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Fundamentos Históricos e Epistemológicos da Psicologia Aula 9: Psicanálise Profª Ana Cristina Braz O que é Psicanálise? • Um método de investigação dos processos mentais e tratamento de sofrimentos emocionais. • Visa tornar consciente o inconsciente e promover a elaboração profunda de conflitos psíquicos. • Fundada no final do século XIX por Freud. Diferenças: psicologia e psicanálise Objeto de Estudo Métodos Psicanálise Inconsciente, conflitos psíquicos Observação clínica, livre associação, interpretação de sonhos Psicologia Experimental Comportamentos observáveis, processos mentais simples Experimentação controlada em laboratório Estruturalismo Estrutura da mente (elementos da consciência) Introspecção sistemática Contexto histórico e influências iniciais • Por volta do século XVIII, a doença mental passou a ser vista como um comportamento irracional. • Durante o século XIX, a psiquiatria dividia-se entre duas visões: oSomática → afirmava que o comportamento “anormal” tinha causas físicas. oPsíquica → consideravam as causas emocionais para explicar o comportamento “anormal”. Contexto histórico e influências iniciais • Psicanálise é influenciada por especulações filosóficas sobre o inconsciente, as primeiras ideias sobre psicopatologia e a teoria da evolução. • Ela surge dentro das tradições da medicina e psiquiatria a partir das tentativas de tratamento de pessoas rotuladas como doentes mentais (trabalho de Charcot e Janet com hipnose). Contexto histórico e influências iniciais • Psicanálise é influenciada por: Filosofia do inconsciente Psicopatologia Teoria da evolução de Darwin Sigmund Freud (1856–1939) • Judeu nascido na Áustria • Estuda medicina em Viena • Pesquisa com reprodução de enguias (neurologia) • Trabalha no Hospital Geral de Viena → 1º contato com a psiquiatria • 1882 → Freud acompanha um caso tratado por Breuer (Anna O.) • 1886 → Bolsa de estudos em Saltpêtrière, na França (Charcot) Breuer e o caso Anna O. • Anna O. → paciente que apresentava sintomas histéricos (paralisias, dificuldades na fala e visão, etc). • Durante o tratamento, Breuer observou que: oEm estado de hipnose, Anna conseguia lembrar e verbalizar eventos traumáticos. oApós expressar emoções ligadas ao trauma, os sintomas desapareciam temporariamente. • Este processo de revivência emocional e verbalização foi chamado de catarse. Estudos com Charcot • Tratamento de pacientes histéricas pelos métodos da hipnose • Charcot chamou a atenção de Freud para o papel do sexo no comportamento histérico. • Freud adotou a hipnose e o método catártico para tratar dos seus pacientes, mas logo acabou os abandonando e desenvolvendo a técnica da associação livre. Associação livre • Técnica → pedir ao paciente que diga tudo o que vier à mente, sem censura ou julgamento, mesmo que pareça irrelevante, desconexo ou embaraçoso. • Objetivo→ permitir que o conteúdo inconsciente emerja espontaneamente para a consciência. • Freud descobriu que as lembranças de seus pacientes remetiam à infância, e que muitas das experiências reprimidas das quais se lembravam estavam relacionadas a questões sexuais. A análise dos sonhos • Sonhos como material emocional significativo: oPistas para conflitos inconscientes e distúrbios emocionais. oBaseava-se na ideia de que sonhos têm causas na mente inconsciente. • Técnica psicoterapêutica: oA interpretação dos sonhos revelou conflitos e desejos reprimidos. Início da Psicanálise • Em 1895, Freud e Breuer publicaram Estudos sobre a histeria, livro considerado o marco formal da psicanálise, embora Freud viesse a adotar a palavra “psicanálise” somente um ano depois. • O livro apresentava trabalhos de ambos e diversos casos médicos, incluindo o de Anna O. • Destaque para o papel determinante do sexo na neurose. A análise dos sonhos • Autoanálise e teoria psicanalítica: oTornou-se a base para o sistema psicanalítico. oFreud afirmou: “Meu paciente mais importante fui eu mesmo”. • Publicação de A Interpretação dos Sonhos (1900): oConsiderada a obra principal de Freud. o Introduziu o conceito do Complexo de Édipo, inspirado por suas próprias experiências. Fundamentos iniciais da psicanálise • Freud propôs que sintomas neuróticos têm origem em conflitos inconscientes. • Desenvolveu a técnica da análise dos sonhos como "via régia para o inconsciente". • Introduziu conceitos como atos falhos, resistência, repressão e transferência. Conceito Definição Exemplo Função Ato Falho Manifestação do inconsciente por meio de lapsos de linguagem e enganos. Chamar a/o atual pelo nome da/o ex. Revela desejos ou conflitos reprimidos. Resistência Força psíquica que impede o acesso a conteúdos inconscientes. Paciente muda de assunto para evitar tema delicado. Mecanismo de defesa que protege o ego do sofrimento psíquico. Repressão Processo que exclui pensamentos, lembranças ou desejos inaceitáveis da consciência. Esquecer completamente um trauma infantil. Origem de muitos sintomas neuróticos Transferência Redirecionar sentimentos ou reproduzir padrões de relacionamento com analista. Sentir raiva ou afeto intenso pelo terapeuta sem razão clara. Recurso central do processo analítico; permite reviver conflitos. Primeira tópica (Teoria dos Sistemas) • 1º Modelo de funcionamento da mente: Inconsciente: • Conteúdos reprimidos (desejos proibidos). • Expressão indireta, por sonhos, atos falhos e sintomas. Pré-consciente : • Filtra o que pode ou não emergir à consciência. Consciente : • Parte menor da mente, ligada à percepção externa e raciocínio. Forças psíquicas: instinto e pulsões • Conceitos centrais na fase mais madura de sua teoria, a partir da obra Além do Princípio do Prazer (1920). • Instintos → representações mentais dos estímulos internos que motivam a personalidade e o comportamento. • Pulsões→ forças fundamentais que movem a vida psíquica Forças psíquicas: instinto e pulsões • Pulsão de vida: impulso para garantir a sobrevivência por meio da satisfação das necessidades de alimento, água, ar e sexo. • Pulsão morte: impulso inconsciente em direção à decadência, destruição e agressividade. • Libido: a energia psíquica que direciona o indivíduo na busca de pensamentos e comportamentos prazerosos. Segunda tópica (Instância psíquicas) • Modelo mais sofisticado e dinâmico da mente • Desenvolvido por Freud a partir de 1923, especialmente na obra O Ego e o Id. • Ela descreve a mente em termos de instâncias psíquicas que estão em constante conflito: id, ego e superego Segunda tópica (Instância psíquicas) Instância Função Características Id Fonte dos impulsos e desejos inconscientes. Inconsciente, busca gratificação imediata (princípio do prazer), regido por pulsões (vida e morte). Ego Instância racional, mediadora entre o Id, o Superego e a realidade Atua de forma consciente. Regido pelo princípio da realidade, tenta satisfazer os desejos do Id de forma aceitável. Superego Instância moral e crítica Representa normas, valores e proibições internalizadas. Atua como “juiz interno”, podendo gerar culpa e autoexigência. Mecanismos de defesa do ego • Esses mecanismos são considerados estratégias automáticas que ajudam o indivíduo a manter o equilíbrio emocional. • Freud via essas defesas como fundamentais para a preservação e funcionamento do ego. • Muitos foram posteriormente elaborados por Anna Freud, sua filha, em sua obra O Ego e os Mecanismos de Defesa. Mecanismo Descrição Exemplo Negação Recusa em aceitar a realidade de uma situação ameaçadora. Alguém com doença terminal insiste que está perfeitamente saudável. Projeção Atribuição de sentimentos ou impulsos próprios a outra pessoa. Dizer que alguém te odeia, quando na verdade você sente isso por ela. Deslocamento Redirecionamento de impulsos de um objeto perigoso para um mais seguro. Descontar raiva do chefe nos filhos ou no pet. RacionalizaçãoJustificativas "lógicas" para fatos incompreensíveis. "Perdi o emprego porque ele não era tão bom assim." Formação reativa Transformar um impulso inaceitável em seu oposto consciente. Exagerar gentileza com alguém que você detesta. Regressão Retorno a comportamentos infantis diante de estresse ou frustração. Um adulto choramingar ou fazer birra ao ser contrariado. Sublimação Redirecionamento de impulsos para atividades socialmente aceitáveis ou criativas. Canalizar impulsos agressivos para a prática de esportes ou arte. Teoria do desenvolvimento psicossexual • Freud acreditava que a sexualidade humana está presente desde cedo, e que seu desenvolvimento influencia a formação da personalidade. • Teoria descreve o modo como a energia libidinal (pulsão de vida, ligada ao prazer) se concentra em diferentes zonas do corpo ao longo da infância. • Cada fase está associada a uma zona erógena e a um tipo de conflito. Não resolução de conflitos gera fixação. Estágios do desenvolvimento psicossexual Fase Idade Zona Erógena Características Oral 0 a 1 ano Boca Prazer em sugar, morder. Formação do vínculo com a mãe. Anal 1 a 3 anos Ânus Controle dos esfíncteres. Conflito entre prazer e disciplina. Fálica 3 a 6 anos Genitais Complexo de Édipo. Interesse pelas diferenças sexuais. Formação do Superego. Latência 6 a 11 anos — Repressão da libido. Investimento em escola, amizades e habilidades sociais. Genital Puberdade Genitais Maturidade sexual. Capacidade de amar e trabalhar. Relações afetivo-sexuais maduras. A Clínica Freudiana e a Formação do Analista • Freud insistia na importância da análise pessoal do analista como parte da formação. • A escuta clínica exige neutralidade, abstinência e atenção flutuante. • A prática clínica da psicanálise deve estar ancorada nos princípios teóricos que a sustentam. Desdobramentos e Críticas • A psicanálise se desdobrou em várias escolas e linhas (ex: kleiniana, lacaniana, ego-psicologia, etc.). • Recebeu críticas por seu método não ser empírico, por seu modelo ser centrado na sexualidade e por não se adequar a todos os tipos de transtornos. • Apesar disso, continua influente no campo da psicologia, psiquiatria, filosofia, crítica cultural e educação. O impacto da psicanálise • Mesmo com muitas críticas, a psicanálise mudou para sempre a maneira como entendemos o comportamento humano. • Freud trouxe à tona que nós não somos totalmente racionais, e que nossos desejos, lembranças e emoções escondidas têm um papel gigante na nossa vida. • Mantém relevância ao oferecer uma escuta diferenciada da subjetividade e uma crítica às normatizações sociais. Escolas da Psicanálise Escola Autor Principal Contribuições Centrais Relações Objetais Melanie Klein Conceitos de posição esquizoparanóide e depressiva, identificação projetiva, análise com crianças e psicóticos. Escola Francesa Jacques Lacan Inconsciente estruturado como linguagem. Importância do significante, Real/Imaginário/Simbolismo. Escola Winnicottiana D. W. Winnicott Conceitos de mãe suficientemente boa, espaço transicional, objeto transicional, verdadeiro e falso self. Ênfase na relação mãe-bebê e no ambiente. Escola Bioniana Wilfred Bion Foco na função de pensar e no continente–conteúdo. Desenvolvimento mental primitivo e função α. Referências Loureiro, I. Capítulo 22: Luzes e sombras. Freud e o advento da psicanálise. In: JACÓ-VILELA, A. M.; FERREIRA, A. A. L.; PORTUGAL, F. T. (Orgs.). História da Psicologia: Rumos e Percursos. 2. ed. Rio de Janeiro: Nau Editora, 2012. p. 371-386. SCHULTZ, D. P.; SYDNEY ELLEN SCHULTZ. O início da psicanálise. In: _________. História da psicologia moderna: tradução da 11ª edição norte-americana. 4ª Edição. São Paulo: Cengage Learning, 2019. p. 313-351. Slide 1: Fundamentos Históricos e Epistemológicos da Psicologia Slide 2: O que é Psicanálise? Slide 3: Diferenças: psicologia e psicanálise Slide 4: Contexto histórico e influências iniciais Slide 5: Contexto histórico e influências iniciais Slide 6: Contexto histórico e influências iniciais Slide 7: Sigmund Freud (1856–1939) Slide 8: Breuer e o caso Anna O. Slide 9: Estudos com Charcot Slide 10: Associação livre Slide 11: A análise dos sonhos Slide 12: Início da Psicanálise Slide 13: A análise dos sonhos Slide 14: Fundamentos iniciais da psicanálise Slide 15 Slide 16: Primeira tópica (Teoria dos Sistemas) Slide 17: Forças psíquicas: instinto e pulsões Slide 18: Forças psíquicas: instinto e pulsões Slide 19: Segunda tópica (Instância psíquicas) Slide 20: Segunda tópica (Instância psíquicas) Slide 21: Mecanismos de defesa do ego Slide 22 Slide 23: Teoria do desenvolvimento psicossexual Slide 24: Estágios do desenvolvimento psicossexual Slide 25: A Clínica Freudiana e a Formação do Analista Slide 26: Desdobramentos e Críticas Slide 27: O impacto da psicanálise Slide 28: Escolas da Psicanálise Slide 29: Referências