Prévia do material em texto
DEGRADAÇÃO AMBIENTAL Prof. MSc. Valter Machado da Fonseca O homem sempre degradou o ambiente? Os estudos científicos relativos à evolução da espécie humana demonstram que, no início o homem convivia com o ambiente da mesma forma que as demais espécies de seres vivos, ou seja, retirava dele apenas o necessário para sua sobrevivência. Mas, a partir do momento em que ele começa a desenvolver sua capacidade de raciocínio, começa também sua ação degradante sobre a natureza. Com a aquisição e produção de conhecimentos, ele começa a construir engenhos, máquinas e equipamentos, os quais ele começou a utilizar para explorar os recursos da natureza. Assim, aumentou também sua capacidade de degradar o ambiente natural. Pode-se afirmar, então, que durante praticamente toda sua existência, o homem sempre degradou, em algum grau, a natureza. O homem, por sua capacidade de raciocínio, de produção, reprodução, assimilação e organização de saberes e conhecimentos, coloca-se num patamar superior à natureza, como se dela não fosse elemento constitutivo, como se não fizesse parte do grande conjunto de forças que mantém o equilíbrio do grande ecossistema planetário. Os diversos conceitos de natureza são frutos da elaboração do homem, portanto decorrentes do entendimento do que ele próprio tem da natureza, ou seja, da relação de apropriação que ele sempre manteve com ela. Nota-se ainda, que em todas as sociedades existentes até os dias atuais, a visão antropocêntrica1 sempre existiu, em maior ou em menor grau. A natureza deve ser compreendida como um recurso valioso, um “bem”, do qual o homem depende para sua sobrevivência e, não se descarta um “bem” fundamental para a continuidade da vida. Luís Paulo Sirvinskas (2005, p.31) resgata o conceito de bem ambiental extraído da Constituição Federal: Bem ambiental é aquele definido constitucionalmente (art. 225, caput) como sendo de uso comum do povo e essencial à sadia qualidade de vida. Qual é o bem de uso comum do povo? Bem ou recurso ambiental é aquele definido no art. 3º, V, da Lei n. 6.938/81, ou seja, a atmosfera, as águas interiores, superficiais e subterrâneas, os estuários, o mar territorial, o solo, o subsolo, os elementos da biosfera, a fauna e a flora. É em outras palavras, o meio ambiente ecologicamente equilibrado2. Nota-se, nessa conceituação, que o “bem ambiental” é a própria natureza e, em última instância, a própria vida. Então, pode-se deduzir que o homem, pela sua prática destruidora, não sabe sequer o significado de ambiente (ou meio ambiente como preferem chamar a maioria dos autores). Portanto, a necessidade da reflexão sobre os laços que unem a sociedade à natureza se faz urgente, no sentido de se evitar o colapso total. É preciso resgatar o verdadeiro significado da vida, significado este há muito perdido diante da lógica irracional da ação do homem sobre a natureza. É preciso entender que a vida vai 1 Antropocentrismo refere-se à corrente filosófica que considera o homem como centro do universo. 2 Grifo do original. muito além da existência ou não do homem: vai desde suas formas mais simples até as mais complexas. Quando começa a acirrar a degradação ambiental? É notório que a problemática ambiental acirrou-se com a Revolução Industrial e, seus efeitos mais gritantes começaram, de fato, a serem percebidos a partir da década de 1960, quando o Planeta começou a dar respostas às agressões contra ele dirigidas. Estas respostas vieram na forma de grandes catástrofes, às quais o homem chama de “naturais” como: o efeito estufa, o buraco na camada de ozônio3, as “chuvas ácidas”, o aumento considerável na temperatura e no nível dos oceanos, o aquecimento global, as grandes enchentes, maremotos, furacões, terremotos, o derretimento das calotas polares, dentre outras. Por se tratar de um fenômeno cujo acirramento remonta à década de 1960, a degradação ambiental pode ser considerada um acontecimento ainda recente. Diante dessa constatação os estudos ambientais sérios e conseqüentes só foram iniciados a partir desse momento. Se os estudos científicos também são recentes, é lógico que a legislação deles derivada é também incipiente e ainda em processo de discussão, elaboração e reelaboração. Neste sentido, observa-se que qualquer elaboração teórico-prática acerca desse processo é ainda cheia de lacunas e indagações. Mas, permanece uma certeza: a sociedade precisa encontrar uma forma harmônica de se relacionar com a natureza. Diante do cenário que se desenha a partir da Revolução Industrial, abre-se uma nova situação e um novo campo de pesquisas para os estudiosos das temáticas ambientais. Trata-se de um vasto campo de investigação, sobre o qual o conjunto das ciências deve se debruçar: desvendar os “mistérios” da natureza, ou melhor, rediscutir novas formas da sociedade se relacionar com ela. Mas, para isso o homem deve ser capaz de se despir de sua arrogância e hipocrisia e, se dignar a reformular antigas indagações: O que é a natureza? Qual o real significado do termo ambiente, tema sobre o qual tanto se fala, mas nunca se sai do discurso? De que maneira o homem deve se relacionar com a natureza? Como, quando e de que forma se devem explorar os recursos naturais? Por que se briga tanto pela posse dos combustíveis fósseis e não se tem interesses reais em encontrar uma nova forma de “energia limpa” para substituí-los? Podemos afirmar, então, que a degradação ambiental do planeta começa a se intensificar a partir da Revolução Industrial e ganha, de fato, notoriedade a partir dos anos 1960, quando a Terra começa a dar respostas às agressões contra ela dirigidas. Portanto, é na sociedade capitalista que a degradação ambiental atinge seu ápice. Hoje, podemos afirmar que a degradação ambiental é um processo e, enquanto processo, está em curso, ou seja, se intensifica cada vez mais, na medida em que evoluem a ciência e as técnicas voltadas para a exploração dos recursos naturais. Dias (2002) ilustra o crescimento da degradação ambiental no planeta, considerando-se a interferência humana nos ecossistemas: Segundo o IGBP (International Geosphere-Biosphere Programme, 1990), durante a geração passada, o ambiente da Terra mudou mais rapidamente do que qualquer outro tempo comparável na história. Embora os fenômenos naturais tenham um papel importante nessas mudanças, a fonte primária dessa dinâmica tem sido precipitada pelas interações do ser humano com a biosfera. Tais influências, produzidas de modo inadvertido ou propositado, criaram e criarão mudanças globais dramáticas que alterarão a existência humana por muito tempo. Tais mudanças globais são resultados das relações políticas, sociais, econômicas e religiosas da humanidade com a Terra. Agricultura, silvicultura4, produção e padrões de consumo de energia 3 Camada gasosa composta por moléculas de oxigênio (O3), responsável pela filtragem seletiva da luz solar. Ela elimina (diminui) os efeitos dos raios ultravioletas, os quais provocam doenças de pele (inclusive câncer) e são letais para o homem e várias espécies animais. 4 Grifo meu. O termo refere-se ao plantio de florestas com espécies vegetais exóticas (principalmente o eucalipto e o pinus). Muitos confundem silvicultura com reflorestamento. Silvicultura significa o replantio de e materiais, aumento da população, urbanização e outras atividades humanas alteraram os ecossistemas aquáticos, terrestres e a atmosfera da Terra. (DIAS, 2002, p.57) A citação de Dias (2002) demonstra a relevância da ação humana sobre os ecossistemas, o que tem acelerado a degradação do ambiente terrestre e colocado em risco o equilíbrio desses ecossistemas. Dentre as alterações decorrentes da ação antrópica no ambiente podemos citar: a) O aquecimento e as alterações climáticas globais (impactos sobre o ambiente e a sociedade, causas do aquecimento); b) Desflorestamentos5 (impactosna biosfera, na sociedade); c) Redução da camada de ozônio (efeitos sobre os seres vivos); d) Redução da produtividade biológica e da biodiversidade; e) Redução da diversidade cultural; f) Alterações da superfície terrestre pelo uso; g) Alterações da qualidade do ar e da qualidade de vida de milhões de seres humanos e não-humanos. Desmatamento: uma das primeiras formas de degradação ambiental do planeta. A Revolução Industrial inaugurou um novo ciclo de degradações ambientais no planeta. Toda inovação tecnológica necessita em primeiro lugar de energia, para que possa ser colocada em prática. Assim, também para fazer funcionar as máquinas, engenhos e locomotivas a vapor, foi necessário combustível para a produção de energia. Neste sentido, o carvão vegetal foi o primeiro combustível utilizado para fazer funcionar os engenhos e locomotivas, na primeira etapa da Revolução Industrial. Daí pode-se concluir que as florestas temperadas da Europa Ocidental foram os primeiros recursos naturais a serem utilizados como combustíveis para as máquinas a vapor. Já no início da Revolução Industrial, com a utilização das máquinas a vapor, iniciou-se um violento ataque à biomassa do planeta, com milhões de km² de florestas virgens sendo devoradas para a manutenção da indústria de base, principalmente a siderurgia. Iniciava- se, assim, o processo de degradação ambiental do planeta. Figura 1: Florestas de coníferas ou temperadas áreas com espécies vegetais exóticas, já o reflorestamento é o replantio de áreas com espécies vegetais características (originais) da própria região. 5 O termo desflorestamento possui a mesma significação de desmatamento, embora seja mais correta sua utilização, quando se referir à retirada de florestas originais. Já o termo desmatamento também poder ser utilizado, quando se refere à remoção de qualquer forma de vegetação. Disponível em: www.10emtudo.com.br/matérias/geografia_geral . Acesso em 9/12/2007. A Figura 1, acima mostra os aspectos fitofisionômicos das Florestas de Coníferas ou Temperadas que ocupavam a maior faixa da Europa Ocidental. Vamos compreender melhor o papel da energia durante toda a vida do homem em sociedade? Na realidade, a energia é essencial para a manutenção de qualquer forma de vida no planeta. O próprio planeta, para manter sua dinâmica necessita de energia, cuja fonte primária é o sol. Assim, também os seres vivos e dentre eles os seres humanos necessitam de energia para sobreviver e para realizar trabalho. Os alimentos que consumimos, nada mais são do que fontes de energia, da qual necessitamos para continuarmos vivos. Assim, durante toda sua existência na Terra, o homem vem numa busca constante por novas formas de energia. A cada nova invenção, nova inovação no processo produtivo, mais quantidade de energia é necessária. A invenção do motor a explosão (Segunda Revolução Tecnológica) iniciou a exploração dos combustíveis fósseis como nova forma de energia, que revolucionou todo o processo produtivo da sociedade capitalista. Hoje, já se anuncia o prenúncio do fim do ciclo do petróleo e o mundo já vislumbra, para um futuro que se confunde com o presente, uma nova crise energética. Podemos concluir que a energia não somente é a grande responsável pela continuidade da vida na Terra, como também para garantir as atividades humanas no planeta. Estas considerações são importantes, pois, o consumo de energia está diretamente ligado à degradação ambiental, conforme veremos neste roteiro de estudos. Voltando ao desmatamento... Apesar de o desmatamento ter aumentado, de forma contundente, após a Revolução Industrial, ele já ocorria nas sociedades pré-capitalistas em decorrência das áreas abertas para as atividades agrícolas, em especial. Pode-se dizer que, atualmente, existem apenas pequenas manchas da vegetação original no continente europeu e em grande parte dos EUA. Além das atividades industriais e agropecuárias, as atividades ligadas à exploração dos recursos minerais (atividades mineradoras e garimpo) são também importantes responsáveis pela destruição de grande parte da vegetação em várias partes do globo. Alguns dos principais efeitos do desflorestamento: O desflorestamento auxilia, em grande parte, para o desequilíbrio ambiental do planeta. Dentre os efeitos dos desmatamentos podemos citar: a) Extinção de rios, lagos, riachos, córregos e nascentes; b) Exposição do solo aos processos erosivos; c) Assoreamento dos corpos d’água (rios, riachos e córregos); d) Rebaixamento do lençol freático; e) Remoção de matas ciliares; f) Contribui com o desequilíbrio do balanço hídrico de uma determinada região; g) Influencia no processo de precipitação pluviométrica, alterando o regime de chuvas; h) Contribui para o aumento da temperatura global; i) Contribui com o desequilíbrio climático; j) Provoca diminuição da diversidade biológica e/ou extinção de espécies endêmicas6; k) Auxilia para o processo de contaminação das águas superficiais e subterrâneas, dentre outros. O desflorestamento é apenas um dos aspectos que incidem sobre a degradação ambiental. É preciso perceber que a degradação ambiental é um processo e, sendo processo, inclui uma série de fatores interligados e combinados entre si. Assim, para se analisar um processo de degradações e impactos ambientais sobre uma determinada área, é preciso estar atento para a análise de uma série de fatores, dos quais o desmatamento é apenas um. O desflorestamento tem influência no balanço hídrico7 de uma região??? O desflorestamento tem relação direta com a quantidade de água de uma determinada região. A remoção da vegetação interfere no processo de evapotranspiração (diminuindo-o), o qual por sua vez tem incidência direta sobre a formação de nuvens responsáveis pela ocorrência das precipitações pluviométricas (chuvas). A ausência de vegetação também diminui a umidade do ar e do solo, acarreta o rebaixamento do lençol freático, diminui a vazão8 e, conseqüentemente, o volume dos corpos d’água, ocasionando, muitas vezes, grandes processos erosivos e desertificação de extensas áreas. Em muitos locais, onde ocorre a remoção intensa da vegetação e das matas ciliares, os rios são assoreados e até extintos. O desflorestamento tem influência nos processos de erosão dos solos??? O desflorestamento também tem relação direta com os processos de erosão dos solos. A remoção da vegetação deixa o solo totalmente exposto aos processos erosivos. Antigamente, a preocupação com a preservação dos solos era pequena, justamente pela abundância de terras virgens; quando uma área ficava comprometida, era simplesmente abandonada e se partia para a predação de outras áreas. Quantas vezes já se presenciaram a prosa entre antigos agricultores, quando da derrubada das matas para novos plantios: “Terras cheias de vida, gordas”, diziam. Sobre essas terras “cheias de vida”, 6 Espécies vegetais e/ou animais endêmicas são espécies que só são encontradas em determinada região. Por isso, quando se destrói seu hábitat são definitivamente extintas. 7 O “balanço hídrico de uma determinada área ou região é dado por uma série de fatores que possuem relação com a quantidade e tipo de vegetação existente. Alguns destes fatores são pluviosidade (regime de chuvas), nível do lençol freático, umidade do ar, umidade do solo, volume dos corpos d’água (rios, lagos, riachos e córregos), temperatura, dentre outros. 8 É o volume de água que passa por um determinado ponto de um rio, por unidade de tempo. Geralmente é calculada em l/s (litros por segundo). pouco se pode dizer, nos dias atuais. Elas se transformaram em simples substrato de sustentação de plantas e que exigem técnicas artificiais e cada vez maiores quantidades de agrotóxicos, para produzirem.O sintoma mais aparente e conhecido da degradação dos solos é a erosão. Ela não é um fenômeno natural, embora a intensidade das chuvas e a declividade do terreno possam influir sobre sua ocorrência. Sua origem verdadeira é a infiltração deficiente da água no solo, por alterações ou perda de sua bioestrutura e/ou por um manejo incorreto. É interessante notar que nas matas ou nos campos naturais (o que restam deles), não há perda de solos, mesmo após os mais violentos temporais. As águas dos rios de floresta são sempre límpidas. A remoção da vegetação é responsável por grandes processos erosivos desde a formação de ravinas até a formação de imensas voçorocas (figura 1). Figura 1: Exemplo clássico de voçoroca, provocada pela erosão. Fonte: Geocities, 2006. Disponível em: www.geocities.com. Acesso em 20/10/2006. A figura 1, acima mostra um exemplo clássico de voçoroca. Quando o processo erosivo atinge este estágio, a área atingida torna-se irrecuperável e a erosão tende a aumentar, provocando entulhamento dos vales e assoreamento dos corpos d’água que por acaso existam em seu curso. Existem localidades em que as voçorocas chegam a atingir dezenas de quilômetros de extensão por quilômetros de profundidade, formando verdadeiras crateras no solo.