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E o mistério ainda maior

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Derek Gregory, Ron Martin, Graham Smith
(orgs.)
Geografia Humana
Sociedade, Espar;o e Ciencia Social
Tradu(:iio:
My Ian Isaack
Ac ~ 09
U.F.M.G.• BIBLIOTECA UNIVERSITARIA
Pedro Geiger
Gerigrafo/IBGE
1111111111111111111111111111111 II1111133480806
NAo DANIFIQUE EST A ETIQUETA
Jorge Zahar Editor
Rio de Janeiro
Rees, G. e J. Lambert (1986) Cities in Crisis (Londres: Edward Arnold).
Relph, E. (1987) The Modern Urban Landscape (Londres: Croom Helm).
Rex, J. (1986) Race and Ethnicit.\' (Milton Keynes, Open University Press).
Saunders, P. (1981) Social Theory and the Urban Question (Londres: Hutchinson)
(2" ed., 1986).
Scott, A.J. (1986) 'Industrialization and urbanization: a geographical agenda', Annals,
Association of American Geographers, vol.76, p.25-37.
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Smith, M.P. (1980) The City alld Social TheOl)' (Oxford: Blackwell).
Smith, S.J. (1986) Crime, Space and Society (Cambridge University Press).
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p.I-24.
Zukin, S. (1991) Landscapes of Power (Berkeley: University of California Press).
Hist6ria, geografia eo" misterio
ainda maior" da geografia hist6rica
Algumas pessoas consideram 0 ge6grafo como uma especie de trapeiro intelectual
[coletor] que se contenta em separar fragmentos e peda~os de informa~6es
desconexas de varias outras disciplinas ... A geografia hist6rica e um misterio
ainda maior; poucos se aventuram alem da cren~a de que se trata de "velhos"
mapas, e que talvez ela se preocupe demais com as lendas de marinheiros de
antigamente, viajantes medievais e mercadores aventureiros. Outros acham que
se trata de uma disparatada tentativa dos ge6grafos em explicar a hist6ria, e
pens am que 0 ge6grafo hist6rico esta certamente transgredindo e deveria prova-
velmente ser processado. [sto nao e bem assim, 0 ge6grafo hist6rico e um ge6grafo
em primeiro lugar, por ultimo e 0 tempo todo (Mitchell, 1954, p.I-2).
"Geografia historica" e urn termo que vem sendo empregado ha muito
no mundo da lingua inglesa para descrever certas variedades de escritos
topograficos, e e urn termo que, nos anos mais recentes, veio a identificar
uma subdisciplina aparentemente distinta da geografia academica. Al-
gumas dificuldades san associadas a esta subdisciplina, todavia, e os
estudantes que se deparam pela primeira vez com cursos de geografia
historica ficam confusos de como exatamente esses cursos devem ser
diferenciados de outros ministrados nos departamentos de historia e
geografia. N a verdade, a geografia hist6rica - ao contrario das geografias
mais sistematicas designadas por "economica", "social", "politica",
"urbana", "agrfcola", "medica", e assim por diante - nao pode rei-
vindicar urn objeto de estudo perfeitamente definido, pois 0 que significa
dizer que" historia" e este objeto quando a historia por si e tao hetero-
genea e po de ser estudada em tantos aspectos diferentes (e quando os
proprios historiadores dividem suas investiga<;:oes em caixas rotuladas
"economica", "social", "polftica")? Alem do mais, e evidente que os
pesquisadores que se autodenominam geografos historicos se concentram
sobre uma diversidade de questoes substantivas, e tambem tendem a
fazer uso de uma diversidade de jogos de ferramentas filosoficas e
metodologicas sobre uma diversidade de fontes primarias e secundarias.
A situa~ao, entao, nao e tanto a de um empreendimento academico
uniforme impulsionado pOl' um misto de interesse, teoria e pratica, mas
sim de uma compila~ao solta e ecletica de investiga~oes que se somam
para 0 que Mitchell (J 954) descreveu como 0 "misterio ainda maior"
da geografia historica.
Evidentemente, uma observa~ao como essa pode alimental' a conclusao
de que nao faz senti do falar sobre uma geografia historica, mas quero
me opor a tal conclusao pelo fato de que investigar "0 misterio ainda
maior" de Mitchell permite uma compreensao de como a complexa
geografia do mundo esta estreitamente Jigada com 0 que acontece em
sua historia. Eu poderia desenvolver esta aJega~ao em diversas dire~6es,
mas meu argumento principal aqui e que a importancia da geografia
historica e fazer com que uma sensibilidade geografica seja introduzida
no estudo de todos esses fenomenos do passado - economicos, sociais,
polfticos ou qualquer outro - que sao a propria" substancia" da historia
e que atrafram a aten~ao dos historiadores (como tambem a de outros
estudiosos das ciencias sociais e das humanidades). Considere, por
exemplo, um acontecimento historico como 0 do" massacre" de Newport
ocorrido no outono de 1839 (ver Williams, 1959, p.234-41) quando
varios galeses dos Welsh Chartists, agitadores em prol da reform a polftica,
foram baleados e mortos pOI' soldados durante uma rebeliao na cidade
de Newport, no Pafs de Gales do SuI. 0 fato de uma regiao como a de
Gales do Sui ter experimentado uma atividade dos chartistas reflete uma
combina~ao peculiar de dificuldade economica com um certo estilo de
radicalismo polftico; 0 fato de uma rebeliao ter ocorrido de todo dependeu
da reuniao num mesmo lugar de indivfduos descontentes oriundos de
tres centros diferentes e disjuntos (Blackwood, Ebbw Vale e Pontypool);
eo fato de que a rebeJiao evoluiu ern confusao e perda de vidas foi, em
parte, devido aos homens de Pontypool nao terem chegado a Newport
a tempo, uma falha ela mesma relacionada tanto a distancia que eles
tin ham de percorrer pOl' terrenos acidentados como ao mau tempo da
noite anterior. Isto e obviamente apenas urn diminuto exemplo, mas
mostra como um punhado de fatores geograficos - as caracterfsticas
economicas e polfticas de uma determinada regiao, a coordena~ao de
pessoas em diferentes lugares e 0 movimento de pessoas e de informa~oes
aU'aves do espa~o - foram fundamentais a cria<;:ao de um pequeno
"peda<;:o" de historia.
Essas alega~oes podem, a princfpio, nao parecer suficientemente fortes
ou excepcionais, mas sustentar a importancia de uma sensibilidade
geografica enaltecida em face de um "historicismo" arraigado - uma
tendencia que os estudiosos de quase todos os credos tem de interpretar
o mundo social em termos de rela~6es temporais (geralmente cadeias
de causas-e-efeitos que se perseguem "atraves dos anos") - e uma
tarefa vital mas onerosa (e para um tratamento teorico sistematico desses
assuntos, ver Soja, 1989, especial mente 0 capftulo I). Ademais, enquanto
minhas alega~6es aqui nao pareceriam estranhas para as gera~6es mais
velhas de historiadores e geografos, muitos dos quais estavam atentos
ao papel da geografia na historia, eles, na verdade, vao contra 0 que
mais recentemente tem sido considerado como 0 nicho da geografia
historica na "divisao do trabalho" intelectual. Para ser mais preciso, 0
nicho alternativo que imagino para a geografia historica em meio as
ciencias sociais e as humanidades e 0 que os estudiosos uma vez se
referiram nao como geografia historica mas como" historia geografica"
(e eu explicarei este termo em breve), e, ao externar esta opiniao, nao
estou apenas argumentando contra os geografos historicos de hoje, mas
tambem nadando de acordo com a mare do que eles real mente fazem
em suas pesquisas substantivas. Na segunda se~ao de meu ensaio,
consequentemente, examino distin<;:oes mais antigas feitas entre historia
e geografia e, pOl' meio desse exame, resgato a no~ao de historia
geografica como uma especie de lente atraves da qual podemos observar
trabalhos em curso em geografia historica. Na terceira se~ao desenvolvoum exemplo mais detalhado de historia geografica, e neste caso, a historia
em questao e a da "]oucura" : de pessoas que foram declaradas " ]oucas" ,
das institui~oes que as abrigaram e dos medicos que delas trataram. E,
na se~ao final, pondero sobre a historia "espacializada" de Michel
Foucault, 0 renomado intelectual Frances que frequentemente escreveu
sobre assuntos historicos, e ao faze-Io insiro tanto um "tato" por
investiga~ao historica como alguns conceitos - que tratam de fenomenos
intangfveis tais como conhecimento e poder - que instruem minha
visao mais geral de geografia historica (ou historia geografica) e tambem
figuram em minha mais focalizada geografia historica da "loucura".
Em conjunto, espero que os varios elementos de meu capftulo resultem
numa demonstra~ao teorica e substantiva das raz6es para que algo que
ainda pode ser chamado de "geografia historica" (mesmo que eu,
pessoalmente, preferisse resgatar 0 termo "hist6ria geognifica") continue
central para a arena intelectual.
A hist6ria ... nao e uma est6ria de eventos consecutivos ou urn relato de mudan~as.
Ela nao trata de eventos considerados como tais. Ela e urn estudo dos processos
de pensamento que motivaram as a~6es humanas no passado, e nao simplesmente
apreciar fen6menos em seus relacionamentos com 0 tempo. 0 conteudo do campo
da hist6ria limita-se a objetos particulares, isto e, a~6es humanas que sao as
conseqiiencias do pensamento consciente (Beaujeu-Garnier, 1952, p.6).
omaterial, ou objetos, do estudo geografico [sao] os aspectos que caracterizam
partes diferentes da superffcie da terra. POI' aspectos, quero me referir aqueles
fen6menos que podem ser observados seja diretamente a olho nu ou indiretamente
pOI' intermedio de urn instrumento ou estatfsticas. Podemos vel' coisas como
casas, linhas ferroviarias, nuvens, plantas e morros; pOI' meio de instrumentos
podemos observar temperatura, chuva, radia~ao solar; podemos mediI' estatisti-
camente 0 numero de pessoas em urn lugar ou a densidade de colheitas em
determinada area. Todos eles em conjunto formam os aspectos da superffcie da
terra que podem, razoavelmente, compoI' 0 material da geografia (ibid., p.7).
melhor as possfveis termos de uma reconcili~<;ao). Afirma-se as vezes
que a manobra crucial foi a separa<;ao analftica entre hist6ria como a
ciencia de "rela<;6es de tempo" e geografia como a ciencia de "rela<;6es
espaciais" que Richard Hartshorne (baseando-se em ge6grafos e fi16sofos
alemaes mais antigos) introduziu na literatura geognifica anglo-ameri-
cana (Hartshorne, 1939, p.134-44):
Esses trechos foram extrafdos de uma palestra proferida pela ge6grafa
francesa Jacqueline Beaujeu-Garnier no Ibadan University College, Ni-
geria,em 1952, e embora possa parecer estranho desenterrar este discurso
ha muito esquecido - fico impressionado que Beaujeu-Garnier tambem
explicite aqui uma serie de· discrimina<;6es que influfram bastante na
opiniao acerca de geografia hist6rica tanto na epoca como mais recen-
temente. Mais particularmente, ela bate numa exposi<;ao mais ampla
pela qual varios ge6grafos de meados do seculo buscavam estabelecer
os Iimites entre hist6ria e geografia, e que deste modo estavam a ponto
de efetivamente escolher em separado 0 que fora a abordagem mais
aberta e holfstica para aliar a investiga<;ao hist6rico-geografica apresen-
tad a pOI' (digamos) Vidal de la Blache e os Anna/iSles na Fran<;a ou pOI'
H.J. Fleure e a Aberystwyth School no Pais de Gales. 0 resultado desta
escolha em separado foi 0 de compartimentalizar 0 conhecimento de urn
modo nao muito util, assim diria, e produzir uma situa<;ao em que a
subdisciplina declaradamente hist6rica da geografia - isto e, a geografia
hist6rica - acabou curiosamente divorciada das preocupa<;6es, teorias
e metodos da hist6ria.
Nao basta fazer esta reclama<;ao, no en tanto, pOl'que e vital compreen-
der a exata natureza desta separa<;ao (mesmo que seja apenas para avaliar
A descri~ao em conformidade com 0 tempo e Hist6ria, a que esta de acordo com
o espa~o e Geografia" ... "A Hist6ria difere de Geografia apenas na considera~ao
de tempo e area. A primeira e urn relata de fen6menos que seguem urn ao outro
e tern rela~ao com 0 tempo. A segunda e urn relata de fen6menos urn ao lado
do outro no espa~o (Kant, 1802, citado em Hartshorne, 1939, p.135).
Hartshorne declarou, pois, que para a geografia "0 tempo em geral
passa para 0 segundo plano" (ibid., p.184), e afirmou que estudos
geograficos que enfatizam a dimensao temporal corriam 0 risco de se
tornar estudos em hist6ria (ibid., p.I77-84). Isto significava que sua
compreensao da geografia hist6rica envolvia urn certo distanciamento
do fator tempo - urn distanciamento que a levou a usaI' 0 termo
"hist6rico" simplesmente mais no sentido "do passado" do que inferir,
a partir dele, qualquer liga<;ao com 0 campo da hist6ria (ibid., p.185)
- e, desse modo, ele confinou a subdisciplina a reconstru<;ao do
"presente hist6rico" , urn "atalho" utilizado pOl' urn particular e prefe-
rivelmente curto perfodo de tempo (ibid., p.184-8).
Deve-se duvidar, pOl'em, da separa<;ao de Hartshorne como uma base
para a efetiva pratica da geografia hist6rica em meados do seculo XX,
especialmente tendo em vista que, praticamente ao mesmo tempo, Carl
Sauer - que e freqiientemente considerado urn ge6grafo hist6rico
(Williams, 1983) por seu papel central para a Escola de Berkeley de
geografia hist6rica e cultural - foi bastante explfcito em sua enfase
sobre as muta<;6es hist6ricas de longo prazo no ambito da cultura material
(e ate descreveu seus estudos como parte de uma "hist6ria cultural"
mais ampla: vel' Sauer, 1941). Sauer, no entanto, nao teve receio em
identificar uma preocupa<;ao pOl' hist6ria como" rela<;6es temporais" no
cerne de sua priitica hist6rico-geografica, e ate mesmo 0 ge6grafo
britanico hist6rico H.C. Darby, que certamente se preocupava com a
compatibilidade l6gica entre hist6ria e geografia, estava preparado a
aceitar 0 compromisso de Sauer com a "dimensao de tempo em geo-
grafia" (Darby, 1989). E pOltanto revelador que, em sua palestra de
1952, Beaujeu-Garnier tenha delineado a separa<;ao de Hartshorne entre
hist6ria e geografia (Beaujeu-Garnier, 1952, p.2-4), mas depois criticou
a mesma por deixar de especificar os objetos - 0 conteudo ou 0 material
- que comp6em "0 campo da investiga<;:ao geografica", em oposi<;:ao
ao da investiga<;:ao historica (ibid., pA-7). Ela se valeu das ideias do
historiador R.G. Collingwood, que delimitou a historia como 0 estudo
de "processos de a<;:aoque possuem urn lado interior, constitufdo por
processos de pensamentos" (citado em ibid., p.5: ver tambem Guelke,
1982), e usou sua defini<;:ao como trampolim para delimitar a geografia
como 0 estudo de fenomenos muito mais permanentes, tangfveis e
observaveis. Esta distin<;:aoesta claramente estabelecida nos dois trechos
de Beaujeu-Garnier citados anteriormente, e em sfntese fica claro que
ela considerava historia e geografia como separados nao tanto em termos
de uma preocupa<;:ao, seja por "rela<;:6es temporais" seja por "rela<;:6es
espaciais", quanta separadas pOl'que uma se concentrava em objetos
imateriais (ou "ideais") tais como pensamentos e a<;:6eshumanos, en-
quanto a outra se concentrava em objetos materiais tais como" casas,
linhas ferroviarias, nuvens, plantas e morros" .
Gostaria de lembrar que os geografos humanos de urn modo geral
sentiram-se freqiientemente pouco 11vontade em tratar de fenomenos
destitufdos de uma materialidade obvia, e que toda uma historia ainda
esta por ser escrita do medo "do imaterial" na investiga<;:ao geografica
(ver, pOl-em, Philo, 1991; Watson, 1957)_ Tambem parece que 0 tipo de
distin<;:ao identificada por Beaujeu-Gamier levou muitos geografos his-
toricos a concentrar suas pesquisas em tomo de objetos materiais, e, ao
faze-Io, eles se distanciaram dos historiadores que estao mais propensos
em falar acerca defenomenos imateriais, nao apenas as" ideias" presentes
nas cabe<;:asde pessoas historicas (enfoque de Collingwood) mas tambem
de todo urn conjunto de acontecimentos passageiros (guerras, fome),
entidades abstratas (institui<;:6es polfticas, movimentos intelectuais) e
estruturas mais profundas (as" leis" do capitalismo, a "Iogica" da luta
de classes). Na verdade, se pensarmos nas diversas tradi<;:6ese "escolas"
de geografia historica poderemos notar esta predile<;:ao pelo mundo
material e isto e tao verdadeiro para os norte-americanos como Carl
Sauer e Fred B. Kniffen (com seus enfoques sobre cultura material e
coisas tao "corriqueiras" como estabulos e moir6es de cerca) quanto 0
e para os pesquisadores britanicos preocupados com as morfologias de
povoamentos do passado e sistemas de campo. Ademais, se formos
reexaminar 0 classico ensaio teorico de Darby de 1953 (reeditado em
1957), poderemos ver que ele considerava a atividade do geografo
historico como basica "para explicar a paisagem" - explicar as con-
figura<;:6es (as distribui<;:6es e as associa<;:6es) dentro da paisagem -
caso necessario pela lama e 0 suor do trabalho de campo (Darby, 1957,
p.650).
Sera util deter-nos por urn momenta no ensaio classico de Darby,
visto que ele codificou aqui tres possfveis maneiras de reunir as disciplinas
de historia e geografia, e, ao tango do processo, ele, de uma maneira
questionavel, imprimiu 11geografia historica uma dire<;:aoque a afastou
do muito que havia de interessante no campo de historia (0 que certamente
nao deve depreciar a substancia de sua propria pesquisa). Em primeiro
lugar, ele identificou 0 estudo de "geografias passadas", em que as
paisagens de artefatos humanos e atividades associadas com determina-
dos perfodos de tempo (" cortes transversais" temporais) tinham de ser
reconstrufdas (ibid., p.643-54); e, em segundo lugar, ele identificou a
"historia por tras da geografia" em que acontecimentos de tango prazo
esculpindo importantes impactos na paisagem (" os temas verticais")
tiveram de ser rastreados por dezenas e ate centenas de anos (ibid.,
p.646-9). Ele aparentemente considerou a primeira dessas possibilidades
como a "verdadeira" geografia historica, com a segunda possibilidade
desempenhando urn importante papel de apoio, mas a terceira dessa
trfade - 11qual ele se referia como a "geografia por tras da historia"
- foi vista mais como alheia e como algo que nao poderia ser incorporado
"ate mesmo dentro da abrangencia mais ampla de geografia" (ibid.,
p.643). 0 que Darby chamava de "geografia por tras da historia" eram
aqueles estudos em que 0 curso da historia humana se relacionava com
con troles postos em a<;:aopelos atributos naturais e humanos da "base
geografica" de uma determinada regiao (ibid., p. 640-3) e, ao identificar
esta especie de investiga<;:ao intelectual e em seguida banir a mesma do
campo da geografia, ele anunciou urn tema que estivera presente na
geografia britanica continuamente desde 0 encontro de geografos e
historiadores em 1932, quando C.B. Fawcett - captando 0 ambiente
do encontro - declarou que qualquer tentativa de usar "fatos geogra-
ficos" para explicar "acontecimentos historicos" se constituiria num
exercfcio de "Historia, historia geografica e nao geografia" (Geograp-
hical AssociationlHistorical Association, 1932, pAO). Neste sentido, na
verdade, alguns escritores se referiram ao objeto dos debates como
"historia geografica" , e um breve resumo das conclus6es a que se chegou
aqui foi apresentado por F.J. Monkhouse em 1955:
o relacionamento entre Geografia e Historia pode ser examinado em termos de
historia geografica e geografia historica. Historia geografica e a atividade do
historiador, que procura seus [sic] proprios interesses com 0 emprego de seus
proprios metodos; ele se utiliza da "geografia por tras da historia" a fim de dar
uma localiza~ao exata 11 teia de acontecimentos pelos quais ele se interessa ...
Mas, inversamente, a geografia hist6rica esta dentro da competencia direta do
ge6grafo. 0 ge6grafo hist6rico ocupa-se da reconstru~ao da geografia do passado,
a hist6ria da paisagem ... (Monkhouse, 1955, p.19-20).
Em outras palavras, desde que os pesquisadores ancorassem seus estudos
nos objetos materiais de paisagens do passado (e com isso investigassem
onde estavam localizados esses objetos, e como eram combinados), 0
resultado era geografia hist6rica propriamente dita: mas, se desviassem
sua aten~ao para acontecimentos, entidades e estruturas mais imateriais
da hist6ria, e se taJvez quisessem dizer algo a respeito da geografia pOl'
tras desta hist6ria, 0 resultado entao, seria a hist6ria geografica que
pertencia a hist6ria e nao a geografia. E manobras como essa exclufram,
de fato, muitos estudos mais antigos - como os de Ellsworth Huntington,
Ellen Churchill Semple e, mais recentemente, Gordon East (1938) -
do corpo geografico, e ao proceder assim tambem exageraram a distancia
disciplinar entre os ge6grafos e os escritos fascinantes de historiadores
como H.B. George (1901) e Lucien Febvre (1932).
Pode parecer urn tanto estranho preocupar-se agora com esses argu-
mentos e discrimina~6es mais antigas, mas 0 prop6sito da narrativa
acima e de resgatar uma serie de oposi~6es que foram outrora levadas
a serio - entre hist6ria e geografia; entre hist6ria geografica e geografia
hist6rica - e que podem proveitosamente esclarecer 0 que esta se
passando rea/mente em geografia hist6rica hoje em dia (e talvez em
geografia humana de urn modo mais geral: vel' tambem Driver, 1988).
Simplificando as coisas, ocorre-me que grande parte do que atualmente
se faz passar pOI' geografia hist6rica deixou de respeitar as cercas mais
antigas, e que estudo ap6s estudo segue atualmente 0 sentido de uma
hist6ria geografica onde 0 foco se desviou da materialidade de "fatos
geograficos" para a imaterialidade de fenomenos hist6ricos. Nao se
deduz daf que ge6grafos hist6ricos do presente nao mexam com feno-
menos que tenham uma expressao indelevel sobre a superffcie da terra
- como a1deias desertas, igrejas, templos, fabricas, guetos e assim pOI'
diante - mas serve para afirmar que pelo menos uma boa parte da
pesquisa se voltou para fenomenos com, na melhor das hip6teses, urn
impacto mfnimo ou tangencial sobre "0 solo". E, com rela~ao a esta
ultima conexao, considere a pesquisa sobre temas tao variados como a
difusao de inova~6es, a migra~ao de pessoas e seus sistemas ideol6gicos,
o crescimento de associa~6es fraternas e polfticas, 0 embate de classes
sociais, 0 funcionamento da maquina estatal, as representa~6es artfsticas
de ten'as e mao-de-obra, e assim pOI' diante. A motiva~ao pOI' tras desta
pesquisa nao e, evidentemente, urn genulno desejo de reconstruir a
materialidade de "geografias passadas": na verdade, a aten~ao se des-
garrou dessas geografias como ponto final de investiga~ao para uma
agenda estabelecida pOI' historiadores (e pOI'outros estudiosos) domina-
dos pOI' questoes e temas tidos como significativos na transforma~ao de
antigos sistemas ecol6gicos, economicos, sociais, polfticos, culturais e
ideol6gicos. Isto nao quer dizer que a geografia material do mundo tenha
desaparecido dos estudos realizados: em vez disso, serve para enfatizar
que esta geografia deixou de ser investigada como urn "fim em si", mas
e introduzida para apontar a diferen~a crucial que a geografia na hist6ria
faz para as questoes e temas especificados na agenda (a primeira vista
"ageografica" e "aespacial") dos historiadores. Em outras palavras, se
antes eram coisas a ser explicadas, as "geografias passadas" se tornaram
parte de uma explica~ao sendo dad a para algo diferente, e aqui este
"algo diferente" deve ser encontrado no raio de acontecimentos mais
imateriais, entidades e estruturas que pOI' conven~ao sac tratados no
campo da hist6ria.
Esta manobra deve ser interpretada com muito cui dado, todavia, pois
o que ela envolve nao e urn retorno a crassa hist6riageografica inserida
no "determinismo ambiental" de Huntington, Semple e outros, nem
qualquer simpatia pOI' declara~6es como" a hist6ria e governada pe1a
geografia" ou "hist6ria e geografia posta em movimento" (Darby, 1957,
p.642). Neste senti do, concordo com Darby que deverfamos ser caute-
losos em fazer permutas em hist6ria geografica, mas nao vejo nenhuma
razao para supor que todos os esfor~os em escrever hist6ria geografica
sejam mal orientados em suas ambi~oes ou rea1iza~6es. E, se recentes
trabalhos de geografia hist6rica forem consultados, res tara pouca duvida
que a tendencia nao e em dire~ao a algum simples determinismo ambiental
mas em dire~ao a uma cautelosa narrativa de como as realidades de
espa~o e Jugal' - os contrastes e rela~6es de cidade/campo, padroes
regionais de praricas agrfcolas e industriais, modos de vel' e agir em
paisagens, disposi~oes internas e ambientes externos de institui~oes como
asilos e prisoes, geografias locais de etnia, genero, grupos ocupacionais
e de classe (apenas para dar alguns exemplos) - se tornaram todos eles
basicos para a forma~ao de acontecimentos hist6ricos fundamentais como
o surgimento do capitalismo, as revolu~oes agrfcoJas e industriais, a
rapida expansao do urbanismo no mundo ocidental, 0 desenvolvimento
de na~oes e estados, a forma~ao de modernos sentidos de auto-identidade
humana, e a produ~ao de contlitos raciais, sexuais e baseados em classes
(vel', pOI'exempio, Cosgrove, J984; Daniels, 1993; Dennis, 1984; Dodg-
son, 1987; Driver, 1993a; Dunford e Perrons, 1983; Gregory, 1982;
Harvey, 1985; Langton e Morris, 1986; Mackenzie, 1989; Rose, 1988).
A conclusao a ser tirada desses trabalhos nao e que os acontecimentos
da historia podem ser reduzidos as complexidades da geografia, mas
que e possfvel enriquecer e lan<;ar uma nova luz sobre esses aconteci-
mentos historicos ao injetar-lhes urn pouco de sensibilidade geognifica.
Esta e a promessa da nova historia geografica: e a promessa de estudos
que se recusam a fechar-se em torno da disposi<;ao dos objetos no mundo
material, mas que estao preparados a reel aboral' as preocupa<;6es de
"mestres" como Darby e Sauer numa tentativa de criar uma subdisciplina
em sintonia com os interesses mais amplos das contemporiineas ciencias
sociais e humanidades. E tambem a promessa que devo me empenhar
agora em exemplificar mais explicitamente, embora deva-se admitir que
o debate a seguir nao pode fazer mais do que esbo<;ar 0 potencial de
uma historia geognifica cuidadosamente buscada.
seus achados numa tela de mudan<;as socio-economicas mais amplas na
natureza do mundo ocidental. Ademais, seguindo 0 rastro do pioneiro
Historia da loucura (1967), de Michel Foucault, admitiu-se que a historia
da loucura e urn momento crucial na historia da razao: na historia de
como as pes so as nas sociedades ocidentais vieram a considerar-se - e
foram encorajadas a se lornar - indivfduos humanos, "racionais",
"normais" e "responsaveis" . POl·tanto, a estoria de como" nos" apren-
demos a identificar, internal' e tratar de loucos (com 0 proposito de
torna-los "nao-loucos") e, ao mesmo tempo, a estoria de como" nos"
constitufmos os ediffcios conceituais de "racionalidade" , "normalidade"
e "responsabilidade" dos quais depende todo 0 funcionamento da mo-
derna vida social. Manifestamente, entao, os tipos de historias ora sendo
pesquisadas aqui respondem quest6es acerca do mundo moderno pelo
menos tao importantes quanto as quest6es abordadas pOl' (digamos)
historiadores marxistas preocupados com 0 surgimento de uma ordem
socio-economica capitalista.
Esfor<;os foram devidamente despendidos na realiza<;ao de investiga-
<;6es em dimensao historica de "temas de saude mental" , mas conside-
ravelmente pouco foi tentado com respeito as conjuntas dimens6es
historico-geograficas desses temas, com a conclusao - assim diria eu
- de que os estudos empreendidos nao conseguiram realizar tudo 0 que
poderiam tel' realizado. Em primeiro lugar, e esta e a reivindica<;ao mais
fragil, os historiadores deixaram freqUentemente de notal' as diferen<;as
geograficas extremamente reais na maneira como as sociedades do
passado identificavam, mandavam internal' e tratavam os loucos. Isto os
levou a produzir historias que dao a entender terem os negocios de
loucos do passado side muito mais coerentes em seus contextos e
conteudos do que 0 eram na realidade, e tambem de retratar mudan<;as
historicas como se elas envolvessem tendencias instantfll1eas e em massa
de urn conjunto de ideias e praticas para outro. A "verdade" era
indubitavelmente muito mais heterogenea e fragmentaria do que essas
historias admitem, e, em rela<;ao a isto, e esclarecedor repetir a advertencia
de Roy Porter sobre considerar os asilos que apareceram na Inglaterra
dos seculos XVIII e XIX como urn "sistema" coerente:
Ate recentemente, grande parte da pesquisa no campo da saLide mental era
ahist6rica e aespacial. Achamos que 0 tratamento compreensivo de ambos, os
assentamentos hist6rico e geognlfico de temas ligados a saLidemental e particu-
larmente importante (Smith e Giggs, 1988, p.viii).
Nos ultimos anos, trabalhos sobre a historia da "Ioucura" se tornaram
bastante comuns, e e possfve! encontrar toda sorte de investiga<;6es
historicas preocupadas com indivfduos mental mente perturbados de
epocas passadas - as "pessoas loucas", "Iunaticos" e "insanos" de
terminologias mais antigas - e, tanto com as institui<;6es que algumas
vezes os abrigaram como com os medicos (e outros especialistas) que
as vezes trataram deles. Essas investiga<;6es tern com isso resgatado os
pensamentos e as experiencias de pessoas loucas do passado; reconstrufdo
interpreta<;6es sobre a loucura no passado e as propostas associadas para
seu tratamento; debatido as atuais prciticas adotadas em asilos e outros
espa<;os institucionais; deparado com os "medicos de loucos" e seus
antecedentes; e tern desenredado os contextos demograficos, economicos,
sociais e poHticos em que surgiram os especializados "negocios de
loucos" (sistemas de institui<;6es e praticas direcionadas para 0 objeto
da loucura). Alguns desses estudos eram limitadas "historias psiquiatri-
cas" escritas pOl' psiquiatras que proclamavam as realiza<;6es de seus
predecessores, mas a maioria dos estudos mais recentes tende a situar
o asiJo por fim transformou-se no remedio preferido para a doenc,;a de uma
civilizac,;ao. Apesar disso, sua ascensao foi lenta, limitada e gradativa ate 0 fim
do seculo XVIII, e e discutfvel se 0 termo "sistema" que ocasionalmente era
aplicado a este devenvolvimellto nao seria engallador. Afillal de contas, ate 0
illfcio da era vitoriana, a nac,;aos6 possllfa lima cobertura esparsa de hospfcios,
mesmo em areas dellsamente povoadas, e apesar de aprovar a Lei de 1808 que
permitia aos condados estabelecerem asilos subvencionados, apenas uma duzia
estava em funcionamento ate 1845. 0 mapa dos manic6mios do seculo XVIII
mostra menos um sistema coordenado do que uma distribui~ao altamente desigual
de inslilui~6es heterogeneas - grandes e pequenas, empreendimentos privados
ou de caridade, publicos ou particulares. 0 termo "sistema" sugere uma unifor-
midade i1us6ria. A diversidade era 0 ingrediente fundamental (Porter, 1987,
p.156).
resultado foi deixar em Iiberdade uma comunidade a que Foucault se
refere como" os Mesmos" e mandar confinar uma comunidade a que
ele se refere como" os Outros" (ver Foucault, 1970, p.xxxiv, onde ele
pondera sobre seus objetivos em Historia da loucura). Os detalhes de
exatamente quem foi confinado, juntamente com os detalhes de como
este confinamento foi interpretado, fundamentado e organizado, obvia-
mente variavam muito conforme a epoca e 0 lugar em questao, mas nao
resta duvida de que 0 processo de separa<;ao s6cio-espacial foi funda-
mental para as hist6rias aqui examinadas.
Alem disso, 0 princfpio da separa<;ao s6cio-espacial foi algumas vezes
ampliado a medida queas autoridades buscavam transferir as pr6prias
institui<;5es para longe dos centros populacionais, resultando daf que os
asilos especializados em lumiticos, inaugurados em muitas partes do
mundo do seculo XIX, acabassem espacialmente marginalizados. Foram
assim instalados no "alto da colina" ou em locais "longe dos olhos,
longe do cora<;ao" , e 0 que geralmente acontecia e que esses locais de
loucura eram banidos - a semelhan<;a de seus predecessores medievais,
as colonias de Ieprosos - para areas rurais bastante afastadas das cidades,
povoados ou importantes rodovias. Esta geografia "ruralizada" de asilos
refletiu evidentemente uma "inten<;ao de policiar" (para usar uma Frase
algumas vezes empregada por contemporaneos) com 0 intuito de alijar
pessoas e acontecimentos incomodos do cenario urbano, mas na realidade
esta ruraliza<;ao era mais do que uma simples e manifesta pratica de
controle social. 0 ponto principal aqui e que as autoridades do seculo
XIX estavam empenhadas assaz constrangidamente em usar a paisagem
rural juntamente com sua beleza natural e serenidade, para acalmar e,
confiantemente, curar as mentes perturbadas dos reclusos em asilos. A
estrategia mais ampla entao empregada, conhecida como "tratamento
moral" ou "administra<;ao moral", pedia um regime institucional humano
em que aten<;ao, afeto e a manipula<;ao detalhada de ambientes locais
(dentro e fora do asilo) eram planejadas para reacender nos "pacientes"
um controle moral sobre suas tendencias a instabilidade. Este importante
ponto de partida na hist6ria da loucura - a institui<;ao de uma resposta
"moral" para os loucos a qual ainda hoje ecoa em diversos procedimentos
psiquiatricos e de assistencia mental - era, pOl'tanto, estreitamente
vincuJado desde 0 infcio a manipula<;ao de geografias institucionais:
Ao levar adiante este argumento, Porter exp5e c1aramente uma sen-
sibilidade para a geografia desigual do" mapa dos manicomios" , e existe
um sentido em que sua perspicacia por este mapa se funde com sua
enfase mais geral sobre a "absoluta diversidade dos desenvolvimentos
(relacionados com a loucura) durante 0 longo seculo XVIII" (ibid., p.14:
voltarei ao assunto ja).
Em segundo lugar, e esta e a alega<;ao mais forte, os historiadores da
loucura raras vezes apreciaram a propor<;ao em que espa<;o e lugar -
as distribui<;5es espaciais e as combina<;6es de fenomenos; a vincula<;ao
de fenomenos a determinados locais - fizeram uma diferen<;a crucial
exatamente para a elabora<;ao das hist6rias que escrevem. De fato, a
pr6pria loucura (ou a popula<;ao de presumfveis loucos) sempre foi um
fenomeno com uma geografia definida: ela sempre foi mais predominante
em certas regi5es e localidades do que em outras, talvez porque deter-
minados tipos de redondezas - e notadamente as circunstancias depres-
sivas dos povoados e cidades do florescente seculo XIX -.-- provocavam,
na realidade, mais desassossego psicol6gico nas pessoas do que outros
tipos de ambientes; ou talvez porque determinados tipos de redondezas
tornavam as pessoas menos capazes de lidar com dependentes pertur-
bados e mais propensos a entrega-Ios a merce de 6rgaos de "controle
social" (inclusive os administradores de asilos) do que antes. Por outro
lado, as diversas institui<;5es que surgiram para lidar com a loucura ao
longo dos seculos dependeram basicamente da manipula<;ao de espa<;o
e lugar, e e por isso que Foucault dedica certa aten<;ao ao que ele chama
a "geografia dos lugares ma~-assombrados" (Foucault, 1967, p.57). A
simples presen<;a de predios aos quais os loucos eram freqUentemente
encaminhados, caracterizados por seus altos e intimidati vos muros,
janelas gradeadas e portas aferrolhadas demonstram 0 uso do espa<;o
como barreira para impor uma distancia entre uma popula<;ao suposta-
mente sa e seus pari as supostamente insanos. Isto significa que 0 processo
hist6rico descrito acima - a cria<;ao e 0 subseqUente desmembramento
das duas categorias, razao e loucura - foi sustentado por e realizado
atraves de uma separa<;ao ao mesmo tempo social e espacial, cujo
Colinas, vales, bosques e jardins eram todos destinados a desempenhar um papel
na administra~ao moral. Ao contemplar essas paisagens rurais e idflicas da
Inglaterra, os IUni:'iticoseram sutilmente impelidos em dire~ao a um padrao
cultural. 0 fato de mulheres pacientes recolhidas no Asilo Fisherton para os
criminalmente insanos arrancarem toda e qualquer flor no minuto em que esta
despontasse acima do solo foi considerado uma psicopatologia muito seria
(Showalter, 1985, p.35-6).
E evidente que meu exame aqui simplifica demais as coisas, uma vez
que, na realidade, havia uma quantidade de diferentes especies de espa~os
institucionais que recolhiam os loucos, cada um deles possuindo deter-
minados tipos de combina~6es locacionais refletindo tipos especfficos
de argumentos a respeito da loucura e seu tratamento apropriado (Philo,
1992a). Porem, como 0 trecho acima de autoria de Elaine Showalter 0
demonstra de forma competente, 0 proprio funcionamento do negocio
de loucos no seculo XIX - 0 objetivo desse negocio e como deveria
ser atingido - mostra que ele era ao mesmo tempo infJuenciado pelos
espa~os e lugares de suas institui~6es competentes e influenciava os
mesmos.
A primeira coisa a ser notada e que uma das verdadeiras raz6es para
a cria~ao da Associa~ao foi a de superar 0 isolamento dos funciomirios
de medicina em asilos, muitos dos quais ficavam efetivamente "presos"
por seus compromissos de residencia a institui~6es afastadas de centros
populacionais (ver a seguir). Em sua circular de 19 de julho de 1841,
Dr. Samuel Hitch, do Asilo do Condado de Gloucestershire anunciou
que seria criada uma Associa~ao, "uma vez que ja se sentira ha muito
ser desejavel que os cavalheiros da medicina ligada a asilos de lunaticos
conhecessem melhor um ao outro" (Hitch, 184 I, citado em diversas
publica~6es, inclusive Outterson Wood, 1896, p.243). Alem disso, tam-
hem com rela~ao a cria~ao da Associa~ao, um tal Dr. Blake fez um
comentario sobre 0 quanto poderia ser realizado pOl' uns "poucos homens
de boa vontade" unidos para combater 0 inimigo da doen~a mental:
pois cada urn vinha trabalhando em isolamento, [quando] cuidar de insanos nao
era urn problema que pudesse ser resolvido por urn unico homem. Aqui, mais
do que com qualquer outro problema, havia a necessidade de uma combina~ao
de uma quantidade de experiencias ao longo de varios anos (Crommelinck, 1843,
citado em Walk e Walker, 1961, p.617).
Vma reuniao foi realizada de forma improvisada na cidade de Glou-
cester em 27 de julho de 184 I, e foi nesta reuniao - e apesar da limitada
presen~a de apenas seis pessoas - que a Associa~ao foi formalmente
instituida e se estabeleceu 0 primeiro conjunto de regras. No decorrer
dos anos seguintes, a existencia da sociedade foi assaz precaria, com
um numero reduzido de reuni6es esporadicas e pouco freqiientadas, mas
logo tentou-se contornar a dispersao geografica dos membros com a
constru~ao de uma biblioteca de "Iivros, esbo~os e folhetos" a cargo
do secretario da sociedade (ao qual os membros poderiam encomendar
exemplares contanto que arcassem com as des pes as de remessa e devo-
lu~ao). Mais tarde, um missivista suficientemente impressionado pOI'
este metoda chegou a recomendar que 0 mesmo Fosse reativado sob 0
fundamento de que isso "propiciaria aos membros, especialmente os
que residiam em areas remotas, um interesse adicional no trabalho da
Associa~ao" (Outterson Wood, 1896, p.249-50). Providencias decisivas
para fortalecer a Associa~ao so foram tomadas depois da reuniao de
1852 em Oxford, e a partir desta data ela apresentou um "crescimento
progressivo" que acarretou tanto" a amplia~ao de seu ambito como 0
aprofundamento de suas raizes" (Kirkman, 1863, p.312).
o detonador do "rejuvenescimento" da Associa~ao (BuckniJl, 1861,
pA-6) durante os primeiros anos de ] 850 foi, indubitavelmente, aprodu~ao de um "boletim interno" atraves do qual os membros isolados
A fim de ser ainda mais especffico com rela~ao a isto, voltar-me-ei para
o que a primeira vista po de parecer uma preocupa~ao improvavel para
a investiga~ao academica: isto e, os "medicos de loucos" ou clinicos
que historicamente organizavam a maior parte do tratamento dado aos
dementes. Os clfnicos (e todos eles eram homens) desempenharam um
papel crucial ao desenvolver conceitos de loucura ou administrando os
asilos publicos que apareceram durante 0 seculo XIX na Inglaterra e
Pais de Gales (e em outras partes do mundo), e um elemento importante
no processo pelo qual eles se tornaram uma "profissao" , com pretens6es
especiais de atacar a afli~ao mental, foi a cria~ao, em 1841, de uma
organiza~ao formal chamada Associa~ao dos Funcionarios de Medicina
em Asilos e Hospitais para Insanos (para detalhes sobre esta organiza~ao,
vel' Hack Tuke, 1879; Hervey, 1985, p.109-13; Outterson Wood, 1896;
Walk, 1978; Walk e Walker, 196 I). A Associa~ao era um fenomeno
altamente intangfvel, e envolvia pouco mais do que 0 compromisso de
seus membros e de alguns fragmentos de trabalhos escritos, e nem e
preciso dizer que seu impacto sobre a paisagem material foi insignificante.
E, no entanto, tambem foi um fenomeno com uma geografia definida:
uma geografia que foi deliberadamente moldada a medida que a Asso-
cia~ao procurava tornar-se um orgao mais integrado, para disseminar
mais amplamente a sua influencia e obter favores nos" lugares certos" .
Examinemos rapidamente esta geografia.
284 Chris Philo 285
I
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podiam manter contato entre si e com os ultimos avanc;os terapeuticos, "' ..• roo ' .;, E
legislativos e administrativos (Anon., 1855, p.3-4: para detalhes da
~C')
'" . E 'I
.0<0 <l.l
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~.~ ~ ~.~ a '"c:publicac;ao vel' Philo, 1987; Russel, 1988, p.299-301; Walk, 1953; Walk, .,- ~ ~ '" <l.lE E ca..c ·z ~ a '" •...'" ., LL o E E;! .'::J
~ ~
0..
1978, p.532-36). 0 resultado foi 0 Asylum Journal, que apareceu pela '" ~~ g'~Q: <l.lII .g 1~ 0 c: •...
",00'0 '" (f)e~~5: ~primeira vez em novembro de 1853 e logo passou a ser 0 Asylum Journal :;:.~ ro e U~ g :5 .0 .gE~~~.:g -E <l.lof Mental Science (em 1856), e depois simplesmente Journal of Mental OJ '" c: ., §E~8~~a IJ) -- r')Ol « 0 E N
Science (em 1859), sendo que as mudanc;as de nome assinalavam 0 Ol «l Il'a '" - C"f«'0 z ~- '-'- -cat'ater cada vez mais academico da publicac;ao e as importantes mudanc;as '" - 0I N ~N ~ - •...
I
<l.l
que aconteciam entao na conceitualizac;ao da perturbac;ao mental. 0 N - E ~~ ,:; N .~
fomento desta publicac;ao pode quase ser descrito como uma deliberada ~ N N N -=
.;,~ - 0 '"
"estrategia espacial", e ela logrou tanto integral' os membros dispersos
~ N .. :::' 00
0' -.,
da Associac;ao como promover a difusao geografica das opinioes da
'ro Cli ~ <>, ro l~
Associac;ao. Como 0 Dr. Charles Lockhart Robertson observou ao as- h - 'u <.>00 .S:!
sumir 0 cargo de editor em 1862: '" <..l'" 0~ '"ro '"as ideias e 0 tom dos artigos publicados no perfodo [1853-62] elevaram consi- "0 ~
deravelmente a posi~ao da medicina psicol6gica inglesa tanto no pafs como no 0 ~•...
exterior. 0 Journal circula agora em nossas co16nias mais distantes, e [oi s6
.0
'"E . 0
neste verao que vim a saber pOl'urn distinto visitante estrangeiro que nao menos <l.l ,g ...E g- -c
do que sete exemplares circulavam na Suecia (Robertson, 1863, p.462). ::E .-
~~ g
Urn dos presidentes da Associac;ao ate chegou a afirmar que nao existia <l.l '" '""0 '"
"discurso ou lingua" no mundo civilizado em que a voz do Journal nao ro~ ~.- ro ~
se fizesse ouvir (Kjrkman, na Reuniao Geral Especial, 1862, p.453-4). g"O 'S'<l.l '" ~
A crescente circulac;ao da publicac;ao caminhava em pat'alelo a cres- '" "'.~
"0 0
~e",
.- •...
'I
"'.0.0'" '0 ltl e Ecente entrada de novos membros na Associac;ao, e pelas listas apensas E'" '0.0 a ""Ol- o E ~ '" ~ <l.l \)E E '" 0 a '"as edic;oes da publicac;ao e possivel acompanhar 0 crescimento do numero Wm -2 E'" Ol ~ E
~ ~ ~
00 .. <l.l '"
de associ ados (cerca de 120 em 1854-5 para cerca de 240 em 1863-4) 'U 1m 0 '" Ol o .-",00'0 o 0 .c ro ~;;::.~ rl .0.0 «i E <.>0e mapear a mudanc;a geografica do quadro dos associados (vel' Figura ~ g :0 E E l::
OJ '" c: Ol Ol .0 ~ ~a tIl --9.1). De muitas maneiras, uma comparac;ao dos mapas para 1853 e para Ol « 0 E E f:! 00) «l 1(0 ..• ~ - '" ~1863 fala pOl' si, no que ela demonstra a "ampliac;ao" eo" aprofunda- «'0 z <l.l .-"0 0_"0 ~
mento" do acima mencionado "ambito" da sociedade. Os pontos que ro <l.lg"O
figuram nesses mapas representam os enderec;os residenciais dos mem- ~ N ~ - ro 0\- o .-
bros da Associac;ao, que na maioria dos casos tambem era onde se
u~~ ro -= ;2- '<l.l
localizavam asilos publicos, e e interessante observar que os medicos ' '
l::"O, , - <l.l ._ ~
\ '" '" S2<l.l <l.l
de loucos estavam conscientes da necessidade de estender sua influencia , •... •... I:l-..- o..~nao s6 a outros asilos mas tambem no dominio publico, alem dos port6es e 0;::?o
dos asilos. Que algum sucesso fora alcanc;ado neste senti do foi indicado '-' .cro«i
pel0 Dr. W.P. Kirkman (1863, p.315) ao mencionar que as func;oes dos "0.0ro ro
"clinicos psicol6gicos" estavam "se tornando, a cada ano, mais intima- u;;:;•• <l.l
mente entrelac;adas com vida social", e ao afirmar que a "esfera de ~"Of-_
nossa atividade" estava ficando "menos limitada ao perimetro de um t
o roZ]
asilo" . 0
A medida que a Associac;:ao crescia para abranger 0 que urn medico
chamou de "urn corpo tao disperso" (Monro, em "Report of the Annual
Meeting, 1864", p.449), certas tens6es geograficas comec;:aram a apare-
eel', todavia, e particularmente, membros da Esc6cia, Irlanda e condados
mais longfnquos da Inglaterra comec;:avam a pensar "que a sociedade
estava se transformando numa sociedade estritamente metropolitana"
(Stewart, em "Report of the Annual Meeting, 1864" , p.451). Este receio
nao era infundado, visto que nos primeiros anos da decada de 1860
interesses poderosos dentro da Associac;:ao estavam pressionando por
"urn predio que seja s6 nosso" ou "amplas salas" em Londres a fim
de proporcionar a sua sociedade "uma existencia mais s6lida do que a
atual" (Monro, em "Report of the Annual Meeting, 1864", p.449).
Ademais, 0 Dr. Henry Monro - 0 presidente da Associac;:ao em 1864-5
- declarou que a sociedade nao deveria nomear para 0 cargo de
presidente os que eram superintendentes de asilos no interior pOl'que
eles "moravam longe demais" :
tendo em vista que eles residem em diferentes partes do pais e longe de Londres,
nao creio que sejam exatamente as pessoas a serem eleitas para preencher 0
cargo de presidente da Associayao ... Acho [que 0 presidente] deve ser urn
cavalheiro que more em Londres (Monro, em "Report of the Annual Meeting,
1863" , p.424-5).
Tudo isso era bastante conveniente para Monro, que era medico
visitante no St. Luke's Hospital em Londres, mas nao era uma recomen-
dac;:aoque agradasse uniformemente ao quadro de s6cios. Por exemplo,
o Dr. Thomas Harrington Tuke respondeu explicando a "grande vanta-
gem" que havia side encontrada na nomeac;:ao de medicos de diferentes
regi6es do pafs (Tuke, em "Report of the Annual Meeting, 1863" , p.426),
enquanto que 0 sucessor de Monro na presidencia - 0 Dr. William
Wood, ele mesmo urn medico visitante do St. Luke's - admitia, ap6s
ter side eleito, que teria side mais apropriado caso "algum cavalheiro
ligado as regi6es do interior tivesse assumido 0 pr6ximo perfodo" (Wood,
em "Report of the Annual Meeting, 1864", p.454).
Urn indicador ainda melhor dessa tensao entre simpatias metropoli-
tanas e nao-metropo1itanas seria encontrada nas acerbas discuss6es que
surgiram em torno do que Wood descreveu "urn assunto de tao grande
importancia para a Associac;:ao" (ibid., p.452): a saber, a escolha do
local para 0 encontro anual da Associac;:ao. Inicia1mentea sociedade fora
afortunadamente "peripatetica" nas escolhas de seus locais de encontro,
visto que na reuniao de Gloucester em 1841 havia sido acordado que
os encontros deveriam coincidir com" visitas [a] serem feitas anualmente
a urn ou mais dos hospitais para insanos no Reino Unido" (citado em
diversas publicac;:6es, inclusive Outterson Wood, J 896, p.244; ver tam-
bem 0 debate em Walk, 1978, p. 536). Ap6s 0 "renascimento" da
Associac;:ao no infcio da decada de 1850 - e apesar de uma infinidade
de intrigas e contend as sobre esta questao -, a tendencia fixou-se
definitivamente em favor de realizar 0 encontro anual em Londres, e
por ocasiao da assembleia de 1851 foi resolvido que "0 encontro anual...
seja no futuro realizado em Londres, no segundo sabado de julho de
cada ano, na Freemason's Tavern (citado em Outterson Wood, 1896,
p.256). E verdade que em 1855 a Associac;:ao aceitara que 0 encontro
poderia realizar-se fora de Londres "em algum municfpio ou cidade
on de haja urn asilo publico ou onde algum outre faro possa atrair os
membros" (Regra XII, acordada no Encontro Anual de 1855, como
relatado em Anon., "Amended Rules", 1855, p.222), mas esperava-se
que a maioria dos encontros ocon'esse na Freemason's Tavern, em
Londres. No entanto, esta tendencia em centralizar as atividades da
Associac;:ao nao deixou de ser desafiada, e este foi notadamente 0 caso
em 1860, quando sustentou-se que urn encontro em Dublin aumentaria
a participac;:ao irlandesa na Associac;:ao e elevaria 0 status (e com isso
estenderia a pnltica) da "medicina psicol6gica" por toda a Irlanda (Flynn
e Stewart, em "Report of the Annual Meeting, 1860", p.27 -8):
voces nos promoveriam, voces elevariam aquele ramo de sua sociedade que vive
na Irlanda, fariam urn imenso bem para os pobres lunaticos ao fazer com que
f6ssemos reconhecidos como funciomlrios da medicina, e voces evitariam 0 que
tern ocorrido algumas vezes - 0 governador de condado nomeando coletores
de impostos da baronia, pessoas destituidas de qualquer status (Flynn, em "Report
of the Annual Meeting, 1860", p.29).
Argumentos semelhantes foram mobilizados quatro anos mais tarde
quando oradores se digladiavam para que Edinburgo sediasse urn en-
contro, mas e evidente que os pedidos formulados aqui para estender a
"esfera de ac;:ao" da Associac;:ao estavam travando uma batalha ingl6ria
contra as reivindicac;:6es propostas para uma reuniao habitual em Londres.
o argumento a favor de Londres tinha duas motivac;:6es basicas, e a
primeira delas refletia a realidade de Londres ser a cidade mais central
e acessfvel do reino, e 0 unico lugar que poderia acomodar, de uma s6
vez, urn grande numero de membros. Oradores como 0 Dr. C. Mountford
Burnett e William Ley demonstraram ser excelentes "analistas locacio-
nais" ao salientar as qualidades de Londres como urn "ponto apropriado" ,
"um grande ponto central" , uma "posi<;:ao central" , e ate" 0 lugar em
que as grandes estradas de ferro se encontram em maior numero do que
em qualquer outro lugar" (Burnett e Ley, em "Report of the Annual
Meeting, 1860", p.26-8). POI' outro lado, outras localiza<;:6es foram
criticadas pOI' sua falta de centralidade e facilidade de acesso, e tanto 0
Dr. Robertson como 0 Dr. Edgar Sheppard se referiram a "deplonivel
reuniao" realizada em Liverpool em 1859 como exemplo da "extrema
dificuldade em organizar um encon,tro interiOl'ano ao pas so que todo
mundo vai a Londres" (Robertson, em "Report of the Annual Meeting,
1862", p.326; Sheppard, em "Report of the Annual Meeting, 1864,
pA52). A segunda serie de raz6es para encontrar-se em Londres refletia
um desejo de se estar perto das "alavancas do poder": um desejo de ser
reconhecido como uma organiza<;:ao grande e capaz pelos burocratas e
polfticos mais influentes do pais, e um desejo de usaI' esta circunstiincia
como um instrumento para determinar mudan<;:as na legisla<;:ao e 0
incremento de atividades rotineiras pOl' parte do estado no campo da
demencia. Em 1858, pOl' exemplo, 0 Dr. Henry Stevens afirmava que:
Ainda ha muito a ser feito para alterar as leis que dizem respeito aos insanos, e
(isto s6 pode) ser feito a contento na metr6pole onde se reunem os homens da
lei. 0 encontro em Edinburgo foi muito agradavel, e nos encontrarmos em Dublin
tambem 0 seria, sem duvida; mas esses encontros nao levaram, em compara9ao,
a nenhuma finalidade pratica (Stevens, em "Report of the Annual Meeting,
1858", p.68).
todos inextricavelmente associ ados com as origens, 0 funcionamento e
o empenho da sociedade relacionando-se tanto com 0 ramo do conhe-
cimento especializado (0 da "medicina psicoI6gica") como a uma va-
riedade particular de poder (0 da "pressao de grupo" profissional).
Devemos admitir que abordamos aqui apenas urn pequeno capitulo da
vasta e freqUentemente tnigica hist6ria da loucura, mas 0 trecho a respeito
dos medicos de loucos continua sendo vital e merece (afinal de contas)
a aten<;:aodo "historiador geografico" .
Dois anos depois, Burnett salientava que" todas as gran des associa<;:6es
se reunem na metr6pole", e deduziu que" deveriamos fazer 0 mesmo
se quisermos ser gran des" (Burnett, em "Report of the Annual Meeting,
1860", p.27-8), enquanto quatro anos mais tarde 0 Dr. T. Kirkman
recordava 0 papel vivificador que Londres havia desempenhado para a
Associa<;:ao "quando os esfor<;:osesponidicos e mais debeis nos condados
haviam sido refor<;:ados pel a conexao eletrica do grande centro de
comunica<;:ao e reconhecimento" (Kirkman, 1862, pA).
o que tudo isto mostra pois e que a Associa<;:ao em q~estao - urn
fenomeno obviamente importante para a hist6ria da 10ucura, mas nao
urn fenomeno que seria habitualmente estudado pelos ge6grafos -
possufa na realidade uma geografia algo complexa. Com efeito, e espero
te-Io demonstrado, os aspectos geograficos aparentemente "simples"
documentados acima -'- a dispersao e 0 isolamento dos membros da
Associa<;:ao, a circula<;:ao do Asylum Journal, a dual "amplia<;:ao" e
"aprofundamento" da "area" da Associa<;:ao, 0 uso de lugares como
nodos dos quais difundir influenciaou onde cultivar influencia-estavam
Uma descri9ao total congrega todos os fen6menos em tomo de urn unico centro
_ urn principio, urn significado, uma mentalidade, uma visao de mundo, uma
configura9ao global: uma hist6ria geral, ao contrario, exibiria 0 espa90 de uma
dispersao (Foucault, 1972, p.l 0),
Varios ge6grafos come<;:aram a determinar as implica<;:6es do pensa-
mento de Michel Foucault para a reelabora<;:ao tanto da geografia aca-
demica propriamente dita como para a teoria social de urn modo mais
geral (Driver, 1985; Philo, 1986, 1992b; Soja, 1989, especialmente
p.16-21), e urn aspecto-chave do que Foucault tern a oferecer aqui
envolve sua pratica do que poderia ser descrito como uma hist6ria
"espacializada" ou ate (com alguma reserva) como uma "hist6ria geo-
grafica" . Minha base inicial para esta afirma<;:ao deriva da introdu<;:ao a
obra A arqueologia do saber (1972), em que Foucault faz uma serie de
observa<;:6es sobre a composi<;:ao da hist6ria academica que (assim
sustentaria eu) envolve urn" tato" para investiga<;:ao hist6rica que deveria
revelar-se agradavel para os ge6grafos. Seus comentarios nesse sentido
sao talvez urn tanto polemicos e exagerados, e e 6bvio que alguns
historiadores (curiosamente os mais limitados e paroquiais dentre eles)
nao garantem os violentos golpes desferidos, mas mesmo assim ainda
e esclarecedor apreciar 0 ataque que ele arma ao que denomina de
historia total e examinar tambem a alternativa a que ele se refere como
historia geral.
No que diz respeito a Foucault:
o projeto de uma hist6ria total e urn projeto que busca reconstituir a forma global
de uma civiliza9ao, 0 principio - material e espiritual - de uma sociedade, a
importiincia de uma epoca, a lei responsavel por sua coesao - 0 que metafori-
camente e chamado a "face" de uma epoca .., [E] sup6e-se que entre todosos
eventos de uma area espa90-temporal bem definida, entre todos os fen6menos
dos quais se acharam trac;:os, se possa estabelecer urn sistema de relac;:oes
homogeneas (Foucault, 1972, p.9).
Este trecho e, c1aramente, urn trecho diffcil, mas a sua mensagem
basica e simples: afirma que uma grande quantidade de ensaios historicos
trac;:am, efetivamente, uma nftida linha em tomo de uma determinada
epoca e de urn determinado lugar (a bem-definida area" espac;:o-tempo-
ral"), e depois julgam que de alguma forma todos os eventos e fenomenos
encontrados no interior deste espac;:o se relacionam uns com os outros
(atraves de urn hipotetico "sistema de relac;:6es homogeneas") ou estao
de alguma maneira ligados pOl' "forma", "princfpio", "importancia"
ou "lei" com urn a todos. Tome, pOl' exemplo, uma exposic;:ao marxista
nao refinada na qual se afirma que (digamos) a Europa do seculo XIII
estava sob controle de urn modo feudal de produc;:ao cuja logic a polfti-
co-economic a determinava tudo que se passava naquela sociedade (desde
o que os camponeses comiam ate as complexidades da teologia medieval):
ou tome 0 tosco relato "Whiggish" no qual se conclui que (digamos) a
Inglaterra vitoriana foi energizada em cada urn de seus poros pOl' urn
zelo cientffico e humanitario destin ado a eliminar todos os remansos de
ignorancia e pobreza. As observac;:6es proprias de Foucault lanc;:am
alus6es validas para uma serie de possfveis abordagens historicas (mar-
xista, "Whiggish", positivista, idealista, estruturalista), mas em cada
caso ele assevera que 0 historiador procede postulando urn "nucleo
central" para 0 perfodo e 0 lugar sob exame - urn nucleo que poderia
en vol vel' as realizac;:6es de uma "grande" figura historica, as tradic;:6es
de uma cultura, as polfticas de urn estado, ou algo parecido - para,
depois de conjectural' sobre determinados efeitos e influencias que
emanam deste nucleo, dar ordem e coerencia a todas as coisas contidas
dentro de urn determinado perfodo e lugar.
Este projeto de historia total e quase urn anatema para Foucault, visto
que os objetivos e estrategias da mesma estao em franca oposic;:ao a sua
propria crenc;:a de que" nada e fundamental: e isto que e interessante na
analise da sociedade" (Foucault, 1982, p.18). Com isso, ele desaprova
a maneira pela qual os historiadores tao freqtientemente suavizam 0 caos
e as "arestas" recortadas da historia ao fazer com que as coisas parec;:am
nitidamente ordenadas e coerentes, e ele desaprova a maneira como eles
patinam sobre as minucias de pequenos detalhes da pequena escala e do
dia-a-dia que podem parecer confusos vistos de uma certa distancia (do
ponto de vista desinteressado do pesquisador) mas que eram a verdadeira
substancia das pr<iticas, lutas, esperanc;:as e receios das pessoas no passado.
Sua propria altemativa e, pOttanto, exigir uma "nova historia" - urn
novo modo de pensar a ser chamado "historia geral" - que aparente-
mente:
fale de series, divisoes, limites, diferenc;:as de nfvel, desvios, especificidades
cronol6gicas, formas particulares de remanejamento, possfveis tipos de relac;:oes
(Foucault, 1972, p.IO).
Nao e facil deduzir dessas observac;:6es exatamente como ele pretende
impedir os historiadores de "deixar que a animada, fragi! e palpitante
'historia' escape pOl' entre seus dedos" , mas 0 proposito de se falar em
"series, divis6es, !imites, diferenc;:as" e provavelmente insistir na acei-
tac;:aodas numerosas linhas que efetivamente separam muitos dos eventos
e fenomenos tao freqtientemente vistos pelos historiadores como indi-
visivos (como elementos nao-diferenciados de urn conjunto mais amplo
e homogeneo). E assim, da-se proeminencia a urn senti do de caos e
"at'estas denteadas" , de confusao e diversidade.
A imagem que Foucault mobiliza para captar 0 carater da historia
geral gira em tomo de "desenrolar 0 espac;:o de uma dispersao" (ibid.,
p.IO), e 0 que ele imediatamente transmite pOl' meio desta imagem
espacial nao e urn "nucleo central" irradiando efeitos e influencias (a
imagem sugerida pela historia total) mas uma planfcie imaginaria sobre
a qual as coisas (eventos e fenomenos) estao dispersos. E neste momento,
pois, que a historia de Foucault se toma "espacializada" , visto que, a
fim de salientar a diversidade da historia, ele se volta para uma imagem
espacial explfcita em que a desigualdade e 0 esparramar de uma "dis-
persao" sao "desenrolados" de uma forma bastante deliberada. Consi-
dero esta especffica t<itica de Foucault altamente sugestiva, e da mesma
maneira acho esclarecedor que 0 historiador Roy Porter escreva sobre
o "mapa dos manicomios" - e ao faze-Io sinaliza tanto a "cobertura
fragmentada" como "a dissipac;:ao desigual" das instituiC;:6es - quando
insiste que a diversidade, mais do que urn sistema coerente, era a
"essencia" das condic;:6es dos asilos nos seculos XVIII e XIX (vel'
acima). A menc;:ao das importantes investigaC;:6es de Porter levanta
inevitavelmente a questao de Foucault estar atento ou nao a dispersao
espacial (a diferenciac;:ao geografica ou de area) em seus proprios e
substanciais estudos sobre desvio de conduta, doenc;:a e loucura, e -
embora em uma entrevista, ele, com efeito, admite a necessidade de
"dar precisao ao espac;:o em questao" - a resposta a esta questao deve
permanecer amplamente na negati va. N a verdade, Porter realmente cri tica
Foucault pela insensibi!idade demon strada em Historia da loucura com
respeito as diferen~as de como as pessoas dementes eram tratadas em
diferentes partes da Europa pre-moderna (Porter, 1987, p.9).
Dito isto, creio que existe de fato uma dimensao na "espacializa~ao"
da hist6ria de Foucault que vai um tanto alem do que 0 simples uso
de uma imagem, e eu diria que suas observa~6es abstratas acerca "do
espa~o de uma dispersao" se conectam diretamente com uma preocu-
pa~ao mais conCl'eta por relacionamentos espaciais. Ao afirmar isto e
necessario observar que, enquanto sua exposi~ao sobre dispersao visa
principalmente enfatizar a diversidade da hist6ria, trata-se tambem de
que ele ve nesta dispersao mais do que um simples caos resistente a
todos os esfor~os de compreensao. 0 que ele ve, na verdade, sao os
relacionamentos espaciais que aparecem na dispersao - embora mo-
mentaneamente - entre coisas (eventos e fen6menos) conforme eles
OCOlTem ou nao pr6ximos uns dos outros no espa~o ou se eles se
juntam uns aos outros de algum modo, ou nao, atraves do espa~o. E
isto e talvez por que ele da a entender que vivemos agora na "era do
espa~o", visto que, para entender 0 mundo social a nossa volta,
devemos pensar espacialmente:
Nos nos encontramos na era da simultaneidade: estamos na era da justaposi~ao,
a era do perto e do longe, do lado-a-Iado, do disperso. Estamos num momento,
creio eu, em que a nossa experiencia do mundo e menos a de uma longa vida
que evolui atraves do tempo [a compreensao temporal ou historicista das coisas]
do que a de uma rede que une pontos (Foucault, 1986, p.22).
Essas insinua~6es ainda poderiam ser interpretadas como pouco mais
do que uma metafora sinalizando um estilo particular de "fazer" pesquisa
social, e claro, mas a possibilidade de que a insistencia de Foucault na
"era do espa~o" signifique mais do que uma metafora esta indicado por
suas ideias quanto ao" problema de situar ou localizar" (0 enganosamente
simples problema de onde as cria~6es humanas estao situadas no espa~o
uma em rela~ao a outra):
Esta questao do sftio humane ou do espa~o de vivencia nao reside simplesmente
em saber se havera ou nao espa~o suficiente [para os humanos] no mundo -
um problema que certamente e bastante importante - mas tambem de saber que
rela~6es de proximidade, que tipos de armazenagem, circula~ao, marca~ao e
classifica~ao dos elementos humanos deverao ser adotados em uma determinada
situa~ao a fim de atingir um determinado objetivo. Nossa epoca e aquela em que
o espa~o toma para nos a forma derela~6es entre sftios (ibid., p.23).
POltanto, a partir de sua imagem abstrata de "0 espa~o de uma
dispersao" passando por suas observa~6es mais conCl'etas acerca de
"rela~6es entre locais" no funcionamento do mundo social, Foucault
oferece, de fato, urn "tato" por hist6ria que agrada aos ge6grafos.
Alem do mais, ate mesmo uma eventual olhada em muitas das
substanciais investiga~6es hist6ricas de Foucault sobre fen6menos com-
plexos e freqUentemente intangfveis como loucura e razao, doen~a e
medicina, desvio de comportamento e disciplina mostra que ele atribui
aos relacionamentos espaciais - a distribui~ao e arranjo de pessoas,
ideias, atividades, institui~6es e edifica~6es no espa~o - urn papel
central nos processos hist6ricos sob exame. Em Historia da loucura, ele
tira varias conclus6es do que ele denomina "a geografia de lugares
mal-assombrados" (Foucault, 1967, p.57), como brevemente indicado
anteriormente, e em 0 nascimento da clfnica (1976) ele trata de tres
formas diferentes de "espacializa~ao" envolvidas em nosologias de
doen~a, nas priticas de investiga~ao pato16gica e na disponibilidade de
instala~6es medicas ou "centros de cura" (e e fascinante especular com
que se pareceria uma geografia medica informada por este texto).
Enquanto isso, em Vigiar e punir, ele investiga a no~ao de que" disciplina
provem da distribui~ao de indivfduos no espa~o" (Foucault, 1977, p.141),
e tambem examina detalhadamente 0 controle ffsico e psicol6gico sobre
os seres humanos levado a cabo pela manipula~ao de relacionamentos
espaciais no famigerado "Panopticon" de Jeremy Bentham (uma insti-
tui~ao disciplinar do tipo ideal dos ultimos anos do seculo XVIII que
teve grande influencia no projeto de subseqUentes pris6es, casas de
corre~ao e asilos). A primorosa disseca~ao de Foucault das estrategias
espaciais empregadas por administradores de institui~6es para isolar,
maximizar a visibilidade e tratar de modo uniforme as vidas dos internos
ja interessou varios ge6grafos (ver Dear, 1981; Driver, 1985, 1993a,
1993b; Philo, 1989), mas menos aten~ao foi dedicada ate 0 momento a
sua exposi~ao das (por exemplo) estrategias espaciais empregadas na
transferencia de leprosos, luniticos e outros indesejaveis para casas
situadas alem dos port6es da cidade ou em "abrir" corpos a um olhar
medico atento, no infcio do seculo XIX. Nao posso evidentemente fazer
aqui mais do que indicar rapidamente os conteudos dos textos de Foucault,
mas gostaria de acrescentar que (ate onde Foucault especifica "princf-
pios" mais amplos que organizam suas hist6rias) ele avalia serem os
relacionamentos espaciais que exp6e - as inumeras intera~6es e mo-
vimentos de pessoas, ideias, atividades e assim pOI'diante - na essencia
relacionamentos de conhecimento e poder: relacionamentos envolvidos
na produ~ao e na subseqUente difusao de conhecimento a respeito de
determinados assuntos, e ao mesmo tempo relacionamentos constitutivos
de poder pelos quais grupos sociais especfficos imp6em sua vontade a
outros ou (menos declaradamente mas talvez ate mais significativamente)
pelos quais uma "visao" geral de ordem e transmitida e inculcada nos
membros de uma popula~ao. E este cuidado para com os relacionamentos
espaciais construfdos no conhecimento e no poder que informou meu
estudo acima sobre os medicos de loucos, visto que meu proposito era
mostrar como os medicos de loucos moldavam a sua propria geografia
a fim de alimental' a ciencia mental e exercer influencia profissional
sobre uma esfera problematica da realidade social (perturba~ao mental
e suas tendencias desagregadoras).
Nao quero concluir dando a impressao que a obra de Foucault se
constitui na ultima palavra sobre 0 que uma historia "espacializada"
pode trazer, em parte pOl'que seus esfor~os em tratar de espa~o e lugar
nao sao de modo algum consistentes ou sistemaricos. Alem disso,
poder-se-ia objetar que ele nao pesa suas observa~6es quanto a espa~o
de forma similar a sua aguda percep~ao do lugar, no que - para dar
urn exemplo - ele poder ser sensfvel a "geometria" no interior de urn
asilo (a configura~ao de quartos, corredores, escadas e janelas), e ainda
assim continuar insensfvel a "geografia" externa do asilo (a sua situa~ao
em meio de campos ou fabricas; a sua localiza~ao ser mais em uma
determinada parte do mundo do que em outra), Essas obje~6es nao tern
por objetivo, POl'em, diminuir 0 brilho dos insights de Foucault, nem 0
das varias possibilidades que ele abre para uma forma "espacializada"
de investiga~ao historica ciente do que relacionamentos espaciais (se
nao tanto associ ados com fugar) rea/mente fazem na historia. Se estou
certo em minha avalia~ao geral de que os esfor~os das geografias
historicas de hoje em dia estao mais proximos do espirito do que uma
vez se chamou de "historia geografica" do que propriamente de uma
geografia historica limitadamente concebida, e se isto significa que
estamos agora colocando quest6es acerca da influencia da geografia em
toda a sua" riqueza" (em sua infinidade de aspectos de espa~o, lugar,
ambiente, localiza~ao, regiao, distribui~ao, dispersao), sobre toda sorte
de importantes mas nao imediatamente tangiveis processos historicos,
entao os geografos historicos terao tanto algo a aprender com os escritos
historicos de pessoas como Foucault, como algo a ensinar-lhes tambem.
Driver, Derek Gregory, Ron Martin, Miles Ogborn, Jenny Robinson e
Graham Smith, Gostaria de agradecer tambem a Maureen Hunwicks e
Caron McKee pOI' terem datilografado as minutas deste capitulo e a
Miles Edwards pel a prepara~ao dos mapas,
Escrever este capitulo nao foi tarefa faci], e devo agradecer a ajuda,
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(arg.), Geography in the Twentieth Century (Londres: Methuen, 3a ed.), p.463-99.
Indice remissivo
Nota: este fndice se encontra em ordem alfabetica; referencias a paginas em iuilico
indicam tabelas ou figuras; tftulos dos artigos sao mostrados em negrito.
Aberyswyth, escola, 272
acumula~ao tlexfvel, 253, 262-3, 264-6
Adorno, T.W., 105
Afeganistao, 201
Africa do SuI, 192, 194, 195, 197,201
Africa:
sub-saariana, 136, 201-2
sob imperialismo britanico, 194,
195
agricu1tura:
nativa,206
nova tecnologia, 135-6, 142
ajustamento estrutural, 201
aliena~ao, 79-80, 238-9
Alsacia Lorena, 219, 221
Althusser, L., 13, 104
ambiente, 125-58
imperialismo ecol6gico, 204-5
avalia~ao ambiental (AA), 147-52
contlito

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