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MONOGRAFIA - THIAGO-CORRIGIDO

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ESCOLA SUPERIOR DO MINISTÉRIO PÚBLICO SP
THIAGO SORRILHA
IMPUNIDADE E REINCIDÊNCIA
SÃO PAULO
2018
SUMÁRIO
RESUMO...................................................................................................................3
1) EVOLUÇÃO HISTÓRICA DA PENA...................................................................6
1.1) Vingança privada..............................................................................................7
1.2) Vingança divina................................................................................................8
1.3) Vingança pública..............................................................................................9
1.4) Período humanitário.......................................................................................10
2) TEORIAS DA FUNÇÃO DA PENA...................................................................11
3) O SISTEMA DE EXECUÇÃO PENAL BRASILEIRO.....................................13
3.1 A NATUREZA JURÍDICA DA EXECUÇÃO PENAL......................................13
3.2 O OBJETO DA EXECUÇÃO PENAL..............................................................14
3.3 OS PRINCÍPIOS RELATIVOS À EXECUÇÃO DA PENA.............................17
3.3.1. Princípio da legalidade..........................................................................19
3.3.2. Princípio da isonomia............................................................................20
3.3.3. Princípio da dignidade da pessoa humana.........................................20
3.3.4. Princípio da proporcionalidade.............................................................21
3.3.5. Princípio da jurisdiscionalidade ...........................................................22
3.3.6. Princípio da individualização da pena..................................................23
4) LEI DE EXECUÇÃO PENAL E SEU OBJETIVO............................................25
4.1 RESSOCIALIZAR É REEDUCAR, CAPACITAR E REINSERIR..................26
4.2 SUPERLOTAÇÃO E O ABRANDAMENTO DA LEI......................................28
4.3 DIRETO PENAL MÍNIMO E A CERTEZA DA IMPUNIDADE.......................34
CONCLUSÃO.........................................................................................................39
RESUMO:
Motivado pela principal temática dos dias atuais, a crise na segurança pública, o presente estudo traz à baila, num primeiro momento, como o ser humano decidia as punições àqueles que não aceitavam as regras do contrato social, num breve levantamento histórico das penas.
Na segunda parte faz-se a análise da função da punição ao infrator e do sistema adotado no Brasil para essa atividade Estatal, com uma consulta à doutrina de Execução Penal.
Na parte final, são avaliados dados e números dos mais recentes levantamentos sobre a criminalidade e reincidência para demonstrar que a lei Brasileira tenta contornar o problema da falta de vagas em presídios se abrandando.
O resultado obtido é que o abrandamento das penas é um remédio meramente paliativo que pode ajudar no curto prazo, mas, quando se avalia o sistema de forma macro, mostra-se um efeito devastador dessa política que é a impunidade, um verdadeiro combustível ao aumento das práticas criminosas.
Como conclusão temos um perigoso ciclo vicioso que forma uma bola de neve pela qual nosso país vem sendo esmagado.
ABSTRACT:
Motivated by the main theme of the present day, the crisis in public security, the present study brings the discussion, in a initial moment, how the human being decided the punishment of those who did not accept the rules of the social contract, in a brief historical survey of the penalties.
In the second part the analysis of the function of the punishment to the offender and of the system adopted in Brazil for this State activity, with a consultation to the doctrine of Criminal Execution.
In the final part, the data and numbers of the most recent surveys on crime and recidivism are evaluated to demonstrate that Brazilian law tries to overcome the problem of the lack of vacancies in deprived prisons.
The result is that the easing of sentences is a purely palliative remedy that can help in the short term, but when the system is evaluated in a macro way, a devastating effect of this policy is impunity, a real fuel for the increase of criminal practices.
As a conclusion we have a dangerous vicious cycle that forms a snowball for which our country has been crushed.
PALAVRAS CHAVE
Funções da pena, superlotação, reincidência, direito penal mínimo, impunidade, lei de execução penal.
KEY WORDS:
Functions of penalty, overcrowding, recidivism, minimum criminal law, impunity, criminal enforcement law.
1) EVOLUÇÃO HISTÓRICA DA PENA
Aristóteles foi um dos primeiros a reconhecer que o ser humano é um ser social e político por natureza e que precisa um do outro. Por isso, o convívio social, desde a época do homem primitivo, estabeleceu regras de conduta e, consequentemente, as punições para quem não as obedecesse.
Sendo assim, todos os povos sempre estabeleceram o instituto da penalização, seja como meio de retribuição ou intimidação, como forma de manutenção da harmonia.
Este capítulo abordará, numa visão funcional do Direito, a evolução das finalidades da pena, já que, com o desenvolvimento da humanidade, surgiram novos propósitos para a punição dos infratores: o recuperador e o educador.
A origem latina poena, também nomeia o termo pain do inglês, que basicamente significa impor sofrimento, dor e que conforme Odete Oliveira[footnoteRef:1], pena ainda poderia significar castigo, vingança ou intimidação. [1: OLIVEIRA, Odete M. Prisão: um paradoxo social. 3. ed. Florianópolis: UFSC, 2003, p. 24.] 
Ou seja, a aplicação de pena seria uma solução milagrosa, já que numa simples medida reativa à ação agressora do infrator, o Estado atingiria diversos objetivos que são importantíssimos na manutenção da ordem.
Dentro deste diapasão, Paulo Rodrigues[footnoteRef:2] elenca as quatro fases mais importantes da evolução histórica das penas: as vinganças privada, divina, pública e o período humanitário. [2: RODRIGUES, Paulo D. Pena de morte. Belo Horizonte: Del Rey, 1996. p. 31] 
1.1) Vingança Privada
A forma mais antiga de manifestação da pena é a vingança individual, chamada de privada, que predominava no início da vida em sociedade, quando não havia um limite para o revide, o que acarretava em penas cruéis, geralmente traduzidas em castigos corporais, tendo a vingança de sangue como a mais frequente forma de punição.
Com o passar do tempo, da vingança privada surgiram duas grandes regras possíveis de serem aplicadas: o talião e a composição.
a) O talião, que consistia em aplicar ao ofensor o mal que ele causasse ao ofendido, na mesma proporção. Sendo definido por Mirabete[footnoteRef:3] como sendo a regra que “limitava a reação à ofensa a um mal idêntico ao praticado”. [3: MIRABETE, Júlio F. Manual de direito penal. São Paulo: Atlas, 1996, p. 38.] 
Numa época em que havia um abismo tamanho, entre a gravidade do mal causado pelo ofensor e o sofrido por ele em retribuição, que Odete Oliveira[footnoteRef:4] chega a considerar que o código de Hamurabi “representava uma grande conquista, pois estabelecia uma proporcionalidade entre a ação e a reação do delito cometido e da pena imposta”. [4: OLIVEIRA. Odete M. Prisão: um paradoxo social. 3. ed. Florianópolis: UFSC, 2003, p. 23.] 
A mesma autora explica que no Brasil, a punição adotada era o talião simbólico, constante do livro V, das Ordenações Filipinas, estendendo-se até o advento do primeiro Código Criminal do Império, datado de 1830. E que, nesse período da vingança privada, este tipo de pena era tido como segura a vingança da vítima pois, em algumas vezes, se podia contar até mesmo com a ajuda da família da vítima no procedimento de aplicação da “pena”.
b) A composição, que era uma forma mais branda de punição, envolvendo a troca da pena de sangue por uma pecuniária ou troca por serviços, tendo sido, conforme Mirabete[footnoteRef:5],a forma de resolução “largamente aceita pelo Direito Germânico”. [5: MIRABETE, Júlio F. Manual de direito penal. São Paulo: Atlas, 1996, p.39.] 
1.2) Vingança Divina
Nas civilizações antigas os princípios religiosos predominavam e, naturalmente, produziam as normas, sendo considerados por muitos como o próprio Direito da época.
Por isso, Odete Oliveira[footnoteRef:6] ensina que a repressão tinha fundamento na “ira” divina e, por isso, a administração da sanção penal ficava a cargo dos sacerdotes que agiam como mandatários dos Deuses, já que “o delito era uma ofensa à divindade que, por sua vez ultrajada, atingia a sociedade inteira”. [6: OLIVEIRA. Odete M. Prisão: um paradoxo social. 3. ed. Florianópolis: UFSC, 2003, p 25.] 
Buscava-se na divindade subsídio para aplicação de castigos, já que ninguém se oporia à vontade celestial. De modo que o poder dos reis e imperadores, imbuído de caráter divino, se encontrava inserido nos livros sagrados.
Na Bíblia Sagrada, em seu capítulo sétimo, no livro de Josué, há um claro exemplo da aplicação da vingança divina, nos seguintes termos:
“Então Josué e todo o Israel com ele tomaram a Acã filho de Zera, e a capa, e a barra de ouro, e a seus filhos e a suas filhas, e a seus bois, e a seus jumentos, e a suas ovelhas, e a sua tenda, e tudo quanto tinha, e levaram-nos ao vale de Acor. Disse Josué: Por que nos conturbaste? O Senhor hoje te conturbará. E todo Israel o apedrejou; e depois de apedrejá-los, queimou-os a fogo. E levantaram sobre ele um monte de pedras, que permanece até ao dia de hoje; assim o Senhor apagou o furor de sua ira...”[footnoteRef:7] [7: Bíblia Sagrada, traduzida por: João Ferreira de Almeida,SBB,1969, p.238 e p.239 ] 
1.3) Vingança Pública
Odete Oliveira[footnoteRef:8] ensina que, com o fortalecimento do Estado, o exercício da pena passou a fazer parte de suas atribuições. As leis já não eram fundamentadas e aplicadas como simples costumes sagrados, aprovadas pelos deuses: [8: OLIVEIRA. Odete M. Prisão: um paradoxo social. 3. ed. Florianópolis: UFSC, 2003, p. 36.] 
“Neste período, surgiram os suplícios corporais. Pessoas eram esquartejadas, marcadas a ferro quente, dentre outros castigos cruéis. A pena era aplicada em praça pública, para que todos pudessem ver o que acontecia a quem praticasse um crime.”
Isso ocorre quando a pena perdia sua índole sacra para se transformar em uma sanção imposta em nome de uma autoridade pública, que representava os interesses da comunidade, num período posterior àquele em que o agente responsável pela punição era o soberano, exercendo sua autoridade em nome de Deus para cometer inúmeras arbitrariedades.
Entretanto, em que pese as penas serem super severas, o número de crimes ficava cada vez maior, de modo que a pena de morte e a execução pública não obtinham os resultados desejados. 
Odete Oliveira nos conta que o condenado passou a ser vítima e objeto de piedade, ao passo que o Carrasco, que executava pessoas diariamente, passou a ser visto pelo povo, como um criminoso.
1.4) Período humanitário
Em continuidade a este pensamento, por natural, passou-se a considerar o suplício como forma de punição exagerada e assim passaram a surgir movimentos de protestos por parte de magistrados, parlamentares, juristas, filósofos e legisladores que pregavam a moderação das punições de a acordo com uma proporcionalidade com o crime.
Tido como o período compreendido entre 1750 e 1850, no qual os reformadores como Voltaire, desejavam ver o fim dos castigos aflitivos, numa época em que, na Europa, nascia o período Iluminista e com ele se inicia um momento mais humano do Direito Penal, com o objetivo de modificar as leis e a administração da justiça penal.
Nesse período, Becaria já se opunha ao tratamento desumano: 
“a desordem que nasce da obediência rigorosa a letra de uma lei penal não pode se comparada às desordens que nascem de sua interpretação”[footnoteRef:9] [9: BECCARIA, Cesare. Dos delitos e das penas. São Paulo: Martin Claret, 2.003, p. 47] 
Os escritos de Monteguieu, Voltaire, Rosseau, D’Alembert e o Cristianismo foram de suma importância para o humanismo, uma vez que construíram o próprio alicerce do período humanitário.
Esses pensadores iluministas, trouxeram à tona uma nova ideologia, o pensamento moderno que repercutiria até mesmo na aplicação da justiça: à arbitrariedade se contrapôs a razão, à determinação caprichosa dos delitos e das penas se pôs a fixação legal das condutas delitivas e das próprias penas, já que o povo clamava pelo fim de tanto barbarismo disfarçado.
2) TEORIAS DA FUNÇÃO DA PENA
Dentro da ótica jurídica são várias as teorias sobre a razão fundamental do direito de punir e a finalidade da pena. Estas teorias podem ser classificadas como absolutas, relativas e mistas[footnoteRef:10]. [10: RODRIGUES, Paulo D. Pena de morte. Belo Horizonte: Del Rey, 1996. p. 32.] 
Pela Teoria Absoluta a pena serve apenas para “dar o troco”, numa ideia de se atingir um equilíbrio, na qual o “justo” seria devolver ao agressor o mal que ele causou a outra pessoa, seja por uma questão moral, para cumprir a lei ou para satisfazer a vontade divina.
Jason Albergaria defende que “a Teoria Absoluta atende ao sentido de fim, de objetivo, já que traduz a retribuição, ou seja, a imposição do mal da pena pelo mal do crime e, neste caso, esta teoria vê a pena como a consequência justa e necessária do crime.”[footnoteRef:11] [11: ALBERGARIA, Jason. Das penas e da execução penal. 3. ed. Belo Horizonte: Del Rey,1996, p.20.] 
Já a Teoria Utilitária ou Relativa, entende que a pena serve para algo mais, funcionando como um verdadeiro instrumento para controle da criminalidade, pois ela seria a maior forma de se prevenir as infrações.
Albergaria vê na Teoria Relativa, a prevenção, e que a intimidação faz com que os cidadãos se afastem do crime.
Por fim, a Teoria Mista ou Sincrética une as teorias anteriores, por entender que não é possível considerar que apena ser apenas para prevenir o crime, afastando a retribuição, já que uma parte da sociedade sempre clama por “justiça”, por entenderem que o equilíbrio cósmico fica afetado quando uma agressão não é devolvida na mesma proporção nos casos de impunidade.
Logo, a Teoria Mista, também conhecida como Teoria da União, assume uma postura intermediária, buscando conciliar a retribuição e a prevenção. Sendo assim, a Teoria Mista é a que mais se adapta a atualidade, já que, hoje, a pena objetiva retribuir e prevenir o ato criminoso.
Numa ótica social, analisar a finalidade da punição exige uma distinção entre o que se espera atingir ao punir o infrator, e o que efetivamente se obtém na prática com a punição.
Esta dificuldade em se obter, na prática, os resultados pretendidos, é o grande obstáculo que a sociedade moderna enfrenta, ao se estudar a finalidade da pena, dentro da questão da violência e políticas que visam seu controle.
Tanto que, conforme bem observado por Paulo Rodrigues[footnoteRef:12]: [12: RODRIGUES, Paulo D. Pena de morte. Belo Horizonte: Del Rey, 1996. p. 33] 
“O Direito Penal, não só no Brasil, está pautado na Escola Clássica, que atribui ao Estado à função de resolver toda e qualquer diferença, de forma indisponível. No entanto, essa Escola vê na pena uma obrigação dada àquele que ofende seus ordenamentos jurídicos, com um fim único de retribuição, sem se preocupar, essencialmente com a ressocialização do infrator, e, principalmente com a situação e os interesses das vítimas e de seus familiares.”
Como veremos no último capítulo, infelizmente no Brasil só é possível enxergar a função retributiva da pena, visto que cada vez mais caminhamos para um direito penal mínimo além do ideal, onde reina a impunidade e o criminoso não mais se intimida face à certeza de que se for descoberto terá uma pena que lhe faça pensar que talvez compense continuar a praticar delitos ao invés de se adequar ao contrato social.
3) O SISTEMA DE EXECUÇÃO PENAL BRASILEIRO
3.1 A NATUREZA JURÍDICA DA EXECUÇÃO PENAL
Tendo em vista tratar-se de uma atividade que se desenvolvetanto no campo jurisdicional como no campo administrativo, há uma grande divergência doutrinária quando à natureza jurídica da execução penal.
Conforme ensina o professor Mirabete[footnoteRef:13]: “O Código de Processo Penal classifica a execução penal como mista: jurisdicional e administrativa, correspondendo a primeira a solução dos incidentes da execução e a segunda a imposição de medida de segurança.” [13: MIRABETE, Julio F. Execução penal: comentário a Lei n. 7.210. 11 ed. São Paulo: Atlas, 2006] 
Ada Pellegrini Grinover[footnoteRef:14], ao dispor sobre a natureza jurídica da execução da pena, afirma que existe a intervenção do Direito Administrativo, embora seja necessário frisar a importância do Direito Penal e Processual Penal: [14: GRINOVER, Ada P. Execução penal. São Paulo: Max Limonad, 1987, p. 7] 
“Na verdade não se nega que a execução penal é uma atividade complexa, que se desenvolve, entrosadamente, nos planos jurisdicional e administrativo. Nem se desconhece que dessa atividade participam dois Poderes estaduais: o Judiciário e o Executivo, por intermédio, respectivamente, dos órgãos jurisdicionais e dos estabelecimentos penais”
Neste sentido, Nogueira[footnoteRef:15] conclui que a natureza jurídica da execução penal é mista, complexa e eclética, no sentido de que certas normas da execução pertencem ao Direito Processual, como a solução de incidentes, já são observadas outras regras que regulam a execução propriamente dita, o que levam ao Direito Administrativo. [15: NOGUEIRA, Paulo L. Comentários à lei de execução penal. 3. ed. São Paulo: Saraiva, 1996, p. 35.] 
Válido se faz ressaltar que que na Exposição de Motivos da Lei de Execução Penal, o legislador deixou claro que ela é um instituto híbrido e, por isso, não se deve tentar impor limites a extensão de seus ramos:
“Art. 16: A aplicação dos princípios e regras do Direito ProcessualPenal constitui corolário lógico da interação existente entre o direito de execução das penas e das medidas de segurança e os demais ramos do ordenamento jurídico, principalmente os que regulam em caráter fundamental ou complementar os problemas postos pela execução.”
Portanto, nota-se que a execução penal possui duas naturezas jurídicas: uma jurisdicional que cabe ao Estado que administra os estabelecimentos penais e outra que cabe ao Judiciário que cuida das questões processuais da execução da pena.
3.2 O OBJETO DA EXECUÇÃO PENAL
Quanto ao objetivo da Lei de Execução Penal, o jurista Paulo Lúcio Nogueira[footnoteRef:16] explica que a execução penal objetiva fazer valer a condenação sentenciada: [16: NOGUEIRA, Paulo L. Comentários à lei de execução penal. 3. ed. São Paulo: Saraiva, 1996, p. 33.] 
“A execução é a mais importante fase do direito punitivo, pois de nada adianta a condenação sem a qual haja a respectiva execução da pena imposta. Daí o objetivo da execução penal, que é justamente tomar exeqüível ou efetiva a sentença criminal que impôs ao condenado determinada sanção pelo crime praticado”
Ocorre que, pela leitura do artigo 1° da Lei de Execução Penal, Lei n. 7.210 de julho de 1984, percebe-se que são duas as finalidades: a primeira é realizar a lei e a segunda é reintegrar o delinquente.
“a execução penal tem por objetivo efetivar as disposições de sentença ou decisão criminal e proporcionar condições para a harmônica integração social do condenado e do internado”.
É exatamente desta forma que entende o professor Mirabete[footnoteRef:17] ao dividir as duas ordens do dispositivo, conforme colacionado abaixo: [17: MIRABETE, Julio F. Execução penal: comentário a Lei n. 7.210. 11 ed. São Paulo: Atlas, 2006, p. 28.] 
A primeira é a correta efetivação dos mandamentos existentes na sentença ou outra decisão criminal, destinados a reprimir e prevenir os delitos. O dispositivo registra formalmente o objetivo de realização penal concreta do título executivo constituídos por tais decisões. A segunda é a de proporcionar condições para harmônica integração social do condenado e do internado, baseando-se por meio da oferta de meios pelos quais os apenados e os submetidos às medidas de segurança possa participar construtivamente da comunhão social.
Traduzindo o entendimento do autor, ao aplicar-se uma medida de segurança, o objetivo deve ser o de incentivar a vontade de viver conforme a lei e manter-se com o produto do seu trabalho, devolvendo-lhes o sentido de responsabilidade e os incentivando à desenvolver respeito por si mesmos, para que decidam voluntariamente participar e respeitar o contrato social. 
Percebe-se, então, que a pena se tornou mais “humana”, ao adotar os princípios da nova defesa social, que prevê que as penas e as medidas de segurança devem realizar a proteção dos bens jurídicos e a reincorporação do autor a comunidade. 
O professor Mirabete[footnoteRef:18] vai além e explica que é necessário seguir a declaração universal dos direitos do preso: [18: MIRABETE, Julio F. Execução penal: comentário a Lei n. 7.210. 11 ed. São Paulo: Atlas, 2006, p. 28.] 
Além de tentar proporcionar condições para a harmônica integração social do preso ou do internado, procura-se no diploma legal não só cuidar do sujeito passivo da execução, como também da defesa social, dando guarita, ainda, à declaração universal dos direitos do preso comum que é constituída das Regras Mínimas para Tratamento dos Presos, da Organização das Nações Unidas, editadas em 1958.
Fica claro, portanto, que, assim como a natureza jurídica da execução penal, o seu objeto não é único, uma vez que este visa tanto a aplicação da sentença de condenação, como também a recuperação do preso para que esse possa, posteriormente se reintegrar na sociedade.
Até porque o sentido verdadeiro da reintegração social, conforme o estabelecido na Lei de Execução, compreende o objetivo de reajustar a personalidade do sentenciado aos padrões adotados pela boa convivência com a sociedade, permitindo a ele voltar a produzir e ser útil.
É, em verdade um mandamento bonito e que se mostra, de certa forma, até utópica, como veremos adiante, visto que, como em muitos casos, no Brasil a basta haver uma lei dispondo uma ideia que o cidadão se dá por satisfeito, ainda que, na prática, ocorra exatamente o oposto.
Talvez porque, assim como o preâmbulo da constituição federal, a exposição de motivos da lei de Execução, não seja considerada norma cogente, não constrangendo assim o Estado a executá-la literalmente, permitindo esse abismo entre o mundo ideal e o mundo real.
3.3 OS PRINCÍPIOS RELATIVOS À EXECUÇÃO DA PENA
Embora a execução penal tenha natureza mista, por ser composta de procedimentos meramente administrativos, o art. 2º da Lei de Execução Penal tratou expressamente da "jurisdição penal dos Juízes", demonstrando que a jurisdicionalidade prevalece em quase todos os momentos. Logo, a jurisdição existe durante toda a execução penal:
Art. 2º A jurisdição penal dos Juízes ou Tribunais da Justiça ordinária, em todo o Território Nacional, será exercida, no processo de execução, na conformidade desta Lei e do Código de Processo Penal.
E de acordo com o artigo 38 do Código Peal Brasileiro, o condenado tem seus direitos assegurados, excepcionado a liberdade ou outro direito tolhido pela sentença, naturalmente e, além disso, surge às autoridades o dever de lhe proteger a integridade física e moral.
Art. 38 - O preso conserva todos os direitos não atingidos pela perda da liberdade, impondo-se a todas as autoridades o respeito à sua integridade física e moral.
Tal garantia é também positivada no artigo 3º da Lei de Execuções Penais que praticamente repete o dispositivo 64 anos depois da edição do Código Penal:
Art. 3º Ao condenado e ao internado serão assegurados todos os direitos não atingidos pela sentença ou pela lei.
 Parágrafo único. Não haverá qualquer distinção de natureza racial, social, religiosa ou política.
Sendo assim, fica clara a intenção do legislador em reforçar a imposição de que o Estado garanta um mínimo de dignidade ao condenado na aplicação e cumprimento das penas.
Paulo LúcioNogueira[footnoteRef:19] discorre sobre os princípios associados à execução penal, de forma brilhante: [19: NOGUEIRA, Paulo L. Comentários à lei de execução penal. 3. ed. São Paulo: Saraiva, 1996, p. 07.] 
“Estabelecida a aplicabilidade das regras previstas no Código de Processo Penal, é indispensável à existência de um processo, como instrumento viabilizador da própria execução, onde devem ser observados os princípios e as garantias constitucionais, a saber: legalidade, jurisdicionalidade, devido processo legal, verdade real, imparcialidade do juiz, igualdade das partes, persuasão racional ou livre convencimento, contraditório e ampla defesa, iniciativa das partes, publicidade, oficialidade e duplo grau de jurisdição, entre outros. Em particular, deve-se observar o princípio da humanização da pena, pelo qual se deve entender que o condenado é sujeito de direitos e deveres, que devem ser respeitados, sem que haja excesso de regalias, o que tornaria a punição desprovida da sua finalidade.”
Preciosa se faz a análise do disposto no item 16 da Exposição de Motivos da Lei de Execução Penal que faz questão de frizar a observância dos princípios do Processo Penal:
16. A aplicação dos princípios e regras do Direito Processual Penal constitui corolário lógico da interação existente entre o direito de execução das penas e das medidas de segurança e os demais ramos do ordenamento jurídico, principalmente o que regulam em caráter fundamental ou complementar os problemas postos pela execução. 
Por isso, passaremos à análise de alguns princípios que norteia a execução penal.
3.3.1. Princípio da legalidade
O princípio da legalidade encontra-se expresso nos já colacionados artigos 2º e 3º da Lei n.º 7.210/84, já que ela determina que a jurisdição seja exercida na forma dela própria e do Código de Processo Penal. Portanto, a restrição de direito deve decorrer da lei e nesse diapasão, a Constituição Federal, em seu inciso II, do art. 5º, que "ninguém será obrigado a fazer ou deixar de fazer alguma coisa senão em virtude de lei."
O princípio da legalidade norteia a execução penal em todos os seus momentos, dirigindo-se a todas as autoridades que participam dela, seja ela judicial ou administrativa.
A respeito do princípio da legalidade, o item 19 da Exposição de Motivos da Lei de Execuções Penais assevera: 
19. O princípio da legalidade domina o corpo e o espírito do Projeto, de forma a impedir que o excesso ou o desvio da execução comprometem a dignidade e a humanidade do Direito Penal. 
E não poderia ficar mais cristalina a necessidade de observância à legalidade no item 168 do mesmo documento:
168. Todo procedimento está sujeito a desvios de rota. Em harmonia com o sistema instituído pelo Projeto, todos os atos e termos da execução se submetem aos rigores do princípio de legalidade. Um dos preceitos cardeais do texto ora posto à alta consideração de Vossa Excelência proclama que "ao condenado e ao internado serão assegurados todos os direitos não atingidos pela sentença ou pela lei" (artigo 3º).
3.3.2. Princípio da isonomia
Tal princípio figura como epicentro do conceito de democracia e está ligada diretamente aos valores supremos da natureza humana e dá a cada indivíduo uma igualdade de oportunidade, um mínimo existencial.
Em que pese a relevância dos posicionamentos nominalistas, contrários à Declaração Universal dos Direitos Humanos, que que sustentam que a desigualdade é uma característica do universo, não há como negar que, no mundo jurídico, a importância de se considerar os homens iguais foi uma evolução no sentido de limitar o Legislativo, reduzindo os arbítrios.
Observância a tal diretriz se mostra evidente no item 23 da Exposição de Motivos da Lei de Execução Penal:
23. Com a declaração de que não haverá nenhuma distinção de natureza racial, social, religiosa ou política, o Projeto contempla o princípio da isonomia, comum à nossa tradição jurídica.
3.3.3. Princípio da dignidade da pessoa humana
Como não poderia deixar de ser, a necessidade de se garantir a dignidade da pessoa humana também é figura carimbada quando se fala em Execução Penal. Fica clara a necessidade de sua observância quando, em seu item 56, a Exposição de motivos da Lei de Execuções Penais faz menção à dignidade:
56. O Projeto conceitua o trabalho dos condenados presos como dever social e condição de dignidade humana - tal como dispõe a Constituição, no artigo 160, inciso II - , assentando-o em dupla finalidade: educativa e produtiva.
Sua previsão constitucional, em sintonia com os direitos naturais, inalienáveis e sagrados do homem, defendidos pela Declaração dos Direitos do Homem e do Cidadão, de 26 de agosto de 1789, como princípio fundamental, conforme bem asseverado pelo professor Flademir Martins[footnoteRef:20],mostra que os legisladores pretenderam tornar este princípio fundamental um parâmetro para a aplicação, interpretação e integração de todo o ordenamento jurídico: [20: MARTINS, Flademir J. B. Dignidade da pessoa humana: princípio constitucional fundamental. Curitiba: Juruá, 2006, p. 124.] 
[...] em parte, a pretensão constitucional de transformá-lo em um parâmetro objetivo de harmonização dos diversos dispositivos constitucionais, obrigando o intérprete a buscar uma concordância prática entre eles, na qual o valor acolhido no princípio, sem desprezar os demais valores constitucionais, seja efetivamente preservado
O referido professor[footnoteRef:21] ainda adiciona que a Constituição Federal de 1988 utilizou o termo "dignidade", em seu art. 1°, inciso III, e nos demais dispositivos com o fim de “acompanhar o homem desde seu nascimento até a sua morte, posto que ela é da própria essência da pessoa humana. Assim, parece-nos que a "dignidade" é um valor imanente à própria condição humana, que identifica o homem como ser único e especial, e que, portanto, permite-lhe exigir ser respeitado como alguém que tem sentido em si mesmo” [21: Ibidem, p. 115.] 
3.3.4. Princípio da proporcionalidade
Também conhecido como princípio da proibição do excesso, este princípio ensina que a pena não pode ser superior ao grau de responsabilidade pela prática do fato. Significa que a pena deve ser medida pela culpa do autor, daí dizer que culpabilidade é a medida da pena.
É, em profunda análise, uma decorrência do direito do homem de ser considerado igual a qualquer outro, não merecendo assim, punição desmedida e superior à necessária retribuição.
E é precisamente na proporcionalidade que a retribuição da pena deve se encaixar, no sentido de não ultrapassar a linha fronteiriça do justo e necessário, visto que essa transgressão esvaziaria o sentido da justiça.
Na execução penal, a proporcionalidade será garantida através de classificação do condenado, de maneira a estabelecer correspondência entre este e o modo pelo qual a pena lhe foi imposta venha a ser adequadamente executada, após o exame de sua personalidade e o fato a ele imputado.
É exatamente este o ponto levantado no item 26 da Exposição de Motivos da Lei de Execuções Penais.
26. A classificação dos condenados é requisito fundamental para demarcar o início da execução científica das penas privativas da liberdade e da medida de segurança detentiva. Além de constituir a efetivação de antiga norma geral do regime penitenciário, a classificação é desdobramento lógico do princípio da personalidade da pena, inserido entre os direitos e garantias constitucionais. A exigência dogmática da proporcionalidade da pena está igualmente atendida no processo de classificação, de modo que a cada sentenciado, conhecida a sua personalidade e analisado o fato cometido, corresponda o tratamento penitenciário adequado.
3.3.5. Princípio da jurisdiscionalidade
Hoje em dia, ainda há na doutrina duas correntes a respeito da natureza jurídica da execução penal. A primeira e majoritária sustenta a jurisdicionalidade da execução penal, e a segunda ainda entende que seria uma atividade puramente administrativa.
Entretanto, restou claro com o advento da Lei de Execução Penal que a primeira corrente temrazão, e é isso o que sustenta o professor Mirabete[footnoteRef:22]: [22: MIRABETE, Júlio F. Execução penal: comentário a Lei n. 7.210. 11 ed. São Paulo: Atlas, 2006, p. 26.] 
 “anteriormente prevalecia o entendimento de que a atividade do Juiz da Execução, ainda que proveniente de órgão do Poder Judiciário, era sempre uma atividade administrativa. Com a Lei de Execução Penal, prevalece o entendimento de que a execução penal é jurisdicional, o que significa que a intervenção do juiz, na execução da pena, é eminentemente jurisdicional, sem excluir aqueles atos acessórios, de ordem administrativa, que acompanham as atividades do magistrado.”
Também é o que está positivado no artigo 2º, caput da LEP:
Art.2°. A jurisdição penal dos Juízes ou Tribunais da Justiça ordinária, em todo o Território Nacional, será exercida, no processo de execução, na conformidade desta Lei e do Código de Processo Penal.
Sendo assim, na atual conjuntura legislativa nacional, é insustentável o entendimento de que a sua natureza seja meramente administrativa, já que após o julgado surge entre o Estado e o condenado uma complexa reação jurídica, com direitos, expectativas e, como em qualquer relação jurídica, a solução dos conflitos demanda a intervenção jurisdicional.
3.3.6. Princípio da individualização da pena
Quando o Código Penal estabelece uma punição igual para todos, ele é generalista para manter a isonomia. Entretanto, esta abrangência geral perde sentido no exato momento da aplicação da pena, no qual se faz necessário olhar para o indivíduo especificamente e às peculiaridades e circunstâncias de sua conduta e de sua vida pessoal.
É o que estabelece a Constituição Federal no artigo 5º:
XLVI - a lei regulará a individualização da pena (...)
E não é somente à dosimetria que esta fase de aplicação da pena se limita. A individualização da pena continua sendo necessária também na fase executória, quando serão avaliadas as condições para progressões de regime prisional, como também nas concessões de outros benefícios para o preso condenado. Tanto que a LEP estabelece em seu 5º artigo que:
Art. 5º Os condenados serão classificados, segundo os seus antecedentes e personalidade, para orientar a individualização da execução penal.
Embora o termo individualizar signifique “particularizar”, ou no caso, “adaptar” a pena à pessoa do condenado, o legislador não definiu especificamente o que é individualização como explica Grinover[footnoteRef:23]: [23: GRINOVER, Ada P. Execução penal. São Paulo: Max Limonad, 1987, p. 134.] 
A cada indivíduo, uma pena. Para particularizar a pena, a lei haverá, evidentemente, de balizar-se em parâmetros que, como não poderia de ser, são o homem que violou a norma e o fato por ele praticado, cada qual, com suas particularidades, suas peculiaridades, suas características próprias, subjetivas e objetivas, que os individualizam.
E o professor Mirabette[footnoteRef:24] ressalta que “a individualização é uma das chamadas garantias repressivas, constituindo postulado básico de justiça”, já que a execução penal está vinculada aos preceitos constitucionais, à observância do princípio da proporcionalidade, não podendo afetar a dignidade do condenado, que de nenhuma forma pode ser tratado de maneira desumana ou degradante, sendo-lhe devido o acesso ao desenvolvimento integral de sua personalidade. Em razão disso é ilegítima qualquer forma de diferenciação e de atividade corretiva durante o cumprimento de pena. [24: MIRABETE, Júlio F. Execução penal: comentário a Lei n. 7.210. 11 ed. São Paulo: Atlas, 2006, p. 29.] 
A finalidade da ressocialização deve corresponder a uma garantia individual, e não um direito da sociedade ou do Estado. O objetivo da individualização é o cumprimento de pena, período no qual se não for possível haver uma reeducação, pelo menos não se deve fazer com que o delinquente fique pior após o cumprimento.
4) LEI DE EXECUÇÃO PENAL E SEU OBJETIVO
Embora seja latente que os estabelecimentos penais brasileiros não disponibilizem programas efetivos para que este processo se concretize, a Lei de Execução Penal brasileira estabelece expressamente a finalidade ressocializadora da pena.
Nogueira[footnoteRef:25] bem lembra que a “pretensão de transformar a pena em oportunidade para promover a reintegração social do condenado esbarra em dificuldades inerentes ao próprio encarceramento”. [25: NOGUEIRA, Paulo L. Comentários à lei de execução penal. 3. ed. São Paulo: Saraiva, 1996,p. 7.] 
A atual situação dos presídios, em todo país, gera um ambiente favorável a mais criminalidade e isso se dá, sobretudo, graças à superlotação. É a conclusão de Tânia Pinc, Doutora em Ciência Política e pesquisadora associada ao Núcleo de Pesquisas de Políticas Públicas da Universidade de São Paulo (UPPs/USP), no último episódio de uma série de reportagens da revista EXAME[footnoteRef:26], publicada em maio deste ano: [26: https://exame.abril.com.br/blog/instituto-millenium/a-superlotacao-cria-um-ambiente-favoravel-para-a-pratica-do-crime/] 
“A superlotação cria um ambiente favorável para a prática do crime - Existe uma impossibilidade de atender às regras mínimas de tratamento às pessoas presas, que acabam vivendo em condições insalubres. Além disso, pressupõe-se que o sistema penitenciário neutralize o preso para ele não voltar a cometer o crime. No entanto, a situação mostra o contrário: há um favorecimento da prática criminosa, além de um gerenciamento do crime de dentro das prisões.”
Portanto, observamos uma notória contradição entre o que a legislação prega e a realidade dos estabelecimentos penais. Assim, este capítulo aborda a ideologia da ressocialização do preso no Brasil.
4.1 RESSOCIALIZAR É REEDUCAR, CAPACITAR E REINSERIR
É óbvio que dever-se-ia evitar que a pessoa pratique ações delituosas desde cedo, dando-lhe uma boa educação, o corrigindo sempre que for necessário e possível, dialogando ao máximo, conforme descreve Beccaria[footnoteRef:27] [27: BECCARIA, Cesare. Dos delitos e das penas. São Paulo: Martin Claret, 2.003, p. 101] 
É preferível prevenir os delitos a ter de puni-los; e todo legislador sábio deve antes procurar impedir o mal que repará-lo, pois uma boa legislação não é mais do que a arte de proporcionar aos homens a maior soma de bem-estar possível e livrá-los de todo os pesares que se lhes possam causar, conforme o cálculo dos bens e dos males desta existência.
Essa conclusão é corroborada com facilidade pela análise do nível de escolaridade da população carcerária brasileira, exposta no sitio eletrônico do Ministério da Justiça[footnoteRef:28], no qual foi levantado 75% da população prisional brasileira sequer chegou ao ensino médio e que menos de 1% dos presos possui graduação. [28: http://www.justica.gov.br/news/ha-726-712-pessoas-presas-no-brasil ] 
A ressocialização não é simplesmente trabalhar a reeducação para que o apenado tenha um comportamento de acordo com que a sociedade deseja, mas também visa realizar uma reinserção social eficaz, através de mecanismos e de condições para que este apenado venha a retornar à comunidade sem traumas.
É o que pretendia o legislador, conforme explicitado na exposição de motivos da Lei de Execuções Penais:
14. Sem questionar profundamente a grande temática das finalidades da pena, curva-se o Projeto, na esteira das concepções menos sujeitas à polêmica doutrinária, ao princípio de que as penas e medidas de segurança devem realizar a proteção dos bens jurídicos e a reincorporação do autor à comunidade.
Por isso, notamos que a expressão ressocialização é vista como sinônimo de: reformar, reeducar, reintegrar alguém que um dia soube conviver em sociedade, mas desviou-se ao cometer uma atitude anti-social. Neste sentido, evidencia-se que objetivo da ressocialização é resgatar o instituto da socialização.
Segundo Albergaria[footnoteRef:29], a ressocialização objetivaria a reeducação que também pode ser entendida como a escolarização social do delinquente: [29: ALBERGARIA, Jason. Das penas e da execução penal. 3. ed. Belo Horizonte: Del Rey,1996,p. 139.] 
[...], a reeducação ou escolarização social de delinqüente é educação tardia de quem não logrou obtê-la em época própria [...]. A reeducação é instrumento de salvaguarda da sociedade e promoção do condenado [...]. Ora, o direito à educação é previsto na Constituição e na Declaração Universal dos direitos do Homem [...]. Por isso, tem de estender-se a todos os homens o direito à educação, como uma das condições da realização de sua vocação pessoal de crescer. A UNESCO tem estimulado as nações para a democratização do direito à educação social, que se propõe a erradicar as condições criminógenas da sociedade.
Poder-se-ia afirmar que na ressocialização está subentendida a ideia de um amplo trabalho de reestruturação psicossocial do infrator, bem como da própria sociedade, que o receberá de volta quando acabar o cumprimento da pena, supostamente livre da possibilidade de reincidir.
Neste contexto, Mirabete[footnoteRef:30] explica que: [30: MIRABETE, Júlio F. Execução penal: comentário a Lei n. 7.210. 11 ed. São Paulo: Atlas, 2006,p. 28.] 
O sentido imanente da reinserção social, conforme estabelecido na lei de execução, compreende a assistência e ajudaria obtenção dos meios capazes de permitir o retomo do apenado e do internado ao meio social em condições favoráveis para a sua integração, não se confundindo ‘com qualquer sistema de tratamento que procure impor um determinado número e hierarquia de valores em contraste com os direitos da personalidade do condenado.
Infelizmente, verifica-se que as unidades prisionais ainda não possuem ações regulares de ensino, posto que o maior interesse dos reclusos recai nas atividades laborais que possam apenas propiciar algum ganho financeiro ao apenado e/ou algum abatimento de parte da pena, mas não um efetivo curso de capacitação para uma pretensa ocupação futura, quando da liberdade.
A verdade é: a realidade brasileira mostra que o condenado dispõe de bastante tempo livre nas prisões, normalmente destinado ao ócio que conforme bem ensinado por Mirabete[footnoteRef:31] “produz efeitos deletérios (indolência, preguiça, egoísmo, desocupação, jogo, contágio moral, desequilíbrio), num conteúdo antiético que pode lançar por terra as esperanças do reajustamento social do condenado.” [31: MIRABETE, Julio F. Manual de direito penal. São Paulo: Atlas, 1996, p. 119.] 
4.2 SUPERLOTAÇÃO E O ABRANDAMENTO DA LEI
Conforme colacionado do site[footnoteRef:32] do Ministério da Justiça, em artigo publicado em dezembro de 2017 “o número exato de presos no sistema penitenciário brasileiro somou 726.712 pessoas em junho de 2016 – último dado tabulado” e “o relatório constata que 89% da população prisional encontram-se em unidades com déficit de vagas, independente do regime de cumprimento da pena”. Ou seja, a tese da mencionada pesquisadora Tânia Pinc se confirma quando os números mostram que a superlotação é unanimidade. [32: http://www.justica.gov.br/news/ha-726-712-pessoas-presas-no-brasil] 
Ao se analisar números fica inevitável a comparação com outros países, porque um número isolado sem parâmetros não é tão eficaz quanto a análise feita num paralelo com outras nações.
E nesse momento percebemos que não há apenas uma grande diferença nos índices de superlotação no Brasil, mas sim um verdadeiro abismo, conforme demonstrado na figura abaixo, colacionada do sitio eletrônico supracitado, percebemos que a situação do Brasil é crítica:
[footnoteRef:33] [33: http://www.justica.gov.br/news/ha-726-712-pessoas-presas-no-brasil/paises.png ] 
O referido relatório constata que 89% da população prisional encontram-se em unidades com déficit de vagas, independente do regime de cumprimento da pena.
Sobre este tema Thompson[footnoteRef:34] destaca que a reforma penitenciária deve, além de propiciar regeneração dos detentos, dispor de vagas o suficiente para recolher a “clientela que lhe é destinada”. [34: THOMPSON, Augusto. A questão penitenciária. 4. ed. Rio de Janeiro, 1.993, p. 4.] 
A grande questão é que o Brasil administra um dos dez maiores sistemas carcerários do mundo, possuindo a quarta maior população carcerária do planeta. Segundo o Ministério da Justiça, se a taxa de prisões continuar no mesmo ritmo, um em cada 10 brasileiros estará atrás das grades em 2075.
Mas a pior constatação é a de que caminhamos para cenários cada vez piores, conforme o noticiado pela UOL em seu sítio eletrônico[footnoteRef:35] “Segundo o Ministério da Justiça, a população carcerária do Brasil deverá superar a da Rússia em 2018.” [35: https://noticias.uol.com.br/cotidiano/ultimas-noticias/2015/06/23/prisoes-aumentam-e-brasil-tem-4-maior-populacao-carceraria-do-mundo.htm?cmpid=copiaecola] 
O INFOPEN relata que o aumento da taxa de encarceramento no Brasil está indo na contramão da tendência dos países que possuem as maiores populações carcerárias do mundo. Enquanto aqui no Brasil a taxa aumentou 33% entre 2008 e 2013, a dos Estados Unidos caiu 8%, a da China caiu 9% e a da Rússia, 24%.
Portanto, não bastasse termos o maior índice de superlotação mundial, caminhamos na contramão do sucesso, visto que as políticas públicas adotadas nas últimas décadas não estão voltadas à ampliação de vagas. É o que mostra de maneira bem didática o gráfico abaixo, extraído da apresentação coletiva[footnoteRef:36] do Ministério da Justiça de dezembro de 2017. [36: http://www.justica.gov.br/news/ha-726-712-pessoas-presas-no-brasil/apresentacao-coletiva-08-12-2017.pdf/@@download/file ] 
A princípio, este discurso de falta de vagas se aproxima dos defensores de direitos Humanos que se preocupam mais com as condições individuais de cada delinquente do que com o macro ambiente da Segurança Pública do país, no qual se insere o sistema prisional.
Ocorre que, quem entende que a superlotação é um problema que afeta exclusivamente ao próprio condenado, que terá condições de vida ruins durante o cumprimento, as quais ele fez por merecer, não está enxergando o problema de maneira abrangente dentro da Segurança Pública.
A superlotação inicia e integra um círculo vicioso composto por outros quatro elementos que são seus descendentes diretos, conforme o gráfico abaixo:
SUPERLOTAÇÃO
MAIS CRIMES
LEIS BRANDAS
NÃO INTIMIDAÇÃO
IMPUNIDADE
Antes de abordarmos cada efeito acima, precisamos apenas observar que se no Brasil nós temos aproximadamente 207 milhões de habitantes com apenas 370 mil vagas em prisões, significa que temos um percentual de 0,18% do total da população do país em vagas criadas.
De outro lado temos os Estado Unidos, com seus 325 milhões de habitantes[footnoteRef:37], para aproximadamente 2 milhões e 200 mil vagas prisionais. Ou seja, lá a taxa de vagas criadas pelo governo em relação ao número de habitantes é de 0,61%. [37: https://www.google.com.br/search?ei=inYJW5DUKcGPwgSL_YTIDw&q=POPULAÇÃO+brasil&oq= POPULAÇÃO+brasil&gs_l=psy-ab.3..0i67k1j0i131k1l2j0l7.26041.26973.0.27286.6.2.0.4.4. 0.106 .206.0j2.2.0....0...1c.1.64.psy-ab..0.6.247....0.HxsJwmc_3aM] 
Essa simples comparação nos mostra que a política adotada nos Estados Unidos envolve três vezes mais investimento em criação de vagas do que o Brasil faz por habitante. Logo, nós investimos muito menos do que um país desenvolvido faz para manter um equilíbrio.
Este desequilíbrio é devastador porque obriga o Legislativo e o Judiciário a aplicarem políticas de livramento antecipado aos condenados por falta de lugar para alocá-los, e essa política de imunidade faz com que a função da pena no Brasil se torne meramente retributiva e não preventiva por intimidação, o que gera maior número de criminalidade e, por consequência, as prisões ficam cada vez mais cheias.
Isso vem sendo feito no Brasil desde a década de 1990 com a criação de penas alternativas e privilégios de concessão de liberdade e progressão de regime com cumprimento de quantidade pífia da pena, amparados nas políticas internacionais que pregam a mínima intervenção do direito penal como o protocolo da ONU chamado de “Regras Mínimas Para o Tratamento dos Presos” e as Regras de Tóquioque o Brasil se tornou signatário na mesma década, que impõe a instituição de regras mínimas para penas não privativas ou sem restritivas de liberdade.
Mas a verdade por trás destas políticas adotadas é o sistema superlotado, que faz o legislador e o Juiz refém destas medidas por falta de escolha para evitar o colapso.
Portanto essas medidas de liberdade antecipada, sem adoção de critério criminológicos subjetivos, mas apenas os objetivos, são em verdade uma válvula de alívio ao sistema prisional que beira a explosão. 
Essa realidade foi transparecida com naturalidade na entrevista concedida por Marcos Fuchs, diretor-adjunto da Conectas Direitos Humanos e ex-integrante do Conselho Nacional de Política Criminal e Penitenciária (CNPCP), do Ministério da Justiça, à reportagem da HUFFPOSTBRASIL, publicada em outubro de 2017, em seu sítio eletrônico[footnoteRef:38], cujo trecho colacionamos abaixo: [38: https://www.huffpostbrasil.com/2017/10/16/como-a-reforma-da-lei-de-execucao-penal-pode-reduzir-a-superlotacao-nas-prisoes_a_23240514/] 
Ficou bem definido que a preocupação com a superpopulação carcerária no Brasil é iminente. A partir do momento que vamos nos tornar o terceiro país com maior número de presos, você tem uma ideia de tentar mudar isso pela LEP", afirmou ao HuffPost Brasil Marcos Fuchs
Na mesma reportagem, o Coordenador-Chefe do Departamento de Estudos e Projetos Legislativos do IBCCRIM, Luiz Guilherme Mendes de Paiva, ainda demonstra entender que no Brasil há encarceramento em excesso, usando o bordão “cultura do encarceramento” em defesa da tese de que deveríamos ter penas ainda mais brandas, conforme o trecho abaixo:
Paiva, do IBCCRIM, por sua vez, lembra que foram feitas outras alterações legais com objetivo de reduzir o encarceramento, mas isso não aconteceu. "Um exemplo é a lei que aumentou as hipóteses de medidas cautelares e é pouco usada porque não entrou na cultura judicial", afirma. "Não há nenhuma alteração legal que resolva se os aplicadores da lei tiverem uma cultura que tenha o encarceramento, a prisão, como foco principal", completa. O especialista lembra que a cultura do encarceramento não é exclusiva de juízes ou de parlamentares, mas encontra ressonância no pensamento da sociedade, que vê a prisão como forma de combate ao crime.
Isso demonstra como as políticas no Brasil estão equivocadas, pois usam a péssima situação dos presídios para justificar uma inversão de valores que prega a impunidade. Ao final perguntamos: se prender não é a solução, então soltar seria?
4.3 DIRETO PENAL MÍNIMO E A CERTEZA DA IMPUNIDADE
Ainda que seja impossível a qualquer profissional, militante no Direito Penal atual, posicionar-se contrariamente à doutrina capitaneada por Luigi Ferrajoli, que defende uma menor intervenção do Direito Penal, também não podemos nos deixar levar pelos princípios mais extremados do Garantismo Penal, que é o que se vem instalando no sistema jurídico brasileiro, infelizmente, conforme o que foi exposto nas declarações supracitadas.
Não podemos nos esquecer que, pelo menos no papel, o espírito da Lei de Execuções é justamente o oposto: reprimir o crime para cumprir sua função preventiva e intimidatória contra o crime. Essa busca pela manutenção da essência preventiva da punição está clara na exposição de motivos da lei:
XVIII – Do que vem de ser ressaltado, e de vários outros critérios adotados pelo projeto, se evidencia que este se norteou no sentido de obter equilíbrio entre o interesse social e o da defesa individual, entre o direito do Estado à punição dos criminosos e o direito do indivíduo às garantias e seguranças de sua liberdade. Se ele não transige com as sistemáticas restrições ao poder público, não o inspira, entretanto, o espírito de um incondicional autoritarismo do Estado ou de uma sistemática prevenção contra os direitos e garantias individuais.
Ora, um Direito Penal sem sanção é inconcebível, já que a pena é o alicerce do Direito Repressor. Não se deve confundir ultima ratio com as ideias de exclusão do Direito Penal. Vivemos uma inversão de valores perigosíssima, que se escancara em decisões lenientes dos tribunais superiores como a do garantista assumido Teori Zavacki que em sua sabatina no senado afirmou[footnoteRef:39]: Se ser garantista é assegurar aquilo o que está na Constituição, eu sou garantista, eu acho que todos devem ser garantistas. Ele próprio, aquele que deu seu voto de minerva para absolver os réus do mensalão do crime de formação de quadrilha, mesmo com toda complexidade e articulação do sistema de pagamentos recorrentes. Mas isso daria tema para outra monografia. [39: https://politica.estadao.com.br/noticias/eleicoes,pressao-parlamentar-nao-intimida-ministro-imp-,935927 ] 
Para esclarecer a nítida incoerência do discurso dos garantistas, basta confrontar a repetida afirmação de que “o Brasil prende muito” com os números de crimes não solucionados e descobrir que a verdade é que: 
o Brasil não prende ninguém!
O mesmo jornalismo[footnoteRef:40] que acusa o sistema de ser repressor e punitivista, afirmando que o Brasil precisa diminuir o número de encarceramento, como se isso resolvesse a criminalidade: [40: https://www.cartacapital.com.br/sociedade/brasil-possui-a-quarta-maior-populacao-prisional-do-mundo-7555.html ] 
A urgência do País em reduzir o número de presos fica mais clara com as projeções do relatório. De acordo com o texto, se o ritmo de encarceramento for mantido, o Brasil terá cerca de 1 milhão de presos em 2022. Em 2075, o número chegará a uma em cada dez pessoas, estima o estudo.
Em outro momento[footnoteRef:41] ataca o Estado com os números de crimes não solucionados pela polícia que atingem os absurdos 80% quando se fala em homicídio – que é um crime com menor dificuldade investigativa. [41: https://www.cartacapital.com.br/sociedade/homicidios-no-brasil-sao-pouco-elucidados-diz-pesquisa ] 
(...)80% dos crimes de homicídio nos estados não são solucionados pelo poder público. Segundo levantamento Onde Mora a Impunidade?, publicado pelo Instituto Sou da Paz na última terça-feira 28, apenas seis estados foram capazes de fornecer dados à pesquisa sobre a taxa de crimes de homicídio solucionados. É o caso do Pará (4%), Espírito Santo (20%), Rondônia (24%), São Paulo (38%), Rio (12%) e Mato Grosso do Sul (55,2%).
Ora, se o Brasil é incompetente na elucidação dos crimes, como se pode dizer que é um país que prende muito? A verdade é que o criminoso sabe que a chance de ser descoberto é mínima e ao colocar na balança o crime sempre compensará. A certeza da impunidade reina, pela soma da deficiência policial com a benevolência legislativa.
Essa conclusão do criminoso, de que a vida crime compensa, está explicitada no Relatório do IPEA[footnoteRef:42] elaborado em 2015, especialmente num trecho em que uma assistente social explica a forma de pensar do criminoso, que entende perfeitamente que a lei lhe é favorável e que ele deliberadamente voltará a delinquir em função disso: [42: http://www.ipea.gov.br/agencia/images/stories/PDFs/relatoriopesquisa/150611_relatorio_reincidencia_criminal.pdf - pág. 97] 
Outro motivo que contribuiria com a reincidência seria uma espécie de tratamento brando do Estado com os criminosos. Assim, houve quem clamasse por reformas jurídicas que promovessem o endurecimento das penas, no sentido de incrementar as sanções estatais, evitando assim o que era entendido como “impunidade”: “O meu sonho é a reforma no Código Penal, porque eles chegam aqui e falam que estão doidos para sair, mas daqui apouco voltam. Eu acho que o sistema carcerário no Brasil é muito a favor do preso, eu acho” (Assistente social de unidade comum).
No relatório[footnoteRef:43], um Juiz de Execução Penal tem a mesma percepção do criminoso e conclui da mesma forma: o sistema de progressão de regime precisa ser alterado, pois a sensação de impunidade gera reincidência: [43: Ibidem, pág. 98] 
Quais os motivos da reincidência? Eu acho que um pouco da impunidade entra nesse ponto. O que se vê hoje, como não há uma fiscalizaçãoefetiva principalmente no regime aberto, a questão da tornozeleira é ainda muito tímida, só aplicada na região metropolitana [RM]. Então eu acho que se você olhar numa situação macro, porque não há uma efetiva fiscalização da pena, é uma questão séria que incentiva a reincidência. Falta de políticas públicas, de incentivo à educação, de trabalho, enfim, falta de uma política de ressocialização no interior das unidades prisionais, pois isso ainda é muito acanhado. Nós não temos ainda, falta muito ainda, falta pessoal para poder implementar esse tipo de coisa, o estado padece da falta de dinheiro para implementar políticas públicas. Tem fatores que são preponderantes para a reincidência. Basicamente é isso, falta de fiscalização da pena, a impunidade gera reincidência (Juiz de execução penal).
Sobre o tema, numa brilhante análise comparativa, Sebatian Sheerer[footnoteRef:44] mostra que é utópico defender a não punição: [44: SCHEERER, Sebastian. A punição deve existir! Deve existir o Direito Penal?. Tradução de Raphael Boldt. Revista Brasileira de Ciências Criminais. vol. 117. Ano 23. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2015.] 
Pelo fato de conheceremos castigos desde a infância, acreditamos que eles são naturais – talvez em todas as suas formas e a qualquer pretexto, mas em princípio (e também inconscientemente) de que eles são indispensáveis. Pensemos apenas nos castigos impostos pela família. Muitos pais aprenderam a educar os filhos sem bater e que a surra, outrora uma instituição pedagógica, é, no entanto, violência que estigmatiza os filhos. Mas, com isso, os castigos foram realmente abolidos ou transformados em uma variedade infindável de proibições, como a de assistir televisão e ficar acordado, ou mesmo o corte da mesada e outras sanções ligadas ao contato ao consumo? Antigamente eram as surras, hoje sofremos com sanções de desaprovação com o olhar, ostracismo social e privações de carinho. As punições podem se tornar mais brandas, mas poderiam também desaparecer? (e é a brandura realmente mais suave?). Uma sociedade que se sustente sem sanções negativas provavelmente nunca existirá, afinal, elas são um mal necessário, o mal necessário por excelência.
Sendo assim, o Brasil precisa sim continuar evoluindo a sua legislação no sentido de buscar penas alternativas em casos que não faça sentido o encarceramento, mas não abrir as portas dos presídios indistintamente com uma legislação branda que tenta contornar a superlotação como paliativo.
A prova de que isso não funciona são os índices altíssimos de pessoas que depois de presas voltaram a delinquir, ou seja, foram soltas, deliberaram e concluíram que valeria a pena continuar neste caminho.
Infelizmente, no mesmo relatório[footnoteRef:45] no qual, num momento de lucidez, demonstra coerência com a tese do presente estudo, ao expor a mesma conclusão tanto do condenado, como da assistente social e a do Juiz, todas no mesmo sentido: que a lei é branda e a impunidade reinante gera reincidência. Em outro ponto, se mostra tendencioso ao garantismo, insinuando que a criação de mais vagas e o endurecimento da lei não seria uma solução para os altos índices de reincidência: [45: http://www.ipea.gov.br/agencia/images/stories/PDFs/relatoriopesquisa/150611_relatorio_reincidencia_criminal.pdf] 
Esse grave problema tem levado o poder público e a sociedade a refletirem sobre a atual política de execução penal, fazendo emergir o reconhecimento da necessidade de repensar essa política, que, na prática, privilegia o encarceramento maciço, a construção de novos presídios e a criação de mais vagas em detrimento de outras políticas.
Ou seja, vivemos uma complicada situação, na qual alguns “especialistas” se iludem com o discurso populista que defende melhores condições aos presidiários, mas usa essa pauta legítima como escudo para implementar políticas de abrandamento penal.
CONCLUSÃO
O ser humano evoluiu e abandonou seu desejo visceral por vingança até os dias atuais; nos quais temos, inclusive, uma preocupação com o bem-estar dos condenados.
Vivemos hoje num ponto mais equilibrado, no qual percebemos que além de retribuição às condutas que infrinjam o contrato social, a existência de uma penalização por condutas reprováveis também precisa trazer ao cidadão uma percepção negativa, ou seja, uma intimidação para que não escolha por delinquir.
Entretanto, o que se vê em nosso país é uma inversão de valores de alguns defensores do Direito Penal Mínimo que se esquecem dessa função primordial da pena: a preventiva.
Devido à adoção de políticas públicas de abrandamento de penas que visam remediar o problema da falta de vagas nos presídios, opostas à política americana de lei e ordem, temos um cenário nacional de sensação de impunidade que influencia diretamente na escolha do condenado em voltar às práticas delituosas.
Isso somado ao não investimento em ferramentas de ressocialização e reinserção do egresso à sociedade, por meio de ensino, capacitação funcional e orientação psicológica, é um caldeirão de equívocos com pitadas de desinformação, cujo prato final é a insegurança.
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS:
ALBERGARIA, Jason. Das penas e da execução penal. 3. ed. Belo Horizonte: Del Rey,1996
BECCARIA, Cesare. Dos delitos e das penas. São Paulo: Martin Claret, 2.003
Bíblia Sagrada, traduzida por: João Ferreira de Almeida,SBB,1969
GRINOVER, Ada P. Execução penal. São Paulo: Max Limonad, 1987
MARTINS, Flademir J. B. Dignidade da pessoa humana: princípio constitucional fundamental.Curitiba: Juruá, 2006,
MIRABETE, Julio F. Execução penal: comentário a Lei n. 7.210. 11 ed. São Paulo: Atlas, 2006
MIRABETE, Júlio F. Manual de direito penal. São Paulo: Atlas, 1996
NOGUEIRA, Paulo L. Comentários à lei de execução penal. 3. ed. São Paulo: Saraiva, 1996.
OLIVEIRA, Odete M. Prisão: um paradoxo social. 3.ed. Florianópolis: UFSC, 2003, 
RODRIGUES, Paulo D. Pena de morte. Belo Horizonte: Del Rey, 1996
SCHEERER, Sebastian. A punição deve existir! Deve existir o Direito Penal?. Tradução de Raphael Boldt. Revista Brasileira de Ciências Criminais. vol. 117. Ano 23. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2015.
THOMPSON, Augusto. A questão penitenciária. 4. ed. Rio de Janeiro, 1.993.
RELATÓRIO INFOPEN – 2016 - Levantamento Nacional de Informações Penitenciárias Atualização
RELATÓRIO IPEA – 2015 - Relatório de Reincidência Criminal organizado 
SÍTIOS DA INTERNET:
https://www.cartacapital.com.br/sociedade/brasil-possui-a-quarta-maior-populacao-prisional-do-mundo-7555.html 
https://www.cartacapital.com.br/sociedade/homicidios-no-brasil-sao-pouco-elucidados-diz-pesquisa
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