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Ainda lembro do primeiro paciente que me fez repensar a estética e a terapêutica em dermatologia: uma mulher de cinquenta e poucos anos, olhos cansados pelo tempo e por inúmeras tentativas frustradas de recuperar a pele que lembrava de sua juventude. Veio para consultar sobre rugas finas, manchas pigmentares e cicatrizes de acne que insistiam em marcar seu rosto. Ao ouvi-la falar, percebi que não se tratava apenas de um conjunto de sinais anatômicos, mas de uma história — de autoestima, perdas e esperança. Foi essa narrativa que me levou a buscar, ao longo dos anos, não só tecnologias sofisticadas, mas uma abordagem terapêutica moderna centrada no indivíduo: o laser tornou-se, para nós, uma ferramenta de precisão narrativa. No núcleo dessa abordagem está o princípio físico conhecido como fototermólise seletiva: comprimentos de onda específicos são escolhidos para atingir cromóforos particulares — melanina, oxiemoglobina, água — promovendo alteração térmica controlada sem danificar tecidos adjacentes. A jornada clínica, contudo, exige algo além do entendimento físico: integração de dispositivos (lasers ablativos e não ablativos, fracionados, de pico e nano-segundos), da ciência de biomarcadores cutâneos e de protocolos que respeitem a individualidade do paciente. É essa confluência que define o moderno manejo dermatológico. Os lasers ablativos fracionados (como CO2 e Er:YAG) reescrevem a pele ao promover remoção parcial da epiderme e estímulo dérmico, sendo poderosos para cicatrizes e fotoenvelhecimento. Já os lasers não ablativos fracionados estimulam remodelamento colágeno com menor tempo de recuperação. Em paralelo, as plataformas de picosegundo ampliaram as fronteiras no tratamento de tatuagens e da pigmentação recalcitrante, ao produzir ondas de choque que fragmentam partículas pigmentares com dano térmico reduzido. Para lesões vasculares, lasers de corante pulsado e KTP oferecem seletividade para vasos, enquanto o alexandrita e o diodo dominam a depilação por atingirem o folículo piloso. A estratégia terapêutica moderna alia tecnologias: combinar um laser fracionado com terapia tópica transepidérmica (como retinoides ou fatores de crescimento) potencializa resultados; séries curtas de sessões com intervalos bem calculados equilibram eficácia e segurança. A personalização do protocolo — considerando fototipo, histórico de cicatrização, uso de isotretinoína, exposição solar e expectativas — é imperativa. Ferramentas de imagem não invasivas (dermatoscopia, fotografia padronizada, espectrofotometria) auxiliam no planejamento e no acompanhamento objetivo. Segurança e gestão de risco são pilares éticos. Complicações variam de eritema e edema temporários a hiperpigmentação pós-inflamatória, infecção e, raramente, cicatrizes atróficas. A prevenção exige seleção criteriosa de fluência, pulse duration, spot size e número de passes, além de preparo cutâneo e orientação sobre fotoproteção. Equilíbrio entre agressividade e tempo de recuperação define o sucesso clínico e a satisfação do paciente. Um aspecto transformador recente é a integração entre lasers e outros procedimentos: microagulhamento estimula vias reparativas que podem ser complementadas por lasers fracionados; peelings químicos pré e pós-sessão modulam resposta epidérmica; injeções de toxina botulínica e bioestimuladores complementam remodelamento estrutural. Também avança o uso de lasers como coadjuvantes no tratamento de lesões pré-malignas e de carcinomas cutâneos superficiais, embora requeiram protocolo rigoroso e acompanhamento oncológico. A medicina baseada em evidências vem qualificando indicações e desmistificando promessas. Ensaios comparativos e revisões sistemáticas mostram eficácia variável conforme condição tratada, tipo de laser e estudo; por isso, comunicação honesta sobre resultados esperados faz parte da clínica moderna. O treinamento continuado do operador e a regulamentação de equipamentos mantêm a prática dentro de padrões seguros e eficazes. O futuro desenha-se na precisão ainda maior: lasers com feedback em tempo real, inteligência artificial que sugere parâmetros com base em base de dados anatômicos, e terapias combinadas com moduladores moleculares que acelerem a regeneração tecidual. A democratização do conhecimento e o acesso responsável às tecnologias são desafios éticos e sociais: a dermatologia moderna precisa equilibrar inovação com equidade e prudência. Volto à paciente que iniciou esta reflexão: seu tratamento foi um mosaico — avaliação rigorosa, sessão fracionada de CO2 com protocolo conservador, sessões complementares de luz pulsada intensa para uniformizar o tom e uso tópico de retinoide e antioxidantes. Mais do que apagar sinais, buscamos reconstruir confiança. O laser, nessa história, foi um instrumento de transformação técnico e humano, e a abordagem terapêutica moderna o transforma em parte de um plano integral, ético e personalizado. PERGUNTAS E RESPOSTAS 1) Quais são os principais tipos de laser usados hoje na dermatologia? R: Ablativos (CO2, Er:YAG), não ablativos fracionados, picosegundo, corante pulsado, alexandrita, diodo e KTP, cada um com indicações específicas. 2) Como se escolhe o protocolo ideal para um paciente? R: Avaliando fototipo, diagnóstico, histórico médico, expectativas, preparo cutâneo e risco de complicações; ajustar fluência, duração de pulso e intervalos. 3) Quais riscos mais comuns e como preveni-los? R: Eritema, edema, hiperpigmentação, infecção; prevenção com seleção adequada, preparo, proteção solar e seguimento pós-procedimento. 4) Lasers podem tratar cicatrizes e manchas ao mesmo tempo? R: Sim, combinações (fracionado + luz intensa/picosegundo) podem melhorar textura e pigmentação, mas requerem planejamento sequencial. 5) O que esperar do futuro das terapias a laser em dermatologia? R: Maior personalização com IA, feedback em tempo real, combinação com bioterapias e acesso mais seguro às tecnologias.