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DEPARTAMENTO DE ENGENHARIA ENGENHARIA ELÉTRICA / 2013 ENG 3511 - Conversão de Energia Prof. Carlos Medeiros Cap. 03 – Circuitos Magnéticos e Indutores Conteúdo 3.1 Objetivos do capítulo ............................................................................................................................................................. 1 3.2 Circuitos magnéticos lineares ............................................................................................................................................ 1 3.2.1 Circuito magnético simples ........................................................................................................................................ 1 Exercícios 3.1 ............................................................................................................................................................................... 6 3.2.2 Circuitos magnéticos mais gerais e analogia com circuitos elétricos ....................................................... 7 3.2.2.1 Formulação geral de circuitos magnéticos .................................................................................................... 10 Exercícios 3.2 ............................................................................................................................................................................ 13 3.2.3 Fluxo concatenado, força eletromotriz induzida e indutância .................................................................. 14 Exercícios 3.3 ............................................................................................................................................................................ 18 3.2.4 Energia em circuitos magnéticos lineares ......................................................................................................... 19 3.2.5 Indutância e energia armazenada em sistemas com entreferro .............................................................. 21 Exercícios 3.4 ............................................................................................................................................................................ 23 3.3 Circuitos magnéticos não-lineares ............................................................................................................................... 24 3.3.1 Ferromagnetismo ........................................................................................................................................................ 24 3.3.2 Magnetização ................................................................................................................................................................. 26 3.3.3 Saturação ......................................................................................................................................................................... 27 3.3.4 Permeabilidade dos materiais ferromagnéticos e indutor não-linear................................................... 28 3.3.5 Aproximação da permeabilidade para meios não-lineares ........................................................................ 29 3.3.6 Efeito da temperatura ................................................................................................................................................ 31 Exercícios 3.5 ............................................................................................................................................................................ 32 3.3.7 Histerese .......................................................................................................................................................................... 33 3.3.8 Energia e co-energia em sistemas magnéticos não-lineares ..................................................................... 35 3.3.9 Excitação em corrente alternada e perdas no núcleo ................................................................................... 36 3.4 Outras questões .................................................................................................................................................................... 43 3.4.1 Fluxo de dispersão....................................................................................................................................................... 43 3.4.2 Efeito do entreferro em sistemas não-lineares ............................................................................................... 45 3.4.3 Força magnetomotriz com mais de um enrolamento energizado ........................................................... 45 Exercícios 3.6 ............................................................................................................................................................................ 46 APÊNDICE A – Informações adicionais .............................................................................................................................. 48 A.1 Classificação magnética dos materiais ................................................................................................................... 48 A.2 Co-energia magnética .................................................................................................................................................... 49 A.3 Perdas por histerese ...................................................................................................................................................... 50 Bibliografia ..................................................................................................................................................................................... 51 Respostas de exercícios ............................................................................................................................................................ 52 1 3.1 Objetivos do capítulo Apresentar grandezas e fenômenos relacionados aos circuitos magnéticos, consistindo de suporte fundamental para a compreensão teórica, aplicações e projetos de equipamentos tais como: indutores, transformadores, motores e geradores. 3.2 Circuitos magnéticos lineares Nesta seção do capítulo: Principais tópicos: fundamentos de circuitos magnéticos; análise e solução de circuitos magnéticos; indutância e energia magnética. Principais aproximações: nos casos de núcleos com materiais magnéticos a permeabilidade () será considerada constante; assume-se que o fluxo magnético está praticamente confinado no núcleo (despreza-se dispersão de fluxo), pois considera-se >> 0; não serão consideradas perdas no núcleo. o efeito de espraiamento de fluxo devido a entreferro será apresentado, mas desconsiderado nos cálculos. 3.2.1 Circuito magnético simples Para começar, a fig. 3.1 mostra um circuito magnético simples, que consiste em um núcleo de material magnético sobre o qual está enrolado um condutor com N voltas ou espiras. Considerando que uma corrente i percorre esse enrolamento, será produzido um campo magnético no núcleo, como ilustrado pelas linhas de fluxo (tracejadas). Fig. 3.1. Circuito magnético simples. Assume-se que o núcleo é composto por um material cuja permeabilidade magnética é muito maior que a do ar, isto é >> 0, como indica a fig. 3.2. Devido a essa alta permeabilidade do núcleo em relação ao ar, uma solução exata mostraria que: o fluxo magnético fica confinado quase que totalmente no núcleo. Em outras palavras, o fluxo se estabelece naturalmente pelo caminho mais fácil, ou seja, por aquele de maior permeabilidade; as linhas de campo seguem o caminho definido pelo núcleo; basicamente tanto a intensidade de campo H como a densidade fluxo B são consideradas uniformes em qualquer seção reta, porque a área desta é uniforme.2 Fig. 3.2. Circuito magnético simples e grandezas do núcleo. A fig. 3.2 mostra também um vetor simbolizando o campo H , produzido pela corrente no enrolamento. A magnitude da intensidade de campo magnético (H) pode ser determinada pela Lei Circuital de Ampère (recordada no Capítulo 02): ildH (3.1) Considerando uma espira amperiana ao longo do caminho médio lc do núcleo e o campo H constante, a parte da esquerda da integral resulta em Hlc. Como o percurso fechado da integral envolve o enrolamento com N espiras, a corrente total envolvida é o produto Ni. Assim sendo, a magnitude H (A/m) é: cl Ni H (3.2) onde: lc é o comprimento do caminho médio desse circuito magnético, em metros. A relação entre a intensidade de campo ( H ) e a densidade de fluxo magnético ( B ) é uma propriedade do material em que se encontra o campo magnético. Nesta seção estudar-se-á esta relação como sendo linear, ou seja: HB (3.3) Onde: é a permeabilidade magnética do núcleo, considerada constante, em henry/metro (H/m); a unidade de B é Wb/m2 ou T. A fig. 3.3 mostra a curva de magnetização ou curva B-H (para valores positivos). Intensidade de Campo, H (A/m) Densidade de Fluxo, B (T) o Fig. 3.3. Visualização gráfica da relação entre B e H (curva B-H), para o CASO LINEAR: B = H (sendo = constante). 3 Em unidades do Sistema Internacional (SI), a permeabilidade do vácuo é 0 = 410-7 henry/metro. A permeabilidade dos materiais magnéticos considerados lineares pode ser expressa em termos da permeabilidade relativa r, em relação à do vácuo: 0 r (3.4) Valores típicos de r variam entre 2.000 a 80.000 para os materiais ferromagnéticos usados em transformadores e máquinas rotativas. Por enquanto, a fim de enfatizar outros aspectos do estudo, assume-se r como sendo uma constante conhecida, embora, na realidade, nos materiais ferromagnéticos varie apreciavelmente em função da densidade de fluxo (B). O ferromagnetismo e as características dos materiais magnéticos serão descritos posteriormente neste capítulo. A tab. 3.1 mostra (apenas a título ilustrativo), alguns valores de permeabilidade típicos. Tab. 3.1. Permeabilidades relativas de alguns materiais. Material r Ar 1,0000 Madeira 0,99999950 Alumínio 1,00000065 Cobre 0.9999910 Níquel 50,0 Ferro fundido 60,0 Aço-silício (10.000 gauss) 3000 Superliga 100.000 O fluxo magnético por sua vez é dado por A AdB . Com a consideração de que a densidade de fluxo magnético B é uniforme na seção reta do núcleo, tem-se o fluxo (Wb) expresso por: cBA (3.5) onde: Ac é a área da seção transversal em m2. A fig. 3.4 ilustra um corte transversal do núcleo com as linhas de campo emergindo da área Ac: Fig. 3.4. Linhas do campo B considerado uniforme na seção reta do núcleo Ac. Além dessas três grandezas fundamentais H , B e , uma outra muito utilizada em circuitos magnéticos é a força magnetomotriz fmm, também simbolizada por . A fmm expressa o produto das N voltas do enrolamento pela corrente que o percorre. No circuito da fig. 3.2, ela é dada simplesmente por Ni, ou seja, se relaciona com o campo H como mostra a eq. (3.6): ldHNi (3.6) onde: na prática atribui-se à fmm a unidade ampère-espira (Ae). Analisando a fig. 3.2 e com (3.5), obtém-se: cHlNi (3.7) Campo B Área Ac 4 Embora a fig. 3.2 mostre somente uma bobina, os transformadores e a maioria das máquinas rotativas têm no mínimo dois enrolamentos e, nesse caso, a força magnetomotriz resultante é a soma algébrica dos ampères-espiras de todos os enrolamentos. Substituindo (3.3) e (3.5) em (3.7) tem-se: c c A l (3.8) Quando a permeabilidade magnética é considerada constante, nota-se na eq. (3.8), que existe uma constante de proporcionalidade entre o fluxo magnético e a força magnetomotriz . Esta constante é a relutância do circuito magnético , que leva em conta as características geométricas (lc, Ac) e magnéticas () do núcleo, isto é: c c A l (3.9) Entende-se que a força magnetomotriz fmm é a fonte do fluxo magnético que atua no circuito podendo-se expressar (3.8) como: ou, (3.10) Em outras palavras, o fluxo magnético é diretamente proporcional à força magnetomotriz e pode ser considerado como o resultado dela. A constante de proporcionalidade entre e é a relutância do caminho magnético (A/Wb), definida por: (3.11) A fig. 3.5 representa o sistema magnético da fig. 3.2 com o uso de símbolos. Esse circuito lembra algo já conhecido por você? + - (=Ni) c Fig. 3.5. Modelo do circuito magnético da fig. 3.2. A tab. 3.2 mostra analogias entre um circuito elétrico e magnético e suas grandezas correspondentes. 5 Tab. 3.2. Analogia entre circuitos elétrico e magnético. Circuito elétrico Circuito magnético e i R+ - + - Força eletromotriz, fem (V): e Força magnetomotriz, fmm (A): Corrente (A): R e i Fluxo magnético (Wb): Resistência (V/A ou ): condutor condutor A l R Relutância (A/ Wb): A l * Observações: a) A força eletromotriz fem realiza trabalho sobre portadores de carga através de transformação da energia de uma fonte (química como numa bateria, num gerador eletromecânico convencional, termopilha, célula fotovoltaica, etc.), sendo aplicada a um circuito, é a responsável pela corrente i. b) Por analogia, a força magnetomotriz fmm pode ser entendida como uma diferença de potencial magnético estabelecida no enrolamento de N espiras, sendo responsável pelo fluxo magnético . c) A permeabilidade absoluta , considerada como constante nessa Seção 3.2 deste texto, se deve a uma aproximação quanto ao comportamento do meio magnético (núcleo) e seu estudo será aprofundado posteriormente para a situação não-linear. d) Uma diferença importante entre os circuitos elétrico e magnético é o fato de que é necessário fornecer energia para manter a corrente em um circuito elétrico, enquanto que, um fluxo magnético após ser produzido não solicita energia adicional. Por exemplo, uma vez que o fluxo magnético produzido pela corrente, em um dispositivo como num solenóide ou num toróide, tenha atingido seu valor máximo, toda energia que continuar a ser absorvida pelo dispositivo será apenas para suprir perdas, ou seja, é dissipada na forma de calor na resistência do enrolamento – perdas Joule (Ri2) –, e nas perdas no núcleo (por exemplo, nos casos de núcleos compostos por materiais ferromagnéticos). e) Outra diferença: não existem isoladores magnéticos análogos aos conhecidos para os circuitos elétricos. 6 Exercícios 3.1 (01) Considere o núcleo abaixo com dimensões mostradas em centímetros. Adote a hipótese simplificadora que sua permeabilidade é constante, sendo seu valor relativo: r = 39789. (a) Determinar a permeabilidade absoluta do núcleo. (b) Calcule a relutância magnética e, em seguida, a força magnetomotriz necessária para que o fluxo estabelecido no núcleo seja 50x10-3 Wb (despreze a dispersão de fluxo pelo ar). (c) Considerando que se deseja trabalhar com uma corrente i = 1,5 A, qual deve ser a quantidade de espiras do enrolamento. (d) Desenhe o circuito magnético equivalente colocando os símbolos e valores das respectivas grandezas. 02) Seja um núcleo toroidal feito de madeira, com seção reta circular,raio externo de 20 cm e raio interno de 10 cm, dotado de um enrolamento de 500 espiras. Fazendo circular uma corrente contínua de 0,5 A determine: a) A intensidade de campo magnético no núcleo. b) A densidade magnética que se manifesta no núcleo. c) A relutância magnética. d) A força magnetomotriz gerada. e) O fluxo magnético (de duas maneiras diferentes). 03) Considerando o toróide do exercício (02), porém, com uma corrente i(t) = 0,707cos(t) A. Determine: a) Força magnetomotriz gerada. b) Fluxo magnético. c) Densidade de campo magnético. d) Intensidade de campo magnético. 04) Elabore uma tabela relacionando todas as grandezas magnéticas estudadas até aqui, contendo: símbolo, designação por extenso, definição básica (e/ou equação) e unidade. 7 3.2.2 Circuitos magnéticos mais gerais e analogia com circuitos elétricos Certos projetos de indutores e equipamentos com um elemento móvel possuem um ou mais entreferros de ar em seus circuitos magnéticos. Como a própria palavra diz, entreferro é um espaço entre partes ferromagnéticas do núcleo. A fig. 3.6 mostra um núcleo ferromagnético com um entreferro de ar de comprimento g. Fig. 3.6. Núcleo magnético com entreferro de ar de comprimento g. Quando o comprimento g do entreferro for muito menor que as dimensões do núcleo, o fluxo magnético seguirá o caminho definido pelo núcleo e pelo entreferro. Com essa consideração a análise de circuitos magnéticos pode ser diretamente aplicada. Assim, considerando que o comprimento g é suficiente pequeno a configuração da fig. 3.6 pode ser analisada por duas componentes em série: um núcleo magnético com permeabilidade , área de seção Ac e comprimento médio lc; um entreferro de permeabilidade 0, área de seção Ag e comprimento g. O fluxo é comum no circuito magnético. Além disso, no núcleo, a densidade de fluxo pode ser considerada uniforme, assim: c c A B (3.12) Analogamente, no entreferro: g g A B (3.13) A aplicação da eq. (3.6) a esse circuito magnético fornece: gHlH gcc (3.14) Usando a relação linear entre B e H da eq. (3.3) tem-se: g B l B g c c 0 (3.15) Vale lembrar que = Ni é a força magnetomotriz aplicada ao circuito magnético. De (3.14) nota- se que uma parte dela, c = Hclc, é necessária para produzir campo magnético no núcleo, e o restante, g = Hgg, produz o campo magnético no entreferro. 8 Com os materiais ferromagnéticos da prática (discutidos posteriormente neste capítulo), Bc e Hc nem sempre se relacionam de maneira simples e proporcional, através da permeabilidade constante. Assim, embora a expressão (3.14) continue sendo válida, ela não levará a uma expressão simples como a (3.15) que relaciona a força magnetomotriz aplicada com as densidades de fluxo. Ao invés disso, deve- se usar, gráfica ou analiticamente os detalhes específicos da relação não-linear Bc-Hc do núcleo ferromagnético. Apesar disso, em muitos casos, o conceito de permeabilidade constante aplicada a um material fornece resultados cuja precisão é aceitável em engenharia, sendo por isso usado frequentemente. Das equações (3.12), (3.13) e (3.15) reescreve-se a força magnetomotriz aplicada em termos do fluxo total como: gc c A g A l 0 (3.16) As duas parcelas que multiplicam o fluxo na eq. (3.16) são conhecidos como as relutâncias do núcleo e do ferro respectivamente (compare com = ): c c c A l (3.17) g g A g 0 (3.18) E assim: gc (3.19) Isolando-se o fluxo obtém-se: gc (3.20) ou, gc c A g A l 0 (3.21) Em geral, para qualquer circuito magnético de relutância total equivalente, total, o fluxo pode ser determinado por: total (3.22) O inverso da relutância é conhecido como permeância magnética , (em Wb/A), isto é, = 1/, de forma que: total (3.23) 9 Note que as equações (3.19) e (3.20) são análogas às relações entre tensão e corrente em um circuito elétrico série. Como exemplifica a fig. 3.7, no circuito elétrico uma tensão V impulsiona uma corrente I passando pelos resistores R1 e R2 em série; no circuito magnético, uma força magnetomotriz (análoga à V), estabelece um fluxo (análogo à corrente I) através das relutâncias c e g em série. Esse raciocínio por analogia pode ser empregado para se obter as soluções dos fluxos em circuitos magnéticos lineares de maior complexidade. Fig. 3.7. Analogia entre circuitos elétrico e magnético (elementos em série). A fração de fmm necessária para impulsionar o fluxo através de uma parte do circuito magnético, denominada de queda de fmm em um circuito magnético, é proporcional à relutância daquela parte do circuito na forma "", em analogia à queda de tensão num circuito elétrico que é proporcional à resistência, isto é, "RI". No circuito elétrico Rtotal = R1 + R2; no magnético tem-se: total = c + g. Da eq. (3.17) nota-se que uma alta permeabilidade no material pode resultar em uma baixa relutância do núcleo, muito inferior à do entreferro, isto é: c << g e assim total g. Nesse caso a relutância do núcleo pode ser desprezada e o fluxo, e portanto B, podem ser obtidos apenas das propriedades do entreferro, transformando-se a eq. (3.20) em: g A Ni g g 0 (3.24) Como será visto neste capítulo, na prática os materiais ferromagnéticos têm permeabilidades não constantes, que variam de acordo com o nível de fluxo. Mesmo assim, das equações (3.17) a (3.20) observa-se que enquanto essa permeabilidade permanecer suficientemente elevada, a sua variação não afetará significativamente o desempenho do circuito magnético conforme está sendo estudado. Um fenômeno que ocorre em sistemas reais é que as linhas de campo magnético se abrem nas extremidades do entreferro, isto é, se espraiam ou se "espalham" pelos lados do entreferro. Se esse espraiamento não for excessivo as técnicas de circuito magnético continuam aplicáveis. A fig. 3.8 ilustra esse fenômeno mostrando linhas de campos de espraiamento. Fig. 3.8. Campos de espraiamento no entreferro. 10 A consequência desse espraiamento de campo é aumentar a área efetiva da seção transversal reta do entreferro Ag. Diversos métodos empíricos foram desenvolvidos para levar em conta esse efeito. Em entreferros de comprimento pequeno, uma correção para esses campos de espraiamento pode ser feita acrescentando-se o comprimento do entreferro a cada uma das suas dimensões, aumentando-se assim a área de sua seção reta como ilustra a fig. 3.9. Ac Ag, corrigida g g g g Fig. 3.9. Uma forma de correção da área para entreferros de pequenos comprimentos. Esse efeito leva à redução da densidade de fluxo no entreferro Bg em relação à Bc. No entanto, neste texto, a menos que seja mencionado o contrário, o efeito do espraiamento será ignorado. Assim a área de seção do núcleo ferromagnético Ac será considerada igual à área do entreferro Ag, isto é: Ac = Ag. Neste caso sendo o fluxo comum, as densidades de fluxo no núcleo e no entreferro serão também iguais (Bc = Bg). Mas, as intensidades de campo serão diferentes, isto é, Hc = Bc/ e Hg = Bg/0. 3.2.2.1 Formulação geral de circuitos magnéticos Em geral os circuitos magnéticos podem ser compostos por vários elementos em série e em paralelo. A eq. (3.6) pode ser generalizada para: k k kkk lHLdHNi (3.25) Portanto, a eq. (3.25),complementa de forma mais geral a analogia entre circuito elétrico e magnético, sendo que a força magnetomotriz total impulsiona o fluxo magnético em um laço fechado de um circuito magnético. Além disso, a quantidade: kkk lH (3.26) representa a queda de fmm no k-ésimo elemento desse laço. Essa análise é análoga à queda de tensão nos circuitos elétricos constituídos por fonte e resistores como preconiza a lei de Kirchhoff das tensões: k kkiRV (3.27) onde: V é a fonte de tensão que impulsiona a corrente e Rkik é a queda de tensão no k-ésimo elemento resistivo daquele laço. Já a lei de Kirchhoff das correntes estabelece que a soma das correntes em um nó de um circuito elétrico é zero, a qual é expressa matematicamente por: 0 n ni (3.28) O circuito magnético também tem analogia com essa lei, ou seja, a soma dos fluxos em um nó de um circuito magnético é zero: 0 n n (3.29) 11 Exemplo 3.1. A eq. (3.29) pode ser aplicada no cálculo que envolve circuitos magnéticos com caminhos paralelos, como ilustra a fig. 3.10(a), onde se tem os nós do circuito justamente nas junções superior e inferior da coluna central do núcleo. A fig. 3.10(b) mostra o circuito magnético equivalente. De (3.29): 321 . (a) (b) Fig. 3.10. (a) Núcleo com caminhos paralelos e nós. (b) Circuito equivalente com nós correspondentes. Exemplo 3.2. Seja o sistema da fig. 3.11(a), com dois materiais de permeabilidades absolutas distintas, constituído por ferro fundido (i) e aço fundido (s). Além disso, as áreas de seção transversal Ai e As e comprimentos li e ls, respectivamente, são também diferentes. Pode ser mostrado que: iiss ABAB (3.30) onde: Bi e Bs são as densidades de fluxo no ferro e no aço, respectivamente. (a) (b) Fig. 3.11. (a) Sistema com dois materiais ferromagnéticos diferentes. (b) Circuito equivalente. O circuito magnético equivalente é mostrado na fig. 3.11(b), onde a relutância do ferro é i e a do aço é s. De (3.25): NilHlHldH ssii (3.31) Como descrito anteriormente o termo Hili é uma diferença de potencial magnético (ou queda) na parte de ferro, cuja relutância i é, portanto: iri i i ii iiii iiii A l AB lHlH lH 0 (3.32) Analogamente para o aço fundido: srs s s A l 0 (3.33) onde: ri e rs são as permeabilidade relativas do ferro fundido e aço fundido, respectivamente. Assim: )( sisi (3.34) A relutância total total do sistema "vista" a partir da força magnetomotriz é: sitotal (3.35) 12 Vale ressaltar no Exemplo 3.2 que a equações (3.34) e (3.35) estão de acordo com o circuito magnético equivalente com relutâncias em série, conforme a fig. 3.11(b). Note também que, embora nesta situação as densidades de fluxo Bi e Bs sejam diferentes, o fluxo que percorre o núcleo é o mesmo, podendo ser expresso por: ssii ABAB (3.36) Exemplo 3.3. Desenhe o circuito magnético equivalente para o sistema da fig. 3.12(a). Solução: circuito magnético equivalente, mostrado de forma parcial na fig. 3.12(b): (a) (b) Fig. 3.12. (a) Sistema magnético de uma máquina rotativa. (b) Circuito magnético equivalente (PARCIAL). Enfim, nesta seção foram examinados os princípios básicos e adotadas aproximações que conduziram a um modelo de circuito magnético relativamente simples, bem como propiciaram um entendimento básico para engenheiros, para auxiliar na solução de problemas práticos de análise e projeto. As principais simplificações foram: desprezou-se o fluxo de dispersão; ignorou-se o espraiamento do campo magnético no entreferro; considerou-se a permeabilidade do material constante. O sucesso desta abordagem depende do raciocínio, experiência e da intuição próprios da engenharia. Embora estas suposições sejam razoáveis para muitas situações, verifica-se, por outro lado, que as correntes do enrolamento produzem campos magnéticos fora do núcleo (ou fluxo de dispersão). Quando dois ou mais enrolamentos são colocados em um campo magnético, como no caso de transformadores e máquinas rotativas, esses campos externos ao núcleo, conhecidos como campos de dispersão, não podem ser ignorados, pois afetam de forma significativa o desempenho destes dispositivos. Ademais, em diversas situações práticas os fenômenos conhecidos como saturação magnética e histerese são muito importantes e não podem ser desconsiderados. Seu estudo será realizado na posteriormente neste capítulo. 13 Exercícios 3.2 01) O circuito magnético mostrado na figura ao lado tem as dimensões Ac = Ag = 9 cm2, g = 0,05 cm, lc = 30 cm e N = 500 espiras. Suponha uma aproximação linear para o comportamento do núcleo de tal forma que a permeabilidade relativa de seu material seja r = 70.000. a) Determine as relutâncias c e g. Despreze a dispersão de fluxo. b) Dada a condição de que o circuito magnético esteja operando com Bc = 1,0 T, encontre o fluxo e a corrente i. 02) A estrutura magnética de uma máquina síncrona simplificada está mostrada na figura. Supondo que o ferro do rotor e do estator tenham permeabilidade praticamente infinita ( ), encontre: O fluxo do entreferro e a densidade de fluxo Bg, sendo a corrente I = 10 A, N = 1000, g = 1 cm e Ag = 2000 cm2. 03) Seja o sistema magnético ao lado onde TODAS as dimensões estão em polegadas e a profundidade é uma polegada (não mostrada no desenho). Desenhe o circuito magnético equivalente e calcule o fluxo e a densidade de fluxo, em cada uma das pernas do núcleo. Desprezar o espraiamento nos entreferros e a dispersão de fluxo pelo ar. Supor que a permeabilidade do núcleo é tão alta que a força magnetomotriz do enrolamento é totalmente utilizada para a magnetização nos entreferros. O enrolamento possui 1000 espiras e a corrente que flui por ele é 0,2 A. 04) Seja o sistema magnético: Onde: l1 = l3 = 300 mm l2 = 100 mm A1 = A3 = 200 mm2 A2 = 400 mm2 r1 = r3 = 2250 r2 = 1350 N = 25 espiras a) Determine as densidades de fluxo B1, B2 e B3 nas três partes do circuito sendo a corrente na bobina igual a 0,5 A. b) Desenhe o circuito magnético equivalente e coloque os valores encontrado: , relutâncias e fluxos. 14 3.2.3 Fluxo concatenado, força eletromotriz induzida e indutância Nesta seção estuda-se uma das maneiras de apreciar a manifestação da indução da força eletromotriz (fem) segundo a lei da Indução de Faraday. Para tanto, como será mostrado a seguir, as grandezas elétricas e magnéticas variam em função da variável independente tempo, t. Seja a situação mostrada na fig. 3.13 onde um fluxo magnético em uma espira é produzido pela corrente i(t) variando no tempo, graças à aplicação de uma fonte de tensão externa também variante no tempo v(t). O fluxo (t) que passa pela espira é obtido pela integração do campo B sobre a superfície limitada pela espira. Se a corrente i(t) na espira está aumentando então o fluxo (t) também aumentará, e consequentemente, uma força eletromotriz e(t) será induzida na espira. Pela lei de Lenz a polaridade resultante de e(t) será em oposição ao aumento da corrente. No laço da fig. 3.13 e(t) será positiva, em oposição à v(t), quando i(t) estiver aumentando. A lei de Faraday estabelece que a fem induzida é: dt td te )( )( (3.37) onde o sinal negativo foi suprimido devido à interpretação direta da lei de Lenz, como descrito acima. Fig. 3.13. Ilustração da lei de Faraday. Considerando como exemplo o sistema toroidalda fig. 3.14, com N espiras, sendo i = i(t), então o fluxo também será variável, isto é, = (t), e novamente pela lei da indução de Faraday, uma força eletromotriz e(t) será induzida em cada espira do enrolamento, sendo, portanto: dt td te espira )( )( (3.38) Fig. 3.14. Bobina enrolada em um toróide de plástico (permeabilidade 0). 15 Como o enrolamento concatena o fluxo no núcleo N vezes, a fem total induzida no enrolamento é, portanto: dt td dt tNd te )()( )( (3.39) Onde é o fluxo concatenado do enrolamento de N espiras definido por: N k k tt 1 )()( onde: K é o fluxo concatenado com a espira k (atravessa a espira k); é expresso em webers (ou webers-espiras). Considerando o fluxo total praticamente confinado no núcleo, então = K, logo mostra-se que: )()( tNt (3.40) é também denominado fluxo total enlaçado pelas N espiras de uma bobina, ou referido como enlace de fluxo. Exemplo 3.4. Mostre que para o sistema magnético da fig. 3.14: )( 42 )( 2 0 2 ti d a N t (3.41) Esta expressão indica que o fluxo concatenado é diretamente proporcional à corrente i no enrolamento. Em um circuito magnético composto por material de permeabilidade magnética constante ou que inclua um entreferro dominante, ver a eq. (3.24), a relação entre o fluxo concatenado e a corrente i será linear. Desta maneira, pode-se definir a indutância L como: i L (3.42) sendo a unidade da indutância weber/ampère (Wb/A) ou henry (H). Em outras palavras, (t) = Li(t), veja também a fig. 3.15. Corrente, (A)i Fluxo concatenado, Wb) Fig. 3.15. Gráfico mostrando a relação de proporcionalidade entre o fluxo concatenado e a corrente i para o caso linear: = Li. Compare com a curva B-H também para o caso linear: B = H (compare com fig. 3.3). 16 Substituindo (3.6), (3.22) e (3.40) na eq. (3.42) obtém-se: total N L 2 (3.43) Nota-se de (3.43) que a indutância de um indutor é uma propriedade que depende do quadrado do número de espiras do enrolamento e é inversamente proporcional à sua relutância. Expressando para o sistema magnético simples da fig. 3.2, observa-se que depende do enrolamento (N2), do meio magnético empregado () e de suas características geométricas (lc, Ac): c c l AN L 2 (3.44) Exemplo 3.5. Demonstre que a indutância do circuito magnético da fig. 3.6, supondo que a relutância do núcleo seja desprezível em comparação com a do entreferro é dada por: g AN L g0 2 (3.45) A indutância é uma característica dos campos magnéticos. De maneira geral pode ser caracterizada como aquela propriedade de um elemento do circuito pela qual a energia pode ser armazenada num campo de fluxo magnético. Um fato importante é que seu efeito só aparece num circuito quando há variação da corrente ou fluxo, isto é, sua presença no circuito é sentida somente se houver uma variação da corrente no tempo, por exemplo, em situações transitórias ou em circuitos de corrente alternada. Em muitas situações de interesse prático, a relutância do sistema é dominada pela do entreferro cuja característica é a linearidade, e assim, os efeitos não lineares dos materiais magnéticos (a serem estudados posteriormente neste capítulo) podem ser ignorados. Em outros casos, pode ser aceitável assumir um valor médio para a permeabilidade magnética do material do núcleo, o que resulta numa indutância média correspondente, que pode ser usada com exatidão razoável em certos casos de cálculos de engenharia. Um indutor é, portanto, a estrutura magnética como um todo: uma bobina enrolada sobre um núcleo. Seu propósito em um circuito elétrico é prover indutância (ou auto-indutância). Considerando o indutor com um enrolamento ideal, isto é, sem resistência, uma tensão aplicada aos terminais da bobina v(t) será igual à fem induzida e(t) na mesma, ou seja: dt tdi di td dt td tetv )()()( )()( (3.46) Como para o caso linear: idi td )( (3.47) Então, com (3.42) e (3.46): dt tdi Ltetv )( )()( (3.48) Esta expressão revela que a tensão induzida é proporcional à indutância L. Em outras palavras, uma maior indutância significa que um indutor, para uma mesma taxa de variação da corrente em relação ao tempo, induz mais força eletromotriz e(t). 17 A bobina puramente indutiva é representada simbolicamente no circuito da fig. 3.16(a). Na prática o enrolamento tem uma resistência cujo efeito, em muitas circunstâncias, não pode ser desprezado. Um modelo de circuito de indutor prático incluindo esse efeito na forma de um parâmetro concentrado de circuito, um resistor R, é dado na fig. 3.16(b). Para este modelo tem-se: dt tdi LtRitv )( )()( (3.49) Lev (a) RRi Le v (b) Fig. 3.16. Modelos de circuito elétrico para indutor linear: (a) bobina com resistência desprezada. (b) indutor linear prático. Observação: frequentemente em dispositivos de conversão de energia, como é o caso das máquinas motrizes, em que as indutâncias podem ser expressas por L = /i mas são variáveis com o tempo, a equação e(t) = d(t)/dt se torna: dt tdL i dt tdi LtitL dt d te )()( )()()( (3.50) 18 Exercícios 3.3 01) Qual é a diferença entre indutor e indutância? 02) Seja um núcleo toroidal feito em madeira, de seção reta circular, com um raio externo de 20 cm e um raio interno de 10 cm, dotado de um enrolamento de 500 espiras. Fazendo circular uma corrente contínua de 0,5 A. a) Calcule o fluxo magnético concatenado. b) Determine a indutância do dispositivo (indutor) de duas maneiras diferentes. 03) Demonstre que a indutância do toróide da fig. 3.1 com, = 0, é dada por: a dN L 8 22 0 . 04) Projete de forma simplificada um indutor de tal forma que: deve ter uma indutância de 1 mH; núcleo toroidal de ar (ar 0); com bobina com fio de cobre esmaltado de 1 mm2 enrolada ao longo de um molde de papelão; Alguns parâmetros do indutor poderão ser arbitrados para poder encontrar os demais. Represente o circuito elétrico equivalente levando em conta a resistência do enrolamento. Adote a resistividade do cobre como sendo 1.72×10−8 m a 20 oC. Para simplificar, suponha que esta será a temperatura de trabalho do indutor. 05) Elabore uma tabela com todas as grandezas magnéticas estudadas até aqui, contendo: símbolo, designação por extenso, definição básica (e/ou equação) e unidade. 06) PESQUISE e cite exemplos de utilização prática de indutores tanto para circuitos elétricos e eletrônicos em geral, quanto para sistemas elétricos de potência. O que são reatores no contexto que estamos estudando? 19 3.2.4 Energia em circuitos magnéticos lineares Em um circuito magnético, a potência elétrica nos terminais de um enrolamento é uma medida da taxa em relação ao tempo com que a energia flui para aquele circuito. Da teoria de Circuitos Elétricos, sabe-se que a potência instantânea p(t) é dada por: )()()( titvtp Em um indutor uma corrente i(t) fluindo em seu enrolamento produz um fluxo (t) enlaçando suas N espiras. Considerando também a resistência do condutor, da seção anterior sabe-se que: dt td tRitetRitv )( )()()()( (3.51) Multiplicando-se a expressão anterior pela corrente i(t), obtém-se a potência p(t), em watts, nos terminais do dispositivo:dt td titRititvtp )( )()()()()( 2 (3.52) O termo Ri2(t) é a parte da potência dissipada na resistência R da bobina. A outra parcela corresponde ao fluxo de potência da rede elétrica para o campo magnético. O trabalho necessário para estabelecer o fluxo magnético no indutor corresponde à energia que é armazenada em seu campo magnético, em joules, dada por: 2 1 2 1 )( )()()( t t t t dt dt td tidttiteW 2 1 diW (3.53) Note da expressão (3.53) que o cálculo da energia corresponde a uma integral definida que fornece a área obtida da curva -i, conforme ilustra a fig. 3.17 para o caso linear. Corrente, (A)i Fluxo concatenado, Wb) o i i2 Energia W Fig. 3.17. Energia em circuito magnético linear. 20 No caso de um sistema magnético com único enrolamento de indutância L constante, para o qual vale a relação = Li (ou, i = /L), a variação da energia magnética armazenada quando o fluxo varia de 1 à 2, pode ser escrita como: )( 2 1 2 1 2 2 2 1 L d L W (3.54) A energia magnética total armazenada para qualquer valor de , pode ser obtida fazendo-se 1 igual a zero: 2 2 1 L W 2 2 1 LiW (3.55) A equação (3.55) é aquela conhecida do estudo de Circuitos Elétricos. Outra maneira de chegar a ela é: t ti i t dttiLdtti dt tdi LdttitetW 0 )( )0(0 )()( )( )()()( )( 2 1 )( 2 tLitW onde: considerou-se zero a corrente inicial no indutor, isto é: i(0) = 0 (sem energia inicial). Portanto, o indutor absorve uma quantidade de energia proporcional à sua indutância e é sempre positiva. A energia armazenada no campo magnético do indutor linear é de valor finito e pode ser recuperada, pois a energia aumenta, diminui ou zera quando o mesmo ocorre com a corrente, de forma que o indutor linear retorna a energia à fonte ou rede elétrica da qual ele a recebeu. Entretanto vale enfatizar que, nos casos em que a resistência do enrolamento não pode ser desprezada, mesmo num indutor linear há uma dissipação de energia na forma: dttRitW t disspada 0 2 )()( (3.56) Outra maneira de expressar a energia em sistemas magnéticos é fazendo uso do campo B e da curva B-H do material do núcleo. Como exemplo, considere a aplicação de uma tensão variável v(t) aos terminais da bobina do toróide mostrado na fig. 3.18. Fig. 3.18. Toróide com permeabilidade 0 e caminho magnético médio l = 2a. 21 Sendo sua permeabilidade praticamente igual a 0, pode-se mostrar que a energia magnética armazenada (em joules) para um determinado valor de densidade de fluxo B0 é: 0 2 0 2 AlB W (3.57) Sendo o produto Al o volume do espaço envolvido pela bobina, então a densidade de energia (em J/m3) é dada por: 0 2 0 2 1 B w (3.58) A curva de magnetização deste sistema não ferromagnético pode ser representada por uma linha reta passando pela origem como mostra a fig. 3.19. Desta figura e da eq. (3.58) nota-se que a densidade de energia correspondente a um valor específico 0B é dada pela área compreendida entre a linha representando a relação B-H do toróide e o eixo vertical B. Fig. 3.19. Curva B-H para material não ferromagnético e densidade de energia = área sombreada. 3.2.5 Indutância e energia armazenada em sistemas com entreferro Devido à relação linear entre e , ou assumindo que ela existe, isto é, nos sistemas magnéticos que são linearizados em decorrência da presença do entreferro, a indutância é considerada uma grandeza constante. Neste caso, vale a definição já conhecida: total N i L 2 (3.59) Tomando como exemplo o sistema magnético da fig. 3.6 composto por um núcleo com um entreferro tem-se: gc N i L 2 (3.60) Quando >> 0 o que implica em c << g, a indutância fica sendo: g ANN L g g 0 22 (3.61) onde, neste caso, percebe-se que a indutância é praticamente ditada pelo entreferro. 22 Com (3.55) a energia, em joules, pode ser expressa por: 20 2 2 1 i g AN W g (3.62) Outra forma de expressar a energia armazenada, porém em função no campo B no entreferro, pode ser obtida diretamente de (3.62), sendo nesta região B = 0Hg e como Hg Ni/g, obtém-se: )( 2 1 0 2 gA B W g (3.63) onde: o produto (Agg) é o volume do entreferro em m3. Assim, sendo >> 0, praticamente toda energia magnética fica armazenada no entreferro. Uma maneira ainda melhor de perceber esta afirmação é através da análise da expressão abaixo, a qual foi deduzida levando em conta as duas parcelas de energia, por unidade de volume do núcleo e por unidade de volume do entreferro: 0 22 22 BB w (3.64) onde: w é densidade de energia dada em J/m3; foi desprezado o espraiamento do fluxo, isto é, Ac = Ag; a densidade de fluxo B foi considerada igual para o núcleo e o entreferro: B = Bc = Bg; o produto (Agg) é o volume do entreferro e (Aclc) é o volume do núcleo, ambos em m3. Da eq. (3.64) nota-se claramente que quando >> 0 a primeira parcela, correspondente à energia para o núcleo, fica desprezível em face da outra, ou seja, a energia magnética é praticamente armazenada no campo estabelecido no entreferro como mostraram também as equações (3.62) e (3.63). 23 Exercícios 3.4 01) No sistema magnético abaixo Ac = Ag = 9 cm2, g = 0,05 cm, lc = 30 cm, N = 500 espiras, r = 70000 para o material do núcleo. Encontre: (a) A indutância. (b) A energia magnética armazenada quando a densidade de fluxo magnético no núcleo é 1,0 T. (c) A tensão induzida no enrolamento considerando que Bc = 1,0sen(t) T, sendo a frequência 60 Hz. (d) A indutância desprezando a influência do núcleo e compare com a letra (a). (e) A energia magnética armazenada desprezando a contribuição do núcleo e compare com a letra (b). 02) (a) Considerando o exercício (01) novamente, porém, com r = 30.000, calcule a indutância. Compare com o valore encontrado anteriormente. O que você conclui a respeito disso? (b) Usando o programa MATLAB (ou outro), faça um gráfico da indutância do circuito magnético do exercício (01) em função da permeabilidade do núcleo no intervalo 100 r 50000. Observe o que ocorre com a indutância à medida que r aumenta. Por exemplo, com r em torno de 1000, como fica o efeito do núcleo sobre a indutância? (c) Idem para a energia, considerando a presença do núcleo e do entreferro. 03) Calcule a densidade de energia (J/m3) e a energia (J) no entreferro para a estrutura magnética ao lado (para a qual admite-se que o ferro do rotor e do estator tenham permeabilidade praticamente infinita). Considere a corrente no enrolamento I = 10 A, N = 1000 espiras, g = 1 cm e Ag = 2000 cm2. 04) O circuito magnético da figura é constituído por uma bobina de N espiras enroladas em um núcleo magnético, de permeabilidade muito alta (considerada infinita ), com dois entreferros paralelos de comprimentos g1 e g2, e áreas A1 e A2, respectivamente. Determine de forma literal: a) O diagrama do circuito magnético equivalente. b) A indutância. c) A densidade de fluxo B1 no entreferro 1 quando o enrolamento está conduzindo uma corrente i. Despreze os efeitos de espraiamento no entreferro e de fluxos de dispersão. 05) Demonstre a eq. (3.57). 24 3.3 Circuitos magnéticos não-lineares Nesta seção,será estudado o ferromagnetismo, sua importância e influência prática nos sistemas magnéticos. Dentre outros assuntos será mostrado que a permeabilidade dos materiais ferromagnéticos não é constante, que a relação entre B e H é não-linear e que existem perdas de energia no núcleo. Os materiais magnéticos (ou mais precisamente ferromagnéticos) têm grande importância no funcionamento de equipamentos elétricos e de conversão eletromecânica de energia, pois: a) permitem obter densidades elevadas de fluxo magnético (B) com níveis relativamente baixos de intensidade de campo (H). Como as forças magnéticas e a densidade de energia aumentam com a densidade de fluxo, esse efeito apresenta grande influência no desempenho dos equipamentos. Em termos práticos, o uso de materiais ferromagnéticos no núcleo dos equipamentos aumenta o fluxo por unidade de corrente, o que propicia dispositivos menores e mais baratos. b) delimitam e direcionam os campos magnéticos no circuito, em caminhos bem definidos. Em transformadores, os materiais magnéticos são usados para maximizar o acoplamento entre os enrolamentos, assim como para diminuir a corrente de excitação. Em máquinas motrizes, os materiais magnéticos dão forma aos campos de modo que seja produzido o conjugado desejado, e as características elétricas específicas sejam obtidas nos terminais da máquina. 3.3.1 Ferromagnetismo Considere novamente o toróide da fig. 3.14. A corrente no enrolamento produz uma intensidade de campo magnético H dentro do toróide e uma densidade de fluxo magnético B que são colineares. Sendo o meio o vácuo, a relação entre B e H em qualquer ponto é dada pela conhecida expressão: HB 0 (3.65) Se o núcleo do toróide for preenchido com ar, plástico ou madeira, a magnitude da densidade de fluxo, B, é muito pouco aumentada. De fato, para a maioria das substâncias não ferromagnéticas, a diferença em relação à expressão (3.65) é tão pequena que, em termos práticos, pode ser completamente desprezada. Todavia, como será explicado, se o núcleo de madeira for substituído por um de ferro de dimensões idênticas, será observado que a densidade de fluxo magnético B e, portanto, o fluxo magnético total produzido pela mesma bobina, com a mesma corrente (mesmo campo H), será enormemente aumentado! Este aumento é devido ao fenômeno denominado de ferromagnetismo, visto que foi observado primeiramente no ferro. Para entender os fundamentos deste fenômeno é suficiente empregar um modelo atômico relativamente simples, que consiste de um núcleo circundado por uma nuvem de elétrons. Cada elétron possui uma carga de 1,6x10-19 C, e esta carga pode ser considerada como concentrada em uma pequena esfera. Os elétrons estão em órbita ao redor do núcleo. Além disso, cada elétron gira em torno de seu próprio eixo enquanto se move na órbita em torno do núcleo, ver fig. 3.20. A fig. 3.20(a) ilustra um elétron em órbita. A direção do movimento orbital descrita pela carga negativa do elétron corresponde a uma corrente i positiva (sentido convencional), em um laço formado pela órbita fluindo no sentido mostrado. A direção do fluxo magnético resultante, e consequentemente a direção do momento magnético orbital, ao longo do eixo da órbita, é aquele indicado pelo vetor mop . Além disso, cada elétron tem um momento magnético de spin decorrente da rotação da carga em torno de seu próprio eixo, como ilustra a fig. 3.20(b). Se a carga é entendida como distribuída esfericamente ao redor de seu eixo, girando no sentido horário, então equivale a um laço de corrente 25 no sentido anti-horário. Como um elétron tem uma quantidade específica (um quantum) de carga elétrica, ele tem também um momento magnético específico. O momento magnético de spin msp , tem uma magnitude de 9,27x10-24 Am2, e o momento magnético orbital 0mp , vale zero ou é um múltiplo inteiro deste valor. Fig. 3.20. (a) Movimento orbital de um elétron. (b) Spin de um elétron. Existem, portanto, dois fatores que podem se combinar para produzir o momento magnético do átomo mp . No entanto, nos átomos de muitos elementos os elétrons estão dispostos simetricamente, de forma que os momentos magnéticos devidos ao spin e ao movimento orbital cancelam-se entre si, levando o átomo a não ter momento magnético líquido. Mas, nos átomos de mais de um terço dos elementos conhecidos não há essa simetria, de forma que eles possuem um momento magnético atômico líquido. Mesmo assim, a disposição dos átomos na maioria dos materiais é tal que o momento magnético de um átomo é cancelado por de outro de direção oposta (antiparalelo) vizinho próximo. Em somente cinco elementos os átomos estão dispostos com seus momentos magnéticos em paralelo de forma que eles se suplementam ao invés de se cancelar. Os cinco elementos ferromagnéticos são: ferro; níquel; cobalto; disprósio; gadolínio. Os dois últimos são metais de terras-raras, têm aplicação limitada na indústria e seu ferromagnetismo ocorre em temperaturas mais baixas que a ambiente. Um número de ligas destes cinco elementos, que incluem substâncias não ferromagnéticas em sua composição, também possuem a propriedade do ferromagnetismo. Um exemplo muito usado é o aço-silício, uma liga projetada especialmente para sistemas magnéticos práticos. Foi demonstrado, experimentalmente, que uma amostra de material ferromagnético é dividida em domínios magnéticos, comumente de tamanho microscópico, nos quais os momentos atômicos estão alinhados. A figura ao lado mostra uma fotografia ampliada de um conjunto de domínios num cristal simples de níquel. Para tirá-la o fotógrafo espalhou uma suspensão coloidal de um finíssimo pó de óxido de ferro sobre uma superfície do cristal convenientemente cortada. As linhas brancas mostram as fronteiras destes domínios. As setas indicam a orientação dos momentos magnéticos no interior dos domínios. A direção de alinhamento dos momentos atômicos difere de um para outro domínio. Isto está ilustrado na fig. 3.21(a) onde as setas indicam a direção do momento magnético em cada domínio. Mas, deve-se ter em mente que os domínios podem estar alinhados de forma aleatória nas três dimensões do material. O tamanho dos domínios é tal que um simples cristal pode conter muitos domínios, cada qual alinhado com um eixo do cristal. Quando uma amostra ferromagnética é colocada em um campo magnético, os momentos magnéticos atômicos tendem a girar em alinhamento ao campo magnético. O volume dos domínios na amostra em que os momentos magnéticos são mais ou menos alinhados com o campo magnético (favoravelmente orientados) aumenta em tamanho, às custas da diminuição do volume dos domínios 26 que estão mais ou menos em alinhamento oposto ao campo aplicado (desfavoravelmente orientados). Este fenômeno é conhecido como movimento de parede de domínio, ilustrado na fig. 3.21(a) para a fig. 3.21(b) e também de forma similar, para outro caso, na fig. 3.21(c) para (d). A consequência deste movimento de parede é que a amostra do material como um todo adquire um momento magnético que pode ser considerado como o resultante de todos seus momentos atômicos. O momento magnético da amostra fornece uma medida do grau de alinhamento de seus momentos. (c) (d) Fig. 3.21. Domínios ferromagnéticos: (a) sem campo magnético aplicado; (b) campo magnético aplicado de intensidade H; (c) outro material desmagnetizado; (d) magnetização e movimento da parede do domínio. 3.3.2 Magnetização Mais uma vez usando o toróide da fig. 3.14, porém, considerando que seu núcleo é de ferro fundido, pode ser determinada a curva de magnetização B = B(H) experimentalmente,medindo-se um conjunto de valores de B e H a partir de uma determinada faixa de valores de corrente aplicada. Tipicamente, a relação obtida entre B e H tem a forma da curva de baixo da fig. 3.22. Se a bobina é enrolada em um toróide de aço fundido, material usado em máquinas elétricas, então a curva de magnetização típica obtida é a curva intermediária da fig. 3.22, ou, se o núcleo for de aço silício do tipo especificado tem-se a curva superior na fig. 3.22. Fig. 3.22. Curvas de magnetização de três materiais ferromagnéticos diferentes. 27 A densidade de fluxo produzida no material ferromagnético pode ser descrita como constituída por duas componentes: MBBB 0 (3.66) onde: B0 é a magnitude da densidade de fluxo que ocorreria em uma bobina envolvendo o vácuo; BM é a magnitude da densidade de fluxo adicional devida à presença do núcleo ferromagnético. Com H = 1000 A/m, ter-se-ia: B0 = 0,0012566 T; da fig. 3.22 para o ferro fundido B = 0,513 T; assim, da eq. (3.66), em módulo: BM 0,512 T. Portanto, nota-se um extraordinário aumento da densidade de fluxo devido à presença do material ferromagnético, mais de 400 vezes maior que a densidade produzida somente no ar. Assim, quando uma intensidade de campo magnético externa ( H ) é aplicada ao material ferromagnético, os momentos dos domínios magnéticos tendem a se alinhar com o campo aplicado. A componente de densidade de fluxo MB é o resultado de um alinhamento parcial dos momentos magnéticos atômicos do ferro na direção do campo H aplicado. Como resultado, se produz um valor muito mais elevando de densidade de fluxo ( B ) do aquele que existiria se houvesse apenas o vácuo ou o ar. À medida que a magnitude H aumenta B também aumenta – porém, de forma não-linear com a variação de H, isto é, não é mais constante (ver curvas B-H da fig. 3.22) –, até que todos os momentos magnéticos estejam alinhados com o campo aplicado. Nesse ponto, eles não podem mais contribuir para o aumento da densidade de fluxo (B), diz-se que o material está completamente saturado. 3.3.3 Saturação As curvas de magnetização da fig. 3.22 mostram que a densidade de fluxo B cresce rapidamente enquanto H é aumentado a partir de zero. Isto indica que somente um pequeno campo aplicado H é requerido para fazer as fronteiras dos domínios magnéticos moverem-se e permitir mais momentos atômicos se alinharem parcialmente com H. À medida que H é aumentado, a inclinação da curva de magnetização (dB/dH) é reduzida, indicando que as paredes dos domínios estão se movendo mais lentamente. Para se obter uma magnetização adicional será requerida a aplicação de um valor de H grande o suficiente para girar os momentos atômicos dos eixos dos cristais a uma direção mais próxima do alinhamento com H. Este achatamento da curva B-H é proveniente da chamada saturação do ferro. A saturação completa, correspondendo à magnetização máxima, ocorreria se todos os momentos atômicos fossem levados a um completo alinhamento na direção do campo aplicado. Para qualquer outro valor menor de magnetização tem-se: )(00 MHBBB M (3.67) A denominada magnetização M explicitada na eq. (3.67) é dada por: 0 MBM (3.68) onde: em módulo: M= BM/0; a unidade da magnetização é A/m; no vácuo M = 0. Como pode ser visto na fig. 3.22, por exemplo, até mesmo para H = 3000 A/m a densidade de fluxo para o ferro fundido é somente B = 0,76 T, um valor muito menor que o decorrente de um 28 perfeito alinhamento de todos os momentos atômicos na direção do campo aplicado. Consequentemente, este material é muito difícil de saturar completamente. Se H é aumentado enormemente, B continuaria a aumentar, e a inclinação da curva tenderia à 0, onde a máxima magnetização do material seria alcançada. Na fig. 3.22 o material M36 (lâminas de aço-silício de espessura "29 gauge") atinge uma densidade de fluxo B = 1,8 T em 1000 A/m. Neste ponto, somente 0,0012 T advém do campo H aplicado, sendo a maior parte devida a magnetização do material. Em H = 3000 A/m, 1,99 T é obtido, que é cerca de 92% de BMmax do ferro (2,18 T), o principal componente desta liga. Portanto, alguns materiais ferromagnéticos podem se aproximar do limite teórico (2,18 T) com a aplicação de valores relativamente pequenos de H. Enfim, diferentes materiais saturam em diferentes valores de densidade de fluxo. Na saturação a permeabilidade torna-se muito pequena. 3.3.4 Permeabilidade dos materiais ferromagnéticos e indutor não-linear Considere em primeiro lugar uma amostra não magnetizada de material ferromagnético. Se a intensidade magnética H, inicialmente nula, for aumentada continuamente, a relação B-H descreverá uma curva semelhante à da fig. 3.23, a curva de magnetização do material. Nota-se mais uma vez que a permeabilidade não é constante, sendo seus valores tomados na curva de magnetização sempre de sinal positivo em uma ampla faixa. Da curva de magnetização obtém-se a permeabilidade, que deve ser calculada para cada ponto da curva, dada por: dH dB (3.69) Esta expressão fornece a permeabilidade de forma geral, isto é, válida tanto para o caso linear estudado anteriormente, quanto para o caso não-linear, onde a permeabilidade varia dependendo do ponto de operação na curva B-H. Fig. 3.23. Ilustração da curva de magnetização (curva B-H) e permeabilidade ( = dB/dH) de um material ferromagnético típico. A permeabilidade máxima ocorrerá no "joelho" da curva onde a derivada dB/dH é máxima; em alguns materiais esta permeabilidade máxima é maior do que 1050, em outros é bem menor. Como pode ser observado na fig. 3.23, a permeabilidade do material cai drasticamente na saturação, o que faz com que a indutância se torne muito pequena nesta situação, como explanado a seguir. O uso do material ferromagnético introduz a mencionada relação não-linear entre B e H, o que faz com que a curva -i seja também não-linear como mostra a fig. 3.24. Assim, não será válida a relação de proporcionalidade que representa uma reta = Li com a indutância constante (ver fig. 3.15). Em outras palavras, quando se faz passar um fluxo por um material ferromagnético, a relação com a corrente que o produz não é mais proporcional. Alguns autores chamam o dispositivo de indutor não-linear. Neste caso a indutância, denominada de indutância incremental, é dada por: di d L (3.70) 29 Por exemplo, considerando o toróide da fig. 3.14 com núcleo ferromagnético e usando as conhecidas expressões anteriores obtém-se: N lH d NAdB di d N di d L dH dB l AN L 2 (3.71) O que mostra que a indutância neste caso é variável, atingindo um valor máximo na maior inclinação da curva B-H (maior valor da derivada = dB/dH), podendo cair bastante na região de saturação, que ocorre com maiores valores de H, com correntes mais elevadas. Fig. 3.24. Gráfico mostrando a relação não-linear entre o fluxo concatenado e a corrente i para materiais ferromagnéticos. Veja a curva B-H não-linear da fig. 3.23 e compare também com o caso linear da fig. 3.15. 3.3.5 Aproximação da permeabilidade para meios não-lineares Como visto, as curvas B-H na fig. 3.22 são não-lineares. Em muitos casos, nos equipamentos os materiais magnéticos operam normalmente em pontos de suas curvas B-H antes da saturação. Assim, com frequência, é conveniente aproximar por uma linha reta aquela parte da curva B-H que é usada. Isto foi feito para o aço fundido da fig. 3.22, como mostra a fig. 3.25. Neste caso, a aproximação é aceitável até o valor de B 0,9 T. Acima destevalor, as imprecisões se tornam muito grandes. Fig. 3.25. Aproximação para a curva de magnetização para o aço fundido da fig. 3.22. 30 Dentro da faixa "linear" aceitável, a curva B-H pode ser descrita pela conhecida relação: B = 0rH (3.72) Onde r é a conhecida permeabilidade relativa do material, isto é, um fator pelo qual a densidade de fluxo é multiplicada devida a presença do material ferromagnético, valendo portanto a expressão B = H, onde = r0. Na aproximação linear da fig. 3.25, para B = 0,9 T, H 530 A/m e, portanto, r 1350. Veja como é grande o efeito na permeabilidade devida à presença do material! Exemplo 3.6. Suponha uma ferrite para a qual r = 50 e que esteja operando com baixa densidade de fluxo, a fim de que se possa considerar uma relação linear para o meio. Sendo B = 0,05 T, calcule , H, M e a susceptibilidade magnética m a qual é dada pela relação M/H. Solução: Permeabilidade absoluta: = 0r = (410-7)*50 = 6.2832x10-5 H/m. Intensidade magnética: H = B/ = 795,7747 A/m. Magnetização: B = 0(H + M) => M = B/0 – H => M = 38992,9611 A/m. Susceptibilidade: m = M/H = 49,0000. O que mostra que a magnetização produzida pelo material é 49 vezes maior que a produzida pelas cargas livres (corrente). Exemplo 3.7. Considere que a bobina da fig. 3.14 tem 1000 voltas e que o núcleo do toróide é de aço fundido, com um raio médio de 250 mm e uma seção transversal com 25 mm de diâmetro. Use a curva B-H (aço fundido) da fig. 3.22 para determinar M e r, quando a corrente na bobina é 1,2 A. Solução: H = Ni/l = 1000*1,2/(2**25010-3) = 763,9 A/m Da fig. 3.22: B 1,03 T Como: B0 = 0H = 410-7763,9 = 9,6010-4 T Logo: BM = B – B0 1,029 T De (3.68): M = BM/0 = 1,029/(410-7) = 8,19105 A/m Com (3.72): r = /0 = (B/H)/0 => 1073 104 )09,763/()003,1( 7 r . Exemplo 3.8. Para o sistema magnético do Exemplo 3.7 determine: a) A corrente na bobina para produzir uma densidade de fluxo de 1,2 T no toróide. b) A permeabilidade relativa para uma densidade de fluxo de 0,9 T. c) A indutância da bobina usando uma reta passando pelo ponto na curva para 0,9 T como aproximação. Solução: a) Da fig. 3.22, em B = 1,2 T tem-se: H 1140 A/m. Da eq. (3.2): H = Ni/lc => i = lcH/N => Ai 79,1 1000 114010250**2 3 b) Da fig. 3.25, em B = 0,9 T, H 580 A/m. Da eq. (3.72): r = /0 = (B/H)/0 => 8,1234 104 )0580/()09,0( 7 r c) B = 0,9 T o fluxo magnético é: mWb44179,09,0)1025( 4 23 E a indutância é: H l ANN L c cr 485,0 102502 4/)1025(1048,12341000 3 2372 0 22 * Note nos Exemplos 3.7 e 3.8 que as permeabilidades relativas são diferentes para o mesmo sistema magnético, devido a pontos de operação diferentes na curva B-H. 31 Como já mencionado, na prática os materiais ferromagnéticos são usados para aumentar o fluxo concatenado por unidade de corrente para se ter equipamentos (indutores, transformadores, motores, geradores, etc.) menores e mais baratos. No entanto, os materiais ferromagnéticos se caracterizam por sua magnetização, saturação e pelo fato de sua presença no circuito implicar usualmente em um profundo efeito na indução magnética. Portanto: os materiais ferromagnéticos, amplamente utilizados em máquinas elétricas, são não-lineares. Desta forma a permeabilidade constante não se aplica estritamente a eles; como aproximação pode-se considerar uma linha reta na parte da curva B-H em que se presume que o núcleo irá trabalhar antes da saturação, isto é, válida somente até um certo valor de B; outra maneira é examinar separadamente cada problema que envolve o ferromagnetismo, determinando-se qual região da curva B-H é importante para o problema em particular, fazendo-se aproximações para esta região. Em certos estudos linearizar-se por partes determinados trechos da curva B-H, ver Exercícios 3.5, número (04). ou, simplifica-se o problema pela adoção de um valor médio constante para a permeabilidade; certas espécies de ferros conhecidas como ferro doce podem ser tratadas como aproximadamente lineares. Embora tenha sido enfatizado neste texto somente as substâncias ferromagnéticas, em geral nos materiais, cada átomo contém componentes diferentes para o momento magnético e a sua combinação determina as características magnéticas do material e provê sua classificação magnética. Deste modo, tem-se seis tipos diferentes, descritos resumidamente no Apêndice A, que pode ser acessado pelo hiperlink: A.1 Classificação magnética dos materiais. Esta classificação é bem mais abrangente e adequada do que a simplificada tab. 3.1 mostrada no início deste capítulo. 3.3.6 Efeito da temperatura Quando a temperatura de um material é aumentada cada átomo oscila ao redor de sua posição média no cristal, e esta oscilação perturba o alinhamento dos momentos magnéticos. Consequentemente, quando a temperatura de um material ferromagnético é aumentada, sua magnetização é alterada da maneira ilustrada na fig. 3.26. Fig. 3.26. Diminuição da magnetização ferromagnética com a temperatura. Em uma temperatura conhecida como Temperatura Curie (Tc), o alinhamento atômico paralelo desaparece completamente e os momentos atômicos ficam alinhados aleatoriamente. A Temperatura Curie para o ferro é 770 C. Desde que as temperaturas na maioria das máquinas elétricas são usualmente abaixo de 150 C, o efeito nas propriedades ferromagnéticas do ferro será pequeno. Os efeitos de temperatura são mais importantes no níquel, no qual Tc = 348 C. Nos elementos das terras- raras, as Temperaturas Curie estão abaixo da temperatura ambiente normal. 32 Exercícios 3.5 01) Considere o sistema magnético toroidal da fig. 3.14, no qual é aplicado uma intensidade magnética externa de magnitude H = 1000 A/m. a) Determine (aproximadamente) para as três curvas da figura ao lado, a magnitude da componente de densidade de fluxo BM e da magnetização M correspondente. b) Calcule a corrente i para se obter uma densidade de fluxo magnético B = 1,4 T considerando o núcleo do toróide e somente para as curvas do aço fundido e do aço-silício da figura. Dados: raio a do toróide: a = 15 cm; número de espiras: N = 250. 02) O núcleo da figura ao lado é feito de aço-silício M-36 (29 gauge), cuja curva de magnetização é mostrada no exercício (01). O enrolamento possui 300 voltas. As dimensões estão em milímetros. a) Determine a corrente requerida para produzir uma densidade de fluxo de 1,4 T no núcleo. b) Se a curva de magnetização é aproximada por uma reta a partir da origem até o ponto B = 1,4 T, qual seria a permeabilidade relativa do material do núcleo e a indutância do dispositivo? 03) Um indutor composto por um núcleo de área de seção transversal retangular A e caminho magnético médio de 0,60 m, deve trabalhar na região da curva B-H do material antes da saturação, isto é, abaixo do joelho da curva. A indutância deve ser 5 mH. Sendo o enrolamento com 50 espiras, calcule qual deve ser a área A para cada um dos três materiais da figura do exercício (01). Despreze a dispersão de fluxo. Analise os resultados. 04) Seja uma liga de aço-silício com os seguintes valores de sua curva de magnetização: H = [0 25 50 75 100 150 200 250 300 350 400 500 600 700 800 900 1000 ] A/m B = [0 0.0222 0.1222 0.3111 0.6000 0.8444 1.0000 1.1000 1.1556 1.2000 1.2333 1.2778 1.3000 1.3111 1.3222 1.3333 1.3344] T a) Plote a curva B-H correspondente.b) Faça uma linearização da curva B-H usando duas retas. Ache as equações destas retas sendo a 1ª da origem até B = 1,10 T (aproximadamente início da saturação). A 2ª reta de B = 1,10 T até B = 1,3344 T. c) Determine, para a aproximação da curva B-H obtida no item (b), a indutância obtida em cada reta, considerando um núcleo com a geometria do exercício (03) sendo A = 6x10-2 m2 , l = 0,6 m e N = 50 espiras. O que você observa? 33 3.3.7 Histerese Embora o estudo da curva de magnetização seja de grande importância, outros fenômenos, não menos importantes, também ocorrem nos materiais ferromagnéticos, os quais serão discutidos nesta e nas próximas seções. Verifica-se que, quando se aumenta e depois se diminui a intensidade de campo H aplicada, a curva de magnetização ou curva B-H de um material ferromagnético não se sobrepõe. Para apreciar isso, considere novamente a bobina da fig. 3.14 enrolada sobre um toróide de ferro e excitada por uma corrente alternada de frequência muito baixa. Desta forma, H inicia em zero e varia muito lentamente entre valores de pico Hmax e –Hmax como mostra a fig. 3.27(a). Com o ferro inicialmente desmagnetizado, a variação de B é mostrada na fig. 3.27(b). Após alguns ciclos de H, se define um laço B-H fechado, o laço abcdefa mostrado na fig. 3.27(c), no qual a densidade de fluxo B é uma função de dois valores para cada valor de H. As setas indicam o sentido do movimento do estado magnético do ferro à medida que H varia. Assim, a curva B-H para H crescente difere de modo notável daquela para H decrescente. Este fenômeno é a histerese magnética. Fig. 3.27. Variação de B com H. (a) Intensidade H aplicada variando no tempo. (b) Variação de B para 0 < t < t1. (c) Laço B-H em regime permanente. A variação de H para obter o laço B-H fechado da fig. 3.27(c), de Hmax para –Hmax e a volta de –Hmax para Hmax, deve ser unidirecional. Por exemplo, em nenhum momento o aumento contínuo de H que fornece a parte defa do laço pode ser interrompido ou revertido. Se isto ocorrer, um laço menor de histerese (minor loop) como o mostrado na fig. 3.28 surgiria, e muitos ciclos de variação de H seriam necessários para restabelecer o laço fechado abcdefa, em regime permanente, da fig. 3.27(c). Fig. 3.28. Laço de histerese menor (minor loop). Observe que no ponto b da fig. 3.27(c), o ferro permanece magnetizado até mesmo se a corrente no enrolamento for zero. Para remover esta magnetização a corrente deve aumentar em módulo, mas em sentido negativo. Portanto, nos pontos b, e no laço, o ferro possui uma magnetização que não desaparece com a remoção do campo H que a produziu: diz-se que o material ficou imantado. Através de todo o ciclo de variação, o valor de B está sempre defasado (atrasado) do valor de H. Este fenômeno é denominado histerese, da palavra grega que significa "vir atrás". O fator preponderante do ciclo de histerese é a reorientação lenta dos domínios magnéticos em resposta a uma força magnetizante H que varia ciclicamente. 34 A forma da curva de histerese depende não só da natureza do material ferromagnético, mas também do valor máximo de H ao qual o material está submetido. A fig. 3.29(a) mostra uma família de laços de histerese para vários valores de Hmax. Observe que após H ter sido aumentado até Hmax e então ser reduzido a zero, algumas paredes de domínios se movem espontaneamente em direção às posições que eles tomaram quando H era inicialmente zero. Isto reduz a extensão dos domínios positivos alinhados, mas o movimento não é completo e, como consequência, tem-se a densidade de fluxo Br remanente (imantação), mostrada na fig. 3.29(a). Este valor Br também é conhecido como densidade de fluxo remanescente ou residual, sendo diferente para cada laço de histerese, determinado por cada Hmax em particular. O valor negativo da intensidade de campo –Hc, requerida para remover a densidade de fluxo residual, é conhecido como coercitividade ou força coercitiva do ferro como mostra a fig. 3.29(a). Já a fig. 3.29(b) mostra o ciclo de histerese em termos de H e da magnetização M do material, fazendo uma associação, de forma ilustrativa, com a teoria dos domínios magnéticos apresentada anteriormente. (a) (b) Fig. 3.29. (a) Família de laços de histerese em regime permanente. (b) Variação da magnetização em função da intensidade do campo magnético aplicado. Se no primeiro quadrante da fig. 3.29(a) forem ligados os pontos das extremidades dos vários laços produzidos pelos vários valores de Hmax, o resultado é uma curva como aquela internamente tracejada. Esta é a conhecida curva de magnetização do ferro ilustrada na fig. 3.22, sendo também denominada de curva normal de magnetização, útil para se efetuar cálculos mais exatos com materiais ferromagnéticos do que quando se considera simplesmente uma permeabilidade constante, valendo destacar que: para muitas aplicações em engenharia é suficiente o uso da curva de magnetização, que embora desconsidere a histerese do material, leva em conta as suas características não-lineares. Enfim, devido a histerese a relação entre B e H é não-linear e plurívoca. Em geral, as características do material não podem ser descritas por expressões analíticas. Usualmente se utiliza gráficos com conjuntos de curvas determinadas a partir de ensaios de amostras dos materiais. O exemplo a seguir ilustra estas considerações. 35 Exemplo 3.9. Laços de histerese e curva de magnetização para o aço elétrico tipo M-5: o primeiro e o segundo quadrantes (onde B 0) de um conjunto de laços de histerese estão mostrados na fig. 3.30(a) para este material, tipicamente usado em equipamentos elétricos. Observe que, com um valor crescente de H, as curvas começam a ficar horizontais à medida que o material tende à saturação. Para uma densidade de fluxo cerca de 1,7 T, o material está fortemente saturado. Em todas as curvas pode ser notado tanto a densidade residual (Br) como a força coercitiva (–Hc). Como já referido, para muitas aplicações em engenharia é suficiente descrever o material por uma curva unívoca, obtida da plotagem dos lugares de valores máximos de B e H nas extremidades dos laços de histerese. Esta é a mencionada curva de magnetização CC ou normal, mostrada na fig. 3.30(b). Mais uma vez observa-se que, embora a curva de magnetização despreze a histerese do material, ela exibe claramente suas características não-lineares. (a) (b) Fig. 3.30. Aço elétrico de grão orientado, tipo M-5, de 0,012 polegadas de espessura. Armco Inc. (a) Laços de histerese (apenas metades superiores). (b) Curva de magnetização (com apenas valores positivos de B e H). 3.3.8 Energia e co-energia em sistemas magnéticos não-lineares De forma semelhante à Seção 3.2.4, considere o cálculo da energia em sistemas magnéticos, porém, considerando o material ferromagnético para o qual a relação entre H e B é não-linear. Tomando como exemplo o indutor da fig. 3.2, com área de seção transversal Ac e caminho magnético médio lc, continua sendo válida a eq. (3.53), ou seja: 2 1 diW Fazendo 1 = 0 e 2 = tem-se, na fig. 3.31, uma representação gráfica da energia W, em joules, que corresponde à área entre a curva -i e o eixo vertical. Fig. 3.31. Representação gráfica da energia magnética e a da co-energia para curva -i. 36 Como i = Hlc/N e com = NAcB, obtém-se a variação de energia da rede elétrica para a parte magnética, W (em joules), quando a densidade de fluxo varia de B1 à B2, como: 2 1 B B cc HdBlAW (3.73) quando W < 0 então que a energia está sendo devolvida do campo magnético para a rede elétrica. A densidade de energia w, em J/m3, é dada por:
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