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Processo penal -julio f. mirabete trecho do livro para a prova

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1.6 FONTES DO DIREITO PROCESSUAL PENAL
1.6.1 Classificação
Fonte, em sentido geral, é aquilo de onde provém algo. No direito, significa tudoaquilo de onde provém um preceito jurídico. Como em todos os ramos do direito as fontesdo Direito Processual Penal podem ser classificadas em: de produção (materiais), que constituem, criam o direito; e formais (de cognição), que revelam o direito, que são os seus modos de expressão.
Fonte de produção do processo penal é o Estado. As fontes formais são a lei (a única fonte primária, imediata), o costume, os princípios gerais do direito e a analogia (fontes secundárias, mediatas). Não são fontes, mas meras formas de interpretação, a doutrina e a jurisprudência.
1.6.2 Fonte de produção
Diante da natureza publicista do processo penal, cabe ao Estado legislar sobre a matéria, criando, com exclusividade, o direito correspondente. É ele, pois, a única fonte de produção, material, do direito processual penal.
Nos termos da nova Constituição Federal, compete privativamente à União legislar sobre "direito processual" (art. 22, I). Entretanto, a própria Carta Magna, rompendo com a tradição que vem desde a Constituição Federal de 1934, permite que lei complementar autorize os Estados a legislar sobre questões específicas das matérias relacionadas no citado artigo, inclusive Direito Processual Penal (art. 22, parágrafo único). Além disso, estendeu a competência dos Estados e Distrito Federal para legislar concorrentemente com a União sobre a "criação, funcionamento e processo do juizado de pequenas causas" (art. 24, X, e 98, I) e "procedimentos em matéria processual" (art. 24, XI).
Concorrentemente com a União, também cabe ao Estado e ao Distrito Federal legislar sobre "direito penitenciário" (art. 24, I, e §§ 1° e 2°). É também da competência dos Estados-membros, conforme as constituições estaduais, a legislação sobre organização judiciária no âmbito estadual, bem como sobre custas dos serviços forenses (art. 24, IV, da CF). Essas autorizações constitucionais derivam da necessidade de se adaptar o processo penal às peculiaridades locais, tão diversas no nosso país, de dimensão continental e com problemas distintos conforme a região do território em que se deve aplicar a lei processual.
1.6.3 A lei
A lei é a única fonte formal imediata, ou direta, do Direito Processual Penal pois é por meio dessa regra jurídica que o Estado impõe a sua vontade. É fonte imediata porque contém em si mesma a norma jurídica processual. Utiliza-se a palavra lei em seu sentido amplo, isto é, como toda disposição emanada de qualquer órgão estatal (Executivo, Legislativo e Judiciário), na esfera de sua própria competência.
Em relação ao processo penal brasileiro, além dos dispositivos referentes à matéria na Constituição Federal, são fontes primárias todas as normas jurídicas que se referem ao processo penal, divididas entre preceitos que regulamentam o Direito Processual Penal da jurisdição comum e as que se referem ao Direito Processual Penal das jurisdições especiais.
Quanto ao Direito Penal comum, há como lei básica o Código de Processo Penal (Decreto-lei n° 3.689, de 3-10-1941) e as leis extravagantes ou modificadoras do Estatuto, das quais as mais importantes são: Decreto-lei n° 7.661, de 21 de junho de 1945 (Lei de Falências); Lei n° 263, de 23 de fevereiro de 1948 (que modifica a
competência do Tribunal do Júri); Lei n° 1.079, de 10-4-1950 (que define os crimes de responsabilidade); Lei n° 1.408, de 9 de agosto de 1951 (que prorroga vencimento de prazos judiciais); Lei n° 1.508, de 19-12-1951 (que regula o processo de contravenções); Lei n° 1.521, de 26-12-1951 (Lei de Economia Popular); Lei n° 4.898, de 9-12-1965 (Lei de Abuso de Autoridade); Lei n° 5.250, de 9-2-1967 (Lei de Imprensa); Decreto-lei n° 201, de 27-2-1967 (Lei dos Crimes de Responsabilidade de Prefeitos); Lei n° 6.368, de 21-10-1976 (Lei Antitóxico); Lei n° 7.106, de 28-6-1983 (Lei dos Crimes de Responsabilidade de Governadores e Secretários); Lei n° 1.431, de 12-9-1951 (que alterou o art. 725 do CPP); Lei n° 6.416, de 24-5-1977 (que alterou vários dispositivos do CPP); Lei n° 4.336, de 1-5-1964 (que acrescentou parágrafo ao art. 600 do CPP); Lei n° 5.941, de 22-11-1973 (que alterou dispositivos do CPP sobre a prisão); Lei n° 7.170, de 14-12-1983 (Lei de Segurança Nacional); Lei n° 7.780, de 22-6-1989 (que alterou os arts. 325 e 581 do CPP); Lei n° 8.038, de 28-5-1990 (que regula o processamento de recursos no STJ e STF); Lei n° 8.072, de 25-7-1990, alterada pela Lei n° 8.930, de 6-9-1994 (que dispõe sobre os crimes hediondos); Lei n° 8.658, de 16-5-1993 (que revogou os arts. 556 a 562, do CPP); Lei n° 8.699, de 27-8-1993 (que acrescenta parágrafo ao art. 24 do CPP); Lei n° 8.701, de 1°-9-1993 (que acrescenta parágrafo ao art. 370 do CPP); Lei n° 8.862, de 28-3-1994 (que dá nova redação aos arts. 6°, incisos I e II; 159, caput e § 1°; 160, caput e parágrafo único; 164, caput, 189; e 181, caput, do CPP); Lei n° 8.866, de 11-4-1994 (que se refere à prisão administrativa); Lei n° 8.906, de 4-7-1994 - Estatuto da Advocacia (que contém dispositivos processuais); Lei n° 9.033, de 2-5-95, que deu nova redação ao art. 408, § 1°, do CPP; Lei n° 9.034, de 3-5-95, que dispõe sobre o crime organizado; Lei n° 9.043, de 9-5-95, que deu nova redação ao art. 4° do CPP; Lei n° 9.061, de 14-6-95, que deu nova redação ao art. 809, do CPP; Lei n° 9.099, de 26-9-95, que dispõe sobre os Juizados Especiais Cíveis e Criminais; Lei n° 9.133, de 16-10-95, que deu nova redação ao art. 484, III, do CPP; Lei n° 9.271, de 17-4-96, que alterou os arts. 366 a 370 do CPP etc.
Quanto às leis processuais das jurisdições especiais existem o Decreto-lei n° 1.002, de 21-10-1969 (Código de Processo Penal Militar), a Lei n° 4.737, de 15-7-1965 (Código Eleitoral) etc.
Também são fontes diretas as leis de organização judiciária, federais e estaduais, que se referem a nomeação, investidura e atribuições dos órgãos jurisdicionais e seus auxiliares, bem como os Regimes Internos dos Tribunais, da Câmara Federal, do Senado e das Assembléias legislativas no que tangem ao processo de impeachment. São elas fontes orgânicas, mas, além das questões de ordem interna, podem conter normas supletivas da legislação processual, desde que entrelaçadas à marcha do serviço interno, ou quando houver remissão da norma de processo às regras regimentais para que estas preencham a área em branco do preceito legal, citando-se como exemplos no Código de Processo Penal os arts. 560, 618, 638, 666 e 667.
Nos termos do artigo 1°, caput, do Código de Processo Penal, o processo penal rege-se, em todo o território, por esse estatuto. Ressalva-se, porém, no inciso II, as prerrogativas do Presidente da República, dos Ministros de Estado, nos crimes conexos com os do Presidente da República e dos Ministros do Supremo Tribunal Federal, nos crimes de responsabilidade, referidos, na nova Constituição Federal no artigo 52, I e II, que inclui o Procurador-Geral da República e o Advogado-Geral da União; no artigo 102, I, "c", referente aos crimes de responsabilidade dos Ministros de Estado, membros dos Tribunais Superiores e do Tribunal de Contas da União e os chefes de missão diplomática de caráter permanente; e no artigo 105, I, que menciona os crimes de responsabilidade de desembargadores dos Tribunais de Justiça dos Estados e do Distrito Federal, os membros dos Tribunais de Contas dos Estados e do Distrito Federal, os dos Tribunais Regionais Federais, dos Tribunais Regionais Eleitorais e do Trabalho, os membros dos Conselhos ou Tribunais de Contas dos Municípios e os do Ministério Público da União que oficiem perante tribunais.
Ressalva-se também, no inciso III, do artigo 1° do CPP, os processos de competência da Justiça Militar, ora regidos pelo Código de Processo Penal Militar; no inciso IV, os processos da competência do tribunal especial, que era na época da promulgação do CPP o Tribunal de Segurança, extinto pela Lei Constitucional n° 14, de 7-11-1945; e, no inciso V, os processospor crimes de imprensa, regidos atualmente pela Lei n° 5.250, de 9-2-1967.
1.6.4 O costume
O costume, regra de conduta praticada de modo geral, constante e uniforme (elemento interno), com a consciência de sua obrigatoriedade (elemento externo), é fonte formal mediata, secundária, indireta, do processo penal. Embora não mencionado no artigo 3° do CPP, que admite a aplicação da analogia e dos princípios gerais do direito, o costume é referido pelo artigo 4° da Lei de Introdução do Código Civil como uma das formas integradoras do Direito, em especial na lacuna da lei, podendo ser considerado como forma de revelação do Direito Processual Penal. Não coartando a liberdade ou qualquer dos interesses dos sujeitos processuais nem contrariando os fins do processo, o costume pode auxiliar na interpretação e mesmo aplicação da norma processual. É o que se tem denominado de "praxe forense".
Fala-se em costume secundum legem (de acordo com a lei), extra legem (na ausência de lei) e contra legem (contra a lei). O último, segundo o direito moderno, é proibido.
1.6.5 Princípios gerais do direito
Os princípios gerais do direito são premissas éticas extraídas da legislação e do ordenamento jurídico em geral. São eles estabelecidos com a consciência ética do povo em determinada civilização, e podem suprir lacunas e omissões da lei, adaptados às circunstâncias do caso concreto. O Direito Processual Penal está sujeito às influências desses princípios, como os referentes à liberdade, à igualdade, ao direito natural etc. É o que estabelece expressamente, aliás, o artigo 3° do Código de Processo Penal, ao considerá-lo como fonte suplementar da lei processual.
1.6.6 Tratados, convenções e regras de direito internacional
Menciona o Código de Processo Penal, em seu artigo 1°, I, os tratados, convenções e regras de direito internacional. Os tratados são acordos assinados entre países em assuntos de natureza política, incluindo-se os da repressão aos ilícitos penais.
As convenções, de uma maneira geral, têm natureza privada. Por fim, as regras de direito internacional são os princípios induzidos das leis internas dos Estados civilizados ou inferidos de convenções internacionais ou afirmados na doutrina ou proclamados em congressos.
Pela nova Constituição Federal, compete privativamente ao Presidente da República celebrar tratados, convenções e atos internacionais, estando eles sujeitos a referendo do Congresso Nacional (art. 84, VIII). É da competência exclusiva do Congresso Nacional, "resolver definitivamente sobre tratados, acordos ou atos internacionais que acarretem encargos ou compromissos gravosos ao patrimônio nacional" (art. 49, I). Por fim, compete à União manter relações com Estados estrangeiros e participar de organizações internacionais (art. 21, I). Nos termos do artigo 102, do Regulamento da ONU, os tratados estão sujeitos a registro para terem vigência.
Como os tratados devem ser submetidos à deliberação do Congresso Nacional para vigirem como norma jurídica interna, a doutrina os tem considerado como fonte secundária do direito. O Código de Processo Penal, porém, lhes dá o mesmo valor que a lei, afastando esta quando o contraria. O Supremo Tribunal Federal, aliás, tem decidido que, no conflito entre a lei e o tratado há prevalência deste. (2) Segundo esta orientação, o tratado é fonte direta primária do Direito Processual Penal como dos demais ramos do direito.
* 2. RH 58.272, DJU 3-4-81, p. 2.854; HC 58.731, DJU 3-4-81, p. 2.854.
1.6.7 Analogia
A analogia é uma forma de auto-integração da lei. Na lacuna involuntária desta, aplica-se ao fato não regulado expressamente um dispositivo que disciplina hipótese semelhante. No entender de Bettiol consiste na extensão de uma norma jurídica de um caso previsto a um caso não previsto com fundamento na semelhança entre os dois casos, porque o princípio informador da norma que deve ser estendida abraça em si também o caso não expressamente nem implicitamente previsto. (3)
* 3. Cf. AQUINO, José Carlos O. Xavier. Aplicação analógica do artigo 28 do
Código de Processo Penal em conflito negativo de atribuições no processo civil. Justitia 100/111.
Fala-se em analogia legis e analogia iuris. A primeira verifica-se quando a própria norma legal tanto pode regular o fato por ela previsto quanto outro. A segunda quando o que se poderia aplicar extensivamente seriam os princípios jurídicos induzidos das normas particulares.
A analogia somente pode ser aplicada na lacuna involuntária da lei, não sendo cabível nas hipóteses em que a lei processual tem caráter inflexível, taxativo (2). É necessário ainda que haja real semelhança entre o caso previsto e não previsto, além de igualdade de valor jurídico e igualdade de razão entre ambos (ubi eadem ratio, ubi idem ius).
* 2. O STF não admitiu analogia na aplicação dos impedimentos referidos no artigo 252, III, do CPP, concernentes aos processos do Júri, aos de competência do juiz singular: RT 619/372.
No direito pátrio, o artigo 4° da LICC afirma que "quando a lei for omissa, o juiz decidirá o caso de acordo com a analogia, os costumes e os princípios gerais do direito" e o artigo 126 do CPC permite na lacuna ou obscuridade da lei que o juiz recorra à analogia, aos costumes e aos princípios gerais do direito. especificamente, o artigo 3° do Código de Processo Penal admite a aplicação analógica (3). Pode-se citar como exemplo do emprego da analogia, às vezes equivocadamente chamada de interpretação analógica, o cabimento do recurso em sentido estrito nas hipóteses de revogação da prisão preventiva e de concessão da liberdade provisória por analogia com o artigo 581, V, do CPP, na sua antiga redação, referente aos casos de indeferimento da prisão preventiva e relaxamento de prisão em flagrante (4). Por analogia com o artigo 296 e respectivos parágrafos do CPC, se tem permitido o direito do indiciado de oferecer contra-razões em recurso em sentido estrito interposto pelo Ministério Público de decisão em que se rejeita a denúncia. Também se permitiu a representação processual de pessoa jurídica por quem estava à frente dos negócios, sem apresentação dos respectivos estatutos, por analogia com a jurisprudência cível.
* 3. Sobre a existência de lacunas no direito: MARINHO, José Domingos da Silva. As chamadas "lacunas" do direito. Justitia 140/98-114. 4. Nesse sentido: STF: RTJ 114/388, RT 588/425, 592/411, 613/437, 626/404, 632/386; TJSP: RJTJSP 99/419, RT 551/332, 571/314, 611/347, 613/319, 629/326-7; TACrSP: RT 555/376, TJSC: RT 560/359. Contra, entendendo-se que a enumeração do artigo 581 é taxativa: TJSP: RT 551/349, 565/309, 570/312, 578/332, 612/301; TACrSP: RT 550/334, 553/381; TJMG: RT 540/351; TJPR: RT 547/396; TJRJ: RT 559/370. A discussão foi superada com a Lei n° 7.780, de 22-6-89, que deu nova redação ao dispositivo, permitindo o recurso em sentido estrito nas hipóteses questionadas.
2 
APLICAÇÃO DO DIREITO PROCESSUAL PENAL
2.1 A LEI PROCESSUAL NO TEMPO
2.1.1 Princípio do efeito imediato
Havendo possibilidade de iniciar-se um processo na vigência de determinada lei e sobrevir lei nova que o regule, surge o problema de dirimir o aparente conflito entre as duas regras jurídicas, a anterior e a posterior. De acordo com o artigo 2° do CPP, "a lei processual penal aplicar-se-á desde logo, sem prejuízo da validade dos atos realizados sob a vigência da lei anterior". Vige o princípio tempus regit actum, do qual derivam dois efeitos: a) os atos processuais realizados sob a égide da lei anterior se consideram válidos; b) as normas processuais têm aplicação imediata, regulando o desenrolar restante do processo (1). Estabeleceu-se na lei, portanto, o chamado princípio do efeito imediato ou princípio da aplicação imediata da lei processual penal. O fundamento lógico desse princípio é o de que a lei nova presumidamente é mais ágil, mais adequada aos fins do processo, mais técnica, mais receptiva das novas e avançadas correntes do pensamento jurídico.
* 1. Cf. TUCCI, Rogério Lauria. Persecução penal, prisão e liberdade.Saraiva, 1980. p. 9. Nesse sentido: STF: RTJ 93/94; RT 548/411.
O princípio do efeito imediato aplica-se também à matéria de competência, seja ela regulada por leis de processo, seja pelas normas de organização judiciária. Mesmo que a lei nova venha criar ou suprimir uma ordem de jurisdição, substituir juízes, modificar composição de tribunais etc., deve ser ela aplicada aos processos em curso.
2.1.2 Irretroatividade
Tem se afirmado, por vezes, que a lei nova processual não pode ser aplicada se for prejudicial ao réu em confronto com a lei anterior face ao princípio da irretroatividade da lei mais severa. A doutrina moderna tem rechaçado tal entendimento porque, na hipótese, não há retroatividade já que a lei vai ser aplicada aos atos processuais que ocorrerem a partir do início de sua vigência. A lei processual não está regulando o fato criminoso, esse sim anterior a ela, mas o processo a partir do momento em que ela passa a viger. Além disso, o princípio da irretroatividade da lei mais severa na Constituição Federal refere-se apenas à lei penal (art. 5°, XXXIX e XL).
A lei nova extrapenal, aliás, só não pode retroagir quando ocorrer direito adquirido, ato jurídico perfeito ou coisa julgada (art. 5°, XXXVI, da CF). Resumindo, a lei processual penal brasileira não é retroativa pois se aplica aos fatos processuais ocorridos durante a sua vigência, permitindo a Constituição Federal a retroatividade desde que não prejudique a coisa julgada. O autor do crime não tem o "direito adquirido" de ser julgado pela lei processual vigente ao tempo em que ele ocorreu mas apenas que a lei nova respeite as garantias constitucionais do devido processo legal, com os seus corolários explicitados na Carta Magna.
Não se pode negar, porém, que existem normas mistas, ou seja, que abrigam naturezas diversas, de caráter penal e de caráter processual. São normas penais as que versam sobre o crime, a pena, a medida de segurança, os efeitos da condenação e, de um modo geral, o jus puniendi (por exemplo; extinção da punibilidade). São normas processuais, as que regulam o processo desde o seu início até o final da execução ou extinção da punibilidade. Ora, se um preceito legal, embora processual, abriga uma regra penal, de direito material, aplica-se a ela os princípios que regem a lei penal, de ultratividade e retroatividade da lei mais benigna. Assim, embora as regras sobre ação penal e representação sejam leis processuais, como a falta de iniciativa da parte na ação privada e na ação pública dependente da representação pode acarretar a decadência, que é matéria penal ligada ao jus puniendi, não pode ser aplicada a lei nova que impede a extinção da punibilidade, por ser mais severa. Os fatos anteriores à lei nova, que agora prevê a apuração mediante ação penal pública incondicionada, só podem ser apurados mediante queixa ou representação, como dispunha a lei anterior, diante da ultratividade da lei mais benigna. Esse princípio não se aplica à requisição do Ministro da Justiça já que a ausência desta não causa a extinção da punibilidade.
É evidente, também, que uma nova lei processual penal pode acarretar maiores gravames para o autor do delito se, por exemplo, restringe o direito à liberdade provisória, exclui um recurso, aumenta as hipóteses de prisão preventiva, diminui os meios de defesa etc. Mesmo assim, aplica-se o princípio do efeito imediato previsto no artigo 2° do CPP, que não contraria, como já visto, as normas constitucionais. Nada impede, porém, que a lei nova ressalve a aplicação dessas regras aos processos pendentes ou aqueles que ainda não foram iniciados embora o crime tenha ocorrido na vigência da lei anterior. É o que ocorre na legislação de outros países (2).
* 2. É o que ocorre, por exemplo, na Colômbia, conforme JIMÉNEZ, Hernando Londoño Ob. cit. p. 46-50. Na Argentina, Carlos J. Rubianes prega a irretroatividade da lei processual mais severa por analogia com o artigo 2° do Código Penal (Manual de derecho procesal penal. 6. ed. Buenos Aires: Depalma, 1985. p. 96).
A aplicação da lei processual penal mais favorável, por exceção expressa, não é hipótese virgem na legislação brasileira. Dispondo sobre o confronto da lei anterior com o Código do Processo Penal vigente, a Lei de Introdução ao Código de Processo Penal (Decreto-lei n° 3.689, de 3 de outubro de 1941) determinou a aplicação dos dispositivos que fossem mais favoráveis ao autor da infração no referente à prisão preventiva e à fiança (art. 2°).
Tal dispositivo, segundo entendemos, continua em vigor, aplicando-se a todas as modificações introduzidas ao Código de Processo Penal de 1941 no relativo a tais matérias. Embora o citado decreto-lei visasse especialmente à transição da lei anterior para o Código de Processo Penal, não foi ele revogado, sendo ele aplicável, ao menos por analogia, às modificações do Estatuto. Essa sempre foi a orientação seguida pelo STF quanto a aplicação do artigo 13 da LICPP (1).
* 1. Nesse sentido: RTJ 85/786, 87/447 e 1067, 88/1082 e 1098, 90/451, 92/881, 90/881, 94/564, 95/758; RT 533/435, 537/415; Súmula 611.
2.1.3 Vigência e revogação
Em princípio, a lei, inclusive a processual, é elaborada para viger por tempo indeterminado. Após a promulgação, que é o ato governamental que declara a existência da lei e ordena a sua execução, é ela publicada. Ao período decorrente entre a publicação e a data em que começa a sua vigência, destinado a dar tempo ao conhecimento dela aos cidadãos, é dado o nome de vacatio legis. Esse período é de 45 dias quando a própria lei não dispõe de modo contrário e de três meses para a sua aplicação nos Estados Estrangeiros, quando esta é admitida (art. 1° e seu § 1°, da LICC).
Encerra-se a vigência da lei com a sua revogação, que pode ser expressa (quando declarada na lei revogadora) ou tácita (quando a lei posterior regulamenta a matéria disciplinada pela antiga). A revogação pode ser parcial, caso em que é denominada derrogação, ou total, quando é chamada de ab-rogação. Existe a auto-revogação quando cessa a situação de emergência na lei excepcional ou se esgota o prazo da lei temporária.
A lei nova pode, entretanto, dispor sobre o início de sua vigência, sem estar vinculada aos princípios gerais mencionados. O Código de Processo Penal (Decreto-Lei n° 3.689, de 3 de outubro de 1941), publicado em 13 e retificado em 24-10-41, entrou em vigor em 1° de janeiro de 1942. Nessa mesma data entrou em vigor a Lei de Introdução ao Código de Processo Penal (Decreto-Lei n° 3.931, de 11-12-1941), com dispositivos referentes à compatibilização da lei anterior com o novo Código, inclusive à aplicação da lei mais favorável no que diz respeito à prisão preventiva e à fiança (art. 2°). Quanto às leis extravagantes ou modificadoras do Código de Processo Penal, o legislador pátrio tem tido o mau vezo de determinar o início da vigência à data da publicação da lei, o que tem impedido o conhecimento prévio das novas normas aos aplicadores da lei.
2.1.4 Repristinação
Também de acordo com o artigo 2° da LICC, "salvo disposição em contrário, a lei revogada não se restaura por ter a lei revogadora perdido a vigência". Assim, o fenômeno da repristinação, pelo qual a lei revogada volta a viger quando a lei revogadora perdeu a vigência, só existe se a lei nova dispuser nesse sentido ou se, mesmo não o fazendo, da interpretação da nova lei se conclui que foi essa, implicitamente, sua intenção. Nessas hipóteses revigora-se a lei primitiva.
2.2 A LEI PROCESSUAL PENAL NO ESPAÇO
2.2.1 Conceito de território
Nos termos do artigo 1°, caput, do Código de Processo Penal, o processo penal é regido "em todo o território brasileiro" por esse estatuto, princípio que se aplica, salvo disposição em contrário, às leis processuais extravagantes. Em sentido estrito (material), o território abrange o solo (e subsolo) sem solução de continuidade e com limites reconhecidos, as águas interiores, o mar territorial, a plataforma continental e o espaço aéreo. O território por extensão (ou ficção) para os efeitos penais e processuais,conforme o disposto no artigo 5°, § 1°, do CP, abrange as embarcações e aeronaves brasileiras, de natureza pública ou a serviço do governo brasileiro, onde quer que se encontrem, bem como as aeronaves e as embarcações brasileiras, mercantes ou de propriedade privada, que se achem em alto mar ou no espaço aéreo correspondente (1).
* 1. A propósito do assunto discorremos em Manual de direito penal. 4. ed. São Paulo: Atlas, 1989. p. 76-79.
2.2.2 Aplicação da lei processual penal no espaço
Aplica-se a lei processual penal a todas as ações penais e correlatas que tiverem curso no território nacional e, nos termos dos artigos citados no item anterior, são regidos por ela todos os atos praticados inclusive no território por extensão.
Abrange ela, em primeiro lugar, os processos referentes aos crimes praticados no território brasileiro, sem prejuízo de convenções, tratados e regras de direito internacional (art. 5°, caput, do CP, e art. 1°, I, do CPP). Considera-se praticado no território brasileiro o crime cuja ação ou omissão, ou resultado, no todo ou em parte, ocorreu em território nacional (art. 6°, do CP). Adotou-se, no caso, a chamada teoria da ubiqüidade ou mista (2).
* 2. A respeito da aplicação da lei penal no espaço discorremos na ob. cit. p. 74-83.
Em segundo lugar, aplica-se também a lei processual brasileira aos crimes praticados fora do território nacional que estejam sujeitos à lei penal nacional, conforme o disposto no artigo 7° do CP. Entretanto, enquanto no direito penal se fala da extraterritorialidade, ou seja, da aplicação da lei brasileira a crimes cometidos fora do território nacional, a lei processual penal não ultrapassa os limites do território já que exprime um dos aspectos da soberania nacional, que não pode ser exercida senão dentro das fronteiras do Estado. Como afirma Fenech, a lei processual penal, como emanação da soberania do Estado, só pode ser aplicada nos limites do território em que este pode fazer valer sua vontade. Vige, portanto, nessa matéria o princípio da territorialidade da lei processual penal: o processo é regulado pelas normas do lugar onde se desenvolve.
Por último, aplica-se também a legislação processual brasileira aos atos referentes às relações jurisdicionais com autoridades estrangeiras que devem ser praticados em nosso país, tais como os de cumprimento de rogatória (arts. 783 e ss), homologação de sentença estrangeira (arts. 9° do CP e 787 e ss do CPP) e procedimento de extradição (arts. 76 e ss da Lei n° 6.815, de 19-8-1980 - Lei de Estrangeiros).
Pelo mesmo princípio de obediência à soberania, os atos referentes a processos penais que devem ser realizados no exterior devem obedecer à lei processual penal do país onde devem ser efetuados (princípio da lex fori).
A doutrina, porém, registra exceções aos princípios acima mencionados, referindo a possibilidade de casos de extraterritorialidade, ou seja, de aplicação da lei processual penal brasileira fora do território nacional. São as hipóteses de aplicação: a) em território nullius (onde não há soberania de qualquer país); b) em território estrangeiro, com autorização do respectivo Estado; c) em território ocupado, em caso de guerra.
Escapam à aplicação do Código de Processo Penal os processos referidos nas leis processuais extravagantes (item 1.6.3) e da legislação processual pátria os autores de infrações penais que possuem imunidades diplomáticas (item 2.3.1). Deve-se notar também que, embora a lei processual penal básica seja a proveniente do legislador federal, a CF possibilita a elaboração de leis processuais estaduais (item 1.6.2), inclusive as de organização judiciária dos Estados, que só podem vigir, evidentemente, nessas unidades da Federação.
2.3 A LEI PROCESSUAL PENAL EM RELAÇÃO ÀS PESSOAS
2.3.1 Considerações prévias
Em sentido geral, os limites da aplicação da lei processual penal em relação às pessoas são definidos pelos artigos 5° e 7° do Código Penal, que se referem aos crimes praticados no território nacional ou no estrangeiro, combinados com o artigo 1° do Código de Processo Penal, que prevê a aplicação do referido estatuto aos atos processuais praticados em todo o território brasileiro (itens 2.2.1 e 2.2.2). Em princípio, pois, as regras de processo penal aplicam-se a qualquer pessoa na hipótese de apuração de infração penal a que se aplique a lei penal brasileira e aos atos processuais a serem praticados no Brasil embora decorrentes de processo sobre infração penal submetida às leis estrangeiras.
Entretanto, a regra comporta exceções. O artigo 1°, I, do CPP, e o artigo 5°, do CP, ressalvam as convenções, tratados e regras de direito internacional, referindo-se precipuamente às imunidades diplomáticas, e o artigo 1°, II, do CPP, exclui da aplicação do Código de Processo Penal o Presidente da República, os ministros de Estado nos crimes conexos com os do presidente, e os ministros do Supremo Tribunal Federal, nos crimes de responsabilidade. A Constituição Federal refere-se também às chamadas imunidades parlamentares. Em todos os casos, os privilégios da imunidade não se referem à pessoa do autor do crime mas têm em vista a função exercida por ele, com o que não se viola o preceito constitucional da igualdade das pessoas perante a lei.
As Constituições Federal e estaduais prevêem, ainda, hipóteses de foro por prerrogativa de funções, que também podem ser consideradas, em sentido amplo, de imunidades.
2.3.2 Imunidades diplomáticas
Não se aplicam as leis processuais brasileiras nas hipóteses de imunidades diplomáticas, fundadas no respeito e consideração ao Estado que representam e na necessidade de cercar sua atividade de garantia para o perfeito desempenho de sua missão diplomática, um aspecto da soberania do Estado estrangeiro. Entende-se que os chefes de Estado e os representantes de governos estrangeiros estão excluídos da jurisdição criminal dos países em que exercem suas funções (1).
* 1. Cf. BRUNO, Aníbal. Direito penal. Rio de Janeiro: Forense, 1959. v. 1, p. 232.
É possível, porém, a renúncia à imunidade da jurisdição penal que, pela própria natureza do instituto, é da competência do Estado acreditante, e não do agente diplomático.
Fundamentalmente, a questão das imunidades está prevista na Convenção de Viena sobre relações diplomáticas, assinada a 18 de abril de 1961, aprovada pelo Decreto Legislativo n° 103, de 1964, e ratificada em 23 de fevereiro de 1965, e da Convenção de Viena sobre relações consulares, de 24 de abril de 1963, aprovada pelo Decreto Legislativo n° 6, de 1967, e ratificada em 20 de abril de 1967. Referem-se elas a qualquer delito e se estendem a todos os agentes diplomáticos (embaixador, secretários da embaixada, pessoal técnico e administrativo das representações), aos componentes da família deles e aos funcionários das organizações internacionais (ONU, OEA etc.) quando em serviço. Em caso de falecimento de um diplomata os membros de sua família "continuarão no gôzo dos privilégios e imunidades a que têm direito, até a expiração de um prazo razoável que lhes permita deixar o território do Estado acreditado” (2).
* 2. Art. 39, § 3°, da Convenção de Viena sobre relações diplomáticas.
Cobre também a imunidade o chefe de Estado estrangeiro que visita o país, bem como os membros de sua comitiva. Estão excluídos das imunidades referidas os empregados particulares dos agentes diplomáticos, ainda que da mesma nacionalidade destes, a não ser que o Estado acreditante as reconheça. Todavia, o Estado acreditado deverá exercer a sua jurisdição sobre tais pessoas de modo a não interferir demasiadamente com o desempenho das funções da missão diplomática (3).
* 3. Art. 37, § 4°, da Convenção de Viena sobre relações diplomáticas.
Os cônsules, agentes administrativos que representam interesses de pessoas físicas ou jurídicas estrangeiras, não gozam de ampla imunidade, a não ser na existência de tratado entre as nações interessadas. Não estão porém sujeitos à jurisdição das autoridades judiciárias e administrativas do Estado receptor pelos atosrealizados no exercício das funções consulares. Além disso, gozam de alguns privilégios a respeito da prisão preventiva (1).
* 1. Arts. 41 a 43 da Convenção de Viena sobre relações consulares. Pelas infrações praticadas no exercício de suas funções respondem perante as autoridades do País que os nomeou: STF: RTJ 63/65.
As sedes diplomáticas (embaixadas, sedes de organismos internacionais etc.) já não são consideradas extensão de território estrangeiro, embora sejam invioláveis como garantia aos representantes alienígenas. Nas citadas convenções assinala-se que "os locais das missões diplomáticas são invioláveis, não podendo ser objeto de busca, requisição, embargo ou medida de execução", ficando assegurada a proteção aos seus arquivos, documentos, correspondência etc., incluídos os dos funcionários consulares, por não pertencerem a estes, mas ao Estado a que eles servem. O Estado acreditante pode também renunciar a tais imunidades, mas o deve fazer expressamente. Os delitos cometidos nas representações diplomáticas são alcançados pela lei brasileira se praticados por pessoas que não gozem de imunidade, respeitando-se entretanto as imunidades no que diz respeito aos atos de investigação e do processo. A inviolabilidade dos diplomatas se estende à residência particular ou oficial dos protegidos.
2.3.3 Imunidades parlamentares materiais
As imunidades parlamentares compõem a "prerrogativa que assegura aos membros do Congresso a mais ampla liberdade de palavra, no exercício de suas funções, e os protege contra abusos e violações por parte dos outros Poderes constitucionais". Para que o Poder Legislativo, como um todo, e seus membros, individualmente, possam atuar com liberdade e independência, a Constituição outorga em favor dos congressistas algumas prerrogativas e, entre elas, as imunidades. Não há Poder Legislativo que possa representar, com fidelidade e coragem, os interesses do povo sem essa garantia constitucional. São duas as espécies: a de natureza material ou substantiva, denominada imunidade absoluta, e a de natureza formal ou processual, denominada imunidade relativa.
Quanto à natureza jurídica das imunidades absolutas, as posições são as mais controvertidas. São reproduzidos a seguir os esclarecimentos de Antonio Edying Caccuri: "Pontes de Miranda, Nelson Hungria e José Celso de Mello Filho entendem-na como uma causa excludente de crime e, semelhantemente, Basileu Garcia como causa que se opõe à formação do crime; Heleno Cláudio Fragoso considera-a causa pessoal de exclusão de pena; Damásio de Jesus, causa funcional de exclusão ou isenção de pena; Aníbal Bruno, causa de exclusão de criminalidade; Magalhães Noronha, causa de irresponsabilidade; José Frederico Marques, causa de incapacidade penal por razões políticas. Conclui o citado autor, aliás, que se trata de "causa impeditiva de aplicação da lei (ou causa paralisadora da eficácia da lei, relativamente aos congressistas, em razão de suas funções)".
Após inúmeras modificações nos textos constitucionais do país, a Constituição Federal de 1988 assegura aos parlamentares (deputados e senadores), de forma ampla e irrestrita, a imunidade absoluta (penal, civil, disciplinar e política) no artigo 53, caput: "Os Deputados e Senadores são invioláveis por suas opiniões, palavras e votos". Essa inviolabilidade na manifestação de pensamento tem sido considerada elementar no regime representativo e inerente ao exercício do mandato (2).
* 2. Nesse sentido: FRAGOSO, Heleno C. e HUNGRIA, Nelson. Comentários ao código penal. 5. ed. Rio de Janeiro: Forense, 1977. v. 1, tomo I, p. 253.
Ao contrário do preceito constitucional anterior, não é necessário que, por ocasião do fato, o congressista se encontre no exercício de suas funções legislativas no momento do fato criminoso ou que a manifestação constitutiva do ilícito penal verse sobre matéria parlamentar. Entretanto, segundo o Supremo Tribunal Federal, mesmo não fazendo o dispositivo referência expressa ao exercício das funções legislativas, não se dispensa a existência de um nexo entre a manifestação do pensamento do congressista e sua condição (3).
 Inexistente mínima relação entre a manifestação do parlamentar e as funções do congressista inexiste a imunidade absoluta. De outro lado, havendo tal correlação, a imunidade absoluta, nos novos termos constitucionais, estende-se a todos os crimes de opinião, também chamados de "crime da palavra", não respondendo os parlamentares por delitos contra a honra, de incitação ao crime, de apologia de crime ou criminoso etc., previstos no Código Penal, bem como pelos ilícitos definidos na Lei de Imprensa, na Lei de Segurança Nacional ou em qualquer outra lei especial (4).
* 3. Nesse sentido: RT 648/318, JTJ 182/340.
4. Hungria exclui alguns delitos, citando como exemplos a traição ao mandato e o crime praticado em detrimento de interesse nacional (ob. cit. p. 188). Fragoso, porém, assegura que a inviolabilidade subsiste em qualquer caso de crime contra a segurança nacional, mesmo quando se tratar da chamada ofensa subversiva (ob. cit. p. 134).
Sendo inerente ao mandato, a imunidade parlamentar absoluta é irrenunciável, não se podendo instaurar inquérito policial ou ação penal mesmo que o parlamentar os autorize. Trata-se de instituto que visa preservar não a pessoa do parlamentar, mas o próprio regime representativo, possibilitando a atuação livre e independente do Parlamento.
Não se exigindo agora que o fato ocorra no exercício do mandato, não perde a imunidade o deputado ou senador que estiver afastado das funções legislativas por ter sido nomeado Ministro de Estado, por estar licenciado etc. A imunidade parlamentar, porém, não se estende ao co-autor do ilícito que não goze dessa prerrogativa, como deixa claro a Súmula 245 do STF.
O período coberto pela imunidade absoluta inicia-se com a diplomação do deputado ou senador, já que este é o termo inicial previsto na Constituição Federal, expressamente, para as imunidades relativas (art. 53, § 1°), e se encerra com o término do mandato. Mesmo após o término ou perda do mandato, o deputado ou senador não poderá ser processado pelo fato constitutivo de crime de opinião praticado por ele durante o período de imunidade.
Os deputados estaduais também devem gozar da imunidade parlamentar e das prerrogativas que lhes têm sido reconhecidas pelas diversas Constituições dos Estados-membros desde a Proclamação da República. Os Estados-membros devem, obrigatoriamente, incluir tais garantias na sua organização porque a Carta Magna impõe, sob pena de intervenção federal, a observância do sistema representativo e do princípio de independência a harmonia dos Poderes (1). De qualquer forma, as imunidades dos deputados federais pela nova Constituição Federal são automaticamente deferidas aos deputados estaduais, já que preconiza o artigo 27, § 1°, da nova Carta, que se lhes aplicam as regras da Constituição Federal referentes às imunidades. As Constituições dos Estados, porém, devem prever expressamente tais imunidades, nos exatos termos da Carta Federal.
* 1. CACCURI, Antonio Edying. Ob. cit. p. 300. No mesmo sentido, BAPTISTA, Cleômenes Mário Dias. As imunidades parlamentares. RT 662/276. 
Os vereadores, que haviam perdido a imunidade absoluta a partir de 1964, a readquiriram. Nos termos da Carta Magna, são eles invioláveis por suas opiniões, palavras e votos, mas apenas quando o crime for praticado no exercício do mandato e na Circunscrição do Município (art. 29, VIII). Assim, a inviolabilidade pessoal do vereador por opiniões, palavras e votos no exercício do mandato está relacionada com a atividade profissional do agente, tratando de causa pública, no interesse coletivo. De outro lado, não ocorre a imunidade quando o edil age motivado pelo interesse exclusivo ou quando foge aos limites razoáveis das funções inerentes ao cargo que ocupa (4). Mas não importa que, no exercício do mandato, a ofensa atinja pessoa não política, já que não há qualquer restrição a esse respeito no dispositivo constitucional (5). Estandono exercício específico do mandato e na circunscrição do município, a opinião do vereador é inviolável mesmo quando emite, na tribuna, um juízo de valor sobre fatos ou coisas (6). A imunidade permanece ainda que reafirme sua opinião em depoimento prestado em Juízo (7). Sendo, porém, restrita ao âmbito de seus municípios, a inviolabilidade dos vereadores não abrange as declarações prestadas em emissora de radiodifusão, cujo alcance é indeterminado (8). A Constituição Federal, além disso, não assegurou ao vereador a garantia da imunidade parlamentar formal. Os membros do Poder Legislativo dos Municípios, nos casos em que não há imunidade material, podem ser submetidos a processo penal, independentemente de prévia licença da Câmara de Vereadores a que pertencem (9).
* 4. Nesse sentido: JTAERGS 88/140, RT 727/515 e 586. 
5. Nesse sentido: NASCIMENTO, Antonio Benedito; VALÉRIO, Eduardo Ferreira. Da inviolabilidade dos vereadores na Constituição de 1988. RT 701/261-266
6. Nesse sentido: RT 733/585.
7. Nesse sentido: RT 728/504
8. Nesse sentido: J. Cat. 69/473.
9. Nesse sentido: STF: RT 707/394; STJ: RSTJ57/427. Face à limitação constitucional, têm decidido nossos tribunais que a verificação da inviolabilidade do vereador implica exame de provas de modo que se possa concluir se adstritas ao exercício do mandato e na circunscrição municipal, o que veda seja reconhecida pela via sumária do habeas corpus (10).
* 10. Nesse sentido: STF: RT 648/336, 660/347; TACrSP: RT 664/281.
A regra que concede a imunidade absoluta aos parlamentares na Constituição é lei penal mais benigna e, por força da própria Carta Magna, tem efeito retroativo, constituindo-se em hipótese de abolitio criminis (1).
* 1. Nesse sentido: RT 648/309; MÉDICE, Sérgio de Oliveira. Imunidades parlamentares. RT 666/403-4.
Dispõe o artigo 133 da Constituição Federal que o advogado é "inviolável por seus atos e manifestações no exercício da profissão, nos limites da lei". Tal inviolabilidade, porém, não se confunde com a conferida aos parlamentares e não se elide a responsabilidade penal do advogado por crime cometido no exercício da profissão, tanto que é ela condicionada aos "limites da lei" (2). Assim, o profissional tem direito apenas à imunidade judiciária quando comete injúria ou difamação "na discussão da causa" (art. 142, I, do Código Penal). O Estatuto da Advocacia (Lei n° 8.906, de 4-7-1994) ampliou a imunidade, não a limitando ao Juízo e protegendo o autor de desacato. Nesta parte, porém, o dispositivo foi suspenso pelo STF em medida liminar de ação direta de inconstitucionalidade.
* 2. Nesse sentido: RT 652/289 e 346, 653/351: JSTJ 8/141.
2.3.4 Imunidades parlamentares processuais
As imunidades parlamentares processuais, ou relativas, são as que se referem à prisão, ao processo, às prerrogativas de foro e para servir como testemunha, embora somente as duas primeiras sejam incluídas na noção de imunidade em sentido estrito. Quanto à primeira hipótese, prevê o artigo 53, § 1°, 1ª parte, da CF, que "desde a expedição do diploma, os membros do Congresso Nacional não poderão ser presos, salvo em flagrante de crime inafiançável", e o § 3° do mesmo artigo assinala que "no caso de flagrante de crime inafiançável, os autos serão remetidos, dentro de vinte e quatro horas, à Casa respectiva, para que, pelo voto secreto da maioria de seus membros, resolva sobre a prisão e autorize, ou não, a formação da culpa". Nunca pode ocorrer, portanto, a prisão e a autuação em flagrante delito se o parlamentar tiver praticado crime afiançável. Sendo o delito inafiançável, deve ser efetuada a prisão e lavrado o auto, comunicando a autoridade policial os fatos à Câmara ou ao Senado, conforme o caso, que, por maioria absoluta e em votação secreta, poderá determinar a soltura e, ainda, impedir que se instaure posteriormente a ação penal.
Quanto ao processo, a imunidade processual que, na Constituição anterior era apenas um caso de sustação do processo, voltou com a nova Carta a se constituir em prévia licença por parte das Casas Legislativas para a instauração da ação penal contra o parlamentar. Dispõe o artigo 53, § 1°, segunda parte, que, desde a expedição do diploma, os membros do Congresso Nacional não poderão ser processados criminalmente sem prévia licença de sua Casa. Como o processo penal se instaura com o recebimento da denúncia ou da queixa, nada impede a instauração do inquérito policial e o oferecimento da denúncia por parte do Procurador Geral da República ou da queixa pelo ofendido, mas a inicial somente poderá ser recebida se e quando for concedida a licença pela Câmara ou Senado.
O dispositivo constitucional veda o processo criminal sem licença ainda que o fato tenha ocorrido quando o autor não era deputado ou senador. Caso a ação penal se tenha iniciado antes da expedição do diploma, o processo criminal deve ficar sustado até que seja pedida e concedida a licença da Casa Legislativa. Revendo posição anterior, o STF passou a entender que, na hipótese de ser concedida a licença, são válidos os atos anteriormente praticados, inclusive a denúncia, na ação penal cujo réu se tornou parlamentar no curso do processo (1).
* Ag. Reg. em Inq. n° 492-4-MG-DJU de 25-9-93, p. 10.382. 
A imunidade processual refere-se à prática pelo parlamentar de crimes comuns. Numa interpretação lógica do artigo 53 da CF, crimes comuns são todos os não abrangidos pela imunidade absoluta (crimes de opinião), inclusive os definidos em leis penais especiais. Não se trata de opor aqui a espécie de crimes comuns aos de responsabilidade referidos no artigo 85 ou aos crimes políticos. Os membros do Congresso estão protegidos pela imunidade absoluta nos crimes de opinião e pela imunidade processual nos demais.
A imunidade parlamentar visa assegurar o livre exercício das funções públicas dos deputados e senadores, mas não deve conceder aos representantes do povo uma impunidade assegurada por seus pares. Por essa razão, se prevê que "o indeferimento do pedido de licença ou a ausência de deliberação suspende a prescrição enquanto durar o mandato" (art. 53, § 2°, da CF). Extinto o mandato do autor do crime comum, recomeça a correr o prazo prescricional, não mais se necessitando da licença para a instauração ou prosseguimento do processo.
As imunidades absoluta e relativa dos deputados e senadores subsistirão durante o estado de sítio, só podendo ser suspensas mediante o voto de dois terços dos membros da Câmara respectiva, nos casos de atos praticados fora do recinto do Congresso e que sejam incompatíveis com a execução da medida. Nas demais hipóteses, ou seja, de qualquer crime praticado no recinto do Congresso ou que não sejam incompatíveis com o estado de sítio ainda que praticados fora dele, são asseguradas as imunidades parlamentares (art. 53, § 7°). Também se estendem aos deputados estaduais as imunidades processuais referidas anteriormente, por força do artigo 27, § 1°, da CF (item 2.3.3). Os vereadores não são beneficiários das imunidades com relação à prisão e ao processo por falta de apoio constitucional. Não podem prevê-la as constituições estaduais ou as leis orgânicas dos municípios por se tratar de matérias penal e processual, que só devem ser objeto de lei estadual nos casos especificados na Carta Magna Federal (item 1.6.2).
2.3.5 Prerrogativa de função
Entre as imunidades relativas, em seu sentido amplo, estão as referentes ao foro por prerrogativa de função, consistentes no direito de determinadas pessoas de serem julgadas, em virtude dos cargos ou funções que exercem, pelos Órgãos Superiores da Jurisdição, em competência atribuída pela Constituição Federal ou constituições estaduais.
Não se viola o princípio da igualdade entre as pessoas e não se concede foro privilegiado, vedado constitucionalmente, mas dá-se tratamento especial não à pessoa mas ao cargo ou função que exerce, de especial relevância para o Estado.
Ao contrário do que ocorre nas monarquias constitucionais, em que os soberanos são invioláveis pelas infrações penais, os chefes deEstado ou Presidentes da República não gozam da imunidade absoluta, outorgando-se-lhes apenas prerrogativas de função.
No Brasil, o Presidente da República, após licença da Câmara Federal pelo voto de dois terços, será julgado pelo STF nos crimes comuns (art. 102, I, b, da CF), e pelo Senado Federal nos delitos de responsabilidade (art. 86, da CF). Os crimes de responsabilidade são os previstos no artigo 85 e incisos da CF, mas deverão estar definidos em lei, conforme dispõe o parágrafo único desse artigo.
A Lei n° 1.079, de 10-4-1950, define os crimes de responsabilidade Do Presidente da República, dos Ministros de Estado, dos Ministros do Supremo Tribunal Federal, do Procurador-Geral da República, dos Governadores e Secretários de Estado e regula o respectivo processo de julgamento. Não tendo sido elaborada nova lei do impeachment, esse diploma legal, recepcionado pela Constituição Federal de 1988, está em vigor no que não colide com a Carta Magna. Afirma Tourinho que, diante do art. 129, I, da CF, cabe ao Ministério Público, tanto nos crimes comuns como nos de responsabilidade, proceder a acusação. Quanto a estes, entretanto, seguindo-se os arts. 41 e seguintes da Lei n° 1.079/50, no processo de impeachment de ex-Presidente, a acusação ficou a cargo dos denunciantes. Quanto à acusação no crime comum, caberá esta ao Procurador-Geral da República.
Compete também ao STF julgar originariamente, por crimes comuns, o Vice-presidente e o Procurador-Geral da República, e, por crimes comuns e de responsabilidade os Ministros de Estado (exceptuados os conexos com os do Presidente ou Vice-presidente da República, para os quais é competente o Senado Federal), os membros dos Tribunais Superiores, os do Tribunal de Contas da União e os Chefes de missão diplomática de caráter permanente (art. 102, I, c, da CF). Compete ao Superior Tribunal de Justiça processar e julgar originariamente: "nos crimes comuns, os Governadores dos Estados e do Distrito Federal, e, nestes e nos de responsabilidade, os desembargadores dos Tribunais de Justiça e do Distrito Federal, os membros dos Tribunais Federais, dos Tribunais Regionais Eleitorais e do Trabalho, os membros dos Conselhos ou Tribunais de Contas dos Municípios e os do Ministério Público da União que oficiem perante tribunais" (art. 105, I, a).
Quando aos Governadores, em similitude com o que se prevê na Constituição Federal para o Presidente da República, a ação penal está submetida à prévia apreciação e licença da Assembléia Legislativa do Estado, conforme devem dispor as Constituições estaduais. Além disso, como sempre, a imunidade aplica-se aos processos em andamento, devendo ser remetidos ao Superior Tribunal de Justiça os processos em curso nos Tribunais de Justiça quando do advento da nova Carta Magna.
Os Vice-governadores não têm foro por prerrogativa de função na Constituição Federal, devendo as Constituições dos Estados fixarem para eles, pela dignidade do cargo, a competência do Tribunal de Justiça do Estado. Compete aos Tribunais Regionais Federais processar e julgar, originariamente, "os juízes federais da área de sua jurisdição, incluídos os da Justiça Militar e da Justiça do Trabalho, nos crimes comuns e de responsabilidade, e os membros de Ministério Público da União, ressalvada a competência da Justiça Eleitoral" (art. 108, I, a).
A Constituição Federal confere ainda aos membros do Congresso Nacional a prerrogativa de serem julgados pelo Supremo Tribunal Federal (arts. 53, § 4°, e 102, I, b) (2). A competência do Pretório Excelso existe ainda que o crime tenha sido praticado anteriormente à eleição do agente, já que a prerrogativa tem natureza objetiva, perdurando enquanto o parlamentar detiver o mandato. Essa prerrogativa remete a competência ao STF para apreciar qualquer crime praticado pelos parlamentares, após a prévia licença da Casa Legislativa, incluindo-se os crimes eleitorais, que também são crimes comuns com relação às imunidades, e aqueles praticados fora das atividades parlamentares. Também aos deputados estaduais é concedido o foro por prerrogativa de função, conforme disponham as constituições estaduais, sendo tradicional que se atribua a competência ao Tribunal de Justiça.
* 2. Ao STF, portanto, deve ser dirigido o pedido de habeas corpus quando se tratar de crime praticado por deputado federal ou senador; RT 652/378.
Adquiriram também o foro por prerrogativa de função os prefeitos municipais, que devem ser julgados originariamente pelo Tribunal de Justiça dos Estados (art. 29, X).
Não limitando a Constituição Federal o alcance do art. 29, X, compete ao Tribunal de Justiça não só o julgamento dos crimes comuns como dos de responsabilidade, previstos no Decreto-lei n° 201/67, e ainda que cometidos antes da investidura no cargo (6). Quanto aos crimes de responsabilidade funcional, se a ação penal foi instaurada antes de expirado o mandato, a posterior cessão da investidura não obsta o seu prosseguimento. Não detêm os vereadores, entretanto, as demais imunidades absolutas ou relativas (item 2.3.3).
* 6. Nesse sentido: RT 668/308. Contra, STJ: RMS 1.981-0-AM-DJU de 21-3-94, p. 5.440.
As imunidades referentes ao foro por prerrogativa de função concedidas aos deputados estaduais e quaisquer outras no âmbito estadual são válidas apenas em relação às autoridades judiciárias locais, não podendo ser invocadas em face do Poder Judiciário Federal (8). Nesse sentido a Súmula 3 do STF: "A imunidade concedida a Deputado Estadual é restrita à Justiça do Estado-membro". Assim, nos crimes eleitorais, a competência originária é do TRE, nos crimes contra as instituições militares a competência é dos Conselhos de Justiça de primeira instância, e nas infrações penais em detrimento de bens, serviços ou interesse da União do TRF.
* 8. MELLO FILHO, José Celso de. Imunidades dos deputados estaduais. Justitia 114/167
A competência por prerrogativa de função concedida pela Constituição Federal prevalece sobre a competência do Júri quanto aos crimes dolosos contra a vida pela exceção criada pela própria Carta. O contrário ocorre quando a imunidade é concedida por outra norma jurídica, federal ou estadual, já que esta não pode contrariar a lei básica do país.
2.3.6 Imunidade para servir de testemunha
De acordo com a Convenção de Viena sobre relações diplomáticas, "o agente diplomático não é obrigado a prestar depoimento como testemunha" (art. 31, § 2°). Os agentes consulares são obrigados a depor, exceto sobre fatos relacionados com o exercício de suas funções (art. 44, 1 e 3., da Convenção de Viena sobre relações consulares). Dispõe também o art. 53, § 5°, da CF, que "os deputados e senadores não serão obrigados a testemunhar sobre informações recebidas ou prestadas em razão do exercício do mandato, nem sobre as pessoas que lhes confiaram ou deles receberam informações". Quanto ao mais, porém, os congressistas deverão prestar depoimento, praticando crimes de desobediência se se recusarem a prestá-los, ou de falso testemunho se calarem ou falsearem a verdade (art. 342 do CP). Essa prerrogativa deve ser estendida aos deputados estaduais.
2.4 INTERPRETAÇÃO DA LEI PROCESSUAL PENAL
2.4.1 Conceito
Ao menos para se alcançar o sentido léxico das palavras utilizadas pelo legislador, a interpretação da lei é indispensável. A interpretação é o processo lógico que procura estabelecer a vontade da lei, que não é, necessariamente, a vontade do legislador. A lei deve ser considerada como entidade objetiva e independente e a intenção do legislador só deve ser aproveitada como auxílio ao intérprete para desvendar o verdadeiro sentido da norma jurídica. Interpretar é descobrir o verdadeiro conteúdo da norma jurídica, precedendo sempre à aplicação, processo pelo qual se submete o caso concreto à norma geral.
Na interpretação da lei, deve-se atender "aos fins sociais a que ela se dirige e às exigências do bem comum" (art. 5° da LICC). Deve-se, porém, ter em vista na interpretação da lei processual penal que a tutela da liberdade individual está compreendida nosimperativos do bem comum e que o fim da pena é promover a integração social do condenado (art. 1° da LEP).
A ciência ou método que se preocupa com a interpretação da lei é denominado Hermenêutica, cujos princípios aplicam-se a todos os ramos do direito e, portanto, à lei processual penal.
A analogia, os costumes e os princípios gerais do direito não se constituem em interpretação da lei mas em fontes do direito processual penal (itens 1.6.1. a 1.6.5).
2.4.2 Espécies de interpretação
Quanto ao sujeito que realiza a interpretação, pode ser ela autêntica, jurisprudencial (ou judicial) e doutrinária (ou doutrinal). A interpretação autêntica é a que procede da mesma origem que a lei e tem força obrigatória. Quando vem inserida na própria legislação, é chamada contextual. É o caso, por exemplo, do conceito de "flagrante delito", estabelecido pelos artigos 302 e 303 do Código de Processo Penal. A interpretação, porém, pode ser promovida por lei posterior, elaborada para esclarecer o sentido duvidoso de uma lei já em vigor.
A jurisprudência pode ser conceituada como conjunto de manifestações judiciais sobre determinado assunto legal, exaradas num sentido razoavelmente constante. A interpretação jurisprudencial é, assim, a orientação que os juízos e tribunais vêm dando à norma, sem, entretanto, ter força vinculativa. Podem ser incluídas como interpretação jurisprudencial as súmulas do STF e do STJ e as decisões de uniformização de jurisprudência dos tribunais.
Por fim, a interpretação pode ser doutrinária, quando constituída da communis opinio doctorum, ou seja, do entendimento dado aos dispositivos legais pelos escritores ou comentadores do direito. Também não tem, evidentemente, força obrigatória. Relativamente ao meio empregado, a interpretação pode ser gramatical (ou literal), lógica e teleológica. Na primeira, procura-se fixar o sentido das palavras ou expressões empregadas pelo legislador. Examina-se a "letra da lei", em sua função gramatical, quanto ao seu significado no vernáculo. Se este for insuficiente, é necessário que se busque a vontadeda lei, o seu conteúdo, através de um confronto lógico entre os seus dispositivos. Assim, a palavra "autoridade" utilizada no artigo 10, §§ 1°, 2° e 3°, do CPP, significa "autoridade policial", conforme dispõem os artigos 4°, caput, 6° etc. do mesmo Estatuto. A palavra "queixa" (arts. 41, 12 etc. do CPP) deve ser interpretada como a "peça inicial da ação penal privada", e não como simples ato de queixar-se, seu conceito vulgar. Mas, a par dessa lógica formal (logos do racional), há que se falar da lógica do razoável a que se refere Recasèns Siches, que apresenta certas características referentes à lógica (logos) do humano que: está condicionado pela realidade concreta do mundo social-histórico e particular no qual, com o qual e para o qual se elaboram as normas jurídicas; está impregnado de valorações, de critérios estimativos ou axiológicos referidos a uma determinada situação humana real, e que constituem a base para uma formulação de finalidades; é regido por razões de congruência ou adequação entre a realidade social e valores, entre valores e fins, entre fins e realidade social concreta, entre fins e meios, quanto à conveniência dos meios para os fins, entre os fins e os meios em vista da correção ética dos meios; entre fins e meios naquilo que se refere à eficácia dos meios etc.
Como bem resume Elcio de Cresci Sobrinho, a interpretação das normas jurídicas, inclusive das que parecem mais claras e mais completas, requer referência a princípios axiológicos, a critérios valorativos que muitas vezes não estão expressos no texto da lei.
Os termos de uma norma jurídica devem ser interpretados em função do propósito para o qual foi emitida e sempre em relação com o sentido e o alcance dos fatos particulares, em questão, referidos àquela finalidade da norma (1). Há pois que se indagar, por vezes, do sentido teleológico da lei, com vista na apuração do valor e finalidade do dispositivo.
* 1. O juiz criador do direito e a interpretação razoável. Ajuris, 50/29.
Quanto aos resultados obtidos com a interpretação, pode ser ela declarativa, restritiva e extensiva. Embora o Código de Processo Penal somente se refira à última, é evidente a possibilidade da interpretação declarativa ou restritiva, comum a todos os ramos do direito.
A interpretação declarativa ocorre quando o texto examinado não é ampliado nem restringido, encontrando-se apenas o significado oculto do termo ou expressão utilizada pela lei. Quando a lei processual se refere a "casa habitada" (art. 248) evidentemente está se referindo a ser ela ocupada por uma ou mais pessoas, numa interpretação meramente declarativa. A interpretação pode ser restritiva quando se reduz o alcance da lei para que se possa encontrar a sua exata vontade. Quando a lei prevê a nulidade pela falta de"intervenção do Ministério Público em todos os termos da ação por ele intentada e nos daintentada pela parte ofendida, quando se tratar de crime de ação pública" (art. 564, III, d, do CPP), deve-se entender que ela só ocorrerá se for alegada no momento oportuno, diante do que dispõe o artigo 572.
A interpretação extensiva, referida expressamente pelo artigo 3° do CPP, ocorre quando é necessário ampliar o sentido ou alcance da lei. Já se entendeu, por exemplo, que, embora o artigo 475 do CPP se refira expressamente a documento, o dispositivo abrange também alegação da defesa em plenário sobre autos ou papéis que não constavam do processo. Embora a renúncia "expressa" deva constar de declaração assinada pelo ofendido (art. 50 de CPP), a interpretação extensiva obriga a ser considerada como também "expressa" a renúncia produzida oralmente, já que a lei admite, inclusive, a renúncia tácita.
Fala-se, ainda, em interpretação progressiva para se abarcarem no processo novas concepções ditadas pelas transformações sociais, científicas, jurídicas ou morais que devem permear a lei processual estabelecida. Pela evolução legislativa do país o "Tribunal de Apelação" pode ser o Tribunal de Justiça ou Tribunal de Alçada, conforme disponha a lei estadual, o "Chefe de Polícia" é o Secretário de Segurança Pública etc.
Por fim, referem-se os doutrinadores à interpretação analógica. Quando fórmulas casuísticas inscritas em um dispositivo são seguidas de expressões genéricas, abertas, utiliza-se a semelhança (analogia) para uma correta interpretação destas últimas. Quando a lei se refere a "quaisquer outros elementos" no artigo 6°, IX, do CPP, está mencionando outros dados referentes à "vida pregressa do indiciado". Quando menciona "repartição congênere", refere-se a órgãos que atuem com o objetivo de identificação e estatística.
Quando contém a expressão "fato análogo", como no artigo 254, inclui no rol crimes previstos no mesmo capítulo da lei penal. Não se confunde a interpretação analógica, que é a busca da vontade da norma através da semelhança com fórmulas usadas pelo legislador, com a analogia, que é forma de auto-integração da lei com a aplicação a um fato não regulado por esta de uma norma que disciplina ocorrência semelhante (item 1.6.7). Muito útil à interpretação é o elemento sistemático, quando se procura a interpretação para harmonizar o texto interpretado com o contexto da lei, elaborada, ao menos em tese, em um sistema lógico. O parágrafo de um dispositivo, por exemplo, deve ser sempre analisado tendo-se em vista o caput do artigo e este de acordo com o capítulo a que pertence. Assim, por exemplo, a incomunicabilidade no processo prevista no parágrafo único do artigo 21, só pode ser decretada pelo juiz quando o interesse da sociedade ou a conveniência da investigação o exigir, condição estabelecida pelo caput do citado dispositivo.

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