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Interpretação por Hans Kelsen (Capítulo VIII) 1. A interpretação é, portanto, uma operação mental que acompanha o processo da aplicação do Direito no seu progredir de um escalão superior para um escalão inferior (...). Não só o escalão superior, como por exemplo, o poder legislativo e, o escalão inferior, como os indivíduos, precisam observar as leis, o legislativo ao editar decretos ou outros atos constitucionais e o cidadão para evitar a sanção, e também a ciência jurídica, ao descrever um Direito positivo, tem de interpretar as suas normas. (...). Existem duas espécies de interpretação que devem ser distinguidas: A interpretação do Direito pelo órgão que o aplica, e a interpretação do Direito que não é realizada por um órgão jurídico, mas por uma pessoa privada e, especialmente pela ciência jurídica. a) Relativa indeterminação do ato de aplicação do Direito: A relação entre os escalões é de demasiada importância, logo que, entre o escalão superior e o escalão inferior existe uma relação de determinação ou vinculação, ou seja, a norma do escalão superior regula o ato de execução do escalão inferior “determina não só o processo em que a norma inferior ou o ato de execução são postos, mas também, eventualmente, o conteúdo da norma a estabelecer ou do ato de execução a realizar”. Porém, essa regulação não é completa. A norma do escalão superior não pode determinar ao escalão inferior todas as maneiras que ele deve aplicar a norma. Por isso existe uma margem – essa margem pode ser ora maior, ora menor-, onde o escalão inferior tem absoluta autonomia para interpretar a lei a sua maneira de acordo com as circunstâncias, não se afastando jamais da relação de sentido definida pelo escalão superior. Mesmo uma ordem por mais pormenorizada possível tem de deixar àquele que a cumpre ou executa uma pluralidade de determinações a fazer (...) quando, onde e como realizará a ordem de prisão, decisões essas que dependem das circunstâncias externas que o órgão emissor poderia, nem sequer prever. b) Indeterminação intencional do ato de aplicação do Direito: Exemplo: Uma lei de sanidade determina que, ao manifestar-se uma epidemia, os habitantes de uma cidade têm de, sob cominação de uma pena, tomar certas disposições para evitar um alastramento. A autoridade administrativa é autorizada a definir essas disposições. A indeterminação intencional é a maneira do Direito se fazer presente em diferentes ocasiões e situações quais ele não consegue prever ao originar uma norma, porém, essa abertura pode ser regulada pela própria lei, os seus limites de atuação, limites máximos e mínimos. c) Indeterminação não-intencional do ato de aplicação do Direito: A indeterminação do ato jurídico pode também ocorrer de maneira equivocada, ou seja, pela traição das palavras e seus sentidos múltiplos. A indeterminação não-intencional ocorre pela pluralidade de significações de uma palavra e não pela intenção do legislador. Pode haver discordância total entre a expressão verbal e a vontade da autoridade legisladora. Para casos assim, há a possibilidade da investigação a partir de outras fontes (legisladores), na medida em que se possa presumir que esta não corresponde a vontade de quem a estabeleceu. A discordância entre vontade e expressão pode ser completa ou parcial, nessa última, uma das interpretações corresponde a intenção do legislador originário. d) O Direito a aplicar como uma moldura dentro da qual há várias possibilidades e aplicação: Quando o Direito é aplicado por um órgão jurídico, este necessita de fixar o sentido das normas que vai aplicar, tem de interpretar estas normas. (p. 387) O Direito a aplicar como escalão superior cria para o escalão inferior uma espécie de moldura com todas as interpretações possíveis para determinada norma. (...) forma uma moldura dentro da qual existem várias possibilidades de aplicação, pelo que é conforme ao Direito todo ato que se mantenha dentro deste quadro ou moldura, que preencha essa moldura em qualquer sentido possível. Dizer que uma sentença é fundada na lei é dizer que ela se contém dentro da moldura. e) Os chamados métodos de interpretação: Apesar da existência da moldura no âmbito jurídico, não há nenhum critério que determine qual das possibilidades é a mais correta. Não há nenhum método que defina isso. “Todos os métodos de interpretação até o presente elaborados conduzem sempre a um resultado apenas possível, nunca a um resultado que seja o único correto”. Com isso, há a necessidade de ser trabalhada todas as opções possíveis, ou seja, não conter ainda nenhuma decisão sobre a questão de saber qual dos interessem em jogo é mais valioso deixando tal para uma posição relativa aos interesses, a um ato de produção normativa que ainda vai ser posto -à sentença judicial, por exemplo. 2. A interpretação como ato de conhecimento ou como ato de vontade A interpretação como ato de vontade ocorre quando órgão aplicador do Direito efetua uma escolha diante a todas as possibilidades a ele reveladas pela sua interpretação. Através deste ato de vontade se distingue a interpretação jurídica feita pelo órgão aplicador do Direito de toda e qualquer outra interpretação, especialmente da interpretação levada a cabo pela ciência jurídica. Esse tipo de interpretação sempre é feito pelo órgão aplicador do Direito, logo, é sempre autêntica. Ela cria Direito. A interpretação autêntica é, criadora do Direito, é a interpretação feita por um órgão aplicador do Direito. Por esse tipo de interpretação pode-se também criar uma norma que se encontra totalmente fora da moldura. A interpretação como ato de conhecimento ocorre a partir de um órgão aplicador do Direito. Esse tipo de interpretação é dado por não-autêntica, por não criar Direito. É a interpretação que ocorre diante de diferentes possibilidades. O agente não cria Direito ele se encontra já em frente de uma realidade tendo que realizar uma escolha. Ratificando, ela não é autêntica pois não é criada por um órgão estatal que aplica o Direito. 3. A interpretação da ciência jurídica: A interpretação da ciência jurídica nada mais é, do que uma análise crítica de todas as possíveis significações de uma norma, não indicando qualquer uma que seja como errada. Essa interpretação é puramente o conhecimento total das possibilidades que uma norma possui. É importante evidenciar que a interpretação jurídico- científica é uma interpretação não-autêntica, pois não cria Direito. mariacbarbosa15@icloud.com
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