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Os Impactos Socioeconômicos e Ambientais do Programa Grande Carajás

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UNIVERSIDADE FEDERAL DO PARÁ
CAIÊ CUNHA RELVAS
SAMANTA DA SILVA SOUZA
WENDELL DA COSTA MAGALHÃES
OS IMPACTOS SOCIOECONÔMICOS E AMBIENTAIS DO PROGRAMA GRANDE CARAJÁS
Belém – PA
2015
CAIÊ CUNHA RELVAS
SAMANTA DA SILVA SOUZA
WENDELL DA COSTA MAGALHÃES
OS IMPACTOS SOCIOECONÔMICOS E AMBIENTAIS DO PROGRAMA GRANDE CARAJÁS
Trabalho apresentado na Universidade Federal do Pará, no curso de Economia, para a obtenção de nota na disciplina de Economia Amazônica, ministrada pelo professor Doutor Gilberto de Souza Marques.
Belém – PA 
2015
INTRODUÇÃO
Em 1974, a criação do Programa de Polos Agropecuários e Agrominerais da Amazônia (POLAMAZÔNIA) evidencia, mais flagrantemente, que política de desenvolvimento, por parte do Estado brasileiro, iria predominar para a região amazônica ao longo dos anos. Depois do início da integração da região ao resto do país via rodovia – com a construção da Belém-Brasília na década de 1950 – no intuito de fazê-la fornecedora de matérias-primas e consumidora de manufaturas, na década de 1970 ganha corpo o seu caráter de província energético-mineral, com o objetivo de fazer frente à necessidade do governo militar de manter as taxas de crescimento da economia nacional e de cumprir suas obrigações em termos de dívidas, internas e externas, através do aumento das exportações e da consequente acumulação de divisas.
O Programa Grande Carajás (PGC) vindo na esteira desse processo, iniciado formalmente a partir do Decreto-lei nº 1813, de 24.11.1980, dá maior sentido ao POLAMAZÔNIA, pois elege determinada área que abrange parte dos estados do Pará, Maranhão e Tocantins, para concentrar investimentos via incentivos estatais tributários e financeiros, e assim transformar aquele espaço em lugar de extração de recursos, sobretudo minerais, para a exportação. Porém, não se resumindo a isso, o PGC atua em três grandes frentes que envolvem um conjunto de projetos mínero-metalúrgicos, projetos agropecuários e florestais e um grupo de projetos de infraestrutura (ferrovias, rodovias, portos e barragens). Esses projetos ancoram-se no pressuposto de que trarão desenvolvimento para a região e para o restante do país através desse desequilíbrio provocado pela concentração espacial de capitais que seria capaz de modificar atividades por meio de uma cadeia de ligações, a jusante e a montante, das atividades produtivas consideradas chaves. (Monteiro, 2005, p. 145-148)
A medida que o PGC vai se concretizando, traz consigo uma série de impactos socioeconômicos e ambientais para a região que, em sua maioria, não recebem a devida atenção. Os diversos setores da sociedade que, ainda hoje, alertam a respeito desses impactos, frequentemente não são ouvidos, pelo contrário, são até combatidos. No passado, este combate contra toda forma de oposição ao que se pensava implantar em Carajás tem como exemplo o ocorrido com a Guerrilha do Araguaia, ou com a criação e atuação do GETAT (Grupo Executivo de Terras do Araguaia-Tocantins). A própria forma como nasce o Programa já diz bastante de seu caráter autoritário, como bem explica José Helder Benatti (1997), 
A própria instalação autoritária do PGC, em 1980, reflete a política centralizadora e de caráter militar, segundo a qual foi concebido nos anos de 1970. Para a implantação dessa política, os governos militares utilizaram-se de decretos-leis, o que significava, na prática, a exclusão do poder legislativo federal, estadual e da sociedade civil brasileira da discussão e implementação de políticas públicas. O decreto-lei foi um instrumento jurídico criado pelo Regime Militar, e por ser de lavra exclusiva do Poder Executivo, é uma usurpação das prerrogativas do Poder Legislativo, fazendo com que a elaboração e aprovação se restringisse aos gabinetes palacianos. (BENATTI, 1997, p. 80)
Portanto, a partir desse contexto aqui traçado, pretende-se avaliar os impactos no âmbito social, econômico e ambiental gerados por esse grande programa que se estabelece na Amazônia no ano de 1980, mesmo tendo seu sentido de ser surgido bem antes, acabando formalmente em 1992, mas deixando severas consequências ao longo de toda a sua efetivação, consequências estas que persistem ainda hoje, em plena segunda década do século XXI.
OBJETIVO
Elencar e analisar os impactos socioeconômicos e ambientais deixados pelo Programa Grande Carajás desde o início de sua implantação, em 1980, passando pelo seu término formal em 1992, até chegar aos dias de hoje, já que o programa pode ter se encerrado, mas sua concepção de desenvolvimento e as práticas derivadas desta ainda vigoram na região amazônica como resultado do que o programa se propôs a fazer.
METODOLOGIA
A análise dos impactos socioeconômicos e ambientais do Programa Grande Carajás se embasará em pesquisa e revisão de material bibliográfico que trate da implantação do referido Programa, de sua história, e dos resultados colhidos pela população dos Estados de sua abrangência, pelo Governo brasileiro e pelos grupos econômicos ligados ao Programa. Fazendo isso, visa-se ter um panorama dos diversos impactos gerados pela implantação do Programa Grande Carajás.
RESULTADOS
Contextualização Histórica do Programa Grande Carajás
Na análise do que foi o Programa Grande Carajás (PGC), buscando entendê-lo em sua maior dimensão e profundidade, é preciso resgatar a história antes mesmo de seu início formal em 1980, pois tal Programa está inserido em um contexto maior que envolve diversos interesses políticos e econômicos que abarcam o Estado, o capital regional, o capital nacional e o internacional.
Portanto, envolvendo o Programa Carajás em um esquema maior de análise, podemos dizer que ele é produto da inserção da Amazônia nos objetivos de acumulação capitalista nacional e internacional, pertencendo à era dos grandes projetos na Amazônia. Um grande responsável por assim o ser é o governo militar, instaurado em 1964, e a criação de sua política de desenvolvimento para a região. Entretanto, antes mesmo dos militares assumirem o poder através de um golpe, estudos a respeito dos recursos minerais que a Amazônia possuía com potencial de abastecer o mercado externo, já estavam sendo feitos e parte das reservas encontradas estavam sendo possuídas por grandes empresas de fora da região, haja vista o empenho destas em rastreá-las. O primeiro exemplo dessa realidade se deu em 1945, quando foram descobertas as reservas de manganês no Amapá, mais particularmente na Serra do Navio. No caso, quem deteve o direito de explorar o mineral foi a mineradora Icomi, subsidiária da multinacional norte-americana Bethlem Steel. (MARQUES, 2009 apud MARQUES, 2012, p. 34)
Esse é só um exemplo de como o projeto – que se consolidou posteriormente – de fazer da Amazônia uma província energético-mineral a serviço do capital externo, principalmente, iniciou-se antes mesmo dos militares chegarem ao poder. O Programa Grande Carajás, como bem veremos, é resultado de todo esse processo, e não se explica sem ele. Logicamente que, depois dos militares assumirem o poder, as pesquisas sobre a região se intensificam. O Projeto Radam (Radar da Amazônia), por exemplo, é parte dessa etapa de mapeamento das riquezas amazônidas. Ele era responsável por fazer o levantamento aeroradarmétrico de 1,5 milhões de quilômetros quadrados da região, visando a ocorrência de minérios. (MARQUES, 2010, p. 80)
Porém, antes mesmo da implantação do Projeto Radam, que passou a operar somente a partir de 1970, descobriu-se em 1967 as reservas de ferro da Serra Arqueada (Carajás). Em 1968, a região de Carajás começou a ser estudada pela CVRD (Companhia Vale do Rio doce). Já em 1970, esses estudos passam para a mão da Amza (Amazônia Mineração S/A) que era formada pela CVRD, que detinha 50,9% das ações, e pela United States Steel, detendo 49,1% das ações, consequentemente. (Ibid., p. 78)
A partir daí, o que se viu, por parte do governo brasileiro, foi uma progressiva
abdicação da tutela dos recursos minerais da Amazônia em favor do setor privado industrial. Isso foi feito através de uma série de medidas e ações institucionais que incluíam a redefinição da legislação mineral e a fixação de diretrizes para este setor. Dentre essas medidas, a mais escandalosa era a que estava expressa no art. 168 da constituição de 1967 definindo as jazidas, minas e demais recursos minerais, e os potenciais de energia hidráulica como propriedade distinta do solo quando se tratasse de exploração ou aproveitamento industrial. Isso abriu precedente para a aprovação do novo Código de Minas (1967) que implantou o regime res nullius, no qual o subsolo não tem dono, no lugar do regime de acessão, em que as jazidas pertencem ao proprietário do solo. (ibid., p. 79)
Nesse sentido, nos anos de 1970 surge o projeto de alumínio (Trombetas e Albrás/Alunorte) e Ferro-Carajás. Dois projetos que implicavam na concentração de uma grande soma de investimentos na região amazônica, criando, para o futuro, uma estrutura que ampararia os sucessivos grandes projetos que ainda estavam por vir, como o próprio Programa Grande Carajás. No que diz respeito ao projeto Ferro-Carajás, por meio de negociação dos dirigentes da CVRD – que visavam os mercados asiáticos, principalmente, e assim tornar o Brasil um grande polo exportador de minério de ferro - esse projeto tornou-se de exclusiva responsabilidade da CVRD em 1977, através das compras das ações pertencentes à United States Steel e da consequente saída do negócio desta. Tal fato só foi possível pela empresa americana querer se limitar a abastecer, através do Ferro-Carajás, o Leste Estadunidense e suas siderurgias. Daí que, quando a CVRD propõe a ampliação do negócio através da construção de um grandioso projeto logístico que atingiria destinos asiáticos, e a US Steel se nega a embarcar na empreitada, aquela propõe que esta venda suas ações, o que é o que acaba acontecendo. (FARO et al. 2005, p. 127)
No financiamento desse complexo logístico que era o Projeto Ferro-Carajás, três grandes atores merecem destaque, segundo Eliezer Batista, presidente da CVRD na época da implantação do referido projeto: Banco Mundial, a Comunidade Européia (do Carvão e do Aço, na época) e o KFW (Banco de Desenvolvimento da Alemanha Federal). (Ibid.,133) Bennati (1997) detalha melhor esse aspecto dizendo que um dos financiadores do Projeto Ferro Carajás foi
o Banco Mundial que interveio no co-financiamento juntamente com os bancos comerciais; empréstimos japoneses; créditos europeus ligados à Comunidade Européia do Carvão e do Aço, e um empréstimo dado pelo Banco de Desenvolvimento da Alemanha Federal (KFW); financiamentos para aquisição de equipamentos dos EUA – Eximbank na Europa e no Japão; um euro-prêt de US$ 30 milhões, empréstimo realizado por um consórcio de bancos dirigidos por Morgan Quaranty Trust; e instituições de crétidos brasileiras que completaram o empréstimo para o projeto (BENATTI, 1997, p. 83- 4).
Em 1980, como já citado, tem início oficialmente o Programa Grande Carajás, através do Decreto-Lei nº 1813, de 24.11.1980. Nesse momento, passadas as sucessivas crises do petróleo na década de 1970, o Estado brasileiro encontrava-se grandemente endividado e necessitando acelerar os projetos de extração de matérias-primas destinadas para exportação, concebidos nas décadas passadas, no intuito de gerar divisas que fizessem face às dívidas contraídas. O Programa incluía um regime especial de incentivos tributários e financeiros para empreendimentos localizados em sua área de atuação. Sua estrutura administrativa era formada por um conselho interministerial composto por representantes da Seplan-PR, Ministério das Minas e Energia, Transportes, Indústria e Comércio, Fazenda, Interior, Agricultura, Trabalho, Ciência e Tecnologia e Reforma e Desenvolvimento Agrário, sem contar a Secretaria Geral do Conselho de Segurança Nacional. A presidência desse conselho era ocupada pelo ministro chefe da Seplan, vinculado à Presidência da República. (COTA, 2007; LÔBO, 1996 apud MARQUES, 2010, p. 81)
A área de influência direta do PGC alcançou 895.265 km² que equivalia a 10,6% do território brasileiro e mais de 240 municípios do Maranhão, Pará e Tocantins. Por nela conter vários tipos de minérios como ferro, bauxita, ouro, níquel, cobre, manganês, cassiterita e outros minerais não-metálicos, as atividades que se desenvolveram nessa região foram amplamente diversas. Mas não só de atividades minero-metalúrgicas viveu essa região, como indicado na introdução deste trabalho, o PGC atuou em diversas frentes como as obras de infraestrutura que incluíam as ferrovias, rodovias, portos e barragens. Podemos destacar nessa frente, em particular, a hidrelétrica de Tucuruí, construída para abastecer, com energia subsidiada, o complexo de alumínio Albrás/Alunorte, que compõe a frente minero-metalúrgica do Programa. Destaca-se também a própria Estrada de Ferro Carajás (EFC), ferrovia inaugurada em 1985 que tinha como projeto inicial uma extensão de 892 km que transportaria 35 milhões de toneladas anuais de minério de ferro, sob a forma de ferro gusa. Hoje, o trem que sai da da Serra dos Carajás e vai até o Porto de Ponta de Madeira, detém 320 vagões e sua estrada tem 3,5 km de extensão. (IBASE, 2014; SANTOS, 2009)
Como exemplo dos outros projetos que atuaram nas mais diversas frentes do PGC, temos a Mineração Rio do Norte, com a pretensão de exportar, na primeira metade da década de 1980, 3,4 milhões de toneladas de bauxita por ano; a Alunorte com uma produção de 800 mil toneladas de alumina por ano; a Albrás com 320 mil toneladas de alumínio anuais; Alcoa com 500 mil toneladas de alumina por ano e 100 mil toneladas de alumínio por ano etc. (IBASE, 1983, p. 58) 
Impactos Socioeconômicos e Ambientais do PGC
Um dos primeiros impactos ocasionados pelo Programa Grande Carajás é no nível de emprego do setor mineral. Com base numa elevada composição técnica de capital – maior emprego de máquinas e equipamentos em relação ao emprego de mão de obra – que tinha como objetivo reestruturar a produção, o Programa tem sua infraestrutura básica preparada para iniciar os trabalhos em 1983: instalações industriais, equipamentos de lavra, beneficiamento e manuseio do minério, além das usinas de britagem primária e secundária (IBASE, 2014, p. 17). A CVRD, como uma das principais companhias desse programa, explicita bem esse fenômeno se observamos sua progressiva redução no índice de empregados, ao longo de sua atuação. Fenômeno este que tem prolongamento mesmo depois do encerramento formal do Programa Grande Carajás em 1992.
A partir de uma pesquisa feita pelo IBASE (2014) – baseada em observação in loco, entrevistas, pesquisas científicas e levantamento de indicadores – visando analisar os resultados deixados pelo PGC depois de 30 anos de sua instalação, se detectou 7 impactos econômicos locais, positivos e negativos, deixados pela mineração. Dentre os positivos, encontra-se o aumento da arrecadação municipal, que tem como principal fonte a CFEM (Compensação Financeira pela Exploração Mineral), também conhecida como royalty da mineração. No ano de 2012, se chegou a obter R$1,834 bilhão com a CFEM, passando, em 2013, para 2,376 bilhões, ou seja, um aumento de 29,5%. Como principal imposto municipal, 65% da CFEM, que incide sobre a receita líquida da empresa, são repassados para o município produtor do mineral. No entanto, se comparada às receitas obtidas pela mineradora, o ganho obtido com a CFEM é pequeno, já que sua maior porcentagem incidente sobre a receita líquida é de 3%, o que no caso do minério de ferro é 2%.
Outro impacto positivo, já relativizado neste trabalho, é a criação de empregos. Apesar de um discurso que promove a mineração com base nesse impacto nas regiões mineradoras, esta atividade, se comparada com tantas outras atividades econômicas, é bastante limitada pois não envolve um emprego intensivo de mão de obra, mas sim de máquinas e equipamentos, além de não criar uma cadeia produtiva complexa
que gere tantos outros empregos indiretos que apoiem a atividade principal, pois esta não promove os beneficiamento de seus produtos, limitando-se a exportá-lo em estado bruto ou pelotizado.
Como último impacto econômico positivo local, destaca-se a expansão do mercado de bens e serviços locais, que encontra sua razão de ser na migração para as cidades pequenas e médias em que costumam se instalar as atividades mineradoras.
Passando para os impactos negativos locais, destacam-se quatro. Primeiro temos a concentração de renda. Esta é colocada como consequência inevitável da atividade mineradora, já que o próprio objetivo da mesma é acumulação de capital por parte da empresa e de seus acionistas. Tal impacto é considerado negativo pelo fato de beneficiar pequenos grupos e não gerar maiores encadeamentos econômicos, não contribuindo para o desenvolvimento local, nem nacional. Por isso, é necessária a intervenção do poder público incentivando a distribuição de renda.
Segundo, temos os gastos com a criação e manutenção da infraestrutura de estradas que não são compensados pela baixa porcentagem do CFEM. Isso acontece pelo fato de muitas minas utilizarem, parcial ou integralmente, o modal rodoviário para efetivar o transporte de seus produtos, diminuindo a vida útil das estradas, deteriorando-as, causando diversos acidentes deixados para o erário arcar, já que o que se arrecada com a mineração não é suficiente para cobrir esses custos.
O terceiro impacto destacado se refere às propriedades vizinhas à área da jazida que podem perder valor comercial, pois devido aos impactos negativos gerados pela instalação de uma mina, como a poluição sonora e aérea, o valor imobiliário das regiões vizinhas pode cair, prejudicando a população que vive próxima das minas.
Por fim, o quarto impacto econômico negativo local se refere ao custo de oportunidade envolvido na renúncia ao incentivo de outras atividades econômicas. É destacado que existe um custo na opção dos governos locais, estaduais e do governo federal ao incentivarem a exportação mineral, renunciando aos benefícios a serem gerados por outras atividades, como por exemplo, se se incentivasse a diversificação produtiva local. Além disso, pode-se dizer que ao exportar o minério de ferro em estado bruto, pelotizado ou em sinter-feed, as empresas e o Estado renunciam aos benefícios a serem gerados pela industrialização destes bens. Existe também o custo de oportunidade envolvido na pequena taxa de royalties da mineração, que renega uma renda possivelmente maior que poderia encadear outros investimentos.
Ainda na pesquisa do IBASE (2014), se detectaram oito impactos socioculturais locais negativos, não se detectando, em contrapartida, impactos socioculturais positivos. Dentre estes, cita-se o dumping social e ambiental, que envolve a negociação das empresas mineradoras com o governo para que se diminua e se flexibilize as exigências sociais e ambientais requeridas dos seus projetos. Temos também a superexploração do trabalho na cadeia produtiva do minério de ferro e em outras ligadas ao minério, com maior destaque para a produção de carvão vegetal, requerido como insumo da produção de ferro-gusa. O aumento do tráfego local, devido ao contingente populacional excessivo que se desloca para áreas próximas a mineração, é outro ponto negativo ressaltado. O aumento dos riscos de acidente de trabalho, sobretudo nas minas subterrâneas, é o quarto ponto levantado. Como evidência disso, cita-se as 11 mortes de trabalhadores, no ano de 2011, em acidentes nas minas a céu aberto da Vale, antiga CVRD.
Além desses quatro primeiros pontos, o IBASE (2014) destaca como impacto sociocultural local negativo o reassentamento de populações residentes próximo às minas, causando para as comunidades em quebra da rede de sociabilidade, destruição da cultura imaterial, mudanças nos hábitos e tradições dos grupos etc. Destaca também a destruição de formas de produção tradicionais, deslocamento de grandes contingentes populacionais para as cidades próximas às jazidas, o que pode resultar em aumento da violência urbana, da especulação imobiliária e dos preços relativos. E, por fim, cita-se a inviabilização de formas tradicionais de viver, estar e produzir.
Assim como não existem impactos sociais locais positivos, obviamente não existem impactos ambientais positivos causados pela mineração. É o que destaca o IBASE. Como impactos ambientais negativos, elenca-se a poluição aérea causado por pó decorrente do transporte do mineral, o que pode causar doenças respiratórias e de pele na população; a construção e manutenção de represas de rejeito, que, por vezes, depois de encerrada as atividades nas minas, fica a cargo do município e submete a população ao risco de ser atingida pelo seu rompimento, já que fica incumbida de armazenar grande quantidade de rejeito da atividade mineral; contaminação, destruição e assoreamento de rios e reservatórios de água, que é provocado pela quantidade de rejeitos produzidos pela extração mineral e que é depositada nos rios, contendo elementos tóxicos, e pela necessidade de rebaixamento de lençóis freáticos para realizar a extração; poluição sonora causada por explosões e movimentação de carga, que é agravada pela utilização de transporte ferroviário; destruição de sítios arqueológicos, provocada pela remoção de milhares de toneladas de terreno para extração de minerais; remoção de biomas no local da cava, de onde é retirada toda a cobertura vegetal impactando em biomas muito específicos e raros, como a canga ferrífera; e, por fim, a utilização de água para transporte, drenagem em minerodutos e separação do minério, requerendo enormes quantidades do líquido.
O trabalho do IBASE (2014), na medida que faz todos esses apontamentos a respeito da mineração, com o levantamento desses impactos na esfera econômica, social e ambiental, trata, concomitantemente, dos impactos gerados pelo PGC, pois o mesmo teve na mineração sua principal frente de atividade. Porém, para além dos elementos já apontados, destacamos também o progressivo aumento do desmatamento na região por conta da necessidade de produção de ferro-gusa que tem como insumo básico o carvão vegetal, conseguido com a extração madeireira. Nesse sentido Philip Fernside, um professor do Instituto Nacional de Pesquisa da Amazônia (INPA) aponta, por meio de estudos, que para produzir 2,8 milhões de toneladas de ferro gusa por ano, as indústrias necessitariam de 2,3 milhões de toneladas de carvão, o que provoca um corte de mil quilômetros quadrados de floresta amazônica. (SUTTON, 1994, p. 64 apud SANTOS, 2009, p. 8)
Toda essa devastação através do desmatamento e da plantação de mudas de eucalipto para a produção de carvão vegetal, foi complementada por atividades madeireiras e projetos pecuários interligados ao PGC. Corroborando o que aponta o IBASE (2014) no levantamento dos impactos ambientais promovidos pelo PGC e pela atividade da mineração, Santos (2009) diz: 
Os desmatamentos provocaram, no decorrer do tempo, anomalias no comportamento de rios e riachos, secando muitos deles; numa reação em cadeia, a flora natural também sofreu muitas transformações, juntamente com as espécies animais, insetos e peixes; o subsolo, igualmente, sofreu interferências com a presença de produtos químicos e metais pesados. No conjunto, o resultado da ação das indústrias provocou, assoreamento e poluição de rios, assim como a própria atmosfera, pela emissão de gases nocivos. (SANTOS, 2009, p. 9)
Por fim, podemos concluir com a provocação feita por José Jonas Borges da Silva, do MST, em entrevista concedida por ocasião do evento Seminário Internacional “Carajás 30 anos: resistências e mobilizações frente a grandes projetos na Amazônia Oriental”, na Universidade Federal do Maranhão, em São Luís, entre os dias 5 e 9 de maio. Apesar de ressaltar os impactos do PGC no Maranhão, em especial, a provocação é válida para o entendimento do que este programa deixou para toda a área de sua influência: 
O PGC acabou, mas apenas no campo legal,
afinal, o projeto, enquanto ideia foi realizado, foram implementadas iniciativas econômicas em todas as áreas que compõem o PGC, temos hoje, o cultivo de eucalipto, numa proporção gigantesca em relação a outras produções agrícolas no Maranhão, com impactos negativos em todos os aspectos; temos a prática da pecuária extensiva, que destitui as famílias camponesas das possibilidades de trabalho e vida; temos ou tivemos a extração da madeira de forma irracional (digo tivemos porque o Maranhão, por exemplo, já sofre com a falta de madeira em algumas áreas); temos a siderurgia como um setor consolidado, com práticas produtivas plausíveis de questionamento.
Enfim, o PGC é tão real que dispensa o seu reconhecimento legal, pois se materializou realmente, com todas as mazelas e problemas para a sociedade e para o meio ambiente. A característica mais importante desse processo é a disputa por território, pois intensificou a grilagem de terras na região expulsando milhares de famílias do campo, levando-as a migração forçada do campo para as cidades e para outros estados, assim como, provocou o agravamento das condições de trabalho no campo e o agravamento da questão indígena no Maranhão.1Entrevista disponível em: http://www.ihu.unisinos.br/noticias/530505-o-que-significou-para-a-regiao-e-a-quem-beneficiou-o-programa-grande-carajas-30-depois-de-sua-implantacao-na-regiao-amazonica. Acessado em: 09/11/2015.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
Conclui-se que o Programa Grande Carajás, ao aprofundar a realidade, que se deu com os grandes projetos, de transformar a região em uma grande colônia enérgético-mineral, fornecedora de matérias-primas e produtos semielaborados para o resto do mundo, provocou e continua a provocar profundos impactos sociais, ambientais e econômicos, que relegam à região a continuar a ser mero espaço de saque, como assim se projetou desde o início de sua colonização.
O curioso é que, apesar de a realidade amazônica se configurar como algo caótico e complexo, de difícil transformação para o bem do povo que aqui vive, esforços não cessam de aparecer no sentido de se viabilizar grandes projetos que aprofundem e recrudesçam a retirada de riquezas de seus solos para a contínua valorização e acumulação do capital que se encontra distante dela. A grande obra de engenharia que foi o Projeto Ferro Carajás é só um dos exemplos que sinalizam essa realidade.
Há que se destacar, entretanto, que grande parte do que se fez na região para lhe dar utilidade como fornecedora das mais vastas riquezas, foi com o aval do Estado Brasileiro, que diz tutelá-la. Portanto, os descasos responsáveis por tantos impactos negativos do PGC, desnudados aqui neste trabalho, requerem que o Estado assuma seu papel como protetor e promotor do bem-estar do povo amazônida, e não somente do promotor, como o foi quase sempre através de amplos subsídios e incentivos, da acumulação de capital.
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
BENATTI, José Helder. Carajás: desenvolvimento ou destruição. In. COELHO, Maria Célia Nunes, COTA, Raymundo Garcia (Org.). Dez anos da estrada de Ferro Carajás. Belém: UFPA/NAEA, 1997. p. 79-106
COELHO, Maria Célia Nunes, COTA, Raymundo Garcia (Org.). Dez anos da estrada de Ferro Carajás. Belém: UFPA/NAEA, 1997. p. 79-106
COTA, Raimundo G. Carajás: a invasão desarmada. Cametá – PA: Novo Tempo, 2007.
FARO, L. C.; POUSA, C.; FERNANDEZ, C (Org.). Conversas Com Eliezer. Insight Engenharia de Comunicação. 2005. 
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LÔBO, Marco Aurélio Arbage. Estado e capital transnacional na Amazônia: o caso da ALBRÁS – ALUNORTE. Belém: NAEA, 1996.
MARQUES, Gilberto. A incorporação amazônica no desenvolvimento capitalista brasileiro. In: TRINDADE, José R.; MARQUES, Gilberto (orgs). Revista de Estudos Paraenses, edição especial – IDESP. Belém: IDESP, 2010.
MARQUES, Gilberto. Amazônia: uma moderna colônia energético-mineral? Revista Universidade e Sociedade, ano XXI, n. 49, jan 2012. Brasília: ANDES-SN, 2012.
MARQUES, Indira. Território Federal e mineração de manganês: gênese do Estado do Amapá. Rio de Janeiro: UFRJ, 2009 (Tese de Doutorado).
MONTEIRO, Maurílio. Mineração industrial na Amazônia e suas implicações para o desenvolvimento regional. Novos Cadernos do NAEA, v. 8, n. 1, jun 2005. Belém: UFPA/NAEA, 2005.
O que significou para a região e a quem beneficiou o Programa Grande Carajás 30 depois de sua implantação na região amazônica. Disponível em: http://www.ihu.unisinos.br/noticias/530505-o-que-significou-para-a-regiao-e-a-quem-beneficiou-o-programa-grande-carajas-30-depois-de-sua-implantacao-na-regiao-amazonica. Acesso em: 09/11/2015
SANTOS, Raimundo. O Projeto Grande Carajás (PGC) e seus reflexos para as quebradeiras de coco de Imperatriz - MA. In: II Seminário de Pesquisa da Pós-Graduação em História UFG/UCG, 2009, Goiânia. II Seminário de Pesquisa da Pós-Graduação em História UFG/UCG. Goiânia: UFG, 2009. v. 1. p. 1-20.

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