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Apostila resumida int a fisica

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Sumário
Capítulo 1. Uma história de mistério. Da Grécia antiga até Newton. III
Capítulo 2. Números, medidas, erros e vetores XXIX
1. Introdução XXIX
2. Números compactos e ordem de grandeza XXXI
3. Erros XXXIII
4. Vetores XLI
Capítulo 3. Como as coisas se movem: As equações do movimento. XLIX
1. Velocidade média e instantânea XLIX
2. Aceleração LIV
3. As equações do movimento LXI
Capítulo 4. Porque as coisas se movem: As Leis de Newton. LXV
1. A lei da inércia LXVII
I
CAPíTULO 1
Uma história de mistério. Da Grécia antiga até Newton.
Voce gosta de histórias de mistério? Gosta de histórias de detetive onde, através
da análise dos fatos, vestígios e pistas, o assassino é pego e os verdadeiros culpados
são presos? Pois bem, a Ciência é feita através de um procedimento semelhante e,
há anos, que os cientistas tentam desvendar os mistérios que a Natureza nos mostra
todos os dias. Ao se estudar Física, devemos pensar que estamos fazendo parte de uma
grande empreitada na tentativa de solucionar os mistérios mais intrincados e difíceis
que poderíamos imaginar; a compreensão da Natureza. Mas na verdade, a comparação
do cientista com o detetive não é totalmente verdadeira, e como já comentaram dois
brilhantes cientistas:
"A comparação é falsa e terá de ser posteriormente abandonada, mas
tem uma parcela de justi…cativa que pode ser aumentada e modi…cada
para que se torne mais apropriada ao esforço da ciência para resolver o
grande mistério do universo."(Albert Einstein e Leopold Infeld1)
O grande problema desta história de mistério que nos propomos a desvendar é que
ela ainda não foi solucionada e podemos, sem dúvida alguma, dizer que está longe de
ser! Temos grande di…culdade em reunir evidências, juntar vestígios e obter fatos para
serem analisados e, por vezes, podemos cometer erros na interpretação das pistas e
sermos conduzidos a enganos, desvios ou mesmo a "verdades de La Palisse2".
As pistas deste mistério já são largadas há tempo, e os homens, através da obser-
vação e raciocínio, souberam aproveitar suas vantagens. As máquinas simples, como a
cunha, a alavanca, as polias, os moinhos de água, já eram conhecidos pelos sumérios e
egípcios há mais de 3000 anos antes de Cristo, e eles faziam uso delas para levantar seus
palácios, pirâmides e estátuas colossais. Certos aborígenes australianos não conseguem
contar além de três, mas conhecem o boomerang que, quando não atinge o seu alvo,
volta às mãos de seu possessor... e que impõe ao perito em balística problemas terríveis!
As tábuas sumérias de Sumer e Accad mostram que os conceitos de movimento já eram
su…cientemente claros e que já existia a de…nição de velocidade como sendo a razão
1A Evolução da Física, A. Einstein e L. Infeld. Editora Zahar, (1962)
2O guerreiro francês Jacques de Chabannes, senhor de La Palissse (1470-1525), foi morto em
batalha e um de seus aliados, impressionado com sua bravura, compôs uma canção com versos tão
ingênuos que …nalizaram por associar o nome de La Palisse com uma evidência tão grande que se
torna ridícula: Uma "verdade de La Palisse"! Um dos versos (eram 15 no total), segue abaixo:
"Ele foi morto, por falta de sorte/ Ferido por uma mão cruel/ Mas podem crer, pois ele está
morto/ Que sua ferida foi mortal!"
III
IV
entre a distância percorrida e o tempo gasto para percorrê-la. Os sumérios praticavam
uma forma básica de astronomia, mas tiveram uma importante in‡uência na so…sti-
cação da astronomia dos babilônios. A Teologia Astral, que deu aos deuses planetários
um papel importante na Mitologia e religião mesopotâmica, começou com os sumérios.
Eles também usavam um sistema numérico sexagenal (de base 60), que simpli…cava a
tarefa do registro de números muito grandes ou muito pequenos. A prática moderna
de dividir um círculo em 360 graus, de 60 minutos cada, começou com os sumérios.
As necessidades do comércio já haviam criado as medidas de comprimento e de
massa, muitas vezes complicadas de se comparar pois cada região adotava um sistema
próprio de medidas de comprimento e massa! En…m, o homem já fazia uso de sua
capacidade de observar algumas das pistas do grande mistério da natureza para usar
em seu benefício próprio. Porém, neste levantamento de pistas, o homem era apenas
o construtor que usava os fenômenos que observava, mas não buscava para eles um
porquê. O homem era um artí…ce (homo faber) e não um pensador (homo sapiens),
mesmo porque toda a Ciência estava nas mãos dos sacerdotes e todo o conhecimento
era associado à religião, possuindo assim um caráter dogmático. Porém, para passar
da técnica à ciência, foi necessário que o homem realizasse uma certa conversão de
sua inteligência: Ele foi obrigado a agir menos e pensar mais! Este comportamento
não é natural da espécie humana, exige um esforço extraordinário sobre si próprio,
desinteresse e até uma certa pitada de genialidade.
Mas nos séculos VI e V a.C., um punhado de gregos da Jônia, colônia grega da
costa ocidental da Ásia Menor, deram os primeiros passos no sentido de realizarmos
esta conversão, ao mesmo tempo que lançavam as bases da nossa civilização ocidental3.
Eles quiseram atingir o mais profundo da ciência, estabelecer uma linha de raciocínio
sistemática e unitária, baseada numa hierarquia de princípios. Os seus representantes
mais ilustres são: Tales de Mileto, Anaximandro, Anaxímenes e Heráclito. Esses quatro
pensadores são os fundadores da …loso…a no sentido especí…co, pois lançaram as bases
dos problemas …losó…cos discutidos até hoje no Ocidente: a verdade, a totalidade,
a ética e a política. Os …lósofos desta Escola explicavam o mundo como resultante
do desenvolvimento cíclico de uma natureza comum a tudo o que existe, sempre em
perpétuo movimento. Acreditavam na existência de um princípio que é a origem de
tudo o que existe.(aqui entra o primeiro apêndice: Os Jônios). Seus conhecimentos
já eram tais que em 535 a.C. Tales de Mileto já havia explicado um eclipse do Sol,
ao supor que a Lua era iluminada por este astro. Anaximandro a…rmou que todas as
coisas são feitas de uma substância elementar, que não é a água, e que seria in…nita,
eterna e que comporia todos os mundos, sendo o nosso apenas um entre muitos. Para
Anaxímenes, a substância elementar seria o ar, sendo o fogo o ar rarefeito; ao se
condensar o ar se tornaria água e esta em terra, formando o universo. Cada elemento
teria uma caracterísitca divina, onde um tentaria dominar os outros, porém, haveria
3Bertrand Russel, grande pensador, disse uma vez sobre os gregos:"Em toda a História, nada é
tão surpreendente ou tão difícil de explicar como a súbita eclosão da civilização na Grécia".
V
uma certa proporção entre eles que seria dada através de uma fatalidade, fatalidade
esta que seria a lei da natureza.
Eles acreditavam que a água seria o elemento mais importante. Contraindo-se ou
expandindo-se ela daria origem aos sólidos ou ao ar, respectivamente. Tudo poderia
ser explicado através de forças primordiais que seriam as de contração e de dilatação,
sendo a primeira uma força centrípeta (que impele para o centro) e a segunda uma
força centrífuga (que impele para fora). Mas para que isso acontecesse, teríamos que
ter toda a matéria em constante movimento, conceito este que reveremos mais tarde
na Mecânica Quântica.
Heráclito (500 a.C.), declara que todas as coisas estão em perpétuo movimento e
que são forçadas a tal. Além disso, a…rma que nada na Natureza se perde, antecipando
em mais de 2000 anos a Lavoisier, pai da Química Moderna. Porém, nem todos concor-
davam entre si. Não muito longe dali, em Eléia, colônia grega na Itália (hoje cidade de
Vélia), uma outra corrente de pensamento, liderada por Parmênides, pregava que toda
mutação é ilusória, e propôs que tudo o que existe é eterno, imutável, indestrutível,
indivisível e, portanto, imóvel! Ele dividia tudo o que existe entre o ser e o não-ser,
sendo o ser tudo aquilo queé percebido no domínio da mente, distinto do que é perce-
bido de forma sensorial, que ele considerava como enganoso e falso, e pertencente ao
domínio do não-ser. Logo, tudo que era, era, e tudo que não era, não era. Esta teroria
representa uma idéia de unidade, do uno, ou um monismo.
Por volta de 450 a.C., Empédocles, em Agrigento (uma cidade na atual Sicília,
Itália), diz que os quatro elementos água, terra, fogo e ar, estão em constante movi-
mento, em processos de mistura e separação, mas que a quantidade de matéria sempre
permanece constante. Quanto às forças que unem ou separam os elementos, ele as
classi…cou como duas: o Amor e o Ódio4, e que uma estaria sempre prevalecendo sobre
a outra. Dizia que vivemos um momento onde o Ódio prevalece sobre o Amor. Não
devemos tomar esta idéia de Empédocles como uma coisa piegas, mas como uma idéia
de que vivemos um momento do Universo em que as forças de dissociação ou repul-
são prevalecem sobre as forças de atração ou integração. De certa forma, suas idéias
estão em total acordo com as mais modernas teorias sobre o Universo (Big Bang).
Ele também deu os primeiros passos no pensamento Teórico Evolucionista, a…rmando
que Sobrevive aquele que está melhor capacitado, aproximadamente 2500 anos antes de
Charles Darwin. Com a mesma linha de raciocínio de Tales de Mileto, a…rma que O
mundo evoluiu da água por processos naturais, em completa ressonância com as mais
modernas teorias da criação da vida.
Mais ou menos ao mesmo tempo, em Samos, Grécia, uma outra corrente de pen-
samento se formava, através de um dos pilares da …loso…a: Pitágoras. Tudo sobre sua
vida é um pouco cercado de lendas. Sabe-se que viveu aproximadamente entre 570 e
495 a.C., tendo nascido em Samos e tendo falecido em Metaponto, antiga cidade grega
na Itália. Ele foi o fundador de uma escola de pensamento, hoje batizada de escola
4Hoje poderiamos associar estas forças à forças de integração ou de atração, e de repulsão ou
dissociação.
VI
pitagórica, que possuía como linha de pensamento além de uma doutrina extremamente
matemática, um cunho místico, sendo os alunos obrigados a seguirem certas regras de
conduta, alimentação e vestimenta, além de uma total obediência e submissão aos seus
mestres. Os pitagóricos interessavam-se pelo estudo das propriedades dos números, que
para eles (número = sinônimo de harmonia) eram considerados como a essência das
coisas.
Segundo o pitagorismo, a essência, o princípio essencial de que são compostas todas
as coisas, é o número, ou seja, as relações matemáticas. Os pitagóricos acreditavam
…rmemente que a essência de tudo, na geometria ou nas questões práticas e teóricas
da vida humana, podia ser explicada em termos de arithmos, isto é, através das pro-
priedades intrínsecas dos números inteiros ou das suas razões. Os números estavam
sempre ligados à contagem de coisas. Ora, a contagem requer que a unidade individ-
ual permaneça a mesma e portanto a unidade nunca podia ser dividida. Pelo fato de
considerarem o número como a base do Universo, todas as coisas podiam ser contadas,
incluindo os comprimentos. Para contar um comprimento era necessária uma medida
e os pitagóricos assumiram que podiam sempre encontrar uma unidade de medida.
Assim que uma medida fosse achada num problema particular, tornar-se-ia a unidade
e não poderia ser dividida.
À Pitágoras devemos as descobertas das séries harmônicas sonoras. Ele descobriu
em que proporções uma corda deve ser dividida para a obtenção das notas musicais.
Uma longa corda presa a duas extremidades que, quando tangida, nos dará o som
mais grave - e a partir dela, podemos gerar a quinta e terça através da reverberação
harmônica. Prendendo-se a metade da corda, depois a terça parte e depois a quinta
parte conseguiremos os intervalos de meia, quinta e terça em relação à frequência
de oscilação fundamental. A chamada Série Harmônica, que até hoje usamos como
parâmetro para fazermos música! À medida que subdividimos a corda obtemos sons
mais altos e os intervalos serão diferentes. E assim sucessivamente. Descobriu ainda
que frações simples das notas, tocadas juntamente com a nota original, produzem sons
agradáveis. Já as frações mais complicadas, tocadas com a nota original, produzem
sons desagradáveis. Porém o seu legado mais famoso é o Teorema de Pitágoras que
diz que:"Em todo triângulo retângulo, a soma dos quadrados dos catetos é igual ao
quadrado da hipotenusa".
Eles julgam poder explicar a variedade do mundo mediante o concurso dos opostos,
que são - segundo os pitagóricos - o ilimitado e o limitado, ou seja, o par e o ímpar,
o imperfeito e o perfeito. O número divide-se em par, que não põe limites à divisão
por dois, e, por conseguinte, é ilimitado (quer dizer, imperfeito, segundo a concepção
grega, a qual via a perfeição na determinação); e ímpar, que põe limites à divisão por
dois e, portanto, é limitado, determinado, perfeito. Os elementos constitutivos de cada
coisa - sendo cada coisa um número - são o par e o ímpar, o ilimitado e o limitado, o
pior e o melhor. Radical oposição que explicaria o vir-a-ser e o multíplice, que seriam
reconduzidos à concordância e à unidade pela fundamental harmonia (matemática),
VII
Figura 1. Uma forma de se visualizar o teorema de Pitágoras
que governa e deve governar o mundo material e moral, astronômico e sonoro. Simples
, não?
Mas a grande contribuição de Pitágoras, foi também foi sua desgraça! Diz a lenda
que um dos seus discípulos, Hipaso de Metaponto, foi um dos responsáveis por mu-
danças fundamentais na matemática do século V a. C, essencialmente no campo
da geometria. Inicialmente um pitagórico, ele demonstrou que nem sempre a razão
numérica entre dois segmentos de reta resultava em um número racional ( ~400 a.C.).
Esta descoberta é uma conseqüência direta da obra mais importante do mestre, o Teo-
rema de Pitágoras! Simplesmente, usando seu próprio teorema, podemos criar um
grande impasse à sua teoria dos números racionais. Se considerarmos um triângulo
retângulo, isósceles e de lados iguais a 1, temos que a hipotenusa será um número que
não pode ser representado por uma razão: é um número irracional! Esta descoberta
pôs …m à crença pitagórica de que tudo podia ser expresso ou explicado por números
e ameaçava destruir toda a doutrina pitagórica. Os discípulos juraram nunca divul-
gar a notícia, mas ele divulgou sua descoberta para pessoas que não pertenciam à
VIII
irmandade e, assim, foi expulso da confraria. Conta-se lendariamente que, após estes
acontecimentos, os pitagóricos enlouqueceram e o assassinaram.
A idéia da escola pitagórica, onde tudo seria explicado por números, será reencon-
trada mais tarde, depois de Galileo e Newton, nos trabalhos de Maxwell, Einstein e
Dirac, que tentaram explicar a natureza através de uma grande uni…cação: um modêlo
matemático que pudesse interpretar todas as interações entre as partículas.
A segunda revolução na busca de pistas para o grande mistério ocorre em Abdera,
na Trácia, onde os …lósofos Demócrito e Leucipo, in‡uenciados pelo monismo de Par-
mênides, criam um pensamento divergente do de Anaxágoras (ver Apêndice 1), onde
cada átomo era agora considerado em tudo igual ao seu vizinho. Eles explicam a diver-
sidade através de simples diferenças quantitativas ou de estrutura. Um corpo difere do
outro apenas pela quantidade e disposição de partículas que o compõem. Todos eles
são animados de movimento de cima para baixo e, como o mais pesado cai mais de-
pressa que o mais leve5, os mais pesados se chocariam com os mais leves e produziriam
turbilhões que gerariam novas substâncias. Os mais leves seriam então levados para
cima por estes turbilhões em movimento de rotação e, se a rotação fosse muito alta, o
elemento pegaria fogo!6. Estes …lósofos admitiam o vácuo e o determinismo, pregando
que nada acontece por acaso. Um dos pontos mais interessantes sobre os atomistas gre-
gos é queestes não faziam uso de dados empíricos para fundamentar seus pensamentos.
Eles se baseavam principalmente no raciocínio lógico mais do que na observação. De
qualquer forma, nesta época, o raciocínio era tão válido, ou ainda mais válido, que os
dados colhidos da experimentação.
Mas a grande virada estava mesmo para acontecer não muito longe dali, com uma
outra escola de pensamento: os …lósofos socráticos! Tudo começou em Atenas, com um
personagem tão mítico quanto esquisito, o próprio Sócrates. Pouco se sabe sobre sua
vida, mas alguns detalhes denotam uma certa peculiaridade de seu caráter. Apesar de
grande pensador, não se conhece nenhuma obra que tenha sido feita por ele próprio e
todos os relatos de sua vida são retirados de escritos de pessoas que viveram próximas
a ele. Era um mestre que não gostava de ter discípulos e era um homem piedoso mas
que morreu por impiedade. Andava descalço e não gostava de tomar banho e podia
parar o que estivesse fazendo e …car horas imóvel, meditando sobre algum problema
em particular. Sua vida e forma de pensar in‡uenciaram outros …lósofos que deram
continuidade ao seu trabalho. Destes …lósofos, dois deles se sobressaíram e deixaram
um grande legado à Humanidade: Platão e Aristóteles.
Platão viveu em Atenas entre 428 e 347 a.C., aproximadamente. Foi um …lósofo e
matemático do período clássico da Grécia Antiga, autor de diversos diálogos …losó…cos
e fundador da Academia em Atenas, a primeira instituição de educação superior do
mundo ocidental. Juntamente com seu mentor, Sócrates, e seu pupilo, Aristóteles,
Platão ajudou a construir os alicerces da …loso…a natural, da ciência e da …loso…a
5Esta idéia errada vai permanecer até Galileu.
6Se substituirmos por moléculas os átomos de Demócrito, podemos dizer que sua explicação do
calor é bem razoável........
IX
ocidental. Acredita-se que seu nome verdadeiro tenha sido Arístocles; Platão era um
apelido que, provavelmente, fazia referência à sua característica física, tal como o porte
atlético ou os ombros largos, ou ainda a sua ampla capacidade intelectual de tratar de
diferentes temas, entre eles a ética, a política, a metafísica e a teoria do conhecimento.
A so…sticação de Platão como escritor é especialmente evidente em seus diálogos
socráticos; trinta e cinco diálogos e treze cartas são creditadas tradicionalmente a
ele, embora os estudiosos modernos tenham colocado em dúvida a autenticidade de
pelo menos algumas destas obras. Embora não exista qualquer dúvida de que Platão
lecionou na Academia fundada por ele, a função pedagógica de seus diálogos - se é
que alguma existia - não é conhecida com certeza. Os diálogos, desde a época do
próprio Platão, eram usados como ferramenta de ensino nos tópicos mais variados,
como …loso…a, lógica, retórica, matemática, entre outros(colocar o diálogo Críton como
apêndice).
Em linhas gerais, Platão desenvolveu a noção de que o homem não está sujeito a dois
tipos de realidade: a sensível e a inteligível. A primeira seria aquela ligada às coisas que
nos afetam os sentidos, são realidades dependentes, mutáveis e são imagens da segunda
realidade, a realidade inteligível, que é a realidade imutável, igual a si mesma. Tal con-
cepção de Platão também é conhecida por Teoria das Idéias ou Teoria das Formas.
Para Platão, o mundo concreto percebido pelos sentidos (realidade sensível) é uma
pálida reprodução do mundo das Idéias (realidade inteligível). Cada objeto concreto
que existe, participa, junto com todos os outros objetos de sua categoria, de uma Idéia
perfeita. Uma determinada caneta, por exemplo, terá determinados atributos (cor,
formato, tamanho etc). Outra caneta terá outros atributos, sendo ela também uma
caneta, tanto quanto a primeira. Aquilo que faz com que as duas sejam canetas é, para
Platão, a Idéia de Caneta, perfeita, que esgota todas as possibilidades de ser caneta.
A ontologia de Platão diz, então, que algo é na medida em que participa da Idéia desse
objeto. No caso da caneta é irrelevante, mas o foco de Platão são coisas como o ser hu-
mano, o bem ou a justiça, por exemplo. Um dos grandes exemplos desta idéia de Platão
é o mito, ou alegoria, da caverna (http://pt.wikipedia.org/wiki/Mito_da_caverna) que
pode ser considerada uma das mais poderosas metáforas imaginadas pela …loso…a.
O problema que Platão propõe-se a resolver é a tensão entre Heráclito e Parmênides:
para o primeiro, o ser é a mudança, tudo está em constante movimento e é uma ilusão
a estaticidade, ou a permanência de qualquer coisa; para o segundo, o movimento é
que é uma ilusão, pois algo que é não pode deixar de ser e algo que não é, não pode
passar a ser; assim, não há mudança.
Por exemplo, o que faz com que determinada árvore seja ela mesma desde o estágio
de semente até morrer e o que faz com que ela seja tão árvore quanto outra de outra
espécie com características tão diferentes? Há aqui uma mudança, tanto da árvore em
relação a si mesma (com o passar do tempo ela cresce) quanto da árvore em relação
a outra. Para Heráclito, a árvore está sempre mudando e nunca é a mesma, e para
Parmênides, ela nunca muda, é sempre a mesma e sua mudança é uma ilusão. Platão
resolve esse problema com sua Teoria das Idéias. O que há de permanente em um objeto
X
é a Idéia; mais precisamente, a participação desse objeto na sua Idéia correspondente.
E a mudança ocorre porque esse objeto não é uma Idéia, mas uma incompleta repre-
sentação da Idéia desse objeto. No exemplo da árvore, o que faz com que ela seja ela
mesma e seja uma árvore (e não outra coisa), a despeito de sua diferença daquilo que
era quando mais jovem e de outras árvores de outras espécies (e mesmo das árvores
da mesma espécie), é a sua participação na Idéia de Árvore; e sua mudança deve-se ao
fato de ser uma pálida representação da Idéia de Árvore.
Platão também elaborou uma teoria gnosiológica, ou seja, uma teoria que explica
como se pode conhecer as coisas, ou ainda, uma teoria do conhecimento. Segundo ele,
ao ver um objeto repetidas vezes, uma pessoa se lembra, aos poucos, da Idéia daquele
objeto que viu no mundo das Idéias. Para explicar como se dá isso, Platão recorre a um
mito (ou uma metáfora) segundo a qual, antes de nascer, a alma de cada pessoa vivia
em uma estrela, onde se localizam as Idéias. Quando uma pessoa nasce, sua alma é
"jogada"para a Terra, e o impacto que ocorre faz com que esqueça o que viu na estrela.
Mas, ao ver um objeto aparecer de diferentes formas (como as diferentes árvores que
se pode ver), a alma se recorda da Idéia daquele objeto que foi visto na estrela. Tal
recordação, em Platão, chama-se anamnesis. Uma das condições para a indagação ou
investigação acerca das Idéias é que não estamos em estado de completa ignorância
sobre elas. Do contrário, não teríamos nem o desejo nem o poder de procurá-las. Em
vista disso, é uma condição necessária, para tal investigação, que tenhamos em nossa
alma alguma espécie de conhecimento ou lembrança de nosso contato com as Idéias
(contato esse ocorrido antes do nosso próprio nascimento) e nos recordemos das Idéias
ao vê-las reproduzidas palidamente nas coisas. Deste modo, toda a ciência platônica é
uma reminiscência.
Platão não buscava as verdadeiras essências da forma física como buscavamDemócrito
e seus seguidores. Sob a in‡uência de Sócrates, ele buscava a verdade essencial das
coisas. Platão não poderia buscar a essência do conhecimento nas coisas, pois estas
são corruptíveis, ou seja, variam, mudam, surgem e se vão. Como o …lósofo busca a
verdade plena, deve buscá-la em algo estável, nas verdadeiras causas, pois logicamente
a verdade não pode variar e, se há uma verdade essencial para os homens, esta verdade
deve valer para todas as pessoas. Logo, a verdade deve ser buscada em algo superior.
O conhecimento a ser buscado era o conhecimento do próprio homem, mas sempre
ressaltando o homem não enquanto corpo, mas enquanto alma. O conhecimento contido
naalma era a essência daquilo que existia no mundo sensível. Portanto, em Platão,
também a técnica e o mundo sensível eram secundários. A alma humana enquanto
perfeita participa do mundo perfeito das idéias, porém este formalismo só é reconhecível
na experiência sensível.
Também o conhecimento tinha …ns morais, isto é, levar o homem à bondade e à
felicidade. Assim a forma de conhecimento era um reconhecimento, que faria o homem
dar-se conta das verdades que sempre possuíra e que o levavam a discernir melhor
entre as aparências da verdades e as verdades. A obtenção do autoconhecimento era
um caminho árduo e metódico.
XI
Quanto ao mundo material, o homem poderia ter somente a doxa (opinião) e téchne
(técnica), que permitia a sua sobrevivência, ao passo que, no mundo das Idéias, o
homem pode ter a épisthéme, o conhecimento verdadeiro, o conhecimento …losó…co. Foi
essa idéia da perfeição que o levou a basear toda a sua Física sobre a geometria, onde as
…guras geométricas, perfeitas e não corrompidas, poderiam explicar a Natureza como
ela deveria ser. Com as …guras geométricas, ele poderia construir todos os elementos,
sendo o tetraedro o fogo, o octaedro o ar, o hexaedro a terra e o icosaedro a água. Assim,
dois tetraedros de fogo formariam um octaedro de ar, da mesma forma que um octaedro
de ar poderia se quebrar formando dois tetraedros de fogo!7 Outra grande observação
de Platão foi que o peso dos corpos era devido a uma força que agia sobre os mesmos, de
cima para baixo, o que não era nada mais nada menos que uma primeira pista para se
pensar em uma noção de gravidade. Foi também o primeiro a distinguir o movimento
progressivo, o movimento de rotação e notar que existe uma lei de conservação do
plano de rotação no movimento de um peão, dando o primeiro passo para a invenção
do giroscópio. Foi o primeiro …lósofo a incentivar a experimentação, pois para ele esta
era a maneira correta de se observar os fenômenos naturais.
Mas seria o seu discípulo, Aristóteles de Estagira(384-322 a.C.), quem seria o mais
conhecido e o responsável pelas bases da …loso…a natural, lançando conceitos que per-
durariam durante muitos anos. Aristóteles não era considerado um bom matemático,
mas mesmo assim resolveu entrar para a escola de Platão, onde era conhecido que
"quem nao sabe Geometria não entra"! Na visão de Aristóteles, o conceito de movi-
mento era fundamental. Na sua concepção, o movimento era entendido como uma coisa
mais ampla, de forma que não somente a mudança de posição no espaço era abarcada
no conceito, mas também as mudanças qualitativas como o aumento e a diminuição
das quantidades. O movimento, para o estagirita, seria explicado meta…sicamente pela
passagem da potência ao ato, concepção cuja clareza não pode ser chamada de bril-
hante.
A mudança de posição, era apenas um dos tipos de movimento, e era chamado de
movimento local8. Apesar de importante, pois estava sempre envolvido nos demais,
era apenas um entre vários tipos. O grande avanço gerado pela …loso…a de Aristóteles
vem de sua visão global do Universo. Ele criou uma forma de pensamento onde todas
as coisas, que hoje fazem parte da física, química, biologia, medicina, lógica, política,
retórica, assim como a metafísica, estavam organizados em um todo coerente. Desta
forma, a análise do movimento (movimento local, no sentido aristotélico), não se faz
possível sem que tenhamos uma visão mais geral do cosmos aristotélico.
Segundo ele, o universo era …nito e limitado por uma esfera na qual estavam dis-
postas todas as estrelas …xas9. Os corpos celestes conhecidos na época (Lua, Sol,
7Estranha idéia de ligação química........
8De agora em diante, falaremos de movimento nos referindo apenas ao movimento local, na con-
cepção aristotélica.
9Estrelas …xas são objetos celestes que aparentam não se mover em relação a outras estrelas no céu
noturno. Nebulosas ou outros corpos celestes de aparência similar à estrelas no céu terrestre também
podem ser categorizadas como estrelas …xas.
XII
Mercúrio, Marte, Vênus Júpiter e Saturno), estariam presos a esferas concentricas e se
moveriam com relação as estrelas …xas. No centro comum, estaria a Terra, imóvel, em
repouso.
Figura 2. O Universo de Aristóteles, segundo uma representação da
Idade Média.
Havia, para explicar o movimento dos planetas neste sistema geocentrico, um
emaranhado de esferas intermediárias animadas de movimentos intrincados que serviriam
até para explicar o movimento retrógrado dos planetas. Eram necessárias por volta de
50 esferas para poder representar este sistema. As camadas celestes, esferas perfeitas
onde repousariam os planetas, se localizavam em duas regiões distintas: a sublunar e
a celestial. Abaixo da sublunar, onde a Terra estaria reinando, todas as coisas eram
cosntituídas pelos quatro elementos: fogo, ar, água e terra. Esta região era imperfeita,
sujeita a todo tipo de mudanças e degenerescência. A região acima da sublunar, a
celestial, seria composta pelo que Aristóteles denominou a quintessência (de quinto
elemento) ou éter, substância perfeita10. Neste universo, as coisas dentro da esfera sub-
lunar tenderiam sempre a voltar para seu lugar natural e desta maneira ele explicaria
porque a terra, o mais "pesado"dos elementos, tenderia sempre para o centro da Terra
(por conseguinte o centro do universo), sendo seguida pela água (acima da terra), pelo
ar e …nalemte pelo fogo (pois vemos sempre as chamas subirem no ar)!
No mundo celestial, o movimento deveria ser perfeito, imutável, circular e perpétuo!
Todavia, na região sublunar, devido à imperfeição das coisas, os movimentos seriam
10Esta invenção de Aristóteles vai se arrastar durante muito tempo, e vai ser retomada mais a
frente com a descoberta das ondas eletromagnéticas.
XIII
decompostos em dois tipos: o natural e violento (ou forçado). O movimento natural
seria aquele no qual a matéria tende a retornar ao seu lugar natural, ou seja, em direção
ao lugar natural do elemento predominante em sua composição. Desta forma, uma
pedra cairia pelo simples fato que ela procura a camada mais baixa da Terra, a chuva
cairia no mar, etc, etc.... Tudo que nao se encaixasse neste caso de movimento, seria
considerado como violento ou forçado (com ação de uma força). Desta forma, ainda
com a mesma pedra, se a lançarmos para o alto seu movimento inicial será forçado,
sendo a sua queda um movimento natural. Na concepção aristotélica, o movimento
da queda não é de forma alguma devido a força de atração que a Terra exerce sobre
a pedra, mas pelo simples fato de que ela retorna ao seu lugar natural. Visto desta
maneira, o movimento de queda seria regido por uma espécie de geometria do espaço
e não por uma ação a distância11. Mais além, a velocidade de queda dos objetos
seria diretamente proporcional as suas massas, fazendo com que objetos mais pesados
caissem mais rápido.
Para Aristóteles, no movimento violento, a velocidade adquirida pelo corpo era
diretamente proporcional à força aplicada e inversamente proporcional à resistência
oferecida pelo meio, que ele acreditava também ser ligada ao peso, pois a concepção
aristotélica de peso seria mais próxima à nossa idéia de inércia12 do que a ação de
um campo gravitacional. Em sua concepção, o movimento era sempre um efeito, que
cessava uma vez que cessava a causa, ou seja, uma vez que parávamos de agir sobre o
corpo, o movimento deveria terminar, logo, no movimento violento, tanto maior seria a
velocidade (efeito) quanto maior fosse a força exercida (causa) enquanto que no movi-
mento natural a causa seria a busca do lugar natural. Esta teoria vinha diretamente
da experiência diária de como os objetos se movem, como por exemplo o fato de que se
necessita a aplicação constante de uma força para que uma carreta se mova, e é nada
mais, nada menos que uma expressão do pensamento intuitivo que, até hoje, confunde
muitos estudantes.
Mas o que vale a penapensar é que …cava difícil explicar, com esta teoria aris-
totélica, o movimento observado quando atiramos uma pedra para longe, pois uma vez
que a pedra saísse de nossas mãos, não teríamos mais a força sendo exercida e a pedra
devia parar, coisa que não observamos! Para explicar isto ele recorreu a uma idéia
de que ao se deslocar, a pedra promoveria em sua passagem um vácuo, devido ao seu
deslocamento. Este vácuo seria imediatamente preenchido pelo ar ao redor da pedra,
e o movimento do ar serviria para "empurrar" a pedra para frente e este processo era
conhecido como antiperistase. Desta forma …ca claro que, segundo a Física de Aristóte-
les, um objeto jamais poderia se movimentar quando lançado no vácuo(movimento
forçado), pois se não houvesse um meio material que pudesse promover a antiperistase,
ele deveria parar assim que a ação …ndasse. Além disso, uma queda livre (movimento
11Esta idéia vai retornar muitos anos à frente com o contínuo de 4-dimensões de Einstein.
12Inércia, vem do latim inertia que quer dizer ignorância, incapacidade, inação, indolência,
preguiça, apatia, indiferença, repugnância, aversão, covardia, descuido, negligência.
XIV
natural) no vácuo não ofereceria resistência, o que implicaria em uma velocidade in-
…nita. Assim, Aristóteles criava um grande mito que também perdurou durante anos:
o que a Natureza tem horror ao vácuo! Esta idéia era uma pá de cal sobre toda a teoria
atomista, onde tudo seria explicado pelo movimento de átomos no vácuo. Este tabu só
irá cair bem mais a frente com Torriceli por volta de 1600.
A grande difusão da obra de Aristóteles deve-se provavelmente ao fato de que ele
foi o primeiro a concatenar todo o conhecimento em uma obra uni…cada. De certa
forma ele criou uma …loso…a inteira como um sistema, onde havia conexão entre várias
áreas do conhecimento que ele havia tratado. Ele escreveu sobre todos os ramos do
conhecimento de sua época, menos as matemáticas, onde dizem que ele era realmente
muito fraco..... Podemos sem dúvida dizer que a Física de Aristóteles tenha prestado
um péssimo serviço à ciência durante a Idade Média, quando sua obra foi aceita e
imposta ao mundo cristão através da releitura feita por São Tomás de Aquino. Ele
foi uma das provas (ainda existirão outras) de que, as vezes, as pistas deixadas pela
Natureza podem ser mal interpretadas e as conclusões oriundas destas interpretações
errôneas podem nos levar a caminhos errados na nossa História de Mistério.
Felizmente, alguns outros grandes pensadores do mundo antigo, ignoraram total-
mente as obras de Aristóteles e deram curso aos seus trabalhos por conta própria.
Dentre eles, podemos citar Arquimedes e Héron de Alexandria. Estes gênios foram na
verdade mais homens práticos do que sonhadores e devemos principalmente ao primeiro
deles a ruptura total entre a metafísica e a física. Foram homens que colocaram a ex-
perimentação, a observação e a dedução a partir de dados experimentais acima dos
devaneios e meditações.
Arquimedes (287-212 a.C.), foi sem dúvidas o um dos maiores pensadores do mundo
antigo. Suas obras remontam até hoje e duas de suas descobertas podem marcar o
início da Física calcada na experimentação: a alavanca e o empuxo, ou princípio de
Arquimedes. Isso sem contar as outras grandes descobertas que são menos conhecidas.
Durante muitos séculos seu método foi o único para o cálculo do valor de �, primeiro
caso conhecido de uma soma de uma série in…nita; a espiral de Arquimedes e, 19 séculos
antes de Leibnitz e Newton, apresentou os primeiros rudimentos do cálculo diferencial.
Sua expressão: "Dêem-me uma alavanca e um ponto de apoio e eu moverei o mundo",
é bem conhecida até hoje.
Seu princípio, do qual todos já ouviram falar, e cuja ação nos permite boiar na
água, diz que: "Todos os corpos mergulhados na água recebem um impulso de baixo
para cima, igual ao peso do volume de líquido deslocado". Dizem que ao descobrir
este princípio, Arquimedes se encontrava no banho, e observando a água que saia da
banheira a medida que ele entrava nela, teve a compreensão do fenômeno que ocorria.
Nesta hora, saiu correndo pelas ruas de Siracusa, sua cidade natal, gritando: "Eureka!
Eureka!", que quer dizer, "Encontei! Encontei!"
Outra de suas grandes invenções foi o parafuso de Arquimedes, que permite fazer
remontar uma coluna d’água através do uso de um parafuso sem …m.
XV
Figura 3. Ilustração de um livro do século XVII, mostrando o princípio
da alavanca.
Figura 4. Ilustração do parafuso de Arquimedes, do livro De Subtilitate
de Jerônimo Cardan, de 1556.
Das grandes invenções de Arquimedes, muitas foram no terreno bélico. Suas cata-
pultas possibilitavam um maior alcance, o que fez com que durante mais de três anos
Siracusa conseguisse resistir ao sítio pelas tropas romanas comandadas pelo Cônsul
Cláudio Marcelo. Foi morto por um soldado romano, durante o massacre que se seguiu
à rendição da cidade aos romanos. Conta-se que ao ser abordado pelo soldado, se
encontrava re‡etindo sobre um problema e disse a este que o deixasse em paz.
Mas embora a Física de Aristóteles tenha sido aceita durante a Idade Média como
a verdade absoluta, em 517 Johannes Philoponus comenta ironicamente o …lósofo de
Estagira e, pela primeira vez, dá uma versão da transmissão do movimento que será
considerada durante muito tempo. Ele diz que "as energias passam de um corpo para
outro de tal modo que uma vis impressa é comunicada ao corpo projetado". Será
sobre esta tese de ação por contato que Descartes vai construir toda a sua mecânica
mais de 1000 anos mais tarde. Além disso, para Philoponus, a velocidade do corpo
seria proporcional à diferença entre a força motriz, que …ca incorporada ao corpo (vis
XVI
impressa) e a resitência oferecida pelo meio. Com esta idéia, ele tornou possível o
movimento no vácuo, pois quando a resistência fosse nula a velocidade seria igual a
força impressa e não in…nita. As idéias sobre o movimento e suas causas, seriam
discutidas ainda nos séculos X e XII por …lósofos islâmicos, que ajudaram a preservar
as obras dos gregos e sua reintrodução na cultura ocidental. Durante muitos anos, a
Igreja católica lutou para se organizar e manter a sua hegemonia espiritual, intelectual
e econômica, e as Escrituras eram o único documento de referência, o que gerou um
certo atraso no avanço do pensamento ocidental. Com a expansão do mundo islâmico
até a península ibérica, os textos gregos, comentados pelos …lósofos orientais, forma
difundidos no ocidente mais uma vez.
A análise destes textos, mesmo que com a severa vigilância da Igreja, levou ao
estabelecimento de uma tradição escolástica13, e dentro desta tradição forma criadas
as primeiras universidades, onde as de Oxford e Paris mais se destacarão no século XIV.
EmOxford, os desenvolvimentos em cálculo foram tais que nesta época já se possuia um
conhecimento razoavelemte sólido do conceito de aceleração, sendo inclusive formulada
a "Regra do Valor Médio"segundo a qual, um movimento com aceleração constante
pode ser equiparado, quanto à distância percorrida, a um movimento uniforme cuja
velocidade seja igual à média entre as velocidades inicial e …nal. Mas no que diz
respeito a evolução das idéias de força e movimento, foi na Universidade de Paris que
Jean Buridan e Nicole d’Oresme deram as maiores contribuições.
Para Buridan, ao se lançar uma pedra, imprimia-se a esta uma certa força motriz
(vis motiva), ou como ele de…niu, um certo impetus. Para ele, este impetus teria uma
natureza permanente, se não fosse afetado pela resitência do meio que circundava ou
pela gravidade, sendo entendia a gravidade como a tendência da pedra a se dirigir
ao seu lugar natural (ainda o conceito aristotélico). Para Buridan, o impetus seria
tanto maior quanto maiores fossem a velocidade e a quantidade de matéria do objeto
lançado, no nosso caso, a pedra. Aparentemente, ele chega bem próximo do conceito
de quantidadede movimento, hoje aceito, mas não devemos esquecer que, no caso de
Buridan, o impetus era a causa do movimento e não o efeito! Pois segundo o conceito
de Aristóteles, a todo movimento estaria associado uma causa!
A mesma linha de raciocínio foi seguida por d’Oresme, seu discípulo:
". . . quando Deus criou[os céus]...Ele os imprimiu com uma certa quali-
dade ou força de movimento, assim como Ele imprimiu as coisas terrestres
com peso...;é exatamente o mesmo de um homem que constrói um relógio
13A Escolástica (ou Escolasticismo) é uma linha dentro da …loso…a medieval, de acentos no-
tadamente cristãos, surgida da necessidade de responder às exigências da fé, ensinada pela Igreja,
considerada então como a guardiã dos valores espirituais e morais de toda a Cristandade. Por assim
dizer, responsável pela unidade de toda a Europa, que comungava da mesma fé. Esta linha vai do
começo do século IX até ao …m do século XVI, ou seja, até ao …m da Idade Média. Este pensamento
cristão deve o seu nome às artes ensinadas na altura pelos escolásticos nas escolas medievais. Estas
artes podiam ser divididas em Trivium (gramática, retórica e dialéctica) e Quadrivium (aritmética,
geometria, astronomia e música). A escolástica resulta essencialmente do aprofundar da dialética.
XVII
e o deixa andar por si próprio. Assim Deus deixou os céus se moverem
continuamente...de acordo com a ordem [por Ele] estabelecida."
Outros grandes baques na teoria aristotélica iriam ser dados por Copérnico, com a
publicação de sua obra As revoluções das orbes celestes, e em 1543 por Galileu,
com seu livro Diálogo sobre os dois sistemas do Mundo, publicado em 1632. Na
verdade, no século XVII, através de Copérnico e Galileu, o homem passa a perceber o
mundo que o cerca não mais pela ação direta de um Criador que molda uma a uma, ex-
nihilo, as suas criaturas, mas pela existência de leis universais da natureza que podem
ser expressas matematicamente, sendo estas criadas por Deus como a representação
de Sua inteligência superior. O homem começa a questionar agora de outra forma: se
Deus criou a matéria através de um sopro inicial, colocando-a em movimento, quais
seriam as leis básicas que regeriam a evolução do Universo? Quais seriam as grandezas
que melhor representariam a matéria e seu movimento? Que expressões matemáticas
melhor representariam os grandes princípios de conservação do universo? A contem-
plação escolástica medieval da obra divina passa a ser substituída pela pergunta: por
quê? Enquanto que o para quê é a pergunta da causa …nal, ou …nalidade, o por quê é
a pergunta da causa e…ciente, ou causalidade.
À Copérnico, deve-se o fato de ter tirado a Terra como centro do Universo, colocando-
a como um mero planeta que orbitava em torno do Sol, idéia que não foi bem aceita
na época não só pelo fato de ir contra ao dogma religioso da Terra como centro do
universo. Podemos pensar o quão assustador foi para a Igreja pensar que a Terra (lar
de Sua Santa Igreja) não era o centro do Universo. É como se Deus tivesse, possivel-
mente, "outras casas"... Vale lembrar, que nas primeiras universidades os professores
também eram padres (lembre-se de Abelardo e Heloísa14), o que compromete todo o
pensamento …losó…co e cientí…co até, provavelmente, a Reforma Protestante.
Do ponto de vista da astronomia observacional, que era bem desenvolvida na época,
havia ainda no modêlo de Copérnico algumas falhas, pois com este ele podia explicar
apenas qualitativamente o movimento retrógrado dos planetas. Na verdade seu mod-
êlo era apenas um pouco menos complicado que o sistema geocêntrico proposto por
Ptolomeu, em seu livro Almagesto15. Tanto no modêlo de Ptolomeu como no de
Copérnico, eram necessárias as introduções de epiciclos, para descrever o movimento ob-
servados pelos planetas conhecidos na época (Marte, Vênus, Saturno), além de algumas
estrelas. O esquema da …gura(5), mostra como seria explicado o movimento aparente
do planeta Marte. A diferença básica entre eles era que no modêlo de Ptolomeu a Terra
seria o centro do Universo e no de Copérnico, a Terra seria apenas mais um planeta
14http://www.educ.fc.ul.pt/docentes/opombo/hfe/momentos/abelardo/abelardoheloisa.html
15Almagesto, palavra árabe que signi…ca "O Maior", é o nome de um tratado de Astronomia
escrito no século II pelo astrônomo Claudius Ptolomaeus de Alexandria, Egito. A obra, uma coleção
de 13 livros, contém o mais completo catálogo de estrelas (cerca de mil) da Antiguidade e foi utilizado
amplamente pelos árabes e europeus até a alta Idade Média. Descrevia também o geocentrismo e o
movimento aparente das estrelas. Tinha o título original de "A Coleção Matemática", no entanto,
…cou conhecida por "O Grande Astrônomo", de onde vem o seu título …nal.
XVIII
orbitando em torno do Sol. Esta necessidade de epicíclos cairia com Johannes Kepler,
no início do século XVII, com a introdução de órbitas elípticas.
Figura 5. Representação do sistema de epicíclos de Ptolomeu.
Do ponto de vista físico, Copérnico tinha um problema grave que era explicar
porque os corpos na superfície da Terra seguiam seu movimento de rotação, já que ela
não se encontrava mais estática no centro de tudo! Mas isso para Copérnico, que era
um astrônomo, não era uma prioridade e suas expicações para este aparente paradoxo
foram todas baseadas na teoria aristotélica de tendência ao lugar natural das coisas.
Foi Galileu que buscou uma solução mais revolucionária para tais fatos.
Grande adepto da observação, Galileu pode ser considerado o "pai" do método
cientí…co, ou seja, uma pessoa que capaz de de…nir um problema; recolher dados;
propor uma hipótese; realizar uma experiência controlada, para testar a validade da
hipótese; analisar os resultados e interpretar os dados e tirar conclusões, o que serve
para a formulação de novas hipóteses. Graças a esta, digamos, quebra de paradigma
com relação à mentalidade cientí…ca da época, Galileu pode realizar experiências que
colocavam como válidas as idéias de Copérnico. Vamos dar um exemplo do como o
método cientí…co de Galileu mostrou a validade da teoria de Copérnico:
Imagine voce, dentro de um onibus, voltando para casa, depois de um longo dia de
estudos... . O onibus se movimenta com uma velocidade de 60 km/h e voce esta de
pé (que azar), segurando um caderno debaixo do braço. Eis que, meio que dormindo
em pé, voce deixa cair o caderno no chão. Bom, até aí tudo bem, azares acontecem,
mas o problema é que segundo a teoria de Aristóteles, apesar do caderno estar em
movimento junto com voce dentro do ônibus, este não teria nenhum impetus, uma
XIX
vez que voce não o empurrou para lugar nenhum, ele apenas caiu, buscando seu lugar
natural ! Se ele não tem impetus e voce está se movimentando, o caderno, ao cair no
chão deveria cair atrás de você, pois a medida que ele cai, você se movimenta para
frente! O que fez Galileu? Ele realizou um experimento para mostrar o erro da teoria
de Aristóteles! Quem nunca houviu falar da famosa experiência de Galileu, na célebre
(em parte graças ao mesmo Galileu) torre inclinada da cidade de Pisa?
Ele deixou cair duas balas, uma de canhão, e outra de mosquete, ambas de ferro e
com massas bem diferentes. Segundo Aristóteles, a de maior massa deveria cair mais
rápido que a de menor massa, além do fato de que como a Terra se move, ambas as
bolas não cairiam ao pé da torre! Bom, Galileu mostrou que se deixarmos cair as
duas balas, ambas cairão ao mesmo tempo e ao pé da torre! Ou seja, com apenas um
experimento ele derrubava dois grandes pilares da teoria aristotélica.
Figura 6. A queda das duas balas da torre, segundo a teoria aristotélica
(esquerda) e a experiência de Galileu.
Não existem indícios formais de que esta experiência tenha realmente sido realizada,
apenas relatos do secretário de Galileu. Alguns dizem que foi apenas uma "experiência
de pensamento"de Galileu. De uma forma ou de outra, seria uma experiênciafácil de
ser realizada e nos que mostra que as vezes uma simples experiência pode fazer com
que evitemos pistas falsas na elucidação de nossa história de mistérios.
Mas isso custou muito caro a Galileu, pois ele mostrou experimentalmente, e voce
também a partir do momento que viu o caderno cair nos teus pés, que o fato das coisas
não se deslocarem enquanto caem, apesar de estar dentro de um ônibus em movimento,
que a queda vertical dos corpos não é uma evidência para o estado estacionário da
Terra. Ou seja, ela poderia sim, estar ser movendo! Isso o levou ao Tribunal da Santa
Inquisição e diante do mesmo ele foi obrigado a pedir desculpas e adimitir publicamente
que estava errado e que, na verdade, a Terra estava parada no centro do universo. A
lenda conta que após ter admitido que a Terra não se movia ele teria murmurado,
XX
meio que para si mesmo, a frase "Eppur si muove"(Todavia, ela se move). Apesar de
ter admitido o erro, Galileu passou o resto da sua vida em prisão domiciliar, o que
podemos considerar uma grande recompensa, uma vez que os crimes graves de heresia
contra a Igreja Católica eram punidos com a morte, ou na fogueira, ou por decapitação,
ou por enforcamento (não sem antes uma boa sessão de torturas para ver se o herege
admitia sua culpa....)!
Mas Galileu ainda conservou a idéia do impetus, apenas modi…cando-a um pouco.
Para ele, o impetus era auto-consumível, pois sendo ele a causa do movimento, deveria
ser gasto para mante-lo. Tratava-se ainda de uma visão não-inercial, pois o impetus era
considerado como a causa do movimento! Mas, cabe aqui mencionar que devemos a
Gelileu a primeira idéia sobre a inércia, como a concebemos atualmente. Em seu livro,
Diálogo Sobre os Dois Principais Sistemas do Mundo, Galileu discute sobre o movi-
mento de uma esfera de metal que ao rolar sobre um plano inclinado sua velocidade
aumenta e, se a mesma for lançada para cima sua velocidade diminui gradualmente.
Com base nestas re‡exões, ele chega a conclusão que em um plano horizontal, a veloci-
dade não deverá aumentar nem diminuir e, na ausência de impedimentos externos, ela
deverá manter sua velocidade de forma perpétua, a partir do momento que receba um
impulso inicial. Mas para que este movimento pudesse continuar de forma perpétua, o
plano deveria ser constantemente estendido e Galileu resolveu este problema a…rmando
que este seria uma superfície cuja distância ao centro da Terra fosse constante, ou seja,
o movimento perpétuo da esfera seria um movimento circular uniforme. Na verdade,
ele considerava que a inércia seria de alguma forma associada ao movimento circular e
alguns historiadores da Ciência discutem se seu conceito de inércia não seria na verdade
a expressão de um pensamento quase que copernicano de manutenção de movimento
circular em torno da Terra. Outros dizem que, na verdade, uma vez que o dogma de
circularidade seria o dominante na época, seria mais conveniente conseguir adesões a
sua teoria se ele supuse-se uma "inércia circular ". Mas isto não impediu que Galileu
tivesse trazido grandes contribuições ao estudo dos movimentos, sendo ele o primeiro a
explicar o movimento de lançamento de projéteis como a combinação de dois movimen-
tos: um movimento retilíneo uniforme (paralelo a Terra) e um uniformemente acelerado
(perpendicular ã Terra). Porém, o que todo o processo iniciado por Galileu, que pode
ser considerado como o ultimo dos pensadores antigos ou o primeiro dos pensadores
novos, mostra é que se para ser um bom físico bastasse apenas ser um bom observador,
a Física seria uma ciência bem banal! Como ele mesmo a…rmava: Ninguém poderá
compreender o grande livro do universo se ignorar a linguagem matemática16.
Porém, coube ao …lósofo francês René Descartes (1596-1650) enunciar de forma
mais clara o princípio de inércia, de modo mais sistemático, em seu livro Princípios de
Filoso…a, publicado em 1644. Em suas Leis da Natureza, encontramos as seguintes
idéias:
"A primeira lei da natureza: qualquer coisa –desde que dependa de si –
persevera sempre no mesmo estado; e portanto qualquer coisa uma vez
16Lembre-se bem desta frase ao longo de seus estudos....
XXI
em movimento continua sempre a se mover. A segunda lei da natureza:
todo movimento por si mesmo é retilíneo...
Dessas a primeira [lei da natureza] é que qualquer coisa, enquanto
seja simples e indivisível, permanece, desde que dependa de si, sempre
no mesmo estado, nunca mudando [em seu estado] a não ser por causas
externas."
Esta visão é bem mais próxima da que hoje temos da lei de inércia, mas sua con-
cepção era ainda um pouco distante do que hoje acreditamos. Para ele havia todo
um sistema do mundo no qual a matéria se identi…cava com o espaço, e não havia
lugar para o vazio. A lei fundamental do sistema de Descartes é a conservação do
movimento pois, Descartes acreditava em um deísmo e para o …lósofo francês Deus deu
ao Universo uma certa quantidade de movimento em sua Criação, e este continuaria
inalterado17. A física cartesiana, baseada na …gura e no movimento, dominou o século
XVII. Para Descartes, não existe vácuo, nem átomo e a ação a distância é impensável.
A matéria confunde-se com o espaço e, para que este último esteja sempre preenchido, o
movimento longitudinal transforma-se em movimento circular, originando turbilhões e
ondas. Em sua teoria, o movimento seria representado pelo produto da massa pela ve-
locidade do corpo (o que hoje conhecemos como momento) mv, prescindindo do caráter
direcional da velocidade. Poderia haver transferência de movimento entre partículas
que se chocam, porem nunca poderia ser criado nem destruído. A casualidade física se
reduz a um princípio puramente mecânico: toda variação é movimento e toda alteração
do movimento se deve ao contato entre os corpos. Na concepção de Descartes a questão
chave da Física, que nunca tinha sido apresentada até então, estaria apoiada nas leis
dos choques entre os corpos, que o mesmo formulou:
Se um corpo que se move encontra outro mais forte que ele, não perde
nada de seu movimento e se encontra outro mais fraco, a quem possa
mover, perde de seu movimento aquilo que transmite ao outro.
A quantidade de movimento de um corpo poderia, desta forma, aumentar ou
diminuir através de choques, desde que esta variação fosse compensada por variações
na quantidade de movimento nos corpos com os quais colidiu. Na ausência de col-
isões, o corpo tenderia a manter o seu estado de movimento, ou de repouso. Através
desta idéia, ele pensava poder explicar todo o movimento, inclusive o dos planetas,
por sistemas de colisões com pequenos corpúsculos. Para isso ele teve que postular
um universo repleto de pequenos corpúsculos, se movendo em vórtices, para explicar
estes movimentos. Deve-se também a Descartes a idéia de que o Universo é totalmente
preenchido por um "éter"onipresente. Assim, a rotação do Sol, através do éter, criaria
ondas ou redemoinhos, explicando o movimento dos planetas, tal qual uma batedeira.
O éter também seria o meio pelo qual a luz se propaga, atravessando-o pelo espaço,
desde o Sol até nós.
17Em seu livro Principios da Filoso…a, um de seus postulados diz que: "Deus é a primeira causa
do movimento, e que Ele conserva uma mesma quantidade de movimento no Universo. "
XXII
Figura 7. Diagrama extraido dos Principia Philosophiae, de Descartes,
ilustra sua famosa teoria dos turbilhões.
A sua tentativa de reunir uma interpretação da natureza que pudesse integrar a
…loso…a, matemática, religião e a ciência natural, não foi muito bem sucedida e um dos
motivos foi simplesmente o fato que de na análise de sua conservação de movimento
ele não possuia um conceito claro de massa, a qual confundia com volume, o peso e a
força, além do que não se levava em consideração o caráter direcional da velocidade, ou
seja, uma lei vetorial não foi tratada claramente. Descartes porém contribui em vários
outros ramos da Física, sendoque uma das suas grandes contribuições foram no campo
da Optica, onde ele formulou as equações de lentes e levantou as primeiras hipóteses
sobre a formação do arco-íris como sendo um efeito do desvio da luz por gotículas de
água (ver …gura (8)).
Descartes é considerado o primeiro …lósofo moderno. A sua contribuição à episte-
mologia é essencial, assim como às ciências naturais por ter estabelecido um método
que ajudou no seu desenvolvimento. Descartes criou, em suas obras Discurso sobre o
método e Meditações - ambas escritas em francês, em lugar do latim, língua tradicional-
mente utilizada nos textos eruditos de sua época - as bases da ciência contemporânea.
O método cartesiano consiste no Ceticismo Metodológico - que nada tem a ver com
a atitude cética: duvida-se de cada ideia que não seja clara e distinta. Ao contrário dos
gregos antigos e dos escolásticos, que acreditavam que as coisas existem simplesmente
porque precisam existir, ou porque assim deve ser etc., Descartes instituiu a dúvida:
só se pode dizer que existe aquilo que puder ser provado, sendo o ato de duvidar
indubitável. Baseado nisso, Descartes busca provar a existência do próprio eu (que
XXIII
Figura 8. Diagrama do livro Dioptrica de Descartes, mostrando a for-
mação do arco-íris, pela decomposição da luz pelas gotas de água.
duvida, portanto, é sujeito de algo - ego cogito ergo sum- eu que penso, logo existo) e
de Deus.
Também consiste o método de quatro regras básicas:
� veri…car se existem evidências reais e indubitáveis acerca do fenômeno ou coisa
estudada;
� analisar, ou seja, dividir ao máximo as coisas, em suas unidades mais simples
e estudar essas coisas mais simples;
� sintetizar, ou seja, agrupar novamente as unidades estudadas em um todo
verdadeiro;
� enumerar todas as conclusões e princípios utilizados, a …m de manter a ordem
do pensamento.
A sua contribuição à epistemologia18 é essencial, assim como às ciências naturais
por ter estabelecido um método que ajudou no seu desenvolvimento. Descartes criou,
em suas obras Discurso sobre o método e Meditações - ambas escritas em francês, em
lugar do latim, língua tradicionalmente utilizada nos textos eruditos de sua época - as
bases da ciência contemporânea.
Ainda na Europa do século XVII, um outro grande pensador se dedicava a desven-
dar os mistérios de nossa história: Gottfried Wilhelm Leibniz. Grande opositor de
Descartes, Leibiniz criou um sistema de pensamento que diferia em muito do criado
por Descartes, no qual não bastavam apenas a extensão e o movimento da matéria, mas
também conceitos como esforço, a vontade e a alma. Como Descartes, que artibuia
ao produto da massa pela velocidade do corpo mv, uma medida de "força", Leibniz
18s. f. Teoria do conhecimento; estudo crítico do conhecimento cientí…co em seus vários ramos
(do grego episteme+logos)
XXIV
acreditava que esta medida seria na verdade a massa pelo quadrado da velocidade
(mv2), grandeza esta a qual ele denomina de vis viva (força viva). Ele acreditava que
para para medir esta impulsão (não havia ainda o conceito de força), bastava encon-
trar uma maneira de medir o impacto causado pelo corpo. Como Galileu e Torricelli
haviam descoberto empiricamente que as velocidade …nais de um corpo em queda livre
eram proporcionais à raiz quadrada da altura, Leibniz prova (ou pretende provar) que a
grandeza que mede o movimento, e portanto a medida desta impulsão, é a massa vezes
o quadrado da velocidade! Em seu livro, Discurso de Metafísica, ele ataca abertamente
a Descartes, criticando-o ferozmente:
Freqüentemente nossos novos …lósofos se servem da famosa regra em que
Deus conserva sempre a mesma quantidade de movimento do universo.
De fato isto é muito plausível e antes eu próprio a tinha como indubitável.
Porém há algum tempo reconheci em que consiste o seu erro. O Senhor
Descartes e muitos hábeis matemáticos têm acreditado que a quantidade
de movimento, isto é, a velocidade multiplicada pela magnitude (massa)
do móvel é exatamente a força motriz ou, para falar matematicamente,
que as forças estão na razão direta das velocidades e das magnitudes(...).
O sistema de pensamento de Leibniz era bem diferente do de Descartes, pois ele
acreditava que, para a concepção do Universo, a extensão e o movimento da matéria
não eram su…cientes, mas era necessário também introduzir algumas idéias de caráter
metafísico: a alma, o esforço e a vontade. Porém a ideia mais complicada era uma
outra noção fundamental, não só do sistema …losó…co de Leibniz, como a de outros
sistemas …losó…cos racionalistas da época: a causa imanente. Esta causa imanente
seria uma identidade completa entre a causa e seu efeito, causa aequat e¤ectum, ou
seja causa igual a efeito. Desta forma, haveria uma identidade completa entre a causa
e seu efeito que neste se manifesta, exprime e esgota. Esta seria também a idéia de
outro …lósofo racionalistas, B. Spinoza, que levaria a causa imanente à uma esfera
ainda mais elevada, considerando que Deus seria a causa imanente do Universo, sendo
o Universo a sua manisfestação, expressa através da natureza e das leis que a regem.
Sua famosa frase Deus sive natura (Deus, ou seja, natureza) é a frase que melhor
expressa a metafísica de Spinoza.
Leibniz, embora concordando com Descartes sobre a necessidade de exatidão nos
princípios e no método, achava que seria indispensável devolver à ciência certas noções
que os cartesianos haviam excluído, ou seja, a metafísica. Contra o dualismo carte-
siano, que opõe a matéria (res extensa)19 ao pensamento (res cogitans) situando-os em
domínios distintos, Leibniz propõe a teoria das mônadas, uma espécie de átomo da
espiritualidade e da força da matéria, não vendo nenhuma contradição entre esta e o
espírito. Desta forma ele passa a buscar a verdadeira representação matemática da
força (vis) das mônadas. Para Spinoza, também não havia dualidade porque tanto o
pensamento como a extensão da matéria eram manifestações da substância divina, e
19A res cogitans (o sujeito pensante) que encontra obstáculo numa res extensa (coisa extensa) que
é o corpo, a realidade deste mesmo ou matéria.
XXV
esta se confundia com a própria natureza e suas leis. Leibniz e Spinoza, ao contrário
de Descartes, eram pensadores monistas. Durante algum tempo esta discusão entre as
idéias de Descartes e Leibniz foram assunto da comunidade cientí…ca da época.
Porém, iria aparecer uma pessoa para estabelecer uma ponte entre as duas formas
de pensar e modi…car toda a maneira de se interpretar o movimento: Isaac New-
ton! A primeira publicação de seu famoso livro Princípios Matemáticos da Filoso…a
Natural (Philosophiæ Naturalis Principia Mathematica) em 1687, causou uma certa
revolução no meio cientí…co da época. Era considerado um livro di…cílimo, que poucos
tinham condições de entender, porém, nesta obra foram colocadas as mais importantes
de…nições e leis da Física como a entendemos hoje em dia.
Figura 9. Fac-simile da primeira edição do Principia de Newton, de 1686
O Principia de Newton é sem sombra de dúvidas o mais importante livro sobre
Filoso…a Natural publicado no período moderno, sendo até os dias de hoje consider-
ado como uma das maiores realizações cientí…cas de todos os tempos. Ele apresenta
uma nova forma de se enxergar a Física, dando uma interpertação matemática aos
fenômenos físicos e mostrando que havia a possibilidade de se descrever, através de ex-
pressões matemáticas, o movimento dos corpos na superfícies da Terra como também
XXVI
nos movimentos celestes. Ou seja, pela primeira vez um rigor matemático era dado
ao movimento dos corpos, de tal forma que não somente podia-se dizer quais seriam
as condições do movimento em um determinado momento do tempo como também,
tendo conhecimento das causas e parâmetros iniciais do mesmo, poder descreve-lo em
qualquer instante de tempo, anterior ou posterior!
Mas quais foram as grandes mudançasintroduzidas por Newton em sua obra? O
que fez Newton para ser tornado tão célebre?
A sua grande contribuição vem do fato de que ele colocou em uma mesma Física
o mundo terrestre e o mundo celestial. Como já haviamos visto anteriormente, desde
a Física de Aristóteles, as coisas eram divididas em duas realidades: a que regia o
mundo na Terra e outra que governava o mundo celestial. A sua grande revolução foi
mostrar que os dois mundos podem ser explicados pela mesma Física, com as mesmas
regras. Porque ele foi tornado tão célebre? Simples. Pelo fato de ter colocado o mundo
celestial sendo governado pelas leis que descreviam os movimentos dos corpos na Terra,
ele podia determinar, sem grandes problemas, o movimento dos corpos celestes com
grande precisão através de cálculos matemáticos.
Em 1679 Newton deduziu através das Leis de Kepler, que foram obtidas através
da observação do movimento dos planetas, que a força de atração entre os planetas
era diretamente dependente das massas e do inverso do quadrado da distância e que
as órbitas eram elipticas. Mas nesta época, talvez devido a dados errados e enganos
de unidades usadas, os resultados obtidos por ele, através desta hipótese, foram dados
como apenas como "bem próximos"! Por esta simples razão, ele deixou os cálculos
de lado, esquecendo-os por completo. Em 1684, Hooke, Halley (o mesmo do cometa)
e outros concluiram em Londres que, através dos dados obtidos por observação do
movimento dos planetas, as órbitas deveriam ser elipticas e a força de atração e do
tipo inverso do quadrado da distância. Ao saber dos resultados de Newton, Halley vai
a Cambridge procura-lo sobre a questão. Logo ao encontra-lo Newton explica a Halley
todo o movimento das órbitas dos planetas e lhe diz que já havia trabalhado nele havia
um tempo, mas que havia deixado de lado. Ele foi então incentivado por Halley não
somente a retomar seus cálculos como também os apresentar os resultados a Royal
Society. Conta-se que ao ser abordado por Halley em Cambridge, este o perguntou
de forma direta: "Voce sabe como são as órbitas do planetas?", Newton respondeu
sem re‡etir: "Elipses!", o que deixou Halley extremamente chocado, pois ele tinha
descoberto isto através de longa análise dos movimentos dos planetas. Um pouco sem
ação, ele perguntou a Newton como ele já sabia disso, e obteve a resposta: "Eu já sabia
faz tempo, só não dei muita importância...".
Suas contribuições foram inúmeras, tendo inclusive realizado alguns estudos sobre
Teologia. De seu livro Principia, o que mais se retem são as suas famosas Leis de
Newton, que enunciamos a seguir (o texto em latim é o que foi publicado na versão
original, pois essa era a lingua cientí…ca da época):
* Lex I: Corpus omne perseverare in statu suo quiescendi vel movendi uniformiter
in directum, nisi quatenus illud a viribus impressis cogitur statum suum mutare.
XXVII
(Lei I: Todo corpo continua em seu estado de repouso ou de movimento uniforme em
uma linha reta, a menos que seja forçado a mudar aquele estado por forças imprimidas
sobre ele.)
* Lex II: Mutationem motus proportionalem esse vi motrici impressæ, et …eri se-
cundum lineam rectam qua vis illa imprimitur.
(Lei II: A mudança de movimento é proporcional à força motora imprimida, e é
produzida na direção da linha reta na qual aquela força é imprimida.)
* Lex III: Actioni contrariam semper et æqualem esse reactionem: sine corporum
duorum actiones in se mutuo semper esse aequales et in partes contrarias dirigi. (Lei
III: A toda ação há sempre oposta uma reação igual, ou, as ações mútuas de dois corpos
um sobre o outro são sempre iguais e dirigidas a partes opostas.)
Podemos notar que a Lei I, ou Primeira Lei como costumamos chamar, é nada mais
nada menos que uma forma mais elaborada de expressar as duas Leis da Natureza de
Descartes, que já vimos acima. Todavia, as duas outras Leis são totalmente inovadoras,
e levam
As consequências e implicações destas leis, assim como das outras
idéias expressas por Newton, serão discutidas mais em detalhe no
capítulo XX,
mas podemos adiantar
"Nature and nature’s laws lay hid in night;
God said:
’Let Newton be’
and all was light"
(A natureza e as leis da natureza estavam imersas em trevas;
Deus disse
"Haja Newton"
e tudo se iluminou).
Alexander Pope (21 de maio de 1688, Londres — 30 de maio de
1744, Twickenham, hoje parte de Londres) foi um dos maiores poetas
britânicos do século XVIII.
CAPíTULO 2
Números, medidas, erros e vetores
O objetivo principal da Física é o conhecimento das relações de interdependência de
grandezas que podem associar-se a um dado fenômeno físico. Chegamos a estas relações
através da observação e da experimentação, ou através de conhecimentos adquiridos.
A observação consiste no estudo de fenômenos onde podemos não somente constatar
o fenômeno e anotar as fases de desenvolvimento do mesmo, como também podemos
levantar hipóteses sobre as causas que os produziram. Na experimentação partimos
do pressuposto de que poderemos repetir o fenômeno em condições variáveis e que
nas mesmas condições serão observados os mesmo fenômenos. Este é o prinípio da
Causalidade, de fundamental importância em Ciências.
As …nalidades mais importantes da experimentação são o exame de hipoteses sug-
eridas, seja pela observação ou através de conhecimentos teóricos e respectiva conjec-
turação sobre a natureza da função que relaciona as variáveis deste fenômeno. As
expressões analíticas que as traduzem são as leis quantitativas. As leis quantitativas,
as vezes são extraídas da experimentação sem uma formulação teórica prévia. Estas
relações são chamadas de empíricas ou experimentais. Elas são nosso interêsse exclu-
sivo na Física. Ou seja, em Física nos interessam somente as leis quantitativas, aquelas
que possibilitam inferir as relações entre as diversas grandezas que caracterizam os
fenômenos. Para isso, necessitamos medir essas grandezas e, para que possamos tirar
as relações que nos interessam das medidas, precisamos fazer um estudo dos erros que
podemos cometer nas medições.
1. Introdução
"Tenho a…rmado frequentemente que, quando se pode medir aquilo que
se está falando e podemos expressar essa medida em números, …camos
sabendo algo a seu respeito; mas quando não se pode exprimir em números,
o conhecimento é limitado e instatisfatório. Ele pode ser o começo do
conhecimento, mas o pensamento terá avançado muito pouco para o está-
gio cientí…co, qualquer que seja o assunto."(Sir William Thomson, Lorde
Kelvin, 1824-19071)
O Universo é composto por corpos que ocupam lugar no espaço. As modi…cações
dos corpos no tempo e no espaço são chamdas fenômenos. Havendo uma dependência
1Físico escocês de origem irlandesa (26/6/1824-17/12/1907), criador da escala de temperaturas
absolutas Kelvin. O nome deriva de seu título de barão Kelvin of Largs, outorgado pelo governo
britânico em homenagem a sua descoberta, em 1892.
XXIX
XXX
entre os fenômenos, podem inferir uma relação quantitativa entre as grandezas que nele
intervêm e estas relações são chamadas de Leis Físicas.
Na Física buscamos as leis fundamentais que regem os acontecimentos através da
observação e do experimento. Uma lei física pode ser expressa por uma expressão
matemática, um grá…co ou uma tabela. Para estudar os fenômenos quantitativamente é
necessário que possamos medir as diversas grandezas envolvidas e, medir uma grandeza
é compará-la com uma outra de uma mesma espécie, tomada como unidade.
Por longo tempo cada país, cada região, teve seu próprio sistema de medidas. Essas
unidades de medidas, entretanto, eram geralmente arbitrárias e imprecisas, como por
exemplo, aquelas baseadas no corpo humano: palmo, pé, polegada, braça, côvado.
Isso criava muitos problemas para o comércio, porque as pessoas de uma região não
estavam familiarizadas com o sistema de medir das outras regiões, e também porque
os padrões adotadoseram, muitas vezes, subjetivos. As quantidades eram expressas
em unidades de medir pouco con…áveis, diferentes umas das outras e que não tinham
correspondência entre si.
A necessidade de converter uma medida em outra era tão importante quanto a
necessidade de converter uma moeda em outra. Na verdade, em muitos países, inclusive
no Brasil dos tempos do Império, a instituição que cuidava da moeda também cuidava
do sistema de medidas.
Em 1789, numa tentativa de resolver esse problema, o Governo Republicano Francês
pediu à Academia de Ciência da França que criasse um sistema de medidas baseado
numa "constante natural", ou seja, não arbitrária. Assim foi criado o Sistema Métrico
Decimal, constituído inicialmente de três unidades básicas: o metro, que deu nome
ao sistema, o litro e o quilograma. Posteriormente, esse sistema seria substituído pelo
Sistema Internacional de Unidades - SI.
O Sistema Internacional de Unidades - SI foi sancionado em 1960 pela Conferência
Geral de Pesos e Medidas e constitui a expressão moderna e atualizada do antigo
Sistema Métrico Decimal, ampliado de modo a abranger os diversos tipos de grandezas
físicas, compreendendo não somente as medições que ordinariamente interessam ao
comércio e à indústria (domínio da metrologia legal), mas estendendo-se completamente
a tudo o que diz respeito à ciência da medição.
O Brasil adotou o Sistema Internacional de Unidades - SI em 1962. A Resolução no
12 de 1988 do Conselho Nacional de Metrologia, Normalização e Qualidade Industrial
- CONMETRO, rati…cou a adoção do SI no País e tornou seu uso obrigatório em todo
o território nacional. A Tabela abaixo mostras as unidades fundamentias do SI. As
outras são de…nidas a partir destas
UNIDADES FUNDAMENTAIS DO SI
XXXI
Grandeza Unidade Símbolo
Comprimento metro m
Massa quilograma kg
Tempo segundo s
Corrente elétrica Ampère A
Temperatura termodinâmica Kelvin K
Quantidade de matéria mol mol
Intensidade luminosa candela cd
Curiosidade interessante a respeito dos sistemas de medidas!
O Mars Climate Orbiter era uma sonda de 2,1m � 1,6m � 2m, 629Kg, que em
1998 deveria entrar em órbita de Marte em uma altitude entre 140Km e150Km, após
uma manobra de frenagem, onde usaria a atmosfera marciana para desacelerar.
Deveria, se o software não fosse produzido de forma descentralizada, com desen-
volvedores em várias empresas colaborando com o projeto. Uma das empresas respon-
sáveis pelo software de controle dos propulsores auxiliares que faziam a rotação da nave
escreveu suas rotinas usando valores em libras-força. A NASA usou a rotina trabal-
hando com valores em Newtons. A relação Libra-Força/Newton é 4,45. Com isso a
nave não conseguiu corrigir a trajetória, entrou muito baixo na atmosfera marciana e
se transformou em um lindo show de fogos para quem more por lá.
Custo da missão: US$327,6 milhões de dólares.
Em uma segunda parte iremos estudar as grandezas vetoriais e as operações entre
vetores. Iremos tentar exempli…car ao máximo esta parte.
2. Números compactos e ordem de grandeza
Ao longo de nosso estudo, teremos de lidar com números extremamente grandes
como, por exemplo, o número de Avogadro: N=602.000.000.000.000.000.000.000 molé-
culas/mol ou com números muito pequenos, como a carga de um único elétron, expressa
em Coulombs: e=0,000000000000000000016 C
Estes números, quando escritos desta forma, são difíceis de se manipular. No caso
de termos de realizar operações com os mesmos, teríamos que gastar muito papel (além
de paciência) para fazer as contas. Existe uma maneira de tornarmos nossa vida mais
fácil, fazendo uso dos números compactos. Qualquer número pode ser escrito como
o produto de um número entre um e dez por outro que é uma potência de dez. Por
exemplo, podemos representar os números que vimos acima da seguinte forma:
N = 6,02 � 1023 moléculas/mol
e = 1,6 � 10�19 C
No primeiro caso, o expoente do número dez indica quantos zeros estão contidos
na potência de dez. No segundo, o sinal negativo é usado para indicar que o número
está sendo dividido pela potência de dez. Na verdade, para obtermos este números,
XXXII
fazemos uma conveniente multiplicação e divisão do número por potências de dez. Por
exemplo, o número 1958 pode ser escrito como:
1958 = 1958�1000
1000
= 1958
1000
� 103 = 1; 958� 103;
assim como o número 0,00013 pode ser escrito como:
0,00013 = 0;00013�10:000
10:000
= 1;3
10:000
= 1; 3� 10�4:
Estes números são chamados números compactos, e serão largamente usados ao
longo de nosso curso e, pode …car certo, ao longo de todo o resto de sua vida....
2.1. Operações com números compactos.
2.1.1. Soma e subtração. Para somar e subtrair números compactos, devemos ter
o cuidado de, antes de qualquer coisa, transformá-los na mesma potência de dez. Por
exemplo, se vamos somar os números 2,4 e 3,25�10�1:
2,4 = 0,24�10�1.
Temos então que: 0,24�10�1+3,25�10�1 = 3; 49 � 10�1. O que teria acontecido
se tivéssemos transformado a potência de dez do segundo número? Faça o teste você
mesmo!
2.1.2. Multiplicação e divisão. Para se multiplicar um número escrito em forma
compacta por outro basta multiplicarmos os números e somarmos os expoentes. Por
exemplo:
4�10�2 � 5�103 = (4 � 5)� 10(�2+3) = 20� 101 = 200:
(como …caria a divisão entre estes dois números? Qual seria o resultado de 4�10�2 �
5�103? Faça você mesmo!)
Podemos ver que o uso de potências de dez é uma questão de conveniência, pois no
exemplo acima …ca mais fácil escrever 200 do que 20� 101(mais a frente veremos que
deveremos tomar mais cuidado com esta praticidade, pois ao tratarmos com algarismos
signi…cativos as coisas …carão mais complexas).
2.2. Ordem de grandeza. Ordem de grandeza de um número é a potência de
dez mais próxima do número. Por exemplo, a ordem de grandeza do número 243 é 102,
pois 243 está mais próximo de 100 do que de 1000. A ordem de grandeza de 0,00262 é
10�3 porque 0,00262=2,62�10�3, que está mais próximo de 10�3 do que de 10�10�3.
Um exemplo interessante é o do número 550. A ordem de grandeza de 550 pode
ser 102 ou 103, porque ele está igualemente distanciado de ambos. Porém, como nas
regras de arredondamento o número 5 é sempre arredondado para cima, é preferível
tomar 103 como sendo a ordem de grandeza de 550.
O cálculo da ordem de grandeza é muito útil na Física, pois muitas vezes ao se fazer
uma estimativa das ordens de grandeza, podemos evitar muitos cálculos cansativos.
A Tabela abaixo mostra os pre…xos usados no SI para os números compactos.
XXXIII
10n Pre…xo Símbolo Escala curta2 Equivalente decimal
1024 yotta Y Septilhão 1 000 000 000 000 000 000 000 000
1021 zetta Z Sextilhão 1 000 000 000 000 000 000 000
1018 exa E Quintilhão 1 000 000 000 000 000 000
1015 peta P Quadrilhão 1 000 000 000 000 000
1012 tera T Trilhão 1 000 000 000 000
109 giga G Bilhão 1 000 000 000
106 mega M Milhão 1 000 000
103 quilo k Milhar 1000
102 hecto h Centena 100
101 deca da Dezena 10
100 Unidade 1
10�1 deci d Décimo 0,1
10�2 centi c Centésimo 0,01
10�3 mili m Milésimo 0,001
10�6 micro � (mu)3 Milionésimo 0,000 001
10�9 nano n Bilionésimo 0,000 000 001
10�12 pico p Trilionésimo 0,000 000 000 001
10�15 femto f Quadrilionésimo 0,000 000 000 000 001
10�18 atto a Quintilionésimo 0,000 000 000 000 000 001
10�21 zepto z Sextilionésimo 0,000 000 000 000 000 000 001
10�24 yocto y Septilionésimo 0,000 000 000 000 000 000 000 001
3. Erros
Para nosso estudo temos que nos concentrar em um objetivo, que é o objetivo
principal da Física: medir grandezas físicas (volume, densidade, tempo, etc...), de
forma direta ou indireta, a saber:
Medida direta - A comparação é meramente mecânica: através de
uma …ta métrica, medida de massa com uma função análitica, etc...
Medida Indireta - A grandeza procurada é claculada a partir de
outras grandezas de medida direta e com o auxílio de relações exis-
tentes entre estas

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