que os casos sejam novos. A possibilidade mesma de estabelecer uma relação causal entre certos bacilos e o cólera baseou-se na observação, quer dizer, na percepção de dois casos específicos. Portanto, a inferência depende, em última análise, da percepção. Nos casos inferidos não chegamos a qualquer verdade nova, nada realmente novo que não tenha sido encontrado nos casos observados. Nestes, os bacilos são seguidos pelo cólera e, nos casos inferidos, também os bacilos são seguidos pelo cólera; não houve qualquer verdade nova, embora os casos sejam novos e inéditos. Não importa que tipo de pensamento, raciocínio, inferência ou imaginação empreguemos, eles não nos levam a encarar face a face a Realidade. A razão ou o pensamento podem organizar e sistematizar os fatos da experiência. Podem procurar ver as coisas como um todo. Podem tentar esclarecer o mistério do mundo. Seus esforços, porém, são dificultados pelos elementos com que trabalham: os dados da experiência, as impressões dos sentidos. São dados crus e grosseiros, desconexos, limitados por nossa capacidade de percepção. Nosso processo de pensamento, longe de ser beneficiado por esse elemento, é perturbado por ele, que flui em constante inquietude. O primeiro método religioso que destacamos é o intelectual, que utiliza o pensamento discursivo como meio para conhecer a Realidade, o estado de Bem- aventurança e de tranquila percepção. Mas ele fracassa. As percepções corporais nos perturbam; o processo do pensamento também, já que ele, operando com as variadas e inquietas percepções sensoriais, nos impede de permanecer por muito tempo em estado concentrado. Portanto, pelo intelecto, fracassamos em alcançar a consciência da unidade na diversidade. Um dos méritos do método intelectual, entretanto, está em que, quando estamos absortos no mundo dos pensamentos, de certo modo nos elevamos para além das sensações corporais; mas isso é sempre temporário. Nos dois outros métodos – o da devoção e o da meditação – oprocesso de pensamento é reduzido; contudo, está presente. No método da devoção (quer dizer, no culto ritualístico ou cerimonial e na oração coletiva ou individual), grande parte do processo do pensamento está ocupada no preparativo de condições favoráveis. Contudo, existe a tentativa de concentrar-se em algum objeto de culto ou oração. O método da devoção consegue ter êxito na medida em que a diversidade dos processos de pensamentos é detectada ou controlada. O defeito, porém, é este: devido a um mau hábito que tem se prolongado através dos séculos, nossa concentração não é profunda, deixando a possibilidade de que os diversos processos de pensamento voltem a agir diante da mais leve distração. No método da meditação, a concentração se fixa em um único objeto de pensamento (tendo sido dispensadas as formalidades exteriores, as convenções e os ritos, assim diminuindo a possibilidade de que os processos de pensamentos sejam postos em movimento com a mesma facilidade que no método da devoção). Existe então a tendência gradual de se abandonar a esfera do pensamento e entrar no domínio da intuição, que analisaremos a seguir. 3. Intuição Até aqui, analisamos os instrumentos e os processos para se conhecer este mundo sensório. A intuição, com que nos ocuparemos agora, é o processo pelo qual conhecemos o mundo suprassensório, o mundo que está além dos sentidos e dos pensamentos. É verdade que o suprassensório se expressa no sensório e através dele, e conhecer o último de maneira completa implica conhecer o primeiro, mas o processo para se conhecer os dois é diferente. Será que somos capazes de conhecer com precisão o mundo sensório em toda a sua plenitude apenas por meio da percepção e do pensamento? Seguramente que não. Inumeráveis são os fatos, fenômenos, conexões e leis da Natureza, inclusive de nosso próprio organismo, que ainda permanecem desconhecidos para a humanidade. Se não nos é possível conhecer plenamente o sensório sequer por meio da percepção e do pensamento, muito menos seremos capazes de conhecer o reino suprassensório mediante tais processos. A intuição nasce do interior; o pensamento, do exterior. A intuição proporciona a visão direta da Realidade; o pensamento oferece uma visão indireta. A intuição, graças a uma empatia especial, capta a Realidade em sua totalidade, enquanto o pensamento a divide em muitas partes. Todo ser humano tem o poder da intuição, bem como a capacidade de pensar. Assim como o pensamento pode ser cultivado, a intuição também pode ser desenvolvida. Por meio da intuição, sintonizamo-nos com a Realidade – com o mundo da Bem-aventurança, com a “unidade em meio à diversidade”, com as leis interiores que governam o mundo espiritual, com Deus. Como sabemos que existimos? Por meio da percepção sensorial? São os sentidos que nos dizem primeiro que existimos e deles nasce a consciência de existir? Isso é impossível, pois essa consciência baseia-se na intenção dos sentidos de nos dar a conhecer nossa existência. Se não temos consciência de que existimos no ato mesmo da percepção sensorial, não nos é possível tampouco tomar consciência de objeto algum por meio dos sentidos. A inferência – o processo do pensamento – nos diz que existimos? Seguramente que não, pois a matéria-prima do pensamento são as impressões sensoriais e estas, como já vimos, não nos podem dizer que existimos, uma vez que tal saber já está implícito nelas. Nem pode o processo do pensamento nos dar a consciência de existir, pois esta já está implícita naquele. Quando, ao nos compararmos com o mundo exterior, pensamos ou inferimos que existimos nele, a consciência de existir já está presente no próprio ato de pensar e inferir. Então, se os sentidos e o pensamento falham, como sabemos que existimos? É somente por meio da intuição que conhecemos esse fato. Tal saber é uma espécie de intuição, e está mais além dos sentidos e do pensamento; e estes últimos são possíveis graças ao primeiro. É muito difícil definir o que é a intuição, pois ela está muito próxima de cada um de nós. Todos a sentimos. Não sabemos o que é ter a consciência de existir? Todos a conhecem. Ela é tão familiar que nos é impossível defini-la. Perguntem a alguém como sabe que existe e ele permanecerá calado. Ele sabe, mas não pode definir. Poderá, talvez, tentar explicar, mas sua explicação não revelará o que sente no íntimo. Todo tipo de intuição tem essa mesma característica peculiar. O quarto método religioso, explicado no último capítulo, baseia-se na intuição. Quanto mais sinceros formos em relação a ela, tanto mais ampla e segura será a nossa visão da Realidade, que é Deus. É por meio da intuição que a humanidade alcança a Divindade, que o mundo sensório entra em conexão com o suprassensório, e que o suprassensório é sentido expressando-se no mundo sensório e através dele. A influência dos sentidos desaparece, os pensamentos intrusos se desvanecem, a Bem- aventurança Divina é percebida; a consciência de “todos em Um e Um em todos” floresce em nós. Todos os grandes sábios e profetas do mundo tinham essa intuição. O terceiro método, o da meditação, explicado na Parte 4, quando é praticado com seriedade também nos leva à esfera da intuição. Mas ele tem seus rodeios e, ordinariamente, exige um tempo maior para produzir em nós os estados sucessivos do processo intuitivo ou de realização. Por meio da intuição, Deus pode ser experimentado em todos os Seus aspectos Assim, é pela intuição que Deus pode ser experimentado em todos os Seus aspectos. Não temos qualquer outro sentido que possa revelar o conhecimento Dele. Os sentidos proporcionam apenas o conhecimento das manifestações divinas. Nem o pensamento ou a inferência nos podem capacitar a conhecer Deus como Ele verdadeiramente é. Pois o intelecto não pode transcender os dados dos sentidos. Só pode organizar e interpretar as impressões sensoriais. Já que os sentidos são incapazes de nos levar a Deus, o pensamento – que depende deles – é também incapaz de nos conduzir a Ele. Portanto, é para a intuição que teremos de nos voltar para conhecer Deus como Bem-aventurança e Seus outros aspectos. Há, todavia, muitos obstáculos a essa visão intuitiva, muitas barreiras para a percepção da verdade. Eis algumas delas: a doença, a incapacidade mental, a dúvida, a indolência, o mundanismo, os falsos conceitos e a instabilidade. Esses obstáculos ou são inerentes à associação com as pessoas, ou são gerados e agravados por tal associação. Nossas tendências intrínsecas (samskaras) para com certos defeitos podem ser superadas pelo esforço resoluto (purushakara). Pelo exercício da força de vontade, podemos remover todas as nossas deficiências. É pelo esforço correto e pela associação com pessoas boas, devotadas a Deus, que podemos erradicar os maus hábitos e formar os bons. Até que nos associemos com aqueles que viram, sentiram e experimentaram a verdadeira religião em sua vida, não poderemos saber plenamente o que ela é e em que reside sua universalidade e necessidade. O espírito de investigação está em todos. Neste mundo, todos estão buscando a verdade. É sua herança imortal, e eles a procuram cegamente ou com sabedoria, até tê-la recuperado em sua plenitude. Nunca é tarde demais para nos reformarmos. “Buscai, e encontrareis; batei, e abrir-se-vos-á.”¹ Um dos primeiros encontros dirigidos por Paramahansa Yogananda na Sede Internacional da SRF em Los Angeles, 1925. Sede Internacional da Self-Realization Fellowship, 1982. 1 Mateus 7:7. A respeito do autor Os ideais do amor por Deus e de serviço à humanidade manifestaram-se plenamente na vida de Paramahansa Yogananda. (…) Embora tenha passado fora da Índia a maior parte de sua vida, seu lugar é entre os nossos grandes santos. Sua obra continua a crescer e a luzir cada vez mais, sempre com maior brilho, levando pessoas de todos os recantos para o caminho da peregrinação em busca do Espírito. Excerto da homenagem feita pelo Governo da Índia ao lançar um selo comemorativo de Paramahansa Yogananda por ocasião do 25ºaniversário de seu falecimento. Paramahansa Yogananda nasceu em 5 de janeiro de 1893, com o nome de Mukunda Lal Ghosh, no norte da Índia, na cidade de Gorakhpur, nos contrafortes das montanhas do Himalaia. Desde os primeiros anos, ficou evidente que sua vida estava marcada por uma destinação divina. Segundo os que lhe eram mais íntimos, mesmo em criança a profundeza da sua percepção e experiência do mundo espiritual estava muito além do comum. Na juventude, ele procurou muitos sábios e santos da Índia, esperando encontrar um mestre iluminado que o guiasse em sua busca espiritual. Foi em 1910, com a idade de 17 anos, que ele conheceu o venerado Swami Sri Yukteswar e dele se tornou discípulo. No eremitério desse grande mestre de Yoga, ele passou a melhor parte dos dez anos seguintes, recebendo a estrita, porém amorosa, disciplina espiritual de Sri Yukteswarji. Em 1915, após diplomar-se pela Universidade de Calcutá, fez os votos formais como monge da venerável Ordem monástica indiana dos Swamis, e nessa ocasião recebeu o nome de Yogananda (que significa bem-aventurança, ananda, por meio da união divina, yoga). Em 1917, Sri Yogananda iniciou o trabalho de sua vida com a fundação de uma escola da “arte de viver” para meninos, em que modernos métodos educacionais combinavam-se com treinamento em yoga e educação nos ideais espirituais. Três anos depois, ele foi convidado para ser representante da Índia em um Congresso Internacional de Religiosos Liberais que se realizaria em Boston. Seu discurso no Congresso a respeito do tema “A Ciência da Religião” foi recebido com entusiasmo. Nos diversos anos que se seguiram, ele ministrou conferências e ensinou na costa leste dos Estados Unidos e, em 1924, empreendeu uma viagem transcontinental para dar conferências. Em janeiro de 1925, em Los Angeles, deu início a uma série de palestras e aulas, com duração de dois meses. Como em toda a parte, suas palestras foram acolhidas com interesse e aplauso. Narrou o Los Angeles Times: “O Philharmonic Auditorium apresenta o espetáculo extraordinário de milhares de pessoas (…) sendo informadas de que não poderiam entrar, uma hora antes da divulgada abertura de uma conferência, com o auditório de 3.000 lugares completamente lotado.” No final daquele ano, Sri Yogananda estabeleceu em Los Angeles a sede internacional da Self-Realization Fellowship, a organização que fundara, em 1920, para disseminar seus ensinamentos a respeito da antiga ciência e filosofia da Yoga e de seus métodos imemoriais de meditação.¹ Por toda a década seguinte, ele viajou extensivamente, falando nas principais cidades de todo o país. Entre os que se tornaram seus estudantes, muitos eram figuras de destaque na ciência, nos negócios e nas artes, incluindo o horticultor Luther Burbank, o soprano do Metropolitan Amelita Galli-Curci, Margaret Wilson, filha do presidente Woodrow Wilson, o poeta Edwin Markham e o maestro Leopoldo Stokowsky. Após uma viagem de 18 meses pela Europa e pela Índia, em 1935-36, ele começou a afastar-se um pouco de suas conferências públicas por toda a nação, de modo a poder dedicar-se à edificação de um alicerce permanente à sua obra mundial, bem como aos seus escritos, que haveriam de levar sua mensagem às gerações futuras. A história de sua vida, Autobiografia de um Iogue, foi publicada em 1946. Permanentemente reeditado desde então, esse livro vem sendo traduzido para muitos idiomas, tendo alcançado renome como um clássico da literatura espiritual moderna. Hoje, a obra humanitária e espiritual iniciada por Paramahansa Yogananda continua sob a direção de Irmão Chidananda, presidente da Self-Realization Fellowship/Yogoda Satsanga Society of India.² Além de publicar as conferências, obras e palestras informais de Paramahansa Yogananda (inclusive a série abrangente das Lições da Self-Realization Fellowship para estudo por correspondência), a sociedade orienta os membros da Self-Realization em sua prática dos ensinamentos de Sri Yogananda, supervisiona templos, retiros e centros em todo o mundo bem como as comunidades monásticas da Self- Realization, e coordena um Círculo Mundial de Orações, que serve como um instrumento que ajuda a curar os que têm alguma carência física, mental ou espiritual e a produzir maior harmonia entre as nações. Desde o seu falecimento em 1952, Paramahansa Yogananda veio a ser reconhecido como uma das personalidades espirituais realmente grandes do século 20. Através de seus ensinamentos universais e de sua vida exemplar, ele tem auxiliado pessoas de todas as raças, culturas e credos a compreender e expressar, mais plenamente, em suas próprias vidas, a beleza e a nobreza do espírito humano. Em um artigo a respeito da vida e da obra de Sri Yogananda, Dr. Quincy Howe Jr., professor de idiomas antigos do Scripps College, escreveu: “Paramahansa Yogananda trouxe para o Ocidente não apenas a promessa eterna da realização divina que a Índia nos oferece, mas também um método prático pelo qual os que aspiram à espiritualidade, em todos os caminhos da vida, podem perseguir essa meta com rapidez. Apreciado no Ocidente, inicialmente, apenas em nível mais elevado e abstrato, o legado espiritual da Índia está agora acessível como experiência prática para todos aqueles que anelam por conhecer Deus, não no além, mas aqui e agora. (…) Yogananda pôs ao alcance de todos os métodos de contemplação mais elevados.” 1 O caminho específico de meditação e comunhão com Deus, ensinado por Paramahansa Yogananda, é conhecido por Kriya Yoga, uma sagrada ciência espiritual originada há milênios na Índia. O livro Autobiografia de um Iogue, de Sri Yogananda, oferece uma introdução geral à filosofia e aos métodos de Kriya Yoga. Instruções minuciosas quanto às técnicas são postas à disposição dos estudantes das Lições da Self-Realization Fellowship que se qualifiquem a recebê-las. 2 Na Índia, a obra de Paramahansa Yogananda é conhecida pelo nome de Yogoda Satsanga Society. Paramahansa Yogananda: um iogue na vida e na morte Paramahansa Yogananda entrou em mahasamadhi (a derradeira vez que um iogue abandona conscientemente seu corpo) em Los Angeles, Califórnia, em 7 de março de 1952, após concluir seu discurso num banquete em homenagem a Sua Excelência Binay R. Sen, embaixador da Índia. O grande instrutor mundial demonstrou o valor da yoga (técnicas científicas para chegar à realização divina) não apenas em vida, como também na morte. Semanas após haver partido, sua face inalterada brilhava com o divino esplendor da incorruptibilidade. O Sr. Harry T. Rowe, diretor do Cemitério de Forest Lawn, de Los Angeles (onde o corpo do grande mestre jaz temporariamente), enviou à Self-Realization Fellowship uma carta autenticada da qual se extraem os seguintes trechos: “A ausência de quaisquer sinais visíveis de decomposição no cadáver de Paramahansa Yogananda constitui o mais extraordinário caso de nossa experiência. (…) Nenhuma desintegração física era visível no corpo, mesmo vinte dias após a morte. (…) Nenhum indício de bolor revelava-se em sua pele e nenhum dessecamento (secagem) ocorreu nos tecidos orgânicos. Tal estado de preservação perfeita de um corpo, até onde vão nossos conhecimentos dos anais mortuários, não tem paralelo. (…) Ao receber o corpo de Yogananda, os funcionários do cemitério esperavam observar, através da tampa de vidro do ataúde, os costumeiros e progressivos sinais de decomposição física. Nossa admiração crescia à medida que os dias passavam sem trazer qualquer mudança visível no corpo em observação. O corpo de Yogananda estava aparentemente num estado fenomenal de imutabilidade. “Nenhum odor de decomposição emanou de seu corpo em qualquer momento. (…) A aparência física de Yogananda em 27 de março, pouco antes de ser colocada a tampa de bronze no ataúde, era a mesma de 7 de março. Ele parecia, em 27 de março, tão cheio de frescor e intocado pela corruptibilidade como na noite de sua morte. Em 27 de março não havia, em absoluto, motivo para se afirmar que seu corpo houvesse sofrido qualquer desintegraçãofísica visível. Por essas razões, declaramos novamente que o caso de Paramahansa Yogananda é único em nossa experiência.” Recursos adicionais aos ensinamentos de Kriya Yoga de Paramahansa Yogananda A Self-Realization Fellowship dedica-se a auxiliar sem restrições os que buscam a verdade em todo o mundo. Para informações a respeito de nossas séries anuais de aulas e conferências públicas, meditações e serviços inspiradores em nossos templos e centros em todo o mundo, agendamento de retiros e outras atividades, convidamos o leitor a visitar nosso website ou nossa Sede Internacional: www.yogananda.org Self-Realization Fellowship 3880 San Rafael Avenue Los Angeles, CA 90065-3219 USA Tel.: +1 (323) 225-2471 Fax: +1 (323) 225-5088 https://yogananda.org/pt/ Lições da Self-Realization Fellowship Orientação pessoal e instruções de Paramahansa Yogananda acerca das técnicas de meditação iogue e princípios de uma vida espiritual Se você se sentiu atraído pelas verdades espirituais apresentadas em A Ciência da Religião, está convidado a inscrever-se para receber as Lições da Self- Realization Fellowship. Durante suas viagens, Paramahansa Yogananda ministrou aulas aos aspirantes à verdade que estavam interessados num estudo mais profundo de seus ensinamentos. Essas instruções pessoais foram mais tarde compiladas, sob sua orientação, numa série especial de Lições da Self-Realization Fellowship. Paramahansa Yogananda criou esta série de lições para estudo em casa, a fim de dar aos buscadores sinceros da verdade a oportunidade de aprenderem e praticarem as antigas técnicas de meditação iogue apresentadas neste livro – inclusive a ciência de Kriya Yoga. As Lições também contêm a orientação prática dele para que se alcance o bem-estar físico, mental e espiritual. As Lições da Self-Realization Fellowship estão disponíveis a uma taxa nominal (apenas para ajudar a cobrir os custos de impressão e correio). A todos os estudantes é dada, gratuitamente, por monges e monjas da Self-Realization Fellowship, orientação pessoal em sua prática. Para mais informações… Para solicitar um pacote abrangente de informações suplementares sobre as Lições, visite www.srflessons.org. Objetivos e Ideais da Self-Realization Fellowship Estabelecidos por Paramahansa Yogananda, Fundador Irmão Chidananda, Presidente Disseminar entre as nações o conhecimento de técnicas científicas definidas para atingir a experiência pessoal e direta de Deus. Ensinar que o propósito da vida é a evolução, mediante o esforço pessoal, da consciência mortal limitada do homem para a Consciência de Deus e, para esse fim, estabelecer templos da Self-Realization Fellowship, no mundo todo, para a comunhão com Deus, e estimular o estabelecimento de templos individuais para Deus nos lares e nos corações dos homens. Revelar a unidade básica e a completa harmonia entre o Cristianismo original ensinado por Jesus Cristo e a Yoga original ensinada por Bhagavan Krishna, e mostrar que esses princípios da verdade são o fundamento científico comum de todas as verdadeiras religiões. Apontar a divina e única estrada preferencial para a qual todas as sendas das verdadeiras crenças religiosas levam afinal: a estrada da meditação em Deus, diária, científica e devocional. Libertar o homem de seu tríplice sofrimento: a doença física, as desarmonias mentais e a ignorância espiritual. Estimular o “viver com simplicidade e pensar com elevação” e difundir o espírito de fraternidade entre todos os povos, ensinando-lhes o eterno alicerce de sua unidade: a filiação a Deus. Demonstrar a superioridade da mente sobre o corpo, e da alma sobre a mente. Vencer o mal com o bem, a tristeza com a alegria, a crueldade com a afabilidade, a ignorância com a sabedoria. Unir a ciência e a religião mediante a compreensão da unidade de seus princípios subjacentes. Preconizar a compreensão cultural e espiritual entre o Oriente e o Ocidente e o intercâmbio de suas características distintivas mais refinadas. Servir a humanidade como seu próprio Eu ampliado. Também publicada pela Self-Realization Fellowship… Autobiografia de um Iogue Esta consagrada autobiografia apresenta o retrato fascinante de um dos maiores vultos espirituais contemporâneos. Com envolvente franqueza, eloquência e fino humor, Paramahansa Yogananda narra as passagens inspiradoras de sua vida: as experiências de sua infância extraordinária, os encontros com muitos santos e sábios durante sua busca na juventude, por toda a Índia, de um instrutor iluminado, os dez anos de treinamento no eremitério de um respeitado mestre iogue e os trinta anos que viveu – e durante os quais ensinou – na América. Registra também seus encontros com Mahatma Gandhi, Rabindranath Tagore, Luther Burbank, a estigmatizada católica Theresa Neumann e outras personalidades espirituais do Oriente e do Ocidente. A Autobiografia de um Iogue é, a um tempo, belo relato de uma vida excepcional e introdução profunda à ciência milenar da yoga, com sua tradição imemorial de meditação. O autor explica claramente as leis sutis, mas definidas, implícitas tanto nos fatos corriqueiros da vida cotidiana quanto nos acontecimentos extraordinários que costumam ser chamados milagres. A história absorvente de sua vida se torna, então, o pano de fundo de um exame penetrante e inesquecível dos mistérios supremos da existência humana. Publicado em 1946 e ampliado por Paramahansa Yogananda em 1951, o livro tem sido reimpresso permanentemente pela Self-Realization Fellowship. Considerada um clássico espiritual moderno, a obra já foi traduzida em mais de 50 idiomas e é amplamente utilizada como livro de texto e de referência em escolas e universidades. Esta edição completa é a única que reúne todas as modificações que o autor desejou para a versão final do texto, inclusive o extenso material que ele acrescentou à edição original de 1946. Best-seller permanente desde sua primeira edição, há mais de 70 anos, a Autobiografia de um Iogue tem conquistado o coração de milhões de leitores ao redor do mundo. “Um raro relato.” The New York Times “Um estudo fascinante comentado com clareza.” Newsweek “Mantenho exemplares da Autobiografia de um Iogue espalhados pela casa e constantemente a dou de presente a pessoas que precisam mudar de vida. Eu digo: Leia isto, porque este livro toca o coração de todas as religiões.” George Harrison “Jamais houve, em inglês ou em qualquer outra língua europeia, algo como esta apresentação da Yoga.” Columbia University Press Outros livros de Paramahansa Yogananda Disponíveis nas livrarias ou por intermédio da: Distribuidora Omnisciência www.omnisciencia.com.br A Eterna Busca do Homem O Romance com Deus Jornada para a Autorrealização Deus Fala com Arjuna: O Bhagavad Gita (Volumes I e II) A Segunda Vinda de Cristo: A ressurreição do Cristo interior https://www.omnisciencia.com.br (Volumes I, II e III) A Yoga do Bhagavad Gita A Yoga de Jesus Afirmações Científicas de Cura Meditações Metafísicas Onde Existe Luz: Discernimento e inspiração para enfrentar os desafios da vida No Santuário da Alma: Como orar para obter a resposta divina Paz Interior: Como ser calmamente ativo e ativamente calmo Assim Falava Paramahansa Yogananda A Lei do Sucesso Como Falar com Deus Viva Sem Medo Para Ser Vitorioso na Vida Por Que Deus Permite o Mal e Como Superá-lo Livros de outros autores Swami Sri Yukteswar A Ciência Sagrada Sri Daya Mata “Só o Amor”: Como viver espiritualmente num mundo em transformação No Silêncio do Coração: Como criar um relacionamento amoroso com Deus Intuição: Orientação da alma para as decisões da vida Coleção “A Arte de Viver” Livretos contendo palestras de Paramahansa Yogananda ou de discípulos seus Paramahansa Yogananda A Cura pelo Poder Ilimitado de Deus Mrinalini Mata O Relacionamento Guru-Discípulo Irmão Anandamoy Casamento Espiritual Coleção Infantojuvenil Dois Sapos em Apuros (Baseado numa fábula narrada por Paramahansa Yogananda) DVD (documentário)da filosofia e do método da Yoga) e o pensamento de Shânkara (a mente mais larga que já habitou um corpo mortal). Essa é a deliberada declaração de alguém que afinal encontrou no Oriente, após muitas perambulações, a solução para os enigmas do universo. Os hindus revelaram a Verdade ao mundo inteiro. E isso não nos pode senão parecer natural, se considerarmos que há mais de cinco mil anos, quando os ancestrais de bretões e gauleses, de gregos e latinos, vagavam pelas imensas florestas da Europa à procura de alimento, em plena barbárie, os hindus já se dedicavam a meditar no mistério da vida e da morte, que agora sabemos que são uma e a mesma coisa. O aspecto essencial a ser destacado a respeito do ensinamento de Paramahansa Yogananda, em contraposição ao dos filósofos europeus como Bergson, Hegel e outros, é que não é especulativo, porém prático, mesmo quando trata das mais elevadas esferas da metafísica. O motivo é que, em toda a humanidade, somente os hindus penetraram além do véu e obtiveram o conhecimento que, na verdade, não é meramente filosófico (quer dizer, amante da sabedoria), mas é a própria sabedoria. Pois, quando expresso em termos de dialética verbal, tal conhecimento se vê forçosamente exposto à crítica dos filósofos, cuja vida, conforme diz Platão, há de ser constantemente dedicada à discussão. A verdade não pode ser expressa em palavras, e quando estas são usadas, mesmo por um Shânkara, as mentes aguçadas podem sempre encontrar um ponto fraco para atacar. Com efeito, o finito não pode conter o infinito. A Verdade não é uma eterna discussão; é a Verdade. Segue-se daí que somente por meio da autêntica experiência pessoal – obtida pela prática de um método semelhante ao que Paramahansa Yogananda oferece – pode a Verdade chegar a ser conhecida para além de qualquer dúvida. Todo mundo deseja a bem-aventurança – como Paramahansaji afirma e prova –, mas a maioria tem sido enganada pelo desejo de prazer. O próprio Buda afirmou com a máxima clareza que é o desejo, perseguido de forma ignorante, que leva ao pântano do sofrimento no qual a imensa maioria da humanidade em vão se debate. Entretanto, Buda não ensinou, com a mesma clareza, o quarto dos quatro métodos para se alcançar o estado de bem-aventurança que todos almejamos. Esse quarto método é de longe o mais fácil, embora necessite, para sua aplicação prática, da orientação de um perito. Esse perito encontra-se agora entre nós, para dar ao Ocidente a técnica, as regras simples que foram legadas há séculos pelos antigos filósofos da Índia e que levam à realização ou ao estado de permanente bem-aventurança. Esse contato direto é sempre destacado, tanto na doutrina quanto na prática hindu, como de grande importância. Até hoje, permanece fora do alcance de todos, exceto daqueles afortunados que vivem na Índia. Agora que a temos no Ocidente, tão perto, seria em verdade pouco sensato rejeitar ou deixar de submeter à prova uma prática que, por si mesma, é intensamente bem- aventurada – “muito mais bem-aventurança pura do que o maior prazer que qualquer um dos cinco sentidos ou a mente podem jamais nos proporcionar”, conforme Paramahansa Yogananda exatamente declara, acrescentando: “Não desejo dar a ninguém outra prova dessa verdade que não seja a proporcionada por sua própria experiência”. O primeiro passo pode ser dado com a leitura deste pequeno livro; os outros necessários para alcançar o supremo estado de bem-aventurança se seguirão naturalmente. Concluo citando algumas linhas de minha obra John of Damascus, na qual procuro sugerir, em forma poética, o que se expõe neste livro. Fala o Buda – que para nós é Paramahansa Yogananda, uma vez que “Buddha” significa simplesmente “Aquele que sabe”: Há tanto – ele canta –, há tanto tenho vagado, Sob grilhões, muitas vidas sofrendo, Incontáveis dores, garras do passado, De feroz desejo, a alma ardendo. Encontrei – ele canta – a Causa, encontrada, Da alma ardendo, do desejo tresloucado. A mim, ó Arquiteto, nenhuma morada Nem novo lar será edificado. Tuas vigas sucumbiram, arrasadas. Nada restou inteiro, tão destroçado: E outra morada não me darás como legado. Meu é o Nirvana, meu; é logo ali, Tão perto, foi assim que o vi. E agora, sim, basta querer, agora, Eternamente livre, sem demora, Incógnito, da bem-aventurança desfrutar, Dentro de mim, em todo lugar. Pelo amor, porém, pelo amor fiquei, Servindo ao mundo, a meus irmãos, Uma ponte ergui, co’as próprias mãos, Se a cruzares, também deixarás Nascimento, morte e dor para trás, E bem-aventurança eterna terás. O construtor da ponte encontra-se entre nós. Com as próprias mãos, erguerá a ponte, se realmente quisermos que o faça. Londres, Inglaterra Fevereiro de 1927 Prólogo Uma espiritualidade universal para a civilização global que se aproxima Introdução a esta edição especial de “A Ciência da Religião” para comemorar o 100 aniversário da chegada de Paramahansa Yogananda ao Ocidente e da fundação de sua associação internacional, a Self-Realization Fellowship. Em 19 de setembro de 1920 chegou ao Porto de Chelsea, em Boston, o City of Sparta, o primeiro navio a vapor a sair da Índia para a América após o término da Primeira Guerra Mundial. Entre os passageiros que desembarcavam estava uma “figura pitoresca”, como descreveu o The Boston Globe, que “veio participar de uma conferência religiosa em Boston e mais tarde planeja fazer uma ciclo de palestras pelo país”. Praticamente desconhecido na América à sua chegada, Paramahansa Yogananda mais tarde se tornaria conhecido como “o pai da Yoga no Ocidente”. Trezentos anos antes, no outono de 1620, os Pais Peregrinos da América haviam desembarcado ao sul de Boston, em Plymouth. Sua chegada resultou no nascimento de uma nova nação, que proclamou a liberdade religiosa como um direito inalienável do povo. Para comemorar o trigésimo aniversário deste acontecimento, a American Unitarian Association organizou o “Encontro do Tricentenário dos Peregrinos” no Congresso Internacional de Religiosos Liberais, que começaria no início de outubro de 1920 com o intuito de discutir, do ponto de vista religioso, o significado da liberdade. Foi a essa conferência histórica que o jovem Swami Yogananda havia sido convidado. Ele falaria sobre o tema da ciência da religião e abordaria a mais elevada liberdade do homem: aquela que vem da percepção da unidade eterna e imutável da alma com Deus. Entre os organizadores do evento estava Charles Wendte, um ministro unitário americano que esteve envolvido na criação do Parlamento das Religiões do Mundo em Chicago em 1893 e que, juntamente com outros líderes unitários, pioneiros neste novo esforço, foi bem-sucedido em atrair delegados religiosos de outras tradições religiosas do mundo inteiro. Wendte e os outros organizadores do Congresso apelavam para a criação de uma base para uma “Liga das Religiões, que será a contrapartida e aliada da Liga das Nações de natureza política”. Tal visão tinha muito em comum com o próprio Paramahansa Yogananda. Em seu discurso aos delegados do Congresso, o swami ressaltaria a espiritualidade universal subjacente a todas as religiões, e alguns anos depois ele invocaria “uma Liga de Almas e um Mundo Unido [...] em que todas as nações façam parte de maneira proveitosa, guiadas por Deus, por meio da consciência iluminada do homem”. Swami Yogananda fora convidado a participar do Congresso de 1920 por intermédio do Dr. Heramba Maitra, professor do City College de Calcutá, que tinha se programado para ir como representante do Brahmo Samaj (um movimento de reforma religiosa e social na Índia que ajudou a moldar o Renascimento de Bengala), mas teve que cancelar a viagem por motivo de doença. “No lugar dele [Dr. Maitra],” registrou o New Pilgrimages of the Spirit, “Swami Yogananda Giri, representando o teísta Brahmacharya Sanghashram, participou de nossas conferências e fez um marcante discurso […].” A publicação também registrou: “Em inglês fluente e vigorosa expressão, [Yogananda] fez uma palestra de caráterAWAKE: A Vida de Yogananda Um filme de CounterPoint Films O catálogo completo das publicações da Self-Realization Fellowship, incluindo CDs e DVDs, está disponível em nosso website ou pode ser solicitado diretamente à nossa Sede Internacional. Self-Realization Fellowship 3880 San Rafael Avenue • Los Angeles, CA 90065-3219 USA Tel.: +1 (323) 225-2471 Fax: +1 (323) 225-5088 www.srfbooks.org https://bookstore.yogananda-srf.org/product-category/otherlanguages/portugues_portuguese/ Cover Page A Ciência da Religião Direito autoral A Respeito deste Livro Índice Prefácio Prólogo Introdução PARTE 1: A universalidade, necessidade e unidade da religião O objetivo comum da vida Definição universal de religião O que significa ser religioso A religião nos “liga” às leis benevolentes Religião é questão de fundamentos A Religião Universal é pragmaticamente necessária PARTE 2: Dor, prazer e Bem-aventurança: suas diferenças A causa fundamental da dor e do sofrimento As causas imediatas da dor O prazer é uma consciência dúplice Confundir os meios com o fim A consciência de Bem-aventurança surge do rompimento da identificação com o corpo PARTE 3: Deus como Bem-aventurança O motivo comum de todas as ações Apenas a consciência de Bem-aventurança pode efetivamente apaziguar a excitação Que é Deus? A prova da existência de Deus está dentro de nós A religião só se torna universalmente necessária quando Deus é concebido como Bem-aventurança Em Deus ou consciência de Bem-aventurança nossas aspirações espirituais se realizam A vida: grande peça teatral PARTE 4: Quatro métodos fundamentais de realização divina A necessidade de métodos religiosos O “Filho de Deus” e o “filho do homem” A origem do sectarismo Quatro Métodos Religiosos Fundamentais 1. O método do intelecto 2. O método da devoção 3. O método da meditação 4. O método científico ou Yoga Explicação fisiológica do método científico A prática do método científico resulta em libertar-se das distrações corporais e mentais A prática continuada do método científico leva à consciência de Bem-aventurança ou Deus O método científico trabalha diretamente com a força vital PARTE 5: Os instrumentos do conhecimento e a validez teórica dos métodos religiosos Os Três Instrumentos Do Conhecimento 1. Percepção 2. Inferência 3. Intuição Por meio da intuição, Deus pode ser experimentado em todos os Seus aspectos A respeito do autor Paramahansa Yogananda: um iogue na vida e na morte Recursos adicionais aos ensinamentos de Kriya Yoga de Paramahansa Yogananda Lições da Self-Realization Fellowship Objetivos e Ideais da Self-Realization Fellowship Autobiografia de um Iogue Outros livros de Paramahansa Yogananda Livros de outros autores Coleção “A Arte de Viver” Coleção Infantojuvenilfilosófico sobre ‘A Ciência da Religião’ […]. A religião, ele sustentou, é uma só e universal. Talvez não seja possível universalizar costumes e convenções particulares, mas o elemento comum nas religiões pode ser universalizado, e a todos podemos pedir que o sigam e cumpram. Na medida em que Deus é um só, necessário a todos nós, também a religião é uma só, necessária e universal. É apenas o ponto de vista humano, limitado, que fecha os olhos para o elemento universal subjacente às assim chamadas diferentes religiões do mundo.” O discurso de Yogananda, que ocorreu em 6 de outubro de 1920, na Unity House, perto da câmara municipal de Boston, foi um dos acontecimentos mais significativos na história da aceitação e compreensão, pela América, da ciência indiana da Yoga, na medida em que marcou o começo do trabalho do “homem que mais do que ninguém tornou [a Yoga] acessível ao Ocidente”.¹ O jovem e vibrante swami da Índia não tinha por objetivo converter seus ouvintes ao Hinduísmo ou a qualquer outra religião. Em vez disso, ele abordava a ciência universal que fundamenta e unifica todos os caminhos religiosos e dizia que cada indivíduo, independentemente de sua filiação sectária, poderia efetivamente experimentar Deus como uma realidade viva em sua vida. Seu discurso tocou um ponto sensível em Boston: aqui estava o que os transcendentalistas da Nova Inglaterra haviam procurado em sua solidão e contemplação algumas décadas antes – uma liberdade maior do que a libertação social e política, uma experiência da Divindade que não dependia de credos ou dogmas. Ele estava apresentando aos ocidentais um conceito inteiramente novo do propósito da religião, do propósito mesmo da vida – como remover permanentemente a dor e o sofrimento e encontrar a felicidade duradoura como Bem-aventurança, a presença de Deus na própria pessoa. E mostrava uma metodologia passo a passo pela qual toda pessoa poderia experimentar por si mesma essa Bem-aventurança: a meditação de Yoga, a universal ciência da alma, originária da Índia. Foi nesse discurso histórico, a partir do qual se desenvolveu o presente livro, que Yogananda falou pela primeira vez a um público ocidental sobre a eficácia da meditação de Kriya Yoga para alcançar essa meta universal. Suas palestras subsequentes sobre o assunto receberiam cobertura da mídia em todos os principais jornais dos EUA e atrairiam milhares de buscadores que lotavam os maiores auditórios do país para aprender, com esse orador divinamente carismático, a antiga “ciência da alma”. No mesmo ano de sua histórica chegada ao Ocidente, Yogananda fundou a organização que mais tarde denominaria Self-Realization Fellowship (SRF) para difundir os ensinamentos de Kriya Yoga em todo o mundo. Seus esforços incessantes para promover a universalidade da religião e ensinar a suprema ciência da religião tiveram um profundo impacto em todo o tecido da vida religiosa e espiritual do Ocidente. Anos mais tarde, ao narrar a história do Congresso de 1920, a Associação Internacional de Religiosos Liberais (como o Congresso de Religiosos Liberais é conhecido hoje) escreveu: “Um dos palestrantes proeminentes deste congresso que reuniu mais de duas mil pessoas foi Paramahansa Yogananda, que hoje é altamente respeitado na Índia e reverenciado em todo o mundo como um santo. Yogananda […] trabalhou ininterruptamente, de 1920 a 1952, para promover o entendimento entre Oriente e Ocidente […]. Dos líderes religiosos do Oriente que viveram e trabalharam no Ocidente, foi um dos mais influentes e respeitados. Durante os 32 anos que se seguiram, ele foi um dos grandes pioneiros do encontro entre Oriente e Ocidente e continua sendo, hoje, um instrutor espiritual amado por milhões de pessoas.” Desde que desembarcou em solo americano, ele trabalhou incansavelmente para trazer a mais elevada sabedoria e as supremas técnicas de meditação da Índia aos buscadores ao redor do mundo, lançando os alicerces para o início de uma nova civilização global baseada nos princípios eternos da espiritualidade universal, em que cada homem e mulher tem o potencial de se comunicar pessoalmente com Deus, trazendo assim uma consciência maior e mais iluminada para os interesses cívicos, nacionais e internacionais da família humana. Ao celebrarmos o histórico centenário da chegada de Paramahansa Yogananda ao Ocidente e da fundação de sua associação, a Self-Realization Fellowship, é com este mesmo sentimento de esperança – por todos aqueles que seguem sinceramente o caminho de Kriya Yoga e pela humanidade em geral – que entramos com alegria e entusiasmo nos próximos 100 anos da SRF, nos quais um número cada vez maior de buscadores da Verdade irá descobrir os métodos espirituais universais para alcançar a liberdade suprema: a libertação da alma. Self-Realization Fellowship 1 Robert S. Ellwood, Ph.D., Professor de Religião, Universidade do Sul da Califórnia, em Religious and Spiritual Groups in Modern America (Routledge, 1973). A CIÊNCIA DA RELIGIÃO Introdução O propósito deste livro é definir o que deve ser compreendido por religião, a fim de que possamos concebê-la como universal e pragmaticamente necessária. Também busca tratar daquele aspecto da concepção da Divindade que sustenta diretamente as motivações e os atos de cada minuto de nossa vida. É verdade que Deus é infinito em Sua natureza e aspectos; e é também verdade que, dentro das possibilidades da razão, pintar um quadro detalhado das características de Deus é pura evidência das limitações da mente humana em sua tentativa de sondá-Lo. Contudo, é igualmente verdade que a mente humana, apesar de todas as suas imperfeições, não pode se sentir plenamente satisfeita com o que é finito. Ela tem o anseio natural de interpretar o que é humano e finito à luz do que é sobre-humano e infinito – o que ela sente mas não pode expressar, o que interiormente acha-se implícito mas que, sob as circunstâncias, recusa tornar-se explícito. Nossa ideia comum de Deus é a de que Ele é sobre-humano, infinito, onipresente, onisciente e semelhantes qualificações. Nessa concepção geral há numerosas variações. Alguns dizem que Deus é pessoal, outros O veem como impessoal. Seja qual for a ideia que tenhamos de Deus, se ela não influencia nossa conduta diária, se nela a vida cotidiana não encontra inspiração e se ela não é universalmente necessária, tal concepção não tem utilidade. Se a ideia de Deus não for de tal maneira que não possamos dispensá-Lo na satisfação de uma carência, em nosso relacionamento com as pessoas, no ganhar dinheiro, na leitura de um livro, na prestação de um exame, no cumprimento das obrigações mais insignificantes ou mais relevantes, então é claro que não sentimos qualquer ligação entre Deus e a vida. Deus pode ser infinito, onipresente, onisciente, pessoal e misericordioso, mas tais concepções não bastam para nos estimular a procurar conhecê-Lo. Podemos muito bem passar sem Ele. Ele pode ser infinito, onipresente e assim por diante, mas não temos necessidade prática e imediata dessas concepções em nossa vida ocupada e corrida. Recorremos a essas concepções apenas quando procuramos justificar, em composições filosóficas ou poéticas, na arte ou em palestras idealistas, o anseio finito por algo transcendental; quando nós, com todo o nosso conhecimento presunçoso, não conseguimos explicar alguns dos fenômenos mais comuns do universo; ou quando as vicissitudes do mundo nos criam dificuldades. “Oramos ao Todo-misericordioso quando estamos em apuros”, diz a máxima oriental. Caso contrário, parece que vamos indo bem sem Ele, em nosso mundo rotineiro. Essas concepções estereotipadas parecem ser válvulas de segurança para o nosso pensamento humano encurralado. Oferecem uma explicação a respeito de Deus, mas não nos fazem buscá-Lo. Carecem de poder motivador. Não estamos necessariamente buscando Deus quando O chamamos de infinito, onipresente, todo-misericordioso e onisciente. Tais concepções satisfazem o intelecto, mas não confortam a alma. Se respeitadas e acalentadas em nossoscorações, podem nos expandir até certo ponto – podem nos moralizar e nos tornar resignados perante Ele. Mas não são suficientemente íntimas, e Deus não Se faz nosso. Elas O colocam distante das preocupações diárias do mundo. Tais concepções têm sabor exótico quando estamos na rua, na fábrica, atrás do balcão ou no escritório. Não porque estejamos realmente mortos para Deus e para a religião, mas porque nos falta uma concepção correta a respeito dos dois – uma concepção que possa entrelaçar-se com o tecido da vida cotidiana. O modo de conceber Deus deve ser para nós uma orientação diária, ou melhor, de cada hora. A própria ideia de Deus nos deve estimular a buscá-Lo em nossa vida cotidiana. É o que significa uma concepção pragmática e motivadora de Deus. Precisamos transferir Deus e a religião da esfera da crença para o âmbito da vida cotidiana. Se não acentuamos a necessidade de Deus em todo aspecto de nossa vida e o imperativo da religião em cada minuto de nossa existência, então Deus e a religião escapam da intimidade de nossa consideração diária, tornando-se apenas assunto de um dia da semana. A fim de compreendermos a real necessidade de Deus e da religião, devemos dar ênfase à concepção que seja mais relevante para o principal objetivo de nossas ações de cada dia e de cada hora. Este livro também pretende mostrar a universalidade e a unidade da religião. Diversas religiões têm surgido em diferentes épocas. Acaloradas controvérsias, guerras prolongadas e muito derramamento de sangue têm ocorrido por causa delas. Uma religião se ergue contra outra, uma seita luta contra outra. Não apenas existe uma diversidade de religiões, mas também uma ampla variedade de seitas e opiniões dentro da mesma religião. Surge, porém, a pergunta: “Se só existe um Deus, por que haveria tantas religiões?” Pode-se argumentar que os estágios particulares do crescimento intelectual e os tipos especiais de mentalidades correspondentes às diversas nações (devidos a diferentes condições geográficas e outras circunstâncias externas) determinam a origem das diversas religiões – como hinduísmo, islamismo e budismo para os asiáticos; cristianismo para os ocidentais, etc. Se por religião compreendemos apenas as práticas, doutrinas, dogmas, costumes e convenções particulares, então pode haver espaço para a existência de tantas religiões; mas se religião significa primordialmente consciência de Deus ou a experiência de Deus tanto dentro quanto fora de nós, e secundariamente um conjunto de crenças, doutrinas e dogmas, então, estritamente falando, só há uma religião no mundo, pois só existe um Deus. Os diferentes costumes, formas de culto, doutrinas e convenções podem ser considerados solos em que medram as diversas denominações e seitas incluídas nessa religião única. Se a religião é compreendida dessa maneira, então – e só então – pode sua universalidade ser defendida; pois talvez não nos seja possível universalizar costumes e convenções particulares. Apenas o elemento comum a todas as religiões pode ser universalizado, e a todos podemos pedir que o sigam e cumpram. Assim, poder-se-á verdadeiramente declarar que a religião não é somente necessária mas também universal. Todos podem seguir a mesma religião, pois só existe uma, visto que o elemento universal de todas as religiões é um só e o mesmo. Procuro mostrar neste livro que, na medida em que Deus é um só, necessário a todos nós, também a religião é uma só, necessária e universal. Apenas os caminhos para ela podem, no começo, diferir em alguns aspectos. Para falar a verdade, não é razoável dizer que há mais de uma religião, quando só existe um Deus. Pode haver duas denominações ou seitas, mas apenas uma religião. O que agora chamamos diferentes religiões deveria ser conhecido como diferentes denominações; e as seitas devem ser especificadas como diferentes cultos ou credos secundários. Se conhecêssemos o significado da palavra “religião”, seríamos naturalmente muito cautelosos em empregá-la. É apenas a opinião humana, limitada, que fecha os olhos para o elemento universal nas chamadas diferentes religiões do mundo, e tal omissão tem sido a causa de muitos males. Este livro apresenta uma definição psicológica da religião, não uma definição objetiva, baseada em dogmas e doutrinas. Em outras palavras, ele procura fazer da religião um assunto que comprometa nossa atitude interior e nosso ser inteiro, e não uma mera observância de determinadas regras e conceitos. PARTE 1 A universalidade, necessidade e unidade da religião O objetivo comum da vida Em primeiro lugar, precisamos saber o que é religião; só então poderemos julgar se é necessário para todos nós sermos religiosos. Sem necessidade, não há ação. Toda ação nossa tem um fim próprio, por cujo alcance nós a praticamos. Neste mundo as pessoas agem de maneiras várias para conseguir variados objetivos; existe uma multiplicidade de fins que determinam as ações de todos. Mas existe algum objetivo comum e universal em todos os atos de todas as pessoas do mundo? Existe para todos nós alguma necessidade comum, superior, que nos estimula na prática de todas as ações? Uma pequena análise das motivações e dos objetivos dos atos humanos no mundo mostra que, embora haja mil e um fins próximos e imediatos do homem em relação à sua vocação ou profissão específica, o objetivo máximo – ao qual todos os outros fins apenas se subordinam – é evitar a dor e a carência e adquirir a permanente Bem- aventurança. Se somos capazes de evitar a dor e a carência permanentemente e obter a Bem-aventurança é outra questão; mas, de fato, em todas as nossas ações obviamente procuramos evitar a dor e ganhar o prazer. Por que um homem se submete ao processo de aprendizado? Porque deseja aprimorar-se em certo trabalho. Por que ele escolhe esse trabalho específico? Porque nele pode ganhar dinheiro. Por que deve ganhar dinheiro afinal? Porque satisfará suas carências pessoais e familiares. Por que devem suas carências ser satisfeitas? Porque será assim removida a dor e adquirida a felicidade. Para falar a verdade, felicidade e Bem-aventurança não são a mesma coisa. Todos nós almejamos a Bem-aventurança, mas por um grande equívoco imaginamos que o prazer e a felicidade são Bem-aventurança. Explicarei, logo em seguida, como isso acontece. A motivação máxima é realmente a Bem- aventurança, sentida interiormente; mas, por erro nosso, a felicidade – ou o prazer – tomou o seu lugar, e o prazer veio a ser considerado a motivação máxima. Vemos assim que a satisfação de alguma carência, a remoção de alguma dor física ou mental – da mais leve à mais aguda – e a obtenção da Bem-aventurança constituem nosso objetivo máximo. Não podemos mais discutir por que se deve obter a Bem-aventurança, pois nenhuma resposta pode ser dada. Ela é o objetivo máximo, não importa o que façamos – abrir um negócio, ganhar dinheiro, reunir amigos, escrever livros, adquirir conhecimento, governar reinos, doar milhões, explorar terras, buscar fama, ajudar os necessitados, tornar-se filantropo ou abraçar o martírio. E ficará evidente que a busca de Deus torna-se para nós um fato real quando se tem a atenção rigorosamente aplicada ao nosso verdadeiro objetivo. Pode haver milhões de passos, miríades de atos e motivos intermediários; mas o motivo máximo é sempre o mesmo: alcançar permanente Bem-aventurança, mesmo que seja por uma longa cadeia de ações. O homem geralmente gosta de prosseguir no encadeamento para chegar ao objetivo final. Ele pode suicidar-se para fazer cessar alguma dor, ou cometer assassinato para livrar-se de alguma forma de carência, dor ou cruel desgosto, pensando que assim alcançará real satisfação ou alívio, os quais confunde com Bem-aventurança. Mas o ponto a notar é que aqui, também, é o mesmo trabalho (embora equivocado) em direção ao objetivo máximo. Alguém dirá: “Não me interesso por prazer ou felicidade. Vivo a vida para conseguir algo, para lograr êxito.” Outro dirá: “Quero fazer o bem no mundo. Não me importa se eu sofra ou não.” Mas se examinarmosa mente dessas pessoas, verificaremos que existe o mesmo trabalho em direção a um objetivo de felicidade. Desejará o primeiro homem um êxito em que na sua obtenção não haja prazer ou felicidade? Desejará o segundo fazer bem aos outros, sem contudo lograr felicidade para si quando assim procede? Obviamente, não. Eles podem não se importar com mil e uma dores físicas ou sofrimentos mentais, infligidos por terceiros ou surgidos acidentalmente durante a busca do êxito ou a prática do bem aos outros; isso porque um encontra satisfação no êxito e o outro goza intensamente a felicidade de fazer o bem ao próximo, a despeito das dificuldades acidentais. Mesmo o mais abnegado de todos os motivos e a mais sincera das intenções de promover o bem da humanidade, para o próprio bem dela mesma, nasceram do impulso básico voltado para um tipo de felicidade pessoal que se aproxima da Bem-aventurança. Mas não é a felicidade de um egoísta tacanho. É a felicidade de um buscador generoso desse “eu puro” que está em você, em mim e em todos. Essa felicidade é Bem-aventurança – um pouco misturada. Desse modo, tendo a Bem-aventurança pura como motivação pessoal para ações abnegadas, o altruísta não se expõe à acusação de egoísmo estreito, pois não se pode ter Bem- aventurança pura a menos que se seja bastante generoso para desejá-la e buscá-la também para os outros. Essa é a lei universal. Definição universal de religião Assim, quando remontamos às mais afastadas origens dos motivos das ações de todos os homens, encontramos a mesma motivação básica para todos: remoção da dor e obtenção da Bem-aventurança. Sendo esse um objetivo universal, precisa ser considerado como o mais necessário. E o que é universal e mais necessário para o homem é, naturalmente, religião para ele. Daí a religião consistir necessariamente na permanente remoção da dor e na experiência da Bem-aventurança ou Deus. E as ações que precisamos adotar para evitar permanentemente a dor e experimentar a Bem-aventurança ou Deus são chamadas religiosas. Se compreendemos religião nesses termos, torna-se óbvia a sua universalidade. Pois ninguém pode negar que deseja evitar definitivamente a dor e alcançar permanente Bem-aventurança. Isso precisa ser universalmente admitido, porquanto ninguém pode contradizer essa verdade. A própria existência do homem está com ela comprometida. Todos querem viver porque amam a religião. Mesmo o homem que comete suicídio age também movido por esse mesmo amor; por esse ato, ele espera alcançar um estado mais feliz do que encontra enquanto está vivendo. De qualquer modo, pensa em livrar-se de uma dor que o importuna. Nesse caso sua religião é grosseira, mas não deixa de ser religião. O objetivo desse homem é perfeitamente justo e coincide com o de todas as pessoas; pois todos querem obter a felicidade ou Bem-aventurança. Entretanto, o método que o suicida empregou é insensato. Por ignorância, ele não distingue o que realmente o levará à Bem-aventurança, a meta de todos os homens. O que significa ser religioso Assim, em certo sentido, toda pessoa neste mundo é religiosa, porque cada uma está tentando livrar-se da carência e da dor e obter a Bem-aventurança. Todas trabalham para o mesmo objetivo. Em sentido estrito, porém, somente poucos neste mundo são religiosos, porque não são muitos os que conhecem os métodos mais eficazes para remover, permanentemente, toda dor e carência – física, mental ou espiritual – e obter a verdadeira Bem-aventurança. O devoto genuíno não pode se aferrar a um conceito rigidamente estreito e ortodoxo da religião, mesmo que tal conceito esteja remotamente relacionado à ideia de religião que estou procurando elucidar aqui. Se você, durante algum tempo, não frequentar igreja ou templo, nem participar de qualquer cerimônia ou formalidade religiosa – mesmo que se comporte religiosamente em sua vida diária sendo tranquilo, equilibrado, concentrado, caridoso e extraindo felicidade até das situações mais difíceis –, então as pessoas comuns de tendências marcadamente ortodoxas ou estreitas moverão a cabeça e afirmarão que, embora você esteja tentando ser bom, ainda assim, do ponto de vista da religião ou aos olhos de Deus, você está “se perdendo”, já que nos últimos tempos não tem entrado nos limites dos lugares sagrados. É claro que, embora não possa haver desculpa válida para a pessoa se excluir permanentemente de tais lugares sagrados, não pode haver, por outro lado, razão legítima para ela ser considerada mais religiosa por frequentar a igreja se, ao mesmo tempo, não aplica na vida cotidiana os princípios que a religião sustenta, quer dizer, aqueles que contribuem afinal para a obtenção da Bem-aventurança permanente. A religião não está atarraxada aos bancos da igreja, nem tampouco limitada às cerimônias que ali se realizam. Se você tem uma atitude de reverência, se vive cotidianamente sempre com a perspectiva de trazer a imperturbável consciência de Bem-aventurança para sua vida, será tão religioso dentro quanto fora da igreja. Naturalmente, isso não deve ser entendido como argumento para abandonar a igreja, a qual é, geralmente, um grande auxílio em muitos aspectos. O que se deseja destacar é que não basta se sentar no banco da igreja e apreciar passivamente uma pregação; é indispensável não economizar esforços para alcançar a felicidade eterna também nas horas em que se está fora do templo. Não se trata de que ouvir uma pregação não seja em si uma coisa boa; certamente que é. A religião nos “liga” às leis benevolentes A palavra “religião” deriva do latim religare: ligar. O que liga? Quem é ligado? E por quê? Afastando qualquer explicação ortodoxa, é lógico que “nós” é que somos ligados. O que nos liga? Nenhuma corrente ou algema, é claro. Pode-se dizer que a religião nos liga apenas por suas regras, leis ou preceitos. E por quê? Para nos fazer escravos? Para nos privar de nosso direito inato à liberdade de pensar e agir? Isso não é razoável. Assim como a religião precisa ter um motivo suficiente, também seu motivo para “ligar-nos” precisa ser bom. Qual é esse motivo? A única resposta racional que podemos dar é que a religião nos liga por meio de regras, leis e preceitos para não degenerarmos, para não cairmos no sofrimento – seja ele físico, mental ou espiritual. O sofrimento físico e mental já o conhecemos. Mas o que é o sofrimento espiritual? É ignorar o Espírito. O sofrimento espiritual está sempre presente em toda criatura limitada, embora muitas vezes sem ser notado, enquanto a dor física e mental vai e vem. Que outro motivo da palavra “ligar”, senão o acima mencionado, podemos atribuir à religião que não seja ilógico ou repulsivo? Obviamente, os outros motivos, se existem, precisam estar subordinados ao acima exposto. Não é a definição de religião dada no início consistente com o motivo acima mencionado da palavra “ligar”, o significado fundamental da religião? Dissemos que a religião consiste, em parte, na erradicação definitiva da dor, da infelicidade e do sofrimento. Bem, a religião não pode consistir meramente em suprimir alguma coisa, como a dor, mas precisa consistir também na aquisição de algo mais. Não pode ser puramente negativa, mas precisa ser também positiva. Como poderemos nos livrar permanentemente da dor sem aderir a seu oposto, a Bem- aventurança? Embora a Bem-aventurança não seja exatamente o oposto da dor, é de qualquer modo um estado de consciência positivo, no qual podemos nos refugiar a fim de evitar a dor. É claro que não podemos ficar para sempre suspensos na atmosfera de um sentimento neutro, que não seja dor ou seu oposto. Repito que a religião consiste não apenas em evitar o sofrimento e a infelicidade, mas também em alcançar a Bem-aventurança ou Deus (mais adiante será explicado que Bem-aventurança e Deus são, em certo sentido, sinônimos). Examinando, então, o motivo do significado fundamental da religião (ligar) chegamos à mesma definição de religião que havíamos alcançado antes, ao analisar a motivação das ações humanas. Religião é questão defundamentos Religião é questão de fundamentos. Se nossa motivação fundamental é a procura da Bem-aventurança ou felicidade, se não há um só ato, um só momento de nossa vida que não esteja definitivamente determinado por esse motivo final, não deveríamos considerar que esse anseio é a mais profunda e arraigada motivação da natureza humana? E o que pode ser a religião se ela não se encontra entrelaçada de alguma maneira com o anseio mais profundamente arraigado da natureza humana? Se há de ter algum valor existencial, a religião precisa estar alicerçada em algum instinto ou anelo vital. Esse é um postulado a priori sobre o qual se baseia o conceito de religião exposto neste livro. Alguém poderia argumentar que, ao lado do anseio pela felicidade, existem muitos outros instintos humanos (o instinto gregário, o instinto de autoconservação, etc.). Por que não deveríamos interpretar a religião também à luz desses outros instintos? A resposta é que esses instintos ou são expressões secundárias do instinto de buscar a felicidade ou já estão indissoluvelmente ligados a ele para afetar de maneira substancial nossa interpretação da religião. Voltemos mais uma vez ao argumento anterior: aquilo que é universal e mais necessário ao homem é religião para ele. Se não for assim, o que então pode ser? Naturalmente, o que é apenas acidental e variável não pode ser. Se procuramos fazer do dinheiro a única coisa da vida que requeira nossa atenção, o dinheiro então se converte em nossa religião – “nosso deus é o dólar”. Seja qual for a motivação predominante de nossa existência, essa é a nossa religião. Deixemos de lado aqui as interpretações ortodoxas, porquanto são os princípios em que se baseiam nossas ações – e não nosso credo intelectual dogmático ou nossa observância de cerimônias – que determinam qual é a nossa religião, sem a necessidade de a anunciarmos pessoalmente. Não precisamos esperar que o teólogo ou o sacerdote nos revelem o nome da seita ou da religião a que pertencemos – nossos princípios e ações têm milhões de línguas para proclamá- la a nós mesmos e aos outros. A parte importante disso é que por trás das coisas que cultuamos com exclusividade cega está sempre um motivo fundamental. Quer dizer, se fazemos do dinheiro, do trabalho ou da obtenção das coisas da vida, necessárias ou supérfluas, o motivo e o fim último de nossa existência, ainda assim, por trás de nossas ações permanece um motivo mais profundo: procuramos tais coisas para banir a dor e obter a felicidade. Esse motivo fundamental é a verdadeira religião da humanidade; outros motivos secundários formam as pseudorreligiões. Por não ser a religião concebida de maneira universal, ela é relegada às nuvens ou considerada por muitos como uma diversão elegante para senhoras, idosos e fracos. A Religião Universal é pragmaticamente necessária Vemos assim que a Religião Universal (ou a religião concebida dessa maneira universal) é uma necessidade prática ou pragmática. Tal necessidade não é artificial ou forçada. Embora sentida no coração, infelizmente nem sempre estamos plenamente conscientes dela. Se o estivéssemos, a dor há muito tempo teria desaparecido do mundo. Pois, de modo geral, o homem vai atrás do que julga ser realmente indispensável, apesar de todos os obstáculos. Se alguém pensa que ganhar dinheiro é absolutamente necessário para sustentar a família, ele não hesita em enfrentar todos os riscos para consegui-lo. É pena que não consideremos a religião igualmente necessária. Em vez disso, nós a consideramos um ornamento, uma decoração, e não um elemento constitutivo da vida humana. Grande lástima é que, embora o alvo de todo homem neste mundo seja necessariamente religioso – já que ele está sempre trabalhando para remover a carência e alcançar a felicidade –, contudo, devido a certos erros graves, a humanidade foi mal orientada e levada a considerar como de menor importância a verdadeira religião, cuja definição acabamos de apresentar. Qual é a causa disso? Por que nos apercebemos da aparente falta de importância que a religião tem, e não da sua verdadeira necessidade? A resposta está no comportamento errôneo da sociedade e em nosso próprio apego aos sentidos. A influência das pessoas e das circunstâncias que nos rodeiam, ou seja, a companhia que mantemos é o que determina, para nós, a necessidade que sentimos de diferentes coisas. Assim, se quisermos “orientalizar” um ocidental, coloquemo-lo no meio de asiáticos, e se quisermos “ocidentalizar” um oriental, ponhamo-lo entre europeus… e vejamos os resultados. É óbvio, inevitável. O homem do Ocidente aprende a amar os costumes, hábitos, roupas e o modo de viver, pensar e ver as coisas do Oriente; já o homem do Oriente passa a gostar das coisas do Ocidente. Parece que o próprio padrão da verdade varia para eles. Numa coisa, porém, a maioria das pessoas há de concordar: a vida terrena, com suas preocupações e prazeres, bens e males, merece ser vivida. Contudo, são poucas ou quase inexistentes as pessoas que alguma vez nos lembrarão da necessidade da Religião Universal; é por isso que não estamos absolutamente conscientes dela. Que o homem raramente enxergue além de seu próprio círculo é um truísmo. Tudo aquilo que cai dentro do seu círculo ele justifica, segue, imita, disputa e sente que é padrão de pensamento e de conduta. Um advogado, por exemplo, elogiará e prestará mais atenção ao que diz respeito à lei. Outras coisas terão, via de regra, menor importância para ele. A necessidade prática ou pragmática da Religião Universal costuma ser entendida como necessidade meramente teórica, sendo a religião considerada um objeto que concerne ao intelecto. Se conhecemos o ideal religioso apenas por meio do intelecto, pensamos que já alcançamos esse ideal e que não precisamos vivê-lo ou realizá-lo. É grande erro de nossa parte confundir necessidade prática com necessidade teórica. Muitos talvez hão de admitir, com uma pequena reflexão, que a Religião Universal consiste, com certeza, na permanente erradicação da dor e na experiência consciente da Bem-aventurança, mas poucos compreenderão realmente a importância e a necessidade prática que essa religião proporciona. Paramahansa Yogananda com alguns delegados do Congresso Internacional de Religiosos Liberais, em outubro de 1920, Boston, Massachusetts. Sri Yogananda falou à distinta audiência a respeito de “A Ciência da Religião”. PARTE 2 Dor, prazer e Bem-aventurança: suas diferenças A causa fundamental da dor e do sofrimento Agora é necessário que investiguemos a causa fundamental da dor e do sofrimento, tanto físico quanto mental, já que evitá-los constitui, em parte, a Religião Universal. Antes de tudo, devemos afirmar, com base em nossa experiência universal, que estamos sempre conscientes de nós mesmos como o poder ativo que desempenha todos os nossos atos mentais e corporais. Com efeito, estamos desempenhando muitas funções diferentes: perceber, pensar, recordar, sentir, agir, etc. Contudo, sob essas funções podemos perceber que existe um “ego” ou “eu” que as governa e que se julga substancialmente o mesmo ao longo de toda a sua existência passada e presente. Diz a Bíblia: “Não sabeis que sois o templo de Deus, e que o Espírito de Deus habita em vós?”¹ Todos nós, como indivíduos, somos muitos Entes espirituais, reflexos do bem-aventurado Espírito universal: Deus. Assim como aparecem muitas imagens do único sol quando este se reflete em diversas vasilhas cheias d’água, também a humanidade está dividida em muitas almas, que ocupam esses veículos corporais e mentais, estando portanto externamente separadas do único Espírito universal. Na realidade, Deus e o homem são um, e a separação é apenas aparente. Então, se somos bem-aventurados Entes espirituais refletidos, por que é que somos totalmente inconscientes de nosso estado de bem-aventurança, estando sujeitos à dor e ao sofrimento físico e mental? A resposta é que o Eu² espiritual foi trazido ao presente estado (não importa por qual processo) quando se identificoucom um veículo corporal transitório e uma mente inquieta. Assim identificado, o Eu espiritual sente-se triste ou feliz quando o corpo e a mente experimentam, respectivamente, um estado doentio e desagradável ou um estado saudável e agradável. Por causa dessa identificação, o Eu espiritual está sendo o tempo todo perturbado pelos estados transitórios do corpo e da mente. Tomemos como exemplo um fenômeno de identificação imaginária: a mãe que se identifica profundamente com seu filho único sofre e sente dor intensa ao saber da morte dele – seja uma morte real, seja um simples boato –, embora ela possa não sentir tal aflição se vier a saber da morte do filho de uma vizinha com o qual não se identifica. Agora podemos ter uma ideia da consciência quando a identificação é real e não apenas imaginária. Portanto, o sentimento de identificação com o corpo transitório e com a mente inquieta é a fonte ou a causa fundamental da infelicidade de nosso Eu espiritual. Compreendendo que a identificação do Eu espiritual com o corpo e a mente é a causa primordial da dor, devemos agora analisar, do ponto de vista psicológico, as causas imediatas ou próximas da dor, e as diferenças entre dor, prazer e Bem- aventurança. As causas imediatas da dor Em virtude dessa identificação, o Eu espiritual parece ter certas tendências mentais e físicas. O desejo de satisfazer essas tendências cria uma carência, e carência produz dor. Pois bem, essas tendências ou inclinações são naturais ou artificiais: tendências naturais que produzem necessidades naturais, e tendências artificiais que produzem necessidades artificiais. Com o tempo, devido ao hábito, uma carência artificial torna-se uma necessidade natural. A carência, seja de que espécie for, produz dor. Quanto mais carências temos, maiores as possibilidades de sofrer; porque, quanto mais carências temos, mais difícil é satisfazê-las, e quanto mais elas permanecem insatisfeitas, maior é a dor. Aumentemos nossos desejos e carências, e a dor também aumentará. Portanto, se um desejo não encontra uma perspectiva de satisfação imediata, ou se encontra um obstáculo, a dor surge imediatamente. E o que é o desejo? Nada mais que uma nova condição de “excitação” assumida pela mente – um capricho mental criado por causa das companhias. Assim, o desejo, ou o aumento das condições de excitação da mente, é a origem da dor ou da infelicidade e, também, do equívoco de procurar satisfazer as carências – primeiro, criando-as e aumentando-as e, depois, tentando satisfazê-las com objetos, em vez de diminuí-las desde o início. Pode parecer que a dor seja algo produzido sem a presença de um desejo prévio, como, por exemplo, a dor de um ferimento. Devemos, porém, observar aqui que o desejo de permanecer saudável – o qual está, consciente ou subconscientemente, presente em nossa mente e cristalizado em nosso organismo fisiológico – foi contrariado, no caso acima, pela presença de um estado patológico, ou seja, a presença do ferimento. Desse modo, quando determinada condição mental de excitação, na forma de um desejo, não é satisfeita ou removida, o resultado é a dor. Assim como o desejo leva à dor, também leva ao prazer, sendo a única diferença a de que, no primeiro caso, a carência envolvida no desejo não é satisfeita, ao passo que, no segundo, a carência envolvida no desejo parece ser satisfeita pela presença de objetos externos. Mas essa experiência de prazer – resultante da satisfação da carência por meio de objetos – não dura, se desvanece, e retemos apenas a lembrança dos objetos que pareciam ter removido essa carência. Eis por que, no futuro, o desejo desses objetos, introduzido pela memória, ressuscita e desperta uma sensação de carência, a qual, se não satisfeita, novamente leva à dor. O prazer é uma consciência dúplice O prazer é uma consciência dúplice, constituída de uma “consciência de excitação” por possuir a coisa desejada e uma consciência de já não sentir a dor provocada por sua carência. Quer dizer: há no desejo tanto um elemento de sentimento quanto de pensamento. Essa posterior “consciência de contraste”, vale dizer, a consciência inteira (como eu sofria quando não possuía o objeto desejado e como agora não sofro porque consegui o que eu queria) é o que essencialmente constitui o encanto do prazer. Por isso, vemos que a consciência da necessidade antecede à consciência do prazer – e que a consciência da satisfação de tal carência nela está inserida. Portanto, a consciência do prazer está relacionada com a carência e sua satisfação. É a mente que cria a carência e a satisfaz. É grande equívoco considerar determinado objeto como prazeroso em si mesmo e guardar na mente a ideia dele, na esperança de satisfazer uma carência pela presença real desse objeto no futuro. Se os objetos fossem em si mesmos prazerosos, a mesma roupa ou alimento contentariam sempre a todos, o que não ocorre. O que se chama prazer é criação da mente: é uma consciência enganosa de excitação, que depende da satisfação do estado anterior de desejo e da atual consciência de contraste. Quanto mais se pensa que um objeto estimula a consciência do prazer e quanto mais se nutre na mente o desejo de possuí-lo, maior é o apetite para esse objeto, cuja presença considera-se que trará uma consciência de prazer e sua ausência, um sentimento de carência. Os dois estados de consciência levam, por fim, à dor. Logo, se queremos realmente diminuir a dor, temos que, tanto quanto possível, libertar a mente, de forma gradual, de todo desejo e ideia de carência. Se eliminamos o desejo de determinado objeto – ao qual se atribui a remoção da carência –, nem mesmo a presença desse objeto diante de nós pode despertar a consciência enganosa e excitante do prazer. Todavia, em vez de diminuirmos ou restringirmos a noção de carência, nós habitualmente a aumentamos e, satisfazendo uma carência, criamos várias outras, o que resulta no desejo de satisfazer todas elas. Por exemplo, para evitar a falta de dinheiro, abrimos um negócio. A fim de levar adiante o negócio, temos de dar atenção a milhares de carências e necessidades que a manutenção desse negócio requer. Cada carência e necessidade, por sua vez, envolve outras carências e mais atenção, e assim por diante. Vemos, assim, que a dor original envolvida na carência de dinheiro é mil vezes multiplicada pela criação de outras carências e interesses. Naturalmente, não significa que dirigir um negócio ou ganhar dinheiro seja ruim ou desnecessário. O que é ruim é o desejo de gerar carências cada vez maiores. Confundir os meios com o fim Se, na tentativa de ganhar dinheiro para alguma finalidade, fazemos do dinheiro a nossa meta, começa nossa loucura. Pois o meio torna-se fim, e o verdadeiro objetivo perde-se de vista. E assim recomeça a nossa infelicidade. Neste mundo todos têm seus deveres a cumprir. Vamos, por questão de conveniência, reexaminar o exemplo anterior. O dono de casa tem de ganhar dinheiro para sustentar a família. Ele inicia certo negócio e começa a ocupar-se dos detalhes que o tornarão bem-sucedido. Ora, o que acontece depois de algum tempo? O negócio progride bem e o dinheiro talvez se acumule ao ponto em que há muito mais que o necessário para a satisfação das carências dele e de sua família. Agora, uma das duas coisas acontece. Ou o dinheiro vem a ser ganho por causa dele próprio e um prazer peculiar chega a ser sentido por acumulá-lo, ou pode acontecer que o prazer de dirigir esse negócio por sua própria causa persiste ou aumenta ainda mais. Vemos que, em ambos os casos, o meio de satisfazer carências originais – que eram o fim – tornou-se um fim em si mesmo: o dinheiro ou o negócio tornaram-se o objetivo. Ou ainda pode acontecer que carências novas e supérfluas sejam criadas e se faça o esforço para satisfazê-las com “objetos”. Em qualquer caso, nossa atenção desvia-se da Bem-aventurança (a qual nós, por natureza, confundimos com o prazer, e este torna-se o nosso objetivo). Então, o propósito pelo qual nós, aparentemente, abrimos um negóciotorna-se secundário em relação à criação ou ao aumento das condições ou dos meios. E, na raiz da criação ou do aumento das condições ou dos meios, existe o desejo deles e esse desejo é uma excitação ou sentimento e, também, uma imagem mental do passado, quando essas condições deram origem ao prazer. Naturalmente, o desejo procura satisfação mediante a presença destas condições: quando é satisfeito, surge o prazer; quando não, surge a dor. E, visto que o prazer nasce do desejo e está relacionado com as coisas transitórias, ele leva à excitação e à dor quando ocorre o desaparecimento delas. É assim que começa nossa infelicidade. Resumindo: do propósito original do negócio, que era a remoção das carências físicas, desviamo-nos para os meios – seja para o negócio em si, seja para o acúmulo da riqueza que dele provém – ou, às vezes, para a criação de novas carências; e, visto que nelas encontramos prazer, somos arrastados para a dor, a qual, como já frisamos, é sempre uma consequência indireta do prazer. O que sucede com a aquisição de dinheiro também se aplica a qualquer ação neste mundo. Sempre que esquecemos nosso verdadeiro objetivo – a obtenção da Bem-aventurança, ou o estado, a condição ou o modo de vida que finalmente conduzem a ela – e dirigimos toda a nossa atenção para os objetos que erradamente consideramos como meios ou condições da Bem-aventurança e os transformamos em fins – nossas carências, desejos e excitações continuam aumentando, e empreendemos então a viagem que leva à infelicidade ou à dor. Jamais devemos esquecer nossa meta. Devemos construir uma cerca em torno de nossas carências. Não devemos continuar a aumentá-las cada vez mais, pois isso finalmente trará infelicidade. Não digo, entretanto, que não devamos satisfazer necessidades básicas, que surgem de nossa relação com o mundo inteiro, ou tornarmo-nos sonhadores e idealistas ociosos, ignorando nosso próprio papel essencial na promoção do progresso humano. Em suma: a dor resulta do desejo e também, indiretamente, do prazer, o qual se apresenta como um fogo-fátuo, atraindo as pessoas para o pântano das carências, que as tornam cada vez mais infelizes. Vemos, assim, que o desejo é a raiz de toda infelicidade e surge do sentido de identificação do Eu com o corpo e a mente. Portanto, o que devemos fazer é eliminar o apego, banindo o sentido de identificação. Simplesmente romper o laço do apego e da identificação. Devemos representar nossos papéis no palco do mundo conforme assinalado pelo Grande Diretor, com toda a nossa mente, intelecto e corpo, porém mantendo-nos interiormente tão invulneráveis ou imperturbados pela consciência do prazer e da dor como fazem os atores no palco. A consciência de Bem-aventurança surge do rompimento da identificação com o corpo Quando rompemos a identificação e vemos a vida de maneira desapaixonada, surge em nós a consciência da Bem-aventurança. Enquanto formos humanos, não podemos deixar de ter desejos. Sendo humanos, como podemos então perceber nossa divindade? Primeiro, tenhamos desejos racionais, e depois estimulemos nosso desejo de coisas mais nobres, esforçando-nos o tempo todo por alcançar a consciência da Bem-aventurança. Sentiremos que a corda de nosso apego individual aos diversos desejos está se afrouxando de maneira automática. Em outras palavras, no centro tranquilo da Bem-aventurança aprenderemos afinal a renegar nossos próprios desejos insignificantes e sentir apenas os que parecem ser estimulados em nosso íntimo por uma lei maior. Por isso, disse Jesus Cristo: “Não se faça a minha vontade, mas a Tua”.³ Quando afirmo que a obtenção da Bem-aventurança é o objetivo universal da religião, não pretendo dizer por Bem-aventurança aquilo que se costuma chamar de prazer, ou a satisfação intelectual que surge da realização de um desejo e carência e que está misturado com uma excitação, como quando dizemos que estamos “prazerosamente animados”. Na Bem-aventurança não há excitação, nem é ela uma consciência de contraste: “Minha dor ou carência foi removida pela presença de tais e tais objetos”. É uma consciência de perfeita serenidade – a consciência de nossa natureza tranquila, não poluída pela intromissão da consciência de que a dor não existe mais. Uma ilustração esclarecerá esse ponto. Suponhamos que fui ferido e sinto dor; depois de curado, sinto prazer. Essa consciência de prazer consiste de uma excitação ou sentimento e de uma constante consciência mental de que não estou mais sentindo a dor do ferimento. Ora, o homem que alcançou a Bem-aventurança, mesmo que sofra um ferimento físico, sentirá, quando curado, que seu estado de serenidade não foi perturbado quando a ferida existia, nem foi recuperado após a cura. Esse homem sente que está passando por um universo de prazer e dor com o qual não tem qualquer conexão e o qual não pode perturbar ou aumentar o estado tranquilo e bem- aventurado que flui dentro dele sem cessar. Esse estado de Bem-aventurança encontra-se livre das inclinações e das excitações envolvidas no prazer e na dor. Existe, na consciência de Bem-aventurança, um aspecto positivo e outro negativo. O aspecto negativo é a ausência da consciência de prazer e dor; o positivo é o estado transcendental de tranquilidade superior, no qual está incluída uma consciência de grande expansão e de “todos em Um e Um em todos”. Esse estado tem gradações. Quem busca a verdade com seriedade provará dele um pouco; um vidente ou profeta está impregnado desse estado. Já que o prazer e a dor têm origem no desejo e na carência, deve ser nossa obrigação – se quisermos alcançar a Bem-aventurança – eliminar todos os desejos, exceto o desejo de Bem-aventurança, nossa verdadeira natureza. Se todos os nossos progressos – científico, social e político – são orientados por esse único objetivo comum e universal (a remoção da dor), por que deveríamos adotar um elemento estranho (o prazer) e esquecermos de estar permanentemente atentos ao que é tranquilidade e Bem-aventurança? Inevitavelmente, quem desfruta o prazer da saúde experimentará, vez por outra, a dor produzida pela doença, porque o prazer depende de uma condição mental, a saber, a ideia de saúde. Ter boa saúde não é ruim, nem está errado buscá-la. Todavia, a única objeção é estar apegado a ela ou a se deixar afetar interiormente por ela. Pois desse modo a pessoa está cultivando o desejo, que a levará à infelicidade. Precisamos buscar a saúde não pelo prazer que ela encerra, mas porque ela torna possível o cumprimento de nossos deveres e a consecução de nosso objetivo. A saúde se verá, ocasionalmente, obstruída pela condição oposta: a doença. Mas a Bem-aventurança não depende de nenhuma condição determinada, externa ou interna. É o estado inato do Espírito. Portanto, ela não receia ser contrariada por qualquer outra condição. Fluirá continuamente, para sempre, na derrota ou na vitória, na saúde ou na doença, na riqueza ou na pobreza. Unity House, palco do Congresso Internacional de Religiosos Liberais. 1 I Coríntios 3:16. 2 Literalmente, “Self”. Com letra maiúscula, designa o atman, a alma, diferente do eu comum, que constitui a personalidade ou ego. O Eu é o Espírito individualizado, cuja natureza é alegria sempre-existente, sempre-consciente, sempre-nova. Pela meditação obtém-se a experiência desses atributos divinos da natureza da alma. [Dependendo do contexto, Self foi traduzido pelos termos Eu, Auto- ou Si-Mesmo.] (Nota da Editora) 3 Lucas 22:42. PARTE 3 Deus como Bem-aventurança O motivo comum de todas as ações A discussão psicológica anterior a respeito da dor, do prazer e da Bem- aventurança, com a ajuda dos dois exemplos seguintes, esclarecerá minha concepção da suprema necessidade comum e da Divindade, à qual aludi apenas de modo incidental, no começo. Ressaltei no início que, se observássemos detidamente as ações humanas, comprovaríamos que a motivação fundamental e universal pela qual o homem age é a de evitar a dor e a consequente obtenção da Bem-aventurança ou Deus. A primeira parte dessa motivação– evitar a dor – é algo que não podemos negar, se observarmos os motivos de todas as ações, boas ou más, praticadas no mundo. Tomemos, por exemplo, o caso da pessoa que deseja cometer suicídio e do homem verdadeiramente religioso que considera desapaixonadamente as coisas deste mundo. Não pode haver dúvida de que ambos estão procurando livrar-se da dor que os perturba; ambos pretendem acabar com a dor definitivamente. Se são bem-sucedidos ou não, é outra questão, mas no que se refere aos motivos que os guiam, existe unidade entre ambos. Será, porém, que todas as ações deste mundo são diretamente motivadas pelo desejo de alcançar a permanente Bem-aventurança ou Deus – que é a segunda parte da motivação comum de todas as ações? Por acaso um criminoso tem como motivação imediata alcançar a Bem-aventurança? Parece difícil que seja assim. A razão disso foi assinalada na discussão a respeito do prazer e da Bem- aventurança. Constatamos que o Eu espiritual, por causa de sua identificação com o corpo, contraiu o hábito de cultivar desejos e a consequente criação de carências. Tais desejos e carências, se não forem satisfeitos por meio de objetos, levam à dor – ou ao prazer, se forem satisfeitos. Mas é aqui que o homem comete um erro fatal. Quando uma carência é atendida, a pessoa sente uma agitação prazerosa e, por um triste equívoco, fixa sua atenção exclusivamente nos objetos que criam essa excitação, supondo que são eles a causa principal desse prazer. Esquece-se por completo de que tinha antes, em sua mente, uma agitação – na forma de desejo ou carência – e que mais tarde teve outra agitação – na forma de prazer, aparentemente provocado pela obtenção dos objetos – que suplantou a primeira. Assim, com efeito, uma excitação surgiu em sua mente e foi suplantada por outra excitação na mesma mente. Objetos externos são apenas ocasiões de prazer – não são causas. Uma pessoa pobre com desejo de guloseimas pode contentar-se com um doce qualquer, e essa satisfação despertará nela um certo prazer. Uma pessoa rica, porém, talvez não possa satisfazer um desejo semelhante senão com o mais fino dos manjares; mas tal satisfação dará origem a um prazer de igual intensidade. Então: o prazer depende dos objetos externos ou do estado mental? Certamente, deste último. Mas o prazer é, como já dissemos, uma excitação. Portanto, jamais se justifica procurar eliminar a excitação do desejo com outra excitação, a saber, a que é sentida no prazer. É porque agimos assim que nossas excitações nunca terminam e, consequentemente, nossa dor e infelicidade jamais cessam. Apenas a consciência de Bem-aventurança pode efetivamente apaziguar a excitação O que devemos fazer é apaziguar a excitação que se encontra no desejo, em vez de estimulá-la ou perpetuá-la por meio da agitação do prazer. E somente a consciência de Bem-aventurança – que não significa insensibilidade, porém um estado superior de indiferença tanto ao prazer quanto à dor – é capaz de tranquilizar, de maneira efetiva, a excitação do desejo. Todo ser humano procura alcançar a Bem-aventurança satisfazendo seus desejos, mas comete o erro de deter-se no prazer; por isso seus desejos nunca terminam, e ele é arrastado para o redemoinho da dor. O prazer é um perigoso fogo-fátuo e, no entanto, é essa associação prazerosa que se torna nossa motivação para futuras ações. E isso já se provou ser tão enganoso quanto a miragem no deserto. Uma vez que o prazer, como já dissemos, consiste numa consciência de excitação juntamente com a consciência de contraste de que a dor não mais existe, quando o buscamos no lugar da Bem-aventurança, preparamo-nos para nos atirar de cabeça no ciclo de existência ignorante caracterizado por uma sucessão de prazeres e dores. Vemos assim que, embora o verdadeiro objetivo da humanidade seja evitar a dor e alcançar a Bem-aventurança, o homem, por causa de um erro fatal, ao tentar evitar a dor, persegue algo enganoso denominado prazer, o qual se confunde com Bem-aventurança. O fato de que o ser humano jamais se satisfaz com um único objeto de prazer comprova, indiretamente, que a obtenção da Bem-aventurança, e não o prazer, é sua necessidade suprema e universal. Ele sempre corre de um prazer a outro: do dinheiro ao vestuário, deste às propriedades, daí ao prazer conjugal… é uma inquietude permanente. E, assim, embora deseje evitar a dor adotando todos os meios que julga serem adequados, o homem continua sempre sujeito a ela. Contudo, um anseio desconhecido e insatisfeito parece subsistir em seu coração. Mas o homem religioso (o segundo exemplo que propus) sempre se esforça em adotar os meios religiosos adequados para entrar em contato com a Bem- aventurança ou Deus. Naturalmente, quando afirmo que Deus é Bem-aventurança, também quero dizer que Ele é sempre-existente e é também consciente de Sua existência bem- aventurada. E quando desejamos a Bem-aventurança Eterna ou Deus, está implícito que com Bem-aventurança também queremos existência eterna, imortal, imutável e sempre-consciente. Já demonstramos – tanto a priori quanto por meio da análise das motivações e dos atos humanos – que todos nós, desde o mais importante até o mais humilde, desejamos viver na Bem-aventurança. Repetindo o mesmo argumento de uma forma um pouco diferente: suponhamos que algum ente superior descesse à Terra e nos dissesse: “Ó criaturas do mundo! Eu lhes darei eternos sofrimentos e infelicidade, juntamente com existência eterna; aceitarão isso?” Alguém gostaria dessa perspectiva? Ninguém. Todos querem eterna Bem-aventurança (Ananda) junto com existência (Sat) eterna. Para falar a verdade, considerações sobre as motivações do mundo também demonstram que não há ninguém que não gostaria de ter Bem-aventurança. De modo parecido, ninguém gosta da expectativa de aniquilamento; se for sugerida, estremeceremos ante a ideia. Todos desejam existir permanentemente (Sat). Mas se nos oferecessem existência eterna sem a consciência dessa existência, nós a rejeitaríamos. Pois quem aceitaria uma existência inconsciente? Ninguém. Todos queremos uma existência consciente. Em suma: queremos existência eterna, bem-aventurada e consciente: Sat-Chit- Ananda (Existência – Consciência – Bem-aventurança). Esse é o nome hindu para Deus. Mas apenas por questão pragmática, destacamos o Seu aspecto de Bem-aventurança e a nossa motivação para alcançá-la, omitindo os dois outros aspectos: Sat e Chit, ou seja, existência consciente (também não vamos tratar aqui de outros aspectos Dele). Que é Deus? Agora: que é Deus? Se Deus não for Bem-aventurança e se Seu contato não produzir em nós Bem-aventurança, ou se nos trouxer apenas dor, ou se Seu contato não afastar de nós a dor, haveremos de desejá-Lo? Não. Se Deus é inútil para nós, não O queremos. Para que serve um Deus que permanece sempre desconhecido, cuja presença não se manifesta interiormente em nós, pelo menos em algumas circunstâncias de nossa vida? Qualquer concepção que formemos de Deus pelo exercício da razão (por exemplo: “Ele é transcendente” ou “Ele é imanente”) sempre permanecerá vaga, confusa, a menos que Deus seja realmente sentido como tal. Para falar a verdade, mantemos Deus, cautelosamente, distante de nós, concebendo-O às vezes apenas como um ser pessoal, e depois, também teoricamente, pensando que Ele está em nosso interior. Por essa imprecisão de nossa ideia e experiência de Deus, não somos capazes de compreender a verdadeira necessidade que temos Dele e o valor pragmático da religião. Essa teoria ou ideia monótona deixa de ser convincente para nós. Não muda nossa vida, não influencia nossa conduta de modo apreciável, nem nos induz a tentar conhecer Deus. A prova da existência de Deus está dentro de nós Que diz a Religião Universal a respeito de Deus? Diz que a prova da existência de Deus está dentro de nós. É uma experiência íntima. Com certeza você pode se lembrar de pelo menos uma ocasião na vida em que, durante a oração ou um culto, sentiu que as limitações do corpo quase se desvaneciam, que a experiência de