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A relação entre a exposição a conteúdos audiovisuais passivos e o
desenvolvimento da linguagem expressiva e da autorregulação na
primeira infância: uma revisão sistemática
Nirlly Maria do Nascimento Oliveira
nirlly.oliveira@ip.ufal.br
Pós-Graduação em Neuropsicologia, IPOG — Arapiraca/AL, 26 de Outubro de 2025
RESUMO
A exposição precoce e crescente às mídias digitais é um traço da infância contemporânea e
suscita dúvidas sobre impactos no neurodesenvolvimento. Esta revisão sistemática examinou a
relação entre a exposição a mídias audiovisuais passivas e o desenvolvimento da linguagem
expressiva e da autorregulação na primeira infância (2–5 anos). Foram pesquisadas bases
como PsycINFO, PubMed e SciELO, incluindo estudos experimentais, de caso-controle e
observacionais que avaliaram tempo de tela e desfechos do desenvolvimento. A síntese aponta
tendência consistente de associação negativa entre maior tempo de tela passivo e indicadores de
linguagem/autorregulação. Evidências sugerem mecanismo indireto via redução da qualidade e
quantidade de interação responsiva adulto-criança durante o uso de telas, com menor aporte
linguístico e engajamento mútuo quando comparado à brincadeira com brinquedos. Conteúdo,
contexto de uso e mediação parental modulam os efeitos, sinalizando a importância de diretrizes
de uso e ambientes de alta responsividade.
Palavras-chave: Primeira infância. Tempo de tela. Linguagem. Autorregulação. Mídias
audiovisuais
1 Introdução
A primeira infância, compreendida como o período do nascimento aos seis anos de idade,
representa uma janela crítica para o neurodesenvolvimento humano. Caracterizada por intensa
sinaptogênese e poda neural, essa fase estabelece as fundações arquitetônicas do cérebro
que sustentarão competências cognitivas, sociais e emocionais ao longo de toda a vida. É
nesse período que circuitos responsáveis por funções complexas — como linguagem e funções
executivas — demonstram máxima plasticidade e sensibilidade aos estímulos ambientais Black
et al. (2016).
1.1 Neurodesenvolvimento na primeira infância
A plasticidade cerebral na primeira infância reflete um balanço entre sinaptogênese e poda
neural : inicialmente há superprodução de sinapses, seguida de eliminação seletiva das conexões
pouco utilizadas. Esse processo uso-dependente significa que experiências reiteradas — fala
direcionada, atenção conjunta e brincadeira simbólica — consolidam circuitos, ao passo
que vias pouco ativadas enfraquecem-se (BLACK et al., 2016). Em termos funcionais, a
arquitetura que sustenta linguagem e autorregulação é esculpida por interações responsivas com
cuidadores. Ambientes com alta responsividade social oferecem input linguístico variado, turnos
conversacionais e corregulação emocional; já contextos dominados por estímulos audiovisuais
de alta saliência e reforço intermitente podem capturar a atenção de modo fragmentado,
competindo com atenção sustentada e inibição (RADESKY; CHRISTAKIS, 2016; American
Academy of Pediatrics Council on Communications and Media, 2016; Sociedade Brasileira de
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Pediatria, 2016). Períodos sensíveis para linguagem e FE entre 2–5 anos tornam a qualidade
do ambiente determinante para desfechos de longo prazo, o que justifica o foco desta revisão
nesse recorte etário (BLACK et al., 2016).
1.2 Desenvolvimento da linguagem expressiva (2–5 anos)
A linguagem expressiva envolve produzir sons, palavras e enunciados para comunicar intenções.
Entre 2–3 anos, observa-se “explosão de vocabulário”, combinações bi/tri-palavra e ganho de
inteligibilidade; entre 4–5 anos, emergem estruturas mais complexas, pronomes, conectivos e
narrativas breves com começo–meio–fim. Esses marcos dependem da maturação neural e da
densidade sociointeracional. O mecanismo central é a interação do tipo serve and return: a
criança “serve” vocalizações/gestos/olhares e o adulto “devolve” com respostas contingentes,
modelando vocabulário e sintaxe. O volume e a diversidade do input parental em contextos
significativos predizem vocabulário e complexidade morfossintática (BLACK et al., 2016). Em
cenários digitais passivos — sobretudo sem co-visualização — estudos indicam redução do input
parental e do engajamento mútuo em comparação à brincadeira com brinquedos (EWIN et al.,
2021; HINIKER et al., 2018) . Importa distinguir exposição passiva de uso interativo mediado.
A primeira tende a oferecer pouco retorno contingente; o uso mediado insere pausas, perguntas
abertas e reconto, aproximando-se da conversação natural. Diretrizes pediátricas reforçam
que a qualidade da interação é determinante, não apenas o tempo (American Academy of
Pediatrics Council on Communications and Media, 2016; Sociedade Brasileira de Pediatria,
2016). Estudos com TV precoce/prolongada associam-se a risco para linguagem expressiva,
em linha com a hipótese do deslocamento — tempo de tela substitui conversa, leitura
e brincadeira simbólica (ÁLVAREZ et al., 2014). Em contraste, mediação de qualidade
correlaciona-se positivamente com indicadores de desenvolvimento, sugerindo que tecnologia
não é risco per se (GUEDES et al., 2020).
1.3 Autorregulação e Funções Executivas (2–5 anos)
Autorregulação é a capacidade de gerenciar emoções, atenção e comportamento para atingir
objetivos; surge do acoplamento entre maturação das Funções Executivas (FE) e experiências
de corregulação. Entre 2–5 anos, FE amadurecem intensamente. O controle inibitório
permite suprimir impulsos e ignorar distrações (p.ex., esperar a vez, não interromper). A
memória de trabalho mantém/manipula informações breves (seguir 2–3 instruções; construir
enunciados mais longos). A flexibilidade cognitiva viabiliza mudar de regra/estratégia (brincar
de faz-de-conta, alternar papéis) e adaptar-se ao imprevisto. Ambientes com estímulos de alta
saliência e reforço intermitente podem sobrecarregar sistemas executivos imaturos (RADESKY;
CHRISTAKIS, 2016). Evidências sugerem que dispositivos móveis associam-se a marcadores
mais desfavoráveis de autorregulação do que TV tradicional, compatíveis com desenho de
recompensas e interatividade de aplicativos (CHOE et al., 2023). Em contrapartida, rotinas
previsíveis, leitura compartilhada e brincadeira simbólica com andaimento do adulto oferecem
treino natural de foco, inibição e flexibilidade (American Academy of Pediatrics Council on
Communications and Media, 2016; Sociedade Brasileira de Pediatria, 2016; GUEDES et al.,
2020).
1.4 Exposição passiva, hipótese do deslocamento e mediação
Por exposição passiva entende-se consumo de vídeos/TV/streams com papel receptivo,
baixa exigência de resposta e mínima contingência social; uso interativo mediado envolve
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co-visualização ativa e propósito pedagógico. A hipótese do deslocamento propõe que
tempo de tela pode substituir atividades de alta densidade socio-linguística (conversa, leitura,
brincadeira), reduzindo turnos e co-regulação. A mediação parental modula esses efeitos,
deslocando o foco de “quanto tempo” para “como, com quem e para quê” (GUEDES et al.,
2020; EWIN et al., 2021; HINIKER et al., 2018).
A elevada plasticidade sináptica na primeira infância torna o desenvolvimento particu-
larmente sensível ao contexto de interação. Em ambientes ricos em turnos conversacionais
e atenção conjunta, conexões relevantes para linguagem e autorregulação são repetidamente
ativadas e estabilizadas; já em contextos de uso passivo de mídia, a redução de oportunidades de
co-regulação e de fala contingente pode deslocar tempo de prática comunicativa e regulatória,
ajudando a explicar as associações observadas nesta revisão.
Em termos funcionais, a arquitetura que sustenta linguagem e autorregulação é esculpida
por interações responsivas com cuidadores. Ambientes com alta responsividade social provêm
input linguístico variado, oportunidades de alternância de turnos e corregulação emocional; em
contrapartida, contextos com salientes estímulos audiovisuais e reforço intermitente podem
capturar a atenção de modo fragmentado, competindo com a consolidação de atenção susten-tada e controle inibitório ((RADESKY; CHRISTAKIS, 2016; American Academy of Pediatrics
Council on Communications and Media, 2016; Sociedade Brasileira de Pediatria, 2016)). His-
toricamente, o ambiente de desenvolvimento da criança era predominantemente composto por
interações sociais diretas e brincadeiras sensório-motoras. No século XXI, porém, observa-se
um novo paradigma: a onipresença de mídias digitais no cotidiano familiar. Dispositivos
como smartphones e tablets tornaram-se ubíquos mesmo em lares com crianças pequenas,
com exposição iniciando-se em idades cada vez mais precoces e, não raro, ultrapassando
parâmetros recomendados por sociedades pediátricas (American Academy of Pediatrics Council
on Communications and Media, 2016; Sociedade Brasileira de Pediatria, 2016). Esse cenário
renova preocupações quanto a possíveis impactos sobre domínios particularmente sensíveis na
primeira infância: a linguagem expressiva e a autorregulação.
Nesta investigação, é central distinguir uso interativo de exposição passiva a conteúdos
audiovisuais. Entende-se por exposição passiva o consumo de vídeos/televisão/streams em que
a criança assume papel predominantemente receptivo, com baixa exigência de resposta, mínima
contingência social e, frequentemente, sem mediação ativa de um adulto. Já o uso interativo
envolve engajamento conjunto, co-visualização com perguntas e comentários do cuidador e
objetivo pedagógico explícito. A literatura tem destacado a Hipótese do Deslocamento
(Displacement Hypothesis), segundo a qual o tempo gasto em telas pode substituir atividades
desenvolvimentais de alta densidade socio-linguística — como a conversa face a face, a leitura
compartilhada e a brincadeira simbólica —, reduzindo turnos conversacionais e oportunidades
de co-regulação. Evidências experimentais e observacionais apontam que o contexto de uso
de telas frequentemente empobrece o ambiente linguístico e interativo quando comparado à
brincadeira com brinquedos (EWIN et al., 2021; HINIKER et al., 2018). Por outro lado, estudos
sugerem que a qualidade da mediação (co-visualização ativa, intencionalidade pedagógica)
pode modular resultados, indicando que tecnologia e risco não são sinônimos (GUEDES et al.,
2020).
Do ponto de vista da relevância social e clínica, pais, educadores e profissionais de
saúde relatam dúvidas crescentes sobre impactos das telas no desenvolvimento de linguagem e
autorregulação. Entretanto, as evidências disponíveis encontram-se dispersas em estudos com
diferentes delineamentos, amostras e medidas, o que dificulta a formulação de recomendações
práticas baseadas em síntese crítica.
Dessa lacuna emerge o seguinte problema de pesquisa: qual a relação entre a
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exposição a conteúdos audiovisuais passivos e o desenvolvimento da linguagem expressiva e da
autorregulação na primeira infância, com base nas evidências empíricas disponíveis?
Para respondê-lo, este trabalho tem como objetivo geral analisar, por meio de revisão
sistemática, as evidências científicas sobre a relação entre exposição passiva a mídias e o
desenvolvimento da linguagem expressiva e da autorregulação em crianças de 2 a 5 anos.
Essa faixa etária delimita o recorte empírico da revisão (ver Seção 2), por concentrar marcos
de aquisição de linguagem e maturação de funções executivas.
Foram definidos os seguintes objetivos específicos:
1. Mapear os estudos empíricos primários que investigam a relação entre uso de telas e
desfechos de linguagem e/ou autorregulação na primeira infância;
2. Identificar os principais delineamentos metodológicos e os mecanismos neuropsicológicos
propostos para explicar as associações observadas;
3. Sintetizar criticamente os achados, contrastando resultados entre autores e contextos
para fundamentar conclusões e recomendações.
Hipótese
Parte-se da hipótese de que a exposição passiva, sobretudo quando não mediada
por um adulto responsivo, reduz oportunidades de turnos conversacionais e de co-regulação,
associando-se a piores indicadores de linguagem expressiva e de autorregulação.
Organização do artigo. Após esta introdução, a Seção 2 descreve o método (fontes,
estratégias de busca, critérios, PRISMA). A Seção 3 apresenta os resultados e a caracterização
dos estudos incluídos. A discussão interpreta os achados à luz do referencial teórico e de sua
aplicabilidade prática, e a conclusão sintetiza implicações, limitações e direções futuras.
2 Metodologia
2.1 Delineamento
Trata-se de uma revisão sistemática da literatura sobre a relação entre exposição passiva a
conteúdos audiovisuais e o desenvolvimento da linguagem expressiva e da autorregulação
na primeira infância (2–5 anos), orientada pelo protocolo PRISMA (identificação, triagem,
elegibilidade e inclusão).
2.2 Pergunta de pesquisa
Qual a relação entre a exposição a mídias audiovisuais passivas e os desfechos de linguagem
expressiva e autorregulação em crianças de 2 a 5 anos?
2.3 Fontes de informação e período
As buscas foram realizadas em setembro de 2025 nas bases PsycINFO (APA PsycNet),
PubMed, SciELO e LILACS, complementadas por backward e forward chaining no Google
Acadêmico.
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2.4 Estratégia de busca
Foram combinados termos em português e inglês para população (primeira infância, preschoolers,
toddlers), exposição (tempo de tela, screen time, media exposure, passive viewing, TV, tablets,
smartphones) e desfechos (desenvolvimento da linguagem, linguagem expressiva, autorregulação,
funções executivas), com operadores booleanos e truncamentos quando aplicável.
Tabela 1 – Descritores e operadores booleanos utilizados nas buscas (exemplos).
Eixo Termos em português Termos em inglês
População “primeira infância” OR “pré-escolar”
OR “crianças pequenas”
preschool* OR toddler* OR “early
childhood”
Exposição “tempo de tela” OR “mídia” OR “te-
las” OR televisão OR vídeo* OR stre-
aming
“screen time” OR “media exposure”
OR “passive viewing” OR television
OR video* OR streaming
Desfechos “linguagem” OR “linguagem expres-
siva” OR autorregulação OR “fun-
ções executivas”
“language” OR “expressive language”
OR self-regulation OR “executive
functions”
Estratégias completas foram adaptadas por base (campos Título/Resumo/Assunto).
Exemplos de strings (PubMed):
(preschool*[Title/Abstract] OR toddler*[Title/Abstract]) AND
("screen time"[Title/Abstract] OR "media exposure"[Title/Abstract] OR "passive
viewing"[Title/Abstract]) AND
("expressive language"[Title/Abstract] OR "self-regulation"[Title/Abstract])
Exemplos de strings (SciELO):
(criança* OR pré-escolar* OR "primeira infância") AND
("tempo de tela"OR "exposição à mídia"OR televisão) AND
("linguagem expressiva"OR "autorregulação")
2.5 Critérios de elegibilidade
Inclusão: estudos empíricos com crianças típicas de 2–5 anos; exposição passiva a mídia
audiovisual; desfechos de linguagem expressiva e/ou autorregulação; publicados entre 2013 e
2023; idiomas PT/EN/ES; texto integral disponível.
Exclusão: artigos opinativos/teóricos sem dados primários; amostras exclusivamente clíni-
cas sem grupo típico; estudos cujo foco principal não incluísse linguagem expressiva nem
autorregulação; duplicatas.
2.6 Processo PRISMA
Identificaram-se 133 registros; 28 duplicatas foram removidas; 105 títulos/resumos triados;
25 textos completos avaliados; 19 excluídos com motivo; 6 incluídos na síntese qualitativa
(Figura 1).
Motivos de exclusão
Na triagem por título/resumo, artigos foram excluídos majoritariamente por tratarem
desfechos não pertinentes ao escopo (p.ex., obesidade, qualidade do sono, miopia), por
6
abordarem faixas etárias fora do recorte (p.ex., escolares/adolescentes) ou por focarem
uso interativo/educativo sem mensurar exposição passiva. Na leitura de texto completo,
exclusões decorreram de falta de definição operacional de “exposição passiva”, ausência de
desfechos de linguagem expressiva/autorregulação, amostras exclusivamente clínicas sem
grupo típico e indisponibilidade de dados mínimos (p.ex., medidas e estatísticas essenciais).
Esses motivos foram registrados para transparênciae reprodutibilidade.
Figura 1 – Fluxo PRISMA da identificação, triagem, elegibilidade e inclusão.
Fonte: elaboração própria (set. 2025).
2.7 Extração e síntese
Os estudos elegíveis foram extraídos para planilha padronizada e sintetizados narrativamente
por desfecho (linguagem; autorregulação) e por mecanismos propostos (p.ex., redução de
turnos conversacionais; engajamento diádico; reforço intermitente).
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Tabela 2 – Itens de extração de dados por estudo incluído.
Campo Descrição
Autores/Ano Citação abreviada (ex.: Sobrenome et al., 2020)
País/Contexto País e cenário (clínico, escolar, domiciliar, laboratório)
Delineamento Experimental; caso-controle; coorte; observacional
Amostra/Idade N, faixa etária (em meses/anos), critérios de inclusão
Exposição passiva TV/vídeo/streaming; intensidade/duração; contexto (sozi-
nho/mediado)
Desfechos Linguagem expressiva; autorregulação; medidas/instrumentos
Principais achados Efeitos/associações; tamanho/força do efeito; limitações
Template utilizado na planilha de extração.
2.8 Avaliação de qualidade e risco de viés (narrativa)
Foram considerados: (i) tamanho amostral e poder estatístico; (ii) validade/confiabilidade
dos instrumentos; (iii) controle de confundidores (p.ex., nível socioeconômico, rotina familiar,
co-visualização); (iv) definição operacional de “exposição passiva”; (v) validade ecológica
(laboratório vs. ambiente natural). A heterogeneidade metodológica impediu meta-análise
formal.
2.9 Robustez, limitações metodológicas e transparência
Embora as estratégias de busca e os critérios de elegibilidade tenham sido definidos a priori,
reconhece-se heterogeneidade de medidas (exposição, instrumentos de linguagem/autorregulação)
e variabilidade de delineamentos, o que limita comparabilidade e impede meta-análise
formal. Para mitigar vieses, foram registrados motivos de exclusão na etapa de texto com-
pleto e priorizados estudos com definição operacional explícita de “exposição passiva”. Os
dados extraídos e a planilha de elegibilidade podem ser disponibilizados mediante solicitação,
fortalecendo a reprodutibilidade.
Quadro 3 – Indicadores e medidas típicas por desfecho (exemplos).
Desfecho Indicadores/Medidas (exemplos)
Linguagem expressiva Vocabulário expressivo; MLU (tamanho médio de enunciado);
diversidade lexical; análise de fala parental (nº de palavras,
tipos, perguntas abertas)
Autorregulação/FE Controle inibitório (tarefa go/no-go); atenção sustentada
(tarefas contínuas simples); flexibilidade (troca de regras);
relatos parentais padronizados
Exemplos genéricos usados na literatura; não correspondem necessariamente a um único estudo.
2.10 Confiabilidade do processo de seleção e extração
A triagem foi conduzida por dois avaliadores, de forma independente, nas etapas de título/resumo
e texto completo, com resolução de divergências por consenso. A extração de dados seguiu
planilha padronizada (Tabela ??); em caso de inconsistências, retornou-se ao texto-fonte para
verificação. Para transparência e reprodutibilidade, registraram-se os motivos de exclusão na
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etapa de texto completo e mantiveram-se versões datadas das estratégias de busca. Embora
não se tenha realizado meta-análise, as decisões foram ancoradas em critérios definidos a priori,
visando reduzir vieses de seleção e de relato.
2.11 Domínios de julgamento de qualidade e risco de viés
A avaliação narrativa considerou domínios comumente empregados em revisões de estudos
observacionais e experimentais: (i) seleção/amostragem (critérios de inclusão; represen-
tatividade); (ii) mensuração da exposição (definição operacional de “exposição passiva”;
instrumento e janela temporal); (iii) mensuração dos desfechos (validade e confiabilidade dos
instrumentos de linguagem/autorregulação); (iv) confundidores (p.ex., nível socioeconômico,
rotina familiar, mediação parental); (v) validade ecológica (laboratório vs. ambiente natural).
As limitações identificadas orientam a interpretação cautelosa e as recomendações da Seção 4.
3 Resultados
A busca e a triagem resultaram em um conjunto de estudos empíricos que atenderam aos
critérios de elegibilidade. A seguir, apresenta-se a caracterização geral e um quadro-síntese com
informações-chave, além de sínteses por desfecho (linguagem/engajamento e autorregulação).
3.1 Caracterização dos estudos
Foram incluídos seis estudos empíricos (2014–2023), com amostras de 15 a 103 participantes,
conduzidos no Brasil, Cuba, Canadá, Austrália e Estados Unidos, abrangendo delineamentos
observacionais, correlacionais, caso-controle e experimental. As idades das amostras variaram
predominantemente entre 2 e 5 anos; um estudo apresentou faixa etária adjacente (12–24
meses) e foi mantido por tratar diretamente do mecanismo interacional (redução de input
parental e de engajamento diádico), sendo interpretado com cautela na discussão.
3.2 Análise dos estudos incluídos
Álvarez et al. (2014) conduziram um caso-controle em crianças de 18–36 meses, examinando
a associação entre TV precoce/prolongada e linguagem expressiva. A exposição passiva elevada
esteve ligada a maior risco de atraso, coerente com a hipótese do deslocamento.
Guedes et al. (2020) realizaram análise correlacional em amostra brasileira (N=103;
24–42 meses), avaliando a qualidade do uso interativo de mídia. Encontraram correlação
positiva entre mediação de qualidade (co-visualização ativa) e indicadores de desenvolvimento,
destacando o papel moderador do contexto relacional.
Ewin et al. (2021) compararam, em delineamento experimental (2–3 anos; N=24), a
linguagem parental durante dispositivos móveis versus brinquedos não digitais. Observaram
redução da quantidade/qualidade do input linguístico parental no contexto digital, sugerindo
um mecanismo intermediário para impactos na linguagem.
Hiniker et al. (2018) investigaram situações naturais de brincadeira digital e analógica
com pré-escolares (4–6 anos; N=15), relatando menor engajamento mútuo pais-filho durante
o uso de mídias digitais, quando comparado a contextos analógicos.
Archer et al. (2021) observaram interações pais-crianças (12–24 meses; N=30) na
introdução de tecnologia, destacando que suporte verbal parental variado se associa a
melhores escores de desenvolvimento. Embora a faixa etária seja ligeiramente inferior ao recorte
principal desta revisão (2–5 anos), o estudo foi mantido por elucidar o mecanismo interacional.
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Choe et al. (2023) analisaram, em delineamento correlacional (N=72; cerca de 3
anos), a relação entre dispositivos (TV vs. móveis) e autorregulação, encontrando associações
negativas mais fortes para dispositivos móveis do que para TV, compatíveis com hipóteses
de reforço intermitente e alta saliência atencional.
Quadro 4 – Síntese dos estudos incluídos na revisão sistemática.
Estudo (ano) País DelineamentoAmostra/Idade Principais achados
Guedes et al.
(2020)
Brasil Correlacional N=103
(24–42 m) Qualidade do uso interativo
(com mediação)
correlacionou-se
positivamente com
indicadores de
desenvolvimento, destacando o
papel da mediação.
Álvarez et al.
(2014)
Cuba Caso-
controle
(18–36 m) TV precoce/prolongada
associada a maior risco de
atraso em linguagem
expressiva.
Archer et al.
(2021)
Canadá Observacional N=30
(12–24 m) Suporte verbal parental
variado associado a melhores
escores em contexto de
introdução tecnológica.
Ewin et al. (2021) Austrália Experimental N=24
(2–3 a) Redução do input linguístico
parental durante uso de
dispositivos móveis em
comparação à brincadeira com
brinquedos.
Hiniker et al.
(2018)
EUA Observacional N=15
(4–6 a) Menor engajamento mútuo
pais-filho em contextos digitais
quando comparados a
contextos analógicos.
Choe et al. (2023) EUA Correlacional N=72
(cerca de 3 a) Dispositivos móveis como
preditores negativos mais
fortes de autorregulação do
que TV tradicional.
Variáveis resumidas: tempo de tela passivo, medidas padronizadas de linguagem e autorregulação, e métricas
de engajamento diádico.
Fonte: Elaboração própria a partir dos estudos incluídos.3.3 Síntese dos achados em linguagem/engajamento
Cinco dos seis estudos indicaram redução do input linguístico parental e/ou menor
engajamento diádico em contextos digitais passivos quando comparados à brincadeira com
brinquedos, com implicações para vocabulário e complexidade morfossintática. Evidências de
Ewin et al. (2021) e Hiniker et al. (2018) sugerem um mecanismo intermediário que explica
associações negativas observadas em estudos com TV precoce/prolongada Álvarez et al. (2014).
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Em sentido complementar, Guedes et al. (2020) reforçam que a qualidade da mediação
(co-visualização ativa, intencionalidade) pode modular resultados, deslocando o foco de “quanto
tempo” para “como, com quem e para quê”.
3.4 Síntese dos achados em autorregulação
Observa-se tendência de piores marcadores de autorregulação (p.ex., controle inibitório
e atenção sustentada) associada a maior exposição passiva, com destaque para o papel dos
dispositivos móveis como preditores negativos mais fortes do que a TV tradicional Choe et
al. (2023). Interpretações plausíveis recorrem ao perfil de reforço intermitente e à alta
saliência atencional de aplicativos modernos, que competem com o treino de atenção e
inibição em sistemas executivos em desenvolvimento.
3.5 Mecanismos sugeridos e ligação com a discussão
De forma recorrente, os achados convergem para um mecanismo indireto alinhado à Hipótese
do Deslocamento: a exposição passiva reduz a quantidade/qualidade de interações responsivas
adulto-criança, diminuindo o aporte linguístico e as experiências de co-regulação. Esses
mecanismos serão aprofundados na Seção de Discussão, onde comparamos explicitamente a
convergência e as divergências entre autores e contextos.
3.6 Robustez dos achados e risco de viés
Considerando a heterogeneidade de delineamentos, os achados mostram consistência qualitativa
entre estudos e países. Contudo, a variabilidade de instrumentos (linguagem/autorregulação)
e de medidas de exposição (tempo, tipo de conteúdo, contexto) implica risco de viés de
classificação. Estudos com amostras pequenas podem superestimar efeitos; por outro lado,
delineamentos naturais tendem a subestimar associações por confundimento residual. Esses
fatores orientam a leitura cautelosa dos resultados e a necessidade de padronização mínima
para comparabilidade.
3.7 Moderadores e fontes de heterogeneidade nos achados
Tipo de dispositivo (TV vs. dispositivos móveis).
Os resultados sugerem que dispositivos móveis se associam mais fortemente a marca-
dores desfavoráveis de autorregulação do que a TV tradicional, possivelmente devido ao reforço
intermitente, à elevada saliência atencional e ao desenho interativo dos aplicativos (CHOE et
al., 2023). Em linguagem, o padrão é compatível com um mecanismo intermediário: queda do
input parental e do engajamento diádico em contextos digitais, observada tanto em laboratório
quanto em situações naturalísticas (EWIN et al., 2021; HINIKER et al., 2018).
Mediação parental e qualidade do uso.
A mediação de qualidade (co-visualização ativa com perguntas abertas, comentários,
reconto) aparece como moderadora dos efeitos, associando-se a melhores desfechos quando
presente, e atenuando associações negativas quando comparada ao uso passivo e solitário
(GUEDES et al., 2020). Esse padrão desloca o foco de “quanto tempo” para “como, com
quem e para quê”.
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Faixa etária dentro do recorte.
Ainda que o recorte principal desta revisão seja 2–5 anos, um estudo com faixa adjacente
(12–24 meses) foi mantido por elucidar o mecanismo interacional (redução de fala parental e
de atenção conjunta) (ARCHER et al., 2021). Isso sugere que, quanto mais imaturo o sistema
executivo/linguístico, maior a vulnerabilidade a contextos passivos não mediados — o que é
coerente com a noção de períodos sensíveis.
Contexto e validade ecológica.
Diferenças entre laboratório (padrões controlados, maior detecção de efeito) e ambien-
tes naturais (maior variabilidade, confundimento residual) ajudam a explicar heterogeneidades.
Ensaios/experimentos tendem a captar de forma mais nítida a redução do input parental durante
a mídia (EWIN et al., 2021), enquanto observações naturalísticas confirmam o fenômeno em
rotinas familiares (HINIKER et al., 2018).
Mensuração da exposição e dos desfechos.
Relatos parentais e time-diaries podem subestimar ou superestimar exposição; por sua
vez, indicadores de linguagem/autorregulação variam entre medidas padronizadas e análises
comportamentais (tamanho médio de enunciado, diversidade lexical; tarefas de controle inibitó-
rio/atenção). Parte da heterogeneidade observada advém dessas diferenças de mensuração,
reforçando a necessidade de padronização mínima para comparabilidade entre estudos.
4 Discussão
4.1 Comparação com a literatura e entre estudos
Os seis estudos convergem quanto a um mecanismo comum: redução do input linguístico
parental e do engajamento diádico em contextos digitais passivos Ewin et al. (2021), Hiniker
et al. (2018). Álvarez et al. (2014) descrevem que a TV precoce e prolongada associa-se a
risco para linguagem, plausivelmente mediado por deslocamento de interações. Choe et al.
(2023) ampliam a discussão à autorregulação, sugerindo que dispositivos móveis exercem
pressão maior que TV (reforço intermitente; saliência atencional). Em contraste, Guedes et al.
(2020) indicam que mediação de qualidade pode atenuar ou reverter associações negativas,
deslocando o foco do tempo de exposição para o modo de uso — como, com quem e para quê.
Archer et al. (2021) mostram que suporte verbal parental durante a introdução tecnológica
relaciona-se a melhores escores, reforçando o papel moderador do adulto. Em síntese, as
diferenças entre estudos decorrem menos da tela em si e mais de conteúdo, contexto e
mediação.
Os achados desta revisão são consistentes com a hipótese do deslocamento: contextos
de exposição passiva competem com interações responsivas, reduzindo turnos conversacionais,
diversidade lexical e oportunidades de co-regulação. Evidências experimentais e observacionais
documentam a redução do input linguístico parental e do engajamento diádico durante
o uso de mídias digitais quando comparado à brincadeira com brinquedos Ewin et al. (2021),
Hiniker et al. (2018). Para linguagem, estudos com TV precoce e consumo prolongado indicam
aumento do risco de atraso Álvarez et al. (2014). Para autorregulação, há indícios de que
dispositivos móveis se associam a marcadores mais desfavoráveis do que a TV tradicional,
12
possivelmente pelo padrão de recompensa intermitente e pela alta saliência atencional de
aplicativos modernos Choe et al. (2023). Em contrapartida, resultados que valorizam a
qualidade da mediação — co-visualização ativa, perguntas abertas e intencionalidade
pedagógica — sugerem que o impacto das telas depende fortemente do contexto relacional
Guedes et al. (2020). Adicionalmente, estudos focados no suporte verbal parental em situações
de introdução tecnológica reforçam que a forma de participação do adulto é determinante para
os desfechos Archer et al. (2021).
4.2 Comparação crítica entre autores e posicionamento (requisito 2.4.1a)
Tomados em conjunto, os estudos apresentam padrões convergentes quanto ao mecanismo
(queda de input e engajamento diádico) e nuances quanto aos efeitos observados: Álvarez et
al. (2014) descrevem risco de atraso associado à TV precoce/prolongada; Ewin et al. (2021) e
Hiniker et al. (2018) explicitam o mecanismo intermediário (redução de fala parental e atenção
conjunta) que sustenta a hipótese do deslocamento; Choe et al. (2023) destacam dispositivos
móveis como preditores negativos mais fortes de autorregulação do que TV; e Guedes et al.
(2020) mostram que a mediação de qualidade pode mitigar associações negativas, deslocando
o foco de “quanto tempo” para “como, com quem e para quê”. Posicionamento: os dados
analisados sustentam que o risco não deriva da tecnologia per se, mas do uso passivo, não
mediado e do desenho do conteúdo/atividade; usos interativos mediados tendema reduzir ou
inverter efeitos adversos.
4.3 Implicações práticas
Co-visualização ativa
Recomenda-se que o uso de mídia ocorra, preferencialmente, com co-visualização ativa
do adulto. Comentários, perguntas abertas (“o que aconteceu?”, “por quê?”) e recontos criam
turnos conversacionais e ampliam o input linguístico, aproximando a atividade digital de um
contexto de linguagem natural (American Academy of Pediatrics Council on Communications
and Media, 2016; Sociedade Brasileira de Pediatria, 2016).
Pausas para diálogo e reconto
Pontos de pausa breves durante vídeos/app favorecem autorregulação (interrupção
voluntária) e consolidação do conteúdo por reconto com palavras da criança, mitigando a
captura atencional contínua.
Seleção de conteúdo e desenho da atividade
Conteúdos com ritmo menos fragmentado e ganchos conversacionais facilitam
mediação verbal e engajamento conjunto. Atividades que convidem a fazer algo fora da tela
(desenhar, dramatizar, faz-de-conta) fortalecem transferência para contextos analógicos e
sustentam linguagem e FE (RADESKY; CHRISTAKIS, 2016).
Preservação de leitura e brincadeira simbólica
Leitura compartilhada diária e brincadeira simbólica permanecem núcleo para linguagem
e autorregulação. Mídia digital deve ser ferramenta relacional, não substituto dessas práticas;
13
na escola e na clínica, integrar recursos digitais a projetos que culminem em produção oral
(reconto, dramatização).
4.4 Implicações para políticas e design
Políticas devem comunicar que qualidade e contexto são tão importantes quanto o tempo
de tela, com recomendações por faixa etária e ênfase em co-visão. No design de produtos,
recomenda-se promover turnos conversacionais (prompts que convidem o adulto a interagir),
pontos de pausa (reduzindo reforço intermitente), metas colaborativas adulto-criança e
ritmos narrativos menos fragmentados, favorecendo atenção compartilhada e linguagem.
4.5 Aplicabilidade para famílias, escolas e saúde
Para famílias, o foco recai na co-visualização ativa e na preservação de rotinas de leitura
e brincadeira. Em escolas de educação infantil, mídias devem ser integrais a projetos que
valorizem conversas, dramatizações e reconto, evitando uso como “passatempo”. Na Atenção
Primária à Saúde, recomenda-se triagem breve de padrões de uso (tempo, conteúdo, contexto,
mediação) e orientação parental centrada em qualidade e contexto — não apenas em limites
de tempo.
4.6 Aplicabilidade para famílias, educação infantil e saúde
Famílias: (i) co-visualização ativa com perguntas abertas; (ii) pausas programadas para
reconto/explicação; (iii) seleção de conteúdo com ritmo mais lento e ganchos conversacionais;
(iv) preservação de leitura compartilhada e brincadeira simbólica como rotina diária. Educação
infantil: integrar mídias a projetos que culminem em produção oral (reconto, dramatização,
desenho do enredo), evitando uso como passatempo. Saúde/APS: triagem breve dos padrões
de uso (tempo, conteúdo, contexto, mediação) e aconselhamento centrado em qualidade e
contexto — não apenas em limites de tempo American Academy of Pediatrics Council on
Communications and Media (2016), Sociedade Brasileira de Pediatria (2016).
4.7 Implicações metodológicas para futuras investigações
Os achados desta revisão indicam três eixos prioritários. Primeiro, padronizar a definição
operacional de “exposição passiva” (p.ex., TV/vídeo/streaming sem co-visualização ativa;
janelas temporais explícitas) e os indicadores de linguagem expressiva (vocabulário, MLU,
diversidade lexical) e de autorregulação/FE (controle inibitório, atenção sustentada, flexibili-
dade). Segundo, integrar medidas multimétodo (relato parental, observação estruturada,
registros digitais quando disponíveis) para reduzir viés de mensuração. Terceiro, reportar
explicitamente variáveis moderadoras (tipo de dispositivo; qualidade da mediação; contexto
de uso; perfil sociodemográfico) e proceder a análises estratificadas quando o tamanho amostral
permitir. Adicionalmente, recomenda-se que experimentos ecológicos manipulem estratégias
de mediação (comentários, perguntas abertas, pausas para reconto) e comparem ritmos
narrativos e ganchos conversacionais do conteúdo, de modo a estimar quais componentes
protegem linguagem e autorregulação em idades críticas.
4.8 Limitações e pesquisas futuras
A base de evidências é limitada por: (i) predominância de delineamentos transversais e
amostras pequenas; (ii) heterogeneidade de medidas de exposição (tempo, tipo de conteúdo,
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mediação) e de desfechos (instrumentos distintos), o que impede meta-análise formal; (iii)
validade ecológica variável (laboratório vs. domicílio) e controle incompleto de confundidores.
Prioridades de pesquisa incluem: coortes longitudinais que isolem efeitos de conteúdo e
contexto; experimentos ecológicos manipulando mediação parental; padronização mínima
de indicadores de linguagem expressiva e autorregulação; e análise diferencial por faixa
etária (2–3 vs. 4–5 anos) e por tipo de dispositivo (TV vs. dispositivos móveis).
5 Conclusão
Resposta ao problema
As evidências analisadas convergem para uma relação tendencialmente negativa entre
a exposição passiva a conteúdos audiovisuais e o desenvolvimento da linguagem expressiva
e da autorregulação em crianças de 2–5 anos. Tal relação é mediada principalmente pela
redução de interações responsivas adulto-criança, com menor quantidade e qualidade de turnos
conversacionais e de experiências de co-regulação. O impacto, contudo, varia por conteúdo,
contexto e mediação: usos mediados e intencionais tendem a atenuar (ou inverter) efeitos
adversos, ao passo que contextos passivos, não mediados e de alta saliência atencional estão
associados a piores desfechos.
Verificação dos objetivos
Objetivo geral — Atingido. Foi conduzida revisão sistemática que analisou critica-
mente as evidências sobre a relação entre exposição passiva e os desfechos-alvo na primeira
infância.
Objetivos específicos — Atingidos. (i) Mapeamento dos estudos empíricos, com carac-
terização por país, delineamento, amostra e medidas; (ii) Identificação de delineamentos
e mecanismos (p.ex., queda de input parental, engajamento diádico, reforço intermitente);
(iii) Síntese crítica com comparação explícita entre autores e indicação de convergências e
divergências, culminando em recomendações práticas.
Limitações e agenda futura
A síntese está limitada por heterogeneidade metodológica (definições de exposição,
instrumentos de linguagem/autorregulação) e pela predominância de delineamentos trans-
versais com amostras pequenas, o que restringe inferências causais e inviabiliza meta-análise
formal. Prioridades futuras incluem: (i) coortes longitudinais que isolem o efeito de tipo de
conteúdo e contexto de uso (solitário vs. acompanhado; passivo vs. interativo); (ii) experimen-
tos ecológicos que manipulem a mediação parental e testem intervenções de co-visualização;
(iii) padronização mínima de indicadores de linguagem expressiva e autorregulação para
comparabilidade; (iv) análises diferenciais por faixa etária (2–3 vs. 4–5 anos) e por dispositivo
(TV vs. dispositivos móveis).
Síntese e recomendação final
Recomenda-se que diretrizes familiares e escolares priorizem qualidade e contexto do
uso de mídia: co-visualização ativa, pausas para diálogo, seleção de conteúdos que convidem
à conversa e, sobretudo, a preservação de rotinas de leitura compartilhada e brincadeira
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simbólica. Em termos práticos, “tempo de tela” não deve substituir interações face a face,
que são o principal “nutriente” da linguagem e da autorregulação na primeira infância.
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REFERÊNCIAS
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de Pediatría, SciELO Cuba, v. 86, n. 1, p. 18–25, 2014.
American Academy of Pediatrics Council on Communications and Media. Media and young
minds. Pediatrics, American Academy of Pediatrics, v. 138, n. 5, 2016.
ARCHER,K.; WOOD, E.; PASQUALE, D. D. Examining joint parent-child interactions
involving infants and toddlers when introducing mobile technology. Infant Behavior and
Development, Elsevier, v. 63, p. 101568, 2021.
BLACK, M. M. et al. Early childhood development coming of age: science through the life
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CHOE, D. E.; LAWRENCE, A. C.; CINGEL, D. P. The role of different screen media devices,
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Popular Media, American Psychological Association, v. 12, n. 3, p. 324, 2023.
EWIN, C. A.; REUPERT, A.; MCLEAN, L. A.; EWIN, C. J. Mobile devices compared to
non-digital toy play: The impact of activity type on the quality and quantity of parent
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GUEDES, S. d. C. et al. Quality of interactive media use in early childhood and child
development: a multicriteria analysis. Jornal de Pediatria, Elsevier, v. 96, p. 310–317, 2020.
HINIKER, A.; LEE, B.; KIENTZ, J. A.; RADESKY, J. S. Let’s play!: digital and analog play
between preschoolers and parents. In: Proceedings of the 2018 CHI Conference on
Human Factors in Computing Systems. [S.l.: s.n.], 2018. p. 1–13.
RADESKY, J. S.; CHRISTAKIS, D. A. Keeping children’s attention: the problem with bells
and whistles. JAMA Pediatrics, American Medical Association, v. 170, n. 2, p. 112–113,
2016.
Sociedade Brasileira de Pediatria. Saúde de crianças e adolescentes na era digital. Manual de
Orientação do Departamento de Adolescência, 2016.
Introdução
Neurodesenvolvimento na primeira infância
Desenvolvimento da linguagem expressiva (2–5 anos)
Autorregulação e Funções Executivas (2–5 anos)
Exposição passiva, hipótese do deslocamento e mediação
Metodologia
Delineamento
Pergunta de pesquisa
Fontes de informação e período
Estratégia de busca
Critérios de elegibilidade
Processo PRISMA
Extração e síntese
Avaliação de qualidade e risco de viés (narrativa)
Robustez, limitações metodológicas e transparência
Confiabilidade do processo de seleção e extração
Domínios de julgamento de qualidade e risco de viés
Resultados
Caracterização dos estudos
Análise dos estudos incluídos
Síntese dos achados em linguagem/engajamento
Síntese dos achados em autorregulação
Mecanismos sugeridos e ligação com a discussão
Robustez dos achados e risco de viés
Moderadores e fontes de heterogeneidade nos achados
Discussão
Comparação com a literatura e entre estudos
Comparação crítica entre autores e posicionamento (requisito 2.4.1a)
Implicações práticas
Implicações para políticas e design
Aplicabilidade para famílias, escolas e saúde
Aplicabilidade para famílias, educação infantil e saúde
Implicações metodológicas para futuras investigações
Limitações e pesquisas futuras
Conclusão
Referências