Prévia do material em texto
Thais Alves Fagundes DOENÇAS INFECCIOSAS, DEGENERATIVAS E INTOXICAÇÕES DO SNC DOENÇAS INFECCIOSAS CONCEITOS GERAIS Mecanismos de defesa: Encéfalo e a medula espinhal são protegidos pelos ossos cranianos, coluna vertebral, meninges e barreira hematoencefálica. Mecanismos de defesa externos que impedem agentes infecciosos de chegar ao SNC. Quando essas barreiras são ultrapassadas, os meios de defesa do SNC são pouco eficazes para controlar a infecção. o Baixos níveis de complemento e imunoglobulina no líquor. o Circulação do líquor leva o agente infeccioso para sítios distintos. Infecções oportunistas do SNC são frequentes em pacientes imunossuprimidos Mecanismos de infecção: Disseminação hematogênica Implantação direta (trauma, cirurgia, malformações congênitas) Extensão local por infecção em estruturas adjacentes (seios da face, dentes, vértebras) Acesso pelo sistema nervoso periférico (herpes-zoster, raiva) Nomenclatura da infecção de acordo com o sítio anatômico: Meningite: meninges Encefalite: parênquima cerebral Mielite: medula o Meningoencefalite: meninges e parênquima cerebral o Encefalomielite: parênquima cerebral e medula Aguda Crônica MENINGITE AGUDA MENINGITE BACTERIANA AGUDA (LEPTOMENINGITE PURULENTA) Conceito: infecção bacteriana produtora de pus, nas leptomeninges (aracnoide e pia-máter). Epidemiologia e etiologia: Agentes etiológicos relacionados aos diferentes pacientes: Recém-nascidos: Streptococcus grupo B; E. coli; Listeria (bactérias do trato vaginal, que infectam durante o parto). 2 a 20 anos: Neisseria meningitidis. Adultos: Streptococcus pneumoniae; Neisseria meningitidis. Crianças e adultos não vacinados: H. influenzae (diminui cada vez mais, devido à vacinação). Idosos, grávidas, imunocomprometidos: Listeria. Pós procedimentos neurocirúrgicos: Staphylococcus aureus e estafilococos coagulase-negativos. Conduta: emergência médica. Instituir tratamento empírico para agentes mais comuns. Antibioticoterapia de amplo espectro, limitado o espectro após a confirmação do agente etiológico. Diagnóstico: anamnese, exame físico Hemocultura (via hematogênica de disseminação) Neuroimagem (se necessário, sendo pouco específico) Punção lombar (celularidade, bioquímica, exame direto - gram - e cultura) Características do líquor: Pleocitose (100- 10 000/mm3), com predomínio inicial de polimorfonucleares / neutrófilos (80%). Nível de proteína elevada (> 100mg/dl). Glicose reduzida (≤ 40mg/dl) - correlacionar com a glicemia. Consumo de glicose pelo agente infeccioso. Gram: revela o agente em 60 a 80% dos casos (pneumococo: diplococos G+) (meningococo: cocos ou diplococos G-) (estafilo: cocos G+ em cacho). Outros: cultura com antibiograma, PCR Thais Alves Fagundes Macroscopia: Exsudato purulento, entre a pia-máter e a aracnoide (na base do encéfalo, no espaço subaracnóideo). Hiperemia de vasos meníngeos. Microscopia: Infiltrado neutrofílico / polimorfonucleares. Aumento da celularidade. Congestão vascular dos vasos meníngeos. MENINGOENCEFALITE BACTERIANA CRÔNICA (MENINGITE TUBERCULOSA) Conceito: infecção das meninges por bacilo. Epidemiologia: Forma mais comum de neurotuberculose e uma das mais graves complicações da tuberculose primária. Mais frequente em crianças abaixo dos 5 anos e em pacientes imunossuprimidos. Quadro clínico: cefaleia, confusão mental, vômito Macroscopia: exsudato fibrinoso denso esbranquiçado aderido à base do encéfalo (exsudato não é purulento). Microscopia: achados clássicos de tuberculose Granuloma epitelióide Necrose caseosa Identificação do bacilo em coloração específica. MENINGITE CRÔNICA MENINGOENCEFALITE VIRAL Conceito: infecção parenquimatosa do cérebro e das meninges por diversos tipos de vírus. Epidemiologia: importante causa de infecção oportunista em indivíduos imunossuprimidos. Vias de penetração dos vírus no SNC: hematogênica e neural (via fluxo axonal - infecção periférica e migração). Agentes infecciosos: vírus da raiva, vírus da poliomielite, vírus herpes simples, vírus varicela-zóster, citomegalovírus. Microscopia: efeito citopático viral Inclusões nucleares difusas (herpes simples). Aumento de volume, aumento nuclear e binucleação (citomegalovírus) Thais Alves Fagundes INFECÇÕES SUPURATIVAS FOCAIS AGUDAS ABSCESSO CEREBRAL Conceito: necrose liquefativa cerebral focal por agente bacteriano (supurativa, produz pus). Simples ou múltipla. Pode confundir com tumores em exames de imagem. Epidemiologia: segunda causa mais frequente de infecção purulenta do SNC, depois das meningites bacterianas. Agentes infecciosos mais comuns: estreptococos, bacilos gram negativos, estafilococos (os mesmos da meningite). Macroscopia: área focal preenchida por pus no parênquima cerebral, bem delimitada. Microscopia: abscesso Centro purulento, com células necróticas e infiltrado inflamatório neutrofílico. Fibrose e tecido de granulação com fibroblastos. Corado em azul. o Organização e formação de tecido de granulação e neovascularização. o Recrutamento de fibroblastos e formação de fibrose. Não há fibroblastos no parênquima cerebral. INFECÇÕES POR HELMINTOS NEUROCISTICERCOSE Patogenia: cisticercos de Taenia solium no SNC por ingestão de ovos (heteroinfecção). Antígenos do parasita são limitados por cápsula que envolve o cisticerco, não havendo resposta inflamatória. Com a morte do parasita, a cápsula se desintegra. Exposição dos antígenos desencadeia resposta inflamatória e calcificação no local. Quadro clínico: depende da quantidade e do sítio do cisticerco. Forma assintomática: mais comum (até 80% dos casos). Identificada pelas calcificações em exames de imagem. Formas sintomáticas (convulsiva, meningite, encefalite, espinhal, disseminada). Macroscopia: cisticercos em região de transição entre a substância cinzenta e branca, devido a maior vascularização sanguínea. Thais Alves Fagundes DOENÇAS NEURODEGENERATIVAS CONCEITOS GERAIS Perda seletiva e progressiva de neurônios em uma ou mais regiões anatômicas do sistema nervoso central. Surgimento sem qualquer evento incitante claro em pacientes sem déficits neurológicos prévios. Acúmulos neuronais de proteínas resistentes aos mecanismos usuais de degradação dessas proteínas. Progressão estereotipada, afeta neurônios com relações funcionais. Vulnerabilidade seletiva, seleção neuronal de neurônios localizados em uma região e com determinadas funções. DOENÇA DE ALZHEIMER Epidemiologia: causa mais comum de demência no idoso e sua prevalência aumenta com a idade. Clínica: Comprometimento insidioso da função intelectual superior. Alterações do humor e comportamento. Desorientação progressiva, perda da memória e afasia. Doença progressiva, com óbito típico no 8º ano por broncopneumonia, doenças cardiovasculares e embolia pulmonar. Patogenese: Acúmulo do peptídeo β-amiloide. o Proteína precursora amiloide é degradada inadequadamente e se acumula. o Clivada normalmente no sítio α e γ, formando uma substância solúvel. o Na doença de Alzheimer, é clivada no sítio β, forma peptídeo insolúvel, depositado no parênquima cerebral. o Formação de placa senil, pela agregação com outros peptídeos β-amiloide, causando lesão neuronal. Hiperfosforilação da proteína Tau. o Proteína Tau compõe a composição tubular do axônio. o Quando hiperfosforilada, não é capaz de se ligar ao axônio e ocorre seu depósito. o Forma neurofilamentos anormais, causando lesão neuronal. Apolipoproteína E no cromossomo 19 (alelos ε2, ε3, ε4, associado a formação do peptídeo β-amiloide). o Predomínio do alelo 2 tem menor incidência de doença de Alzheimer o Predomínio do alelo 4 tem maior incidência de doença de Alzheimer. Proteína precursora amiloidecodificada no cromossomo 21. Maior probabilidade de desenvolver doença de Alzheimer mais jovem na trissomia do 21. Macroscopia: diminuição do volume cerebral por atrofia do córtex. Redução da espessura dos giros e alargamento dos sulcos cerebrais. Expansão do espaço ventricular. Microscopia: Placa senil, formada pela deposição de β-amiloide (material eosinofílico no H&E). o Coloração especial vermelho-congo. o Cora proteína β-amiloide em vermelho. E luz polarizada torna verde o que estava em vermelho. o Estabelece o diagnóstico. Emaranhados neurofibrilares (proteína Tau hiperfosforilada) (estiramento do corpo neuronal – coloração prata). Thais Alves Fagundes DOENÇA DE PARKINSON Patogenia: degeneração dos neurônios dopaminérgicos da substância negra do mesencéfalo (via nigroestriada). Clínica: sinais e sintomas motores (parkinsonismo) e não motores. Diminuição da expressão facial. Postura encurvada. Rigidez; tremor; lentidão dos movimentos (bradicinesia). Instabilidade postural, com marcha festinante (passos encurtados e acelerados). o Manifestações motoras: 55 a 65 anos. o Não motoras: até 15 anos antes (distúrbios do sono, depressão). Epidemiologia: acomete mais homens, brancos e pessoas com familiares acometidos Macroscopia: palidez da substância negra causada pela degeneração dos neurônios dopaminérgicos no mesencéfalo (normalmente há pigmentação dos neurônios, que passam a ficar descorados na doença de Parkinson). Microscopia: corpo de Lewy (depósito de α-sinucleina) Diminuição da quantidade de neurônios dopaminérgicos na substância negra (células pigmentadas em marrom). Depósito de α-sinucleína. ENCEFALOPATIAS TÓXICAS / INTOXICAÇÕES CONCEITOS GERAIS Conceito: encefalopatias causadas por toxinas no SNC são um problema crescente. Exposição ocupacional, poluição ambiental, uso para fins recreativos e terapêuticos. Mais comum por etanol. Toxinas endógenas (radicais livres, glutamato) e exógenas (ingestão, inalação e absorção pela pele). Manifestações: muitas vezes inespecíficas; imediatas ou tardias; dependem da dose e do tempo de exposição. Macroscopia: achado mais marcante nas encefalopatias tóxicas agudas é edema e sua consequência (necrose neuronal seletiva) Microscopia: edema, necrose neuronal seletiva ou do tecido nervoso ETANOL Umas das drogas mais utilizadas por seres humanos. Causa de doenças, algumas incapacitantes e óbito. Lesões hepáticas, cardíacas, digestórias e no SNC. Distúrbios nutricionais, síndrome alcoólica fetal, aumento risco de câncer. Efeitos no SNC: Potencializa infecções no SNC. Contribui para o traumatismo cranioencefálico, indivíduo alcoolizado sujeito à traumas. Aumento risco de AVC, especialmente hemorrágico. Causa de miopatia e neuropatia periférica. Intoxicação aguda e crônica INTOXICAÇÃO AGUDA Efeitos reversíveis e associados com a concentração no sangue. Clínica: Incoordenação motora (10dg/L). Diminuição do nível da consciência (20 a 25dg/L). Óbito por depressão respiratória e parada cardíaca (acima de 50dg/L). Patogênese: não é totalmente conhecida. Alterações na membrana dos neurônios (altera posição das moléculas que atuam no transporte iônico). Possível aumento do poder inibidor do GABA (ácido gamaaminobutírico) nas sinapses. Morfologia: cérebro normal ou apenas edema cerebral. Thais Alves Fagundes INTOXICAÇÃO CRÔNICA Efeitos diretos do álcool e metabólitos e/ou indiretos, pela atuação de outros fatores (deficiências nutricionais). Principais lesões descritas são: Atrofia cerebral* Encefalopatia de Wernicke* Atrofia cerebelar* Neuropatia periférica Síndrome alcoólica fetal Doença de Marchiafava-Bignami Mielinólise pontina central Atrofia cerebral: Alteração mais encontrada por TC e RM em alcoólatras crônicos. Redução do peso cerebral em cerca de 10%, podendo ser intensificada por déficits nutricionais. Global, mas pode haver envolvimento mais seletivo de algumas regiões cerebrais. Parcialmente reversível, com a cessação do etilismo e nutrição. Encefalopatia de Wernicke (EW): Causada pela deficiência de tiamina (vitamina B1). o Deficiência de tiamina está presente na maioria dos alcoólatras crônicos (80%). o Encefalopatia de Wernicke está presente em 35% dos alcoolistas crônicos. Patogênese da deficiência de tiamina no alcoolismo: o Tiamina exerce função importante em neurotransmissores e na condução nervosa. o Deficiência de tiamina resulta em redução da utilização da glicose e de ATP. o Deficiência de tiamina: Dieta inadequada. Redução do transporte de tiamina pela mucosa duodenal. Redução da capacidade hepática de armazenamento. Redução de tiamina para seu composto ativo. Aumento da demanda de tiamina para o metabolismo do álcool. Manifestações clínicas após 2 a 3 semanas de restrição alimentar, por haver reserva de tiamina. Carência aguda (ocorre rapidamente): o Lesões agudas e disseminadas. o Confusão mental. o Coma (se não tratada). Oftalmoplegia, nistagmo e ataxia. Carência insidiosa ou em episódios subclínicos (maioria dos casos): o Efeito cumulativo dos déficits subclínicos repetidos, causando manifestações. o Principal manifestação dos casos crônicos da EW é a psicose de Korsakoff: Amnésia anterógrada e retrógrada seletiva. Com preservação relativa de outras funções cognitivas. Macroscopia: petéquias nos corpos mamilares (fase aguda) e atrofia dos corpos mamilares Atrofia cerebelar: presente em 35% dos pacientes com EW. Patogênese não está clara, mas dados sugerem que se deve principalmente à carência de vitamina B1. Clínica: ataxia de marcha e incoordenação das pernas. Macroscopia: atrofia na porção superior do cerebelo (seletiva / regional). o Redução dos giros e aumento dos sulcos cerebelares.